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12 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011

Fotos Alexandre Moraes

Entrevista JORNAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ • ANO XXVI • N. 98 • Outubro, 2011

Rosyane Rodrigues

J

á está longe o tempo em que pais e professores controlavam crianças e adolescentes com um simples olhar. Hoje, as crianças estão cada vez mais conscientes de seus direitos, buscam formas de expressar seus desejos e pontos de vista, deixando a todos sem saber ,exatamente, como lidar com essa nova postura infantil. Os especialistas alertam para as pressões da mídia, para os perigos do incentivo ao consumo e à postura competitiva. O Jornal Beira do Rio entrevistou Carlos Maciel, professor da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal do Pará e integrante do Programa de Infância e Adolescência, que recentemente promoveu curso de atualização, cujo tema foi “Infância e Família: desafios contemporâneos”. De acordo com o professor, escola, famílias e instituições precisam conversar para encontrar novas referências para essa geração. Beira do Rio – É possível dizer que há um “encurtamento” da infância nos últimos tempos? Carlos Maciel – Segundo alguns autores, estamos vivendo o “desaparecimento da infância”. As pressões da mídia e do próprio mercado têm criado um processo de maior mercantilização da infância, impedindo que a criança possa se desenvolver plenamente em todos os aspectos: físico, emocional e cultural. Isso também tem relação com a sociabilidade própria da infância, pois, cada vez mais, exige-se da criança um comportamento adulto. Hoje, dentro da perspectiva da empregabilidade, ela também tem que adotar um comportamento competitivo muito mais cedo. Todos esses fatores criam uma subtração dos processos próprios da infância, os quais, no passado, eram considerados comuns a todas elas. Ou seja, a criança tinha espaço para brincar, para o desenvolvimento lúdico, para a criação, sem necessariamente estar envolvida em processos competitivos que exigissem dela uma postura de busca por uma posição no mercado. Isso, infelizmente, tem criado uma pressão muito forte para o desaparecimento da infância.

Beira do Rio – Então, temos o mercado como um dos indutores desse fenômeno? Carlos Maciel – Sim, se observarmos atentamente, já existe uma fatia de empresas e indústrias que focaliza a criança, direcionando seus produtos para ela. À medida que essa criança vai incorporando a lógica do consumo desde cedo, ela “naturaliza” esse comportamento consumista e passa a adotá-lo como se isso fosse normal, ou seja, como um modo de vida. O documentário “Criança: a alma do negócio” mostra que, hoje, a criança sofre uma pressão tão forte das mídias voltadas para o consumo que ela consegue identificar, rapidamente, as marcas de empresas e produtos, mas tem dificuldade para reconhecer, por exemplo, um legume, um alimento, coisas que, até bem pouco tempo, seriam parte da vida cotidiana nessa fase. Beira do Rio – Existem dois comportamentos familiares: ou temos a criança como o centro das atenções ou temos um cenário de negligência, violência e falta de compromisso dos adultos. É possível encontrar um ponto de equilíbrio? Carlos Maciel – Há dois ou três séculos, o trato dado às crianças não tinha a ver com o que consideramos comum e natural na vida contemporânea. O processo civilizatório foi alterando a maneira como a sociedade concebe a criança e mudando o que chamamos de infância. Philippe Ariès destaca que, do período renascentista até 1800, houve um processo de transição durante o qual a criança foi reconhecida como um ser que precisava de cuidados especiais. Para o autor, esse é “o novo sentimento da infância”. No entanto podemos dizer que não foram criadas as condições adequadas para que essa família possa desempenhar essa proteção. A precarização do trabalho e os processos de exploração fazem com que homens e mulheres fiquem mais ausentes e tenham pouco tempo para a criança. Geralmente, isso não é acompanhado pelo Estado, com a criação de serviços de escolas e creches, por exemplo. É por isso que a família acaba se constituindo em uma instituição contraditória, ou seja, o espaço familiar pode ser um espaço tanto de proteção quanto de violência. Beira do Rio – Hoje, há um “jogo de empurra”

entre pais e escola quanto à responsabilidade sobre a educação e sobre a formação desse pequeno cidadão? Carlos Maciel – No passado, dentro do ambiente familiar tradicional, as relações entre pais e filhos eram marcadas por comportamentos autoritários. Naquele período, apesar de ter muito mais tempo para a brincadeira, havia pouco espaço para a criança se manifestar. Esse padrão de comportamento e sociabilidade estava presente na casa, na escola, no trabalho, na igreja, era um padrão daquele tempo. Há pouco tempo, por exemplo, os pais controlavam os filhos pelo olhar. Isso funcionava, porque esse controle ocorria em todos os ambientes institucionais. Desse modo, criança não tinha para onde correr, todos os ambientes eram marcados por esse comportamento autoritário. Isso criava uma impressão de que havia maior comunicação entre família e escola. Hoje, as instituições estão enfrentando a falta de sintonia entre esses ambientes de sociabilidade. Por isso, a tendência comum é a família jogar para a escola responsabilidades que são suas e vice-versa. Escola, famílias e instituições precisam conversar para construírem ações conjuntas a fim de melhorar a qualidade da relação com a criança. Esse “jogo de empurra” só vai desampará-la a criança. Uma das consequências pode ser observada em crianças e adolescentes buscando referências no mercado, no consumo, na liberdade sem fronteiras, criando dificuldades para viver, para se expressar como adulto saudável e capaz de viver dignamente. Beira do Rio – Qual é o perfil dessa família contemporânea? Carlos Maciel – Para compreender a família atual, é preciso entendê-la como uma instituição contraditória. Independentemente da classe social, a família tem dimensões tanto protetivas quanto de violência. Quando entendo isso, supero a concepção moralista de família e não as classifico como “estruturadas” e “desestruturadas”. As perspectivas moralistas cristalizam concepções que podem não traduzir a realidade do ambiente familiar. Com o conceito de família contraditória, é possível identificar e reforçar o que for positivo e colaborar para a superação dos seus pontos fracos.

Memória

Clara Pandolfo recebe homenagens

Pág. 3

Câncer de tireoide

Mapeamento genético pode prevenir Pesquisa realizada no Laboratório de Erros Inatos do Metabolismo do ICB teve seus primeiros resultados premiados em Congresso. Pág. 8

Entrevista O professor Carlos Maciel discute família e infância na contemporaneidade. Pág. 12

No centro ou na periferia, violência baixa em 20% o valor final dos imóveis residenciais

Religião

Museologia

Peregrinação de imagens Patrimônio prepara devotos para o Círio preservado na Iniciada em 1972, a tradição é considerada, pela Igreja Católica, um momento de evengelização antes da

grande procissão do segundo domingo de outubro. Entre os devotos é oportunidade de aproximação. Pág. 7

Vila de Joanes.

Pág. 9

Acervo do Pesquisador

É necessário superar o olhar moralista e enxergar as famílias reais

Acervo do Pesquisador

“A família é uma instituição contraditória”

móveis de alvenaria, com um ou dois pavimentos, piso de cerâmica, cobertura de telha ou laje, instalações elétricas embutidas e sem marcas de sofisticação. Na Terra Firme, um imóvel como este pode ser comprado por R$40 mil. Em Nazaré, seu valor chegaria a R$590 mil. A descoberta foi feita pela engenheira Elaine Angelim, que acaba de defender dissertação no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFPA. A pesquisa analisou de que forma as variáveis localização, violência e regularização fundiária influenciam no valor de venda de imóveis residenciais em seis bairros de Belém: Umarizal, Nazaré, Pedreira, Marco, Guamá e Terra Firme. Pág. 4

Karol Khaled

I

Violência desvaloriza imóveis

Coluna da Reitoria A pró-reitora Marlene Freitas fala sobre os novos caminhos da graduação na UFPA. Pág. 2

Opinião Maria Leonice de Alencar comemora os 20 anos de atividades do Uniterci. Pág. 2

Igreja distribui 5.500 kits com imagem, bíblia, cartaz e livro de peregrinações

Ruínas impressionam visitantes


BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011 –

Coluna da REITORIA

Marlene Freitas - Pró-Reitora de Ensino de Graduação

H

Alexandre Moraes

Nanotecnologia kkk

Avançam pesquisas com nanopartículas

mfreitas@ufpa.br

Novos tempos no ensino de graduação da UFPA

á razões para redesenhar perspectivas e renovar a crença na efetiva melhoria das condições do ensino de graduação na Universidade Federal do Pará. A despeito de não se ter ainda alcançado o patamar satisfatório para atender demandas historicamente acumuladas, o fato é que não há como ignorar os benefícios trazidos com os suportes financeiros do governo federal oriundos do Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), implementado a partir de 2008, o qual tem permitido a edificação de novos e confortáveis prédios para a instalação de gabinetes para docentes e pesquisadores, laboratórios e salas de aulas nos vários campi, e a criação de vagas para docentes e técnicos. Esses benefícios têm objetivos definidos em favor de melhor qualificação do ensino superior, visando reorganizar cursos de graduação, realizar programas de assistência estudantil, adotar políticas de inclusão e promover a mobilidade discente, dentre outros. É confortante observar o entusiasmo de docentes, alunos e técnicos que passam a dispor de ambiente digno e humanizado para realização de pesquisas, de inovação e da elaboração de produtos científicos, culturais e artísticos. É certo que a natureza do ente universitário não reside no seu aparato físico-material, e sim na sua capacida-

de de investigar e gerar conhecimento novo, na sua competência para qualificar profissionais habilitados a difundir saberes e gerar produtos, bens e serviços destinados a promover o bem-estar social. Contudo o padrão científico e tecnológico das inovações e conquistas alcançadas no tempo presente não mais permite a conformação com o simplório e o obsoleto, especialmente porque estamos a falar em inovação e criatividade nessa sociedade mundializada, competitiva e sem fronteiras, a chamada sociedade do conhecimento, que tem a informação como o seu ativo fundamental. É exatamente esse o ponto que merece destaque no que toca às políticas acadêmicas que vêm sendo implementadas pelo MEC, Capes e CNPq, descortinando possibilidades nunca dantes ocorridas no ensino de graduação a cargo das instituições federais. São programas orientados por editais que possibilitam o concurso de projetos de pesquisa e de extensão com a participação de alunos da graduação que obtêm bolsas para a iniciação científica, a iniciação à docência e a revelação de talentos, entre outros programas, todos inspirados sob o princípio da integração entre o ensino, a pesquisa e a extensão. São centenas de graduandos dos cursos da UFPA, da capital e do interior, que conquistam essas vantagens, cujos resultados serão visíveis no seu desem-

penho acadêmico com nítidos impactos no seu perfil profíssional. Também a UFPA, por motu próprio, tem realizado um esforço significativo para a ampliação e a implementação de novas políticas destinadas à qualificação dos jovens profissionais por ela graduados. Mediante efetiva integração,as Pró-Reitorias de Pesquisa e Pós-Graduação, de Extensão e de Ensino vêm compartilhando orçamentos, notadamente de parcelas da Assistência Estudantil, para destiná-los à consolidação do Programa de Monitoria, de inovações metodológicas na formação de docentes, à ampliação de projetos de iniciação científica e à implementação de ações afirmativas, colaboração também dada pelo Centro de Processos Seletivos (CEPS). Por outro lado, a criação e a difusão de programas de mobilidade estudantil dentro e fora do País têm contribuído para gerar maior estímulo ao desempenho bem sucedido dos alunos da graduação, aqui e ali envolvidos com retirada de passaportes e vistos estrangeiros, porque estão a concorrer para estágios em Universidades da Europa e dos EUA. Essa é uma novidade sem par. Recentemente, alunos dos cursos de Teatro e Música embarcaram com destino à Universidade de Coimbra, onde permanecerão, por até dois anos, integrando o Programa Licenciaturas Internacionais /Capes, sob o modelo

OPINIÃO

Maria Leonice da Silva de Alencar

U

niterci: 20 anos de história é uma pequena amostra dos múltiplos caminhos percorridos pelo Programa em sua trajetória de extensão, de pesquisa e de ensino, bem como na produção e divulgação de conhecimento sobre o envelhecimento humano na região amazônica. A nova configuração demográfica brasileira surgiu a partir da segunda metade do Século XX, na qual já era visível o aumento da população idosa, em consequência dos avanços da medicina, da ampliação das possibilidades de acesso aos serviços de saúde, saneamento básico e de higiene, da modificação nos hábitos alimentares e da introdução da prática de atividades físicas, entre outros fatores. Foi sob a influência de todas essas mudanças demográficas e comportamentais que, na década de 70, os cursos de extensão cultural à terceira idade foram planejados dentro das instituições brasileiras de ensino superior. Nesse contexto, a Universidade Federal do Pará- UFPA, (Reitor prof. Nilson Pinto), a partir da experiência da PUCCAMP

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ Rua Augusto Corrêa n.1 - Belém/PA beiradorio@ufpa.br - www.ufpa.br Tel. (91) 3201-7577

e da ideia e sensibilidade do professor Luis Otávio Brito, docente do Centro Tecnológico, atualmente, Instituto de Tecnologia, implantou, em 1991, o Projeto de Extensão Universidade da Terceira Idade – Uniterci, com apoio da Pró-Reitoria de Extensão, sendo próreitor, à época, o professor Alex Fiúza de Melo, e convênio entre a Fundação Legião Brasileira de Assistência e Fundação de Amparo ao Desenvolvimento da Pesquisa. O Projeto foi implantado no Instituto de Ciências Sociais Aplicadas, coordenado pelo curso de Serviço Social, tendo como coordenadora a professora Heliene Carvalho, e aprovado em 7 de maio de 1992, pelo Conselho Superior de Ensino e Pesquisa. O Projeto Uniterci surge com a formatação de curso livre, com o “Curso de Atualização Cultural na Terceira Idade”, o qual, naquela época, era desenvolvido em um ano e meio. No decorrer desses anos, várias dificuldades e desafios são enfrentados pelo Programa para sua consolidação, tais como, carência de recursos materiais, financeiros e humanos, visão preconcei-

da Pós-Graduação Sandwich. E agora, com um Edital conjunto, a Propesp, a Prointer e a Proeg estão concluindo o processo de inscrição e encaminhamento à CAPES de candidaturas de alunos para uma temporada de estágios em universidades americanas. Esses novos tempos para a graduação na UFPA revitalizam o entusiasmo de quantos se ocupam desse nível de ensino, como ocorreu na Semana do Instituto de Tecnologia-SITEC, com reuniões de docentes, técnicos e alunos para definirem metas e ações voltadas à melhoria do ensino dos seus cursos de graduação. Ações dessa natureza encorajam a ampliação de vagas e a proposição de novos cursos, como consta do Edital para o Processo Seletivo 2012, com 7.600 vagas, cuja inscrição se iniciou no ambiente da Feira do Vestibular (XIII FeiVest), ocorrida recentemente, visitada por milhares de jovens, muitos vindos em caravanas das salas de aula do ensino médio, durante a qual tiveram a oportunidade de assistir a aulas diversas, proferidas por pesquisadores da Instituição, e contactar com alunos da graduação, com professores dos muitos cursos, vendo e conferindo parte dos produtos e dos fazeres por estes realizados, além de conhecerem o Campus, sob a alegria e ritmos de bandas e cantores graduandos desta fantástica e grandiosa Instituição do saber e da intelligentsia amazônica.

mleonice@ufpa.br

Uniterci: 20 anos de história tuosa e discriminatória da comunidade acadêmica sobre a velhice. Vinte anos se passaram trazendo novos desafios. A população de idosos aumentou para 21 milhões de idosos brasileiros, sendo 603.379 paraenses (IBGE, 2010), um novo cenário se apresentou, movimentos sociais se organizaram e novas demandas surgiram provocando uma nova impressão no Projeto, bem como atendendo os dispositivos da Política Nacional da Pessoa Idosa e do Estatuto do Idoso. Atualmente, o Uniterci é composto de cinco projetos e vem tentando superar os desafios articulando ações em diferentes áreas de conhecimento, constituindo-se como espaço de pesquisa, ensino e extensão para favorecer a melhor compreensão das questões pertinentes ao processo de envelhecimento e da velhice no âmbito local e regional e a formação e qualificação de recursos humanos para atuar nessa área. Assim, possibilita a ressignificação de vivências cotidianas de homens e mulheres idosos/as para a melhor qualidade de vida. Possui um acervo riquíssimo de

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TCCs, teses e dissertações abordando diversas problemáticas da pessoa idosa e já atendeu, aproximadamente, 1.500 pessoas, além de ter participado da elaboração da Política Municipal do Idoso, do Fórum Metropolitano da Pessoa Idosa, da assessoria para implantação de projetos em outras IES, tendo como modelo o Programa Uniterci. As ações são materializadas com a colaboração de profissionais de Organizações Governamentais e Não Governamentais e pelas diversas Faculdades da UFPA. Essas ações vêm sendo constantemente reavaliadas, o que possibilita uma melhor prestação de serviços à população idosa. Nessa caminhada, trabalhamos, durante esses anos, pela melhoria do relacionamento interpessoal, intergeracional e familiar. Lutamos, a cada dia, pela conquista e garantia dos direitos da pessoa idosa. Maria Leonice da Silva de Alencar é socióloga, especialista em Envelhecimento e Saúde do Idoso e Mestra em Serviço Social, atualmente coordenadora do Programa Uniterci.

Reitor: Carlos Edilson Maneschy; Vice-Reitor: Horácio Schneider; Pró-Reitor de Administração: Edson Ortiz de Matos; Pró-Reitor de Planejamento: Erick Nelo Pedreira; Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Marlene Rodrigues Medeiros Freitas; Pró-Reitor de Extensão: Fernando Arthur de Freitas Neves; Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Emmanuel Zagury Tourinho; Pró-Reitor de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: João Cauby de Almeida Júnior; Pró-Reitor de Relações Internacionais: Flávio Augusto Sidrim Nassar; Prefeito do Campus: Alemar Dias Rodrigues Júnior. Assessoria de Comunicação Institucional JORNAL BEIRA DO RIO Coordenação: Luiz Cezar S. dos Santos; Edição: Rosyane Rodrigues; Reportagem: Anne Beatriz Costa/Dilermando Gadelha/Flávio Meireles/Glauce Monteiro (1.869-DRT/PA)/Igor de Souza/Jéssica Souza(1.807DRT/PA)/ Marilia Jardim/Paulo Henrique Gadelha/ Raphael Freire (2.239 - DRT/PA)/ Rosyane Rodrigues (2.386-DRT/PE); Fotografia: Alexandre Moraes/Karol Khaled; Secretaria: Silvana Vilhena/Débora Menezes; Beira On-Line: Leandro Machado/Diogo Adriel; Revisão: Júlia Lopes/Cintia Magalhães; Arte e Diagramação: Rafaela André/Omar Fonseca; Impressão: Gráfica UFPA; Tiragem: 4 mil exemplares.

Substâncias serão aplicadas nas áreas da saúde e do meio ambiente Fotos Karol Khaled

Mácio Ferreira

2 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011

Equipe do Laboratório de Preparação e Computação de Nanometais avança com aplicações de nanopartículas de ferro Glauce Monteiro

O

s pesquisadores do Laboratório de Preparação e Computação de Nanomateriais (LPCN) do Instituto de Ciências Exatas e Naturais da Universidade Federal do Pará dedicam-se a diversas pesquisas sobre materiais, dispositivos e fenômenos nanométricos, a partir de simulações computacionais e de investigações experimentais. Em laboratório, eles desenvolvem méto-

dos de síntese de nanopartículas de ferro que podem ser utilizadas na área de fármacos, de energia renovável e ambiental. "A pesquisa base desbrava o mundo em busca de aplicabilidades futuras para o que quer que estejamos analisando", assegura Gunar Mota, professor da Faculdade de Ciências Naturais da UFPA. É um mundo extremamente vasto. Para os pesquisadores, a observação da natureza também é o ponto de partida para as

análises nano. "Os fenômenos que observamos despertam questionamentos que tentamos desvendar por meio das simulações no computador. Estes estudos auxiliam a parte experimental, permitindo que os pesquisadores prevejam as reações dos materiais e escolham procedimentos metodológicos mais coerentes com o objeto analisado, economizando investimentos em tempo e recursos financeiros", argumenta Antônio Maia, professor da Faculdade de Física da UFPA e

líder do Laboratório. Entre as pesquisas computacionalmente desenvolvidas pelo grupo, estão os estudos sobre o uso de nanofios de ouro em circuitos elétricos, dos movimentos de flagelos em nanorobôs e de transportadores de fármacos. Na parte experimental, os pesquisadores se dedicam a estudos sobre a síntese e a aplicabilidade de nanopartículas de ferro metálico, o F3O4, um tipo de óxido de ferro e de novos materiais hidrofóbicos.

Laboratório: simulação testa locomoção de nanorobôs Nanofios de ouro em um circuito são como cabos de transmissão de energia que vemos ao longo das ruas. "A diferença é que, nesta escala, o fio sofre influência da própria passagem de elétrons por ele. Se a corrente elétrica é esta movimentação de elétrons por um condutor e esse 'passar de cargas' gera o que chamamos de campos eletromagnéticos, perguntamo-nos: Como estes fios reagem? Que influência uns têm sobre os outros durante a transmissão de eletricidade? A que distâncias eles devem estar uns em relação aos outros para que não se toquem? E fomos aprofundando as perguntas, conforme

obtínhamos respostas", narram os pesquisadores. Eles testaram várias matrizes formadas com nanofios de ouro que mediam 10 nanômetros e eram separados por cinco nanômetros. O número de fios também foi testado com grupos de dois a cem fios organizados de forma paralela, uns em relação aos outros. "Quando montamos as matrizes, um fio 'sente' a presença do outro e esta interação interfere no processo de troca de informação porque se um elétron 'nota' a presença de um vizinho, ele fará seu caminho de forma distinta daquela que percorreria sem

a percepção desta presença. A interferência atrapalha a comunicação do circuito, tornando-o menos estável", explica o pesquisador Gunar Mota. As descobertas indicam como melhorar os sistemas com nanofios que já existem em computadores, por exemplo, evitando o aquecimento e a instabilidade ao acessar informações armazenadas no aparelho, aumentando, assim, a sua eficiência. Com a participação de alunos de graduação e pós-graduação da Universidade, os pesquisadores também estão analisando a criação de nanorobôs, concentrando as pesquisas na forma

de locomoção destes aparelhos. Segundo o professor Antônio Maia, "na natureza, temos micro-organismos e células, como as amebas ou os espermatozoides, que utilizam flagelos para se movimentar. Este uso implica a existência de um alto consumo de energia que gera correntes elétricas ao longo da estrutura da cauda do espermatozoide, por exemplo. O movimento é garantido pelas forças de atração e repulsão magnética ao longo do flagelo. Aqui, ensaiamos como provocar e controlar forças de repulsão, conhecidas como Força de Van der Waals, para garantir que um nanorobô mova o flagelo".

Processo de funcionalização descobre função específica Os pesquisadores do Laboratório iniciaram suas pesquisas experimentais desenvolvendo processos de síntese de nanopartículas de óxido de ferro, no caso, o F3O4. "Nosso objetivo era produzir este óxido de ferro no menor tamanho possível, em escala nanométrica. Conseguimos partículas de 25 nanômetros e, neste processo, desenvolvemos uma metodologia de síntese a partir de dois cloretos de ferro reagindo em meio alcalino", explica Ossalim de Almeida, pesquisador da Faculdade de Química da UFPA. Entre as variáveis estudadas na busca de um processo de síntese do material, estavam a velocidade de agitação das partículas, a temperatura, o tempo de reação e o pH da substância. "Utilizando tecnologia e

método próprios, podemos começar as pesquisas sobre a aplicabilidade destas nanopartículas", afirma Antônio Maia. As nanopartículas de ferro podem proteger da radiação solar, potencializar medicamentos, ajudar a limpar vazamentos no mar e nos rios e, ainda, ser utilizadas em fontes de energia renováveis. Para isso, precisam passar por um processo de funcionalização. Funcionalizar é programar as nanopartículas de ferro para realizarem uma função específica. A base desta tecnologia está relacionada à propriedade de ímã das nanopartículas. "Imaginem uma célula cancerígena, ela tem propriedades que as difere das demais células saudáveis, como a

temperatura, por exemplo. Ela pode ser até 10 °C mais quente. Sabendo disso, podemos 'programar' nossa nanopartícula para ter uma determinada carga elétrica de modo que, ao aproximar-se da célula do câncer, ela inverta a polaridade, unindo-se a esta célula e isolando-a das demais", resumem os pesquisadores do Laboratório. Além do uso em fármacos, as nanopartículas também podem ser utilizadas em prol do meio ambiente. "Com este mesmo princípio de 'revestimento', podemos usar as nanopartículas de ferro para potencializar a geração de energia em células fotovoltaicas, que absorvem a radiação solar e a convertem em energia elétrica", conta Antônio Maia.

Outros usos possíveis são como catalisador, para agilizar e potencializar reações químicas e, assim, melhorar combustíveis; como corante que, ao revertir substâncias e células, funcione como um marcador, sinalizando sua localização ou presença e, ainda, como uma espécie de esponja absorvente. Para cada uso desejável, é preciso "recobrir" as nanopartículas com um material diferente e os pesquisadores pretendem utilizar substâncias oleaginosas da Amazônia na busca de funcionalizar as nanopartículas de ferro. Serviço: Para saber mais, visite o site do Laboratório de Preparação e Computação de Nanomateriais em www.lpcn.ufpa.br.


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BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011 –

Memória

Saúde

O

câncer de colo uterino é o segundo mais frequente entre a população feminina, atrás, apenas, do câncer de mama. Anualmente, são 4.800 vítimas fatais. É a quarta causa de morte de mulheres por câncer no Brasil. As estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca) apontam que, ano passado, foram descobertos 18.430 novos casos, sendo 1.820 somente na Região Norte. São esses os dados mais recentes, no País, sobre câncer cervical ou câncer do colo do útero, como é mais conhecido. Mas o câncer não surge de uma hora para outra. Um dos principais fatores que implicam o desenvolvimento de lesões no colo de útero e deixam a mulher mais susceptível ao carcinoma é a infecção genital provocada pelo Papilomavirus Humano (HPV). Este vírus é transmitido por meio de relações sexuais, e vários fatores de risco podem influenciar em sua prevalência, como fatores

Alexandre Moraes

Populações femininas de Belém e Tucuruí foram avaliadas

Além do exame, vida sexual e reprodutiva também foram analisadas sociodemográficos, comportamentais, contraceptivos, reprodutivos e clínicos. Com peculiaridades sociais e comportamentais distintas entre grupos urbanos e rurais, o Pará apresenta uma das maiores prevalências

de câncer cervical do País. Estudos apontam que, somente no ano passado, 790 novos casos da doença poderiam surgir. Desse número, 330 seriam em Belém. Diante desse quadro, o Núcleo de Medicina Tropical da Universidade

Federal do Pará (NMT/UFPA) elaborou o Projeto de pesquisa "Prevalência de infecção genital pelo HPV em populações urbana e rural da Amazônia Oriental Brasileira". A proposta era investigar quais fatores levam a esta infecção em duas diferentes regiões do Estado, considerando uma no meio rural e outra no meio urbano. A ideia é que, com os resultados, pudessem ser criadas estratégias específicas para programas regionalizados de prevenção e tratamento. Este estudo esteve inserido no Projeto "Infecção pelo HPV e Câncer Cervical: Correlação Clínico-Epidemiológica e Fatores de Risco em Populações Distintas da Amazônia Brasileira", do NMT/UFPA e contou com o apoio financeiro do Ministério da Saúde e da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco). Além deles, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e as Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A (Eletronorte) também deram subsídios à realização da pesquisa.

Levantamento envolveu questões sociodemográficas A amostra urbana foi composta por mulheres atendidas na Unidade Materno-Infantil do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade do Estado do Pará (CCBS/UEPA). A Unidade é uma das referências para prevenção do câncer uterino e atende os bairros da Região Metropolitana. Foram recrutadas, inicialmente, 289 mulheres, mas, desse número, apenas 233 possuíam amostras com material cervical viável para os testes moleculares de pesquisa do HPV. A pesquisa na cidade foi realizada de janeiro a junho de 2008. Os testes rurais foram rea-

lizados no município de Tucuruí, situado a 426 km de Belém, no sudeste do Estado. Foram recrutadas mulheres participantes do Programa Saúde da Família da região do lago da Usina Hidrelétrica (UHE) de Tucuruí, residentes às margens da UHE, incluindo ilhas e porção continental. A coleta foi realizada no período de março de 2009 a março de 2010 e apenas 211 mulheres, de 235 inicialmente recrutadas, possuíam material satisfatório para testes. A equipe calculou um grau de 95% de confiança e uma taxa de erro absoluto de 5%. Todas as

participantes aceitaram realizar os testes voluntariamente e tinham idades entre 13 e 75 anos. Antes da consulta ginecológica, as mulheres responderam a um formulário que continha informações sociodemográficas e comportamentais, como história sexual, reprodutiva e ginecológica, métodos contraceptivos, além de dados laboratoriais. A escolha por estudar regiões do campo e da cidade se deu porque os dois locais possuem vivências diferentes. "A população rural era, em sua maioria, ribeirinha, então, para elas, é muito caro ter que comprar gasolina, pegar o barco e vir à ci-

dade para realizar os exames. Nesse ponto, as mulheres da zona urbana têm mais oportunidades", explica a professora Hellen Fuzii, uma das coordenadoras da pesquisa. Além dela, também estavam à frente dos estudos os professores Juarez Quaresma e Denise da Silva Pinto. "As famílias rurais estão agrupadas em locais distantes, o que torna difícil o acesso à informação. A população urbana tem mais informações sobre a doença e as formas de prevenção. Em compensação, as ribeirinhas estão menos expostas do que as que vivem na cidade", explica Hellen Fuzii.

Cerca de 15% estão infectadas Jovens são mais atingidas Não houve diferença significativa nos resultados. Na zona rural, 14,2% das mulheres estavam com a infecção genital e, em Belém, o índice foi de 15% entre as mulheres examinadas. Conforme ressalta Juarez Quaresma, estes resultados demonstram que as doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) estão mais relacionadas ao comportamento sexual do que à distribuição geográfica. Entre as 431 mulheres examinadas, 97,2% tiveram um resultado normal ou inflamatório na citologia. Na verdade, raros são os casos em que mulheres não possuem inflamação alguma. Segundo o Instituto Nacional do Câncer, estudos internacionais comprovam que de 50% a 80% das mulheres sexualmente ativas serão infectadas por um ou mais tipos de HPV em algum momento de suas vidas. Porém a maioria das infecções é transitória,

sendo combatida espontaneamente pelo sistema imunológico, principalmente, entre as mulheres mais jovens. Já foram contabilizados mais de 100 tipos diferentes do Papilomavirus Humano e eles são classificados em baixo e alto risco de câncer. Somente os de alto risco estão associados a tumores malignos. "Mas os que causam câncer são a minoria", revela a professora Hellen Fuzii. Segundo o professor Juarez Quaresma, o grande disseminador do Papilomavirus Humano é o homem. No corpo masculino, geralmente, a infecção acontece de forma silenciosa. "As pessoas pensam que só estão com um problema quando sentem algum sintoma. Por isso o homem pode contrair a doença e contaminar suas parceiras, porque, para ele, não há nada de errado com sua saúde", explica o professor.

Para um estudo mais detalhado, a população de cada uma das regiões foi subdividida em três faixas etárias. A primeira de 13 a 25 anos, a segunda de 26 a 44 anos e a última acima de 45 anos. A maior ocorrência de HPV foi entre mulheres do primeiro grupo nas duas regiões. Na mostra urbana, houve um pico de prevalência entre mulheres acima de 45 anos. O alto índice entre adolescentes e mulheres jovens pode ser explicado com o início da vida sexual. Desse modo, a frequência da atividade sexual, a rotatividade de parceiros, o uso irregular de métodos contraceptivos e a fragilidade da cérvice uterina implicam a alta prevalência. "Além disso, é um grupo que normalmente não procura os serviços de saúde com a mesma regularidade que as mulheres mais velhas, para fins preventivos", explica Hellen Fuzii. O segundo pico, entre mulheres de meia idade ou idosas, está relacionado com questões morais, com os

costumes sexuais, a perda gradual da imunidade devido à menopausa e uma vida sexual ativa na maturidade. Na zona rural, outro fator associado à infecção pelo HPV é a situação conjugal de mulheres na faixa de 13 a 25 anos. Os estudos indicaram que o índice era maior entre as solteiras, separadas ou viúvas, ou seja, entre as que tiveram maior número de parceiros. Mas isso não significa dizer que para estar imune ao vírus é preciso abandonar a atividade sexual. A melhor forma de prevenção é sexo com camisinha e, para as mulheres, é importante realizar o exame Preventivo do Câncer do Colo do Útero (PCCU), o Papanicolau. "Os resultados podem ser parecidos, mas os fatores que levaram à infecção em cada uma das regiões são diferentes. Desse modo, estudos direcionados proporcionam subsídios para programas de prevenção específicos para cada população", conclui Hellen Fuzii.

Clara Pandolfo é homenageada

Reconhecimento vem quando se comemora o Ano Internacional da Química Raphael Freire

A

ciência, na segunda década do século XX, era um reduto quase exclusivamente masculino, não fosse pela audácia, inteligência e pioneirismo de umas poucas figuras do gênero feminino, como Clara Pandolfo. Considerada uma cientista à frente do seu tempo e pioneira em quase tudo o que fez, a pesquisadora paraense foi a primeira mulher a se formar em Química na Região Norte e uma das cinco primeiras no País. Desde cedo, Clara já mostrava enorme interesse pela ciência, o que a levou, em 1926, aos 14 anos, a ingressar no curso de Química da antiga Escola de Chimica Industrial do Pará, fundada em 1920 e dirigida pelo renomado naturalista francês Paul Le Cointe, um dos maiores pesquisadores da flora amazônica. O curso funcionava no prédio que, hoje, é ocupado pela Escola de Música da Universidade Federal do Pará (UFPA). A pesquisadora graduou-se em 1929, na última turma da Escola, apresentando o trabalho "Contribuição ao Estudo Químico de Plantas Medicinais da Amazônia". Após a formação, Clara trabalhou como colaboradora do professor Paul Le Cointe em pesquisas

Ecologia e Economia juntas

Fotos Acervo Pessoal

Estudo mapeia fatores de risco do HPV Flávio Meireles

3

Sentido horário: Clara em Curitiba, na Santa Casa, na UFPA e em seu gabinete. tecnológicas sobre matérias-primas regionais, o que marcou essencialmente sua formação técnico-científica. A partir daí, a pesquisadora dedicou-se ao estudo dos recursos naturais da Amazônia. “Clara Pandolfo foi minha professora de Química Inorgânica no primeiro ano do curso quando a Escola foi reaberta por ela. À primeira vista,

ela impressionava por sua presença, dedicação e inteligência. Sempre falava muito bem e tinha uma excelente didática”, lembra o professor aposentado da UFPA Harry Serruya, que considera Clara a “Madame Curie da Amazônia”, fazendo referência a uma notória pesquisadora vencedora dos Prêmios Nobel de Física, em 1903, e outro de Química, em 1911.

Pioneira nos estudos de espécies oleaginosas Em 1930, as subvenções que mantinham as escolas de Química em todo o país foram canceladas. Algumas sobreviveram, pois foram incorporadas a universidades ou institutos afins. Em Belém, a Escola foi fechada. Por mais de 20 anos, Clara Pandolfo exerceu atividades nos Laboratórios de Bromatologia e de Hipodermia da Diretoria de Saúde

Pública do Pará e do Laboratório de Biologia da Santa Casa de Misericórdia do Pará. Durante esse período, a pesquisadora também realizou estudos sobre espécies oleaginosas da Amazônia. O que, anos mais tarde, viria a ser um dos seus principais projetos e contribuições para o Estado. A pesquisadora é um exemplo de mulher moderna numa época em que o machismo dominava as relações

conjugais e familiares. “A minha mãe era uma pessoa muito simples, dedicada ao trabalho e a casa", conta Sérgio Pandolfo, filho de Clara. Ela atuou como técnica na Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA) e na Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), foi membro do Conselho Técnico e diretora do Departamento de Recursos Naturais.

Preocupação com o uso sustentável da floresta Clara Pandolfo foi fundamental na articulação para a reabertura da Escola de Chimica Industrial do Pará. Com apoio financeiro do Estado e da SPVEA, em 1956, a Escola foi reaberta com o nome de Escola Superior de Química do Pará, agora, escrita com “qu”.

No início dos anos 60, por sua iniciativa e por ser intermédio, implantou-se um projeto experimental de cultura do dendê. O projeto foi incorporado pela Sudam, que financiou uma plantação em 1970. O plantio mostrou-se viável economicamente e contribuiu para o desenvolvimento

dessa cultura no Pará. De acordo com o historiador Murilo Fiuza de Melo, quando nem se ouvia falar em manejo florestal sustentável, Clara Pandolfo já desenvolvia pesquisas nesse sentido, denominadas de Florestas de Rendimento, as quais previam a exploração sustentável da floresta.

Os conceitos de Ecologia e Economia foram utilizados juntos, pela primeira vez, para se falar do uso racional dos recursos e das riquezas da floresta, bem antes da expressão "desenvolvimento sustentável". Apesar de muitas críticas, o presidente na época, João Figueiredo, formou uma comissão com especialistas de diversos órgãos e universidades, inclusive com a própria Clara Pandolfo, para estudar um projeto de lei que objetivasse o planejamento da ocupação sustentável da Amazônia. A comissão propôs a concessão de florestas públicas e o zoneamento ecológico-econômico da Amazônia. A partir de 1963, docentes e discentes lutaram para conseguir a incorporação da Escola de Química pela UFPA, criada em 1957. Somente um ano depois, a Escola passou a fazer parte da UFPA, tendo sido notável o empenho de Clara Pandolfo em viabilizar tal conquista. Na Universidade, Clara atuou como pesquisadora e professora titular até a aposentadoria. Clara Martins Pandolfo faleceu em Belém, no dia 31 de julho de 2009, pouco depois de ter completado 97 anos, ainda lúcida e participativa. Reconhecimento – No Ano Internacional da Química, não haveria nome mais merecedor de homenagens do que o de Clara Pandolfo. Como reconhecimento a todas as contribuições da pesquisadora para o Estado do Pará, a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti) homenageará, pela primeira vez, uma mulher na IV Feira Estadual de Ciência e Tecnologia, que acontece entre os dias 19 e 21 de outubro, na Estação das Docas. "A notícia foi recebida com muita alegria, principalmente pela possibilidade de usar o nome da minha mãe para despertar a importância do conhecimento científico e tecnológico", afirma Sérgio Pandolfo. O Conselho Regional de Química concede, desde 2008, o “Prêmio Professora Clara Pandolfo” a quem contribui com o desenvolvimento da Química na região.

Química no Pará e na UFPA 1920

Criação da Escola de Chimica Industrial do Pará

1929

1930

Clara FechaPandolfo mento da gradua-seEscola de em Quí- Chimica mica

1956

1964

A Escola é A instituição incorporade ensino é reaberta sob a da à UFPA denominação de Escola de Química Industrial do Pará

1972

1973

1979

1980 a 1992

1985

1988

1992

2011

O Consep aprova projetos de pesquisa sobre Plantas Amazônicas e Óleos Vegetais

Por meio de concurso público, são admitidos 10 professores para o Departamento de Química da UFPA.

Foi isolada e identificada a primeira substância química inédita pesquisada na UFPA, a Sacaca (Desidrocrotonina)

Intercâmbio entre professores da UFPA e pesquisadores franceses no Dep. de Química.

Início do Programa de PósGraduação em Química.

Implantação da Biblioteca Setorial de Química

Clara Pandolfo foi condecorada como Presidente de Honra do XXXII Congresso Brasileiro de Química.

Corpo docente das Faculdades de Química composto por 36 professores (19 doutores, 13 mestres, 1 especialista e 3 graduados).


4 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011

BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011 –

Museologia

Habitação

Para ver relíquias e contar a história

Violência atinge mercado imobiliário

Regularização fundiária também interfere no valor final da venda

Infraestrutura do Umarizal valoriza até os imóveis mais simples inseridos em áreas urbanas ou rurais, indicando, assim, as tendências do mercado imobiliário. O fato de in-

tegrar a Comissão de Regularização Fundiária da UFPA foi uma das justificativas para a escolha do tema.

Elaine Angelim selecionou seis bairros da capital paraense: Nazaré e Umarizal (classificados como centrais), Marco e Pedreira (classificados como intermediários) e Terra Firme e Guamá (classificados como periféricos). Nesses bairros, a engenheira procurou visitar imóveis que estivessem à venda e possuíssem características muito próximas, sendo classificados como padrão simples. Esse modelo de residência, de acordo com a pesquisadora, teria as seguintes características: construído em alvenaria, com um ou dois pavimentos, com piso de cerâmica, cobertura composta por telha ou laje, instalações elétricas e hidráulicas embutidas e sem marcas de sofisticação. "Tendo este paradigma como referência, a influência das três variáveis poderia ser apontada com mais precisão, já que os imóveis selecionados para amostra tinham o mesmo padrão. Assim, algumas residências que se distanciavam desse modelo foram descartadas", explica a engenheira. Entre as amostras pesquisadas, 28

Acervo do Pesquisador

Imóveis de padrão simples foram referência

Seis bairros da Região Metropolitana de Belém foram selecionados para análise foram selecionadas para alimentar o modelo matemático criado para verificar, percentualmente, o influxo dos fatores localização, violência e regularidade fundiária no valor dos imóveis nos bairros citados. O quesito violência fora classificado de um a

três a partir da análise qualitativa realizada durante o estudo, pois não se teve acesso aos números oficiais de violência urbana em Belém. Elaine Angelim considerou a infraestrutura e os relatos de moradores sobre a violência nessas áreas.

De acordo com Elaine Angelim, "aquela ideia de que violência é algo apenas da periferia não corresponde à realidade. Pude conversar com moradores e estudantes dos bairros de Nazaré e Umarizal e muitos deles diziam que alguns trechos dessas localidades são perigosos e vulneráveis a assaltos". Já a variável regularidade fundiária recebeu os valores um (atribuído aos imóveis com regularidade) e dois (atribuído às residências sem regularidade). A variável localização, por sua vez, foi classificada de duas formas. Primeiramente, dentro de um mesmo bairro, a engenheira considerou a "hierarquia da via", por meio da qual as vias receberam um valor numérico definido de acordo com a importância que possuem dentro do bairro. Depois, de forma mais abrangente, os próprios bairros foram classificados numericamente. Assim, Guamá e Terra Firme receberam valor quatro; Marco e Pedreira receberam a atribuição sete e Nazaré e Umarizal, o valor dez. Depois de fazer essas atribuições para as três variáveis, Elaine Angelim realizou vários cálculos com o auxílio do modelo matemático criado. De acordo com os resultados, a regularização fundiária pode depreciar o valor final dos imóveis colocados à venda em 14%; a violência pode desvalorizar as residências em 20% e a localização, em 33%. Juntas, as três variáveis podem ter um impacto negativo sobre o valor final de uma propriedade, sobretudo o quesito localização. "Assim, um imóvel sem documentação regular, localizado em uma área periférica, desprovida de infraestrutura e vulnerável a violência pode ser desvalorizado em 67%", avalia Elaine Angelim. Como exemplo de referência a esses resultados, a engenheira revela que, entre os imóveis utilizados como amostra, o de menor valor era localizado no bairro Terra Firme e estava à venda por R$ 40 mil. O imóvel de maior valor encontrava-se em Nazaré, à venda por R$ 590 mil. Mesmo considerando a área total construída dos imóveis, as três variáveis estudadas são as que mais influenciam para a formação de valores tão díspares. "Essa situação foi recorrente durante a pesquisa. Muitos imóveis com as mesmas características apresentavam preços de venda divergentes uns dos outros", finaliza Elaine Angelim.

Moradores contribuem para criação de museu na Vila de Joanes

Igor de Souza

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á cerca de quatro séculos, os padres da Companhia de Jesus chegaram ao território conhecido, atualmente, como a Vila de Joanes, pertencente ao município de Salvaterra, na Ilha do Marajó. Lá, desenvolveram atividades e construíram a primeira igreja da localidade. O tempo passou, os padres foram expulsos da terra e o que resta, agora, do antigo templo são as ruínas, as quais despertam a curiosidade de visitantes e o interesse dos moradores da Vila em preservar esse patrimônio arqueológico. Buscando compreender o interesse da população local da Vila de Joanes e articular um trabalho de gestão compartilhada, a professora Luzia Gomes Ferreira, da Faculdade de Artes Visuais e Museologia do Instituto de Ciências da Arte (ICA) da UFPA, desenvolve o Projeto de Extensão "O passado no presente: musealização compartilhada do patrimônio arqueológico na Vila de Joanes, Ilha do Marajó – PA", financiado pela Pró-Reitoria de Extensão da UFPA (Proex). O objetivo principal do Projeto é contribuir para a preservação, a comunicação e a manutenção do referido patrimônio na comunidade. O Projeto propõe uma parceria acadêmica entre os campos da Museologia e da Arqueologia, adotando o princípio da multivocalidade. Está vinculado à pesquisa "Os significados do patrimônio arqueológico para os moradores da Vila de Joanes, Ilha do

Acervo do Pesquisador

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ende-se. Depois de planejar e economizar por muito tempo, é chegada a hora de, finalmente, realizar o "sonho da casa própria", objetivo de muitas famílias brasileiras. Porém quem procura um imóvel para comprar também se preocupa em saber se o futuro lar está regularizado, se o local é de fácil acesso e seguro. Esses fatores foram analisados pela engenheira civil Elaine Cristina de Souza Angelim na Dissertação Modelagem para a mensuração das variáveis quantitativas violência urbana e regularidade fundiária na formação do valor de imóveis residenciais urbanos. O trabalho, que começou a ser desenvolvido em 2009, foi defendido em agosto deste ano, no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal do Pará (UFPA), sob orientação dos professores Renato Martins das Neves e André Augusto Azevedo Montenegro Duarte. Com esta pesquisa, a engenheira buscou desvelar como a localização, a violência urbana e a regularidade fundiária podem influenciar substancialmente no valor final de imóveis residenciais à venda em Belém. "Esses fatores, naturalmente, já estão inseridos no valor. A regularização fundiária é, inclusive, uma condição necessária quando se pretende financiar o imóvel", explica Elaine Angelim. De acordo com a engenheira, o estudo tem como principal aporte teórico a Engenharia de Avaliação – ramo da Engenharia Civil que, basicamente, estuda a mensuração do valor de imóveis, os quais podem ser residenciais ou comerciais e estar

Perigo também está no Centro

Alexandre Moraes

Paulo Henrique Gadelha

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Vestígios da ocupação dos Jesuítas, ruínas despertam curiosidade de turistas e interesse dos moradores Marajó", coordenada pela professora Marcia Bezerra de Almeida, do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da UFPA (PPGA). A ideia de elaborar o Projeto surgiu quando a professora Luzia Gomes foi requisitada para prestar

assessoria técnica ao Projeto "Pesquisa arqueológica e educação patrimonial na Vila de Joanes, Ilha do Marajó, PA", feito em parceria entre o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o Museu do Marajó e o Museu Paraense Emílio

Goeldi (MPEG). Nele, Luzia Gomes auxiliou a reestruturação da exposição de vestígios arqueológicos, a qual funcionou de abril de 2009 a abril de 2010, montada em parceria com os moradores, na Escola de Ensino Fundamental de Joanes.

Vestígios arqueológicos encontrados no quintal de casa Durante o trabalho, foi possível perceber o interesse da população pelos vestígios arqueológicos presentes na paisagem local, alguns encontrados nos terrenos das residências, tais como fragmentos cerâmicos, pedaços de louças, metais e moedas. A exposição, que deveria permanecer por pouco tempo, agradou turistas e moradores da Vila, o que instigou a equipe gestora da Escola a solicitar a permanência dela por mais tempo. Esse tempo foi de um ano, e os materiais ficaram expostos dentro de uma sala de aula, recebendo visitas de moradores e de turistas brasileiros

e estrangeiros que frequentam a Vila de Joanes. No entanto a exposição teve que ser desmontada por haver a necessidade de a Escola ocupar a sala de aula. Assim, a professora Luzia Gomes decidiu elaborar e executar o Projeto de Extensão para reestruturar a exposição na Vila de Joanes. "Quando eu comecei a fazer a assessoria, percebi que a população envolvida, em Joanes, tinha interesse em manter o patrimônio lá e, posteriormente, criar um museu. O interesse de compreender o que é museu para os moradores de Joanes deu origem ao meu projeto de mestrado no PPGA e

ao projeto de extensão que elaborei", explica a professora Luzia Gomes. Para reestruturar a exposição, a equipe busca desenvolver ações museológicas, como documentação, conservação e comunicação, sendo que esta última envolve a exposição propriamente. Além disso, busca considerar interesses, sentimentos, ideias e modos de se comportar e agir compartilhados socialmente pelos moradores com relação à porção material que compõe a paisagem local. Todavia, na Vila de Joanes, o objetivo não é montar um museu aos moldes clássicos, e sim identificar

que tipologia de museu os moradores pretendem constituir. "Durante muito tempo, os processos de musealização ocorreram dentro de muros de museus clássicos, nos quais as memórias de vários grupos sociais foram excluídas. No entanto, hoje, nós temos a ideia de que a musealização pode ocorrer em outros espaços, tanto é que existem grandes projetos de musealização de sítios arqueológicos, e Joanes está dentro desse contexto contemporâneo, onde é possível refletir e executar novas estratégias de musealização do patrimônio", ressalta a professora Luzia Gomes.

Narrativas sobre patrimônio estarão disponíveis na web Para compreender o que significa museu para os moradores de Joanes, também se estabelece um diálogo com a Antropologia, adotando o desenvolvimento do trabalho etnográfico. Durante o trabalho em campo, foram realizadas a observação participante, as entrevistas e o registro audiovisual para entender como os moradores da Vila de Joanes interpretam e interagem com o patrimônio arqueológico. "O Projeto trabalha com outras narrativas que

não sejam apenas as minhas, como museóloga, mas que os próprios moradores possam contribuir com suas interpretações, as quais podem ser trabalhadas na exposição. Buscamos, sempre, estabelecer um diálogo para saber como eles querem se autoapresentar nesse espaço, afinal, é o patrimônio deles", afirma a coordenadora Luzia Gomes. Ao realizar as entrevistas, as quais ocorreram no primeiro semestre deste ano, foi identificado que

alguns moradores almejam a criação de um museu. "Eles possuem a perspectiva de que o museu se concretize e que seja, como eles dizem: um espaço no qual eles possam ver 'relíquias' e contar a 'história de Joanes", ressalta Luzia Gomes. As visitas dos pesquisadores à Vila de Joanes acontecem mensalmente. Futuramente, a professora Luzia Gomes buscará concretizar outra etapa, criar um banco de dados a partir das narrativas dos moradores

ao apresentar a relação deles com as ruínas, com os vestígios encontrados no cotidiano da comunidade e a partir das interpretações acerca do patrimônio arqueológico em Joanes. "A intenção é disponibilizar tudo isso na web, a partir, é claro, do consentimento deles. Dessa forma, se for constituído um museu na Vila, nós já iremos saber o que os moradores estão pensando e o que eles querem desse espaço", finaliza a professora.


8 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011

BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011 –

Cartuns

Câncer de tireoide

Jéssica Souza

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esquisa realizada na Universidade Federal do Pará (UFPA) pode indicar uma forma de prevenir e tratar, previamente, o câncer da tireoide. Esse tipo de tumor se aloja na região anterior do pescoço e pode ser ocasionado por mutações genéticas. Identificar os genes que estejam associados ao desenvolvimento do câncer da tireoide é o objetivo da investigação realizada pelo médico-cirurgião Alberto Kato, especialista em cabeça e pescoço, mestrando do Programa de Pós-Graduação em Genética e Biologia Molecular da UFPA. O câncer da tireoide mais frequente é o carcinoma papilar, que é também o mais comum entre os tipos de câncer que acometem as glândulas endócrinas do organismo. Alberto Kato investiga a relação deste tipo de câncer com mutações no gene TSHR, responsável pela produção dos hormônios da tireoide. A pesquisa é orientada pelo professor Luiz Carlos Santana da Silva, coordenador do Laboratório de Erros Inatos do Metabolismo (LEIM), o qual pertence ao Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFPA. A investigação é feita por meio da análise dos genes presentes no sangue de pessoas já diagnosticadas. Para isso, Alberto Kato conta com

Alexandre Moraes

Pesquisa investiga a relação entre a mutação de genes e a doença

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Laboratório de Erros Inatos do Metabolismo quer ampliar número de pacientes e genes investigados a colaboração de pacientes por ele atendidos no Hospital Universitário João de Barros Barreto. O sangue coletado é enviado ao LEIM do ICB e analisado com o apoio dos também pós-graduandos Nathalia Lima e Erik Alves. O exame busca encontrar

mutações no gene TSHR desses pacientes para que se possa comprovar a relação desse gene com a ocorrência do câncer da tireoide. A intenção é, que "no futuro, nós possamos informar ao paciente, analisando o seu DNA, se ele vai ou

não desenvolver um câncer de tireoide", afirma Alberto Kato. "O próximo passo será iniciar o tratamento antes que o tumor se desenvolva", complementa. Da mesma forma, os familiares poderão descobrir se são propensos a desenvolver a doença.

os que acometem as glândulas endócrinas do organismo. Na Amazônia, em um ranking de maior incidência, esse tipo de tumor apareceria em décimo lugar. O tratamento é sempre cirúrgico. Quase 100% dos casos podem ser curados simplesmente com a cirurgia e com um tratamento complementar chamado iodo radioativo, aplicado em, aproximadamente, 40 dias depois da intervenção. Iodo – "Não é necessário fazer quimioterapia ou radioterapia porque a tireoide é o único órgão do nosso corpo que metaboliza o iodo. Inclusive se houver metástase em outros órgãos, como o pulmão, o tratamento pode ser feito com o iodo radioativo,

até mesmo sem necessidade de cirurgia", explica Alberto Kato. Segundo o pesquisador, a tireoide retira o iodo da circulação sanguínea e o elemento, que é radioativo, acaba matando a célula cancerígena. "Então, é um câncer de tratamento mais fácil e com um prognóstico muito melhor que os demais tipos", assegura. Os hormônios produzidos pela tireoide são basicamente três: a calcitonina, que possui um papel muito importante na homeostase do cálcio; a tiroxina (T4) e a triiodotironina (T3), que regulam a taxa do metabolismo e afetam a taxa funcional de muitos outros sistemas do corpo. O câncer da tireoide pode afetar a produção desses hormônios, mas, segundo o médico,

o fato de engordar e emagrecer como consequência de distúrbios da tireoide não é considerado sintoma relacionado a esse câncer. "Trata-se de uma outra doença associada à produção de hormônios", explica Alberto Kato. Quando há excesso de produção, ocorre o hipertireoidismo. O hormônio da tireoide trabalha no metabolismo das células, então, se a célula começa a trabalhar mais rápido, ela consome mais energia e, assim, a pessoa emagrece. Quando há déficit na produção de hormônio, a pessoa tem hipotireoidismo - o organismo fica desacelerado, provocando o aumento de peso, pois as células não consomem energia. Tais doenças são identificadas pelo exame de sangue.

Resultados foram premiados em Congresso de Genética A pesquisa "Polimorfismo D727E no gene TSHR em pacientes com carcinoma bem diferenciado da tireoide", financiada pelo Instituto Nacional de Genética Médica Populacional (INAGEMP), foi premiada no XXIII Congresso Brasileiro de Genética Médica, realizado em julho de 2011, em Cuiabá, Mato Grosso. O trabalho foi o vencedor entre as 40 melhores apresentações orais do evento, pois se trata de mais uma ferramenta que pode auxiliar a conduta médica no diagnóstico, na prevenção e no tratamento da doença.

Acervo reunido pelo MUFPA conta história da cidade Anne Beatriz Costa

Sem o tratamento, doença pode atingir outros órgãos O principal sintoma da doença é a presença de um nódulo ou o aumento de volume na região do pescoço. Quando o câncer se instala e a pessoa não procura cuidados médicos, o tumor invade as estruturas do pescoço e pode evoluir para uma metástase. A tireoide, no organismo, fica unida à traqueia, então, também pode ocorrer falta de ar. A formação de raízes no pescoço pode evidenciar a metástase. Se não houver tratamento, a disseminação do câncer pode atingir o pulmão, os ossos, o fígado e outros órgãos. O câncer da tireoide atinge principalmente as mulheres. A incidência gira em torno de 10%. Esse tipo de câncer é o mais frequente entre

Coleção tem duas mil obras

O câncer da tireoide não se desenvolve mediante fatores externos. O único fator externo que interfere no desenvolvimento desse tipo de tumor é a radiação. "Observou-se, por exemplo, que, após o acidente nuclear em Chernobyl (1986), houve aumento na incidência de câncer da tireoide na Ucrânia. A mesma coisa ocorreu no Brasil, quando houve, em Goiânia, por volta de 1987, o acidente radiológico envolvendo o elemento Césio-137", recorda Alberto Kato. De acordo com o pesquisador, como os fatores de causa do câncer da

tireoide são basicamente genéticos, não há como prevenir a doença, a não ser tentar não se expor à radiação. "Há pessoas que gostam de fazer radiografias ou tomografias anualmente. Mais de duas tomografias por ano aumentam o risco de mutações em genes e, em consequência, o desenvolvimento do câncer da tireoide", explica. No entanto a identificação de genes que possam estar associados ao desenvolvimento do câncer da tireoide, foco da pesquisa de Alberto Kato, pode ser uma forma de prevenir a doença. "Hoje, 60% desses genes já

estão identificados. Quando a Academia conseguir completar 100% de genes identificados, toda a população poderá investigar o risco de um câncer da tireoide mediante um simples exame sanguíneo", prevê o médico. A Dissertação está em fase final. "Conseguimos identificar que a mutação presente no gene TSHR pode estar associada com a etiologia do câncer de tireoide. Isso é um fato novo que conseguimos comprovar", diz. Os planos são ampliar o número de pacientes e de genes investigados.

o falarmos de charges, cartuns, desenhos, quadrinhos e caricaturas, a confusão é grande. Em comum, todos têm a linguagem humorística, mas a principal diferença habita entre charges e cartuns. Enquanto os cartuns são feitos a partir de situações cotidianas, a charge normalmente é inspirada em assuntos que estejam em evidência no momento - escândalos políticos, performances esportivas, guerras, programas de TV, entre outros. Eles recriam os fatos de uma forma fictícia, de modo a inserir a comicidade naquela situação. É uma crítica político-social feita de forma satírica e essa é a principal distinção entre um e outro. Outra definição explica o cartum como o desenho que abrange o plano de uma forma geral, capturando todo o personagem. O plano, quando feito em close fechado no rosto, definiria a caricatura, que normalmente enfatiza as características mais marcantes dos personagens de forma cômica. A Coleção de Cartuns do Museu da UFPA (MUFPA) reúne charges, caricaturas, recortes de jornais e

Alexandre Moraes

Análise do DNA poderá prevenir

EM DIA

Foram mantidos: os critérios de eliminação, o sistema de cotas e as provas de línguas estrangeiras ofertadas na 2ª fase do concurso. Para mais informações, acesse www.ceps.ufpa.br

Platão

Compilação teve início em 1997 e contou com o apoio dos próprios artistas revistas e, é claro, os cartuns que dão nome ao acervo. De acordo com Raquel Santos, coordenadora de Acervos no Museu, a coleção surgiu do gosto que o escritor paraense Vicente Salles tinha por esse tipo de arte. A biblioteca do Museu também abriga a Coleção Vicente Salles, que, além de livros, recortes de jornais, fotografias, partituras e periódicos,

conta com vários cartuns, caricaturas e desenhos. O escritor teve a ideia de criar uma coleção, pois o Pará tinha muitos artistas talentosos e certa tradição na produção de cartuns, mas essa obra estava completamente dispersa e desorganizada. Vicente já mantinha contato com muitos cartunistas e sugeriu que doassem suas obras para formar uma coleção.

se formou, Vicente Salles foi convidado a participar de reuniões e do lançamento da Coleção de Cartuns. Mino Affonso conta que, em uma dessas reuniões, cada um dos cartunistas fez uma caricatura do escritor. Hoje, a caricatura feita por Biratan é usada como logomarca em alguns documentos referentes à Coleção Vicente Salles. Também fazem parte do acervo da Coleção cópias de cartuns publicados por José Carlos Wiegandt em jornais e revistas. O cartunista nasceu em 1841, na Alemanha, e, por volta de 1868, veio para o Brasil. Quando chegou ao país, seu nome de batismo, Hans-Karl Wiegandt, foi adaptado para uma versão bem brasileira – José Carlos – e foi assim que ficou conhecido. Ele passou algum tempo em Recife, onde

trabalhou no Jornal A Careta, que era ilustrado com seus desenhos. Em 1870, o cartunista mudouse para Belém, adotando-a como seu novo lar. Ele foi o primeiro cartunista do Pará, ganhando, mais tarde, o título de "Patrono da Caricatura do Grão-Pará", dado por Vicente Salles. Foi aqui que faleceu, em 1908, deixando importantes contribuições para a arte local. José Wiegandt teve seu trabalho sempre muito ligado à política. Sua influência foi tanta que, depois dele, os governos republicanos passaram a investir na formação de artistas locais, pois consideravam a arte um forte instrumento persuasivo e formador de opinião. Em 2009, o cartunista alemão foi homenageado no II Salão de Humor da Amazônia.

Da biblioteca para o Acervo de Obras de Arte Segundo Mino Affonso, os cartunistas deveriam continuar alimentando o acervo adicionando novas obras. A dificuldade, de acordo com a coordenadora, é que, atualmente, os arquivos são digitais, "dificilmente, os cartunistas produzem algum material em papel, o qual possa ser levado à Coleção de Cartuns". A ideia de Vicente Salles, ao criar a Coleção, é repetida por Mino Affonso para ressaltar a importância desse acervo para a sociedade. "O Pará tem uma tradição de cartuns. No final do século XIX, havia gente

Em 2012, a UFPA deve receber 7.631 mil novos alunos. O edital do Processo Seletivo prevê a criação de 675 novas vagas em 18 cursos de graduação. O Enem será novamente adotado como 1ª fase do Processo Seletivo. A 2ª fase, com prova elaborada pela Universidade, está marcada para o dia 3 de dezembro.

Vestibular II

O alemão José Wiegandt foi o grande precursor A compilação teve início em 1997, a partir de doações de material por alguns artistas, entre eles, Biratan, Luís Pinto, Waldez, Atorres, João Bosco e Walter Pinto. A coordenadora da Coleção Vicente Salles, Mino Affonso, trabalha no MUFPA desde 1996 e acompanhou de perto essa formação. Ela conta que o cartunista Luís Pinto enviou uma caixa com todo o seu trabalho. "É interessante, pois podemos ver pelos rascunhos como ele chega ao cartum. É possível perceber a sua evolução até o produto final", avalia a coordenadora. A Coleção também conta com as obras de alguns artistas amadores, provenientes do I Salão de Humor Ri Guamá e da I Semana de Humor Paraense. Mesmo não sendo mais diretor do MUFPA quando a Coleção

Vestibular I

fazendo caricatura", o alemão João Carlos Wiegandt é o grande exemplo disso. Ela ainda destaca que "essa tradição passou um tempo meio parada e retornou na década de 70, com Biratan e Walter Pinto". No final de 2010, os cartuns foram transferidos da biblioteca do MUFPA para integrarem o Acervo de Obras de Arte do Museu. Segundo Mino Affonso, apesar do valor documental por retratarem o tempo de uma forma ímpar, os cartuns são, essencialmente, obras de arte e esta foi a razão da mudança. A Coleção de Cartuns do MUFPA é composta por

material doado por artistas para esse fim. Os cartuns da Coleção Vicente Salles não foram transferidos, pois integram o acervo do escritor. Recentemente, todas as obras foram reorganizadas para verificar se algo havia se perdido ao longo dos anos. Felizmente, os números continuam corretos. A Coleção de Cartuns conta com um total de 2.967 obras, sendo 1.411 só de Biratan. Outros artistas com números significativos de cartuns no acervo são Luís Pinto, com 556; João Bosco, com 418; e Walter Pinto, com 166 obras doadas ao MUFPA.

A ed.ufpa lançou os três primeiros volumes da Coleção Diálogos de Platão: Banquete, Fedro e Fédon. A edição bilíngue, em grego e português, sob a responsabilidade de Plinio Martins Filho, foi coordenada por Benedito Nunes e Victor Sales Pinheiro.

Seminário O Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formação de Professores e Relações Étnico-Raciais (GERA) do Instituto de Ciências da Educação realiza, no período de 1º a 3 de dezembro, o III Seminário Nacional e o V Seminário Regional sobre Formação de Professores e Relações Étnico-Raciais, no Campus Guamá. O objetivo é promover a divulgação-discussão e pesquisa sobre a temática no campo da Educação.

Extensão Acontece, de 16 a 18 de novembro, a 14ª Jornada de Extensão Universitária promovida pela Proex. “Meio Ambiente e Responsabilidade Social” será o tema deste ano. De acordo com o pró-reitor Fernando Arthur, a proposta é antecipar o debate que ocorrerá em 2012, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio + 20, na cidade do Rio de Janeiro. Mais informações no o site http://www.ufpa.br/jornadadeextensao/

Estrelas 49 cursos de graduação da UFPA receberam os selos de cinco, quatro e três estrelas na avaliação anual do Guia do Estudante, publicação da Editora Abril que classifica os cursos superiores das maiores Instituições de Ensino Superior do Brasil. Os cursos de Biomedicina, Ciências Biológicas, Enfermagem, Odontologia, Farmácia, Direito, Geologia, Pedagogia, Arquitetura e Urbanismo, Engenharia Civil, História e Geografia receberam o selo das cinco estrelas, equivalente ao conceito Excelente.

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6 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011

BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2011 –

Semiótica

Religião

"O

lhe compadre, nem quero lhe contar a triste sina deste meu barco a vela feito de miriti. Eu trouxe ele mas foi pra colocar no Carro dos Milagres. Promessa feita e jurada ao pé da imagem de Nossa Senhora do Retiro, na noite de lua cheia, três noites depois do medonho temporal. Tive que correr terra – o senhor pensa – pra cumprir dita promessa. E trazer, com minhas próprias mãos, esta veleira copiada da fina canoa que o vento e a água reduziram a fanico na contracosta da Baía do Marajó. Só este criado seu escapou são e salvo por obra e graça de Deus e Nossa Senhora de Nazaré". Assim, inicia o conto Carro dos Milagres, parte da coletânea homônima escrita pelo romancista paraense Benedicto Monteiro. Na história, o narrador oferece um barco de miriti, no dia do Círio de Nazaré, pela graça alcançada quando, por meio de uma promessa feita por sua mãe e da ajuda do finado irmão, sobreviveu à destruição de seu barco em uma noite de tormenta. O conto reproduz uma ação corriqueira nas procissões em homenagem a Nossa Senhora de Nazaré: a oferenda de objetos chamados exvotos, abreviação latina de ex-voto suscepto - "o voto realizado" -, representando um pedido feito ou o agradecimento por um pedido atendido.

Fotos Acervo do Projeto

Projeto analisa imagens e discursos dos ex-votos do Círio de Nazaré

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Ligação simbólica: promesseiros se deixam fotografar e explicam o significado do objeto que carregam Tais objetos são uma manifestação estética e religiosa que se constitui arte popular, despertando o interesse de arqueólogos, antropólogos, culturalistas e linguistas, como no Projeto de Pesquisa "Objetos e promessas no Círio de Nazaré: processos semióticos de (re)significação", vinculado à Faculdade de Letras (Fale) da Universi-

dade Federal do Pará (UFPA). O Projeto surgiu há quatro anos, quando alguns alunos da Faculdade de Letras, reunidos pela coordenadora do Projeto, professora Rosa Brasil, decidiram estudar essa manifestação a partir de uma perspectiva discursiva e semiótica. "Nós começamos com a proposta de trabalharmos a relação

ponto do trajeto da romaria. Este ano, será em frente à sede da Assembleia Paraense, na Avenida Presidente Vargas. Durante o evento, antes e depois da passagem da Berlinda, os participantes abordam promesseiros que trazem ex-votos e fazem perguntas sobre o objeto e a motivação deles estarem ali. A documentação das entrevistas é feita por meio de gravação de voz, fotos do ex-voto sozinho e sendo carregado pelo romeiro, além de filmagens em vídeo. Após as abordagens, as gravações de voz são transcritas para o papel e

separadas juntamente com as imagens que ilustram aquele ex-voto, para, então, serem feitas as análises a partir das teorias estudadas. De acordo com a professora Rosa Brasil, apesar de só haver um único dia do ano em que se dá a coleta de dados – o domingo do Círio –, muitos são os relatos colhidos, em virtude da boa vontade dos promesseiros por contarem suas histórias. Os ex-votos podem ser qualquer objeto, um barco, uma casa (os mais comuns), uma cruz, um tijolo ou qualquer coisa que tenha alguma ligação simbólica

Formas e cores dos objetos traduzem cultura Segundo a professora Rosa Brasil, o discurso "é a parte fluídica do texto. Discurso é uma maneira de ver, definir e lidar com a realidade, é um conjunto de princípios, de valores e de significados imanentes ao texto". Esses significados não são arbitrários, mas determinados pela cultura. Os paraenses "escolhem", por exemplo, objetos como barcos e casas, mas imprimem nesses objetos formas e cores que revelam os costumes e valores por meio dos quais vivem. O formato dos ex-votos também segue uma lógica regional, como podemos observar no conto de Benedicto Monteiro, "um barco a vela feito de miriti... copiado da fina canoa que o vento e a água reduziram a fanico",

'Visita' da Santa cria momentos de sociabilidade entre vizinhos

Marilia Jardim

entre imagem e discurso, e o Círio, por meio dos ex-votos, apresentou a possibilidade de envolvermos também questões de identidade nessa relação. Cada um dos objetos carregados pelos promesseiros apresenta um ‘recheio discursivo’ que nos identifica, que fala de nós, paraenses", explica a professora.

Bakhtin e Peirce preparam para a coleta de dados As atividades começam muito antes do Círio, quando os alunos e a professora se reúnem em grupos de trabalho para estudar a parte teórica do Projeto, baseada na perspectiva enunciativa e estética de Mikhail Bakhtin e na teoria semiótica proposta pelo norte-americano Charles Sanders Peirce. As reuniões acontecem todas as quintas-feiras e preparam os pesquisadores para o "dia chave" do Projeto. Na manhã da procissão, no segundo domingo do mês de outubro, a professora e os alunos se reúnem em um

Cinco mil imagens peregrinam em Belém

ou seja, um característico barco de rio dos ribeirinhos paraenses. "Somos nós que estamos representados lá", afirma Rosa Brasil, que explica que os ex-votos são, também, uma maneira de pensar a identidade paraense na festa do Círio. "Pelos ex-votos, nós representamos a nossa comunidade semiótica, o que nós temos de referência pessoal e, ao mesmo tempo, coletiva, assim, essa representação, consciente ou não, passa a ter a nossa cara, passa a ser nós mesmos. Os ex-votos compõem um rio colorido e multiforme que corre nas mãos dos paraenses na sua maior procissão", analisa a professora. Outro caso considerado inte-

ressante pela pesquisadora foi o de um senhor que estava levando como ex-voto uma grande cruz, além de estar enrolado em uma profusão de terços de todos os tamanhos. Ao ser questionado por que levava aquela cruz nas costas, ele respondeu: "Não é nada específico, quero que o meu filho seja um cidadão". "Isso é emblemático", avalia a professora Rosa Brasil, "porque se trata de uma pessoa comum que se submete ao sacrifício de carregar a cruz, tal qual Cristo fez, com o intuito de salvar a humanidade, para pedir o mínimo, pedir que o filho tenha o mínimo de dignidade". Ainda, segundo a professora, o caso deixa à mostra o aspecto político ao lado de nosso universo cultural e social.

com os anseios daquele que está fazendo a promessa ou agradecendo o pedido alcançado. Muitas vezes, os ex-votos não precisam nem ter uma ligação direta com a graça alcançada ou pedida, como conta uma das bolsistas do Projeto e aluna do sexto semestre do curso de Letras, Gabriela Brito, "nós perguntamos para um senhor por que ele levava um barco tão grande, ele respondeu que estava se curando de um câncer e o tamanho do barco era proporcional ao quão agradecido ele estava, mas não tinha, efetivamente, nada a ver com o barco".

Resultados estarão em álbum Este ano, acontecerá a última pesquisa de campo dentro do Projeto "Objetos e promessas no Círio de Nazaré: processos semióticos de (re) significação". Após o mês de outubro, a professora Rosa Brasil e os integrantes do grupo começarão a organizar um álbum com o mesmo nome do Projeto. Nesse álbum, constarão discussões teóricas sobre Análise do Discurso, Estética, Identidade e Semiótica, e análises que inter-relacionam objeto estético e linguagem, acompanhadas de fotos e transcrições das falas dos romeiros. O Projeto também resultou em artigos que serão apresentados no Encontro de Estudos Bakhtinianos, em Juiz de Fora.

ntre os vários eventos que antecedem o dia da principal homenagem à padroeira dos paraenses, o segundo domingo de outubro, um dos mais importantes é a Missa do Mandato, ritual que abre o calendário litúrgico do Círio de Nazaré. Na solenidade realizada após a missa, milhares de imagens são entregues a grupos de voluntários, que, munidos de livros de orações, dão início à Peregrinação de Nossa Senhora de Nazaré pelas residências católicas dos bairros de Belém. Para os paraenses, é o tempo do Círio que começa. A peregrinação no bairro Umarizal foi o objeto de estudo da Dissertação No primeiro - Ela dorme, no segundo - a gente reza, defendida por Mariana Pamplona Ximenes no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, sob orientação da antropóloga Carmem Izabel Rodrigues. A análise deteve-se na organização do evento e na negociação entre os que recebem a imagem em casa e o grupo de peregrinação. O trabalho de pesquisa ainda incluiu um breve histórico sobre abordagens antropológicas dos símbolos do Círio já estudados, os aspectos do sagrado e do profano, além da relação entre o catolicismo popular e o oficial. O uso do termo peregrinação para esses encontros religiosos foi um dos itens trabalhados pela autora. O conceito de peregrinação como o movimento de pessoas ou grupos que se deslocam por um determinado caminho em busca do sagrado é alterado na peregrinação de Nossa Senhora de Nazaré. Neste caso, é a Santa quem

Acervo do Pesquisador

Entre barcos, casas e cruzes

Dilermando Gadelha

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kkk Devotos arrumam pequenos altares com flores e velas para receber a Santa peregrina, quem é levada ao lar do devoto, tornando aquele espaço sagrado. "As peregrinações podem ser consideradas como uma ‘atualização’ do mito do caboclo Plácido, que teria encontrado a imagem de N. S. de Nazaré às margens de um igarapé, onde, hoje, é a Basílica-Santuário, e feito do local um centro de veneração. Durante a peregrinação, a casa de cada

família se torna um pequeno centro de romaria, noqual é montado um altar enfeitado com flores e velas, e a veneração é feita por orações e cantos", explica Mariana Ximenes. A aproximação da Santa com o Homem, durante os encontros, é outro aspecto destacado pela pesquisadora. "A proximidade com a imagem e o cuidado em carregá-la é algo sagrado e, ao mesmo tempo, mantém um

distanciamento horizontal. Ela – a Santa – está acima dos homens, mas, ao mesmo tempo, é alguém que as pessoas chamam de mãezinha e tratam com intimidade. A Santa é como se fosse uma visita ilustre, tão humana quanto os que estão ali. Isso se percebe nas expressões daqueles que recebem a imagem em seus lares: a Santa 'dorme', 'vou fazer a mesa pra Santa'", comenta a pesquisadora.

Momento de orações, cânticos, leituras e mesa farta A Dissertação também aborda as relações tecidas entre os participantes do culto à imagem de N. S. de Nazaré a partir de análise etnográfica. Realizada de casa em casa, a peregrinação aproxima os moradores do bairro, cria momentos de sociabilidade e solidariedade entre vizinhos. A dirigente do grupo de peregrinação torna-se a "guardiã" da imagem e mediadora da relação entre a paróquia do bairro e os moradores. Esta pessoa é responsável por localizar os interessados em receber a imagem e verificar

quando acontecerão as ‘visitas’. Nesse momento, muitos moradores do bairro adentram, pela primeira vez, uns na casa dos outros. São desconhecidos, cujas relações se limitavam a um "bom -dia" que, por meio da peregrinação, obtém permissão para circular pelo espaço privado. A imagem da Santa passa de uma família para outra. No dia da chegada, Ela "dorme". No dia seguinte, os peregrinos voltam à casa da família onde a Santa está e o momento é de orações, cânticos e leitura

de trechos da Bíblia. Também são feitos comentários sobre o tema da Campanha da Fraternidade. Ao final, os participantes se confraternizam em torno da mesa, com um lanche ou um jantar. É a partilha da comida, tal como faziam os antigos peregrinos. As famílias mais abastadas parecem querer reproduzir, neste momento, a fartura do almoço do Círio. O crescimento do bairro Umarizal causou mudanças na peregrinação ao longo dos anos. O aumento da especulação imobiliária, trazendo

para o bairro vários condomínios fechados, causou uma redução nas visitas. Principalmente por essa razão, os moradores desses locais fazem a própria peregrinação, com as orações feitas em um espaço comum do prédio, como o salão de recepções, sem a proximidade do grupo de peregrinações do bairro. "Hoje, já não é mais como era antes. A gente passava trinta, quarenta e cinco dias indo de casa em casa. Todo dia tinha casa para ir, hoje, já não tem mais", dizem os peregrinos.

Período prepara os devotos para a Grande Procissão A peregrinação de Nossa Senhora de Nazaré, em Belém, caminha para quatro décadas. Teve início em 1972, idealizada pelo padre Giovanni Incampo, que havia chegado a Belém há pouco e não conhecia o Círio de Nazaré. Até então, a Festa Nazarena se reduzia ao mês de outubro, com as procissões da Trasladação, do Círio e do Recírio, com novenas e pregações de religiosos entre uma procissão e outra.

A ideia das peregrinações surgiu a partir da necessidade de preparar as pessoas para o Círio, como afirma o padre Giovanni. "Não há nada de válido e valioso que não exija uma adequada preparação. Naquele ano, fez-se um mês de preparação para o Círio. E só na Paróquia de Nazaré, a Santinha, a imagem de Nossa Senhora, foi levada de casa em casa por um grupo já preparado e treinado", lembra o religioso.

De acordo com o padre Giovanni, cerca de trezentas imagens foram distribuídas naquela época. Hoje, são cerca de cinco mil e quinhentos kits, os quais contém a imagem de Nossa Senhora de Nazaré, o livro de peregrinações, os cartazes do Círio 2011 e uma Bíblia Sagrada. A peregrinação também abrange as instituições públicas e privadas que recebem a Santa em seus espaços. O religioso afirma que, mais

do que uma festa, o Círio tornou-se uma boa oportunidade para a evangelização dos próprios católicos. "Antigamente, não havia tantos prédios, é dificílimo penetrar nesses conjuntos, porque a fiscalização é severa. Ninguém pode entrar, além disso, no mesmo espaço, moram famílias de outras religiões que, por isso, são contra a imagem e a peregrinação", diz o padre reconhecendo as mudanças ocorridas ao longo do tempo.


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