Beira 66

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12 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Novembro, 2008

Entrevista

Mulheres permanecem à margem da arena política

JORNAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ • ANO VI • No 66 • Novembro, 2008

Aumenta o trabalho informal

Cotas não garantem participação feminina nos espaços dedicados à prática da “grande política” no Brasil

O

aquecimento da economia não foi suficiente para diminuir o crescimento do trabalho informal nas grandes cidades. Vistos como “um problema” a ser resolvido, muitas vezes, os trabalhadores informais são responsabilizados pela violência e pelo caos em ruas comer-

ciais. Ao estudar os camelôs do centro de Belém, o sociólogo Válber de Almeida Pires constatou que a falta de qualificação dificulta o exercício de outras funções na economia. Assim, a profissão é herdada pelos filhos, que levam o negócio adiante como estratégia de sobrevivência. Pág. 9

BR – A senhora analisou o Orçamento Participativo em Porto Alegre a partir de uma perspectiva de Gênero. Quais foram os principais BR – O Estado do Pará é governado resultados da pesquisa? por uma mulher, e este ano tiveJP – O título “Protagonistas ou Bemos duas candidatas à prefeitura neficiárias” já propõe uma discussão. de Belém. Uma delas usou em seu Nós pensamos o Orçamento Particidiscurso “o cuidar”, reforçando os pativo como uma forma de política papéis historicamente atribuídos pública, dentro de uma perspectiva às mulheres. Como a senhora anade participação e não de represenlisa o resgate desse discurso como tação, e percebemos que, mesmo estratégia de campanha? havendo uma cota para participação JP – No livro “As Prefeitas”, Eva das mulheres, aquelas atribuições Blay elabora uma espécie de tipologia da dupla jornada estavam fazendo dessas candidatas. Ela fala na Prefeita com que elas fossem excluídas do Coronel, na Prefeita Feminista e na processo. Há um critério de exclusão Prefeita que assume esse papel materpor número de falta às reuniões, mesnal. A prefeita Coronel mo sendo delegado ou seria aquela que assumembro do conselho me o lugar do marido. do OP. Dessa maneira, Em algumas regiões as pessoas com maior do País, nós tínhamos possibilidade de serem um número maior de excluídas seriam as prefeitas em função mulheres, e uma das desta “substituição”. E reivindicações era a nós nem sempre temos criação de um espaço a prefeita que fará a para cuidar de criandesconstrução desse ças, para que, nas reudiscurso, que passa por niões, as mães pudesuma postura mais de sem contar com esse O processo de esquerda. Isso não quer tipo de apoio. Normaldizer que candidatas mente, nós chegávasocialização mais à esquerda ,no mos a certa paridade ainda delega campo político-ideoquanto ao número de lógico, também não cotas instituídas para às mulheres o possam ter um discurso homens e mulheres. conservador em relação Em algum sentido, a espaço privado à mulher, de manutencota era problemática

mostra como o processo de socialização, que começa na infância, passa pela adolescência e chega materializado à idade adulta, ainda é marcado por uma distinção de papéis entre esfera pública e esfera privada, de assimetria de relações de poder, que faz com que a mulher não se interesse pela “grande política”, pois é a política que a exclui. E elas conseguem perceber que é mais fácil o trabalho de participação política onde está mais perto, nos centros comunitários, por exemplo. Na “grande política”, as mulheres estão tendo representação política, mas de forma não convencional - elas estão nos movimentos sociais, estão nas ONG’s.

BR – O seu trabalho sobre Juventude, Cidadania, Gênero e Gerações apresenta dados que indicam um desinteresse da juventude pela política e por mecanismos de participação da cidadania. Quais serão as conseqüências desse comportaBR – A produção cultural reforça mento a longo prazo? os estereótipos, os papéis sociais JP – Quando se pergunta o porquê do tradicionais. Isso acaba tendo desinteresse na política, as análises uma conseqüência no exercício da são todas focadas na população de cidadania? eleitores, normalmente maiores de 18 JP – Com certeza, pois do processo anos. E fazendo um estudo que comde socialização fazem parte a escola, para gerações, nós percebemos que, as relações de amizade, a família, os quanto ao interesse por política, não meios de comunicação, eu poderia existe diferença entre dizer até as religiões. uma geração madura Enfim, todo o processo e uma geração mais de socialização conjovem. Então ficamos tribui, de alguma forpensando – se já há ma, para a manutenção esse desinteresse agora, desse discurso. Se penuma população adulgarmos, por exemplo, ta, como ficaria isso a novela, que é uma futuramente, à medida coisa a que as pessoas que o desinteresse acaassistem todo dia, e as ba passando de geração mulheres, mais que os em geração? A resposta homens, esse discurso é que os jovens tenacaba sendo introjeO desinteresse dem a chegar cada vez tado. Além disso, nós mais desesperançosos temos um processo de pela política e desinteressados. Ensocialização que passa tão, percebemos que acaba passando por uma educação setemos uma crise e a xista, por uma relação de geração em possibilidade de uma na família que também geração futura fazer reproduz esses papéis geração uma mudança é pratie esses estereótipos. camente impossível. E com o elemento que É preocupante pensar complementa tudo isso, nesses termos. os meios de comunicação, forma-se um “caldo de cultura” e fica tudo BR – A pesquisa mostrou que o pronto para esses papéis continuarem desinteresse pela política é maior sendo reproduzidos. Algumas pesentre as mulheres. Isso acaba soas é que conseguem romper com sendo utilizado como argumento isso. É preciso modificar o processo por aqueles que questionam a de socialização, porque se não mudacompetência feminina na atividade rem comportamentos, mentalidades, política? atitudes, percepções, pontos de vista, JP – É nesse contexto que a pesquisa continua sendo comum ouvir que sobre a juventude é importante, pois “lugar de mulher é em casa”.

Mácio Ferreira

Coluna do Reitor Alex Fiúza de Mello apresenta os fundamentos para um Projeto PolíticoPedagógico Institucional . Pág. 2

Opinião A professora Sílvia dos Santos de Almeida analisa o perfil dos participantes da VII Parada do Orgulho GLBT, realizada em Belém. Pág. 2

Pesquisa Pesquisa revela que trabalhadores informais são vistos como “bodes expiatórios” para problemas das grandes cidades

Qualificação

Meio Ambiente

Genética avalia qualidade de água na Amazônia Núcleo de Biodiversidade e Bioindicadores utiliza, pela primeira vez, peixe elétrico como indicador

de poluição nos rios da Amazônia. As coletas serão realizadas no Pará e no Amazonas. Pág. 7 acervo projeto

ção do status quo. Mas se pensarmos no processo de educação, naquilo que as próprias mulheres reproduzem, vamos perceber que essa postura está arraigada em todos os processos de socialização e romper com isso é complicado. Eu costumo dizer que ninguém consegue ser coerente 24 horas por dia, mesmo nós, que temos um discurso progressista, muitas vezes nos pegamos caindo nas próprias armadilhas de um discurso contrário àquele que a gente quer fazer.

porque faltavam condições para essa mulher efetivar a sua participação em condições de igualdade, ou seja, não adiantava ter cotas se ela não tivesse uma infra-estrutura para exercer aquele papel. Assim, elas aparecem no estudo muito mais como beneficiárias do que como protagonistas do processo. As políticas públicas ou decisões que emergem do OP acabam tangenciando as questões das mulheres.

A professora Jussara Prá fala da participação feminina na política brasileira. Pág. 12

Lucivaldo Sena/ AG.Pará

Beira do Rio – Em sua opinião, o que mantém as mulheres ainda afastadas da arena política? Jussara Reis Prá – Em princípio, nós podemos pensar em vários aspectos para essa questão. Um deles é a questão das mentalidades e comportamentos que vêm forjando historicamente o papel da mulher na sociedade e delegam a ela o espaço do cuidado, o espaço privado e ao homem, o espaço público. O outro aspecto está na própria estrutura política, que não vem acolhendo as mulheres. As estruturas políticas são extremamente elitistas e elitizadas e a mulher se manteve sempre afastada dessa elite.

Jussara Prá: socialização contribui para manutenção do discurso sexista

Entrevista

Rosyane Rodrigues

A assimetria das relações de gênero tem interferência direta na participação feminina, nos espaços dedicados à prática da “grande política” no Brasil. Ainda que, em alguns casos, o estabelecimento de cotas obrigue o acolhimento das mulheres nos processos, sem o respaldo adequado para exercer os novos papéis, elas acabam sendo afastadas de cena. Essa é uma das análises da Profa. Dra. Jussara Reis Prá, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que esteve em Belém, participando do III Encontro Amazônico sobre Mulher e Gênero: as faces da diversidade, a convite do Grupo de Estudos e Pesquisas “Eneida de Moraes” (GEPEM). Em entrevista ao BEIRA DO RIO, Jussara Prá analisou a maneira como as mulheres vêm ocupando seu espaço na cena política brasileira e apresentou resultados de pesquisas desenvolvidas nas temáticas Política e Gênero. De acordo com a pesquisadora, entre jovens e adultos, é crescente o desinteresse pela política. E diante de uma juventude cada vez mais desesperançosa e desinteressada, a possibilidade de mudança é quase impossível.

Fotos Rosyane Rodrigues

Rosyane Rodrigues

Pimenta-do-reino será beneficiada

Pará participa de Projeto Genoma

Professores e alunos da UFPA compõem a Rede Paraense de Genômica, pioneira na região Norte e Nordeste. Pág. 11

EAD: novo modelo de aprendizagem

Pág. 4

Poluição

Tratamento adequado de resíduos Águas de Tucuruí, Barcarena e Mamirauá serão analisadas

Prefeitura do Campus cria infraestrutura para coleta, triagem e tratamento de resíduos químicos na Cidade Universitária. Pág. 8


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