Advocatus, Nº5

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Director: João Teives

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Director Editorial: Jorge Fiel

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Mensal

Ano I

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N.º 5

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Agosto de 2010

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www.advocatus.pt Pedro Pérez-Llorca não tem dúvidas

“Boa altura para arriscar” O sócio-director da Pérez-Llorca Abogados está convencido de que a crise veio criar uma grande janela de oportunidades: “Todos os dias assistimos à inauguração de novas áreas de prática em escritórios. O mercado jurídico está efervescente, há bons clientes para angariar. Esta é uma boa altura para arriscar e abrir uma nova firma de advogados”

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A anatomia de um rumor

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15 euros

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CM O BCP tornou-se um caso único onde as contas de Facebook foram MY mais activas que as do banco. O CY rumor da falência propagou-se em três dias nos murais das redes e, por pouco, CMY foi possível impedir uma corrida de levantamentos. K O boato visto à lupa por Rodrigo Moita de Deus (NextPower), Filipe Mayer (Carlos Cruz & Associados) e Gonçalo da Cunha Ferreira (Garrigues)

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José Pedro Aguiar-Branco entra na polémica

“Estado deve ser mais rigoroso nos cursos” Pág. 33

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Director-geral João David Nunes jdn@briefing.pt Director João Teives joao.teives-14761l@advogados.oa.pt Director Editorial Jorge Fiel jf@briefing.pt Editor online António Barradinhas ab@briefing.pt

Destaques Entrevista

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TESTEMUNHO

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PASSEIO PÚBLICO

No Direito Aéreo, mas com os pés na terra

Carlos Neves de Almeida, director jurídico da Groundforce, é um franco defensor da assessoria jurídica interna, pelo menos numa empresa tão complexa e específica como a sua. A racionalidade de custos é um dos argumentos. O outro é a eficácia. “Dificilmente os escritórios de advogados tendem a investir no desenvolvimento de competências em ramos tão específicos como o Direito Aéreo”, explica

Ela é eléctrica e gosta dos espanhóis

Directora de Marketing Maria Luís Telf. 925 606 107 ml@briefing.pt Distribuição por assinatura Preço: 180€ (12 edições; oferta de voucher Odisseias) assinaturas@briefing.pt Tiragem média mensal: 2.500 ex. Depósito legal: 308847/10 N.º registo erc 125859 Editora Enzima Amarela - Edições, Lda Av. Infante D. Henrique, 333H, 44 1800-282 Lisboa Tel. 218 504 060 Fax: 210 435 935 advocatus@briefing.pt www.advocatus.pt Impressão: Sogapal, Rua Mário Castelhano, Queluz de Baixo 2730-120 Barcarena

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Cresceu entre os livros de Direito das bibliotecas dos avôs, ambos juristas e enveredou pela advocacia dado o gosto pela leitura. Sempre quis ser advogada. Foi monitora na Clássica e adjunta na Secretaria de Estado da Habitação até se tornar uma das maiores especialistas do país em energia. O retrato à la minuta de Mónica Carneiro Pacheco, sócia da Rui Pena, Arnaut & Associados, que gosta imenso dos espanhóis “Identifico-me imenso com a maneira de ser deles. São muito eficientes” e acha que “se as pessoas trabalharem efectivamente durante o tempo que passam no escritório, dá perfeitamente para conjugar tudo”

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ELEIÇÕES

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ESTADO DA ARTE

As três primeiras declarações de voto

Miguel Costa Marques não tem dúvidas: Marinho e Pinto foi o melhor bastonário de sempre. José de Sousa Macedo acredita que Fernando Fragoso Marques prima pela discrição e o aprumo. Carlos Aguiar garante que Luís Filipe Carvalho vai ser um primeiro entre Iguais de uma excelente equipa. As três primeiras declarações de apoio aos três candidatos a Bastonário, que o Advocatus vai publicar até às eleições

Eles deitam o Fisco no seu divã

Sua Excelência o Fisco, apreciado por cinco especialistas: Miguel Teixeira de Abreu (Abreu), Carlos Pinto de Abreu (presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem), Tiago Alcoforado Calhau (Cuatrecasas), Rogério Alves (ABBC) e João Espanha (Espanha e Associados). Um dossiê para ler e guardar Agosto de 2010

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Entrevista Cortar a direito

João Teives Director Advocatus

Condenados ao silêncio O futebol não pode ser uma ilha ou fortaleza inexpugnável alheia ao Direito. E para prová-lo está aí o crescente interesse e estudo que tem sido devotado, por insignes juristas, ao ramo do Direito do Desporto O crescimento exponencial do futebol profissional tem levado à compressão de direitos fundamentais, por vezes de forma claramente ilegal, injustificada e arbitrária. Recordemo-nos, a título de exemplo, da aplicação de uma sanção disciplinar de três meses de suspensão ao presidente do Futebol Clube do Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa, por este ter prestado declarações à Comunicação Social enquanto suspenso de funções. De acordo com tal interpretação da Comissão Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), a aplicação de uma sanção acessória de suspensão do exercício de funções, seja de treinador, seja de dirigente desportivo, implicaria a impossibilidade do mesmo conceder entrevistas a meios de Comunicação Social, participar em seminários ou aniversários de outros clubes ou até, pasme-se, declarar que iria recorrer da decisão que o suspendia. Esta interpretação aberrante e draconiana do artigo 33.º

do Regulamento Disciplinar que, recorde-se, apenas inabilita o dirigente das funções de representação no âmbito das competições desportivas e das relações oficiais com a LPFP e a Federação Portuguesa de Futebol (FPF), constituiu um violento ataque ao direito fundamental de liberdade de expressão. Tal interpretação não viria, felizmente, a ser sufragada pelo Conselho de Justiça da FPF (ver processo 33/CJ-09/10/ FPF), que absolveu o arguido do processo. Mais do que o caso em concreto, no que ele tem de extraordinário e anormal, importa perscrutar as razões de fundo que justificam tal raciocínio. Ora, tenho para mim que, afastando a “clubite”, tal advém de duas ordens de razões. Uma delas é a de que a protecção do negócio/ indústria futebol gera a necessidade de o isolar e autonomizar das demais regras do nosso ordenamento jurídico. Ouvimos discursar continuamente sobre a especificidade do futebol, estatutos de excepção, restrições

“As declarações de Paulo Bento talvez pequem um pouco por excesso, mas não deixam de ser belas peças de oratória”

fortíssimas no acesso aos meios de jurisdição comuns e, mais recentemente, a defesa de criação de um Tribunal Arbitral do Desporto para fazer face à ineficácia e total falência do poder judicial estatal. Tal especificidade, que não se nega, também é sentida ontologicamente por todos os seus intervenientes, incluindo os sócios e adeptos dos clubes, o que nos leva ao segundo fundamento. O futebol não só é um mundo à parte, como é sentido por todos como uma ordem autónoma e diferenciada, com regras e princípios próprios. E, assim, parece-nos estranho, por exemplo, que um jogador, árbitro ou dirigente intente uma acção por injúrias, difamação ou ofensa à integridade física decorrentes do próprio jogo. Faz parte das regras do próprio espectáculo “and the show must go on”. Também por isso me custa a compreender a ânsia compressora e limitadora da liberdade de expressão dos intervenientes do futebol e que até é contrária à nossa cultura

PORTRAIT OF JENNIE

Os forties e a força imanente dos retratos Os anos 40 de Hollywood representam o expoente máximo do classicismo. Ao contrário de outras décadas, os filmes dos forties não nos parecem hoje datados. Têm a intemporalidade característica dos clássicos. Um dos expoentes máximos dessa década prodigiosa é um filme de William Dieterle, de 1948, Portrait of Jennie, com Jennifer Jones e Joseph Cotten, produzido por David O. Selznick. Ao contrário de tantos outros, onde o quadro gerava a ilusão e a acção (v.g. Rebecca, Alfred Hitchcock, 1940; Laura, Otto Preminger, 1944; The woman in the window, Fritz Lang, 1944; The Ghost and Mrs. Muir, Mankiewicz, 1947, entre outros), aqui dá-se precisamente o contrário, a

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ilusão gera o quadro quando aqueles “big sad eyes” de Jennie (Jones) encontram e inspiram o amargurado Adams (Cotten) a pintar a sua obra-prima. Filme pleno de sombras e de luz, num preto e branco com alguma influência do expressionismo alemão (Dieterle era mais um imigrante alemão em Hollywood e havia trabalhado, como actor, no Faust, de Murnau), impressiona, ainda hoje, pelo seu experimentalismo. Muitas cenas são rodadas com a pigmentação granulada própria dos quadros, a última bobine foi tingida a verde (até à cena no Farol) e a castanho, sendo a cena final, que mostra o quadro no MOMA, num portentoso Tecnicolor, não existindo genérico inicial

(o início do filme é marcado pela voz off “and now The Portrait of Jennie…”. O quadro deste filme imensamente onírico e poético (“Beauty is truth, truth beauty, That is all ye know on earth, and all ye need to know”, citação de Keats no início do filme) foi pintado por Robert Brackman, tendo como modelo a própria Jennifer Jones. Uma última nota para o facto do grande director de Fotografia Joseph H. August ter falecido durante a rodagem, no próprio set. August fazia parte da grande família fordiana, tendo filmado 12 filmes com o grande mestre, entre os quais The Informer (1935) e They were Expendable (1945). Portrait of Jennie está editado em DVD.

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latina. Alguma polémica também alimenta o espectáculo. Confesso que, para além do caso Pinto da Costa, recordei-me, ao escrever este artigo, das palavras, que sempre me pareceram sábias, do antigo treinador do meu clube, Paulo Jorge Gomes Bento, proferidas em momentos imediatamente posteriores aos encontros com o arqui-rival, um para o campeonato, na Luz, em que o fiscal de linha deu indicação de grande penalidade a favor do Sporting Clube de Portugal que o árbitro não assinalou, e outro na famosa final da Taça da Liga, onde foi assinalada uma grande penalidade inexistente por indicação de um árbitro auxiliar que se encontrava a mais de cinquenta metros de distância. As declarações, proferidas após aqueles encontros, a quente, valeram-lhe duas penas de suspensão e multa, o que, naquele tempo, me pareceu uma afronta ao valor supremo da Justiça e da Liberdade de Expressão. Nunca concordei com aqueles que consideravam Paulo Bento monocórdico ou de discurso vazio. Bem pelo contrário, o seu discurso sempre foi claro, preciso e muito incisivo no exercício do seu direito de crítica. Tenho que reconhecer que, lidas a frio, aquelas declarações talvez pequem um pouco por excesso, mostrando-se adequadas as sanções aplicadas face aos regulamentos em vigor, mas não deixam de ser belas peças de oratória. Certo é que a emotividade do desporto-rei tem, muitas vezes, de ser sinónimo de alguma irracionalidade no discurso e não é proibindo, à priori, as palavras dos intervenientes, numa espécie de cultura cega de lápis azul, que o mesmo sairá enriquecido. Enfim, diatribes à parte, o futebol não pode ser uma ilha ou fortaleza inexpugnável alheia ao Direito. E para prová-lo está aí o crescente interesse e estudo que tem sido devotado, por insignes juristas, ao ramo do Direito do Desporto. Na próxima edição, colocando as paixões clubísticas de lado, se é que isso é possível, e já com o pontapé de saída do próximo campeonato, o Advocatus dedicará um dossiê ao Futebol, com a colaboração preciosa dos Colegas Francisco Pimentel, Alexandre Mestre e Francisco Raposo Magalhães. O novo agregador da advocacia

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Entrevista

Tatiana Canas Jornalista tc@briefing.pt

Pedro Pérez-Llorca, sócio-director da Pérez-Llorca Abogados

José Cardigos

“Honorários vão ter de baixar”

“Os honorários vão ter de baixar. Os clientes estão a passar por dificuldades financeiras porque as empresas estão a gerar menos lucros. Uma redução de preços cobrados, correspondente à contracção da procura, com a consequente redução de prémios (e é a primeira vez que me recordo deste fenómeno na advocacia), parece-me coerente. Faz sentido”, afirma Pedro Pérez-Llorca, sócio-director da Pérez-Llorca Abogados, eleita pela Chambers a firma ibérica do ano 2006.

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Advocatus | Quando afirma que o mercado jurídico se está a virar cada vez mais para a realidade interna, refere-se ao caso espanhol em particular, ou ao de todos os estados-membros da UE? Pedro Pérez-Llorca | Definitivamente, em Espanha é o que está a acontecer, mas penso que é também uma tendência de todos os nossos pares europeus. O interesse dos investidores estrangeiros está a reduzir-se e as empresas que mais apostam no mercado interno são as nacionais. As operações de fusões e aquisições (M&A) estão pouco activas. Hoje em dia, os departamentos que mais facturam são os que assessoram as empresas espanhoO novo agregador da advocacia


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las a nível do Contencioso, Laboral ou Fiscal. Daí a afirmação de que o mercado se está a virar para o nível doméstico: por um lado, porque os clientes espanhóis estão a aumentar; por outro, porque as áreas de Direito mais em voga são internas e não internacionais. Advocatus | Em relação às firmas de advogados espanholas, quais são os principais desafios que enfrentam com a crise? PPL | As firmas espanholas tomaram consciência de que é necessário sacrificar a rentabilidade em prol da coesão interna das sociedades. Talvez as firmas anglo-saxónicas tenham sido mais realistas, ao manterem os níveis de rentabilidade, preterindo — por vezes — a dimensão.

Entrevista

“As firmas espanholas tomaram consciência de que é necessário sacrificar a rentabilidade em prol da coesão interna das sociedades. Talvez as firmas anglo-saxónicas tenham sido mais realistas, ao manterem os níveis de rentabilidade, preterindo - por vezes a dimensão”

Advocatus | Em Portugal, há dois meses, a Linklaters fez um corte equivalente a 20% dos seus colaboradores. Pensa que vamos assistir a movimentos semelhantes um pouco por toda a Europa? PPL | Pelo que sei, muitas firmas anglo-saxónicas seguem essa estratégia nas suas filiais europeias, criando um novo conceito de spin off que dantes significava fusão/aquisição de uma nova sociedade. Actualmente, este termo aplica-se ao encerramento de escritórios. As firmas anglo-saxónicas fecham as suas filiais, dando como justificação um spin off na estratégia da empresa. O fenómeno que referiu, da Linklaters em Lisboa, não é único, nem quanto à Linklaters, nem em relação a Portugal. Penso que as firmas anglo-saxónicas estão a enfrentar a crise económica com muito maior realismo do que as europeias, através de uma política de redução de recursos humanos muito agressiva. Advocatus | Na sua opinião, qual é a estratégia mais correcta: a anglo-saxónica ou a europeia-continental? PPL | A questão coloca-se em saber se, ao manter os lucros da firma num curto prazo ao invés de apostar no seu crescimento orgânico está, de facto, a beneficiá-la. Não sei qual é a resposta correcta. Mas sei o que a minha firma está a fazer – continu-

“As firmas anglo-saxónicas estão a enfrentar a crise económica com muito maior realismo do que as europeias, através de uma política de redução de recursos humanos muito agressiva”

amos a apostar no seu crescimento orgânico, o que significa que reduzimos as margens de rentabilidade. E há bastantes escritórios de grande dimensão, quer portugueses, como espanhóis, que estão a seguir a mesma estratégia que a Pérez-Llorca. Advocatus | Qual é o objectivo com esse plano? Porque, por enquanto, e durante um período indefinido, estão a perder dinheiro... PPL | Reduzir as margens de lucro não é a mesma coisa que perder dinheiro. E aquelas têm de adaptar-se aos níveis de procura do mercado. Se a procura é menor, os lucros são mais reduzidos. Olhando para a nossa carteira de clientes, isso é muito claro – construir uma firma de advogados e mantê-la dentro de padrões de excelência constantes não é fácil. Uma vez atingido esse patamar, é-nos impensável perder os clientes angariados. Advocatus | Qual a tendência das sociedades de advogados no futuro? As grandes firmas vão continuar a existir, ou as boutiques especializadas tendem a ganhar terreno? PPL | Na minha opinião, um advogado muito bom tem sempre lugar em qualquer tipo de estrutura, seja num grande escritório ou numa pequena boutique. Não acho que as firmas com maior sucesso no futuro sejam boutiques. Alguns clientes podem gostar de trabalhar com firmas especializadas num determinado ramo de Direito, mas a maioria gosta de ser assessorada por um escritório cuja dimensão lhe permita ter capacidade para responder a desafios multidisciplinares, e só uma firma de grandes dimensões consegue alocar recursos humanos de qualidade para responder a estas questões num registo permanente. Não digo que não haja lugar para as boutiques, mas as grandes sociedades terão sempre maior procura.

“Os honorários cobrados têm de baixar. Os clientes estão a passar por dificuldades financeiras porque as empresas estão a gerar menos lucros, a situação é óbvia para todos. Uma redução de preços cobrados, correspondente à contracção da procura, com a consequente redução de prémios (e é a primeira vez que me recordo deste fenómeno na advocacia), parece-me coerente. Faz sentido”

Advocatus | E quais são os departamentos mais lucrativos actualmente? PPL | Essa questão é muito clara – pessoalmente, a minha especialidade é Direito Financeiro, M&A e >>>

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Entrevista

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Mercados de Capitais. Foi assim que comecei a minha carreira, e era este o sector da moda, até há poucos anos. Agora, os advogados mais famosos em Madrid são os de Contencioso, os que tratam de Resolução de Conflitos e dos de Direito Comercial focados em insolvências. A crise veio alterar por completo a estrutura das operações jurídicas, bem como as áreas do Direito em voga. Contencioso sempre foi um ramo muito estável, nunca conheceu picos de solicitações como agora. M&A era uma área de grandes operações, que – dada a conjuntura económica – está pouco activa. Contencioso, Direito Regulatório e Insolvências são os três grandes ramos que a crise trouxe para a ribalta em Espanha.

“Construir uma firma de advogados e mantê-la dentro de padrões de excelência constantes não é fácil. Uma vez atingido esse patamar, é-nos impensável perder os clientes angariados”

Advocatus | Existem departamento jurídicos que sejam menos necessários, nesta época? PPL | M&A e Imobiliário são dois exemplos de áreas que já conheceram “anos de ouro”, e cuja actividade agora abrandou bastante por causa da crise. Qualquer firma tem de estar preparada para isto – consoante a evolução do mercado, assim as áreas que vão ter maior procura. Advocatus | E como se gerem advogados especializados nestas áreas dentro de um grande escritório, se as suas potencialidades não podem ser aproveitadas dada a conjuntura? PPL | Um advogado de Imobiliário é, realmente, um advogado de transações (Comercial), que faz M&A com uma forte componente imobiliária. Um advogado que trabalhe no financiamento de operações imobiliárias durante muitos anos não tem hoje qualquer dificuldade em adaptar-se a operações de reestruturação. Porque é isso que os clientes estão a fazer actualmente. É só uma questão de reorientação das operações, a área de prática mantém-se. Há 10 anos era um advogado que lidava com operações online. Actualmente, ninguém faz isso. As pessoas têm de se adaptar à evolução dos tempos e os advogados não são uma excepção. 8

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Advocatus | Quando afirma que as tendências na advocacia se alteraram em Espanha até em relação aos clientes, em que está a pensar? Renegociação de honorários? PPL | Passámos, sem dúvida, a um reajustamento nos preços. Tivemos de baixá-los. É a nova tendência. Mas é normal, a procura de advogados em M&A ou Imobiliário, há três anos atrás, era imensa. Actualmente, é muito menor, o que – segundo as leis normais, da procura e da oferta – significa que os honorários cobrados têm de baixar. Os clientes estão a passar por dificuldades financeiras porque as empresas estão a gerar menos lucros, a situação é óbvia para todos. Uma redução de preços cobrados, correspondente à contracção da procura, com a consequente redução de prémios (e é a primeira vez que me recordo deste fenómeno na advocacia), parece-me coerente. Faz sentido. Advocatus | Existe algum critério-base de redução dos honorários entre as principais firmas de advogados espanholas? PPL | Não, cada uma tem a sua própria fórmula. Até porque não existe uma solução única que satisfaça todos os clientes. As suas necessidades são diferentes. É na forma como a resposta aos seus problemas é dada que se têm de adaptar as soluções. Alguns clientes querem funcionar por avenças (um preço fixo mensal), outros preferem orientar-se segundo uma estimativa feita pelos escritórios. Outras alternativas de fixação de honorários podem passar

por caps (determinação de “tectos” quanto ao preço cobrado no final) ou na anexação de uma “quota litis” (que em Portugal é proibida pela Ordem dos Advogados, mas em Espanha passou a ser permitida, e consiste num prémio associado ao sucesso que a assessoria jurídica tenha). O importante é dar ao cliente o que ele quer, em termos de qualidade do serviço e de flexibilidade na oferta. Advocatus | De que forma advogados e respectivas firmas conseguem, actualmente, ser inovadores quanto à angariação de novos clientes? PPL | Se a procura por serviços jurídicos do mercado é menor e os clientes têm menos liquidez, a manterem-se os elevados níveis de oferta dada a quantidade de players na advocacia, torna-se maior a receptividade dos clientes a soluções inovadoras. Creio que a crise veio criar uma grande janela de oportunidades, todos os dias assistimos à inauguração de novas áreas de prática em escritórios, novas sociedades têm sido inauguradas e prosseguem a sua actividade com sucesso (também em Lisboa), o mercado jurídico está efervescente. Advocatus | Vê, efectivamente, boas condições para as firmas florescerem com sucesso no mercado ibérico hoje em dia? PPL | Há bons profissionais no mercado, há bons clientes para angariar. Esta é uma boa altura para arriscar e abrir uma nova firma de advogados.

BI

Da Uría a Firma Ibérica 2006 “Um advogado muito bom tem sempre lugar em qualquer tipo de estrutura, seja num grande escritório ou numa pequena boutique”

Pedro Pérez-Llorca nasceu em Madrid, em 1968. Licenciado em Direito pela UNED, também na capital espanhola, em 1992, sempre exerceu a profissão de advogado. Começando a sua carreira na multinacional Uría Menéndez, mais tarde Pedro Pérez-Llorca fundou uma firma própria, juntamente com o pai. Actualmente, o advogado é sócio-director da Pérez-Llorca Abogados, escritório que recebeu, em 2006, o prémio de “Firma Ibérica do Ano” pela Chambers. Casado, tem duas filhas.

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Olivier Martinez


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Tendências

Com o mercado doméstico à beira da saturação, para poderem continuar a crescer, os escritórios de advogados optam pela internacionalização —“Um processo complexo, propenso a riscos e incertezas, a avanços e recuos”, como nota Rui Amendoeira, da Miranda, a mais internacional das sociedades portuguesas—, privilegiando na geografia da sua expansão os países lusófonos, que além da língua e cultura comum têm ordenamentos jurídicos semelhantes

Gettyimages

Crescer em português

PLMJ

Vieira de Almeida & Associados

Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados

A internacionalização das firmas portuguesas para os PALOP tem-se revelado uma boa válvula de escape para os escritórios cujo crescimento no mercado interno já se encontra saturado. Angola e Brasil são os destinos de eleição, mas Cabo Verde, Moçambique, Guiné e Macau também se começam a popularizar (ver mapa). Rui Amendoeira, sócio-partner da Miranda Correia Amendoeira & Associados (Miranda), traça 10

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Abreu Advogados

Miranda

um paralelismo com a linguagem informática para explicar a internacionalização das sociedades de advogados: “É um processo complexo, propenso a riscos e incertezas, a avanços e recuos”. Por isso, o responsável pela firma portuguesa com maior vocação internacional deixa um conselho: “Será prudente começar pelos mercados que nos são mais familiares, quer na língua, quer na cultura”. Esta seria

Franco Caiado Guerreiro & Associados

a versão “1.0”. A fase seguinte, apelidada de “2.0”, consiste na expansão “para mercados fora do espaço lusófono”, continua Rui Amendoeira, explicando que “esta constituirá a verdadeira internacionalização, na medida em que exige a capacidade para operar em ambientes estranhos ao da sua matriz”. A Miranda está, desde o mês passado, a implementar esta segunda fase, com a abertura de esO novo agregador da advocacia


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Tendências

“Será prudente começar pelos mercados que nos são mais familiares, quer na língua, quer na cultura”

“No Brasil e restante América Latina temos uma sociedade best friend em cada jurisdição”

Rui Amendoeira

Frederico Pereira Coutinho

Fernando Resina da Silva

Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em 1991, no ano seguinte o advogado tirou uma pós-graduação em Direito Comercial Internacional, na mesma academia. Com a sua prática jurídica focada no sector energético, mais especificamente, no Petróleo e Gás, o sócio-partner da Miranda Correia Amendoeira & Associados (Miranda), o advogado é também um dos principais envolvidos nos projectos de internacionalização da firma, cujo principal destino são os PALOP

Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em 1987, o especialista foi docente de Direito Internacional Privado na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa entre 1988 e 1989, tendo – simultaneamente – sido assessor jurídico do Fundo de Turismo. Sócio na área de Fusões e Aquisições, Frederico Pereira Coutinho é membro da International Bar Association (IBA) e membro da Direcção do Instituto das Sociedades de Advogados (ISA)

Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em 1986. O advogado iniciou a sua carreira na Vieira de Almeida & Associados (VdA), tendo depois sido sócio da Perry da Câmara & Resina da Silva – Sociedade de Advogados e da PMBGR – Pena, Machete, Botelho Moniz, Nobre Guedes, Ruiz & Associados – Sociedade de Advogados. Resina da Silva reintegrou a Vieira de Almeida & Associados em 2001, onde exerce na área das TMT - Telecomunicações, Media e Tecnologias de Informação (TI)

Miranda

critórios no Congo e no Gabão. Também para a PLMJ faz sentido crescer dentro do espaço lusófono. Manuel Santos Vítor, sócio administrador da sociedade liderada por Luís Sáragga Leal, afirma que “a estratégia de internacionalização em PLMJ privilegia os países lusófonos pelas sinergias criadas pela língua e cultura comuns, e semelhanças entre ordenamentos jurídicos”. Como razão complementar, estes países são ainda mercados-alvo dos investimentos das empresas portuguesas que a PLMJ acompanha. A PLMJ está presente, através de parcerias, em Angola, Brasil, Moçambique, Macau e Cabo Verde, e depois – através de uma plataforma de apoio a empresários – nos países do Leste europeu. De acordo com o sócio da Vieira de Almeida & Associados (VdA), Fernando Resina da Silva, “a globalização da economia e consequente globalização das O novo agregador da advocacia

CGP

transacções leva a que a VdA tenha estabelecido acordos com sociedades de referência estrangeiras”. Partilha de conhecimentos e acompanhamento de clientes noutras jurisdições são exemplos das mais-valias das alianças externas dadas por este advogado. A sociedade colabora com uma firma no Brasil, tem relações próximas com outra no Reino Unido, e recentemente celebrou uma parceria em Moçambique, cujo balanço se salda, nas palavras de Resina da Silva, em “excelentes resultados”. A ponto de ponderar transpor este mesmo modelo de cooperação em Angola, num futuro próximo. Nas multinacionais espanholas com presença em Portugal, a expansão do negócio para os PALOP continua a fazer sentido. Na Cuatrecasas, Gonçalves Pereira (CGP), tudo começou com um “acordo de parceria com a Cuatrecasas [quando a firma portuguesa se designava

por Gonçalves Pereira, Castelo Branco & Associados] em 1995, que culminou numa fusão em 2003”, lembra o sócio da firma, Frederico Pereira Coutinho. Em 1998, a CGP abriu escritório em Moçambique, sendo Angola outro dos focos onde o escritório liderado em Portugal por Manuel Castelo Branco pretende intensificar a sua presença ao longo de 2010. “Paralelamente, a CGP desenvolveu uma rede de correspondentes a nível mundial”, continua Frederico Pereira Coutinho. E conclui: “No Brasil e restante América Latina, com uma sociedade best friend em cada jurisdição”. No passado mês de Abril, a única firma britânica com presença directa em Portugal, a Linklaters, dispensou cerca de 25% dos seus colaboradores no País, por razões conjunturais, relacionadas com a manutenção dos níveis de (alta) rentabilidade da sociedade. Também no recuo

“A nível internacional a estratégia da VdA passa pela manutenção e reforço da sua posição de firma independente”

VdA

da fusão entre a britânica Simmons & Simmons com a Rebelo de Sousa, em 2009, demonstrou que a estratégia financeira seguida pelos escritórios anglosaxónicos não se coaduna a 100% com o plano estratégico de multinacionais de matriz europeia-continental presentes em Portugal, como é o caso das gigantes espanholas Cuatrecasas, Garrigues e Uría Menéndez. Segundo Pedro Rebelo de Sousa, a sua sociedade manteve com a Simmons & Simmons uma relação de best friend que já leva 17 anos, e, “naturalmente”, alguns clientes comuns. Mas a incorporação total das duas firmas não se chegou a verificar porque as estratégias de crescimento diferiam. A Sociedade Rebelo de Sousa já está no Brasil há sete anos, marcando ainda presença em Angola, Moçambique e Cabo Verde, com “crescente actividade conjunta”, remata Rebelo de Sousa. Agosto de 2010

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Por Direito

Pedro Quintas, CEO da Jurinfor

Rapidamente e em força

No mercado há 21 anos, a líder portuguesa de publicações jurídicas esgotou o mercado nacional e aposta agora em Angola, para onde está a ir rapidamente e em força. Pedro Quintas, CEO da Jurinfor, explica como conquistou este nicho de negócio, cujo target agora está nas PME 12

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O novo agregador da advocacia


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Os departamentos jurídicos estão a ganhar terreno no mercado da advocacia. Quem o diz é o CEO da Jurinfor, empresa portuguesa líder de mercado no sector das publicações jurídicas, que se internacionalizou em 2009 para Angola. “Embora as sociedades de advogados sejam mais conhecidas, as empresas são mais fortes”, diz Pedro Quintas. E continua: “A nível de clientela, este é um segmento que não devemos menosprezar”. Enquanto os escritórios de advogados são mais especializados, em termos de organização jurídica, as empresas trabalham antes em regime de outsourcing, com equipas de dez a 12 juristas, que se articulam com cinco a dez sociedades, para assuntos mais especializados. A Jurinfor, através do Jurigest, actua precisamente na gestão de Contencioso que os gabinetes jurídicos das empresas e sociedades de advogados têm de lidar no seu dia-a-dia. Criado em 1995, na óptica de advogados em prática individual e escritórios de advogados, o Jurigest permitia a co-existência de até dez utilizadores em rede. Adaptado aos grandes escritórios há cerca de cinco anos atrás, hoje os aderentes estão segmentados por facturação (para efeitos contabilísticos), níveis privilegiados de acesso (exclusivos para sócios) ou gestão da captação de clientes. O Jurigest é o “produto-estrela” da Jurinfor, representando mais de 60% da facturação da firma. Jerónimo Martins, EDP e Galp são apenas alguns dos nomes de grandes empresas na mira da Jurinfor. “Em 2008, quando nos estreámos a nível macro, o nosso principal alvo eram os escritórios de advogados”, diz Pedro Quintas. Volvidos dois anos, este sector já só representa 20% da clientela da Jurinfor. “O mercado português é limitado, a tónica hoje está nas empresas”, explica o CEO da empresa, admitindo que “não saturámos aquele mercado [da advocacia], mas não estamos longe”. A expansão da Jurinfor para AnO novo agregador da advocacia

Por Direito

100

mil USD

foi o volume de negócios em 2009 da SoftAngol. No primeiro trimestre deste ano já facturou mais que no ano passado

Em 2008, o principal alvo da Jurinfor eram os escritórios de advogados, que dois anos volvidos apenas representam 20% da sua facturação. “A tónica está agora nas empresas”, explica Pedro Quintas

PERFIL

De pequenino se traça o caminho Licenciado em Engenharia Informática pela Universidade Nova de Lisboa (1990-1998), Pedro Quintas fez o mestrado na mesma área. Começou a trabalhar como programador, logo no primeiro ano da faculdade, em regime de freelance para a União de Bancos Portuguesa. A entrada na Jurinfor deu-se em 1990. Com 38 anos, o engenheiro considera uma vantagem ter começado a trabalhar cedo, porque “sempre permitiu a aplicação de soluções práticas à vida real”. Casado, e com dois filhos, o CEO da Jurinfor admite que não dorme muito, dedicando o (pouco) tempo livre que dispõe em família, a ver um filme ou a dar um passeio.

gola deveu-se à vocação internacional que tem a maioria das empresas lá presentes. Numa altura em que já havia pouco crescimento anual em Portugal, a empresa estava bem posicionada no mercado e já era conhecida entre os principais players. Com um produto “muito apetecível” como o Jurigest, e detentores da maior colectânea jurídica online, em 2009 a empresa liderada por Pedro Quintas recebeu uma proposta de fusão com a Wolters. “O spin off com esta empresa alemã deu-se, e a Jurinfor ficou impedida de crescer no mercado nacional durante os próximos quatro a cinco anos”, explica o engenheiro responsável pela empresa. Assim, a chave foi crescer no plano internacional, com o “Angolegal” a equivaler ao “Lex Portugal”. Com uma facturação muito positiva, a SoftAngola é a empresa contratada pela Jurinfor para o mercado angolano. Pedro Quintas justifica o sucesso de forma modesta: “A ideia de entrar no mercado jurídico surgiu a partir das solicitações dos clientes das bases de dados”. Com o final dos anos 90 a coincidir com o boom informático, o CEO da Jurinfor diz que “na altura nem tínhamos muita noção de como gerir o produto”. Levantado a ponta do véu do se-

gredo para o crescimento da empresa, Pedro Quintas acrescenta que, “quando surgimos, foi logo com uma vocação informática de legislação”. Isto foi há 21 anos, a imprensa só lhes seguiu as pegadas quatro anos mais tarde, em 1993. E remata: “Chegar sempre primeiro é uma das nossas principais mais-valias. Claro que há mais players no mercado, e hoje em dia é incontestável que a imprensa nacional é o principal”.

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Por Direito

Quanto melhor o advogado conhecer o seu cliente, melhor interpretará as suas dificuldades e melhor lhe pode resolver os problemas. Esta visão da relação entre cliente e advogado não se compadece, do meu ponto de vista, com a compra de uma consulta numa loja onde se vendam consultas sobre questões de Direito

Papini e as lojas jurídicas Quando Giovanni Papini no seu Gog (colectânea de contos satíricos publicados em primeira edição em 1931) descreveu a sua máquina de fazer justiça, estávamos como estamos no domínio do surreal. A máquina inventada por Papini (cito de cor) continha os dados do arguido, a acusação de que era objecto, a posição da defesa, e após alguns momentos que sugeriam alegações da acusação e da defesa, mostrava-se num painel a sentença: no caso era uma sentença de morte simbolizada por uma caveira. O que torna este conto de Papini dramático, do meu ponto de vista, é o facto de o desenvolvimento da audiência de discussão e julgamento se fazer sem intervenção humana imediata. Digo imediata porque obviamente um humano forneceu os dados sobre os quais a máquina decidiu. O arguido não é julgado pelos seus pares: por homens iguais a ele. O arguido sente-se julgado por uma máquina, algo que não está dentro do seu universo, não faz parte da sua vida nem pessoal nem social. Isto vem a propósito das lojas onde se dão consultas jurídicas. Quem se vê obrigado a enfrentar problemas jurídicos tem agora a possibilidade de comprar uma consulta numa loja. E a distância entre o consultor e o consulente reflecte a distância que ia do arguido à máquina de fazer justiça de Papini. Uma loja onde se vendem consultas jurídicas não é a casa do advogado, ou seja, não é o seu escritório: espaço de trabalho concebido ao modo do advogado com condições de atendimento ao cliente e que merece protecção legal, em que o advogado e os seus colaboradores estão sujeitos, nomeadamente, ao dever de sigilo. 14

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“A casa do advogado que é o seu escritório, constitui um local de refúgio onde o cliente pode confessar-se, pode exprimir as suas inquietações e ajudar o advogado a definir a estratégia com que melhor abordará o caso que lhe leva”

A relação entre advogado e cliente não se limita a uma pergunta e uma resposta, qualquer que seja o âmbito de uma e de outra. Há uma relação humana a desenvolver de modo a que nem o advogado seja a máquina que dá respostas nem o cliente a pessoa que formula questões. Do desenvolvimento dessa relação é possível entender muitas vezes que o problema colocado pelo cliente não é exactamente aquele ou que o cliente não necessita de um advogado mas de um médico ou de um psicólogo ou até de um padre. A relação individual baseia-se na confiança do cliente no advogado e na confiança que este, com a sua atitude e os seus conselhos, vai cimentando. A casa do advogado, que é o seu escritório, constitui um local de refúgio (apesar de alguns atentados recentes de que tem sido vítima) onde o cliente pode confessar-se, pode exprimir as suas inquietações e ajudar o advogado a definir a estratégia com que melhor abordará o caso que lhe leva. O cliente deve sentir o escritório do advogado como o lugar onde cria força e a esperança de resolver os seus problemas. Se a relação pessoal não tem relevância, então não tardará o dia em que uma espécie de máquina com uma base de dados com perguntas tipo e respostas tipo responderá às questões que lhe forem colocadas pelos consulentes. O escritório do advogado é um espaço de segurança e a relação subjacente às necessidades de natureza jurídica de quem a procura não se compadece com uma pergunta e uma resposta. É mais profunda que isso porque, quanto melhor o advogado conhecer o seu cliente, melhor

César Pratas César Pratas & Associados Nascido em Setúbal, o advogado é licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Diplomado em Estudos Comerciais, César Pratas é membro da Ordem dos Advogados portuguesa.

interpretará as suas dificuldades e melhor lhe pode resolver os problemas. Esta visão da relação entre cliente e advogado não se compadece, do meu ponto de vista, com a compra de uma consulta numa loja onde se vendam consultas sobre questões de Direito. O novo agregador da advocacia



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Testemunho

Fátima Sousa Jornalista fs@briefing.pt

Carlos Neves de Almeida, director jurídico da Groundforce

In house em nome dos custos

Ramon de Melo

É um franco defensor da assessoria jurídica interna, pelo menos numa empresa tão complexa e específica como a Groundforce Portugal: a racionalidade de custos é apenas um dos argumentos de Carlos Neves de Almeida. A maior eficácia é outro dos que pesa

Quando Carlos Neves de Almeida assumiu a Direcção de assessoria jurídica da Groundforce Portugal, em Janeiro de 2008, tinha uma missão clara: estava mandatado para, por razões de rentabilidade económica, reduzir os elevados custos com a consultoria externa. Mais de dois anos depois, a missão está, quanto a esse objectivo, concluída. Não é que seja contra a consultoria externa, advoga mesmo o princípio da combinação, mas entende que, numa empresa com a complexidade e especificidade da 16

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Num mercado com a dimensão do português, dificilmente os escritórios de advogados tendem a investir no desenvolvimento de competências em ramos tão específicos como o Direito Aéreo

Groundforce, a melhor solução é assessoria in house. O negócio de uma empresa ligada ao transporte aéreo é tão específico que não encontra nos escritórios de advogados as correspondentes competências. Não tem dúvidas de que se perde em eficácia. E explica porquê: “Quando em negócios desta natureza se vai buscar consultoria externa, acaba por se ter uma duplicação de custos, porque o que normalmente acontece é que os advogados externos vêm procurar inputs junto dos advogados internos, que têm O novo agregador da advocacia


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de fazer todo o trabalho prévio de preparação”. Carlos Neves de Almeida conhece bem as teorias de gestão que defendem que a assessoria jurídica, não sendo core business, deve estar fora da empresa, mas, na sua opinião, esta regra não tem validade numa empresa tão específica como a Groundforce. Uma especificidade que advém, desde logo, da regulamentação que a conforma, relativa quer ao tipo de actividade, quer aos procedimentos operacionais e contratuais: há regras padronizadas internacionalmente que a empresa de handling tem de observar, não podendo, pois, prescindir de uma estrutura interna que acompanhe a evolução normativa e procedimental. Ora, num mercado à dimensão do português, dificilmente os escritórios de advogados tendem a investir no desenvolvimento de competências em ramos tão específicos como o Direito Aéreo. Soma-se a especificidade laboral, por via de um acordo de empresa único. Se existisse um advogado externo para lidar com os processos de natureza laboral, seria necessário afectar também um quadro da assessoria interna, conduzindo mais uma vez à duplicação de custos. E, assim sendo, só muito esporadicamente estes processos são tratados externamente, quando, por razões superiores, se entende que deve haver um menor envolvimento da organização. Mas, ressalva, os membros da assessoria interna “trabalham com todo o profissionalismo, para que não seja levantada a mínima interrogação sobre a sua isenção”. Sendo uma empresa business to business to consumer, a Groundforce acaba por ter duas categorias de clientes – os directos, que são as companhias de aviação que lhe contratam o serviço de assistência em terra, e os indirectos, os passageiros, clientes dos transportadores aéreos. É mais uma particularidade que abre a porta a que os clientes indirectos apresentem reclamaO novo agregador da advocacia

Testemunho

ções junto do handler quando se sentem lesados nos seus direitos. A sociedade da informação veio despertar a consciência reivindicativa dos cidadãos, o que originou uma mudança de atitude: se antigamente, as reclamações eram dirigidas sobretudo ao transportador, hoje são também canalizadas para o handler e mesmo para as associações de defesa do consumidor e para a tutela do sector de actividade (INAC). Sem avançar números, Neves de Almeida diz que apenas uma pequena percentagem dessas queixas — as mais complexas — chega à assessoria jurídica, depois de filtradas pelo Serviço de Atendimento ao Cliente. São queixas tratadas com “o máximo respeito” que é devido ao cliente, ainda que, por vezes, sendo a responsabilidade do transporte aéreo limitada por convenções internacionais, a consciência reivindicativa possa chocar com tais limites. Entre as relações com o transportador, com os clientes indirectos, com os trabalhadores, com os fornecedores, com a entidade aeroportuária (ANA), com as autoridades aduaneiras (Direcção-Geral das Alfândegas) e de imigração (SEF), a assessoria jurídica da Groundforce não tem mãos a medir. E são apenas três pessoas, com apoio administrativo. Para a equipa que lidera, e em matéria de desenvolvimento de competências, defende um equilíbrio entre a competência generalista associada a uma formação de base sólida – garantia de polivalência e rotatividade dos elementos nas diversas funções – e a especialização numa ou duas áreas: é um modelo que funciona bem e que permite uma maior racionalidade dos recursos numa assessoria obrigada a conciliar a consultoria interna diária com a actividade judicial, cujos prazos são imperativos. É essa necessidade de conciliação, nem sempre fácil, que leva Carlos Neves de Almeida a advogar um cuidado adicional no controlo dos inputs internos: “Quando não existe consultoria interna, a

organização sabe que, se consultar um escritório de advogados, esse custo se vai reflectir nos resultados, pois, mesmo que o faça ao abrigo de avença, existem, normalmente, limites que esta não cobre. Em consequência, há uma contenção na consulta, uma consulta mais responsável, melhor direccionada”. Ora, “numa grande organização com assessoria interna, representando um custo fixo, por vezes há a tentação – até porque todos têm muito trabalho – de direccionar a consulta sem trabalho preparatório, o que implica, para o advogado interno, despender mais tempo e, por conseguinte, o acumular de um maior volume de solicitações sem meios para responder ao que é essencial”. Nesses casos, por imperativos de eficiência e de racionalidade eco-

nómica, “o exercício que deve ser feito é o da filtragem da consulta”, levando à assessoria apenas o que efectivamente se justifica e resistindo ao facilitismo na consulta, até porque, fazendo parte do custo fixo da organização, o órgão consulente não sente directamente o custo no seu orçamento. Neves de Almeida preconiza a adopção de um modelo que passa por conceber a assessoria jurídica interna segundo princípios de equilíbrio próprios da análise sistémica, o que permite, para além de outras valias em matéria de funcionalidade, fazer a imputação do custo: ainda que possa ser uma operação meramente escritural, vai permitir ao cliente interno sentir o custo da consultoria no seu orçamento e assim promover uma maior racionalização da consulta.

TEMPOS LIVRES

No fim do dia, sobra sempre trabalho Um dia de trabalho normal de Carlos Neves de Almeida prolonga-se, muitas vezes, por um mínimo de 12 horas. E quando, mesmo assim, o trabalho sobra, leva-o para casa. E os prazeres vão sendo adiados: viajar é um deles, o desporto outro, a leitura outro ainda. Tempos houve em que fazia desporto com regularidade, nadava à hora de almoço e corria cedo nas manhãs de fim-de-semana, “muitos quilómetros”. Actualmente só de quando em vez. As leituras vão ficando inacabadas, restringidas à “literatura tecnocrática”. E as viagens, apesar da facilidade inerente ao facto de ser quadro do grupo TAP, circunscrevem-se a pouco mais do que as que são ditadas pela actividade profissional. Neves de Almeida gosta de trabalhar e do que faz em concreto, mas lamenta que se perca algum equilíbrio entre a vida profissional e os prazeres pessoais. Tanto mais que também é docente no ISCTE, de Direito do Trabalho e de Direito das Sociedades Comerciais. Foi em resposta a um anúncio para um estágio que deu os primeiros passos na TAP. Entrou em 1989 como jurista, com um percurso que em 2005 o conduziu à SPdH – Serviços Portugueses de Handling, como director de Relações Internacionais e Parcerias Institucionais. Em 2008, foi convidado a assumir o cargo de director jurídico no grupo TAP responsável pela assessoria jurídica a prestar na Groundforce.

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Passeio Público

Mónica Carneiro Pacheco está sempre ligada à corrente. Cresceu entre os livros de Direito das bibliotecas dos avôs, ambos juristas e enveredou pela advocacia dado o gosto pela leitura. Sempre quis ser advogada. Foi monitora na Clássica e adjunta na Secretaria de Estado da Habitação até se tornar numa das maiores especialistas do país em energia

Ramon de Melo

Sempre ligada à corrente

“Sempre quis ser advogada”, afirma, peremptoriamente, Mónica Carneiro Pacheco. A advogada justifica, em seguida, a certeza que desde cedo a acompanhou: “Cresci praticamente entre livros de Direito, porque ambos os meus avôs foram juristas, e por isso em minha casa havia uma biblioteca enorme, 18

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metade com livros de Direito”. O gosto natural pela leitura, o estudo e a investigação científica reforçaram esta convicção, levando Mónica, à data com 17 anos, a cursar Direito na Católica. Terminada a licenciatura, a jurista foi convidada para monitorizar Direito Comercial na Clássica, uma cadeira do

4.º ano, fazendo com que, com 23 anos, desse aulas a alunos apenas um ano mais novos. O estágio profissional foi realizado na firma do reputado administrativista Mário Esteves de Oliveira. “Foi uma pessoa que me marcou imenso do ponto de vista profissional”, continua a advogada, sem

hesitar em dizer que “ir para este escritório deu completamente a volta à minha carreira”. Isto porque uma inclinação que à partida parecia ser para a área do Direito Privado, afinal se revelou errada. “Direito Administrativo não me cativou especialmente na faculdade, mas o Dr. Mário Esteves de Oliveira O novo agregador da advocacia


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conseguiu interessar-me pelo assunto, alterando por completo o meu rumo profissional”, admite. Terminado o estágio, foi adjunta do secretário de Estado da Habitação e Comunicações, quando Ferreira do Amaral liderava esta pasta governamental. “Foi uma época em que se produziu legislação importantíssima, relativa aos loteamentos urbanos e licenciamento de obras particulares”, diz a sócia de Energia da RPA, considerando a experiência “muito engraçada”, uma vez que permite ao advogado ter uma visão de como as coisas se passam do lado da administração pública, desde a feitura de requerimentos, ao seu percurso burocrático. Algures entre o final da licenciatura e as primeiras experiências profissionais, Mónica descobriu a sua vocação dentro do Direito: “No meu tempo, as cadeiras não eram tão variadas, actualmente os estudantes têm um leque mais amplo de escolhas, o que também faz com que descubram mais cedo a sua vocação”. A advogada realça, ainda, a crescente especialização e concorrência de que o mercado jurídico é alvo: “Também não tínhamos a preocupação de saber onde íamos estagiar. Hoje em dia, ainda não chegaram ao último ano, e já vejo estudantes que sabem exactamente quais as melhores firmas de advogados, em que áreas, para onde querem ir e o que querem fazer”. Como justificação para este fenómeno, Mónica adianta que há mais e melhor acesso à informação: “Na minha altura, sabia quem eram o Daniel Proença de Carvalho, o José Miguel Júdice, e pouco mais. As sociedades de advogados não estavam estruturadas como estão hoje”. Durante 10 anos, a advogada exerceu na Vasconcelos, Sá Carneiro, Fontes & Associados (VSCF), como responsável pela área de Público. E o balanço que faz desta década é muito positivo: “Em 2005 estava criada uma equipa sólida de Direito Público na VSCF, da qual muito me orgulho”. Entretanto, a firma fundiu-se com a multinacional esO novo agregador da advocacia

Passeio Público

“No meu tempo, as cadeiras não eram tão variadas, actualmente os estudantes têm um leque mais amplo de escolhas, o que também faz com que descubram mais cedo a sua vocação”

panhola, Uría Menéndez (UM). Um ano depois, Mónica saiu por motivos que, sublinha, foram de índole pessoal, “até porque gosto imenso dos espanhóis e me identifico imenso com a maneira de ser deles, são muito eficientes”. Durante 12 meses, a advogada trabalhou a partir de casa com um conjunto de clientes, o que lhe possibilitou dedicar mais tempo aos filhos. Considerando “extremamente difícil”, para uma mulher, conjugar a vida profissional com a pessoal, Mónica Carneiro Pacheco diz que o segredo está numa “grande organização”, aliada a uma “paixão intrínseca” pela profissão. Sócia da firma Rui Pena, Arnaut e Associados (RPA) desde 2007, a advogada atingiu o topo da carreira há três anos e é considerada uma das maiores especialistas em Energia de Portugal. Apesar disso, considera ter uma “óptima” qualidade de vida, sem abdicar da família nem do que gosta de fazer. “Todas as profissões têm picos de trabalho, e, se as pessoas trabalharem efectivamente durante o tempo que passam no escritório, dá perfeitamente para conjugar tudo”, conclui.

“Todas as profissões têm picos de trabalho, e, se as pessoas trabalharem efectivamente durante o tempo que passam no escritório, dá perfeitamente para conjugar tudo”

PERIPÉCIAS

O dia em que o jantar queimou

“Gosto imenso dos espanhóis. Identifico-me imenso com a maneira de ser deles. São muito eficientes”

Com dois filhos e quatro enteadas, a gestão da família exige, segundo Mónica, “uma grande organização e capacidade de sacrifício”. Com o dia de trabalho a começar às oito e meia da manhã, a advogada reservava sempre um tempo ao final da tarde para os filhos, levando o que não conseguia acabar no escritório em disquetes, para casa, voltando a pegar nelas depois de deitar as crianças. “Umas vezes sacrificava a família, outras vezes o escritório, tem de haver um balanço”, resume a jurista. Não ter leite em casa, cruzar-se com a filha à ida para a escola no regresso de uma noitada no escritório ou queimar um jantar para convidados que esperou demasiado tempo no forno foram algumas das peripécias que aconteceram durante os 15 anos de trabalho. Entre a gestão da casa, da família e da carreira, Mónica garante que ainda sobra um tempo só para si, que dedica à ginástica (duas vezes por semana) e à leitura, à média de um livro por semana, intermediado entre os fins-de-semana, e as horas em que a casa está adormecida.

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Eleições

O melhor Bastonário de sempre Com a vitória de António Marinho e Pinto tudo mudou na Ordem dos Advogados. Começou a deixar de haver Advogados e Advogadas de primeira e Advogados e Advogadas de segunda

A recandidatura de António Marinho e Pinto é esperada e desejada. Esperada, porque ainda há muito trabalho para fazer na Ordem dos Advogados, de forma a dignificar o prestígio da classe e da profissão. Sobretudo numa altura em que o actual Bastonário da Ordem dos Advogados tem sido vítima de uma abominável campanha, com vista a denegrir a sua imagem. Campanha essa que conta com o beneplácito e a complacência de alguns colegas que ainda não digeriram convenientemente os resultados das últimas eleições, onde foram copiosamente derrotados, mas que querem voltar para os órgãos sociais da Ordem dos Advogados a todo o custo. Desejada, porque ainda há muito para fazer em prol da Ordem dos Advogados, da classe, e do prestígio da profissão de Advogado. Durante anos a fio, a Ordem dos Advogados foi uma estrutura aparelhística e obsoleta, centralizada em Lisboa, refém dos grandes escritórios de Advogados de Lisboa, que faziam da Ordem dos Advogados como que um couto privado de caça que usavam a seu bel-prazer. Durante anos a fio, houve Advogados de primeira, que eram os oriundos dos grandes escritórios de Lisboa e do Porto, aos quais se associavam os principais escritórios das sedes dos restantes Conselhos Distritais, que prestavam vassalagem aos grandes escritórios de Lisboa e do Porto. E havia os Advogados de segunda, que eram todos os restantes Advogados, que na maioria dos casos estão no interior do País, exercem a sua profissão em regime de prática isolada, e deparam-se com grandes 20

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“Durante anos a fio, a Ordem dos Advogados foi uma estrutura aparelhística e obsoleta, centralizada em Lisboa, refém dos grandes escritórios de Advogados de Lisboa, que faziam dela como que um couto privado de caça que usavam a seu bel-prazer”

“Durante anos a fio, houve Advogados de primeira, que eram os oriundos dos grandes escritórios de Lisboa e do Porto, aos quais se associavam os principais escritórios das sedes dos restantes Conselhos Distritais, que lhes prestavam vassalagem”

dificuldades para manterem abertos os seus escritórios. A Ordem dos Advogados só se lembrava desses Advogados na altura de lhes pedir o dinheiro das quotas, suspendendo-os do exercício da profissão se não pagassem pontualmente as quotas, e só se lembrando desses Colegas em alturas de eleições. Com a vitória de António Marinho e Pinto tudo mudou na Ordem dos Advogados. Começou a deixar de haver Advogados e Advogadas de primeira e Advogados e Advogadas de segunda. Conheço António Marinho e Pinto há muitos anos. Comecei a ter mais contacto com ele de há 15 anos a esta parte, numa altura em que eu era Presidente da Comissão Política Concelhia de Tábua e Vice-presidente da Comissão Política Distrital de Coimbra do então Partido Popular, e ele era o responsável pela Delegação do “Expresso” em Coimbra, tendo a meu cargo os contactos com a Comunicação Social do distrito. E, fruto dessa circunstância pelas funções que ambos desempenhávamos, fomos trocando ideias sobre vários assuntos e tornamo-nos amigos. Politicamente eu e ele estamos nos antípodas políticos. António Marinho e Pinto é Republicano e é de esquerda. Eu sou Monárquico, e sou de direita, sendo um acérrimo defensor da Europa das Nações e dos Estados soberanos. Mas tal não nos impede de defendermos políticas de ruptura com um sistema vigente, que está caduco e obsoleto. Pese embora as nossas diferenças políticas, defendemos as mesmas ideias, os mesmos valores e os mesmos princípios para a Ordem dos Advogados. Queremos uma verdadeira dignificação da profissão de

Miguel Costa Marques Advogado na Comarca de Santa Comba Dão. Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra em 1995. Exerce Societário a nível nacional e regional.

Advogado, assente numa relação de proximidade com os cidadãos. O Advogado é absolutamente necessário na administração da justiça, e na defesa dos legítimos direitos e interesses dos cidadãos. E só com uma Ordem forte, coesa e unida é que tal missão pode ser levada a bom porto. Enquanto Bastonário teve medidas positivas e medidas negativas. Cometeu erros, como qualquer um de nós comete, já que errar é inerente à nossa condição de seres humanos. Mas também teve muitas medidas positivas, como as que acabei de enumerar. Certamente que não está dentro dos protótipos do Bastonário tradicional. Principalmente se tivermos em conta os protótipos dos anteriores Bastonários, que eram oriundos dos grandes escritórios de advocacia de Lisboa, e que dos mesmos estavam reféns. Mas, na minha modesta opinião de Advogado de província, com 15 anos do exercício da minha profissão em regime de prática isolada, e com as dificuldades daí inerentes, António Marinho e Pinto foi o melhor Bastonário que a Ordem dos Advogados conheceu. E o que melhor soube defender os direitos e interesses dos Advogados e das Advogadas, conforme o demonstram as suas várias tomadas de posições. O novo agregador da advocacia


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Eleições

FERNANDO FRAGOSO MARQUES

Candidato a Bastonário da Ordem dos Advogados 2011-13

Uma advocacia sem crispações

AGENDA

O dr. Fernando Fragoso Marques apresentou-se com um Manifesto em que reafirma, pela positiva e sem ambiguidades, valores humanistas muito relevantes e princípios deontológicos fundamentais, entre os quais a isenção, a independência, a lealdade, a discrição e o aprumo José de Sousa Macedo

A opção e escolha de um Bastonário, de entre vários que se possam candidatar, e ao qual se concede apoio, deve ser, a meu ver, tanto quanto possível ditado por razões objectivas. Não é que não concorram, também, e isso ainda bem que sucede, motivos de natureza subjectiva. Eu, pessoalmente, sempre os tive, por amizade ou por simpatia. Todavia, acima de tudo, move-me o que entendo ser o superior interesse da Advocacia. Aproximam-se eleições para o Bastonário, e para os demais Órgãos da Ordem dos Advogados, para o triénio de 2011/2013. Já se perfilaram diversos candidatos e suponho que se multipliquem, também, listas para os demais Órgãos. Eu nunca tive, felizmente, grande problema de voto em anteriores actos eleitorais. E já participei em muitos, desde que me inscrevi como Advogado, no tempo do dr. Pedro Pitta, hoje já com mais de 50 anos dedicados à profissão. Nunca me determinei, por conseguinte, a favor de um Candidato por razão dos defeitos dos outros. Desta vez, continuo a ter a sorte de saber bem em quem votar. Desde, pelo menos, há cerca de 15 anos, fiquei a conhecer melhor o dr. Fernando Fragoso Marques, e com ele tive oportunidade, em diversas situações difíceis, de nos vermos colocados do mesmo lado, sempre na defesa de uma Advocacia, O novo agregador da advocacia

“Eu nunca tive, felizmente, grande problema de voto em anteriores actos eleitorais. Nunca me determinei a favor de um candidato por razão dos defeitos dos outros. Desta vez, continuo a ter a sorte de saber bem em quem votar”

“Não é, sequer, concebível um Estado de Direito Democrático nem a plena cidadania sem uma Advocacia aberta ao diálogo, adversa a crispações, desejada e respeitada por todos”

livre, isenta e independente. Recordo, sem esquecer outras, a “resistência” a algumas afrontas tentadas pelo Poder Político, denunciadas numa Assembleia de Delegações, em Albufeira, ou no Congresso dos Advogados Portugueses, que teve lugar na Universidade Católica de Lisboa. Mas, sobretudo, é de salientar o desempenho do dr. Fernando Fragoso Marques enquanto Presidente do Conselho Distrital de Lisboa, e o seu enorme contributo, no êxito então alcançado, para a solidariedade entre todos os Órgãos da Ordem, e os seus Membros, no mandato que foi o do Bastonário dr. António Pires de Lima (1999/2001), facilmente reconhecido, sem melindre para ninguém, como o tempo em que a Ordem dos Advogados alcançou uma assinalável notoriedade e um crédito incontestado, unindo a generalidade dos Advogados e reforçando o prestígio da Advocacia Portuguesa. O dr. Fernando Fragoso Marques, para além de acompanhar e conhecer muito bem os gravíssimos problemas que, actualmente, enfrenta a Advocacia, a Ordem dos Advogados e a Justiça em geral, apresentou-se com um Manifesto em que reafirma, pela positiva e sem ambiguidades, marcado por forte convicção e com firmeza, não preconceituoso nem arrogante — o que eu muito prezo ! —, valores humanistas muito relevantes e princípios deontológicos fundamentais, entre os quais a isenção, a independência, a le-

Advogado em Lisboa desde 1959, com a inscrição n.º 2002, da Ordem dos Advogados Portuguesa. Exerceu funções no Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados no triénio 1981/83 e no respectivo Conselho Superior nos triénios de 1984/86 e 1987/89. Presidente da Comissão de Legislação da Ordem dos Advogados durante 9 anos, entre 1992 e 2001. Constituiu, e foi primeiro Presidente, do Instituto de Advogados de Empresa, da Ordem dos Advogados entre 2002 até 2004, tendo promovido o seu Primeiro Encontro Nacional. Foi-lhe atribuída em 2009 a Medalha de Honra da Advocacia Portuguesa e em 2010 a Medalha Comemorativa de 50 anos como Advogado.

aldade, a discrição e o aprumo, uns e outros inderrogáveis, que são a verdadeira razão de ser de uma profissão secular, como é a Advocacia. Sei que o dr. Fernando Fragoso Marques pensa e diz que não é, sequer, concebível um Estado de Direito Democrático nem a plena Cidadania, sustentada no exercício dos Direitos, Liberdades e Garantias dos Cidadãos e na justa exigência e cumprimento dos correlativos Deveres, sem uma Advocacia aberta ao diálogo, adversa a crispações, desejada e respeitada por todos. Também assim penso e já o tenho dito, em múltiplas oportunidades. Daí, o meu inteiro acordo com ele. Por tais razões, apoio, sem hesitação, o dr. Fernando Fragoso Marques, como Candidato que é e como Bastonário que desejo, para o triénio de 2011/2013. Agosto de 2010

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Eleições

Vai ser um Primeiro entre iguais O Luis Filipe Carvalho será um Primeiro entre Iguais muito marcante na excelente equipa que está a reunir à sua volta para conduzir, com moderação e firmeza, os destinos da Ordem a partir do próximo ano, e para projectar e prestigiar a advocacia portuguesa, num compromisso sábio entre a tradição e a modernidade Carlos Aguiar

Ao longo destes últimos anos foi-se firmando o grande apreço que tenho pelas qualidades humanas e profissionais do Luis Filipe Carvalho: um excelente Colega, cortês, descontraído, disponível, decidido, de elevado sentido ético e cheio de energia e iniciativa. Eram conhecidos o entusiasmo e a dedicação que o Luis Filipe Carvalho punha em tudo o que fazia em prol da Ordem, em particular no mandato que exerceu no Conselho Geral, que coincidiu com o meu no Conselho Superior. Ganhou a justificada reputação de ser um trabalhador incansável e pragmático, um conhecedor minucioso da realidade da advocacia em Portugal, um conciliador, mas igualmente um firme defensor dos interesses legítimos dos advogados portugueses. Tenho acompanhado algumas das suas intervenções públicas — oportunas, serenas e bem informadas e preparadas. Tenho a convicção de que o Luis Filipe Carvalho, como meu Bastonário, usará a Comunicação Social, onde se move com facilidade, para valorizar e defender a sua Ordem e os seus Colegas, e não como um púlpito para protagonismo pessoal. Estou igualmente certo de que o Luis Filipe Carvalho, pelas suas qualidades, se preocupará em reforçar a boa convivência e a harmonia no interior da Ordem e no relacionamento entre os seus órgãos; e em manter uma linha de diálogo, permanente e paciente, com os poderes ins22

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“Ganhou a justificada reputação de ser um trabalhador incansável e pragmático, um conhecedor minucioso da realidade da advocacia em Portugal, um conciliador, mas igualmente um firme defensor dos interesses legítimos dos advogados portugueses”

tituídos, seja qual for a sua cor política, e com as restantes profissões jurídicas. Estou ainda convicto de que o Luis Filipe Carvalho se empenhará em reforçar a aproximação entre todos os Colegas e as formas pelas quais a nossa profissão é exercida em Portugal – individual ou societária. Todas elas são igualmente nobres e necessárias porque a todas elas subjaz o Advogado, cujo estatuto, deontologia, autonomia e prestígio nunca é de mais proclamar. O Luis Filipe Carvalho será, estou certo, um Primeiro entre Iguais muito marcante, na excelente equipa que está a reunir à sua volta para conduzir, com moderação e firmeza, os destinos da Ordem dos Advogados a partir do próximo ano, e para projectar e prestigiar a advocacia portuguesa, num compromisso sábio entre a tradição e a modernidade.

Sócio fundador da sociedade Carlos Aguiar, Ferreira de Lima e Associados. Dedica-se em especial ao Direito Comercial e das Sociedades, Fusões e Aquisições, Direito Financeiro, Contencioso e Arbitragens. Nasceu em 1953. Licenciou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa em 1976. Está inscrito como advogado na Ordem dos Advogados desde 1978. É membro da International Bar Association; associado fundador da Associação Portuguesa de Arbitragem; membro do Club Español del Arbitraje. É Vice-Presidente da Câmara de Comércio e Indústria Luso Francesa. Foi monitor de Direito Comercial na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e na Universidade Livre (1976/80). Foi sócio fundador da sociedade de advogados “João Morais Leitão & Associados” (1978/1993) e sociedade de advogados “Aguiar, Vasconcelos, F. Sá Carneiro & Associados” (1993/1995). Foi membro do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados (1996/1998). Foi membro do Conselho Superior da Ordem dos Advogados (2005/2007). É fluente em inglês, francês e espanhol.

“Tenho a convicção de que o Luis Filipe Carvalho, como meu Bastonário, usará a Comunicação Social, onde se move com facilidade, para valorizar e defender a sua Ordem e os seus Colegas, e não como um púlpito para protagonismo pessoal” O novo agregador da advocacia


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Brainstorming

…e o brioche mudou o mundo O boato sobre as dificuldades financeiras do BCP veio colocar de novo em cima da mesa a questão da responsabilização judicial dos seus autores e dos prestadores de serviço de Internet

Rodrigo Moita de Deus

Miguel Mendonça, Who

Director-geral da Nextpower Consumer Generated Marketing

— Majestade. O povo protesta nos portões por falta de pão. — Não tem pão? Então que coma brioches. E foi assim que Maria Antonieta terá respondido à sua criada de quarto. O diálogo foi amplificado pelos panfletos propagandísticos da época para revolta do povo esfomeado de Paris. E foi considerado como um rumor pelo próprio Rousseau. Maria Antonieta nunca terá respondido assim e o diálogo é fantasia de um guionista mais talentoso. Mas o resto é História. O povo descontente rebela-se. Revolução francesa. Antonieta perde a cabeça. Vem o iluminismo e o brioche mudou o mundo. Durante anos os sócios do Sporting olharam para a pala do seu estádio O novo agregador da advocacia

como os irredutíveis gauleses olhavam para o céu. Roma terá tomado a aldeia. A pala, essa, só caiu quando o estádio foi demolido. Da mesma forma, toda a gente diz que Marcelo Rebelo de Sousa só dorme três horas por dia. Não quero parecer céptico mas duvido que a maior parte tenha dormido de facto com o Professor para confirmar a teoria. No auge da pandemia comunicacional sobre a pandemia das aves poucos devem ter escapado a um email com link para uma entrevista da ministra da Saúde finlandesa. A ministra, senhora bastante apresentável, de inglês quase irrepreensível, advertia que a gripe das aves tinha sido criada pelas farmacêuticas e pelos americanos para controlar a

população nos países mais pobres. A coisa confirmava as piores teorias da conspiração sobre o assunto. E basta googlar (belo verbo) o nome da ministra para confirmar que é, de facto, uma autora consagrada. Tem milhares de livros vendidos. Sobre a Atlântida e o rapto de seres humanos por extraterrestres. Só nunca foi ministra. E também não é da Finlândia. A expressão mitos urbanos tem origem na forma rápida como a informação circulava nas cidades. Por comparação com as sociedades rurais. É simples. No campo era preciso andar muitos quilómetros para fazer chegar um rumor à aldeia vizinha. Na cidade conseguíamos fazer isso atravessando a rua para

ir ao café. Na era dos social media a informação circula a 20 megas por segundo. Consequentemente, por analogia aos mitos urbanos, temos agora mitos sociais. E assim foi com o BCP. Caso único onde as contas de Facebook foram mais activas que as contas do banco. O rumor da falência propagou-se em três dias nos murais das redes e, por pouco, foi possível impedir uma corrida de levantamentos ao banco que transformaria este mito social numa self-fulfilling prophecy. Os mitos urbanos — mesmo em formato rural ou social — sempre existiram. Não foram os social media que os criaram. Não vale a pena responsabilizá-los. Os social media aceleram a propagação da informação. Da negativa. Mas também da positiva. Foram os próprios social media que trataram de dar eco às notícias que davam como infundados os rumores que circulavam. Os social media são amplificadores. É isso. Regressando ao tema. A verdade é que Maria Antonieta era uma cabra arrogante. A verdade é que a pala de Alvalade tremia. A verdade é que Marcelo Rebelo de Sousa deita-se tarde e acorda cedo. A verdade é que não houve pandemia das aves. Verdade, verdade é que todos os mitos urbanos, para terem sucesso, têm de corresponder a uma concepção colectiva mais ou mais generalizada. Ou seja, qualquer estória é sempre baseada em factos reais. Mas isso é outra conversa. Ou rumor. Agosto de 2010

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Através do anonimato perfeito A difusão de SMS e, em especial, de e-mails alertando para a iminente falência do BCP levanta diversas questões jurídicas, entre elas a responsabilização dos seus autores e dos prestadores de serviço de Internet, intermediários no acesso à informação Os recentes acontecimentos recordam o dito de uma jornalista americana: “Trying to squash a rumor is like trying to unring a bell”. A difusão de SMS e, em especial, de e-mails alertando para a iminente falência do BCP levanta diversas questões jurídicas, entre elas a responsabilização dos seus autores e dos prestadores de serviço de Internet, intermediários no acesso à informação. No que se refere aos autores de um “boato”, tal como tem sido afirmado por diversos especialistas em Direito Penal, estará em causa o crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva, previsto no art. 187.º do Código Penal, ao serem afirmados e divulgados “factos inverídicos, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança” devidos a uma determinada entidade. Como sanção para este crime, o legislador penal prevê uma pena de prisão até dois anos, constituindo a prática deste crime através de meios electrónicos uma agravante, tal como preceitua o n.º 2 do mesmo artigo. Contudo, a dificuldade em imputar os actos ilícitos aos verdadeiros autores, que através de numerosos mecanismos conseguem mascarar a sua identidade, leva à questão da determinação da responsabilidade dos prestadores de serviços que desenvolvem a sua actividade na Internet. Neste âmbito, caberá, primeiramente, delimitar a função exercida pelo prestador de serviço em causa, com vista a determinar a sua eventual responsabilidade. Nos termos do Decreto-Lei n.º 7/2004 de 7 de Janeiro, a responsabilidade dos prestadores de serviços em rede está sujeita ao regime geral da responsabilidade aquilia24

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“A dificuldade em imputar os actos ilícitos aos verdadeiros autores, que através de numerosos mecanismos conseguem mascarar a sua identidade, leva à questão da determinação da responsabilidade dos prestadores de serviços que desenvolvem a sua actividade na Internet”

“Os recentes acontecimentos recordam o dito de uma jornalista americana: Trying to squash a rumor is like trying to unring a bell”

na, com especificações pontuais constantes do referido Decreto-Lei. Sub judice está o desempenho da função de disponibilização de um serviço como o de correio electrónico, meio utilizado na divulgação do boato de falência daquela entidade bancária. Ora, tratando-se o e-mail de um meio de comunicação privado, o acesso não só é negado por imposição técnica, como impende sobre os responsáveis pelo tratamento de dados pessoais, os fornecedores de acesso, um dever de sigilo previsto no art. 17.º da Lei de Protecção de Dados Pessoais. Na prática este afastamento da responsabilidade das operadoras encontra justificação na inexistência de qualquer contacto com a informação veiculada através de e-mail, ao contrário do que sucede, por exemplo, nos casos em que o prestador de serviços participa, de algum modo, da autoria dos conteúdos ilícitos. No entanto, esta posição de neutralidade é limitada por alguns deveres positivos consagrados pelo Decreto-Lei n.º 7/2004, nomeadamente a obrigação de satisfazer os pedidos de identificar os destinatários dos serviços com quem tenham contrato de armazenagem. Este mecanismo permitirá identificar os reais autores do “boato” ou da conduta ilícita, nos casos em que estes não se encontrem “escudados” por uma falsa identidade ou endereço de IP ou, ainda, por um fornecedor de acesso estrangeiro. Assim, a utilização destes instrumentos legais torna-se, numerosas vezes, de difícil aplicação, sendo possível, nas palavras de Lawrence Lessig “o crime perfeito”, através do anonimato perfeito.

Gonçalo da Cunha Ferreira Licenciado em Direito pela Universidade Moderna, o advogado fez uma formação complementar em Gestão Estratégica no INDEG/ISCTE e Mediação e Arbitragem na ASIPI/INTA. Consultor em Propriedade Industrial e Intelectual desde 1985. Gonçalo Cunha Ferreira iniciou a sua actividade na sociedade de advogados Gastão da Cunha Ferreira, tendo fundado a sociedade Cabral, Cunha Ferreira & Associados em 1988. Em 2006, o advogado integrou o projecto da Garrigues, onde se encontra actualmente.

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A difícil prova de nexo causal Toda a investigação criminal poderá esbarrar nas regras do ónus da prova que obrigam a que se demonstre quem em concreto praticou o acto lesivo e gerador da responsabilidade, independentemente do equipamento ou endereço virtual utilizados No mês de Julho começaram a circular, indiscriminadamente, men-sagens via SMS de que era iminente a intervenção estatal no maior banco privado português, atentas as dificuldades financeiras que se lhe apontavam. Prometidos inquéritos rápidos e prioritários, que devemos então esperar da nossa máquina judicial para reagir a tão premente e volátil situação deste mundo novo? Há muito que o nosso ordenamento prevê o crime de ofensa a serviço, organismo ou pessoa colectiva (artigo 187.º do Código Penal), punindo a actuação de quem propalou factos inverídicos e susceptíveis de ofender a credibilidade, prestígio e confiança de uma daquelas entidades, agravando os limites mínimos e máximos da pena num terço, quando o facto tenha sido praticado com recurso a meios que facilitaram a sua divulgação. No entanto, esta previsão abarca apenas a difusão que seja desinteressada nos seus fins. A par da responsabilidade criminal, não é imune a existência cumulativa de responsabilidade civil. Não se prevendo quaisquer desvios ao regime normal da responsabilidade aquiliana do Código Civil, devem as consequências e os efeitos deste acto ser examinados à luz do regime geral da responsabilidade civil extracontratual, nomeadamente, do artigo 484.º do Código Civil, que prevê a protecção do crédito e do bom nome de quaisquer pessoas, singulares ou colectivas. A quem se deve, então, responsabilizar? Numa primeira aproximação, poder-se-ia tentar responsabilizar os fornecedores de meios de telecoO novo agregador da advocacia

“Mais difícil se tornará essa prova quando os equipamentos sejam utilizados por várias pessoas ou se tenha recorrido a falsos números de IP. Também difícil será a prova do nexo causal, sendo certo que cada pessoa apenas poderá responder pelo efeito concreto da mensagem que por si enviada tenha tido na credibilidade da referida instituição, mas já não pelo facto da sua mensagem ter sido reencaminhada”

“As novas tecnologias introduziram um novo elemento na cadeia da responsabilidade, tanto civil como a criminal, que terá obrigatoriamente de ser objecto de legislação adequada, sem colidir com os direitos de defesa nem inverter as regras do ónus da prova”

municação. Porém, nos termos do artigo 12.º da Lei do comércio electrónico (Lei 7/2004, de 4 de Janeiro), a responsabilidade daquelas entidades está expressamente excluída, prevendo aquele artigo que: “Os prestadores intermediários de serviços em rede não estão sujeitos a uma obrigação geral de vigilância sobre as informações que transmitem ou armazenam ou de investigação”. Por outro lado, embora a aprovação da Lei n.º 32/2008, de 17 de Julho, preveja a conservação dos dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações, este mecanismo está previsto, exclusivamente, para fins de investigação, detecção e repressão de crimes graves. Na prática, toda a investigação criminal poderá esbarrar nas regras do ónus da prova que obrigam a que se demonstre quem em concreto praticou o acto lesivo e gerador da responsabilidade, independentemente do equipamento ou endereço virtual utilizados. Mais difícil se tornará essa prova quando os equipamentos sejam utilizados por várias pessoas ou se tenha recorrido a falsos números de IP. Também difícil será a prova do nexo causal, sendo certo que cada pessoa apenas poderá responder pelo efeito concreto da mensagem que por si enviada tenha tido na credibilidade da referida instituição, mas já não pelo facto da sua mensagem ter sido reencaminhada. As novas tecnologias introduziram um novo elemento na cadeia da responsabilidade, tanto civil como

Filipe Mayer Licenciado pela Faculdade de Direito da Católica (2002), começou a exercer três anos mais tarde, tendo construído toda a sua carreira profissional na firma liderada por Carlos Cruz, na área da Propriedade Intelectual.

a criminal, que terá obrigatoriamente de ser objecto de legislação adequada, sem colidir com os direitos de defesa nem inverter as regras do ónus da prova. A presunção de que o acto terá sido praticado pela pessoa que adquiriu o equipamento de comunicação ou a máquina associada àquele IP colidiria inevitavelmente com os mais elementares Princípios do Direito e seria inaceitável. Agosto de 2010

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Fisco

Sua Excelência o Fisco

Marie Rodrigues, Who

IRS, IVA e IRC — num piscar de olhos, a taxa, quer de impostos directos (IRS e IRC), como de impostos indirectos (IVA), disparou em nome da aceleração do plano de austeridade para reduzir o défice. Sua Excelência o Fisco examinado por cinco advogados, em quatro artigos e uma entrevista

“Mantendo o status quo, continuará a existir uma classe média sobre a qual incide uma carga fiscal brutal e, nos extremos, uma tendência para a elisão e evasão fiscais. Acresce que a despesa do Estado é excessiva. Quantas vezes sumptuária”, chama a atenção Carlos Pinto de Abreu, presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados. Sua Excelência o Fisco é o tema 26

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abordado em artigos de quatro advogados. Tiago Alcoforado Calhau, da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira & Associados, lembra que as relações entre a Administração Tributária e os contribuintes assentam em interesses opostos: por um lado, o interesse público na obtenção da receita fiscal necessária à prossecução dos fins do Estado e, por outro lado, os interesses patrimoniais dos contribuintes.

Rogério Alves, da ABBC, não entende os lamentos de alguns, que clamam por uma maior abertura do segredo bancário, alertando para a necessidade de cuidados e escrúpulos sempre que se atravessa a fronteira que separa a regra da excepção. Miguel Teixeira de Abreu, da Abreu Advogados, recorda que a Comissão Europeia exige dos Estados-Membros a remoção de leis que

coloquem em causa a liberdade de circulação de bens, serviços, pessoas e capitais, ou a livre concorrência no acesso aos mercados europeus. Por último, João Espanha, da Espanha & Associados, está satisfeito por as regras de contabilidade serem hoje muito mais densas e minuciosas – e terem com fundamento doutrinal adequado e com racionais de decisão conhecidos. O novo agregador da advocacia


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UE atenta na fiscalidade directa Caso o Tribunal de Justiça da UE venha a decidir em favor da Comissão, os contribuintes fiscais portugueses terão o direito de solicitar perante os tribunais nacionais o reembolso de impostos pagos em violação do direito comunitário

Embora, salvo algumas excepções de integração positiva, a fiscalidade directa tenha ficado fora do esforço de harmonização legislativa comunitária, a verdade é que a soberania dos Estados-Membros nesta matéria tem vindo a ser desafiada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) em todos os domínios em que o seu exercício coloque em causa a liberdade de circulação de bens, serviços, pessoas e capitais, ou a livre concorrência no acesso aos mercados europeus. Note-se que existem hoje mais de 200 decisões do TJUE em matérias relacionadas com a fiscalidade directa, as quais dão origem a um fenómeno de integração negativa que os Juízes nacionais ajudam a aplicar nos seus países. Com efeito, sendo o Juiz nacional o Juiz comum de direito comunitário, cabe-lhe assegurar o primado do direito comunitário sobre o direito nacional, devendo por isso decidir em conformidade com as decisões do TJUE, em casos similares a outros sobre os quais o TJUE já se tenha pronunciado. Mas não é apenas o TJUE o único agente activo neste fenómeno de integração negativa: também a Comissão Europeia anda atenta ao impacto que as diferentes legislações fiscais têm sobre os princípios de direito comunitário, exigindo dos Estados-Membros a remoção de leis que não estejam em conformidade com esses princípios – sob pena precisamente de recurso para o TJUE. No caso português, o impacto desta intervenção tem vindo a ser crescente. Temos diversos exemplos de normas alteradas por O novo agregador da advocacia

“Mas se exemplos existem de normas fiscais que foram alteradas, outros existem de normas que a Comissão Europeia já considerou serem violadoras do direito comunitário e que ainda permanecem vivas no nosso ordenamento fiscal”

“A Comissão Europeia anda atenta ao impacto que as diferentes legislações fiscais têm sobre os princípios de direito comunitário, exigindo dos Estados Membros a remoção de leis que coloquem em causa a liberdade de circulação de bens, serviços, pessoas e capitais, ou a livre concorrência no acesso aos mercados europeus”

imposição das instâncias comunitárias, como disso são exemplo os artigos 14.º, n.º 6 do CIRC (tributação de dividendos à saída); 10.º, n.º 5, alínea (a) do CIRS (reinvestimento de mais valias imobiliárias); 9.º, n.º 2 do CIRS (rendimentos do jogo) e 17.º-A do CIRS (englobamento de rendimentos obtidos por não residentes). Mas se exemplos existem de normas fiscais que foram alteradas, outros existem de normas que a Comissão Europeia já considerou serem violadoras do direito comunitário e que ainda permanecem vivas no nosso ordenamento fiscal. Assim, a Comissão Europeia, depois de diversos avisos enviados ao Governo Português, intentou já acção junto do TJUE, designadamente, nas seguintes situações: • em sede de tributação à saída de sociedades e de pessoas individuais (artigos 83.º, 84.º e 85.º do CIRC e 10.º e 38.º do CIRS) — Processo C-38/2010 de 22 de Janeiro; • em sede de tributação de juros pagos a bancos residentes num Estado-Membro que não Portugal (artigos 87.º, 94.º e 97.º do CIRC) — Processo C-105/2008 de 6 de Março; • em sede de nomeação de representantes fiscais por entidades residentes num Estado-Membro que não Portugal (artigo 130.º do CIRS) — Processo C-267/2009 de 15 de Julho; • em sede de tributação de dividendos pagos a fundos de pensões constituídos ao abrigo da legislação de um Estado-Membro que não Portugal (artigo 16.º do EBF) – Processo C-493/2009 de 1 de Dezembro.

Miguel Teixeira de Abreu Sócio da Abreu Advogados Licenciado em Direito pela Clássica em 1987, o advogado encetou o seu percurso profissional em PLMJ, onde permaneceu até 1992. No ano seguinte, fundou a Abreu, Cardigos e Associados, actual Abreu Advogados, de que é managing partner desde 2007.

Será de realçar que em todas estas situações, caso o TJUE venha a decidir em favor da Comissão, os contribuintes fiscais portugueses terão o direito de solicitar perante os tribunais nacionais o reembolso de impostos pagos em violação do direito comunitário. E o Juiz nacional, porque Juiz comum de direito comunitário, será obrigado a decidir em favor desses contribuintes (remetendo ou não, conforme o decida, o caso ao próprio TJUE). Finalmente, uma curta nota para o facto de as decisões do TJUE serem também importante na interpretação de normas fiscais. Disso é exemplo o Acórdão Cadbury Schweppes que, em nossa opinião, impõe restrições importantes na interpretação, e no alcance, do artigo 66.º do CIRC sempre que estejam em causa entidades residentes em dois Estados-Membros. Agosto de 2010

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Fisco

“Despesa do Estado é excessiva” “Mantendo o status quo, continuará a existir uma classe média sobre a qual incide uma carga fiscal brutal e, nos extremos, uma tendência para a elisão e evasão fiscais. Acresce que a despesa do Estado é excessiva. Quantas vezes sumptuária. A produtividade no domínio da função pública é preocupante. A falta de organização, endémica”, acusa Carlos Pinto de Abreu, do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados

Carlos Pinto de Abreu Presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados Licenciado em Direito pela Católica em 1990, o advogado começou a exercer dois anos mais tarde, sob patronato do penalista Germano Marques da Silva. Especializado na área do Direito Penal, que pratica há 16 anos, actualmente o advogado encabeça o Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados.

Advocatus | Qual o principal problema que, na sua opinião, existe na área do Direito Fiscal? Que soluções proporia para resolver esse(s) problema(s)? CPA | Vislumbro não um mas pelo menos dois problemas essenciais: o primeiro (o da falta de rigor e de respeito pelo contribuinte, não poucas vezes associado à excessiva discricionariedade) ao nível da administração fiscal e outro (o da ausência de celeridade e da inexistente capacidade de resposta adequada) ao nível dos tribunais tributários. O rigor e o respeito na administração foram substituídos pela obsessão pelas “metas quantitativas” e pela actuação dominada pela “arbitrariedade”. A celeridade e a capacidade de resposta adequada dos tribunais estão obstaculizadas por uma crescente litigiosidade evitável, por uma preocupante falta de meios e de instrumentos alternativos e por uma lei processual sem “válvulas de escape”. A falta de pedagogia e de diálogo nos procedimentos e nos processos também não ajuda. Todas as regras de procedimento e de processo são basicamente burocráticas, afastam a participação, não permitem a adesão, e não são minimamente orientadas para o resultado. E seria importante que houvesse leis simples e guidelines jurispru28

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“Infelizmente, e a propósito de reformas fiscais, uma das atitudes difíceis de mudar é a do legislador que não pára de legislar, cada vez mais e cada vez pior! Não se simplifica, nem se corrige”

“O rigor e o respeito na administração foram substituídos pela obsessão pelas metas quantitativas e pela actuação dominada pela arbitrariedade”

denciais claras para a actividade da administração. E que esta as cumprisse… Advocatus | Relativamente às novas taxas de IRS, prevê dificuldades acrescidas na prática fiscal? CPA | Alguns entendem que na prática não entrarão em vigor duas tabelas diferentes respeitantes ao ano de 2010. Quando afirmam que a lei não é retroactiva, o que querem dizer é que o IRS (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares) é um imposto cujo facto tributário apenas se forma no dia 31 de Dezembro de 2010, ou seja, é um imposto de formação sucessiva, sendo o rendimento tributável apurado apenas anualmente e não mensalmente. É por esta razão que muitos afirmam que aplicar aos rendimentos de todo o ano de 2010 as taxas que entraram agora em vigor não representa uma aplicação retroactiva das mesmas. De acordo com esse entendimento, as expectativas do contribuinte só se formam no final do ano e não mês a mês. A questão é, porém, interessante do ponto de vista constitucional e das garantias dos contribuintes. E, havendo vontade, de fácil resolução. No meu entendimento, a reserva de lei e o princípio da

não retroactividade dos impostos obrigam a que só se apliquem as novas taxas à matéria colectável que se forme após a entrada em vigor da lei menos favorável ao contribuinte. Quem disser o contrário pode apresentar argumentos formais, mas não respeita o espírito da lei fundamental e os princípios que salvaguardam a segurança jurídica e os direitos constitucionais dos cidadãos contribuintes. Não é especialmente difícil do ponto de vista da prática fiscal resolver esta situação. Basta prever nas declarações contributivas dois campos especiais para que se introduzam, em cada um, os rendimentos obtidos no domínio da taxa antiga (no primeiro campo) e os rendimentos obtidos já na vigência da nova taxa (no segundo campo). E sobre cada valor fazer incidir a taxa respectiva. Também me parece de fácil resolução. Assim se queira resolver… Se não se quiser resolver, prevejo mais recurso aos tribunais, desde logo reclamações, impugnações, oposições, recursos ordinários e extraordinários, o que não augura nada de bom num sistema já sobrecarregado e em rotura. Advocatus | O que pensa do Executivo ter decidido aumentar os impostos sobre um caO novo agregador da advocacia


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baz que integra bens essenciais, como o pão ou o leite, ao mesmo tempo que Portugal regista uma taxa recorde de desemprego? CPA | O aumento dos impostos só sucede pela manifesta incapacidade de gestão que têm demonstrado os sucessivos governos. Mas também os cidadãos e as empresas têm especiais responsabilidades. Cumprissem todos os seus deveres fiscais e as taxas poderiam baixar significativamente. Mantendo o status quo, continuará a existir uma classe média sobre a qual incide uma carga fiscal brutal e, nos extremos, uma tendência para a elisão e evasão fiscais. Acresce que a despesa do Estado é ex-

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cessiva. Quantas vezes sumptuária. A produtividade no domínio da função pública é preocupante. A falta de organização, endémica. O desemprego resulta da profunda crise económica e da falta de confiança dos operadores económicos na retoma. Resulta também de leis inadequadas. Não seria de prever uma legislação laboral, ao menos temporária, em que a flexibilidade e a mobilidade fossem muito mais amplas? Não seria de lançar um programa de obras públicas produtivas que pudesse absorver o crescente desemprego? E em que os subsídios de desemprego e de reinserção social se substituíssem por rendimentos de actividade, de tra-

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“O aumento dos impostos só sucede pela manifesta incapacidade de gestão que têm demonstrado os sucessivos governos. Mas também os cidadãos e as empresas têm especiais responsabilidades. Cumprissem todos os seus deveres fiscais e as taxas poderiam baixar significativamente”

balho ou de serviço? Não seria também de combater eficazmente as fraudes nestes subsídios e a inércia, a falta de produtividade e a desmotivação que implicam? Mas, enquanto estas medidas não forem implementadas, claro que choca o aumento dos impostos sobre um cabaz onde se compreendem bens essenciais, como o pão ou o leite, numa altura em que Portugal atingiu uma taxa recorde de desemprego dos últimos 30 anos, de mais de 10%, isto de acordo com os dados oficiais do INE, sobretudo quando se gastam milhões mal gastos no Estado... dito social. Diminua-se a despesa e seja-se mais inteligente na afectação da receita.

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Relação com interesses opostos As relações entre a Administração Tributária e os contribuintes assentam em interesses opostos: por um lado, o interesse público na obtenção da receita fiscal necessária à prossecução dos fins do Estado e, por outro lado, os interesses patrimoniais dos contribuintes. Neste contexto, os advogados desempenham um papel fundamental, em que acompanham as inspecções tributárias e intervêm na defesa dos direitos dos contribuintes, contribuindo para a justa repartição dos encargos públicos A relação entre a Administração Tributária – entidade responsável pela liquidação e cobrança dos créditos tributários – e os cidadãos – contribuintes – nasceu como uma das mais evidentes manifestações do poder e autoridade do Estado. Nos tempos modernos, essa relação tem vindo, no entanto, a assumir contornos cada vez mais paritários, dada a crescente importância que a legislação tributária tem vindo a reconher aos direitos e garantias dos contribuintes que, desse modo, operam como limites à actuação do Estado. Enquanto entidade incumbida da liquidação e cobrança de tributos, a Administração Tributária continua a dispor de amplas prerrogativas de poder, entre as quais se destacam: os extensos poderes de inspecção conferidos para efeitos de apuramento da situação tributária dos contribuintes, sendo permitido o acesso a documentos relacionados com a respectiva actividade bem como a informações de natureza bancária e financeira; os mecanismos de troca de informações com as autoridades fiscais dos outros Estados-Membros da União Europeia e de países terceiros; a possibilidade de proceder à liquidação de imposto com base na aplicação de métodos indirectos; a especial exequibilidade das dívidas tributárias, a qual se manifesta mesmo em caso de contestação graciosa ou judicial da legalidade do imposto; ou ainda os mecanismos de compensação das dívidas tributárias dos contribuintes com créditos da mesma natureza. Num Estado de Direito moderno, es30

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tas prerrogativas de poder têm como contraponto a vasta panóplia de direitos e garantias legalmente conferidos aos contribuintes, entre os quais se destacam os diversos meios graciosos e judiciais que poderão ser despoletados em caso de ilegalidades. De facto, os contribuintes podem obter não só a anulação dos actos ilegais, mas também o ressarcimento dos danos deles resultantes, seja através do pagamento de juros indemnizatórios a computar sobre o imposto indevidamente pago ou de indemnização pelos encargos suportados com a prestação indevida de garantia, seja mediante o recurso ao instituto da responsabilidade civil do Estado. Nas suas relações quotidianas com a Administração Tributária, os contribuintes dispõem ainda do direito a obter informações respeitantes à sua situação tributária, para além de as respectivas declarações fiscais e contabilidade gozarem de uma presunção de veracidade, o que faz recair sobre a Administração Tributária o ónus da prova dos factos contrários que invoque. No cerne das relações entre os contribuintes e a Administração Tributária encontramos um dever de colaboração recíproca que visa, em última análise, o cumprimento da lei fiscal por ambas as partes. Na óptica dos contribuintes, esse dever concretiza-se, designadamente, no dever de prestação de esclarecimentos e apresentação da documentação solicitada pela Administração Tributária relativamente à sua situação tributária e às suas relações económicas com terceiros. Tal

dever de colaboração poderá no entanto cessar caso a informação em causa esteja legalmente protegida por qualquer tipo de sigilo (bancário, profissional ou outro) ou caso a respectiva prestação possa indiciar a prática de infracções tributárias pelo próprio contribuinte. Em contrapartida, o dever de colaboração que recai sobre a Administração Tributária manifesta-se, desde logo, ao nível dos deveres de informação que visam facilitar o cumprimento da lei fiscal por parte dos contribuintes, bem como dar-lhes a conhecer alguns dos benefícios e vantagens fiscais ao seu dispor. Paralelamente, com vista a salvaguardar os direitos e garantias dos contribuintes, a Administração Tributária encontra-se vinculada aos deveres de fundamentação e notificação dos actos tributários, cujo incumprimento pode inclusivamente determinar a invalidade ou ineficácia dos mesmos. Não obstante a existência deste dever de colaboração recíproca, a verdade é que as relações entre a Administração Tributária e os contribuintes assentam em interesses opostos: por um lado, o interesse público na obtenção da receita fiscal necessária à prossecução dos fins do Estado e, por outro lado, os interesses patrimoniais dos contribuintes. A conciliação de tais interesses depende, antes de mais, do regular exercício do poder de tributar, o que naturalmente requer um distanciamento das preocupações e necessidades orçamentais do Estado, as quais, por vezes, acabam por com-

Tiago Alcoforado Calhau Associado da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira Licenciado em Direito pela Nova em 2005, e com uma pós-graduação em Gestão Fiscal pelo ISCTE, integra a equipa de Fiscal da multinacional espanhola liderada, em Portugal, por Manuel Castelo Branco, desde 2008.

prometer a legalidade da actuação da Administração Tributária. Será, então, no âmbito destas complexas e potencialmente conflituosas relações que os advogados são chamados a desempenhar um papel fundamental, seja informando, seja acompanhando inspecções tributárias, seja intervindo na defesa dos direitos dos contribuintes no quadro dos litígios emergentes, contribuindo assim para uma mais justa repartição dos encargos públicos. O novo agregador da advocacia


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Impõem-se cuidados e escrúpulos O que se tem, o que se gasta, como se tem e onde se gasta, diz respeito a cada um e assim deve ser preservado. Mas é hoje consensual que esta regra tem de ceder, quando, prosseguindo em erudita companhia, “outros valores mais altos se levantam”

Rogério Alves Associado da ABBC

Não há regra sem excepção. Como em Camões “se transforma o amador na cousa amada”, também a acentuada prodigalidade no uso da excepção transforma esta, afinal, na regra e a regra, afinal, na excepção. Pede-se-me que comente, de forma tópica, o estado em que se encontra o segredo bancário em Portugal. Comecemos pela regra. A regra consiste no dever de segredo. Um segredo que acolhe “os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias”. (artigo 78/2 do RGICSF). Estará bem assim, ou deveria a vida bancária dos cidadãos ser de acesso mais ou menos livre, à imagem do que ocorre com os registos predial, civil, ou automóvel? Claro que está bem assim. O instituto radica-se na “reserva da intimidade da vida privada” (artigo 26/2 da CRP), valor constitucional em boa hora consagrado e na saudável regra geral de proscrição da intrusão na vida alheia, que o Código Civil perfilhou no seu artigo 80.º. O que se tem, o que se gasta, como se tem e onde se gasta, diz respeito a cada um e assim deve ser preservado. Mas é hoje consensual que esta regra tem de ceder, quando, prosseguindo em erudita companhia, “outros valores mais altos se levantam.” Valores capazes de fundamentarem a violação do segredo e o acesso aos elementos que ficam a descoberto. Há dois casos paradigmáticos, conquanto não únicos, onde a admissibilidade de acesso aos elementos bancários surge como justificada: a investigação criminal e o apuramento da verdade fiscal. A O novo agregador da advocacia

“Há dois casos paradigmáticos, conquanto não únicos, onde a admissibilidade de acesso aos elementos bancários surge como justificada: a investigação criminal e o apuramento da verdade fiscal”

“Não entendo os lamentos de alguns, que clamam por uma maior abertura. Ao atravessar a fronteira que separa a regra da excepção, impõem-se cuidados e escrúpulos”

sociedade carece destes meios de defesa e os cidadãos aplaudem-nos sem hesitações. Assim deve ser. O afastamento do segredo em depoimento ou prestação de informação vem previsto no artigo 135 do CPP, em termos aceitáveis. Os artigos 181.º e 182.º do mesmo diploma conferem ao juiz um amplo poder de derrogação do segredo, sem limitação quanto ao crime sob investigação ou julgamento. O artigo 2.º da Lei 5/2002, de 11 de Janeiro, permite o rompimento do segredo bancário nas fases de inquérito, instrução ou julgamento, quando se trate de um conjunto de crimes de catálogo, o que é acessível, na fase de inquérito, ao Ministério Público. Os deveres de informação das entidades bancárias estão consignados no artigo 16 da Lei 25/2008, de 5 de Junho, no quadro do combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. O segredo bancário pode mesmo ser derrogado, em sede de processo civil. Vd. o acórdão do STJ de 17 de Dezembro de 2009, acessível em www.dgsi.pt. A evolução no direito fiscal é, igualmente, imparável. Veja-se o disposto actualmente no artigo 63-B da LGT, que se resume no acesso livre e sem peias à informação bancária do contribuinte, num amplíssimo leque de situações. Não entendo os lamentos de alguns, que clamam por uma maior abertura. Ela já existe e está bem expressa na lei. Ao atravessar a fronteira que separa a regra da excepção, impõem-se cuidados e escrúpulos, inspirados no democrático e saudável princípio segundo o qual “a lei só

Licenciado em Direito pela Católica em 1984, começou por exercer em nome individual três anos depois. Presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados entre 2002 e 2004, no ano seguinte o advogado foi eleito bastonário desta ordem profissional, cargo que exerceu até 2007.

pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos” (artigo 18/2 da CRP). Creio que essa garantia tem uma maneira de ser obtida, mediante a consagração de recurso judicial, sempre com carácter urgente e com efeito suspensivo, de todas as decisões que determinem a quebra de segredo. Assim o sistema ficaria justo, jurisdicionalizado e equilibrado. Agosto de 2010

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Fisco

Regras densas e minuciosas Estamos perante um enorme desafio para as empresas — será desta que perceberão que a contabilidade serve a gestão e a informação dos stakeholders, e não o mero apuramento do lucro tributável? Até à aprovação do primeiro Plano Oficial de Contabilidade (POC) em 1977, só nos sectores da banca e seguros se praticava normalização contabilística, no geral, reinava a indisciplina e a confusão. Contudo, mesmo o novo POC (DL 410/89) providenciava quadro legal muito insuficiente. Tal diploma, para além de um enunciado sintético do que seriam os “princípios contabilísticos fundamentais” e de algumas notas explicativas ao Código de Contas, pouco ou nada acrescentava para a adequada regulamentação da multiplicidade de casos concretos. Era, todavia, um avanço: este corpo de normas – obviamente jurídicas – já permitia ao intérprete o recurso a algumas guidelines. No entretanto, foi publicado o Código do IRC, sendo que, da remissão que no Código da Contribuição Industrial se fazia para os ditos sãos princípios da contabilidade, passou a remeter-se in totum para a contabilidade. É isso que resulta do estabelecido nos artºs 15.º e 17.º do CIRC, pelo que as regras do jogo passaram a ser mais claras. As normas de contabilidade foram acolhidas pelo CIRC, que as fez suas, por vezes reproduzindo-as e/ou adaptando-as. E algumas das regras de contabilidade passaram a provir dos Códigos fiscais. O POC começou cedo a revelar-se insuficiente. É certo que este diploma previa que a sua regulamentação “ouvida a Comissão de Normalização Contabilística” (CNC), mas tal nunca surgiu. O que assistimos foi a um duplo movimento de aprofundamento e adopção de regras de contabilidade mais profusas e detalhadas, com o progressivo acolhimento, na ordem jurídica nacional, das normas destiladas por organizações profissionais de âmbito inter32

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nacional. E dizemos duplo porque as fontes são distintas: de um lado, são as próprias empresas, pelas suas necessidades de gestão, que acolhem os GAAP (general accepted accounting principles), muito por força do labor dos Auditores e Revisores de Contas. É aí que estes encontram a consagração de regras que devem ser por eles observadas para a análise e certificação das contas; de outro lado, a CNC começa a emitir umas Directrizes Contabilísticas (DC), que apenas em 1999 merecem acolhimento legal (DL 367/99). Mas estas são, afinal, más e parcelares traduções das regras que aqueles organismos internacionais consagraram. Basta comparar as DC com os IAS (International Accounting Standards) para verificar este facto. O primeiro choque verdadeiro a que assistimos deu-se com a aplicação, a partir de 2005, das Normas Internacionais de Contabilidade (NIC) Regulamento (CE) 1606/2002. Mas é em 2010 que assistimos a um corte geral e radical na contabilidade em Portugal: a entrada em vigor do Sistema de Normalização Contabilística – SNC. Hoje em dia, e sem embargo da persistência de vários Planos de Contas Sectoriais, está generalizado como sistema contábil, no nosso tecido empresarial, um sistema baseado em princípios e não em regras rígidas, em sintonia com as normas IASB. A relação íntima entre fiscalidade e contabilidade faz-se notar: foi necessário promover uma ampla reformulação do CIRC, alterado e republicado pelo DL 159/2009. Seguidamente, houve que reformular todo o sistema de aceitação fiscal das amortizações e depreciações

“Assim, as regras de contabilidade são hoje muito mais densas, minuciosas, com fundamento doutrinal adequado e com racionais de decisão conhecidos”

“Não desapareceram os conceitos vagos e indeterminados, mas acabou o tempo das normas telegráficas e dos conceitos obscuros, de pai incógnito e sem pergaminhos. Com toda a certeza, para o intérprete e o aplicador da lei, que tal fenómeno comporta”

João Espanha Sócio da Espanha e Associados Nascido em Janeiro de 1965, o advogado é licenciado em Direito pela Clássica, licenciatura que conclui em 1989. Especializado em Direito Fiscal, Castro Silva & Associados (1997), Manuel Jorge Goes, Gonçalo Capitão, Cláudio Monteiro, Jorge Gonçalves e Pedro Madeira de Brito (1998), Capitão, Espanha, Goes, Silva Miguel, Rodrigues Bastos, Areia & Associados (2002), e Capitão, Espanha, Rodrigues Bastos, Areia & Associados (2004) foram outros escritórios por onde o advogado passou até exercer na Espanha e Associados.

– Decreto Regulamentar 25/2009. Importa salientar que o princípio geral e basilar da relação contabilidade/fiscalidade mantém-se: O lucro tributável em sede de IRC tem como ponto de partida o lucro contabilístico. Contudo, duas notas parecem evidentes. O acolhimento do SNC pelo IRC é modesto, o que preocupa – tratando-se de um sistema contabilístico mais “livre”, e a manter-se o conservadorismo da administração tributária e do legislador, a distância entre contabilidade e fiscalidade tenderá a aumentar. Estamos perante um enorme desafio para as empresas — será desta que perceberão que a contabilidade serve a gestão e a informação dos stakeholders, e não o mero apuramento do lucro tributável? Assim, as regras de contabilidade são hoje muito mais densas, minuciosas, com fundamento doutrinal adequado e com racionais de decisão conhecidos. Não desapareceram os conceitos vagos e indeterminados, mas acabou o tempo das normas telegráficas e dos conceitos obscuros, de pai incógnito e sem pergaminhos. Com toda a certeza, para o intérprete e o aplicador da lei, que tal fenómeno comporta. O novo agregador da advocacia


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Entrevista

Jorge Fiel Jornalista jf@briefing.pt

José Pedro Aguiar-Branco, ex-ministro da Justiça e fundador da JPAB

Ramon de Melo

Há um problema? Faz-se uma lei !

“Legisla-se muito e com muita facilidade. Não se faz uma avaliação consistente das consequências das leis que fazemos. Em Portugal, há o péssimo hábito de, quando há um problema, faz-se uma lei em vez de se resolver o problema”, afirma José Pedro Aguiar-Branco. “Gostei de ser ministro da Justiça. Se se deve voltar ou não a um lugar onde se foi feliz? Deixo isso em reticências...”, acrescentou, não pondo ainda de parte ser Bastonário dos Advogados. O novo agregador da advocacia

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Entrevista

Advocatus | Há falta de juízes? José Pedro Aguiar-Branco | Portugal tem juízes suficientes. Não é preciso mais. O que há é uma má distribuição de recursos humanos em relação à procura. Grande parte dos litígios ocorre na faixa litoral, em quatro ou cinco comarcas de referência, como Sintra, Lisboa, Porto e Gaia. E, nestes locais, a capacidade de resposta existente não é proporcional à procura. Advocatus | Como é que se resolve esse problema? JPAB | Há que fazer uma movimentação diferente dos recursos. Com as novas vias de comunicação, não faz sentido que se mantenha este desequilíbrio entre sítios com excesso de pessoal e pouca procura e outros sem recursos suficientes para os muitos casos que têm de resolver. É preciso estimular a mobilidade dos juízes e dos funcionários judiciais, de modo a que haja uma situação mais adequada de resposta à procura. É uma questão de redistribuição dos recursos existentes.

“Portugal tem juízes suficientes. Não é preciso mais. O que há é uma má distribuição de recursos humanos em relação à procura. Grande parte dos litígios ocorrem na faixa litoral, em quatro ou cinco comarcas de referência, como Sintra, Lisboa, Porto e Gaia. E nestes locais a capacidade de resposta existente não é proporcional à procura. É preciso estimular a mobilidade dos juízes e dos funcionários judiciais”

Advocatus | A quem compete fazer essa gestão? JPAB | Ao ministro da Justiça. Eu quando fui ministro da Justiça disse que a reforma do mapa judiciário e uma melhor racionalização dos meios eram fundamentais para uma melhor capacidade de resposta… Não tive tempo para as fazer. Advocatus | O problema não é de falta de recursos, mas da sua má distribuição? JPAB | Não são necessários tantos tribunais. A questão prende-se com a sua distribuição geográfica. Vou dar-lhe um exemplo. Com as novas vias rápidas, Ponte da Barca e Arcos de Valdevez ficam à distância de cinco minutos. Não faz sentido que em Arcos de Valdevez haja escassez de resposta para a procura e em Ponte da Barca suceda exactamente o contrário. É preciso olhar o país de cima e ver como é que se deve fazer a distribuição dos recursos sem que isso ponha em causa o acesso e a proximidade dos cidadãos à Justiça. Advocatus | Defende a avaliação 34

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“Não se pode cortar a legítima expectativa de quem tirou um curso de Direito e pretende aceder à profissão de advogado. Mas a montante, o Estado tem de ser mais rigoroso e exigente na autorização da abertura de novos cursos, na fiscalização da qualidade dos existentes e na contingentação das vagas de acesso”

do desempenho dos juízes? JPAB | É importante que haja essa avaliação. E seguramente é possível encontrar uma lógica de auditorias — que hoje não existem e é fundamental que sejam criadas — para que seja possível verificar o seu desempenho, em simultâneo com uma contingentação que deve existir a nível dos processos que são afectos a cada um dos magistrados. E averiguar se há ou não uma boa resposta, não só ao nível quantitativo, mas também, e essencialmente, do ponto de vista qualitativo. Advocatus | Quem deve responsável por essa avaliação? JPAB | A nível do Conselho Superior de Magistratura, defendo que haja uma maior responsabilização dos representantes eleitos na Assembleia da República nesse órgão, de modo a que a fiscalização e a avaliação que é aí feita seja o menos corporativa possível. Advocatus | O Bastonário aconselhou os jovens estudantes a fugirem dos cursos de Direito. Concorda que há excesso de advogados e de cursos de Direito? JPAB | Durante décadas os cursos de Direito proliferaram e isso provocou um excesso, uma massificação que não foi positiva para a Justiça no geral e para a advocacia em particular. Não se pode cortar a legítima expectativa de quem tirou um curso de Direito e pretende aceder à profissão de advogado. Mas o Estado tem de ser responsável e, a montante, tem de ser mais rigoroso e exigente na autorização da abertura de novos cursos, na fiscalização da qualidade dos existentes e na contingentação das vagas de acesso. Advocatus | O exame de admissão à Ordem deve ser muito exigente? JPAB | Nós temos de introduzir um grau de exigência forte no que diz respeito à advocacia. Seja à entrada, seja na formação contínua, seja na exigência de uma advocacia que tem de recuperar o prestígio que foi perdendo por força da massificação. Por isso, sou favorável a tudo quanto seja introduzir rigor, mas sem castrar a livre iniciativa, a livre concorrência

e a excelência da profissão liberal que é a advocacia. Caberá sempre aos cidadãos distinguir o que é um bom advogado de um mau advogado. Mas acho que essa matriz do rigor deve existir. Advocatus | Ninguém sabe ao certo quantos leis há em Portugal. Legisla-se demais no nosso país? JPAB | Acho que se legisla com muita facilidade e muito – e, muitas vezes, não se faz uma avaliação consistente das consequências das leis que fazemos. Em Portugal, há o péssimo hábito de, quando há um problema, faz-se uma lei em vez de se resolver o problema. E portanto acaba por fazer-se o mais fácil que é legislar. Dizia o Professor Costa Andrade que o Código Penal Alemão tem mais de cem anos e não tem modificações porque não se mexe com facilidade num Código Penal. É preciso que a sociedade interiorize os princípios e ela própria também saiba depois pautar a sua conduta em função de princípios que vão sendo assimilados. Depois há que ir regulamentando e não mudando muito os princípios. Nós, em Portugal, confundimos a regulamentação, que deveria acontecer, com a dignidade de lei. Daí esta proliferação legislativa. É preciso introduzir um elemento de maior rigor na feitura da lei. Advocatus | O crescente papel da arbitragem na resolução de conflitos é o reconhecimento da falência do Estado na administração da Justiça? JPAB | O sistema não está a funcionar bem. Agora a arbitragem é um meio alternativo que é complementar. Mesmo em sistemas que funcionam bem, a arbitragem existe e é mais uma alternativa. Portanto, é mau quando ela surge como forma de resolver aquilo que não funciona bem. A arbitragem é uma alternativa que visa retirar dos tribunais os assuntos que podem ser resolvidos sem recorrer à soberania de um juiz. Há muitas áreas onde isso é possível e podemos concertar sem estar a entupir os tribunais. Mas é um modelo mais caro e por isso não é acessível a todos os cidadãos. Portanto há aqui uma relação custo/benefício O novo agregador da advocacia


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que tem de ser ponderada. A cultura anglo-saxónica é mais forte no recurso à arbitragem do que a cultura latina, em que a figura do juiz tem um peso muito importante para dirimir os conflitos. A arbitragem é um bom meio alternativo, usado cada vez mais.

“Quando eu estou menos bem-disposto e mais irritado, os meus colegas de escritório aconselham-me a ir fazer um julgamento, porque sabem que para me acalmar os nervos um julgamento funciona melhor que qualquer medicação. Gosto mais do tribunal do que do Parlamento, porque a minha oratória é mais a dialéctica do debate e menos a do discurso”

Advocatus | Não acha que o mau funcionamento da Justiça acaba por beneficiar os advogados, já que os cidadãos os consultam cada vez mais preventivamente para evitarem litígios judiciais? JPAB | A advocacia preventiva não é uma coisa negativa. Em termos absolutos de fluxo financeiro ganha-se menos numa advocacia preventiva do que no contencioso. Quando um problema está já numa fase avançada, para o resolver é preciso mais trabalho, gasta-se mais tempo, e por isso fica mais caro. Na maioria dos casos, a advocacia preventiva é um meio mais barato, pois permite que as pessoas evitem uma situação de conflito. É bom para o sistema de Justiça que haja um recurso à advocacia preventiva. Advocatus | A Justiça não é excessivamente corporativa? JPAB | Em Portugal há uma dimensão de capelinha em tudo o que é a Administração, o que normalmente tem contribuído para o mau funcionamento da Administração Pública. Conhecemos o caso típico das polícias, sabemos a situação de vários institutos que se multiplicam. Embora no sistema de Justiça não seja comparável, a verdade é que, normalmente, a culpa morre solteira porque nunca sabe bem a quem imputar a responsabilidade do que corre mal. Advocatus | É para combater isso que propõe a criação de um Conselho Superior de Justiça? JPAB | Dada a proliferação de responsabilidades, é negativo não haver um órgão, uma zona visível para os cidadãos, de responsabilização do que se passa na Justiça. Ainda para mais porque pode parecer aos cidadãos que há aqui uma coisa que funciona à margem da legitimidade democrática. Acho que a melhor for-

“Na maioria dos casos, a advocacia preventiva é um meio mais barato, pois permite às pessoas evitarem uma situação de conflito. É bom para o sistema de Justiça que haja um recurso à advocacia preventiva”

“A Justiça é um sector conservador que resiste às alterações que devem acontecer nos ritos, na informatização, na forma de trabalhar, na assunção de que tempo e a produtividade são elementos que têm de ser considerados, na aceitação com simplicidade das auditorias externas que a cidadania exige em relação a tudo o que é poder”

ma de resolver este problema seria através da criação de um Conselho Superior de Justiça, presidido pelo Presidente da República — tal como acontece no Conselho Superior de Defesa Nacional —, que assim daria a dimensão da representação do povo ao seu mais alto nível no órgão onde convergiriam as diversas responsabilidades dos sectores. Advocatus | Está ancorada na opinião pública a ideia de que a evolução da qualidade da Justiça tem sido muito mais lenta do que a registada na Saúde e Educação. Está de acordo? JPAB | A Justiça não acompanhou como devia a sua ligação com a sociedade. Houve arcaísmos fortes. Faltou dinâmica reformista interna. A Justiça é um sector conservador que resiste às alterações que devem acontecer nos ritos, na informatização, na forma de trabalhar, na assunção de que tempo e produtividade são elementos que têm de ser considerados, na aceitação com simplicidade das auditorias externas que a cidadania exige em relação a tudo o que é poder. Por que é que um tribunal não há-de ter uma gestão profissional como os hospitais? A gestão das agendas das salas, da comunicação com as pessoas, a marcação das audiências… há aqui todo um mundo de gestão e de administração que não evoluiu tanto quanto poderia evoluir. Tudo isto coloca pequenas areias nas engrenagens que fazem com que o sistema de Justiça não se tenha modernizado tanto quanto devia ao longo desta democracia. Também é verdade que há uma maior litigiosidade, própria da democracia. As pessoas reclamam mais, e ainda bem, pois é sinal de que são mais exigentes e ciosas dos seus direitos. Advocatus | É advogado e deputado. Está de acordo em tornar mais severo o regime de incompatibilidades em vigor na AR? JPAB | Eu sou o maior defensor da exigência e do crivo que se deve fazer da transparência. Do registo de interesses e da fiscalização e da punição a quem viole as regras da transparência. Mas sou contra um >>>

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Entrevista

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regime de incompatibilidades que leva à funcionalização da actividade política, a que só pode ser deputado ou exercer um cargo político quem seja um desgarrado da sociedade. Devemos reforçar o registo de interesses, a transparência, depois a efectiva fiscalização e a forte punição a quem viole as regras. Esse caminho é muito mais saudável do que criar incompatibilidades. Infelizmente, em Portugal, criam-se muitos sistemas, muitos cruzamentos de responsabilidades, mas depois não se é consequente na punição e na verdadeira perseguição das situações que são violadoras das regras. Advocatus | Alguma vez se sentiu condicionado por ser ao mesmo tempo advogado e deputado? JPAB | Não. Nem quando fui líder parlamentar. Tenho total transpa-

rência. Nunca me senti prejudicado, nem beneficiado. Total transparência. Toda a gente sabe quais são os meus proveitos, os meus ganhos, as fontes de rendimento e as actividades profissionais que legalmente devo dar a conhecer. Tudo isto está acessível à Comunicação Social, até pelo registo de interesses que eu faço e que está acessível no Tribunal Constitucional. Tenho a consciência totalmente tranquila. Há seis anos que exerço intervenção pública de primeira linha e a transparência é total e tenho sentido sempre a autoridade moral para poder, quer na política, quer na advocacia, fazer o que acho dever fazer no interesse do país. Advocatus | Porque é que há tantos advogados na política? JPAB | A AR é o palco de um proces-

PERFIL

Colecciona Montblancs e Ferraris Filho, irmão e marido de advogados, com 53 anos acabados de fazer (nasceu no Porto a 18 de Julho de 1957), Zé Pedro é militante do PSD desde a primeira hora: filiou-se na JSD em Novembro de 1974, no dia em que Francisco Sá Carneiro fez o primeiro comício laranja na sua cidade natal. No ano lectivo 75/76 ainda ensaiou estudar Ciências Políticas, em Bordéus, mas regressou ao país para estudar Direito em Coimbra. Em 1980 acabou o curso e casou-se. Tem cinco filhos, três raparigas (Ana, a mais velha, trabalha em Paris como estilista na Yves Saint Laurent, Leonor, a segunda, fez o curso de Som e Imagem, e Maria tem 11 anos) e dois rapazes (Frederico, 16, e João, 8). Em 2003 fundou a José Pedro Aguiar-Branco & Associados, e no ano seguinte foi para o Governo, onde esteve oito meses como ministro da Justiça de Pedro Santana Lopes. Eleito deputado, foi líder parlamentar do PSD até ser derrotado por Passos Coelho nas eleições para presidente do partido. Ganhar eleições não é o seu forte. Em 1986 e 1990 foi derrotado nas eleições para a distrital do Porto, primeiro por Brochado Coelho, depois por Luís Filipe Menezes — que chegou a fazer parte do mesmo grupo que ele e Rui Rio nos tempos da Jota. Organizado, meticuloso, cerebral e racional são as palavras mais usadas para caracterizar este advogado que divide as suas simpatias clubísticas pelo Boavista e FC Porto e na sua juventude jogou futebol no MGC, uma das mais míticas equipas do Campeonato de Amadores do Porto. Colecciona canetas Montblancs (tem cerca de 50) e carrinhos em miniatura. Esta última colecção iniciou-a aos cinco anos, quando lhe deram um Rolls Royce, que deixou os amigos espantados pois abria as portas e tinha travão de mão. Tem mais de 400 miniaturas, das quais cerca de metade são Ferraris (a sua marca favorita). A jóia da sua colecção é um Ferrari 312P que lhe custou mais de mil euros.

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“Por que é que um tribunal não há-de ter uma gestão profissional como os hospitais? A gestão das agendas das salas, da comunicação com as pessoas, a marcação das audiências… Há aqui todo um mundo de gestão e administração que não evoluiu tanto quanto poderia evoluir”

so legislativo, de escrutínio e debate, por isso é mais natural que haja mais advogados do que cientistas... Advocatus | Sente-se mais à vontade no Tribunal ou no Parlamento? JPAB | Adoro o tribunal, mas infelizmente já lá não vou há muito tempo. Quando eu estou menos bem-disposto e mais irritado, os meus colegas de escritório aconselham-me a ir fazer um julgamento, porque sabem que para me acalmar os nervos um julgamento funciona melhor que qualquer medicação. Gosto imenso de tribunal. Sempre fui um advogado de barra. Confesso que isso ajuda para a dialéctica nos debates televisivos e parlamentares. Eu gosto mais do tribunal do que do Parlamento, porque a minha oratória é mais a dialéctica do debate e menos a do discurso. Gosto do frente-a-frente típico do debate televisivo. Sinto-me melhor em confronto a dois do que propriamente num debate plenário com muita gente. Advocatus | Desligou-se da Ordem dos Advogados. Tenciona voltar? JPAB | Fui presidente do Conselho Distrital do Porto entre 2002-2004. Saí para ministro da Justiça. Depois a vida encarregou-se de me afastar da estrutura da Ordem dos Advogados [OA]. Não está fora dos meus horizontes poder um dia ter um empenhamento maior na Ordem. Ser bastonário é uma função de grande prestígio e importância em Portugal. O bastonário que as pessoas têm como referência é o dos advogados. Até pela particularidade de a Ordem ter como primeira das suas competências a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. A primeira das competências não é a defesa dos direitos dos advogados. Isto significa o interesse público que a instituição tem. Eu diria que não é com gosto que eu me sinto mais afastado. E a Ordem tem necessidade de ser um patamar de prestígio muito grande em Portugal. Advocatus | Como vê a conflitualidade existente na Ordem? JPAB | Tenho uma relação muito cordial com o bastonário Marinho Pinto. O novo agregador da advocacia


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Entrevista

Do ponto de vista pessoal, dou-me muito bem com ele. Mas não me revejo em muitas das suas posições. Acho que inclusivamente algumas delas são prejudicadas pela forma como as apresenta. Às vezes tem razão, mas a sua atitude acaba por ter um efeito perverso em relação à razão que tem. E acho que fez algumas incursões no campo político que não são adequadas a um bastonário. Devia ter mais cuidado. Tenho respeito pelo bastonário, estou convencido de que ele faz o melhor que sabe e pode na função que exerce. Mas não é um bastonário com quem eu me identifique.

“O Parlamento é o palco de um processo legislativo, de escrutínio e debate, por isso é mais natural que haja mais advogados do que cientistas”

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Advocatus | As grandes sociedades de advogados vão deixar espaço para a prática isolada? JPAB | Todas as formas de exercer a advocacia são complementares. As sociedades apareceram para dar resposta às questões do Direito. Quando, há 30 anos, comecei a exercer advocacia, o factor tempo tinha uma interpretação completamente diferente da que tem hoje. Se me viesse procurar, expor o seu caso e eu lhe respondesse numa hora, o mais natural é que desconfiasse de mim, a pensar que ou eu não estava a esforçar-me devidamente, ou não tinha que fazer – ou o seu assunto era demasiado simples. “Se ele respondeu na ponta da língua, é porque não sabe muito” era o paradigma da referência. Hoje, se eu não responder na hora, a interpretação é exactamente ao contrário. A sua percepção vai ser a de que não respondi logo porque ou não estou preparado, ou não tenho capacidade de resposta e estrutura. Há uma exigência completamente diferente. O mundo da rapidez obriga a uma capacidade de actualização de resposta nas diversas áreas, que, na minha maneira de ver, não se compadece com o trabalho isolado. É evidente que continua a haver espaço para alguns advogados isolados, generalistas, e até advogados de outros advogados. De uma maneira geral, no mundo em que hoje nos movemos, de actividade comercial intensa, é necessário ter uma actividade de equipa. Não diria que são mundos de costas voltadas. O registo da Ordem confirma

“Tenho uma relação muito cordial com o bastonário Marinho Pinto. Do ponto de vista pessoal, dou-me muito bem com ele. Mas não me revejo em muitas das suas posições. Não é um bastonário com quem eu me identifique”

“O mau funcionamento da Justiça é prejudicial para a economia. Agora não vamos esconder o sol com uma peneira. Um bom sistema de justiça é importante, mas não é a alavanca para a retoma da actividade económica. A Justiça tem de fazer o seu papel e deixar de ser um bloqueio – mas, repito, não é uma alavanca”

isso, as sociedades de advogados são hoje a prática mais comum do exercício da advocacia. Advocatus | O mau funcionamento da Justiça prejudica a competitividade da nossa economia? JPAB | Apesar de não ser um problema exclusivo de Portugal, é evidente que prejudica a actividade económica. Como a justiça é demorada, os spreads bancários são mais elevados, por exemplo. O mau funcionamento da Justiça influi na fixação dos preços porque de antemão os empresários sabem da maior dificuldade em recuperar um crédito. Tem consequências na componente da empregabilidade. E também diminuiu o índice de confiança dos investidores. Agora não vamos esconder o sol com uma peneira. Um bom sistema de justiça é importante, mas não é a alavanca para a retoma da actividade económica. Não concordo com a facilidade com que por vezes se atiram para as costas da Justiça os problemas todos da economia portuguesa. Ainda que a Justiça estivesse a funcionar bem, não era por aí que recuperávamos economicamente. A Justiça tem de fazer o seu papel e deixar de ser um bloqueio – mas, repito, não é uma alavanca. Advocatus | Foi ministro da Justiça. Sentiu que devia ter mais poderes que os que tinha? JPAB | A pasta da Justiça é uma pasta importantíssima em Portugal. A minha experiência diz-me ser necessário reforçar os poderes da intervenção do ministro da Justiça na responsabilização e na execução. Advocatus | Gostava de voltar a ser ministro da Justiça? JPAB | Gostei de ser ministro da Justiça. Se se deve voltar ou não a um lugar onde se foi feliz? Deixo isso em reticências... Advocatus | Do que sente mais orgulho do que fez enquanto foi ministro? JPAB | De ter apresentado um guião para uma reforma da JusAgosto de 2010

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Entrevista

Edição vídeo desta entrevista em www.advocatus.pt

OS ASSOCIADOS

Maria Augusta Fernando Lic. Direito Coimbra (1990). Duas pós-graduações: em Direito dos Valores Mobiliários, Direito Lisboa/ Instituto dos Valores Mobiliários (2003) e em Contratos em Especial, pela Portucalense do Porto (2002). Frequência do Programa para Executivos de Fiscalidade Empresarial, pela Fac. Ciências Económicas e Empresariais da Católica Porto (2000). Secretária da Mesa da Assembleia Geral da Impresa

Ivone Rocha Lic. Direito Coimbra (1989). Três pós-graduações: O Novo Contencioso Administrativo, Católica Porto (2005); Ciências Jurídicas, Direito Lisboa (2000); Estudos Europeus, Direito Coimbra (1992). Mestrado em Direito Público, Católica Porto (2008). Presidente da Direcção da Eurojuris Portugal. Chairwoman do grupo permanente “Direito da Energia e do Ambiente” da Eurojuris

Maria Filomena Neto Lic. Direito Clássica Lisboa (1981). Duas pós-graduações: Direito de Protecção de Menores e em Human Rights and Democratisation- European Master’s Degree, ambas por Direito Coimbra. Membro da International Society of Family Law. Responsável pela implementação do protocolo relativo à violência doméstica, celebrado entre a Ordem dos Advogados Portugueses e a Comissão para a Igualdade dos Direitos das Mulheres, desde 2005

Pedro Botelho Gomes Lic. Direito Portucalense Porto (1987). Pós-Graduação em Direito do Trabalho, Direito Coimbra (2002). Sócio fundador da Associação Luso-Brasileira de Juristas do Trabalho (2004). Director do Departamento Jurídico da Ramirez & Raul S.A (Jan 90-Abr 00). Professor convidado na Católica Porto, onde lecciona duas cadeiras: Práticas Processuais Laborais e Praticum de Processo Civil

João de Castro Baptista Lic. Direito Coimbra (1998). Mestrando em Direito Civil, em Direito Coimbra. Três pós-graduações: Direito do Consumo, Direito Europeu da Banca, Bolsa e Seguros, Direito Penal Económico, todas em Direito Coimbra. Membro do Centro de Combate à Procuradoria Ilícita do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados (2002). Professor convidado Católica Porto, onde lecciona Processo Civil Prático e o seminário sobre Responsabilidade Civil Automóvel (desde 2003/2004)

Paulo Cutileiro Correia Lic. Direito Católica Porto (1996). Duas pós-graduações: Direito do Urbanismo, Ordenamento do Território e Ambiente, em Direito Coimbra, e Direito da Edificação e Construção, na Católica do Porto. Chefe de Gabinete do Grupo Parlamentar do PSD (09-10). Vereador da CM Porto (Jan 98-Out 05) com pelouros da Educação, Desporto, Juventude, Recursos Humanos e Euro 2004. Presidente da AE da Fac. Direito Católica Porto

Duarte Martins Carvalho Lic. Direito Católica Lisboa (1997). Pós-graduação em Práticas Processuais Forenses pela Católica Lisboa (2005). Cursos: A Salvaguarda Jurisdicional dos Direitos dos Particulares, Contencioso Administrativo e Fiscal (ambos na Católica Lisboa) e de Fiscalidade, pelo CECOA - Centro de Formação Profissional para o Comércio e Afins. Vice-Presidente da Direcção da Associação Portuguesa das Empresas Municipais

Domingos Jerónimo Lic. Direito Clássica Lisboa (1978). Cursos: O Novo Regime das Empreitadas de Obras Públicas, Católica Porto (2010) e Gestão Superior, Universidade de Kalmar, Suécia (1988/1989). Pós-graduação em O Novo Código dos Contratos Públicos”, Católica Porto (2009). Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros no XVI Governo Constitucional. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros no XV Governo. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro dos Negócios Estrangeiros no XII Governo

Diogo Feio Lic. Direito Católica Porto (1993). Mestrado em Ciências Jurídico-Políticas, Direito Coimbra (1998). Assistente Direito Clássica do Porto. Deputado no Parlamento Europeu desde Junho de 2009. Deputado à Assembleia da República na X Legislatura. Secretário de Estado da Educação no XVI Governo Constitucional

Diogo Vassalo Lic. Direito Coimbra (1993). Pós-graduação em Fiscalidade, pelo Instituto Superior de Gestão (1996). Responsável do Departamento Jurídico da Cotacâmbios (desde 1999). Director da Delegação de Coimbra da Direcção de Contencioso da instituição de crédito Banco Mais (Jun 92-Dez 1993). Membro da APF (Associação Portuguesa de Fiscalistas) e da AFP (Associação Fiscal Portuguesa)

tiça com princípio, meio e fim. Apresentei o Pacto para a Justiça em que dividi os sectores e as áreas onde entendia que a reforma devia acontecer de uma forma complementar: a constitucional, a do ordenamento das profissões e legislativa. No guião que apresentei aos partidos mostrei uma reforma que tinha de ir para lá de uma legislatura com um fio condutor e que tocava a dimensão constitucional, a 38

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dimensão das carreiras profissionais, da administração da máquina da justiça e da dimensão legislativa. Foi a primeira vez que se falou de um pacto da Justiça, que era um pacto diferente do que depois mais tarde veio a acontecer. Mas também me orgulho muito de pela primeira vez no nosso país ter nomeado uma mulher não juiz, a professora Anabela Miranda Rodrigues, para directora do Centro dos Estudos Judiciários.

Advocatus | E o que ficou por fazer? JPAB | Quase tudo. É um ritmo alucinante. A minha passagem pelo ministério, dizem, foi marcante, apesar de curta. É evidente que se sente a frustração de, tendo um projecto para executar, ver o mesmo posto em causa pela dissolução da AR e deixar uma equipa que estava altamente motivada para intervir. Devo dizer que no âmbito do Ministério da Justiça

(MJ) encontrei pessoas altamente mobilizadas para me acompanharem na reforma que eu pretendia. Nós, que vimos da actividade privada, pomos com muita facilidade em causa a qualidade dos quadros da Administração Pública. Neste caso do MJ, vim, nessa matéria, com outro retorno; saí mais agradado que quando entrei. Mas fiquei com pena de não ter podido concretizar o Pacto da Justiça que apresentei. O novo agregador da advocacia


www.advocatus.pt António Barradinhas Jornalista ab@briefing.pt

A Sérvulo & Associados acompanha o Estado Português com uma equipa multidisciplinar coordenada por três sócios, Rui Medeiros, Lino Torgal e Miguel Gorjão-Henriques, no processo sobre os direitos especiais que o Estado português detém na Portugal Telecom. Recorde-se que o Tribunal de Justiça Europeu decidiu que a existência da chamada golden share do Estado sobre a PT viola a lei comunitária, posição que o Governo português contesta, alegando que “as acções em causa são meras acções privilegiadas de direito privado que não podem ser equiparadas a golden share” e que “a existência destas acções apenas pode ser imputada à vontade da própria sociedade e não ao Estado. De acordo com fonte oficial da Sérvulo, citada pelo DE, “o que está em causa é a reconfiguração dos instrumentos adequados à salvaguarda dos interesses nacionais em jogo no sector das telecomunicações”.

SRS Advogados funde-se com Soares Machado

Pedro Rebelo de Sousa e José Carlos Soares Machado vão fundir as suas sociedades, permitindo posicionar a SRS Advogados num patamar de liderança da área de Contencioso. O funcionamento conjunto fará com que a equipa de Direito Contencioso da SRS Advogados, que tem vindo a crescer significativamente nos últimos anos, conte agora com a experiência e a contribuição do grupo de profissionais liderado por José Carlos Machado, especialista reconhecido nesta área do Direito. Soares Machado transita para a SRS com dez outros profissionais, de reconhecido percurso

profissional, que irão reforçar as áreas de Contencioso, Laboral e Público da SRS. Esta operação significa a primeira grande fusão entre sociedades de advogados portugueses este ano. Pedro Rebelo de Sousa, managing partner da SRS, refere que “a integração da equipa de Soares Machado no universo da SRS Advogados é um acréscimo de valor fortíssimo à nossa equipa de profissionais, que progressivamente reforça a sua liderança nas diferentes áreas do Direito”. José Soares Machado, sócio fundador da Soares Machado & Associados, acrescenta que “esta

fusão será benéfica para ambas a partes e muito relevante para a Soares Machado, na medida em que nos permite exercer o Direito numa sociedade também de elevado prestígio e focalizada, com grande experiência, em diferentes áreas de prática”. Fundada em 1991, a Soares Machado & Associados é uma das mais antigas e prestigiadas sociedades de advogados a actuar em Portugal. Conferencista e autor de várias obras, José Soares Machado foi Vogal do Conselho Geral e do Conselho Superior, bem como Presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados. Actualmente é Vogal da Comissão de Admissão e Controle dos Administradores de Insolvência, em representação do Ministro da Justiça. Após a expansão no universo da lusofonia, via alianças, a SRS Advogados afirma-se mais uma vez, com esta operação, como uma das maiores e mais dinâmicas sociedades de advogados portuguesas, reforçando a sua aposta na liderança em todas as áreas de prática e não afastando a possibilidade de futuras fusões.

A Abreu Advogados apoiou a sétima edição do Prémio Excelência, uma iniciativa da Casa de España em Lisboa, realizada no dia 8 de Julho, num almoço formal no Hotel Mirage em Cascais. A advogada Leonor Chastre representou a sociedade na cerimónia dos prémios que distingue empresas portuguesas de capital espanhol que se destaquem por factores como a produtividade, crescimento, geração de emprego ou autonomia financeira. O novo agregador da advocacia

Sociedades em litígio Oito ex-sócios da maior firma de advogados portuguesa, a PLMJ, que entretanto fundaram outro escritório, os AAA, reclamam cerca de 2ME à sociedade encabeçada por Luís Sáragga Leal. Segundo o Correio da Manhã (CM), a AAA reclama à PLMJ um valor referente a salários, prémios e lucros. A PLMJ desmente ter salários em dívida e o diferendo entre as duas firmas chegou ao Tribunal Cível de Lisboa. Fonte da PLMJ diz ao CM que a discórdia resulta de

diferentes interpretações de lucros entre sócios. A PLMJ contesta ainda os argumentos apresentados pelos antigos sócios, alegando que os prejudicados foram eles, reclamando 2,6ME de perdas por desvio de clientes e cerca de 20 mil horas não trabalhadas. Já segundo o Diário Económico, num comunicado interno emitido pelo escritório fundado por José Miguel Júdice, a PLMJ conta a sua versão da história, afirmando que de acordo com o entendimento

do conselho de Administração da firma, é antes a PLMJ que pode considerar-se “fortemente credora” deste grupo de advogados tendo em conta os “activos societários por eles levados”. A PLMJ alega ainda ter tentado um acordo extrajudicial com aquela equipa de advogados dissidentes, terminando o comunicado interno dizendo que esta acção visa “atingir a imagem, credibilidade e reputação” do escritório e dos seus colaboradores. Agosto de 2010

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pessoas

Direito entre os cursos com mais vagas Com cerca de 53 mil vagas, o curso de Direito lidera as licenciaturas com maior número de lugares disponíveis. Segundo dados oficiais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES), Direito “ganha” mais cem vagas que no ano passado, contando actualmente com 1330 lugares espalhados um pouco por todo o país. Só a Clássica oferece 600 vagas. Entre os maiores aumentos registados, contam-se a Faculdade de Direito da Universidade do Minho, com 150 lugares, o mesmo número existente, a partir de agora, na Faculdade de Direito da Universidade do Porto (FDUP).

ABBC apoia Festival ao Largo A ABBC foi, pelo segundo ano consecutivo, parceira institucional do Festival ao Largo, que proporcionou espectáculos culturais ao grande público, com entrada livre, entre 26 de Junho e 27 de Julho. Iniciativa do Teatro Nacional de São Carlos e da Companhia Nacional de Bailado, o festival ocupou o Largo de São Carlos, entre o teatro e o escritório da sociedade de advogados, com espectáculos de música, ópera e dança.

Coimas para as empresas que percam recursos A Autoridade da Concorrência (AdC) quer que os tribunais possam agravar as coimas aplicadas às empresas, nos casos em que estas não vençam os recursos sobre decisões da autoridade. 40

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Férias judiciais até Setembro Os tribunais estão em férias judiciais desde 15 de Julho, após o Governo ter aprovado um diploma que suspendeu os prazos processuais entre essa data e o dia 31 do mesmo mês. A medida veio assim colar-se às férias de Verão dos tribunais que abrangem todo o mês de Agosto.

Contas bancárias penhoradas sem ordem de um juiz A penhora de saldos bancários para pagamento de dívidas poderá vir a dispensar a autorização de um juiz. De acordo com uma notícia do DN, o Governo quer que seja suficiente uma ordem emanada por agente de execução – solicitador, advogado ou oficial de justiça – para que os devedores fiquem sem acesso às suas contas. Actualmente, existem pendentes 1,2 milhões de processos de execução, o que equivale, em média, a 1,8 mil milhões de euros em dívida.

Provedor de Justiça envia exame de advogados para TC O Provedor de Justiça considerou inconstitucional o exame de acesso ao estágio instituído pela Ordem dos Advogados (OA). Segundo publicado pelo DN, Alfredo José de Sousa pediu ao Tribunal Constitucional (TC) para fiscalizar essa norma, deixando claro se o exame de acesso ao estágio, que entrou em vigor em Janeiro, deve ou não fazer parte dos critérios de acesso à profissão. Os estatutos da OA só podem ser revistos pelo Governo, mas a discussão pode ser levantada pelo Parlamento.

VdA assessora Pelican SME O mercado da titularização de créditos português conheceu um novo capítulo na sua história, com a concretização da primeira operação envolvendo linhas de crédito em conta corrente a pequenas e médias empresas (PME) – Pelican SME No. 1. Já antes tinham sido realizadas operações tendo por base créditos concedidos a pequenas e médias empresas, mas é a primeira vez que são titularizadas linhas de crédito no âmbito de uma operação que mereceu rating AAA das duas agências de rating envolvidas. O originador destes créditos foi a Caixa Económica Montepio Geral, tendo a britânica J.P. Morgan actuado como arranger da operação. A assessoria jurídica foi prestada pelas sociedades de advogados António Frutuoso de Melo & Associados (advogados do originador) e Vieira de Almeida & Associados (advogados do arranger e do emitente, com responsabilidade pela redacção dos documentos da operação). No plano internacional a assessoria jurídica foi assegurada pela Clifford Chance LLP.

Paulo Rangel, sócio da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira (CGP) e eurodeputado, foi designado representante da Comissão de Assuntos Constitucionais do Parlamento Europeu no recém-criado grupo de trabalho para o Código Europeu de Direito Administrativo. O grupo é composto por sete eurodeputados, que vão começar por fazer uma compilação das normas europeias de Direito Administrativo, para depois avaliar e decidir se deve ou não existir um Código Europeu de Direito Administrativo. João Ildo de Freitas é a mais recente contratação da sociedade Almeida & Athayde, para reforçar o departamento de contencioso do escritório que representa em Portugal a sociedade britânica de advogados Kennedys. Fundada por Augusto de Albuquerque de Athayde, a sociedade é especializada em Direito Societário, Civil e dos Seguros.

Miguel Poiares Maduro, especialista em Direito Comunitário e da Concorrência, foi a 20 de Julho galardoado com o prémio Gulbenkian Ciência, pela Fundação Calouste Gulbenkian. Presidida por Rui Vilar, a fundação premeia, para além desta dintinção, ainda as categorias Beneficência, Arte, Educação e Prémio Internacional Calouste Gulbenkian. O novo agregador da advocacia


24 anos de

influĂŞncia


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Séries

Cláudia Köver Jornalista ck@briefing.pt

José Moreira da Silva é fã de Raul Vasconcelos

Com mais de 20 anos de existência, a sociedade de advogados fictícia Vasconcelos, Brito & Associados é uma das mais bem sucedidas da capital portuguesa, cujo prestígio se estende também ao seu co-fundador Raul Vasconcelos. A personagem de Liberdade 21, interpretada por António Capelo, é um homem de ego exacerbado e grande autoconfiança que José Moreira da Silva, sócio responsável pela área de Direito Público e Contencioso da Sociedade Rebelo de Sousa & Advogados Associados, descreve como s endo um retrato extremado do estereótipo do advogado de sucesso. De fora fica o aspecto “conquistador” de Raul Vasconcelos, acrescenta ainda José Moreira da Silva, que o leva a envolver-se em numerosos escândalos amorosos que muitas vezes se cruzam em demasia com a sua vida profissional. Divorciado pela terceira vez e com 55 anos de idade, Raul, que provém de uma família com tradição na área do Direito e uma forte educação católica, é, ao contrário dos seus antepassados, reconhecido pela rigidez dos seus princípios morais e éticos, “um homem excêntrico”. Astuto e conhecido por aceitar casos difíceis, Raul não gosta de sentir ameaças à sua liderança mas não se cinge de todo ao comportamento exemplar, chegando a gastar quatro mil euros em almoços e jantares, aumentando assim a irritação da co-fundadora da firma, Helena Brito, interpretada por Ana Nave. A relação entre ambos é muitas vezes impetuosa, muito devido aos comportamentos de Raul, que fuma charutos e ensaia passos de dança em reuniões. A série judicial da RTP estreou-se em Outubro de 2008 e reflecte o dia-a-dia de uma sociedade que emprega mais de uma centena de advogados. Apesar de ser impossível retratar fidedignamente esta ou qualquer outra realidade profissional, a personagem “desmistifica algumas concepções erradas transmitidas pelas séries norte-americanas, em que o papel do advogado pouco se assemelha ao existente em Portugal, além do essencial da defesa dos direitos do cliente”. 42

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Hóbi

Sara Graça

Advogada portuense, de 27 anos, Sara começou a carreira profissional no escritório de Lisboa da multinacional espanhola Uría Menéndez (2005). Terminado o estágio, emigrou para Inglaterra (2007), para se juntar ao então noivo, e fez um LLM (estudo avançado em Direito, equivalente a um MBA) em Direito Bancário e Financeiro, na Universidade de Londres. Nessa altura, surgiu o convite da Partners Group, uma empresa de private equity sedeada na Suíça, mas com uma filial na ilha de Mann (ao largo do Reino Unido), no departamento jurídico. Já casada, a jurista aceitou o novo desafio. Paralelamente, e porque sempre se interessou por artes gráficas, em 2009 Sara Graça lançou uma boutique de Design, Branding e Direcção de Arte intitulada “Design 302”, em conjunto com o marido, Francisco Castro Santos. Com clientes portugueses, ingleses, franceses e suíços, a empresa opera a partir de um estúdio capaz de dar resposta “às mais diversas ideias, de modo a que o cliente consiga obter um serviço total”, assegura a advogada. Desde filmar, editar, compor, produzir ou criar material para a Internet, a especialidade da “Design 302” é na área do impresso, ou seja, revistas, livros, posters e trabalhos tipográficos. O novo agregador da advocacia

Sara Graça 27 anos. Licenciada em Direito pela Escola do Porto da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa (2005). Integra o departamento jurídico da Partners Group, uma firma de private equity sedeada na Suíça, nas áreas de Bancário e Financeiro

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Conhaque

Despesas de representação

Manuel Falcão Director-geral da Nova Expressão

Cozinha superior, localização única Custos

Eleven

Rua Marquês da Fronteira, Jardim Amália Rodrigues, Alto do Parque Eduardo VII Estacionamento disponível Telefone 213 862 211 Fecha aos Domingos e Segunda-feira

Comecemos por uma verdade de La Palisse – o Eleven chama-se assim porque tem onze sócios, tudo figuras conhecidas – de empresários a advogados, incluindo obviamente o seu Chef, o alemão Joachim Koerper que antes de chegar a Portugal trabalhou em alguns dos grandes restaurantes da Europa. Inaugurado em Novembro de 2004, um ano depois recebia uma estrela Michelin, que tem mantido – felizmente sem recurso a espumas e artefactos moleculares e com grande recurso a produtos frescos locais – nomeadamente o peixe e o marisco.

Comodidades Uma das particularidades deste restaurante é que o edifício que o acolhe foi projectado pelo arquitecto João Correia (que integra o grupo de sócios) expressamente com o objectivo de albergar um restaurante de luxo num local absolutamente único – o alto do Parque Eduardo VII, no meio do jardim Amália Rodrigues, desenhado por Gonçalo Ribeiro Telles. Assim temos um edifício muito conseguido, no meio de uma área verde, num dos pontos mais altos da cidade, virado para uma vista fabulosa sobre Lisboa, o Tejo e a outra margem – nos dias bons é possível vislumbrar o recorte da Serra da Arrábida. Se a vista cativa, o interior do restaurante também: mesas espaçosas, confortáveis, serviço atento e muito profissional. Quem escolhe este restaurante pode concentrar-se apenas na refeição e na vista – magnífica quer de dia, quer de noite. O edifício dispõe ainda de um terraço por vezes utilizado para eventos e 44

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a equipa do Eleven tem sempre sugestões inesperadas em matéria de actividades. Este Verão, por exemplo, propõe o «Eleven no Tejo», um almoço com a marca da casa, servido a bordo de um catamaran, para dez pessoas, com um custo de 1200 euros. É uma das experiências propostas – a outra, já um clássico, a «escola de Chefs», proporciona uma manhã passada na cozinha do restaurante, a preparar o almoço, antecedida por uma visita, na companhia do chef, ao El Corte Inglés para selecção dos produtos.

Escolhas Mas passemos à substância. O Eleven proporciona sempre uma ementa da estação. Na deste Verão destaco duas entradas – a salada de lavagante e, sobretudo,

as bruschettas de sardinha em bolo do caco – uma maneira de Koerper mostrar a sua criatividade com produtos portugueses. Nos peixes escolho o robalo com crosta de amêndoa e nas carnes o carré de cordeiro com crosta de açafrão. Pode escolher à carta, ou optar ao almoço pelo Menu Executivo, que varia todos os dias mas tem como ponto de partida a ementa sazonal. Finalmente, se convencer os seus parceiros de mesa, pode optar pelo menu degustação numa das fórmulas possíveis. Volta e meia há umas surpresas que os empregados lhe revelarão, por exemplo um menu de lavagante. A garrafeira do restaurante é muito boa, mas se optar pelo Menu Executivo há uma escolha de vinhos incluída – e não desmerece.

Claro que com a qualidade da cozinha, a localização e o serviço exemplar, a factura não é leve. O menu executivo anda nos 40 euros por pessoa, mas uma escolha à carta com vinhos condizentes e refeição completa facilmente atinge os 70 euros por pessoa. E se houver alguma extravagância (saborosa, é certo), o aumento será proporcional. Em abono da verdade, também digo que mais depressa me disponho a pagar os 40 euros do Menu Executivo do Eleven, do que pagar igual nalguns locais muito em voga dos arredores de Lisboa que usam o lado very typical para apresentar facturas semelhantes. A clientela, claro, tem recursos para este padrão de preços e é basicamente empresarial, com um toque ou outro político. À noite há alguns turistas – e por falar nisso, este é o restaurante perfeito para levar algum visitante estrangeiro quer ao almoço, quer ao jantar. O efeito causado pelo local, pelo serviço e pela cozinha garante uma razoável dose de boa vontade na altura de passar a falar de negócios. Não há almoços grátis – isso aqui é uma evidência, mas pelo menos a impressão final é muito boa.

BANDA SONORA

Herbie Hancock: The Imagine Project Aos 70 anos e com mais de meia centena de álbuns no activo, Herbie Hancock continua a surpreender nas escolhas de repertório que faz, dentro do rumo de explorar as potencialidades de standards da música pop das últimas décadas. Há algum tempo, e pegando em canções de Joni Mitchell, Hancock fez um brilhante «The Joni Letters». Agora, e tomando como base o tema «Imagine» de John Lennon, Herbie Hancock junta uma série de artistas «num esforço para mostrar o poder e a beleza da colaboração a nível global como um caminho radioso para a paz», citação das notas de capa. No disco participam nomes como

Seal, Jeff Beck, Pink, Los Lobos, The Chieftains e Dave Matthews, entre outros. Destaco as versões de «Space Captain», uma canção popularizada por de Joe Cocker, «Don’t Give Up», de Peter Gabriel, «Tempo de Amor», de Baden Powell e Vinicius, e, sobretudo, as versões de «The Times They Are A Changin» de Bob Dylan e «Exodus» de Bob Marley. Disponível na FNAC.

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80 anos do Atmos Na sequência do 80.º aniversário do Atmos, a relojoeira Jaeger-LeCoultre e o designer Marc Newson juntaram-se na criação deste novo modelo, o Atmos 561. Este é um relógio de mesa fora do comum, envolvido numa bolha de cristal Baccarat. Marc Newson, admirador do Atmos há muitos anos, sugeriu colaborar nesta criação, tendo conseguido um resultado único e tão diferente de todos os outros Atmos criados desde 1928. Com uma série limitada de 888 exemplares, o Atmos 561 é diferente de tudo o que já foi visto, pois as horas e os minutos vêem-se através de um mostrador transparente, enquanto as duas funções suplementares se revelam em discos rotativos: o disco do centro mostra o mês em curso, o disco às 6 horas apresenta a fase da lua. Tudo isto através de um mecanismo único, de diferenças quase imperceptíveis da temperatura, o que o torna eterno. Este famoso e tão valioso relógio conta já com uma longa história e ao longo dos séculos foi presenteado a personalidades tão importantes como John Fitzgerald Kennedy, Sir Winston Churchill, Charles de Gaulle, Ronald Reagan, Charlie Chaplin ou o Papa João Paulo II.

Biotherm com primeira fragrância para Homem A Biotherm lançou o primeiro perfume para homem. 2010 foi o ano em que o mercado europeu e americano receberam esta nova fragrância Biotherm Homme Force, criada por Bruno Jovanovic. Com um toque cítrico, de água e madeira, este novo perfume pretende estimular a energia física e psicológica de cada homem. Lima, toranja, mandarim verde são alguns dos aromas que pode detectar no Biotherm Homme Force, e que contribuem para que quem o use se sinta confiante. Pode encontrar o novo produto Biotherm em frascos de 55ml e 100ml, em conjunto com um desodorizante de 150ml e um gel de banho de 200ml.

Jazz em Agosto De 6 a 15 de Agosto, a Fundação Calouste Gulbenkian recebe a 27.ª edição do Jazz em Agosto, que contará com a presença de nomes como John Surman, Steamboat Switzerland, Circulasione Totale Orchestra, entre muitos outros. Os concertos serão nos dias 6, 7, 8, 13, 14 e 15 de Agosto, possibilitando a ida de todos, mesmo os que trabalham. Este Festival tem início no dia 6 pelas 21h30 e acontecerá em variados Auditórios da Fundação, sendo que um deles é ao ar livre, o que permite aproveitar os fins de tarde com bom tempo e boa música. Para além dos concertos, o Jazz em Agosto contará ainda com um filme e uma Conferência — “Jazz Europeu e Jazz Americano: um diálogo não interrompido” — nos dias 14 e 15.

A Polaroid está de volta! Agora já pode voltar a tirar fotografias e obtê-las no momento! A nova Polaroid PoGo Instant Digital Camera é a nova aposta da já conhecida marca Polaroid. Com o aparecimento das máquinas fotográficas digitais, as Polaroid perderam o valor e uso que tinham. A instantaneidade da imagem em papel foi trocada pela instantaneidade da imagem digital. A Polaroid PoGo é a primeira máquina digital que traz incorporada uma impressora que imprime as fotografias em 60 segundos. Uma característica atraente desta nova máquina é o facto de se poder ver a fotografia e apagá-la se se quiser, sem que seja impressa automaticamente.

Vodafone lança smartphones Android A Vodafone lança dois smartphones Android, o Vodafone 845 e o Sony Ericsson X10 Mini Pro. O primeiro pode adquirir pelo preço mais competitivo do mercado, e possui características como o acesso à Internet e à loja online Android Market, ecrã táctil, módulo GPS, Wi-Fi e câmara de 3.2 megapixel. O segundo, para além de ser também um smartphone e ter o sistema operativo Android incorporado, tem igualmente um formato compacto com teclado QWERTY. Ecrã táctil, câmara de 5.0 megapixel, leitor de MP3, Wi-Fi e acesso ao Android Market, são as principais características deste novo telemóvel lançado pela Vodafone. Aproveite os preços baixos e compre o seu Android. O novo agregador da advocacia

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Ramon de Melo

Joana Andrade Correia

Advogada da Raposo Bernardo e Associados, Joana é natural da Beira Alta e escolheu esta obra, intitulada “Vista da Penha de França – Lisboa”, porque a paisagem retratada a recorda de alguns cenários que conheceu durante a infância, nos arredores de Viseu. Por uma necessidade de preservação desta pintura a óleo sobre tela, o quadro encontra-se exposto numa área mais reservada do escritório fundado por Nélson Raposo Bernardo, numa sala destinada a conferências internas dos colaboradores. Nela pode ver-se como era a paisagem desta colina de Lisboa há 151 anos atrás. “Vê-se a igreja que está lá longe, e um pouco da estrutura de edifícios do topo da colina”, descreve a advogada, adiantando ainda que “existe uma fotografia no arquivo histórico da Câmara Municipal de Lisboa que retrata também esta colina, contendo imensas semelhanças com esta obra”. Sobre as sensações que a imagem lhe desperta, Joana fala em inspiração e tranquilidade: “De certo modo, permite-me sair por breves momentos do bulício e azáfama da nossa vida actual e transportar-me para a tranquilidade e simplicidade da vida no séc. XIX”, conclui.

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Isaías Newton Pintor português do período do romantismo, Isaías Newton (1838-1921) pintou sobretudo paisagens. É um dos mais importantes vultos deste período na pintura portuguesa, juntamente com Roquemont, Tomás da Anunciação (do qual ele foi discípulo), João Cristino da Silva e Francisco Metrass

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