issn 1982-5994
12 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Fevereiro, 2010
Entrevista
“Luto e frustração são os primeiros sentimentos diante da doença"
JORNAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ • ANO XXIV • N. 80 • Fevereiro, 2010
O mundo da nanotecnologia
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isquetes fazem parte do passado, hoje, nossos arquivos são transportados em pen drives cada vez menores. O chip do cartão traz os nossos dados bancários e, acompanhado da senha, dispensa a assinatura. Os telefones celulares deixaram de ser instrumento de comunicação direta e trazem, cada vez mais, aplicativos que
Programa Caminhar, do Hospital Bettina Ferro, oferece diagnóstico e tratamento para diversas doença genéticas
Tambor
Beira do Rio - Quais são os tipos de doenças genéticas atendidas no Bettina? Qual delas mais se destaca no Estado? I.N. - Existem as doenças genéticas cromossômicas, gênicas, mitocondriais e multifatoriais. Em 2009, tivemos mais de 700 atendimentos no laboratório de genética. Entre as doenças cromossômicas a mais frequente e com maior demanda no Bettina é a Síndrome de Down, que acontece, em média, em uma pessoa para cada seiscentas nascidas vivas. A Síndrome é uma doença fácil de identificar no exame físico, porque tem características faciais e de extremidades. Temos grande interesse em acompanhar esses pacientes, para que eles recebam orientação sobre todos os problemas que ocorrem junto com a Síndrome e também seja realizado o aconselhamento genético com a família.
Beira do Rio - Como esses pacientes chegam ao Hospital? I.N. - Eles são encaminhados pelo Sistema de Regulação da Secretaria Municipal de Saúde (Sesma). Temos 150 atendimentos controlados por esse setor, ou seja, é como se fossem 150 vagas para atendimento em Genética Médica ao A Síndrome mês. Fazemos, ainda, o agendamento direto de Down é a por meio do Serviço doença mais Social do Bettina. Ainda este ano, estaremos frequente no totalmente regulados pela Sesma. Isso vai laboratório fazer com que os outros
Beira do Rio - Há prevenção para doenças genéticas? I.N. - A prevenção se dá pelo aconselhamento genético. A partir do momento em que uma doença genética é identificada, precisamos verificar o tipo de herança e o risco de recorrência para outros descendentes do casal. Em nível po-
volvimento infantil, tornou-se um programa e agora é um serviço que abriga uma equipe multidisciplinar formada por 30 profissionais nas áreas de Pediatria, Cardiologia, Endocrinologia, Neurologia, Fonoaudiologia, Fisioterapia, Terapia Ocupacional e Psicologia. Além das especialidades médicas, os serviços de enfermagem e atendimento social que dão suporte às famílias das crianças. Temos 30 estagiários de diversas áreas. Os alunos da Engenharia da Computação, por exemplo, nos auxiliam a registrar os atendimentos, elaborar gráfico dos resultados obtidos, tudo para ajudar a traçar os diagnósticos dos pacientes.
Beira do Rio - Qual é a contribuição da UFPA para esse quadro da Genética Médica? I.N. - Dá-se pelo atendimento ambulatorial no Hospital Bettina e também pelos seus laboratórios especializados no Centro de Ciências Biológicas, nosso grande suporte. A Beira do Rio - Na Genética Médica, UFPA tem outras iniciativas valiosas o Caminhar auxilia, também, as para a população, como a pesquisa famílias das crianças. Como é essa da determinação de relação? paternidade, diagnósI.N. - É muito importico das mutações mais tante a relação com a frequentes na nossa família das crianças. região, hiperplasia Quando seu filho nasce adrenal congênita, fie não é uma criança brose cística, surdez normal, gera um sennão sindrímica, entre timento de frustração outras. Os programas e luto. Para ajudar a de pós-graduação têm superar isso, oferecevários grupos de pesmos o suporte da psiquisas voltados para cologia, que assume a área médica, levanum papel fundamental Pós-graduação no Caminhar, em espedo os profissionais a se aproximarem mais cial, no Ambulatório de aproxima da Genética Médica. Genética. Nosso papel Essa iniciativa permite dentro desse processo profissionais que a Medicina avance de aconselhamento é da Génetica bastante, inclusive, na comunicar e orientar área da Oncologia. No o risco ao casal e não Médica futuro, teremos um podemos interferir na grande centro nessa decisão de ter ou não área. um próximo filho, ela cabe ao casal. O atendimento psicoBeira do Rio - Como funciona o lógico ajuda a família a aceitar essa Serviço Caminhar? criança com suas limitações. Algumas I.N. - O Caminhar abriga o Ambulatófamílias têm dificuldades de estaberio de Genética e funciona há sete anos lecer vínculo afetivo com o bebê. no Hospital Bettina Ferro. Em 2009, Nossa intervenção é para que essa atendemos mais de 18 mil crianças família o aceite, lute por ele, busque com alterações de desenvolvimento tratamento, diagnóstico, enfim, uma infantil e síndromes genéticas, entre vida de qualidade com o que é permizero e 12 anos. Inicialmente, era tido com a doença e a patologia que um projeto voltado para o desena criança tem.
Tour, visitas às unidades e bate-papo
Projeto "Visitação ao Campus Universitário: uma proposta turístico-ambiental" traz alunos do ensino médio para dentro do Campus Guamá, oportunidade para obter informações e conhecer de perto a Universidade. Pág. 10 Wagner Meier
Coordenado pelo professor Miguel Santa Brígida, grupo estuda criação carnavalesca, etnocenografia e performance. Pág. 3
Durante visitação, estudantes observam rios, pássaros e vegetação da Cidade Universitária
Folia é tema de estudos
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Nutrição
Entrevista A pediatra Isabel Neves, coordenadora do Programa Caminhar, fala sobre o serviço de Genética Médica prestado pela UFPA. Pág. 12
Oportunidade
Frituras e doces compõem cardápio de estudantes Pesquisa apresentada no curso de Especialização em Bioestatística do ICEN entrevistou mais de 400 alunos.
Sem tempo, eles optam pelos lanches rápidos e não praticam nenhuma atividade física. Pág. 9
Alexandre Moraes
municípios que tenham interesse em marcar uma consulta terão que procurar o Serviço de Regulação da Sesma.
pulacional, é possível, também, fazer um diagnóstico precoce e até inibir a manifestação de sintomas, como o teste do pezinho, que identifica a fenilcetonúria - doença autossômica recessiva que na sua evolução leva à deficiência mental, tem risco de recorrência de 25% e ocorre, em média, em um a cada 12 mil nascidos vivos no País.
Carnaval ganha núcleo de pesquisa
Wagner Meier
Beira do Rio - Como você vê a introdução da Genética Médica no Sistema Único de Saúde (SUS)? Isabel Neves - É algo extremamente necessário. O SUS tem se aprimorado ao longo dos anos, mas existia essa lacuna que era assumida pelos serviços das universidades. No Pará, há alguns anos, estamos integrados ao SUS, mas existem muitas deficiências. De exame laboratorial, temos somente o cariótipo, que é pago pelo SUS por meio de uma parceria entre o Laboratório de Genética Humana e Médica da UFPA e o Hospital Bettina. Contamos também com a triagem para erros inatos do metabolismo, por meio de uma parceria entre o Bettina e o Laboratório de Erros Inatos do Metabolismo da UFPA. Se não fosse a existência dessas parcerias ficaria muito complicado atender aos pacientes.
Isabel Neves: "Suporte para famílias das criança é fundamental"
Turismo
Márcio Santos
Em 2009, o Programa Caminhar atendeu mais de 18 mil crianças, de zero a 12 anos, com alterações de desenvolvimento infantil e síndromes genéticas. Funcionando há sete anos no Hospital Universitário Bettina Ferro, o Programa conta com uma equipe multidisciplinar pronta para oferecer diagnóstico e tratamento. O atendimento também é dado à família dos pacientes, que precisa superar a dor e aprender a lidar com as limitações dessas crianças. Em entrevista exclusiva ao Jornal Beira do Rio, a pediatra Isabel Neves, coordenadora do Programa, falou sobre a importância da inclusão da genética médica pelo Sistema Único de Saúde, dos serviços oferecidos pela Universidade Federal do Pará à comunidade nessa área e da importância da interdisciplinaridade no atendimento aos pacientes e familiares. De acordo com a Dra.Isabel Neves, a melhor prevenção ainda é o aconselhamento genético, momento em que as doenças são identificadas e os riscos de recorrências são analisados. Mas a decisão final sobre ter ou não outros filhos caberá ao casal.
Fotos Wagner Meier
Cleide Magalhães
promovem a interatividade. Esses são alguns exemplos de quanto o mundo invisível da nanotecnologia se faz presente no nosso cotidiano. Esse universo está sendo estudado por pesquisadores das Faculdades de Farmácia, Física e Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Pará. Págs. 6 e 7
CNPq, UFPA e Fapespa distribuem mais de 400 Bolsas de Iniciação Científica. Parte delas foi destinada, especificamente, para cotistas. Pág. 8
Extensão
Coluna do Reitor
Cinema dá lições de ética médica
Carlos Maneschy discute a internacionalização da agenda universitária. Pág. 2
Opinião O jornalista Oswaldo Coimbra comenta as dificuldades da expressão verbal Pág. 2
Iniciação Científica para todos
RU é a única opção de alimentação balanceada no campus Guamá
Linguagem cinematográfica ajuda médicos residentes do Hospital Barros Barreto a refletirem sobre ética e conduta profisssional. Pág. 10
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Carlos Maneschy
Alexandre Moraes
às instituições de ensino e pesquisa, exigindo-lhes significativas transformações pragmáticas e conceituais para aumentar a qualidade da sua produção e exercer um papel mais em consonância com as expectativas nelas colocadas. Curiosamente, esse mesmo processo de globalização que traz às universidades a necessidade da abertura de atividades e de integração internacional impõe realidades às quais é preciso reagir. Dentre elas, ganha dimensão a lógica privatista de que o ensino deve ter a condição de mercadoria, dissociado, portanto, do conceito clássico de bem público, conforme se depreende de recente solicitação feita pelos EUA para inserção da educação no Acordo Geral sobre o Comércio de ServiçosGATTS, da Organização Mundial do Comércio-OMC. Não é, certamente, essa a característica da internacionalização acadêmica que se pretende para o país. Longe de se querer um quadro educacional fragilizado por um mosaico de interesses estrangeiros, nossas metas devem estar bem definidas num plano nacional que conceba a integração global da universidade brasileira dentro de uma moldura em que geração de conhecimento de alto nível, formação qualificada e mérito acadêmico sejam misturados a valores, como mobilidade, intercâmbio e flexibilidade nos critérios
OPINIÃO
Oswaldo Coimbra
de avaliação institucional. Enfim, espera-se introduzir nas nossas universidades uma consciência em que a importância da dimensão internacional esteja bem presente, dando forma a um perfil mais apropriado para atuar em um mundo de rápidas transformações, que impele as instituições acadêmicas a interpretar, adequadamente, as conjunturas internacionalizadas como maneira de fortalecer sua própria internacionalização. Como já mencionado, no Brasil, as iniciativas de estímulo à cooperação internacional ainda são muito tímidas. Extraídas as experiências consolidadas de formar e qualificar profissionais em universidades estrangeiras, são pontuais os exemplos brasileiros de articulação interinstitucional de sucesso envolvendo outros países. A mudança de fundo que se espera promover nessa direção deve tomar como fator essencial nas associações internacionais a possibilidade concreta de alterar qualitativamente os indicadores de excelência do ensino de graduação. Olhar para o futuro com uma perspectiva que aceita e valoriza a integração internacional, resguardado o papel autônomo das nossas instituições, é, certamente, condição indispensável para inserção altiva das universidades brasileiras no plano global estabelecido neste novo século.
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Um jeito de viver, um jeito de escrever
s insatisfações que uma pessoa sente com seu modo de escrever e de falar ganham um tom dramático naqueles campos profissionais em que é essencial a produção de textos, como no Jornalismo. Não é por acaso que, nos cursos desta área, as dificuldades de expressão verbal manifestadas por seus alunos tornam-se grandes preocupações tanto para eles próprios como para seus professores. Para enfrentar tais dificuldades, um curso de Jornalismo do Centro-Oeste brasileiro resolveu contratar um especialista em Expressão Verbal, com a missão de analisar os textos produzidos nas aulas das disciplinas de Redação Jornalística, tendo em vista dois objetivos: 1º) montar um quadro ordenado das dificuldades dos alunos; 2º) propor soluções. Após um ano de estudos, o quadro organizado pelo especialista
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abrigava uma variedade de itens, como: 1) ausência de expressividade e de originalidade, indicada por frases-feitas e chavões; 2) banalidade de conteúdo e falta de ideias próprias; 3) uso inadequado de vocabulário; 4) perda de coerência e de coesão textuais; 5) falta de rigor na reprodução do real; 6) desconhecimento de regras ortográficas e de outras noções de Língua Portuguesa aplicadas na elaboração de textos; 7) domínio insatisfatório dos vários modelos de estruturas de textos; 8) barreiras no desenvolvimento de raciocínio lógico; 9) embotamento de sensibilidade e pouca capacidade de percepção. Para enfrentar esse quadro, o especialista propôs a criação, dentro da Faculdade, de um Núcleo de Atividades Pedagógicas. E justificou-se dizendo que todas as dificuldades identificadas podiam ser resumidas em três itens: falta de criatividade, visão estereotipada
Uma receita de preservação ambiental
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Internacionalização da agenda universitária vendo diferentes países ganham maior importância, e quando a integração da ciência e da técnica se torna ainda mais necessária, é de fundamental relevância ambientar as universidades ao exercício da cooperação internacional como forma de potencializar sua vocação para produzir conhecimento e formar quadros com capacidade de atuação multicultural. Se nos países desenvolvidos essa preocupação já está inserida no cotidiano das ações dos agentes interessados, no Brasil, constata-se que a internacionalização acadêmica tem sido muito pouco compreendida e valorizada, com as políticas e iniciativas nessa direção refletindo um cenário de desencontro que muito pouco acrescenta ao esforço de conferir maior intercâmbio às universidades brasileiras. O fato é que a cooperação no nível internacional tem sido uma tarefa a ganhar cada vez maior peso institucional, numa realidade decorrente de um processo de globalização em que a dinâmica econômica em curso considera a educação como um insumo estratégico para o desenvolvimento da sociedade moderna. Num contexto dessa natureza, a competição em um ambiente onde o conhecimento acumulado é fator de distinção no valor da produção e riqueza nacional confere maior relevo
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Tecnologia
Coluna do REITOR
m sua milenar trajetória, a universidade tem sido, recorrentemente, levada a alterar seu nível de participação na sociedade, ao mesmo tempo em que se vê provocada a repensar e redimensionar algumas de suas funções essenciais. Apoiada em características contraditórias que, de um lado, revelam um conservadorismo resistente a grandes mudanças e, de outro, a capacidade de transformar o futuro a partir das experiências analisadas, a instituição universitária preserva a força que a mantém no centro das grandes transformações humanas. No rastro desse curso histórico, muitos foram os modelos com que as universidades foram identificadas: ao início, de guardiã de um conhecimento hermético e de viés religioso, a universidade viu-se transformada em núcleo de instrução da nobreza; posteriormente, já como polo de formação profissional de massas, incorporou a produção de pesquisa como elemento basilar de sua missão. Hoje, moldando-se em um novo formato em que a prestação de serviços sociais é um dos resultados esperados, exige-se, também das universidades, um figurino talhado às linhas demarcadas pela internacionalização de suas atividades. Para esse tempo em que redes interinstitucionais de pesquisa envol-
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BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Fevereiro, 2010 –
da vida, linguagem verbal estropiada. Ele acrescentou que tais itens estavam ligados a esferas situadas além do universo restrito das disciplinas de Técnicas de Redação, pois emergiam da ampla cadeia de relações sociais, no cerne da qual se desenrolava a existência de cada um dos alunos, dentro e fora da escola. O especialista alertou: as dificuldades só seriam superadas se a Faculdade fosse capaz de manter seu poder de influência sobre os alunos, a ponto de tornar os quatro anos de permanência nela num período em que eles pudessem se libertar dos condicionamentos responsáveis pelo empobrecimento de seus textos e adquirissem percepção mais aguda, maior sensibilidade e capacidade de reflexão apurada. Três diferentes campos de ações deveriam se desenvolver no Núcleo de Atividades Pedagógicas proposto: 1) o
do Jornalismo de Pesquisa; 2) o das atividades interdisciplinares, com ênfase nos estudos aprofundados de textos, em parceria com o curso de Letras; 3) o das atividades extracurriculares. Em resumo, o especialista propôs que os alunos fossem libertados das amarras que os detinham como prisioneiros nos espaços específicos de cada disciplina. Afinal, a grade curricular a que eles estavam presos não havia sido montada com a preocupação de ajudá-los a vencer suas dificuldades de expressão verbal. Oswaldo Coimbra é jornalista, pósdoutor pela Escola de Comunicação e Artes/USP, coordena o Grupo de Memória da Engenharia, da Faculdade de Engenharia Civil/ITEC. É autor do livro O texto da reportagem impressa (Ática).
Reitor: Carlos Edilson Maneschy; Vice-Reitor: Horácio Schneider; Pró-Reitor de Administração: Edson Ortiz de Matos; Pró-Reitor de Planejamento: Erick Nelo Pedreira; Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Marlene Rodrigues Medeiros Freitas; Pró-Reitor de Extensão: Fernando Arthur de Freitas Neves; Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Emmanuel Zagury Tourinho; Pró-Reitor de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: João Cauby de Almeida Júnior; Pró-Reitor de Relações Internacionais: Flávio Augusto Sidrim Nassar; Prefeito do Campus: Alemar Dias Rodrigues Júnior. Assessoria de Comunicação Institucional JORNAL BEIRA DO RIO Coordenação: Ana Carolina Pimenta Edição: Rosyane Rodrigues; Reportagem: Abílio Dantas/Cleide Magalhães(1.563-DRT/PA)/Glauce Monteiro(1.869-DRT/ PA)/ Igor de Souza/Jéssica Souza (1.807-DRT/PA)/Killzy Lucena/Raphael Freire/Walter Pinto(561-DRT/PA); Fotografia: Alexandre Moraes/Mácio Ferreira/Márcio Santos/Wagner Meier; Secretaria: Carlos Junior/ Felipe Acosta; Beira On Line: Leandro Machado/ Leandro Gomes; Revisão: Júlia Lopes/Karen Correia; Arte e Diagramação: Rafaela André/Omar Fonseca; Impressão: Gráfica UFPA.
Aproveitamento de resíduos coloca a construção civil a serviço da ecologia Glauce Monteiro
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que você pode fazer para ajudar a preservar o meio ambiente? Pegue um problema socioeconômico, como os altos custos de construção de casas populares, e misture com investigação científica voltada para propor soluções para as questões ambientais na Amazônia. Com essa receita na cabeça, pesquisadores da Faculdade de Engenharia Civil da Universidade Federal do Pará produziram novos materiais que usam rejeitos das indústrias madeireiras e cerâmicas como matéria-prima para a construção. "Estimamos que a construção civil seja responsável por até 50% do uso dos recursos naturais em nossa sociedade. Por outro lado, temos processos de beneficiamento de diversas substâncias, como o metacaulim e a madeira, que produzem muitos resíduos sem utilidade alguma e representam uma ameaça ambiental. A possibilidade de conquistar uma proposta que tente solucionar dois destes problemas, ao mesmo tempo, certamente deve ser comemorada. Com o tempo, teremos menos necessidade de extrair argila e de derrubar árvores graças ao desenvolvimento de pesquisas que criem e aperfeiçoem novos materiais", defende o professor Dênio Ramam, do curso de Engenharia Civil.
Mácio Ferreira
Mácio Ferreira
2 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Fevereiro, 2010
Pesquisador Alcebíades Macedo mostra o compósito madeira-cimento, material que aproveita sobras de madeira
n Sua casa mais resistente
n Mistura de madeira e cimento
Problema: O metacaulim que sobra na produção de papel e de cerâmica pode ser totalmente aproveitado. Solução: Produção de cimento e blocos de concreto com metacaulim.
Problema: Indústria madeireira aproveita, apenas, 41,5% das toras, o resto é jogado fora. Solução: utilizar os resíduos de madeira para produzir concreto, revestimentos, pisos, forros e mobiliário.
Um dos materiais mais utilizados para a construção de uma casa é o concreto, que, por sua vez, é confeccionado a partir do cimento. Que tal diminuir os custos da obra e, ainda por cima, dar destino a substâncias prejudiciais ao meio ambiente? É o que propõem os pesquisadores do Grupo de Análise Experimental de Estruturas e Materiais (Gaema) da UFPA. Empresas de cerâmica produzem tijolos, blocos, telhas e porcelanas e se distribuem por todo o país, consumindo, mensalmente, 10,5 milhões de toneladas de argila retiradas do meio ambiente. No Estado do Pará, existem diversas regiões ricas em argila as quais têm, no setor oleiro, um importante segmento econômico devido à sua participação na geração de empregos, na indústria de transformação e, também, ao seu papel complementar na construção civil. No entanto, a extração de argila para a fabricação de materiais cerâmicos, embora não seja considerada uma atividade poluidora, degrada o meio ambiente e está relacionada com o assoreamento dos rios.
Os processos de fabricação de cerâmicas e de papel têm como resíduo um material de pigmento esbranquiçado, conhecido como metacaulim. "Meta é o último estágio da cadeia produtiva, ou seja, quando já passamos por todo o processo de produção e não é possível fazer mais nada com o material que restou. A única 'solução' é estocá-lo", explica Dênio Ramam, pesquisador da Faculdade de Engenharia Civil e um dos coordenadores do Gaema. Pesquisas comprovaram que é possível substituir até 30% do peso do cimento por metacaulim, com considerável aumento da resistência em relação ao material tradicional. Isso significa que, em cada saco de 50kg de cimento, podemos utilizar 15kg de metacaulim. “Atualmente, estamos testando outros percentuais para incentivar, ainda mais, a utilização desse material na construção civil. Nosso objetivo é substituir a microsílica, rejeito da produção de ferro e silício metálico das indústrias do Sudeste do Brasil, como adição para concretos e argamassas. Ou seja, substituir o lixo das indústrias do Sudeste pelo lixo da produção mineral amazônica nos produtos para a construção utilizados na Região Norte, o que representaria uma redução de preço já que o nosso metacaulim é mais barato que a microsílica", revela o pesquisador.
Todos os anos, 58,5% da madeira retirada das florestas do Pará vai parar no lixo. Estima-se que o Estado consuma, anualmente, onze milhões de metros cúbicos desse material, mas o rendimento médio do processamento de uma tora é de, apenas, 41,5%. Isso significa que, a cada árvore derrubada, metade de seu peso se converte em tábuas, chapas e madeira serrada. Já a outra metade, composta por cascas, galhos, serragens e pedaços disformes de madeira, é jogada fora. Em 2004, seis milhões de metros cúbicos de madeira saíram das florestas diretamente para o lixo. Como aproveitar essas “sobras” do beneficiamento da madeira? O Grupo de Análise Experimental de Estruturas e Materiais (Gaema) da UFPA encontrou uma opção. Madeira e cimento formam um par indispensável em todas as fases de uma obra: aquela se consagrou em forros e pisos, e este reina absoluto em paredes e vigas. Agora, imagine as possibilidades de um material que una a leveza e a maleabilidade da madeira com a resistência e a durabilidade do cimento? Esse produto chama-se compósito madeira-cimento. A mistura de madeira e cimento
é um dos poucos materiais à prova de incêndios e com propriedade antirruído. Ideal para fabricar divisórias, lajes, painéis antirruídos, telhas e elementos pré-moldados mais resistentes, baratos e duráveis, e para a produção de concreto e argamassa mais leve e fácil de transportar, o que facilitaria, por exemplo, a construção de rodovias em locais mais isolados. Mas esse casamento ideal não é tão simples assim de se obter. De acordo com o pesquisador Alcebíades Macedo, as fibras de madeira não podem, simplesmente, ser adicionadas a uma mistura de concreto. Isso porque os vegetais acumulam líquidos, produzem açúcares e outras substâncias que são incompatíveis com o cimento. Ao secar, a mistura se desfaz. Os pedaços de madeira soltam-se e o cimento fica repleto de falhas, comprometendo a sua resistência. Pesquisadores da Faculdade de Engenharia Civil da UFPA estudam técnicas e aditivos, como o cloreto de cálcio, que permitam esta união tornarse duradoura.“Coletamos serragens obtidas pelo beneficiamento de diversas espécies vegetais. Cada uma reagiu diferentemente quando misturadas ao cimento, sendo que o jatobá, a quaruba e, especialmente, o cedro tiveram o melhor desempenho. Porém, todas elas apresentaram potencial para serem utilizadas na produção de compósitos madeira-cimento”, explica Alcebíades Macedo.
10 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Fevereiro, 2010
BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Fevereiro, 2010 –
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Pesquisa
Fotos Divulgação
Extensão
Da Sapucaí para o mundo acadêmico
Walter Pinto
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"Erin Brockovich - uma mulher de talento", "Mar adentro" e "Menina de Ouro" são alguns dos filmes já exibidos pelo projeto Cinemed
Cinema como ferramenta pedagógica
Filmes ajudam futuros médicos a refletirem sobre ética e conduta profissional Killzy Lucena
Q
uando estamos na escola, aprendemos que ética é um conjunto de valores que orienta as atitudes do homem em relação aos seus semelhantes. No dia a dia – em casa ou no trabalho – nossas decisões são pautadas por esses valores. O Projeto "Cinemed: o estudo da ética em saúde através da linguagem cinematográfica" ajuda os médicos residentes do Hospital Universitário João de Barros Barreto (HUJBB), da Universidade Federal do Pará (UFPA), a refletirem sobre a prática da ética médica
utilizando filmes que retratam situações que podem ocorrer na relação médico-paciente. O Projeto Cinemed iniciou em 2002 com o desafio de aplicar, de forma dinâmica, a disciplina "Ética Médica e Bioética", uma exigência dos Programas de Residência Médica em todo o país. Coordenado pelos professores Luiz Moraes e Rita Medeiros, o Cinemed é uma atividade complementar nos Internatos de Clínica Médica e de Clínica Cirúrgica do curso de Medicina da UFPA, cujo Projeto Político-Pedagógico prevê que o profissional "(...) deverá exercer a medicina com postura ética e
humanística em relação ao paciente, à família e à comunidade (...)". Durante o período da Residência, geralmente de dois anos, cerca de 120 pessoas assistem aos filmes na última sexta-feira de cada mês. Os filmes são escolhidos por docentes, técnicos e representantes do Conselho Regional de Medicina, que também recebem sugestões dos participantes do Projeto. Ao final das sessões, o debate é auxiliado por textos e pelo código de ética profissional. Os alunos elaboram relatório semestral abordando um dos filmes, com análise sob o ângulo da ética em saúde.
Miguel Santa Brígida estuda a relação do giro dos orixás com a dança do mestre-sala e da porta-bandeira na Sapucaí”, o pesquisador buscou compreender como se organizam três conceitos fundamentais para seu estudo: a dramaturgia, a coreografia e a performance. “Essas três matrizes, no meu entender, são a configuração desse espetáculo no que chamo de cena contemporânea”, explica. Segundo ele, o carnaval incorpora todas as questões trabalhadas na linguagem do teatro, “a questão da dramaturgia, os processos criativos da dança contemporânea e a relação da performance enquanto linguagem híbrida, que conversa com todas as linguagens e anuncia novas linguagens”. A relação do carnaval com no-
vas tecnologias, por exemplo, é uma das novas linguagens que compõem chamada cena contemporânea: “desde que o astronauta voou no desfile da Grande Rio, em 2001, o carnaval reconfigurou uma nova dimensão cenográfica, conquistando o espaço aéreo como expressão do samba. Não foi só um efeito técnico pensado por Joãozinho Trinta, havia uma relação complexa com aquele enredo da Grande Rio. Então, a minha investida nessa pesquisa foi entender como se organiza o espetáculo como uma cena contemporânea”. A experiência como encenador, carnavalesco e praticante dessa
cena tem sido fundamental. No doutorado, Miguel Santa Brígida incorporou três anos de experiências na Sapucaí, de 2004 a 2006. No primeiro ano, ele encenou o Auto do Círio em carro alegórico. Em 2005, realizou a pesquisa do enredo “A Viradouro é sorriso”, tendo por base a relação do riso na história do teatro. Em 2006, participou da pesquisa do enredo “A vida que pedi a Deus”, da Mocidade Independente de Padre Miguel. "Busco entender o carnaval do Rio não como alguém de fora, mas como quem está inserido no espetáculo, que pensa e vive aquele processo criativo", explica.
n Performance do mestre-sala e da porta-bandeira n Núcleo tem duas
n Filmes provocam emoção
n Prêmio conhece metodologia
A linguagem cinematográfica foi a escolhida por condensar, na mesma história, emoção e fundamentos éticos, algo positivo, na visão da médica infectologista e virologista Rita Medeiros, lembrando que a disciplina poderia ser ministrada de muitas outras formas, mas a exibição de filmes, aliada à discussão, tem produzido bons resultados e o principal deles é a reflexão sobre a conduta profissional. De acordo com a coordenadora do Cinemed, os temas mais polêmicos, como aborto, terminalidade e eutanásia, geram muita discussão. “Nem todos agradam à maioria, mas, em geral, os filmes são bons. Os alunos absorvem mais a discussão quando se trata de uma história real, especialmente aquelas vivenciadas na rotina dos profissionais de saúde”, relata Rita Medeiros.
No Encontro Nacional de Epidemiologistas, realizado em Brasília, o Cinemed recebeu o segundo lugar como projeto de extensão. A metodologia foi reconhecida como interessante e inovadora. O Projeto já existe há sete anos e a professora Rita Medeiros atribui o sucesso à maneira diferente utilizada para abordar a ética médica. O mais comum, segundo ela, seria levar a turma para o Conselho Federal e lá ter uma aula formal. “Não é fácil verificar a mudança no comportamento ético dos residentes, mas estudos posteriores envolvendo nossos egressos poderão ser desenvolvidos em parceria com o Conselho Regional de Medicina. No momento, já consideramos positiva a discussão e a reflexão sobre temas tão polêmicos, um exercício pouco praticado durante o ensino médico”, avalia a professora Rita Medeiros. Rose Sheyla Rodrigues Carneiro, médica residente em Infectologia,
No ano passado, um dos temas tratados foi o aborto e a discussão foi além do ponto de vista jurídico - ser a favor ou contra - abordando a pos tura de um médico diante de uma mulher que quer abortar ou que já abortou. “As reações foram bastante curiosas para quem vai ser médico e não advogado. A pessoa deve ser vista primeiro como paciente precisando de cuidados e não como alguém que está indo contra a lei”, afirma a professora. Além dos temas recorrentes, o Cinemed também abre espaço para assuntos como a pesquisa de drogas para alguns tratamentos. Recentemente, foi exibido um filme que tratava da descoberta do HIV e a discussão posterior girou em torno de bioética e da ética profissional durante a pesquisa.
á dez anos, o carnaval, como tema de pesquisa acadêmica, era bastante estigmatizado nas universidades brasileiras. Mesmo no Rio de Janeiro, capital do grande carnaval, a academia era refratária à ideia de estudá-lo. Tal situação foi herdada da formação acadêmica que privilegiava os estudos ligados às áreas de comprovação quantitativa mais imediata, como as ciências exatas. O estigma não atingiu somente o carnaval, mas todas as manifestações culturais circunscritas à tradição popular. Felizmente, o quadro acima está sendo superado, nos últimos anos, por pesquisadores interessados em mostrar que o carnaval, para além de espetáculo consagrado mundialmente, é, também, uma enorme fonte para a produção de conhecimento pela academia. Em Belém, o estudo do carnaval está ligado, sobretudo, ao nome de Miguel Santa Brígida, professor da Escola de Teatro e Dança da UFPA (ETDUFPA). Depois de concluir o mestrado, quando estudou a utilização de elementos do carnaval no Auto do Círio, Santa Brígida fez o percurso inverso, no doutorado, ao estudar a conversão do Círio de Nazaré no carnaval carioca de 2004, quando a Escola de Samba Viradouro reeditou o enredo em homenagem à maior festa religiosa dos paraenses. Ou seja: a conversão da maior festa religiosa dos paraenses dentro do maior cortejo profano que é o carnaval. Na Tese de Doutorado "O maior espetáculo da terra: o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro como cena contemporânea
Márcio Santos
Carnaval perde o estigma marginal e ganha núcleo de estudo científico
participou do Projeto Cinemed no período do Internato e da Residência Médica e, para ela, a experiência foi positiva. Rose Carneiro conta que, fazendo uma comparação com a metodologia tradicional, o projeto é uma maneira mais estimulante de abordar temas polêmicos e situações do dia a dia na assistência à saúde. “Durante o período em que participei do Cinemed, os filmes apresentados chamaram a atenção para questões importantes que, talvez, se ministrados nos moldes clássicos, em sala de aula, não teriam marcado tanto. Tivemos discussões calorosas em certas sessões, como na exibição do filme ‘Regras da vida’, que nos fez discutir muito sobre aborto. Tratamos bastante sobre a humanização da Medicina, já que, muitas vezes, nos identificamos com a figura do paciente, abrindo possibilidade para um atendimento melhor em todos os sentidos”, finaliza Rose Carneiro.
O próximo passo na carreira acadêmica de Santa Brígida será estudar a relação do giro dos orixás com a dança do mestresala e da porta-bandeira no pósdoutoramento que realizará no Núcleo de Estudos e Pesquisas e Performances Ameríndias e Africanas (Nepaa), da Unirio. O trabalho terá por título "A dança do mestre-sala e da porta-bandeira: performance e ritual na cena afrobrasileira". Há 17 anos ministrando a disciplina Técnicas Corporais II, Miguel Santa Brígida pesquisou e utilizou em sala de aula mitos universais, mas, nos últimos cinco anos, concentrou sua investigação sobre mitos afro-brasileiros. Seus estudos no mestrado e no doutorado lhe proporcionaram um olhar mais acurado sobre a matriz africana na cultura brasileira. Em 2008, o pesquisador foi contemplado com o Prêmio de Pesquisa, Experimentação e Direção Artística em Dança pelo
IAP, resultando daí o espetáculo: "A dança do mestre-sala e da porta-bandeira: instalação coreográfica". Foi um momento de experimentação em que relacionou a performance do casal com as histórias em torno de Iansã e Xangô, dois orixás do batuque afro-brasileiro. Entre as várias histórias que cercam esses dois orixás, o pesquisador identifica uma disputa amorosa. “Há sempre uma contracena de sedução e de erotismo entre eles, que incorporei na pesquisa e no espetáculo", conta. No espetáculo, Miguel Santa Brígida associou a dança do mestre-sala e da porta-bandeira com questões da dança contemporânea. Durante um ano, ele se dedicou ao estudo da dança, quando, então, mergulhou profundamente na matriz africana. O pesquisador levará para o pós-doutoramento a somatória de seus estudos e experimentações. O trabalho será orientado por Zeca Ligiéro,
coordenador do Nepaa e um dos maiores especialistas em estudo da performance afro-ameríndia. Em função da questão da matriz africana na sua pesquisa, Santa Brígida vem orientando muitos trabalhos na UFPA. Em 2008, por exemplo, ele orientou uma pesquisa sobre a performance da cabocla Mariana no culto Mina em Belém. “Atravessei noites em terreiros com a minha orientanda. Acabei descobrindo uma configuração de Belém toda especial", conta o pesquisador. "Por meio dela, consegui entender, para além do que já conhecia historicamente, a raiz antropológica do samba em Belém". Essa imersão possibilitou ao pesquisador entender por que surgiu em Belém a quarta escola de samba do Brasil, o "Rancho Não Posso me Amofiná", fundada pelo negro Manito. "Não é só uma questão histórica, há uma configuração antropológica e de ancestralidade negra nessa cidade muito especial”, afirma.
linhas de pesquisa
Na Escola de Teatro e Dança da UFPA, Miguel Santa Brígida coordena o Tambor - Núcleo de Estudos de Carnaval e Performance, que atua em duas linhas de pesquisa, o estudo da criação carnavalesca e a etnocenologia e os estudos da performance. O Núcleo conta com pesquisadores associados e, recentemente, recebeu dois novos professores: Cláudia Palheta e Beto Benone, ela é a carnavalesca e ele, o responsável pela comissão de frente da Escola de Samba BoleBole. Os dois irão aproveitar suas experiências no carnaval paraense para o desenvolvimento de pesquisas científicas. Na ampla sala onde Miguel Santa Brígida ministra aula, não há cadeiras escolares. A única peça visível é um tambor e não é por acaso. Tudo começou quando o pesquisador descobriu que Belém tinha mais de 2 mil terreiros, "aquilo foi um sinal para mim. Entendi a importância do tambor no carnaval e no terreiro paraense”.
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BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Fevereiro, 2010 –
Literatura Alexandre Moraes
Nutrição
Vida e obra de Eneida de Moraes
Pesquisa descreve perfil alimentar de estudantes
"E
neida sempre livre/ Eneida sempre flor/ Eneida sempre viva/ Eneida sempre amor". Os versos de João de Jesus Paes Loureiro definem bem o significado da vida e da obra da escritora Eneida de Moraes. Sua vitalidade e ternura estão eternizadas em cada linha escrita, em cada amor vivido, em cada conquista política. Por isso o livro Eneida-Memória e Militância Política, escrito pela professora Eunice Ferreira dos Santos e lançado nas comemorações do décimo quinto aniversário do Grupo de Estudos e Pesquisa Eneida de Moraes (Gepem), é um documento precioso para a história brasileira. Tanto proporciona a melhor compreensão de contextos sociais do País, quanto mantém acesa a memória dessa mulher que viveu o seu tempo como poucos. Resultado da tese de doutorado defendida no Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o livro é fruto da grande paixão da pesquisadora Eunice dos Santos pela obra de Eneida de Mora-
Reprodução
Biografia traz percurso intelectual da escritora paraense Abílio Dantas
Livro foi lançado durante o 15° aniversário do Gepem
es. "Desde a graduação, encantei-me pelos escritos de Eneida. Depois, no curso de mestrado, fiz um trabalho enfatizando a questão textual em sua obra e descobri que havia lacunas históricas sobre seu legado intelectual", afirma a professora. Entre os anos 2000 e 2004, Eunice dos Santos pesquisou por várias cidades do Brasil, consultou, inclusive, o Arquivo Público do Rio de Janeiro (APERJ) e os prontuários da extinta Delegacia de Ordem Política e Social (DOPS) buscando de informações para o seu objeto de pesquisa: uma biografia intelectual de Eneida. Reuniu 5.850 peças documentais que, hoje, fazem parte do acervo do Gepem. Para contar a história da autora de Aruanda, a estudiosa preocupouse com uma questão fundamental quando o assunto é a vida de uma escritora: a linguagem. As três partes que compõem o livro são construções literárias e os seus títulos assim como os títulos dos capítulos fazem referência aos textos da biografada. "Ouçam o ruído dos Jacumãs", título da primeira parte, foi retirado de um trecho do livro Cão da Madrugada, primeiro livro da fase memorialística de Eneida.
n Aulas particulares despertam pensamento crítico "Eram três horas e a tarde prometia ser morna". Assim, Eunice dos Santos começa a narrar a vida da militante dedicada do Partido Comunista. Filha de um comandante e de uma professora, o nascimento do pensamento crítico na menina pode ser atribuído às aulas particulares de sua mãe. Nunca faltavam comentários políticos sobre a disputa eleitoral em Belém do Grão Pará. Depois, vieram os livros de autores como Máximo Gorki e Victor Hugo, que
lhe emocionavam com narrativas em que os poderosos eram enfrentados. Caminho natural para uma menina, cujo nome fora uma homenagem da mãe à obra clássica do poeta Virgílio, Eneida. Muito cedo, a menina aprendeu o que era repressão. Ainda não completara dez anos de idade quando foi para o Colégio Sion, internato localizado em Petrópolis. Lá, a rotina era muito rígida. Havia horários fixos para as refeições e
limitações quanto aos dias de visita. Talvez tenha sido nesta época que o significado da palavra Aruanda – lugar onde todos podem ser livres e viver em paz – surgiu em sua mente. Durante toda a vida, buscou transformar o mundo em Aruanda, tanto por meio de sua literatura, quanto da vida política. Quando voltou para Belém, em 1918, o mundo havia passado pela Guerra Mundial de 1914 e novas ideias habitavam a mente de Eneida.
Nomes como Stalin (que daria mais tarde para um gato seu), Lênin e Trotsky significavam palavras como transformação, liberdade e justiça; representavam questionamentos profundos ao sistema capitalista. E a capital do Pará também mudara. Surgiram revistas que já anunciavam o nascimento do Movimento Modernista no Brasil, como A Semana e Efemeris. Neste contexto, a futura escritora começou a escrever seus primeiros ensaios poéticos.
n Eneida levou a militância política para fora do Brasil "Tudo na vida de Eneida era extremamente intenso, vivido com fervor", afirma a pesquisadora Eunice dos Santos. Em seu livro, isso fica explícito quando notamos o envolvimento que há entre a literatura de Eneida e a sua orientação ideológica. A crônica, gênero literário que é fruto da mistura da linguagem poética com o jornalismo, foi escolhida por ela por possibilitar uma aproximação maior com o leitor, já que circulava em jornais. A partir de 1926, a escritora passou a assinar seus textos apenas com o primeiro nome. Segundo ela, fazia isso para que ninguém responsabilizasse "nem o pai nem o marido pelos delitos que cometesse". Decidida a entrar para o Partido Comunista, em 1930, mudou-se para o Rio de Janeiro, deixando marido e dois filhos em Belém. Durante o governo autoritário de Getúlio Vargas, Eneida sofreu inúmeras prisões. "Em todos os feriados nacionais,
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Eneida era presa, pois eram nesses dias que costumava haver manifestações contra o governo. E ela já era muito visada", afirma Eunice dos Santos. Sua primeira prisão ocorreu em 1932, por distribuir material de propaganda do partido. A participação na tentativa de Revolução no Brasil, liderada por Luís Carlos Prestes, em 1935, levou à sua segunda e mais demorada prisão. Eneida passou um ano e cinco meses presa na Casa de Detenção da Rua Frei Caneca, no Rio de Janeiro. Encarcerada na sala 4, foi companheira de mulheres como Maria Werneck de Castro e Olga Benário, da qual foi intérprete na cadeia, pois esta só se comunicava em francês. Mesmo presa, Eneida continuou extremamente ativa. Criou, junto com seus companheiros que faziam parte do Coletivo, organização que promovia oficinas e comícios no pátio da prisão, a Rádio Liberdade. A programação era formada por
notícias trazidas pelos visitantes e pela declamação de poemas. Segundo Eunice dos Santos, Eneida tinha uma voz muito bonita e forte, o que a fez contribuir com a locução dos programas. "Pode-se dizer que ela exerceu a profissão de radialista por conta do trabalho na Rádio Liberdade. Por onde passava, ela inventava uma forma de lutar pelas coisas em que acreditava", constata a pesquisadora. Eneida também levou sua militância política para fora do Brasil. Morou algum tempo em Paris, sendo informante de brasileiros pelo Partido Comunista, e proferiu quatro conferências sobre literatura na China. Nessa viagem ao oriente, foi representando a União Brasileira dos Escritores (UBE), entidade da qual fazia parte com outros escritores, como Jorge Amado e Peregrino Júnior. Muitas organizações e grupos contaram com os esforços e a participação de Eneida ao longo dos anos.
Da autora de História do Carnaval Carioca, nasceu outro tipo de organização, bem menos sisuda – o "Baile do Pierrô". Neste baile, realizado tanto no Rio de Janeiro quanto em Belém, Eneida demonstrava todo o seu amor e respeito pelo carnaval. Carinho retribuído por duas escolas de samba com a realização de sambas-enredo tendo Eneida como tema: o Salgueiro, do Rio de Janeiro, e o Quem São Eles, de Belém, cujo refrão abriu esta matéria. E se Eneida estivesse viva hoje, estaria lutando pelo quê? "Com certeza, pelas crianças do Brasil. Esse era um tema que a emocionava muito. Eneida, se estivesse viva, estaria lutando pela melhoria da educação", afirma Eunice dos Santos. Infelizmente, a maioria dos livros dessa lutadora está com as edições esgotadas há décadas. É preciso cobrar a reedição dessas obras urgentemente, em respeito ao país pelo qual ela tanto lutou.
O objetivo é contribuir com estratégias que melhorem a alimentação dentro da Universidade
Opções nada saudáveis: frituras, doces e refrigerantes compõem o cardápio da maioria dos entrevistados Igor de Souza
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rabalhos, provas, seminários, artigos, aulas e estágios são atividades que compõem o cotidiano da maioria dos estudantes universitários. Com tanta coisa para fazer, nada melhor do que ter uma alimentação saudável e balanceada para suprir o gasto de energia no dia a dia. Mas, será que o estudante da Universidade Federal do Pará possui a preocupação com a alimentação correta? Instigada com essa
pergunta, a pesquisadora Vanessa Mayara Souza Pamplona escreveu a monografia “Perfil dos hábitos alimentares dos discentes da Universidade Federal do Pará", na qual responde essa dúvida apresentando dados estatísticos referentes ao ano de 2009. O trabalho foi requisito para a titulação de Vanessa Pamplona na Especialização em Bioestatística, do Instituto de Ciências Exatas e Naturais da UFPA (ICEN), por meio do Laboratório de Sistema de Informa-
ção e Georreferenciamento (Lasig). Sob orientação do professor Edson Marcos Leal Soares Ramos, a monografia contou com uma amostra de 451 alunos de idade igual ou superior a 15 anos, sendo todos regularmente matriculados nos cursos do Campus de Belém da Universidade, com exceção dos cursos a distância. Os dados foram recolhidos a partir de entrevistas feitas com os estudantes pelo Grupo de Estudos e Pesquisas Estatísticas e Computacionais (Gepec/UFPA), do qual
n Arroz e feijão estão entre alimentos preferidos Verificou-se que, entre os alunos da UFPA, 89,58% não fazem nenhum tipo de dieta. Os alimentos e as bebidas mais escolhidos pelas mulheres são arroz (97%), feijão (93%), açúcares (92%), refrigerantes (82%) e as frituras (81%). No caso dos homens, a situação é quase a mesma, sendo os seguintes alimentos e as bebidas mais consumidos: arroz (97%), feijão (95%), açúcares (95%) e refrigerantes (89%). Cerca de 52% dos discentes consomem verduras de 1 a 4 dias, sendo que as mais consumidas são alface, repolho e couve. Além disso, 51,44% dos entrevistados consomem
frutas de 1 a 4 dias por semana. As mais consumidas são banana, maçã e laranja. Todavia, o consumo diário de frutas, verduras e legumes é essencial para a saúde do corpo humano, além de combater o colesterol ruim, controlar a obesidade e diminuir o risco de ocorrência de várias doenças. A dieta saudável é um dos principais determinantes para a prevenção das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNTs), as quais estão entre as que mais contribuem para as despesas globais no âmbito da saúde e nos valores de mortalidade. " Um dos fatores determinantes no aparecimento de DCNTs é a má alimentação", esclarece
Vanessa Pamplona. De acordo com a pesquisa, 65,19% dos discentes ficaram doentes de 1 a 3 vezes nesse ano, entre os quais, 60,29% citaram a gripe como a doença mais recorrente. Além disso, 14,25% dos discentes afirmaram ter tido algum tipo de virose no ano de 2009. Uma alimentação rica em frutas, legumes e verduras ajudaria na prevenção desses tipos de doenças, e das doenças pulmonares crônicas e obstrutivas, uma vez que esses alimentos são ricos em vitaminas, minerais e fibras, e devem estar presentes, diariamente, nas refeições e não somente em lanches ocasionais.
n Falta de tempo para a prática de atividade física Outro dado preocupante identificado pela pesquisa é sobre a atividade física dos estudantes da UFPA. Verificou-se que 62% dos discentes não desenvolveram atividade física durante o ano de 2009. Entretanto, mesmo sem atividades físicas, 53% dos entrevistados afirmam que estão com seu peso normal e só 15,40% acham que estão acima do peso. Praticar exercícios físicos com frequência faz parte da estratégia de prevenção das Doenças Crônicas,
pois, além de estimularem o sistema imunológico e moderarem o colesterol, ajudam, também, na saúde mental e na prevenção da depressão. Para a estudante do curso de Jornalismo da UFPA, Brena Ribeiro, a correria do dia a dia é o principal fator para deixar a atividade física de lado. "Curso duas universidades e, com tantos trabalhos para fazer, fica difícil arranjar tempo para frequentar academia ou fazer exercícios em casa", justifica a estudante.
A falta de tempo afeta, também, a escolha dos alimentos no decorrer do dia. Na maioria das vezes, a opção é um lanche rápido e prático (salgados e biscoitos), vendido em vários pontos comerciais na UFPA. Como o Restaurante Universitário da UFPA, que conta com refeiçoes balancedas e saudáveis, só oferece a refeição do almoço durante a semana, muitos estudantes recorrem às cantinas e lanchonetes, trocando as frutas por salgados gordurosos, por exemplo.
Vanessa Pamplona faz parte. O Gepec é formado por uma equipe de alunos e professores das áreas de Estatística, Informática, Geociências e Ciências Sociais da UFPA, os quais desenvolvem pesquisas em diversos âmbitos, como Pesquisas de Mercado, de Opinião, de Audiência, de Hábitos e Atitudes. São serviços que buscam oferecer mecanismos para a solução de problemas e para o desenvolvimento da Estatística em suas múltiplas relações com os âmbitos tecnológicos, sociais e culturais.
n Comer bem para viver melhor A pesquisa “Perfil dos hábitos alimentares dos discentes da Universidade Federal do Pará" foi a primeira que tratou a questão dos hábitos alimentares em dados estatísticos. "A intenção foi, justamente, pegar os dados estatísticos e transformar em informação para que, assim, possam ser criadas medidas e estratégias para melhorar a alimentação dos discentes", afirma a pesquisadora Vanessa Pamplona. No caso da falta das ativ i d ad es f í s i cas n o co t i d i an o dos alunos e da procura pelas lanchonetes, Vanessa Pamplona sugere que "a UFPA potencialize os seus programas relacionados à prática de atividades físicas, realizando-as em vários horários para que possa abranger todos os estudantes da Instituição. O dia a dia deles não traz uma alimentação saudável, já que a maioria come muito doce e fritura. Então, deveria ser aplicada alguma política interna para que houvesse uma melhora nas lanchonetes que funcionam aqui, na UFPA".
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BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Fevereiro, 2010 –
Turismo
Oportunidade
Alunos cotistas são beneficiados com Programa de Bolsas Alexandre Moraes
n Atividades além da sala de aula
Para muitos, bolsa é o único recurso para cobertura das despesas com transporte e alimentação Jéssica Souza
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os 4.494 candidatos classificados no Processo Seletivo da Universidade Federal do Pará em 2009, 1.203 estudantes ingressaram na Instituição como cotistas, por se declararem pretos ou pardos; outros 989 foram contemplados com as cotas voltadas para estudantes de escolas públicas. Eles representam um número significativo de estudantes que, muitas vezes, devido à situação de vulnerabilidade social, sequer conseguem concluir o curso em que foram aprovados. Com o objetivo de garantir aos universitários que ingressaram no ensino superior por meio de cotas a oportunidade de iniciar uma vida acadêmica e científica produtiva, o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), em parceria com a Subsecretaria de Políticas de Ações Afirmativas da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, da Presidência da República, criou o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica-Ações Afirmativas (PIBIC-AF). Em 2009, a Universidade Federal do Pará foi contemplada com 25 bolsas do Programa PIBIC-AF, enquanto projeto piloto. A UFPA se colocou entre as cinco instituições que receberam a maior cota de bolsas previstas pelo Programa, juntamente com as Federais da Bahia, de São Carlos, de Brasília e do Rio de Janeiro. Agora, a Universidade oferta mais 25 bolsas a partir de uma ação conjunta da Pró-Reitoria de Pesquisa e PósGraduação (Propesp) e da Pró-Reitoria de Extensão (Proex), totalizando a
disponibilidade de 50 bolsas. De acordo com as regras do Programa, quem concorre aos editais são os docentes da Instituição, os quais são avaliados segundo a produtividade científica dos últimos cinco anos. Se o projeto de pesquisa do professor for selecionado, ele poderá escolher bolsistas de Iniciação Científica, mas, no caso do PIBIC-AF, a escolha só pode ser feita entre universitários cotistas. “A ideia desses editais, tanto do CNPq, quanto da UFPA, era, exatamente, fornecer ao aluno que entrou por meio de ação afirmativa ou por critérios de vulnerabilidade social a oportunidade de fazer parte da Iniciação Científica da Universidade”, explica o diretor de Pesquisa da Propesp, Antonio Carlos Vallinoto. As Bolsas PIBIC-AF do CNPq e da UFPA estão no valor de R$ 300.
A expectativa é poder aumentar o número de Bolsas do PIBICAções Afirmativas para o período de 2010-2011. O universitário Alfredo Fonseca Andrade, 22 anos, que está no quarto semestre do curso de Biologia, está usufruindo de sua segunda Bolsa de Iniciação Científica. O primeiro projeto de Iniciação Científica já foi concluído. Este ano, o estudante que ingressou na UFPA, em 2008, como cotista proveniente da escola pública foi contemplado pelo PIBIC-AF. Alfredo é bolsista de um projeto sobre Biologia Pesqueira, com enfoque em manejo e ecologia. “O PIBIC me oferta uma excelente oportunidade de aprendizado de metodologias de pesquisa, além de experiências, como viagens e produção de conhecimento", afirma. Na opinião do jovem pesquisador, o Programa permite que os estudantes se dediquem às atividades diferenciadas daquelas do dia a dia de aula. Najara Mayla Costa, de 20 anos, é caloura do curso de Serviço Social. Ingressante na UFPA por meio das cotas para alunos de escolas públicas, a aluna foi selecionada pelo orientador do Projeto de Apoio à Reforma Urbana, vinculada à Faculdade de Serviço Social, como bolsista do PIBIC-AF. A experiência recente com a Iniciação Científica já foi decisiva para o futuro de Najara, que planeja seguir a carreira acadêmica como profissão. "A prática da pesquisa nos permite ver a realidade sobre outro olhar e fomenta a busca incansável de conhecimento. Hoje, estudo para me tornar pesquisadora”. A Bolsa do CNPq mantém a jovem Najara Costa em Belém. Natural de Oeiras do Pará, ela está na capital para concluir o ensino superior. "Com o auxílio financeiro que recebo, arco com as despesas de transporte, alimentação, material escolar e didático para a pesquisa", conta.
n Primeiros resultados serão apresentados em outubro Em agosto de 2009, as Bolsas do PIBIC-Ações Afirmativas vieram como uma boa surpresa para a Propesp, pois a UFPA já tinha realizado a seleção dos projetos de docentes que seriam contemplados pelo PIBIC 2009/10. No total, 392 docentes participaram da seleção, dos quais, 283 receberam entre um e dois bolsistas, totalizando 566 bolsas distribuídas, sendo 336 sob responsabilidade do CNPq; 140, da UFPA e 65, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Pará (Fapespa). "Essa foi a nossa primeira experiência. Esses 50 alunos (25 com Bolsas do CNPq e 25 com Bolsas da UFPA) iniciaram o projeto deles em agosto de 2009. Em outubro,
eles estarão concluindo essa etapa e apresentando o resumo de seus trabalhos no XXI Seminário de Iniciação Científica da UFPA", conta Antonio Vallinoto. Como resultado do PIBIC 2008/2009, foram apresentados 476 resumos no XX Seminário de Iniciação Científica. Durante a vigência da bolsa, o estudante deve cumprir a carga horária de orientação para a elaboração do seu projeto. Cada aluno tem o prazo de doze meses para desenvolver o trabalho. Dentro de seis meses, o bolsista deve apresentar um relatório parcial de suas atividades, o qual será avaliado por consultores internos da UFPA. Ao término do prazo de um ano, o relatório final é apresentado de
forma oral, em seminário. "Aí, percebemos que não é só o valor em dinheiro que está em jogo nesse Programa, mas também, e principalmente, a possibilidade de inserir esse aluno em um grupo de pesquisa e incentivá-lo a produzir conhecimento, mostrando a carreira acadêmica como opção profissional", sintetiza. A Iniciação Científica é um projeto do CNPq, cujo objetivo é preparar o aluno de graduação para a prática de pesquisa, que é o que move a sociedade para as grandes descobertas e inovações tecnológicas. Segundo dados da Propesp, graduandos que participam de projetos PIBIC têm mais facilidade de ingressar em programas de pós-graduação, o que
dinamiza a produção científica local e aumenta o número de pesquisadores na região amazônica. Atualmente, a UFPA possui 720 projetos de pesquisa em andamento, sendo a maior universidade da Amazônia em termos de pesquisa. "Os números da Instituição são muito claros neste sentido. A Iniciação Científica é o primeiro degrau dessa escada acadêmica. Mais de 70% dos alunos que ingressam em programas de pós-graduação da UFPA e se formam mestres e doutores no futuro são ex-alunos de Iniciação Científica. Isso traz um retorno social fundamental para a região e permite que a UFPA exerça a inclusão social", observa o diretor de Pesquisa.
Projeto abre portões da Universidade Visitação oferece informações e tour pelo Campus Guamá
Raphael Freire
A
ntes de ser estudante da Universidade Federal do Pará, você já conhecia o campus onde pretendia estudar? Provavelmente, não. Pensando nisso, a Faculdade de Turismo, do Instituto de Ciências Sociais e Aplicadas (ICSA), criou o projeto de extensão "Visitação ao Campus Universitário do Guamá: uma proposta turístico-ambiental para os estudantes do ensino médio da cidade de Belém-PA", coordenado pelo professor José Lúcio Bentes do Nascimento. O Projeto surgiu com a necessidade da Faculdade de Turismo levar seus conhecimentos para a comunidade, aproximando esse grupo do ambiente acadêmico. Alunos de ensino médio, escolhendo a futura profissão, recebem informações sobre a Universidade e os cursos que ela oferece, observando o meio ambiente – rios, animais, pássaros e vegetação típicos da região amazônica. "O Projeto é altamente engrandecedor e produtivo para os alunos do ensino médio, porque muitos passam a conhecer a Universidade. Eles ficam encantados com as possibilidades que a Instituição apresenta em relação aos cursos das
EM DIA
Wagner Meier
Iniciação Científica para todos
Prêmio
Proposta turístico-ambiental envolve alunos do ensino médio diversas áreas do conhecimento", comenta José Lúcio. De acordo com o professor, o Projeto de visita ao Campus oferece, também, uma grande contribuição para os estudantes envolvidos - bolsistas e voluntários, uma vez que estabelece a relação entre aquilo que eles aprendem dentro da sala de aula e o que desenvolvem durante as atividades do Projeto. Esses estudantes aplicam o conteúdo de disciplinas, como Teoria Geral do Turismo,
Geografia do Turismo, Eventos e Ecoturismo, e ainda desenvolvem a relação interpessoal por meio do trabalho em equipe, que exige deles responsabilidade e boa comunicação. “O Projeto acaba nos dando mais maturidade e responsabilidade, ou seja, contribui para a formação pessoal e profissional também. Ele me estimulou dentro do curso e me proporcionou a oportunidade de ingressar na área", destaca Gilson Santos, bolsista do Projeto.
n Palestras, visitas às unidades e bate-papo Inicialmente, os estudantes entram em contato com as escolas públicas e privadas de Belém e do interior e aguardam a confirmação das que têm interesse na visita. Paralelamente, é feito o contato com os institutos, as faculdades e com outras unidades da UFPA para saber quem está disponível para receber os visitantes. Depois de confirmar o convite, a escola deve indicar cinco cursos sobre os quais a maioria dos alunos gostaria de receber informações. Geralmente, os alunos que participam da visita são os que possuem as melhores notas e têm bom comportamento. Chega, então, a hora de receber os futuros alunos da Universidade. A visita começa com uma recepção preparada pelos universitários de Turismo. No auditório do Instituto de Ciências Sociais e Aplicadas, os alunos assistem a palestras com professores dos cursos escolhidos.
Após as palestras, é chegado o momento de conhecer a estrutura e os diversos espaços da UFPA. No roteiro, estão: Prefeitura do Campus, Editora da UFPA, Restaurante Universitário, Biblioteca Central, Laboratório de Engenharia Química, Incubadora de Empresas, Atelier de Artes, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA), Hospital Bettina Ferro de Souza, Laboratório de Biotecnologia. A visita é finalizada com uma pesquisa de opinião aplicada durante um “bate-papo” final no Espaço Vadião. “Durante a visita, aprendi valores sobre o curso de Direito, visitei laboratórios que contribuíram para o meu aprendizado. Antes de visitar a UFPA, eu achava que ela era uma faculdade básica, mas, hoje, vejo que ela é gigante e isso me dá mais vontade de estudar aqui”, revela Breno Brito, 18 anos, estudante do segundo ano do ensino médio. O Projeto já se expandiu in-
serindo escolas dos municípios de Santo Antônio do Tauá, Castanhal, Marabá, Tucuruí, Moju na agenda de visitas ao Campus. De 2007 até novembro de 2009, foram realizadas 41 visitas envolvendo cerca de 2.800 alunos. A intenção é ampliar, ainda mais, esses números, mas, para isso, é necessário que um ônibus realize o transporte dos alunos da rede pública. Além do “Projeto de Visitação ao Campus do Guamá”, a Faculdade de Turismo também participa da recepção dos calouros promovendo o tour denominado “Campustur”, uma programação diferenciada, voltada para os novos universitários da UFPA. Serviço: As escolas interessadas em realizar a visita e as unidades da UFPA que quiserem receber os estudantes podem ligar para 32018046 ou enviar um e-mail para visitacampus@ufpa.br
Bacharelado em Turismo O curso de Turismo foi criado em 1975 pelo Conselho Universitário da UFPA (CONSUN). Pelo fato de estar localizado na região a m a z ô n i c a , o c u r s o, d e s d e então, visa a uma educação de qualidade para uma formação de planejadores de ecoturismo,
em oito semestres. A Universidade Federal do Pará oferece 80 vagas no curso de Bacharelado em Turismo, divididas em duas turmas de 40 alunos cada, ofertadas nos turnos diurno e noturno. O profissional formado em Turismo está preparado para atuar no
planejamento e na gestão do ecoturismo, de empresas turísticas (eventos, agenciamento, hotelaria, transportes e outras), assim como no planejamento, na implantação e na gestão de programas de desenvolvimento turístico local, regional e nacional.
A Dissertação “Casas de Saúde e Assistência Farmacêutica: desafios da saúde indígena em Belém e em Macapá”, de autoria da farmacêutica Jocileide Gomes, recebeu o Prêmio Nacional de Incentivo à Promoção do Uso Racional de Medicamentos. Orientado pelo professor Flávio Leonel Abreu da Silveira no Programa de Pós-Graduação em Saúde, Sociedade e Endemias na Amazônia da Universidade Federal do Pará, o trabalho foi o único representante da Região Norte entre os premiados.
Especialização Estão abertas, até o dia 04 de março, as inscrições para o Processo Seletivo do Programa de Especialização em Patrimônio (PEP), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). A seleção irá preencher as vagas de bolsistas da Turma 2010, distribuídas em diversas unidades do IPHAN no território nacional. Podem participar profissionais recém-graduados em diferentes áreas de formação, que receberão bolsas de estudo durante 12 meses. Para mais informações, acesse o Edital em < http://portal.iphan.gov. br/portal>
Documentário I Acaba de ser lançado o vídeo-documentário "Mulheres, Mães e Viúvas da Terra: sobrevivência da Luta, esperança de justiça", produzido e dirigido pelo professor Evandro Medeiros, coordenador do Núcleo de Estudos em Educação do Campo, do Campus de Marabá. O Projeto foi aprovado na categoria "Estreante", em edital do Ministério da Cultura, de Apoio à Produção de Obras Cinematográficas Inéditas.
Documentário II Inspirado na obra Viúvas da Terra - morte e impunidade nos rincões do Brasil, do jornalista Klester Cavalcanti, vencedor do Prêmio Jabuti em 2005, o vídeo conta como as mulheres assumem a responsabilidade pela sobrevivência da família e a coordenação dos trabalhadores rurais na luta pela reforma agrária, após perderem esposos, irmãos e filhos em meio aos conflitos agrários.
Concurso A Academia Paraense de Letras abre inscrições para o Concurso Literário Anual. Até 31 de março, os interessados podem inscrever trabalhos. Mais informações pelo telefone 3222-0630 e site www.apl-pa.org.br
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Inovação
O mundo invisível da nanotecnologia
Pesquisadores estudam materiais, fenômenos e produtos que não podem ser vistos nem por microscópios
Chip do cartão bancário, pen drive, celular, disco rígido, cartões de memória são exemplos do nanomagnetismo entre nós um bilhão. Se você ainda não conseguiu imaginar algo tão pequeno, olhe para um fio de cabelo seu e saiba que ele mede cerca de 70 mil nanômetros de espessura. Mas se esse mundo parece distante, as descobertas dele se refletem diretamente em nosso cotidiano. Pesquisas sobre as propriedades nanomagnéticas dos materiais estão relacionadas com
aparelhos eletrônicos compactos, como pen drives e telefones celulares. A manipulação de moléculas em escala nanométrica permite a criação de novas substâncias que podem ser utilizadas como base para a fabricação de LEDs e lasers. Simulações computacionais desvendam o comportamento de substâncias e fenômenos observados na Amazônia e buscam indicar
uma forma de converter este conhecimento em materiais e produtos melhores e mais eficientes dos que temos hoje. Já as pesquisas com fótons, metamateriais e nanotubos de carbono podem levar a criação de dispositivos tão pequenos quanto o próprio mundo “nano”, mas que representam um avanço significativo para os equipamentos usados em comunicação.
n Equipamentos com maior capacidade de armazenamento De cartões de banco, motores, transformadores a bússolas e ímãs de geladeira, o magnetismo está a nossa volta de várias maneiras. Embora seja comumente associado aos ímãs, magnetismo, na verdade, é a propriedade que os materiais possuem de atrair ou repelir outros, eletricamente carregados. Para definir se um material é ou não magnético, temos que olhar para o comportamento dos átomos de que são feitos. Ao contrário do que os gregos pensaram, o átomo não é indivisível. Ele é constituído por outros subelementos, como os prótons, nêutrons e elétrons. Enquanto os nêutrons e prótons se localizam no centro dos átomos, os elétrons giram ao redor deste núcleo, porém eles também realizam uma rotação sob seu próprio eixo. Este "movimento" é conhecido como spin. Cada elemento possui número de elétrons, nêutrons e prótons diferente dos demais e seus elétrons, por sua vez, podem ter spin para cima ou para baixo, dependendo do sentido em que estão "girando". Quando o número de elétrons, com estes dois tipos de spin, é diferente, dizemos
que o elemento possui um "momento magnético", portanto, é magnético. Por esta razão, na natureza, apenas o cobalto, o níquel e o ferro são materiais magnéticos, já que todos os outros materiais puros não têm saldo, ou seja, possuem momentos magnéticos nulos. Já as ligas, misturas desses materiais com outras substâncias, em geral, também são magnéticas. Mas se os materiais são definidos pelo tipo de átomos que os constitui e pela forma como estes átomos estão organizados, o que acontece quando mudamos o posicionamento dos átomos? Este tipo de alteração cria um novo material. Investigar os novos materiais que surgem por meio da reorganização de átomos é o objetivo do Grupo Teórico em Nanomagnetismo da UFPA, liderado pela professora Angela Klautau, da Faculdade de Física. "Quando temos combinações de átomos, entre os novos materiais que surgem, muitos apresentam novas propriedades magnéticas. Em colaboração com grupos de pesquisa nacionais e internacionais, nós pesquisamos a chamada física básica em nanomagnetismo, buscando
entender como se comportam esses novos materiais e prever, por simulações computacionais, as propriedades que essas ‘misturas’ podem apresentar”, define a pesquisadora. Descobertas – Ela explica, ainda, que o mundo do nanomagnetismo está mais próximo do nosso cotidiano do que imaginamos. Entre as principais aplicações para as descobertas nesta área de pesquisa, estão os aparelhos com grande capacidade de armazenamento de dados, como celulares, discos rígidos, pen drives e I-pods. Para armazenar um bit de informação dentro de um material magnético, o ordenamento dos momentos magnéticos de seus átomos deve ser estável, ou seja, o sistema deve sofrer, o mínimo possível, a influência de fatores externos, como a temperatura. Essa estabilidade é chamada de "energia de anisotropia magnética” e indica que, num material, dependendo da direção no plano que analisamos, a energia é diferente. “Se todos os spins estão paralelos ao plano, tem-se uma energia. Se eles estiverem de forma perpendicular, temos uma energia diferente
e assim por diante. Se a diferença entre essas energias é elevada, isso significa que é possível manter os momentos magnéticos alinhados em uma dada direção, evitando que as informações associadas a tal configuração se percam", detalha a professora da Faculdade de Física. O Grupo de Pesquisa participou do desenvolvimento de um método teórico para calcular o magnetismo não-colinear em nanomateriais, em parceria com pesquisadores da Universidade do Estado de São Paulo (USP) e da Universidade de Uppsala, na Suécia. "Este é um dos poucos métodos capazes de calcular, no caso de metais, as propriedades magnéticas de nanomateriais com magnetismo não-colinear, isto é, aqueles em que os momentos magnéticos dos átomos no material estão em diferentes direções. Com este método, somos capazes de explicar as propriedades magnéticas de nanomateriais atualmente produzidos em laboratórios e também de predizer propriedades para materiais ainda não manipulados experimentalmente, mas que podem vir a ser obtidos em pesquisas”, revela Angela Klautau.
Sabe aquela pequena luz que acende no computador ou no aparelho de som indicando que eles estão ligados? Ela se chama diodo transmissor de luz, do inglês Ligth Emitting Diode, ou simplesmente LED. Na verdade, os LEDs têm inúmeras aplicabilidades e constituem a base tecnológica para uma nova e extensa linha de produtos que vai de sinais de trânsito a televisores e display de celulares. Pesquisadores do Grupo de Física dos Materiais da Amazônia, da Faculdade de Física da UFPA, em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), propõem a criação de um LED a partir de plástico e óleo de buriti. Os professores Jordan Del Nero, Petrus Alcantara Junior, Sanclayton Moreira, Cláudio Remédios e Antônio Maia integram o grupo de pesquisa que tem trabalhado com a análise de óleos essenciais da Amazônia e cristais dopados e faz parte do Instituto Nacional de NanoBioEstruturas e Simulação NanoBioMolecular, formado por sete instituições de ensino e pesquisa das Regiões Norte e Nordeste, sediado na Universidade Federal do Ceará. A pesquisa que deu origem ao LED, na verdade, estava analisando as propriedades ópticas, elétricas e térmicas do óleo de buriti. Já na década de 90, os pesquisadores da UFPA descobriram que a elevada concentração de carotenoides e de ácido oleico tornava
o óleo eficaz para a proteção solar, especialmente dos raios ultravioletas, também conhecidos como raios UV. O professor Sanclayton Moreira entrou em contato com a professora Maria José Sales, do Laboratório de Pesquisa em Físico-Química de Polímeros da UnB, e os grupos passaram, então, a testar dois tipos de plástico, o polietileno e o metacrilato de metila (PMMA), e a utilizá-los como uma espécie de embalagem que isola micro e nanogotículas do óleo, dando ao plástico as propriedades do buriti. Mas a principal descoberta, que torna a perspectiva de uso do novo material como um LED, é a sua propriedade de fotoluminescência. “O óleo possui a capacidade de não apenas absorver, mas também refletir luz. Poucos materiais têm este potencial. Diante da luz ultravioleta, o óleo, geralmente amarelo, muda de cor e passa a ser verde e isso acontece também com o plástico de buriti que criamos”, revela o pesquisador. Outros óleos de plantas amazônicas estão sendo estudados em busca de uma matéria-prima para a produção de LEDs de outras cores. O novo plástico fotoprotetor pode ter inúmeras aplicabilidades. “Com este material, podemos produzir películas para janelas, carros e óculos, as quais protegerão as pessoas da radiação UV. Já temos produtos no mercado com essa propriedade,
Alexandre Moraes
n Pesquisadores propõem LED com plástico e óleo de buriti
Novo plástico, à direita, pode ser utilizado em películas de proteção UV mas são todos patenteados, com a tecnologia inacessível”, defende Sanclayton Trindade. Por outro lado, já existem, em Belém, sinais de trânsito que são, na verdade, um conjunto de LEDs agrupados. “Para a iluminação pública, é algo inovador, porque consome menos energia, é mais eficiente e tem uma durabilidade superior às lâmpadas. No mercado de telas, essa tecnologia também ganha espaço”, explica o físico. “Em nanociência, quanto menor o LED, mais nítida é a imagem, porque temos como definir melhor o ponto que
queremos acender e em que tonalidade queremos ver a luz. Quanto maior são esses pontos isolados, possíveis de serem acionados, mais ‘borrada’ é a imagem. A produção desses aparelhos tem uma tecnologia cara e estamos oferecendo um material que pode ser a base para a produção de aparelhos tão bons ou melhores que os que estão no mercado, mas com uma matéria-prima abundante no país e uma tecnologia nacional. Teríamos aparelhos mais baratos para nossos consumidores e com competitividade internacional”, acredita o pesquisador.
n Cristais dopados são base para a criação de novo laser Famosos pela beleza de suas formas e cores, os cristais são compostos por estruturas muito organizadas. Os átomos deste tipo de material sempre se posicionam em padrões que se repetem, chamados de redes cristalinas. "As 14 redes existentes dão origem aos vários tipos de cristais que conhecemos. A diferença entre cada um deles está no tipo de elemento químico que o constitui e na posição que cada átomo assume nesta rede”, explica o professor Sanclayton Moreira, pesquisador do Grupo de Física dos Materiais da Amazônia, da Faculdade de Física da UFPA. Os professores do Grupo estão produzindo, em laboratório, os chamados cristais dopados. "Colocamos pequenas quantidades de outros materiais dentro de um cristal, gerando modificados em escala nanométrica. A chave do processo é tentar controlar este crescimento e verificar as propriedades que esses novos compostos apresentam. A esses novos cristais, chamamos cristais dopados”, resume o professor. As pesquisas lideradas pelo professor Cláudio Remédios adicionam metais de transição abundantes na região amazônica, como ferro, alumínio, manganês e níquel, num tipo específico de cristal chamado
Alexandre Moraes
I
magine um universo inteiro na palma de sua mão. Essa é a experiência que cientistas de diversas áreas do conhecimento têm experimentado diante do mundo "anão" da nanotecnologia. Há mais de dois mil anos, os filósofos gregos imaginaram que, se tentássemos dividir qualquer coisa até o ponto em que a fragmentação já não fosse mais possível, encontraríamos o átomo: o indivisível. Hoje, sabemos que toda matéria é composta por átomos e que a forma como eles se organizam, uns em relação aos outros, define os elementos que encontramos na natureza. Essa é a mágica que faz com que o precioso e resistente diamante seja constituído do mesmo carbono que gera o frágil e comum grafite utilizado em um lápis, por exemplo. E se pudéssemos não apenas observar os átomos, mas também posicioná-los onde desejamos? O que poderia parecer ficção científica há cinquenta anos, hoje, é realidade para cientistas que estudam os novos materiais e fenômenos que acontecem num mundo que é invisível não apenas para os olhos humanos, mas também para os precisos microscópios. Na Universidade Federal do Pará, pesquisadores das Faculdades de Farmácia, Física e Engenharia Elétrica descobrem os mistérios desse universo, em que as coisas têm seu tamanho medido em nanômetros, ou seja, medem 10 -9 metros ou um metro dividido por
Wagner Meier
Glauce Monteiro
À esquerda, cristais naturais e, à direita, os dopados - misturados a outros metais KDP. "O KDP é um dos materiais mais antigos e conhecidos pelos cientistas. Ele parece um sal que, quando dissolvido em água e depois submetido a um processo de evaporação, gera um cristal transparente. Na UFPA, antes da evaporação, adicionamos na solução um metal, um outro tipo de cristal ou um agrupamento específico de moléculas, criando um novo tipo de cristal”, descreve o pesquisador. O novo elemento introduzido no composto pode se inserir na rede
cristalina ou substituir algum dos materiais que ali existiam, ocupando o espaço deixado por ele na rede. Isso depende da compatibilidade entre os átomos. Um dos novos materiais testados na UFPA é a mistura de KDP com sulfato e cloreto de manganês, que assumem o lugar do potássio na rede cristalina, fazendo com que o cristal passe a apresentar tons avermelhados. “Os cristais dopados mudam sua reação à absorção de luz, calor, resistência mecânica e elétrica. Propriedades importantes como essas
podem ser aperfeiçoadas com a manipulação de cristais", revela Cláudio Remédios. Os cristais têm a propriedade de gerar o chamado segundo harmônico. Sanclayton Trindade conta que há lasers muito eficientes e potentes, mas que não geram luz visível. No entanto, por vezes, é preciso que consigamos visualizar este laser para uma determinada aplicabilidade, como na área de Medicina para a realização de exames ou cirurgias. Então, o laser é passado por um cristal, como o KDP, que converte uma frequência de onda em outra com o dobro do valor inicial, tornando a luz visível a olho nu. Porém, os cristais que transformam uma cor em outra não o fazem da mesma forma. "Descobrimos que alguns cristais dopados possuem essa capacidade de conversão mais acentuada em relação ao cristal natural. É o caso do cristal dopado com níquel, que produz uma nova frequência de onda em 512 hertz. Não há lasers com esta frequência de onda, o que abre várias possibilidades de investigação científica ao permitir estudos de microscopia capazes de verificar a influência de um novo tipo de onda em um determinado material. Porém outras aplicabilidades ainda deverão ser reveladas”, assegura Sanclayton Moreira.