Espaços Independentes

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APRESENTA

EspaรงosIndependentes


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Espa รงos Inde pen den tes Sรฃo Paulo 2010


AteliĂŞ397 Coordenadores Carolina Soares Marcelo Amorim Mariana Trevas Thais Rivitti Assistentes Cesar Rivitti Isabella Rjeille

www.atelie397.com Rua Wisard, 397 - Vila Madalena 05434-080 - SĂŁo Paulo -SP 397atelie@gmail.com


Espa รงos Inde pen den tes Sรฃo Paulo 2010


Copyright 2010 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Espaços Independentes. Thais Rivitti, et all (Textos). São Paulo, 2010. 160 p.: il.

Textos em Português.

Arte Contemporânea, Circuitos Alternativos - século XXI – Brasil. I.Título. II. Atelier Subterrânea. III. Arquipélago. IV. Ateliê 397. V. Branco do Olho. VI. Lauriano, Jaime. VII. Rivitti, Thais. VIII. Viana, Robson. IX. Conexão Artes Visuais MinC Funarte Petrobras 2010 CDU: 72.037(81) CDD: 709.81 CDD 0000000

Foi feito o depósito legal na Biblioteca nacional (Lei nº 10.994, de 14/12/2004)


Espa รงos Inde pen den tes Sรฃo Paulo 2010



Conexão Artes Visuais O Conexão Artes Visuais possibilita a artistas, curadores, pesquisadores e espectadores participar de uma grande rede de troca de ideias e experiências no campo das artes visuais. O programa — realizado pela Funarte com patrocínio da Petrobras, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura — já se disseminou por todo o Brasil, alcançando grandes centros urbanos e municípios menores. Em 2010, os trinta projetos viabilizados pela segunda edição do programa ampliaram esse intercâmbio. Dois dos proponentes contemplados publicaram seu próprio edital para convocar propostas de todo o país, uma novidade que torna o Conexão ainda mais democrático. Quarenta cidades brasileiras recebem exposições, intervenções, oficinas e debates. Além disso, livros e websites reúnem textos críticos e acervos artísticos, de forma a fomentar a documentação e a reflexão. Esse conjunto reflete a diversidade de linguagens hoje presente nas artes visuais, da fotografia ao grafite, da videoarte à instalação. Os artistas e produtores contemplados promovem eventos de caráter performático, ações de difusão da cultura digital, pesquisas que integram arte e ciência, além de atividades que fazem circular bens culturais e seus criadores por diversas regiões do país. As ações são registradas pelos proponentes em textos, fotos e vídeos. O material abastece o site do Conexão e servirá de base para a produção de um catálogo, o que garante a difusão dos resultados para um público ainda mais abrangente. A primeira edição do programa viabilizou, em 2008, cerca de 300 atividades, oferecidas gratuitamente a mais de 80 mil pessoas, em 42 cidades. Para nós é um grato prazer saber que muitos desses projetos continuam a evoluir, incentivando o trabalho de outros artistas e atraindo novos públicos para as artes. Esperamos que o livro Espaços Independentes siga essa trilha de sucesso, propiciando cada vez mais olhares diversos para as artes visuais no Brasil. Sérgio Mamberti Presidente da Funarte



Apresentação Ateliê397 Barracão Maravilha Atelier Subterrânea Branco do Olho Arquipélago Outras tantas histórias

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Espaรงos In de pen den tes


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Ao atribuir a esta publicação o título Espaços Independentes, o Ateliê397 propõe investigar a possibilidade de um circuito de arte contemporânea independente; ou a viabilidade de uma atuação autônoma, definida a partir de claras diferenças em relação a um circuito que se realiza somente no mercado e cuja ideia de valor está relacionada apenas a maior liquidez de um trabalho de arte. Afinal, em tese, esses espaços independentes deixariam de estar submetidos a injunções de diferentes ordens – econômica, política ou social – para atuarem de maneira mais livre. Isso implicaria novas articulações a partir de uma atitude reflexiva sobre o papel que esses lugares assumem no contexto contemporâneo. Não resta dúvida sobre o esforço empenhado por esses espaços em levar adiante a possibilidade de um funcionamento que não se restrinja à realização de transações de compra e venda de trabalhos de arte. Tampouco esses espaços podem ser vistos como os últimos bastiões de resistência contra uma lógica comercial que retira dos trabalhos sua condição crítica para lhes transformar em produto. Afinal, mesmo que de forma lateral, esses espaços fazem parte do mesmo circuito – o circuito da arte – em que as leis de mercado tem papel decisivo em determinar os modos de pressão sobre a produção e de consumo do trabalho de arte. E é de experimentações, de proposições artísticas e críticas não pautadas por uma agenda nos moldes institucionais que surge uma condição reflexiva que atua como medida para um contraponto a burocratização. É a possibilidade de uma programação menos engessada ou mesmo autoritária que autoriza aos espaços independentes uma atuação que de fato reverbere ruídos de naturezas diversas sobre o circuito comercial da arte. De algum modo, é desejável que paire certa incerteza sobre a definição dos espaços independentes. Esta definição tem que permanecer em suspenso, sob o risco de que seja preenchida com possibilidades já pré-definidas e completamente esquadrinhadas de atuação. Um vazio potente, capaz de revelar contradições de um sistema já estabelecido e de abrir-se ao novo, ainda desconhecido, que está por vir. É apenas nesta condição que se pode ambicionar uma atitude


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verdadeiramente experimental, desejo que permanece no horizonte dos espaços que integram esta publicação. Assim, a presente publicação, mais do que uma troca de informações entre espaços já existentes, é também um convite ao engajamento de todos os agentes do mundo da arte que, de um modo ou de outro, sentem-se inclinados a abrirem-se a esta indefinição. Embora a existência desses espaços esteja sempre por um fio, pois é uma constante as dificuldades que tem para se sustentar e manter uma programação ativa, aos poucos a impressão é de que eles vão ganhando importância e reconhecimento no circuito das artes. Definitivamente cada um deles cumpre uma importante função nos contextos em que se instalam: friccionando com instituições e galerias, mas também indicando novos caminhos possíveis. A presença e proximidade dos artistas e curadores (que, em muitos casos gerenciam os locais) é um diferencial comum a esses espaços. Uma programação feita por artistas, por críticos e pesquisadores, não subordinada a uma agenda política nem a interesses exclusivamente mercadológicos garante um modus operandi diferente, mais experimental, baseado na troca, na conversa no trabalho conjunto. Nota-se como os editais – quer sejam promovidos pelo governo, quer sejam por outras empresas – desempenham papel importante na atuação desses espaços. A inscrição em editais é uma prática comum aos espaços independentes que entramos em contato, embora muitas vezes surja a pergunta: será que as ações que são objetos de financiamento por esses editais são realmente as ações que se quer desenvolver? Ou será que os espaços acabam por se adequar aos editais, a ponto deles ditarem o nosso universo de ações possíveis? Muitas vezes sobrevém a sensação de se estar realizando projetos para editais no lugar de se estar pensando qual o projeto que de fato gostaria realizar efetivamente. No lado da vida prática, o grande “x” da questão parece ser como um local que não tem, a priori, nenhuma dotação orçamentária, nem uma ligação grande com o mercado de


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arte (embora ações de venda de trabalhos de arte, sempre a preços quase simbólicos, despontem aqui e acolá), parece ser um grande desafio também. E, sobretudo, como não burocratizar as atividades, como não deixar que o cotidiano desses espaços seja completamente voltado para o pensamento de como sustentá-lo, como pagar seus colaboradores, como arrecadar fundos para fazer as atividades e projetos. Estas são perguntas que permanecem sem resposta. Sim, porque a viabilidade desses espaços é sempre uma pergunta: “Será possível? Como?” Isso parece ser o que merece ser investigado nesse livro: Como viabilizar a continuidade de ações promovidas por esses espaços? Uma vez que a importância de sua existência como campo de experimentação já está para nós, mais do que provada. Assim, a maneira com que foi conduzida a realização deste livro foi a de revelar como cada um desses espaços atua e percebe sua atuação dentro de um sistema, mais do que ditar regras e padrões a serem seguidos. A seleção dos espaços foi feita de modo a envolver uma descentralização do debate, escolhendo espaços baseados em diferentes cidades brasileiras, e assim tentar alcançar uma maior abrangência a partir de diferentes regiões do país. Com cada um dos quatro espaços escolhidos buscou-se estabelecer um diálogo estreito para se pensar num formato de publicação que fosse de algum compartilhado por todos. Isso resultou em importantes trocas de experiências que se concretizam por meio dos textos produzidos pelos espaços. Para dar início a uma reflexão, foram enviadas algumas perguntas sobre como cada um dos espaços se constitui, sobre a relação que estabelecem com o contexto local e de que modo sua atuação contribui para um adensamento da discussão sobre o circuito de arte. Um texto que traçasse o panorama em relação às artes plásticas, sobretudo à produção contemporânea na cidade, e que falasse também sobre como se relacionam com certas instâncias institucionais e de mercado. Essas questões assumiam o papel de apenas dar um pontapé inicial às conversas, pois cada espaço contou com total liberdade para produzir o texto nos termos que melhor expressasse seu modo de atuação. Desse modo, não houve uma edição propriamente do material enviado e o resultado


final é quase uma colagem dessas colaborações, sendo mantidos o formato, a composição e o tamanho dos textos e das imagens que nos foram enviados, sempre que possível. O livro foi pensando como um local privilegiado para o compartilhamento de ideias, como uma tentativa de idealizar um projeto comum em que todos os envolvidos assumissem papel equivalente na investigação sobre os espaços independentes. Nesse sentido, parte do prêmio foi também dividida com os espaços que produziram essa colaboração. O intuito foi o de promover uma espécie de ação em rede apoiada numa troca efetiva. Os diálogos, a divisão do prêmio e todas as colaborações recebidas integram esse projeto como partes equivalentes. Ainda sobre as contribuições recebidas, é necessário ressaltar a fundamental participação do pesquisador Jaime Lauriano a quem coube a tarefa de mapear uma série de outros espaços, no sexto capítulo, este que encerra o livro. Por meio desse grande panorama que a presente publicação conseguiu traçar pode-se perceber semelhanças e diferenças no modo como cada espaço se configura, mas sobressai um esforço comum, dirigido a criar brechas para uma discussão mais aberta sobre a arte contemporânea, discussão esta que esperamos que esse livro seja capaz de colaborar. Ateliê397



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Ateliê397 (2003) Rua Wisard, 397 – Vila Madalena – São Paulo – SP http://www.atelie397.com - 397atelie@gmail.com

integrantes: Carolina Soares Cesar Rivitti Isabella Rjeille Marcelo Amorim Mariana Trevas Thais Rivitti


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Velhos sonhos, novos desafios 1 “A liberdade, Sancho, não é um pedaço de pão” Don Quixote A tarefa de contar a história do Ateliê397 não pode ser feita por um homem só. Para esta publicação, tentamos juntar os cacos dessa trajetória fragmentada, encontrados em um site (herança de outros tempos), em um modesto clipping do espaço, nas conversas com antigos gestores, num curioso DVD do projeto “Passagem em permanência”, que retratava algumas das exposições ocorridas no ateliê – pistas de um percurso que já não pode ser trilhado com precisão. Assim, como os leitores poderão ver nas páginas que sucedem este texto alguns esforços foram feitos para que esse capítulo inicial do livro, que nos cabe, reconstruísse, na medida do possível, algumas passagens de uma história que teve início em 2003. O fato é que durante o ano de 2010, o Ateliê397 passou por uma reformulação em seu modo de atuação. Não foi a primeira, e muito provavelmente não será a última, mas é a partir dela que podemos começar a falar. Em 2010, o Ateliê deixa de funcionar como um ateliê de artistas – muito embora ele já abrigasse, desde 2009 com uma certa frequência, atividades como mostras de vídeo e exposições de arte – para se tornar o que chamamos hoje de um espaço dedicado à projetos de arte. Pensamos em dar início a uma atuação diversificada, que trouxesse como princípio fundamental a possibilidade de experimentação. Nós todos – que atualmente estamos a frente do espaço: Carolina Soares, Marcelo Amorim, Mariana Trevas e Thais Rivitti – conhecemos de perto o cotidiano de algumas instituições culturais paulistas. Tivemos a oportunidade de trabalhar, por um bom tempo, em museus ou centros culturais. A experiência, ao mesmo tempo em que foi imprescindível para a nossa formação, foi também bastante frustrante para nós, então jovens recém-formados e cheios de ideias novas, de vontade de pesquisa, de energia para conhecer os acervos, os artistas e os colegas de trabalho. Longe de nós querer traçar aqui um diagnóstico generalista, que levasse a uma atitude anti-institucional, pois, sobretudo no 1 Esse bordão era usado por alguns militantes do PT – Partido dos Trabalhadores – durante a década de 1990. Para nós, esse chavão da (então) esquerda demarca um momento em que o horizonte utópico [do socialismo] desaparece de cena, fazendo com que as propostas políticas precisem ser redimensionadas. Os limites dessa reformulação, no entanto, são perigosos: até onde é preciso ceder, até que ponto é possível resistir?


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“sessão Corredor”, 2009 público durante o programa de vídeos


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caso brasileiro, negar a importância da instituição seria de uma ingenuidade tremenda. Sabemos, também por nossa vivência, que há muitas instituições sérias, que conseguem a duras penas levar a cabo uma programação de qualidade, pensada e refletida. Mas as transformações recentes no campo institucional nos fazem crer que a dinâmica geral está mudando. E para pior. A pesquisa – entendida como parte da tarefa de uma equipe de curadoria de um museu, por exemplo – já não existe; os projetos de publicações e exposições propostos pela equipe da casa raramente são realizados. Hoje, as exposições chegam prontas, itinerantes ou encomendadas, pensadas por uma equipe terceirizada. Cabe à equipe da instituição – muitas vezes subordinada a uma diretoria que não tem a menor afinidade com arte – apenas executar os projetos das mostras. O volume de eventos que uma instituição necessita cumprir, muitas vezes, inviabiliza a profundidade da reflexão que de fato demandariam, impedindo desdobramentos mais frutíferos e enquadrando tudo numa fórmula já desgastada. Cansados dessa dinâmica dos eventos, das agendas que são impostas, das exposições que se realizam mais por interesses privados do que por uma vontade real, e buscando relações mais gratificantes, mais reflexivas, assumimos o ateliê. Alguns meses por aqui, três editais para publicações aprovados, duas exposições já realizadas, entre outras coisas, e nos damos conta de que a batalha contra a burocratização é constante e permanente; de que não basta estar fora das grandes instituições para nos livrarmos do cotidiano burocrático. Percebemos de que, às vezes sem querer, às vezes de forma muito consciente, repetimos os vícios e virtudes dos locais pelos quais já passamos. Sabe-se que a prática dos espaços independentes esbarra constantemente numa série de obstáculos, que vão desde achar um financiamento para as ações e para a manutenção, até inventar um novo modo de agir, mais voltado aos interesses dos artistas e pesquisadores, que muitas vezes não são colocados em primeiro plano em outros lugares. Inauguramos, com a presente publicação, o que gostaríamos que fosse o início das “Edições 397”. Como todos os atuais coordenadores do Ateliê397 têm uma prática profissional que se relaciona com a edição de publicações de arte, a ideia nos ocorreu muito naturalmente, e vem sendo implementada aos poucos. Avaliamos


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(acima)

Kilian Glasner Pista, 2010 “Rec><GRU”, 2010 abertura da exposição


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que há uma carência de ações nesse sentido e que um determinado modelo enrijecido de publicação impera na área de artes. Trata-se daquele formato que reúne uma fortuna crítica sobre determinado artista e reproduções de seus trabalhos. Nosso objetivo, ao contrário, é tornar viável um outro tipo de publicação, mais experimental, mais inovador, que fuja dos padrões já disponíveis no mercado editorial e nas instituições de arte. De resto, colocar mais livros em circulação nos parece muito importante para que as ideias surjam e se adensem no meio das artes. Trata-se de um esforço para colocar em prática uma vontade de criar uma espécie de pequeníssima editora de livros de artes por aqui, que mostre a possibilidade de realizar livros voltados para uma reflexão sobre o sistema das artes (como é o caso deste livro, que investiga os espaços independentes), livros que dêem a palavra para o artista (é o caso da coleção “Arte em prosa”– ainda uma ideia –, em que conversas entre dois artistas serão transcritas e publicadas), livros de arte, que pensema publicação como um outro suporte possível para intervenções artísticas (como é o caso de uma coleção de fotografia que submetemos a um outro edital e ainda aguardamos o resultado) e mesmo catálogos das exposições que acontecem por aqui, pensados não apenas como registro, mas também como uma espécie de extensão da própria exposição, desdobrando aspectos que ela aborde. Ao lado disso, pensamos em continuar apostando no potencial do Ateliê para projetos novos, conservando, de certa maneira, o local como um espaço também voltado para o incentivo à realização de trabalhos de arte. Assim, permanece a ideia de potencializar o corredor do Ateliê como um lugar de experimentações e de obras pensadas precisamente para ele. Vale ressaltar que, embora não tenhamos conseguido implementar o programa nos termos planejados (desde 2009 há um projeto de ocupação anual desse espaço com mostras com intervalos regulares), alguns artistas realizaram projetos específicos para o local em 2010, como Aline Van Langendonck em


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“surpraise!”, 2010 vistas da exposição relâmpago


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abril e, mais recentemente, Kilian Glasner, com a obra Pista (2010). O programa de ocupação do corredor é um dos mais antigos do lugar e, de certa forma, é a alma do espaço. O espaço arquitetônico do Ateliê tem a peculiaridade de ser composto por um comprido corredor que, ao final, abre-se para uma grande sala, algo próxima a uma espécie de “barracão”. A singularidade do espaço nos estimulou a pensar na possibilidade de realizar exposições nele todo, e não apenas naquele espaço dos fundos, que, em todo caso, foi sendo construído e reconstruído ao longo dos anos, mostrando-se capaz de abrigar diversas mostras. A proposta não é a de realização de mostras coletivas do tipo “pequenos formatos”, em que curadores sujeitam os trabalhos à ilustração de ideias que pouco se sustentam como reflexão (formato que é também muito frequente em galerias de arte e outros estabelecimentos voltados principalmente para a venda de trabalhos de arte). Pensamos antes na possibilidade de apresentar para o público trabalhos que, de outra forma, não seriam vistos, desse modo buscando o adensamento de uma a discussão sobre as obras e sobre o contexto em que são produzidas. Assim, procuramos sempre que possível, exibir trabalhos inéditos em São Paulo, visando também a uma circulação de âmbito nacional, algo que ainda é muito pouco frequente, por conta das dificuldades de obtenção de apoios que as viabilize. É deste intuito que surge a ideia da exposição “REC><GRU: ida e volta” como oportunidade para mostrar a jovem produção de arte Pernambucana. Outro projeto importante no ano de 2010 foi o “Múltiplos397”, que sintetizou uma tentativa de criar condições para que quatro novos trabalhos fossem feitos, além de ter sido uma estratégia para levantar verba para o espaço, viabilizar outras exposições e dar continuidade aos projetos. O “Surpraise!” seguiu critérios semelhantes, envolvendo o empenho na venda de trabalhos. Contudo, o “Surpraise!” configurou-se como um misto de rifa e leilão


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“sessão Corredor”, 2010 público durante o programa de vídeos


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de arte, como forma de levantar dinheiro para cobrir os gastos com a reforma que abriu o bar (retirando o vitrô da cozinha e permitindo que ela se comunicasse com o espaço externo da casa) e consertou o telhado (livrando o “barracão” de goteiras que impossibilitavam seu uso como espaço expositivo). O evento tornou-se também uma certa paródia do mercado de arte, despertando certo frisson de compradores e artistas, que só aumentou pelo fato dos trabalhos em exposição permanecerem sem identificação de autoria. A doação de mais de sessenta trabalhos de artistas foi motivo de grande alegria, pois, além de viabilizar o evento, nos serviu de indicativo do quanto o espaço estimula relações afetivas com os artistas e do quanto os artistas apostam nesse novo formato que vem sendo pensado para o Ateliê. A “Sessão Corredor” apresenta para o público mostras de videoarte, programação que vem se mantendo com certa regularidade e que continua com um público fiel. Acontece sempre nos intervalos das exposições quando o espaço vazio permite que a “Sessão” termine em animadas festas, reunindo grupos diferentes no Ateliê. Abrimos muitos caminhos e possibilidades durante o ano de 2010. Pretendemos dar continuidade a muitas dessas frentes ao longo do próximo ano. Outras serão abandonadas. Após algumas conversas internas, aos poucos chegamos à compreensão de que um espaço independente envolve um esforço que parece sempre se esgotar quando a reflexão se volta para a natureza do lugar, pois o objetivo de uma experimentação com o ato de manter e fazer circular trabalhos de arte, de estimular o exercício crítico, acaba por esbarrar na dificuldade de encontrar apoios financeiros. Embora a perspectiva de auto-sustentação esteja num horizonte cada vez mais próximo, o Ateliê é um espaço mantido por seus integrantes.


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“Rec><GRU– ida e volta”, 2010 vista da exposição


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Mas, a partir dessas experiências e das dificuldades que enfrentamos nesse ano de trabalho, fica a pergunta: seria realmente necessário inventar a roda? Ou seja; será que no Brasil já não existem muitos outros espaços que, como o 397, mantém uma atuação independente? Como saber como eles se organizam? Como saber como eles levantam verba para suas ações? Não seria possível articular entre nós uma rede de iniciativas que facilite e fortaleça nossas atuações individuais? Este livro surge exatamente dessas indagações e da certeza de que as experiências que vivemos nesse ano podem ser úteis para outros espaços de arte que enfrentem um cotidiano com problemas parecidos com os nossos. Da mesma forma, a busca de diálogo com outros espaços nos deu ideias a respeito de como lidar com algumas dificuldades. Esperamos sinceramente que ele também ajude-nos a diminuir as dificuldades que rondam nossas atuações, fortalecendo-as.


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HĂŠlio melo e james prior Sonho Meu, 2004 HĂŠlio Melo em foto de James Prior


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No dia 2 de agosto de 2010, recebemos para uma conversa no Ateliê397 três artistas que foram essenciais para a criação desta empreitada: Marcelo Comparini, Rafael Campos Rocha e Silvia Jábali. Com o intuito de tentar entender pontos cegos das inúmeras histórias e lendas que cercam o Ateliê397, fizemos algumas perguntas. A saborosa conversa que segue foi regada a cerveja, transcrita e editada. Marcelo Amorim: Gostaria de entender um pouco mais sobre o início do Ateliê. Toda vez que alguém vem nos visitar, me pergunta: “Qual é a desse Espaço? Como começou?”. E eu sempre conto a mesma historinha, de que foi inaugurado por três artistas: Bruna Costa, Rafael Campos Rocha e Silvia Jábali. Vocês dividiam o aluguel dos ateliês e apenas esse corredor estava disponível para as exposições. Sei que há muitas lacunas nessa história, mas uma coisa que sempre ficou clara pra mim é que vocês três eram as pessoas que tocavam o projeto, coordenavam as exposições e promoviam as atividades que caracterizaram o lugar. Silvia Jábali: Na verdade, o lugar de cada um aqui dentro era independente. O Rafa [Campos Rocha] alugava ali em cima e eu aqui em baixo.1 Da cozinha pra cima, era dele, e da cozinha pra baixo, era meu espaço. Nesse ponto, nós éramos muito independentes. O que nos unia era o corredor. Rafael Campos Rocha: Começou com um negócio chamado Olho Seco, em 1998.2 A gente tentava arrumar espaços para expor e cada um conseguia uma coisa: na época, o Wagner Morales tinha um bar, então ele era o responsável pela cerveja da abertura; o [Wagner] Malta era responsável por tudo que envolvia dinheiro, afinal ele era o único que tinha (risos). Enfim, cada um fazia uma coisa. Não tínhamos uma sede; a idéia era nos unirmos pra fazer exposições que aconteciam em cima do Tuca [No Museu da Cultura da PUC/ SP aconteceu a primeira exposição do Grupo intitulada Tralha, em 1998]. Teve também na Funarte [exposição Retralha, em 1999], no Centro Cultural São Paulo [exposição coletiva Iniciativas, em 2000]. E eu era quem um tanto coordenava tudo. E aí o Wagner [Malta 1 Nota do editor: O espaço físico do Ateliê397 tem um declive que permite descrevê-lo

a partir de duas partes: uma superior de entrada que mantém uma certa nivelação com a rua; e outra inferior localizada numa superfície um pouco mais abaixo. 2 Participaram do grupo Olho Seco os artistas Ana Paula Oliveira, Dália Rosenthal, Rafael Campos Rocha, Renata Lucas, Tatiana Ferraz, Vanderlei Lopes, Wagner Morales e Wagner Malta Tavares. Felipe Cohen integrou algumas das exposições.


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Wagner malta tavares Horizonte de eventos, 2004 foto Denise Adams


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Tavares] abriu a galeria 10,20 x 3,60, em 2001, que funcionou por 3 anos.3 Quando a galeria fechou, todo mundo ficou órfão de espaço, e aí a gente veio pra cá. Eu cheguei aqui no final de 2003. Silvia: Então, a primeira exposição foi em 2003? Foi a nossa? Foi uma exposição que foi junto com a festa de aniversário da Tatiana Blass e da Renata Lucas. Era uma muvuca! Aconteceu entre dezembro de 2003 e janeiro de 2004 e então em fevereiro teve a exposição do Hélio Melo. Foi aí que realmente tudo começou. Thaís Rivitti: Então não havia exatamente uma seleção de artistas? Eram aqueles que já vinham do grupo Olho Seco e da galeria 10,20 x 3,60? Rafael: A 10,20 x 3,60 fez exposições do pessoal do Olho Seco e de outras pessoas agregadas, que a gente convidava, e também de um pessoal mais experiente, como Paulo Monteiro, Rodrigo Andrade. Já para expor aqui [no Ateliê397], a gente resolveu chamar a Tatiana Blass, o Hélio Melo, a Patrícia Pisaneli. Era um pessoal bem mais novo. A gente impõe no 397 um outro perfil. Silvia: Os artistas vinham, batiam aqui para expor. A maioria das exposições nasceu assim. O legal também é que a gente dividia funções e fazia tudo direitinho: tinha convite, o Rafa fazia o release e eu recebia também os artistas, ajudava na montagem. A Bruna [Costa] ficou pouco tempo. Rafael: A gente começou com muita gana fazendo exposições. Esse período de 2004 foi muito rico. Aconteceram muitas coisas. Em 2005, ficamos cansados de montar exposição dos outros. Eu não estava muito animado. Mas, em 2006, voltou a animação, com a chegada do Marcelo Comparini que era uma pessoa nova. E tudo começou a ficar alegre de novo. Mas eu já estava bem cansado, esgotado; já não queria mais. Marcelo A.: Eu sempre entendo a história do 397 como uma “corrida de revezamento”. Parece que quando um cansa, passa a bola pro outro e a história segue. 3 Nota do editor: Em 2001, Ana Paula Oliveira e Wagner Malta Tavares abriram a galeria 10,20 x 3,60. O espaço, que encerrou as suas atividades em 2003, era gerido pelos artistas que a integravam. www.dezevinte.com.br


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Tatiana blass Atavio, 2004


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Rafael: Foi o que eu tinha combinado com o Wagner Malta Tavares há uns dez anos: “Eu faço isso por um tempo e depois alguém pega e continua”. Isso porque, como vocês agora estão vendo, esgota, tem muita requisição, aparece gente todo dia. Se acontece alguma coisa com o trabalho, você desenvolve uma cirrose e perde a concentração facilmente. Silvia: Era ateliê de artista e espaço de exposição. Tinha uma coisa legal que era essa troca. E isso era muito gostoso. Rafael: Eu morava lá em cima, morava e dava aula. Fiz com o Vanderlei [Lopes] um Fanzine, feito no Word. Chique! Eu o intitulei “The king of the Word”, fiz por muitos anos. Meu trabalho se misturava com as coisas do Ateliê. O trabalho tinha a ver com o Ateliê, a aula tinha a ver com o Ateliê. Alguns alunos vieram porque ficaram sabendo do Ateliê. Enfim, era tudo meio misturado. Silvia: A coisa de pagar o aluguel era independente e não tinha nenhuma atividade aqui que tivesse lucro. Rafael: Vendemos, certa vez, uma Tatiana Blass, mas eu peguei todo o dinheiro pra mim. Vendemos um [Wagner] Malta também e nós quase nos matamos por causa desse trabalho. Vendemos uma outra pintura e a gente comprou tudo em pinga no mesmo dia. Era um bolo de dinheiro e eu fui lá para o bar do William e falei: “ninguém sai daqui enquanto não acabar o dinheiro”. E era uma grana. Eram uns 500 reais, 600... Eu nem lembro o que aconteceu depois. Silvia: A gente conversava muito sobre os rumos do Ateliê397. Eu e o Marcelo Comparini discutíamos sobre filmar e fazer todo um levantamento sobre os artistas... Com o Rafael conversei também, mas é que houve um cansaço. Por isso que chegou um momento em que eu achava que tinha que fazer alguma outra coisa. Marcelo Comparini: Um pouco depois que eu cheguei, o Rafa foi para Espanha e eu resolvi fazer um site, organizar um pouco do que tinha de registro das exposições que aconteceram até então [www. atelie397.com]. E hoje eu fiquei sabendo que teve uma primeira exposição, que não corresponde à primeira que consta no site. Silvia: É porque não tem foto... Falando das nossas reflexões e do


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HÉLIO MELO “Vídeofluxo”, 2004 flyer do programa de vídeos


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site, a gente sempre quis deixar esse espaço cada vez mais dinâmico. Então, a gente tinha várias ideias como abrir um bar, fazer projeções de vídeos... Eram milhões de projetos que a gente pensava, mas acho que o que a gente fez de mais importante foi o site. Rafael: O Hélio Melo tinha uma programação de vídeo. Foi a Silvia quem fez com ele... Marcelo A.: O “Videofluxo”? Silvia: É, eu fiz com ele! As pessoas vinham e entregavam o vídeo na hora. Marcelo A.: A gente encontrou um flyer do “Videofluxo” e tinha uma coisa curiosa que era assim: “Traga a fita rebobinada no ponto”. (risos) Silvia: Era uma TV e um videocassete. As pessoas chegavam 15 minutos antes e todos os vídeos eram expostos. E sempre tinha um ou outro mais “consagrado”. Isso já existia como um projeto dele [Hélio Melo] – era um projeto itinerante. Ele já havia feito isso em outros lugares, em uns casarões velhos no centro. Ele é bem trash, o Hélio! Adoro! Rafael: Descia um pessoal no ponto de táxi pra ver o “Vídeofluxo”, e quando eles chegaram aqui, estava passando um vídeo que começa com a cena de um cara chupando um mastro, uma piroca do tamanho de um braço; ele passa mal e vomita... Era assim o vídeo! Eles me chamavam de professor e falavam: “É forte o conteúdo, né professor?”. Eu mesmo fiquei espantado: “meu Deus do céu”! Silvia: Uma vez eu e o Marcelo Comparini pegamos o seu William, dono do boteco ao lado dormindo aqui dentro. Ele estava aqui onde tem este tanque, e estava caído. Ele tinha a chave da porta... Rafael: O seu William alimentou uma geração inteira com seus churrasquinhos. Silvia: Era legal nesse aspecto, não tinha tempo quente. Ele arrumava cerveja, arrumava a mais barata... Rafael: A organização que a gente dava para o artista era a divulgação.


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Vanderlei LOPES V么o, 2004


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Até o artista ajudava a pagar a cerveja. O artista às vezes comprava dois engradados de cerveja e deixava o resto para o pessoal. Mas também chegava uma hora em que a gente pagava tudo. Às vezes eu vinha e comprava vinte espetos de uma vez. Custava um real e meio o espeto! Silvia: Nessa época, nas aberturas ainda não tinha som. Só depois o Marcelo Amorim e eu começamos a trazer Djs... Às vezes a gente colocava um sonzinho na sala do Comparini, mas nada pensado. Marcelo A.: Eu lembro de uma vez em que eu vim aqui e tinha uma música que ficava no repeat. Eu pensava: “tira essa música, pelo amor de Deus!” Rafael: “Galeria Caos” era isso aqui. Foi caótico! Thaís: Isso incomodava ou era uma coisa que era legal? Silvia: A gente gostava. Marcelo Comparini: a mim agradava... Silvia: Em alguns momentos, a gente tentou começar a pensar seriamente em fazer alguma coisa, mas aí começou a pegar a coisa da grana. Marcelo C.: Daí, a gente começou a pensar em uma maneira do Ateliê se bancar, o que nunca rolou. Thaís: Isso vocês só foram pensar recentemente? Silvia: Foi em 2007, porque antes era tudo bem. A gente dividia e ficava barato. Thaís: Talvez porque o raciocínio fosse o de pagar o aluguel de um ateliê... Rafael: É. Aqui era a nossa casa, que a gente abria para os outros fazerem exposição. Silvia: Isso que era o mais legal. E entrava gente pra burro aqui! Mesmo quando não era visitação, tinha um movimento, uma coisa muito aberta.


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Andrea cavagnaro AteliĂŞ, 2005

Edu Marin e daniel trench Poltrona 42, 2005 foto Edu Marin


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Thais: E o espaço, vocês reformaram? Silvia: Eu fazia aquele curso com o Rodrigo Naves e tinha um surto. Todos perguntavam: “Quem está alugando ateliê?” E eu falava: “eeuu!!”. Foi quando a Bruna e eu nos juntamos. Ela fazia arquitetura, ela era arquiteta também, aí ela abraçou a ideia e falou: “ah, vamos mexer nisso aqui”. Rafael: Eu morei aqui quando não tinha nada. Era uma casa meio abandonada. Era uma casa fantasma quando eu cheguei. O seu João morava aqui, o barbeiro. O seu João e o William. De um lado, ficava o seu João e do outro, o William; e eles se odiavam. Aí, um dia, o seu João teve um pirepaque e morreu, de um dia pro outro. Fui contar pro William: “Pô William, seu João morreu.” E ele respondeu: “Pô, ele nem teve tempo de me pedir desculpas”. Silvia: E tinha uma coisa que ele dizia que era engraçada: “Eu que bebo e fumo e ele que morre!”. Rafael: Teve uma história importante para o ponto de vista do Ateliê397, que foi a presença de uma artista estrangeira, a Andrea Cavagnaro. Ela expôs aqui com dois artistas: Daniel Trench e Edu Marin, que quiseram colocar uma cadeira aqui na frente; era uma poltrona de concreto que ficava ali fora. E ela foi nossa primeira artista estrangeira. Não podíamos colocar a cadeira na calçada, pois parece que dá problema com a prefeitura. Aí, a gente tentou colocar no William e ele disse que não. Aí, fomos no seu João e ele já veio dizendo “não, não, não!”. Então, chegou o cara do jogo do bicho, ouviu e disse: “Pode botar aí, que aqui ninguém mexe”. Segundo o William, numa noite chegou um rapaz da rua, um fiscal da prefeitura, e começou a perguntar o que era essa cadeira, e parece que alguém que frequentava o bar jogou alguma coisa nele, um guardanapo... Sei lá... só aí tivemos que tirar a cadeira de lá. Tinha um cara que assaltava todo mundo aqui na Vila Madalena, e um dia, os taxistas pegaram ele e bateram nele. Quase o mataram e deixaram ele caído aqui na frente do bar do Sacha. Depois, ele voltou e matou um taxista. Eu gostava dessa parte da Vila Madalena; era minha sala de estar. Tinha o Zezinho também, que era o cara do crack. Aquele moleque era muito louco de drogas e ele era predador total, drogado e doido. Ele fez uma rapa aqui no bairro e fugiu. E tinha também uma pizzaria aqui na frente. O dono era um estrangeiro, ninguém ia lá, era meio falida.


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Tatiana ferraz Miolo de quadra, 2004


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Marcelo A: Onde era essa pizzaria? Silvia: Era ali em cima. Depois fechou... Rafael: Ouvi falar que virou um ponto de cocaína... Thais: O legal é começar a conversar com esses lugares, porque tem muita coisa que impede a mistura. Vocês acham que tem abertura? Silvia: Tem, bastante. Marcelo C.: Tinha um projeto de fazer um festival de vídeo no bar, lembra? Silvia: Ah, é mesmo. Muito legal! Marcelo A.: Agora todo boteco tem uma TV... Rafael: Eu sempre quis que tivesse um bar aqui. Eu enchia a cara no boteco, mas preferia encher aqui... Marcelo A.: Mas a Vila Madalena mudou bastante; é como se a Vila Olímpia tivesse vindo pra cá e, com ela, toda uma idéia de bairro. Hoje tudo é caríssimo... Rafael: Vocês estão com alguma coisa de vender bebida aqui no bar?


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2010 – REC><GRU:ida e volta – A Casa. Como Convém – Amanda Melo – Bárbara Wagner – Branco do Olho – Bruno Vieira – Bruno Vilela Carlos Mélo – Cristiano Lenhardt – Fernando Peres – Kilian Glasner Lourival Cuquinha – Marcelo Coutinho – Oriana Duarte – Paulo Meira – Rodrigo Braga

2010 – MúLTIPLOS397 – Fabio Flaks, Laura Huzak Andreato, Luiz Roque, Nazareno.

2010 – SURPRAISE! – Adams Carvalho – Andrea Facchini – Anne Cartault D’Olive – Alexandre Hypólito – Alice Shintani – Ana Teixeira –Bettina Vaz Guimarães – Carolina Ponte – Cristiano Lenhardt –Edith Derdyk – Fabio Tremonte – Felipe Cama – Fernanda Chieco – Flavia Sammarone – Glaucia Mayer– Gustavo Ferro – Jaime Lauriano – João Loureiro – Lais Myrrha – Leo Ayres – Luiz Roque – Malu Saddi – Leticia Ramos – Manoel Novello – Marcelo Gandhi – Maurício Adinolfi – Mel Guerra – Mônica Nador – Nino Cais – Pedro Varela – Rafael Campos Rocha –Rebeca Rasel – Reginaldo Pereira – Renato Leal – Rodrigo Torres – Silvia Jábali – Sofia Borges – Tais Ribeiro – Teresa Berlinck – Vanderlei Lopes. 2009 – Marcelo Amorim e Silvia Jábali

2009 – REALIDADES IMPOSSíVEIS – Bob N – Brígida Baltar – Cadu D’Oliveira – Carla Chaim – Carolina Ponte Celina Portella – Chico Fernandes – Cristiano Lenhardt – Daniel Zarvos Elisa Pessoa – Glaucia Mayer – João Penoni – Leo Ayres – Luiz Roque – Marcelo Amorim – Maria Laet – Mariana Leal – Marina Weffort – Marlon de Azambuja – Miha Mlaker – Nino Cais – Pedro Varela – Reginaldo Pereira – Rodrigo Torres 2009 – A PAIXãO DE MICKEy: vida, morte e ressurreição – Bruno Sipavicius – Marcelo Gandhi – Monica Rizzoli


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2009 – OBRA MENOR curadoria Mario Gioia – Albano Afonso, Estela Sokol, Fernanda Figueiredo e Eduardo Mattos, Lucas Arruda, Marcia de Moraes, Naiah Mendonça, Patricia Brandstatter, Paula Coelho, Paulo Almeida, Sérgio Sister

2009 – Biel Carpenter e Celina Portella

2009 – Anne Cartault D´Olive e Diego Castro

2009 – NADA MAIS – Fábio Tremonte

2009 – PISCINAS e PAPELUCHOS – Camila Alvite e Diogo de Moraes

2008 – Isabela Lucchesi e Bruno Monteiro

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2008 – Sofia Borges e Marcelo Amorim

2008 – INVERSO Mariane Abakerli e Karen Kabbani

2008 – EQUAL Daniel Steegmann

2007 – ATELIê DAS QUATRO – Lyn Carone, Carol Seiler, Natasha Barricelli, Helena Cavaliunanas

2007 – Bruno Dunley

2007 – DA INSANIDADE À SALVAçãO – Bruno Sipavicius


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2007 – PRONTO e ARTROCKBUREAU – Chico Togni, Bruno Palazzo e Tiago Alem

2007 – FOGO FÁTUO – Maurício Adinolfi

2006 – COLETIVA 397 – Silvia Jábali, Henrique Oliveira, Marcelo Comparini, Rafael Campos Rocha e Pedro Torres.

2006 – PINTURA DE CAVALETE – Antonio Malta

2006 – Nino Cais e Erika Engel

2006 – AULA DE PLÁSTICA – Rubens Espírito Santo


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2005 – AGUADAS – Stela Barbieri

2005 – POLTRONA 42 – Andrea Cavagnaro – Edu Marin – Daniel Trench

2005 – DAS TENTATIVAS – Dália Rosenthal e Alexandre Tripiciano

2005 – TORRE – Bruna Costa e José Berno

2005 – SONHO – Fabiana Queirolo

2004 – CERCA – Ana Paula Oliveira


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2004 – MIOLO DE QUADRA – Tatiana Ferraz

2004 – PESO LíQUIDO – Patrícia Pisanelli

2004 – Vanderlei Lopes

2004 – EWÁ CONTRA O SURFISTA PRATEADO – Wagner Morales

2004 – HORIZONTE DE EVENTOS – Wagner Malta Tavares

2004 – LOBISOMEM – Rafael Campos Rocha


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2004 – ATAVIO – Tatiana Blass

2004 – SONHO MEU – Hélio Melo – Clark Ferguson – James Prior

2003 – Rafael Campos Rocha – Bruna Costa – Silvia Jábali


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BARRACÃO MARAVILHA (2008) Av. Gomes Freire, 242 – Centro –Rio de Janeiro – RJ http://www.barracaomaravilha.com.br – contato@barracaomaravilha.com.br

integrantes: Hugo Richard Natali Tubenchlak Robson Viana Zé Carlos Garcia Marcelo Velloso


Barracão Maravilha - RIO DE JANEIRO

Barracão Maravilha

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por Robson Viana artista

Instalado em um sobrado centenário, o Barracão Maravilha vem se afirmando, desde 2008, como um destacado espaço de produção e de lançamento de novos nomes da arte contemporânea, organizando exposições nacionais e internacionais. A intenção é desenvolver uma maneira própria de apresentar e fazer circular arte – e tudo o que decorre dela – que pretende ser apenas simples, colaborando com a paisagem da arte no Rio de Janeiro e possibilitando novos horizontes na forma de se relacionar com os artistas e o público. A arte contemporânea no Rio de Janeiro As exposições com maior volume de investimento na cidade são exclusivamente apresentadas em instituições de caráter público, mantidas por grandes empresas privadas ou governamentais. São lugares por onde passam as exposições mais caras de artistas nacionais ou estrangeiros da atualidade ou de diferentes épocas. A maioria sediada no centro da cidade. As galerias comerciais (salvo algumas exceções, com atividade comercial consolidadas no centro) estão, em sua maioria, localizadas na zona sul, junto ao comércio de luxo. A arte para visitar está no centro. A arte para comprar está na zona sul. Espero que essa distinção não pareça um juízo de valor. Mas é corrente a constatação de que muitos compradores e colecionadores nacionais ou estrangeiros apenas circunstancialmente atravessem os túneis da zona sul em direção ao centro da cidade. O que deve explicar o maior volume de galerias e escritórios de arte na zona sul. Embora seja uma apresentação muito superficial da questão, é assim o estado atual da arte contemporânea no Rio de janeiro. Acontece que essa situação muito bem demarcada, além da institucionalização, da profissionalização e dos compromissos de mercado, deixa tão pouco espaço ao risco e à imprevisibilidade, tão fundamental para que a novidade se faça novidade. Nesse espaço do risco e da previsibilidade relativa, estão os “alternativos”. Sempre à beira do precipício, resistindo a fechar as portas, são lugares em que


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“2 anos”, 2010 vista da exposição foto Marcelo Velloso


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cada evento tem o mesmo potencial de ser o melhor ou o pior que se pode ver, em que quase sempre o romantismo paga os prejuízos, no final das contas. E, sendo efêmeros como são – pois muitos espaços alternativos têm curtos períodos de atividades –, desempenham função muito importante, no sentido de promover a circulação de arte de modo independente das grandes instituições de ensino, exibição e das galerias comerciais. O que surpreende atualmente é que os alternativos estão se consolidando, e isso parece criar ainda algumas estranhezas, pois acabam por criar novos modos de se inserir e de explorar as possibilidades de subsistência cultural e econômica, incorporando inclusive estratégias profissionais, como as técnicas necessárias para o acesso às leis de incentivo. O que é um barracão? O barracão é definido mais por aquilo que ele não é do que por aquilo que é, pois não tem um paralelo direto nos modelos de arte européia e norte-americana mais influentes no Brasil. Não é um atelier (pelo simples fato de não ser francês) e não é uma galeria, já que não se presta exclusivamente à exibição. Não é um lugar onde se guarda qualquer tipo de verdade. Não existe crítica de arte no Rio de Janeiro (quem sabe o que é arte contemporânea no Rio de janeiro?) Sempre que escrevo, tal constatação me parece um exagero. Mas volto a pensar no assunto e chego a ela novamente. Não existe crítica de arte no Rio de Janeiro. Os pesquisadores especializados em arte contemporânea ou jornalistas dedicados ao assunto escolhem, ao que parece, apenas o que gostam, para tecer suas interpretações e avaliações críticas. De fato, sabemos que não é bem assim, pois, geralmente, são os profissionais que são convidados para escrever sobre uma exposição ou artista. Geralmente são pagos. Os museus e centros culturais usam seus serviços para demonstrar a pertinência e o valor da sua programação pública. As galerias os utilizam como parte da propaganda dos seus produtos. Novamente, gostaria de salientar que não há problema algum nisso tudo. Mas, para nós, a ausência da crítica tem sido uma questão importante, no sentido

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Vista da exposição “Analogia dos Contrários”, 2010 foto Marcelo Velloso

Barracão Maravilha, 2008 foto Robson Viana


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de pensar os modos de autoavaliação do nosso trabalho, já que não existe uma resposta independente por parte da crítica especializada. Vale especular: a arte no Rio de Janeiro seria outra se houvesse para ela uma Bárbara Heliodora [importante crítica brasileira de teatro]? Essas características da crítica deveriam aparecer de alguma forma no conteúdo das instituições de ensino dedicadas à arte contemporânea no Rio de Janeiro, polarizadas entre as universidades públicas e as escolas privadas de arte. Estas costumam oferecer cursos livres e diversificados (nunca são baratos), com temática mais atualizada, em sintonia com as discussões em andamento no campo da arte internacional e com foco no mercado, com estratégias internas de promoção dos seus resultados (artistas); enquanto aquelas centram esforços no estudo aprofundado de alguma questão específica da arte (como um movimento artístico ou alguma questão formal ou conceitual), nos moldes da pesquisa científica acadêmica, sobretudo nos curso de pós-graduação. Emergem, desse quadro, pontos positivos, como a relação de complementaridade entre as instituições públicas e privadas. Mas também muitas lacunas... Ou certos “lugares comuns” supervalorizados. Por exemplo: é quase um imperativo, aos artistas novos, exibir em seus currículos a sua formação acadêmica. As ações do Barracão Maravilha Alugamos o sobrado no centro do Rio, inicialmente como um lugar para trabalhar, nos moldes de um ateliê coletivo. Na época, a maioria de nós trabalhava em barracões de escolas de samba, e era natural chamarmos nosso local de trabalho de “barracão”. Para complementar a maravilha, bastava um adjetivo extravagante... O sobrado oferecia um espaço muito interessante para a apresentação de exposições, e convidamos uma produtora – a Mara Pereira –, pois pensamos em montar uma programação para o ano. Além disso, ela nos ajudaria a planejar essa programação de maneira que ela realmente funcionasse. A primeira exposição aberta ao público foi Barracão Maravilha Convida Túlio Bambino e André Amaral. Coletiva com os quatro artistas do Barracão [Natali Tubenchlak, Zé Carlos Garcia, Hugo Richard, Robson] e mais dois artistas convidados (realizamos uma exposição de inauguração com os artistas do Barracão, mas

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enviamos um número limitado de convites... Serviu de teste). O tema era simplesmente o convite. Depois, tudo mais seria discutido e decidido entre todos os participantes: obras, montagem, iluminação, investimentos, divulgação etc. Esse formato de trabalho serviu de base para boa parte das nossas atividades ao longo desses quase três anos. Nele, procuramos misturar profissionais que não atuam em áreas identificadas estritamente como artes visuais ou artes plásticas. Outra característica determinante era a duração. As exposições durariam apenas o dia da abertura e deveriam oferecer aos participantes a possibilidade de torná-la uma festa, o que aconteceu em diversas ocasiões. Nunca fazíamos (e raramente ainda fazemos) impressos... Convidamos basicamente por e-mail, redes sociais, “boca-a-boca”. Sempre servimos cerveja e água, e eventualmente outras coisas, gratuitamente (o santo gosta). Um evento que teve grande repercussão foi a mostra Performance, em junho de 2008, nossa terceira exposição. Grande variedade de artistas, bem distribuídos no programa, que durou tarde e noite, público intenso. Tudo deu certo. O “Barracão Maravilha” poderia ter acabado ali mesmo, tragicamente. Desde então, nossas atividades têm alcançado boa repercussão, principalmente entre o público. Fizemos diversas parcerias para viabilizar exposições com artistas nacionais e estrangeiros, com outras galerias, debates com temas ligados a arte, cultura, política etc. Boa parte das parcerias acontece em decorrência das exposições, quando, a partir delas, recebemos diversas propostas de atividades que incorporamos, na medida do possível, à nossa programação.

Barracão Maravilha, 2008 foto Robson Viana

Alguns eventos deram maior visibilidade ao aspecto profissional do trabalho desempenhado pelo Barracão Maravilha, talvez pela dimensão (e pelo risco, sempre). Um desses eventos foi a exposição que organizamos por ocasião da reabertura do Centro de Arte Hélio Oiticica, em setembro de 2009, no centro do Rio. O CAHO é um excelente espaço para exposições na cidade. Com três pavimentos e salões amplos, o edifício neoclássico já abrigou mostras memoráveis de artistas nacionais e internacionais. Além disso, abrigava parte

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considerável das obras deixadas por Hélio Oiticica. A reabertura aconteceria após intensa disputa entre a prefeitura do Rio e a família do artista, que administrou a programação do lugar por muitos anos, através do Projeto HO. A prefeitura havia assumido a administração após o fim do convênio. O assunto foi – e ainda é – motivo de muita discussão e troca de acusações. Um verdadeiro bang-bang. A situação chegava a ser engraçada, pois, no meio disso tudo (basta uma rápida pesquisa dos fatos na internet para encontrar farto material), nós fomos convidados para ocupar dois pavimentos do CAHO. Os artistas no Rio estavam divididos, mas minha impressão particular era a de que poucos tinham uma noção clara do que se passava... Não é o momento para entrar nos detalhes. O lugar reabriria depois de um período de pouco movimento e em meio a muita polêmica. Nós nos dispusemos à mesa para sermos devorados... Poucos esperavam alguma coisa que prestasse. Fizemos tudo, como de costume: iluminação, produção, desenho da exposição, seleção dos artistas... Barracão Maravilha Convida. Convidamos artistas que haviam passado por exposições no Barracão e artistas com quem ainda não havíamos trabalhado. A exposição foi muito bem sucedida.

(acima à esquerda) Vista da exposição “Ecos de Hélio”, 2009 foto Robson Viana

Barracão Maravilha, 2008 foto Robson Viana

Acho que a atividade mais interessante realizada pelo “Barracão Maravilha” até então, por todas as circunstâncias em jogo, foi a alegoria que construímos para um desfile carnavalesco na cidade de Soweto, na África do Sul. À convite da Fundação Palmares [A Fundação Cultural Palmares é uma entidade pública vinculada ao Ministério da Cultura], desenhamos uma alegoria com temática inspirada na cultura e nas paisagens brasileiras, que foi construída de maneira expositiva, durante a copa do mundo de futebol, e desfilou junto a organizações carnavalescas locais. Ao final, em ato solene, a alegoria foi doada ao governo da cidade como um presente. Trabalhamos com artistas do Boi de Parintins (que tem uma das escolas de arte mais interessantes do país na atualidade) para uma execução rápida e eficiente. Produzimos fantasias para os destaques que viriam sobre a alegoria, passistas, índios, mães de santo, entre outras. O desfile foi maravilhoso e os representantes do Barracão experimentaram certa notoriedade lá em Soweto. Além disso, a África (se é que se pode tomar um país pelo continente inteiro) mostrou-se muito diferente da ideia que fazíamos dela.

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“Ecos de Hélio”, 2009 vistas da exposição foto Robson Viana


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Curiosidades É difícil trabalhar em grupo, dividir as tarefas, as despesas, definir funções e tal. Lidar com as nossas vaidades, com as opiniões do outro, admitir os erros pessoais e os coletivos – tudo isso é muito difícil. Entender se o Barracão Maravilha é galeria ou ateliê já deixou algumas pessoas irritadas. Fazer entender que um desfile na África é um trabalho de arte intencional, planejado, não parece ser tarefa das mais fáceis. O fato de usarmos técnicas e conceitos de trabalho diretamente influenciados pelo carnaval do Rio, por exemplo, parece gerar, em profissionais especialistas na arte contemporânea, interpretações equivocadas e carregadas de preconceito. Para ilustrar: estávamos apresentando a obra Andaina, que consistia numa grande instalação, com esculturas e outras estruturas usadas em desfiles de escolas de samba, na Praça Tiradentes, interagindo com a belíssima Estátua equestre de D. Pedro I. O evento era o Viradão Carioca, imitação da Virada Cultural de São Paulo... Excelente oportunidade para realizar uma obra em praça pública, de grandes dimensões. Nossa proposta – foi obra coletiva dos artistas do Barracão – era melhorar a escultura, carnavalizá-la, estendê-la até o chão, para que as pessoas pudessem entrar nela. Para isso, acrescentamos ao monumento as alegorias de carnaval. Na ocasião, percebemos que algumas pessoas interpretaram nossa obra como a participação curiosa de um grupo de carnavalescos num contexto específico de arte contemporânea, a ponto de ouvirmos comentários do tipo: “essas peças de carnaval virariam um trabalho de arte muito foda!”. No encerramento, trouxemos um sósia do Rei Roberto Carlos para um show emocionante – de verdade. Quanto pode custar? Quanto se pode ganhar? Todas as nossas atividades são custeadas pelas nossas atividades. Não fazemos distinção entre as esculturas gigantes que realizamos para desfiles de escolas de samba e obras apresentadas em galerias. Um monstro articulável de 2,5 metros de altura, que estamos desenvolvendo para um filme de terror, faz parte da nossa obra,

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tanto quanto o carro alegórico que desfilou em Soweto, na África do Sul, durante a Copa do Mundo. Algumas atividades dão dinheiro, outras, não, e tentamos equilibrar nossas contas dessa maneira. Algumas obras ou ações são mais difíceis de vender ou gerar patrocínios. Quando convidamos os artistas para exposições ou quando nos sugerem projetos, dividimos as despesas, os investimentos. O que se ganha, muitas vezes, são experiências, visibilidade num mercado disputado e até a possibilidade de alguma comercialização imediata. Isso pode ser muito frustrante para o artista mais experiente. É uma questão muito delicada, e lidamos com ela de forma muito intuitiva. É preciso estar atento e sentir as possibilidades em tudo. Não existem receitas. Poucos artistas vendem o suficiente para se manterem da comercialização das suas obras. Parece não haver espaço para todos. Nesse aspecto, a profissionalização, mesmo que por vias alternativas, parece ser o caminho mais promissor. Carnavalismo Atualmente, trabalhamos com a ideia de um “carnavalismo”. O termo nos parece adequado para definir conceitualmente boa parte das nossas atividades, pois trabalhamos diretamente a partir – e através – de influências diretas do carnaval brasileiro, mais especificamente o do Rio de Janeiro, a começar pelo nome – Barracão Maravilha –, que parte de um princípio muito simples: não poderia ser o francês atelier ou o norte-americano studio. Para nós, nada mais natural do que ser “Barracão”, como já foi comentado em linhas anteriores; trazendo também, com isso, todas as qualidades específicas desses centros de arte tipicamente brasileiros – trabalho coletivo, múltiplas linguagens, desfecho apoteótico, potencialização alegórica etc. O Maravilha é a alegoria colada ao nome.

“Ecos de Hélio”, 2009 vista da exposição foto Robson Viana

O “carnavalismo” surge também como uma constatação, mais do que como uma invenção, do que percebemos (inversão de valores e alegorização dos costumes, por exemplo) como presença distinta na arte e na cultura brasileira de um modo geral: artes visuais, música, teatro, dança, culinária, moda, design, cinema etc. Outra coisa é que, embora existam relações com o que ocorreu nos anos de 1960 e 70,

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“Ecos de Hélio”, 2009 vista da exposição foto Diego Rosa


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muito especificamente na obra do Hélio Oiticica, o conjunto do que estamos discutindo agora é muito diferente... A isso, dedicaremos boa parte das nossas ações futuras. Quem somos? O Barracão Maravilha é constituído por uma equipe de profissionais de qualificação diversificada em arte e cultura, com acúmulo de experiências em produção em arte contemporânea, em concepção artística, em confecção das grandes alegorias das escolas de samba dos grupos especiais do carnaval do Rio e de São Paulo e em gestão cultural de projetos e equipamentos públicos e privados.

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“Mostra Performance�, 2008 foto Marcelo Velloso


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Principais atividades 2008 Barracão Maravilha - Abertura 2008 Barracão Maravilha convida Túlio Banbino e André Amaral 2008 Mostra Performance 2008 In Situ 2008 Do gelo da Escandinávia ao fogo tropical, o Barracão Maravilha recria na Terra um inferno de delícias 2009 Abre Alas (com A Gentil Carioca) 2009 1 Ano – Barracão Maravilha 2009 Feira – Múltiplos Produtos Gomo 2009 Andaina – Viradão Carioca – Praça Tiradentes 2009 Escombros Vivos 2009 Juegos – Foto Rio 2009 Suprenova 2009 1 ano de Moitará – Grupo UM e OPAVIVARÁ 2009 Ecos de Hélio – Centro de Arte Hélio Oiticica 2009 Por um lugar para viver 2009 Karnevalismus – Berlim 2010 SESC Arte 24 horas 2010 Zé Carlos - Eco, ritmo, acaso – coletiva – Durex 2010 02 anos 2010 Cuaresma – Artistas en Latinoamérica 2010 Zé Carlos – Hereditários – Durex 2010 Instalações – Viradão Carioca 2010 Zigue zague – MAM SP – oficina 2010 Carnaval na África do Sul 2010 Andrei Muller – Analogia dos Contrários

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ATELIER SUBTERRÂNEA (2006) Av. Independência, 745/Subsolo – Porto Alegre – RS http://www.subterranea.art.br – contato@subterranea.art.br

integrantes: Adauany Zimovski Gabriel Netto Guilherme Dable James Zortéa Lilian Maus Túlio Pinto


ATELIER SUBTERRÂNEA - PORTO ALEGRE

Apresentação O Atelier Subterrânea, é um espaço independente dividido por seis artistas: Adauany Zimovski, Gabriel Netto, Guilherme Dable, James Zortéa, Lilian Maus e Túlio Pinto. O local é um híbrido de ateliê coletivo e espaço expositivo, onde são realizadas diversas atividades culturais, entre elas: exposições, palestras, oficinas, performances, exibição de vídeos etc. Esse espaço artístico, atuante desde 2006, tem por objetivo fomentar e fortalecer as redes de cooperação e intercâmbio artístico-cultural nacional e internacional, promovendo trocas entre gerações de artistas, críticos, professores, produtores culturais, e também promover o estreitamento das relações com o público. Além do espaço de ateliê em que os seis artistas integrantes trabalham, dispõe de sala expositiva e sala para cursos. Esses eventos buscam divulgar e refletir sobre a produção artística contemporânea, promovendo a troca entre artistas jovens, artistas consagrados e o público em geral. Todos os eventos são públicos e de entrada gratuita. Da paisagem local A cidade de Porto Alegre vem sendo reconhecida amplamente, ao longo da última década, como capital cultural. São diversos os eventos internacionais que tiveram a cidade como sede e que contribuíram para tal reconhecimento. No âmbito das artes visuais, destaca-se a Bienal de Artes Visuais do Mercosul. Além disso, instituições culturais vêm se fortificando, por meio da construção de centros culturais em prédios históricos revitalizados por grandes empresas em parceria com o Governo Federal. No ano de 2008, foi inaugurado o prédio da Fundação Iberê Camargo, que insere a cidade como ponto de referência de arte e arquitetura internacional, o que contribui decisivamente para o aumento de investimentos no turismo e para o crescimento do sistema cultural. Porém ao lado dessa fortificação das grandes instituições culturais, está a escassez e precariedade dos espaços públicos destinados à atuação de jovens artistas locais. É da necessidade de criação de espaços alternativos para atuação e debate de artistas ainda em formação e da organização de redes de cooperação entre artistas, críticos, professores e produtores locais consagrados e iniciantes que nasce o Atelier Subterrânea.

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Uma das inovações do Atelier Subterrânea vem sendo a criação de alternativas para a aquisição de obras de arte a baixo custo e de propostas inovadoras de sustentabilidade da produção artística local. A exemplo disso está a realização dos sorteios das obras de arte doadas pelos artistas que expõem no local (além das obras expostas, o artista é convidado a doar uma obra, a sua escolha, para o sorteio). A venda dos números das rifas – a R$ 5 – e o sorteio são realizados no dia da abertura da mostra, criando uma atmosfera descontraída, que se contrapõe à formalidade das grandes instituições. A cada evento, essa rede fortifica-se, reafirmando a relação de cumplicidade entre artista, público e o Atelier Subterrânea. A criação e a articulação de redes de artistas, curadores e do público amplia-se com passar do tempo. Esse trabalho, desenvolvido pelos artistas que integram o espaço, é um laboratório que serve de escola para todos aqueles que dele participam.

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Da Documentação Desde o início, o Atelier Subterrânea vem registrando seus eventos e armazenando essa documentação em arquivo. Uma parcela desse material está disponibilizada no site: http://www.subterranea.art. br. A quantidade de atividades produzidas e realizadas no espaço apontou para a necessidade de construir através de uma publicação uma extensão do espírito do espaço. Essa iniciativa foi contemplada pelo edital FUMPROARTE (Fundo Municipal de Apoio à Produção Artística e Cultural de Porto Alegre) no ano de 2009 e hoje é uma importante referência da produção artística local para pesquisadores e para o público em geral, difundindo a produção independente de artes visuais em Porto Alegre. Esse recorte de tempo é apresentado no livro a partir de extensa documentação fotográfica, de um texto crítico, de uma entrevista com o historiador e crítico de arte Alexandre Santos e de trabalhos concebidos especificamente para a publicação, pelos artistas convidados Cildo Meireles, Edith Derdyk, Fábio Zimbres, Flávio Gonçalves, Gerson Reichert, Lia Menna Barreto e Rodrigo Lourenço, e também pelos integrantes da Subterrânea.

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Atelier Subterr창nea


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Das parcerias Desde o início do ateliê, os principais apoiadores dessa iniciativa independente foram os próprios artistas e críticos que dela participaram, seja ministrando cursos, realizando exposições ou palestras. A ampliação do público ao longo desses anos também tem sido fundamental para a continuidade das atividades. No contexto do surgimento da Subterrânea, existia na cena do sistema local a atuação do Torreão (1993-2009). O espaço era gerido pelos artistas Elida Tessler e Jailton Moreira, que promoviam, além de exposições de artistas convidados, uma parceria com o Instituto Goethe de Porto Alegre, através da qual artistas alemães realizavam períodos de residência na cidade – Projeto Artist in Residence –, que culminavam em exposições no próprio espaço do Torreão. Em função do encerramento de suas atividades, a Subterrânea passou a ser uma alternativa para abrigar e dar continuidade a esse projeto de residência, previsto para ser retomado no subsolo do número 745 da Av. Independência no ano de 2011. Em janeiro de 2010, Gabriel Netto e Túlio Pinto visitaram o ateliê do artista Raul Mourão, no Rio de Janeiro. Visita que já deveria ter acontecido em 2009, mas que, por motivos que agora não lembramos, não ocorreu. O fato é que, se isso tivesse acontecido em 2009, a magia acionada pela recém iniciada série Balanços, não seria apreciada. A empolgação foi tanta, que a exposição de Raul foi acertada para abrir o calendário de exposições de 2010 do ateliê. Como é de costume toda mostra tem um convidado para escrever sobre a exposição. Raul Mourão sugeriu Felipe Scovino. Ideia prontamente aceita pelo grupo e que depois renderia um convite do jovem crítico ao ateliê para participar de uma publicação sobre coletivos de artistas. Paralelamente a isso, o Santander Cultural, instituição privada atuante no sistema cultural da cidade, procurou a Subterrânea para propor uma parceria, inaugurada com a exposição Balanço Geral de Raul Mourão. Após quatro anos de produção percebemos que tínhamos material suficiente para inscrevermos uma proposta no edital Conexão Artes Visuais – MinC / FUNARTE / Petrobras, que nada mais era do que

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(acima)

Gabriel netto Estudo de Amplitude #1, 2005

Gabriel netto VĂ­deo Corpo, 2009


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a execução do calendário, já previsto para o segundo semestre de 2010. Desde sempre idealizamos o espaço como um laboratório de experimentação onde procuramos fazer aquilo que percebemos faltar no entorno. O ateliê, em sua sistemática de atuação, tornou-se uma ferramenta saudável para a paisagem cultual da cidade de Porto Alegre e o seu caráter profissionalizante se consolidou, mesmo que por um período, através do edital Conexão Artes Visuais.

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Guilherme dable Tacet: FĂŞnix I - xilofone, 2007 foto Vera Chaves Barcellos


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Guilherme dable sem título, 2010 foto Raul Krebs/ Estúdio Mutante

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James zortéa Mancha (still de vídeo), 2009

James zortéa Reflexo (still de video), 2009


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Lilian maus Piscina, 2009 foto Lilian Maus Lilian maus Tramas diárias, 2009 foto Túlio Pinto

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TĂşlio Pinto Linha, 2010


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Túlio Pinto Situação de encontro, 2010


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Adauany zimovski sem tĂ­tulo, 2008


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Adauany zimovski da série Paisagem Pragmática, 2010


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Branco do Olho (2004) Rua do Lima, casa 138 – Recife – PE – www.brancodoolho.com.br http://condominiobrancodoolho.blogspot.com – contato@brancodoolho.com.br

Integrantes Bárbara Collier Bruno Monteiro Clarissa Diniz Eduardo Romero Izidorio Cavalcanti João Manoel Feliciano Luciana Padilha Lucia Padilha Silvia Paes Barreto Zel Garrett


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Navegar é preciso. Nadar é imprescindível. Coletivo Branco do Olho

“Gentileza gera gentileza”. Mesmo! I – Da natação e da água ao redor A necessidade de discutir, trocar, pensar sobre arte e o desejo de estreitar laços de amizade foi o que impulsionou, em 2004, a primeira formação do coletivo Branco do Olho, que, na ocasião, contava com 15 integrantes – em sua maioria, artistas que se conheceram no Salão Pernambuco de Artes Plásticas/Novos Talentos 1999 (Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco, Olinda) e cujas obras começavam a ser reconhecidas no final dos anos de 19901. A intenção estava voltada não só para a prática artística em si, mas também se fazia a partir do desejo de discutir arte, visto que tínhamos ainda poucas oportunidades de caráter público ou coletivo para debater acerca das inquietações que concerniam à nossa experiência com arte contemporânea. A cidade, apesar de apresentar um reconhecido histórico de grupos e coletivos de artistas, sinalizava, nos primeiros anos do século XXI, um processo de retração de suas iniciativas independentes e colaborativas, lacuna que, ainda que discreta, já motivava alguns artistas a se movimentarem no sentido de amenizá– la. Assim, em meio a esforços advindos de várias partes – artistas, grupos, instituições, governos –, o Branco do Olho contribuía, por meio de suas diversas atividades (como exposições, projeções de vídeos, soirées performáticas, debates, além da participação de alguns de seus integrantes em listas nacionais de discussão e proposição de ações, como a Artes Visuais Políticas), com a sinergia local de dinamização e profissionalização de um campo para a arte contemporânea. 1 A formação do Branco do Olho nunca esteve restrita a gerações específicas,

contando com participantes de idades, trajetórias, interesses e ideias muito diversificadas sobre arte.


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(acima)

Vista da exposição de Bárbara Collier (Programa Exposições Relâmpago), 2006

(à esquerda)

Bruna Rafaella Premiação, 2006


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Nesse processo de adensamento do campo da arte local – que se enfatiza ainda no final da década de 1990, com o agrupamento de artistas, a fundação do Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães (1997), a instauração de programas de exposições e cursos na Fundação Joaquim Nabuco, a fundação do Instituto de Arte Contemporânea da Universidade Federal de Pernambuco, UFPE (1996) etc –, a primeira década dos anos 2000 cumpre importante papel, sobretudo pela legitimação nacional que passam a adquirir instituições e artistas de Pernambuco. Entre 2000 e 2010, altera– se o lugar de Recife na arte brasileira e, aliada ao estabelecimento de leis e outras políticas públicas de incentivo à arte, uma agenda de atividades (como seminários, o Salão de Artes Plásticas de Pernambuco e, em especial, o SPA das Artes2) protagoniza a circulação de artistas, críticos e curadores pela cidade, estimulando trocas e fomentando debates variados. Nesse processo, ressalta–se também: o “ressurgimento” do Museu Murillo La Greca, que se torna, entre 2005 e 2009, um relevante espaço de experimentação; a tentativa de atualização do curso de Licenciatura em Educação Artística/Artes Plásticas da UFPE, com a implementação de um programa de pós– graduação, em conjunto com a Universidade Federal da Paraíba; o surgimento do primeiro bacharelado em artes visuais da cidade, na Faculdade AESO Barros Melo; a discreta ampliação do mercado de arte local e o esforço de nacionalização que as galerias do Recife têm perpetrado; a tentativa de fomentar e veicular um debate crítico, como aquele levado a cabo pela revista Tatuí [a revista existe desde 2006] e pelo Portal 2PTOS; e o amadurecimento do trabalho de arte– educação nos museus e nas escolas, num esforço de aproximação da produção artística a um público amplo. Nesses últimos anos da década (2008–2010), todavia, sobretudo por crises políticas e econômicas locais e globais, as instituições de arte 2 O SPA das Artes é um evento com amplitude nacional, promovido pela Prefeitura do Recife, através da Gerência de Artes Visuais da Fundação de Cultura Cidade do Recife, que, em 2010, chegou à sua 9ª. edição.


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(abaixo)

Séphora Silva Vês, 2007


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do estado têm suas atividades francamente diminuídas. A ocupação prioritariamente política da direção de vários museus, os drásticos cortes orçamentários, a irresponsabilidade na gestão pública e a burocracia cultural dificultaram a continuidade dos projetos institucionais e, inclusive, mantiveram fechados – por diferentes períodos de tempo – alguns dos principais museus da cidade, como o Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães, o Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco e o Museu da Cidade do Recife. Vivenciando tais transformações, atualmente, o Branco do Olho, em suas discussões internas, percebe que, ainda que a produção dos artistas recifenses esteja intensa – note-se, por exemplo, a grande quantidade de jovens artistas na cidade –, o processo de institucionalização vivenciado em âmbito local (e nacionalmente celebrado) demonstra suas fragilidades. Ademais, dificuldades de agenciamento – dada a pouca interlocução entre as instituições e a frágil articulação dos artistas e outros profissionais para a construção/acompanhamento de políticas públicas por meio das interfaces de participação cívica disponíveis, como os fóruns de artes visuais da Prefeitura e do Governo do Estado – parecem indicar verdadeira alteração nas dinâmicas de convivência e trabalho no campo da arte local. Se este, na virada para os anos 2000, esteve, por um lado, marcado por ações intensamente sinérgicas, parece, por outro lado, adentrar, na segunda década do século XXI, num processo de desarticulação da coletividade. II – Nadar coletivamente em meio à crise da coletividade A história íntima do Branco do Olho, aquela que nem sempre fica evidente, inclusive para os próprios integrantes do coletivo, relaciona–se diretamente às transformações experimentadas em muitos dos âmbitos do campo da arte recifense. A formação, as estratégias de trabalho, os ritmos e dúvidas do coletivo dão a ver, de algum modo, índices desse processo, que, apesar de vinculado às especificidades locais, parece também estar em consonância


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(acima) Vista da exposição “Quando Dez Mil Vozes se Calam” – Bruno Vilela (Programa Exposições Relâmpago), 2007 Vista da exposição “Vitrines” – Bruna Rafaella (Programa Exposições Relâmpago) , 2006


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com o que ocorre em outros lugares do país, sinalizando seu caráter ampliado – não à toa, em conversas com artistas ou grupos de outras localidades, percebemo–nos às voltas com questões comuns. De modo geral, em Pernambuco, a energia que mobilizava grande parte dos agrupamentos coletivos – e que tinha estreita relação com o desejo de viabilizar a produção de arte, sua circulação e visibilidade – é redirecionada no processo de institucionalização e profissionalização do campo local. Novas dinâmicas de exposição e legitimação passam a suprir parte das necessidades que impulsionavam o trabalho colaborativo, desvinculando–o de responsabilidades que, outrora eram encabeçadas pelos artistas, atualmente são assumidas por instituições e outros modos de gestão pública da arte e da cultura. O desejo de estar junto – de trabalhar coletivamente – tem, então, desenhado outras perspectivas e, com elas, diferentes linhas de ação, num processo que se desenvolve aqui e agora. No Branco do Olho, hoje, esse estar junto parece ser uma circunstância de generosidade entre indivíduos, tempos e espaços – inclinação à compreensão do outro que talvez seja uma das características do meio artístico pernambucano em sua propensão ao agrupamento. Percebendo e desenvolvendo novos modos de convivência e trabalho, faz–se o fortalecimento – por vias de um amadurecimento – do B.O., que cria dinâmicas para lidar com as diferentes nuanças de sua sociabilidade interna. Além de, desde o princípio do Branco do Olho, dizermos que “a esclerótica é a única coisa que temos em comum”, hoje, ao contextualizar nossa ação de forma mais sistêmica, conseguimos também lidar melhor com o casamento – pessoal e profissional – a dez, que, como coletivo, escolhemos construir. Pois, se, inclusive no princípio dos anos 2000, o agenciamento coletivo foi, para muitos, visto como uma estratégia de inserção e legitimação do


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Luciana Padilha Periódico, 2009 foto Michele Souza

(à direita)

Cartaz do Quarta Etílica Evento que reunia pessoas para conversar sobre arte e tomar caipirinha


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trabalho dos artistas que coletivamente se colocavam, a ponto de ser comum a piada de que, no Brasil, havia “mais coletivos do que artistas”, este final de década parece trazer novos dados à leitura da “febre dos coletivos”. Se, antes, tais coletivos estavam muito próximos da ideia de “grupo” – tratada, por sua vez, ainda em proximidade com a concepção modernista de trabalho coletivo, como, por exemplo, na relação com a autoria (artistas cuja individualidade se concentrava numa subjetividade comum, a do grupo, em sua obra conjunta) –, hoje, parecem ter construído um espaço de diferenciação evidente. Para além da constituição de estratégias de trabalho e modos de subjetivação distintos, um fenômeno específico parece, ainda timidamente, se delinear: a migração da ênfase na autoria coletiva para o foco nas formas de sociabilidade. Ocorre que experiências recentes na arte brasileira – como o Branco do Olho, a Galeria Mau Mau (PE), o beco da arte (SP), o Atelier Subterrânea (RS), o Arquipélago (SC), o QG do GIA (BA), o Kaza Vazia (MG), entre dezenas de outros –, na sequência do trabalho inaugural desenvolvido por coletividades como o Alpendre (CE), o Capacete (RJ) ou o Torreão (RS), têm difundido uma noção expandida de “instância coletiva” e ampliando a noção para além de uma ideia tradicional de capacidade criadora (como sempre a exercitaram os grupos), em direção à instauração de espaços–tempos de subjetividades (e práticas) diferenciadas (ou diferenciadoras), genericamente tratados como “espaços alternativos”, cuja gestão habitualmente é feita por artistas. O interesse parece ser, então, menos a já muito experimentada “criação artística coletiva” e, mais, a necessidade de responder às inquietações advindas de uma discussão sobre o lugar da arte no estágio atual do capitalismo. Ao incômodo de perceber a arte atada a negociações econômicas, políticas, midiáticas e simbólicas diversas – condicionada a demandas perversas a despeito do discurso de liberdade que a cerca


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Público interagindo na obra de Izabela Luchesi Condomínio Branco do Olho foto Michele Souza


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–, a experiência coletiva de gerenciamento de um espaço/coletivo, com suas construções particulares de subjetividade, responde quase que como uma catarse, como tentativa simbólica mas, sobretudo, física e econômica (producente) de fazer diferente. Todavia, dado o fato de que os coletivos têm, crescentemente (e o Branco do Olho é um exemplo desse processo), pleiteado apoios governamentais ou privados – sobretudo através de editais públicos – para o exercício (ou ampliação) de suas atividades, envolvendo–se em sua lógica de responsabilidades e contrapartidas sociais, a questão que se coloca, em toda a sua radicalidade, termina por concentrar– se numa só: é possível fazer diferente partindo dos mesmos meios? Não estaríamos, porventura, internalizando (inclusive no âmbito da criação) a lógica da institucionalização? III – Do nada ao nado Urge, então, rever – sobretudo ideológica e eticamente – nossas concepções de independência, dependência e co–dependência, na direção de compreender com mais discernimento o que se passa no campo da arte brasileira e de nele atuar de forma libertária, experimental e produtiva. Perceber a complexidade das relações em que estamos submersos é também uma das tarefas que se deve assumir quando se quer pensar e trabalhar coletivamente. Agir a partir das percepções construídas é como nadar: usar a água ao redor em favor do deslocamento desejado, inclusive quando na


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Fotografias da abertura do programa “Exposições Relâmpago”


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Programa de exposições relâmpago do Branco do Olho Uma sequência de treze exposições individuais de curta duração, com apoio do Sistema de Incentivo à Cultura da Prefeitura da cidade de Recife de 18 de outubro de 2006 a 6 de junho de 2007 “A cada exposição, a Casinha foi especialmente preparada para receber os artistas. Suas paredes, teto e piso receberam obras várias - sua arquitetura não só amparou os trabalhos expostos como também serviu de inspiração para alguns outros. Foram apresentados desenhos, pinturas, fotografias, objetos, instalações, vídeos, performances, site specifics, ações, áudios. Grande parte dos trabalhos mostrados durante o programa foi criada especialmente para ele e, em seu ineditismo, indicavam com precisão questões caras os treze (dos quartoze) membros do Branco do Olho que estavam expondo: Bárbara Collier, Bruna Rafaella, Bruno Monteiro, Bruno Vilela, Eduardo Romero, João Manoel Feliciano, Lúcia Padilha, Luciana Padilha, Maurício Castro, Miss Móes, Sérgio Vasconcellos, Rodrigo Braga e Séphora Silva. A 14a integrante do B.O. - Clarissa Diniz - dedicou-se a escrever os textos críticos (...)” “Não foram poucas as vezes que a gente conversava, levava a cadeira para a ladeira da Misericórdia, em Olinda, e ficava vendo o pôr-do-sol. Assim surgiam diversas exposições. Foi um pouco dessa informalidade que as coisas fluíram. O próprio projeto da exposição relâmpago é produto disso. Foi em um churrasco, fazendo um risoto, que a gente começou a pensar nele. Depois botamos no papel e, em uma semana, estava pronto. Talvez a espontaneidade seja parte importante do processo.”


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Zel Garret Reliquias, 2009 foto Rodrigo Braga Lucas Bambozzi Intervenções mínimas, 2009 foto Rodrigo Braga


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Projeto Condomínio B.O. “Ansiando estabelecer relações mais prolongadas, necessariamente presenciais, o B.O. realizou, com o apoio do sistema de incentivo à cultura, da prefeitura da cidade de Recife, uma série inicial de cinco residências” Residência 01 (nov/dez 2008) Residentes: Thula Kawasaki e Zel Garret Convidadas: Beth da Matta, Clarissa Diniz e Juliana Notari Residência 02 (jan / fev 2009) Residentes: Luiz Rodolfo Annes, Bruna Rafaella e Eduardo Romero Residência 03 (fev / mar 2009) Residentes: Lucas Bambozzi, Jarbas Jácome e Lúcia Padilha Residência 04 (abril de 2009) Residentes: Vitor Cesar, Clarissa Diniz, Isabela Lucchesi Convidados: Diogo Todé, Yuri Firmeza, Miró da Muribeca, Editora Livrinho de papel finíssimo Residência 05 – piso escorregadio (maio / jun 2009) Residentes: Fabiano Marques, João Manoel Feliciano e Luciana Padilha Convidado: Tatuí


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ARQUIPÉLAGO (2007-2010) Rua Idalina Pereira dos Santos, 81 - Agronômica – Florianópolis -SC http://arquipelagoart.wordpress.com - arquipelago.art@gmail.com

integrantes: Fabiana Wielewicki Letícia Cardoso


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Arquipélago: espaço de arte que atuou como centro de pesquisa e debate da produção artística em Florianópolis. Inaugurado em 2007, realizou exposições, apresentações musicais, encontros literários e oficinas de arte. Encerrou suas atividades no início de 2010. Uma entrevista bem de perto: nossa intenção, aqui, é tentar falar um pouco do trabalho realizado (“pensar alto” sobre o que foi feito) a partir do ponto de vista de cada uma de nós. Habituadas a propor e executar as atividades do “Arquipélago” em conjunto, escolhemos o formato “pergunta e resposta”, na tentativa de promover situações de distanciamento e proximidade ao cruzar nossos depoimentos sobre as experiências compartilhadas no espaço. O combinado: elaborar quatro perguntas sobre a atuação do “Arquipélago”, enviálas por e-mail e responder rapidamente. Fabiana e Letícia. Fabiana: Por que montar um espaço de arte na ilha de Florianópolis? Letícia: Uma estratégia de sobrevivência numa ilha. Em 2003, fui morar em Porto Alegre para fazer o mestrado. Quando voltei para Florianópolis, muitos artistas da cidade, da nossa geração, tinham uma projeção maior fora do estado e migravam para outras cidades. Você tinha uma empresa e eu tinha uma casa. Criar um espaço de arte na ilha, naquele momento, era, novamente, uma vontade de discutir, conversar e concretizar os projetos. O desejo de iniciar um movimento de mercado na cidade vinha aliado ao de viver do próprio trabalho e apostar num espaço para a pesquisa, fora do ambiente universitário. Letícia: Fale um pouco sobre o nome “Arquipélago”. Fabiana: Lembro que a escolha de um nome para o espaço foi norteada por certa relação de identidade com a cidade de Florianópolis. A imagem da ilha era recorrente, mas sempre desistíamos dela, por sugerir certo isolamento. O “estalo” (óbvio, mas tardio) do conjunto de ilhas nos trouxe a imagem do arquipélago. Uma situação geográfica que fala de conjunto, mas que preserva certa ideia de identidade. Um estar junto na diferença. Fabiana: Em que medida você acha que o Arquipélago interferiu na cena artística local? Letícia: No primeiro ano de Arquipélago, artistas como Fernando Lindote, Denise Bendiner, Julia Amaral, Diego Rayck, Aline Dias, Tiago Romagnani, Diego de los Campos, Franzoi e Camila Barbosa

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“Contin(g)ente”, 2009 vista da exposição


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estavam muito próximos do espaço. Nesse ano [2007], realizamos exposições individuais de Julia Amaral e Gabriele Gomes. Durante a mostra, uma publicação de 50 exemplares, lançada no evento Café com o artista, era vendida a preço de custo, com uma série de textos de convidados. A publicação e a conversa almejavam discutir com o artista seu trabalho e fomentar a discussão com o público. Nesse ano, Gabriela Motta nos procurou para realizar o mapeamento do Rumos Artes Visuais. Semestralmente, realizávamos a Noite do Múltiplo, um evento em que a troca de um ingresso dava direito a um múltiplo, reunindo muitos artistas e motivando a produção de obras nesse formato. Quando o Arquipélago fez um ano, conseguimos aprovar um projeto de agenda cultural, pela Lei de Incentivo Estadual, o que garantiu nossa programação para 2009. Assim, fizemos a exposição 4 pinturas, com trabalhos de Camila Barbosa, Manoel Veiga, Fábio Noronha e Renata Patrão, e uma intervenção arquitetônica, no segundo piso do espaço, realizada por Marcos Sari. Tivemos ainda as mostras Contin[g]ente, com curadoria de Guy Amado, e Terra de Areia, de Gabriela Motta. Para conceber essas mostras, enviávamos o material de exposições realizadas no estado, para que os curadores tivessem uma ideia do panorama da arte em Santa Catarina. O alcance de tudo isso talvez seja difícil de calcular hoje. Letícia: Qual a relação entre o continente e a ilha? Fale um pouco da sua experiência em estabelecer pontes entre as ilhas nesse tempo de Arquipélago. Fabiana: Um arquipélago não deve ficar ilhado. Acho que nosso meio de arte sempre foi meio isolado em relação ao resto do Brasil, mas vejo que hoje existe uma vontade de conversa mais evidente, mesmo que as ações ainda sejam tímidas. Sobre as experiências, acredito que o Arquipélago fez progressos: trouxe gente interessante para a cidade, mostrou a produção daqui, que ainda não tinha sido vista, por estar sem lugar; levantou questões e problemas da arte e de seu meio, mas, sobretudo, esboçou uma vontade de conversa muito grande. O apoio da Lei de Incentivo Estadual nos permitiu convidar mais pessoas a atravessar a ponte e ligar a ilha ao continente. Nossa tentativa inicial de trabalhar com a venda de obras em uma cidade sem referenciais reais de mercado para a arte contemporânea soa meio ingênua agora. Mas, mesmo assim, alguns artistas que passaram pelo Arquipélago venderam trabalhos (coisa meio inédita por aqui). E, sempre que o fôlego acabava, chegava alguém com uma proposta nova e o entusiasmo era renovado (por algum tempo).

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Conversa com Julia Amaral


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Fabiana: Na sua opinião, quais ações do espaço falharam ou foram insuficientes e como poderíamos tê-las feito de outra forma? Letícia: Acredito que as ações que tentaram fomentar a discussão da arte contemporânea com o grande público. Existe um limite que é histórico e cultural. Lançamos cursos legais de arte e crítica, mas conseguimos poucos inscritos. As pessoas resistiam a pagar pelas oficinas, a loja dos múltiplos vendia pouco e nós tínhamos que ter outros trabalhos para manter a empresa. O retorno foi mínimo... Talvez devêssemos ter investido mais nos projetos? Não sei, pois escrevemos tantos... Olhar para isso hoje é mais fácil, mas, durante o processo, a angústia era grande, o corpo, cansado, as contas mensais para manter uma empresa, o retorno lento dos projetos, nenhum manual de instrução, o desejo de realizar as mostras, as conversas e o constante medo de afundar... Se pudesse voltar no tempo, teria apostado mais num espaço de ateliê e num movimento mais individual do que coletivo. Letícia: Como se sentiu sendo sócia (o que incluía as funções de secretária, office-boy, designer gráfico, curador, artista, recepcionista etc.) de uma microempresa brasileira de nome “Arquipélago”, que findar-se-á neste mês? Você acredita (isto é uma questão de fé) que o Arquipélago é parte do circuito de arte brasileira ou um “espírito Vaca Amarela”1, prestes a desaparecer no tempo? Fabiana: Nos tempos do Vaca Amarela (2001), sentíamos uma vontade eufórica de trocar experiências. Estávamos saindo da universidade e questionando muita coisa por aqui. O silêncio nessa ilha era constrangedor: nenhuma exposição era comentada ou criticada, e um release no jornal era lucro (bom, dá até uma certa deprê... Hoje é muito diferente?). Nas reuniões do grupo, vislumbrávamos um espaço para trabalhar, expor e discutir arte (uma das sementes do “Arquipélago”?). Bem diferente das propostas do “Vaca”, o Arquipélago pretendia ser parte da cena local e fazer as coisas “direitinho”. A ideia era ganhar terreno e credibilidade para conquistar certa autonomia como espaço de arte. Em Florianópolis, acho que nossa atuação foi importante e representou uma vontade concreta de transformação. Fizemos muita coisa sem prática nenhuma. Acertamos, erramos, mas fizemos. Quanto aos papéis mencionados na pergunta, confesso que 1 Vaca Amarela: grupo de discussão de arte que se iniciou em 2000, integrado pelos

artistas Cynthia Pimenta, Elisa Noronha, Fabiana Wielewicki, Gabrielle Althausen, Letícia Cardoso, Lucila Vilela, Roberto Freitas e Zé Lacerda. As reuniões de discussão impulsionaram o grupo a realizar ações que reagiam ao silêncio crítica local.

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Conversa com Guy Amado


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fico exausta só de ler/lembrar (e um pouco estressada também). Mergulhamos em impostos e termos aparentemente indecifráveis, desenvolvemos jogo de cintura para exercer esses papéis sociais, negociar egos (inclusive os nossos), sempre tentando entender (com o barco andando) qual seria a função do Arquipélago na engrenagem do “circuito de arte” local e quais os seus limites (ao esbarrar neles). Uma das questões, bastante curiosa pra mim, é o fato de termos criado um espaço também para poder mostrar nosso próprio trabalho (por estarmos descontentes com o grau de experimentação limitado ou com a burocracia dos outros espaços de arte da cidade). No entanto, nos sentimos rapidamente desconfortáveis com a ideia de mostrar nossa produção em um lugar onde as decisões passavam por nós. Uma espécie de institucionalização precoce foi sendo gerada pelo meio e por nós mesmas – respondíamos a essa institucionalização e isso tornava a relação artista/“coordenadora do Arquipélago” mais conflituosa. O espaço era uma iniciativa de artistas – faltou lembrar mais disso. Pode ser uma questão de fé, mas acredito que o Arquipélago existiu (ou começou a existir) também fora dessa ilha. Acho que ele desaparece no espaço, mas não no tempo. Digo isso sob dois pontos de vista: um, cético, e outro, afetivo. Em um circuito local precário, iniciativas razoavelmente bem-sucedidas já ganham certa visibilidade. Mas, observando o processo pelo lado de “dentro”, lembrando de como a camisa suava a cada ideia colocada em prática e daqueles que se envolveram de algum modo com o espaço (acreditando), não posso dizer que a coisa morreu. Ela segue. Fabiana: Como um arquipélago não fica “ilhado” (na sua concepção e no rebatimento com o meio)? Letícia: Depende do ponto de vista. Um arquipélago é uma rede que se desloca. Algumas ilhas se afastam e outras se aproximam. Tem um ensinamento budista que diz: “quando nós nos juntamos, somos como duas bóias num mar revolto, mas, no final, cada uma pode estar num oceano diferente. Os ventos, as ondas vão nos arrastando”. Fazer parte desta publicação é formar um “Arquipélago” com outras ilhas. O problema é que um espaço físico, ao mesmo tempo que permite que as propostas artisticas se materializem, solicita cuidados e recursos para se manter vivo. A exposição Terra de Areia, por exemplo, com curadoria de Gabriela Motta, teve poucas visitas, mas reuniu artistas do interior do estado e de diferentes gerações e está documentada num catálogo. A mostra esteve ilhada? Fizemos a nossa parte divulgando-a e sempre tivemos apoio de mídia espontânea nos

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“Coletiva Arquipélago”, 2007 vista da exposição


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jornais da capital e do estado. Acredito que a documentação permite que outros públicos se aproximem do espaço e que a discussão não se dissolva no tempo. Letícia: Fabi.... Já descobriu como sair da “ilha de Lost”? Fabiana: Não. Continuo achando que existe um campo magnético (indetectável) pairando sobre a ilha, que me faz confundir as coisas: não sei se ainda estou aqui, se eu estou em algum lugar ou se a ilha nunca existiu.

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Recital de piano com Diogo de Haro, 2008

Comemoração do Bloomsday, 2008


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Vista da fachada do Arquipélago


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Montagem da exposição


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Registro da Performance Memórias no Espaço-Tempo de Franzoi


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vista da sala de estar do ArquipĂŠlago


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“Terra de Areia”, 2009 vista da exposicão

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Vista da exposicão “Terra de Areia”, 2009


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Alguns eventos realizados: Exposições coletivas 2007 Coletiva Arquipélago 2008 Intervenções no espaço: Diego de los Campos, Diego Rayck e Camila Barbosa 2008/09 O mistério da rua Idalina Pereira dos Santos, nº 81 (curadoria: Fernando Lindote) 2009 4 Pinturas: Camila Barbosa, Fabio Noronha, Manoel Veiga e Renata Patrão 2009 Contin(g)ente (curadoria: Guy Amado) 2009 Terra de Areia (curadoria: Gabriela Motta) Exposições Individuais 2008 Os Céus Velam Minhas Mortes Contínuas, de Gabriele Gomes 2008 Memórias no Espaço-Tempo, de Franzoi 2008 Apesar de, de Julia Amaral 2008 Saudade, de Tiago Romagnani 2008 Não nos responsabilizamos pelo uso incorreto do produto, de Roberta Tassinari 2009 Aquário, de Karina Zen 2009 Intervenção: 2º piso, de Marcos Sári Outros 2007 Conversa com a escritora Maria Esther Maciel 2007 Conversa e leitura com o poeta Ricardo Corona 2007 Recital de piano com Diogo de Haro 2008 Lançamento do livro “55 começos”, de Manoel Ricardo de Lima 2009 Palestra sobre pintura com Marcos Sári e Manoel Veiga 2009 Instantânea: Festival de Música. 2009 Pequena sala de jejum – conversa no jardim com Milena Travassos 2010 Conversa com o poeta Ray Bianchi 2007/09 1ª, 2ª e 3ª NOITE DO MÚLTIPLO 2007/08 Comemoração do Bloomsday 2007//10 Oficina de orientação para artistas, com Fernando Lindote

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ou tras tantas hist贸 rias


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Sobre possibilidades de organização e outras tantas histórias

Como pensam sua atuação/inserção dentro da sua cidade e dentro do circuito de arte no Brasil? Esta pergunta foi lançada para espaços independentes de arte contemporânea espalhados pelo Brasil. Alguns deles já foram desativados, porém resolvemos incluí-los, dada a sua importância para a constituição do circuito de arte no Brasil. Longe de querer ser um mapeamento definitivo desse tipo de iniciativa, este capítulo pretende ampliar a discussão levantada ao longo do livro, trazendo para o debate outras múltiplas vozes. Diferentes no formato e na abordagem, os textos produzidos pelos espaços convidados revelam seus posicionamentos, preocupações e, acima de tudo, um pouco da sua lógica de trabalho. Nas páginas seguintes, vocês poderão conferir as falas dos agentes culturais que tocam os seguintes espaços: A Casa. Como Convém (PE), A Coisa (SP), Ateliê Aberto (SP), BASE (CE), beco da arte (SP), Casa Contemporânea (SP), Casa da Xiclet (SP), Casa Tomada (SP), Contemporão (SC), GIA (BA), Kaza Vazia (MG), Projeto Figura (RJ) e Rés-doChão (RJ). Por motivos diversos, outros tantos espaços ficaram de fora do livro, porém não podemos deixar de registrá-los aqui. Em primeiro lugar, seria preciso mencionar as iniciativas pioneiras do Torreão (RS), do Alpendre (CE) [www. alpendre.org.br] e do Capacete Entretenimentos (RJ) [www.capacete. net], os dois últimos na ativa até hoje. Além deles, o Ateliê Oço (SP) [www. atelieoco.com.br], o Centro de Contracultura de São Paulo – Casa da Grazi (SP), o Estúdio Dezenove (RJ) [http://estudiodezenove.carbonmade.com], a Jambrohouse (SP) [www.jambrohouse.blogspot.com], a Matilha Cultural (SP) [http://matilhacultural.com.br], a N.A.V.E. (PE) [www.e-nave.com.br], a Sala Dobradiça (RS) [http://saladobradica.blogspot.com] e a Sala Recife (PE) [www.salarecife.com.br]. Jaime Lauriano


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A Coisa (2006) Rua Amador Bueno, 1300 – Centro – Ribeirão Preto – SP http://espacoacoisa.blogspot.com – espacoacoisa@gmail.com O espaço A Coisa começou com um sarau literário, em 11 de outubro de 2006. O sucesso do evento foi tão gratificante para nosso grupo de amigos, que decidimos dar sequência às atividades. O que seria apenas um evento chamado “A Coisa”, tornou-se o espaço A Coisa. No início, abríamos o espaço apenas às sextas, e os eventos duravam até à noite de domingo, com apresentações de teatro, dança, música, leitura de poesias e exposições de fotos, desenho e pintura. Aos poucos, todos que participavam dos eventos foram se conhecendo, e dessa relação surgiram grupos de leitura, estudo e teatro, como, por exemplo, o grupo Trupe Acima do Bem e do Mal, que ensaiava durante a semana no espaço e apresentava as chamadas “seções malditas” nos fins de semana ensaios teatrais sinistros, que começavam à meia noite, tratando de temas como sonhos, moral, loucura etc. Outras atividades foram incorporadas ao espaço, como as palestras de psicanálise Senso e Contra Senso da Revolta, de teatro-psicanálise, de cinema-psicanálise e os grupos de pintura e desenho. A cada semestre que começava, víamos o projeto ficar mais sério. Novas atividades e aprimoramentos na estrutura do espaço eram inevitáveis. Nas primeiras apresentações de teatro, não havia sequer uma cadeira igual à outra para o público se sentar. Trazíamos jogos de cadeiras de casa, tudo bem improvisado. Atualmente, o espaço abriga grupos de teatro, grafite, desenho e yoga, durante a semana, e, nos fins de semana, acontecem apresentações de jazz e teatro. Sempre que sabemos de algum grupo ou artista com trabalhos inovadores, tentamos trazê-lo para o espaço. Ser uma espécie de arena para trabalhos distintos revitaliza nosso espírito e o da cidade.


A COISA - RIBEIRテグ PRETO

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B.A.S.E. (2002 - 2004) Fortaleza – CE www.arte-esferapublica.org – contato@arte-esferapublica.org De uma maneira mais descritiva e sucinta, uma definição da B.A.S.E. seria: um espaço destinado à discussão, produção e circulação de práticas artísticas, localizado numa casa, na área central da cidade de Fortaleza (Ceará). Organizado pelos integrantes da Transição Listrada1 – Renan Costa Lima, Rodrigo Costa Lima e Vitor Cesar – o projeto aconteceu entre 2002 e 2004. Falar da B.A.S.E. implica inevitavelmente numa reflexão, com as ferramentas de que disponho hoje, para contar sobre o que aconteceu na época das atividades. Nesse caso, não me sinto capaz de estabelecer um distanciamento crítico que pudesse pressupor uma suposta neutralidade em relação à experiência que tive na B.A.S.E. Portanto, me parece que escrever sobre a B.A.S.E. hoje significa atualizá-la, somar essas novas ferramentas àquelas que existiam naquele momento. Fortaleza, no início dos anos 2000, passou por uma transformação no circuito cultural e, consequentemente, no meio de artes visuais. Isso se deu principalmente com a inauguração do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, que abrigou grandes exposições, shows e espetáculos que circulavam pelo país. Além disso, é fundamental ressaltar a criação do Alpendre, espaço interdisciplinar que teve atuação decisiva na formação de artistas da cidade por meio de grupos de estudo. Na cidade, até então sem escolas de artes visuais, cinema e design, esses dois equipamentos promoveram contatos e inquietaram um grupo de artistas, cineastas, escritores, músicos e intelectuais locais. A B.A.S.E. surgiu nesse contexto, não como uma alternativa aos espaços institucionais, mas para desempenhar um outro papel, mais voltado para, de algum modo, evidenciar as inquietações. Não existia uma clareza por parte dos integrantes quanto aos objetivos da B.A.S.E. Tudo foi feito e organizado a partir de respostas aos contextos imediatos da cidade e do desejo de novas associações entre diferentes grupos. Os procedimentos foram permeados pelo que seria possível chamar de nãoprofissionalismo, o que foi fundamental para a constituição da B.A.S.E. como um espaço agregador. Nesse caso, o não-profissionalismo não significa falta de comprometimento. Trata-se de reconhecer que o surgimento e a atuação da B.A.S.E. não respondiam diretamente à demanda do circuito artístico, fosse por interesses institucionais ou de mercado. E isso não acontecia por conta de uma possível crítica ao circuito, mas talvez por um certo 1 Coletivo de Fortaleza cujo trabalho acontece na relação com o espaço urbano. Atuando no cotidiano das pessoas, as ações e intervenções do coletivo contribuem no processo de construção e transformação da cidade.


BASE - FORTALEZA

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desconhecimento dele não existiam muitos motivos para que esse circuito pudesse pautar a produção. Comprometimento, havia bastante. Durante os dois anos de atividades, realizamos exposições, mostras de vídeos, palestras, conversas e festas, tudo custeado pelos integrantes da casa e pelos artistas colaboradores, com eventuais pequenos apoios. Com o andamento do projeto, foi inevitável o contato com alguns artistas de outros lugares do Brasil. A B.A.S.E. tornou-se uma espécie de pretexto ou espaço de boas vindas para a aproximação a alguns artistas que estavam de passagem na cidade por conta de outros projetos. A B.A.S.E. foi uma resposta à cidade, com interesse na visibilidade de questões debatidas por grupos de pessoas de diversas áreas: artes visuais, arquitetura, vídeo, música. Por isso, sua natureza era reconhecidamente específica: ela tratava principalmente de práticas artísticas e era, de certo modo, restrita, porque não dava conta (e nunca pretendeu dar) de toda a cidade. Ainda assim, era um espaço que se abria para novos grupos e públicos. A atuação da BASE se deu como uma tentativa de criar modos de estabelecer espaços públicos (e aqui compreende-se “espaço” no sentido de “meios”) de discussão sobre assuntos e questões que atravessavam Fortaleza, na época. Por Vitor Cesar


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BECO DA ARTE (2007) Rua Major Maragliano, 47, Vila Mariana (sede desativada), São Paulo – SP http://becodaarte.blogspot.com/ Arte contemporânea no Brasil: um dão conta de expor a complexa e circuito embaralhado diversa produção contemporânea, a criação de novos espaços é inevitável. Matéria de Arte exclusiva para este Foi assim que surgiu o beco da arte. livro. A: Em que vocês se diferenciam Para o beco da arte, as complicações e se assemelham aos “espaços do circuito de arte no Brasil estabelecidos”? impulsionam o surgimento de espaços para a circulação da arte B: Não vou traçar aqui semelhanças e contemporânea no país. Mas como a diferenças, mas gostaria de ressaltar posição do Brasil no cenário político- que nossas ações e posicionamentos econômico internacional pode pretendem mostrar uma possível influenciar esse circuito? Não há alternativa de gerenciamento para resposta definitiva. esses espaços. São a nossa forma de contribuir para o amadurecimento e a Leia abaixo trechos da entrevista constituição de um cenário forte para realizada durante um jantar, no dia a arte no Brasil. 05/10/2010. A: E as semelhanças e diferenças com os outros “espaços independentes” Arte: Qual a sua relação com o espalhados pelo Brasil? circuito de arte brasileiro? B: Aí eu não me arrisco, pois esse Beco: Você me chamou para esta tipo de iniciativa se caracteriza pela entrevista por conta da minha complexidade e pluralidade. Talvez experiência no beco da arte, certo? isso se dê pela transitoriedade das pessoas que gerem os “espaços A: Sim. Porém, não queria que você independentes”; mas não posso falasse do beco da arte, mas de como afirmá-lo. essa experiência transformou a sua visão a respeito do circuito de arte no A: Você crê que a transitoriedade de Brasil. pessoas na gestão desses espaços é B: O que mais me impressiona na desorganização do circuito de arte contemporânea no Brasil é a potência que esse contexto traz para o surgimento dos chamados “espaços independentes”. Em um cenário em que os “espaços estabelecidos” não

uma constante? B: Não posso te responder pelos outros espaços, pois estaria sendo generalista. Mas, a meu ver, no caso do beco da arte, essa transitoriedade acontece pelo simples fato de que, ao passo que um integrante atinge


BECO DA ARTE - SÃO PAULO

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seu objetivo pessoal, ele, de certa entre si: a primeira é o pertencimento, maneira, se afasta de uma visão que é o que, de cada um (ideias, ideologias etc.), se vê dentro do beco; coletiva. a outra é a propriedade, que é como A: Então quer dizer que os cada um se impõe dentro do beco. projetos realizados pelos “espaços Na maioria das vezes, essas forças se independentes” partem de equilibram e atingimos o estado de motivações individuais, que, para construção coletiva; porém, outras serem realizadas, necessitam de mais vezes, uma dessas forças (quase sempre a propriedade) sobressai e pessoas e estrutura? os trabalhos ficam parecendo um B: Novamente terei que dizer que Frankenstein. só posso responder a partir das experiências do beco da arte e A: Voltando ao começo da nossa que sua tentativa de traçar uma conversa, quais seriam os fatores genealogia do modo de operar dos que contribuem para o crescimento “espaços independentes” a partir repentino do número de “espaços das minhas repostas vai ser uma independentes” no Brasil nos últimos tremenda furada. No nosso caso, os anos? projetos começam com motivações pessoais e são trazidos para serem B: Um deles é a já citada falta de desenvolvidos em conjunto. Muitas estrutura do circuito de arte e dos vezes, essa lógica operacional é uma “espaços estabelecidos” no Brasil. maravilha, pois, mesmo com toda Outro fator, também já citado, é essa carga de autoria individual, todos a larga demanda de espaços para abraçam o projeto de tal maneira que exposição de novos artistas. Porém, a autoria individual se dilui, em favor não podemos deixar de lado a de uma robustez coletiva. Porém, acelerada ascensão que o Brasil vem outras vezes é um fiasco, pois a registrando no cenário políticonoção de propriedade da ideia inicial econômico internacional. Os grandes atropela a noção de pertencimento a eventos esportivos, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos um coletivo... de 2016, colocarão em breve o A: Desculpe interromper, mas você Brasil em uma posição mais central, disse algo interessante. Gostaria o que vai valorizar ainda mais nossa que você falasse um pouco mais produção cultural. Isso não poder ser sobre as noções de propriedade e deixado de lado na reflexão sobre o pertencimento dentro de um coletivo. circuito de arte. B: Caramba! Fico feliz de ter falado algo interessante, mas já cansei de te dizer que vou falar somente a partir das experiências do beco. Acredito que dentro de cada integrante do beco da arte há visivelmente duas forças que se digladiam diariamente. Essas forças possuem sutis diferenças

A: Isso vai modificar a forma de atuação dos “espaços independentes”? B: Não vou ser generalista e por isso não vou te responder. Primeiro precisaria viver esse momento, para depois falar. No mais, seria uma especulação sem embasamento.


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CASA DA XICLET (2001) Rua Fradique Coutinho, 1855 – Vila Madalena, São Paulo - SP http://casadaxiclet.multiply.com - casadaxiclet@gmail.com “Não é underground, é playground. Não é Ponto de Cultura, é ponto de interrogação” Adriana Xiclet A “Casa da Xiclet” é uma galeria de arte e também uma residência. A presença de uma transforma a outra – a galeria é diferente por causa da casa e a casa é diferente por causa da galeria. Além disso, a partir da consciência dessa relação, existe a perspectiva da galeria-casa como obra. Tudo o que a constitui se inter-relaciona: os nomes das exposições, os temas, provocações, slogans, critérios de (não) seleção, (não) curadoria – tudo é permeado por uma coerência muito viva no interior do caos. Uma coerência crítica, ética, ideológica e criativa: a poética da “Casa da Xiclet”. A “Casa da Xiclet” surgiu da necessidade de novos espaços para novos artistas na cidade de São Paulo, com a I Mostra de Arte de Fabiana Arruda, em 21 de setembro de 2001. Hoje, 9 anos depois, ocupa um lugar de enfrentamento diante do circuito oficial da arte, utilizando-o deliberadamente como material de trabalho.


CASA DA XICLET - SÃO PAULO

Alguns exemplos são: 2002 Bienal Eu Quero Ser Nelson Leirner 2004 Ela não é Milliet 26ª Bienal de Cu é Rola 2005 e 2009 Coletiva MoMA 2005 Quero Ser Amiga da Lisette Prima Rica/ Fica Quietinha Preu Gostar De Vc/ Shut The Hell Up I Bienal MerCUsul e Mostra El Cid 2006 Feliz Aniversário Nelson Leirner Feira Marginal – Seja Marginal, Seja Herói 27ª Bienal da Casa da Xiclet – Como Viver Longe 2006 e 2008 X-FILET – Festival Internacional da Linguagem Eletrônica Tutti-Frutti 2007 Sandra, Sinto Muito! Diga Não às Doras! 2008 Playground Coletiva “MAMi” Bienal Tô Cheia – Not Good Enough 2009 Rumos-Não-Rumos- Prumos – Curadoria da Não Curadoria Eletrobrás – Outras Fontes de Energia Emergênese – Momento Crítico e Fortuito Be AN’ALL = Seja AN’ALL 2010 A Casa da Xiclet Não É Underground, É Playground! Deu$ é Real Bienal, My Ass.: Xiclet Feira ChACO 2010 – Feira Internacional de Arte Contemporânea no Chile (a mostra recebeu o apoio do Programa Brasil Arte Contemporânea, da Fundação Bienal de São Paulo e do Ministério da Cultura). Em parceria com o Mapa das Artes São Paulo, fizemos as exposições “Olho sobre Tela”, em 2007 e “1º Salão dos Artistas Sem Galeria”, em 2010. A Casa da Xiclet atua dentro da encruzilhada arte-vida.

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CASA TOMADA (2009) Rua Brás Cubas, 335. Aclimação, São Paulo – SP http://casatomada.com.br/site/ – info@casatomada.com.br A ideia de construir um espaço de arte como a Casa Tomada veio da vontade de colocar em contato direto as diversas áreas de atuação das artes. Os projetos da Casa abordam a questão do hibridismo de linguagem nas práticas artísticas contemporâneas e possibilitam o encontro de artistas e pesquisadores com segmentos diversos das artes. Como projeto principal, a Casa Tomada oferece semestralmente um programa de residência, que conta com a participação tanto de jovens artistas como de jovens curadores, pesquisadores, críticos etc. O projeto de residência Ateliê Aberto recebe proponentes de nacionalidades e naturalidades diversas e de áreas variadas das artes. Os artistas selecionados recebem um acompanhamento dos trabalhos não só de artistas mais experientes, curadores, professores e galeristas, mas também de pessoas de outras áreas, visando a um apontamento e a uma visão diferenciados dos processos. O programa é baseado na questão do convívio e oferece a artistas e pesquisadores recém-formados ou em início de carreira uma possibilidade de continuação da pesquisa em arte, sem, necessariamente, a obrigação da construção de um trabalho final. Ao contrário de grande parte dos editais, nos quais são selecionados trabalhos prontos ou projetos específicos a serem desenvolvidos, a Casa Tomada busca selecionar os participantes de modo a formar sempre um grupo heterogêneo, em suas formas de trabalho e linguagem. E, a partir do convívio na Casa com os outros artistas, surge o material para o trabalho. Essa é uma forma de aproximar os participantes de seus processos e fazer com que cada um discuta seu trabalho no coletivo, sem contar com a figura de um orientador central (prática comum da academia). Longe da academia, os jovens artistas e pesquisadores muitas vezes se perdem de seus processos, para trabalhar em projetos (algumas vezes não realizados e engavetados) que servem apenas aos editais específicos dos grandes salões de arte. Longe desse


CASA TOMADA - SÃO PAULO

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pensamento, a Casa busca fazer com que o participante se volte novamente às suas pesquisas individuais, mas sempre levando as discussões para o grupo. Outro programa desenvolvido pelo espaço é A Casa Recebe, que estimula o intercâmbio entre espaços independentes de arte e promove a difusão de publicações de caráter artístico. Esse programa tem como objetivo fortalecer as redes de relações entre centros independentes. Outros programas da Casa Tomada buscam sempre estabelecer intercâmbios e vínculos com outras iniciativas no campo das artes. Localizada em um bairro central da cidade de São Paulo, a Aclimação, embora fora da “rota de arte”, a Casa traz como proposta esse deslocamento do visitante. Torna-se, assim, um lugar de experimentação, produção e discussão em arte, numa tentativa de ampliar os circuitos dos centros de arte na cidade.


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CONTEMPORÃO ESPAÇO DE PERFORMANCE (2009) Rua Frederico Veras, travessa 7, no. 596, Pantanal, Florianópolis – SC www.dobbra.com/terreno.baldio/contemporao.htm – contemporao@gmail.com O Contemporão Espaço de Peformance localiza-se na ilha de Florianópolis e tem sua atuação voltada para o tema da performance nas artes plásticas e seus desdobramentos. O espaço, aberto a propostas e colaborações de artistas brasileiros e estrangeiros, surgiu da necessidade de proporcionar um espaço diferenciado para a realização de trabalhos de artistas ligados à performance. Assim, seu principal objetivo é promover projetos de performance, que incluem ações ao vivo e também possíveis prolongamentos dessa prática artística, como fotografias, vídeos, ações participativas, entre outros. O Contemporão deseja apoiar uma produção experimental que aproveite os riscos dos processos. Assim sendo, o espaço trabalha com o conceito de “eventos efêmeros” e também apoia artistas cujos projetos apresentem um tipo de densidade poética desafiadora. Como o espaço surgiu com a intenção de incentivar o debate cultural e a troca de ideias e informações, realiza cursos e palestras sobre o tema da performance. Pode-se dizer que, em certo aspecto, o Contemporão é um espaço dependente. Sua existência real deve-se a alguns artistas ligados à arte da performance, que, de forma desprendida e gratuita, vêm participando dos eventos. Algumas relações de parcerias se estabeleceram para alguns eventos, como, por exemplo, a organização, em conjunto com uma docente do Centro de Artes da UFSC, Universidade Estadual de Santa Catarina, da mostra Fluxus em museus em Fluxus, que trouxe uma pesquisadora da Unicamp, Universidade de Campinas, para o evento. Amigos também ajudaram a receber artistas e participantes em suas casas. Outra parceria foi com um grupo de alunos da UFSC, que fez o lançamento de uma revista de artes no espaço e mostrou artistas de performance ligados à literatura, além de vídeos e fotografias. Houve tentativas de interagir com outros espaços e contextos, dialogar com uma instituição pública da cidade durante um evento de performance, bem como de receber apoio de Leis de Incentivo Cultural estaduais, mas não se construiu pontes estáveis, como aquela que leva ao continente... Nesse sentido, o espaço forçosamente se manteve com um mínimo de recursos.


CONTEMPORÃO - FLORIANÓpolis

O Contemporão não opera na arbitrariedade nem com uma visão ingênua sobre a cultura; sua abertura é contextual e relativa. Qualquer formatação institucional, mesmo sendo diferenciada e fora do sistema convencional, funciona com base em escolhas, e por isso tem dinâmicas, problemas, conflitos e exclusões. O espaço é formatado na efemeridade, na ausência de recursos das ações realizadas, tudo acontece “dentro do possível”. Existe uma simplicidade estrutural, sem paredes tombadas, e uma desconexão com o contexto comercial. Os eventos e palestras são sempre abertos e gratuitos. O Contemporão oferece um espaço para a realização de eventos construídos a partir do diálogo com os artistas. Nesse ambiente, algumas condições mais prazerosas de trabalho são possíveis e realizáveis.

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KAZA VAZIA - GALERIA DE ARTE ITINERANTE(2005) Belo Horizonte – MG – kazavazia.blogspot.com kazavaziax.blogspot.com – kazavazia@gmail.com Falar sobre a produção cultural em um espaço independente, mantido pela Kaza Vazia – galeria de arte itinerante, exige dar algumas voltas. A verdade é que a Kaza Vazia não tem uma sede, uma galeria, um galpão ou um espaço do tipo, nem nunca conseguiu manter um ponto de encontro duradouro que virasse referência em termos de produção/reflexão/mostra em arte na cidade. A Kaza, no alto dos seus cinco anos incompletos, apenas se prestou a criar diversos espaços, que eram abandonados pouco tempo depois. Seus projetos são sempre ocupações temporárias, apropriações de parques públicos, apartamentos particulares, lojas comerciais, casarões abandonados e até mercados municipais. Lugares que, por um determinado tempo, convivem com um grupo diferente de frequentadores e um grupo de inquilinos residentes. Esses espaços ocupados, encarados como próprios para a produção de arte, tornam-se centros de referência para incorporação das dinâmicas locais em processos artísticos, sejam elas dinâmicas de comércio, de despejo, de abandono, de constituição de famílias ou de passeio dominical. Por meio de reuniões periódicas, os novos inquilinos começam a firmar as bases da Kaza. Usam os materiais disponíveis no local para tentar sustentar o peso de um telhado de ideias e possibilidades de ação que é formado pela contribuição de cada indivíduo do grupo. Nem sempre todas as telhas são usadas, mas podem acabar servindo para outras ocupações. Por ser movimentada por um grupo aberto, a Kaza Vazia, a cada edição, sempre conta com modelos de ocupação diferentes, uma vez que seu grupo de inquilinos nunca é o mesmo. Moradores vêm e vão, garantindo um arejamento de propostas de ação, modos de construir e de se relacionar com seu entorno. Nesse sentido, é difícil definir uma natureza específica da Kaza, que não a de itinerância, de movimento constante e de ser constituída com elementos mutáveis, a serem rearranjados a cada levantamento e assentamento. Da mesma forma, os motivos pelos quais ela surgiu não são os mesmos que alimentam a lenha do seu fogão hoje. Ela foi construída, pela primeira vez, em um casarão abandonado, ao lado do Museu de Arte da Pampulha, por artistas que aspiravam a um espaço alternativo e independente de atuação, livre de processos excludentes de seleção e de regras colocadas por profissionais externos ao processo artístico. A partir de então, o grupo passou a mapear casarões abandonados da cidade, apropriando-se de espaços privados e incorporando-os, temporariamente, ao domínio público. Mas, logo, logo, passou a ocupar locais de intensa movimentação, como conjuntos habitacionais, por exemplo. Hoje (setembro de 2010), a Kaza planeja a construção de uma galeria de arte dentro de um assentamento ilegal de famílias, chamado Ocupação-comunidade Dandara. A proposta inicial é a criar


KAZA VAZIA - BELO HORIZONTE

uma programação de residências artísticas de coletivos e artistas do Brasil e do mundo numa espécie de choupana ou barraco multiúso. Estruturado por vigas de eucalipto, que servirão para a instalação de redes durante a noite, o espaço serve de dormitório e de ateliê (ao se retirarem e dobrarem as redes). Não se trata, assim, de abrir espaços para artistas à margem da programação de galerias ou museus, mas de abrir frentes de trabalho diferenciadas, em vias, espaços públicos ou comunidades em que o artista entre em ressonância com fenômenos sociais que colocam em questão as formas de configurar e habitar o espaço da cidade. Ao circuito de arte de Belo Horizonte, restam os desvios e um redesenho. Num trabalho de criar sempre novas conectividades para seus trabalhos poéticos e mapas de ligações para a Kaza Vazia, os artistas envolvidos acabam colocando um novo traçado para o circuito da arte, convidando artistas, curadores, estudiosos, apreciadores, transeuntes, crianças, bêbados e desavisados a passarem por aqui. Por Tales Bedeschi – integrante da Kaza Vazia, durante o processo de ocupação da Kaza X. Belo Horizonte, setembro de 2010.

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PROJETO FIGURA (2002) Praça Tiradentes, Centro, Rio de Janeiro – RJ www.projetofigura.com/projeto/ – contato@projetofigura.com O Projeto Figura surge com o encontro entre duas artistas, Claudia Tavares e Dani Soter, no Rio de Janeiro, quando regressavam ao Brasil, após terem morado uma temporada na Europa – uma na França, outra na Inglaterra. Após uma imediata identificação, as artistas decidem trabalhar juntas e pensam em ter uma galeria para a veiculação de novos artistas. Rapidamente, compreendem que isso envolveria muitos obstáculos financeiros e optam por criar espaços para a exibição da produção artística contemporânea. Apartamentos, casas, galpões, lugares não destinados à exposição de trabalhos de arte e tampouco à visitação pública são então utilizados como alternativa ao circuito estabelecido. Pelo caráter não institucional, essas exposições são efêmeras e geralmente duram apenas um dia. Dessa forma, os artistas são convidados a apresentar sua produção ou intervir especificamente nesses locais. A 1ª exposição, apenas de fotografias, aconteceu em um apartamento e teve uma circulação inesperada, em torno de 250 pessoas, o que estimulou as organizadoras a continuarem. E assim começou a série: Figura 1, Figura 2, Figura 3 etc. A partir de Figura 5, o projeto contou com o apoio da Secretaria de Cultura do Rio de Janeiro, que durou por 5 edições. Mais de 45 artistas contribuíram para essas dez edições do projeto Figura até hoje. Consideramos isso um número respeitável e representativo da importância de iniciativas como essa dentro do circuito de arte da cidade do Rio, que é bastante carente de espaços expositivos abertos a artistas emergentes e até mesmo de formação de um novo público. Como um desdobramento natural do projeto Figura, com a entrada de Mônica Mansur, surge o Espaço Figura, inaugurado em 2008. Seguindo o conceito de ampliação de circulação da arte contemporânea, o Espaço Figura pretende ser um lugar de aprendizado, discussão, desenvolvimento e produção de arte. Exposições relâmpagos, bate-papos e oficinas, leituras de portfólio e eventos relacionados à arte fazem parte da concepção do lugar.


PROJETO FIGURA - RIO DE JANEIRO

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O mais recente desenrolar do Projeto Figura é uma residência artística realizada em Lisboa, Portugal (setembro de 2010), organizada por Dani Soter, em parceria com a artista portuguesa Monica de Miranda e com apoio do Ministério da Cultura de lá. Quatro artistas (duas brasileiras e duas portuguesas) ficarão hospedadas em uma pensão no centro da cidade, onde desenvolverão seus trabalhos durante uma semana. Ao longo desse período, haverá encontros e debates entre o público, as artistas e outras pessoas ligadas ao meio das artes, além de performances e exposições. Ao final, será produzido um livro com as obras – in progress e concluídas – e um DVD, que serão apresentados no Rio de Janeiro. O projeto chama-se Projeto Figura-Pensão Ibérica e nosso objetivo é fazer uma itinerância por pensões que tenham o mesmo caráter (isto é: locais por onde passa todo tipo de pessoas e culturas, procurados por viajantes de baixa renda e também por prostitutas, que moram ou exercem suas funções ali) em outras cidades do mundo, com parcerias locais. Todas as atividades do Projeto Figura (exposições, oficinas, batepapos, residência) complementamse e são pensadas para gerar um projeto vivo, com a participação de artistas brasileiros e estrangeiros, trazendo dinamismo e alternativas ao circuito convencional de arte carioca.


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A CASA. COMO CONVÉM (2008) Rua Silveira Lobo,150-A, Poço da Panela, Recife – PE http://convem.tumblr.com/ – acasa.comoconvem@gmail.com Como esse processo é desenvolvido dentro da casa? A casa é a nossa morada, nosso ateliê e um lugar que abriga pessoas que estão de passagem por Recife. O processo é antropofágico. Terá validade para outras intervenções urbanas? Intervenção urbana é uma classificação posterior, que não é dada por nós e nem cogitada. Existe um modo de se relacionar com a cidade que faz ter vontade de agir e pensar sobre contextos específicos da cidade do Recife. A casa atende a outras demandas? Quais? Sim, a água que falta na caixa, uma praia no fim de semana, as pulsões sexuais, os desejos e as urgências. Cada pessoa que mora na casa atende também a uma série de demandas profissionais. Como pensam sua atuação/inserção dentro da sua cidade e dentro do circuito de arte no Brasil? A CASA. COMO CONVÉM.1 Funciona como ateliê-morada, como ponto de partir e de chegar. Fica no Recife, numa região de encontro entre três bairros de cara ainda bem marcada, mas por mudar: casa amarela, casa forte, poço da panela. Não diria que a escolha de morar junto vem do trabalho, mas digo isso tendo que pensar um pouco. É certo que não. Mas, depois da aproximação, é difícil distinguir o que veio antes e o que veio depois. O trabalho entra pela vida. A arte atravessa os dois. O endereço comum assume duas facetas: uma, concreta, é o lugar, com suas paredes, janelas, plantas e guardados; a outra, abstrata, é a coordenada geográfica, que fixa um ponto e estabelece uma referência para o deslocamento e para a observação da cidade. Pensar em como esse endereço se insere no circuito de arte no Brasil, em nosso particular, faz com que nos encontremos cada um vindo de um canto deste país (ou de outro país, como é o caso do gaúcho). O interesse, um no outro, no andar da cidade e no que vem depois, põe todos juntos. O espaço aberto vira pouso disponível para o convívio e para as coisas de fazer e de guardar. A passagem aberta vira porta de acesso ao Recife, para nós e para as visitas. Porta que não é só de passar – porta de ficar. O endereço é de correspondência e de prática de residência artística doméstica.


A CASA COMO CONVÉM - RECIFE

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A CASA. COMO CONVÉM. Arquiteto Marcos de Vasconcellos, Guanabara, 1963. O encontro no Rio de Janeiro com uma edição desse livro dá nome ao projeto de comemoração e expansão do campo, que havia se constituído na casa, com a vontade de abri-la para outras presenças. O livro chegava familiar à problemática das transformações na cidade e nas formas de morar, trazendo uma carta de abertura que dava o tom para a conversa – a carta ao Mino. Na contramão do entorno, experimentamos abrir nossa casa por uma semana, celebrando o potencial do encontro (e da própria contramão). Além do projeto de residências, que aconteceu de forma condensada em 2008 e que continua como uma vocação da casa em receber pessoas, outros momentos fixam pontos no percurso da casa: desde 2007, a carta ao Mino, prólogo do livro, é serigrafada sobre espaços em fragilidade; em 2008 acontece o Banquete desjejum, convite aberto para artistas, arquitetos e quaisquer interessados para visitar uma casa modernista em processo de saqueamento e desmanche, sob o pretexto de uma partilha de café da manhã; em 2009, Volume Base, entendendo a barraca de formas de bolo como escultura, mistura-se ao funcionamento do Mercado de São José, em Recife, operando uma fabriqueta de fôrmas de gesso vendidas no meio das mercadorias; e, em 2010, “A CASA COMO CONVÉM” ocupa-se do vislumbre da criação do Parque Jaqueirinha, em vez do supermercado previsto para um terreno arborizado, onde havia sido demolido, de forma um tanto obscura, um antigo hospital; “A CASA COMO CONVÉM” é convidada pela Galeria Mariana Moura para uma exposição que reúne um tanto do que é feito por ali.

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a casa, como convém: jonathas de andrade [al], cristiano lenhardt [rs], cristina lino [am/sp], priscila gonzaga [pe], silvan kälin [ch]


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GIA - GRUPO DE INTERFERÊNCIA AMBIENTAL (2002) Salvador – BA www.giabahia.blogspot.com – arquivogia@gmail.com “QG do GIA” e “Salão de Maio”: espaços de encontro, pensamento e ação Pensar as relações entre público, arte e cidade é um dos desafios propostos não apenas pelo GIA1, como também por outros coletivos. Nos caminhos sugeridos pela arte contemporânea, o GIA executa suas ações pelas ruas das cidades e busca ampliar aseus questionamentos a outros cenários, como instituições culturais “oficiais”, sem, no entanto, ficar limitado a tais espaços. Isso porque, diante de um circuito artístico elitista, atitudes de resistência e crítica fazem-se necessárias. Este texto traz algumas considerações sobre tentativas do GIA de gerir espaços/ eventos independentes na cidade de Salvador: o Salão de Maio e o QG do GIA. O Salão de Maio, encontro organizado pelo GIA em 2004 e 2005, contou com a participação de artistas e coletivos do Brasil e outros países. Foram dias de experimentação: um salão sem curadoria, sem aval institucional, sem uma sede fixa, em que todas as propostas seriam aceitas, desde que fossem de fácil montagem, dialogassem com o meio urbano – interferindo nele sem poluí-lo – e que o artista/coletivo custeasse sua realização. Grande parte dos artistas veio para Salvador realizar seus trabalhos, acompanhar a movimentação do Salão, trocar experiências, entrar em contato com outras pessoas, ter novas ideias ou simplesmente comer um acarajé e tomar um banho de mar, embora inicialmente a proposta do Salão de Maio era a de que o GIA executasse os projetos enviados e, posteriormente, disponibilizasse os registros2. Vale ressaltar que os momentos de festa e confraternização foram muito frutíferos surgiram ideias de ações artísticas que vieram a se realizar oportunamente, como foi o caso do Flutuador3, cuja ideia surgiu em uma conversa despretensiosa. Não se tratou apenas de questionar ou contestar as instituições culturais “oficiais” que organizam a maioria dos salões e exposições de arte... A vontade do GIA era agir com liberdade, sem burocracias, prestação de contas ou pretensões legitimadoras; era aproximar a arte do meio urbano, fazer o cidadão refletir sobre a sua relação com a cidade, deparar-se com situações inusitadas que tirassem seu cotidiano da mesmice, sem precisar, necessariamente, entrar nos espaços restritos de museus e galerias para ter acesso à arte. Pensando a arte como um processo de relações humanas e sociais, o GIA, em 2009, manteve por alguns meses o QG do GIA, espaço de encontros, aglutinações, vivências, festas – uma proposta de imersão total. A vontade do grupo de manter um espaço onde as pessoas tivessem acesso ao seu acervo

O GIA (Grupo de Interferência Ambiental) é um coletivo de artistas visuais, designers e arteeducadores que vem atuando desde 2002, propondo intervenções artísticas, preferencialmente nas ruas das cidades. Seus integrantes moram e trabalham em Salvador-BA. São eles: Everton Marco, Cristiano Piton, Ludmila Britto, Luís Parras, Tiago Ribeiro e Mark Dayves.

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Por conta da quantidade de trabalhos e de registros em vídeo e fotografia, a sistematização e organização desse material demorou bastante para se concretizar. Em 2009, o GIA foi contemplado com um edital do Fundo de Cultura do Estado da Bahia, que possibilitou a edição de um DVD duplo com toda a documentação do Salão de Maio.

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3 O Flutuador é um deck flutuante, posicionado em pleno mar. É um espaço público de encontros, uma área de lazer e de liberdade, que foge do funcionamento habitual das grandes cidades, explorando este espaço democrático, que é a praia. Saiba mais sobre esse projeto em: www. qgdogia.blogspot.com


GIA - SALVADOR

O QG do GIA surgiu, inicialmente, em uma intervenção na cidade de Recife, em 2005, por ocasião do SPA das Artes. Em uma tenda amarela – o Caramujo –, montada no centro da cidade, o grupo se reunia diariamente e organizava suas ações, propondo, também, que os transeuntes utilizassem aquele espaço como quisessem, sem regras pré-estabelecidas. A proposta amadureceu e foi realizada também em espaços fechados. Em 2008, o GIA realizou o QG em Madri – Espanha, no espaço Intermediae – dentro de um projeto mais amplo, que propunha um encontro de diferentes coletivos, brasileiros e espanhóis (www.intermedialogia. blogspot.com ). No mesmo ano, o grupo ocupou a capela do Museu de Arte Moderna da Bahia com o QG, também dentro de uma programação mais abrangente (www.qgdogia. blogspot.com)

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Mais informações sobre o QG do GIA no Pelô: www. qgdopelo.blogspot.com

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MATOS, Lidice. Arte é este comunicado agora – Paulo Bruscky e a Crítica Institucional. Concinnitas – Revista do Instituto de Artes da UERJ, Ano 8, volume 10, julho de 2007.

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– atualmente bem amplo com vídeos, fotografias, registros e resquícios de ações do GIA e de outros tantos coletivos e artistas – é bem antiga. Já em 2004 a Fonte do GIA funcionou – também por alguns poucos meses – em uma pequena casa, na Ladeira da Fonte, centro de Salvador. Para custear suas despesas, o GIA promovia um samba quinzenal e, muitas vezes sem sentir, os visitantes entravam em contato com os trabalhos e integrantes do grupo. Esse espaço, que fugia do circuito artístico oficial de Salvador, inspirou o GIA a criar seu QG4, em 2009, no Pelourinho, em um casarão, na Rua das Laranjeiras, n° 46, que rapidamente utilizou a música – o samba – como um recurso de encontros fortuitos. Enquanto passeavam pela casa ou dançavam, os visitantes eram convidados a manusear, visualizar, interagir com as “obras” do acervo5. Apesar da proposta de um espaço “alternativo” ao circuito artístico oficial de Salvador, o QG só aconteceu devido a um edital do Fundo de Cultura. Assim, o GIA estava submetido às burocracias necessárias e lidando com dinheiro público, o que impunha um impasse à natureza independente do grupo. O GIA não é anti-institucional, pelo contrário, sua formação e atuação autônomas não anulam sua participação em exposições em galerias e museus, simpósios, salões de arte, ou o que for. A rua foi eleita território propício para suas ações, mas o diálogo proposto pelo grupo pode muito bem ser ampliado para públicos mais específicos. Não se pode negar, também, a importância dos editais de fomento à cultura, que se apresentam como ferramentas eficazes no apoio à consolidação/circulação dos trabalhos de inúmeros coletivos pelo Brasil. O problema só se apresenta se houver um condicionamento a esse tipo de iniciativa. Para o GIA, é fundamental agir de forma autônoma, expandindo seu discurso e suas propostas de forma livre, propondo espaços de encontro, pensamento e ação. Para finalizar, as palavras de Lídice Matos são bastante oportunas: Arte e instituição: como perceber entre intrincadas e mútuas implicações as forças instauradoras e de resistência de cada uma? Com propósitos e sentidos diversos, essas forças estão enredadas no sistema social (...) A consciência das condições institucionais de formulação e recepção da arte é fundamental na produção da Arte Contemporânea em geral.6


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Rés-do-Chão (2002 - 2006) Rua do Lavradio, nº106, ap 302, Rio de Janeiro – RJ -edson_barrus@ig.com.br http://web.mac.com/edsonbarros/Rés_do_Chão/Rés_do_Chão/Rés_do_Chão.html O Rés-do-Chão, uma experiência de quatro anos, realizou-se na rua do Lavradio, nº106, apartamento 302. O endereço é importante porque foi a partir de um condomínio residencial que a gente conseguiu desequilibrar o circuito de arte com a nossa proposição crítica. Nesse momento, a gente se nomeava “Espaço Experimental”, e funcionava de diversas formas. No início, nos inteiramos de muitas coisas que aconteceram no Rio de Janeiro e pelo Brasil afora nesse começo de milênio. A gente está no início de ideias que vingaram e que hoje circulam nas poéticas de muitos artistas que estavam ‘por ali’, experimentando. A gente trabalhava como grupo de estudos, fazia exposições, hospedava... Ou seja: atuávamos na emergência do artista, nos disponibilizando para o público/ator que aparecia. Era algo que saía totalmente da esfera de um apartamento privado, para receber às vezes oitenta, cem pessoas, para produzir um festival de uma frequência muito alta. Às vezes, tinham coisas totalmente mínimas… Não estávamos preocupados com o enquadramento do “artista” e sim em deixar passar a arte. Então se misturavam cientista nuclear, psicólogo, historiador, estudante, criança, dona de casa, puta, artista também – e era bacana essa confluência de pessoas. No Rés-do-Chão, estávamos sempre atentos ao espaço, a quem chegava, ao que se fazia. Rés, um espaço de constante troca e atenção, mesmo que você esteja relaxado. Um outro tempo de atenção, que fala de uma expectativa, que é uma espera viva e ativa-mente para ver em que hora entra, para ver se e o que você vai fazer. Então, dentro desse clima, o outro é percebido e a figura egocêntrica do artista se dilui um pouco. Não existe um centro. A qualquer instante você pode passar de ajudante a centro, pode ser o centro e, de repente, estar na câmera filmando, ou servindo bebida. A gente sempre se esforçou para trabalhar com essa bagunça, com a mistura de acontecimentos, eventos, pessoas, investindo nessa desordem do cotidiano e mostrando que isso pode produzir um saber, uma inteligência, como a gente produziu. Nós conseguimos, através do Rés do Chão, produzir a Quarentena Açúcar Invertido, na Funarte, estava começando tudo meio junto. Depois produzimos outros eventos de convivência/vivência poética em Nova York, na Amazônia e na França, sempre transitando esses artistas pra lá e pra cá, criando zonas de produtividade e experimentação bem interessantes. Esses programas do Rés, durante 4 anos, eram, sobretudo, um contraponto à programação globalizada. Destoavam da estética do MAM e do CCBB ao mostrar os artistas criando, bebendo. Era uma coisa sem acabamento, era processual, tinha clima de laboratório. Era uma bagunça. Era muita loucura: o Rés cheio de gente, latas de cerveja pelo chão – uma festa. Diferente de quando você entra num Museu e é aquela coisa ascética. Parece um hospital. Não se come,


RÉS-DO-CHÃO - RIO DE JANEIRO

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não se bebe, não se fuma, não se faz nada ali dentro… Havia um certo valor nessa transgressão, nesse desregramento. Não deixava de ser também uma maneira de enfrentar e suportar a plastificação do circuito. Estávamos interessados no conceito de sintoma, e não na produção da obra. Investindo no processo, ocupávamos um lugar que o Estado deixava vazio. A gente fez uma zona de confluência, de afeto, de carinho, o cuidado da pessoa com a pessoa, do artista que estava interessado no artista, e não interessado no produto para vender. Ao mesmo tempo, a gente uniu diversos mecanismos. Utilizávamos a internet, a mídia impressa, produzimos a revista para circular nossas atividades. Fotografias, transcrições de conversas, trocas de correspondências eletrônicas (realizada no yahoogrupos e que permanece) e documentos audiovisuais. Tais registros recuperam o início dos anos 2000 e chamam a atenção pelo despojamento, pelo ambiente caseiro, pelos ensaios descontraídos. Esses documentos registram a experiência e o que isso possibilitou. “Não se trata mais de integrar a arte na vida, e sim de dissolver o artista na sociedade”. Esta frase define o espaço, de cuja constituição participaram muitos, em geral, sem ostentação. A esfera da intimidade como suporte da invenção era por nós valorizada e exercitada conjuntamente. O trabalho construído, criando, assim, uma situação, um “lugar” onde éramos conduzidos a habitar o espaço da criação, tratando-o “como obra de arte”. Uma arte da conjuntura (a atualidade, o público) e das ocasiões (epistemológicas, políticas). É uma coisa que ainda está muito viva, mas mudando de configuração, porque as pessoas que passaram pelo Rés continuam carregando algo daquela passagem, no sentido de conduzir para outro tipo de formato, que não se sabe bem qual é, mas que se mostra em outras cristalizações. O Rés permitia essa variedade de papéis para diversos personagens, buscando outras configurações.


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ATELIÊ ABERTO (1997) Rua Major Sólon, 911, Cambuí, Campinas – SP www.atelieaberto.art.br – contato@atelieaberto.art.br Como organismo independente, voltado para a criação e a cultura contemporânea, o Ateliê Aberto entende que cuidar de sua relação com o entorno é parte de uma estratégia: a maneira de ver uma organização e entender sua função dentro desse corpo maior em que ela está inserida. Esse entorno extrapola os limites da cidade, sendo composto por todas as partes interessadas, das quais dependemos para existir: o público ou os espectadores; os fornecedores e prestadores de serviço; os clientes; os artistas; as empresas parceiras; as instituições parceiras; o Estado; os apoiadores em geral. Chamamos de partes interessadas todos os atores com quem o Ateliê Aberto estabelece mecanismos ou acordos de troca e com os quais compõe uma rede. O Ateliê Aberto, que neste ano completou 12 anos, é um espaço de referência na cidade de Campinas (São Paulo), reconhecido pela consistência de sua programação, por seu compromisso com processos experimentais, pela idealização de projetos inovadores e pelo trabalho de cooperação que estabelece com diversos atores, movimentando a cena cultural na cidade, envolvendo os artistas locais e trazendo artistas de outras cidades e estados do Brasil. Desde 2000, foram realizadas 44 exposições no espaço do Ateliê. Participamos de cerca de 33 projetos externos, ora como idealizadores e produtores, ora como coletivo de artistas. Envolvemos, nos projetos internos e externos, mais de 330 artistas. Hoje, buscamos nos estabelecer como organismo cultural independente e também como idealizador e produtor de projetos culturais externos, viabilizados, inclusive, através das Leis de Incentivo Fiscal. Em 2010, demos um passo importante ao abrir as portas de nossa sede própria, ampliando o espaço expositivo e a biblioteca, criando uma nova área de convívio, um “espaço-garagem-multiuso” (pensado para conversas abertas, exposições e residências artísticas), o cine-caverninha (sala de projeções), um agradável jardim e a fachada do espaço, que hospeda o projeto RUA [Ruídos Urbanos Amplificados].


ATELIÊ ABERTO - CAMPINAS

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Dentro dessa busca, um dos principais objetivos é intensificar o uso do espaço e ampliar a circulação do público: incluir na programação projetos educativos, acolhendo artistas e outros profissionais que desenvolvem cursos e/ou workshops; promover nossa biblioteca e seus títulos através de nosso site; desenvolver um programa de estágio, trazendo para nosso espaço alunos da graduação do curso de Artes Visuais da PUC-Campinas (através de convênio já estabelecido entre as duas instituições), colocando-os em contato com o meio profissional e contribuindo para sua formação; viabilizar um programa de residências artísticas; viabilizar processos sustentáveis em suas realizações.


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CASA CONTEMPORÂNEA (2009) Rua Capitão Macedo, 370, Vila Mariana, São Paulo – SP http://www.casacontemporanea.com.br – casacontemporanea370@gmail.com A Casa Contemporânea começa a surgir em março de 2009, quando tivemos a oportunidade de adquirir um sobrado da década de 1940 na Vila Mariana (São Paulo). A ideia inicial era a de ter um ateliê onde pudéssemos trabalhar, comercializar e exibir nossa produção individual e, eventualmente, a de algum outro artista. Porém, não só o tamanho, mas a disposição dos ambientes e o espírito do lugar tornaram a ideia maior. Resolvemos transformar uma deficiência – nossa pouca experiência com a arte e seu mercado – em vantagem: definimos uma proposta de inserção nesse circuito que aproveita o momento de consolidação pelo qual ele passa. Ainda que incipiente, o circuito em São Paulo comporta a proposta de um espaço gerido por artistas, onde a relação profissional se faça de forma mais transparente e onde o mercado caminhe juntamente com um debate aprofundado sobre a arte que se produz hoje e sobre como ela se infiltra nas várias camadas de conhecimento e ações como a psicanálise, a arquitetura, o urbanismo, moda, música e teatro. Essa inserção se dá, portanto, em alguns pontos chaves: a criação de um público mais amplo para a arte contemporânea, através de algo que chamamos proximidade com as obras e os artistas, pois percebemos que o discurso arte-vida não se efetivava realmente; dentro dessa ideia da proximidade o espaço onde ocorre essa aproximação passa a ter um papel preponderante, devendo se afastar do que se identificou como galeria de arte e possuir um projeto em que as condições técnicas necessárias não sejam mais importantes que a criação de um ambiente mais amigável e assemelhado a uma casa; além da já citada transparência na relação com os artistas, a otimização dos custos da operação desses espaços deve ser feita através de parcerias com fornecedores e de uma divisão de custos que envolva as atividades e oficinas, workshops e cursos; exposições que procurem traduzir a diversidade da arte contemporânea e possibilitem oportunidades para novos artistas (e não só artistas novos); estratégias de divulgação constantes nas mais variadas e possíveis mídias;


CASA CONTEMPORÂNEA - SÃO PAULO

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contatos com outros espaços que tenham similaridades de pensamento, em São Paulo ou em outras cidades, com troca de experiências e atividades; uma postura crítica em relação à produção desses artistas, criando uma identidade para o espaço e facilitando a comercialização. Em julho deste ano (2010) a Casa Contemporânea completou um ano de atividade, dentro desta ideia de inserção/atuação. O trabalho é grande e necessita sempre de ajustes ou adaptações. Sabemos também que é longo o caminho. Estamos satisfeitos, mas não acomodados com os resultados. Afinal, foi por isso que fomos levados a fazer arte: a busca de uma satisfação inquieta. por Márcia Gadioli, artista visual, e Marcelo Salles, arquiteto e artista visual


Realização Ateliê 397 Coordenação editorial Thais Rivitti, Carolina Soares, Mariana Trevas e Marcelo Amorim Design gráfico Marcelo Amorim Revisão Carlos Eduardo Riccioppo Produção editorial Cesar Rivitti e Isabella Rjeille Colaboração capítulo 6 Jaime Lauriano Agradecimentos A Casa. Como Convém, A Coisa, Alpendre, Amilton Santos, Ana Luisa Lima, André Sztutman, Arquipélago, Ateliê Aberto, Ateliê Oço, Atelier Subterrânea, Barracão Maravilha, B.A.S.E., beco da arte, Branco do Olho, Capacete Entretenimentos, Carollina Lauriano, Casa Contemporênea, Casa da Xiclet, Casa Tomada, Centro de Contracultura de São Paulo – Casa da Grazi, Contemporão Espaço para Performance, Coro Coletivo, Estúdio Dezenove, Flávia Vivacqua, Jaílton Moreira, Jambrohouse, Kamilla Nunes, Kaza Vazia, Léia Carmen Cassoni, Leonardo Araújo, Letícia Baldan, Livia Benedetti, Matilha Cultura, N.A.V.E., Paula Borghi. projeto FIGURA , QG do GIA, Regina Sousa, Rés-do-Chão , Revista Número, Ricardo Basbaum, Sala Dobradiça, Sala Recife, Tatuí Crítica de Arte, Tiago Santinho

Conexão Artes Visuais MinC Funarte Petrobras 2010


AteliĂŞ397 Coordenadores Carolina Soares Marcelo Amorim Mariana Trevas Thais Rivitti Assistentes Cesar Rivitti Isabella Rjeille


Título Formato Tipografia

Espaços Independentes 15 x 21 cm Museo, Museo Slab e Museo sans

Miolo

Couchet 150 g/m2

Capa

Cartão supremo 350 g/m2

Número de páginas Tiragem

160 1.000

Este livro foi produzido em outubro de 2010.

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA, PROIBIDA A VENDA


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