A máfia da grilagem no DF

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DOMINGO 8 de janeiro de 2012 Ano 41

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Nº 13.098

MICHAEL MELO

Exemplar de assinante

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Grileiros vão ter bens confiscados Para isso, novas e severas medidas, como integração entre as polícias, serão adotadas no DF. Cidades, páginas 4 e 5 MICHAEL MELO

Praia, livros ou os dois? Viajar e continuar sua preparação para um concurso é possível. Júlia Satie já sabe como. Concursos & Carreiras

Nova lei contra o cigarro

Ponto para as autoridades. Lei que proíbe o veneno dentro de veículos deve entrar em vigor no dia 29 de março. Cidades, páginas 8 e 9

Big brother sobre rodas Dotadas de câmeras que podem vigiar tudo num raio de 800 metros, centrais móveis de monitoramento estão a serviço do Detran, experimentalmente, por 60 dias. Cidades, página 6

Golpes caem na cidade

Tem ex-miss Brasil na floresta

Vem aí o seguro de baixo custo: até pelo celular

Cultura, página 37

Economia, página 31

A dura missão de substituir um santo

Mãe que deixou bebê se entrega à polícia Cidades, página 11

Torcida, página 51 PIERVI FONSECA/AGIF/AE

DIVULGAÇÃO

A criatividade dos estelionatários, entretanto, cresce cada vez mais. Assim, “parente em dificuldade” e “falso sequestro” são as bolas da vez entre criminosos. Segurança, páginas 12 e 13


4l Domingo, 8 de janeiro de 2012 l Jornal de Brasília

CIDADES

Mande sua sugestão de pauta para o Jornal de Brasília: Nosso telefone é 3343-8051, ou mande para o e-mail redacao@jornaldebrasilia.com.br.

Editora: Nelza Cristina [nelza@jornaldebrasilia.com.br]. Subeditoras: Elza Troncoso e Roberta Luiza. Redatora: Carolina Tulim. Fone: 3343-8061 ou 3343-8097

GRILAGEM DE TERRAS

Ação combatida

l Atividade é tida como um dos crimes mais rentáveis e que não são punidos exemplarmente

com rigor total ! Bruna Sensêve

GLAUCYA BRAGA

bruna.senseve@jornaldebrasilia.com.br

S

ete prisões por grilagem de terras foram feitas em menos de 30 dias no Distrito Federal. Esse é o rendimento que a Delegacia Especial de Proteção ao Meio Ambiente e à Ordem Urbanística (Dema) quer manter em 2012. A detenção de pessoas que fazem o parcelamento irregular de terras no DF será endurecida. A primeira medida é manter atrás das grades todas as pessoas flagradas vendendo lotes ou loteando terrenos. A rentabilidade desse negócio também será atacada de frente. O patrimônio do grileiro será relacionado e os bens serão expropriados. Duas pessoas presas em flagrante por parcelamento nas últimas operações da Polícia Civil continuam detidas. Os autos em flagrante agora serão convertidos em prisão preventiva e todo o patrimônio adquirido de forma ilícita e criminosa terá ações movidas para expropriação dos bens. As medidas serão aplicadas aos negociadores de pequeno a grande porte. As medidas, inclusive, já se aplicam às últimas apreensões. Para isso, o combate foi reforçado. O diretor do Departamento de Polícia Especializada (DPE), delegado Mauro Cezar Lima, afirma que todo o trabalho da DPE será realizado de forma integrada. “A polícia que combate as drogas também vai dar apoio ao combate à grilagem. Aqueles que combatem o crime contra a mulher também vão combater a grilagem de terras e vice-versa. Estamos interagindo. A polícia trabalha integrada, não são mais delegacias especializadas isoladas”, explica. IMPUNIDADE A grilagem seria um dos crimes mais rentáveis e sem punição rigorosa. A DPE buscou junto ao Poder Judiciário e ao Ministério Público a efetivação da ação policial que, até então, não conseguia manter grileiros presos por muito tempo. “Tanto é verdade que pouco tempo atrás os grileiros levavam milhões fatiando uma cidade inteira. Eram autuados em flagrante e não acontecia nada. Nenhum deles era condenado. Nenhum deles pagava por seus crimes”, afirma o delegado. Ele considera que muitas vezes a legislação é benevolente com alguns criminosos e a equipe da Dema agora atua de forma específica para combater a grilagem de terras.

SAIBA No parcelamento irregular no Morro da Cruz, em São Sebastião, dos 42 lotes, 38 foram vendidos. Cada um, por R$ 20 mil, rendendo R$ 760 mil aos grileiros

Um dos suspeitos ainda detidos, J.M.R., 54 anos, foi flagrado comandando a ação de uma máquina retroescavadeira em área pública, na Chácara Floresta, no Núcleo Rural Ponte Alta Norte, no Gama, na última quarta-feira. Ruas eram abertas, retirando a vegetação para um futuro parcelamento ilegal do solo. Com ele estavam cópias de cessão de direitos de lotes, um cheque, um mapa com demarcação de lotes e alguns comprovantes de anúncios em jornais. Ele foi identificado como corretor de imóveis e dono de uma imobiliária, no Gama, onde os agentes confiscaram mais documentos que comprovam a venda de áreas públicos. J.M.R. também possui extensa ficha policial – sete passagens por estelionato, uma por formação de quadrilha e essa por parcelamento irregular. Em outro caso, W.F.A., de 41 anos, foi preso em 8 de dezembro de 2011, junto com

J.M.S. pelo parcelamento irregular de terrenos no bairro Morro da Cruz, em São Sebastião. De acordo com informações da Dema, ele negociava os terrenos de uma chácara parcelada em 42 lotes, sendo que 38 deles já estavam vendidos. Cada um, pela quantia de R$ 20 mil. No total, foram R$ 760 mil ganhos com a venda irregular. “Antes, ele recebia todo o dinheiro e, se flagrado, ficava preso por um ou dois dias. Ele saía no lucro, o que o levava a pensar que o crime compensa”, argumenta o delegado da Dema, Marcelo Zago. Nesse caso, o crime foi confessado mais tarde, durante a depoimento na delegacia. Por isso, a clareza nos dados fornecidos. O delegado afirma que os dois passaram bastante tempo presos, mas já foram liberados. “Continuamos com a investigação para finalizar o inquérito policial.”

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De acordo com a legislação vigente, a pessoa que é pega fazendo a grilagem de terras incorre no crime de solo urbano. Muitas vezes, o crime é qualificado pois o parcelamento é destinado à venda. A pena é de um a cinco anos de reclusão. Se a área for de preservação ambiental, a pessoa também responde pelo crime ambiental. Isso porque para o parcelamento precisam ser abertas ruas e feitos piquetes e cercados, o que não é permitido dentro de Áreas de Preservação Permanente (APP) e Preservação Ambiental (APA). Os dois crimes somados podem acumular até sete anos de pena. Dependendo da área ocupada, a pena pode alcançar até nove anos.


Domingo, 8 de janeiro de 2012

Jornal de Brasília

CIDADES

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FOTOS: GEYZON LENIN

Ocupações proibidas

Dois homens foram detidos pela venda de lotes localizados em duas chácaras no Altiplano Leste na região do Lago Sul (acima). Os delegados Mauro Cezar, da DPE, e Marcelo, da Dema, explicam que agora todas as delegacias vão atuar conjuntamente para combater a grilagem de terras

Comprador será punido No momento em que os dois suspeitos eram autuados em Morro da Cruz, na região de São Sebastião, por parcelamento irregular de terras, um de seus clientes chegou ao local. O comprador queria o número da conta bancária na qual seria feito o depósito para a aquisição de dois lotes. Ele também foi levado à delegacia, onde prestou depoimento sobre a atividade ilegal. Segundo o delegado Mauro Cezar, o comprador também passará a ser responsabilizado criminalmente. Portanto, além de perder o dinheiro e o material de construção, quem compra lote de grileiros também deverá ser indiciado. “E não adianta falar que é comprador de boa-fé. Na nossa visão, ele é o grande incentivador para o parcelamento irregular e o crime ambiental. Vamos dar um tratamento à altura para quem se diz vítima e não é vítima coisa nenhuma. Vítimas são o Estado, o meio ambiente e a população”, afirma Mauro Cezar. Segundo informações da Dema, na maioria dos casos onde há área com dano ambiental o comprador não pode construir, pois provocará um dano ainda maior e corre o risco de, além de ter o dinheiro perdido, também ser preso em flagrante. O delegado Marcelo Zago alerta que as áreas são monitoradas constantemente. M.N.L.P., 43 anos, permanece presa por parcelamento de lotes, no Condomínio Veneza, na região do Lago Sul, próximo ao Condomínio Quintas da Alvorada. A Operação Teia de Aranha, deflagrada no dia 10 de dezembro, apreendeu a mulher, que se identificou como gerente do parcelamento, junto a

“Vamos dar um tratamento à altura para quem se diz vítima e não é. Vítimas são o Estado, o meio ambiente e a população” Mauro Cezar Lima, diretor da DPE

outros três homens que também foram indiciados. Ela comandava retroescavadeiras que abriam ruas no terreno. A suspeita já tinha antecedentes criminais de parcelamento de solo. Segundo o delegado Mauro Cezar, a impunidade anterior foi anunciada pela mulher, que declarou, ao chegar à delegacia, que não permaneceria por mais de dois dias em detenção, como teria acontecido da última vez. Já G.T.C., 36 anos, responde em liberdade por parcelamento de solo. C.M.O.T., 46 anos, e J.C.V., 44 anos, respondem, também em liberdade, por dano ambiental. O site do condomínio, no entanto, continua no ar. Informações colocadas na página da internet mostram que o ano de 2011 foi destinado à eleição de síndico, subsíndico e con-

selho fiscal do parcelamento. Os dados mostram que o parcelamento estava em processo de consolidação. A reportagem do JBr identificou também dois anúncios na internet para a venda de lotes nesse condomínio. De acordo com um deles, são 23 lotes para venda ou troca por imóveis no Distrito Federal. Cada um, com área de 4.683 metros quadrados, custaria R$ 350 mil, e a pavimentação estaria em andamento. O vendedor não atendeu às ligações da equipe. O site do condomínio também indica o Condomínio Portal do Lago Sul como referência. Em ligação, ninguém soube informar sobre o Residencial Veneza. PRISÕES O primeiro registro de prisões do ano foi em 2 de fevereiro, quando D.S.G. e R.A.R. foram flagrados vendendo lotes provenientes de parcelamento irregular no Setor de Mansões Lago Norte. Em março, quatro novas prisões foram realizadas pelo mesmo crime. O casal de irmãos M.O. e O.O.F. vendiam lotes localizados em duas chácaras no Altiplano Leste, na região do Lago Sul. Duas outras prisões foram feita na tarde do dia 26 de março de 2011. Os dois grileiros foram flagrados na Chácara 117 do Condomínio Sol Nascente, em Ceilândia, com 166 notas promissórias, dois mapas, duas agendas com acertos de compras ilegais, cessões de direito e R$ 4.262 em espécie. O registro foi feito na 19ª Delegacia de Polícia, após a operação conjunta da Secretaria da Ordem Pública e Social (Seops) e Polícia Militar.

Novas construções e ocupações em áreas irregulares estão proibidas desde a publicação do Termo de Ajustamento de Conduta 002/2007, assinado entre o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e o Governo do Distrito Federal (GDF). O intuito era conter o avanço na ocupação irregular. Hoje, praticamente um terço da população do Distrito Federal vive em áreas irregulares. Pelo mesmo motivo, foi criado, no início do ano passado, o Comitê de Combate ao Uso Irregular do Solo, coordenador pela Secretaria de Ordem Pública e Social e formado por diversos órgãos da administração pública. No entanto, com relação à grilagem de terras, a Seops afirmou por meio de sua assessoria que o seu trabalho está focado nas ações de vigilância para impedir novas invasões e parcelamentos. Por conta disso, os casos em que há flagrantes de grilagem em ações da Seops não ocorreriam com tanta frequência. A Seops teve como saldo de 2011, quase três mil erradicações de construções irregulares em todo DF. Também no primeiro semestre de 2011, o secretário de Habitação, Geraldo Magela, anunciou que novos ocupantes de terrenos irregulares não terão suas terras regularizadas. Ele explicou que os compradores de grileiros podem ser considerados cúmplices da ação criminosa. No entanto, a venda dos lotes não está legalmente proibida. O maior dano é para quem compra o terreno que, na melhor das hipóteses, deverá pagar novamente. Novas ligações de energia e água também estariam proibidas para áreas irregulares.

Em casos específicos A Secretaria de Regularização, Habitação e Desenvolvimento Urbano do DF (Sedhab) informou, por meio de nota, que, no caso de lotes localizados nas áreas de habitação de interesse social em processo de regularização, não há nada que impeça a venda individual. Se a pessoa ocupava o lote antes da selagem – processo em que é feito o cadastro do lote e da família ocupante – e o lote foi selado, deverá ser regularizado. A partir daí, qualquer transferência de domínio será detectada pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional (Codhab). No caso da compra ter sido realizada depois da selagem e o morador havia sido cadastrado nos programas habitacionais, o lote é passível de regularização. Porém, o segundo morador deverá possuir um documento de transferência do morador original. Por se tratar de lotes em áreas destinadas à habitação de interesse social, como é o caso dos condomínios Sol Nascente e Pôr do Sol, em Ceilândia, também será verificado se o ocupante está enquadrado na política habitacional, como o morador original na época da selagem. Onde não há processo de regularização, a Sedhab afirma que o governo não tem como intervir. Novas invasões, no entanto, não são permitidas desde a posse do atual governo.


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CIDADES

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GRILAGEM DE TERRAS

Artimanhas para

burlar a polícia l Criminosos usam artifícios para aparentar ter mais tempo de permanência nos lotes ! Bruna Sensêve bruna.senseve@jornaldebrasilia.com.br

A

dificuldade da força policial em alcançar os grileiros está na produção de provas contra essas pessoas. Assim como todo tipo de ato criminoso, os parceladores moldam seus métodos de acordo com a ação repressiva. Hoje, até árvores adultas e paredes inteiras são transportadas ao lote grilado para falsificar uma permanência anterior e de longa duração. O delegado Marcelo Zago, da Delegacia Especial de Proteção ao Meio Ambiente e à Ordem Urbanística (DEMA), garante que a estratégia não consegue burlar a perícia policial. “Produzir provas contra o crime organizado não é fácil. Eles se moldam, se aperfeiçoam e se qualificam de acordo com a nossa ação repressiva. Eles têm bons advogados,

que também levam sua parte”, afirma o diretor do Departamento de Polícia Especializada (DPE), delegado Mauro Cezar Lima. O crime fundiário é mutante e aproveita brechas na fiscalização e falhas legislativas para encontrar seu espaço. A técnica mais nova usada por esses criminosos é a compra de material envelhecido e grandes árvores adultas. A vegetação serviria como prova de que os ocupantes se estabeleceram na região há muito tempo. Ela também ajudaria a esconder as construções que se seguem, formando em alguns casos grandes paredes de árvores nos limites do lote, que tornam impossível ver o interior do terreno. O objetivo é atestar para a perícia policial, se forem flagrados, que estão ali há muito tempo e até acompanharam o crescimento das plantas. “Algumas alvenarias eles trazem

“Eles (grileiros) se moldam, se aperfeiçoam e se qualificam de acordo com a nossa ação repressiva” Mauro Cezar Lima, delegado

prontas. Acham que se fizermos uma perícia ali vamos concluir que aquela janela, porta ou árvore já estão no local há muito anos”, descreve o delegado Marcelo Zago. Ele conta ainda que já presenciou casos em que

paredes inteiras de casas mais antigas foram transportadas para o parcelamento e unidas, como se fossem pré-moldadas. A venda de lotes não é tão explícita como acontecia há algum tempo. Os grileiros sabem que as faixas são indícios que levam a polícia até o local. Os anúncios são feitos de forma mais acanhada, no boca-a-boca entre os compradores, que podem até conseguir descontos no caso de indicações de novos clientes. A ação também aproveita os fins de semana e a escuridão noturna para não serem tão notados. O material de publicidade dos lotes oferecidos é dirigido ao público comprador, que sabe procurar em jornais e sites na internet os locais de anúncio. No período de fim e início de ano, as invasões e construções irregulares tende a aumentar. Segundo a polícia, isso acontece porque as

pessoas costumam achar que a fiscalização fica mais frouxa e que é mais fácil consolidar o lote ou condomínio irregular. No entanto, o delegado Mauro Cezar afirma que a ação realizada no último mês coibiu a ação desses criminosos. As sete prisões em 30 dias de grileiros em três regiões administrativas do Distrito Federal teria coibido a continuidade de outras ações. “Eles se comunicam e sabem que estamos integrados e trabalhando contra essas irregularidades. Por isso, tendem a se retrair”, detalha o delegado Mauro Cezar. Ele explica que muitos inquéritos estão em andamento na Dema , inclusive das regiões consideradas as mais visadas para ocupações irregulares, como Vicente Pires, Estrutural, Arniqueiras, Altiplano Leste, São Sebastião e os condomínios Sol Nascente e Pôr do Sol, em Ceilândia.

FOTOS: GEYZON LENIN

Vegetação e alvenaria antigas são compradas pelos falsários para tentar convencer os policiais de que a ocupação é antiga


Segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

SAIBA

Jornal de Brasília

A grilagem A grilagem nada mais é que a apropriação indevida de terras públicas, por meio da falsificação de documentos. Vários são os interesses para a existência dessa prática: especulação imobiliária, venda de recursos naturais do local (principalmente madeira), lavagem de dinheiro e até captação de recursos financeiros. A grilagem de terra conta hoje também com a ajuda da tecnologia, seja com o GPS, que ajuda na localização das terras, seja com a própria internet, onde são vendidos lotes enormes de terra sem nenhuma comprovação documental definitiva. O grileiro Grileiro é um termo que designa quem falsifica documentos para de forma ilegal tornar-se dono por direito de terras devolutas ou de terceiros ou ainda quem está na posse ilegal de prédios ou prédios indivisos, por meio de documentos falsificados. Também é utilizada quando uma pessoa consegue várias procurações falsas de pessoas desconhecidas, geralmente camponeses que assinam os papéis para seus "patrões". Com estes documentos falsos é realizada a compra de várias propriedades vizinhas, como se fosse um grande loteamento. Porém, na verdade estas várias propriedades unidas formavam um grande latifúndio. É bom lembrar que grileiro não é a mesma coisa que posseiro. O primeiro normalmente tem poderio econômico, circula nos corredores do poder e não vive na terra. O posseiro é aquele pequeno agricultor que toma posse da terra para sobrevivência. Os caminhos da grilagem Como já foi dito não há um só caminho para a grilagem de terra. Vamos explicar alguns dos modos como esses criminosos esquentam documentação e ganham dinheiro. Usando documentos antigos Uma das maneiras de fazer a grilagem é criar uma falsa cadeia patrimonial do imóvel. A cadeia patrimonial é a história cronológica dos antigos donos de uma determinada propriedade ou área. Assim, para conseguir grilar, os falsificadores mudam a cadeia patrimonial e chegam até a criar documentos falsos. Os contratos de concessão de terra pública, uma autorização para uso da terra com Fonte: www.hsw.uol.com.br

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Verdadeiro faroeste

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Por que grilagem? O termo grilagem vem de um antigo macete dos falsificadores. Para dar aspecto de velho aos documentos criados por eles, os falsários deixavam os papéis em gavetas com insetos como o grilo. Com a ação dos animais, os papéis ganhavam a coloração amarelada com aspecto de gastos.

CIDADES

diversos parâmetros, dados nos anos de 1970 são os mais usados no Distrito Federal. Invadindo a terra Outra forma de grilar é simplesmente colocar uma cerca na área que interessa. Depois disso, são colocadas pessoas para vigiar o lote. No Distrito Federal, muitas vezes, famílias são pagas para morar em uma pequena casa no meio do lote. A manobra facilita possíveis problemas judiciais. Arrendando a terra Outra tática usada é convencer posseiros a venderem seus títulos de posse. Esses documentos não são necessariamente comprovação de propriedades, mas uma espécie de autorização para o uso da terra. Com eles na mão, o grileiro acaba forçando os posseiros vizinhos a entregarem suas propriedades, muitas vezes com violência. Usando laranjas e fantasmas Uma tática para evitar a exposição do grileiro é usar “laranjas”, pessoas que emprestam seu nome ingenuamente ou coniventemente para o grileiro. Há também casos de simples nomes falsos ou “fantasmas”. O cuidado existe porque, por lei, qualquer terra pública com mais de 2.500 hectares que for transferida para mão de particulares deve receber aprovação do Congresso Nacional. Como ninguém quer esse tipo de exposição, o jeito é usar “laranjas” e “fantasmas” para dividir os hectares. Fraudes grosseiras Muitas das fraudes feitas chegam a ser grosseiras. Em alguns casos, os documentos têm informações discrepantes dos limites da propriedade. Em outras são feitas rasuras para mudar nomes ou limites. Há quem apenas coloque um número na frente para transformar os 10 mil hectares, por exemplo, em 110 mil hectares. Outros simplesmente inventam os limites de suas supostas terras e, com a conivência do cartório, registra em um livro de registro de imóveis.

A Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) oferece o serviço de informações sobre a regularidade das terras no DF. As informações são fornecidas por meio da gerência comercial do órgão, com o objetivo de que menos terras públicas sejam ocupadas irregularmente. De acordo com a Terracap, o serviço é utilizado pela população, mas o órgão não sabe especificar a quantidade de pedidos que são recebidas por mês – sabe-se que ainda são poucos. Para o professor de arquitetura e urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), Frederico Flósculo, o comprador é tão ou mais responsável pela venda indiscriminada de lotes em terras irregulares, independentemente de ser feita por um grileiro ou o ocupante atual. O professor discorda do que foi informado pela Secretaria de Regularização, Habitação e Desenvolvimento Urbano (Sedhab) em reportagem publicada ontem no Jornal de Brasília. Para ele, a venda de qualquer lote em área irregular é criminosa e configura um enorme dano para a população e o Distrito Federal como um todo. Na reportagem sobre o mesmo assunto, a Sedhab, por meio de nota, informou que a venda individual dos lotes em áreas irregulares não é legalmente proibida. No caso de terrenos passíveis de regularização que não estejam incluídos em áreas destinadas a programas de interesse social, a única penalidade para o comprador irregular é pagar novamente pelo lote, quando este for licitado pelo órgão proprietário. TOTALMENTE IRREGULAR Atualmente, toda a cidade de Vicente Pires encontra-se em área

irregular, nenhum de seus moradores possuem escritura do lote onde moram. Da mesma forma vive grande parte dos moradores de condomínios no Jardim Botânico, Grande Colorado, Sobradinho, Itapoã, entre outras tantas cidades do DF. Mesmo com o interesse pela regularização de seus terrenos, alguns moradores já chegam a mais de 30 anos de espera e ainda sem previsão de quando serão atendidos. Em Vicente Pires é possível flagrar dezenas de faixas para a venda de lotes sem ocupação consolidada. A compra e a venda desses terrenos que pertencem à União é feita por ocupantes que oferecem como única garantia uma concessão de uso de terra pública, que não é reconhecida pela Sedhab como documentação válida para a regularização futura. “Esse é o faroeste do DF. As pessoas já perderam a noção do estado de direito. O cidadão olha para o Estado, se ele não está a impor a lei e a ordem, uma nova lei ilegal e outra ordem desordeira se impõe”, diz. Ele acredita que quando criminosos começaram a fazer vendas e o governo não agiu, a cidadania foi corrompida. Flósculo conta que conhece casos de professores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB que são compradores destes lotes. “São pessoas que sabem do crime que estão cometendo e, mesmo assim, estão associados ao crime fundiário de Brasília”. De 1990 ao final dos anos 2000, a corrupção fundiária teria tomado a cidade e o controle sobre a ocupação de terras públicas ou rurais não existiu mais. “Teve grilagem de rico, pobre, classe média, magistrado, professor, policial. A população se corrompeu”.

GLAUCYA BRAGA

"Legalização" das terras Depois de feitas algumas dessas falcatruas, é só procurar um cartório para “legalizar” sua terra. Com o documento em mãos, começa a outra fase que é dar credibilidade para o documento. Como? Registrando o documento em outros órgãos públicos como institutos de terras estaduais, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) ou Receita Federal. Daí, é só começar a pedir autorização para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e começar a explorar ou usar a terra para vender e assim esquentar a terra. Além disso, muitos deles chegam a conseguir empréstimos em bancos privados e até públicos. Na Ponte Alta, faixas sinalizam a venda dos lotes: este tipo de publicidade é pista para a polícia combater o crime


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CIDADES

Terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Jornal de Brasília

VICTOR AUGUSTO

GRILAGEM DE TERRA

l Maioria dos que se arriscaria avalia que local seria regularizado pelo governo ! Bruna Sensêve bruna.senseve@jornaldebrasilia.com.br

A

inda existem pessoas que comprariam suas habitações em áreas consideradas irregulares, sem preocupações, conforme constatou uma enquete do portal Clicabrasília, do Grupo Jornal de Brasília. Pouco mais de 37,69% confessaram não ver problema na compra de lotes ou casas irregulares, enquanto 62,31% responderam não comprar esse tipo de imóvel. Conforme a enquete, isso seria motivado principalmente pela certeza de que o local seria regularizado pelo governo, mais cedo ou mais tarde, segundo 46,67% dos internautas. Em segundo lugar nos motivos pelos quais comprariam um imóvel irregular, está a falta de punição (26,67%) bem próxima ao preço dos imóveis regulares, considerados muito elevados (22,96%). Alguns ainda responderam que a localização dos lotes e casas irregulares é melhor (3,68%). Para o arquiteto Marcelo Montiel da Rocha, 50 anos, o motivo seria a falta de infraestrutura nos lotes regulares. Ele é responsável pelo projeto do bairro Chapéu de Pedra, localizado no Setor Habitacional Tororó,

SAIBA

próximo ao Jardim Botânico. Esse é um dos pontos onde é possível comprar um lote regular no DF. A chácara era do pai de Marcelo, o também arquiteto Gladson da Rocha. São 21 hectares que foram divididos em 249 lotes residenciais e 20 comerciais. As dificuldades para fazer o parcelamento legal do terreno foram grandes e foi necessário bastante paciência. Foram mais de oito anos do início do processo até que fosse possível ter em mãos as escrituras individuais de cada lote. Por ter seguido os trâmites legais, o parcelamento não pode ser fechado, como ocorre com grande parte dos condomínios irregulares do DF. A regularização desses parcelamentos, inclusive, passa pela possibilidade de retirada de portões, muros e portarias. No entanto, no caso de Chapéu de Pedra, a característica prejudica muitos compradores e moradores. “Lá, não é condomínio, é parcelamento urbano regular, e não poderia ser fechado. Precisou ser aberto. Se fosse fechado valeria mais e estariam totalmente construídos”, avalia Marcelo. A área ainda é pouco habitada pelos donos dos lotes. Uma das principais preocupações é a segurança que não é provida pelo poder público e não pode ser implementada pelo dono dos lotes. Diferentemente do que foi constado na enquete do portal Clicabrasilia, Marcelo vê como o maior atrativo para a irregularidade a infraestrutura oferecida pelos condomínios. Grande parte tem segurança privada e toda a instalação de rede elétrica, água potável, ruas e iluminação interna.

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Atualmente, cerca de um terço da população residente no Distrito Federal ocupa áreas irregulares. Ao todo. são 513 condomínios horizontais onde apenas sete possuem suas escrituras em mãos. Desde o início do ano passado,

órgãos da administração pública buscam o endurecimento nas medidas de prevenção contra novas invasões e construções em áreas irregulares. No último mês, sete pessoas foram presas por parcelamento irregular do solo urbano no DF.

CEDOC/JOSEMAR GONÇALVES 30.09.11

Dispostos a ocupar área ilegal Marcelo (acima) é responsável pelo Chapéu de Pedra, um dos poucos loteamentos regulares do DF com lotes disponíveis. Kátia (ao lado) comprou um terreno lá, mas não se mudou pela falta de infraestrutura

Infraestrutura deficiente A servidora pública Kátia Nunes acredita ter tido uma atitude diferente de muitas outras pessoas que decidem mudar para uma casa no Distrito Federal. Ela e o marido buscar alternativa regulares de moradia junto à Secretaria de Regularização, Habitação e Desenvolvimento Urbano do Distrito Federal (Sedhab) e à Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) e lhes foram dadas duas opções de terrenos regulares onde

pudessem construir. A primeira era exatamente no bairro Chapéu de Pedra e a segunda estava em Sobradinho. Por ter familiares que moram no Lago Sul, Kátia optou pelo terreno no Setor Habitacional Tororó. Ela confessa que a tentação foi grande e muitos amigos e familiares a aconselharam a buscar um terreno irregular que ofereceria vantagens, como infraestrutura e proximidade do Plano Piloto.

O sonho da moradia regular, porém, não foi tão bem sucedido. Há mais de dez anos da compra, o casal ainda não se mudou para o local. “Telefone e televisão a cabo não chegam aqui”, diz Kátia. Em um condomínio irregular vizinho, no entanto, todos os serviços são fornecidos. Ela procurou vários órgãos, que também não souberam explicar a Kátia porque seu lote regular não dispunha dos mesmos serviços.

Ocupações são reprimidas A consolidação de mais um parcelamento irregular no Distrito Federal foi impedida. Uma ação do Comitê de Combate ao Uso Irregular do Solo, coordenado pela Secretaria de Ordem Pública e Social (Seops), evitou o loteamento de mais um terreno na área pública conhecida como Assentamento 26 de dezembro, localizada na DF-001, em Taguatinga, na saída para Brazlândia. Na operação, realizada na manhã de ontem, foi removida uma

edificação de alvenaria de cem metros quadrados em construção. As paredes que estavam erguidas, duas bases e cem metros lineares de arame que demarcavam a área, foram removidos do local. Duas cisternas e duas fossas sanitárias também foram inutilizadas. De acordo com a Seops, os pontos localizados na Rua 01 acabaram identificados após uma vigilância dos agentes no local. O Setor Habitacional Arniqueiras também passou por operação

nesta segunda-feira. O Grupo Emergencial de Combate a Ocupações Irregulares (Gecoi), criado especificamente para monitorar as atividades do bairro, erradicou duas edificações. A primeira, com 15 metros quadrados inacabados, nos fundos da Chácara 21 da Colônia Agrícola Águas Claras, e outra com 40 metros quadrados, também inacabada, um muro de oito metros lineares e um portão metálico, na Chácara 42 do Conjunto 03.


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