RIO GRANDE DO SUL
16 a 30 de abril de 2019 distribuição gratuita brasildefato.com.br
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Ano 1 | edição 13
Mordaça Governo de Eduardo Leite quer impedir gaúchos de decidirem sobre privatização de empresas públicas.
A AMEAÇA DO CARVÃO A extração de 166 milhões de toneladas de carvão põe sob risco mais de quatro milhões de moradores da Grande Porto Alegre. Para os ambientalistas, a abertura da Mina Guaíba, distante apenas 20 km da capital, comprometerá o ar que você respira e a água que bebe. Sem contar a agressão à natureza. É o Brasil apostando na energia suja e indo na contramão do mundo. TERRA | PAG 3, 4 e 5
GERAL | PAG 6
Futebol 10ª edição do Campeonato Estadual da Reforma Agrária reúne mais de 35 equipes de assentados em São Miguel das Missões. ESPORTES | PAG 8
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OPINIÃO
PORTO ALEGRE, 16 A 30 DE ABRIL DE 2019
ARTIGO | A letalidade de uma democracia sem cor
CHARGE | Santiago
Maister F. da Silva*
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O Dia da Vergonha
rês josés. Três joões. Três antonios. Nomes tão afeitos ao afeto, à memória, à cultura popular. Nomes que batizaram santos. E os sobrenomes? Silvas, Pereiras, Souzas. Muitos. E Dias, Costa, Rabelo, Santana. Todos imagináveis, singelos, caboclos, mestiços de sangue português, índio e negro. Todos, porém, desprezíveis aos olhos da polícia, quase sempre extensões dos senhores do chão e do chicote. No dia 17 de abril de 1996, os joões, josés e antonios e seus companheiros tiveram seus nomes e carnes trespassados pelas balas dos fuzis. Este 17 de abril marca o 23º aniversário daquele que pode ser considerado “O Dia da Vergonha Nacional”. Um dia de reflexão sobre um banho de sangue que – fosse em outro país mais justo e generoso – consagraria a data como de luto nacional. Vinte e um sem terra foram assassinados pela polícia militar em Eldorado dos Carajás/PA. As cenas da cha-
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cina deram a volta ao planeta, atestando o grau de selvageria no tratamento oficial dos pobres da terra no país continental que lhe nega terra. Mas a desonra vai além das mortes. Até porque, depois que os corações deixaram de pulsar e as pás cobriram os caixões, veio o julgamento. Que explicitou, novamente, o Brasil como uma nação brutal. Em que a desigualdade no acesso à terra se reproduz no acesso à justiça: dos 144 envolvidos no massacre, apenas dois foram responsabilizados. Um deles, mesmo condenado a 228 anos de prisão, somente se apresentou para cumprir pena em 2012. O que demonstra que, dependendo do acusado, a Justiça brasileira tanto pode deixar um assassino solto por anos a fio quanto, em velocidade recorde, jogar no fundo de uma masmorra quem não possui culpa alguma. É o que o Brasil, hoje mais do que nunca, continua mostrando ao mundo.
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CONSELHO EDITORIAL Danieli Cazarotto, Cedenir Oliveira, Fernando Fernandes, Ezequiela Scapini, Ronaldo Schaefer, Milton Viário, Frei Sérgio Görgen, Ênio Santos, Isnar Borges, Cláudio Augustin, Maister Silva, Miriam Cabreira, Fernando Maia, Jonas Tarcísio Reis, Rogério Ferraz, Adelto Rohr, Fábio Castro, Mariane Quadros, Carlos Alberto Alves, Daniel Damiani, Vito Giannotti (In Memoriam) | EDIÇÃO Katia Marko (DRT7969), Marcos Corbari (DRT16193), Ayrton Centeno (DRT3314) e Marcelo Ferreira (DRT16826) | REDAÇÃO NESTA EDIÇÃO Fabiana Reinholz, Ayrton Centeno, Katia Marko, Eduarda Schein e Marcelo Ferreira | DIAGRAMAÇÃO Marcelo Souza | DISTRIBUIÇÃO Alexandre Garcia | IMPRESSÃO Gazeta do Sul | TIRAGEM 25 mil exemplares
O povo negro é parte significativa dos trabalhadores subempregados. A liberdade veio acompanhada do confinamento nas periferias e guetos das grandes cidades.
A POIO
EDITORIAL |
um país como o Brasil, onde mais de 50% da população é considerada negra, a democracia racial precisa ser tratada de forma clara e objetiva: uma democracia que represente a transformação simultânea das relações raciais e de classe. A democracia só será realidade quando houver de fato igualdade racial e o povo negro não sofrer nenhuma espécie de discriminação, preconceito ou segregação, seja em termos de classe, seja em termos de raça. O povo negro é parte significativa dos trabalhadores subempregados. A liberdade veio acompanhada do confinamento nas periferias e guetos das grandes cidades. É também a parcela mais significativa dos pobres do campo, desprovidos de terra pra plantar, continuando sujeitos às piores condições de trabalho impostas pelo agronegócio “moderno”, que não raro lança mão do trabalho escravo para aferir maior lucratividade à sua lavoura. Ao negro
tudo foi proibido, na condição de livre lhe foi negado o direito ao estudo e a possibilidade de competir de forma igualitária aos melhores postos no mercado de trabalho. A violência que assola as comunidades periféricas tem cor e classe social. Quem mais morre pela letalidade do Estado são os jovens negros. A morte do músico Evaldo Rosa, atingido por 80 tiros desferidos pelo Exército Brasileiro no Rio de Janeiro, mobilizou as redes sociais e a opinião pública, no entanto, não sensibilizou as autoridades governamentais vigentes. Essa omissão torna claro que a violência dentro da lei, tal como era regida segundo os valores, preceitos e código moral da casa-grande, continua privilégio dos brancos ricos, ou seja, dos poderosos do país. Você, branco ou negro pobre, embevecido pelo decreto que facilita a posse de armas, não se engane: o privilégio da violência segue sendo patrimônio da elite. Justiça seja feita, muitas políticas públicas foram implementadas na busca por reparar tais crimes do Estado brasileiro para com o povo negro, sobretudo nos governos Lula e Dilma. Todavia, com os entraves que a elite impõe ao Estado, sem um rompimento drástico de paradigmas, não será possível eliminar as iniquidades econômicas, educacionais, culturais e políticas. Nossa democracia segue letal com os menos favorecidos e com contornos ainda mais obscuros nos dias de hoje.
*Militante do MPA e Acadêmico de Administração em Sistemas e Serviços de Saúde na UERGS
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AMBIENTE |
Quatro milhões de gaúchos sob risco
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Foto: Jornal Extra Classe
Uma nova ameaça ronda Porto Alegre e a região metropolitana. Chama-se Mina Guaíba e já está em processo de licenciamento ambiental. Atrás deste nome, existe a intenção de extrair 166 milhões de toneladas de carvão a partir de 2023. AYRTON CENTENO E KATIA MARKO
PORTO ALEGRE (RS)
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om para a economia, péssimo para a saúde humana e o meio-ambiente. Junto viria o comprometimento da qualidade do ar e da água, a destruição da natureza, a extinção de espécimes raros da fauna e da flora e a inviabilidade da agricultura orgânica do entorno composto por 34 municípios que somam 4,3 milhões de habitantes. É o que acontecerá se a população não reagir e o projeto vingar, segundo prevê o biólogo Paulo Brack, coordenador do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá). “Teríamos a contaminação química por metais pesados tóxicos (zinco, cobre, mercúrio, chumbo, cádmio, entre outros) além da turbidez maior dos cursos de água e particulados (poeira de minério de carvão) que afeta flora, fauna e saúde humana”, acentua. Fundado em 1999 por um grupo de biólogos para lutar pela biodiversidade, o InGá é a principal sigla envolvida na denúncia e no combate à abertura da mina em Charqueadas, distante 20 quilômetros do centro da capital gaúcha.
Extração de carvão no RS: impacto ambiental e social e ínfima geração de empregos.
Do outro lado, está a Copelmi Mineração, hoje o maior grupo privado na exploração do carvão no país. Que planeja operar a maior mina de carvão a céu aberto do Brasil, entre os municípios de Charqueadas e Eldorado do Sul. A princípio, os chineses do Zhejiang Energy integrariam a parceria, o que a Copelmi nega. Em nota, informa “que não tem nenhum sócio para a produção da Mina Guaíba”. Mil empregos diretos Na projeção da Copelmi, a nova planta gerará mil empregos diretos e cinco mil indiretos. Pela produção do minério, segundo a empresa, a União receberá, entre diversos tributos, cerca de R$ 140 milhões/ano. Calcula, ainda, que os dois municípios-sede, apenas com a mina, arrecadarão em Imposto Sobre Serviços (ISS) o equivalente a tudo que hoje arrecadam. O investimento, em termos de proteção ambiental, seria
de R$ 60 milhões, direcionado para gerenciar efluentes, monitorar ar e água, realizar compensação florestal e outras medidas. E prevê aplicar R$ 14 milhões/ano em manutenção e ampliação destes programas. “Uma mina à cerca de 15 a 20 km de Porto Alegre é algo impensável”, insiste Brack. Mas seria apenas o começo. Em um segundo momento, termelétricas e indústrias formariam um polo carboquímico em volta da mina para usar o car-
vão. O que resultaria, observa Brack, em poluição ainda maior. Outro ambientalista, Fernando Campos, do Amigos da Terra Brasil, ataca as “falsas promessas de geração de emprego” e o argumento de que se trata de um projeto de extração de carvão sustentável e de baixo impacto, “quando na verdade representa uma ameaça eminente de poluição do ar e da água, já que prevê uma mina a céu aberto às margens do rio Jacuí”.
Projeto prevê remoção do segundo maior assentamento produtor de arroz orgânico do estado Foto: Divulgação MST
A poluição que o vento traz "O uso do carvão mineral corresponde às formas mais agressivas do ponto de vista socioambiental, seja pela mineração e a consequente produção de energia ou pela indústria carboquímica”, ressalta o biólogo. Para quem tem ainda alguma dúvida, Brack sugere que vejam na internet as imagens das áreas degradadas na China, grande consumidora de carvão. “Centenas de trabalhos científicos tratam destes males que o grande setor econômico da mineração e da produção das térmicas a carvão tentam esconder”, critica. A contaminação aérea impactaria a capital inclusive seu centro e, de acordo com o InGá, nos dias de
predominância de vento sudoeste, avançaria para o Vale do Sinos, alcançando também Canoas, Sapucaia do Sul e Esteio. Sob ameaça direta estaria o rio Jacuí, que contribui com 84% da água do Guaíba e os parques do Delta do Jacuí e a Reserva da Biosfera da Mata Atlântica. Uma primeira audiência pública aconteceu em Charqueadas. Agora, um grupo de entidades ambientalistas ingressou com pedido de audiência publica em Porto Alegre e Eldorado do Sul. E pede que outros movimentos sociais, ambientais e lideranças políticas, do Estado e do país, se juntem à luta “para que esta calamidade do combustível do século passado não nos engula”.
No caminho da Mina Guaíba está o assentamento Apolônio de Carvalho, a segunda maior unidade produtora de arroz orgânico do estado depois de Viamão. São 72 famílias de agricultores, 700 hectares de cultivo de arroz, além da produção de hortaliças. O projeto prevê a remoção do assentamento. O impacto ainda se estende a três unidades de conservação e um loteamento urbano, o Guaíba City. Segundo o assentado Marcelo Lucas da Silva, produtor de arroz orgânico e um dos fundadores do assenta-
mento, as famílias pretendem resistir. “Somos contra o projeto, queremos permanecer na nossa terra, conquista do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Essa é uma área histórica do movimento. Quando ocupamos servia aos negócios escusos do traficante internacional Juan Carlos Ramirez Abadía. Vamos denunciar esse projeto nas feiras e nos espaços que participamos. Estamos abertos para o diálogo com a sociedade e vamos lutar junto com as entidades para evitar esse desastre”, salientou.
(Como a proteção da qualidade da água consumida por mais de quatro milhões de gaúchos está em jogo nesta questão, pedimos que a Corsan e o DMAE dessem sua opinião a respeito. Até o fechamento desta edição nenhum dos dois órgãos se manifestara)
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AMBIENTE | Um grupo de países já anunciou que vai banir o carvão de seus fornos. Acontecerá até 2030. Inglaterra, França, Itália, Canadá e México são alguns deles. AYRTON CENTENO
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PORTO ALEGRE (RS)
decisão foi anunciada na COP23, a conferência do clima organizada pela ONU em 2017. Entre os combustíveis fósseis, o carvão ainda ocupa o primeiro lugar entre as fontes de eletricidade no planeta. Porém, é a mais poluente de todas. É uma atitude que bate
O Brasil na contramão do mundo
de frente com as intenções de Donald Trump. Ele alega que a redução de gases que provocam o efeito estufa prejudica a indústria norte-americana. Baseado nisso, retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris. O Acordo – um pacto global contra as mudanças climáticas – estabelece regras que comprometem os países com a proteção ao ambiente natural. Na COP24, realizada em dezembro de 2018, na Polônia, o Brasil foi alvo de ataques. Não pela poluição associada ao carvão – que representa apenas 3,7% de sua matriz energética – mas pelos recuos no setor. Alinha-
Foto: Maia Rubim/Sul21
O carvão é a mais poluente das fontes de eletricidade no planeta
do a Trump, o governo Bolsonaro desistiu de sediar a COP25, que vai acontecer em novembro deste ano. O encontro, então, acontecerá no Chile.
Quando a reação popular derrota a poluição
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orregaard” até hoje é sinônimo de mau cheiro em Porto Alegre e arredores. É o resultado das emissões fétidas da empresa de mesmo nome que, vinda da Noruega, instalou-se em Guaíba, defronte à capital gaúcha, em 1972. “Borregaard” é também exemplo de como uma comunidade unida pode enfrentar e vencer a contaminação ambiental. A reação popular forçou a interdição e a venda da indústria. E ainda alimentou o surgimento do movimento ambientalista gaúcho então
o mais atuante do país. A Borregaard desembarcou no Brasil sob a fanfarra e o apoio oficial. Já em 1967, um decreto da ditadura, de número 60.803, considerava o projeto “de alto interesse nacional”. Tão alto que o Banco Regional de Desenvolvimento Econômico, o BRDE, entrou com 43% dos recursos do investimento de US$ 76 milhões. Começou a operar em 1972 liberando 3,5 toneladas/dia de componentes sulfurosos. Sob fogo cerrado da mídia – sobretudo do Correio do Povo, de Breno
Caldas – dos ecologistas, de parte dos políticos e com péssima imagem junto à população, suspendeu as operações por 100 dias em 1974 para tentar atenuar o problema. Voltou a operar sem uma solução e, em 1975, teve o controle acionário repassado ao consórcio Sulbrasileiro/Montepio da Família Militar. Com o tempo, os principais problemas foram solucionados. Trocou de mãos várias vezes e hoje é controlada por um grupo chileno sob o nome CMPC Celulose Riograndense Ltda.
Campeã do carvão, China agora quer ser “economia verde”
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ais de 1,1 milhão de chineses morrem anualmente devido a doenças associadas à poluição. E o principal agente da contaminação atmosférica é o carvão, base da indústria nacional. A China contribui com uma quarta parte das emissões globais de gases, sendo 85% gás carbônico. Usinas e indústrias consomem metade do carvão mineral do mundo. Mas isto está, lentamente, mudando. Após triplicar no começo do século, o consumo de carvão está em queda na China. As emissões de dióxido de enxofre e de óxido de nitrogênio devem cair 3% em 2019. O mesmo vale para a concentração de material
particulado fino (PM 2.5) que continua a diminuir. A mudança tem origem na decisão do estado chinês, em 2014, de combater a poluição e caminhar rumo a uma “economia verde”. Investiu em energia alternativa – o país é o maior fabricante mundial de painéis solares – e tornou-se grande mercado de carros elétricos. Fechou minas e fábricas, puniu gestores e empresários – inclusive com prisão – que não cumpriram suas metas, retirou das ruas milhares de veículos poluentes, implantou filtros de ar nas escolas, ampliou o monitoramento de forma que cada chinês através de um aplicativo, em qualquer canto do país, pode
monitorar no seu celular a qualidade do ar, minuto a minuto, na sua cidade. Nos últimos anos, Pequim deixou de frequentar o ranking das cidades campeãs mundiais de poluição atmosférica. Não figura nem mesmo entre as 100 primeiras. Entre as 20 mais poluídas da avaliação de 2018 há somente duas chinesas. As restantes pertencem à Índia, Paquistão e Bangladesh. A capital fechou as minas de carvão nos seus seis distritos, baixou seu consumo para sete milhões de toneladas/ano – eram 22 milhões em 2013 – e planeja eliminar de vez o uso do combustível também como fonte de aquecimento doméstico.
A guinada na posição ambientalista brasileira, sustentada ao longo de décadas e muitos governos, recebeu uma saraivada de críticas da opinião públi-
ca internacional. Os ataques vão desde a perda do protagonismo do Brasil na questão do clima até sua aliança interna com os desmatadores.
Ataque à saúde e ao ambiente
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carvão carrega consigo “uma enciclopédia de poluentes” adverte Paulo Brack em entrevista à repórter Catiana de Medeiros. Mestre em Botânica pela UFRGS, doutor em Ecologia e Recursos Naturais pela UFSCar, de São Carlos/SP, Brack é também ligado ao InGá - Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais. Suas respostas estão sintetizadas nos tópicos seguintes.
O impacto “Os impactos de uma mina de carvão são imensos à biodiversidade. Inicialmente, ocorre a necessidade de rebaixamento de lençol freático, desvio de cursos de água, intervenção em ecossistemas etc”.
A natureza “Os ambientes aquáticos seriam os mais afetados, primeiro pelo rebaixamento do lençol freático, em segundo lugar, pela elevada acidificação das águas (por métodos quase sempre ineficientes ligados à drenagem ácida da mina) que elimina a possibilidade de vida de vertebrados, como peixes, anfíbios, répteis, mamíferos e aves.”
Os metais pesados “Teríamos a contaminação química por metais pesados tóxicos (zinco, cobre, mercúrio, chumbo, cádmio, entre outros) além da turbidez maior dos cursos de água e particulados (poeira de minério de carvão) que afeta flora, fauna e saúde humana”.
Os alimentos “A agricultura, e em especial a agroecológica, que floresce em Eldorado do Sul e na região, seria profundamente afetada e ameaçada. Estamos lidando com impac-
tos socioambiental multifacetados”.
A água e o ar “As águas tornar-se-iam contaminadas, seja pela acidez acentuada e inevitável nos corpos hídricos, ou por metais pesados e sem chance de serem utilizadas à população, comprometendo também a qualidade do ar pela poeira decorrente dos rejeitos, das pilhas de carvão, dos gases tóxicos de enxofre, nitrogênio, monóxido de carbono, entre outros”.
A saúde “Estamos lidando com altíssimos riscos à saúde humana, inclusive desde a possibilidade de incremento de morte prematura de fetos ou bebês pelos contaminantes (metais pesados ou substâncias tóxicas) até aumento de doenças crônicas e morte prematura de adultos”.
Quem ganha “A sociedade deve ter em mente que, por trás da demanda de consumo energético sem limites, existe uma economia de mercado que não está preocupada com o uso racional de energia nem com limites aos negócios de sempre. Quanto mais mineração e energia utilizamos, mais as empresas lucram em cima disso”.
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PORTO ALEGRE, 16 A 30 DE ABRIL DE 2019
Mineração de metais pesados ameaça a Metade Sul Foto: Divulgação MAM
O impacto na mineração não ameaça apenas a Grande Porto Alegre. No Sul do Estado, dois projetos do setor põem em risco a sobrevivência de comunidades tradicionais e o ambiente natural. Estão localizados em Caçapava do Sul e em São José do Norte. FABIANA REINHOLZ PORTO ALEGRE
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m Caçapava do Sul, a iniciativa é da empresa Nexa Resources S.A, antiga Votorantim Metais Holding. A mina que deseja explorar está na região das Guaritas, distante apenas 800 metros do rio Camaquã, na divisa com o distrito de Palmas, pertencente a Bagé. Quer minerar zinco e cobre. Pecuária inviabilizada A cada hora, a mineradora da Nexa vai beber 150 metros cúbicos de água do Camaquã. É uma receita certa para seu assorea-
Moradores de São José do Norte se mobilizam contra mineradoras
mento e diminuição drástica do volume do caudal. Vai agravar a já precária situação dos municípios da bacia do Camaquã, que sofrem constantemente com estiagens. É o que aponta Marcia Colares, da Unidade de Proteção Ambiental (UPP) do Camaquã. Destaca que a região do Alto Cama-
hoje detentores de selo de certificação, em função de um projeto desenvolvido pela Associação pelo Desenvolvimento Sustentável do Alto Camaquã (ADAC), ficarão contaminados com chumbo e outros produtos tóxicos, tornando-se impróprios para o consumo.
No jogo de Bolsonaro
Poluição perpétua Além disso, os rejeitos serão depositados em pilhas a céu aberto, comprometendo a saúde e o meio ambiente de forma perpétua. Sujeitos a intempéries, serão transportados para o rio e daí espalhando-se pelos 28 municípios que formam a sua bacia do Camaquã, chegando à lagoa dos Patos e o oceano.
quã tem como base econômica a pecuária, desenvolvida de forma sustentável há séculos, através de técnicas não invasivas, atividade incompatível com a mineração. A criação de gado será inviabilizada com a mineração. Ela repara que produtos como carne, mel, leite, queijo, doces,
Foto: Reprodução Instagram
Mesmo sem ser aprovado, o projeto Caçapava do Sul já afeta a vida local. Bióloga da Fundação Universidade de Rio Grande (Furg), Jaqueline Durigon, comenta a chegada de forasteiros à comunidade, pressionando os produtores “para permitirem a prospecção de novas jazidas em suas terras”. Foto: Divulgação MAM
Ministro Ricardo Salles foi condenado por favorecimento a mineradoras
É só destruição Em São José do Norte, a empresa Rio Grande Mineração quer minerar titânio e zircônio na região de Retiro. Planeja explorar cerca de 600 mil toneladas de minerais pesados em uma faixa de terra de 30 quilômetros de extensão, entre a lagoa dos Patos e o Atlântico. O pescador e agricultor Dinar-
te Silva, quinta geração a nascer em Retiro, é um dos muitos moradores que, desde 2014, lutam contra o projeto. “A gente sabe que é só problema, só destruição. A mineradora vai destruir o nosso solo, tirar os nutrientes da terra. São as duas partes que ela afetará imediatamente, a agricultura e pesca”, argumenta.
Pesquisador do Observatório dos Conflitos Urbanos e Socioambientais do Extremo Sul do Brasil, Caio Floriano dos Santos, frisa que a história de vida do município está vinculada à água, seja para a agricultura, seja para a pesca. “O impacto sobre os pescadores artesanais não é levado em consideração no estudo de impacto ambiental”. Mesmo com os protestos de rua e o alerta do Ministério Público Federal, o Ibama concedeu licença prévia para a mineração. O MPF pediu a suspensão da licença do empreendimento. Mas a 2ª Vara Federal de Rio Grande negou a concessão de liminares nas duas ações civis públicas movidas contra o Ibama e a em-
presa RGM. No final de março, o MPF recorreu da decisão ao TRF da 4ª Região. Jaqueline enfatiza que o governo federal, para implantar seu projeto de mineração, está flexibilizando normas e procedimentos adotados no processo de licenciamento. Aponta forte pressão política sobre os órgãos de defesa ambiental, como o Ibama e as secretarias e fundações estaduais. Tudo se agravou ainda mais na gestão atual de Ricardo Salles. Ministro do Meio Ambiente nomeado por Jair Bolsonaro, Salles já foi condenado em primeira instância por favorecer empresas de mineração quando era secretário estadual do meio ambiente de São Paulo.
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Entidades defendem direito do povo opinar sobre privatizações
MOBILIZAÇÃO | Desde 28 de fevereiro, entidades sindicais do Rio Grande do Sul, juntamente com os servidores públicos estaduais, estão coletando assinaturas para apresentar na Assembleia Legislativa (AL-RS) dois projetos de decreto legislativo de iniciativa popular que visam a manutenção do plebiscito como condição para a privatização de empresas públicas.
Fotos: Divulgação
Foto: Catiana de Medeiros
EDUARDA SCHEIN
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o dia 2 de abril, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da AL-RS considerou como constitucional a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 272/2019, que foi idealizada pelo Governo Leite, e que retira da Constituição estadual a exigência da realização do plebiscito para a privatização das estatais dos setores de energia, Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Companhia Riograndense de Mineração (CRM) e Sulgás – Companhia de Gás do RS. Correndo contra o tempo, a oposição ao governo Eduardo Leite se articula para tentar barrar a Proposta de Emenda Constitucional. A estratégia é buscar as 70 mil assinaturas para consolidar um projeto de decreto legislativo por emenda po-
O Teatro Dante Barone da Assembleia Legislativa ficou lotado no dia 18 de março para o ato em defesa da manutenção do plebiscito
pular, o que trancaria a pauta do governo. O número é o mínimo exigido por lei: um por cento do eleitorado gaúcho. Outro requisito é que a coleta ocorra em 50 municípios e que, em cada um deles, 0,5% do eleitorado assine. De acordo com o presidente da Associação dos Funcionários Públicos em Defesa das Estatais e do Patrimônio Público (ADEFERS), Fabrício Cavalheiro, 60 municípios atingiram a meta exigida. Segundo Cavalheiro, a criação do projeto de iniciativa popular surgiu como resposta à busca jurídica por um meio que pudesse impossibilitar a retirada da Constituição Estadual a exigência da realização de um plebiscito para decidir sobre a privatização de empresas estatais. “O governador Eduardo Leite segue no mesmo projeto de desmonte do Governo Sartori. A atitude antidemocrática do Governo do Estado está rasgando a constituição, por isso buscamos, através destes projetos, barrar esse crime contra a população gaúcha”, afirma. Conforme a coordenadora da Comissão de Serviços Públicos da Assembleia Legislativa, Ariane Leitão, o cálculo é que a votação a respeito da retirada do plebiscito chegue ao plenário dia 23 de abril. Antes disso, porém, dois relatórios referentes ao assunto tramitam nas comissões de Finanças e Serviços Públicos.
Frente em Defesa das Estatais Servidores das estatais miradas pelo governo também se mobilizam. Oito entidades sindicais formam a Frente em Defesa das Estatais e dos Serviços Públicos, criada ainda sob a gestão Sartori, que já objetivava a federalização ou venda das empresas. Em documento elaborado para contrapor o projeto do Executivo, a Frente argumenta que a solução para as finanças do Rio Grande do Sul está no combate à sonegação e na revisão das renúncias e isenções fiscais. Só em relação à primeira, a estimativa é de que quase R$ 3 bilhões deixaram de ser arrecadados este ano. Além de expor os números, servidores e demais envolvidos também apostam em ações junto à população, como caminhadas com placas reivindicando o plebiscito e mordaça simbólica em monumentos, representando a tentativa de silenciamento do posicionamento popular. Para a presidente do Sindicato dos Eletricitários do Rio Grande do Sul, Ana Maria Spadari, a intenção de revogar o que prevê a Constituição Estadual demonstra que o governo teme derrota. Conforme o Senergisul, vereadores de 37 municípios enviaram moções de repúdio à revogação do
plebiscito. “Inclusive do partido do governador. Da base aliada.” As Câmaras de Vereadores de Carazinho e São Lourenço do Sul devem enviar ofício ao governador manifestando a contrariedade à PEC de retirada do plebiscito. No município da região Sul do Estado, a moção de repúdio foi aprovada por unanimidade. Pela Constituição Estadual, é prevista a necessidade de plebiscito em caso de alienação, transferência do controle acionário, extinção, fusão, incorporação ou cisão de sociedades de empresas públicas.
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CULTURA & LAZER
HUMOR
HORÓSCOPO ÁRIES (21/3 A 20/4) Preste atenção nos mínimos detalhes. Você fica mais assertivo quando consegue concentrar-se no agora, não é momento para imprudências. A atual conjuntura do país te exige responsabilidade.
TOURO (21/4 A 20/5) Quando entrar em algum debate, procure não colocar emoção. Mais do que nunca é necessário ser racional, e isto não impede você de se colocar no lugar do outro, inclusive ajuda.
GÊMEOS (21/5 A 20/6) Este é um momento ideal para você aprender a diferença entre esperteza e sabedoria. Os horizontes se expandem, mas você só conseguirá avançar se obtiver foco. Lembre-se que a saída é coletiva.
CÂNCER (21/6 A 22/7) Você conseguira ficar mais feliz nos próximos dias somente se deixar o seu ego de lado. Lembre-se que crises são vias de mão dupla: há riscos e conveniências. Utilize seu poder criativo.
LEÃO (23/7 A 22/8) Sua visão organizativa está muito nítida, é momento de ajudar a construir processos coletivos. Tenha iniciativa. Você tem grandes chances de se destacar, pois entende que o tempo de fazer é agora.
VIRGEM (23/8 A 22/9) A vida é um grande espiral. Muitas vezes, passamos muito próximos do ponto que almejamos, mas é preciso dar mais algumas voltas para realmente chegar nele. Tenha paciência e autoconfiança.
LIBRA (23/9 A 22/10) É como se você estive na primavera da sua vida. Lembre-se de aproveitar os momentos e conecta-se consigo mesmo para que sua inspiração e criatividade o levem a enxergar o ciclo vivo.
ESCORPIÃO (23/10 A 21/11)
GRAFAR
Para encontrar sua paz de espírito é necessário sobriedade e bom senso para entender as mudanças que vêm. Utilize o charme que você conjura neste momento com inteligência e sagacidade.
SAGITÁRIO (22/11 A 21/12)
TIRINHA | Rango
Não seja ridículo. Seu temperamento e suas ideias inspiram a todos em sua volta, isto não é segredo, mas é preciso ser na dose certa. No atual momento é necessário ser o mais assertivo (a) possível.
CAPRICÓRNIO (22/12 A 20/1) É chegada a hora de perceber que as tarefas se tornam mais fáceis quando sabemos delega-las aos outros. Para isto, é preciso muita habilidade e paciência, nem todos têm o seu ritmo organizativo.
AQUÁRIO (21/1 A 19/2) Entenda que quanto mais atenção você dá para os problemas, mais eles aumentam. É momento de planejamento e de ação. Cultive seu senso diplomático e mediador que tudo se resolve.
TIRINHA | Armandinho (Alexandre Beck)
PEIXES (20/2 A 20/3) Adaptação é sua palavra de ordem. Esteja desperto para entender o que se passa a sua volta. É um pequeno paradoxo, você só conseguirá mudar algo quando aceitá-lo e entende-lo. A gentileza é sempre bem-vinda. Mateus Além Pisciano, jornalista, comunicador popular e militante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Tem mais facilidade em guardar o mapa astral do que o nome das pessoas.
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A bola vai rolar no campo da reforma agrária FUTEBOL |
A 10ª edição do Campeonato Estadual da Reforma Agrária reúne mais de 35 equipes de assentados em São Miguel das Missões. MARCELO FERREIRA
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PORTO ALEGRE (RS)
dia a dia nos assentamentos da Reforma Agrária é feito de trabalho, produção agroecológica e também de futebol. O esporte mais amado pelos brasileiros e brasileiras tem potência de luta e faz parte da vida do MST no Rio Grande do Sul, que anualmente realiza o Campeonato Estadual da Reforma Agrária. Em sua 10ª edição, neste ano o evento será promovido no Assentamento da Barra, em São Miguel das Missões, nos dias 27 e 28 de abril. Cerca de 500 atletas assentados e acampados de todas as regiões do estado participam do torneio de futebol sete nas categorias feminino livre, masculino livre, veteranos e sub-15. Já são mais de 35 equipes confirmadas para esta que é a fase final da competição. Desde agosto de 2018, as regionais vêm realizan-
Fotos: Letícia Stasiak
do suas fases preliminares para enviar um time por categoria para disputar os troféus. “É um momento de integração de companheiras e companheiros que têm o mesmo objetivo, a luta pela Reforma Agrária e por uma alimentação saudável, com a finalidade de ser espaço de produção e também de lazer e bem-estar”, afirma a assentada Cassiane Borges Mayca, que é da comissão organizadora do Assentamento da Barra. “Aqui estamos na expectativa. Além dos jogos, vamos ter exposição e comercialização da produção do assentamento, como artesanato, panificação, doces, tudo feito agroecologicamente”, conclui.
A última edição do torneio em Hulha Negra já contou com as categorias feminino livre, masculino livre, veteranos e sub-15
e não puderam mais se ver e celebrarem conquistas”. A disputa passa primeiro pela fase de chaves, na qual as equipes jogam entre si. Depois vem o mata-mata até a grande final em cada uma das modalidades. “O sorteio das chaves vai ser no dia 25 de abril, tudo direitinho. Para se ter uma ideia, contratamos árbitros com registro para apitar os jogos”, explica Piovesan. O campeão, segundo e terceiro colocado, em cada uma das quatro categorias, levam medalhas e troféus para seus assentamentos. Também são premiadas as equipes de melhor disciplina, defesa menos vazada e os goleadores.
Levado a sério O encontro esportivo promove cultura, celebração e resistência, e é levado a sério pelos atletas. Daniel Piovesan, da comissão organizadora da Coceargs, conta: “Muito esperado, o dia de campeonato tem mística, ato político, festa e muito futebol. Oportunidade para as famílias conhecerem a realidade das demais regiões, reencontrarem amigos que se forjaram na luta
Cerca de 500 atletas assentados e acampados de todas as regiões do estado participam do torneio
TABELINHA GRENAL
Uma grande festa Para receber tanta gente, uma grande estrutura está sendo montada no Assentamento da Barra, com cozinhas coletivas, área para barracas, banheiros, áreas de lazer, ciranda para as crianças, bocha e feira da produção. Estão previstos mística e ato político com a presença de membros
Internacional
Grêmio
24/04 – 21:30 – Libertadores Alianza Lima X Internacional
23/04 – 19:15 – Libertadores Libertad X Grêmio
27/04 – 19:00 – Brasileirão Chapecoense X Internacional
28/04 – 11:00 – Brasileirão Grêmio X Santos
do assentamento anfitrião, autoridades da região e direção do movimento. Na noite de sábado, tem o tradicional baile da Reforma Agrária. No domingo tem churrasco coletivo, os jogos finais e a premiação. “São mais de 70
pessoas envolvidas na organização do campeonato para fazer uma festa bonita! O assentamento tem uma forte relação com a sociedade, já temos a presença confirmada de autoridades e pessoas do município”, informa Mayca.
Torneio itinerante O primeiro campeonato aconteceu em 1996 no município de Júlio de Castilhos, somente na categoria masculino. Anos depois, em 2009, foi retomado já com as categorias masculino, feminino e veterano em Tupanciretã e, em 2010, Piratini, ganhando periodicidade. Em 2012, seguiu anualmente por Charqueadas, Candiota, Santana do Livramento, Joia, Viamão. Na última edição, em Hulha Negra, foi incorporado o sub-15 e, hoje, “o campeonato é sucesso principalmente entre a gurizada, que não precisa mais esperar ter idade para participar. É a juventude, inclusive, que mais se envolve na organização”, declara Piovesan.