issn 1982-5994
12 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Agosto, 2010
Entrevista
Pesquisador investiga relações amorosas transnacionais
JORNAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ • ANO XXIV • N. 85 • Agosto, 2010
Beira do Rio – Do que trata a sua Tese “Putas, Pivetes e Gringos no Brasil Globalizado”? Samuel Veissière – Na verdade, essa é a primeira parte do título, a segunda parte fala do desejo, do sofrimento e da violência nas ruas de Salvador (BA). Então, muitas vezes, quando as pessoas me perguntam sobre o que é o meu trabalho, eu respondo, de maneira simples, que é sobre turismo sexual, mas, na verdade, eu examino questões muito mais amplas do que isso. O que me interessa é entender esse espaço diaspórico que eu chamo de “economia cultural do desejo transatlântico”, no qual, pessoas dos dois lados do Atlântico, procuram liberação e emancipação, procuram construir o que eu chamo de modernidade alternativa por meio do sexo ou das relações amorosas. Procuro entender o tipo de descontentamento sobre a condição pós-colonial e a busca de vidas alternativas mediadas pelo sexo e pelo relacionamento amoroso.
seu corpo e os seus atributos sexuais constituíam o principal meio de sobrevivência. Elas poderiam usar o corpo com a finalidade de mobilidade social e emancipação econômica. Mas será que isso é realmente tão diferente? Será que isso sai dos parâmetros normativos, dentro dos quais as relações entre homens e mulheres estão ligadas no capitalismo? Eu acho que não. Instituições como a família nuclear, a monogamia, o casamento são também formas de transações econômicosexuais. Em muitos lugares no mundo, por falta de oportunidades – sociais, econômicas e educacionais – muitas mulheres não têm outra opção a não ser arranjar um homem para conseguir dinheiro, para ser inserida na rede social. Esse não é um argumento que é só meu, acho que muitas feministas já falaram que o casamento monogâmico, no contexto capitalista patriarcal, não é só uma transação econômicosexual, como também uma forma de prostituição.
Beira do Rio – Explique melhor por Beira do Rio – É nesse contexto que que tanto a prostituição quanto o surge a "economia do coroa"? casamento podem ser considerados S. V. – Existem muitos lugares no transações econômicas? mundo onde, infelizmente, mulheres S. V. – Eu comecei a que não têm muitas pesquisar sobre o assunoportunidades serão to quando estava tentansocializadas para achar do achar uma definição que seus atributos mais do que significava ser importantes são os cortrabalhadora sexual. Na porais e os sexuais e pesquisa, eu uso a palaque encontrar um hovra puta porque muitas mem é a única saída. das minhas interlocutoA "economia local do ras, na Bahia, usavam coroa" é um fenômeessa palavra para se no que a antropóloga auto-identificarem. Ao Donna Goldstein idenexaminar a vida dessas tificou em seu trabalho Infelizmente, eu sobre gênero e sexuamulheres, percebi que aquelas que assumiam não posso falar lidade nas favelas do essa identidade eram Rio de Janeiro e eu do outro sem pessoas que tinham pastambém encontrei em sado por um processo Salvador. Passando falar de mim de conscientização, por muito tempo nas pemeio do qual estavam riferias e nas favelas, mesmo conscientes de que o conhecendo as histó-
rias das pessoas, me dei conta de que, para muitas dessas mulheres, não existem as chamadas “oportunidades tradicionais de mobilidade social”. Elas não terão muita chance de cursar uma universidade pública, de conseguir um emprego bom. Considerando o contexto do capitalismo patriarcal, também não terão oportunidade de conseguir um marido. Então, percebi que uma estratégia importante para quem não tinha emprego, mas tinha filhos, constituindo a típica família matrifocal, era conseguir um amante rico, “um coroa”. Sem querer generalizar, percebi que algumas mulheres sentiam um certo orgulho de conseguir os favores sexuais e econômicos. Mas também me dei conta de como era frágil essa “economia local do 'coroa'”, pois, sempre existem outras mulheres, crise financeira, problemas no trabalho. Para muitas mulheres, essa ideia de usar o corpo como meio de sobrevivência não constituía desvio ou transgressão.
processo como emancipatório e procurei saber como seria esse processo do lado dos gringos. Do que será que eles escapavam? Quais eram as realidades sociais, econômicas, históricas de que eles procuravam escapar?
Beira do Rio – Muitas outras ciências estão utilizando o método de pesquisa antropológico. Explique como seria essa experiência da etnografia experimental? Onde fica o autor nessa ficção etnográfica? S. V. – Eu acho que as relações entre etnografia e ficção, etnografia e literatura são muito importantes e ficaram famosas depois do “Writing Culture” de James Clifford. Nós, antropólogos, somos necessariamente escritores. Mas, infelizmente, trabalhamos dentro de uns parâmetros metodológicos bastante restritivos. A etnografia, como gênero literário, não nos dá muitas oportunidades de explorar a condição humana de maneira profunda por causa da herança positivista e científica, na qual o autor deve Beira do Rio – Quem seria essa prosse colocar como especialista e usar tituta transnacional? uma linguagem seca. S. V. – Seria uma muPor outro lado, temos a lher que passou por um revolução pós-moderna processo complexo de e pós-estruturalista que conscientização sobre paralisa – epistemologicondições de opressão camente – o autor. Uma e que procura sair dessa geração de jovens anrealidade com os únicos tropólogos norte-amemeios que ela percebe ricanos tem se recusado que tem. Eu procuro a fazer etnografia, pois não vitimizar as pesacredita que nós não soas com as quais eu temos como entrar no trabalhei, porque pude pensamento do outro, Meu interesse observar nelas um pencomo estar nas cabeças samento crítico. das pessoas, retomando é entender aquela imagem malinoBeira do Rio – Quem é wiskiana de entender o a economia esse gringo que busca ponto de vista do naticultural do amor e sexo? vo. A etnografia não nos S. V. – É difícil fazer dá essa oportunidade, desejo. uma generalização. E, mas a literatura, sim. estatisticamente, exisNa literatura, você pode tem muito mais transatudo: se imaginar denções românticas, amorosas, econômitro da pessoa, ler seus pensamentos, cas e sexuais entre gringos e brasileiras sofrer com ela. A minha forma de fora desse padrão institucionalizado, o fazer ficção etnográfica é um pouco chamado turismo sexual, e é isso que diferente da de outros autores, eu eu procuro entender. O padrão clásme coloco numa região mais central, sico de estudos sobre prostituição ou com cuidado para não ser narcisista. A turismo sexual, nas Ciências Sociais, Antropologia fala fundamentalmente de um lado, vitimiza a mulher e de sobre o outro, mas que também fala outro, criminaliza o turista sexual. sobre o encontro entre os seres. E, Procurei sair desse padrão. Não infelizmente, não posso falar do outro vitimizei as mulheres ao entender o sem falar de mim mesmo.
Diagnóstico indica diferenças sociais entre alunos dos diversos institutos da Universidade Federal do Pará
Turquesas
Saúde
Voluntariado
Esporte e lazer para crianças da comunidade
Encontrados novos veios em Carajás
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Entrevista O antropólogo Samuel Veissière conversa sobre turismo sexual e relações amorosas transnacionais. Pág. 12
Coluna da Reitoria João Cauby de Almeida Júnior discute a gestão com pessoas no serviço público. Pág. 2
Opinião O professor Gilmar da Silva fala sobre o Projeto Reuni e a interiorização da UFPA. Pág. 2
Há um ano, o Projeto Riacho Doce do Futuro atende crianças e jovens em escolinhas de karatê, judô, capoeira,
xadrez, balé, canto e futebol. A UFPA apoia o Projeto cedendo espaço para a realização das atividades. Pág. 10
Pará tem alto índice de câncer uterino
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Extensão
Proex agita cena cultural de Belém
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Alexandre Moraes
O governo brasileiro tem intensificado as campanhas contra o turismo sexual nas capitais, especialmente as que estão próximas ao litoral, destino certo de estrangeiros que buscam lazer, além dos circuitos turísticos tradicionais. Ao analisar a questão mais de perto, o antropólogo Samuel Veissière revela novos personagens envolvidos nessa história. Em entrevista do Jornal Beira do Rio, Samuel Veissière conversou sobre a sua Tese de Doutorado “Putas, Pivetes e Gringos no Brasil Globalizado”, resultado da pesquisa realizada em Salvador, na qual o autor analisa aquilo que chama de "economia cultural do desejo transatlântico".
Alexandre Moraes
Veissière: "a literatura torna o texto etnográfico mais acessível "
Karol Khaled
Rosyane Rodrigues
Fotos Karol Khaled
Estudo antropológico discute sexo, desejo e sofrimento entre estrangeiros e brasileiras em Salvador.
Grupo de Estudos em Educação e Direitos Humanos (GEEDH), do Instituto de Ciências da Educação (ICED) da Universidade Federal do Pará, lançou o Diagnóstico Socioeconômico e Cultural do Estudante da UFPA. O estudo analisou o Questionário Socioeconômico desenvolvido pelo Centro de Tecnologia da Informação e Comunicação, disponível no Portal da Universidade. O formulário foi respondido por mais de 12 mil pessoas. De acordo com a análise, estão no ICED os alunos que estudaram por mais tempo em escolas públicas (78%) e os que possuem filhos (22,3%). Os números podem indicar que esses alunos têm responsabilidades adicionais em relação aos que não precisam dividir o tempo dos estudos com cuidados com crianças e adoslescentes. De acordo com a professora Emina Santos, o diagnóstico é um instrumento importante de gestão para a direção da faculdade e para a própria Reitoria. Pág. 3
Alexandre Moraes
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O mapa social da UFPA
Aulas acontecem aos sábados, nas áreas do Campus Guamá
Sétima arte
Incubadora
UFPA lança Graduação em Cinema
Economia solidária em Marabá
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Exposição mostra evolução da roupa