Rousseau e O Banqueiro Anarquista de Fernando Pessoa

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Manuel Vilaboa Cebreiro | Estudos Lusófonos III | 2017-2018

Rousseau e O Banqueiro Anarquista de Fernando Pessoa (Manuel Vilaboa Cebreiro) 1

Este breve artigo pretende mostrar que dentro do pensamento de O Banqueiro Anarquista (1922) de Fernando Pessoa, na propia personaxe do banqueiro, están presentes as ideas do prefacio do Discours sur l’inégalité et les fondements de l’inégalité parmi les hommes (Discurso sobre a desigualdade dos homes) de Jean-Jacques Rousseau, publicado en 1755. Veremos, como podemos trazar un paralelismo entre os dous textos e como é a interpretación desas ideas unha parte vital que o impulsa a ser un anarquista tan particular. O prefacio de Rousseau é a busca de como é a natureza do ser humano para poder entender como debe ser unha lei natural ‘verdadeira’. O banqueiro anarquista (o protagonista da obra) coida que é vital descifrar esa natureza do ser humano para entender por un lado como debe ser esa sociedade anarquista futura, onde está a orixe da tiranía, e por outro, máis importante, cal debe ser o seu papel para axudar a que se realice este destino. Estes dous obxectivos, paralelos, teñen un percorrido semellante para chegar ás súas conclusións, e os mesmos problemas. O principal problema para poder alcanzar esa imaxe do ser humano natural, no seu estado primitivo, é a súa propia historia. Todos os cambios na sociedade humana, o que se corresponde ás chamadas ficcións sociais no caso do banqueiro de Pessoa, fixeron tan irrecoñecible ese estado natural que resulta imposible alcanzalo dun modo certo.

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Graduação em Ciências da Linguagem e Estudos Literários, Estudos Lusófonos III – Literatura 1890-1974.


Manuel Vilaboa Cebreiro | Estudos Lusófonos III | 2017-2018

ROUSSEAU: PREFÁCIO

PESSOA: O BANQUEIRO ANARQUISTA

como conhecer a fonte da desigualdade entre os homens, se não se começar por conhecer os próprios homens? E como chegará o homem a se ver tal como o formou a natureza, através de todas essas transformações que a sucessão dos tempos e das coisas teve de produzir na sua constituição original, e a separar o que está no seu próprio natural do que as circunstâncias e o progresso acrescentaram ou modificaram em seu estado primitivo? Semelhante à estátua de Glauco, que o tempo, o mar e as tempestades tinham desfigurado tanto que se assemelhava menos a um deus do que a um animal feroz, a alma humana, alterada no seio da sociedade por mil causas sempre renascentes, pela aquisição de uma multidão de reconhecimentos e de erros, pelas mudanças verificadas na constituição dos corpos, e pelo choque contínuo das paixões, mudou por assim dizer de aparência, a ponto de ser quase irreconhecível, e nela só se encontra, em vez de um ser que age sempre por meio de princípios certos e invariáveis, em vez dessa celeste e majestosa simplicidade com a qual o seu autor a marcara, o disforme contraste da paixão que julga raciocinar e do entendimento em delírio.

O mal verdadeiro, o único mal, são as convenções e as ficções sociais, que se sobrepõem às realidades naturais — tudo, desde a família ao dinheiro, desde a religião ao Estado. A gente nasce homem ou mulher — quero dizer, nasce para ser, em adulto, homem ou mulher; não nasce, em boa justiça natural, nem para ser marido, nem para ser rico ou pobre, como também não nasce para ser católico ou protestante, ou português ou inglês. É todas estas coisas em virtude das ficções sociais. Ora essas ficções sociais são más por quê? Porque são ficções, porque não são naturais. [...+

O que há de mais cruel ainda é que, como todos os progressos da espécie humana a afastam sem cessar de seu estado primitivo, quanto mais acumulamos novos conhecimentos, tanto mais nos privamos dos meios de adquirir o mais importante de todos, o qual consiste, num certo sentido, em que à força de estudar o homem é que nos tornamos incapazes de o conhecer.

esta nossa tirania, se não era derivada das ficções sociais, também não era derivada das qualidades naturais; era derivada duma aplicação errada, duma perversão, das qualidades naturais. E essa perversão, de onde é que provinha?» «Tinha que provir de uma de duas coisas: ou de o homem ser naturalmente mau, e portanto todas as qualidades naturais serem naturalmente pervertidas; ou de uma perversão resultante da longa permanência da humanidade numa atmosfera de ficções sociais, todas elas criadoras de tirania, e tendente, portanto, a tornar já instintivamente tirânico o uso mais natural das qualidades mais naturais. Ora, destas duas hipóteses, qual é que seria a verdadeira? De um modo satisfatório — isto é, rigorosamente lógico ou científico — era impossível determinar. O raciocínio não pode entrar com o problema, porque ele é de ordem histórica, ou científica, e depende do conhecimento de fatos. Por seu lado, a ciência também nos não ajuda, porque, por mais longe que recuemos na história, encontramos sempre o homem vivendo sob um ou outro sistema de tirania social, e portanto sempre num estado que nos não permite averiguar como é o homem quando vive em circunstâncias pura e inteiramente naturais.

Os dous realizan un percorrido semellante e chegan á mesma conclusión: os cambios histórico-sociais dificultan coñecer este ser humano natural, incluso desde o plano da ciencia (Rousseau ve niso un problema máis).


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Os dous pensan que era nese estado de natureza en que os seres humanos son iguais entre si, libres; por iso é para os dous vital chegar a ese punto. E descartando o apoio científico, intentan, entón, explicar como se xerou a desigualdade (Rousseau) / tiranía (o Banqueiro de Pessoa). Aínda que os pasos entre a presentación do problema e as conclusións non sexan exactamente os mesmos si que chegan a un punto semellante. Para Rousseau son dous principios: creio perceber dois princípios anteriores à razão, um dos quais interessa ardentemente ao nosso bem-estar e à conservação de nós mesmos, e o outro nos inspira uma repugnância natural de ver morrer ou sofrer todo ser sensível, e principalmente os nossos semelhantes. (Rousseau, Prefácio)

O banqueiro anarquista de Pessoa alcanza dúas conclusións semellantes, inda que na realidade só unha lle parece intrínseca do ser humano: a do seu propio benestar. Debemos lembrar que Rousseau procuraba entender ese estado de natureza para adecuar a el a denominada “lei natural”, mentres que o banqueiro pessoano atopa nese home natural unha sorte de xustificación de ser banqueiro e anarquista. Por tanto, para o banqueiro o máis natural é ser egoísta e buscar o benestar propio: a mesma lógica que me mostra que um homem não nasce para ser casado, ou para ser português, ou para ser rico ou pobre, mostra-me também que ele não nasce para ser solidário, que ele não nasce senão para ser ele-próprio, e portanto o contrário de altruísta e solidário, e portanto exclusivamente egoísta. (Pessoa, O banqueiro anarquista)

Naturalmente, esta única “conducta natural” batería co seu ideal anarquista, por tanto prosegue reflexionando ata chegar a unha conclusión final que xa se asemella máis ós dous principios de Rousseau: Eu discuti a questão comigo mesmo. Repara tu, dizia eu para mim, que nascemos pertencentes à espécie humana, e que temos o dever de ser solidários com todos os homens. Mas a ideia de “dever” era natural? De onde é que vinha esta ideia de “dever”? Se esta ideia de dever me obrigava a sacrificar o meu bem-estar, a minha comodidade, o meu instinto de conservação e outros meus instintos naturais, em que divergia a ação dessa ideia da ação de qualquer ficção social, que produz em nós exatamente o mesmo efeito? Esta ideia de dever, isto de solidariedade humana; só podia considerar-se natural se trouxesse consigo uma compensação egoísta, porque então, embora em princípio contrariasse o egoísmo natural, se dava a esse egoísmo uma compensação, sempre, no fim de contas, o não contrariava. (Pessoa, O banqueiro anarquista)

Como vemos, finalmente, o banqueiro interpreta que hai unha xerarquía no comportamento natural, o primeiro é procurar o beneficio propio e o beneficio dos demais sempre que iso repercuta para ben no benestar propio. Así, o banqueiro constrúe a súa argumentación para xustificar ser banqueiro e anarquista. Por un lado non é natural a tiranía nin as ficcións sociais e, véndose incapaz de derrubalas, o que fai é procurar non crear tiranías novas ás que xa hai; polo outro si é natural buscar o benestar propio, o egoísmo, polo que non atopa contraditorio ser banqueiro. Que estes dous textos estean conectados dificilmente pode ser froito da casualidade, o prefacio ten unha extensión de apenas seis páxinas e boa parte del se pode colocar en paralelo á argumentación de O banqueiro anarquista.


Manuel Vilaboa Cebreiro | Estudos Lusófonos III | 2017-2018

O banqueiro de Pessoa dálle a ese espazo da reflexión sobre o home natural unha importancia vital na historia (se contamos as veces que sae a palabra “natural” dános un resultado de 44 aparicións; significativo tendo en conta que se trata dunha novela bastante breve). Así, non resulta estraño pensar que Pessoa tiña na súa mente esas palabras de Rousseau cando lle quixo dar forma a este noso banqueiro e anarquista.

NOTA: Enlace á versión traducida ó portugués do discurso de Rousseau: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cv000053.pdf


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