OHNOGRAFIAS www.bethbarone.com.br “O trabalho é composto por fotografias do dançarino Yoshito Ohno, tiradas no final dos anos 90, durante uma apresentação de butoh, uma dança tradicional japonesa cuja maquiagem melancólica – com uma pintura branca sobre todo o corpo – procura esconder pele e pelos, tentando revelar as “formas da alma”. Segundo Solange Caldeiras, no butoh “a obra é uma espécie de moldura para a autocontemplação de um olhar que encara o vazio existencial. (…) É necessário luz para se ver o oculto, e este oculto está dentro de cada um”. As fotografias foram obtidas com uma câmera analógica, cuja película p&b (Tri-X da Kodak) foi utilizada em processo puxado e teve seu tempo de revelação significativamente aumentado. Como pode ser observado nas imagens, o altíssimo contraste que resultou desse procedimento retirou definitivamente qualquer vestígio da figura humana fotografada, resultando numa espécie de sombra branca. Existem referências na história da origem da pintura que mencionam o uso das mãos que, colocadas sobre uma parede, assoprando-se sobre elas um pó colorido, resultavam numa imagem de “um traço, uma transposição, o vestígio de uma mão desaparecida que estava ali (…) O resultado, imagem de um contorno por contato, aparece assim como uma sombra em negativo, figura em branco, em oco, esvaziada, pintura não pintada (…) obtida por subtração” . Na fotografia, esse padrão de trabalho, também obtido por subtração, aparece nas famosas Rayografias de Man Ray e nos Fotogramas de Moholy-Nagy, imagens obtidas sem câmeras, nas quais objetos são colocados sobre papel fotográfico (sensível à ação da luz) que, após ser sensibilizado e revelado resultam numa imagem branca (do objeto) sobre fundo preto. Em oposição aos exemplos citados, neste trabalho é a luz refletida oriunda da presença do referente que se inscreve sobre a película registrando o branco absoluto que nos remete diretamente às técnicas de subtração citadas. A foto que deveria atestar que o homem esteve lá, acaba por atestar sua ausência, pois ultrapassa seu referente, congelando-o nesse índice parcialmente autônomo que se move e tenta sair de cena pela representação sequencial executada no ato da tomada. Outra possível referência é o desenho de sombra, que também aparece em citações referentes à origem da pintura, na qual se usava um carvão para desenhar sobre a parede a sombra daquele que ali está e que logo não estará mais, restando apenas sua silhueta. “O desenho vem de certa forma arrancar a sombra ao tempo de seu referente para fixá-la e detê-la num tempo que lhe seja próprio (…) e corresponde finalmente a um grande fantasma” . Trata-se de uma técnica que – assim como a fotografia – necessita da presença da luz para existir.” Beth Barone.