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GOVERNANÇA JURÍDICA
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A NOVA GUERRA FISCAL:
SUA EMPRESA ESTÁ
PREPARADA? Especialistas revelam o que fazer para se manter competitivo em meio a uma legislação complexa como a brasileira
Em todo território nacional, é comum constatar a presença de incentivos fiscais, que têm por objetivo atrair investimentos estrangeiros, seja para os estados com a economia mais delicada, seja para os grandes polos industriais do Brasil. O maior problema nesse processo é que muitos estados acabam concedendo incentivos ilegais às empresas que podem sofrer grandes penalidades se autuadas nesse sentido.
Para, então, tentar controlar essa guerra fiscal, o Senado Federal aprovou a Resolução 13/2012, que unifica em 4% a alíquota do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), de competência dos estados, incidente nas operações interestaduais com mercadorias que contenham conteúdo de importação superior a 40%. Essa mudança também implicou todo um novo planejamento organizacional, levando muitas empresas a correrem contra o tempo na tentativa de se reorganizarem, reduzirem custos e otimizarem resultados para se manterem competitivas. CASE 01 Que o diga a Empalux, uma das maiores empresas de iluminação do País, com 20 anos de mercado, cerca de 800 itens no portfólio e clientes no Brasil e América Latina. A empresa paranaense trabalha para se recompor do abalo produzido pela resolução que repercutiu no preço final de sua extensa lista de produtos comercializados para uma clientela variada, que vai de órgãos públicos a consumidores residenciais.
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Cenário instável Há não muito tempo, a Empalux enquadrou-se em incentivos previstos na legislação tributária paranaense, que reduziram em 75% o ICMS devido em suas operações de importação. Na prática, é como se, para cada R$100 mil em mercadorias importadas, a empresa tivesse um recolhimento do imposto de R$3 mil, sendo que sem o incentivo teria de pagar um montante de aproximadamente R$12 mil. Pouco depois, a legislação foi alterada, reduzindo o benefício para 25% ao invés de 75%. E, ainda, com a entrada em vigor da Resolução 13, foram necessários diversos ajustes em seus sistemas de gestão e em seus procedimentos de cumprimento de obrigações acessórias. Impactos esses que refletiram diretamente em seu orçamento financeiro. “Estamos muito focados nos controles internos para garantirmos uma gestão forte”, resume o controller da Empalux, Renato Adriano Paiva. Na prática, isso significa zelar pelo seu já consolidado sistema informatizado (do qual depende a realização de seus negócios), redimensionar a equipe e, acima de tudo, observar rigorosamente a legislação vigente. “É necessário um controle equilibrado das finanças”, resume Paiva, que tem no horizonte comercial perto de 15 outras empresas competindo pelos mesmos mercados. CASE 2 Guardadas as diferenças de segmento, são basicamente os mesmos os cuidados observados no grupo empresarial Autoglass. Com unidades espalhadas por quase todos os estados brasileiros, a Autoglass atua no mercado de reposição de peças automotivas e na prestação de serviços de gerenciamento de carteiras de seguros para cobertura de vidros, faróis e lanternas. Conhecer muito bem o mercado, gerir estoques com rigor e investir na capacitação de pessoal estão entre as providências que a controller capixaba Ângela Takla de Biasi Nogueira acrescenta à receita do colega paranaense. ESTRATÉGIAS Todos esses fatores, explica Ângela, têm por fim reduzir o impacto da comercialização sobre a carga tributária e o custo final dos produtos e serviços, uma vez que entrou em jogo uma variável que coloca o setor produtivo em desvantagem: a substituição tributária. “Como esse instituto nada mais é que a antecipação do recolhimento de ICMS, ou seja, um crédito antecipado para o governo que deixa de ser movimentado pela empresa a título de capital de giro, é necessário saber com a máxima exatidão do que precisa e quando precisa o nosso público consumidor. Assim, é possível manter o mercado regularmente abastecido com um mix de produtos com
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a nossa marca e sem a necessidade de operações que resultem em mais tributação desnecessária”, resume. Retaguarda Para atingir esses resultados, completa a controller, não há como sobreviver sem sistemas de TI modernos e ágeis que mantenham as áreas fiscal e contábil da organização alinhadas às necessidades das novas regras tributárias que, a todo momento, precisam ser absorvidas.
SPED
Essa vigilância, contudo, não elimina totalmente os riscos de perdas alheias à gestão da empresa. Foi o caso das novas exigências trazidas pela Resolução 13 para cálculo do ICMS a recolher, o que demandou perda de tempo e de dinheiro na adequação dos softwares para cálculo do tributo. Isso porque, além de informações sobre estados remetente e destinatário, alíquota e Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), passou a ser exigida também a especificação da origem do produto. “De uma hora para outra, a empresa teve de se adaptar simplesmente a uma regra anteriormente não prevista no ordenamento jurídico”, relembra a controller. A NOVA GUERRA FISCAL
SPED O SPED é um instrumento que unifica as atividades de recepção, validação, armazenamento e autenticação de livros e documentos que integram a escrituração comercial e fiscal dos empresários e das sociedades empresariais. Visa a integração e o compartilhamento de informações com o objetivo de racionalizar e modernizar a administração tributária brasileira, reduzindo custos e entraves burocráticos. As obrigações tributárias acessórias do SPED são a emissão de NF-e, de CT-e, o envio mensal da EFD e o envio anual da ECD.
NF-e e CT-e
são os documentos que acobertam as operações de circulação de mercadorias e prestação de serviço de transporte, respectivamente.
EFD
é uma declaração que contém, dentre outras informações, a memória de cálculo do valor do ICMS e do IPI recolhidos mensalmente.
ECD
é uma declaração que contém todos os livros contábeis, além de outras informações exigidas pelas normas contábeis. (Fonte: Sefaz Bahia)
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Hoje Guerra Fiscal significa muito mais do que a guerra entre estados para ver quem dá mais incentivos de ICMS às empresas. A chamada Nova Guerra Fiscal pode ser definida pela busca incessante das empresas por pacotes de incentivos e vantagens fiscais junto aos diversos fiscos — Federal, Estaduais e Municipais — que justifiquem a instalação de empreendimentos em áreas geográficas distantes das que lhes seriam mais vantajosas do ponto de vista econômico e logístico. Além disso, o novo cenário mostra uma verdadeira guerra entre Fisco e contribuinte com relação aos meios de fiscalização — que partem para ser 100% eletrônicos — e às dificuldades geradas para adaptação a tantas novas regras e obrigações que surgem quase que diariamente. “De um lado, o Fisco se prepara com a criação de sistemas eletrônicos que permitem o cruzamento de informações fiscais e impedem, cada vez mais, a sonegação de tributos. De outro lado, o contribuinte tem que adaptar seus próprios sistemas para que se integrem aos sistemas do fisco”, afirma a advogada Letícia Mary Fernandes do Amaral, sócia da Amaral, Yazbek Advogados. Como se preparar De acordo com os especialistas consultados, a única forma de se preparar para a Nova Guerra Fiscal é por meio da adoção de boas práticas de governança jurídico-tributária. “A governança, atualmente, é indispensável para que o contribuinte tenha segurança
“De um lado, o Fisco se prepara com a criação de sistemas eletrônicos que permitem o cruzamento de informações fiscais...
...e impedem, cada vez mais, a sonegação de tributos. De outro lado, o
contribuinte tem que adaptar seus próprios sistemas para que se integrem aos sistemas do fisco.” Letícia Mary Fernandes do Amaral
em relação aos dados que se está transmitindo ao fisco. Se houver falhas na transmissão desses dados, o contribuinte será quase que automaticamente autuado”, explica Letícia. Recentemente, durante o III Congresso Brasileiro de Governança Tributária, promovido pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), o atual Coordenador-Geral de Fiscalização da Receita Federal do Brasil, Iágaro Jung Martins, em palestra sobre Oportunidades e Dificuldades da Fiscalização Digital, explicou que a Receita Federal vem trabalhando para que o Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) passe a ser a única porta da comunicação entre a Receita e a Pessoa Jurídica. “A Receita tem trabalhado com o objetivo de eliminar as obrigações desnecessárias e trabalhosas às empresas, promovendo simplificação ao coordenar
as informações de interesse de diversos órgãos”, disse. Além disso, sinalizou que as informações digitais hoje existentes permitem o aprimoramento da fiscalização, sendo já suficientes para a lavratura de autos de infração em caso de detecção de irregularidades. Nessa linha, o advogado e consultor José Julberto Meira Junior, durante o mesmo evento, ao palestrar sobre Fiscalização Digital e Transparência, afirmou que atualmente a governança tributária é questão de sobrevivência. “Cada movimento pode causar autuações, em função do imediatismo da transferência dos dados à fiscalização. Há uma necessidade imediata de estruturação da governança. Transparência fiscal existe, o contribuinte está nu; só não vê quem não quer”, alertou. ■
Conclusões De acordo com Julberto, o SPED é um dos maiores projetos de desmaterialização do mundo, já estando em seu nono ano de funcionamento e aperfeiçoamento. Para o advogado, algumas considerações podem ser feitas a cerca desse processo de fiscalização digital: • é uma exposição sem precedentes na história da fiscalização brasileira; • exige capacitação tecnológica e de pessoas; • não deve ser tratado como uma mera substituição de software, exigindo que se revejam processos e sistemas internos; • é trabalho de equipe e exige integração das áreas, não só no processo de implantação (que, na maioria das vezes, é traumático); • requer trabalho preventivo constante dos contribuintes, principalmente das pontas no momento da venda. Por regra, um compartilhamento de informações nas três esferas de poder acrescenta uma base de dados gigantesca a ser usada pelos entres tributantes. Fonte: III Congresso brasileiro de Governança Tributária, Palestra Fiscalização e Transparência
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