www.briefing.pt
Epica 2010
Eduardo Cintra Torres redaccaobriefing@briefing.pt
A publicidade como cultura Não sendo atribuídos aos reclames por proporcionarem os maiores aumentos das vendas, o que hoje é medido com algum rigor, os prémios permitem esquecer por momentos o carácter industrial e de grande concorrência da publicidade e das empresas anunciadas para se centrarem no carácter cultural da actividade
Se a publicidade serve em primeiro lugar a função de ajudar a vender, os prémios para os melhores anúncios do ano destacam a criatividade e promovem a reputação das empresas premiadas. Não sendo atribuídos aos reclames por proporcionarem os maiores aumentos das vendas, o que hoje é medido com algum rigor, os prémios permitem esquecer por momentos o carácter industrial e de grande concorrência da publicidade e das empresas anunciadas para se 22
Dezembro de 2010
centrarem no carácter cultural da actividade. Os prémios internacionais Epica, em cujo júri participei em representação do Briefing, visaram distinguir os anúncios com melhores qualidades estéticas. Já na sua 24ª edição, os Epica pretendem distinguir a excelência numa actividade voraz, marcada pelo efémero e pelo esquecimento. Na verdade, o que caracteriza a publicidade no mundo real é que-
rer substituir a publicidade anterior, fazê-la esquecer. Os anúncios, por natureza, dizem-nos “agora é assim, o passado não interessa”. E, no entanto, votamos nos melhores e recordamos os melhores, em livros e programas de TV porque, enquanto actividade cultural, a publicidade contraria a volatilidade do consumismo que a obriga a ser efémera. Por exemplo, no caso das campanhas de publicidade e marketing na internet a concurso nos Epica, os
concorrentes enviaram informação acerca dos aumentos de vendas, os milhões de contactos na internet ou a notoriedade obtida com as campanhas, mas não demoveram o júri, que preferiu votar na originalidade. O júri dos Epica, muito representativo e variado, foi constituído este ano por pessoas indicadas por 34 publicações da imprensa especializada no marketing e publicidade de 27 países. A imprensa portuguesa esteve representada pelo Briefing. DuO agregador do marketing.
www.briefing.pt
rante três dias, o júri observou e votou electronicamente nos anúncios ou campanhas a concurso, podendo debater sempre que necessário. O meu voto, em geral, coincidiu com o da maioria na escolha do melhor em cada um dos grandes prémios atribuídos. A minha principal dúvida relacionou-se com o prémio de melhor filme, atribuído a um vídeo promovendo o telemóvel-câmara N8 da Nokia. O pequeno filme de animação mostra as aventuras de uma menina que é perseguida, ultrapassa obstáculos, até transformar os perseguidores num cobertor e adormecer debaixo dele. Terminado o filme, o anúncio mostra ter sido feito com o tal Nokia. Trata-se de uma animação realizada com o N8 em cima de uma mesa, com materiais que qualquer um tem em casa. Apesar de primoroso na concepção e realização, o anúncio não parecia anúncio, isto é, não ficou claro para mim que tenha tido vida social enquanto objecto publicitário. Pareceu-me feito para ganhar prémios em concursos como este e não para convencer consumidores a comprarem o produto mostrado. Por isso, achei injusto que ele fosse comparado com spots que passaram realmente em televisão, “confrontando-se” com os consumidores e com a concorrência em media legítimos. Foi o caso de uma campanha francesa de Orangina, muito original e ousada no conceito, ao mostrar, não as suas qualidades como bebida, mas inventando situações cómicas no absurdo total, com animais usando Orangina como after-shave, produto de limpeza, etc. para passar a mensagem de que a bebida se poder tomar em qualquer lugar a qualquer hora. Algumas das campanhas concorrentes perturbaram a minha concepção do que deve ser a comunicação comercial no espaço mediático. Actualmente, é crescente o recurso pela publicidade, não identificada como tal, às redes sociais e até à informação noticiosa dos media jornalísticos. Uma campanha do Ikea na Suécia usou o Facebook para noticiar a abertura de uma nova loja, criando o perfil do director da loja que supostamente comunicava com O agregador do marketing.
Epica 2010
“O que caracteriza a publicidade no mundo real é querer substituir a publicidade anterior, fazê-la esquecer. Os anúncios, por natureza, dizem-nos ‘agora é assim, o passado não interessa’. E, no entanto, votamos nos melhores e recordamos os melhores, em livros e programas de TV, porque, enquanto actividade cultural, a publicidade contraria a volatilidade do consumismo que a obriga a ser efémera”
os seus “amigos” na rede. E uma campanha de uma seguradora eslovaca inventou uma unidade “terrorista” anónima (a própria seguradora foi anónima durante a primeira fase da campanha) que supostamente agia contra os condutores irresponsáveis nas ruas e nas estradas, assim obtendo ampla cobertura nos media noticiosos e na internet. Julgo que a mistura entre publicidade, perfis em redes sociais, e jornalismo acabará a prazo por ser negativa para a comunicação comercial, para as redes sociais (já hoje invadidas por marcas, empresas, instituições e produtos) e em especial para o jornalismo, quando se torna indiferenciado do marketing.
VENCEDORES
Franceses ganharam 69 prémios A França foi a grande vencedora dos prémios Epica 2010, com 69 prémios num total de 331, incluindo os 21 primeiros lugares e um Epica de Ouro. Muito próximos entre si, ficaram depois a Suécia, com 55 prémios, o Reino Unido, com 50 (incluindo três Epica de Ouro) e a Alemanha, com 49. Bastante distanciadas, a Suíça, a Holanda e a Itália arrecadaram 12, 10 e oito prémios, respectivamente. Se dos maiores países se espera tradicionalmente um grande número de participações e de prémios, surpreende a Suécia, um país médio, com campanhas criativas e bemhumoradas que mereceram o segundo lugar no total de prémios. Para esse lugar no pódio contribuiu a empresa Forsman & Bodenfors que arrecadou 15 prémios, o top deste ano, dos quais quatro primeiros lugares. Em termos de primeiros prémios, a França obteve 21, ou um terço do total, o Reino Unido 14 e a Suécia oito. Para Portugal vieram apenas dois dos 331 prémios: um terceiro lugar para o filme Mr Pink, anunciando o Festival Queer Gay, apresentado pela Fuel Euro RSCG na categoria Recreation & Leisure, e outro terceiro lugar para o site Tyrannybook, da Amnistia Internacional - Portugal, apresentado pela Leo Burnett Iberia na categoria Consumer Internet Sites - Non Durables. Concorreram 530 empresas, com 3155 entradas, representando 48 países. Receberam prémios empresas de 31 países. Além dos já mencionados, foram atribuídos grandes prémios a concorrentes da Turquia (três), e Finlândia, Noruega, Eslováquia, Ucrânia, Bélgica, Polónia, África do Sul e Egipto (todos com um). Além dos grandes prémios, ou primeiros lugares, o júri votou quatro Epica de Ouro que foram entregues a vencedores do Reino Unido e de França. Na categoria Filme, o Epica de Ouro foi atribuído a Dot, anunciando o modelo Nokia N8, apresentado por Aardman Animations (RU). O Epica de Ouro de Imprensa foi para M&C Saatchi, também do Reino Unido, pela campanha The Last Place You Want to Go, da Dixons online. A campanha de publicidade exterior Red, do Fred & Farid Group para a Wrangler (França), ganhou o Epica de Ouro na categoria Poster. O Epica de Ouro na categoria Interactiva foi atribuído à aplicação para iPhone criada pela Brothers and Sisters Creative (RU) para o Museu de Londres. Além da já referida empresa sueca, de Gotemburgo, as empresas mais premiadas foram: Serviceplan Gruppe (Munique e Hamburgo), com 14 prémios; DDB Stockholm, com 12; Publicis Conseil (Paris), com 10; Marcel (Paris), DDB London e Grabarz & Partner (Hamburgo), todas com nove. A rede com mais prémios foi a Y&R, com oito prémios, seguida da DDB, da Ogilvy, da TBWA e da Publicis, todas com quatro.
Dezembro de 2010
23