“Incerto o pão na sua praia, só certa a morte no mar que os leva, eles partem. Da Vieira de Leiria vêm ao Ribatejo. Aqui labutam, alguns voltam ainda, ávidos de saudade do seu mar. Muitos ficam”. REVISTA FORUM AMBIENTE Directora Geral Sara Souto Directora Editorial Tânia Silva Diretor Comercial Tiago Folgado Diretor Administrativo - Financeiro
Tiago Folgado Directoras de Imagem Sara Souto e Tânia Silva Coordenadora Geral Tânia Silva
Este é um excerto de uma obra literária que descreve bem a vida dos Avieiros ou também chamados de «ciganos do Tejo» e porque falaremos neles na nossa revista como protagonistas, devemos “apresentar-vos” o grande autor que escreveu essa obra - Alves Redol. António Alves Redol nasceu em Vila Franca de Xira a 29 de Dezembro de 1911, e faleceu em Lisboa a 29 de Novembro de 1969. Redol foi considerado um dos expoentes máximos do neo-realismo português. A vida na infância influenciou muito a sua escrita. Redol nasceu e viveu num meio rural e pôde viver as dificuldades de um homem do campo. Desde muito cedo começou a trabalhar, influenciado pelo seu avô e pelas admirações aos jornalistas e escritores iniciouse no «mundo da escrita» aos 12 anos. Aos 14 anos colaborou na redacção de textos para semanários e jornais, inicialmente, como vendedor de mercearias. Aos 16 anos viaja para África e trabalha como operário numa fazenda mas decide regressar ao seu país.
Já em Portugal trabalha como vendedor de camiões, carros, pneus e óleos. Lecionou Língua Portuguesa e tornouse membro do Partido Comunista Português e do Movimento de Unidade Democrática, demonstrando-se assim um forte opositor à política da época. Alves Redol continuou a escrever e publicou diversas obras que demonstraram a perspectiva social, evidenciada pela abordagem de aspectos sociopolíticos e económicos, salientando a diversidade dos grupos sociais portugueses. Entre
as obras escritas por este autor, devemos destacar as que se remetem à nossa região do Ribatejo, mas também mais concretamente ao nosso concelho. Livros como “Avieiros” ou “Glória uma aldeia do Ribatejo” ilustram o quotidiano dos “nossos” antepassados.
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Alberto Caeiro
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O Tejo é o rio mais extenso da nossa Península Ibérica, nasce na Serra de Albarracim, em Espanha e desagua no oceano Atlântico, em Lisboa, sendo a sua bacia hidrográfica a terceira mais extensa da península Ibérica. Em Portugal, próximo de nós, encanta as paisagens de Ribeira de Santarém, Salvaterra de Magos, Vila Franca de Xira, Alverca do Ribatejo, Alcochete, Montijo e Lisboa. No seu estuário, na sua margem direita, encontra-se o porto de Lisboa totalizando uma bacia líquida de 32 mil hectares, o que lhe possibilita receber navios de qualquer porte, como os transoceânicos, mas também oferece condições a modalidades desportivas. A costa portuguesa, devido ao seu posicionamento, está no cruzamento das principais rotas do comércio internacional e na frente atlântica da Europa. Os terminais de cruzeiros situam-se relativamente próximos da zona central de Lisboa, levando a que aí atracam muitos paquetes de turismo . Na margem esquerda podemos observar uma bela reserva ecológica , na sua maioria um sapal, onde desovam muitas espécies de peixes, nidificam várias espécies de aves e se acomodam outras tantas de passagem, em migração. Dessa diversidade podemos incluir o flamingo.
Rio Tejo
Povoados diversos se desenvolveram nas suas margens. Sรฃo exemplo disso ao aldeias piscatรณrias dos concelhos de Salvaterra de Magos e do Cartaxo (mapa topogrรกfico da figura).
Mapa Topogrรกfico - 1/25000
A Importância do Tejo no Passado
O rio Tejo é um dos mais importantes rios que atravessa o território português chegando a ser uma grande via de comunicação demográfica e económica do país. Foi D. Dinis que, ao promover obras no rio, fundou Salvaterra de Magos e Muge, contribuindo assim para a navegação ao longo do Tejo. No século XVIII os transportes aquáticos eram os mais utilizados, tendo em conta a facilidade de transporte que levava a uma redução dos custos, à capacidade de transporte de cargas pesadas e à velocidade da movimentação, principalmente nos percursos de descida dos rio ou nos locais de maré que chega até Valada do Ribatejo, freguesia do concelho do Cartaxo. Durante séculos, os produtos provenientes das Beiras e das outras
regiões foram transportados para Lisboa, passando pelos portos de Abrantes e Constância, que desempenharam um papel importante na movimentação das mercadorias. O transporte de mercadorias por via fluvial viria a diminuir drasticamente a partir de finais do século XIX, primeiro com o aparecimento do caminho-de-ferro e, mais tarde, com a construção de estradas e da ponte em Vila Franca de Xira. Deste modo o Tejo perdeu importância como via de comunicação deixando de ser o responsável pelo desenvolvimento de áreas ribeirinhas. O rio Tejo foi um dos rios onde se criaram portos fluviais. Os habitantes das suas margens viviam da pesca, do comércio fluvial e da agricultura.
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Na aldeia de Porto Sabugueiro, localizada perto da vila de Muge com apenas 25 pessoas a residir, encontramos um antigo Avieiro - Jaime Rabita, o primeiro a estabelecer-se naquele local e também o mais velho que lá reside.
e umobter peixeum Lúcio com cercavivido de 5kgde como era ser avieiro Em entrevista a Jaime Jaime RabitaRabita podemos testemunho
Há quantos anos é pescador? o R: Fui pescador durante uns 15 anos, mas como rendia pouco, acabei por deixar a pesca e exerci outras profissões. Atualmente sou pedreiro.
Sempre viveu aqui? o R: Antes de me fixar cá, vivi no Escaroupim.
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De onde vieram antepassados?
os
seus
o R: O meu pai veio de Vieira de Leiria, a minha mãe era de cá, depois casaram e ficaram a viver cá.
Sabe quais foram os motivos que levaram os seus antepassados a sair de Vieira e Leiria e a rumar a este local? o R: O que eu sei é o que o meu pai me contava. Ele dizia que lá não havia muito trabalho e decidiram vir para aqui pescar. Como era a pesca na altura que a iniciou? o R: A pesca nessa altura era muito melhor, havia mais peixes e de melhor qualidade.
Que tipos de peixes existiam antigamente? o R: Antigamente existiam muitas fataças, salmão, barbo, sável e muitas enguias.
Quais os peixes desapareceram no Tejo?
que
o R: A enguia antigamente existia muita. Hoje em dia já é muito pouca, mas agora apareceu aqui dois novos tipos de peixe, a cravina e o lúcio.
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Quando pescava qual era o tipo de embarcação que usava? o R: Usava um barco de madeira a remos. Quanto tempo passava no rio? o R: Partia à tarde e, muitas vezes, passava lá a noite. Que mudanças pesca?
ocorreram
na
o R: A grande mudança foi principalmente nos barcos. Antigamente não tinham condições, eram a remos… Hoje estão muito melhores e mais rápidos, com os motores. Quando pescava os seus filhos iam consigo? E a sua esposa? o R: Os meus filhos não, ficavam sempre em casa. Já a minha mulher acompanhava-me na faina. Tinha de ser… um lançava as redes e outro remava. Geralmente era eu que lançava e puxava as redes pois tinha mais força.
FIM
Placa à entrada da Casa Típica Avieira
Para melhor entender a vida dos Avieiros, visitámos a casa modelo dos Avieiros, que se encontra na aldeia do Escaroupim. Esse modelo é a melhor representação de como eram as habitações da população, ainda num passado, e presente na memória das gentes ribeirinhas. Tivemos uma interessante visita guiada com a senhora Maria Rabita, a responsável pela casa modelo, e contámos com uma bela descrição de como era viver naquelas casas. Maria Rabita é filha de pais avieiros e viveu sempre perto do rio. Nasceu num barco, muito perto de Benfica do Ribatejo, onde morou com os seus avós maternos.
Representação dos trajes antigos
Srª Maria Rabita, a sua irmã Emília Letra e a repórter
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Casa modelo
A cozinha avieira
Pequena, feita de madeira, suportada por estacas e pintada de cores vivas, a casa dos avieiros destacava-se das restantes da região. Por dentro tinha pequenas divisões onde viviam enquanto não estavam no rio. Preparavam as refeições numa pequena lareira, num canto da cozinha, em pequenas panelas escurecidas pelo fumo. Na refeição, os elementos da família, reuniam-se em volta da mesa e sentavamse em pequenos bancos. A comida era colocada no centro, numa espécie de saladeira, e todos comiam em pratos de alumínio ou de esmalte decorados com ramagens. A água era servida em púcaros do mesmo material.
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Os quartos
Os quartos tinham janela e eram pintados de cores alegres. O das raparigas (à esquerda) era preferencialmente cor-de-rosa, enquanto o dos rapazes (à direita) passava pelos tons de azul celeste. Na decoração preferiam quadros com temas religiosos indicando a fé alojada nos seus corações. Fé, essa, tão necessária quando o rio deixava de ser companheiro e a ondulação e o vento levavam ao medo e ao desespero. As camas eram de ferro, pintadas das mesmas cores, e decoradas com colchas de “trapos”, inteiras ou de dois panos, tecidas em teares locais. No topo tinham um travesseiro, de algodão branco, bordado à mão.
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Instrumentos de Pesca
Rede de apanhar enguia e camarão
Nassa
O rio oferecia muita diversidade de peixe: sável, fataça, lampreia e enguia, entre muitos outros. Na pesca da enguia e do camarão, os pescadores, utilizavam redes próprias. Depois colocavam o pescado dentro de nassas que submergiam-no no rio para os manterem vivos e frescos. Ao chegarem a terra pesavam a pescaria numa balança decimal e, logo de seguida, a mulher avieira avançava para os povoados de Salvaterra de Magos, Marinhais e Muge. De canasta à cabeça, lá ia durante horas seguidas, para a venda, a sua fonte de rendimento.
Balança decimal
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