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Naiana Paula Lucas dos Santos
Naiana Paula Lucas dos Santos
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A Geografa Cultural e o Conceito de Paisagem
Os seres humanos com suas capacidades cognitivas diferenciadas também possuem compreensões de mundo diversas e consequentemente apreensões heterogêneas da paisagem que o cerca. Um exercício interessante é tentar perceber como a geografa pode saltar aos nossos olhos mesmo nos exemplos mais simples ou interessantes do cotidiano, através das percepções ligadas a visão, a audição, olfato, tato e paladar. Todavia, nunca possuiremos a mesma impressão da paisagem, pois pensamos e interpretamos de maneiras de paisagem.
Na geografa cultural renovada a paisagem é carregada de signifcados e percebida como um campo repleto de interpretações. Surge um conceito que envolve a cultura, o signifcado e as práticas simbólicas engendrando novas formas de compreensão da paisagem. Nesse contexto, Silva (2001) afrma que a geografa cultural renovada possibilitou caminhos para os estudos de uma paisagem cultural que não é unilinear e uniforme, mas sim múltipla e repleta de variações com fragmentos temporais das sociedades.
A geografa como ciência não pretende compreender todas as características internas de determinada cultura por si só, mas sim busca compreender as modifcações no (do) espaço por meio da cultura, pois se o homem age interferindo em seu habitat ele produz e reproduz cultura. Assim, o sujeito é quem produz as manifestações culturais e o mesmo age
modifcando o espaço. Quando um grupo ou sujeito consegue perpassar e difundir cultura em outro território que não seja o seu de origem, isto possibilita o processo de ampliação cultural, ou seja, o processo de difusão cultural.
Com a introdução da geografa cultural no Brasil durante a década de 1990 o conceito de paisagem passou a ser analisado de uma maneira mais aprofundada, inserido na geografa também com o viés cultural. Só para constatar que na geografa tradicional a paisagem era pautada na objetividade do meio físico, no caráter empiricista e na racionalidade da interpretação do objeto de estudo.
A cultura popular, negligenciada pela geografa brasileira, constitui-se em importante temática para a inteligibilidade do país. [...] Os signifcados das diversas práticas espaciais associadas ao cotidiano, envolvendo as coisas correntes, e as manifestações menos frequentes ou periódicas estão, com raras exceções, a serem evidenciados pelos geógrafos brasileiros. As festas e a música popular estão, entre outras manifestações, entre aquelas práticas merecedoras de atenção (CORRÊA; ROSENDAHL, 2007 p.17).
O Brasil é um país culturalmente heterogêneo, indicam-se alguns temas interessantes para pesquisas e estudos sob a óptica investigativa geográfca através de assuntos como:
[...] O caráter simbólico dos prédios, monumentos, praças, ruas, bairros, cidades e regiões; As trocas comerciais através dos mercados periódicos (feiras) e do comércio itinerante um estudo compreendendo a prática cultural no espaço e seus signifcados; A cultura popular em suas múltiplas manifestações e variação espacial; Os contatos e confitos culturais resultantes do processo migratório interregional; A caracterização e delimitação de áreas culturais, inclusive áreas residuais e enclaves, num contexto de difusão de uma cultura com características globais (CORRÊA, 1995, p.16).
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Dessa forma, as manifestações populares, as religiões e os hábitos são exemplos de manifestações culturais. É importante também ressaltar a linguagem e a arte como símbolos culturais manifestados através das falas, dialetos, escritas, desenhos e sinais corporais. Assim, pode-se entender que a paisagem cultural é transformada e modelada a todo instante. O resultado dessa modifcação é fruto da ação humana nos lugares formando novas composições espaciais.
Nesse contexto, muitas perspectivas de análise têm sido propostas para compreender as muitas transformações existentes no espaço geográfco. Assim a geografa cultural atual torna-se cada vez mais em destaque a partir de estudos antes invisíveis pela seara geográfca:
A geografa cultural é atualmente uma das mais excitantes áreas de trabalho geográfco. Abrangendo desde as análises de objetos do cotidiano, representação da natureza na arte e em flmes até estudos do signifcado das paisagens e a construção social de identidades baseadas em lugares, ela cobre numerosas questões. Seu foco inclui a investigação da cultura material, costumes sociais e signifcados simbólicos, abordados a partir de uma série de perspectivas teóricas (MCDOWELL, 1996, p.159).
Além disso, é necessário enfatizar a inserção na geografa cultural de temáticas como a literatura, a música, a pintura, a fotografa e o cinema que se destacam entre outras temáticas que foram retomadas ou surgiram diante das transformações da geografa.
No intuito de construir uma teoria para a leitura da paisagem, Cosgrove (1998) busca compreensões que conduzam os geógrafos a metodologias mais interpretativas do que morfológicas, fazendo emergir, a partir da confguração de símbolos e signos, o verdadeiro signifcado da paisagem. O autor explica que o conceito de paisagem não é apenas uma maneira
de visualizar algo existente sobre a superfície terrestre, mas sim uma composição do mundo em um momento que por si só não é estático, mas carregado de movimentações e interpretações, conforme a afrmação abaixo:
A paisagem sempre esteve intimamente ligada, na geografa humana, com a cultura, com a ideia de formas visíveis sobre a superfície da terra e com a composição. A paisagem, de fato, é uma maneira de compor e harmonizar o mundo externo em uma “cena”, em uma unidade visual (COSGROVE,1998, p.98).
Cosgrove (1998) nos remete a um pensamento interessante ao explicar que a geografa deixou escapar muito do signifcado existente na paisagem humana, tendendo a reduzi-la a uma impressão impessoal de forças econômicas. É nessa perspectiva que devemos pensar sobre a ideia de aplicar aos estudos da paisagem humana algumas das habilidades interpretativas que possuímos ao estudar um livro, um poema, um flme ou um quadro, e a partir daí trata-la como uma expressão humana intencional com muitas camadas de signifcados. Nesse sentido, é necessário deixar essa estranheza de lado e partir para novos campos de estudos é o que propõe o autor ao difundir suas pesquisas geográfcas.
Perpassar o campo do visível, ou seja, algo que está a frente dos nossos olhos e a partir daí compreender a gama de interpretações é o que propõe Meining (1976), ao abordar várias interpretações diferentes de perceber a paisagem como: natureza, habitat, artefato, sistema, problema, riqueza, ideologia, história, lugar e estética.
Para o entendimento dos sentidos de apropriação da paisagem Rieper (2007) explica que as características perceptivas são diferenciadas de um sujeito para outro, através de alguns fatores, como os valores culturais e as experiências vi-
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venciadas pelos sujeitos. De acordo com o pensamento da autora, sensação e sentimento são eventos relevantes no estudo da percepção, pois são estes que individualizam, humanizam, dão cheiro, história pessoal, vida, à construção de um espaço. Pode-se até falar em um mundo interior subjetivo e um mundo exterior carregado de racionalização e objetividade. Dessa maneira, relacionar ambos os lados faz parte do processo de formação e construção de imagens e paisagens.
Desse modo, como propõe a nova Geografa Cultural o conceito de paisagem permeia a transposição do campo de visibilidade para o campo dos signifcados, através de interpretações nas quais o caráter subjetivo está entrelaçado ao poder de compreensão de determinada paisagem.
Assim, entende-se que a paisagem existe para além do próprio sentido visual, sendo construída pelo observar diário repleto de surpresas conforme afrma Ferrara:
Além do ver físico, simples sensação, há um ver inteligente a que se opõe ao cotidiano como continuidade perceptiva. Observar é produzir descontinuidade que desfaz o anonimato da vida diária (FERRARA, 2000 p.125).
Estudos que vinculam a paisagem e as fotografas estão sendo concebidos de maneira mais difundida, devido a proliferação de temas na geografa cultural que possibilitam o caminhar da geografa em meio as artes.
O Estudo Fotográfco
Todavia, a arte contemporânea tem promovido uma ampliação e expansão de várias possibilidades criativas. Hoje a arte não é percebida somente por uma linguagem como pintura, escultura, desenhos, mas sim existem várias formas e diversas aplicações artísticas.
Busca-se assimilar a fotografa enquanto manifestação artística e forma de intervenção social que proporciona uma memória e análise de momentos históricos dos sujeitos com seu entorno.
Nesse sentido, refetindo sobre esse tema, nos deparamos com ações como a conservação e manutenção de imagens que nos remetem a histórias e momentos do passado. Quando visitamos amigos e familiares muito íntimos em alguns momentos nos deparamos com a visualização de fotos estampadas na sala em porta-retratos ou até mesmo álbuns de famílias, que nos são mostrados como uma forma de contar a história de vidas através das fotografas. Fotos de quando éramos crianças, de viagens, de aniversários em família são exemplos de momentos que fcam registrados. As fotografas são guardadas para relembrar os momentos que foram vividos, mas também em outros momentos essas fotografas podem remeter a sentimentos que não nos fazem bem e somos instigados a destruir imagens que não mais nos agradam que relembram momentos de tristeza ou raiva como uma tentativa de apagar o passado e na certeza de que essas fotografas não irão mais ressurgir diante do sujeito que a observa e não gosta mais do que vê diante de si.
Assim a fotografa tem a capacidade de marcar um tempo e um espaço em um instante e ainda consegue ultrapassar esse espaço-temporal, através de sentimentos íntimos e profundos como chorar, sorrir e relembrar histórias.
A imagem fotográfca seria um produto técnico e cultural no qual a obtenção do registro fotográfco se encontra relacionada diretamente ao processo de criação que dá origem à fotografa é o que pensa Boris Kossoy (2012), dessa maneira esse processo possibilita refetir sobre a imagem fotográfca enquanto meio de conhecimento através de suas utilizações e aplicações.
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A fotografa que gera a imagem é resultado de um processo criativo inserido na elaboração fotográfca. A construção da imagem fotográfca se dá pela conjuntura existente do mundo real que se materializa na imagem através de seus muitos códigos culturais e ideológicos. Dessa maneira, para entender as fotografas é necessário buscar o contexto no qual elas estão inseridas.
Assim, Kossoy (2012) informa que a história da fotografa relaciona-se com o passado histórico e o avanço das técnicas, possibilitando a concretização desta enquanto veículo de comunicação até mesmo junto a expansão comercial através das indústrias voltadas para a área fotográfca.
As apreensões e transformações no uso da fotografa foram acontecendo no decorrer do tempo, a sensação que se transmitia era que as pessoas no mundo pareciam mais familiares e próximas após a disseminação do conhecimento fotográfco. Essa proximidade era acarretada devido a proliferação de conhecimento de realidades existentes em outros lugares, estas realidades agora visualizadas através das fotos, antes eram transmitidas apenas através da escrita ou via oral por meio do repasse das histórias de fatos e momentos que aconteceram, assim como o registro das imagens era feito apenas através de desenhos e pinturas. Kossoy (2012) afrma que, por meio da reprodução das técnicas fotográfcas em grande escala e das revelações das fotos feitas em papel, proliferou-se outro tipo de conhecimento e aprendizagem do real.
Desse modo, Kossoy (2012) questiona o que seria a imagem fotográfca?
A imagem fotográfca é o que resta do acontecido, fragmento congelado de uma realidade passada, informação maior de vida e morte, além de ser o produto fnal que caracteriza a intromissão de um ser fotográfco num instante dos tempos (2012 p.39).
A fotografa seria resultado da ação do fotógrafo que em um determinado espaço-tempo preciso defniu um assunto específco e utilizou uma máquina fotográfca sufcientemente capaz de captar a imagem fotográfca. Kossoy (2012) informa que três elementos são relevantes para a efetivação fotográfca. Os elementos seriam estes: o assunto, o fotógrafo e a tecnologia.
É necessário inserir a fotografa em um contexto junto a outras fontes bibliográfcas para entender e interpretar o que está para além da imagem e assim tentar chegar ao entendimento do acontecido que se propaga na aparente fotografa. Kossoy (2012) comenta um estudo pautado na interdisciplinaridade para compreender as imagens. [...] a proposição de um modelo metodológico de análise e interpretação das imagens fotográfcas, entendidas como fontes históricas, modelo que tem sido adotado pelos pesquisadores e estudiosos, o que se confrma pela sua aplicabilidade em diferentes áreas das ciências humanas (2012, p.17).
A imagem é antes de tudo uma representação elaborada a partir do real que parte a priori do olhar do fotógrafo para uma posterior análise subjetiva do sujeito que a visualiza.
As fotografas possibilitam refetir sobre os lugares e sujeitos que caracterizam e formam a paisagem. Dessa maneira, participam da composição da paisagem as ações do tempo, o acúmulo histórico, a arquitetura e as manifestações culturais. É necessário informar também que a paisagem não está pautada apenas na visualização de um lugar, mas sim em uma gama de apreensões existentes através de outros sentidos perceptivos e principalmente na interpretação subjetiva do sujeito diante da paisagem.
A paisagem que nos cerca como os monumentos arquitetônicos existentes e os objetos históricos podem ser com-
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preendidos como fatia ou parte de uma realidade do presente ou do passado. Os indícios existentes na imagem fotográfca são as pistas inerentes ao próprio documento. Kossoy (2004) informa que as representações fotográfcas possuem em si mesmos conhecimentos e dados do real, desse modo, são instrumentos de grande valor em uma pesquisa pautada na interpretação e entendimento fotográfco.
Os indícios são as pistas, os vestígios existentes nas imagens fotográfcas que se tornam importantes junto a referências bibliográfcas que permeiam o campo de estudos em diversas áreas, possibilitando a ampliação dos estudos do sentido na imagem fotográfca. São informações que são repassadas através da forma escrita e visual que tornam possíveis entender as paisagens geográfcas e a história por trás do registro fotográfco.
Desse modo, entende-se que a fotografa vai além do que se mostra realmente. O assunto fxado na imagem tem sua própria explicação, uma história existente não necessariamente e nem sempre explícita na imagem fotográfca. Como um mistério determinado no espaço e no tempo que corresponde a própria imagem. Kossoy (2004) nos alerta que isso é característico da fotografa, mostrar algo existente, todavia seu signifcado consegue ultrapassar o que está posto na imagem fxa.
Existe um conhecimento implícito nas fontes não verbais como a fotografa; descobrir os enigmas que guardam em seu silêncio é desvendar fatos que lhe são inerentes e que não se mostram, fatos de um passado desaparecido que imaginamos, em eterna tensão com a imagem presente que vemos no documento: realidades superpostas. Existe, sim, um pensamento plástico como afrmava Francastel. Não raro, memória, informação, propaganda, testemunho e fcção se confundem numa
única imagem. Seguir decifrando essa forma de conhecimento é o desafo que nos move (2004, p.232).
Quando diante de uma fotografa o que realmente vemos? A nossa compreensão da imagem fotográfca é infuenciada por várias compreensões de mundo pré-existentes em nossa mente, derivadas estas de nossas experiências e imaginações. Para Kossoy (2004) a fotografa nunca é totalmente imparcial, pois a primeira visualização existente foi a do fotógrafo que registrou o ato fotográfco, seja de maneira espontânea, seja incumbido desta tarefa.
Assim a imagem fotográfca é uma forma de conhecimento na qual podemos visualizar alguns cenários do passado, todavia as imagens não reúnem por si só o total conhecimento do passado. Kossoy (2012) questiona se existe melhor exercício para reviver o passado que a apreciação solitária de nossas próprias fotografas?
A fotografa e o passado associados levam a refetir e relembrar os momentos que já foram vivenciados através de uma experiência visual dos seres diante da imagem de si próprios, por meio de fotografa de diversas ocasiões seja dos momentos mais comuns do cotidiano assim como momentos importantes que já foram vividos no passado.
Quando o homem vê a si mesmo através dos velhos retratos nos álbuns, ele se emociona, pois percebe que o tempo passou e a noção de passado se lhe torna de fato concreta. Pelas fotos dos álbuns de família, constata-se a ação inexorável do tempo e as marcas por ele deixadas [...] (2012, p.112).
Esse pensamento nos faz refetir acerca da maneira como nos envolvemos afetivamente com os conteúdos existentes nas fotografas, pois de uma maneira ou de outra nos dizem respeito e através delas aforamos nossos sentidos, vol-
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tamos ao passado, visualizamos como eram nossos amigos e como nós mesmos éramos, assim os sentimentos aforam. Kossoy (2012) exemplifca como uma espécie de viagem de volta ao passado sob a mediação da imaginação que possibilita reconstruir os acontecimentos em nossa mente. Nos álbuns de famílias, a cada página que percorremos, personagens nos saltam aos olhos e novos assuntos rememoram em nossa imaginação, um meio que possibilita reconstruir uma trajetória de vida através das fotografas.
Nesse entendimento, quando se visualiza uma fotografa do passado é necessário refetir sobre a trajetória da fotografa e lembrar que atrás de toda fotografa existe uma história. Kossoy (2012) explica que a trajetória fotográfca é percorrida através de três estágios bem defnidos. A primeira seria a fnalidade para que ela exista de fato, esta fnalidade pode ter sido do fotógrafo que se viu instigado a fotografar o acontecido de maneira espontânea ou então foi incumbido e pago para fotografar tal fato. A segunda intenção seria a materialização da fotografa. A terceira intenção seriam os caminhos os quais essa fotografa ainda vai percorrer. Nessa terceira intenção vale lembrar sobre os caminhos percorridos e: [...] As mãos que a dedicaram, os olhos que a viram, as emoções que despertaram os porta-retratos que a emolduram, os álbuns que a guardaram, os porões e sótãos que a enterraram e as mãos que a salvaram. Neste caso seu conteúdo se manteve, nele o tempo parou. As expressões ainda são as mesmas. Apenas o artefato, no seu todo envelheceu (2012, p.47).
A fotografa pode trazer de volta informações do passado, mas não consegue compreender os signifcados em sua plenitude, ou seja, o entendimento da realidade em sua totalidade como era no passado. Por trás da aparência ingênua da
fotografa existe uma carga de pensamentos ideológicos que podem manipular o sentido espontâneo existente em uma fotografa.
A Leitura da Paisagem a Partir da Fotografa
Dessa forma, para compreender a relação entre o olhar, a paisagem e o sujeito é possível exemplifcar através do trabalho do fotógrafo contemporâneo o esloveno Evgen Bavcar que é cego e seus trabalhos promovem debates sobre o olhar que perpassa o campo do visível, o concreto e se expande para as sensações mais subjetivas; dessa forma Evgen Bavcar informa como compõe esse processo de formação das imagens: “Registro imagens de sonhos e procuro experimentar o maior número de sensações possíveis.” O fotógrafo tenta dirigir as imagens por meio do tato e da audição.
Foto 1 – Imagem registrada pela fotógrafa cega Amy Hildebrand
Outro exemplo inserido na mesma perspectiva é a fotógrafa americana Amy Hildebrand que nasceu cega por causa
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do albinismo. Na infância e na adolescência, ela passou por tratamentos médicos e passou a enxergar algumas formas, vultos e poucas cores. Apesar das limitações de sua visão, Amy optou por se formar em fotografa e através de suas imagens pode-se perceber a sensibilidade aguçada possibilitando até uma refexão sobre o olhar sensitivo, que perpassa o inimaginável, perpassa o campo do visível.
As questões teóricas que envolvem a arte fotográfca e o estudo de autores que discutem as transformações espaço-temporais e conceituais da fotografa são os assuntos que norteiam e possibilitam novos estudos geográfcos. Busca-se assimilar a fotografa enquanto manifestação artística e forma de intervenção social que proporciona uma memória e análise de momentos históricos dos sujeitos com seu entorno.
Estes exemplos foram trazidos para entendermos como a geografa cultural renovada se detém a novos estudos sem se prender apenas à análise objetiva de suas pesquisas. Pensar em como relacionar a geografa, os sujeitos, a fotografa e artes plásticas podem ser sim objetos de estudos geográfcos e nesse contexto deve-se ressaltar a importância desses estudos para a sociedade e como os mesmos podem ser investigados sob a óptica geográfca. Dessa forma, entende-se que não possuímos a mesma impressão da paisagem, pois interpretamos de formas diferentes e assimilamos de maneiras diversifcadas. Todavia, participam desse processo de construção da paisagem, as ações temporais que possibilitam a conservação de resistências e vestígios de civilizações ou arquitetura e manifestações culturais que compõem e transformam a paisagem. É necessário saber também que a paisagem não está pautada apenas no sentido visual, mas sim em uma gama de apreensões existentes através de vários outros sentidos perceptivos e principalmente na interpretação subjetiva do sujeito.
Considerações Preliminares
Portanto, na primeira etapa deste trabalho foram feitas refexões sobre a Geografa e Paisagem e a relação destas com as artes. Na segunda etapa foram levantados alguns estudos conceituais sobre a fotografa. Na terceira etapa foram levantados exemplos que permeiam o campo da fotografa e uma possível análise junto a paisagem inserida na geografa cultural renovada.
Desse modo, os signifcados da arte apresentam-se sob diversas interpretações, atuações e apropriações espaciais. Estas características podem contribuir para a compreensão da transformação da paisagem, através das modifcações na composição espacial. Assim, assimilar a fotografa se apresenta como manifestação artística e forma de intervenção social proporciona uma memória e análise de momentos históricos que promovem análises perceptivas dos sujeitos com seu entorno.
Referências Bibliográfcas
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