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12 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Maio, 2008

Entrevista

Negros preenchem todas as vagas destinadas a eles O pró-reitor de Ensino de Graduação (Proeg) da UFPA, professor Licurgo Peixoto de Brito, analisa a adoção da política de cotas para negros e estudantes de escolas públicas no vestibular deste ano - uma mudança polêmica na política educacional da Universidade. Foram reservadas 50% das vagas de cada curso para estudantes das escolas públicas e, dentre essas, 40% para negros, um perfil de cota diferente das outras instituições porque faz essa combinação. O professor Licurgo de Brito fala ainda sobre o fim do Processo Seletivo Seriado (PSS) e a desvinculação do Departamento de Apoio ao Vestibular (Daves) da Proeg. BERIA DO RIO - Aumentou o carentes? número de negros matriculados na Sim, nós estamos preparando um Universidade? programa de acompanhamento desses Licurgo Peixoto de Brito - Nós não estudantes e de incentivo também, tínhamos esse controle antes. Na verpor meio de políticas de assistência dade, nós nunca nos preocupamos com estudantil, bolsas, restaurante univeressa questão racial, de quantos negros sitário, que facilitam a permanência estão ingressando na universidade. do estudante carente na universidade. Nós passávamos sem dar atenção a Apesar de nós estarmos contribuindo essa questão. Tanto faz se o estudante também, quem está à frente desse que entrou é negro ou não é, é estudanprojeto é a Pró-Reitoria de Extensão te da UFPA. Nós não tínhamos essa (PROEX). preocupação de perguntar no formulário se é negro, nós não tínhamos isso. BDR - Qual a sua avaliação dessa Mas como no país todo se levantou experiência? essa discussão, nós passamos a fazer Para determinar o sucesso dessa esse levantamento de modo que não é experiência, nós teríamos que acompossível para nós comparar. Mas é pospanhar a permanência desses alunos sível dizer que a quantidade de negros durante uns quatro ou cinco anos na que entrou na Universidade supera os instituição. E isso, nós só poderemos 100% de vagas destinadas a eles que ter a resposta mais a diante, portanto. correspondem aproximadamente a mil Agora cinco anos é o tempo que está vagas. Entraram mais de mil. Agora, previsto para o sistema de cotas ficar se nós fizermos uma simulação, vamos em vigor. Depois desses cinco anos, ver que se nós tivéssemos feito esse após um estudo realizado, nós vamos controle em anos anteriores, em que voltar a analisar o tema e decidir se não havia reserva de vagas, provavelo sistema permanece ou se ele será mente esse número seria menor, esse modificado ou até suprimido. Um percentual seria menor pelo seguinte: dado importante é que o resultado eles foram muito guindados pelo sistedesse sistema de cotas, em termos de ma de cotas porque, com a reserva de diferença no ingresso dos anos antevagas, fica mais fácil para o candidato riores para este, só é percebido nos entrar. Com certeza entraram mais. cursos de alta demanda como Direito, Nós podemos dizer isso Comunicação Social, porque temos o padrão Medicina, Psicologia. da escola pública. Na Nesses cursos de alta escola pública nós tídemanda, realmente, nhamos esse controle o perfil altera porque no passado e nós verivocê tem aí candidatos ficamos que aumentou que, tradicionalmenbastante. Saiu em torno te, eram só de escode 42% para 50%, aprola particular ou quase ximadamente. Então, que exclusivamente como os negros estão de escola particular, incluídos nesse percenque entravam nesses tual da escola pública, cursos, agora não en“Foram provavelmente, eles entra meio a meio. Nos traram também nessa demais cursos isso não preenchidas condição. altera. Cursos de bai100% de vagas xa demanda como as BDR - Vai haver alPedagodestinadas a eles licenciaturas, guma política para gia, Ciências Sociais, evitar a evasão desses sempre a predominân(negros)” estudantes - a maioria cia foi de estudantes

mari chiba

Licurgo de Brito: resultado só é percebido nos cursos de alta demanda. de escola pública e continua sendo. E, dentre eles, os negros também indistintamente. Isso aí não muda absolutamente nada.

caro. A taxa de inscrição, de R$ 88,00, é uma taxa alta para o padrão social do nosso Estado. Por isso, os pedidos de isenção são muito grandes, porque a taxa é alta. Nessa condição, o proBDR - E quanto ao PSS, por que cesso já acaba excluindo candidatos ele acabou? de saída, ficam excluídos aqueles que Com relação ao modelo, a decisão da não tiveram uma boa escolaridade mudança coube ao Consep, o Conseou que não se aplicaram aos estudos, lho Superior de Ensino Pesquisa e Exficam excluídos os candidatos que não tensão é que deliberou pela mudança podem pagar, apesar de nós termos um do modelo. Por quê? O PSS não era processo com 12 mil isenções, somos bom? Foi feita uma avaliação do PSS a universidade que mais isenta no depois dos três anos iniciais - 2004, Brasil – o maior número de isenções 2005, 2006. Ao longo do ano de 2006, é o nosso, perto do nosso tem uma ou foi feito um estudo com entrevistas, duas com 5 mil isenções e nós fazecom formulários, avaliação, análise mos 12 mil. E isso se torna também desses dados, etc. Durante o ano de um agravante àquele quadro anterior. 2007, nós apresentamos todos esses Então, houve uma proposta de nós dados no nível da administração da simplificarmos esse modelo, tornar ele Universidade, da Coperves e do Conmais simples, retirando o seriado para sep, que são os órgãos responsáveis não comprometer isso e dar tempo por esse processo, e nós verificamos para as escolas reagirem, na verdade, que os principais objetivos do Processo um modelo que tivesse outro apelo Seletivo Seriado foram alcançados acadêmico também. E aí entra a caracsatisfatoriamente. No entanto, houve terística diferencial desse novo modedois fatos observados lo, que eu acho que vale que nos fizeram recuar à pena a mudança. Não no modelo. O primeiro se trata de uma volta às fato foi o declínio no inquestões de múltiplas gresso de estudantes das escolhas, como era no escolas públicas. A espassado. Trata-se de cola pública vinha, traum avanço, eu diria. dicionalmente, com um Apesar das questões ingresso equilibrado, serem de múltipla esem torno de 50% com colha, não discursivas, a escola privada. Mas é outra concepção difedepois da aplicação do rente da anterior. Qual PSS começou a reduzir. é a diferença? É que “Nós não Por que isso aconteceu? vinha sendo praticado Porque o PSS começou um modelo de avaliadávamos a verificar o empenho ção pelos conteúdos. do aluno desde a priConteúdo da primeira atenção a essa meira série. Então, em série, da segunda série, questão” um sistema que funda terceira, etc. Mas a ciona bem isso é bom, nossa matriz curricular mas em um sistema é baseada em compeque é frágil evidencia tências e habilidades, fragilidade. O modelo já estabelecidas pelos desse seriado evidenciou a fragilidade Parâmetros Curriculares Nacionais. da escola pública. E aquela corrida Isso, em nível normativo, já mudou, que os estudantes da escola pública mas as nossas avaliações ainda estão costumavam fazer, já no final, para em cima dos conteúdos como se só compensar todas as perdas, passou a isso fosse resolver o problema. E a não dar mais para eles fazerem. No gente sabe que conteúdo não resolve, momento em que a nossa preocupação o que resolve é quando a pessoa sabe social com a educação pública é inteno que fazer com ele. Isso é que resolve. sa, fica difícil nós sustentarmos um Não adianta decorar que não vai sair modelo que, de certo modo, coloca de nada que preste. Isso é que vai fazer lado a escola pública que é a força que a diferença, não é se ele decorou a precisa ser dada ao país. Então, isso foi fórmula, se ele sabe fazer a conta, se determinante para a extinção do PSS. ele não sabe, é se ele sabe pensar, se O outro problema é o seguinte: ele é ele sabe aplicar o conteúdo que ele tem um processo complexo e, portanto, é nas situações mais diversas. É isso.

O

Grupo de Catálise e Oleoquímica, do curso de Química da UFPA, desenvolve o projeto “Craqueamento Catalítico de óleo de Buriti” para a produção do diesel verde, como foi chamado o combustível para diferenciá-lo do biodiesel. As Engenharias Química e Mecânica da UFPA, o Instituto Militar de Engenharia, do Rio de Janeiro, e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia são parceiros no projeto, patrocinado pela Eletrobras. O objetivo é gerar energia elétrica limpa para comunidades isoladas da Amazônia. Pág. 3 mácio ferreira

Poluição

República

Risco de vazamento em Vila do Conde

Pão e circo para conquistar povo para novo regime

Pág. 4

A troca dos nomes de ruas e a promoção de festas cívicas e banquetes foi a estratégia usada pelos republi-

canos para fazer o povo esquecer a Monarquia no Pará, afrima a historiadora Daniela Moura. Pág. 8 reprodução

Supermercados

Trabalho por escala sacrifica vida privada

Pág. 11

Francisco Neto: sonho Banquete no Bosque Rodrigues Alves durante Congresso do PRP, em 1803

Cheia

Sistema monitora casas alagadas O curso de Sistema de Informação do Campus de Marabá desenvolve projeto para monitorar enchentes, em Marabá. Páginas 6 e 7

Coluna do Reitor O reitor Alex Fiúza de Mello fala sobre ética e qualidade na academia. Pág. 2

Opinião Jane Beltrão escreve sobre a Associação dos Povos Indígenas do Tocantins. Pág. 2

Imigração

Entrevista O pró-reitor de ensino de Graduação, Licurgo de Brito, analisa a política de cotas e o fim do PSS na Universidade. Pág. 12

Japoneses sonhavam com a volta mácio ferreira

Raimundo Sena

Diesel verde para Amazônia fotos mácio ferreira

Política de cotas foi bem aceita na Universidade que adotou um sistema misto

JORNAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ • ANO VI • No 61 • MAIO, 2008

Dissertação de mestrado do historiador Francisco Neto aborda o processo de socialização dos imigrantes japoneses no Pará. Pág. 11


LURDINHA RODRIGUES

2 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Maio, 2008

Alex Fiúza de Mello

reitor@ufpa.br

A Ética e a Qualidade

A

e um modelo de cidadania. E isso supõe não apenas salário digno – reivindicação justa, mas, ao que parece, exclusiva do movimento sindical –, mas, igualmente, compromisso ético com a causa da educação, seriedade no exercício do próprio métier. Não é mestre aquele que se recusa a estudar, a aprender, a pesquisar, a dar o máximo de si numa sala de aula ou laboratório para que o aluno, se possível, torne-se, um dia, melhor que ele próprio, superando-o e fazendo avançar, assim, o patamar do conhecimento. Quem se ausenta de seus compromissos, quem é arrogante, ignora seus deveres, não quer dar aulas (ou faz de conta que dá) é cidadão inútil e desonesto: ganha muito pelo que não faz. Não tem vocação universitária. É muito comum – e justa – a reivindicação dos docentes por maiores oportunidades de qualificação e melhor ambiente de trabalho – salas de aula dignas e confortáveis, laboratórios equipados, acervo bibliográfico atualizado, gabinetes, etc. – como condição prévia para o bom desempenho acadêmico. Contudo, o que dizer quando todas essas premissas estão razoavelmente satisfeitas e o

rendimento acadêmico continua a desejar? Qual, então, a justificativa e a explicação? Não acredito num educador que diz que não dá aula ou não tem motivação enquanto todas aquelas pré-condições não estejam satisfeitas. Neste caso, a dificuldade funciona como mero álibi para a sua desonestidade. Continuará, certamente, a ser mau professor em condições materiais ótimas. Não acredito em professor que, se julgando “estrela” em sua área profissional, faltareitor@ufpa.br com regularidade às suas obrigações e menospreza a cátedra universitária. Este pode até ser um brilhante profissional, mas não é um educador. Não acredito em doutor que se nega a dar aulas na graduação, como se isso fosse algo menor ou desprestígio. Este também ilude a comunidade, pois ele sabe (ou deveria saber) que, numa grande universidade, a graduação é tão valorizada quanto a pós e são os doutores que recebem os estudantes calouros, sobretudo nos cursos introdutórios. A universidade melhorou – tem melhorado progressivamente –, nos últimos anos, as suas condições de

OPINIÃO

Jane Felipe Beltrão • Laboratório de Antropologia Arthur Napoleão Figueiredo

oferta: maior número de doutores, laboratórios de pesquisa melhor equipados, salas de aula recuperadas e refrigeradas, gabinetes de trabalho que se expandem, acervo bibliográfico em franca recomposição, regras e regulamentos mais modernos e atuais. Nesse quadro, a qualidade do ensino deveria, também, proporcionalmente, apresentar melhorias. Se os salários ainda não são os ideais, também nunca foram no passado. O fato é que não são os salários e as condições adequadas de trabalho que respondem a todas as questões pendentes da qualidade do ensino. O buraco é mais embaixo. A qualidade do ensino depende de práticas sociais coerentes, do jogo das mentalidades, dos valores hegemônicos. Depende de uma colegialidade acadêmica responsável e ativa entre pares, no seio da qual o interesse público (dos estudantes, da sociedade) deve ter prioridade sobre os particulares e corporativos. Sim, os professores, para serem verdadeiros mestres, têm de dar exemplo. Sobretudo, exemplo da coerência – ou não têm vocação universitária. Em resumo: a qualidade do ensino é, também, uma questão de ética.

jane@ufpa.br

19 de abril. O exercício do pluralismo é essencial

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o ano da graça de 2000, fechando milênio, no dia 31 de julho, em assembléia os povos indígenas Amanayé, Anambé, Aikewára, Atikun, Guarani, Gavião (Kyikatêjê e Parkatêjê), Guajajara e Xikrín constituíram a Associação dos Povos Indígenas do Tocantins (Apito). Formada por lideranças e profissionais indígenas que realizam articulação política em busca de soluções para os problemas vivenciados quotidianamente, a luta os torna incansáveis no encaminhamento de demandas a respeito dos direitos étnicos a órgãos públicos ou privados. Os anos se passaram e a reivindicação por educação escolar em todos os níveis de ensino se agigantou. Hoje, a educação escolar de qualidade é fundamental para a concretização dos projetos indígenas de autonomia e autodeterminação. Historicamente, a educação escolar foi pautada pela catequização; pelas políticas de assimilação e integração que visavam manter a dominação com vistas à exploração dos

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ Rua Augusto Corrêa no 1 - Belém/PA beiradorios@ufpa.br - www.ufpa.br T 91 3201-7577

territórios indígenas e a incorporação gradativa do indígena ao mercado de trabalho e à sociedade nacional. Mas, o cenário étnico no Brasil é integrado por mais de 200 povos indígenas detentores de sistemas jurídicos, religiosos, sociais, educacionais, lingüísticos e culturais próprios, fato que possibilitou o “levante” pela cidadania, mantendo a pertença étnica. Em 26 de março de 2008, de posse de consubstanciado documento, os representantes da APITO estiveram com o Reitor da UFPA, Alex Fiúza de Mello, reivindicando tornar os cursos da Universidade mais representativos da pluralidade étnica que constituem, pois ao longo dos anos, poucos foram os indígenas que chegaram aos campi da instituição. Em Belém, Marabá e Altamira, apesar da concentração de povos indígenas e de seus representantes nos centros urbanos, contam-se nos dedos os formados pela UFPA. O ambiente universitário ainda é hostil e as ações para promover a inclusão apresentam-se pontuais e pou-

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Imigração

Coluna do REITOR

essência da universidade – como da escola – não é o prédio ou o equipamento, mas o professor e o aluno – a qualidade e o padrão de sua interação. Se houver infra-estrutura de excelente nível, mas professores desqualificados ou ausentes e alunos desinteressados e passivos, não há academia. Ela está muito mais presente sob um teto de palha, com bons professores empenhados em orientar e alunos interessados em aprender, que no interior de um moderníssimo e bem equipado edifício, mas sem a devida sinergia intelectual. A razão de ser da universidade é o aluno, mas é o professor o seu lastro de referência. Tornam-se inúteis o computador de última geração e uma biblioteca monumental sem o trabalho primordial e insubstituível do mestre, do educador. A universidade, para deter qualidade, depende de mestres que mereçam essa designação, que sejam coerentes e dêem exemplo com as próprias atitudes: exemplo de assiduidade, de dedicação aos estudos, de interesse em orientar, de disponibilidade ao estudante. Um mestre deve ser uma referência intelectual

Mácio Ferreira

BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Maio, 2008 –

co representativas. Agora, tomando nas mãos a condução de seus destinos, as lideranças indígenas reivindicam a imediata declaração de vagas para a transferência de três indígenas, que estudam fora do Pará, e a abertura de vagas em todos os cursos da UFPA, nos diversos campi. A proposta apresentada foi formulada, não apenas no sentido de requerer, mas de oferecer à Universidade, oportunidade de promover, com urgência, a inclusão de indígenas a partir do acréscimo de vagas nos cursos de graduação para que, ao formar novos profissionais, nos próximos dez anos, os profissionais expressem a complexidade étnico-racial do Estado do Pará e, por conseguinte, a complexidade da sociedade brasileira. Sabedores de que não basta ter a vaga, os embaixadores da APITO indicam a necessidade de pensar, concomitantemente, em (1) um programa de apoio acadêmico psicopedagógico, ou de tutoria, não obrigatório, sob solicitação, para os estudantes indígenas

que demonstrarem dificuldades no trajeto do curso; (2) avaliar os resultados obtidos periodicamente, sugerindo ajustes e modificações quando se identificar aspectos que prejudiquem a eficiência do projeto; (3) a instalação de Ouvidoria, destinada a promover a inclusão de membros das demais minorias e categorias vulnerabilizadas. Para alcançar tais objetivos, as lideranças presentes à reunião se comprometem, juntamente com a instituição, a pleitear a concessão de bolsas para manutenção e resolver os problemas relativos ao alojamento e alimentação dos estudantes indígenas. Nossos embaixadores reivindicam e se mantêm disponíveis para promover, não apenas, a inclusão dos povos indígenas, mas como cidadãos se comprometem a ampliar a inclusão. Após oito anos de constituída, a APITO presta inestimável contribuição à cidadania e, daqui pra frente, todos os dias, como 19 de abril, comemora uma sociedade democrática, plural e, de fato, inclusiva.

Reitor: Alex Bolonha Fiúza de Mello; Vice-reitora: Regina Fátima Feio Barroso; Pró-reitora de Administração: Simone Baía; Pró-reitor de Planejamento: Sinfrônio Brito Moraes; Pró-reitor de Ensino de Graduação: Licurgo Peixoto de Brito; Pró-reitora de Extensão: Ney Cristina Monteiro de Oliveira; Pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação: Roberto Dall´Agnol; Pró-reitora de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: Sibele Bitar Caetano; Prefeito do Campus: Luiz Otávio Mota Pereira. Assessoria de Comunicação Institucional JORNAL BEIRA DO RIO Coordenação: Luciana Miranda Costa; Edição: Raimundo Sena; Reportagem: Ericka Pinto/Walter Pinto/Raimundo Sena/Ana Cristina Trindade; Fotografia: Mari Chiba/Mácio Ferreira/ Manoel Neto; Produção: João Luiz de Freitas; Texto: Hellen Pacheco/Tamiles Costa; Comunicação Institucional: Lorena Filgueiras/Alinic do Carmo/Tamiles Costa; Secretaria: Elvislley Chaves/Gleison Furtado; Beira on-line: Leandro Machado; Revisão: Marcelo Brasil (Editora Ufpa)/Glaciane Serrão (Ascom); Arte e Diagramação: Omar Fonseca Impressão: Gráfica Ufpa.

Sonho trouxe japoneses ao Estado do Pará

Estudo aborda processo de socialização das primeiras gerações de imigrantes fotos Arquivo do pesquisador

Cristina Trindade

A

chegada do navio Manila Maru ao porto de Belém, em setembro de 1929, marcou o início da imigração japonesa ao Pará. As primeiras famílias, compostas por 189 pessoas, foram instaladas em uma colônia agrícola implantada por uma empresa japonesa no município de Tomé-Açu. A migração ao Pará integrava a política expansionista japonesa realizada por meio de companhias de colonização, que compravam terra e propiciavam a infra-estrutura para instalação de pequenos proprietários. O registro da trajetória dos japoneses no Estado começou a ser feito a partir de 1980, quando os primeiros imigrantes passaram a escrever suas memórias. O historiador Francisco Rodrigues da Silva Neto se debruçou em três publicações que registram a saga desses imigrantes, para compor a dissertação de mestrado “Os japoneses no Pará: um estudo sobre a construção de identidades”, defendida no programa de Pósgraduação em Ciências Sociais com ênfase em Antropologia. O trabalho aborda o processo de socialização das duas primeiras gerações de descendentes de imigrantes nascidos na colônia de Tomé-Açu. Com o objetivo de investigar como iniciou a formação de uma identidade nipo-brasileira, Francisco Neto concentrou-se em fragmentos bibliográficos extraídos do livro comemorativo aos 70 anos de imigração japonesa, organizado pela Associação Pan-Amazônia Nipo-Brasileira (Apanb) de Belém e duas autobiografias dos imigrantes Paulo Ohashi e Akira Nagai, editadas pelas próprias famílias. O primeiro autor é filho de um imigrante passageiro de primeira leva. O segundo, um imigrante do período posterior à Segunda Guerra. Os jornais da época e conversas com membros da comunidade japonesa também foram utilizados ao longo da construção do trabalho. Os textos analisados mostram a luta pela sobrevivência dos imigrantes desde a saída do Japão até a chegada ao Pará, o cotidiano familiar e a inserção na sociedade local. Destacam também, os que são considerados como heróis da imigração, entre eles, os dirigentes das companhias que estimulavam a imigração e os que criaram as primeiras associações culturais. As narrativas também dão destaque às adversidades enfrentadas, como poe exemplo, a baixa produtividade dos lotes agrícolas e as difíceis relações durante a Segunda Guerra, período silenciado por alguns imigrantes.

A cultura japonesa só começou a preocupar os imigrantes com o fim do sonho de voltar para casa

n Identidade começa com fim do sonho “A imigração japonesa para o Estado do Pará não se revestia de um cunho de pobreza, como aconteceu com outras etnias. As acomodações de viagem eram muito boas e a chegada deles foi vista como incentivo para o desenvolvimento do interior paraense. Mas como nem todos eram agricultores e havia diferenças sociais entre eles, muitos se dispersaram pelo Estado em busca de outras atividades. A sociedade paraense também tinha uma avaliação positiva da vinda dos japoneses, e até festas foram oferecidas pelo comandante do Manila Maru às autoridades e a segmentos da sociedade paraense por ocasião da chegada, segundo registros de jornais da época”, afirma Francisco Neto. A primeira leva de imigrantes japoneses almejava o rápido enriquecimento e o retorno ao Japão. A própria campanha dos governos brasileiro e japonês tinha esse discurso para atrair e incentivar a imigração. Como a volta para a terra natal era considerada certa, várias eram as famílias que se opunham que seus filhos recebessem educação aos moldes brasileiros, porque não de-

monstravam, a priori, interesse em se integrar à sociedade brasileira. Mas, após alguns anos, cientes de que o retorno não seria mais possível, os imigrantes começaram a construir comunidades para manter os aspectos relacionados à cultura japonesa. “A formação da identidade nipo-brasileira começa no momento em que os imigrantes percebem que a volta à terra natal não será mais possível para eles e, apesar do rígido controle no ambiente familiar para manutenção das tradições, percebem aos poucos que os descendentes passam a adotar também os costumes e comportamentos dos brasileiros. Isto chegou a originar os conflitos intergeracionais”, observa o pesquisador. Outro fator relevante para a formação dessa identidade pode ser constatado por meio daqueles que experimentaram o que pode ser chamado de uma segunda emigração. “Os que conseguiram voltar ao Japão, encontraram um país muito diferente do que haviam deixado. Os imigrantes experimentam sentimentos que oscilam entre pertença e exclusão, tanto no Brasil como no Japão.

Os japoneses não eram pobres e tinham uma hospedaria especial para eles

mácio ferreira

Francisco Neto: avaliação positiva

n Desinteresse preocupa colônia O futuro da colônia japonesa preocupa a comunidade no Estado. O desinteresse pela aprendizado do idioma japonês por parte dos descendentes é um dos sinais desse afastamento da cultura japonesa. “A terceira geração só se mostra interessada em um curso de língua japonesa quando quer ir trabalhar no Japão. Avós e netos, muitas vezes, necessitam de intermediários para uma simples conversa”, diz o historiador. Também preocupa a baixa participação nas atividades culturais promovidas pelas associações japonesas. “Existe uma relação matizada entre os descendentes dos imigrantes japoneses e os brasileiros visíveis nos eventos das associações culturais que, a cada ano, atraem mais brasileiros. Resta à primeira geração nascida em solo brasileiro, os nisseis, o desafio de manter os traços culturais e repassá-los, ainda que dentro de outra releitura, para os descendentes”.


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BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Maio, 2008 –

Pesquisa

Paixão de LER

UFPA desenvolve diesel verde de buriti

Coletânea promove reflexão sobre Educação e Filosofia

Comunidades serão beneficiadas com energia limpa e cotas de combustível

O

rganizada por Maria dos Remédios de Brito, Damião Bezerra Oliveira e Jadson Fernando Gonçalves, a coletânea de textos Filosofia, Educação e Formação – apontamentos e perspectivas é produto de reflexão de pesquisas e de outras produções livres, prioritariamente relativas ao campo da filosofia e educação. Estão presentes nessa viagem do pensar bases formativas diferentes Pedagogos, Psicólogos, Filósofos e Educadores, que enfocam a educação e a formação a partir de seus campos disciplinares, sem esquecer que o fio condutor da reflexão consiste em pensar o indivíduo, assim como o seu processo de constituição. Desvendar os mananciais do processo formativo presentes nas experiências educativas e filosóficas é o grande foco desta publicação, que reúne textos em cinco eixos norteadores. No primeiro eixo, quatro ensaios tentam expressar o cuidado com a formação cultural e educacional que perpassa as reflexões dos filósofos Nietzsche, Adorno, Benjamin e Dussel. Maria dos Remédios mostra que a preocupação com a Bildung faz parte essencial do pensamento de Nietzsche. José da Silva, inspirado no texto de Theodor Adorno, O ensaio como forma, bem como em sua maneira de filosofar, propõe um desafio: buscar no ensaio uma nova forma de realizar a filosofia da educação. Raimundo Nonato, com base no texto O Narrador, de Walter Benjamin, demonstra que, no mundo em que vivemos – sustentado pelo acelerado desenvolvimento científico e tecnológico –, a narrativa, enquanto relato de uma experiência humana, está chegando ao fim. João Batista esclarece como Dussel, partindo criticamente de Heidegger e se apoiando em Lèvinas, trabalha a relação entre os homens numa perspectiva ética e não ontológica.

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PRÓXIMOS LANÇAMENTOS n Breviarium - para refletir com Pe. António Vieira.

n A Palavra Divina na

Surdez do Rio Babel: A Amazônia de Vieira - em Cartas e Papéis.

n Urgências em

Endocrinologia e Metabolismo: Diagnóstico e Tratamento na Criança, no Adulto e na Gestante.

Livraria do Campus Rua Augusto Corrêa, nº1, Campus Universitário do Guamá Telefax (91) 3201-7965 Fone (91) 3201-7911. Livraria da Praça: Instituto de Ciências da Arte da UFPA. Praça da República s/n Fone (91) 3241-8369 O livro contém textos de diversos autores, organizados por três professores

n Novo olhar no fenômeno da educação O segundo eixo norteador desta coletânea é constituído de textos que mostram categorias e contornos diferentes por meio dos quais a educação e formação poderá ser posta em destaque na análise das tensões de nosso mundo globalizado. Cézar Luís utiliza a perspectiva fenomenológica sob novos ângulos – a passagem, trânsito, e a possibilidade, esta inspirada em

Heidegger “Ser e Tempo”, dando, pois, ao fenômeno da educação outros olhares e novas nuances. Gilcilene Costa, tendo como principais interlocutores Nietzsche e Deleuze, problematiza não apenas certas imagens que fazem da educação um lugar de “suportação” e de “falta”, mas também as concepções universalistas de Sujeito e Verdade que operam como balizadores do modelo de escola que a Moder-

ção infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental; deficiências na formação acadêmica do bacharel em Direito; e processos de subjetivação dos docentes no contexto da reestruturação de um curso de Pedagogia. Afonso Welliton e Edinéa Bandeira­ debatem a municipalização do ensino fundamental. Tatiana do Socorro reflete sobre a relação masculinidade e magistério nos dias de hoje. Paulo Sérgio analisa a formação acadêmica dos bacharéis dos cursos jurídicos do Pará e Jadson Fernando, problematiza as práticas discursivas e os processos de subjetivação dos docentes no contexto do Movimento de Reestruturação Curricular do Curso de Pedagogia da UFPA. O quinto eixo desta coletânea debate duas questões eminentemente filosóficas – colonização e tolerância cultural; tensão histórica entre filosofia e sociedade democrática – e apresenta um sugestivo manual “para se

busca por novas alternativas de energia, no Brasil, é cada vez mais freqüente. Na Universidade Federal do Pará, a pesquisa e o desenvolvimento de inovações nessa área são realizadas, entre outros, pelo Grupo de Catálise e Oleoquímica, do curso de Química da instituição formado pelos pesquisadores Geraldo Narciso da Rocha Filho, José Roberto Zamian, Carlos Emmerson Ferreira da Costa e Heronides Adonias Dantas Filho. “Craqueamento Catalítico de óleo de Buriti” é o mais novo projeto em andamento. Consiste em produzir combustível semelhante ao petróleo, só que gerado a partir da quebra de moléculas de óleo vegetal, no caso o óleo de Buriti. As negociações com a Eletrobrás, que está financiando o estudo, iniciaram em março de 2006. Em 2007, o projeto foi assinado, mas só começou efetivamente em janeiro de 2008. Os parceiros da Química nessa iniciativa são a Engenharia Química e a Mecânica (no âmbito da UFPA),

O Laboratório de Pesquisa e Análise de Combustíveis controla a qualidade o Instituto Militar de Engenharia (IME), do Rio de Janeiro, e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). O projeto tem duração prevista de três anos. “Gerar energia elétrica a partir da biomassa, no caso o óleo vegetal, por meio de uma cadeia complexa que envolve manejo sustentável e

extração, depois a produção do óleo, controle de qualidade e o teste nos motores, é o principal objetivo da Eletrobrás”, afirma o coordenador do projeto, doutor em Química, José Roberto Zamian. O processo de craqueamento é uma espécie de “quebra” das macromoléculas dos triglicerídeos do óleo vegetal em frações similares

nidade instituiu. Bruno Pucci em “Educação contra a barbárie: 2007” mostra que a presença da barbárie ou a perspectiva de seu retorno faz parte do contexto sociocultural de Adorno. Sinésio Ferraz se propõe a refletir, à luz da Teoria Crítica, sobre um preocupante fenômeno de nosso mundo globalizado, denominado adequadamente por ele “educação paranóica”.

n Tensão histórica entre filosofia e sociedade O terceiro eixo norteador trata de quatro temáticas diretamente relacionadas ao cotidiano da escola: currículo como lugar de cultura e de poder; coordenação pedagógica sob a ótica dos estudos culturais; envolvimento dos pais na tarefa pedagógica e proposta de ensino da filosofia. Os textos são de Diselma Marinho, Vilma Nonato de Brício, Ana Patrícia e Márcio Danelon que abordam questões como a possibilidade do profissional da educação desenvolver seu trabalho como uma política cultural, análise de currículo enquanto relação de poder e de construção de práticas no cotidiano escolar, as implicações do envolvimento dos pais na tarefa escolar e a questão do ensino da filosofia O quarto eixo norteador se preocupa com outros problemas pedagógicos que caracterizam as experiências formativas escolares, como gestão, descentralização e municipalização do ensino; masculinidade e magistério na educa-

fotos mari chiba

Hellen Pacheco

Estão presentes nessa viagem do pensar bases formativas diferentes Lais Zumero

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escrever uma excelente proposta de tese ou dissertação”. José Valdinei discute questões referentes ao processo de colonização e tolerância cultural. Damião Bezerra e Waldir Ferreira refletem sobre a crise moderna da ontologia da identidade. No último texto, Sandra Corazza apresenta orientações de como construir e escrever uma dissertação de mestrado e uma tese de doutorado. Os ensaios desta coletânea tentam, pois, mostrar que, na luta desigual entre formação e informação, o elemento mais frágil ainda é o ponto de apoio para uma possível emancipação; e que formação, em tempos de tecnologias digitais e genéticas, significa criar condições para que os educandos apreendam o sentido das forças de formação presentes no domínio de seus estudos, bem como desenvolvam a capacidade de refletir sobre elas. Texto baseado na Apresentação e na Introdução da obra.

ao diesel, à gasolina e ao querosene, que possuem moléculas menores. A técnica é semelhante ao que acontece em uma petroquímica, que craqueia o petróleo para conseguir frações mais leves de combustível comum. A ênfase do projeto está em obter a maior quantidade possível de óleo vegetal. Ele foi denominado pelo grupo de “diesel verde” para diferenciá-lo do biodiesel já conhecido no país, produzido através do processo de transesterificação que é a reação de um álcool com o óleo. A inovação está justamente em realizar um processo de obtenção de combustível, usando somente o óleo vegetal. “É um projeto mais audacioso, em termos de pesquisa, porque não existe um processo igual para este tipo de óleo envolvendo toda a cadeia, da produção até os testes em geradores”, afirma Zamian. O buriti foi escolhido por ser uma oleaginosa comum na região Amazônica, principalmente no arquipélago do Marajó, mas que ainda não tem plantação comercial. As comunidades serão orientadas para o manejo sustentável da floresta, visando à obtenção dos frutos recolhidos para a produção de diesel verde.

Os pesquisadores que integram o Grupo de Catálise e Oleoquímica e que estão envolvidos na pesquisa do diesel verde

O buriti é muito comum na região

n Energia limpa para comunidades isoladas Ultrapassada a etapa extração, uma parte do óleo obtido será embarcada para a UFPA e a outra para o IME, no Rio de Janeiro. A primeira etapa do processo - denominada “Otimização das condições de craqueamento” - será realizada em laboratório pela Química. Essa fase inicial demorará aproximadamente um ano. Depois será construída uma planta para o craqueamento, ou seja, uma usina em escala maior com dimensões para 200/250 kg para atender a demanda do projeto. Ela será instalada na Engenharia química, que ficará responsável pela operação da planta e utilização do processo em escala maior. Depois do craqueamento do óleo vegetal, as frações de combustível obtidas serão levadas para o Laboratório de Pesquisa e Análise de Combustíveis (LAPAC), que faz o controle de qualidade de acordo com as normas da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Para a execução do projeto

há duas grandes dificuldades. A primeira está relacionada ao manejo e extração do óleo nas comunidades, já que o Buriti deve ser obtido em quantidade suficiente para uma extração satisfatória. A segunda é uma questão técnica, pois o desafio é aumentar a escala do processo, por meio da instalação de uma planta capaz de produzir um craqueamento dentro do padrão de qualidade adequado e em grande quantidade. Os benefícios gerados a partir da implantação e êxito do projeto são vários. Em primeiro lugar, possibilitará a geração de renda pela população das comunidades locais, que receberão uma porcentagem do que é produzido e poderão revendêlos. O segundo é a geração de energia em comunidades isoladas, por meio da instalação de um motor com base no óleo vegetal. O terceiro é a diminuição do problema de contaminação ambiental, já que o teor de enxofre é praticamente insignificante no

diesel verde. Além disso, há toda uma gama de desenvolvimento tecnológico que ocorrerá na região, com a adoção de novos métodos e equipamentos. A UFPA, em particular, será beneficiada pela modernização da Química, Engenharia Química e Engenharia Mecânica pela implantação da planta de craqueamento e pela ampliação de serviços que a universidade pode prestar à comunidade. Do ponto de vista acadêmico, por meio da oferta de bolsas de iniciação científica, mestrado e doutorado, previstos no projeto, ocorrerá a formação de mão-deobra qualificada, tanto para a Química quanto para a Engenharia Química e Mecânica. A 1ª etapa será realizada no laboratório de Química


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BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Maio, 2008 –

fotos Arquivo do pesquisador

Poluição

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Supermercados

Risco de vazamento é alto em Vila do Conde

Pesquisa mostra áreas de risco e serve de alerta a autoridades e empresas

Trabalho por escalas sacrifica vida privada

A influência da gestão de recursos humanos no cotidiano de trabalhadores arquivo

Walter Pinto

“O

Cristina Trindade

Pelo porto passam minérios, soda cáustica e combustível o que lhe confere um alto grau de vulnerabilidade

População desconhece dimensão dos riscos Mácio Ferreira

Originária do século XVII, a Vila do Conde permaneceu, até o início da década de 70 do século XX, como um pequeno lugarejo, localizado as margens do rio Pará. A implantação do distrito industrial, no início dos anos 80, mudou a realidade da região. De uma população formada por pescadores e lavradores de pouco mais de 500 habitantes passou a receber diversos fluxos migratórios. Os empreendimentos industriais passaram a dominar a economia local e, para que fossem instalados, algumas comunidades foram removidas, mas outras permaneceram no local deixando a Vila do Conde nos limites do distrito industrial e a população vulnerável a acidentes tecnológicos. A economia de Vila do Conde, que centrava-se nas atividades de pesca e agricultura familiar de subsistência, passou a ser heterogênea e, hoje, está

José Edilson: área vulnerável distribuída na pesca, comércio, serviços, lazer e indústria. “No levantamento socieconômico verificou-se que a população tem consciência do risco ambiental, mas desconhece a dimensão dos problemas e de suas conseqüências. Eles, primeiramente, associam a pre-

Banhistas se divertem na praia perto do porto

sença da indústria e do porto ao progresso, ao emprego e à geração de renda, do que a um dano ambiental ”, informa o pesquisador. Os estudos apontaram que a população formada pelos pescadores é a que apresenta o maior grau de vulnerabilidade ao vazamento, seguida pelos moradores da praia e os de terra firme. “A atividade pesqueira será a primeira a ser prejudicada. Portanto, é necessário uma fiscalização mais rigorosa, nas atividades do porto com a criação de medidas preventivas. Os resultados da pesquisa sobre o risco de vazamento de óleo em Vila do Conde vão subsidiar os trabalhos do projeto Potenciais Impactos Ambientais do Transporte de Petróleo e derivados na Zona Costeira Amazônica – Piatam Mar, que tem a participação das instituições de ensino e pesquisa do Brasil, entre elas, a UFPA, com financiamento da Petrobrás.

A área de abastecimento é de maior risco

A

área portuária do distrito de Vila do Conde, município de Barcarena, possui um alto grau de vulnerabilidade para vazamento de óleo. Essa é a conclusão do estudo realizado no curso de pós-graduação em Geografia, da Universidade Federal do Pará, pelo pesquisador José Edilson Cardoso Rodrigues, para compor a dissertação de mestrado “Risco Tecnológico: uma análise do Porto de Vila do Conde como área potencial de ameaça ao vazamento de óleo” defendida no mês passado. O porto de Vila do Conde é um porto público administrado pela Companhia das Docas do Pará. Além da importação e exportação de alumínio e bauxita, nele se desenvolvem atividades de transporte, armazenamento e distribuição de óleo combustível e de outros produtos tóxicos que ameaçam potencialmente as comunidades e sistemas naturais do entorno. “A Vila do Conde é uma área extremamente vulnerável a acidentes ambientais provocados por vazamento de óleo. São igarapés, rios e praias que podem ser atingidos, com o comprometimento da atividade econômica dos moradores. Considerando o porto como área de ameaça e a localidade de Vila do Conde como área de vulnerabilidade, desenvolvemos um estudo preventivo e elaboramos mapas mostrando as áreas de risco, para que sirvam de alerta às autoridades competentes e à própria indústria estabelecida na região”, explica o pesquisador. Para os estudiosos das questões ambientais, a questão do risco tecnológico deve ser tratada como mecanismo de prevenção e tomada de decisões por parte dos órgãos públicos e privados visando a segurança da população e dos grupos expostos. O trabalho do geógrafo José Edilson baseou-se em um levantamento bibliográfico e pesquisa de campo, com entrevistas dos trabalhadores do porto e levantamento socioeconômico dos moradores. Ele identificou como sendo áreas de ameaça de vazamento a área de atracação, onde se dá a prática de carga, descarga e abastecimento de navios; a área de acesso delimitada pela ponte, onde estão os dutos e a área de estocagem; e, por fim, a área onde ficam os tanques de armazenamento e as plataformas de abastecimento (ver mapa). “As principais ameaças de vazamento estão associadas ao procedimento de acostagem de balsas, no uso de equipamentos nas operações de carga e descarga e no abastecimento dos navios. Não se tem registro de vazamento de óleo na região, apenas de soda cáustica, mas as condições de algumas áreas do porto mostram que o risco é visível”, explica.

patrão tem que ver que a gente tem uma vida lá fora”. A frase, colhida pela professora Ida Lenir Gonçalves, durante a série de entrevistas realizadas para a elaboração de sua tese de doutorado em Sociologia, sintetiza bem a contradição vivida por milhares de trabalhadores que precisam corresponder plenamente às exigências do trabalho e, ao mesmo tempo, melhorar sua qualidade de vida. Não ocorre diferente nas grandes redes de supermercado de Belém, objeto de estudo da pesquisadora. O ritmo de trabalho e a carga horária são avaliados pelos funcionários como as duas principais dificuldades que eles encontram para ajustar sua vida privada à atividade profissional. “O pessoal que trabalha neste segmento é levado a se voltar totalmente para o trabalho. E a sua vida privada vai ficando à mercê do pouco tempo que o trabalho permite”, observa. Sob orientação de Cristina Maneschy, a tese de Ida Lenir, no programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFPA, parte da hipótese de que os empregados dos supermercados não estão isentos das pressões exercidas nos setores que se reestruturaram, segundo o atual estágio de desenvolvimento da economia globalizada. O estudo revela a real dimensão do segmento local, que se destaca no cenário nacional por ser formado por empresas familiares, preservadas ainda do processo de fusões e incorporações que vem ocorrendo em outros Estados e países. Além do nível de sofisticação das lojas, as redes de Belém impressionam pela estrutura organizacional e por oferecer milhares de empregos formais, numa cidade em que a informalidade já domina 60% do mercado de trabalho. A pesquisa foi realizada em quatro redes, a partir de entrevistas com 380 trabalhadores, focando-se na possibilidade dos funcionários construírem relações duradouras dentro do ambiente de trabalho, possíveis de serem mantidas fora dele. Para chegar a este objetivo, inicialmente, Ida Lenir fez um levantamento das características dos processos de recrutamento, seleção e de administração dos recursos humanos no interior das redes locais. Os entrevistados, lotados exclusivamente nas atividades-fim, fazem parte de um complexo organograma cujo topo é ocupado pelos gerentes de lojas. Em lojas que possuem mais de 600 postos de trabalho, o gerente administra uma empresa de porte médio, de acordo com o padrão Sebrae. Abaixo dele, vêm os subgerentes, os gerentes de frente de loja, os gerentes de salão, os encarregados de caixa, de prateleiras e de setores. Na base do organograma estão os funcionários de nível operacional, entre os quais repositores, caixas, embaladores, arriadores (quem leva as compras ao carro ou à casa do cliente) e serviços gerais.

As operadoras de caixa e embaladoras trabalham por turnos com longos intervalos e em sistema de escala

n Turnos intercalados por longos intervalos Os supermercados apresentam uma nítida divisão de trabalho por gênero. Enquanto as mulheres se ocupam dos setores de atendimento ao público, seja na recepção, nos caixas ou na embalagem, os homens desenvolvem atividades de maior esforço físico e ocupam as chefias de setor. Em geral, o processo de seleção é coordenado por psicólogas. Chama a atenção à prioridade dada, na seleção de empregados para qualquer setor, a candidatos que tenham o segundo grau completo. O tempo médio de permanência no emprego é de quatro anos. O período típico é de 2 anos e meio. Ida Lenir ressalta, porém, que entrevistou empregados com até 29

anos de trabalho na mesma rede. O trabalho é realizado em turnos fixos e, em menor número, por escala. A jornada é de sete horas, mas intercalada por um surpreendente intervalo que pode ir além de três horas entre o primeiro para o segundo expediente. Um funcionário que entra às 7h, cumpre as primeiras quatro horas de trabalho e sai às 11h. Depois do intervalo de três horas, ele regressará às 14h, concluindo a jornada às 17h. O horário de entrada das turmas é diversificado, daí decorrendo variações no horário de saída para o intervalo. A opção por intervalos longos ocorre em função dos períodos de “pico” nas lojas.

No turno da madrugada, nas lojas 24 horas, o intervalo não é superior a 2 horas. Muitas delas oferecem local de descanso aos funcionários. A maioria dos entrevistados demonstram simpatia pelo sistema de turno e pelos intervalos longos. Este último, lhes possibilitam almoçar com a família ou mesmo resolver assuntos particulares sem que seja necessário faltar ao serviço. A pesquisadora observa que 82% dos empregados ouvidos já concluíram o segundo grau, mas apenas quatro cursavam o ensino superior. “Isso sugere que o horário de trabalho dificulta outros tipos de atividade, inclusive a estudantil”, analisa.

n Progressão funcional é bastante restrita O piso salarial nos supermercados é o salário mínimo, pago para o nível operacional. A progressão funcional é bastante restrita. Ela pode ocorrer de fato ou de status. A análise da trajetória de uma funcionária do nível operacional possibilita ilustrar como ela pode ocorrer. Admitida como embaladora, a funcionária pode tornar-se operadora de caixa, se tiver um bom desempenho no trabalho. Somente será efetivada na função após um período de experiência de um a seis meses de duração. Continuará recebendo o mesmo salário, porém acrescido do adicional

“quebra de caixa” determinado por lei para quem exerce atividade de risco por trabalhar com dinheiro. Como se trata de um adicional determinado por lei, a progressão não ocorre de fato, mas de status. A ascensão real ocorrerá quando a operadora de caixa for promovida a fiscal. No contexto do supermercado, há diferença de gênero também com relação à função “de entrada”. As mulheres são contratadas, inicialmente, como embaladoras e o homens como arriadores. Essas funções são percebidas pelos trabalhadores como as de menor status do nível

operacional. Entretanto, a função de arriador tem vantagens monetárias, porque eles recebem o salário e mais todo o adicional que ganham dos clientes quando vão deixar as mercadorias. Em algumas lojas, o valor apurado é partilhado com o caixa; em outras, a gorjeta é individual. Alguns arriadores entrevistados declararam que arrecadam quase um salário só com gorjetas. Além disso, há clientes tradicionais que costumam presenteálos. Essas vantagens informais explicam o fato deles não desejarem sair da função, na qual alguns trabalham há mais de dez anos.

n Estratégias refinadas só na parte logística Anualmente, a Associação de Supermercados (Aspas) promove congresso em que são discutidos temas relativos ao setor. Para estes eventos são convidados palestrantes renomados nas áreas de recursos humanos, da administração e das finanças. Em geral, os gerentes de loja fazem rodízio para assistir às palestras. No dia-a-dia, entretanto, as empresas privilegiam o investimento na melhoria da logística do supermercado, sobretudo, na oti-

mização do espaço, no controle do estoque e na redução das perdas. Quanto à gestão de RH (Recursos Humanos), os gerentes reconhecem que as “dicas” repassadas nos congressos pelos especialistas não podem ser colocadas em prática devido à carência de trabalhadores qualificados no mercado de trabalho. Os dados da pesquisa continuam sendo analisados considerando as particularidades de gênero,

ciclo de vida, participação em atividades coletivas dos empregados e suas estratégias para organizar e adequar a vida às características do trabalho no setor. O estágio atual sugere que a interpenetração entre o mundo do trabalho e o mundo da vida, no caso dos trabalhadores de supermercados de Belém, ainda é restrita, isto é, o trabalhador consegue estabelecer um limite claro entre os dois mundos, o do trabalho e o da vida privada.


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BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Maio, 2008 –

Extensão

República

Pão e circo para conquistar as massas

Dissertação de mestrado analisa festas e banquetes no período republicano reprodução

Walter Pinto

n Festas foram documentadas

R

ei morto, rei posto, diz o ditado popular. Em Belém, a Câmara de Vereadores não perdeu tempo com o fim da Monarquia: três dias depois, uma lei municipal mudou os nomes das antigas ruas da Imperatriz e do Imperador para, respectivamente, 15 e 16 de novembro, homenageando o dia da Proclamação da República e o dia em que a notícia chegou ao Pará. Para um sistema de governo instituído, por meio de um golpe militar sem respaldo popular, era preciso conquistar o apoio do povo. Uma das formas encontradas pelos republicanos para alcançar esse objetivo foi apagar da memória coletiva qualquer vestígio do regime destronado e substituí-los por datas e nomes identificados com o novo regime, embalados por festas e banquetes cívicos. A troca dos nomes de ruas era uma estratégia do Partido Republicano paraense para conquistar o povo para a causa republicana. O assunto integra a dissertação de mestrado da historiadora Daniela de Almeida Moura, recentemente apresentado no Programa de Pós-Graduação em História, na linha de pesquisa Trabalho, Cultura e Etnocidade. Orientada pelo professor William Gaia Farias, a dissertação “As festas da República no Pará – 1900 a 1911” aborda a formação do calendário republicano e as mudanças nos nomes de ruas e logradouros, processadas logo após a proclamação. É nesta época que Belém passou a chamar algumas avenidas e ruas por Generalíssimo Deodoro, Aristides Lobos e Benjamin Constant, entre outros nomes eminentes da República. Em 14 de janeiro de 1900, um decreto criou o novo calendário, com a instituição oficial da data de 15 de novembro e do dia seguinte, 16 de novembro, quando se comemora a aclamação da República no Pará. Outra forma de consolidar

Festa cívica no Bosque Rodrigues Alves na intendência de Antônio Lemos o novo regime na memória do povo foi a realização de festejos na capital e no interior do Estado por ocasião daquelas duas datas. Uma comissão, integrada pelo governador, intendentes municipais, senadores e deputados era encarregada de organizar as festas em Belém todos os anos. Os políticos da situação pertenciam ao PRP (Partido Republicano do Pará, liderados por Lauro Sodré, Justo Chermont e Antônio Lemos) e PRD (Partido Republicano Democrático, liderado por Vicente Chermont). Enquanto as festas republicanas destinavam-se à toda a sociedade, conforme a ampla divulgação da imprensa, os banquetes eram de cunho mais reservado. Apenas a elite política podia participar deles. A pesquisadora analisou as várias facetas desses banquetes que eram elogiados em jornais como A República ou criticados como em O Democrata, que se alinhava a uma dissidência do PRP. Daniela de Almeida observa que aparentemente os banquetes pareciam transcorrer de forma harmoniosa, mas as mulheres não eram relacionadas, salvo raras exceções, e a distribuição dos convidados

à mesa era definida conforme o grau de importância, assim, o local mais próximo à cabeceira era reservado ao homenageado. Barrado, o povo ficava na entrada do Palácio. A sensação era de harmonia, embora o banquete fosse marcado pela desigualdade. A pesquisadora observa que os banquetes tinham várias causas, entre elas, o lançamento de uma candidatura, o aniversário de um líder ou os preparativos para eleição. Um dos banquetes mais divulgados pela imprensa foi o de 1903, organizado pelo intendente Antônio Lemos, que abriu o Bosque Rodrigues Alves após uma longa reforma para um Congresso do PRP, que garantiu a reeleição de Augusto Montenegro. Os jornais de oposição diziam que as procissões cívicas, que contavam com a participação do povo, pareciam mais cortejo fúnebre que comemoração, alegando que o povo não se entusiasmava com a República. E denunciavam os métodos dos líderes republicanos para atrair a massa, como por exemplo, a distribuição de pães nos locais das grandes concentrações.

Quando começou a fazer a pesquisa sobre a República, Daniela de Almeida sabia que o tema já havia sido explorado, optando por concentrar-se nas festas republicanas de modo geral. “Acredito que minha contribuição é ter lançado um novo olhar sobre a República, a partir das comemorações e seus significados, principalmente, o de consolidar na memória da população o novo momento político vivenciado pela sociedade paraense”, explica a pesquisadora. Ela observa que as festas tinham um cunho pedagógico, efetivado por meio da repetição contínua e espaço para realização de discursos políticos. Ela usou como fontes o Arquivo Público, acervo “documentos do governo”; na Biblioteca Pública Arthur Vianna, seção de “Obras raras” (“Congresso Republicano de 1903”, de Antônio de Carvalho, e “A Musa Republicana”, de Juvenal Tavares, entre outras). Também há informações sobre as festas nos jornais A República, O Democrata, Folha do Norte e A Província do Pará, edições de 1900 a 1911. fotos Arquivo do pesquisador

Daniela de Almeida: novo olhar

ETNOBIOLOGIA

Boto, entre o imaginário e a ciência na Amazônia Tamiles Costa As lendas amazônicas sobre o boto despertam o interesse de diversas vertentes do conhecimento. Um exemplo disso é a pesquisa da bióloga Angélica Rodrigues que fez um estudo sobre o boto na consciência de meninos ribeirinhos da Amazônia. O objetivo de seu trabalho era encontrar mecanismos para unir o saber empírico da região ao conhecimento científico na prática da conservação ecológica dos animais. Angélica é integrante do Grupo de Estudos de Mamíferos Aquáticos da Amazônia (Gemam), uma vertente do Projeto Piatam Oceano, coordenado pela

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UFPA e financiado pela Petrobras. “Em 2005, comecei a fazer um projeto piloto, mas desenvolvi a pesquisa, efetivamente, quando ingressei no mestrado, em 2006, e trabalhei nele durante dois anos”, explica. A dissertação foi defendida em março deste ano. A pesquisadora fez mestrado na UFPA na área de Psicologia para estabelecer uma interface entre o biológico e o psicológico no estudo dos botos. Ela explica que sua produção se enquadra no âmbito da Etnobiologia, que estuda os conceitos das populações tradicionais a respeito da natureza. Ela investigou o conhecimen-

arquivo

O boto causa medo e admiração to de estudantes ribeirinhos a respeito dos botos, no município de Soure, na região do Marajó, e no Rio Sapucajuba, em Abaetetuba, região do Baixo Tocantins. Em parceria com as escolas, foram aplicados questionários a 80 estudantes, filhos de pes-

cadores, entre a 5ªa e a 6ª séries. Os resultados atestaram que 57% dos estudantes têm medo do boto. Mas, apesar disso, a pesquisa mostra que 67% dos entrevistados acreditam na importância da preservação desses mamíferos. Os ribeirinhos atribuem o sentimento negativo em relação ao animal às lendas amazônicas que, na opinião da pesquisadora, devem ser mudadas. “A partir do momento em que uma lenda pode ameaçar uma espécie, ela deve ser estudada e retrabalhada no imaginário popular”, diz. Segundo a pesquisadora, seu principal objetivo é “construir um plano de conservação e não importar um modelo”.

Proeg aperfeiçoa assistência estudantil Questionário socioeconômico pode ajudar a diminuir a evasão na UFPA

Fotos Mácio Ferreira

Ericka Pinto

C

onhecer melhor o perfil socioeconômico dos calouros, para a formulação de políticas de assistência aos estudantes da UFPA, é o principal objetivo da aplicação do questionário socioeconômico que a Pró-reitoria de Extensão (Proex) tornou obrigatório a partir deste ano. A formação de um cadastro geral de alunos é uma preocupação que se dá em nível nacional e tem por objetivo reverter o quadro de evasão nas universidades. De acordo com o diretor de Assistência e Integração do Estudante, Alberto Damasceno, na UFPA, a evasão atinge entre 20% e 25%, enquanto a média nacional chega a 40%. Ele explica que um dos fatores que levam o estudante a abandonar o curso é de ordem socioeconômica, o que levou o Governo Federal a incluir no projeto de Reestruturação das Universidades (Reuni) o compromisso das instituições federais de ensino superior com o fator social. “Nessa linha, a UFPA criou a Diretoria de Assistência e Integração Estudantil, que faz parte da Pró-Reitoria de Extensão, responsável pela concepção, execução e monitoramento das políticas de assistência à moradia, psicossocial, alimentação, transporte, apoio a eventos, entre outras”, diz Damasceno. Para essas áreas, o Governo Federal já garantiu para este ano, cerca de R$ 1 milhão e 300 mil que serão repassados por meio do projeto Reuni. Algumas informações para o planejamento de políticas já foram levantadas pela Diretoria de Assistência e Integração Estudantil, como o diagnóstico de todas as ações de assistência, entre elas, a situação atual da Casa do Estudante e as dificuldades didático-pedagógicas, como a falta de afinidade com o curso. O desafio agora é traçar o perfil do estudante, mas para isso, é preciso que ele preencha o questionário socioeconômico disponível no Portal da UFPA. “Não sabemos quantos negros, índios, mães, são alunos da universidade, então para definirmos os beneficiários dessas políticas é preciso ter dados concretos, como por exemplo, a quantidade de alunas que são mães e poderiam ser atendidas por um serviço de creche”, enfatiza Alberto.

O preenchimento do questionário é permanente e pode ser feito pela internet por meio do site da UFPA.

n Preenchimento agora é obrigatório O questionário socieconômico está disponível desde fevereiro deste ano, mas poucos alunos haviam preenchido o documento até o mês de abril, quando a Proex promoveu uma campanha de mobilização, encerrada no dia 18, no Auditório Setorial Básico I. Seis computadores colocados à disposição dos estudantes para o acesso on-line e preenchimento do questionário. A iniciativa foi uma parceria com a Central Alberto Damasceno: “Dados concretos”. de Tecnologia da Informação e Comunicação (Ctic). nário é permanente e se constitui Mas, apesar da camem uma fonte de informações. panha, foi considerado pequeno São detalhes que a gente precisa o número de estudantes que se conhecer para poder realizar inscreveram, em relação ao uniuma política que, de fato, atenverso de mais de 34 mil estudantes da aos anseios da comunidade da UFPA. acadêmica. Então, é preciso que “A aplicação do questio-

EM DIA Alemanha

O reitor da UFPA, Alex Fiúza de Mello, recebeu a visita do Embaixador da Alemanha no Brasil, Friedrich Prot von Kunow, no dia 15 de abril. Participaram da reunião também, a vice-reitora, Regina de Fátima Feio, e o coordenador da Casa de Estudos Germânicos da UFPA, Hernani Chaves. O reitor falou ao Embaixador da intenção de dinamizar a cooperação entre a universidade e as instituições de ensino alemãs. “Já tivemos um fluxo de intercâmbio maior e, por isso, queremos recuperar esta aproximação”, declarou o reitor. Prot von falou do interesse do governo alemão em investir em desenvolvimento sustentável no Brasil, principalmente na Amazônia.

Margens

A Divisão de Pesquisa e Pós-graduação do campus

todos participem”, ressalta Damasceno. As informações coletadas também vão poder subsidiar estudos em diversas áreas de conhecimento, como a Antropologia, Sociologia, entre outros. A aplicação do questionário também responde à Portaria nº 0330 de 30 de janeiro de 2008, da Reitoria, que estabelece a obrigatoriedade no preenchimento do documento para que os estudantes recebam qualquer forma de apoio, assistência ou se candidatem às bolsas na UFPA. Para responder ao questionário socioeconômico da Proex, basta o aluno acessar o site http:// sig.ufpa.br:8080/questionario/ login.action.

de Abaetetuba lançou, no dia 18 de abril, o quarto número da Revista Margens, Dossiê Gênero e Família. De caráter interdisciplinar, a revista foi criada em 2004 e tem colaboradores até da Universidade do Porto (Portugal). A revista Margens é a única publicação dos campi do interior, constando no Qualys com conceito A . Contatos com a professora Joyce Ribeiro, joyce@ufpa.br

sentir mais autônomos com o site, “pois terão a possibilidade de suas notícias serem vistas por todos que acessarem o site em qualquer lugar do mundo”. O site pode ser acessado através do Portal da UFPA (www.ufpa.br, link campi do interior).

Site Multicampi

O campus de Castanhal completou 30 anos no dia 14 de abril, mas promoverá atividades comemorativas durante todo o ano. O início dos eventos será no próximo dia 15, data que marcará o lançamento da página eletrônica e a cerimônia de posse da nova composição do conselho do campus. Em agosto, haverá a solenidade oficial com apresentação de um vídeo institucional do campus. Já para setembro, está marcado um festival multidisciplinar com atividades esportivas, artísticas e culturais e, em novembro, a conferência final.

A UFPA lançou oficialmente, em abril, o site da Universidade Multicampi – um espaço destinado à divulgação de maneira integrada dos conhecimentos e eventos produzidos ao longo dos 20 anos do processo de interiorização. Históricos, cursos, concursos, documentos, eventos e notícias que estejam relacionadas aos campi poderão ser visualizados no site. Segundo a vice–reitora, Regina Feio, que também coordena a Universidade Multicampi, os campi poderão se

Castanhal


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BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Maio, 2008 –

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Cheia

Campus de Marabá cria sistema de monitoramento de casas alagadas

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As autoridades e a comunidade poderão acompanhar pela internet a evolução do impacto na Velha Marabá e planejar melhor as ações sobre os habitantes daquela área pioneira, o que prejudica bastante o planejamento urbano. Logo que chegou a Marabá, a professora Leila Weitzel Coelho da Silva, mestre em modelagem computacional pela UERJ, percebeu que poderia contribuir para reduzir a carência de informações sobre a chamada Marabá Pioneira e, assim, ajudar a prefeitura a desenvolver uma estratégia de planejamento urbano, com otimização do socorro às vítimas das enchentes e economia de custos. Professora do curso de Sistema de Informação do Campus da UFPA, em Marabá, pensou em um projeto que integrasse a tecnologia de banco de dados geográfico e o cadastro multifinalitário para mapear a população impactada pelas enchentes conforme o crescimento gradual das águas. Trabalhando com uma equipe formada pelos estudantes Gardel Souza, Danilo Costa Luis, Rangel Filho e Armanda Ribeiro e sem qualquer tipo de financiamento, a pesquisadora

Walter Pinto

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uando o comerciante maranhense Francisco Coelho da Silva implantou um entreposto comercial, em 1898, na confluência dos rios Tocantins e Itacaiúnas, estava lançando as bases do que viria a se tornar o principal município do sudeste paraense. Marabá se desenvolveu a partir da agropecuária e do extrativismo de diferentes produtos, entre as quais borracha, castanha-do-Pará, diamante, ouro e ferro. Com o passar dos anos, a cidade se expandiu para outras áreas, mas o núcleo pioneiro inaugurado por Francisco Coelho da Silva continua densamente povoado, apesar de sujeito às enchentes sazonais, todas as vezes que o volume de água do rio Tocantins sobe acima da cota de 72 metros. Anualmente, o Governo Federal presta auxílio aos moradores vítimas das enchentes, mas a prefeitura local não dispõe de um cadastro multifinalitário com informações

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concluiu, ao final de 2007, a primeira etapa do projeto, que resultou na elaboração do Sigma, um sistema de informações geográficas para monitoramento de áreas de risco. Foi um trabalho árduo, realizado durante todo o transcorrer do ano, que precisou superar algumas dificuldades, uma delas, porém, mostrou-se instransponível, apesar do prefeito e do viceprefeito de Marabá declararem que gostaram muito do sistema, o projeto não conseguiu nenhum respaldo junto à prefeitura. A equipe trabalhou com um mapa vetorial de ocupação do espaço urbano, de 1999. Foi necessário transformar sua linguagem para torná-lo compatível com o software livre Spring, utilizado pelo projeto, e possibilitar a identificação das coordenadas geográficas de cada unidade habitacional da região pioneira. O banco de dados é gerenciado pelo software PostgreSQL/PostGIS, que tem capacidade de armazenar e recuperar objetos geográficos.

nível do rio Tocantins em metros, registrado em Marabá

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2002

fotos Arquivo do pesquisador

n Pesquisadora critica falta de apoio

A Marabá Pioneira ficou quase totalmente debaixo d'água na enchente de 1997, quando o rio atingiu a cota de 86,11m

n Prefeitura não tem informações sobre Marabá Pioneira Os pesquisadores esbarraram-se em uma outra dificuldade: a ausência do cadastro multifinalitário com informações reais sobre os moradores da área. “A prefeitura, ao contrário de outras administrações municipais da região, ainda não possui o cadastro atualizado”, informa a coordenadora. A equipe partiu, então, para a elaboração de um banco de dados, quantificando os moradores por unidade habitacional segundo suas especificidades (adultos, crianças, idosos, portadores de necessidades especiais, mães lactantes, recém-nascidos, jovens em idade escolar, entre outros dados). Os dados deveriam permitir a realização de várias formas de consultas, possibilitando ao gestor público planejar estratégia de ajuda e remoção dos indivíduos afetados conforme as necessidades específicas de cada família.

Mas o trabalho corpo-a-corpo não pode ser realizado pela falta de financiamento para pesquisa em campo. A solução foi partir para a simulação por meio de dados sintéticos quantitativos sobre os moradores partir das dimensões das casas. A fase seguinte foi a de modelagem do banco de dados, na qual foram eleitos os itens considerados mais importantes e as informações que se pretendia extrair do banco de dados. Em seguida, a equipe juntou o mapa da cidade ao banco de dados. O trabalho foi concluído com a criação de um sistema de informação que fez a interação das duas partes. “Trabalhamos muito e o Sigma ficou pronto. Nossa intenção era produzir um sistema para todos os distritos do município, mas como só Marabá Pioneira está sob impacto das enchentes, nos preocupamos inicial-

2004

*Dado parcial Fonte: Jornal ("O Correio do Tocantins", ano XV, n.° 611, 11 a 17 de abril de 1997, pág.01) Def esa Civil de Marabá Eletronorte./ Marabá Gráf ico elaborado pela Fundação Casa da Cultura de Marabá.

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IMAGENS DAS MAIORES ENCHENTES 1 1926 2 1977 3 1978 4 1980 5 1989 6 1990 7 1997 8 2000 9 2004

NÍVEIS E COTAS ATINGIDAS PELAS CHEIAS NO PERÍODO DE 1976 A 2004

n Indústria da enchente é incentivada

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A maior enchente em Marabá ocorreu em 1980, quando as águas do rio Tocantins subiram 17,42m acima do normal. Em tais condições, a prefeitura decreta estado de calamidade e recebe apoio do Governo Federal na forma de incentivo às famílias atingidas pelas cheias. As famílias são abrigadas em alojamentos improvisados e recebem cestas básicas, bujões de gás e materiais para a construção de casas em outras áreas. Trata-se de uma operação de socorro que despende somas consideráveis de recursos. O sistema de monitoramento, elaborado no campus de Marabá, pode ajudar a prefeitura a planejar previamente as ações a serem empreendidas e auxiliar no gerenciamento dos recursos. Pode ser também uma efetiva ferramenta para eliminar um problema que existe, de maneira informal, na velha

mente apenas com aquela área”, explica Leila Weitzel. A proposta também contemplava a construção de um sistema para a web, mas não foi possível cumprir com esse objetivo dentro do prazo de um ano. Por isso, o Sigma nasceu como um sistema isolado. Porém, a experiência adquirida pelos pesquisadores, facilitará a adaptação do sistema para a internet, um dos objetivos do projeto para 2008. Quando a segunda etapa for concluída, os moradores de Marabá poderão monitorar o nível das águas pela internet. Na segunda etapa, o projeto contará com a participação de nove estudantes. O objetivo será inserir no sistema as áreas de educação, saúde e comércio, além da construção de um sistema paralelo com informações turísticas.

O curso de Sistema de Informação do Campus de Marabá começou suas atividades em 2002. Possui apenas quatro professores efetivos. Atualmente, dispõe de dois laboratórios e, em breve, contará com um terceiro, em fase de construção. A primeira turma graduou-se em 2006. As pesquisas na área estão apenas começando, mas os professores sentem as dificuldades inerentes ao isolamento em relação ao grande centro. Em Marabá, há uma enorme carência de tecnologia, o que torna o trabalho dos pesquisadores muito mais importante e necessário. Há quase três anos em Marabá, Leila Weitzel levou para o curso a experiência de onze anos de trabalha na área de inteligência artificial. Sua dissertação de mestrado simulou o raciocínio médico no diagnóstico da meningite, por meio de um sistema que, ao ser alimentado com dados, classifica e tipifica o tipo da doença. Como bolsista pesquisadora do CNPq, participou do projeto CardioEducar, pela Coppe, atuando no desenvolvimento de um sistema que simula o raciocínio médico no diagnóstico de infarto agudo do miocárdio. Como bolsista da Fundação de Pesquisa da Coppe, realizou pesquisa na área de energia e meio ambiente, desenvolvendo um módulo de adaptação de um sistema francês de energia à energia renovável. Ela faz críticas ao atual modelo de apoio à pesquisa no Brasil que privilegia apenas pesquisadores doutores e à diferença de tratamento entre licenciaturas, engenharias e bacharelados. “O Reuni privilegia as licenciaturas, as engenharias recebem apoio de outros programas, mas para o bacharelado, como é o caso do nosso curso, não há nenhum tipo de programa específico”, afirma.

Marabá: a indústria da enchente, que utiliza a catástrofe como meio de vida. Os moradores sobrevivem do incentivo repassado pelo Governo Federal. A professora Leila Wetzeil toma como exemplo uma hipotética casa velha, construída há alguns anos, por falta de fiscalização, na área de risco. O proprietário mora atualmente em outro bairro, em casa construída com o material doado pelo governo. A velha casa serve para aumentar o seu rendimento por meio de aluguel. Em época de enchente, o inquilino que estiver morando nela, receberá incentivos que serão utilizados na construção de casa fora dali. Assim, todos os anos, a velha casa terá sempre novos inquilinos. “O sistema que criamos busca mapear efetivamente esse problema. Porque, se houver um cadastramento dos moradores por residência, ficará mais fácil monitorar as casas”, observa.

ANO

Leila Weitzel (centro) junto com a equipe que desenvolveu o projeto

ATINGIDAS NÍVEL DNAEE (M) COTAS PELAS ENCHENTES

ANO

ATINGIDAS NÍVEL DNAEE (M) COTAS PELAS ENCHENTES

1976

8,99

80,87

1990

14,41

86,29

1977

12,43

84,31

1991

12,19

84,07

1978

14,47

86,35

1992

13,52

85,40

1979

14,45

86,33

1993

10,34

82,22

1980

17,42

89,30

1994

12,13

84,01

1981

12,41

84,29

1995

11,41

83,29

1982

13,12

85,00

1997

14,23

86,11

1983

12,44

84,32

1998

9,86

81,74

1984

10,19

82,07

1999

9,10

80,98

1985

13,14

85,02

2000

12,58

84,46

1986

12,59

84,47

2001

10,57

82,45

1987

10,54

82,42

2002

12,56

84,44

1988

11,56

83,44

2003

11,30

83,18

1989

10,81

82,69

2004

13,50

85,38

FONTE: DNAEE - COTA ZERO OU NORMAL É DE 71,88M


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