Ilustrare

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Dá-me um prazer muito especial escrever este prefácio para a publicação associada à exposição ILLUSTRARE – Viagens da Ilustração Científica em Portugal do Museu Nacional de História Natural e da Ciência da Universidade de Lisboa. Por duas razões principais. A primeira é que a exposição não podia ter acontecido noutro sítio senão neste Museu. Por um lado, o Museu possui a mais importante e completa coleção de desenho naturalista e científico do nosso país, constituída por mais de 3000 desenhos cobrindo praticamente 300 anos de práticas de representação de um mundo crescentemente conhecido. Para além dos fabulosos desenhos do naturalista açoriano Francisco de Arruda Furtado (1854-1887) e do médico e botânico Friedrich Welwitsch (1806-1872), entre outros, cerca de metade da coleção compreende os notáveis desenhos das famosas viagens filosóficas, promovidas pelo Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda entre 1783 e 1794 para documentar e estudar os recursos naturais do império português. Muita gente pensa – erradamente – que esses desenhos se perderam. Estão connosco na Universidade de Lisboa, todos catalogados, digitalizados e acessíveis. Os seus autores (riscadores, como se chamavam) – José Joaquim Freire, Manuel Tavares da Fonseca, Cipriano Moreira da Silva, Manuel Piolti, Angelo Donati, Joaquim José Codina, entre tantos outros – são os grandes esquecidos da história da arte portuguesa do século XVIII. Por outro lado, as instituições que precederam o Museu no local onde este se encontra no Príncipe Real, em Lisboa, particularmente a Escola Politécnica no século XIX e a Faculdade de Ciências no século XX, fizeram do desenho científico parte integrante da formação de geólogos, biólogos, físicos, matemáticos, astrónomos. Então como agora, conhecer passava também por desenhar. Fazem também parte da nossa coleção – embora menos conhecidos, infelizmente – centenas de desenhos naturalistas, de máquinas, topográficos, geométricos, feitos por gerações sucessivas de jovens cientistas em contexto de ensino. Esta tradição continua hoje a ser acarinhada pelo Museu, num contexto mais amplo e informal, através dos cursos anuais do biólogo e ilustrador Pedro Salgado. Assim, o Museu não podia deixar de acolher com o maior entusiasmo a oportunidade de apresentar, a um público vasto, a exposição ILLUSTRARE. Trata-se da primeira vez que uma exposição com este fôlego e abordagem é realizada em Portugal, dedicada exclusivamente à ilustração de ciência e natureza. A quantidade de magníficas ilustrações apresentadas, muitas delas inéditas, o âmbito geográfico cobrindo praticamente todo o planeta, os contextos históricos e culturais da utilização do desenho como representação e comunicação, bem como a exploração dos materiais, que vão das técnicas tradicionais (carvão, aguarela, entre outras) às ultramodernas (digitais e multimédia), convidam os 10

visitantes a explorarem por si próprios o papel que a ilustração foi tendo, ao longo dos tempos, na nossa compreensão da natureza. O resultado é uma exposição notável e de excelente qualidade, o que não nos surpreende dado o conhecimento, experiência e inteligência dos comissários científicos: Nuno Farinha, que coordenou, Ana Teresa Bigio, Pedro Salgado e Diana Marques, bem como a vasta equipa que os apoiou, quer na cuidada preparação e investigação preliminar (mais de 20 anos de estudos!), quer na autoria de textos e ilustrações, quer ainda na apresentação museográfica, arquitetónica e gráfica. Em nome do Museu e da Universidade de Lisboa a todos agradeço. A exposição mobilizou, desde o início, o entusiasmo do Museu e da Reitoria de forma transversal e incondicional. Muitos se envolveram com dedicação nas diferentes fases de desenvolvimento da ILLUSTRARE: curadores, conservadores-restauradores, programadores e educadores, taxidermistas, técnicos, especialistas em iluminação, comunicação, acessibilidade, segurança e manutenção. Sendo impossível agradecer a todos aqui, faço-o através dos principais interlocutores com os comissários: Judite Alves, Marta Costa, Jorge Prudêncio e Rogério Abreu. Uma palavra de gratidão também aos colecionadores privados e instituições públicas que cederam objetos dos seus acervos para a ILLUSTRARE, particularmente o Aquário Vasco da Gama, o Museu Nacional de Arqueologia e o Paço Ducal de Vila Viçosa, bem como o apoio da Companhia de Seguros Caravela, parceira de longa data do Museu. Finalmente, a ILLUSTRARE não poderia ter sido feita na Universidade de Lisboa sem o apoio da Câmara Municipal de Lisboa. Enquadrada na programação Lisboa Capital Verde Europeia 2020, a ILLUSTRARE beneficiou de um importante subsídio financeiro, sem o qual não teria sido possível concretizá-la. Porém, o apoio foi muito para além do subsídio. Tratou-se de uma verdadeira parceria e coorganização entre duas instituições de Lisboa. A criatividade e entusiasmo de José Sá Fernandes, a dedicação, simpatia, persistência – mesmo nos momentos mais difíceis da pandemia – e a capacidade de organização de Marise Francisco e de toda a sua equipa foram essenciais para o resultado final. Jean Cocteau disse que “Escrever é desenhar embrulhado de uma maneira diferente. Quando desenho, escrevo, e talvez, quando escrevo, desenho.” No passado como no presente, as subtis representações da criatividade e imaginação humanas inflamam a nossa curiosidade e conhecimento do mundo, do universo e de nós próprios. A exposição ILLUSTRARE é um convite a compreender melhor essa fabulosa e milenar aventura.

Illustrare — Viagens da Ilustração Científica em Portugal

Marta C. Lourenço, Diretora 24 Abril 2021

watercolor) to ultramodern (digital and multimedia) techniques, invite visitors to explore for themselves the role that illustration has played, over time, in our understanding of nature.

It is with special delight that I write this preface for the publication associated with the exhibition ILLUSTRARE – Journeys of Science Illustration in Portugal, at the National Museum of Natural History and Science of the University of Lisbon. For two main reasons. The first is that the exhibition could not have happened anywhere else but here. On the one hand, the Museum has the most important and comprehensive collection of natural and scientific illustrations in Portugal. It encompasses more than 3000 illustrations covering 300 years of representation practices of an increasingly known world. In addition to the fabulous drawings of the Azorean naturalist Francisco de Arruda Furtado (1854-1887), currently on display, and of the physician and botanist Friedrich Welwitsch (1806-1872), about half of the collection comprises the remarkable illustrations resulting from the famous philosophical journeys (‘viagens filosóficas’), promoted between 1783 and 1794 by the Royal Museum and Botanical Garden of Ajuda to document and study the natural resources of the Portuguese empire. Often people think – wrongly – that these illustrations have been lost. They are with us at the University of Lisbon – all cataloged, digitalized and accessible. Their authors (‘riscadores’, as they were called) – José Joaquim Freire, Manuel Tavares da Fonseca, Cipriano Moreira da Silva, Manuel Piolti, Angelo Donati, Joaquim José Codina, among many others - are the great ‘forgotten artists’ of Portuguese 18th century art. On the other hand, the institutions that preceded the Museum in its current location in Príncipe Real, Lisbon, particularly the 19th century Lisbon Polytechnic School and the 20th century Faculty of Sciences of the University of Lisbon, made scientific illustration an integral part of the training of future geologists, biologists, physicists, mathematicians, astronomers. Then as now, knowing was about drawing too. Also included in our collection – although less well known, unfortunately – are hundreds of naturalistic, topographic, and geometric drawings, made by successive generations of young scientists and teachers. This teaching tradition continues today to be treasured by the Museum, albeit in a broader and more informal context, through the annual courses delivered by the Portuguese biologist and illustrator Pedro Salgado. Given this, the opportunity to present the ILLUSTRARE exhibition to a wide audience was enthusiastically welcome by the Museum and the University. It is the first time that an exhibition dedicated exclusively to the illustration of science and nature, with this breath and approach, is presented in Portugal. The number of magnificent illustrations on display, many of them unknown, the geographical scope covering practically the entire planet, the historical and cultural contexts of the use of drawings as representation and communication, as well as the examination of materials, ranging from traditional (charcoal,

The result is a remarkable exhibition of excellent quality. This is hardly surprising given the knowledge, experience, and intelligence of the scientific curators: Nuno Farinha, who coordinated, Ana Teresa Bigio, Pedro Salgado and Diana Marques, as well as their vast supporting team, in the careful preparation and preliminary research (of more than 20 years!) and the authorship of texts and illustrations, as well as in the scenography, architecture and graphic design. On behalf of the Museum and the University of Lisbon, I am grateful for their extraordinary work. From the very beginning, the exhibition mobilized the Museum’s enthusiasm in a transversal and unconditional way. Many have been involved with dedication in the different phases of development of ILLUSTRARE: curators, conservators-restorers, programmers and educators, taxidermists, technicians, specialists in lighting, communication, accessibility, security and maintenance. As it is impossible to name everyone here, I express my gratitude through the main interlocutors with the exhibition development team: Judite Alves, Marta Costa, Jorge Prudêncio and Rogério Abreu. The Museum is also grateful to the private collectors and public institutions that authorized objects from their collections to feature in ILLUSTRARE, particularly the Vasco da Gama Aquarium, the National Museum of Archeology and the Paço Ducal de Vila Viçosa. Caravela – Companhia de Seguros, a long-standing partner of the Museum, also supported the exhibition. Finally, ILLUSTRARE could not have been made at the University of Lisbon without the support of the Câmara Municipal de Lisboa. As part of the Lisbon European Green Capital 2020 program, ILUSTRARE benefited from an important financial subsidy. However, the support went well beyond the subsidy. It was a true partnership and co-organization endeavor between two institutions. The creativity and enthusiasm of José Sá Fernandes, the dedication, sympathy, persistence - even in the most difficult moments of the pandemic - and the organizational capacity of Marise Francisco and her entire team were essential for the final result. Jean Cocteau said that “Writing is drawing in a different way. When I draw, I write, and maybe, when I write, I draw”. In the past as in the present, the subtle representations of human creativity and imagination ignite our curiosity and knowledge of the world, the universe and ourselves. The ILLUSTRARE exhibition is an invitation to better understand this fabulous and millenary adventure. Marta C. Lourenço, Director 24 April 2021

Illustrare — Journeys of Science Illustration in Portugal

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