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ISSN 1982-5994

anos

UFPa • aNo XXiX • N. 125 JUNHo e JULHo, 2015

Faculdade de Arquitetura lança livro contando seus 50 anos de história.

Páginas 8 e 9

Nesta edição • Combate ao HIV • Belém 400 anos • Mudanças climáticas


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UniVeRSidAde FedeRAL dO PARÁ JORNAL BEIRA DO RIO cientificoascom@ufpa.br Direção: Prof. Luiz Cezar Silva dos Santos Edição: Rosyane Rodrigues (2.386-DRT/PE) Reportagem: Brenda Rachit, Juliana Theodoro, Marcus Passos e Maria Luisa Moraes (Bolsistas); Walter Pinto (561-DRT/PA) Fotografia: Adolfo Lemos, Alexandre Moraes e Carlos Sodré Fotografia da capa: Alexandre Moraes Ilustrações: Priscila Santos (CMP/Ascom) e Walter Pinto Charges: Walter Pinto Projeto Beira On-line: Danilo Santos Atualização Beira On-Line: Rafaela André Revisão: Elielson de Souza nuayed, Júlia Lopes e Juliana Couto Projeto gráfico e diagramação: Rafaela André Marca gráfica: Coordenadoria de Marketing e Propaganda CMP/Ascom Secretaria: Silvana Vilhena Impressão: Gráfica UFPA Tiragem: Mil exemplares

Reitor: Carlos Edilson Maneschy Vice-Reitor: Horácio Schneider Pró-Reitor de Administração: Edson Ortiz de Matos Pró-Reitora de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: Edilziete Eduardo Pinheiro de Aragão Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Maria Lúcia Harada Pró-Reitor de Extensão: Fernando Arthur de Freitas neves Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Emmanuel Zagury Tourinho Pró-Reitora de Planejamento: Raquel Trindade Borges Pró-Reitor de Relações Internacionais: Flávio Augusto Sidrim nassar Prefeito: Alemar Dias Rodrigues Junior Assessoria de Comunicação Institucional - ASCOM/UFPA Cidade Universitária Prof. José da Silveira netto Rua Augusto Corrêa, n.1 - Prédio da Reitoria - Térreo CEP: 66075-110 - Guamá - Belém - Pará Tel. (91) 3201-8036 www.ufpa.br


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o caminhar por Belém, é possível perceber as inúmeras contribuições que os egressos do curso de Graduação em Arquitetura da UFPA trouxeram para a cidade. Dos projetos governamentais desenvolvidos pelo arquiteto Paulo Chaves aos prédios residenciais e comerciais projetados por Raul Ramos, estão nas ruas estes 50 anos de história. Para fechar o jubileu com chave de ouro, os professores Cybelle Miranda, Ronaldo Carvalho e Dinah Tutyia lançam o livro Uma formação em curso: esboços da Graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFPA. A reportagem das páginas 8 e 9 traz detalhes dessa trajetória. A UFPA, em parceria com a Universidade de Brighton, na Inglaterra, está desenvolvendo pesquisa para avaliar as taxas de sequestro de carbono atmosférico dentro das florestas costeiras e várzeas da Ilha do Marajó. A equipe está analisando 16 amostras de solo de oito áreas da região. Os resultados irão revelar o quanto as alterações climáticas estão ameaçando as áreas úmidas costeiras do estuário do rio Amazonas. Ainda nesta edição: os municípios paraenses que não cumprem a Lei da Transparência, a cena da música popular paraense da década de 1980, o Cogumelo do Sol sendo utilizado em crianças e adolescentes com HIV, além das fotos da missão #olhardearquitetoUFPA, publicadas no @ufpa_oficial. Boa Leitura! Rosyane Rodrigues Editora

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Índice Maparajuba Firmeza, um estrategista da Cabanagem . .............4 Mudanças climáticas no Marajó ........................................5 92 municípios estão fora da lei .........................................6 Uma história construída em 50 anos . ..................................8 Aquela que já nasceu cidade .......................................... 10 O Marajó em terras catarinenses . .................................... 12 Cogumelo do Sol contra o HIV ........................................ 14 Um canto sobre a cidade ............................................... 16 Olhar, verbo expressionista ............................................ 18

“Colaborei com o Beira do Rio nas comemorações dos 50 anos da UFPA e dos 20 anos da Interiorização. Foi um ano de experiências incríveis, com uma equipe comprometida com o seu leitor e com a qualidade do seu trabalho. Este cuidado certamente trago comigo.” Mari Chiba, fotógrafa


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Alexandre Moraes

Opinião

CARLOS SODRÉ / AGÊNCIA PARÁ

Maparajuba Firmeza, um estrategista da Cabanagem

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s relatos históricos comprometidos ideologicamente com os vencedores da guerra da Cabanagem supervalorizam as causas do conflito como tendo sido resultado, apenas, de intrigas palacianas em que se debatiam as forças partidárias de então no centro de poder da Província, Belém. Só ultimamente pesquisadores vêm esmiuçando o grave episódio, na busca de suas raízes mais profundas, entre as principais, a posse da terra, vetada à população não branca. A Cabanagem foi tão ou mais intensa no interior da Província, onde portugueses e seus descendentes mantinham, sob brutal exclusão, os estratos populacionais não brancos. Por isso, foi também no interior que se deram os mais duros confrontos causadores da monumental mortandade daquela guerra que se iniciou em 1835. Um dos pontos interioranos que mais se destacaram na resistência às forças imperiais foi Cuipiranga, ou Ecuipiranga, como se denominava o vilarejo situado diante da baía formada pelos rios Arapiuns e Tapajós, hoje pertencente ao município de Santarém. Quem resgata a importância desse bastião é o historiador amazonense Arthur Cezar Ferreira Reis. Segundo Reis, o padre Antônio Manuel Sanches de Brito, destacado legalista, assim escreveu ao comando militar, em Santarém, vila já retomada aos cabanos: “Aquela posição

(Ecuipiranga) é mais difícil de combater que as suas redondezas, pelo Amazonas; é absolutamente impossível, pelas alturas do barranco onde os revoltosos tinham ninhos de armas”. Quem visita Cuipiranga hoje percebe que houve uma inteligência destacada na montagem do bastião. Os cabanos instalaram postos de onde podiam ter o domínio visual completo de qualquer navio que se aproximasse, tanto pela parte do Rio Preto, como chamavam, então, o Tapajós, como pelos fundos da vila, nos barrancos do rio Amazonas. O historiador João Veiga dos Santos, em seu livro Cabanagem em Santarém, afirma que “a famosa fortaleza de Ecuipiranga, o terrível espantalho dos legalistas, era comandada pelo notável líder cabano Miguel Apolinário Maparajuba”, que, segundo Veiga dos Santos, havia acrescentado a seu nome a alcunha Firmeza. Diz, ainda, que “Maparajuba Firmeza era homem dotado de natural vivacidade e de tal e qual coragem”, forjado na luta e muito acatado pelos cabanos. Afirma também que “a figura de Maparajuba se projeta no cenário cabano da vila como homem esclarecido, preocupado com o bem-estar de todos, destruindo aquela imagem negativa do cabano como um facínora”, conforme afirmam muitos historiadores, imagem que vem sendo revista por pesquisadores contemporâneos.

A estratégia de Maparajuba Firmeza incluía viagens noturnas a Santarém, onde os cabanos aliciavam mestiços, negros e índios para a sua causa, inclusive para roubarem armas e munição do quartel da força legalista. Há dados que comprovam que os cabanos conseguiram aliciar um número impreciso de soldados das forças imperiais, obviamente, militares de patente inferior, pertencentes às mesmas classes oprimidas pelos brancos. Antes da retomada de Santarém, os cabanos, apossados da principal vila do interior do Pará, provocaram a fuga de todas as autoridades, desde o juiz da comarca até o comandante local do destacamento da Guarda Nacional. Os revoltosos também adotaram medidas extremas, como revela Veiga dos Santos, matando tantos portugueses e descendentes quantos puderam, inclusive o grande comerciante local Miguel Pinto Guimarães, pai do futuro barão de Santarém, de mesmo nome. Henry Bates, naturalista inglês que passou pela região anos mais tarde, anotou, embora exagerando, o que ouviu sobre a Cabanagem no Pará, que “todos os portugueses e aqueles que os defendiam foram brutalmente massacrados na guerra entre índios e brancos”. Nem foram “todos” os portugueses mortos nem a guerra era simplesmente entre índios e brancos. Em diversas tentativas, os revoltosos repeliram os ataques dos soldados do governo. Santarém foi retomada no dia 4 de outubro de 1836, por uma tropa oficial de 105 soldados bem armados, mandados de Belém em três potentes escunas. No entanto Ecuipiranga continuou a resistir e somente foi dominada no dia 12 de julho de 1837. Pilhas de mortos ficaram nas cercanias da vila, sendo enterradas em valas comuns. Manuel Dutra – professor da Faculdade de Comunicação, jornalista, doutor em Ciências Socioambientais/ NAEA/UFPA. e-mail: dutra.manuel@gmail.com


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Meio ambiente

Acervo do Pesquisador

Mudanças climáticas no Marajó Pesquisa analisa sequestro de carbono em oito regiões da ilha Brenda Rachit

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s mudanças climáticas são consequências tanto de fenômenos naturais quanto de ações humanas. Essas alterações intensificaram-se, principalmente, após a Revolução Industrial, quando a poluição aumentou de forma significativa. Nos últimos anos, diversas pesquisas científicas discutem o problema e avaliam alternativas para a redução dos efeitos provocados pelas mudanças no clima global. Nesse sentido, os pesquisadores Tommaso Giarrizzo, professor do Programa de Pós-

Graduação de Ecologia Aquática e Pesca do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará, e Raymond Ward, professor do Aquatic Research Centre da Universidade de Brighton, na Inglaterra, desenvolveram o Projeto de Pesquisa “Mitigação das Mudanças Climáticas nos Estuários da Amazônia”. O projeto teve início em maio de 2014, por meio da parceria entre a Universidade Federal do Pará, a Universidade de Brighton e o governo do Estado do Pará. O objetivo é avaliar as taxas de sequestro de carbono atmosférico dentro das florestas costeiras e várzeas da Ilha do Ma-

rajó, a maior ilha fluviomarinha do mundo. Segundo Tommaso Giarrizzo, as mudanças climáticas antropogênicas, aquelas provocadas pela ação do homem, exercem um impacto no ciclo do carbono costeiro e em várzeas. Isso implica a elevação do nível do mar, a precipitação e as mudanças de temperatura, além de influenciar na frequência e intensidade das tempestades. Os pesquisadores explicam que existem cinco principais reservatórios de carbono no globo: oceânico, geológico, pedológico (solo), atmosférico e biótico. Todos esses reserva-

tórios de carbono encontram-se interligados. Porém as maiores taxas de absorção do carbono ocorrem no solo. O Brasil possui um dos litorais mais extensos do mundo e alguns dos maiores rios e ecossistemas de zonas úmidas costeiras e várzeas contínuas do planeta, incluindo o estuário amazônico. “Manguezais e matas ciliares (várzeas) são naturalmente mais susceptíveis a conter as maiores reservas pedológicas de carbono, proporcionando um importante serviço de ecossistema por meio da remoção deste carbono da atmosfera”, explica Raymond Ward.

Sensoriamento remoto indicou áreas para coleta de dados Raymond Ward e Tommaso Giarrizzo obtiveram 16 amostras de solo dos manguezais e várzea de oito áreas da Ilha do Marajó. As regiões abrangidas foram Camará, Pesqueiro (Soure), praia da Fazenda Jaranduba, na contracosta marajoara, Ponta de Pedras, São Sebastião da Boa Vista, Breves, Chaves e Afuá. Essas regiões foram escolhidas a partir de dados de sensoriamento remoto. “Utilizamos também o conhecimento local para identificar mudanças históricas nas diferentes comunidades de plantas dentro

de cada sítio”, acrescenta o professor Raymond Ward. O helicóptero do Grupamento Aéreo de Segurança Pública (Graesp), cedido pelo governo do Estado, permitiu que a equipe se deslocasse para as áreas mais distantes e de difícil acesso. Os materiais coletados serão analisados na Universidade de Brighton. “Usando índices de isótopos de carbono e de nitrogênio, este estudo possibilitará identificar os principais contribuintes para o sequestro de carbono do solo ao longo do tempo”, afirma Tommaso Giarrizzo.

Raymond Ward explica que dados geocronológicos e de Carbono Orgânico Total (COT) serão relacionados com dados meteorológicos históricos para identificar como a precipitação, o nível do mar e a ocorrência de tempestades influenciaram as fontes e o sequestro de carbono em períodos de tempo diferentes. Os resultados devem mostrar aos órgãos competentes a dimensão da ameaça das alterações climáticas nas áreas úmidas costeiras do estuário do rio Amazonas. As análises possibilitarão uma noção espaço-tem-

poral bastante abrangente e poderão ser feitas comparações das variações de sequestro de carbono ao longo do tempo, em relação à mudança climática global e à variação climática regional. Também será possível identificar o potencial de resiliência das zonas úmidas costeiras, ou seja, sua capacidade de recuperar o equilíbrio, frente a mudanças climáticas futuras. O projeto teve financiamento do Banco Santander, que apoia projetos realizados em parcerias com universidades da Inglaterra e de outros países.


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Transparência

92 municípios estão fora da lei Prefeituras não divulgam informações sobre receitas e despesas Fotos Adolfo Lemos

Levantamento foi realizado por alunos da Faculdade de Ciências Contábeis, em parceria com a ControladoriaGeral da União.

Marcus Passos

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m 2014, 92 municípios do Estado do Pará deixaram de divulgar informações sobre suas receitas e despesas. Considerando-se apenas os recursos transferidos pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS) e pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) aos municípios, o montante com aplicação desconhecida ultrapassa o valor de R$ 3.550.000.000,00. Esse diagnóstico faz parte dos resultados apresentados pelo Projeto de Extensão “Portais da transparência dos municípios paraenses: o cenário atual”, coordenado pela professora Lidiane Dias, da Faculdade de Ciências Contábeis/ICSA/UFPA, e pelo auditor da Controladoria-Geral da União

(CGU), Marcelo de Paula. A iniciativa também envolveu outros professores e alunos da Faculdade de Ciências Contábeis. O trabalho surgiu a partir de um convite feito pela Controladoria-Geral da União e pelo Observatório Social de Belém (OSB) à Universidade Federal do Pará. “Procuramos a Faculdade de Contabilidade para que pudéssemos fazer essa parceria, utilizando o que cada um poderia contribuir de melhor. A CGU, com o conhecimento sobre transparência pública; os professores e os alunos, com a metodologia; e o OSB, com os aspectos relacionados à divulgação desse trabalho”, revela Marcelo de Paula. O objetivo do projeto, segundo a coordenadora Lidiane Dias,

foi apresentar à sociedade o cenário atual dos sítios eletrônicos e portais da transparência dos municípios paraenses, quanto ao atendimento das legislações que regem a temática. O levantamento tomou como base a Lei de Acesso à Informação nº 12.527, de 2011, e a Lei Complementar nº 131, de 2009. A pesquisa surge como pioneira nesse cenário em que nenhum município paraense tinha um histórico sobre transparência pública. Nesse sentido, esse trabalho é importante tanto para a sociedade quanto para os órgãos fiscalizadores, como a Controladoria-Geral da União. Atender às leis não é uma opção do município, e sim uma obrigação relacionada ao repasse de verbas.

Dados levantados com metodologia específica A equipe desenvolveu uma metodologia específica para acompanhar o cumprimento das principais exigências relacionadas à transparência pública. Isso envolveu, primeiramente, a capacitação dos discentes de Ciências Contábeis, para que, posteriormente, eles fizessem o preenchimento de um formulário eletrônico, por meio do levantamento de informações na internet, sobre os

144 municípios do Estado do Pará. Foram analisados 24 itens de cada cidade. Sendo 10 itens principais, que serviram de objeto para a confecção de gráficos e mapas; e 14 itens complementares, usados para outras considerações. “Nós consideramos algumas informações que seriam as principais entre aquelas exigidas pela lei. Com base na metodologia, criamos uma lista de verificações, a

qual possibilitou a realização da coleta de dados pelos alunos”, explica a professora Lidiane Dias. Ao todo, eram 33 estudantes da disciplina Tecnologia da Informação, divididos em seis grupos organizados por mesorregiões do Estado. A coleta de dados ocorreu de outubro a dezembro de 2014. Segundo o auditor Marcelo de Paula, os alunos foram capacitados sobre uma legislação que


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fala a respeito da transparência e de todos os itens exigidos pela lei. Para a aluna Suellen da Silva, que trabalhou com as mesorregiões do sudoeste paraense e do Baixo Amazonas, a maior contribuição desse trabalho foi esclarecer a população acerca da importância da divulgação de informações sobre os gastos públicos. Ela afirma que esse aspecto era sempre frisado nas reuniões com a sua equipe.

Os principais resultados consolidados em relação aos 144 municípios do Estado identificaram que 111 (77%) das cidades do Pará têm Sítio Eletrônico – um site oficial da prefeitura na internet, e 33 (23%) dos municípios não possuem endereço eletrônico. No que diz respeito ao Portal da Transparência – local com informações sobre receitas e despesas, apenas 52 (36%) das cidades possuem o portal, em contraste

aos 92 (64%) dos municípios que não têm esse recurso de transparência pública. 138 (96%) das divisões administrativas não disponibilizam a possibilidade de solicitar informações ao SIC Eletrônico, somente os municípios de Brasil Novo, Igarapé-Açu, São João de Pirabas, Rio Maria, São Domingos do Araguaia e Chaves forneciam essa opção aos cidadãos até a conclusão da pesquisa.

Licitação está entre as informações não divulgadas No que se refere aos Editais de Licitação, 134 (93%) das cidades não divulgaram informações sobre processos licitatórios nos sítios eletrônicos, apenas 10 municípios (7%) deles estavam divulgando essas solicitações. Segundo a coordenadora Lidiane Dias, “em muitos desses sites, no link referente às licitações, eram colocados apenas avisos e informes sobre os processos licitatórios, e não o edital propriamente dito, como é exigido pela lei”. Quanto aos Resultados das Licitações, a maioria das divisões administrativas, 139 (97%) cidades, não estava divulgando esses resultados no sítio eletrônico, sendo

este item cumprido apenas pelos municípios de Tailândia, Cachoeira do Piriá, Iguarapé-Açu, São Miguel do Guamá e Novo Progresso. A principal constatação dessa pesquisa foi verificar que nenhum município paraense conseguiu atender a todos os principais itens verificados. Ou seja, 144 cidades do Estado não possuem, simultaneamente, Sítio Eletrônico, Portal da Transparência, SIC Eletrônico, Editais de Licitação e Resultados das Licitações. E a maior consequência disso é “a desinformação da sociedade, pois, quando o município deixa de ser transparente, o cidadão deixa de ter o direito de saber como os recursos são gastos

em sua cidade”, enfatiza o auditor Marcelo de Paula. Por meio dos dados fornecidos pela transparência pública, a sociedade terá insumos para acompanhar as ações licitatórias do governo e os resultados das obras contratadas. Por isso, na avaliação da professora Lidiane Dias, “é importante para a sociedade ter informações sobre a transparência dos municípios, pois o cidadão, tendo consciência disso, passará a cobrar mais dos gestores, possibilitando que a transparência se incorpore no cotidiano das pessoas. E nisso, a Universidade pode contribuir para fornecer tais informações à comunidade”.

Saiba mais

Infográfico Priscila Santos

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Uma história construída em 50 anos Faculdade de Arquitetura lança livro contando trajetória do curso Maria Luisa Moraes

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ara encerrar as comemorações relativas aos 50 anos de criação do curso de Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Pará, os professores Cybelle Salvador Miranda, Ronaldo Marques de Carvalho e Dinah Reiko Tutyia escreveram o livro Uma formação em curso: Esboços da graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFPA, com previsão de lançamento da versão digital ainda este mês. A inspiração para escrever a obra veio de uma visita à Escola Superior de Desenho Industrial (ESDI), localizada no Rio de Janeiro. Durante um congresso na cidade, os professores Ronaldo Carvalho e Cybelle Miranda ficaram encantados com a arquitetura do prédio. “nós ficamos também interessados em conhecer a história dessa escola de design, e conhecemos um professor que havia escrito um livro sobre essa história”, lembra Ronaldo. Cybelle Miranda afirma que o livro servirá também como base para os discentes. “novos alunos ingressam na faculdade sem ter noção de qual era a ênfase do curso inicialmente, como foi essa trajetória para chegar aos dias de hoje, o que já foi feito em termos de pesquisa e extensão, quais as mudanças no ensino da Arquitetura. Tudo isso precisava de documentação e organização”, conta a professora. Os autores ressaltam que a busca pelas informações e pelos dados não foi fácil, muitos documentos já se perderam ou estavam num estado quase inutilizável, o que também ajudou para que a decisão de reunir informações num livro fosse tomada, tentando evitar a perda desses documentos. A pesquisa teve início com um projeto da professora Cybelle Miranda, no Laboratório de Memória e Patrimônio Cultural (LAMEMO), apoiado pelo Programa de Apoio ao Doutor Recém-Contratado (PADRC) da UFPA. “A pesquisa já tinha começado um pouco antes disso, sem nenhum apoio institucional, apenas com voluntários. Percebemos nessa mobilização dos alunos um interesse em realmente contribuir para a produção dessa história”, explica. E, assim, iniciou-se o trabalho. Além dos documentos oficiais localizados na secretaria do próprio curso, foram verificadas também as atas do Colegiado e Departamento, assim como as pastas de antigos docentes.


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Jubileu Das informações fragmentadas ao texto coerente FOTOS ALExAnDRE MORAES

Além da dificuldade com o estado dos documentos, as informações ainda precisavam ser checadas. “Muitas vezes, os documentos tinham falhas, controvérsias, até datas equivocadas, algumas questões propostas que não foram executadas e você, muitas vezes, não tem como confirmar”, explica a professara Cybelle Miranda. Ela relata que escrever o texto também foi desafiador, pois foi necessário reunir todas essas informações fragmentadas e transformá-las num texto uniforme e coerente. Trabalhando no livro, os pesquisadores tiveram a chance de reviver toda a história do curso. Sua criação coincide com o momento na história da UFPA quando a universidade deixa de ter cursos isolados em diversos campi na cidade e passa a concentrar-se num único lugar. O curso de Arquitetura e Urbanismo começou no Chalé de Ferro localizado na Av. Almirante Barroso, em 1964, e passou por diversas localizações no campus universitário. Essa primeira etapa, porém, é de extrema importância, pois a Arquitetura não era uma profissão muito comum na época. “Era algo novo fazer Arquitetura. A própria maneira como o aluno seria avaliado dentro das disciplinas era novidade. Avaliar desenho, por exemplo, é

totalmente diferente de avaliar uma prova de Matemática ou de Física,” exemplifica Cybelle. Outro momento crucial lembrado pelos professores foi a reforma curricular que ocorreu no início dos anos de 1990, na qual as disciplinas de Urbanismo ganharam mais força. “Foram integradas também as disciplinas de Preservação e Restauração de Patrimônio nessa mesma reforma e foi uma atitude pioneira em relação aos outros cursos de Arquitetura no Brasil. Fomos a primeira escola a introduzir, oficialmente, essas disciplinas”, afirma Cybelle rememorando sua formação discente, que coincidiu

com a primeira turma após a reforma curricular. Outro momento marcante ocorreu em meados dos anos 2000. “As salas de aula eram muito grandes, porque precisavam de pranchetas para os alunos desenharem. Com o advento do computador e das técnicas de computação gráfica, tivemos a possibilidade de diminuir o tamanho das salas de aula, consequentemente, sobrou espaço, o qual foi revertido em laboratórios”, conta a professora. O que também mudou bastante foi o perfil do corpo docente, com a contratação de profissionais pós--graduados, mestres e doutores, ajudando a fomentar as pesquisas na área.

Mais tecnologia e diálogo com outras áreas Hoje, o curso vive um ótimo momento e, com o lançamento do livro, espera-se que ele tenha maior visibilidade. “Queremos mostrar para a sociedade o que o curso já produziu e o impacto que ele teve na formação e na construção da cidade de Belém e do Estado do Pará”, afirma Cybelle Miranda. A ex-aluna Laura Caroline relata que, no início, tinha em mente que a habilidade em desenho era o ponto mais importante na profissão. “Após dois anos de formada e alguns projetos desenvolvidos, percebo que é muito mais do que isso. Além da expressão gráfica, a proposta deve conter uma solução adequada

ao contexto e à necessidade do cliente”. Toda essa influência do curso já pode ser percebida fisicamente em Belém. “Hoje, os edifícios permitem mais a circulação do vento e, ao mesmo tempo, se baseiam nas leis urbanas, no plano diretor e nos estudos aplicados ao conforto ambiental”, explica o professor Ronaldo Carvalho. Laura Caroline aconselha os novos discentes: “a quem pretende fazer Arquitetura, eu diria para explorar suas nuances, gostar da teoria, urbanismo, projeto, conforto ambiental... claro que, com o tempo, escolhemos a área que

mais nos agrada, mas é importante conhecer bem o que o curso oferece, pois um bom arquiteto sabe relacionar todos os campos de sua profissão e consegue propor uma solução coerente”. Olhando para o futuro, os professores acreditam que o curso não deverá abandonar a maquete física, mas o uso de novas tecnologias já é essencial. A valorização da interdisciplinaridade também é um ponto que, segundo os professores, ainda precisa ser melhorado. É necessária a comunicação com outras áreas, como Antropologia, Engenharia e Sociologia, que agregam à Arquitetura e ao Urbanismo.

O Hangar Centro de Convenções da Amazônia é um dos projetos do arquiteto Paulo Chaves, em Belém, citado por Cybelle Miranda como um dos grandes nomes formados pela UFPA.


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Entrevista

Aldrin Figueiredo

Aquela que já nasceu cidade Fontes confirmam pioneirismo de Belém na Amazônia brasileira ALEXANDRE MORAES

Walter Pinto

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Centro de Memória da Universidade Federal do Pará está realizando, durante todo o ano de 2015, sempre às sextas-feiras, a partir das 15h, uma programação alusiva aos 400 anos da cidade de Belém. Por meio de seminários, pesquisadores tematizam questões relativas à Amazônia, focalizadas no espaço de Belém. A programação não se restringe somente ao campo da história, contando com a participação de especialistas de outras áreas culturais. O historiador Aldrin Moura de Figueiredo, coordenador do Centro de Memória da Amazônia, idealizou o evento inspirado em outros centenários de Belém, como a programação de 1915, promovida por intelectuais paraenses ligados ao movimento modernista. Na entrevista a seguir, Aldrin Figueiredo aborda alguns pontos da História de Belém e da Amazônia, com destaque à culinária paraense, hoje considerada uma das mais originais do Brasil.

Belém 400 anos

Belém é a única cidade da Amazônia brasileira que pode, de fato, postular 400 anos. Foi a única que já nasceu cidade, não passou pelo processo de ocupação tradicional, aquele que começa com a chegada das missões religiosas, formação de povoados, depois, transformação em vilas, até atingir o status de cidade. Em Belém, os portugueses criaram uma fortaleza e, em torno dela, uma cidade com seus moradores. Isso é uma coisa bem definida, difícil de ser questionada. Belém está numa região de entrada e saída do

rio Amazonas, ponto de partida para a ocupação de todo o vale amazônico. As ilhas próximas eram habitadas por esses índios. As escavações arqueológicas, realizadas nas décadas de 1990 e 2000, conseguiram encontrar extratos de ocupações indígena, portuguesa e africana. No sítio onde está, hoje, a Estação das Docas e no próprio sítio onde foi erguido o Forte do Castelo, encontraram-se

fragmentos diversos, como cachimbos indígenas, africanos e portugueses. Esses fragmentos são vestígios daquelas ocupações. Quando cruzamos fontes históricas, antropológicas e cartográficas, levando em conta também as críticas das fontes feitas pelos historiadores, não há como negar o pioneirismo de Belém em relação às cidades fundadas na Amazônia brasileira. Todas

as outras surgem a partir dela. Não é possível negar o interesse de franceses, ingleses e holandeses sobre a região, mas eles não fundaram cidades. Não basta passar pelo rio. Se fosse assim, teríamos que considerar Vicente Yañes Pizon como fundador, porque ele cruzou a Amazônia em 1499, antes mesmo dos portugueses chegarem à Bahia. Mas a simples passagem por um rio não pode ser referência


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à fundação de uma cidade. Além disso, existem as teorias antropológicas e arqueológicas sobre cacicados e aldeamentos, que apontam para populações indígenas vivendo de forma organizada em certas regiões da Amazônia, ou seja, em cidades indígenas, que existiam, portanto, antes mesmo da chegada dos portugueses. Então, essa disputa por uma data, por um marco zero, não tem fundamento.

Espanha e Portugal A organização urbanista da cidade de Belém no século XVII espelha o traçado urbanístico de um período em que Portugal e Espanha formaram a União Ibérica. Felipe III, rei da Espanha, era também rei de Portugal, de modo que a presença espanhola também se deu no processo de ocupação da cidade. Belém foi a única a receber uma ordem religiosa ibérica, os Mercedários, a qual desceu de Quito, no Equador, na expedição de Pedro Teixeira. O traçado urbano do sítio histórico de Belém reflete este momento histórico, caracterizando-se por um urbanismo misto, ibero-português. Ele pode ser observado naquela área de entorno do Forte do Castelo. A Praça da Sé foi construída como uma praça maior, fechada, de costas para o rio, com casas em volta. Ela não está à margem do rio; é uma praça que se recolhe do rio. Esse traçado retilíneo da Cidade Velha difere muito do que ocorreu na ocupação de outras cidades brasileiras.

Novas experimentações Os portugueses sonhavam ocupar a Amazônia, sabiam que era uma região cobiçada, havia o interesse de estrangeiros. Viviam um momento de expansão. As próprias elites brasileiras estavam digladiando-se em Pernambuco, depois do contexto da ocupação holan-

desa. Não por acaso, os primeiros governadores do Grão-Pará são os heróis da reconquista pernambucana, os Negreiro, os Albuquerque. Foram eles que vieram para a Amazônia, estabelecer-se como uma elite colonial. Depois, vieram os militares da Ilha da Madeira, os casais açorianos. Não é um processo de ocupação grande se comparado ao das colônias portuguesas na Índia, do século XVII, que representavam o grande celeiro para Portugal. A Amazônia virou a mesa, no século XVIII, com o cacau, assim como Minas Gerais, com o ouro. O açúcar continuou sendo importante, mas, naquele momento, os documentos informam que a produção açucareira passava por uma fase de penúria e dificuldades. E não havia um modelo de plantations muito distinto da monocultura. A Amazônia possibilitou a oportunidade de novas experiências aos portugueses, não só com o extrativismo mas também com a agricultura. Os novos estudos historiográficos estão mostrando essas experiências com vários tipos de plantas e produtos, que vão além das chamadas especiarias.

Tem muito a ver com um momento em que os portugueses estão introduzindo uma série de produtos do sul da Ásia na Amazônia, entre os quais, a manga, na mesma medida em que estão levando outros daqui. É uma riqueza que está começando a ser estudada agora, por causa desse boom da gastronomia amazônica. Muitas pessoas estão interessadas nas frutas da Amazônia, ou melhor, nas frutas que são vistas como da Amazônia, embora não sejam originalmente, mas, aqui, o laço da história concedeu uma certa amazonidade. É o caso da manga, procedente da Índia. Do abricó, fruta chinesa adaptada e cultivada desde muito cedo aqui. Há também os animais. Nada mais africano do que o búfalo do Marajó, algo totalmente assentado à paisagem marajoara. Os cavalos foram introduzidos em Roraima, pelos espanhóis. São histórias que têm muito a ver com o encontro e confronto de culturas e, claro, trazem também a marca das nossas antigas populações indígenas que os portugueses encontraram ao chegar. São diferentes contribuições culturais que permanecem no nosso hábito contemporâneo.

“O boom da gastronomia amazônica está valorizando os sabores locais”

Encontro e confronto O que nós, amazônicos, ainda usamos como tempero na comida é o resultado de um encontro de culturas. São as antigas especiarias, como o coentro, a pimenta, o cominho, até certo ponto, pouco apreciados nas Regiões Centro e Sul do Brasil, mas muito similares aos temperos do sul da Índia.

Saberes da terra O interessante é que o atual boom alimentar promove essas coisas. Agora mesmo, com a culpabilidade do glúten, os derivados da mandioca voltaram à tona, algo que os portugueses, lá no século XVII, chamavam de pão da terra. A mandioca nunca entrou na Europa. Lá, sempre

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se consumiram os derivados do trigo. Ao longo do tempo, o trigo foi ocupando espaço no Brasil. Passamos a consumir um tipo de pão totalmente alienígena, que não guarda nenhuma relação com a nossa tradição indígena. Um café da manhã do século XVII, o equivalente a um pequeno almoço, havia biju de diversos tipos, como biju peteca, conforme se diz no interior, feito com castanha e enrolado na folha da bananeira, segundo a tradição indígena e cabocla. Havia a tapioca e uma série de derivados da mandioca, que os padres chamavam de pão da terra. Havia o peixe, a caça e os vinhos de frutas batidas e amassadas. A população, até há pouco tempo, chamava de vinho ao suco. Então, era vinho de taperebá, vinho de cupu, sendo este um termo superantigo, que tem a ver com a literatura quinhentista. Depois, os portugueses introduziram o leite, a manteiga, o café e o açúcar, alimentos alienígenas. Felizmente, aqueles alimentos antigos não desapareceram da culinária amazônica. Nós continuamos consumindo a tapioquinha no dia a dia, mas houve uma mescla, com a adição da manteiga, do sal, acrescentaram-se isso e aquilo. Isso ocorreu também com a nossa tradição mais europeizada. Nós aprendemos muito com os portugueses, como nos casos do cozidão e da peixada. É muito português o costume de adicionar ovos às verduras. O cozimento do feijão é também uma herança portuguesa, porque os índios até cozem, mas moqueiam muito mais, a uma distância muito grande do carvão. Trata-se de uma técnica muito apurada. Eles assam os alimentos no calor, enrolados em folhas. Isso é uma coisa superbacana que não morreu e, hoje, busca-se incessantemente, porque são saberes e especificidades da terra. Belém é a vitrine da culinária amazônica.


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Arqueologia

O Marajó em terras catarinenses Tom Wildi reuniu um dos maiores acervos de cerâmica marajoara Walter Pinto

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Abaixo, réplica de cerâmica marajoara encontrada em Belém. Na página ao lado, fotos do acervo do pesquisador.

o Brasil, durante muitos anos, antes de se tornar um ofício de formação universitária, a Arqueologia foi exercida, em grande parte, por arqueólogos amadores. Desde o século XIX, a possibilidade de produzir conhecimentos sobre antigas populações por meio de vestígios materiais despertou o interesse de brasileiros e estrangeiros. Entre os pioneiros da Arqueologia brasileira, o arquiteto suíço Tom Traugott Wildi (1897-1985), mesmo residindo em Santa Catarina, associou o seu nome ao da Amazônia e, em especial, à Ilha do Marajó. Nos tesos indígenas do Marajó, ele realizou várias escavações, em meados do século XX, que o levaram a formar, provavelmente, o maior

acervo particular de cerâmica marajoara fora da Amazônia. Após a morte de Wildi, sua família doou as peças ao Museu de Arqueologia da Universidade Federal de Santa Catarina. A coleção, no entanto, poderia estar em Belém, como o Jornal Beira do Rio apurou. Antes de morrer, Wildi teria contatado o governo do Pará neste sentido, mas o então governador Fernando Guilhon não teria demonstrado interesse. Melhor para os catarinenses. “No MArquE, a coleção de Tom Wildi pode ser consultada, admirada e pesquisada, principalmente em razão do excelente atendimento que os funcionários prestam aos visitantes”, constatou a historiadora paraense Anna Maria Linhares, em visita ao museu, durante a pesquisa que realizou sobre cerâmica marajoara para o doutorado no Programa de

Pós-Graduação em História Social da Amazônia, da UFPA. O acervo é composto por mais de 900 peças. Além da vasta coleção de material cerâmico da Ilha do Marajó, Wildi coletou material etnográfico de grupos tupi-guarani de Santa Catarina, peças da Grécia Clássica e vestígios arqueológicos em metal e minerais de culturas pré-hispânicas andinas. “Dada a condição amadora de Tom Wildi em Arqueologia, ele não fez uso de métodos arqueológicos profissionais nas escavações e coletas das peças, razão pela qual muitas delas não podem ser identificadas”, observa Anna Maria. “Graças ao empenho deste suíço apaixonado pelo Brasil e pelo Marajó, temos este significativo acervo de peças marajoaras preservado, mesmo com as limitações de uma coleta amadora”. Alexandre Moraes


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História da região registrada em diários e cadernetas Fotos Acervo do Pesquisador

A importância da formação do acervo, assim como sua manutenção no Brasil chamaram a atenção da pesquisadora: “num momento em que muitos não hesitam em levar exemplares de cerâmica para fora do Brasil, havendo um verdadeiro mercado clandestino alimentando esse comércio ilegal, Wildi manteve os vestígios que coletou no Brasil”. Assim, observa Anna Maria, “ele produziu conhecimento sobre as peças coletadas e as disponibilizou ao público num museu que construiu, ao lado da sua residência, em Florianópolis. Tudo feito com dinheiro próprio e muito trabalho”. Em Santa Catarina, Anna Maria visitou Maria Beatriz Wildi, neta de Tom Wildi e espécie de “memória viva da paixão do avô pela cerâmica marajoara”. Segundo lhe revelou, o avô queria provar que na América do Sul também houve grandes civilizações. “Meu avô atentava para as semelhanças entre mitos presentes em vá-

rios pontos do mundo. A essas semelhanças, ele chamava ‘ponto comum’”, conta Maria Beatriz Wildi. A importância do trabalho de Wildi não está restrita às peças que coletou. Ele deixou também uma rica documentação sobre a história da Amazônia, que pode ser estudada a partir de seus diários, cadernetas e imagens. São documentos que revelam os modos e a atuação de um arqueólogo amador em busca

de sua “ilha dos sonhos”, o Marajó, como de tantos outros que passaram pela região no mesmo período. Segundo o historiador Márcio Couto Henrique, professor do Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia da UFPA, que também esteve no Museu de Arqueologia da UFSC, “os registros feitos nos diários e cadernetas de campo são documentos raros para a compreensão de aspectos aos quais dificilmente se têm acesso

nos trabalhos publicados por antropólogos e arqueólogos”. Relevante é, por exemplo, a possibilidade de se reconstruir a rede de relações formada em torno das peças de cerâmica marajoara a partir dos nomes de pessoas, instituições e lugares citados nas anotações. No mesmo nível, encontra-se a grande quantidade de imagens produzidas pelo arqueólogo amador, capazes de fornecer informações importantes sobre o ofício do arqueólogo e sobre os sítios arqueológicos nos tesos marajoaras. O arquiteto suíço Tom Wildi chegou ao Rio de Janeiro em 1919, aos 22 anos. Em Santa Catarina, casou com Maria Passerino, dentista curitibana, filha de italiano com brasileira de ascendência indígena. Ela seria sua companheira nas muitas viagens que fez pelo mundo, assim como assistente nas expedições à Amazônia, região que elegeu como lócus para a plena realização do trabalho de arqueólogo amador.

Objetivo nunca foi obter qualquer vantagem comercial O Marajó foi um mundo estranho e fascinante que impôs aos Wildi uma dura aprendizagem. Nas anotações, Tom descreveu detalhes de excursões aos sítios e tesos, em meio ao estranhamento cultural do lugar, muito diferente dos costumes do sul do Brasil e da Europa. Geralmente acompanhado por um guia e um vaqueiro, Wildi trabalhou duro em longas escavações, das 7h às 17h. Os relatos não são nada animadores no início. “Muitas expressões revelam desânimo e cansaço, principalmente quando nada de valor era encontrado”, informa Márcio Couto, especialista no estudo de diários como fonte historiográfica.

Com o tempo e muitas expedições, Wildi conseguiu coletar um acervo bastante animador, como conta neste apontamento de 15 de setembro de 1942: “No teso Guajará, trabalhamos, como de hábito, sempre para a frente e cada vez mais em profundidade. O trabalho é duro, mas excitante. Retiro fragmentos de grande prato, boa decoração em incisão. Novos fragmentos de igaçabas [urnas funerárias], seleciono o que é possível, a carga está se avolumando”. Um dos cuidados do arqueólogo foi o de sempre esclarecer que seu interesse pela cerâmica marajoara não era o de auferir vantagem comercial, mediante a prática comum de posse e revenda. Em carta

a um fazendeiro do Marajó, ele reafirmou este propósito: “nunca permitirei que qualquer fragmento trazido do Marajó ou de outra Região Amazônica seja comerciada ou vendida sob qualquer pretexto. Uma vez que não mais me será possível guardar, admirar e amar estes testemunhos de uma grande arte de um grande povo, tudo passará para um museu (...)”. De fato, assim procedeu. Na verdade, quando pensava doar sua coleção a uma instituição, a primeira ideia de Tom Wildi foi doá-la a um colégio religioso de Santa Catarina. Quem o dissuadiu foi o antropólogo paraense Napoleão Figueiredo. Em carta enviada ao amigo, Figueiredo aconselhou-o a não entregar a

coleção a instituições privadas. “Ela é bem e por demais preciosa para ficar em depósito de um estabelecimento de ensino médio. Não há especialista para cuidar desse material. A universidade será outra coisa. Terá não somente o especialista como também servirá igualmente para o estudo dessa mocidade que está se formando: é estabelecimento do governo e uma peça que sumir dará inquérito (...) Desculpe-me essas palavras, porém já vi coleções como a sua terminarem em lojas de belchior, fragmentadas, perdidas e muitas sofrendo os embates públicos do martelo do leiloeiro, para serem adquiridas por alguém que vê nessas peças apenas uma coisa estranha e exótica”.


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Pesquisa

Cogumelo do Sol contra o HIV Estudo envolveu crianças e adolescentes que nasceram com o vírus Fotos Adolfo Lemos

Fungo foi utilizado como suplemento alimentar para 29 pacientes.

Juliana Theodoro

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garicus sylvaticus é um fungo comestível muito popular por suas propriedades medicinais. Quem consome afirma que ajuda no controle do colesterol, do diabetes, das doenças relacionadas à tireoide e ajuda até a prevenir o câncer. O estudo da professora Marcela de Souza Figueira, vice-diretora da Faculdade de Nutrição/ICB/UFPA, apresentou, em sua dissertação no Programa de Pós-Graduação Biologia de Agentes Infecciosos e Parasitários, os benefícios do fungo no tratamento de crianças e adolescentes portadores do vírus da imunodeficiência humana, o HIV.

Também conhecido como cogumelo do sol, o Agaricus sylvaticus é um alimento rico em fibras, vitaminas e minerais, além de ter grande capacidade antioxidante. Na Dissertação O Efeito da Suplementação Nutricional de Agaricus sylvaticus sobre Alterações Oxidativas e da Defesa Antioxidante Associadas à Infecção pelo HIV em Crianças e Adolescentes, orientada pelo professor Sandro Percário, a professora Marcela Figueira analisou essa característica do cogumelo sobre o estresse oxidativo, comum em pacientes com HIV. “O estresse oxidativo é um desequilíbrio entre a defesa antioxidante e a produção de radicais li-

vres - que o organismo naturalmente produz como uma forma do sistema imune combater doenças. Tem a parte benéfica dos radicais livres, porém, em excesso, eles também são capazes de causar danos celulares e algumas doenças”, explica a professora. “Tanto a infecção pelo vírus HIV quanto o próprio tratamento da doença causam o estresse oxidativo. Há a diminuição dos antioxidantes e o aumento dos radicais livres. Para diminuir o estresse, a suplementação com cogumelo do sol na alimentação dos pacientes fornece uma defesa antioxidante maior e reduz os radicais livres”, completa Marcela.


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Relatório alimentar garante segurança dos dados Para analisar as melhorias que o cogumelo do sol poderia trazer aos portadores do HIV foi feito o acompanhamento de 43 crianças e adolescentes¸ entre 1 ano e meio e 18 anos de idade, de ambos os sexos, que nasceram com o vírus. 29 crianças e adolescentes tiverem o cogumelo inserido em sua alimentação por meio de xarope (produzido especialmente para a pesquisa com as crianças menores) e comprimido; os outros 14 pacientes fizeram parte do grupo de controle, formado para as futuras análises comparativas dos quadros das crianças e dos adolescentes. A pesquisa foi realizada na Unidade de Referência Materno, Infantil e Adolescente (UREMIA) e a suplementação do Agaricus sylvaticus à alimentação dos pacientes foi feita com a autorização dos pais ou responsáveis das crianças e dos adolescentes. Os xaropes e comprimidos eram entregues aos responsáveis, que recebiam o medicamento já nas dosagens corretas. Os pais das crianças menores também recebiam uma seringa a fim de facilitar a ingestão do xarope nas quantidades certas. As doses foram calculadas com base no peso e na idade dos pacientes. Para atestar com segurança os efeitos da implementação do cogumelo à alimentação e suas ações sobre o estresse oxidativo, a pesquisa também realizou o chamado recordatório 24 horas, que consiste em fazer um relatório com todos os

Marcela Figueira realizou a pesquisa na Unidade de Referência Materno, Infantil e Adolescente (UREMIA).

alimentos ingeridos pelo paciente nas últimas 24 horas. Esse recordatório era realizado junto com os responsáveis para saber tudo que esses pacientes tinham comido no dia anterior. O procedimento avaliava o apetite e a alimentação das crianças e dos adolescentes. O objetivo do recordatório 24 horas era observar se a alimentação dos pacientes estava interferindo em seu quadro de defesa antioxidante, pois havia a preocupação de que, além da doença e do tratamento, a

alimentação deficiente em componentes antioxidantes também estivesse afetando a saúde dos paciantes. O processo do recordatório foi realizado duas vezes, uma, antes; e outra, depois da suplementação do cogumelo do sol. Foi feita, com o apoio do Laboratório Central do Estado do Pará, a coleta do sangue dos pacientes antes do início da suplementação e, após três meses, realizados novos exames. Todo o processo de coleta durou seis meses.

Uso do suplemento reduziu o estresse oxidativo É importante destacar que a suplementação do cogumelo era feita junto com o tratamento tradicional, composto pelos coquetéis, para HIV. “De forma alguma poderíamos interferir no tratamento medicamentoso que esses pacientes já faziam, o cogumelo do sol foi feito em formato de complemento. E por ser produzido a partir de um cogumelo, não é considerado medicamento, é considerado um

alimento, inclusive, é assim que está registrado no Ministério da Agricultura. Então, foi utilizado como suplemento alimentar”, explica Marcela Figueira. As conclusões da pesquisa apontaram a diminuição do estresse oxidativo nos pacientes que haviam realizado a suplementação com o Agaricus sylvaticus. “O cogumelo do sol realmente melhorou as defesas antioxidantes e conseguiu reduzir o estresse oxidativo de

maneira significativa pelas dosagens bioquímicas que fizemos. Isso, associado à alimentação saudável, pode, sim, melhorar a qualidade de vida desses indivíduos”, afirma a professora. Os resultados do trabalho de dissertação de Marcela Figueira, defendida em 2011, foram publicados em outubro de 2014, na Revista canadense Canadian Journal of Infectious Diseases and Medical Microbiology.


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Dissertação

Um canto sobre a cidade Pesquisador traz à tona a cena musical da década de 1980 Brenda Rachit

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ILUSTRAçãO WALTER PInTO

écada de 1980. Período marcado por transformações políticas e sociais em todo o Brasil. Belém do Pará também reconfigurava seu urbano, de maneira que os movimentos socioculturais ganhavam cada vez mais força. Isso significava, principalmente, mais espaços – físicos e sociais - para a produção artística em suas mais diversas linguagens. nesse contexto, a música popular ganhava força, espalhando-se pela cidade numa relação direta entre os artistas e o público. Inicialmente, impulsionado pela curiosidade e pelo envolvimento com a música, o pesquisador nélio Ribeiro Moreira debruçou-se sobre o cenário da canção popular oitentista da

capital paraense para entender as relações sociais entre os integrantes do mundo artístico dessa época. O objetivo era esquadrinhar os espaços sociais e as relações de sociabilidade havidas, bem como Belém era retratada nas canções, entendidas como produto cultural num circuito comunicacional, a partir das experiências dos artistas e, em contrapartida, entender como a dinâmica social foi influenciada por essas produções musicais. A Dissertação A música e a cidade: práticas sociais e culturais na cena da can-

ção popular em Belém do Pará na década de 1980 foi orientada pelo professor Antonio Maurício Dias da Costa e defendida no Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Sociologia (PPGSA)/IFCH/UFPA. “O que proponho neste trabalho é apresentar uma abordagem analítico-descritiva do cenário musical local, com o objetivo de verificar o sentido e o significado das práticas de sociabilidade ocorridas na cena da

canção popular de Belém do Pará, nos anos 1980”, explica nélio Moreira. Ele enfatiza que, embora os músicos não estivessem vinculados institucionalmente uns com os outros, aquele contexto os conectava. Isso se refletia nas canções, no descrever de uma realidade comum aos artistas locais expressos em uma espécie de sentimento de pertencimento àquela configuração social.


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1980: a Feira Pixinguinha e o Projeto Jaime Ovalle ACERVO DO PROJETO

nélio Moreira afirma que as transformações no espaço físico da cidade influenciaram o desenvolvimento de uma cultura musical na região. O autor inicia o trabalho apresentando dois importantes eventos ocorridos em Belém, no ano de 1980: a Feira Pixinguinha e o Projeto Jaime Ovalle. Segundo o historiador e antropólogo, a Feira Pixinguinha foi o desdobramento de um evento maior, denominado ‘Projeto Pixinguinha’, que consistia em proporcionar a incorporação das produções regionais ao circuito nacional, fazendo com que músicos nacionalmente conhecidos interagissem com os artistas das cidades visitadas. “Em Belém, a Feira Pixinguinha é o ponto inicial, porque é o momento em que os músicos locais têm contato com algo mais profissional. Por

exemplo, da Feira Pixinguinha de Belém foi gravado um disco no Theatro da Paz. Os músicos receberam pagamento e tiveram que fazer registro de direitos autorais. Assim, eles se viram bastante incentivados”, explica nélio Moreira.

O Projeto Jaime Ovalle ocorreu logo em seguida. O objetivo era apresentar novos artistas, dando-lhes estrutura para suas apresentações, e constituir um público de música popular na cidade. O evento acorreu no Theatro da Paz e foi

financiado pela Secretaria de Cultura, Desportos e Turismo. O pesquisador explica que, a partir desses dois eventos e dos encontros por eles proporcionados, a relação entre os próprios músicos acabou se estreitando e surgiu a necessidade de se constituir uma organização representativa para a classe. nélio Moreira afirma que as primeiras tentativas remontam ao final da década de 1970. A Associação dos Compositores, Letristas, Intérpretes e Músicos do Pará (CLIMA) foi quem obteve mais sucesso, permanecendo ativa de junho de 1985, momento de sua criação, até 1992. “Essa associação teria como finalidade ser um instrumento de enfrentamento político. Por meio dela, os artistas teriam uma voz mais potente, além de ser forma de contato mais recorrente entre eles”, diz.

“Belém-Pará-Brasil” é uma das canções emblemáticas Em um dos capítulos da dissertação, nélio Moreira analisa três canções “regionais” emblemáticas de 1980, que bem representam a cidade para aqueles artistas: a canção “Olhando Belém”, que, embora seja do compositor paulista Celso Viáfora, fez grande sucesso com a gravação de nilson Chaves; “Flor do Grão Pará”, composta por Chico Sena, e “Belém-Pará-Brasil”, de Edmar Rocha Jr., então vocalista da banda Mosaico de Ravena. As três composições revelam, de forma abrangente e ao mesmo tempo particular, o olhar do artista sobre a cidade e suas características. Mas deve-se destacar a forma peculiar de interação da região com o restante do País. Por isso, para entender o discurso contido nas canções, é fundamental a noção de Belém como uma cidade fronteira.

nesse período, foi construída uma identidade artística regional como demanda do momento e do lugar, expressa a partir da influência que a cidade exercia sobre os músicos. “Existia um significado simbólico e cultural, ou seja, eles tinham uma relação com o lugar e isso subsidiava a produção musical deles. Toda obra de arte é resultado da relação que o artista tem com o meio em que vive”, explica o pesquisador. Memória – Além de pesquisas bibliográficas, análises de fotos, vídeos e textos de jornais da época, nélio entrevistou alguns músicos que participaram daquela cena, o que possibilitou ao pesquisador esquadrinhar a construção de uma memória sobre a cidade e a canção.

Ele organizou em croquis o que designou de “circuito comunicacional da canção popular em Belém”, ou seja, os lugares que proporcionaram a circulação das produções musicais e de um público. Fazendo um levantamento dos “lugares da canção” na cidade e apresentando-os em ilustrações, foi possível notar que havia uma centralidade dessa prática no cenário urbano. Essa concentração se dava nos bairros Cidade Velha, Comércio e nazaré. “Portanto, a canção popular belenense oitentista é fruto do centro da cidade, das experiências das pessoas com essa centralidade, o que, obviamente, não se deu sem conflitos”, explica. Segundo as pesquisas de nélio Moreira, as canções percorriam, principalmente, os bares e as casas de shows da

cidade, pois poucos músicos tinham a oportunidade de gravar seus trabalhos. Sendo assim, a divulgação era feita, diretamente, entre artista e público, o qual acompanhava, de um estabelecimento a outro, os diversos shows que aconteciam nas noites da capital. O fim desse ciclo ocorre por volta de 1989. Tomando relatos e fontes jornalísticas, o autor afirma que o cenário foi se reconfigurando, “Belém mudou. Os lugares de canção perderam espaço para as grandes casas de show, que tocavam a música massiva da época. O processo de globalização acabou interferindo também. Isso se mostra nos contatos, na vinda de músicos estrangeiros para a região, o que resultou em uma transformação na produção musical da cidade”, explica nélio.


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Resenha Olhar, verbo expressionista Reprodução

Benilton Cruz

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Serviço Olhar, verbo expressionista, Benilton Cruz. Jundiaí: Paco Editorial, 2013.

livro investiga a recepção do Expressionismo alemão no Amar, verbo intransitivo, primeiro romance de Mário de Andrade, publicado em 1927 e substancialmente modificado pelo autor para a edição definitiva, a de 1944. Em seus três capítulos, são avaliadas as analogias entre as artes plásticas e o texto literário, por conta da obra analisada espelhar as assimilações estéticas do autor paulistano, em seu projeto estético-gramatical que, nos idos dos anos de 1920, defendia a expressão de brasilidade em todas as formas estéticas. Cada capítulo avalia três “retratos” de Elza, a alemã, protagonista do romance andradino. No primeiro, o lado artístico da preceptora, como um “ser enfraquecido”, vai abrir espaço para a fala brasileira manifestar sua força. A forte presença de um “olhar amplo” não vai impedir a “metamorfose do diminuto” na representação da heroína. Por sua vez, um “olhar restrito” denuncia os estereótipos de “homem-de-sonho” e de “homemda-vida”, ligados à intelectualidade de Graça Aranha. Em sua essência, o Olhar, verbo expressionista identifica ideias de diminuição na descrição de Elza, especificamente, naquilo que vamos chamar de “metamorfose do diminuto”. O estudo evidencia, portanto, um Mário de Andrade teórico dentro da obra de ficção marcada pela incidência do olhar limitado por estereótipos da época. O lado concreto dessa dualidade (o diminuto e o elástico) era que enquanto, na Alemanha,

Wilhelm Worringer divulgava a ideia de que o Expressionismo nas artes plásticas caracterizava-se pela dilatação de suas formas, algo como uma ”teomorfização” da noção elementar de figurativismo, aqui, no Brasil, um Mário de Andrade, pesquisador do Barroco de Aleijadinho desde 1919, via uma tendência pelo diminuto dessas mesmas formas plásticas. Assim, o livro, enquanto tese, prova a escolha por esse diminuto em razão do “sublime pequenino”, designação usada pelo escritor paulistano, derivar da tradição barroca brasileira, discussão presente ao longo do “idílio”, uma forma menor de narrativa, de Mário de Andrade. Wilhelm Worringer também divulgou um conceito novo de empatia, algo que é sentido na obra do escritor paulistano, como identificação cultural entre o deformismo da vanguarda alemã e o Barroco

brasileiro. O ponto histórico focado é o da admiração de Mário de Andrade pelos mestres, “deformadores da natureza”, nas artes plásticas e na música. Outro tema expressionista destacado no idílio é a fraternidade entre os imigrantes Elza e Tanaka, dois personagens do romance, no paralelo com a poesia de Franz Werfel, poeta admirado por Mário de Andrade justamente por enfocar o drama social da imigração do início do século XX. O ponto forte do Expressionismo, qualquer referência ao Grito, a tela do norueguês Edvard Munch, quadro que acabou virando um manifesto da vanguarda expressionista, como Representação Schrei em seu contexto vanguardista, aparece em uma cena do romance. Todavia essa Representação Schrei de Fräulein, descrita sob uma forte evidência barroca, mostra-nos como figuração rebaixada diante da riqueza de nossa fala, da literatura de Machado de Assis e da natureza brasileira. Assim, concluímos que é o verbo, ativo e “desgeograficado”, expressando uma literatura mais de acordo com a criatividade do falar brasileiro. Essa gramática, hermética e popular, sob o apelo sintetizador, é pequena e atuante, servindo como espelho da predileção pelas formas estéticas menores da nossa tradição barroca. O romance revisa fontes históricas da arte sem deixar de olhar a presencialidade da fala. O estético e o gramatical interagem uma mesma percepção modernista. A obra estudada revela sua Modernidade tardia e questionadora de sua identidade.


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A Hist贸ria na Charge

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