Beira 91

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12 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Fevereiro, 2011

Fotos Alexandre Moraes

Entrevista 25 Anos JORNAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ • ANO XXV • N. 91 • Fevereiro, 2011

Fitoterapia contra leishmaniose

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e acordo com a Organização Mundial de Saúde, a leishmaniose acomete cerca de dois milhões de pessoas em todo o mundo. A doença é provocada pela picada do inseto conhecido como mosquito palha ou birigui. Na forma cutânea, pode provocar úlceras

Educação

Rosyane Rodrigues

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ntender o Brasil festivo e festeiro. Reconhecer as nossas múltiplas identidades. Buscar a nossa matriz africana. Reunir mestres da Academia e da cultura popular. Tudo isso é possível a partir dos estudos dedicados ao carnaval, a maior festa popular brasileira, ou como diz o professor Miguel Santa Brígida, a “grande festa que desenha o País”. Em entrevista ao Jornal Beira do Rio, o professor da Escola de Teatro e Dança da Universidade Federal do Pará falou sobre a importância de estudarmos as festas populares e as manifestações religiosas para compreendermos quem somos, relembrou e discutiu a produção carnavalesca local. De acordo com Miguel Santa Brígida, Belém tem uma nova geração produzindo o carnaval, uma turma que, além de fazer, quer pensar o espetáculo. Beira do Rio – Apesar das mudanças ocorridas nos últimos anos, ainda há preconceito quando se decide estudar temas como o carnaval? Miguel Santa Brígida – Ainda há preconceito. É como discutir preconceito racial, são questões sérias e polêmicas. O País está se abrindo para abrigar essas discussões. Na Academia, em especial, isso é francamente visível. Hoje, por estar no pós-doutorado, posso entender melhor: o samba tem relação com a questão negra no Brasil. Assim, discutir o samba é discutir a cultura de terreiro, a cultura afro-brasileira e a africana. O adensamento dessas discussões tem me emocionado no pósdoutorado. Sou uma pessoa formada pelo teatro, mas o teatro me levou para a dança e a dança me levou para o carnaval, para as escolas de samba. Nos últimos dez anos, a minha paixão pelo carnaval me fez querer entender e estudar a questão da cultura negra no Brasil. Beira do Rio – Há quem diga que Belém não tem carnaval. Por outro lado, no mês que antecede os dias de folia, os blocos invadem a Cidade Velha, o movimento nos barracões das escolas de samba é frenético. Por que insistimos em olhar a nossa festa como "menor", sempre comparada com as que acontecem no restante do Brasil? Miguel Santa Brígida – Primeiro, tem o fato de a cidade se voltar de costas à cultura popular que é viva, é pulsante e não vai morrer. Esse é o entendimento antropológico da questão afro em Belém, especificamente, da cultura do samba e de todas as escolas de samba que estão na periferia. É curioso

perceber que, apesar de essas comunidades manterem o carnaval, o nível do espetáculo se deteriorou e isso tem relação com a organização e com os gestores estaduais e municipais. A decadência do espetáculo em Belém, especificamente o promovido pelas escolas de samba, está intimamente ligada ao fenômeno dos carnavais "fora de época". Foi, a partir de 1993, com o Carnabelém, e, depois, o Parafolia, que começou a "involução" do carnaval. A mídia e os patrocinadores voltaram-se para as micaretas, que estão cada vez mais decadentes, o que já era previsível. Tudo isso arrefeceu o espetáculo. Mas, hoje, percebo um movimento de renovação dos produtores do espetáculo: existe uma leva de carnavalescos formada por pessoas criativas, as escolas estão buscando alternativas financeiras de sobrevivência, de criação, de espaço para produzirem seu carnaval de maneira diferenciada. Ou seja, o que falta, realmente, é gestão para o espetáculo. Eu me admiro de os carnavais, em todas as cidades que possuem escola de samba, serem organizados com eventos, com festa de lançamento de CDs, e eu me pergunto: será que Belém vai retomar isso? Beira do Rio – Por ser um tema com dimensão interdisciplinar, o que pode ser estudado a partir do carnaval? Miguel Santa Brígida – Para entender o Brasil, precisamos estudar as festas brasileiras. Para entender Belém, precisamos entender o Círio de Nazaré, não apenas o ritual organizado pela Igreja Católica, mas também o Círio como fenômeno cultural. Hoje, estudar o carnaval é estudar a grande festa que desenha o País. Na UFPA, é entender a cultura amazônica. Por exemplo, na década de 1970, João de Jesus Paes Loureiro revolucionou propondo sambas para o Quem São Eles, transformando o imaginário amazônico em estética da escola de samba. Isso nos ajuda a compreender esse Brasil festivo, festeiro e transforma a minha prática como professor e pesquisador. Hoje, tenho um tambor africano em sala de aula e chamo um pai de santo para conversar e mostrar como o corpo vibra diferente ao toque do tambor. Estudar o carnaval é descobrir o que está dentro e por trás desse carnaval brasileiro, que é múltiplo, diferente, nos identifica e, ao mesmo tempo, nos torna diverso. Estudar o samba é mergulhar nessa cultura africana. O mestre-sala e a porta-bandeira têm uma roupa totalmente europeia, um bailado nobre de corte, mas o fundamento é africano. É a dança associada aos sons da senzala, do tambor.

O equilíbrio entre essas duas culturas, a africana e a europeia, é o meu foco de estudo e isso vem pelo carnaval. Beira do Rio – A sua tese de doutorado deu origem ao Grupo de Estudo "Tambor: Estudos de Carnaval e Etnocenologia". Que pesquisas estão sendo realizadas? Miguel Santa Brígida – Ao fazer o relatório para o CNPq, percebemos o quanto conseguimos produzir apesar da distância - eu, no Rio de Janeiro, e os demais integrantes do Grupo, em Belém. A professora Cláudia Palheta, por exemplo, é uma carnavalesca, campeã do último carnaval de Belém. Logo após o desfile, ano passado, ela produziu uma exposição de figurinos de carnaval com a produção dela e a de outras escolas de samba. Os alunos visitaram e fizeram trabalhos para as disciplinas que ela estava ministrando. Essa é uma preocupação nossa, fazer a relação com a sala de aula, com a disciplina e o conteúdo programático. Recém aprovada no mestrado, a professora está investigando o processo criativo no carnaval de Belém. O professor Beto Benone, também integrante do Grupo, está pesquisando comissão de frente e o professor Cláudio Didman está estudando maquiagem e o universo das máscaras carnavalescas. Nós quatro, com um olhar específico do carnaval, estamos tentando aglutinar e fortalecer isso dentro da sala de aula. Para este ano, o nosso projeto é trazer a comunidade para dentro da escola. É preciso ter carnavalesco aqui dentro, trocando experiências, assim como trazemos pais e mães de santo para discutirem os mitos africanos. Esse trânsito é importante. O saber científico e o saber popular, que eu chamo de sabedoria dos praticantes, precisam estar no mesmo espaço. Beira do Rio – Nas últimas décadas, o que mudou no modo de fazer carnaval em Belém? Miguel Santa Brígida – Nós temos carnavalescos novos e com formação acadêmica. Sou de uma geração em que os carnavalescos não tinham essa relação com a Universidade. Fazer carnaval era um prazer. Hoje, é diferente. Os carnavalescos estão aqui na ETDUFPA, os compositores estão saindo da Escola de Música da Universidade, ou seja, a Academia está atravessando o samba, profissionais das Artes Cênicas estão virando carnavalescos. Hoje, existe uma geração criando processos para entender esse carnaval e, evidentemente, criando um espetáculo diferente. Existe um novo momento no fazer, no olhar e no estudar o carnaval como cultura brasileira, paraense e belenense.

Um capítulo da arquitetura local Cacos de azulejos criando figuras geométricas em forma de raios nas fachadas das casas. O raio-que-o-parta foi a maneira criativa que paraenses com poucos recursos encontraram para modernizar suas residências. Pág. 5 Alexandre Moraes

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IFNOPAP é o autor da proposta

As figuras geométricas e os combongós esmaltados, coloridos são típicos da década de 1950

Jacarequara

Quilombo tem alto índice de desnutrição

Saúde

Belém tem projeto para novo sistema de esgoto

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Entrevista Pesquisa e carnaval podem dar samba? Leia a entrevista com Miguel Santa Brígida . Pág. 12

Coluna da Reitoria

Tecnologia

Fruto de parceria entre a Universidade Federal do Pará e a Cosanpa, o Plano Diretor do Sistema de Esgoto Sani-

tário dividiu a Região Metropolitana em 29 áreas de coleta e tratamento d'água. Pág. 7

Alexandre Moraes

"Estamos vivendo um novo momento no fazer, no olhar e no estudar o carnaval"

Memória

Alexandre Moraes

A Academia está atravessando o samba

UFPA terá campus flutuante

ou lesões na pele. Na sua forma visceral, pode atingir órgãos internos, como fígado e baço. Pesquisas realizadas na UFPA revelam que o extrato de uma planta amazônica é eficaz no tratamento da doença, tornando-o menos traumático. Pág. 4

Laboratório cria ferramentas que podem ser utilizadas tanto em aulas de História quanto em treinamento em hidrelétricas. Pág. 6

História

Religião e negócios no Grão-Pará

O pró-reitor Emmanuel Zagury Tourinho fala sobre a Pósgraduação na UFPA. Pág. 2

Opinião Célia Brito discute o novo papel do professor de língua portuguesa. Pág. 2

Realidade Virtual na sala de aula

Ambiente insalubre dificulta a conscientização ambiental

Tese vencedora do Prêmio Benedito Nunes analisa conflitos entre jesuítas e Estado Português no século XVIII. Pág. 11


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