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Siriza e a Cultura Europeia João Rebelo
Siriza e a Cultura Europeia
João Rebelo . Professor de Filosofia
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Há alguns anos, em Budapeste tive uma discussão acesa com uma colega grega. Eu tinha tido conhecimento deste Movimento Cívico (Siriza), do seu líder (Alexis Tsipras) e queria saber a opinião grega. A colega, contrariamente às minhas expectativas, era profundamente contra. Disse-me que eles eram uns miúdos, irreverentes, e sem mais que a Utopia. Esclareceu-me…
Estamos formatados para que só exista um caminho, a austeridade, e que as soluções passem por cortes salariais e desemprego pois fomos “gastadores em demasia”. Só uns tantos, mais informados e ligados ao Poder, podem desfrutar dos bens que a Comunidade Europeia proporciona. Qualquer ideia que surja em oposição é perigosa e desmotivadora. Em Dezembro encontrei-a de novo, e voltámos a falar disto. Continuava sem perceber o que se estava a passar… Afinal, ela beneficiava do sistema vigente. Talvez eu tivesse mais razão, apesar de não ser grego. Estive em Atenas em Abril, e pude constatar o estado policial e o medo que o poder tinha da população. Presenciei várias manifestações e falei com pessoas anónimas. O sofrimento deles era medonho. Por exemplo, aqui, enquanto professores queixamo-nos muito, mas na Grécia é mil vezes pior. Fomos todos atirados para uma espécie de limbo, sem o mínimo conhecimento da realidade escolar e respeito pela dignidade, quer humana, quer profissional. Os outros gregos de que me fui tornando amigo defendem cada vez mais esta questão: a dignidade. Dizem: temos de ser “bravos” e não emigrar. Somos patriotas. Nascemos aqui e aqui queremos viver. É, sem dúvida, uma posição corajosa e algo utópica. Mas essencial.
Agora as coisas mudaram, e acredito que a Grécia vai, como na antiguidade e em 43, a seguir à 2ª Grande Guerra, dar uma lição à Europa. O Siriza,
Fonte: http://www.gazetadorossio.pt/
é um conglomerado de pessoas cuja União reside nesta palavra: Dignidade. Ao contrário do que a propaganda neoliberal apregoa não é um partido extremista. Nasceu apenas de forma diferente dos partidos tradicionais do século passado. Nasceu na rua, nas manifestações e cresceu com as redes sociais. O seu líder é um jovem visionário, carismático, cuja simpatia, polimento e coragem, arrastam as pessoas. Vamos ver do que será capaz…
Mas para começar, começa bem. Reintegrou o pessoal da limpeza e despediu os assessores, pois é mais barato a limpeza do que aqueles que vivem num ciclo de pareceres.
Os partidos tradicionais foram legalizados logo a seguir ao 25 de Abril, mas rapidamente se transformaram em caixas de compadrio, trocas de influência, corrupção. Criaram aliás, através das respetivas juventudes partidárias formas de se perpetuarem no poder ou contra poder. Deixaram, há muito, de representar correntes de opinião e anseios das populações. Estão totalmente fora do dia a dia do povo e persistentemente tentam confundi-lo, pois sabem que dominam os meios de comunicação, em particular a TV, que é o meio ainda hoje dominante. Mas descuraram a NET e os novos produtos sociais. E isso vai serlhes fatal!
A descrença nos partidos não é a descrença na liberdade. Não é, como possa às vezes parecer, a ambição e a inveja. Toda a gente sabe que para ter hoje sucesso e dinheiro basta filiar-se ou ter “amigos” nos partidos do “arco do poder”. Mas as pessoas têm dignidade, e a maioria rejeita rebaixarse. Talvez daí as gigantescas taxas de abstenção… O que as dinamiza é a confiança, é saber que não estão a ser enganadas. E os fenómenos como o Siriza ou o Podemos (Espanha) vão acontecer e crescer. De nada vale algumas figuras ligadas aos partidos tradicionais tentarem mascarar-se (vide Bloco de Esquerda). O que se almeja são caras novas, gente em quem já se possa confiar. Por isso a Europa tem de mudar e vai mudar, tal como nós por cá….