Beira do Rio
4 - BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Outubro, 2009
Clube de Ciências á pensou aprender Biologia, Física, Química e Matemática participando de experimentos e pesquisas? Ou fazendo teatro? É exatamente assim que crianças e adolescentes sócio-mirins do Clube de Ciências da Universidade Federal do Pará aprendem. Criado em 1979, o Clube tem como objetivo promover o ensino e a aprendizagem de Ciências de uma forma diferente. Visitas a museus, gincanas e aulas práticas são só algumas das atividades realizadas por professores e alunos. As aulas acontecem aos sábados, pela manhã, na Campus do Guamá. Laís Faria da Costa tem oito anos e está na 3ª série, “eu gosto muito de estudar Ciências e estou adorando participar do Clube”, conta. Ela se tornou sócio-mirim este ano e, até agora, o que mais gostou de aprender foi sobre os planetas e a mata ciliar, que
Encarte especial da edição N. 76 • Outubro, 2009
Fotos Alexandre Moraes
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Venha ser sócio deste clube
é aquela que protege o rio da poluição e do deslizamento de terra. Com 30 anos de existência, cerca de quatro mil crianças e adolescentes já participaram das atividades do Clube de Ciências, segundo o professor Je-
sus Brabo, que coordena o projeto com o professor Cristhian Paixão. Hoje, o Clube tem 200 inscritos como sócio-mirins, entre oito e 17 anos. Paloma Santos da Rocha, de 12 anos, também é um deles. Ela está no Clube
há dois anos e conta como melhorou na escola depois de entrar para o Clube: “quando estudei a Doença de Chagas na escola, por exemplo, eu já tinha aprendido no Clube de Ciências. Isso me ajudou a tirar uma nota boa na matéria”.
Leia as histórias de outros pequenos pesquisadores
Coisa de criança Alexandre Moraes
Brincar, aprender, experimentar, errar e tentar outra vez. É assim que crianças e adolescentes estão descobrindo o mundo mágico da Ciência. Para homenagear os pequenos pesquisadores e despertar a curiosidade de quem ainda não faz parte desse grupo, o encarte traz alguns projetos desenvolvidos pela UFPA, especialmente, para essa turma.
Beatriz Ramos tem 10 anos e por causa do Clube de Ciências já pensa em ser médica ou bióloga. Ela está na 4ª série e se tornou sócio-mirim este ano. Até agora, o que ela mais gostou de aprender foi a plantar, “nós aprendemos a plantar e a cuidar das plantinhas no viveiro”, conta.
Emerson Souza tem 14 anos, está na 6ª série, na Escola São Judas Tadeu. Ele gosta de fazer pesquisas e experiências. “A gente estudou o gorgulho, o bichinho que dá nos grãos. E aprendemos que ele é um bioindicador da qualidade dos alimentos, pois é um sinal de que o alimento não está bom", ensina.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ Rua Augusto Corrêa n.1 - Belém/PA beiradorio@ufpa.br - www.ufpa.br Tel. (91) 3201-8036
Reitor: Carlos Edilson Maneschy, Vice-Reitor: Horácio Schneider, Pró-Reitor de Administração: Edson Ortiz de Matos, Pró-Reitor de Planejamento: Erick Nelo Pedreira, Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Marlene Rodrigues Medeiros Freitas, Pró-Reitor de Extensão: Fernando Arthur de Freitas Neves, Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Emmanuel Zagury Tourinho, Pró-Reitor de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: João Cauby de Almeida Júnior, Pró-Reitor de Relações Internacionais: Flávio Augusto Sidrim Nassar, Prefeito do Campus: Alemar Dias Rodrigues Júnior. Assessoria de Comunicação Institucional - JORNAL BEIRA DO RIO. Coordenação: Ana Carolina Pimenta, Edição: Rosyane Rodrigues, Textos: Suzana Lopes, Fotografia: Alexandre Moraes, Ilustração: Daniella Nunes, Secretaria: Isalu Mauler/Carlos Júnior/Gustavo Vieira, Beira on-line: Leandro Machado/ Leandro Gomes, Revisão: Júlia Lopes/ Karen Santos, Arte e Diagramação: Rafaela André/Omar Fonseca, Impressão: Gráfica UFPA.
Ilustração Daniella Nunes
• Quer fazer parte do Clube de Ciências? Basta ficar atento às inscrições, que acontecem todos os anos, no mês de fevereiro. Só precisa levar o comprovante de matrícula da sua escola e uma foto 3X4.
Aprenda com os Shipaya de onde veio o fogo. Pág.3
Ilustração Daniella Nunes
Gabriel Fonseca tem 10 anos e está na 4ª série, no Centro Educacional Santa Luzia. Ele quer ser professor de Matemática. No Clube de Ciências, gosta de participar dos inventos e do teatro de fantoches. E em casa, ainda ensina aos pais: “eu falo o que aprendo no Clube e eles aprendem também”, diz.
Quer medir a chuva que cai no seu quintal? Vá na Pág.2
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Quanta chuva chove na sua casa? Material
Fotos Acervo do Projeto
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rianças e jovens estão aprendendo a ser meteorologistas. A professora Maria Aurora Mota, da Faculdade de Meteorologia da UFPA, ensina meninos e meninas de 11 a 17 anos a construir o próprio pluviômetro. Mas o que é isso? Pluviômetro é um instrumento que mede a quantidade de chuva que cai na Terra. Um aparelho oficial custa mais de duzentos reais. Mas a professora Aurora inventou uma forma prática e bem mais barata de montar um. Com materiais como garrafa PET, tubo e torneira, ela ensina a fazer um pluviômetro gastando apenas trinta reais. Adolescentes de vários bairros de Belém já fizeram o seu e instalaram nas suas casas. Agora, todos os dias, às 7h da manhã, eles veem a quantidade de água que o pluviômetro recolheu. E anotam tudo: a hora da chuva, quanto tempo ficou chovendo, aparência do céu e outras informações. Uma vez por mês, eles se reúnem na UFPA para co-
- garrafa PET de 1 litro e meio - estilete e cola de tubo - tubo PVC de 10cm (diâmetro), 20cm (altura) - lixa 120 - presilha de 2cm de tubo PVC - redução de esgoto de 15cm para 10cm - registro de esfera - cola plástica - proveta para medir a quantidade de água
Como fazer locar todas as anotações no computador. Assim, também aprendem a usar programas e fazer gráficos. Com os dados que eles coletam, a professora Aurora Motta já conseguiu perceber quais os locais onde mais chove em Belém, “normalmente, são os lugares mais afastados do rio: Ananindeua e Marituba, porque as nuvens que se formam na beira do rio são levadas pelo vento para locais mais afastados”. Quem participa do projeto ainda tem uma van-
tagem: recebe uma bolsa mensal de Iniciação Científica (PIBIC Júnior). Com o dinheiro, os adolescentes podem investir nos estudos comprando livros e materiais didáticos. Agora, além dos estudantes de Belém, a professora também está ensinando alunos de outros municípios paraenses. Ao todo, são 30 crianças e jovens participando do projeto. A seguir, aprenda a fazer o seu pluviômetro. Antes de começar, peça ajuda para um adulto.
- Recorte o fundo da garrafa PET e, com a cola de tubo, prenda a maior parte da garrafa dentro do tubo PVC. Use a presilha para fixar melhor a garrafa. - Use a lixa para tirar as imperfeições dos cortes na garrafa e no tubo. Com a mesma cola, prenda a redução de esgoto ao tubo. - Na boca da garrafa, cole o registro de esfera (torneira), com cola plástica para não deixar a água vazar. - O pluviômetro está pronto! Instale o aparelho em local aberto e a 1,5 metro do chão. - Com a proveta, você vai medir a quantidade de água da chuva que o pluviômetro coletar.
Brinquedoteca
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rinquei de jogo da memória com o Davi, o Cláudio e o João. Participei do aniversário da boneca Rebeca com a Jaqueline. Algumas meninas pegaram os instrumentos médicos e cuidaram de mim. Tudo isso, sabe onde? Na brinquedoteca da Escola de Aplicação da Universidade Federal do Pará. Lá, 120 crianças, de 4 a 6 anos, da Educação Infantil aprendem brincando. Durante duas horas, toda semana, os alunos se divertem com os mais variados brinquedos. São carrinhos, quebra-cabeças, fantasias, fantoches, bonecas, jogos de cozinha e muito, muito mais. Com as crianças, a professora Solange Mochiutti ensina, aprende e também se diverte. Ela diz que a
Alexandre Moraes
Espaço de brincadeira e aprendizagem na Escola de Aplicação
brincadeira deve fazer parte da educação de qualquer criança e que a brinquedoteca é um espaço em que todos têm muito a aprender. Por exemplo, quando as meninas brincam de cozinhar, elas aprendem a trabalhar em equipe, dividir as tarefas e partilhar as comidas. Sem
contar com a velha lição: brincou, arrumou. Criada em 2002, a brinquedoteca da Escola de Aplicação teve os primeiros brinquedos doados por alunos, pais e funcionários da escola. Depois, a professora Solange conseguiu a ajuda da Universidade para
comprar mais objetos. E, hoje, o espaço está cheio de atrações, brincadeiras e as crianças, é claro, adoram! Davi, Cláudio e João dizem que a sua brincadeira favorita é o jogo da memória. Já o Diogo gosta de tocar teclado. “Eu gosto de ser super herói”, conta Luis, usando uma capa e uma máscara. O espaço apresenta várias opções de brincadeiras e, como diz a professora Solange, “não somos nós que dizemos o que elas têm que fazer. Elas podem escolher do que querem brincar, a qualquer momento”. Além disso, na brinquedoteca, elas convivem com os colegas, aprendem e criam as próprias regras, crescem fazendo aquilo de que mais gostam e o que melhor sabem fazer: brincar!
O fogo, os Shipaya e os perguntadores
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uando criança, somos perguntadores e importunamos os adultos indagando sem parar. Muitas vezes, ao perguntar o que é isso , meu pai, muito brincalhão, respondia: "é a língua dos perguntadores". Ficava furiosa! Mas, com cuidado, minha avó, exímia contadeira de histórias, respondia as minhas perguntas narrando histórias do(s) Marajó(s) para me distrair. Cresci ouvindo histórias, mas não sou uma contadora de histórias. Ao me tornar antropóloga, passei a ouvir narrativas intrigantes, grande parte delas, contadas pelos povos indígenas com quem convivo. Considero-as boas para iniciar uma conversa, essas que chamamos fiada ou que acreditamos jogar fora quando a correria do dia a dia permite. Agora, para comemorar o Dia das Crianças, venho a vocês contar histórias que, ao encantarem, nos transformam. É uma das muitas histórias do povo indígena Shipaya – também chamado Xipaya ou Chipaya – que vive, desde os tempos em que eu e você não éramos nascidos, às margens do Rio Xingu, por eles considerado sagrado, rio intocável, lindo, encachoeirado e cheio de mistérios. Hoje, os Xhipaya vivem na sede do município de Altamira, no Pará, pois foram sendo expulsos de suas terras e pouco podem usufruir do rio sagrado. Mas continuam na luta para evitar que o Xingu desapareça sob a ameaça de Belo Monte. Nos tempos antigos, os Shipaya, sentados à soleira (à frente) de suas casas, em noite de lua cheia, contavam aos curumins (crianças) como conseguiram o fogo. Você, eu e muitas outras pessoas não temos ideia de como surgiu o fogo, mas sempre nos intrigamos com
ele. Para os Xhipaya, o fogo foi tirado por eles de uma ave de rapina (uma poderosa águia) que o possuía e, por ser precioso, guardava-o cuidadosamente. Nós nem podemos nos pensar sem uma caixa de fósforos, quanto mais sem fogo! Um dos demiurgos (espécie de deus, criador do Universo, humano com poderes divinos) Xhipaya, de nome Kumaphari, fingiu morrer e apodrecer. Os urubus (aves que gostam de carniça – carne podre) devoraram seu cadáver, mas a águia havia colocado o fogo num lugar seguro. Então, o demiurgo, que, por ser divino, é imortal, finge novamente morrer e o faz disfarçado em cabrito (assim como se vestisse uma fantasia); mas o pássaro, desconfiado, não se deixa enganar. Kumaphari, finalmente, consegue se transformar em dois arbustos (árvores de pequeno porte), nos quais a águia resolve depositar o fogo. O demiurgo rapidamente pega o fogo e a águia, surpresa, consente em ensinar-lhe a
arte de produzir fogo por fricção. A história é genial e demonstra a sabedoria dos Shypaia. Entre nós, só os escoteiros e as bandeirantes sabem fazer fogo por fricção. Nós usamos fósforos. Se as caixinhas de fósforo não fossem conhecidas, entre nós, deveria haver alguém com poderes divinos – tipo super-herói – para tirar o fogo de quem nos nega o privilégio. Pensem comigo: quantas histórias nos foram contadas na tentativa de responder aos perguntadores, mas, hoje, os novos tempos fazem com que os adultos não mais contem histórias de forma teatral e, também, ficamos impacientes e usamos os recursos que temos – que não são poucos – sem pensar na origem do fogo, da água, pois temos ambos de maneira fácil. Para além da origem e ficando apenas na caixinha de fósforo, imaginem quantas utilidades ela tem. Um famoso sambista brasileiro que talvez você nem tenha conhecido, chamado Ciro Monteiro, se
Ilustração Daniella Nunes
Contação de histórias
Pluviômetro
imortalizou fazendo e cantando suas músicas a partir da batucada na pequena caixinha e, assim como o fogo dos Xhipaya, incendiava os salões. Pensem: o fogo incendeia, mas não queima na história dos indígenas. Mais um mistério da sabedoria dos Xhipaya! As histórias podem não mais nos convencer, mas são lindas e valem ser relembradas, especialmente, pelo esforço de fixar a compreensão do Cosmo (Universo) de todos nós. Contar histórias aproxima as pessoas e nos faz pensar na diversidade (diferenças que nos complementam) entre os povos, além de surpreender pela criatividade das invenções para distrair os perguntadores. Agora, lembrando minha avó, digo: quem quiser que conte outra e quem não souber, ouça e aprenda! Para agradar a criançada, Jane Felipe Beltrão aparece disfarçada em contadeira de histórias, mas, no cotidiano, é antropóloga e docente da UFPA.