ISSN 1982-5994
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Bactéria resistente a antibióticos contamina águas da RMB Para a pesquisa, foram coletadas mostras de água de Mosqueiro, do Rio Guamá e do lago Água Preta.
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UFPA • Ano XXXIV • n. 154 • Abril e Maio de 2020
Universidade Federal do Pará
JORNAL BEIRA DO RIO cientificoascom@ufpa.br Direção: Prof. Luiz Cezar Silva dos Santos Edição: Rosyane Rodrigues (2.386-DRT/PE) Reportagem: Adrielly Araújo, Aila Beatriz Inete, Flávia Rocha e Gabriel Mansur (Bolsistas); Walter Pinto (561-DRT/PA). Fotografia: Alexandre de Moraes Fotografia da capa: Walter Pinto Charge: Walter Pinto Projeto Beira On-line: TI/ASCOM Atualização Beira On-Line: Rafaela André Revisão: José dos Anjos Oliveira e Júlia Lopes Pereira Projeto gráfico e diagramação: Rafaela André Marca gráfica: Coordenadoria de Marketing e Propaganda CMP/Ascom Impressão: Gráfica UFPA Tiragem: Mil exemplares © UFPA, Abril/Maio, 2020
Reitor: Emmanuel Zagury Tourinho Vice-Reitor: Gilmar Pereira da Silva Secretário-Geral do Gabinete: Marcelo Galvão Pró-Reitor de Ensino de Graduação: Edmar Tavares da Costa Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação: Maria Iracilda da Cunha Sampaio Pró-Reitor de Extensão: Nelson José de Souza Jr. Pró-Reitora de Relações Internacionais: Marília de Nazaré de Oliveira Ferreira Pró-Reitor de Administração: João Cauby de Almeida Jr. Pró-Reitora de Planejamento e Desenvolvimento Institucional: Raquel Trindade Borges Pró-Reitor de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: Raimundo da Costa Almeida Prefeito Multicampi: Eliomar Azevedo do Carmo Assessoria de Comunicação Institucional – ASCOM/ UFPA Cidade Universitária Prof. José da Silveira Netto Rua Augusto Corrêa. N.1 – Prédio da Reitoria – Térreo CEP: 66075-110 – Guamá – Belém – Pará Tel. (91) 3201-8036 www.ufpa.br
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rio Guamá, as praias de Mosqueiro, o lago Água Preta estão contaminados com bactéria resistente a antibióticos. Esse é o resultado da pesquisa realizada por Roseane de Nazaré Moura e apresentada no Programa de Pós-Graduação em Análises Clínicas (PPGAC/ICB). A dissertação traz, em detalhes, os testes realizados com mostras de água dos três ambientes hídricos e relaciona o nível de resistência da Escherichia coli aos antibióticos betalactâmicos testados. Os resultados servem de alerta para a população e para os responsáveis pela gestão desses espaços. O Grupo de Desenvolvimento Tecnológico em Biopolímeros e Biomateriais da Amazônia, pertencente ao Laboratório de Óleos da Amazônia (GDTec Biomazon/LOA), está transformando a sabedoria das avós em tecnologia de ponta. O estudo coordenado pela professora Marcele Fonseca Passos, além de valorizar óleos pouco conhecidos na região, também aborda questões de sustentabilidade ambiental. Em 2019, o projeto foi selecionado para o 8º Prêmio Instituto 3M para Estudantes Universitários, no qual recebeu Menção Honrosa e Mentoria em Pesquisa e Desenvolvimento. Saiba mais na reportagem assinada por Flávia Rocha. Também nesta edição: Professores do Laboratório de Estudos da Tradução de Soure dão os primeiros passos para a tradução da obra de Dalcídio Jurandir; na comunidade indígena Xie Pihu Renda, no Alto Turiaçu, as mulheres ka’apor estão conquistando novos espaços dentro e fora da aldeia; em Tucuruí, a Faculdade de Engenharia Elétrica criou o Projeto de Extensão Domótica, para reciclar componentes eletrônicos e desenvolver protótipos didáticos. Rosyane Rodrigues Editora
Nesta Edição Dalcídio Jurandir para novos públicos..................................4 Outros caminhos e novos lugares.......................................5 Bactéria resistente a antibióticos contamina Região Metropolitana.... 6 Da matéria bruta ao produto acabado.................................8 Zélia, a professora emérita............................................ 10 Conservação no nordeste do Pará..................................... 12 De onde vem o seu perfume?.......................................... 14 O que diz o computador do caboclo?................................. 16 Tecnologia e sustentabilidade......................................... 17 O nu e o vestido no carnaval carioca................................. 18 "Sonhos são como deuses. Quando não se acredita neles, deixam de existir". Paulinho Moska PS 2020. Foto Alexandre de Moraes
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Opinião Dalcídio Jurandir para novos públicos
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Laboratório de Estudos da Tradução de Soure (Letraduso) surgiu como fruto imediato do Doutoramento Interinstitucional (Dinter) entre a UFPA e o Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (PGET/UFSC), em uma iniciativa conjunta de um grupo de seus egressos de diversas unidades e setores da UFPA. Estrategicamente sediado na microrregião do Arari, o projeto tem como primeiro ciclo de produção, em parceria com a Casa de Cultura Dalcídio Jurandir, estudar e traduzir o proeminente autor marajoara, a começar pelo livro Chove nos Campos de Cachoeira, o primeiro do chamado Ciclo do Extremo Norte. Compõem o grupo de pesquisa e tradução os professores Antônio Sérgio Pinto (Falem/Belém), Ivan Souza (Faculdade de Letras/Castanhal), Lilian Pereira (FACL/ Abaetetuba), Francisco Ewerton dos Santos (Escola de Aplicação da UFPA) e ainda Joaquim Cancela e André Lima, coordenadores do projeto, ambos da
Faculdade de Letras/ Soure. Com base na proposta de Haroldo de Campos e seu Laboratório de Textos (2002), o grupo é formado por profissionais de diversas áreas do curso de Letras, de maneira que as competências se complementam. Dalcídio Jurandir é objeto de estudo de, pelo menos, quatro projetos de pesquisa coordenados pela professora Marli Tereza Furtado (UFPA), sendo o mais recente voltado para a produção jornalística do autor; também de diversos artigos científicos, tais como As oscilações de um ciclo romanesco, escrito por Benedito Nunes, e Dalcído Jurandir, uma leitura do caroço de tucumã: vias de sonho e fantasias, de Rosa Assis; e ainda de teses, como a do professor Paulo Jorge Martins Nunes, Útero de Areia, um estudo do Romance Belém do Grão-Pará, de Dalcídio Jurandir, pela PUC-Minas. A reedição de Chove nos Campos de Cachoeira apresentada por Rosa Assis foi apontada por Roberto Kahlmeyer-Mertens como indicativo do crescente interesse em revisitar a obra de Dalcídio Jurandir que, “durante as primeiras décadas do século XX, foi lido, reconhecido e admirado pelas gerações de Graciliano Ramos e Jorge Amado” (KAHLMEYER-MERTENS, 2011). Em seu artigo de jornal, o colunista escreve sobre a força e a identidade narrativa do romance que compõe o que Benedito Nunes chamou de “ciclo romanesco”, também acerca do enredo do livro e ainda da rotulação sofrida pelo autor, por conta do caráter regional de sua obra. No que diz respeito a esse aspecto, o professor Gunter Karl Pressler (UFPA), que já conduziu vários projetos de pesquisa sobre Dalcídio e sua obra e, atualmente, coordena o Projeto de Extensão “As vozes subalternas. Mulheres na obra de Dalcídio Jurandir”, escreve o ensaio Dalcídio Jurandir - a escrita do mundo marajoara não é regional, é universal, em que aponta o autor marajoara como parte do grito do absurdo na literatura moderna brasileira, bem como discorre sobre a intenção poética e a composição da obra, destacando aspectos como sua linguagem altamente poética, o recurso linguístico moderno e o tempo da narrativa. Para ele, os aspectos regionais na obra de Dalcídio não são genéricos e “expressam a qualidade humana como tal” (PRESSLER, 2002:4). Reforçando este movimento de retorno a Dalcídio Jurandir, o Letraduso apresentará, dentro de dois anos, a primeira tradução de um livro do autor para a língua inglesa, tencionando ainda fazer o mesmo para a língua espanhola no biênio seguinte. Buscando ampliar o alcance da obra do premiado autor marajoara, o grupo inaugura seu trabalho consciente da responsabilidade que tem em mãos e inicia sua jornada de pesquisa e tradução. Joaquim Martins Cancela Júnior – Professor Adjunto da UFPA e coordenador do Projeto Letraduso. E-mail: jmcj@ufpa.br
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Alto Turiaçu
Outros caminhos e novos lugares Educação ressignifica papéis de mulheres Ka'apor Adrielly Araújo Em 2018, a líder indígena Joênia Wapichana, primeira advogada indígena a exercer a profissão no Brasil, foi eleita para representar o estado de Roraima no Congresso Nacional como deputada federal. Isso exemplifica o começo de uma ressignificação dos papéis sociais das mulheres indígenas, que se apropriam de novos lugares dentro e fora da sua tribo. A pesquisadora Leidiani Pena Pinheiro também percebeu essa mudança nas relações de poder na comunidade Xie Pihu Renda, onde dava aulas de português, “eu queria
entender o que ocasionou a mudança naquela comunidade, onde nós tínhamos uma cacica e várias lideranças femininas muito fortes”, explica. Partindo dessa percepção, escreveu sua dissertação intitulada O papel social das mulheres ka’apor dentro da comunidade Xie Pihu Renda/Terra Indígena Alto Turiaçu, apresentada no Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Linguagem, do Campus Universitário de Tocantins/Cametá da UFPA, sob a orientação do professor Jorge Domingues Lopes. Na pesquisa, Leidiani Pinheiro buscou entender como as mulheres conseguiram alcan-
çar posições de poder, em uma comunidade em que os papéis são muito bem estabelecidos, e quais mudanças sociais ocorreram para que isso fosse possível. Para tanto, entrevistou dez pessoas, homens e mulheres indígenas, residentes na comunidade. “Segundo o meu orientador, eu deveria olhar as mulheres não só pelo ponto de vista delas, mas também pelo ponto de vista dos homens, não como uma forma de validação masculina, e sim por entender que não havia uma subjugação ou inferioridade entre os gêneros. Os papéis sociais de homens e mulheres Ka’apor se
completam e são fundamentais para a sobrevivência desse povo. Em minha opinião, essa perspectiva foi o que enriqueceu a minha pesquisa”, avalia Leidiani. A análise foi feita por meio da convivência da pesquisadora com a comunidade. “Eu fiquei cinco anos frequentando o local como professora e, sempre que podia, observava as conversas das meninas. Frequentemente, eu estava entre as mulheres e, durante as conversas, eu perguntava: ‘mas por que isso? por que aquilo?’. Durante todo o tempo, eu estava pesquisando, gravando e anotando”, conta a professora.
A pesquisa rompeu com lugares-comuns na comunidade De acordo com Leidiani Pinheiro, um dos principais motivos para a construção da pesquisa foi a “quebra” dos lugares-comuns na comunidade, o que justifica a necessidade do estudo. “O papel da mulher não incluía o de liderança, isso era algo novo para elas, que tinham o papel de cuidar da casa, dos filhos, da roça. Mas sentar entre os homens e discutir política, educação e saúde é algo recente. As mulheres passaram a ocupar esse lugar, a sentar ao lado deles e discutir no mesmo nível”, explica. A pesquisadora alerta que não se deve pensar na mulher Ka´apor como um ser fragmentado, passível de ser estudado por partes, deve-se tentar enxergá-la como um todo que compõe o “ser mulher”, entendendo que, ao sair do ambiente escolar, ela ainda será mãe e esposa e terá que desenvolver atividades sociais e culturais na tribo. Leidiani Pinheiro manteve seu foco na educação e em como ela abriu espaço tanto para as mulheres em suas comunidades quanto para os homens e as mulheres na sociedade não indígena. “Com base no que vivenciaram, os Ka’apor veem na educação a ‘fórmula’ para visibilidade das suas necessidades,
reivindicações, lutas e, também, de sua cultura. Durante conversas e entrevistas, a importância do estudo era sempre mencionada, pois, assim, poderiam lutar por seus direitos, saberiam agir diante das dificuldades e participar das decisões que dizem respeito ao seu povo e às suas comunidades”, conta a pesquisadora. A professora pôde constatar como a educação favoreceu a mudança do comportamento feminino na tribo. “Observei de perto essa transformação da mulher indígena. A escola contribuiu para que elas pudessem participar mais, ocupando espaços dentro e fora da comunidade. Elas estão trabalhando como auxiliar de saúde bucal, auxiliar de enfermagem, professora etc. Existe um novo acesso e as mulheres estão ocupando espaços que não existiam ou que só os homens podiam ocupar”, revela. Leidiani Pinheiro alerta para o que chama de negligência governamental, “o que eu mais temo com relação a esses povos é a falta de cuidado por parte do governo, como já ocorre em relação à invasão das terras tradicionais”. A pesquisadora lembra que o governo é responsável por todas as pessoas em território nacional, indígena ou não indígena.
ACERVO DA PESQUISA
Além de mãe e esposa, hoje, a mulher Ka’apor ocupa espaços que, antes, não existiam ou que só os homens podiam ocupar.
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Bactéria resistente a antibióticos contamina Região Metropolitana Em Belém, foram analisadas águas do Rio Guamá, do lago Água Preta e das praias de Mosqueiro Gabriel Mansur
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água é indispensável para a manutenção da vida dos organismos vivos. Além de consumi-la em sua forma potável, nós a utilizamos de várias maneiras: cozinhando os alimentos; lavando a louça, a roupa e o carro; tomando banho em casa ou na praia. Entretanto a ação do homem vem poluindo cada vez mais nossos reservatórios. A água contaminada causa problemas ambientais e compromete a saúde da população. Geralmente, a água é contaminada pelos esgotos ou pelo descarte irregular de resíduos sólidos. Outra forma de poluição pouco discutida ocorre pelo descarte de medicamentos. A falta de tratamento dos esgotos hospitalares, local em que ocorre intenso uso de fármacos, e o descarte irregular por parte do consumidor, que despeja os medicamentos em lugar impróprio,
são exemplos de poluição do ambiente hídrico. Entre as medicações descartadas, estão os antibióticos, que causam grande impacto ao meio ambiente. Os antibióticos mais utilizados no ambiente hospitalar são os da classe dos betalactâmicos. Uma das suas utilidades é combater doenças causadas por bactérias que podem ser contraídas pelo consumo da água contaminada, como diarreia e febre tifoide, que ocorrem com frequência na região amazônica. Com base nesse quadro, a pesquisadora Roseane de Nazaré Moura Vieira procurou demonstrar em sua dissertação a ocorrência de Escherichia coli – bactéria presente no intestino dos seres humanos e dos animais homeotérmicos – resistente aos antibióticos betalactâmicos no ambiente hídrico. A dissertação Ocorrência de Escherichia coli com perfil de resistência aos antibióticos beta-
lactâmicos em ambiente hídrico urbano do município de Belém, Pará foi orientada pela professora Karla Tereza Silva Ribeiro e defendida no Programa de Pós-Graduação em Análises Clínicas (PPGAC/ICB). “Partindo do princípio que a saúde humana e animal está diretamente ligada às condições dos ecossistemas onde vivem, foi possível verificar que a presença da bactéria E. coli, com perfil de resistência aos betalactâmicos, constitui risco à saúde da população”, como explicou Roseane Moura. As bactérias, para continuarem a existir, criam mecanismos de resistência e dificultam a terapia com medicação. Isso pode ocorrer pelo consumo incorreto de antibióticos ou pela contaminação da água por medicamentos e pelas bactérias Escherichia coli, que passam a estar presentes em ambiente propício para a troca de genes de resistência.
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Análises clínicas Bactéria está presente no intestino humano e animal As bactérias da família Enterobacteriaceae são encontradas em todos os lugares: água, solo e vegetação. Estão presentes no intestino humano e no dos animais de sangue quente (aves e mamíferos), contribuindo para algumas funções fisiológicas importantes. Entretanto algumas bactérias dessa família podem estar envolvidas em processos infecciosos. A contaminação do meio ambiente por bactérias deveria ser uma grande preocupação para os agentes da saúde pública. Na literatura, a Escherichia coli é considerada a principal indicadora de contaminação fecal da água e de alimentos. Existem seis categorias patogênicas de E.coli causadoras de infecções intestinais. “As doenças causadas por E.coli podem ser desde uma diarreia leve até uma síndrome hemorrágica urêmica, que é uma condição grave ocasionada pela E.coli. As pessoas mais expostas a essas infecções são crianças, indivíduos com resistência baixa e os que viajam para locais em que as condições de saneamento básico são precárias e podem desenvolver o quadro chamado ‘diarreia do viajante’”, adverte a farmacêutica Roseane Moura. Entre os medicamentos indicados para combater as infecções
FOTOS ALEXANDRE DE MORAES
intestinais causadas pelas classes diarreiogênicas de E. coli, estão os antibióticos da classe betalactâmicos. Estes são amplamente prescritos para o tratamento de diversas infecções em virtude da baixa toxicidade para a célula do hospedeiro humano. Para a pesquisa, foram coletadas mostras de água no lago Água Preta, localizado no Parque Ambiental do Utinga; nas praias do Murubira e do Farol, na Ilha do Mosqueiro; e no Rio Guamá. Após as etapas de isolamento e identi-
ficação, a E. coli foi submetida ao teste de sensibilidade aos antimicrobianos, no qual foram incluídos os betalactâmicos. A farmacêutica Roseane Moura chegou à conclusão de que nenhum antibiótico teve 100% de resistência. Os antibióticos Meropenem e Piperacilina+Tazobactam foram os que apresentaram maior eficácia, porque 99% das testagens demonstraram sensibilidade da bactéria ao fármaco. O menor percentual de eficácia foi do antibiótico Cefazolina, com 71%.
35% das amostras de E. coli são resistentes A resistência aos antibióticos variou de 0% a 21%. A Ampicilina foi o antibiótico que apresentou maior percentual. Na classe intermediária de resistência, houve variação de 0% a 24%, em que a Cefuroxima e a Cefoxitina tiveram taxa de 0%; e o antibiótico Imipenem, 24%. Destaca-se que 35% das amostras de E. coli demonstraram resistência a pelo menos um dos antibióticos e no máximo sete, entre os doze testados. A maior taxa de resistência foi ao antibiótico Ampicilina e a maior frequência de testes resistentes ocorreu
no Lago Água Preta (Parque Ambiental do Utinga), no qual 32% dos testes indicaram resistência. No Rio Guamá, apenas 12% dos testes indicaram resistência. Nas praias do Murubira e do Farol, na Ilha do Mosqueiro, o índice foi de 28% em cada uma delas. A pesquisadora ainda alerta que, “no passado, a resistência aos antibióticos era restrita ao ambiente hospitalar. Hoje, ela foi expandida para a comunidade, para o meio ambiente em geral. Em se tratando de corpos hídricos, percebe-se que é um meio propício para a disseminação
de genes de resistência entre as bactérias”. É importante conscientizar os profissionais de saúde e a população sobre o descarte adequado de medicamentos. Roseane Moura ressalta, ainda, a necessidade do tratamento de esgoto, particularmente os das áreas urbanas e os próximos aos hospitais e aos outros serviços de saúde. A disseminação de resistência das bactérias aos medicamentos é um problema de saúde pública, podendo levar à falha do tratamento de pacientes e contribuir para a elevação dos indicadores de mortalidade.
Antibióticos X Escherichia coli Nenhum antibiótico teve 100% de resistência. Meropenem e Piperacilina+Tazobactam: 99% de eficácia. Cefazolina: 71% de eficácia. Ampicilina, Cefuroxima, Cefoxitina e Imipenem: apresentaram taxa de resistência.
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Inovação
Da matéria bruta ao produto acabado Pesquisa transforma óleos amazônicos em bioprodutos odontológicos Flávia Rocha
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s óleos vegetais amazônicos são um elemento essencial da cultura paraense. Pode-se encontrá-los em farmácias, supermercados e, principalmente, em feiras livres. O conhecimento sobre a sua aplicação é passado de pais para filhos, de tal modo que é quase impossível não ter usado algum desses óleos pelo menos uma vez na vida. A maioria de nós conhece as propriedades inseticidas do óleo de andiroba, mas o que muitos ainda não sabem é o papel promissor que os óleos amazônicos têm no desenvolvimento tecnológico do Pará. O Grupo de Desenvolvimento Tecnológico em Biopolímeros e Biomateriais da Amazônia, pertencente ao Laboratório de Óleos da Amazônia (GDTec Biomazon/LOA), criou o Projeto Óleos
vegetais amazônicos: desenvolvimento sustentável e inovação tecnológica de bioprodutos via impressão 3D, o qual tem o objetivo de transformar óleos vegetais amazônicos em materiais que possam ser aplicados na área da saúde, especificamente, em resinas odontológicas. Segundo a coordenadora do projeto, professora Marcele Fonseca Passos, além de valorizar óleos pouco conhecidos na região, o estudo também possui foco em questões de sustentabilidade ambiental. O principal objetivo é, começando do material bruto, desenvolver uma resina que possa ser aplicada numa impressora 3D para, assim, obter bioprodutos de alto valor agregado, como guias cirúrgicos, implantes, entre outros. “Para esse processo, utilizamos o sistema catalítico verde, ou seja, nós usamos catalisadores que não trazem impactos
negativos ao meio ambiente. Além disso, os solventes que estão por trás desse tipo de processo são não tóxicos, quando descartados não trarão prejuízos à natureza. Então tudo foi planejado para que pudéssemos alcançar um processo de produção sustentável”, afirma Elcio Malcher Dias Junior, estudante de Graduação em Engenharia de Bioprocessos e aluno participante do projeto. Dessa forma, a água foi um dos solventes utilizados. “Ao utilizar água, você também reduz o custo. Geralmente, os solventes usados são extremamente caros. Hoje, as resinas existentes utilizam formaldeído (substância tóxica) na sua composição. Nós conseguimos eliminar a sua presença e obter uma resina com características adequadas, utilizando solventes que não prejudicam o meio ambiente”, acrescenta a professora.
Novo material pesquisado não apresenta toxicidade O estudante Elcio Malcher revela que as resinas utilizadas normalmente possuem um baixo grau de toxicidade. No entanto, com o tempo, os polímeros que compõem a resina se degradam, originando monômeros (pequenas moléculas) tóxicos. “Nós já realizamos alguns testes de viabilidade celular e vimos que o nosso material não apresenta toxicidade. Isso é um ponto muito importante”, afirma Elcio. “Com o passar do tempo, esses monômeros podem trazer algum efeito adverso no organismo, como inflamação ou alergia. Essa implicação pode acontecer sem que a pessoa saiba o que realmente se passa no seu organismo”, explica a professora Marcele Passos. No final de 2019, o projeto foi selecionado para o 8º Prêmio Instituto 3M para Estudantes Universitários, no qual recebeu
Menção Honrosa e Mentoria em Pesquisa e Desenvolvimento. “Foi uma forma de estabelecer um vínculo empresa/universidade. Esse edital é de empreendedorismo e proporciona uma nova forma de apresentar as pesquisas para o público, além de verificar a viabilidade do produto para o mercado. Às vezes, aqui, na região amazônica, nós fazemos a pesquisa básica e vendemos aquilo que temos de importante ou transferimos o conhecimento sem transformá-lo em produto e, quando volta para a região, já vem muito mais caro. Então, por que nós não valorizamos o que temos aqui? ”, questiona Marcele Passos. “Primeiro, tivemos uma capacitação sobre empreendedorismo para aprendermos a ‘vender’ a ideia, naquele molde de apresentação que não é tão familiar
para nós. No último dia, fomos para a sede da 3M para expor nosso produto. Foram apresentados cinco trabalhos de diferentes regiões do Brasil. Nós fomos selecionados para representar a Região Norte, levar o nosso conhecimento e apresentar a potencialidade dos nossos óleos”, conta Elcio Malcher sobre a experiência. “Inicialmente, a nossa apresentação estava no estilo dos seminários que fazemos em sala de aula, mas foram necessárias diversas adaptações. O mundo está mudando e é preciso que tanto os professores quanto os alunos se renovem. Nós ainda temos uma mentalidade voltada para o formato da sala de aula, fazendo com que os alunos apresentem seminários de 40 minutos, e isso é cansativo para todos”, avalia a professora.
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Em outro projeto, grupo desenvolve biocurativos “Dentro do GDTec Biomazon, nós trabalhamos com partes específicas de biomateriais. Um dos projetos de que eu participo está relacionado à regeneração óssea. Nós estamos criando scaffolds, que são estruturas tridimensionais que auxiliam a recuperação celular”, conta Elcio Malcher. “Outro projeto nosso são os biocurativos à base de hidrogéis. Pessoas idosas, por exemplo, ficam muito tempo acamadas. Isso pressiona algumas regiões do corpo causando feridas, que nós chamamos de úlcera de pressão. A ferida aberta libera pus, e esses curativos à base de hidrogéis absorvem os fluidos, facilitando a cicatrização. Além disso, dentro desses curativos, nós colocamos um composto bioativo daqui, da Amazônia, com características anti-inflamatórias e cicatrizantes que auxiliam na cura do ferimento”, explica a professora Marcele Passos. ALEXANDRE DE MORAES
A preocupação com sustentabilidade e preservação do meio ambiente é algo que permeia todos os trabalhos do grupo de pesquisa. Segundo Elcio Malcher, o estudo não é voltado apenas para óleos que acabam de ser extraídos, mas também para os óleos residuais. “Você tem um óleo para uma determinada aplicabilidade, depois disso, ele é descartado. É justamente esse resíduo que queremos transformar em material para a área médica. Nós estamos trabalhando em um pré-tratamento no óleo para reutilizá-lo”, expõe. “Essa etapa de reutilização dos óleos ainda está no estágio inicial. Nossos melhores resultados ainda são com os óleos recém-extraídos. Já fizemos vários testes com o óleo de soja, que é um óleo usado na alimentação e possui um descarte imenso”, relata Marcele Passos.
Uma questão importante para que essas pesquisas tenham continuidade é a necessidade de financiamento. “Quando apresentamos o trabalho no Prêmio da 3M, nos falaram que nossa pesquisa usava tecnologia de ponta. Nós temos o conhecimento, o que precisamos agora é de incentivo. Precisamos, por exemplo, da impressora 3D para mostrar os produtos acabados. É importante que as pessoas conheçam as pesquisas da UFPA na área de biomateriais. O investimento que temos são as bolsas de Iniciação Científica, que ajudam muito os alunos, porém é preciso comprar reagentes químicos e insumos para a caracterização dos materiais em prol de desenvolver as pesquisas adequadamente. Esses custos, muitas vezes, têm como fonte recursos próprios”, alerta a coordenadora.
Na foto abaixo, o curativo biodegradável com efeito antiinflamatório, que está sendo desenvolvido pelo projeto.
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Entrevista
Zélia Amador de Deus
Zélia, a professora emérita Uma vida dedicada às políticas afirmativas Walter Pinto
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raduada em Letras, a professora Zélia Amador de Deus, em sua trajetória, rompeu com todas as regras da política de exclusão que dominaram, por muitos anos, as relações no Brasil – e insistem em voltar nos tempos atuais. Negra, pobre, nascida numa fazenda do Marajó, onde o avô era vaqueiro, ela foi criada na periferia de Belém. Tornou-se mestra em Teoria Literária e doutora em Antropologia, sempre estudando questões de etnia. Foi professora da UFPA, instituição da qual foi vice-reitora, além de coordenadora de colegiado, chefe de departamento, diretora do Centro de Letras e
Professora Emérita da UFPA Fiquei muito emocionada naquela quinta-feira, embora soubesse previamente que o Conselho Universitário havia aprovado meu nome para a concessão do diploma de Professora Emérita da UFPA. Mas a cerimônia de entrega do diploma foi tão tocante que eu ainda estou sob forte emoção. É uma emoção que vem do reconhecimento de todo um trabalho dedicado à construção de uma universidade plural, inclusiva, em que a arte tivesse, como tem hoje, um espaço dentro da Instituição. Todas as vezes em que estive na administração da Universidade, lutei para que a arte conquistasse esse espaço. E, hoje, eu posso afirmar que a arte é um campo consolidado de conhecimento dentro da UFPA. Paralelamente, continuo atuando no movimento negro, lutando, estudando e propondo políticas de ação afirmativa. Dedico-me à questão das políticas afirmativas desde 1996. De lá para cá, cada vez mais, fui me aprimorando. Passei um ano no Ministério de Desenvolvimento Agrário, trabalhando com políticas de ação afirmativa. Foi uma experiência muito rica, pois pude contribuir para a efetivação de alguns avanços significativos na minha área de atuação. Esse trabalho foi interrompido quando o ministro que havia me convidado teve que
Artes, diretora do Departamento Cultural da Pró-Reitoria de Extensão e coordenadora do Núcleo de Artes. Atualmente, é coordenadora da Assessoria de Diversidade e Inclusão Social da UFPA. Há décadas, tem se dedicado à consolidação da política de ações afirmativas na Instituição, trabalho cujos resultados estão mudando, de forma efetiva, o perfil da UFPA. Em reconhecimento à sua dedicação, a Universidade lhe outorgou o diploma de Professora Emérita. Nesta entrevista, Zélia Amador de Deus conta um pouco do trabalho que desenvolve e dos resultados obtidos, ressaltando que nunca esteve só, sempre contou com a colaboração de grandes parceiros, por isso, afirma, o título que recebeu é também um título coletivo.
se desincompatibilizar para disputar a eleição. O espaço tornou-se, portanto, ruim para eu continuar trabalhando no Ministério. Então, voltei para Belém, com a missão de lutar para a implantação de políticas de ação afirmativa na Universidade Federal do Pará.
A implantação de cotas Não foi uma luta fácil. Criamos o Grupo de Estudos Afro-Amazônicos, que se mostrou um importante espaço de luta para enegrecer a Universidade, não só em relação às políticas de ações afirmativas mas também do ponto de vista da produção de estudos sobre negritude. Partiu do Grupo de Estudos Afro-Amazônicos a primeira proposta de ação afirmativa enviada ao Conselho Universitário da UFPA. Propusemos, em 2003, uma cota de 20% de vagas no processo seletivo para negros, indígenas e quilombolas. Mas a proposta demorou muito tempo nas gavetas. Somente em 2005 conseguimos que ela efetivamente fosse à apreciação do Conselho. Mesmo assim nos instruíram para retirar os indígenas da reserva de vaga, porque a questão estaria contemplada numa outra proposta a ser encaminhada ao Conselho. Porém o processo, até a aprovação da nossa proposta, demorou muito, porque as reuniões que iriam deliberar a questão não
tiveram quórum. Naquela ocasião, o reitor era contrário às políticas de ação afirmativa, mas não tinha uma proposta para contrapor a nossa. Houve uma grande discussão, no entanto a Reitoria não apresentou um argumento consistente. Mesmo assim, verificamos que perderíamos, pois tínhamos, em plenário, apenas cinco votos. Por fim, o representante da ADUFPA apresentou uma proposta muito parecida com uma do MEC, estabelecendo cota de 50% de vagas para estudantes da escola pública. E, desses 50%, 40% seriam destinados aos negros. Essa proposta foi aprovada e o Conselho nem chegou a avaliar a nossa, que estendia a cota para os quilombolas.
indígenas e quilombolas Em 2009, a professora Jane Beltrão e associações indígenas tiveram uma audiência com o reitor, e ele assentiu a proposta de vaga para indígenas da maneira como está agora: duas vagas para indígenas em cada curso da Universidade. A Reitoria era a favor da reserva de vagas para indígenas, mas não para negros, menos ainda para quilombolas. Isso nunca desestimulou a nossa luta em favor dos quilombolas. Por fim, houve a troca de reitor, o professor Carlos Maneschy assumiu, e ele era a favor das políticas de ação afirmativa. Voltamos a apre-
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sentar a proposta, finalmente votada no Conselho em 2012, quando, então, conseguimos aprovar a reserva de vaga para os quilombolas. Penso que, agora, a reserva de vaga está consolidada. Mas, há que se zelar por ela. Isso passa também pela responsabilidade das associações dos povos indígenas e das populações quilombolas. Venho chamando a atenção das pessoas que estão à frente dessas entidades para que tenham responsabilidades na assinatura da declaração de pertencimento. É necessário ter todo o cuidado, porque, às vezes, chegam ao nosso conhecimento denúncias de que alguns presidentes de associações estão dando declaração de pertencimento falsa para quem não é quilombola ou indígena. Todo ano, fazemos um seminário para organizar o edital para indígenas e quilombolas, aberto à participação da Administração Superior, dos indígenas, dos quilombolas e dos presidentes das associações. O que a gente discute nesse
seminário é a construção de um edital que dê segurança e possibilidade de fortalecer o processo cada vez mais.
Imigrantes e refugiados A realização do seminário é muito importante, pois nele a gente decide as regras com os sujeitos que irão participar do jogo. Ele é um instrumento de grande importância. Estamos, agora, com a resolução que chamamos de MIGRE, destinada à reserva de vaga para imigrantes e refugiados. O CEPS já botou no ar a resolução para a entrada de refugiados e pessoas traficadas. Nela constam o número de vagas e as regras sobre quem pode participar do processo seletivo. É mais um avanço da política de ação afirmativa na UFPA, fruto do trabalho da Assessoria de Diversidade e Inclusão Social, criada na atual gestão do reitor Emmanuel Tourinho. Trabalham comigo na ADIS as professoras Izabel Cabral, Milene Veloso e Luiza Canali,
além do corpo técnico, a quem agradeço muito a colaboração, assim como agradeço a todas as pessoas com quem trabalhei na Universidade. O título que recebi é também de todos esses parceiros.
Mudanças na UFPA Não tenho dúvida de que as políticas de ação afirmativa mudaram o perfil da UFPA. Aliás, não sou eu quem diz isso, é uma pesquisa realizada pela Andifes. O perfil da UFPA, durante muito tempo, foi o mesmo: só os brancos e a classe média a frequentavam. Então, um negro que entrava na Universidade apenas justificava a regra de exclusão. A partir da década de 1980, a UFPA começou a mudar o perfil por meio dos campi no interior. Os pobres, que não tinham condições de mandar seus filhos para estudar na cidade, começaram a acessar a universidade no interior. A interiorização, hoje, está em uma nova etapa. Iniciaram com
as licenciaturas exatamente para fortalecer a Educação Básica nos municípios. Hoje, já há bacharelados e, em alguns lugares, foram implantados cursos como Medicina, Engenharia e Direito. A pós-graduação já chegou a alguns campi também. Depois, vieram as políticas de ação afirmativa. Em audiência pública para avaliação da reserva de vaga, concluiu-se que, se a cota não tivesse sido implementada desde 2008, cursos como Comunicação Social, Odontologia e Arquitetura não teriam nenhum aluno negro. A partir de 2012, as cotas viraram lei, garantindo vaga para preto, pardo, indígena e pessoa com deficiência. Hoje, posso dizer: a Universidade mudou, no campo e na cidade. Estamos formando indígena em Medicina e Odontologia; quilombolas em Direito, Pedagogia e Serviço Social, por exemplo. Isso está mudando o perfil não só da Universidade mas também da própria sociedade na Amazônia. Essa é a nossa meta.
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Amazônia Engenharia
Conservação no nordeste do Pará Pesquisa analisa recuperação florestal entre agricultores familiares Flávia Rocha
A
conservação ambiental é um tema que, há muito tempo, tem aparecido em discussões sobre a Amazônia. Em 2019, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais registrou aumento nos números de desmatamento da região, o que atraiu a atenção de diversos países para o local. Quando se fala de preservação da Amazônia, é necessário, primeiramente, controlar a situação do desmatamento. Depois disso, uma das alternativas é a recuperação dessas florestas. Na mesorregião do nordeste do Pará, grande parte de pequenos agricultores realiza essa prática. Dessa forma, o agrônomo Renan do Vale Carneiro desenvolveu a dissertação Experiências de recuperação florestal praticadas por agricultores familiares do Nordeste do Pará,
pelo Programa de Pós-Graduação em Agriculturas Amazônicas (PPGAA/ INEAF), sob orientação da professora Lívia de Freitas Navegantes Alves. “Nós tentamos observar as experiências dos agricultores familiares em relação à recuperação florestal. Não queríamos criar um modelo e levar para os agricultores, mas, sim, tentar aprender com eles”, afirma Renan Carneiro. A pesquisa também contou com o apoio do Projeto Refloramaz e da Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa). Segundo o pesquisador, recuperação florestal significa fazer com que uma área volte a ter suas características e funções ecológicas com certa intervenção. Não há possibilidade de retorno à mata primária, mas consegue-se voltar às funções ecológicas desse sistema por meio de inclusão de espécies vegetais. Para isso, é preciso ter certo nível
de diversidade de espécies. O estudo ressalta que políticas públicas e legislações existentes sobre o assunto tentam padronizar um certo número de diferentes tipos de árvores em um arranjo. Foi realizado um levantamento de 60 experiências em quatro municípios da mesorregião nordeste do Pará: Capitão Poço, Irituia, Bragança e Tomé-Açu. “Nós escolhemos esses municípios porque vimos que lá existem experiências interessantes de agricultores fazendo recuperação florestal. Como os municípios têm contextos sociais e históricos diferentes, as experiências não seriam tão parecidas. O nordeste paraense é uma das regiões mais antigas de colonização da Amazônia, existem pessoas que já residem lá há muito tempo, e isso traz características bem particulares”, explica o agrônomo.
Capoeira e quintal agroflorestal são comuns A dissertação está dividida em três partes. Na primeira, foi feita uma tipologia das recuperações. De acordo com o estudo, a Amazônia possui um nível de regeneração natural muito alto, isto é, quando uma área desmatada cresce sozinha, depois de um tempo sem ser mexida. Também chamada de capoeira, essa técnica de recuperação florestal é comum entre os pequenos agricultores. Outro tipo bastante comum é o quintal agroflorestal, no qual plantas são cultivadas ao redor da casa. Essa área tem a função de sombrear o local com espécies frutíferas, geralmente aquelas que a família gosta de consumir. Foram encontrados cinco tipos de recuperação ao todo. Os outros três são sistemas agroflorestais, ou SAF, que significa cultivar, numa mesma área, diversas espécies de plantas em um certo arranjo, diferente da monocultura, que propõe o plantio de uma só
espécie. O código florestal permite que florestas sejam recuperadas com o SAF. “Existem SAFs com três ou quatro espécies de plantas e outros com 70. Assim, o agricultor decidiu aos poucos onde ele ia colocar cada espécie, de acordo com a luminosidade, o espaçamento entre uma planta e outra. Os sistemas mais complexos (com maior variedade de plantas), do ponto de vista da biodiversidade, são mais interessantes. Porém, do ponto de vista da produção, nem tanto, porque você tem ‘um pouco de tudo’ e fica mais difícil de escoar a produção”, expõe o pesquisador. Na segunda parte, a dissertação busca entender quais são as maneiras de incentivo para essas experiências, como as políticas públicas existentes, e verificar quais experiências motivaram esses agricultores a fazer recuperação florestal. O estudo aponta que, quando
esses agricultores se organizam socialmente em forma de cooperativas ou de associação, há grande contribuição para que eles consigam avançar nessas experiências. Um exemplo é a Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA), que é antiga e renomada, e vende produtos provenientes de áreas de recuperação florestal. O terceiro e último capítulo abordou a trajetória da recuperação florestal nos municípios, com base em uma análise espaço-temporal desses processos e como a incorporação dessas práticas afetou a área. Para isso, foram visitadas duas propriedades com tipos diferentes de recuperação para verificar o que elas tinham em comum e quais foram as suas trajetórias de reabilitação. Uma propriedade era em Bragança; e a outra, em Tomé-Açu. Foi feita uma caracterização da história de cada município e como o contexto influenciou essa experiência.
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Engenharia História influencia a escolha da técnica a ser adotada “Na década de 1920, os imigrantes japoneses foram incentivados pelo Brasil a migrarem para cá. O primeiro lugar de imigração japonesa na Amazônia foi Tomé-Açu. Eles começaram a plantar pimenta-do-reino, uma cultura com a qual estavam bastante familiarizados. Eles plantavam a pimenta em monocultivo, o que pode causar alguns problemas, pois, quando a biodiversidade inicial do lugar é retirada, a plantação fica mais propensa ao aparecimento de pragas e doenças. Na década de 1970, esse sistema começou a entrar em crise, com a devastação de muitos pimentais. Então, os agricultores tentaram mudar a maneira de produzir e isso resultou no uso da técnica de sistema agroflorestal. O plantio em SAF gerou mais sombra para as pimenteiras, trazendo alguns benefícios para elas, como o prolongamento da vida”, conta Renan Carneiro. Para muitos desses agricultores, a conservação do meio ambiente é uma questão de tradição, mas também de sobrevivência. “As pessoas que mais sofrem com o desmatamento são as que mais dependem daqueles recursos naturais. Então eles têm notado os problemas ambientais na prática”, afirma Renan Carneiro. “Além disso, observei que muitos filhos de agricultores têm tido mais acesso à educação e, assim, são profissionais formados que também trabalham no campo. Isso incentiva a preocupação ambiental, pois eles sabem o que estão fazendo e o quanto esse trabalho é importante. Eles estão motivados a fazer isso”, revela o agrônomo. Renan Carneiro também afirma que algumas políticas públicas poderiam encorajar essa prática cada vez mais. “Em todo o país, os municípios são obrigados a comprar, pelo menos, 30% da merenda escolar, a partir de produtos desses agricultores. Nos casos em que essa política é seguida, isso serve de incentivo para a recuperação. Há também o nicho de mercado formado pelo público que quer consumir alimentos produzidos de forma mais sustentável. As feiras de agricultura familiar encurtam a distância entre produtor e consumidor, tornando o preço pelo produto mais justo. Essas oportunidades também proporcionam a interação entre os agricultores, o que permite o compartilhamento de informação”, finaliza.
JOICE FERREIRA
Manoel Antônio de Carvalho, conhecido como “Manoel Branco”, 71 anos, agricultor de Tomé-Açu, recupera florestas principalmente por meio de sistemas agroflorestais. Faz isso desde 2002, quando aprendeu com colegas agricultores a técnica de misturar espécies de árvores entre as linhas dos plantios de pimenta-do-reino. JOICE FERREIRA
Cacho de Bacabi (Oenocarpus mapora H. Karsten), uma palmeira pouco explorada, que vem ganhando muitos adeptos por ser bastante resistente (principalmente à escassez hídrica), tem um sabor que lembra a bacaba e/ou o açaí e é uma boa alternativa para compor um arranjo de sistema agroflorestal. RODRIGO VIELLAS
Saiba mais Foram escolhidos 15 agricultores de cada uma das localidades: Bragança, Capitão Poço, Irituia, Tomé-Açu. A técnica mais usada em Bragança foi regeneração natural; em Capitão Poço, quintal agroflorestal; em Irituia, SAF altamente diversificado; e em Tomé-Açu, SAF pouco diversificado. Algumas das espécies mais cultivadas entre os agricultores familiares do nordeste do Pará são: açaí, banana, cupuaçu, cacau, caju, coco, laranja, limão, pimenta-do-reino e pupunha.
Manoel Geraldo de Carvalho, conhecido como “Duquinha”, 85 anos, agricultor de Capitão Poço, recupera florestas por meio da regeneração natural. Faz isso desde 1994, quando passou a deixar áreas de capoeiras crescerem em sua Reserva Ecológica, como gosta de chamar sua propriedade.
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Pesquisa
De onde vem o seu perfume? A complexa relação entre ilhéus e empresas de biocosméticos Gabriel Mansur
O
Mercado do Ver-o-Peso, em Belém (PA), é conhecido por sua variedade, principalmente pela oferta de produtos amazônicos, como peixes, frutas, medicamentos e artesanato. Outra característica marcante do mercado é a venda de banhos de cheiro e perfumes produzidos com ervas da região. Esses produtos são plantados, colhidos e tratados nas ilhas estuarinas – onde acontece o encontro das águas do rio e do mar, como a Ilha de Cotijuba, na Região Metropolitana de Belém. O uso das ervas para o comércio
internacional remonta aos tempos da colonização portuguesa da cidade, que completou 404 anos em janeiro passado. Orientado pela professora Leila Mourão, João Marcelo Barbosa Dergan, historiador e coordenador de Acervo e Pesquisa do Centro de Memória da Amazônia da UFPA, defendeu a tese Ilhas estuarinas amazônicas: histórias, memórias e apropriação de saberes sobre a flora (1990-2017), no Programa de Pós-Graduação em História (PPGHist/IFCH). João Marcelo procurou compreender a relação dos ilhéus (moradores das ilhas estuarinas) e da flora das
ilhas, dando atenção especial ao cultivo das sementes e raízes aromáticas (Ucuuba, Pracaxi e Priprioca), com as empresas que fazem parte do ramo dos biocosméticos. Além da sua área continental, o município de Belém é composto por 43 ilhas. No século XVIII, houve a concessão de sesmarias pela metrópole portuguesa para incentivar a produção agrícola na região. As autorizações eram para a plantação de insumos como arroz, cacau, entre outros. Em busca de informações e de fontes, João Marcelo Barbosa Dergan releu os documentos referentes
às primeiras concessões e encontrou “cartas de doações e o tipo de plantio que a metrópole portuguesa e o governo brasileiro consideravam necessários para serem implementados nessas áreas”, conta. Os moradores das áreas estuarinas eram obrigados a plantar o que mandavam os novos donos das terras, em troca, continuariam vivendo no local, por meio de arrendamentos. Mas, de maneira informal, os ilhéus cultivavam, para uso próprio, ervas e sementes que, muitas vezes, se diferenciavam do estabelecido pelas normas oficiais.
Diversidade de aromas sempre surpreendeu pesquisadores Durante o século XIX, houve um crescente interesse pelo uso de produtos como perfumes e outros cosméticos, além da busca pela categorização da natureza. Com isso, muitos pesquisadores europeus que passaram pelas ilhas estuarinas se deslumbraram com a diversidade de verde e seus cheiros. As sementes e as raízes já eram utilizadas para a fabricação de sabão; e
as frutas, para a fabricação de licores. Com o conhecimento dos ilhéus, os pesquisadores puderam categorizar melhor a flora. Em sua pesquisa, o historiador João Marcelo Dergan entrevistou diversos moradores de Cotijuba, pois um dos elementos que compõem a sua tese é a história oral, em cruzamento com a história social do trabalho e a história ambiental.
“Para entender o que estava acontecendo no presente, precisei voltar no tempo do passado. O que me norteou foram as memórias significativas dos ilhéus com a cidade, com as ilhas e com o trabalho com as sementes e raízes aromáticas”, explica o pesquisador. Seu Leandro é um dos entrevistados citados na tese e conta que seu pai vendia sementes e raízes no mercado de
A semente de Pracaxi nas mãos de Rosiléa, moradora de Cotijuba e associada do Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (MMIB).
Icoaraci, quando o distrito ainda se chamava Vila Pinheiro. No mesmo local, funcionava a fábrica Conceição, que exportava as sementes da ilha para a Itália. Entrevistada por João Marcelo Dergan, Dona Flávia conta que a coleta e o cuidado com as sementes e raízes foram aprendidos com a sua mãe, Dona Antônia. Portanto se percebe que a relação dos ilhéus com a terra é um conhecimento
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repassado de pais para filhos. Hoje, essa relação se refaz com as empresas do ramo de biocosméticos. Com o passar dos anos, os moradores das ilhas estuari-
nas começaram a fazer algumas reivindicações relacionadas à saúde, à educação, ao direito à terra, entre outras. Com o objetivo de organizar essas reivindicações, foram criadas
diversas associações e centros comunitários. Os Centros Comunitários do Combu, do Furo São Benedito e do Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém são exemplos dessas asso-
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ciações e têm como objetivo promover o desenvolvimento sustentável e econômico da região, além de mobilizar a comunidade para cursos, oficinas e outras atividades.
Associações intermedeiam as negociações com o mercado Em 1999, a Brasmazon, empresa incubada pela UFPA, entrou em contato com várias associações e centros comunitários para estudar a viabilidade do plantio e da coleta de espécies vegetais. Em 2002, a empresa Natura entrou em contato novamente, por meio da empresa Beraca, que havia comprado a Brasmazon. A partir daí, houve diversos debates sobre a possibilidade de plantio e de coleta de sementes e raízes nas ilhas para a venda. Boa parte dos ilhéus trabalha para as associações,
que têm contratos com essas empresas, como Dona Deca, que cultiva priprioca e chega a coletar 1.300 quilos por ano. As associações intermedeiam a relação entre a empresa e os moradores, recebem e repassam os produtos para as empresas e ficam com 10% do valor negociado, que é investido em serviços, oficinas e cursos para a comunidade. Além do necessário para atender ao contrato com as empresas, os ilhéus mantêm plantações de hortaliças, frutas e de outras se-
mentes e raízes que utilizam para fazer biojoias e, assim, complementam a renda com a venda direta nos mercados de Belém. Empresas que mantêm relações sustentáveis com o ambiente ou com as comunidades tradicionais ganham um valor no mercado. “Mas até que ponto há equidade e distribuição de recursos e de ganhos? Até que ponto isso chega ao fornecedor da matéria-prima (sementes e raízes), quando não há descentralização da tecnologia para a produção de
bioprodutos?”, questiona João Marcelo Dergan. Uma nova relação entre ilhéus e empresa foi estabelecida, gerando ressignificações e contradições na relação entre os moradores e a flora estuarina. O tempo de coleta para o mercado é diferente do tempo de coleta e tratamento para o uso próprio. O conhecimento empírico dos moradores das ilhas é importante para o uso mais sustentável da flora, e a tecnologia das empresas contribui para o aperfeiçoamento das atividades de coleta.
Saiba mais Cumaru: Matéria-prima utilizada na confecção de aromas naturais, tanto para gêneros alimentícios quanto para cosméticos de perfumaria. As sementes caem no chão e podem ser encontradas ao redor das árvores, lugar em que são coletadas. O óleo de cumaru é um cosmético natural, usado, principalmente, para a saúde e para a beleza dos cabelos.
Priprioca: Utilizada tradicionalmente nos banhos de cheiro. Suas raízes liberam uma fragrância extremamente agradável de aroma amadeirado. A priprioca é colhida, lavada e ensacada para posterior transformação em óleo essencial. Pracaxi: Suas sementes são catadas nas margens de rio e em áreas de várzea,
depois secam ao sol. O óleo de pracaxi é bastante utilizado no tratamento capilar e como revitalizante para a pele. Ucuuba: As sementes têm uma poderosa manteiga natural, que atua na reparação profunda da pele. Predomina em locais alagados, como as margens dos rios, igarapés e furos.
FOTOS ACERVO DA PESQUISA
Mudas de Ucuuba no viveiro do MMIB. As mudas são plantadas e cuidadas pelas próprias associadas.
Ruínas de um engenho que existiu no século XVIII, em Cotijuba. No local, funcionava uma atividade de branqueamento de arroz.
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Cultura
O que diz o computador do caboclo? Geovanni Gallo criou o artefato para divulgar a cultura marajoara MARCOS SANTOS / AGÊNCIA PARÁ
O Museu do Marajó está localizado em Cachoeira do Arari (PA), foi criado informalmente em 1972 e abriu as portas para o público em 1984.
Aila Beatriz inete
A
cultura marajoara é rica em elementos importantes para a história do Pará, pois foi a que alcançou o maior nível de complexidade social na Pré-História brasileira. O Museu do Marajó, criado pelo padre italiano Giovanni Gallo, tornou-se referência para os estudos dessa cultura. Gallo coletou elementos que deram origem ao acervo do museu e criou os computadores do caboclo. Pensando em entender melhor esses computadores, a pesquisadora Niceléia Muribeca da Cruz desenvolveu no Programa de
Programa de Pós-Graduação em Linguagens e Saberes na Amazônia (PPLSA/ Bragança), sob a orientação da professora Carmen Lúcia Rodrigues, a dissertação Artefatos da cultura material marajoara em contexto de tradução cultural no Museu do Marajó/PA. “Giovanni Gallo e o Museu do Marajó fazem parte das minhas memórias de infância, por meio das narrativas contadas pelas minhas avós, que moraram na Vila do Jenipapo, no mesmo período em que o padre esteve por lá. Decidi investigar a origem dessas narrativas e encontrei tudo lá, ‘armazenado na memória’ desses computadores”, conta a pesquisadora.
Os computadores são estruturas em madeira, em diferentes formatos, e possuem informações cuidadosamente escondidas, que são reveladas mediante um jogo de interação com os visitantes. Os computadores representam a técnica desenvolvida por Gallo a fim de revelar o homem marajoara para quem tem “os olhos na ponta dos dedos”. O principal objetivo da pesquisa era investigar os computadores com base no contexto territorial, analisando sua materialidade e seu conteúdo. “Os artefatos denominados de Computadores do Caboclo Marajoara tornaram-se atração turística do arquipélago, em virtude da sua singularidade”, afirma a professora. “Quando começamos a pesquisa de campo, descobrimos que os computadores não possuíam inventário ou qualquer registro. Então, foi preciso executar as etapas de levantamento, listagem, registro fotográfico, elaboração de fichas descritivas, agrupamento e tabulação dos 67 computadores”, explica Niceléia Muribeca.
Acervo foi reunido com a ajuda da população local Segundo Niceléia Muribeca, o museu nasceu com a missão de se tornar polo de desenvolvimento para a comunidade, por meio da cultura. “Embora não tenha alcançado todos os seus objetivos, Gallo conseguiu reunir, com a sua comunidade, todo esse patrimônio material e imaterial”, analisa. De acordo com a pesquisadora, os computadores do caboclo podem ser considerados artefatos da cultura material marajoara. A materialidade e o conteúdo foram interculturalmente traduzidos em linguagem amazônica, revelando saberes territoriais de culturas em contato.
Em relação à materialidade, embora exista uma variedade de modelos com diferentes mecanismos de funcionamentos, há predominância de 34% para os artefatos do tipo “levanta-e-vê” denominação atribuída por Gallo para a técnica que consiste em levantar uma placa para descobrir a informação escondida por debaixo dela. No que diz respeito ao conteúdo, ele é predominantemente antropológico e natural – 86,5% dos computadores fazem uma aproximação entre o homem e o seu meio natural. “São conteúdos que evidenciam preocupações do
homem com a fauna, a flora, os fenômenos naturais, os modos de produção, os costumes, a linguagem, entre outros temas. Esses dados analisados em conjunto com a literatura de Gallo conduzem à reflexão sobre a intenção do autor, para quem não seria possível apresentar o homem marajoara segregado do seu território ou sem considerar sua cosmologia”, analisa a pesquisadora. “O museu tem fama, atrai turistas, inclusive, de fora do país, mas está localizado em uma região que ainda não oferece um atendimento turístico de qualidade”, avalia a professora. Segundo Niceléia,
outro problema é a falta de acordos de cooperação (público e privado), importantes para uma gestão técnica, do desenvolvimento de pesquisas; e a captação de recursos para a manutenção e conservação das atividades. Para a pesquisadora, sua maior contribuição foi o registro e a divulgação do que existe no museu. “Assim como entregar ao museu as fichas sistematizadas com sugestões de aplicabilidade: desde a elaboração de um inventário técnico até a construção de roteiros de visitação para públicos específicos”, finaliza Niceléia Muribeca.
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Engenharia
Tecnologia e sustentabilidade Projeto aplica tecnologias de automação residencial de baixo custo Flávia Rocha
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lixo eletrônico, quando descartado de forma inadequada, pode trazer diversas consequências negativas ao meio ambiente. Muitos equipamentos são produzidos com elementos como chumbo e mercúrio, que possuem capacidade para atingir as águas subterrâneas do ambiente, contaminando-as. Uma saída para o problema é a reciclagem e a reutilização do lixo eletrônico, e-lixo. Dessa forma, a Faculdade de Engenharia Elétrica do Campus de Tucuruí criou o Projeto de Extensão Domótica, que visa reciclar componentes eletrônicos para o desenvolvimento de protótipos didáticos.
“É comum uma quantidade considerável de discentes dos quatro blocos iniciais encontrar-se desmotivada, o que contribui para o baixo desempenho nas disciplinas e para a evasão. O projeto contribui para a qualidade do ensino e a diminuição dessa evasão”, afirma o coordenador Jefferson Costa. Os equipamentos usados são de pequeno porte, como carregadores de celular, aparelhos rotativos (liquidificadores e furadeiras) e placa-mãe de computador. Após a coleta, realiza-se a análise da integridade e a retirada dos componentes eletrônicos que podem ser reutilizados nos protótipos didáticos, como resistores, capacitores, transfor-
madores, entre outros. “Esses protótipos têm em comum a base em uma plataforma microprocessada de baixo custo como o Arduino, que apresenta desenvolvimento em código aberto e proposta simplificada de prototipagem”, explica o professor. O recolhimento das peças se dá com a campanha Coleta de Lixo Eletrônico, desenvolvida pelo projeto. “Em seguida, seminários semanais são realizados com toda a equipe para discutir a construção dos protótipos e os temas aplicados a realizações específicas de cada um deles. Assim, temos maior integração técnica entre as atividades de desenvolvimento e motivação para vencer as etapas plane-
jadas”, avalia Jefferson Costa. Entre os modelos desenvolvidos pelos alunos, estão bancada de automação residencial, que conta com o acionamento remoto por comando de voz e botões em um aplicativo Android; garra robótica; protótipo de robô autônomo bioinspirado em uma aranha que desvia de obstáculos utilizando sensor ultrassônico; trava eletrônica com controle de acesso por senha numérica. Esta foi instalada na sala do laboratório que abriga o projeto. Essas criações renderam ao projeto o prêmio de Melhor Protótipo de Tecnologia, no II Congresso de Tecnologia e Desenvolvimento na Amazônia (CTDA 2018), realizado em Tucuruí.
Atividades motivam os alunos para novas demandas O coordenador explica que o Projeto Domótica procura incentivar o interesse pelo assunto fora da universidade. Os quatro protótipos desenvolvidos foram apresentados na II Feira das Profissões em Tucuruí, realizada pela UFPA, pela UEPA e pelo IFPA. Integrantes do projeto fizeram uma série de palestras sobre robótica de baixo custo em escolas da cidade. Outra atividade desenvolvida foi a oficina sobre Arduino para alunos de Engenharia Elétrica da UFPA e do nível médio/técnico do IFPA/Tucuruí. “Uma crítica recorrente no curso de Engenharia Elétrica tem sido a falta de atividades que associem a teoria vista em sala de aula à prática de funcionamento dos equipamentos e sistemas. Além disso, devido à rigidez da matriz curricular e às poucas atividades de extensão, a formação dos discentes não apresentava atualização com os problemas contemporâneos da sociedade. O Projeto Domótica pode
solucionar essas carências”, acredita Jefferson Costa. O professor revela que os participantes das atividades promovidas pelo projeto, 50% dos ingressantes de 2019, relataram melhora na motivação em continuar no curso, além do grande interesse em participar do projeto ou ainda realizar outras atividades práticas similares. Além disso, a ação de coleta de lixo eletrônico é uma alternativa sustentável e ecologicamente correta para a construção dos protótipos didáticos, uma vez que os recursos naturais utilizados para a fabricação desses componentes são limitados. Outro agravante é que materiais eletrônicos demoram a entrar em estado de decomposição e são prejudiciais ao meio ambiente. “Assim, buscamos fortalecer a consciência ambiental para que mais pessoas percebam que atitudes que parecem pequenas trazem inúmeros benefícios para a natureza e para a ciência”, conclui Jefferson Costa.
FOTOS ACERVO DA PESQUISA
Nas fotos acima, atividades realizadas em escolas públicas de Tucuruí e uma placa desenvolvida pelos alunos do projeto.
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Resenha O nu e o vestido no carnaval carioca Walter Pinto
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m Corpo e alma do desfile da Sapucaí, a atriz, professora e pesquisadora de arte popular Margaret Refkalefsky envereda pelas entranhas de uma escola de samba do Rio de Janeiro, para propor uma leitura dionisíaca do desfile carioca. É pela ótica do teatro que a autora analisa a montagem do que Joãozinho Trinta conceituou como um “tipo de ópera”, embora ressalte que o espetáculo das escolas de samba seja formado por uma imbricação de várias linguagens artísticas, articuladas de forma harmônica e coerente. Atriz formada pela Escola de Teatro da UFPA, Margaret Refkalefsky participou da criação do Teatro Cena Aberta, com atuação destacada nas décadas de 1970 e 1980, quando o grupo liderado por Luís Otávio Barata demarcou o anfiteatro da Praça da República como palco de suas apresentações em protesto contra a política cultural oficial vigente na época. Era o teatro saindo do palco clássico para as
REPRODUÇÃO
ruas, em interação direta com o público, uma experiência que a atriz reconhece no desfile das escolas de samba. Para a pesquisadora, que fez parte do quadro técnico-administrativo da UFPA e coordenou o projeto de criação do Teatro Universitário Cláudio Barradas, o espetáculo das escolas de samba é um produto artístico novo, que incorporou aos elementos tradicionais – danças, ritmos, percussão - elementos modernos exógenos e do imaginário autóctone. Essa mixagem antropofágica obrigou a instauração de um novo espaço cênico, diferente de todos os espaços teatrais conhecidos: o sambódromo. Foi nesse espaço que o desfile se “transformou em nova forma de arte cênica e, como tal, uma nova forma de pensar o corpo”, diz Margaret, fazendo emergir o principal elemento da sua análise: o corpo, nu e vestido. Em 272 páginas, o livro volta às origens fundantes das escolas de samba, às raízes afromísticas do samba, espaço de resistência das comunidades negras marginalizadas da sociedade carioca. As mulheres, por muito tempo sem espaço em virtude do ambiente machista do samba, ganham destaque na narrativa límpida da autora. Nas casas das “tias” – Tomásia, Ciata, Amélia, Prisciliana, Veridiana, Fé, Ester, entre outras –, o samba vai se desenvolver como ritmo por excelência do carnaval, oferecendo um berço para as futuras escolas de samba. A obra parte do samba rumo ao grande desfile na Sapucaí, num percurso que analisa a transformação dos antigos ranchos em blocos carnavalescos e, posteriormente, em escolas de samba; além do processo de renovação pelo qual passaram as escolas, reconhecendo como protagonistas os carnavalescos Fernando
Pamplona e Arlindo Rodrigues. Chega-se, então, à montagem do carnaval de uma escola de samba do grupo especial, a Porto da Pedra, de São Gonçalo, Rio de Janeiro, para o desfile de 2003. Na segunda parte do livro, a autora analisa o corpo no espetáculo. Busca responder a questões como: Que corpo o desfile coloca em cena? Como as pessoas se inserem no espetáculo? Quais os locais mais representativos do desfile? Partindo da relevância que o figurino assume para o espetáculo, a autora investiga o corpo fantasiado, elegendo como foco a ala das baianas, comum a todas as escolas. A ala desfila com o corpo todo coberto e mantém a silhueta intocável ao longo dos anos. Foi nela que Margaret, a convite do carnavalesco, desfilou na escola. Em oposição ao corpo vestido das baianas, há o corpo nu das rainhas ou madrinhas de bateria. Como ressalta a autora, a nudez é um fenômeno recente no carnaval, emergindo em meados da década de 1970 pelas mãos de Joãozinho Trinta. No entanto, como as situações de nudez são constantes em todos os desfiles, a autora passou a considerá-la como uma forma de fantasia. Entende que a nudez, como elemento do espetáculo, ao permitir teatralizar o corpo das foliãs, concede ao corpo nu a noção de fantasia. Em seguida, analisa os contrastes entre baianas e madrinhas de bateria baseando-se em três filtros: o corpo real, o corpo lúdico e o corpo fictício, para estabelecer, com auxílio do filósofo francês Pierre Bourdieu, as principais características dessas personagens: Madrinha de bateria – prestígio, fama, nudez, individualismo, personalismo, alto ou médio poder econômico; Baianas – memória ativa da escola, tradição, religiosidade, vestimenta, coletividade, anonimato e médio ou baixo poder econômico. Corpo e Alma do desfile da Sapucaí é um livro de leitura fluente que interessa não só aos estudiosos do tema como também a todos que desejarem conhecer o carnaval pela ótica de quem vivenciou a construção do desfile e analisou-o com o instrumental da ciência. Serviço: Corpo e alma do desfile da Sapucaí. Autora: Margaret Refkalefsky. Editora Cultural Brasil, 2019. 272 páginas. À venda na Livraria Fox.
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A Histรณria na Charge
#minhaufpa
UFPA 2020
DESAFIOS DE UMA
AMAZÔNIA
NA
O tema transversal da UFPA, este ano, é “Desafios de uma UNIVERSIDADE na AMAZÔNIA”. Durante todo o ano de 2020, o tema irá pautar eventos e ações que levem à reflexão sobre os desafios e as conquistas da UFPA, como liderança acadêmica na formação de material humano e na defesa de uma sociedade mais justa para todas as pessoas.