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Fukushima
Até onde podemos ir? Se pensarmos que o dano ambiental, normalmente, é órfão de causa, desprovido de culpa, resulta de uma actividade lícita e não tem, muitas vezes, reparação, são estas catástrofes que nos fazem perguntar, até onde podemos ir… Nos últimos anos, as grandes catástrofes ambientais tiveram origem em duas “fontes” de energia: petróleo e nuclear. Desde Seveso (Itália), em Julho de 1976, até Fukushima (Japão), em curso, a lista de catástrofes ecológicas é, infelizmente, extensa. Aos políticos, compete perceber que Ambiente e Energia têm, necessariamente, de ser tratados, de forma integrada, como um todo. Aos juristas, compete perguntar a quem cabe a reparação do dano ambiental se uma catástrofe destas acontecesse em Portugal. Com a entrada em vigor do DL 147/2008 de 29 de Julho, que transpõe para a Directiva Comunitária 2004/35/CE, no ordenamento jurídico português, o Ambiente passou a gozar de dois regimes de responsabilidade civil extracontratual – a responsabilidade civil decorrente da funcionalização do instituto geral da responsabilidade civil extracontratual, previsto nos artigos 489 e ss do Código Civil e o regime específico da responsabilidade ambiental. A verdade é que o legislador comunitário, consciente da dificuldade na determinação e na prova da culpa e do nexo de causalidade, objectivou estes dois pressupostos do clássico instituto. Com vista a satisfazer a necessidade de prevenção e de reparação do dano ambiental, prescinde-se da culpa, da ilicitude e do nexo de causalidade adequada, bastando a probabilidade de causa. Consagra-se um novo equilíbrio entre o interesse geral de protecção do AmbienO agregador da advocacia
“A lista de catástrofes ecológicas é extensa. Aos políticos, compete perceber que Ambiente e que Energia têm de ser tratados, de forma integrada, como um todo. Aos juristas, compete perguntar a quem cabe a reparação do dano ambiental se uma catástrofe destas acontecesse em Portugal”
“Segundo a teoria do risco integral, o poluidor, na perspectiva de uma sociedade solidária, tem de contribuir para a reparação do dano ambiental. O poluidor assume todo o risco que a sua actividade acarreta”
te e o interesse individual dos agentes económicos. Por outro lado, além da consagração da responsabilidade objectiva é a própria definição de dano ambiental que passa a ser objectivada na Lei. Nelson Nery Junior, num artigo sobre a responsabilidade civil por dano ecológico, exemplifica: “Ainda que a indústria tenha tomado todas as precauções para evitar acidentes danosos ao meio ambiente, se, por exemplo, explode um reactor controlador da emissão de agentes químicos poluidores (caso fortuito), subsiste o dever de indemnizar. Do mesmo modo que, se por um facto da Natureza ocorrer derramamento de substância tóxica existente no depósito de uma indústria (força maior), pelo simples facto de existir a actividade há o dever de indemnizar.” O legislador não foi tão longe mas, perante Fukushima, há que perguntar quem deve assumir o risco. Segundo a teoria do risco integral, o poluidor, na perspectiva de uma sociedade solidária, tem de contribuir para a reparação do dano ambiental. O poluidor assume todo o risco que a sua actividade acarreta: o simples facto de existir a actividade produz o dever de reparar, uma vez provada a conexão causal entre a dita actividade e o dano dela advindo. Segundo este sistema, só haverá exoneração de responsabilidade, quando: a) o risco não foi criado; b) o dano não existiu; c) o dano não tem relação de causalidade com a actividade da qual emergiu o risco.
Ivone Rocha Sócia JPAB. Licenciada em Direito em Coimbra (89) fez mestrado em Direito Público na Católica do Porto (2008)
Parece demais, talvez! Mas o certo é que se pensarmos que o dano ambiental, normalmente, é órfão de causa, desprovido de culpa, resulta de uma actividade lícita e não tem, muitas vezes, reparação, são estas catástrofes que nos fazem perguntar até onde podemos ir… Maio de 2011
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