Sollicitare n.º 10

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Sollicitare E DIÇ ÃO N.º 10 \ MA IO 2012

Alfredo José de Sousa

Por uma Justiça (cada vez mais) próxima do cidadão

ENTREVISTA COM A MINISTRA DA JUSTIÇA

PAULA TEIXEIRA DA CRUZ Jornadas de Estudo de Solicitadoria

Reafirmar a profissão propondo novos desafios Sollicitare 1


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eDITORIAL José Carlos Resende

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AS JORNADAS DE ESTUDO ste número da SOLLICITARE sai sob a égide das Jornadas de Estudo de Solicitadoria. Através desta iniciativa que pretendemos consolidar anualmente, a par das Jornadas de Estudo dos Agentes de Execução e de outras iniciativas, queremos colocar uma tónica muito forte na Formação. Aqueles que julgam ser suficiente a licenciatura e o estágio rapidamente percebem que o excesso legislativo e a necessidade de aprofundar os casos concretos que lhes são colocados obrigam a este estudo permanente. Hoje, julgo pacífico que se venha a integrar, no nosso futuro Estatuto um sistema de formação contínua que garanta ao cidadão a qualidade da profissão. O FUTURO DA SOLICITADORIA Num tempo de crise acentuada, de excesso de oferta profissional, doença do desenvolvimento, temos de procurar novos caminhos que passem por três vertentes: – A qualidade do serviço prestado medida pela eficácia, celeridade e transparência; – O grau de conhecimento e de especialização, tanto no Direito como nas novas tecnologias. Saber fazer, saber o que não se sabe e saber como contratar quem sabe; – O domínio de nichos de mercado, apresentando as melhores ofertas suportadas em soluções nacionais ou, sempre que possível, transnacionais. Os temas em debate nas Jornadas de Estudo darão algumas pistas sobre estas vertentes. Entre elas não podemos deixar de destacar as iniciativas na área do GEOPREDIAL e da gestão de condomínios. OS AGENTES DE EXECUÇÃO A atividade dos agentes de execução passou por uma crise evidente. As medidas tomadas demostraram a vontade da Câmara dos Solicitadores (CS) e dos profissionais em credibilizar o seu esforço, aproveitando a experiência acumulada. Temos consciência de que há ainda muito a melhorar e de que é essencial um novo Estatuto da CS de onde emerja um Colégio da Especialidade com maior autonomia e pronto a assumir uma aposta em novas áreas de trabalho na área do processo de execução, que siga um Código Deontológico propiciador do respeito pela figura do agente de execução. Tem estado em debate o futuro da ação executiva. O seminário internacional recentemente realizado pelo Ministério da Justiça, em colaboração com a Troika, evidenciou uma dicotomia: Vários países da Europa não têm processos de execução no Tribunal. Não têm sequer estatísticas

fiáveis sobre estes. Os processos são apresentados aos agentes de execução e só vão ao tribunal quando há necessidade de contraditório, ou em casos de reclamação sobre atos dos agentes de execução. Estes asseguram os processos de execução administrativa, fiscal, civil e penal. O modelo português é um excerto do sistema francês em cima do que vigorava em 2003 e para onde se despejaram todos os processos declarativos que incomodavam os tribunais, tentando garantir nestes um sem número de particularidades absolutamente burocráticas. Como é evidente, a comparação com aqueles países da Europa embate na nossa Constituição e nas normas que impedem o conhecimento de dados e o acesso à habitação sem autorização judicial. Este debate é fundamental. Esperamos contribuir ativamente para ele. A SOLLICITARE A nossa revista n.º 10 tenta dar, aos seus leitores, um panorama daquelas problemáticas sem descurar uma atenção ao mundo que nos rodeia. Realçamos a entrevista da Sr.ª Ministra da Justiça pela qual se visualizam e compreendem as principais linhas orientadoras do Governo para o setor da Justiça. O ESTADO DA JUSTIÇA A Câmara dos Solicitadores cresceu de uma forma exponencial nos últimos dez anos. Somos quase 4.000 solicitadores. No estágio do próximo ano deverão comparecer cerca de 1.000 candidatos. A nossa estrutura organizativa tem assistido a uma profissionalização progressiva. A qualidade jurídica dos candidatos e solicitadores aumentou de uma forma evidenciada no número de mestrados e doutoramentos concluídos ou a ser frequentados. Este crescimento exige mais responsabilidade à Câmara dos Solicitadores, enquanto interveniente na Justiça. Uma Justiça que precisa de ser credibilizada. Consideramos premente que os profissionais liberais como os solicitadores assumam uma série de tarefas que atualmente estão na dependência do Estado sem vantagens para o cidadão. Nestas tarefas, o solicitador pode assumir, cada vez mais, o papel de “loja do cidadão” sujeito a regras estritas de transparência. A Câmara dos Solicitadores considera útil o debate público em torno dos temas da Justiça. Recusa-se a contribuir para uma mediatização da banalização, do disparate e dos populismos radicais. Para tal, temos levado a cabo um esforço gratificante para melhorar o nosso relacionamento com todos os operadores da Justiça. Com a colaboração dos colegas, assim vamos continuar. : :

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FICHA TÉCNICA

Sollicitare REVISTA DA CÂMARA DOS SOLICITADORES

EDIÇÃO N.º 10 \ MAIO 2012

Diretor José Carlos Resende Conselho de Redação Assunção Morgado, Aurora Boaventura, Fernando Rodrigues Chefe de Redação Rui Miguel Simão Redatora principal Ana Filipa Pinto Colaboram nesta edição: Ana Rucha, Carlos José Matos, Florbela Jorge, Helena Bruto da Costa, Idalina Carreira, João Capítulo, João Garanhão, Luís Filipe Ramos, Luís Rua Teixeira, Maria do Céu Caldeira Moreira, Maria João Gomes, Pedroso Leal, Timóteo de Matos Conselho Geral Tel. 213 172 063 Fax 213 534 870 c.geral@solicitador.net Conselho Regional do Sul Tel. 213 534 862 Fax 213 534 834 c.r.sul@solicitador.net Conselho Regional do Norte Tel. 222 074 700 Fax 222 054 140 c.r.norte@solicitador.net Design Atelier Gráficos à Lapa www.graficosalapa.pt Impressão CPR Artes Gráficas Tiragem 6 000 Exemplares Periodicidade Trimestral ISSN 1646-7914 Depósito legal 262853/07 Propriedade Câmara dos Solicitadores Av. José Malhoa, n.° 16, 1.° B2 Edifício Europa 1070 - 159 Lisboa Tel. 213 172 063/4/5 Fax 213 534 870 c.geral@solicitador.net www.solicitador.net

CÂMARA DOS SOLICITADORES Assembleia Geral Presidente Silva Queiroz (Vila Franca de Xira) 1.° Secretário Babo Ribeiro (Marco de Canaveses) 2.ª Secretária Dina Matos (Lisboa) CONSELHO GERAL Presidente José Carlos Resende (Viana do Castelo) 1.º Vice-Presidente Paulo Teixeira (Matosinhos) 2.º Vice-Presidente Edite Gaspar (Lisboa) Secretário Aventino Valdemar Martins de Lima (Lisboa) Tesoureiro João Capítulo (Sesimbra) VogaL João Coutinho (Figueira da Foz) VogaL Júlio Santos (Silves) VogaL Luis Teixeira( Paredes) VogaL Ana Rucha (Vila Franca de Xira) VogaL Carla Carlão (Porto) VogaL Armando A. Oliveira (Braga) CONSELHO SUPERIOR Presidente António Brás Duarte (Lisboa) Vice-Presidente Jorge Cerdeira Gil (Évora) Secretário Daniel Sales (Viana do Castelo) Vogal Miguel Ângelo Costa (Barcelos) Vogal Palmira Valério (Arraiolos) Vogal Maria de Lurdes Paiva (Lamego) Vogal Elizabete Pinto (Porto) Vogal Conceição Torres (Marinha Grande) Vogal Jorge Lapa (Coimbra) ASSEMBLEIA REGIONAL DO SUL Presidente Celestina Maria Isidoro Pardal Barneto (Montemor-o-Novo) 1.º Secretária Júlia Maria Gaspar dos Reis Gazua (Vila Franca de Xira) 2.º Secretário Sérgio Valentim Fernandes (Funchal) Assembleia Regional do Norte Presidente Joaquim Baleiras (Porto) 1.º Secretário José Luís Saraiva (Guarda) 2.ª Secretária Paula Pereira (Viana do Castelo) CONSELHO REGIONAL DO SUL Presidente Armando Manuel de Oliveira (Lisboa) Vice-Presidente Ana Maria Alves Cardoso Luís (Cascais) Secretário João Manuel Salvadinho Aleixo Cândido (Seixal) Tesoureiro António Serafim Correia Novo (Portalegre) VogaL Maria José Martins Palma Vieira dos Santos (Silves) Vogal Natércia Reigada (Lagos) Conselho Regional do Norte Presidente Fernando Rodrigues (Matosinhos) Vice-Presidente João Queirós (Valongo) Secretária Maria João Neto (Paços de Ferreira) Tesoureira Maria Helena Reis Pinto (Coimbra) VogaL Maria João Ricardo (Porto) Secção Regional Deontológica do Sul Presidente Paula Cristina da Cunha Botinas (Lisboa) Vice-Presidente Carlos Manuel de Almeida Freire (Loures) VogaL Sérgio José Manços (Seixal) VogaL Henrique Manuel Pedroso Silvestre (Cascais) VogaL Ricardo Alexandre Ferreira do Couto (Sintra) Secção Regional Deontológica do Norte Presidente Alcides Rocha (Porto) Vice-Presidente Vítor Silva (Maia) VogaL Albertina Ribeiro Meireles (Paços de Ferreira) VogaL José Simões (Barcelos) VogaL Fernando Iglésias (Porto) Colégio de Especialidade de Agente de Execução Conselho de Especialidade Presidente Carlos de Matos (Lisboa) Vice-presidente Celeste Chorão Peres (Loures) Secretário Manuel Jesus Moreira (Braga) Delegação do Sul do Colégio de Especialidade Presidente Aurora Maria Pajuelo Boaventura (Lisboa) 1.ª Vogal Assunção Morgado (Oeiras) 2.º Vogal Vítor dos Anjos (Vila Franca de Xira) Delegação do Norte do Colégio de Especialidade Presidente Emanuel Silva (Baixo Vouga) 1.º Vogal Susana Rocha (Matosinhos) 2.º Vogal Paulo Pereira (Barcelos)

Os artigos e entrevistas remetidos para a redação da Sollicitare serão geridos e publicados consoante as temáticas abordadas em cada edição e o espaço disponível.

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Sollicitare índice

E DIÇ ÃO N.º 10 \ MA IO 2012

Entrevista com Paula Teixeira da Cruz 04

Ministra da Justiça

Jornadas de Estudo de Solicitadoria 11

Reafirmar a profissão propondo novos desafios.

Alfredo José de Sousa 12 Entrevista com o Provedor de Justiça

Os Solicitadores Memória e Identidade 22

A construção sócio-histórica de uma Profissão. Entrevista com os autores do livro.

Editorial 01 Histórias Carlos Cordeiro Histórias de um Solicitador Opinião \ Luís Filipe Ramos Uma organização do século XXI Opinião \ João Garanhão O mérito e a compensação acendem o sucesso do indivíduo Formação Avaliar para crescer Em balanço V Congresso Nacional Orlando Monteiro da Silva Entrevista com o Presidente do CNOP Quem é quem Conselho Regional do Norte

Ensino Superior Universidade Portucalense Faculdade de Direito da Universidade Lusíada

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Sociedade A Associação Portuguesa do Direito do Consumo Isabel Jonet e o projeto Entrajuda

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Conversas Paula Dourado fala sobre a Paramiloidose

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No escritório O Documento Particular Autenticado Avaliação geral de prédios urbanos Vá pelos seus dedos

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Sugestões Livros Jurídicos Ler é aprender… Lendo se renova…

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Roteiro Gastronómico

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Viagens

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Agenda

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ENTREVISTA

(…) Tem sido notória a pro-atividade da Câmara dos Solicitadores (…)

Paula Teixeira da Cruz MINISTRA DA JUSTIÇA

A persiana, não completamente fechada, deixava espreitar o Tejo através da janela do Ministério. Apesar da vista apetecível, bem sabemos que, atualmente, todos os olhos estão postos na Justiça. Paula Teixeira da Cruz assumiu a pasta e não receou reformas ou mudanças naquela que é, sem dúvida alguma, uma área fundamental para o bem-estar do país, mais ainda quando são impostas metas audazes. Trata-se de uma maratona na qual o principal adversário é o tempo. Aliás, correr contra o tempo é um desafio constante para Paula Teixeira da Cruz que não tem horário de saída “deste recanto cheio de outros recantos” que é o Ministério da Justiça. A atual ministra da justiça confessa ainda que nunca ambicionou exercer um cargo desta natureza. No entanto e uma vez aceite o desafio, Paula Teixeira da Cruz garante, sem hesitações nem tremuras na voz, que “o exercício da política é um exercício de sofrimento, pois as decisões, sobretudo em situações como aquela em que estamos, são decisões difíceis”. Ciente da importância de manter as mais sãs relações institucionais e reco­nhecida pelo empe­nho que demonstra nesse sentido, a Câmara dos Solicitadores foi recebida neste Ministério­de amplos horizontes e presenteada com uma conversa não só sobre Justiça mas, acima de tudo, sobre a aposta na garantia de que todas as políticas assegurem um melhor serviço aos cidadãos. Esta é de resto a pedra de toque afirmada pelo Ministério: o cidadão. Visão partilhada pela CS contando para o efeito com um número apreciável de profissionais que pretendem colaborar e promover uma Justiça ao alcance de todos e à medida das necessidades­de cada um. 6


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Vários comentadores e críticos destacam o facto de muitos “primeiros passos” terem sido dados no âmbito de diversas áreas da justiça portuguesa e a quantidade de propostas em cima da mesa – é com satisfação que encara este meio ano de mandato? Nos cerca de dez meses que leva de funções, o Governo concretizou já um conjunto importante de reformas neste setor. Permito-me destacar algumas: a nova Lei de Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro), que adota a lei modelo da UNCITRAL e que nos permitirá acolher arbitragens internacionais; a revisão do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, já aprovada em votação final global no Parlamento, que visa criar as condições regulatórias adequadas para permitir a recuperação das empresas ainda aptas a prosseguir a sua atividade, bem como a assegurar a efetiva e rápida satisfação dos credores de empresas declaradas insolventes. Ainda centrada na recuperação das empresas, o Governo aprovou uma Resolução do Conselho de Ministros contendo um conjunto de “Princípios Orientadores das Reestruturações Voluntárias Extrajudiciais”, tendo como paradigma os princípios da INSOL. De importância muito significativa para o funcionamento dos Tribunais, é a Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro que tem como objeto a alteração ao Regulamento das Custas Processuais e a portaria n.º 82/2012, de 29 de Março, que a regulamenta. Para além das alterações de fundo, a padronização do regime de custas judiciais reveste-se de uma enorme importância no funcionamento dos tribunais porquanto a aplicação das mesmas regras a todos os processos tornará, por si só, o regime de custas mais simples e potencialmente mais eficiente, simplificando o trabalho daqueles que diariamente o aplicam e tornando o regime mais compreensível para os cidadãos e empresas que recorrem à justiça, com ganhos evidentes para a agilização, celeridade e transparência dos processos judiciais. Particular atenção está, ainda, a ser dada à ação executiva, sendo intenção firme do Governo reduzir, significativamente, as pendências cíveis e criar as condições para que os processos se concluam em tempo útil e razoável, dando adequada resposta às expetativas, não só sociais, como económicas. Assim, e com o propósito de assegurar uma satisfação tão rápida quanto possível dos créditos devidos e não pagos e prosseguindo um esforço de simplificação e agilização do processo executivo, o Ministério da Justiça já procedeu à alteração da Portaria n.º 331-B/2009, de 30 de Março. Tal alteração permitirá uma fiscalização mais eficaz e uma responsabilização mais célere em caso de irregularidades, ao esta­belecer um conjunto de regras relativas aos meios de paga­mento a utilizar pelo agente de execução, das quais se destaca a indicação do número de identificação bancária, bem como a utilização de referência multibanco ou documento­ único de cobrança no âmbito de cada processo judicial. Como decorrência desta alteração, os pagamentos ao exequente serão­mais expeditos e, ao mesmo tempo, será mais fácil veri­ ficar as transferências efetuadas pelo agente de execução.

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Ainda no âmbito da reforma da ação executiva, o Ministério da Justiça já fez publicar a portaria que regula o perfil de utili­ zador da Comissão para a Eficácia das Execuções de acesso direto aos sistemas informáticos CITIUS e SISAAE, a qual resulta da necessidade de operacionalizar alguns dos comandos contidos na Lei Processual Civil e no Estatuto da Câmara dos Solicitadores de modo a facilitar o exercício das competências legais atribuídas àquele órgão e a introduzir um maior grau de transparência e de eficiência nos procedimentos adotados por todos os intervenientes no processo executivo. Também neste domínio, estão a ser criadas soluções institucionais que facilitem a cobrança de créditos das empresas, reduzindo a pendência processual em atraso no domínio da ação executiva cível. Designadamente, foi constituído, por iniciativa do MJ, um grupo de trabalho interdepartamental, que visa identificar as ações, administrativas ou de outra natu­reza, que importa adotar para que os processos executivos pendentes sejam objeto de rápida resolução. Pretende-se igualmente que do trabalho deste Grupo, que integra representantes do Conselho Superior da Magistratura, da Câmara dos Solicitadores e da Comissão para a Eficácia das Execuções, resultem as bases para uma atuação planeada que sustente uma redução regular da pendência processual. Outras medidas estruturantes em curso merecem ser referenciadas, como as Reformas do Processo Civil e da Organização Judiciária e o Plano de Ação para a Justiça na Sociedade da Informação, o qual se justifica à luz da ideia de que a política de modernização da justiça não dispensa a utilização de tecnologias de informação e da comunicação de modo a tornar a globalidade do sistema mais acessível aos cidadãos e mais adequado às necessidades das empresas. Estão prontas as Propostas de Lei de mediação e dos Julgados de Paz. Igualmente prontas estão as Propostas de Lei de alterações ao Código Penal, Processo Penal e Execução de Penas. Neste meio ano de mandato é visível a sua persistência no diálogo com as diversas profissões jurídicas. Considera essencial essa aposta na proximidade face aos mais diversos agentes? Considero absolutamente essencial a manutenção desse diá­ logo, porquanto as reformas a empreender só podem ser concretizadas com o envolvimento dos órgãos de soberania, dos parceiros judiciários e das respetivas instituições e, mais amplamente, da própria sociedade. Numa palavra, a necessária reforma da Justiça, num tempo que é de crise que importa transformar em oportunidade, é o desígnio a que todos somos convocados e todos, em conjunto, estaremos à altura desse desafio. Olhando em volta, como descreveria o cenário atual da Justiça portuguesa tendo em conta as medidas acordadas no plano de ajuda financeira? As medidas constantes do Memorando de Entendimento assinado com o Banco Central Europeu, a Comissão Europeia e o Fundo Monetário Internacional perpassam todo o sistema


ENTREVISTA COM Paula Teixeira da Cruz

de justiça, tendo já sido dados, neste período de tempo, passos significativos na implementação de um conjunto de medidas reputadas por essenciais à melhoria do funcionamento do sistema. De resto, o Governo assumiu, como base do seu próprio programa, o compromisso de realizar um conjunto de reformas estruturais sem as quais se julga não existirem as condições necessárias a um melhor funcionamento da justiça e, indissociavelmente, da economia. As propostas de reforma do processo civil e do mapa judiciário estão neste momento em cima da mesa, sendo intenção do Ministério da Justiça que as mesmas sejam amplamente divulgadas, discutidas e maturadas, antes de se darem por fechadas e em condições de seguirem para aprovação pela Assembleia da República. Por outro lado, foi já levada a cabo, com grande sucesso, a revisão do regime a recuperação de empresas e insolvência, que pode contar, na sua génese, com a participação das várias entidades envolvidas. Prosseguindo um objetivo há muito almejado por todos os que diariamente lidam com os tribunais, padronizou-se o regime das custas processuais e adotou-se um conjunto de medidas com vista a garantir a sustentabilidade do sistema, com a aprovação da recente Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro. Tendo em conta o atual quadro da ação executiva, responsável pela esmagadora maioria das ações pendentes nos tribunais judiciais de 1ª instância, e a necessidade de promover a agilização dos processos em curso e prover à satisfação tão rapidamente quanto possível dos créditos devidos e não pagos,­para­lelamente à reforma projetada em curso, criaram--se meca­nismos de movimento de verbas mais ágeis e transparentes e reforçaram-se os meios de controlo da atividade dos agentes de execução, por via da aprovação da Portaria n.º 308/2011, de 30 de dezembro, e da Portaria n.º 2/2012, de 2 de janeiro, respetivamente. A par destas medidas, foi ainda constituído um grupo de trabalho, que conta com a participação dos vários serviços do Ministério da Justiça e com as várias entidades com responsabilidade em matéria da ação executiva, a quem se cometeu a tarefa de se identificarem as concretas ações que cada entidade poderá levar a cabo, por si mesma ou em colaboração com outras entidades, no esforço conjunto de redução do número de processos pendentes em atraso que estejam em condições de ser extintos ou que o possam vir a ser o mais rapidamente possível. Todo este esforço que Portugal tem feito na área da Justiça tem sido, de resto, reconhecido pelas instituições europeias e internacionais que, como é sabido, avaliam, regularmente, o desempenho e o cumprimento das metas fixadas.

Tendo em conta o atual quadro da ação executiva, (...) criaram-se meca­nismos de movimento de verbas mais ágeis e transparentes e reforçaram-se os meios de controlo da atividade dos agentes de execução, por via da aprovação da Portaria n.º 308/2011, de 30 de dezembro, e da Portaria n.º 2/2012, de 2 de janeiro, respetivamente. Todo este esforço que Portugal tem feito na área da Justiça tem sido, de resto, reconhecido pelas instituições europeias e internacionais que, como é sabido, avaliam, regularmente, o desempenho e o cumprimento das metas fixadas.

Em matéria penal, tem vindo a ser defendida a possibilidade de negociação da pena. O MJ está a ponderar esta solução? Como evitar que possam a vir a ser apontadas suspeições? As alterações pontuais ao processo penal estão concluídas

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Fotografias de Hugo Vieira da Silva

Procura-se, pois, moralizar o sistema, desincentivando a propositura de ações de forma “irresponsável”. Os grandes liti­gantes devem fazer uma correta avaliação dos seus clientes antes de contratarem, nomeadamente, quanto ao risco que correm quando celebram certos negócios em que está em causa o financiamento de aquisição de bens ou serviços. e seguirão em breve para audições públicas. Tais alterações não contemplam essa possibilidade. As alterações pontuais ao Código Penal, Código de Processo Penal e ao Código de Execução de Penas pretendem resolver situações que reclamam uma intervenção imediata, já que a incompreensão relativamente ao sistema de justiça criminal não contribui para a paz social. São conhecidos diversos casos em que a quase total indisponibilidade de utilização, em julgamento, das declarações legalmente prestadas pelo arguido nas fases anteriores do processo, tem conduzido a situações geradoras de indignação social e de incompreensão dos cidadãos. São também conhecidas situações em que a prescrição do procedimento criminal é vista pela sociedade como uma distorção do sistema, concretizada numa justiça para ricos, e uma outra justiça para pobres. Em ambos os casos era necessário corrigir os mecanismos que possibilitam essas situações, devolvendo ao cidadão a confiança no sistema de justiça criminal.

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Foi, assim, consagrada a possibilidade de as declarações prestadas pelo arguido, nas fases anteriores ao julgamento, serem utilizadas e valoradas na fase de julgamento, bem como a possibilidade de serem valoradas declarações já prestadas por testemunhas que não se conseguem encontrar para comparecerem em julgamento e foi alterado o regime das prescrições, estabelecendo-se que com a notificação da decisão condenatória proferida em 1.ª instância se suspende a prescrição. Supriu-se a lacuna existente na lei penal, criando-se o crime de falsas declarações perante entidades públicas, fora do âmbito dos processos judiciais, já que a ausência de tal incriminação lesa gravemente a autonomia intencional do Estado em áreas tão importantes como os registos, o notariado, os concursos públicos e múltiplos outros procedimentos. A otimização da resposta por parte das entidades encar­ regues das perícias passa, não só pela disponibilização de recursos técnicos e humanos, mas também pela alteração de certas realidades, pelo que foram introduzidas regras que


ENTREVISTA COM Paula Teixeira da Cruz

impõem a delimitação do objeto da perícia e a transmissão de toda a informação relevante às entidades que as fazem. Sabendo-se que as notificações realizadas no âmbito de inquéritos contra desconhecidos representam uma parte substancial das notificações a cargo das secretárias do Ministério Público, a otimização dos recursos existentes, reclamou que se desburocratizasse esse procedimento nesse tipo de processos, economizando custos e libertando os funcionários para outras tarefas. Introduziram-se clarificações no regime de recursos para o Supremo Tribunal de Justiça, preservando a intervenção deste órgãos para os casos de maior gravidade. Em matéria de execução de penas, a ideia fundamental de que as penas devem ser executadas com um sentido pedagógico e ressocializador determinou que se flexibilizasse a execução da pena acessória de expulsão ser antecipada, permitindo que os reclusos nestas condições possam antecipar o seu regresso ao país de origem onde têm as suas raízes, laços familiares e afetivos. Ao longo dos últimos anos têm vindo a aumentar os custos de acesso à justiça, designadamente com acréscimos de custos para os chamados “grandes litigantes”. Não corremos o risco de afastar os credores para métodos de cobrança “agressivos”? A imposição de taxas agravadas aos litigantes que usam de forma massiva o sistema de justiça visa combater o uso exces­ sivo e por vezes desregrado do mesmo, com prejuízo para todos quantos carecem de obter uma decisão justa e em tempo útil. Procura-se, pois, moralizar o sistema, desincentivando a propositura de ações de forma “irresponsável”. Os grandes liti­ gantes devem fazer uma correta avaliação dos seus clientes antes de contratarem, nomeadamente, quanto ao risco que correm quando celebram certos negócios em que está em causa o financiamento de aquisição de bens ou serviços. Se é certo que os grandes litigantes usam o sistema de justiça de forma massiva, provocando o seu congestionamento, mormente na ação executiva, é justo que, sejam estes litigantes a suportar especialmente os custos de funcionamento do referido sistema. Uma palavra, ainda, para referir que as taxas incidentes sobre os grandes litigantes são adequadas e proporcionais ao uso que estes litigantes fazem do sistema de justiça, não sendo, de modo nenhum, um incentivo a formas ilegítimas de cobrança de dívidas. Está igualmente pronta uma Proposta de Lei que visa solucionar estas situações. Os solicitadores pretendem ter um papel mais interventivo no apoio judiciário, seja no mandato, ou na especialidade de agente de execução. Que mecanismos considera necessários para implementar essa intervenção? Podemos afirmar que o atual sistema de acesso ao direito foi construído, mesmo sob o ponto de vista das aplicações

que o gerem, “esquecendo” que os solicitadores poderiam ter um contributo importante a dar a todos quantos carecem de defesa dos seus direitos e não podem suportar os custos inerentes à propositura de uma ação em tribunal. Assim, sem esquecer que as competências dos solicitadores são mais restritas, no que respeita ao mandato forense, que as competências cometidas aos advogados, pensamos que aqueles poderão dar um contributo apreciável para a defesa­ dos direitos dos mais desfavorecidos, em todas as áreas em que já o podem fazer para aqueles que recorrem, no plano privado, aos seus serviços, com custos mais reduzidos que os ora resultantes da aplicação do regime remuneratório dos advo­ gados que participam no sistema de acesso ao direito. É porém prematuro, neste momento, especificar em que moldes deverão os solicitadores passar a integrar no plano concreto o sistema de acesso ao direito, sendo este um dos aspetos que atualmente se encontra em estudo no contexto da aludida reforma do sistema. No que concerne à possibilidade de os solicitadores poderem exercer funções de agente de execução nas execuções instauradas por um exequente que seja beneficiário de apoio judiciário, entendemos que o atual mecanismo vertido na lei, que determina que tais funções sejam exercidas por oficial de justiça, é suficiente para dar resposta às solicitações existentes nesta matéria, pelo que é nossa intenção manter inalterado este regime. A concentração de processos é uma realidade que tem vindo a ser difícil de contornar. A Câmara dos Solicitadores e o Colégio da Especialidade já propuseram soluções de contingentação para evitar pendência excessiva nos agentes de execução. Como encara esta proposta? O Ministério está a analisar a proposta apresentada pela Câmara dos Solicitadores e pelo Colégio da Especialidade. Sendo as funções de agente de execução desempenhadas no âmbito do exercício de uma profissão liberal, não devem ser criadas restrições, sem mais, à possibilidade de livre escolha, pelo exequente, do profissional responsável pela promoção da maioria dos atos no âmbito da ação executiva. É indiscutível, todavia, que uma resposta eficaz do sistema de justiça, no atual quadro da ação executiva, em especial, no domínio da cobrança de dívidas, depende, em grande parte, da capacidade de resposta dos agentes de execução a quem é cometida a prática da gene­ralidade dos atos do processo executivo. Tendo em conta o papel atualmente desempenhado pelos agentes de execução, em quem o Estado delegou o exercício de relevantes funções públicas, para tornar efetivos os direitos legalmente reconhecidos aos cidadãos e empresas, e a necessidade de dar uma resposta mais célere a este tipo de ações, para promoção da confiança no sistema judicial e estímulo da economia, have­rá que implementar medidas adequadas para fazer face à atual situação, as quais não poderão deixar de assentar, na nossa perspetiva, numa redefinição dos termos de distribuição

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de novos processos a agentes de execução. A designação de um determinado agente de execução passará a estar condicionada por uma demonstração da existência de capacidade de resposta, por parte de cada agente de execução, para tramitar todos os processos que lhe são confiados. Não se pretende, com isto, sublinhe-se, criar barreiras puramente formais ou artificiais ao exercício da atividade de agente de execução, mas tão só assegurar que cada agente de execução tem a estrutura e os meios necessários para tramitar as execuções para as quais são designados. O projeto de reforma do processo civil, no âmbito da ação executiva, implica uma maior intervenção dos juízes, o que já foi aplaudido pela Câmara dos Solicitadores. Contudo, há o receio de que tal solução implique maiores atrasos se não forem redistribuídos os processos de execução, uma vez que há hoje juízes com 35.000 processos pendentes. Como avalia esta situação? Não obstante se passar a prever uma maior intervenção dos juízes no domínio da ação executiva, ditada pela necessidade de efetuar um controlo jurisdicional num conjunto muito preciso de situações que dele haviam sido arredadas, as alterações projetadas, no seu todo, visam imprimir uma maior simplificação e agilização da tramitação dos processos, pelo que não se crê que uma intervenção pontual acrescida por parte do juiz conduza a um protelamento desmedido das execuções. Consciente do elevado número de processos pendentes em determinados juízos e das dificuldades atualmente existentes, o Ministério da Justiça, em estreita articulação com o Conselho Superior da Magistratura, e com as demais entidades responsáveis em matéria de ação executiva, tem procurado encontrar as soluções mais adequadas para promover a agilização e extinção tão rapidamente quanto possível dos processos pendentes. Desburocratizar e tornar o aparelho judicial mais “leve” também parecem ser algumas das metas determinadas pela sua equipa: a reforma do mapa judiciário é exemplo disso? O Ministério da Justiça já tornou pública a primeira versão do Ensaio da Reorganização da Estrutura Judiciária, no qual se apresentam propostas de reorganização de 308 tribunais. Tal reforma permitirá otimizar os recursos humanos existentes e fazer a sua gestão racional, de acordo com as necessidades efetivas dos tribunais, agora viabilizada pelo alargamento territorial (geográfico e organizativo) da comarca. É uma aposta na especialização e na gestão dos tribunais. O Ensaio está em discussão pública e, portanto, sujeito aos desenvolvimentos e aperfeiçoamentos a levar a cabo em conjunto com todas as entidades interessadas. Uma nota para referir que as reformas em curso no Ministério­da Justiça e as medidas já tomadas, v.g. em sede de reforma dos processos cível e penal e de organização

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judiciária­, se justificam­à luz do direito constitucional de acesso aos tribunais, entendido, antes de mais, como um direito a uma solução jurídica a que se deve chegar em prazo razoável e com observância­d ­ e garantias de imparcialidade e de independência. Os solicitadores tiveram sempre uma intervenção muito relevante na área dos registos e notariado. Nos últimos anos a classe foi confrontada com um regime de concorrência entre as conservatórias e os profissionais liberais (Solicitadores, Advogados e Notários), tendo estes últimos sido excluídos de um conjunto de facilidades que só estão acessíveis às conservatórias. Existe algum plano que reponha o equilíbrio? Sim, a reorganização das profissões jurídicas. Considera que a opinião pública já registou alguma mudança positiva no que toca ao estado da justiça em Portugal? O Ministério da Justiça está fortemente empenhado na prossecução dos seus objetivos e tem contado, nesta sua missão, com uma colaboração efetiva dos vários profissionais da justiça, a que os solicitadores não têm sido alheios. Aliás, tem sido notória a pro-atividade da Câmara dos Solicitadores quer na apresentação de propostas concretas, quer na implementação de um conjunto de medidas, tidas como fulcrais para a moralização, transparência e agilização da atividade destes profissionais que colaboram na administração da justiça. Todos têm sido convidados, de resto, a participar na discussão e a dar o seu contributo em matérias tão relevantes como, por exemplo, a reorganização judiciária, a reforma do processo civil e a revisão do regime insolvencial. O Ministério da Justiça tudo fará para que o sistema judiciário seja capaz de dar uma resposta efetiva, em tempo útil, às concretas solicitações que lhe são dirigidas para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. No âmbito dos concursos públicos, não se tem assistido à inclusão da Licenciatura em Solicitadoria para funções perfeitamente compatíveis desempenhadas nos tribunais e na Administração Pública. Que justificação apontaria como plausível? Já existe a sensibilidade necessária, da parte do Estado, para que esteja garantido um trato adequado e mais justo em comparação com outros profissionais licenciados noutras áreas? A justificação plausível será, infelizmente, tradicional, quanto à segunda questão creio ser hoje evidente. Que mensagem deixaria à Câmara dos Solicitadores e respetivos associados? Que ajudem a dignificar o judiciário e que pugnem, em cada dia, por um exercício de excelência que a todos serve, sobretudo ao cidadão. : :


atualidade

ATUALIDADE

Jornadas de Estudo de Solicitadoria

Em busca de novos desafios

A

s Jornadas de Estudo de Solicitadoria são já um marco reconhecido na Classe. Durante os próximos dois dias serão várias as questões em cima da mesa a aguardar discussão. Qual o ponto de encontro entre todas elas? A solicitadoria. O Centro de Congressos do Estoril foi o cenário escolhido para este encontro que visa, acima de tudo, desvendar novos desafios no âmbito da profissão e, consequentemente, novas respostas para os cidadãos. Contando com a participação da Ministra da Justiça, Dra. Paula Teixeira da Cruz, estas Jornadas concretizam, em paralelo com as Jornadas de Estudo dos Agentes de Execução previstas para setembro, a aposta da Câmara dos Solicitadores na formação dos associados, A ninguém passa despercebido o esforço constante e crescente em prol da criação de novas oportunidades de trabalho para o Solicitador. Estas oportunidades deverão surgir alicerçadas nas destacadas habilitações jurídicas destes profissionais altamente preparados para apoiar o cidadão e o Estado. Convictos de que o esforço nunca será em vão, a equipa que atualmente dirige a Câmara considera fundamental a aposta numa iniciativa desta natureza que visa acolher a discussão em torno da profissão e do seu futuro, realçando a importância do papel destes profissionais na justiça e identificando novos nichos de mercado para os solicitadores. O Arrendamento, a Avaliação urbana, o Contencioso tributário, o Documento Particular Autenticado, o Inventário judicial, a Administração de imóveis, a Gestão do escritório, o Geopredial - todas estas temáticas estarão em discussão. Com um programa diversificado e capaz de abranger várias questões presentes no dia a dia do solicitador, a Comissão organizadora deste evento acredita que a reflexão interna e conjunta poderá atrair novas ideias. Tudo isto num momento em que o

mercado assiste a um aumento exponencial de prestadores de serviços nas profissões jurídicas. Daí a urgência em definir, tão claramente quanto possível, o papel do solicitador, a sua real e efetiva área de intervenção no seio da sociedade. Perante um cenário desta natureza e tendo em conta que a Justiça atravessa um momento de profundas reformas, estas Jornadas de Estudo assumem-se irrefutavelmente como uma oportunidade importante para os solicitadores mostrarem a sua união e interesse no desenvolvimento da profissão, apostando no aprofundamento e diversificação de competências. Para que estes objetivos sejam alcançados, mostra-se essencial obter, neste encontro, uma participação plural que se deverá materializar em conclusões e propostas reveladoras do pragmatismo característico do solicitador. “A realização das Jornadas de Estudo de Solicitadoria/2012 acontece num momento em que se conjugam vários fatores com influência negativa no exercício da solicitadoria, daí a sua maior importância, uma vez que esta iniciativa pretende reafirmar a nossa profissão e encontrar novos desafios”, explica Júlio Santos, representante da Comissão organizadora. Para além da discussão dos temas mais importantes do momento,­serão apresentados trabalhos realizados na sequência de algumas propostas ou recomendações resultantes do V Congresso Nacional dos Solicitadores, ocorrido em outubro do ano passado. Por todos estes motivos e perspetivando dois dias em que o debate será personagem principal, a organização acredita que a adesão será elevada e que estas Jornadas irão contribuir ativamente para a definição de um futuro de permanente partilha de ideias, sempre com um objetivo que só pode ser comum: garantir, a todos os solicitadores, a preparação necessária para encarar os novos desafios que se adivinham. : :

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ENTREVISTA

Por uma Justiça (cada vez mais) próxima do cidadão

Alfredo José de Sousa Provedor de Justiça

O Provedor de Justiça é um órgão de Estado previsto na Constituição e a prova de que a Justiça está bem próxima do cidadão. Personalizando a garantia do direito de queixa relativamente a ações ou omissões da administração pública que afetem os direitos, liberdades e garantias do cidadão, o Provedor é eleito por maioria de 2/3 dos deputados da Assembleia da República e distingue-se pela sua independência perante e ao serviço do Estado. Não tem, contudo, poderes vinculativos. Exerce, como Mário Soares caracterizou, uma “magistratura de influência”, visto que é tanto mais visível quanto for capaz de exercer essa influência junto dos órgãos do Estado e da Administração Pública. À exceção dos Tribunais, o Provedor deverá agir no sentido de alertar os mais diversos organismos para o facto de determinados atos ou omissões representarem ameaças aos direitos dos cidadãos. No entanto e apesar de o Provedor ser o único responsável pelas recomendações que emite, Alfredo José de Sousa explicou que a Provedoria depende do trabalho de uma equipa composta por 40 juristas e 6 coordenadores juristas, ou seja, um por cada uma das principais áreas de atuação. Assuntos tão profundos quanto comuns ao dia a dia de cada cidadão foram os norteadores de uma conversa que percorreu os corredores da Provedoria.

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Alfredo José de Sousa é, desde 2009, Provedor de Justiça. Antes disso foram diversos os cargos que assumiu. Conheceu a Justiça de várias perspetivas e também desempenhou o cargo de presidente do tribunal de contas durante 10 anos.


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Sollicitare: Podemos dizer que o Provedor de Justiça tem um poder consultivo? Alfredo José de Sousa: diria que é um poder moderador. Não tem poderes vinculativos. No fundo, não pode dizer ao Ministro A: “faça favor de fazer isto”. Dir-lhe-á antes que: “Houve um cidadão que se queixou que o senhor Ministro praticou este ato, o qual é injusto, ilegal e que o prejudica. Portanto queira repensar, queira ter em conta os argumentos que ele invoca - que me parecem corretos - e queira responder”. A recomendação é aceite e corrigida a atuação ou não é aceite, pelo que o Provedor poderá manter a sua recomendação. Isto sem prejuízo desse cidadão recorrer aos Tribunais para que seja reconhecida a ilegalidade do ato e requerida sua anulação. Portanto, o Provedor atua num registo totalmente independente e paralelo ao dos tribunais. O facto de estar presente no Conselho de Estado corrobora essa função moderadora? O facto de estar presente no Conselho de Estado, julgo eu, justifica-se uma vez que o Provedor de Justiça recebe diretamente as queixas dos cidadãos (abre cerca de 6000/7000 processos por ano, embora as queixas sejam mais) e, portanto, leva consigo a voz dos cidadãos no que respeita ao funcionamento do Estado. Daí que esteja numa posição privilegiada para, no Conselho de Estado, dar o seu parecer sobre os problemas que afetam a sociedade Portuguesa. A legitimidade para ser membro do Conselho de Estado reside nisto mesmo. E o Provedor conhece bem o funcionamento da Administração em virtude das queixas que são apresentadas ( ). Existem, como referiu, muitas queixas infundamentadas. Em que situações deve o cidadão recorrer ao Provedor de Justiça? Desde logo, quando existem queixas referentes a decisões que afetam a qualidade de vida ou o ambiente. A proteção do direito ao sono, por exemplo. E são muito comuns as queixas por excesso de ruído nalgumas zonas de diversão noturna, em Lisboa e no Porto. Também nos surgem queixas relacionadas com o ambiente como, por exemplo, decisões que afetam a Reserva Ecológica Nacional. Uma segunda área de atuação muito relevante prende-se com os direitos dos contribuintes, dos consumidores e dos agentes económicos. Por exemplo, os contribuintes que são executados em processos de execução fiscal e quando são violados os limites da penhora de vencimento, verificando-se uma queixa ao Provedor, os juristas que estão ao serviço da Provedoria entram em contacto com a direção-geral dos impostos e resolvem rapidamente o problema. Aliás, são os casos que dão, aos queixosos, maior perceção de uma eficácia muito grande do Provedor de Justiça. São casos em que a atuação do Provedor é mais visível? É visível e é rápido! Muito mais rápido do que recorrer a uma ação judicial que demora certamente muito mais. O Provedor de Justiça atua de acordo com o chamado princípio da informalidade. Isto é, um simples contacto, por fax ou por

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telefone­, com as entidades visadas nas queixas, por vezes, basta para resolver o problema do cidadão. Uma outra área de atuação do Provedor corresponde aos direitos sociais, uma vez que temos juristas especializados nessas matérias. Os direitos dos trabalhadores, função pública e privados, também coincidem com uma área em que o Provedor pode exercer eficazmente a sua influência. O Direito à justiça e à segurança também justifica uma quantidade significativa de queixas recebidas. Aqui são enquadradas as queixas que dizem respeito a atrasos nos tribunais, problemas nas conservatórias, queixas relativas a solicitadores e a agentes de execução ou processos disciplinares contra advogados. Mas atenção que isto não tem a ver com as decisões substantivas dos tribunais. Isto é, devido à separação dos poderes, o Provedor de Justiça não pode intervir nas decisões dos Tribunais. Temos outra área muito própria da intervenção da Provedoria, a qual se refere a outros direitos fundamentais tendo a ver com a ciência, comunicação social, educação, outros direitos, liberdades e garantias e com algo que é também muito impor­ tante e que tem especial interesse para os solicitadores que são as queixas referentes a direitos dos estrangeiros. Há ainda muitas queixas de presidiários e, nesse tipo de circunstâncias, o Provedor de facto tenta resolver situações em que o recluso possa ter razão. Há ainda uma equipa destinada a dar apoio aos direitos da criança, do idoso e da pessoa com deficiência e que segue as queixas relacionadas com as necessidades de acompanhamento destes grupos. Mais uma vez, a atuação da Provedoria busca ser o mais informal e efetiva possível, resolvendo questões em contacto com os Serviços de Segurança Social, Hospitais ou Centros de Saúde. (…) Quais são os meios ao dispor do cidadão para apresentar uma queixa? Qualquer meio. Pode ser pessoalmente, por carta, tele­ fone, fax, e-mail ou indo ao site do Provedor e preenchendo a fórmula da queixa. Além disso, existe um protocolo celebrado com a Associação Nacional de Municípios e a maior parte dos municípios cedem os seus equipamentos informáticos e funcionários, para que estes possam auxiliar os cidadãos no momento­de apresentar uma queixa ao Provedor de Justiça. Mais uma vez, aqui está presente o princípio da informalidade. E há ainda o fator da gratuitidade. Recorrer ao Provedor de Justiça é gratuito e tão fácil que nem precisa de solicitador (risos)! Como é que funciona a estrutura da Provedoria? Há uma parte logística que é permanente, composta por pessoal do quadro da secretaria-geral. É o pessoal que trata da parte administrativa. A equipa substancial, que estuda as queixas e apresenta os relatórios para o Provedor decidir (sendo que para além do Provedor, existem dois Provedoresadjuntos), é composta por 40 juristas e seis coordenadores juristas, cada coordenador tem à sua conta uma média de seis a sete juristas da confiança do Provedor. O Provedor é um órgão


ENTREVISTA COM Alfredo José de Sousa

unipessoal e, como tal, é o único responsável pelas­recomendações que emite. É como se fosse um gabinete ministerial: há os assessores do gabinete ministerial que saem quando muda o Ministro, salvo se o novo Ministro os renomear. Aqui, com os assessores, passa-se a mesma coisa, a qualquer momento, perdendo a confiança do Provedor podem ser exonerados e o Provedor nomeia outro assessor. É óbvio que eu mantive toda a equipa e só nomeei os lugares vagos, renovando a confiança que o meu antecessor tinha no seu grupo de trabalho. Sendo o Provedor uma figura próxima do cidadão, é fácil impor-se quando necessário? Todas as autoridades do Estado estão obrigadas a colaborar com o Provedor de Justiça. O Provedor de Justiça pede um documento, um processo, uma informação e as entidades estão­ obrigadas a fornecer o que for solicitado. Nalguns casos até sob pena de procedimento disciplinar ou criminal. Mas, no geral, com os demais órgãos do Estado, a relação é muito boa, a maioria das recomendações são acatadas e, quando não são, há sempre uma resposta fundamentada. Muitas vezes, com o argumento de falta de orçamento para poder fazer as coisas de outra forma Este é um argumento comum. Como tem sido a relação da Provedoria com a Câmara dos Solicitadores? Em 2010, entraram 22 queixas referentes a processos de execução e uma queixa referente a um processo disciplinar. Em 2011, são contadas 26 queixas. Os principais motivos de queixa são atrasos no processo de execução. Aliás, é um caso muito idêntico ao que se constata quando avaliamos os principais motivos de queixa relativamente aos tribunais. Há ainda queixas relativamente aos montantes penhorados, falta de cancelamento da penhora após o pagamento da dívida exequenda. De maneira geral, é isto e de resto não é muito diferente das queixas relativas aos demais atores da justiça. Como pode a Câmara dos Solicitadores colaborar mais estreitamente com a Provedoria? A Câmara dos Solicitadores pois, com certeza, dará a melhor colaboração ao Provedor de Justiça se, na sequência de uma interpelação ao Provedor, contactar com o seu associado e conseguir resolver o problema que determinou a queixa.

Por exemplo os contribuintes que são executados em processos de execução fiscal e quando são violados os limites da penhora de vencimento, verificando-se uma queixa ao Provedor, os juristas que estão ao serviço da Provedoria entram em contacto com a direção-geral dos impostos e resolvem rapidamente o problema. Aliás, são os casos que dão, aos queixosos, maior perceção de uma eficácia muito grande do Provedor de Justiça.

A figura do Provedor tem sofrido alterações ao longo dos anos? É uma instituição que tem curiosamente uma história singular. A maior parte das pessoas não sabem, mas a Provedoria foi criada, em Portugal, a seguir ao 25 de Abril e antes da Constituição de 76. E o primeiro Provedor de Justiça foi um militar do Conselho da Revolução, o Coronel Costa Brás. ( ) Depois, a Constituição da República Portuguesa consagrou, como órgão de Estado, o Provedor de Justiça, em 1976. A partir daí, tudo seguiu o seu rumo normal, sendo o Provedor eleito para um período de quatro anos, renovável por outros quatro anos,

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Fotografias de Hugo Vieira da Silva

portanto, pelo prazo máximo de oito anos. E não, não existem mudanças substanciais na linha de atuação do Provedor. Claro que com uns Provedores mais visíveis que outros, mas isso depende muito da personalidade do titular do cargo.

Estava a ler esta introdução da autoria do Presidente da Câmara dos Solicitadores (ver Editorial da Sollicitare n.º 9) e concordo inteiramente com o diagnóstico que aqui se faz. Ou seja, ao longo destes anos, as pessoas passaram a ter mais consciência dos seus direitos, passaram a ter mais à mão profissionais como solicitadores, que aumentaram exponencialmente, e o mesmo aconteceu no que se refere aos advogados, tendo aumentado também o acesso aos tribunais.

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E no que se refere à relação com a população, considera que, neste momento, o Provedor está divulgado de uma forma ampla e suficiente? Tem períodos... E essa divulgação é muito interessante porque é muito personalizada. Houve um período antes de eu para cá vir, que foi de crise. O meu antecessor, o Dr. Nascimento Rodrigues, tinha terminado o seu mandato e queria ser substituído, mas Assembleia da República não se entendia quanto à sua substituição. Houve várias tentativas que não lograram a maioria de 2/3 e houve, infelizmente, alguém que se lembrou que talvez aquele... (risos). Eu fui presidente do Tribunal de Contas durante 10 anos e então lembraram-se de mim. Expuseram-me o problema e eu, à partida, disse: “Não, não... Então se o Dr. Jorge Miranda foi um dos candidatos que não foi eleito. Injustamente, porque seria, porventura, das pessoas mais vocacionadas para desempenhar este cargo precisamente pela isenção, pela competência, um Professor Catedrático de Direito Constitucional Mas não foi eleito por razões politicas.” Claro que a minha primeira resposta foi “Meus amigos eu não estou disponível, nesta altura do campeonato.” (…) Só se me garantirem que os dois partidos com maior representação na Assembleia da República me vêm convidar e então, havendo um acordo, eu prometo considerar, sair desta minha condição de Jubilado descansado da vida e, em nome de um serviço à República aceitar o cargo. E assim foi: os partidos lá se entenderam e fui eleito pela totalidade dos partidos, com apenas algumas abstenções e, desde aí, cá estou. A condição para estar aqui foi o acordo entre os dois partidos com mais peso na Assembleia? É óbvio É isso que dá legitimidade e independência ao Provedor de Justiça, que é outra coisa muito importante. Eu não tenho problemas com nenhum dos partidos e agrade ou não agrade a minha atuação é aquela que eu entendo que é legal e que é justa. Isto tem muito a ver com a minha formação. Eu fui magistrado judicial durante toda a minha carreira e é assim que funciono. Mas acha, por exemplo, que a comunicação social passa a imagem correta do Provedor? Lá está, nessa altura falou-se muito do papel do Provedor. Foi quando precisamente não havia uma figura visível. E essa falta foi muito notada. O número de queixas até diminuiu curiosamente. Depois passou a haver figura visível e, pontualmente, a comunicação social relata algumas recomendações que o Provedor de Justiça fez ao Ministro A ou ao Ministro B; Câmara A ou Câmara B. Porque há também uma competência muito importante que o Provedor tem que é a de recomendar ao Governo ou à AR que faça legislação nova, ou que corrija


ENTREVISTA COM Alfredo José de Sousa

legis­lação que existe. E quando a comunicação social relata isso os cidadãos notam mais a intervenção do Provedor de Justiça. Ao longo da sua carreira, tem visto a justiça muitas perspetivas. A que conclusões é que chega acerca da Justiça portuguesa? Estava a ler esta introdução da autoria do Presidente da Câmara dos Solicitadores (ver Editorial da Sollicitare n.º 9) e concordo inteiramente com o diagnóstico que aqui se faz. Ou seja, ao longo destes anos, as pessoas passaram a ter mais consciência dos seus direitos, passaram a ter mais à mão profissionais como solicitadores, que aumentaram exponencialmente, e o mesmo aconteceu no que se refere aos advogados, tendo aumentado também o acesso aos tribunais. Mesmo quando se quer inovar para acelerar, como foi o caso dos agentes de execução, nem sempre o sistema funciona com aquela celeridade que seria desejável e que o legislador teve em vista. É das grandes reformas: a organização da justiça, a reorganização dos tribunais correspondem a grandes reformas que todos governos dizem que vão fazer mas que ainda não se viu nenhum resultado. Então a Justiça portuguesa ainda não pode ser definida como uma aliada do desenvolvimento económico? Cada vez mais, nos grandes contratos, nos contratos feitos entre­empresas portuguesas e, às vezes, até entre o Estado e

empresas estrangeiras, estabelecem a jurisdição, para os eventuais conflitos, em tribunais fora de Portugal como Madrid, como Paris. Fica clausulado que as questões judiciais serão postas em tribunais estrangeiros. E isso é um sinal nítido de que o sistema judicial português tem que ser reformado. E, por fim, aquela pergunta da praxe: qual o futuro da Provedoria? Será que, qualquer dia, poderemos, por exemplo, encontrar o Provedor de Justiça nas redes sociais, assumindo uma proximidade ainda maior com os cidadãos? Algo que se esteve a ponderar foram as vantagens de o Provedor de Justiça entrar no facebook e ficar ao dispor dos “amigos”. Isso tem vantagens, também tem inconvenientes É uma coisa acerca da qual se deverá pensar. Já é muito boa esta moder­nização que se está a operar na tecnologia informática que facilita o contacto entre o cidadão e o Provedor de Justiça. Um investimento que se conseguiu fazer foi na modernização do sistema informático da Provedoria. De tal modo que está previsto que o queixoso, que tenha um processo em curso, possa, a todo o tempo, consultar o estado desse mesmo processo. Esta reforma do sistema informático está em curso e visa a desmaterialização dos processos. Em vez de ser o processo escrito a sair daqui, subir as escadas (isto ainda são três andares), o assessor está no seu computador e está em comunicação, em rede, com todos os partners do Provedor de Justiça. : :

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HISTÓRIAS

A janela está aberta. Entra o sol de pelo escritório que guarda memórias e revistas nas prateleiras. “Já não há espaço para mais”, diz Carlos Cordeiro olhando para a estante e ironizando o facto de ser assinante daquela revista desde o seu primeiro número. Mesmo junto a essa janela que dá acesso ao terraço, está uma máquina de escrever. Carlos Cordeiro ainda se lembra do quão difícil foi encontrar uma com teclado “HCESAR”. A verdade é que esta máquina era apenas uma entre as muitas que por ali iam aparecendo. “Eu nunca tive empregados. Fui sempre eu que fiz tudo. E fui sempre um homem alérgico a minutas. E, portanto, a máquina de escrever era, muitas vezes, a minha conselheira”.

Carlos Cordeiro

O “quase solicitador em part-time” que “nunca deixou de ser solicitador”

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oi fácil chegar até ao escritório que se confunde com livro de contos ou álbum de memórias. No café, na rua. Todos sabiam onde ficava o escritório do solicitador Carlos Cordeiro. Alenquer viu-o nascer e crescer. Na parede, atrás da secretária, está o quadro que não deixa esquecer o seu primeiro escritório, mesmo junto ao Palácio da Justiça. Hoje, aos 78 anos de idade, ainda se senta diariamente à secretária­que alterna papéis e recordações entranhadas nos objetos. Mas nunca sem antes ter comprado o jornal e lido as “gordas”. Diz-se um “quase solicitador em part-time”. “Normalmente, estou sempre aqui antes das dez horas. Levanto-me às oito e meia Eu tenho uma vantagem: não preciso de fazer a barba!” – É com a sua espontaneidade que cativa até mesmo quem acabou de chegar. No entanto, foi o profissionalismo que lhe permitiu triunfar naquela que considera ser a única profissão que poderia ter exercido e que também começa com uma história: “Por acaso, é uma história curiosa. Quando saí da escola primária com cerca de dez anos, meu primeiro trabalho foi no Tribunal, como empregado de um escrivão. (…) A minha mãe era tecedeira e o meu pai era sapateiro. Não havia dinheiro para o colégio particular. Mas só trabalhei um ano (… ). (…) eu fui para o colégio com o dinheiro ganho com

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Fotografias de Hugo Vieira da Silva

a guerra porque a fábrica onde a minha mãe trabalhava fez um contrato para produzir mantas para o exército americano ( …). Então a minha mãe trabalhava desde as 8 horas da manhã até às 9 horas da noite e foram essas horas extraordinárias que permitiram que eu, ao fim de um ano, pudesse ir para o colégio”. Ainda trabalhou no escritório de um advogado que havia sido seu professor. Nessa altura ainda existiam numerus clausus e só dois profissionais é que podiam exercer a profissão de solicitador em Alenquer. No entanto, após a morte de um deles, Carlos Cordeiro concorreu ao lugar de solicitador provisionário e, mais tarde, passou com distinção no exame que lhe garantia o título de solicitador encartado. E assim se passaram ”cinquenta e vários anos”: “Tanto que eu fiz várias derivações por outros campos, como a política, e nunca deixei de ser solicitador. E até recusei alguns convites para exercer funções que me obrigavam a deixar de ser solicitador (…)”. Apaixonado pela profissão e sempre “com a mania de se interessar pelas coisas”, foi desde cedo que começou a viver a vida

da Câmara dos Solicitadores, tendo tido um papel importante nas discussões que se seguiram ao 25 de Abril e que visavam retirar os solicitadores do estatuto judiciário que abrangia todos os profissionais do mundo jurídico. “Os solicitadores foram os primeiros a sair deste estatuto e a ter um estatuto próprio. ( …) E uma das coisas que me deu bastante gozo foi subir à tribuna da Assembleia da República para defender a proposta de lei do Governo para criar um estatuto novo para os solicitadores, o qual foi, no mesmo dia, aprovado na generalidade, na especialidade e em votação final. E por unanimidade. E, nesse dia, na minha intervenção, eles fartaram-se de rir porque eu disse mesmo: “Gastei muitas solas de sapatos a subir as escadas do Ministério da Justiça”.” Nas suas palavras, é a “proximidade” que distingue a solicitadoria das restantes profissões jurídicas: “O solicitador é procurado por pessoas que tinham que resolver problemas do dia-a-dia. E isso torna o solicitador num profissional que está mais perto. (…) Também fiz muito tribunal. Mas sempre me apaixonou mais o trabalho fora do Tribunal Estas coisas das vidas das pessoas”.

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Olhando para trás e recordando um passado que os anos não apagam, Carlos Cordeiro não esconde a nostalgia e a saudade que moram junto a uma “altura em que o Tribunal tinha um rosto humano”. Apesar disso, o solicitador também reconhece terem acontecido mudanças positivas. Para além da massificação da profissão que não acarreta apenas benefícios, também muito mudou no que toca à sua dignificação da e à formação no âmbito da mesma: “(… ) passou a haver muito mais solicitadores, (… ) solicitadores melhor apetrechados para o exercício da profissão (…). Houve uma aposta muito grande na formação (… ) ”. Vivenciou o crescimento da solicitadoria que trata “por tu” e como bem mais do que apenas uma profissão. Nas suas palavras, a maior recompensa do seu trabalho acontece quando “atende às necessidades das pessoas”: “Cada vez que resolvo um problema a um cliente, sinto-me satisfeito como se tivesse resolvido um problema meu”. Sempre perto, Carlos Cordeiro também assumiu, na Câmara dos Solicitadores, cargos diversos, “passou pelos vários cantinhos da casa”. Uma “Casa” que define como sendo de trabalho, mas também de “convívio” e de “amizade”. E foi esta dedicação que ditou a necessidade de o homenagear e distinguir aquando do V Congresso Nacional dos Solicitadores, ocorrido em outubro

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do ano passado: “Senti-me orgulhoso. (…) Olhei para trás e vi todo o trabalho que eu tinha feito, todos os colegas Como eu disse naquele momento, esta homenagem não é para mim. É para toda a gente que andou comigo, nestes anos todos, nos órgãos dirigentes da Câmara. A homenagem é para todos. (…) Fizemos sempre uma grande equipa”. Por tudo que ajudou a alcançar, Carlos Cordeiro acredita que muito ainda está nas mãos dos que compõem a classe: “Desejo que continuem a existir bons profissionais. O prestígio de uma profissão resulta dos seus profissionais. (…) Sem bons profissionais, a profissão não tem futuro. (…) Desejo que [a Câmara dos Solicitadores] continue a ser prestigiada como tem sido até agora, que continue a ser reconhecida pelas entidades oficiais”. “(…) não se pode ser solicitador convenientemente se só se for solicitador dentro do escritório. (…) Não nos podemos refugiar no escritório, atrás dos nossos papéis, nos problemas dos nossos clientes. Temos que deixar sempre um bocadinho para a Câmara e para os interesses da classe”. Este colecionador de momentos, com barbas brancas e sorriso enrugado, que da experiência fez a moral das histórias que conta, não hesita quando afirma que é preciso cuidar da profissão. Só assim a história poderá continuar: “Os solicitadores (…) devem continuar a olhar para o futuro da classe. Porque a classe tem futuro”. : :


Opinião

Uma Organização do século XXI Regresso ao Passado? Regresso ao Futuro! Por Luís Filipe Ramos

Parece-me claro e inequívoco que a Câmara dos Solicitadores necessita de uma reforma substancial no seu modo de funcionamento e de operar interna e externamente.

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nstituições como esta têm (quase) sempre alguma­dificuldade em se transformar e adaptar a novos tempos. Há sempre uma pitada de conservadorismo que provoca resistência à mudança e alguma desconfiança para com novas ideias e metodologia. Os que nelas pontificam, legitimados pelo voto ou administrativamente auto legitimados, tendem a dividi-las: os que seguem as suas ideias (os bons) e os outros que nunca têm razão (os maus). Para levar a cabo uma reforma estrutural – como agora se diz - não basta umas quantas palavras de ordem, mais ou menos consensuais, do tipo mais formação, mais isto, melhor aquilo. Uma dúzia de mais, ainda que implementados, não passarão de umas reformazinhas se se não operar uma mudança profunda de mentalidades. Um bom e salutar princípio seria a implementação de um Órgão de Fiscalização, constituído por pessoas tecnicamente habilitadas que zelasse pela boa gestão dos recursos que a Câmara dos Solicitadores tem e gere, que desse a conhecer a todos os solicitadores o seu parecer técnico sobre o modo como a administração (direção) gere os recursos dos acionistas (os solicitadores) e que alertasse para eventuais erros ou excessos que se possam estar a cometer. Um outro sadio princípio, seria a divulgação das deliberações dos diversos conselhos e órgãos, publicitando as deliberações na área restrita da página da CS e, assim, co-responsabilizando todos os solicitadores e permitindo um maior

conhecimento do funcionamento da estrutura: o que se fez, como se fez e o que se pretende fazer. Afigura-se-me que também em termos administrativos haverá muito a fazer, redimensionando os serviços de acordo com as necessidades, designadamente quanto à conciliação com os Conselhos Regionais e exigindo mais rigor e pró-atividade. Nesta época de crise, será também premente avaliar o impacto que as reformas, anunciadas pelo poder político para a Justiça, terão na profissão e na própria Câmara dos Solicitadores (Estará tal avaliação a ser feita? E estando por quem?). Os eventuais investimentos que a Câmara dos Solicitadores se proponha ou tenha de fazer não podem ignorar as medidas que se anunciam. Estando a Justiça no centro da turbulência mediática, sob constantes críticas quanto ao seu modo de funcionamento, à Câmara dos Solicitadores cabe também, enquanto auxiliar na sua administração, pugnar pela sua credibilização e pela recuperação de um prestígio em crise. Também a actualização do Estatuto terá de ser equacionada e a proposta apresentada a quem de direito. Urge adaptá-lo aos novos tempos, expurgando-o de normas que se encontram ultrapassadas e desfasadas da atual realidade, designadamente diminuindo o número de dirigentes, de modo a tornar a gestão mais ágil e menos onerosa. Por isso, quem dirige esta instituição deve saber que não tem direitos acrescidos. Bem pelo contrário: tem mais deveres. : :

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EDIÇÕES

Os Solicitadores – Memória e Identidade. A construção sócio-histórica de uma profissão

Uma História que estava por contar O desafio era grande: escrever a História dos Solicitadores. Amélia Polónia e Jorge Fernandes Alves, Professores na Faculdade de Letras do Porto, responderam “sim” perante o convite e, durante três anos, viajaram entre arquivos e testemunhos, juntaram as peças e deram corpo de livro e voz de História ao que eram excertos emudecidos e solitários. Uma entrevista que pretende recordar e dar a conhecer o backstage deste livro, as histórias por detrás da História.

Como encararam o convite para integrar este projeto? Amélia Polónia & Jorge Fernandes Alves: Como um desafio, mas também com alguma apreensão perante, pelo que se sabia, a falta de estudos sobre a história dos solicitadores, passíveis de serem sistematizados como ponto de partida. O convite soou em simultâneo como aliciante, pelo que poderia trazer de novo, e preocupante, pelo risco de se chegar ao final da investigação sem informação suficiente e/ou consistente para dar corpo a um livro. E como é que este convite chegou até vós? AP: O convite foi formulado, pela primeira vez, em 2007, aquando da comemoração dos 80 anos da fundação da Câmara dos Solicitadores, pela então direção. Em concreto, foi o Dr. José Vieira, solicitador do Porto, quem estabeleceu os primeiros contactos, conhecendo os trabalhos que tínhamos já desenvolvido em torno de questões de trabalho, ocupações e identidades socioprofissionais, por um lado, e de história empresarial, por outro. O que é que já conheciam da história da profissão? AP: Na verdade, muito pouco. As articulações funcionais com a advocacia e a procuradoria, com o advogado e o procurador, em tempos medievais e modernos, tornavam um pouco nebulosa a perceção prévia dos contornos da profissão /

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ocupação no período medieval e moderno. As leituras prévias e a bibliografia existente em torno da história institucional, da história administrativa, da história do direito permitiam dominar já as estruturas­de enquadramento institucional e o quadro legal, mas muito pouco se sabia sobre o exercício concreto das profissões ligadas à prática jurídica e aos estatutos profissionais dos agentes atuando nessa área. JFA: Se, para os tempos mais recuados do século XIX e inícios do século XX, a posição dos solicitadores é discreta, a verdade é que, para os tempos recentes, a profissão dos solicitadores ganhou visibilidade, acompanhando, de resto, a tendência para o crescimento do setor terciário em Portugal. Os solicitadores souberam reivindicar um espaço próprio, ganharam capacidade de pressão junto dos poderes de decisão e conquistaram formação de nível superior, não passando despercebido aos mais atentos à sua afirmação social. Existia muita história por explorar? AP: Eu diria que estava quase tudo por explorar. Os dados fornecidos, nomeadamente pelo website da Câmara dos Solicitadores e compulsados por Miguel Ângelo e outros, foram um ponto de partida, assim como o foram alguns estudos e dados fornecidos pelo Boletim da Câmara dos Solicitadores. As conversas iniciais com o Sr. Dr. Daniel Lopes Cardoso, infelizmente breves pelas circunstâncias que conduziram à perca


lamentável de uma grande figura no domínio da Solicitadoria, revelaram-se de grande utilidade, dado conhecimento profundo­que continham acerca da evolução da profissão e por terem permitido a compreensão da função, inclusive social, do solicitador, em Portugal, nomeadamente no Norte do país. Por onde é que se começa um projeto desta dimensão? AP: Pela formulação de questões – o que é que eu quero saber, o que é que eu preciso de saber sobre esta profissão, sobre o seu corpo de profissionais (solicitadoria e solicitadores) e raízes históricas –, sabendo de antemão que algumas dessas questões não seriam cabalmente respondidas. Segue-se a conceção de um plano que constitua um guia para a pesquisa e a sistematização da informação a coligir e, depois, avança-se para uma pesquisa bibliográfica tão vasta quanto possível. Porque a História, em geral, e qualquer história, em particular, se faz, antes de mais, através de um questionamento da realidade, só depois se passa para os arquivos como “laboratórios da História”. Embora a documentação sempre forneça, em História, a imprescindível sustentabilidade empírica a uma investigação, conferindo valor de prova (prova documental) às linhas de força e às conclusões que se venham a apurar e a adiantar, a problematização do passado tem valor estruturante na implementação de qualquer projeto de investigação, como era este. A pesquisa em Bibliotecas e Arquivos, inclusive pertencentes à Câmara dos Solicitadores, foi, naturalmente, componente essencial do processo de investigação. Havia já alguma obra desenvolvida neste âmbito? AP: Sobre os Solicitadores especificamente não. Mesmo em termos internacionais, dadas as especificidades e diferenças das funções adstritas aos profissionais que se identificam pelo termo “Solicitador”, a bibliografia não ajuda. O que havia e que conferiu sustentabilidade contextual ao projeto, para o período medieval e moderno, era uma bibliografia académica sobre poder e instituições, sobre a história do direito, sobre a prática jurídica, sobre a formação académica de juristas, advogados, juízes, procuradores e alguma coisa, pouca, sobre o exercício e o acesso à justiça pelas populações. Destacam -se, para o período moderno, os textos de António Manuel Hespanha, Nuno Espinosa, José Subtil, Joana Estorninho, Francisco Ribeiro da Silva, e para o período medieval os de Armando Luís Carvalho Homem e Luís Miguel Duarte, apenas para citar alguns dos mais cotejados no volume I da obra. JFA: Para o período mais recente, há informação muito rica nas várias edições do Boletim da Câmara dos Solicitadores e publicações afins que consubstanciam os principais caminhos da vida associativa, os eventos e os discursos dos seus protagonistas. Por outro lado, a legislação de enquadramento é mais minuciosa desde a época liberal, pelo que, correndo as coleções de legislação, apreendemos os principais vetores da trajectória profissional dos solicitadores.

A que elementos é que recorreram durante a investigação? Quais é que consideraram os mais enriquecedores? AP: Como se disse, recorreu-se a bibliografia (monografias e artigos de publicações periódicas), coleções de legislação e documentação de Arquivo. No caso do volume I, sobre o período medieval e moderno, o Arquivo Nacional – Torre do Tombo foi um dos principais baluartes de pesquisa. Aí, os fundos do Corpo Cronológico, Chancelarias Régias, Gavetas, Feitos Findos, Registo Geral de Mercês, bem como o da Inquisição (Tribunal do Santo Ofício) foram os mais pesquisados. A disponibilidade online desses materiais ajudou, em muito, uma pesquisa que, se não fosse essa circunstância, levaria muito mais tempo a concretizar-se. Fundos locais, nomeadamente de arquivos municipais, foram também utilizados, se bem que não pesquisados sistematicamente. Lamentavelmente, a circunstância de a maior parte dos Arquivos dos Tribunais serem inexistentes para o período medieval e moderno, ou não organizados e globalmente indisponíveis para o período do Antigo Regime, como ocorre com o acervo do Tribunal da Relação do Porto, inviabilizou a utilização desse material arquivístico. No que se reporta a documentação legislativa e a códigos legais, o website Ius Lusitaniae - Fontes Históricas do Direito Português -, uma base de dados constituída com a finalidade de divulgar um conjunto de textos fundamentais para a história do direito português, revelou-se uma fonte de informação valiosa. JFA: Para a época contemporânea, a legislação, os debates parlamentares e a informação dos diversos boletins associativos constituem a base do trabalho. A Câmara dos Solicitadores possui ainda alguma documentação avulsa e, particularmente, um núcleo de documentação manuscrita e dactilografada relativa à luta pelo associativismo na década de 1920, o qual foi fundamental para percebermos os inícios dos meandros e os jogos políticos que acabariam por levar à criação das câmaras dos solicitadores e à sua posterior unificação numa só Câmara. O que é que mais vos surpreendeu durante o período de investigação? AP: Na verdade, a possibilidade de poder chegar à perceção de uma dimensão mais social, da profissão e dos seus agentes, e a de apreender o perfil de alguns deles, nomeadamente os apanhados nas malhas da Inquisição, os quais constituem apenas uma parte de um todo muito mais heterogéneo, mas que, ainda assim revelam vivências reais, não apenas nos espaços de atuação dos Tribunais ou instituições adjacentes, mas também no quotidiano. A sua ação a nível municipal, a sua projeção para espaços ultramarinos, em tempos de expansão e construção de um projeto colonial – são outros aspetos, não totalmente surpreendentes, mas importantes pela malha que definem em espaços que extravasam os metropolitanos. Não foi surpresa verificar que a sua expansão em número, a sua qualificação e diferenciação funcional ocorreu, em paralelo e em simultâneo, com um processo de centralização do poder

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e de maior complexificação da vida económica e social. Surpresa mesmo foi verificar que as funções de execução, cuja inclusão no âmbito do exercício profissional foi objeto de luta recente pela Câmara dos Solicitadores, faziam parte das atribuições ancestrais desses profissionais. JFA: Acrescentarei, para o período contemporâneo, o sentido gregário de alguns profissionais que, militando com prejuízo­ ­pessoal, conseguiram conferir sentido associativo e capacidade representacional a uma classe geograficamente dispersa – isto através da via associativa, desde a organização local, como foi o caso da Associação dos Solicitadores Encartados de Lisboa, em 1868, replicada no Porto cinco anos mais tarde, até à criação da Câmara dos Solicitadores, mais tarde. Fizeram-no para defender a profissão de vários ataques, procurando cerrar fileiras contra os não encartados (os “lareiras”) que invadiam o seu território profissional, e defenderam-se também perante as sucessivas investidas que vieram dos profissionais do direito. E, como da defesa partiram para o ataque, procuraram qualificar a profissão através de um estatuto e da formação superior. Lembremos que tudo isto aconteceu com escassas centenas de profissionais (os encartados, antes de 1974, não chegavam aos 200, os provisionários eram quase outros tantos). Como chegaram à conclusão de que seria mais viável dividir a obra em duas partes distintas? Foi fácil organizar todo o material recolhido e repartir esse mesmo material? AP/JFA: Como se explica na Introdução da obra, o Liberalismo e o século XIX definem, por questões políticas e de história do direito, uma fronteira entre dinâmicas de poder e de exercício da profissão, o que especifica duas épocas distintas. O fim do Antigo Regime constitui, nas sociedades europeias, um processo marcante, mais ainda nos domínios das instituições e do direito. Sem que isso ponha em causa as continuidades da História, justificou uma divisão, e uma atribuição de tarefas de investigação individualizadas, entre os dois autores. As fontes de informação são distintas; novos arquivos surgem; a emergência de uma organização profissional só começa a tomar corpo neste segundo período; as problemáticas que envolvem o exercício da profissão são distintas; as próprias questões que estruturam a pesquisa não são as mesmas. Isso conduziu a um processo de construção da investigação distinto e a um produto final que dificilmente poderia ser visto em continuidade ou em simples progressão. Individualizar os dois volumes pareceu ser a melhor solução, quer do ponto de vista dos autores, quer do ponto de vista dos públicos. O trabalho foi desenvolvido em conjunto ou de forma totalmente individualizada? No âmbito de um trabalho desta natureza, é mais fácil trabalhar sozinho ou, pelo contrário, a troca de ideias assume-se como algo essencial? AP/JFA: O projecto, em si, do livro, foi desenvolvido conjuntamente. As perspetivas de análise foram forjadas através de

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uma ativa troca de ideias inicial, desenvolvida ao longo do processo. Durante o período de escrita, trocámos sempre textos e versões provisórias. Todavia, o trabalho de pesquisa bibliográfica e documental foi individual, assim como a escrita de cada um dos volumes. Isso não obstou a que se partilhassem materiais que se tinham como sendo de utilidade comum. Em que público é que pensaram enquanto elaboraram a obra? Porquê? AP: Confesso que, durante o processo de pesquisa, não pensei em públicos, mas na de investigação em si própria, pois acredito que a sua solidez deve ser a mesma, independentemente dos públicos. Durante a escrita, procurei tornar o texto acessível a um público não especialista, nomeadamente no domínio da História e no domínio jurídico. Por isso, tive a preocupação de fazer uma extensa contextualização do exercício da profissão, facultando os quadros históricos em que se desenvolveu, precisamente no pressuposto de que nem todos os leitores os dominariam a priori. Procurou-se diminuir a carga mais erudita, mais académica, mas confesso que não creio tê-lo conseguido plenamente, ainda que me pareça que o discurso, em si, é acessível a qualquer leitor interessado. Confesso também que, só mais no final da escrita, se prefigurou como possível um outro tipo de público, para além dos solicitadores e outros profissionais ligados ao exercício jurídico: os estudantes de graduação e de pós-graduação que se formam no domínio da Solicitadoria. Creio que, para eles, esta obra será (ou espera-se que venha a ser) de grande utilidade, para que se compreenda a evolução histórica do exercício da profissão e para que se perceba, em simultâneo, o seu perfil, hoje, e a função social que lhe pertence. JFA - Para o público em geral, sem distinção particular. Um livro deste tipo corresponde a uma apresentação externa. Desta forma, gostaria que o livro fosse encarado como um texto em que os solicitadores se revêem. Quanto tempo demorou todo o processo de investigação e de elaboração da obra? AP/JFA: Bom, o processo foi longo: dois anos de pesquisa e um ano de escrita foi o necessário para dar corpo a esta obra. Isto considerando, obviamente, a acumulação desta atividade em complemento das atividades de investigação e de ensino universitários, que todos sabemos serem muito exigentes, no que toca a tempo e a comprometimento. O que distingue a História dos Solicitadores? Quais os factos mais curiosos que destacariam? AP: Se me permitem, em vez de destacar o que distingue a História dos Solicitadores, sublinharia o que tem esse processo de construção sócio- história de uma profissão em comum com tantos outros. A emergência de uma profissão, enquanto tal, implica, tanto a estruturação interna gradual da profissão, quanto a sua adequação aos desafios e às oportunidades que lhes são lançadas pelos contextos envolventes, pela evolução


EDIÇÕES

política, económica, social, institucional e administrativa de uma sociedade, neste caso a portuguesa. Tal como os procuradores, os solicitadores interagem, na sua ação, de uma forma intensa e pessoal com aqueles que representam, e a quem dão voz. Daí o qualificativo de “vozeiros” atribuído aos ancestrais medievais, comum a procuradores e a solicitadores. Em simultâneo, a sua função de mediadores exerce-se, por um lado, entre as populações e o sistema jurídico e judicial, de cada vez maior complexidade a partir da Época Moderna e, por outro lado, entre os diversos outros agentes judiciais, o que lhes confere uma função social ativa, de verdadeiros pivots - facto que lhes foi atribuindo uma presença crescente no quotidiano, em simultâneo, das populações e da prática jurídica e judicial. De afirmação mais tardia do que os advogados e os procuradores, a profissão cresce e organiza-se de forma consistente, no período moderno, a partir de um corpo muito heterogéneo de oficiais, cujo perfil socioeconómico, níveis de literacia, formação escolar e palcos de atuação são marcados por uma intensa diversidade, dificilmente perspetivada, para esse período, como corpo. JFA: Para o período contemporâneo, o traço mais distintivo continua ser o sentido profissionalizante que os solicitadores demonstram, isto é, o solicitador mais representativo procura mais do que uma mera ocupação, desenvolvendo ações de fechamento do grupo, de produção de identidade, de espírito de corpo e de especialização que lhe assegure um espaço próprio de profissionalidade no campo das profissões jurídicas, não obstante os caminhos estreitos que se lhe deparam­. Olhando para trás, qual diriam ter sido o aspeto mais desafiante deste trabalho? AP/JFA: O quase total desconhecimento do que nos esperava em termos de resultados finais de investigação. O facto de essa História estar por escrever. Tendo investigado o passado da profissão, como vislumbram o futuro da mesma? AP: O estudo do passado não nos permite fazer futurologia. Mas o estudo do passado deverá permitir aos agentes do presente uma reflexão mais consciente e informada, não só sobre o presente, mas também sobre o futuro. Atendendo ao processo histórico de afirmação da profissão, no contexto nacional e internacional, que se espelha na obra, imagino que o futuro venha a consolidar esse processo de longa duração e a garantir o exercício da profissão com uma maior qualificação e em articulação inevitável com outras profissões adjacentes. Espero que signifique também uma mais ativa consciência da função social da profissão e de que a criação e a defesa de identidades não é incompatível com um ativo processo de interação a um nível mais global, em particular do ponto de vista socioprofissional. JFA: A classe dos solicitadores tem vindo a sofrer uma autên­tica revolução nos últimos tempos, quer devido ao novo tipo de formação, quer à feminização do corpo profissional.

As gerações recentes de solicitadores têm um amplo caminho à sua frente, ainda que não isento de obstáculos, mas apenas se conseguirem dar continuidade ao pendor associativo que os seus antecessores foram capazes de dinamizar e fortalecer. O que poderá significar, dentro de algumas décadas, ter o Livro do Solicitador na estante da biblioteca pessoal? AP: Espero que não signifique apenas “tê-lo na estante”, apesar de a qualidade gráfica da edição (facto que não é da nossa responsabilidade) seja em si mesmo um fator de valorização da obra e justifique o seu valor como objeto bibliográfico. Espero que signifique ainda, décadas passadas, um desafio ao seu manuseamento, à sua consulta, à sua leitura atenta, pois isso significa que o valor da investigação se manteve. Mas espero que esteja ao lado de outras obras da mesma natureza, porventura mais atuais, ou que tratem mais especificamente este ou aquele aspeto da profissão e do exercício profissional. E espero que esteja ao lado de obras que desenvolvam uma perspetiva comparativa com os domínios do exercício da advocacia e da procuradoria, isto é, que estabeleçam as necessárias articulações entre a solicitadoria e o exercício dos solicitadores num âmbito mais alargado da prática jurídica. Se isso ocorrer, creio que a obra terá cumprido a sua função: a de desbravar terreno; a de fornecer uma primeira aproximação global a um tema, nunca totalmente exaustiva, e a de motivar a elaboração de outros estudos. JFA: Acrescentarei, para finalizar, que todo o autor deseja ser útil, sendo lido. E, neste caso específico, em que o grafismo da versão do texto sobre “Os Solicitadores”, em livro, se desenvolveu todo em torno de letras e palavras do próprio texto, que esse grafismo tenha capacidade para acentuar o convite à leitura. : :

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Opinião

O mérito e a compensação acendem o sucesso do indivíduo Por João Garanhão

A atividade do agente de execução tem sido, nos últimos tempos, tema dos mais variados comentários e artigos de opinião de alguns dos mais iluminados comentadores televisivos.

C

hega a ser preocupante a forma cega como argumentam alguns temas da atividade do A.E e da ação executiva, sem qualquer conhecimento de facto, com o notório intuito de, mais uma vez, tentar desacreditar um profissional que trabalha diariamente em prol de uma justiça mais eficaz, mais célere e que possa, assim, contribuir para que o sistema judicial não seja um entrave mas sim uma mais-valia na retoma da economia portuguesa. Permitam-me o desabafo, será que “esta gente” sabe, verdadeiramente, o que é um agente de execução? O que nos vale são os inúmeros advogados e exequentes que lidam diariamente com a ação executiva e que entusiasticamente afirmam que a ação executiva nestes moldes funciona, é célere e é eficaz. Obviamente que pode ser melhorado o processo, principalmente nos incidentes declarativos onde se regista o principal obstáculo a uma melhor tramitação. Sejamos todos diferentes e, ao invés de dizer mal gratuitamente, de afirmar “que nem tudo está bem, portanto vamos alterar tudo”, como de resto tem sido normal nos últimos anos, apontemos as falhas, até porque o processo executivo tem aspetos muito positivos e outros que podem ser melhorados. Tem sido bastante árduo o caminho percorrido pelos agentes de execução que, em 2003, apenas tinham o GPESE para, basicamente, aceitar processos executivos. À exceção dos processos que eram enviados via postal, a maioria dos processos executivos eram levantados nas secretarias judiciais, perante a imensa resistência dos senhores oficiais de justiça que viam os agentes de execução como intrusos numa atividade que, até ali, era exercida pelos próprios. A forte vontade de fazer bem, de contribuir para uma melhor justiça e a intenção de transformar a reforma da ação executiva num sucesso consolidado, foi o mote para o contínuo investimento na aplicação informática e para a incessante formação dos agentes de execução. A verdade é que, hoje, o GPESE / SISAAE tem um conjunto amplo de funcionalidades e de ligações informáticas que permite tramitar a ação executiva em apenas alguns minutos. Hoje, podemos afirmar que, na maioria dos tribunais, os senhores oficiais de justiça são parceiros judiciários e que alguns juízes reconhecem que os agentes de execução são um contributo positivo para o bom funcionamento dos tribunais. Se, em 2003 e 2004, existia uma eventual justificação para que as alterações legislativas tardassem a ser implementadas e para que não se registasse a desejada evolução qualificativa do sistema processual,­

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Longe de querer ser um exemplo ou de querer ser pretensioso, apenas a humilde vontade de escrever algumas palavras sobre a intensa vida que vivemos.

atualmente­existem menos desculpas para o insucesso da ação executiva, o que transfere para os agentes de execução uma maior responsabilidade, tanto no bom, como no mau desempenho de cada profissional. Os 163 artigos do processo de execução não deixam grande margem para diferentes interpretações teóricas, nem existem manuais de boas práticas no processo executivo, embora tenham surgido, nos últimos tempos, alguns apontamentos que visaram uniformizar procedimentos. Não existem modelos exemplares de gestão de escritório de agente de execução. Há colegas que preferem adotar ou criar tarefas específicas e exclusivas, que distribuem pelos diversos empregados forenses, que se especializam nessas funções executando-as com uma rapidez quase automática. Outros colegas preferem dar pessoalidade aos processos executivos, ou seja, atribuem a cada funcionário forense a responsabilidade de tramitar um determinado número de processos. Garantidamente que se verificará sucesso em ambos ou em todos os modelos de gestão que possam existir. Tudo depende do nível técnico que compõem os elementos de cada equipa. Um bom exercício para aferir se um escritório de agente de execução funciona é, por exemplo, o próprio A.E se interrogar sobre a sua própria dinâmica: 1 – ligar para o seu escritório para perceber como os vários elementos da sua equipa atendem e como abordam os vários temas e fases processuais;

2 – continuar a questionar - como se fosse credor ou mandatário – se o tempo que se demora a tramitar os processos executivos é razoável; 3 – o lapso de tempo na resposta aos mandatários é ajustado ou extemporâneo; 4 – a marcação das diligências de penhora é oportuna ou inoportuna; 5 – a execução dos despejos é penosa ou é célere. Parece-nos, de facto, importante estimular a capacidade individual de cada empregado forense, atribuindo-lhe diariamente tarefas diferenciadas, com crescente grau de dificuldade e responsabilidade, o que lhes permite evoluir, contribuindo para uma melhor qualidade no trabalho desempenhado. Uma reunião semanal ou mensal, onde toda a equipa pode discutir o trabalho menos bem sucedido e analisar, em conjunto, possíveis soluções que consigam incrementar a eficácia do escritório, estimula a noção de grupo. É fundamental que todos os elementos entendam que a gestão deve ser dinâmica e evolutiva, que todos podem contribuir e fazer com que o projeto seja um todo e de todos. As comunicações exteriores não são menos importantes na boa dinâmica de um escritório de agente de execução. A atitude com os tribunais deve ser de estreita colaboração e a imparcialidade do A.E, na medida do possível, deve imperar. O mérito e a compensação acendem o sucesso do indivíduo e, por conseguinte, de toda a equipa. A “onda” do “poucochinho” e do “assim-assim” não chega, devemos ambicionar a excelência. : :

Sollicitare 29


FORMAÇÃO

Avaliar para crescer Departamento de Formação da Câmara dos Solicitadores

Na avaliação, como na vida, “é a prever alternativas em função da experiência anterior, a selecionar a informação relevante, a tomar decisões e a agir em conformidade que todos nós construímos o nosso percurso”1. Com a avaliação da qualidade da formação pretendemos identificar os pontos de melhoraria e inconformidades na formação através de um processo rigoroso, sistemático e dinâmico.

N

o final de cada ação de formação, torna-se importante fazer o balanço da qualidade do processo formativo. Nesta fase, a colaboração de todos os formandos assume uma importância valiosa e imprescindível na obtenção dos dados que permitirão melhorar a quantidade e a qualidade da oferta formativa. A credibilidade das formações está dependente de diversos fatores: – A forma como os formandos encaram os resultados; – O aumento do desempenho através das competências obtidas ou otimizadas; – A satisfação dos formandos e dos empregadores em relação ao desempenho profissional dos formandos, após a formação; ­– Os canais de comunicação que se estabelecem entre intervenientes.

Câmara dos Solicitadores a imagem que todos dão de si e do sistema de formação

Formandos

1

30

www.forma-te.com/mediateca

Escritórios de solicitadores E agentes de execução

A avaliação da qualidade da formação permite, para além do alcance de algumas destas condições, ajustar os objetivos de cada formação e repensar a formação, no total ou nas partes, sempre que necessário. A qualidade das formações ministradas pelo departamento de formação é aferida através de um questionário anónimo, inicialmente entregue em papel no último momento da formação. Mais recentemente, o questionário passou a ser enviado por email, em formato web. Esta nova forma de aceder às opiniões dos formandos permite aferir todos os dados importantes do questionário em formato papel, com as vantagens do anonimato ser garantido a 100%, o preenchimento ser rápido e simples, o tratamento dos dados facilitado e a qualidade das análises e das respetivas conclusões otimizada. Para além disso, o impacto ecológico é substancialmente reduzido. Nesta edição, destacamos os seguintes momentos de formação organizados pelo departamento de formação em 2011: em formato sala, a Fase 1 da formação BUS, a repetição da Fase 1 da formação BUS e, em formato conferência/workshop, as formações dedicadas à análise de temáticas diversas como a desformalização dos atos notariais societários, as Causas da extinção e da suspensão da ação executiva e a venda na ação executiva. No total, obtivemos 1062 avaliações. Por forma às avaliações serem efetivamente representativas da realidade existente, é absolutamente necessário que um número significativo de formandos responda ao questionário. Só assim podemos garantir que a qualidade avaliada corresponde, com uma margem mínima de erro, à qualidade real da formação prestada. O departamento de formação pretende descentralizar, geograficamente, a oferta formativa. Foram planeadas e organizadas diversas ações de formação em locais onde habitualmente


Viana do Castelo

as mesmas não se realizavam, sem esquecer o interior e as ilhas. Contudo, por ausência de inscrições suficientes, muitas destas formações não chegaram a acontecer.

Porto

Corvo

Desformalização dos atos societários Fase 1 da Formação BUS Repetição Fase 1 da formação BUS. Causas da extinção e da suspensão A Venda na ação executiva Localidades propostas, sem inscrições

Flores Faial

Graciosa São Jorge

Terceira Aveiro

Pico

AVALIAÇÃO GLOBAL

A Venda na ação executiva 4 29

Bom

Muito bom

56

12

Desformalização dos atos notariais societários 4 17 68 Causas suspensão e expedição 3 57 BUS Fase 1 – Repetição 1 16 BUS Fase 1

11 41

58

14 53

Guarda

Coimbra

Santa Maria

Suficiente

Viseu

São Miguel

Foram 19 os formadores com perfis profissionais diferenciados que, com o seu saber, colaboraram com a Câmara dos Solicitadores no sentido de bem formar os seus associados, promovendo a fundamental atualização de conhecimentos. Estes formadores foram igualmente avaliados pelos formandos de forma a garantir, sempre que necessário, um reajustamento entre os temas e os perfis profissionais e pedagógicos, bem como a preparação de programas de reciclagem de conhecimentos e metodologias. Os recursos utilizados, quer ao nível de espaços, quer de materiais, são também alvo de avaliação. Os resultados obtidos irão condicionar a possibilidade de reutilização das salas. Mais uma vez, a colaboração dos formandos é extremamente importante no âmbito da otimização de processos, através do preenchimento, sincero e consciente, do formulário. O questionário disponibilizado nas formações, independentemente do formato em que se realizou, permitiu uma melhor adaptação dos conteúdos programáticos (incluindo a carga horária), dos recursos (tais como as instalações e os materiais de apoio) e dos formadores no que diz respeito ao domínio da matéria e à clareza na exposição. O gráfico que se segue resume a avaliação global (em percentagem) das formações referidas:

Insuficiente

Bragança

Vila Real

Braga

25 33

Castelo Branco Leiria Santarém Portalegre

Lisboa

Évora

Porto Santo

Setúbal

Beja

Madeira

FaroAlgarve

Constata-se, pois, que a maior parte dos formandos avaliaram estas formações como globalmente boas ou muito boas. Por temas, foram detetados alguns aspetos a explorar e pontos de melhoria que já foram corrigidos ou ainda serão. Obtivemos ainda muitas sugestões úteis deixadas pelos formandos e que mais uma vez agradecemos. Para além destes avanços, congratulamo-nos pela franca adesão às iniciativas formativas até agora realizadas e pelas inúmeras sugestões apresentadas pelos formandos, as quais são decisivas para alcançarmos uma formação eficaz que responda, de forma concreta, às necessidades de todos os soli­citadores. Do trabalho até agora realizado e dos resultados obtidos, não restam dúvidas: encontramo-nos no caminho certo na área da formação profissional dos nossos associados que, de forma expressiva, nos têm ajudado a crescer neste processo. Assim sendo, a Câmara dos Solicitadores continuará a contar com a colaboração de todos para construir uma boa oferta formativa que muna, os seus associados e colaboradores, das ferramentas essenciais para um exercício profissional de Excelência. : : Texto elaborado em janeiro de 2012

Sollicitare 31


Em Balanço

V CONGRESSO NACIONAL Desde o V Congresso que reuniu a classe em Lisboa, a Sollicitare quis saber as opiniões de alguns dos que fizeram parte deste momento que ficou nas memórias e nas fotografias.

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endo participado ativamente como membro dos órgãos da Câmara desde 1998, este foi o quinto Congresso no qual estive envolvido ao nível da sua organização, pois, apesar de, no mandato atual, não desempenhar qualquer cargo, fui convidado pelo Coordenador da Comissão Organizadora, no sentido de integrar a Comissão de imagem deste V Congresso. Saliento essencialmente duas evoluções: A abertura do congresso aos futuros colegas graças ao I Fórum dos Jovens Solicitadores, o qual se manifestou de grande interesse; e a aposta nas novas tecnologias de informação, nomeadamente com a transmissão integral e em direto de todo o evento, via portal da Câmara dos Solicitadores e Justiça TV. Esta última permitiu o acompanhamento do evento por largos milhares de pessoas o que, atento à estatística obtida, resultou em mais de um milhar de horas de visualização – dados demonstrativos da importância dada ao evento, nomeadamente por pessoas estranhas à Classe. No entanto, pela experiência adquirida, os Congressos profissionais têm um elevado nível de flutuação e dependem essencialmente do “estado de espírito de toda uma classe”. Sendo eventos tão díspares e separados no tempo, nunca poderão ser comparados entre si. As Comissões organizadoras têm de se adaptar às circunstâncias, pelo que entendo não ser de realçar pontos negativos ou positivos. Não me atrevo sequer a dar sugestões, pois dificilmente estas se aplicarão no próximo evento. Pretendo somente realçar o empenho e trabalho desenvolvido por esta Comissão organizadora, a qual se adaptou na perfeição às circunstâncias atuais, presenteando a Classe dos Solicitadores com um evento, a todos os níveis, excecional. Aliás, tenho a noção que este V Congresso, dada a conjetura profissional, politica e económica em que vivemos atualmente, era aguardado com bastante ansiedade por todos os Colegas. Foi notória a satisfação demonstrada pelos Colegas que participaram como delegados ou observadores, não só ao nível do decurso dos trabalhos, mas também no que refere às conclusões e diretivas que resultaram deste evento.

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Afinal de contas, um Congresso Profissional é um evento que aponta em diversas direções. Convívio, trabalho, desenvolvimento do futuro profissional e, não menos importante, projeção da imagem profissional para o exterior. Olhando para o futuro acredito, sem sombra de dúvidas, que a evolução será difícil! O patamar organizativo, ora atingido, colocou a fasquia muito alta para os organizadores dos futuros eventos. No entanto, nos meus 20 anos de profissão, já percebi que a Classe dos Solicitadores é capaz de superar todas as adversidades e desafios que se lhe apresentam. Aguardarei, expectante. Por fim, não quero deixar de expressar, enquanto Solicitador e membro desta nobre Classe, o meu agradecimento na pessoa do Coordenador da Comissão Organizadora, Colega Júlio Santos, bem como a todos os elementos que fizeram parte das diversas comissões e que despenderam de muito do seu tempo profissional e pessoal para que a realização deste evento fosse possível.” Por Jacinto Neto, Membro da Comissão Organizadora

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ssistir ao Fórum dos Jovens Solicitadores foi uma ótima experiência. Todos os intervenientes, sem distinção, estão de parabéns pela forma profissional e carinhosa como realizaram o Fórum. Através do seu esforço, abdicando de tempo de lazer e descanso e/ou conciliando compromissos e responsabilidades, conseguiram produzir dois dias de aprendizagem e conhecimento importantes, não só para o meu futuro profissional, mas também pessoal, graças à simplicidade e disponibilidade de todos. Os jovens solicitadores mostraram que, apesar de jovens, estão bem preparados para o futuro. Espero ter a oportunidade e o enorme privilégio de poder participar em mais iniciativas semelhantes.” Por Marta Alexandra Soares Monte, Aluna do Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra


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concretização do Fórum dos Jovens Solicitadores foi o culminar de um desafio proposto pela estrutura da Câmara dos Solicitadores e da comissão organizadora do V Congresso, convite esse que muito nos honrou, pois permitiu-nos a realização de uma iniciativa pioneira. Tal convite mostra bem a enorme coragem e o espírito de inovação que norteiam esta classe, pois a criação de um espaço de diálogo e de troca de ideias entre os atuais e os futuros solicitadores é uma iniciativa sem paralelo. Foram dias de grande intensidade e, espero, de grande proveito e qualidade. Espero ainda que, além da utilidade, os participantes tenham considerado o Fórum dos Jovens Solicitadores como uma experiência especial, agradável e ‘vivencialmente’ interessante. A nível quantitativo, estamos orgulhosos por poder dizer que conseguimos superar, não só o volume de participantes e comunicações, mas também a participação absoluta do Congresso. Em definitivo, esta é uma das maiores fontes de satisfação que, a nós, organização, nos poderiam ter dado, a par, claro está, da qualidade e da pluralidade de intervenções e dos debates resultantes. Todavia a continuidade destas iniciativas, depende, em grande parte, do empenho e colaboração de todos os jovens Solicitadores, Solicitadores Estagiários e estudantes dos Cursos de Solicitadoria. Isto porque o empenho demonstrado pela estrutura atual da Câmara dos Solicitadores leva a concluir que a participação destes intervenientes é bem-vinda e vista com agrado. Como é evidente, existirão sempre aspetos passíveis de melhoria e estamos conscientes disso. Os pequenos erros técnicos e de coordenação de um evento desta natureza são quase inevitáveis, mas acreditamos que muitos se foram resolvendo com o amável e efetivo trabalho do Secretariado e graças à inestimável compreensão de todos os intervenientes. Este 1.º Fórum deve ser encarado como a primeira pedra num trilho que se pretende de cooperação e diálogo, sempre em busca da rápida e plena integração dos que estão a iniciar uma vida profissional. Termino sublinhando que devemos ter sempre uma postura proactiva em prol da Câmara dos Solicitadores e não ser um mero “espectador”. Está ao nosso alcance contribuir em todas as suas iniciativas, adotando este lema, esta ‘forma de vida profissional’: ‘não pergunte o que a Câmara dos Solicitadores pode fazer por si. Pergunte o que você pode fazer por ela’, parafraseando e adaptando a expressão de J.F.Kennedy”. Por Bruno Nascimento, Organização do I Fórum dos Jovens Solicitadores

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V Congresso Nacional dos Solicitadores ocorreu num momento em que a Câmara dos Solicitadores abraça grandes mudanças e aposta numa formação contínua dos seus profissionais. Não posso fazer comparações com os anteriores congressos já que, como este é o meu segundo ano de exercício da profissão, este foi o primeiro congresso a que assisti. Tenho no entanto a dizer que gostei das inovações, como foi a ideia do Fórum Jovens Solicitadores. Foi assim dada opor-

tunidade, aos que iniciaram agora o exercício da profissão e se interessam pelas questões a ela inerentes, de se fazerem ouvir, contribuindo com ideias inovadoras, implementando outra dinâmica na atuação da Câmara. O contributo dos novos solicitadores, que têm hoje uma formação sólida, pode ser muito importante para a renovação da profissão. No entanto, há muitos aspetos que têm de ser melhorados e trabalhados. A Câmara, ao convidar estes novos profissionais a participar de forma ativa nestas alterações e renovações que se propõe ainda a efetuar, demonstra que está em busca de novas ideias e, acima de tudo, que acredita no espírito empreendedor e na capacidade destes jovens. Aliar a experiência de uns com as ideias inovadoras de outros resulta numa partilha de conhecimentos que, sem dúvida, contribui para um melhor desempenho das funções de Solicitador. Durante o congresso foram apresentados trabalhos muito interessantes, com temas que obrigam a refletir, levantando questões muito pertinentes com que os solicitadores se debatem. Essencialmente, foi salientada a necessidade de afirmação do solicitador e de novas competências para a profissão. Também os oradores convidados defenderam, nos seus discursos, que as profissões jurídicas têm de ser reguladas, pelo que o exercício da solicitadoria não será exceção e o sucesso desta profissão passa pela regulação das atividades a ela inerentes. Só com uma regulação que clarifique a prática de atos por cada profissional, será possível fazer muito mais e sobretudo melhor.

O Congresso tem duas componentes: uma de trabalho e outra de convívio entre colegas. Percebi que este encontro também serviu para rever antigos colegas, conhecer novos e, ao mesmo tempo, trocar ideias e opiniões sobre trabalho. O convívio entre todos os solicitadores é, sem dúvida, muito importante e gratificante. Sabemos que, quando falamos com um colega, ele tem os mesmos problemas, sente as mesmas dificuldades, tem as mesmas dúvidas. Só com o partilhar de experiências, a troca de ideias, aprendendo e ensinando, será possível contribuir para um melhor desempenho da Classe. Todos acreditamos que a solicitadoria tem de ser exercida de forma responsável, porque só assim dignificaremos a profissão. Acredito, por isso, que este Congresso contribuiu para consolidar o respeito pela Classe. E é de prever que o VI Congresso seja ainda mais inovador, sendo para isso necessário mais empenho, dedicação e uma maior participação de todos.” Por Alzira Agostinho, Solicitadora

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ENTREVISTA

“Os profissionais liberais constituem os setores mais dinâmicos da economia Portuguesa”

Orlando Monteiro da Silva PRESIDENTE DO CNOP E BASTONÁRIO DA ORDEM DOS MÉDICOS DENTISTAS

Foi na já década de oitenta, durante o mandato do Presidente Daniel Lopes Cardoso, que a Câmara dos Solicitadores esteve na fundação do então Conselho Nacional das Profissões Liberais. Hoje chama-se Conselho Nacional das Ordens Profissionais e são já 14 as profissões representadas por este órgão. Em entrevista com Orlando Monteiro da Silva, Presidente do CNOP e Bastonário da Ordem dos Médicos dentistas, tentámos perceber o funcionamento desta plataforma de representação das profissões liberais em Portugal. Tendo revelado que o CNOP, muito mais do que apenas servir de base transversal à discussão dos problemas comuns às profissões liberais, tem procurado “pensar construtivamente Portugal” apoiado nas grandes capacidades dos mais de 300.000 profissionais representados, o Presidente do CNOP salvaguardou convictamente que os profissionais liberais portugueses poderão estar na vanguarda da recuperação económica graças também à sua formação reconhecida internacionalmente.

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Fotografias de Hugo Vieira da Silva

Porquê formar um Conselho das Ordens Profissionais quando as Ordens já existem para, por si mesmas, defenderem os interesses dos seus associados? Orlando Monteiro da Silva: O Conselho Nacional das Ordens Profissionais (CNOP), ex-Conselho Nacional das Profissões Liberais, se não existisse teria de ser inventado. Isto porque se regista a necessidade de existir, para além da representação a outro nível de cada uma das Ordens, uma plataforma transversal de comunicação e de representação das Ordens agrupadas entre si, por via, precisamente, da transversalidade das problemáticas que a todas afetam de uma forma geral. Na Europa e fora da Europa, como no Brasil e nos EUA por exemplo, é absolutamente normal que as chamadas profissões reguladas tenham este tipo de representação.

normal aparecimento de novas profissões. Temos alguns requisitos fundamentais para pertencer ao CNOP, nomeadamente ao nível da formação contínua das profissões. Este órgão é relativamente informal, pois o objetivo não é ter uma grande estrutura física, mas sim congregar o pensamento de cada uma das Ordens e tentar, na medida do possível, que essa visão seja comum e partilhada com a sociedade e com uma série de decisores políticos nacionais e internacionais com que o CNOP se relaciona.

E é fácil formar uma voz conjunta que permita defender os interesses de todas as Ordens Profissionais? Por vezes, pode parecer difícil, mas, normalmente, focamonos naquilo que partilhamos e temos em comum. Na verdade, não temos tido dificuldade em detetar um conjunto de preocupações e temas transversais com que nos identificamos.

Podemos dizer que estamos perante um moderador entre os decisores políticos e as várias Ordens? Acho que é uma plataforma extremamente interessante onde, de uma forma aberta, cada uma das Ordens partilha pontos de vista, vivências, experiencias, oportunidades e também ameaças que existem no dia a dia de cada uma. Enriquecemo-nos mutuamente através desta partilha de pontos de vista e de informação. Existe uma colaboração enorme dentro. do CNOP. Trata-se de uma plataforma muito útil para cada uma da Ordens e a prova disso é que nos mantemos há mais de vinte anos.

Para quem não conhece, como é que podemos descrever e definir o CNOP? O CNOP representa atualmente 14 Ordens Profissionais e temos vindo a assistir ao aumento deste número por via do

De que forma é que o profissional liberal isolado pode recorrer ao CNOP? Nós, de vez em quando, recebemos algumas solicitações e tentamos responder da forma mais diligente possível, mas o

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CNOP é uma estrutura que não substitui cada uma das Ordens e, fundamentalmente, essas respostas são encontradas numa base setorial que é competência das Ordens. Alguém que pretende saber alguma coisa sobre medicina, por exemplo, obvia­mente que terá na Ordem dos Médicos o interlocutor ideal para esse efeito. Nós temos um contacto mais interinstitucional. (…) O CNOP contribui para contrariar a tendência das Ordens se fecharem sobre si mesmas? O CNOP contribui, para chamar a atenção para aspetos transversais às Ordens, como são exemplo estas questões relacionadas com o reconhecimento das habilitações académicas. (…) Isso ajuda a esbater um pouco a imagem corporativa que, às vezes, infelizmente, as Ordens ainda têm e que é muitas vezes artificialmente induzida por parte de alguns que se sentem incomodados pela independência das Ordens. As Ordens profissionais são independentes, democraticamente eleitas e esta independência por vezes incomoda algum poder político que preferia ter Ordens domesticadas na sua dependência, é muito apetecível ter este controle. (…) É claro que há muito a fazer nas Ordens, há sempre caminho a percorrer nomeadamente a nível deontológico. As Ordens, cada vez mais, precisam não só de ser reconhecidas como bastiões de qualidade, mas também de ter capacidade de autocrítica e de resposta eficaz às questões que são levantadas pela sociedade. Quais são os principais objetivos do seu mandato no CNOP? Nós temos uma preocupação muito grande com a sociedade portuguesa e o momento que ela atravessa e refletimos muito, não apenas sobre os problemas das Ordens e dos seus associados, mas também numa abordagem mais abrangente sobre a sociedade relacionando isso com cada uma das profissões representadas pelas Ordens. Outra preocupação passa também por promover a abertura do CNOP para que se possa dar a conhecer à generalidade da opinião pública. Estamos também preocupados com os aspetos da defesa da organização das Ordens enquanto tal. Centramo-nos ainda nas questões relacionadas com a qualidade de ensino, algo que é fundamental (…) a forma como se processa a transição da vida académica para a vida profissional é uma grande preocupação da Ordens profissionais e do CNOP. Aliás, o CNOP teve um papel muito ativo na questão do Plano de Bolonha… Sim, nomeadamente através da representação que temos­ no então Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior, atual A3ES. A representação que temos, a esse e a outros níveis­, é, em termos de ensino, absolutamente fundamental. Por exemplo, a questão da petição que fizemos para equiparação dos títulos de Bolonha ao Mestrado integrado antigo, reconhecendo­algo que é fundamental: que as pessoas que, há uns anos atrás, tinham mais formação, não sejam

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ultrapassadas­por via de uma reforma administrativa, nomeadamente em concursos públicos, por pessoas com menos anos de formação. Portanto encontramo-nos ativos no sentido de acompanhar essas questões. Pode dar-nos alguns exemplos? Por exemplo, quando se fala em liberalizar totalmente o acesso a algumas profissões, nós ficamos perplexos! Porque se há país onde se fez um percurso enorme, a este nível, nas profissões reguladas, esse país é Portugal. (…) Quer a nível nacio­nal, quer internacional, temos muitos Portugueses a exercer a sua profissão liberal noutros países e o mesmo acontece com os estrangeiros em Portugal. Nós não temos nenhuma lição a aprender a esse nível, bem pelo contrário. Eu verifico é que há países em que os critérios de acesso à profissão são bem mais limitativos e exigentes do que acontece no nosso país. Por exemplo: já há vários anos que foram retiradas as tabelas de valores mínimos e máximos a cobrar por atos das diversas profissões. Nós, em Portugal, estamos na primeira linha, somos um bom aluno (às vezes até demasiado diligente), relativamente a estas matérias. Há, da parte das Ordens, um mandato que lhes foi dado para assegurar a qualidade do ensino para que a sociedade possa ter confiança na qualidade que é reconhecida ao profissional. Não se pode facilitar a esse nível, sob pena de, por exemplo, uma prerrogativa que existe actualmente, que é a liberdade de circulação no espaço comunitário, ser colocada em causa por outros países. Se nós abrandamos o grau de exigência que é previsto e transversal, obviamente que vamos perder o prestígio que é reconhecido às profissões. O CNOP participa na criação de bases para que os profissionais de outros países sejam reconhecidos em Portugal e para que os nossos também o possam ser lá fora? Cada Ordem tem, nesse contexto, as suas regras, nós acompanhamos a legislação Europeia e nacional sobre essa matéria. Ainda recentemente estivemos na preparação da 11ª Cimeira Luso-Brasileira, onde têm havido problemas enormes. E veja--se como as coisas mudaram em poucos anos: há uns anos atrás havia uma pressão grande de profissionais Brasileiros que queriam vir para Portugal e houve alguns problemas no seu reconhecimento, fundamentalmente porque as nossas habilitações, pelo menos em termos de duração, eram superiores às da formação Brasileira mas, hoje em dia, é precisamente ao contrário e estamos a deparar-nos com uma série de barreiras, da parte do Brasil, ao estabelecimento e reconhecimento dos profissionais vindos de Portugal. Nós temos acompanhado oficialmente isso a pedido da Presidência do Conselho de Minis­ tros e do Instituto Camões (a par de outros organismos que estiveram na preparação da cimeira), para ajudar na resolução deste problema, sensibilizando as autoridades brasileiras nesta matéria. Este é um dos exemplos de casos que acompanhamos nessa matéria.


ENTREVISTA COM ORLANDO MONTEIRO DA SILVA

Falando em opinião pública, como é que acha que o profissional liberal é encarado em Portugal face ao que acontece noutros países? O profissional liberal tem dificuldades que não são verificadas exclusivamente em Portugal. A globalização e uma estratégia decorrente do Tratado de Lisboa que tem vindo a ser seguida pela UE, de liberalização e abertura total, têm sido confundidas e usadas em benefício dos maiores grupos económicos, em detrimento do profissional liberal. (…) São os profissionais liberais que estão próximos das pessoas e que asse­ guram determinado tipo de serviços de forma personalizada. E a pressão que existe em termos de regulação, em termos económicos, em termos de fiscalidade, por exemplo, é brutal! É muito difícil ser profissional liberal. E depois, em Portugal, os verdadeiros profissionais liberais (é desses que estamos a falar) são muitas vezes confundidos com os falsos profissionais liberais. Repare que até existem os chamados falsos recibos verdes. (…) Para além de autónoma e independente, existe por si enquanto profissão aberta no mercado das profissões. Com toda a fragilidade que isso implica, é necessário, desde logo, apostar numa formação, é necessário apostar na afirmação do nome do um profissional liberal que começa do zero e tem sempre um período de investimento, durante o qual já está a ser escrutinado e avaliado pela mais difícil e exigente das avaliações que é a avaliação dos clientes. Acha que existe a ideia de que é caro recorrer a um profissional liberal? Não é algo exclusivo do nosso país, mas nós somos uma sociedade com um capital social muito baixo (digo capital social no sentido da definição de Robert Putnam), em que a participação cívica é muito fraca. Somos ainda, a par de outras sociedades do sul da Europa, uma sociedade em que o condomínio não é valorizado. A casa de cada um talvez seja valorizada, mas o condomínio já não é. E, quando falo do condomínio como exemplo, falaria de outras áreas em que se entende que os problemas são sempre dos outros. Muitas vezes, também dentro das Ordens existe essa pressão. Imputa-se às Ordens, enquanto organizações, a responsabilidade de resolver situa­ ções que são da responsabilidade de cada um de nós em particular e da sociedade em geral. E, como este capital social é baixo, em Portugal é ainda muito mal visto que, perante a disponibilização de um determinado serviço, haja lugar ao pagamento. E, por vezes, há serviços em que as pessoas não têm presente a real relação custo/beneficio, nomeadamente através dos impostos, como têm junto de um profissional liberal onde o pagamento é feito diretamente, mediante a prestação do serviço. Logo, a perceção do custo é muitíssimo maior do que noutros setores de atividade. E a generalidade das profissões liberais em Portugal são totalmente independentes, não têm subsídios, não há nada que as ajude diretamente. Toda a sua estrutura de custos tem que ser refletida nos honorários que cobram. Isto não é fácil de aceitar numa sociedade como a nossa.

Os profissionais liberais, além da independência, cultivam a capacidade de agir por si, o que não é muito fácil de encontrar na sociedade Portuguesa. Eu julgo que as profissões liberais podem estar na vanguarda do empreendedorismo e galvanizar a sociedade para as vantagens do risco e da afirmação sem dependência e penso, por isso, que as profissões liberais podem ajudar muito Portugal a encarar e a superar os desafios que enfrentamos. A seguir a uma crise, vem sempre uma recuperação. E eu acho que as profissões liberais podem estar na vanguarda dessa recuperação.

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ENTREVISTA COM ORLANDO MONTEIRO DA SILVA

Acha que as profissões liberais têm um papel importante na recuperação económica? Não tenho dúvidas nenhumas. Os profissionais liberais constituem os setores mais dinâmicos da economia Portuguesa. Tanto em termos de qualificação, como de empreendedorismo. Somos um setor dinâmico, qualificado e que, obviamente, estará na vanguarda das soluções que venham a surgir dos desafios que este País tem pela frente. Basta ver a quantidade de profissionais que, no âmbito das Ordens, estão, infelizmente, a sair do País para obterem colocação minimamente compatível com a preparação em que tanto investiram. Portugal, neste momento, não está a oferecer oportunidades a estas pessoas mais jovens, muitas delas muito qualificadas. Estas pessoas estão a sair do país e são acolhidas, obviamente de braços abertos. E isto, no discurso de algumas pessoas, pode parecer que alivia o problema do desemprego e do subemprego mas, a longo prazo, vamos pagar um preço caro por vermos sair do nosso país pessoas tão qualificadas e tão jovens (…). No futuro, de que forma é que iremos ouvir falar do CNOP na sociedade civil? Julgo que será bom que a sociedade civil possa ver o CNOP a sair da esfera estrita das profissões liberais, podendo pensar também o país, tendo capacidade para propor caminhos e soluções. Basicamente: utilizar o grande conhecimento que existe nestas 14 profissões e colocá-lo ao serviço do país. Acho que o CNOP poder ter um papel importante nesta matéria e as Ordens, bem aglutinadas, podem propor soluções. Vejo tanta gente a propor caminhos, que penso que as Ordens deviam ser mais ativas nesta matéria. Penso que não há problema nenhum, bem pelo contrário, que estes mais de 300.000 profissionais e as estruturas que os representam tenham uma voz mais ativa na busca de soluções para os enormes desafios que Portugal e a Europa enfrentam.

Neste contexto socioeconómico, os profissionais liberais encontram-se então ainda mais fragilizados… Com certeza. Este ciclo económico, como é fácil de prever, afeta enormemente a rentabilidade das profissões liberais. Há pessoas nas variadíssimas profissões que sobrevivem por brio pessoal, porque acreditam que virão (e virão com certeza) tempos melhores. São muitas vezes profissões exercidas por uma ou duas pessoas, numa estrutura pequena e, por vezes, até familiar, que se esforçam para sobreviver ao ciclo económico que estamos a atravessar. Por isso, acho que se deviam valorizar mais as profissões liberais em Portugal, começando por reconhecer o seu esforço. Em Portugal, temos cerca de 300.000 profissionais liberais que, económica e fiscalmente, estão organizados como micro empresas, mas são essas que criam mais emprego. É fácil de projetar o que 300.000 profissionais inscritos nas Ordens representam, direta ou indiretamente, em termos de emprego.

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2012 afigura-se um ano de desafios. Como pensa que será vivido pelos profissionais liberais? Os profissionais liberais, além da independência, cultivam a capacidade de agir por si, o que não é muito fácil de encon­trar na sociedade Portuguesa. Eu julgo que as profissões liberais podem estar na vanguarda do empreendedorismo, da recuperação e galvanizar a sociedade para as vantagens do risco e da afirmação sem dependência e penso, por isso, que as profissões liberais podem ajudar muito Portugal a encarar e a superar os desafios que enfrentamos. A seguir a uma crise, vem sempre uma recuperação. E não é cinismo dizer isto porque o que virá depois encontrará nas Ordens profissionais pessoas com paradigmas totalmente diferentes daqueles em que temos­vivido, que são os paradigmas da dependência, da falta de qualificação. Julgo que as profissões liberais estão bem colocadas para assumir estas novas perspetivas. Vejo as Ordens com profissionais muito mais preparados para competir dentro da Europa. (…) Os nossos profissionais são reconhecidíssimos e eu acho que podemos ter mais capacidade para nos abrirmos e vermos o mundo de uma maneira mais global. : :


Quem é quem

Quem é quem

No Conselho Regional do Norte Prometido é devido. Depois da visita à nova sede, seguimos para norte, em direção ao Conselho Regional do Norte da Câmara dos Solicitadores. As expressões simpáticas transparecem o ambiente acolhedor que poderá encontrar por aqui. Com um sorriso nos lábios e na voz, os funcionários deste Conselho Regional estarão sempre disponíveis para o receber. Fique então a conhecer a “casa” e os rostos.

Funcionários De baixo para cima: Paula Lopes, Susana Azevedo, Flávia Pimentel, Vanessa Barrosa, Carla Resende, Sofia Monteiro, Fátima Rodrigues, Marta Pinheiro, Helena Peixoto, Ricardo Ferreira, Amadeu Monteiro

Secção de Processos Paula Lopes – Chefe Secretaria; Marta Pinheiro, Vanessa Barrosa

Secretaria Ricardo Ferreira, Flávia Pimentel, Susana Azevedo, Paula Lopes, Sofia Monteiro

Amadeu Monteiro Director de Serviços

Secção Deontológica Fátima Rodrigues, Carla Resende, Helena Peixoto

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ENSINO SUPERIOR Nos últimos anos, os cursos de solicitadoria têm vindo a conquistar público e destaque em diversas instituições nacionais de ensino superior. Visando garantir uma ponte sólida com todas elas, este espaço cheio de espírito académico, o qual irá percorrer Portugal e continuar a marcar presença nas próximas edições, tem como principal objetivo divulgar a história, os desafios, as conquistas, as aspirações, a “personalidade” de cada um destes cursos.

Continuaremos Empenhados na nossa aposta na qualidade e rigor MARIA MANUELA DIAS MARQUES MAGALHÃES SILVA Diretora do Departamento de Direito da Universidade Portucalense

Hoje e olhando para trás, considera que foi o momento certo? Talvez tenha até sido tardio, mas a oportunidade só se manifestou de uma forma mais premente nessa altura. Como considera que tem evoluído ao longo dos anos? De forma positiva, quer em termos de procura, quer de adaptação às necessidades do mercado de trabalho. Que adaptações têm sido levadas a cabo? Temos realizado algumas alterações no plano de curso, face à experiência e a algumas necessidades sentidas em certas­áreas científicas, após auscultação do mercado de trabalho e dos próprios estudantes, e tentado aumentar a mobilidade dos mesmos, para conhecer novas realidades e experiências.

Há quantos anos foi instituído o curso? O 1.º ciclo de estudos em Solicitadoria teve o seu início em 2007/8, com a Coordenação da Mestre Maria Manuela Maia Rebelo que ainda hoje o coordena e foi, desde o início, a Sua mentora e elo de ligação com as instituições representativas da área. O que vos levou a apostar na sua criação? A resposta à necessidade de uma aprendizagem de qualidade neste universo da formação jurídica.

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O curso é um reflexo da passagem do tempo, do incremento da exigência e da evolução das expectativas? Sem dúvida, a Solicitadoria começou por ser uma atividade onde não era necessária formação específica e hoje já é oferecido o Mestrado em Solicitadoria. E essas mudanças, esses sintomas de evolução têm tido impacto no funcionamento da Justiça em Portugal? A evolução faz-se sentir em todos os agentes da justiça, embora a morosidade do sistema ainda hoje seja uma realidade e, por vezes, um entrave.


O que sublinha como aspetos diferenciadores do mesmo face aos outros existentes no país? Sobretudo o facto de ser ministrado numa Universidade que oferece também um 1.º ciclo de estudos em Direito, há já 25 anos, permitindo assim conjugar sinergias e aproveitar a reconhecida experiência do Departamento, do corpo docente e de um plano curricular no qual as unidades curriculares, que constituem o núcleo duro da formação jurídica, têm uma enorme preponderância.

Tem registado mudanças nessa forma de olhar a profissão? Sim, a qualificação dos profissionais determina um maior respeito e consideração pela profissão.

Quais as vossas principais apostas? Rigor, qualidade e exigência.

Sente que o curso oferecido pela vossa instituição tem andado de mãos dadas com a atualidade e o mercado de trabalho? Entendemos que sim, aliás, pelas razões já anteriormente expostas, procuramos dar formação nas áreas em que as necessidades se fazem sentir, dando assim resposta aos desafios atuais e ao mercado de trabalho.

Aliás, tendo que descrever o curso e a formação que oferecem em apenas uma frase, o que diria? Um curso que proporciona uma formação jurídica de base de elevada qualidade complementada por uma formação técnica que permite a aquisição de competências nas várias áreas multidisciplinares, a fim de assegurar uma posição competitiva no mercado de trabalho dos futuros licenciados.

De que forma acompanham essa transição dos vossos alunos? Mediante o contacto permanente que a Universidade mantém com os antigos alunos, através da respetiva Associação, bem como com os representantes da Câmara dos Solicitadores (temos um protocolo com o Centro Regional Norte) e escritórios de Solicitadores protocolados.

A faculdade mantém relações com instituições estrangeiras e favorece a mobilidade dos estudantes? No âmbito dos programas de mobilidade Erasmus e Leonardo, temos protocolos com diversas universidades europeias e, todos os anos, recebemos estudantes de outros países e um número considerável dos nossos alunos realiza períodos de estudo no estrangeiro.

O investimento em protocolos nacionais é uma constante preocupação? Sim, sempre. Não nos podemos manter alheados da realidade, pelo que fomentamos parcerias e protocolos com organismos profissionais, escritórios de solicitadores e outras instituições de ensino superior.

Valorizam essa aposta no âmbito do ensino superior? Claro que sim, apostamos e continuaremos a apostar, mesmo porque os nossos licenciados já deram provas de que valeu a pena e de que continua a valer. E a adesão/procura tem registado progressos? Verificamos que, cada vez mais, o nosso curso é conhecido e reconhecido e, como tal, a procura naturalmente aumenta. Se sim, como justificaria esse aumento? Os nossos licenciados são a melhor publicidade da instituição e desde 2009/2010 (términus do 1.º curso) que os licenciados em Solicitadoria, pela Portucalense, atestam no mercado de trabalho a qualidade do nosso ensino. Dever-se-á a uma maior sensibilidade para compreender o papel do solicitador? Também. Como considera que a sociedade encara a profissão de solicitador? Como um técnico do Direito com um relevante papel na área do Direito e da Justiça.

Aliás, relativamente aos vossos alunos, o que diria que os pode distinguir nesse mercado de trabalho cada vez mais competitivo? Uma formação sólida de elevada qualidade, que decorre da exigência e rigor científico do ensino ministrado na UPT. Como definiria as responsabilidades de uma instituição do ensino superior no contexto atual? Cada vez mais exigentes, no sentido da qualidade e do rigor. De que forma é que participar na direção de uma instituição como esta, atualmente, é por si só um desafio? É sempre um desafio participar e cada vez mais, dado o contexto atual, com vários fatores adversos, mas que é necessário contornar e enfrentar, sempre pautado pela honestidade, por um trabalho sério e de rigor científico e intelectual. Quanto ao futuro, que oportunidades e projetos é que se adivinham? É difícil prever o que o futuro nos reserva nesta sociedade em constante mutação e com a promessa de reformas profundas no sistema do ensino superior e da justiça. O que podemos assegurar é que continuaremos empenhados na nossa aposta na qualidade e rigor e no constante diálogo com os parceiros institucionais. : :

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ENSINO SUPERIOR

A Faculdade está convicta de que tem realizado um bom trabalho José Duarte Nogueira Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Lusíada

evolução das expectativas? E essas mudanças, esses sintomas de evolução têm tido impacto no funcionamento da Justiça em Portugal? A procura surgiu de imediato, foi aumentando e mantevese estável posteriormente, sempre com maior incidência no período pós-laboral. Passado o tempo de avaliação inicial, a Universidade começou a equacionar eventuais ajustamentos, mostrando-se aberta ao sentir dos alunos através dos seus representantes no Conselho Escolar e Pedagógico. Foram então criadas disciplinas de frequência facultativa e gratuita a título experimental. Esta e outras iniciativas irão determinar a reavaliação da estrutura do Curso a apresentar no futuro à entidade competente. O objetivo é mantê-lo, o mais possível, adequado à formação necessária ao Solicitador, tendo em vista o reajustamento da sociedade portuguesa à realidade emergente da crise que o país atravessa. Há quantos anos foi instituído o curso? O que vos levou a apostar na sua criação? Hoje e olhando para trás, considera que foi o momento certo? A licenciatura em Solicitadoria iniciou-se na Universidade Lusíada em 2006, tendo cerca de meia centena de alunos obtido o grau até ao ano transato. Esta correspondeu à transformação do bacharelato existente desde 2004. Constatou-se, em certo momento, que alguns alunos de Direito, em especial na turma noturna, tinham como objetivo profissional a Solicitadoria, ou porque já nela trabalhavam, ou porque a ela pretendiam aceder. A Universidade era também consultada no sentido de saber se disponibilizava formação nessa área. Entendeu-se então que existia uma lacuna no elenco de cursos disponibilizados. O projeto foi formulado logo em 2004 em termos de formação de nível superior. Todavia, nesse momento, surgiram algumas dificuldades ao nível das estruturas nacionais da Educação, concretizando-se apenas como bacharelato. Algum tempo depois, o objetivo foi retomado e o curso foi autorizado como licenciatura. Pode pois dizer-se que, não tendo ocorrido no tempo desejado, aconteceu no possível. Como considera que tem evoluído ao longo dos anos? Que adaptações têm sido levadas a cabo? O curso é um reflexo da passagem do tempo, do incremento da exigência e da

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O que sublinha como aspetos diferenciadores do mesmo face aos outros existentes no país? Quais as vossas principais apostas? Aliás, tendo que descrever o curso e a formação que oferecem em apenas uma frase, o que diria? O curso foi pensado em articulação com o de Direito, de modo a permitir ao Solicitador, não só, o exercício da profissão num quadro de formação académica de nível superior, mas também, se assim o entender, obter a licenciatura em Direito. Para tal a generalidade das disciplinas são comuns, sendo lecionadas pelos mesmos professores com o mesmo grau de exigência de conteúdo e de avaliação, de modo a ser dada equivalência às correspondentes disciplinas da outra licenciatura, se acaso for solicitada. Em suma, o licenciado em Solicitadoria pela Universidade pode, com uma ampliação da formação em um ano, aumentar o leque de alternativas profissionais. Esta possibilidade tem sido utilizada por um certo número de alunos. Numa frase, diria que se trata de um Curso exigente e que permite acesso a uma outra licenciatura. A faculdade mantém relações com instituições estrangeiras e favorece a mobilidade dos estudantes? Valorizam essa aposta no âmbito do ensino superior? A Faculdade de Direito, na qual se insere o Curso de Solicitadoria, tem relações institucionais com um significativo número


de escolas jurídicas na Europa, em África e na América do Sul. O relacionamento efetua-se nos dois sentidos. Na atualidade, encontram-se em mobilidade perto de quinze alunos. Este intercâmbio é assumido pela Universidade como componente corrente da sua existência enquanto escola jurídica, na certeza de que os países não constituem mais ilhas isoladas e de que quanto maior for o contacto internacional entre estudantes, maior será, em termos potenciais, a possibilidade de se afirmarem profissionalmente. O intercâmbio está aberto a estudantes de Direito e de Solicitadoria. Todavia, a apetência destes últimos tem sido escassa. Embora compreensível, por muitos exercerem já uma atividade profissional, a Faculdade incentiva-os, em particular aqueles que não têm tais limitações, a ponderarem contactos com o estrangeiro como forma de ampliarem a visão do mundo e da realidade jurídica, sabendo que tal será sempre um ganho na sua formação e vivência. E a adesão/procura tem registado progressos? Se sim, como justificaria esse aumento? Dever-se-á a uma maior sensibilidade para compreender o papel do solicitador? Como considera que a sociedade encara a profissão de solicitador? Tem registado mudanças essa forma de olhar a profissão? A procura do Curso tem-se mantido relativamente estável, mesmo na atualidade quando a crise é palavra de ordem. O facto de na Faculdade o ensino de Solicitadoria ser feito em associação ao dos Juristas, tem contribuído para o posicionamento de ambas as formações no mesmo plano, enquanto futuros profissionais do Direito, contribuindo para esbater a ideia de que o Solicitador se destina apenas a lidar com prática acrescendo ao Jurista a teoria. O facto de o licenciado em Solicitadoria poder licenciar-se em Direito com algum tempo mais de formação, esbateu a distinção psicológica que hierarquizava as duas profissões. Esta equiparação sente-se, aliás, na camaradagem com que os alunos de ambos os cursos se relacionam nas aulas, participando em simultâneo nas mesmas iniciativas e grupos de trabalho. Sente que o curso oferecido pela vossa instituição tem andado de mãos dadas com a atualidade e o mercado de trabalho? De que forma acompanham essa transição dos vossos alunos? O investimento em protocolos nacionais é uma constante preocupação? A Faculdade está convicta de que tem realizado um bom trabalho na formação destes profissionais e de que eles chegam preparados ao mercado de trabalho. O que não significa que não esteja permanentemente disponível para melhorias, porque a formação universitária é um trabalho permanente, nunca perfeito, sendo certo que, no quadro legal atual, as alterações não dependem apenas da Universidade, mas também de entidades oficiais. A colaboração com as estruturas associativas dos profissionais de Solicitadoria é também desejada, tendo em conta aqueles objetivos. O acompanhamento dos licenciados depois de terem deixado a escola é um dos projetos

que a Universidade acarinha pela inequívoca utilidade de que se reveste. Nem sempre tem sido fácil manter esse contacto, pois a tendência do Solicitador, uma vez obtido o grau, tem sido a de se desligar da escola. A preservação está a ser feita através de Associações de Antigos Alunos e da criação de Cursos de Especialização e Formação Pós-graduada, em matérias a que os Solicitadores são sensíveis em termos de formação ao longo da vida. É o caso, no presente momento, de alguns cursos de especialização em funcionamento, que despertaram a vontade de antigos alunos em regressar aos bancos da escola. Aliás, relativamente aos vossos alunos, o que diria que os pode distinguir nesse mercado de trabalho cada vez mais competitivo? A qualidade da formação que lhes permite a abordagem de muitas áreas jurídicas em termos análogos aos licenciados em Direito, incluindo matérias que, usualmente, não são muito apetecidas aos Solicitadores mas que levaram já alguns a novos rumos profissionais. Como definiria as responsabilidades de uma instituição do ensino superior no contexto atual? De que forma é que participar na direção de uma instituição como esta, atualmente, é por si só um desafio? O saber é a única riqueza que permite ao indivíduo aceder a situações profissionais de alto gabarito e vingar nelas quando não dispõe de vantagens estritamente pessoais, o que acontece na maioria dos casos. A responsabilidade de uma instituição de ensino é, em primeiro lugar, a da garantia da qualidade da formação que disponibiliza. Entre a facilidade e a exigência, mesmo que esta dificulte a vida a alguns, a opção de escola consciente e responsável não pode sofrer dúvida. Estar convicto de que, no dia a dia, este fator está assegurado é a principal obrigação da Direção, ainda que a exigência não a desobrigue de promover a utilização de todos os meios ao alcance para ajudar o aluno a superar dificuldades. Mas só se este quiser, verdadeiramente, empenhar-se. Para além disso a escola deve também contribuir para a formação para a vida, em níveis não puramente virados para o saber especializado. Deve formar para a cidadania e essa é a segunda preocupação da Direção, tentando assegurá-la através de iniciativas conducentes a tal objetivo. Quanto ao futuro, que oportunidades e projetos é que se adivinham? A breve trecho pretende-se reequacionar a estrutura do Curso, em função de exigências jurídicas que há alguns anos não eram tão sentidas. Pretende-se também institucionalizar algumas das disciplinas práticas que vieram a ser experimentadas como facultativas. Eventualmente desaparecerão algumas que a experiência mostrou serem, no dia a dia, menos úteis à atividade de Solicitadoria. Sempre, porém, tendo em conta que o Curso deve manter uma forte proximidade à Licenciatura em Direito, de modo a não fechar portas até ao momento abertas a quem as quis utilizar. : :

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SOCIEDADE

A Associação Portuguesa do Direito do Consumo Os jornalistas da Revista Sollicitare estiveram à conversa com o Professor Mário Frota, Presidente da APDC. Fique a saber mais sobre esta associação.

Como poderemos definir a Associação Portuguesa do Direito do Consumo? A apDC, criada em 23 de novembro de 1989, em Coimbra, é uma sociedade científica de intervenção que se vota à promoção dos interesses e à proteção dos direitos do consumidor. Por promoção dos interesses se concebe tanto a intervenção no domínio da formação como no da informação para o consumo. Já por proteção dos direitos, entende-se tanto o aperfeiçoamento da carta de direitos do consumidor, mercê de um aprofundado estudo das situações de facto e do direito aplicável, como dos meios de tutela, vale dizer, do acesso ao processo e aos tribunais, de molde a que se cumpra a tríade: JUSTIÇA CÉLERE, SEGURA (eficaz) E GRACIOSA OU, ao menos, NÃO ONEROSA. Na sua matriz ainda, já que surge como antena portuguesa da AIDC – Associação Internacional de Direito do Consumo –, a primeira e única sociedade científica internacional, fundada em Coimbra em 21 de maio de 1988, no termo do I Congresso Internacional “Das Condições Gerais dos Contratos”, por nós promovido na Universidade de Coimbra, uma inata vocação para a cooperação, que se cumpre exemplarmente com o Brasil, onde os direitos do consumidor não são conceito vão. Como sociedade científica – e porque privilegia o contacto com a realidade – mantém uma parceria com uma associação de consumidores autêntica, autónoma e genuína: a ACOP – Associação de Consumidores de Portugal –, de âmbito nacional e interesse genérico, a qual cumpre a sua missão ao recoligir as agressões contra o estatuto do consumidor e ao dar resposta direta às afrontas de que padece o concreto consumidor que, afeto à sua linha, a procura para o efeito, apoiando sobretudo a instauração de ações coletivas, como tem sido o caso dos ramais de ligação, das taxas de disponibilidade da água e de cláusulas abusivas. Como se organiza uma entidade que pretende estar perto dos consumidores? Na sua organização interna, dispõe de: – um Centro de Formação e Educação para o Consumo; – um Centro de Informação para o Consumo;

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– um Centro de Documentação; – um Centro de Publicações; – um Centro de Estudos de Direito do Consumo. O Centro de Formação desenvolve a sua atividade voltada para os formadores e para as escolas, independentemente dos programas de preparação, por exemplo, de manipuladores de alimentos e de profissionais outros a quem não escape o propósito de bem servir em obediência à carta de Direitos do Consumidor. Elabora ainda programas e promove ações de divulgação onde quer que requeiram o seu contributo. O Centro de Informação prepara as notícias, os programas de rádio, como outrora os de televisão, mantém, como publicações regulares: – o NETCONSUMO, jornal virtual; – a REVISTA DO CONSUMIDOR, ora em reformulação para a versão digital; – a RPDC - REVISTA PORTUGUESA DE DIREITO DO CONSUMO, publicação científica; – A REVISTA LUSO-BRASILEIRA DE DIREITO DO CONSUMO, editada no Brasil e que cumpre agora o seu primeiro ano de existência, com um êxito considerável. O CEDC - Centro de Estudos de Direito do Consumo - a que tanto se deve, da sua colaboração, nos idos de 80/90, à Comissão de elaboração do Código brasileiro de Defesa do Consumidor à própria Lei de Defesa do Consumidor portuguesa, à Lei dos Serviços Públicos Essenciais, à dos Tribunais Arbitrais Necessários e, bem assim, a tantas outras manifestações nem sempre visíveis, nem sempre identificáveis, como a discussão, que ora pende seus termos no Comité Económico e Social Europeu, em torno da PUBLICIDADE infanto-juvenil. A última proposta carreada aos órgãos do poder é a que versa sobre a LEI DAS CONDIÇÕES GERAIS DOS CONTRATOS por forma a torná-la efetiva, dadas as condições atuais que conduzem a uma inoperância deplorável, que importa combater com firmeza. A cooperação tem hoje (…) uma vertente extraordinariamente importante na execução das atividades que privilegiamos. Só no ano que transcorre cumprimos duas missões cul-


turais no Brasil, com intervenções efetivamente relevantes em inúmeras instituições e para públicos inteiramente distintos, as quais foram muito bem-sucedidas. O Brasil consagra a estes domínios um interesse ímpar, que falece desafortunadamente em Portugal. Que papel exerce na atualidade? A apDC continua a formar, com particular relevância para os cursos de pós-graduação que promove de Norte a Sul do País. Continua ainda a levar a cabo simpósios, seminários, jornadas, conferências, congressos de extensão variável e acerca dos mais candentes temas de Direito do Consumo. Só durante este ano, uma mão cheia de intervenções peculiares surgiram com a chancela da apDC, conquanto, a despeito da sua projeção, os media jamais lhe consignem espaço para que o vulgo tenha acesso ao que efetivamente se faz. No entanto, divulgam sistematicamente pretensas posições da antena da multinacional belga EUROCONSUMER´s, S.A. – a Deco.Proteste, L.da -, como se se tratasse de uma associação de consumidores, num equívoco que fere mortalmente a dignidade dos consumidores, vítimas de um embuste sem limites… em manifestação de franco desrespeito por aqueles que são as suas vítimas ajuramentadas. A apDC continua a manter programas de informação em estações de radiodifusão e colaborações em vários jornais, conquanto apartada das televisões, por razões que lhe escapam. Mantém também, no NETCONSUMO, consultórios jurídicos que apreciam concretas situações vividas pelos consumidores e a que se oferece uma resposta objectiva e rigorosa, para que – em termos pedagógicos – os consumidores que vivam algo de análogo saibam com que linhas se deverá coser. Aposta um outro tanto em revistas como, por exemplo, “O ADVOGADO”, publicação editada no Porto. De resto, o Relatório Intercalar – I Semestre 2011 – reflete bem o desassossego de um punhado de mulheres e homens que emprestam o cunho do seu dinamismo a uma instituição que mereceria decerto ser mais acarinhada pela população portuguesa e pelas entidades que visam servir os cidadãos de modo desinteressado. Não são desprezíveis as ações de cooperação que, de modo generoso, a apDC empreende alémfronteiras, com especial relevo para o que se faz de modo permanente no Brasil. O Relatório a que se alude é disso inequívoco testemunho. Para além do mais, a apDc é referência – tanto nacional como internacionalmente - no Direito do Consumo, sempre tão maltratado em instituições que deveriam cultivá-lo com particular desvelo, dadas as suas responsabilidades. Em lugar de o tratarem cerebralmente, tratam-no malfadadamente “a pontapé”, com os reflexos daí emergentes para as vítimas, duplamente vítimas por tamanho descaso! Qual a proximidade que mantém com os consumidores? A que os consumidores entendam estabelecer. Nunca fechámos as portas fosse a quem fosse.

De resto, pela relação entretecida com a ACOP, estamos em permanente ligação com um sem-número de comunidades de consumidores, especialmente as que são vítimas, aos magotes, de empresas de serviços públicos essenciais, como de outros inescrupulosos agentes económicos. E aí intervimos diretamente para socorrer quem do nosso esforço necessite instantemente, como sucedeu recentemente com populações de determinadas freguesias de Guimarães e de Barcelos, de Gondomar e outros concelhos, vítimas das empresas de distribuição predial de águas. Em contacto direto e marcante com as populações, sem biombos nem muros, sem hipocrisias nem ficções! Tendo em conta o contexto atual, como deve agir o consumidor, que cuidados deverá ter, como poderá gerir o seu dia a dia? Para que o consumidor possa desempenhar, no mercado de consumo, o seu papel, tem necessariamente de ter uma educação de base que o transforme em consumidor razoável, equilibrado, ator que não mera partícula apassivante num mercado agressivo, povoado, quantas vezes, de inescrupulosos agentes que não olham, em geral, a meios para a consecução dos seus ignóbeis fins. Uma coisa é a educação de base, para que apontam os instrumentos normativos tanto nacionais quanto internacionais, e, complementarmente, a formação para o consumo, e outra, bem distinta, o deprimente espetáculo que gente de “cueiros e chupeta à banda” se permite, com uma arrogância execrável, debitar - como se se tratasse de detentores de verdades universais – lições ex cathedra a quem, com uma notável experiência de vida, resiste como poucos e gere com uma proficiência assinalável os seus magros proventos ou as míseras pensões com que se premeia uma vida de insano labor: pensões ínfimas perante a extensão incomensurável do mês… Choca-nos profundamente ouvir certa gente a dar pretensas lições de vida a quem, afinal, mais teria que oferecer do que a receber o que quer que fosse proveniente fosse de quem fosse. Se um conselho desinteressado nos é lícito dar: que “cadelas apressadas parem os filhos cegos” e “cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém!” O importante é que ninguém “corra a foguetes”, que ninguém se precipite ante uma oferta fantástica, que não esqueçam que “não há almoços grátis”. Já que “o pobre desconfia quando a esmola é grande” ou se lhe oferece “galinha gorda por pouco dinheiro”. Precioso ainda é que o consumidor fique sempre com um “olho no burro e outro no tratante” porque, num mercado tecido de artifícios, sugestões e embustes, não se pode dar de barato que os espíritos que por aí vagueiam sejam ungidos por Deus (que há muito quem por aí deambule para perdição das almas…). Do que os consumidores carecem é de se dar as mãos e de constituir a força que em cada um e em todos radica para se alterar o ambiente à nossa volta, contra os que nos querem despojar da condição de cidadãos de parte inteira! : :

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CONVERSAS

Entrevista com Paula Dourado

Paramiloidose. Viver em contrarrelógio

Paula Dourado é solicitadora. O seu dia-a-dia poderia ser apenas e tão só feito disso: quotidiano, rotina. Mas não. Amanhã, subir um degrau poderá ser mais difícil. A paramiloidose, ou “doença dos pezinhos”, vai minando e corroendo a simplicidade das coisas. É um “não mata mas mói” que Paula vai carregando enquanto procura algo mais. O transplante ditou o fim da “sentença”. Mas isso deixou de ser suficiente. Com o aparecimento de um medicamento, o Tafamidis, o objetivo, de quem vê o seu corpo ser tomado de assalto, já pode não ser apenas (sobre)viver. Segundo site do grupo de amigos e portadores de Polineuropatia Amiloidótica Familiar, o ministro da Saúde, Paulo Macedo, terá garantido que o processo de disponibilização do medicamento “seria acelerado e ficaria concluído até ao final de fevereiro. No entanto isso não aconteceu”. Em resposta a uma pergunta do deputado Jorge Machado, do PCP, o Governo terá explicado que continua em negociações com a Pfizer e que espera tomar uma decisão definitiva até ao final do mês de Março. Foi sobre tudo isto que conversámos com Paula Dourado: sobre como é viver ao ritmo de pequenas conquistas quando nem o tempo, nem a doença sabem o que significa parar. Em primeiro lugar, de que forma é que podemos explicar o que é a paramiloidose? Quais os primeiros sintomas? Trata-se de uma doença degenerativa progressiva dos nervos periféricos. Tem uma transmissão hereditária, manifesta-se normalmente entre os 25 e os 35 anos, sendo que costuma surgir mais cedo quando se trata de um doente do sexo masculino. Trata-se de um gene, no cromossoma 18, que dá a informação errada e que, ao produzir uma proteína que se chama transtirretina, produz de maneira anómala. Existem três órgãos que produzem a proteína: o fígado, a retina, plexos coroideus. E é esta proteína, a qual o organismo não consegue expulsar, que se irá depositar nas fibras, criando uma camada a que se chama amiloidose. Esta camada vai impedir que os nervos comuniquem entre si. Daí haver uma série de coisas que se vão perdendo. Tem uma evolução rápida. Em dez anos pode levar à morte. Temos grandes dificuldades motoras, afeta ao aparelho urinário e gastrointestinal. Tudo começa pelos membros periféricos, nomeadamente pelos pés. Aliás, é o primeiro sintoma visível e daí a designação de “doença dos pezinhos”. Tudo que são extremidades do corpo são as primeiras áreas afetadas. Começamos por sentir “picadelas” nos pés, dores que, posteriormente, vão começando a subir. Entretanto, há um aumento enorme da dor que se sente. Irá também afetar o sistema digestivo,

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depois avança e começa a condicionar a frequência cardíaca, temos perda de saliva, as glândulas responsáveis por produzir suor deixam de o fazer Também o funcionamento dos rins será afetado, bem como a visão. No caso dos homens, afeta ainda a parte sexual. É uma doença que afeta o corpo todo. E já existe alguma forma de se saber mais cedo se alguém é ou não portador da doença? Agora nós já conseguimos saber antes quem é portador. Quando se sabe que houve um caso na família, é possível fazer-se um teste que permite saber se alguém é ou não portador da doença. Mas antigamente não e o primeiro sintoma era a dor nos pés e aí toda a gente sabia que estava a começar Começa com dor e, após a dor alcançar o seu nível extremo, avança a perda de sensibilidade. Por exemplo, se alguém bater na perna de um doente de paramiloidose já numa fase mais avançada, ele não sente. Aliás, sente que lhe bateram mas não tem a noção da força. Também se perde a noção da temperatura. Por exemplo, o doente sabe que entra no mar, sente o “molhado” mas não consegue distinguir o frio do quente, é como se estivesse sempre à temperatura do corpo. E, assim sendo, o doente passa a precisar de ajuda de forma a evitar situações como queimaduras.


Perante todas essas adversidades, como é que passa a ser o quotidiano de um portador de paramiloidose? É muito complicado Porque também perdemos força. Ou seja, primeiro temos que viver 24 sobre 24 horas com dores de uma intensidade enorme e depois não é qualquer medicação que nos consegue retirar uma dor neurológica. E essas dores vão aumentando. Chegamos a um ponto em que a medicação “máxima” já não consegue surtir efeito. E a dor é constante. Acorda-se com uma dor e essa dor irá acompanhar-nos em todas as nossas tarefas ao longo daquele dia. Deixamos de conseguir dormir como antes também devido às dores. Não é um sono reparador. Precisamos de muito mais descanso para conseguir recuperar de um esforço que, provavelmente, uma pessoa sem a doença consegue superar numa noite de sono. A força nas pernas, nos braços e nas mãos também se vai perdendo porque há uma atrofia muscular. Ou seja, descer escadas, dar uma corrida para atravessar a rua, caminhar, custa Cada passo custa. E quais as soluções que estão ao alcance dos doentes? Trata-se de uma doença sem cura e que, em dez anos, pode levar à morte. Antes da possibilidade de transplante, a paramiloidose tinha um aspeto de sentença, ou seja, a partir do momento em que se começasse a desenvolver a sintomatologia, bastaria fazer contas em quatro anos estaria acamada, todos os dias iria perder algo e, em dez anos, estaria morta. Sendo o fígado o órgão que mais produz a proteína, surge então a hipótese de recorrer a um transplante hepático. Ganham-se anos de vida. No entanto, a doença permanece. Os doentes melhoravam significativamente mas, ao nível dos outros órgãos, continuavam a piorar. Por exemplo, a retina continuaria a produzir a proteína e acabaria por provocar cegueira. Trata-se de uma solução parcial que consegue garantir mais alguns anos de vida ao doente e com alguma qualidade. Só que, na prática, estamos a trocar uma doença mortal, a paramiloidose, por duas não mortais, ou seja, a paramiloidose que continuamos a ter e as consequências que advêm do facto de se ter feito um transplante. Há ainda um risco de vida de 17% associado à cirurgia, a qual, por vezes, tem que ser repetida. E depois também é algo caro. A começar pelas vidas que se perdem que não têm preço. Isto apesar de existirem casos bem-sucedidos. No entanto e apesar destes riscos, é claro que o transplante foi algo positivo que surgiu na paramiloidose porque acabou com a sentença a que o doente estava sujeito. No entanto, não deixa de ser algo difícil de se fazer. Sim, estou grata pelo transplante ter surgido. Mas porque é que tenho que me sujeitar a esta roleta russa quando atualmente existe um medicamento? Mas como surge esse medicamento? Estamos a falar do Tafamidis. Quando tinha 16 anos, soube que estavam a fazer uma espécie de registo nacional de doentes e contactaram as famílias em que sabiam que existiam casos. Pediram-me para ir fazer um teste para saber se o meu gene tinha mutação ou não. Foi aí que soube que era portadora e que, provavelmente, entre os 25 e os 35 anos iniciar-se-ia a

sintomatologia. O Hospital de Santo António pediu-me para ser seguida a partir dos 18 anos, em consultas anuais, para se verificar e acompanhar a evolução. Quando surge o estudo para um medicamento, eu demonstrei a minha vontade em integrar o mesmo mas não pude fazê-lo porque ainda não apresentava sintomas, sendo que, na altura, pretendiam-se doentes com sintomas. Este estudo terminou em 2009 com muito sucesso. Um estudo normalmente implica que se aplique, a 50% dos doentes, o medicamento e, aos restantes 50%, o placebo. Uma vez que se verificou realmente uma melhoria significativa nos doentes que tomaram o medicamento, a farmacêutica estendeu a toma do medicamento a todos doentes que participaram no estudo. A partir daí, em França, começaram logo a aplicar o medicamento em doentes que apresentassem os primeiros sintomas. Os restantes países optaram por aguardar o parecer da entidade europeia dos medicamentos (EMEA). Esta entidade pronunciou-se a 21 de julho de 2011 e corroborou que estava comprovado o benefício clínico do medicamento no tratamento da paramiloidose. Isto logo após um episódio de viragem política em Portugal. Depois desse marco, vários países começaram a adotar o medicamento. E os portugueses que emigraram ou nasceram nesses países (estamos perante uma doença que é tipicamente portuguesa) começaram a ser tratados. Em julho de 2011, face ao atraso na disponibilização do medicamento em Portugal, fiz uma Petição pela disponibilização, com caráter de urgência, do tafamidis aos doentes de paramiloidose. Coloquei a petição a circular, online e em papel, durante o mês de agosto e, em meados de setembro, entregámos a petição na Assembleia da República com mais de 9.000 assinaturas. Depois, fui recebida pela Comissão de Saúde. Já em janeiro deste ano, assisti à discussão da petição na Assembleia da República. Todos os partidos políticos apresentaram um projecto de resolução ao governo, sublinhando a necessidade da disponibilização imediata do medicamento. No entanto e apesar de tudo, acredito e defendo que podemos (e devemos!) reivindicar os nossos direitos. Nunca me resignei. Em novembro de 2011, a Comissão Europeia autorizou a introdução do medicamento no mercado em toda a União Europeia e Portugal teria até ao dia 21 de março para concluir a negociação de preço – algo que também o Ministério da Saúde afirmou em fevereiro deste ano. A verdade é que, por cá, ainda nada mudou. E em que é que consiste o Tafamidis? O Tafamidis consegue tornar a tal proteína solúvel e o corpo passa a conseguir expulsá-la. Toma-se o medicamento todos os dias e conseguimos impedir que a proteína se deposite, pois a mesma é eliminada. E, a partir do momento em que se começa o tratamento, a sintomatologia não evolui mais. O estudo mostrou que em 60% dos casos a doença deixou de evoluir, em 30% verificou-se um ligeiro avanço, sendo que os restantes 10% correspondem à margem de erro. Relativamente a estes 30% em que se verificaram avanços da doença, deveremos ter em conta que algumas pessoas não tomaram a medicação da f­orma

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ENTREVISTA COM Paula Dourado

indicada­, outras já começaram numa fase muito avançada da doença. E, entretanto, o medicamente tem vindo a ser aplicado e a demonstrar que acarreta benefícios. Ou seja, perante a possibilidade de escolha entre o medicamento e o transplante, é óbvio que prefiro o medicamento em vez de ir para o bloco operatório jogar à roleta russa, pois não sei se sobrevivo a um transplante. Já para não falar no que é a vida de um transplantado. As pessoas não fazem ideia da fragilidade. E o medicamento permite-nos continuar a ter uma vida completamente normal. Já atingimos uma outra fase: não falamos de vida ou morte mas sim de qualidade de vida. E eu quero ter uma vida com qualidade. Então, perante todos estes argumentos, existe ainda alguma razão que impeça a introdução do medicamento em Portugal? Não há justificação Estamos perante uma doença muito veloz e é muito difícil explicar que, dentro de um mês, já muita gente terá que decidir se faz ou não o transplante. Aliás, com possibilidade de tomar o medicamento somos só 170 doentes porque, num universo 1203 doentes, em Portugal, diagnosticados e com sintomas, 740 já foram transplantados, 256 já ultrapassaram a fase em que poderiam tomar o medicamento, 47 estão a tomar o medicamento porque fizeram parte do estudo da farmacêutica, ou seja, sobram 170 doentes. Entre esses 170, existem pessoas que se encontram numa fase crítica, pois estão quase a passar para uma fase em que deixam de estar elegíveis para a toma do medicamento. E é por isso que um mês pode fazer toda a diferença. Quanto ao preço do medicamento Sim, é elevado mas, na saúde, existem muitas outras áreas em que são feitos grandes investimentos e em que os tratamentos não deixam de estar ao alcance dos doentes. Esta atitude está muito relacionada com a forma como se encara a doença em Portugal porque, apesar de toda a gente já ter ouvido falar acerca da doença dos pezinhos ou até conhecer alguém que seja portador da doença, ninguém sabe o que é viver com paramiloidose. Ninguém sabe o que é perder coisas a uma velocidade vertiginosa, tendo a perfeita noção de que não as vai recuperar. E a verdade é que, se eu for atropelada e perder um braço, tenho direito a uma indemnização porque o meu braço tem um valor. Mas a minha capacidade para sentir a temperatura também tem um valor. Podemos então afirmar que não se tem verificado nenhum avanço positivo? Não considero que tenha havido. Existe uma grande mobilização em torno da causa, todos demonstram estar empenhados Resultados práticos é que não existem. E acontece que eu sou solicitadora, trabalho com leis e conheço o estatuto do medicamento, ou seja, sei que, se nós pertencemos à comunidade europeia e se, no âmbito da comunidade europeia, existe um tratamento para o problema que eu tenho e que não está disponível em Portugal, eu tenho direito a ele através de um pedido de autorização de utilização especial. Assim sendo, em fevereiro de 2011 enviei um requerimento ao Hospital de Santo António totalmente fundamentado com base na Lei. Voltei a in-

sistir por uma resposta em junho. Todos sabem que um recurso no tribunal administrativo leva o seu tempo E há aqui um sentimento de impunidade: nada é dito, nada é feito. E este problema também está relacionado com a própria história da doença. Numa fase inicial, esta doença era associada à população piscatória, mais humilde e menos informada. Se um pai de família fosse portador da doença, se existissem oito filhos, não se sabia quantos iriam ter também paramiloidose. Era uma sentença. Depois surgiu o transplante e, uma vez nessa fase, os doentes deixam de morrer de paramiloidose. Mas é só isso: deixam de morrer. A doença permanece. E depois há muito estigma social contra à paramiloidose, pois ninguém queria que esta “desgraça” caísse na sua família e os casamentos com pessoas portadoras não eram lá muito bem vistos. Ao nível do emprego, também se sabia que o doente de paramiloidose não iria ficar empregado durante muito tempo por causa das constantes baixas médicas. E daí haver tanta vergonha, daí as pessoas não aparecerem, não se quererem expor. E nós queríamos que esta doença deixasse de ser vista desta forma porque ninguém tem culpa de ter uma doença que é genética Além de sermos menos que os doentes com cancro ou sida, por exemplo, temos apenas um grupo de oito ou dez doentes que dá a cara pela luta. E a sociedade tem que saber que existe esta doença e, acima de tudo, o que é. Para além da introdução do Tafamidis em Portugal, outro dos vossos objetivos passa por quebrar o tabu que se construiu em torno da doença? Exatamente, queremos que se fale da doença, que se reivindiquem aquilo que são os direitos dos portadores de paramiloidose. Temos a possibilidade de mudar. Mas, para isso, é preciso reunir a ajuda de todos. Para concluir a nossa entrevista, resta perguntar: A sua formação como solicitadora teve alguma influência na atitude que assumiu nesta luta contra o “deixa andar” e a resignação? Ajudou-me, sem dúvida. Eu ainda completei o terceiro ano de Direito, na Universidade Lusíada. Acontece que, no quarto ano, percebi que não era aquilo que queria para mim e pedi transferência para Solicitadoria. A verdade é que, neste percurso, sempre me incutiram a ideia de que o “não” não é resposta. Aliás, nós, estudantes, jamais poderíamos responder “Isto não tem solução”. E, quando comecei a trabalhar, depareime com essa necessidade: temos sempre que tentar resolver o problema. O conhecimento das instituições, o domínio do lado “diplomático” da questão – tudo conta. Posso dizer que o Direito ensinou-me a estudar cada detalhe do problema e a Solicitadoria ensinou-me a lidar com o lado prático da luta. E, nesta luta, é essencial não perdermos a perseverança e não esquecermos os direitos que são nossos. : : [Entrevista realizada a 11 de maio de 2012] Caso pretenda saber mais sobre a paramiloidose, basta aceder a www.gappaf.com.

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ENTREVISTA SOCIEDADE

Projeto Entrajuda

Gerir não só com o coração A Entrajuda nasceu (…) da certeza de que havia um espaço de oportunidade para ajudar a capacitar e a estruturar o terceiro setor, as instituições de solidariedade social para que fossem mais eficientes e mais eficazes.” Ajudar quem ajuda parece ser o lema deste projeto nascido em 2004. Com aspeto de consultora e vivendo, essencialmente, de voluntários, o projeto Entrajuda, segundo Isabel Jonet, “pretende mobilizar pessoas e empresas que se queiram associar, com as suas competências e qualificações, para levar voluntariamente, a cada instituição de solidariedade social, aquilo que ela precisa”. De acordo com a mentora do projeto, a equipa constatou “que havia muitas instituições que eram geridas com o coração mas que, muitas vezes, desperdiçavam recursos escassos apenas porque não tinham competências, nem conhecimentos de gestão”.

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O

primeiro passo consiste em efetuar a inscrição. Só depois é que as entidades deverão passar por um percurso de formação, pois a filosofia é “se nós não ensinamos uma pessoa a fazer diferente, ela, por receio, vai continuar a fazer sempre igual porque pelo menos, bem ou mal, sabe fazer aquilo. Assim sendo, temos que ajudar a fazer de uma outra maneira”. É neste contexto que surge a figura do tutor, um voluntário “que irá ajudar a instituição no seu caminho. Ou seja, nós não fazemos para a instituição, fazemos com a instituição. Fazemos um caminho com a instituição, levamos contabilistas que ensinam a fazer contabilidade, levamos advogados que ensinam a retificar se toda a parte jurídica está de acordo com as regras e que ajudam, por exemplo, a perceber se podem candidatar-se a fundos comunitários, levamos informáticos que também podem colaborar”. De acordo com a experiência de Isabel Jonet, “há um conjunto de tarefas que as instituições não sabem fazer sozinhas

mas, como desconhecem os mecanismos e os processos, não sabem como poderão pedir ajuda. E, portanto, aquilo que a Entrajuda tem vindo a propor é mobilizar pessoas que digam ‘eu posso fazer isto pela instituição’. Em vez de pôr as instituições a pedir aquilo que precisam, é pôr as pessoas a oferecer aquilo que podem dar. Ou seja, o que é que fazemos? Criamos oportunidade de voluntariado”. Mas estamos perante um voluntariado diferente. Nas palavras da mãe do projeto, “as instituições, muitas vezes, não sabem o que é que existe. As instituições sabem que têm muitos pobres que precisam de ajuda e elas querem ajudar. Só que, muitas vezes, (…) estamos perante pessoas que têm um desconhecimento do que é que existe em termos de gestão e de organização. Nós temos que fazer com que as pessoas olhem para este setor como algo em que podem contribuir mas com competências: é voluntariado qualificado”. Tudo vai sendo explicado ao ritmo do passo enérgico e do olhar brilhante de Isabel Jonet. Ao passarmos pelo Banco de Bens Doados, disparam-se “Olás”, “beijinhos”. Trocam-se

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palavras,­piadas. Passam carrinhos cheios de caixas, arruma-se o que acabou de chegar. Seguimos para o escritório. Estamos no Bairro da Quinta do Cabrinha. Foi aqui que se instalaram por terem acreditado, desde o início, que era possível “abrir” este bairro: “Esta aposta da Entrajuda, ao trazermos o escritório para a Quinta do Cabrinha, ambiciona gerar uma mudança positiva, demonstrando que a normalidade pode existir nestes bairros. A Entrajuda foi muito apoiada (…). Mas todas as pessoas aqui do bairro, com quem conversámos e estabelecemos uma comunicação e definimos regras de convivência, perceberam que a Entrajuda não pretendia ser um corpo estranho e que iria instalar-se dentro do bairro para, com eles, mudar de alguma forma este bairro. Quando nos instalámos, este bairro estava todo grafitado e bastante sujo. De alguma forma este bairro mudou porque se acreditou que seria possível criar uma normalidade neste bairro. Criámos aqui postos de trabalho no âmbito do banco de bens doados e todas as pessoas que quiserem podem ser voluntárias. E, neste momento, as pessoas andam dentro do bairro sem receio. O bairro acolheu-nos porque sabe que nós não somos um corpo estranho”. Integrando várias áreas de intervenção, com âmbito nacional e somando já 3570 instituições inscritas, torna-se impreterível apostar numa estratégia de gestão e num funcionamento articulado: “A Entrajuda é composta pelo Banco de bens (não alimentares) doados, pela bolsa de voluntariado, pela área da formação, pelos projetos solidários e ainda por uma área chamada ‘saúde solidária’. Neste momento, temos 3570 instituições inscritas, às quais damos bens não alimentares, levamos projetos solidários de empresas que querem desenvolver ações de voluntariado com os seus colaboradores. E, além disso, temos muitos voluntários que, no terreno, todos os dias,

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visitam as instituições. Depois, temos os tutores que levarão os projetos de gestão às instituições. Simultaneamente, temos uma área de formação e muitas ações de formação para os técnicos e gestores das instituições. Portanto, temos um conjunto de iniciativas a decorrer ao mesmo tempo e daí o dia-a-dia na Entrajuda ser trabalhoso mas muito gratificante (…). Todos os dias temos o feedback das instituições que nos dizem que estamos a gerar valor social com elas e isso é o mais gratificante. (…) É impressionante ver o que se pode fazer desde que haja organização. E as instituições olham muito para nós como um parceiro em quem confiam (…) e é por isso que nós temos que ter, na sociedade civil e em várias profissões, alguém com quem possamos estabelecer pontes porque a Entrajuda não sabe tudo nem tem que ter essas competências, mas tem que saber onde é que as vai buscar”. O feedback positivo das organizações que recebem apoio garante que a vontade de fazer mais se renove mesmo quando os tempos não se adivinham fáceis: “O ano de 2012 vai ser um ano muito difícil para as instituições de solidariedade social porque muitas delas vão ver os seus acordos e os subsídios que recebem do Estado muito reduzidos. Portanto, aquilo que nós temos que fazer é ajudar estas instituições a serem ainda mais eficazes e eficientes para poderem otimizar os escassos recursos dos quais dispõem. Em 2012, queremos apoiar ainda mais as instituições para que elas percebam que, se forem mais eficientes, os menos recursos que têm podem ser otimizados. Muitas vezes, as próprias instituições não tentam imprimir mudança na sua gestão, têm medo. Assim sendo, há muito trabalho a fazer e é um desafio para a Entrajuda que conseguiu estabelecer, com estas instituições, uma relação muito grande de uma confiança”. No entanto e apesar de terem passado oito anos sobre o arranque do projeto, mantém-se o requisito:


PROJETO ENTRAJUDA

“A Entrajuda ajuda as instituições que querem efetivamente ser ajudadas. Têm que querer mudar”. Trata-se de agir já, sem deixar de pensar no futuro. Prova disso é uma das iniciativas a decorrer com o apoio desta Casa e no qual Vanessa está integrada: “Voluntário eu sou” visa sensibilizar os mais jovens para a questão do voluntariado, pretendendo-se que “daqui a 10 anos, continuemos a ter voluntários, voluntários que saibam o que é ser voluntário”. Uma aposta que demonstra a vontade de acompanhar a mudança. Isto porque até as formas de ajudar têm vindo a mudar. Por exemplo, atualmente, é possível organizar, em conjunto com uma empresa, uma atividade de teambuilding com um fim solidário como, por exemplo, “uma recolha de resíduos elétricos e eletrónicos com os associados e colaboradores. É fácil: pomos uma box ou um contentor lá, faz-se uma ação e isso é muito engraçado. (…) Mas se as pessoas quiserem oferecer voluntariado de competência, então basta contactar a Entrajuda e dizer: ‘nós queremos fazer uma ação’. (…) No entanto, as pessoas podem candidatar-se ao voluntariado isoladamente. (…) Quem quiser colaborar, basta enviar um e-mail para geral@ entrajuda.pt, explicando o que é que pode oferecer, de forma a estabelecermos alguma parceria. Porque nós precisamos muito deste voluntariado qualificado. No caso dos solicitadores, terão que explicar às instituições em que é que as podem ajudar. Por exemplo, seria interessante desenvolver um guião jurídico a explicitar o que é que a instituição tem que ter para estar de acordo com a regra do ponto de vista jurídico”. É fácil ficar contagiado pelo entusiasmo dos que compõem este projeto. Difícil acaba por ser expressar esta sensação através de palavras. Mas Helena André, uma colaboradora integrada na área das instituições consegue-o, entre dois golos de café: “Isto é muito mais do que um emprego, isto é assumido

também como uma missão”. Uma missão cujo sucesso depende de uma articulação que tem tanto de mecânico quanto de cardíaco: “Nós conhecemos cada instituição, o que é que ela é, o que é que faz, como faz, se tem bebés, se tem velhinhos, se dá pequeno-almoço, quais os serviços que presta… Temos uma base de dados na qual está tudo registado e quando, por exemplo, uma empresa nos contacta a dizer que quer realizar uma ação em Guimarães, nós sabemos que instituições por lá existem e do que precisam”. Aliás, é com base neste “esquema” de funcionamento que Sofia Cunha Pereira descreve a Entrajuda, recorrendo à frase chave do projeto: “Uma ponte entre quem quer dar e quem precisa de receber”. Membro da equipa que coordena a área “Saúde Solidária”, Sofia não hesita quando se trata de constatar o crescimento da Entrajuda e das áreas que vão surgindo em harmonia com as necessidades detetadas. Quanto ao futuro, vislumbra-o “risonho e com muito trabalho”. Mas mesmo antes de o futuro chegar, também o presente se adivinha desafiante. Segundo Pedro Ferraz, elemento da equipa encarregue pela Bolsa de Voluntariado, “numa altura em que atravessamos tantas dificuldades, é bom as pessoas perguntarem não o que é que os outros podem fazer por elas, mas sim o que é que elas podem fazer pelos outros, o que é que podem fazer pela sociedade (…)”. Por aqui, todos os dias se faz pelos outros e, acima de tudo, com os outros. Por aqui, todos contam, todos fazem a diferença. A Entrajuda olhou em volta e construiu-se, sempre com os olhos bem abertos e sem deixar de sentir com o coração. “Fazer e ensinar a fazer de outra maneira” acaba por ser uma máxima para os que correm não à velocidade do tempo, mas sim à velocidade dos pedidos de quem precisa de ajuda para ajudar. E assim se vai segurando a “ponte”. Aquela que recebe para, logo de seguida, dar. : :

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NO ESCRITÓRIO Opinião

Sugestões Práticas para Organização da Estrutura de Escritório e de Arquivo

O Documento Particular Autenticado Por Timóteo de Matos e Carlos José Matos, Formadores do Conselho Geral e do Conselho Regional do Norte

A

solução de problemas que, à partida, parecem muito simples, leva-nos, por vezes, a tentar “inventar” aquilo que já está “inventado”. Acresce que, quanto maior for o número­dos “inventores”, maior número de formas são achadas para se chegar à mesma solução. Chegarem os solicitadores a práticas semelhantes na autenticação de documentos particulares seria desejável em termos de imagem e eficiência. Os conselhos que aqui deixamos tenderão, pois, por um lado, a dar uma achega no estudo da uniformização da forma dos documentos emitidos em balcão único e, por outro, a ajudar o solicitador a organizar o seu próprio escritório e arquivo. Compete às entidades autenticadoras de documentos particulares sujeitos a registo predial arquivar os respetivos originais após efetuado o depósito eletrónico, de acordo com o referido no n.º 6 do art. 24.º do Dec.-Lei 116/2008, ao mesmo obrigando o art. 8.º da Portaria n.º 1535/2008. Por sua vez, o Regulamento do Balcão Único do Solicitador obriga os registados em regime de balcão único a, entre outras condições, terem escritório que assegure dignidade e privacidade no atendimento dos utentes, com horário afixado e estrutura de arquivo [art. 31.º, alíneas a) e b)]. Conclui-se assim que, para cumprir estas condições, deveremos ter no nosso escritório uma sala destinada à leitura (que nada proíbe que seja o gabinete onde atendemos habitualmente os clientes, se não pudermos­dispor de outra) e um espaço para arquivo, que poderá funcionar na mesma sala de leitura, desde que devidamente recatado, de forma a afastar a possibilidade de manuseamento por parte de elementos estranhos ao escritório. Nas ações de formação que temos vindo a ministrar, uma das questões que surge com frequência é a seguinte: Como organizar os meus documentos particulares autenticados, como devo numerá-los, como arquivá-los corretamente? São hoje postas em prática duas soluções diferentes de arquivo no Balcão Único: por livros, como procede o Notário com as escrituras, ou por Maços ou Pastas. Sempre nos pronunciámos desfavoráveis à primeira porque, sendo o documento particular apresentado pelas partes (embora habitualmente por nós elaborado), não parece fazer muito sentido começar a numeração da primeira folha por qualquer número que não seja o 1. Por essa razão, embora não excluindo a organização por livros, optámos e aconselhamos a utilização do arquivo por Maços, constituídos por pastas de arquivo. Nesse caso, é aconselhável utilizar pastas de material resistente e, de preferência, de cor diferente das restantes. A numeração das Pastas (maços) deverá ser anual e, em caso de necessidade, poderão ser abertas diversas. Exemplo: P001/11 será o Maço ou Pasta n.º 1 do ano de 2011. O ano de 2012 iniciar-se-á com a P001/12 e assim sucessivamente. Na lombada de cada pasta constará ainda, para total facilidade de consulta,­o número dos documentos nela arquivados (ver sugestão na imagem à direita).

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Dentro de cada uma das pastas, para menor dispersão, aconselhamos o arquivamento do documento autenticado conjuntamente com os restantes documentos que o instruem e que têm, obrigatoriamente, de ficar arquivados. Para o efeito, dever-se-á usar uma “micra” ou outro recipiente que seja prático (no fundo, uma subpasta por cada DPA). Aconselhável será, também, inserir, como capa de cada um dos documentos, uma folha a indicar o respetivo número, o tipo de ato, a data, o número de processo de depósito e respetivo PIN, a chave de acesso ao depósito, o nome dos intervenientes, bem como os documentos arquivados. Cada solicitador poderá ainda mencionar quaisquer outras indicações que considere convenientes. O documento terá, obviamente, uma numeração. No nosso escritório utilizamos uma numeração simples e, em tudo, semelhante­à indicada para os Maços. Exemplo: D014/11 será o décimo quarto documento particular autenticado no ano de 2011; D001/12 será o primeiro autenticado no ano de 2012. Se tivermos dois escritórios, poderemos utilizar em, cada um deles,­iniciais próprias. Exemplo: A001/11 é o primeiro documento autenticado no escritório de Alcobaça; P004/11 é o quarto documento autenticado no escritório de Pataias. Nada mais simples a nosso ver, parecendo-nos assim refutada a questão de que o arquivo por livros é o único possível para uma boa e imediata consulta dos documentos. Com efeito, julgamos ser tão fácil consultar o documento arquivado a folhas 733 do Livro 14, como consultar o documento arquivado sob o número A001/11 do Maço P001/11, acrescendo que junto ao DPA podemos consultar, sem mais buscas, todos os documentos que ficaram arquivados. Resta-nos, agora, a impressão do próprio documento particular autenticado. No nosso escritório, optámos por utilizar papel previamente impresso (podendo sê-lo, folha a folha, no próprio momento da impressão do documento particular), no canto superior direito, como na imagem junta, ou utilizando um pequeno carimbo, para definir a folha, o número do documento­e o maço ou pasta onde fica arquivado. É, no entanto, sempre necessário utilizar o carimbo para os casos (embora­pouco habituais) em que as partes nos apresentem um docu­mento particular por elas elaborado em papel próprio, sob pena de, nesse caso, produzirmos um conjunto diferente daque­le que normalmente utilizamos. A numeração das folhas é aqui feita em função do próprio documento, na frente de cada uma delas, servindo para o delimitar­e não permitir introdução de quaisquer outras folhas, não tendo, neste caso, a função de definir a sua situação no arquivo, o que, como ficou dito, é feito pela numeração do documento­e do próprio maço. Inútil será acrescentar que, para buscas futuras, é de toda a importância fazer e manter atualizado um ficheiro de todos os documentos em suporte informático (eventualmente também em papel).

Resta-nos lembrar a todos que, nos documentos particulares autenticados, não é necessário o registo no ROAS, de acordo com n.º 2 do art. 6.º da Portaria n.º 1535/2008. A prática habitual, por parte de alguns colegas, de proceder, neste caso, ao registo no ROAS não passa de uma duplicação absolutamente inútil já que se está a registar apenas alguns dados da totalidade de um documento já depositado. No entanto, não deve ser esquecida a utilização do selo de autenticação e do selo branco, para aqueles que o possuam. Embora a ajuda que deixamos possa não acrescentar muito aos hábitos e conhecimentos já adquiridos por boa parte dos colegas, supomos que possa ainda ser útil a boa parte dos restantes e uma achega ao estudo da uniformização de procedimentos entre os solicitadores. : :

Sollicitare 55


NO ESCRITÓRIO

AVALIAÇÃO GERAL DE PRÉDIOS URBANOS Por João Capítulo

Tal como os colegas sabem, durante o corrente ano de 2012, encontra-se em fase de conclusão a refor­ma dos impostos sobre o património imobiliário urbano através do processo de avaliação geral.


S

e consultarmos o link do Ministério das Finanças (http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/ B3A456A1-0D69-419A-AEEF-CC95A5EF72E8/0/Avaliacao_predios_urbanos.pdf ), verificamos que a avaliação geral incide sobre os prédios urbanos que, em 1 de dezembro de 2011, não tenham sido avaliados nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) e em relação aos quais não tenha sido iniciado procedimento de avaliação, nos termos do mesmo Código. Podemos ainda verificar os princípios que regem a avaliação geral: – Legalidade; – Simplicidade de termos e da celeridade do pro­cedi­ mento; – Economia, eficiência e eficácia, no respeito pelas garantias dos contribuintes. Ora, segundo a Autoridade Tributária, esta avaliação geral visa corrigir distorções e desigualdades, entre contribuintes, no pagamento do IMI relativo ao seu património imobiliário urbano. Assim, relativamente ao IMI, esta avaliação geral terá impacto no pagamento desse imposto em 2013, mas relativo a 2012, e nos anos seguintes. Recomendamos a consulta deste link, onde a Autoridade Tributária disponibiliza vários esclarecimentos, que nos podem ajudar. Legislação: – Artigos 5.º e 6.º da Lei nº. 60-A/2011, de 30 de novembro, que aditou os artigos 15.º-A a 15.º-P ao Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro; – Portaria n.º 307/2011 do Ministério das Finanças, publicada em 21 de dezembro, fixa o valor médio de construção, por metro quadrado, para vigorar no ano de 2012 que, na prática, se traduz na manutenção do valor de 2011. Registamos um excerto da passagem mais significativa: “Artigo 1.º Fixação do valor médio de construção É fixado em (euro) 482,40 o valor médio de construção, por metro quadrado, para efeitos do artigo 39.º do Código do IMI, a vigorar no ano de 2012.” Pode ainda consultar o SIGIMI, Sistema de Informação Geográfica do Imposto Municipal Sobre Imóveis, o qual loca­liza, no mapa, a freguesia, podendo obter os coeficientes de localização atribuídos. Esta consulta poderá ser efetuada, acedendo a: www.e-financas.gov.pt/SIGIMI/default.jsp#

Resumo das alterações do O.E. para 2012 (em sede de IMI e EBF) Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) As taxas deste imposto sofrem um aumento generalizado: · 0.5% a 0.8% para prédios meramente atualizados · (0.4% a 0,7%, em 2011). · 0.3% a 0.5% para prédios avaliados ( 0.2% a 0.4%, em 2011). · No caso de prédios devolutos ou em ruínas há mais de um ano, estas taxas são agravadas para o triplo (em 2011, o agravamento era para o dobro). · A taxa sobre os imóveis detidos por entidades com sede em país ou território com regime fiscal mais favorável passa para 7,5% (5%, em 2011). · Os valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos comerciais, industriais ou para serviços, constantes da alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º, passam a ser atualizados anualmente. Até aqui, esta atualização era trienal. Em sede do EBF (artigos 44.º e seguintes), são introduzidas outras alterações ao IMI: · Passa a existir um prazo único de três anos de isenção de que beneficiavam os prédios urbanos habitacionais construídos, ampliados, melhorados ou adquiridos a título oneroso, destinados à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, bem como dos destinados a arrendamento para os mesmos fins e com um valor tributável não superior a 125.000€ (atualmente os prazos de isenção são de oito e quatro anos consagrados para os imóveis cujo valor não ultrapasse os €157.500 ou, caso ultrapasse os € 157.500, não seja superior a € 236.250, respetivamente). · No caso de imóveis construídos, ampliados, melhorados ou adquiridos a título oneroso para a habitação própria e permanente dos sujeitos passivos de IRS, esta isenção só se aplica se os mesmos não auferiram um rendimento coletável no ano anterior, em sede deste imposto, superior a €153.300. · Esta isenção não se aplica igualmente aos imóveis que tenham sido construídos, ampliados, melhorados ou adquiridos a título oneroso por entidades estabelecidas em países, territórios ou regiões com regime fiscal mais favorável, independentemente do nível de renda cobrada (atualmente, a cobrança de uma renda igual ou superior a 1/15 do VPT elidia esta norma). · São prorrogadas para 2012 as isenções de IMT e de IMI aplicáveis às aquisições e às detenções de imóveis situados nas áreas de localização empresarial. · No que diz respeito aos prédios de reduzido valor patri­ monial detidos por sujeitos passivos com rendimentos baixos,­o limite do rendimento bruto do agregado familiar é aumentado­para 2,2 vezes o valor anual do IAS (atualmente, este limite corresponde a duas vezes o IAS). : :

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SUGESTÕES

LIVROS JURÍDICOS Recomendados por Luís Rua Teixeira, Vogal do Conselho Geral, e Idalina Carreira, Solicitadora

MANUAL DOS CONTRATOS EM GERAL (4ª Edição Reimpressão) De Inocêncio Galvão Telles Coimbra Editora Versa com alguma profundidade cada elemento dos contratos, as suas especificidades. Ótimo para quem pretender sustentar conhecimento jurídico nos contratos em geral. “O conceito de Contrato na Ciência e na Lei; Progressivo alargamento histórico do conceito de Contrato e sua extensão moderna; Elementos do Contrato: Acordo (sua formação); Elementos do Contrato: Acordo (seu conteúdo); Elementos do Contrato: causa ou motivo; Cláusulas contratuais gerais; Alteração das circunstâncias; Inexistência, invalidade e ineficácia do contrato; Requisitos gerais de validade do contrato”; A representação no contrato; Interpretação e integração do contrato; Cessão da posição contratual; Espécies de contratos”

DICIONÁRIO JURÍDICO De Ana Prata Editora Almedina “(…) De novo, optei por publicação já desatualizada, por ter decidido fazer uma revisão mais profunda, para não ter de novo a frustrante sensação de que ‘jurídico’ é uma espécie de alcunha de um livro que quase se limitaria a colecionar textos legais; e porque, estando para além das minhas possibilidades evitar ou eliminar a imparável proliferação de normas legais, tantas vezes mal feitas, muito tempo este trabalho consome e me consome; para que pudesse terminar, havia de pôr um termo temporal à atualização; fi-lo para maio de 2006, supondo com inusitado otimismo que poderia acabar mais cedo; não foi incluído o Novo Regime do Arrendamento Urbano por, na data que estabelecera, ainda não se encontrarem publicados todos os instrumentos legais que permitiriam a sua aplicação. Muitas gralhas, erros e outros defeitos ficaram; ficam sempre. (…)”

Descrições das obras retiradas dos sites das respetivas editoras.

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PRONTUÁRIO DE FORMULÁRIOS E TRÂMITES (Vol. I – Processo Civil e Declarativo) De Joel Timóteo Ramos Pereira Editora Quid Juris “Esta 9.ª edição contempla as mais recentes alterações legais. Explica, designadamente, a forma de pagamento da taxa de justiça. Inclui (entre outras) as soluções adotadas na mais recente jurisprudência e doutrina, emergentes da tramitação do processo declarativo. A tramitação eletrónica dos processos (CITIUS) está igualmente tratada, tal como a nova organização e funcionamento dos tribunais judiciais. Explica os incidentes relativos à citação, às audiências de julgamento, ao adiamento de diligências por falta de mandatário, à apreciação da matéria de facto, e aos prazos incluindo a contagem nas férias judiciais. Trata da injunção e dos procedimentos especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias. Esta obra constitui uma fonte indispensável de consulta para quem atua nos tribunais.”


ROTEIRO DE JUSTIÇA FISCAL - Os poderes da administração tributária versus as garantias dos contribuintes De Carlos Valentim e Paulo Cardoso Vida Económica “Uma obra que alia a visão prática dos problemas a uma profunda e rigorosa análise da lei, numa linguagem acessível ao leigo, ao estudante e aos profissionais da área. A obra reúne preceitos do RCPIT, LGT, CPPT, CPC, RGIT, e legislação avulsa e contém mais de 30 minutas, formulários e petições prontos a utilizar.”

DIREITOS REAIS E DIREITO REGISTAL IMOBILIÁRIO

PRÁTICA DE DIREITOS REAIS De Maria Paula Gouveia Andrade Editora Quid Júris

De José Alberto Gonzalez Editora Quid Júris “Esta edição acrescenta novas referências legais e jurisprudenciais. Aperfeiçoa aspetos formais. Redefine e aprofunda algumas opiniões e/ou conceções. Estruturalmente, e por razões pedagógicas, a obra também foi alterada. O autor faz a construção geral e a análise sumária dos princípios e dos modelos de Direitos Reais e do Registo Predial. Expõe e descreve (numa perspetiva pedagógica) as principais características e conteúdos dos tipos de Direitos Reais.”

O PROCESSO EXECUTIVO E O AGENTE DE EXECUÇÃO De Eduardo Paiva e Helena Cabrita Coimbra Editora “(…) procuramos, nesta segunda edição, manter as características iniciais do Livro, efetuando, porém, melhoramentos, abordando questões não abordadas ou não suficientemente aprofundadas na primeira edição, por forma a atentar abarcar, tendencialmente, todos as áreas do processo executivo. Nesta esteira, foi introduzido um capítulo sobre o estatuto do cônjuge do executado, no qual se procurou não apenas fazer um levantamento do seus direitos e deveres processuais, mas também, para uma melhor e mais completa apreensão do seu verdadeiro estatuto, analisar, ainda que de forma resumida, as questões de direito substantivo com repercussão na ação executiva, como seja o regime de bens do casamento e o regime das dívidas dos

Interessante para uma leitura com constatação de alguns factos conexos com contratos diversos, a sua resolução e descodificação dos institutos jurídicos aplicáveis. “Mais uma edição com material complementar de apoio aos estudantes. Não dispensa, nem substitui os manuais de estudo destinados ao Ensino Superior. Trata de um direito com enorme relevância, face à tipicidade legal dos direitos sobre as coisas e às novas formas de que esses direitos podem revestir-se na vida de todos nós. É o Direito das Coisas (ou Direitos Reais, noutra aceção). A autora optou por tratar das questões com mais importância teórica e prática no âmbito da matéria que preleciona nas suas aulas.”

cônjuges. Porque num mundo cada vez mais globalizado e no quadro da União Europeia, as trocas comerciais intracomunitárias se têm vindo a intensificar, impunha-se a introdução de um capítulo dedicado exclusivamente ao título executivo europeu. Por último, analisaram-se dois mecanismos processuais não tratados na primeira edição, que, muito embora não sejam privativos da ação executiva, têm amplo campo de aplicação no âmbito desta e aqui revelam algumas especificidades que importava tratar. Deste modo, a par de um capítulo dedicado ao incidente de oposição mediante embargos de terceiros, introduzimos um outro capítulo relativo ao regime dos recursos no processo executivo. (…)”

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SUGESTÕES

Recebi o convite da nossa revista Sollicitare para fazer uma breve síntese sobre obras literárias, recomendando assim algumas leituras.

Ler é aprender… Lendo se renova… Por Pedroso Leal

Como introdução, sempre direi que: A nossa existência humana é, a cada momento, encarada segundo visões e análises diversas, nas quais assentam o nosso quotidiano de vida, realizado segundo normas e atitudes sociais que nos formatam a mente e os comportamentos. Somos todos produto do que absorvemos do meio envolvente, assumimo-nos contudo responsáveis, enquanto seres racionais que comandamos individualmente os nossos atos. Diz a sabedoria popular que é no berço que se ‘bebe’ cultura e educação, é o berço que nos marcará definitivamente no nosso viver e conviver. Apesar de a sabedoria popular ser ‘quase’ inquestionável, acredito que esse ‘berço’, a que se referem os sábios, não tem limites temporais, assenta sobretudo nas nossas opções individuais tomadas no percurso da nossa existência. O saber, em toda a sua plenitude, é um pilar da civilização, onde o desafio permanente da nossa condição de seres humanos é procurar saber, sendo certo que essa sabedoria é um legado natural para os que nos sucedem, também eles exploradores numa permanente busca da verdade e da excelência, quiçá esta a verdadeira meta do ser humano em permanente evolução. Para muitos, inalcançável, para outros, porventura, mais perto, é no somatório da atitude individual de todos, refletida no nosso coletivo, que as sociedades modernas conquistam o almejado sucesso. Afirmamos, sem dúvida alguma, que é também na boa leitura, sujeita à nossa seleção individual, que absorvemos os conteúdos que hão de fazer parte dos nossos ativos disponíveis do SABER.

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“O mundo é um belo livro, mas pouco útil para quem não sabe ler!” Carlo Goldoni


Deste modo, recomendo também a leitura das seguintes obras:

Direito Internacional Público Contemporâneo e Relações Internacionais Rui Januário e António Gameiro Coimbra Editora Os ilustres autores colocaram, nesta obra, a sua visão sobre o Mundo, nas suas múltiplas relações. Numa análise meticulosa e cuidada, abordam e avaliam o problema das migrações, onde a demografia assume a sua real importância no futuro e nas relações deste Mundo Global, onde a aparente ausência de estratégia subsiste. Sobressai, da cuidada leitura, a convicção de que muitas das transformações socioeconómicas, que nos afetam, ultrapassam as decisões do poder sufragado, contrariando as estratégias políticas que os fizeram eleger. A problemática do terrorismo e dos efeitos que as medidas de extrema defesa têm sobre a proteção individual da privacidade – importa saber até que ponto são violados os nossos direitos constitucionalmente protegidos e por quanto tempo vai permanecer esta medida extraordinária que, como já observámos, conduz à possível usurpação e utilização de informações de carácter confidencial. Talvez porque o momento é de reflexão sobre a identidade e a proximidade dos povos, o conteúdo da obra abarca, no âmbito da regionalização, a evolução histórica de Países emergentes como Angola e Timor. É também na Lusofonia que as conclusões dimensionam a nossa vivência histórica com o mar e com os povos a que estamos historicamente ligados, em todos os Continentes, onde a distância é a única fronteira que nos separa, sendo que esta já foi palmilhada há cerca de oito séculos. Finalmente, é deixado indelével o momento conturbado em que mergulha o aparelho administrativo do Estado, cuja dimensão tentacular é um problema para a afirmação do País e para o País em que queremos viver.

Ética para o Novo Milénio Dalai Lama Editorial Presença O drama vivido por um Povo, o Povo do Tibete que vivia pacificamente, num pequeno espaço territorial, tão perto dos Deuses, cujo vivência de tolerância e paz eram os padrões da sociedade em que viviam livremente, seria suficiente para desfolhar esta obra, escrita pelo líder espiritual daquela pequena mas grande comunidade espiritual. O autor, não procura catequizar o leitor, fazendo-o aderir aos seus valores religiosos, mas antes acentuar o seu apelo ao bom senso, inteligência e aos valores de cada indivíduo, sensibilizando o leitor a procurar a sua felicidade. Ao percorrer a obra, deparamos com uma abordagem serena e esclarecedora, não seria de esperar menos, o qual, mesmo fazendo breves referências ao seu exílio, procura nas suas cuidadas palavras, abordar o tema que dá titulo à obra. Percebemos que os valores universais, para os quais deveríamos estar atentos, são hoje secundarizados pelo bem-estar material e pelo “el dourado” da “pseudosociedade moderna” que destrói os valores de igualdade com os quais deveríamos conduzir as nossas relações. O autor, fortemente enraizado nos valores tradicionais da religião TIBETANA, em consequência do seu exílio, é profundamente conhecedor do mundo global em que vivemos, conduzindo as suas abordagens no sentido de que o HOMEM deve assumir-se com mais um elemento da natureza, abdicando do egocentrismo e vivendo para a comunidade. Este “profeta” vivo, apresenta nesta obra a defesa da ética, transversal à sociedade em que todos vivemos, inatacável pelas religiões de valores, e durante a sua exposição vai apelando a uma revolução espiritual. No final, ficamos com a certeza de o Mundo seria de facto mais justo e próximo do paraíso prometido,

se muitos de nós contribuíssemos mais e em cada momento para uma Ética para o novo Milénio.

Guia das Assembleias Gerais M. Roque Laia Almeida e Leitão, Lda. Sem margem para dúvida, esta obra, que já vendeu grande número de edições, é um manual de conduta que devemos ter à mão. Um inestimável contributo do autor para a normalização das relações nas organizações, principalmente do tipo de associações, onde se congregam vontades e surgem discussões permanentes sobre os objetivos, as quais exigem metódica regulação. Recomendamos a leitura desta obra aos Solicitadores que, na sua vida profissional e fora dela, façam parte de órgãos de associações e, sobretudo, aos membros das mesas de assembleia geral. No exercício desta função, convivemos amiúde com momentos em se nos deparam dúvidas quanto à melhor forma de atuação, perante situações que nos surgem. A obra percorre a globalidade dos temas que estão subjacentes à atividade de uma associação, desde a sua constituição, eleição de corpos sociais, atas, tomadas de posse, até ao funcionamento puro e duro de uma Assembleia Geral. Pelo que temos visto em muitas das quais fazemos parte, recomendamos a leitura desta obra, a qual é um profundo e útil contributo para a boa gestão das mesas de assembleia geral, as quais exigem conhecimento sobre a matéria.

Ética e Direito Chaim Perelman Instituto Piaget Porque o autor é considerado um dos maiores filósofos do Direito do século XX e o título é adequado à nossa profissão, adquiri já a obra, com 621 páginas e estou ansioso por iniciar a sua leitura.

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NO ESCRITÓRIO

Vá pelos seus dedos Por Florbela Jorge, Diretora Editorial Coimbra Editora, Grupo Wolters Kluwer

Q

uem podia imaginar, há um par de anos, um profissional forense a consultar leis, jurisprudência e artigos doutrinários, através de produtos e serviços tecnológicos elegantemente configurados, simples e de uso fácil, ao alcance do seu dedo? As editoras, e sobretudo as que se dedicam à transmissão do conhecimento para profissionais, têm tido uma especial preocupação em disponibilizar a informação em vários tipos de suporte. A utilidade da Internet e a adaptação de conteúdos jurídicos, em diversas plataformas, são uma realidade indiscutível no que respeita às vantagens que proporcionam aos profissionais forenses, tanto no que respeita à economia de tempo, domínio da realidade espacial e ganhos financeiros, como no que se refere à qualidade e eficiência dos serviços oferecidos para alcançar a satisfação máxima dos seus clientes. A comunidade jurídica tem evoluído para obter o máximo proveito dos recursos que a tecnologia oferece. O recurso à informação, previamente organizada e estruturada em suporte eletrónico, pelo solicitador evita o desgaste da procura, muitas vezes sem sucesso, da informação jurídicas dispersa em livros, manuais, revistas nas infindáveis estantes de escritórios e bibliotecas. A preparação de documentos, também, se encontra facilitada pela possibilidade de se poder adaptar a informação, aos casos concretos. A Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer, foi pioneira em Portugal na disponibilização de bases de dados jurídicas de legislação, jurisprudência e doutrina, absolutamente inter-relacionadas entre si e com pesquisa semântica integrada, suscetíveis de serem consultadas através de vários browsers e apps (JusNet, JusJornal, JusPrático…). A edição para Android, iPhone e iPad é atualizada sempre que um diploma sofre alterações e, em consequência, é enviado um alerta ao utilizador para que atualize o conteúdo, incluindo ainda comentários de vigência indicando as modificações sofridas pelos distintos artigos. A edição dos códigos conta com um motor de pesquisa por artigos e índice sistemático, facilitando a busca. Para consulta do código, poder-se-á utilizar o índice sistemático com links para as principais secções, capítulos, etc., ir diretamente para qualquer artigo escrevendo apenas o número, selecionar e marcar os artigos da norma, arquivando-os em favoritos, ou comentar um artigo e partilhar com colegas. A edição de informação jurídica online abre, à atividade do solicitador, um conjunto de desafios e oportunidades no desenvolvimento da sua profissão e na comunicação com os

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seus clientes, serviços da administração pública, contribuindo ainda para disseminar práticas de sustentabilidade, com planos que integram as preocupações ambientais e um maior empenhamento no que toca à responsabilidade social. : : Aproveitamos para relembrar que, graças a um acordo cele­brado entre a Câmara dos Solicitadores e o Grupo Wolters Kluwer, todos os associados poderão aceder a uma base de dados jurídica. Esta encontra-se disponível no nosso site www.solicitador.net Saiba como: 1. Aceda à área restrita, inserindo os seus dados (utilizador e palavra-passe); 2. Procure a secção “Legislação”; 3. Dê início à sua pesquisa.

A Coimbra Editora, grupo Wolters Kluwer, edita, ainda, códigos para formato próprio das soluções Apple e Android, ideal para quem necessita de consultar legislação atualizada, de forma rápida, segura e confiável, a qualquer hora e em qualquer local, sem necessidade de ligação à internet. Nunca o slogan de origem publicitária esteve tão atual: “vá pelos seus dedos” ilustra, com excecional rigor, o acesso facilitado à informação, o qual tem vindo a ser alcançado nos últimos anos. com a colaboração do Grupo Wolters Kluver


ENTREVISTA COM ...............

ROTEIRO GASTRONÓMICO

“ (…) uma bela vista sobre a serra do Algarve”

“(…) saímos com a promessa de voltar em breve.”

Sugestão de Maria do Céu Caldeira Moreira

Sugestão de Ana Rucha

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a rota dos bons restaurantes de comida típica algarvia, encontramos, no concelho de Loulé, a escassos dois ou três quilómetros desta cidade, no Sítio de Clareanes, o Restaurante Monte da Eira. Situado em pleno barrocal algarvio e instalado numa antiga casa de lavradores, devidamente adaptada a restaurante, para além de amplas salas com respetiva lareira, tem uma ótima esplanada junto à eira que lhe dá o nome e de onde se desfruta uma bela vista sobre a serra do Algarve, que em dias de sol é muito apetecível! Aqui encontramos várias especialidades gastronómicas da região. Entre elas, destacam-se as seguintes: – Xarém (Papas de milho com marisco ou carnes de porco); – Carapaus alimados; – Massinha de peixe; – Cataplana de tamboril; – Estufado de javali com ervas aromáticas; – Mousse de alfarroba; – Morgado de figo; – D. Rodrigo (bolo tradicional com fios de ovos e amêndoa). Podemos contar ainda com entradas e outras sobremesas confecionadas com produtos da região, tal como mel, figos, amêndoas, medronhos, etc. No concelho de Loulé, o Monte da Eira espera por si e, certamente, ficará agradavelmente surpreendido com a boa e vasta oferta gastronómica.

MONTE DA EIRA Clareanes 8100-236 Loulé Algarve - Portugal montedaeira@netcabo.pt Tel. (+351) 289 438 129 www.restaurantemontedaeira.com N 37º 10.399`, W 7º 59.692` Horário: Terça a Sábado das 12h30 às 14h30 e das 19h00 às 22h00, Domingo das 12h30 às 15h30 Preço Médio: 25€

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Apenas a 30 quilómetros de Lisboa e praticamente na saída da A10, encontramos, em Arruda dos Vinhos, o Restaurante Sabores da Quinta. O restaurante foi inaugurado em agosto de 2010 e oferece uma refinada cozinha mediterrânica e de autor, sem esquecer a gastronomia tradicional portuguesa, utilizando frequentemente produtos produzidos na Quinta. Inserido no Hotel Rural “Quinta de Santa Maria”, onde encontramos o requinte e o ar puro do campo, a vista não podia ser melhor. Sente-se e aprecie o panorama dos jardins da quinta e sinta-se simplesmente tranquilo/a. Atualmente, o espaço funciona diariamente para os hóspedes e encontra-se aberto ao público para grupos com o mínimo de 8 pessoas, mas deverá efetuar sempre a sua reserva. O espaço recebe também festas ou noites temáticas ou musicais. A decoração é moderna, sóbria e ao mesmo tempo elegante, com cores apropriadas ao campo, sem descurar os guarSabores danapos de pano. O conjunto da quinta está bem concebido para um Galinhatos bom e calmo repasto. A proposta para o menu 2630-183 Arruda dos Vinhos Tel. (+ 351) 263 975 528/9 do Sabores da Quinta, a qual Fax (+ 351) 263 975 530 aceitámos com agrado, teve, info@quintadesantamaria.pt como entrada, um sortido de reservas@quintadesantamaria.pt chouriços assados e o prato www.quintadesantamaria.pt N 38º 58’ 33.45’’ , W 9º 3’ 54.65’’ principal foi pernas de pato Horário: Segunda a Domingo assadas no forno, acompa- das12h00 às 15h00h nhadas com puré e espina- e das 19h30 às 23h00 fres. Escolha acertada, damos Preço Médio: 30/35 € a nossa aprovação. Quanto à sobremesa, estava divinal e sugerimos Leite-creme ou Tarte de maçã. Terminámos com um cafezinho na parte exterior do restaurante, dado que o dia de sol assim convidava e, após um pequeno passeio pela quinta, saímos com a promessa de voltar em breve. Sugerimos que não vá embora sem visitar a quinta pedagógica e apreciar a natureza. Vai ver que vale a pena!

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Viagens Com a colaboração da Almeida Viagens e Solférias

Madeira

O Jardim do Atlântico “A Madeira é um jardim. No mundo não há igual. Seu encanto não tem fim”, em poucas palavras, os versos desta canção da nossa cultura popular resumem o que os olhos do visitante deslumbram quando chegam à Pérola do Atlântico.

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rovavelmente, terá sido este sentimento que invadiu Tristão Vaz Teixeira e João Gonçalves Zarco, quando em 1419 abordaram a Ilha da Madeira pela primeira vez, após um ano antes terem chegado a Porto Santo. Situada em pleno Oceano Atlântico, a cerca de 980 Km de Portugal Continental e a 700 km da costa africana, a região Autónoma da Madeira é composta pela Ilha da Madeira, pela Ilha do Porto Santo, pelas Ilhas Desertas e pelas Ilhas Selvagens. Graças à sua posição geográfica privilegiada e à tipicidade montanhosa da sua topografia, o clima do arquipélago é ameno com temperaturas médias muito suaves e uma humidade moderada. : :

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A Ilha da Madeira: A maior ilha do arquipélago, também conhecida como a Ilha da Flores, reúne, sobretudo na sua capital - o Funchal -, a maior oferta hoteleira. Esta Ilha de altas montanhas verdejantes e vales profundos, cuja fauna e flora foram distinguidas como Património Mundial Natural, é um convite a um turismo ecológico de enorme qualidade. Na rota dos maiores navios de cruzeiros, a Madeira tem no seu Carnaval, na sua Festa das Flores e na sua Passagem de Ano com um dos maiores fogos de artifícios do mundo, razões de sobra para ser um destino inesquecível. A ilha do Porto Santo: Conhecida como a Ilha Dourada devido às suas extensas praias, Porto Santo é um verdadeiro paraíso para quem queira desfrutar de umas férias balneares. As suas areias finas, o seu mar de águas límpidas e tranquilas, a hospitalidade dos seus habitantes e a grande oferta de atividades turísticas fazem desta ilha um destino de eleição para o visitante mais exigente.


Cabo Verde

Terra da Morabeza

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m dos maiores escritores de morna de Cabo Verde, o mindelense Jorge Fernandes Monteiro (Jotamont), descrevia no coro desta morna uma súmula ao mesmo tempo deliciosa e verdadeira do caráter acolhedor de Cabo Verde:

Oh CABO VERDE, terra stimada, Terra de paz, terra de gozo, Tud’ quem que sentá na sê regass (regaço) El ca ta bai, el crê ficâ, (já não quer ir-se embora, quer ficar) E s’el mandóde, el ta tchorâ (e se tiver que ir vai a chorar) “Estes “dez grãozinhos de terra” que vê aproximarem-se até se poder fixar em cada um deles, ao ponto de notar que há ainda uns ilhéus para além das 10 ilhas que compõem o arquipélago de Cabo Verde, estão a impor-se como um destino turístico novo e atraente. (…) Presente em todas as ilhas habitadas, a Morabitur acolhe assim quem nos visita com o verde-esperança da vegetação, parca mas preciosa, dos campos agrícolas, das fruteiras esparsas, das florestas raras dos cumes; com o azul-nacarado do nosso mar, transparente, tépido e acolhedor; com o rosa-vivo da nossa juventude, alegre, desinibida e sonhadora como as buganvílias que enfeitam as fachadas das casas, por sobre a porta e as duas janelas; com o amarelo-dourado das dunas onduladas pela brisa, e das tâmaras resplandecentes nas mães paridas; com o vermelho-rubro de fogo sobre lava, que simboliza a chama de uma terra e de uma gente novas; com o laranja-sol-poente que banha as extensas praias das nossas ilhas planas ao entardecer; ou com a cor-chocolate das nossas crioulas airosas e sedutoras, e das nossas crianças chilreantes e despreocupadas…” (retirado da introdução ao sítio da Morabitur na NET – 2005, com a devida vénia)

Neste contexto, as habituais recomendações tornam-se fáceis e consensuais: não deixe de ir conhecer cada ilha de Cabo Verde. Se não puder ficar por lá, porque tem a sua vida organizada por cá, então volte, para não ficar a chorar saudades. : :

AS ILHAS BALNEARES Entre o Equador e o Trópico de Câncer, tal como as Caraíbas, as Maldivas ou as ilhas Hawai, Cabo Verde alberga praias entre as melhores do mundo. As ilhas de leste - Sal, Boa Vista e Maio -, planas e arenosas, são as que melhores condições balneares oferecem. Só na Boa Vista existem 26 praias, todas de areia branca e fina, das quais se destacam, a Oeste e a Sul, as de Fátima, Chave, Varandinha, Curralinho (Santa Mónica), Lacacão, Curral Velho e Ervatão, todas excelentes. No Sal, a esplendorosa Baía de Santa Maria, servida por meia dúzia de hotéis de 4 estrelas, e Ponta Preta, a Oeste, onde se fixaram dois hotéis de 5 estrelas, representam a melhor oferta de praias da primeira ilha a abrir-se ao turismo em Cabo Verde, ainda antes da independência do país. Quanto ao Maio, a praia da vila de Porto Inglês e a do Morro são as que de momento mais servem quem procura turismo balnear. Mas outras esperam o desenvolvimento turístico da ilha. De frisar a chegada recente da ilha de S. Vicente ao clube das ilhas balneares de Cabo Verde, com uma dezena de praias das quais a maioria era pouco acessível até há pouco tempo, mas que estão agora disponíveis pela nova estrada que une a Baía das Gatas ao Calhau. De resto, S. Vicente perfila-se como uma interessante promessa para o turismo, com um mix de oferta balnear e cultural que dará que falar a breve trecho, uma vez que o aeroporto internacional já acolhe voos da Europa e acarretará, sem dúvida, novos fluxos turísticos para a região, incluindo as ilhas vizinhas de Santo Antão e S. Nicolau.

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SUGESTÕES

Agenda cultural Lisboa

Porto

Almoços com Arte

Angela Hewitt

Até 27 JunHO Casa-Museu Medeiros e Almeida Rua Rosa Araújo, 41 , 1250-191 Lisboa Quem experimentou repetiu e quem faltou lamenta. Por isso, a Casa-Museu Medeiros e Almeida, no centro de Lisboa, retomou os Almoços com Arte, mas agora só às quartas-feiras e para além de uma peça de arte podem eventualmente ser conhecidas várias, dentro de uma temática. Mas o conceito, que proveio da National Gallery de Londres, mantémse: agarrar numa sandwish e aproveitar a hora de almoço para “beber” um pouco de cultura, entre dentadas. A vasta coleção de arte de António Medeiros e Almeida (1895-1986) é, assim, apresentada ao público através de pequenas histórias. Porcelana Ming, esculturas, tetos de madeira, quadros e relógios são apenas alguns exemplos das 2000 peças que constituem o acervo do fundador da Casa-Museu e que constam desta iniciativa.

3 de junho, 18h00 Casa da Música, Porto

Feira do Príncipe Real ÚltimAS sábADOS E SEGUNDAS DO MÊS DAS 10h00 ÀS 19h00 Jardim França Borges Jardim do Príncipe Real Aquilo que começou por ser uma iniciativa espontânea de um grupo de cidadãos, transformou-se hoje numa feira que se realiza regularmente e que conta com a organização da Junta de Freguesia das Mercês. Nesta feira é possível encontrar artesanato contemporâneo, peças de autor e antiguidades. É também um evento que procura dinamizar um espaço público - o Jardim do Príncipe Real - com momentos de animação, com música ou com performances, transformando o jardim numa mostra de artes ao alcance de todos.

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Piano: Angela Hewitt; Programa: François Couperin: Pièces de Clavecin (excertos); Gabriel Fauré: Tema e Variações, op. 73; Gabriel Fauré: Noturnos n.os 5, 6 e 13; Jean-Philippe Rameau: Suite em Lá menor Após ter-se tornado uma das mais aclamadas pianistas do mundo pela sua integral da obra de Bach, gravada para a editora Hyperion, a pianista canadiana Angela Hewitt mostrou uma afinidade muito especial para com a música francesa.

Entre o trabalho, conversam sobre as suas vidas, aspirações, dúvidas, trocam confidências e discutem sobre temas tão complexos como uma receita de arroz de rodovalho ou a escassez da pedra mármore. Esta comédia é baseada nos textos escritos e interpretados por Frederico Pombares e Henrique Dias na rubrica com o mesmo nome, emitida no programa Cinco para a Meia-Noite, da RTP 2.

Ópera dos vivos - Estudo teatral 8 de junho, 21h30 Teatro Académico de Gil Vicente e TEUC, Coimbra

VII Ciclo Promenade Ciclo anual de concertos sinfónicos, dedicados ao grande público, jovens e crianças Até 17 de Junho Coliseu do Porto Os “Concertos Promenade do Coliseu do Porto” são um ciclo anual de concertos sinfónicos, dedicados ao grande público, jovens e crianças. Ocorrem uma vez por mês, ao domingo de manhã, com a duração de cerca de uma hora.

Coimbra É como diz o outro 24 de maio, 21h30 Teatro Académico de Gil Vicente, Coimbra É Como Diz o Outro é uma comédia que relata o dia a dia de dois amigos que trabalham juntos, frente a frente.

Companhia do Latão no âmbito da Mostra São Palco Ópera dos Vivos combina teatro, música e cinema para abordar a produção cultural dos anos 1960 até hoje, tendo como fio condutor uma reflexão sobre a mercantilização do trabalho artístico atual e sua ideologia. Os quatro atos têm títulos irónicos: Sociedade Mortuária, Tempo Morto, Privilégio dos Mortos e Morrer de Pé. Compõem quatro partes que poderiam ser apresentadas de forma independente, mas que, interligadas, dialogam por oposição, compondo um panorama representativo do trabalho da cultura nos últimos 50 anos do Brasil, antes e depois do golpe militar.”


Faro

DESTAQUE

Ópera Buffa – “Todos os prazeres da mesa num jantar” De 8 a 10 de junho, 21h00 Escola de Hotelaria e Turismo de Faro (Largo de São Francisco)

A companhia Laika e a Muziektheater Transparant fazem reviver, à sua maneira, esta obra brilhante de Mozart. O resultado é uma sumptuosa mistura de música, canto, teatro e… Chocolate. O próprio Mozart descreveu Don Giovanni como uma ‘ópera buffa’: uma peça lírica divertida, com um tom leve e cheio de vida. Pratos gourmet surpreendentes surgem da cozinha de Don Giovanni criando um excitante campo de tensão entre o desejo e o abandono. Este é um espetáculo cheio de voluptuosidade, sensualidade e tentações, a saborear sem moderação!

Outra Voz – Projeto comunitário Dança Contemporânea 30 e 31 de maio, 21h30 Teatro das Figuras, Faro OUTRA VOZ é uma voz coletiva. Uma voz sem palavras, que se faz ouvir e sentir. Através de uma linguagem universal, vencemos as barreiras da língua e falamos com as emoções. Os movimentos falam. A música invade a alma e transforma o corpo. O corpo é uma preciosidade física com o qual experienciamos a vida. A dança vem completar essa experiência. Este é um projeto que se caracteriza por uma intervenção artística na comunidade da localidade onde se apresenta - um projeto para jovens bailarinos, que teve como ponto de partida, o trabalho com um grupo de vinte pessoas de várias idades. Descrições dos eventos retiradas dos sites das respetivas entidades.

Câmara dos Solicitadores aposta na divulgação de trabalhos científicos Ao longo do tempo, muitos trabalhos têm vindo a ser desenvolvidos no âmbito das mais diversas áreas de estudo associadas à solicitadoria e à ação executiva. Assim sendo, pretendendo-se conservar esses contributos intelectuais e ambicionando-se que também as gerações vindouras venham a conhecê-los, considerou-se que a melhor alternativa para alcançar tais objetivos seria compilar os mesmos numa separata anual que acompanharia a revista Sollicitare. Vimos então por este meio solicitar a vossa preciosa colaboração e que sejam enviados, em formato Word, para o endereço imprensa@solicitador.net, até ao dia 29 de junho de 2012, trabalhos originais que gostassem de ver publicados e divulgados pela comunidade profissional. Estes deverão assumir um carácter científico e debruçar-se sobre temáticas com interesse para a classe, sejam elas integradas no âmbito da solicitadoria ou da ação executiva. A avaliação/ seleção dos trabalhos apresentados ficará a cargo de uma comissão editorial presidida pelo 1º Vice-presidente do Conselho Geral da Câmara dos Solicitadores. Este desafio dirige-se não só aos nossos associados, mas também aos estagiários, formadores e estudantes, pois estamos conscientes de que muitos poderão ser os contributos oriundos do meio académico dado o aumento evidente do número de licenciaturas e mestrados em solicitadoria. Exposto o convite, resta-nos então agradecer a vossa atenção. Ficaremos a aguardar os contributos de todos, acreditando que, dessa cooperação, poderá nascer mais um marco na História de uma classe que não desistiu de acompanhar o avançar dos tempos. Afinal de contas, pensar o passado, o presente e o futuro é o grande objetivo deste projeto, cujo sucesso também depende de si. Por Paulo Teixeira, 1.º Vice-presidente do Conselho Geral da Câmara dos Solicitadores

IV Jornadas Transmontanas de Direito do Consumo Irão ocorrer, no próximo dia 30 de maio, na Escola Superior de Comunicação, Administração e Turismo, em Mirandela, as IV Jornadas Transmontanas de Direito do Consumo. Organizadas pela Associação Portuguesa do Direito do Consumo e contando com o apoio do Instituto Politécnico de Bragança, estas Jornadas convidam ao debate em torno da temática “O Turismo e o Direito do Consumo”.

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