CAMPUS
BRASÍLIA, SETEMBRO DE 2015
MEIO AMBIENTE
NÚMERO 426 ANO 45
UNIVERSIDADE
INTOLERÂNCIA
COLETA SELETIVA
SEM LAR
MENOS INVESTIMENTOS
Cooperativas do DF reclamam que o serviço não funciona
Jovens LGBT são expulsos de casa pelas próprias famílias
Verbas para melhorias na UnB diminuem em 33% INPRESS/DIVULGAÇÃO
O ESPAÇO DELAS Estudantes homens resistem à presença de mulheres nas academias militares
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CAMPUS
Brasília, setembro de 2015
NA FILA
MEMÓRIA
Nas filas do Restaurante Universitário, perguntamos aos alunos o que eles pensam sobre a proposta da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) de proibir o uso de saias curtas e decotes na Câmara.
Há anos o Campus traz para discussão a questão da condenação do homossexualismo. Na edição 203, de dezembro de 1995, o suplemento trouxe como título a pergunta “Homossexualismo é pecado?” sobre foto polêmica para a época. A matéria contou com esclarecimentos de passagens bíblicas utilizadas em declarações homofóbicas e trouxe exemplos de igrejas que surgiram para atender ao público de gays e lésbicas. As repórteres Luciana Rodrigues e Valéria Carneiro apresentaram declarações religiosas precipitadas nas condenações feitas na época. Representantes de diversas igrejas foram consultados e utilizaram a Bíblia como “sujeito ativo responsável por toda forma de condenação”. No entanto, a discussão não se ateve ao âmbito religioso. Em outubro daquele ano, a então deputada Marta Suplicy apresentou um projeto de lei para regulamentar a união civil entre homossexuais. A Constituição de 1988 reconhecia como entidade familiar apenas a união estável entre homem e mulher. Somente em 2011 o casamento entre pessoas de mesmo sexo foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. A edição contou ainda com declarações de um casal gay sobre diferentes aspectos da união homossexual. Legalização da união estável, preconceito e religião foram perspectivas abordadas nesse retrato da época.
Peterson Costa Estudante de Letras
“Desnecessário porque isso não influencia nada. A restrição deve ser questão de bom senso.”
Raíssa Ferreira
OMBUDSMAN*
*Termo que significa “provedor de justiça”, o ombudsman discute a produção dos jornalistas a partir da perspectiva do leitor.
Rudá Moreira
A edição 425 do Campus foi dedicada à educação. Logo na capa, um cúmulo da total falta dela (e de inteligência): policial batendo em mulher. Parabéns pela apuração e execução da pauta. É gratificante ver nosso jornal-laboratório furando a “concorrência”. “Agressor Fardado” dá voz a quem não tem sobre algo difícil de ser revelado, pelo corporativismo da instituição. A reportagem convence o leitor que o problema existe. Da mesma forma, “Mãe Concurseira” mostra uma realidade difícil e que deve ser enfrentada em prol do direito dessas mulheres e crianças. “Política Longe de Ensino” afeta diretamente salas de aula Brasil afora. Um assunto relevante socialmente, mas chato. O texto utilizou bons artifícios para torná-lo atrativo. Vários políticos foram ouvidos, deixando o leitor com a sensação de equilíbrio. Já “Aula Em Quadrinhos” transformou vinho em água.
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Deixou um tema interessante insípido pela superficialidade da abordagem. Faltaram fontes, informações e atualidade na notícia. Como um release, tem uma foto de divulgação, a qual não mostra nenhum quadrinho. Maurício de Sousa e Ziraldo foram entrevistados? Por que citá-los na matéria? E bastava “dar um google” para ver que o sobrenome do primeiro é com S. Para o leitor, foi preguiça editorial. Poderia ter cedido o espaço à “Jogando E Aprendendo”, que além de ser local, merecia fotografia, ilustração, personagens mais elaborados como “Atléticas Em Alta”. Com informações visualmente bem organizadas, a matéria atende a uma vocação esquecida do Campus: cobertura esportiva na UnB. A saga é finalizada com a educação psicológica e espiritual. “Constelação Familiar” ambienta o leitor com texto e ilustração convidativos nessa terapia pouco conhecida, mas reveladora.
Estudante de Agronomia
“Sou muito a favor, pois é um local de trabalho. Uma roupa curta chama a atenção.”
Juliana Cristina Estudante de Arquitetura e Urbanismo
“Seu corpo e suas regras. Não dá pra inibir o uso dessas roupas se o problema é outro.”
EXPEDIENTE Editores: Alana Martinez, Carina Ávila, Maria Leticia de Melo, Isabelle Marie, Tatiana Vaz, Yasmim Perna.
Queiroz, Luana Pereira, Ludimila Mamedes, Mayna Ruggiero, Rafaella Panceri, Raphaele Caixeta, Tássia Saraiva, Thaísa Oliveira.
Repórteres: Ana Carolina Fonseca, Ana Carolina Bardini, Ana Gabriela Braz, Anna Caroline Magalhães, Beatriz
Fotógrafos: Felipe Souza, Loyane Alves , Renan Xavier.
Monitoras: Maria Paula Abreu e Mariana Lozzi Professor: Solano Nascimento Jornalista: José Luiz Silva Gráfica Coronário
Jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação da
Universidade de Brasília
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INTOLERÂNCIA
PARA FORA DO NINHO Jovens LGBT sofrem preconceito dentro de casa e são rejeitados pela própria família ANA CAROLINA FONSECA
“P
ega suas malas, seus pertences e cai fora daqui.” Foi com essas palavras do pai que L.U., na época com 22 anos, deixou a casa. Não era a primeira vez que o estudante de Artes Cênicas era “convidado a se retirar”. Ele relata que a convivência com o pai sempre foi difícil, mas a situação piorou quando o jovem levou o primeiro namorado para conhecer a família. Viado, bicha, doente e sem-vergonha foram alguns dos xingamentos que L.U. ouviu durante as inúmeras discussões com o pai. “Falou até que eu não era filho dele”, conta o universitário. Na mesma época em o que o estudante começou a namorar, o irmão também estava em um relacionamento e levava a namorada para casa. Mas o pai nunca se incomodou com a presença da garota. A saída de casa ocorreu poucos dias após L.U. apresentar a defesa da monografia na universidade. Ele passou três meses na casa de um amigo, conseguiu um emprego e alugou uma quitinete. Tudo com o apoio da mãe, da tia e da namorada dela. O jovem, que agora continua a estudar para conseguir a licenciatura, vê como um lado positivo da história a aproximação da tia, também homossexual, com a mãe, já que antes as duas se tratavam como parentes distantes. Para L.U., a ajuda das tias foi fundamental durante essa fase de transição. “É o único casamento na família em que ainda há afeto”, diz. Os pais dele dormem com a porta do quarto aberta há anos. O distanciamento do casal ficou evidente para o filho quando a mãe se tornou sua maior aliada. Ele conta que, em uma briga envolvendo a família, a mãe desafiou o marido: “Você é hipócrita, já te peguei assistindo pornô lésbico. E sei que você ficou com um travesti antes de nos conhecermos”. O caso de L.U. não é exceção. Organizado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, o Relatório sobre Violência Homofó-
bica 2012, o mais recente, 83% dos casos de homofobia denunciados no país são de violência psicológica. De todas as denúncias registradas, um quarto ocorre nas casas das próprias vítimas. A situação de L.U. ainda é um tabu dentro da família. Em reuniões como a Páscoa e o Natal, a homossexualidade do universitário e da tia é ignorada. “Ninguém pergunta como vai a minha vida amorosa”, lamenta o jovem. “Acham que isso vai me envergonhar. Não vai. Eu gostaria que perguntassem mais.” Os conflitos na família começaram na adolescência de L.U. e foi em uma das brigas com os pais que ele assumiu a homossexualidade pela primeira vez. Ao ser chamado de viado pelo pai, confirmou: “Sou viado mesmo. O que você vai fazer agora? É seu maior medo. E você vai ter que lidar com isso”. Por anos, a homossexualidade do estudante nunca foi discutida abertamente, com exceção dos xingamentos do pai. Segundo o jovem, o próprio caráter explosivo e a propensão à violência do pai, que toma medicamentos para esquizofrenia há 30 anos, intensificaram os conflitos. O relacionamento entre pai e filho está melhor agora, um ano após o fim do contato diário. O universitário diz que prefere assim, com bastante distância: a relação é resumida a “bom dia” quando se encontram. “Precisei me afastar da situação para enxergar com mais maturidade e até perdoar o meu pai”, conta. Ainda mais novo que L.U., H.L. tinha apenas 17 anos quando foi expulso de casa pela primeira vez. O estudante do terceiro ano do ensino médio foi agredido verbal e fisicamente pela mãe. Hoje, eles não têm mais contato. H.L. também não fala com o pai e conta que nem sabe onde ele mora. “Sei onde minha mãe está, poderia visitála. Mas não quero”, sentencia. Ao mexer no computador do filho, a mãe descobriu que ele já tinha namorado outro garoto. Ela chegou a agredir
MAYNA RUGGIERO
L.U. deixou a casa da família após anos de conflito e hoje mora sozinho. A orientação sexual do rapaz não foi aceita pelo pai
o jovem, que saiu de casa e morou com uma tia por alguns meses, mas voltou para casa por interferência da avó, que sempre o aceitou e é uma das poucas pessoas da família com quem ele ainda fala. A situação se tornou insustentável para o adolescente, e ele relata que a mãe controlava seus passos: “Só podia ir para a escola e o cursinho”, conta. O jovem decidiu morar com o pai, que desconhecia a orientação sexual do filho. Ele começou a namorar de novo e a verdade foi revelada. O pai, então, pressionou o estudante a trabalhar e se sustentar: “Ele queria que eu largasse a universidade e tentou me boicotar”. Os dois pararam de se falar e H.L. decidiu morar com a irmã, que é casada com um homem transexual, um fato desconhecido pelo resto da família. “Ter que me virar foi a parte mais difícil. Agora eu dependo só de mim mesmo.” O psicólogo clínico Frederico Velloso explica que a não aceitação por parte das famílias ainda é muito definida por questões machistas, religiosas e culturais. Ele aponta duas dificuldades principais para jovens que passam por
essa situação. “Um pensamento muito comum é que se nem os pais aceitam, quem aceitará?”, relata. A falta de estrutura financeira, emprego ou formação colocam os jovens em situações de risco social, como o roubo e a prostituição, segundo Velloso. “O ideal é encontrar um local de apoio e buscar uma formação profissional, que os permita se tornarem independentes”, ressalta. O psicólogo afirma que os Centros de Atenção Psicossocial (Caps) podem fornecer a ajuda que os jovens precisam. O grupo Mães pela Diversidade reúne mães, pais, familiares e amigos de pessoas LGBT para lutar contra a homofobia e a transfobia, por direitos civis e por uma sociedade mais acolhedora a essa parcela da população. Angela Moysés, ativista do grupo, afirma que a falta de apoio das famílias é muito comum. “A homossexualidade, a bissexualidade e a transexualidade são inatas ao ser humano, assim como a heterosexualidade”, explica. “Cabe a nós, mães, entendermos e apoiarmos nossos filhos e filhas.” u
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UNIVERSIDADE
MENOS DINHEIRO Proposta orçamentária prevê diminuição de um terço de verbas para investimentos na UnB THAÍSA OLIVEIRA
S
e o projeto de orçamento para 2016 for aprovado no Congresso Nacional sem alterações, a Universidade de Brasília (UnB) terá R$ 31 milhões a menos em recursos para investimentos no próximo ano. De acordo com a proposta, a Fundação Universidade de Brasília (FUB) deve receber R$ 64 milhões para investir – o que inclui a aquisição de imóveis, instalações, equipamentos, softwares e material permanente e o custeio de planejamento e execução de obras. O valor representa queda de 32,7% em relação a 2015, para o qual estão assegurados R$ 95,1 milhões. Os números do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2016, apresentado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão ao Congresso Nacional em 31 de agosto, in-
dicam que outras instituições também serão afetadas. Dentre as 15 maiores universidades federais em número de alunos, 14 têm cortes previstos no orçamento para investimentos em 2016. A maior redução será sentida pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), que terá R$ 69,5 milhões a menos em comparação com 2015. De acordo com o Decano de Planejamento, Orçamento e Gestão da UnB, César Augusto Tibúrcio Silva, a diminuição dos recursos impacta em demandas que já estavam programadas, mas a Universidade deve seguir a orientação do Ministério da Educação (MEC) de cortar os investimentos. “A política do governo é a de concluir os esqueletos. As obras que já foram iniciadas serão terminadas, mas alguns projetos de construção serão poster-
RANKING DE PERDAS DAS 15 MAIORES FEDERAIS UNIVERSIDADES FEDERAIS
INVESTIMENTOS (MILHÕES DE R$) 2015 2016
REDUÇÃO
1º Universidade Federal de Sergipe
110,8
41,3
62,7%
2º Universidade Federal de Alagoas
63,7
29,6
53,5%
3º Universidade Federal da Bahia
69,9
33,2
52,5%
4º Universidade Federal do Paraná
74,1
41,1
44,4%
5º Universidade Federal da Paraíba
72,3
41,3
42,8%
6º Universidade Federal do Amazonas
47,3
28,1
40,6%
66
39,4
40,3%
8º Universidade Federal do Rio Grande do Norte 124,8
76,6
38,6%
9º Universidade Federal do Pará
70,1
45,5
35,1%
10º Universidade de Brasília
95,1
64
32,7%
11º Universidade Federal de Minas Gerais
71,4
50,5
29,2%
12º Universidade Federal do Rio Grande do Sul
61,7
45,7
25,9%
13º Universidade Federal de Pernambuco
75,7
58,3
23%
14º Universidade Federal do Rio de Janeiro
84,2
82,2
2,4%
15º Universidade Federal Fluminense*
65,3
69,8
+6,9%
7º Universidade Federal de Santa Catarina
* A Universidade Federal Fluminense foi a única com aumento de recursos para investimentos; a expectativa é de que a instituição receba R$ 4,5 milhões a mais em relação a 2015.
RENAN XAVIER
Canteiro de obras do Centro de Vivência no Campus Darcy Ribeiro. A reitoria assegura que as construções iniciadas serão concluídas
gados para quando a situação estiver melhor. A UnB tem também algumas dívidas do passado que ainda não foram cumpridas. O que vai se tentar fazer é tocar essas dívidas e as obras que já começaram.” Tibúrcio afirma ainda que a venda das projeções e imóveis universitários para compensar a queda dos repasses tem sido estudada, mas critica a política. “Não há nada conclusivo sobre isso, mas a experiência passada da UnB mostra que, para o próprio interesse público, a venda não é interessante. Hoje, o dinheiro dos imóveis corresponde à nossa principal fonte de recursos que, de certa forma, passam a ser alocados na Universidade.”
para investir, atrás das universidades Federal do Rio de Janeiro, com R$ 82,2 milhões, Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), com R$ 76,6 milhões e da Federal Fluminense (UFF), com R$ 69,8 milhões. O cenário previsto se assemelha ao de 2015, cujo repasse para investimentos é o terceiro maior entre as federais. Em comparação com a última instituição da lista em volume de verbas para investimentos em 2015 e 2016, a Universidade Federal do Amazonas (UFAM), que recebe R$ 47,3 milhões neste ano, os recursos da UnB são significativamente superiores. Duas vezes maior em relação a 2015 – R$ 47,8 milhões a mais – e 56% em relação a 2016 – R$ 35,8 milhões excedentes.
‘‘A política do governo é a de concluir os esqueletos”
RECURSOS TOTAIS Apesar do corte em investimentos, a UnB receberá pequeno aumento em recursos totais em 2016. O valor proposto, de aproximadamente R$ 1,658 bilhões, supera em R$ 5,9 milhões o deste ano (0,36%), que pode chegar a R$ 1,652. As quantias desconsideram os recursos para o Hospital Universitário de Brasília (HUB), administrado pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) desde 2013. u
A UnB ocupa a 10ª posição na lista de instituições mais prejudicadas, mas, mesmo com os cortes, é historicamente uma das universidades federais com mais dinheiro para investimentos. Em 2016, será a quarta com maior verba
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EDUCAÇÃO
TREINANDO O OLHAR CRÍTICO Escolas recebem diferentes projetos que problematizam as possibilidades de manipulação da mídia TÁSSIA SARAIVA
A
nálise crítica e reflexão sobre a mídia são alguns dos pontos levantados de maneira lúdica pela peça “O Segredo”, da Cia Burlesca, que está sendo apresentada a 16 escolas públicas DF em setembro e outubro. Baseada no conto “O Segredo do Bonzo – Capítulo Inédito de Fernão Mendes Pinto”, de Machado de Assis, o espetáculo traz uma adaptação de um episódio supostamente vivido pelo viajante português. Na versão apresentada a jovens de ensino médio, Fernão Mendes Pinto chega à cidade fictícia de Civita, no reino dos Marinhos, onde se encontra com seu amigo Diogo Meireles. “O conto originalmente se passa na China, mas nós o trouxemos para uma cidade fictícia, onde misturamos várias etnias, brincando um pouco com essa noção do exótico”, explica Lyvian Sena, atriz da companhia. Com tambores, violões e chocalhos, a peça é aberta com versos cantados pelos atores: “Era só uma mentirinha boba, a coisa se espalhou pela cidade, era mentira e agora já virou verdade”. Na cidade, o personagem do escritor português é surpreendido por multidões que se reuniam em torno de diferentes líderes religiosos. Estes pregavam doutrinas absurdas, como o controle da gravidade a partir da mente e o segredo da vida futura. Em adoração, os fiéis da cidade entoavam o coro “vamos aprender, vamos aprender sem questionar”. Nesse contexto, Mendes e Meireles descobrem que uma sabedoria maior guia essas figuras de destaque da cidade. A tal teoria mostra um caminho para os que desejam obter respeito e reconhecimento, sem realmente possuírem o saber, propondo que, se uma coisa pode existir na opinião sem existir na realidade, a única que realmente importa é a opinião. “A essência da doutrina é a aparência, a capacidade de influir a opinião pública e até formála”, conclui Mendes na peça. A partir daí, os dois amigos deci-
dem testar a teoria de diversas maneiras, usando a imprensa e a publicidade como ferramentas de manipulação do povo. Buscando não só ganhos financeiros, mas também o prestígio e o respeito, eles conseguem vender produtos a partir da divulgação de qualidades falsas e enganar a população com notícias sem fundamento. Encerrado pelos versos “Quem divulga a notícia, na TV, jornal, revista, gosta de enrolar a gente. Falo de sete famílias, parece até uma quadrilha, é gente que tem poder”, o espetáculo foi montado com o objetivo de trazer para as escolas a importância de se refletir sobre a mídia. “Problematizar e discutir a nossa relação com a imprensa e a propaganda é algo que sempre aparece nos nossos trabalhos”, explica Sena. Tentando abordar o assunto pelo lado de quem produz e também pelo de quem consome, os artistas buscam sensibilizar os estudantes para as possibilidades de manipulação que passam despercebidas a quem não possui um olhar crítico. “Queremos provocar esse público não só em relação à qualidade do conteúdo, mas também sobre a motivação do consumo. Pensar no que a gente gosta de verdade e o que é construído pela mídia”, conta a atriz. Esses também são os objetivos de Clarinha Glock, jornalista, que desde 2013 oferece oficinas de leitura crítica da mídia para alunos e professores de escolas do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. A partir da apresentação de notícias, programas de entretenimento e até do que é publicado em redes sociais, Glock busca mostrar como o uso de algumas palavras pode servir para propagar preconceitos, ou induzir o público a certas opiniões. “Serve, pelo menos, para que eles pensem antes de reproduzir esse mesmo comportamento”, explica. Atualmente, Glock possui diversas oficinas, entre elas uma que fala só sobre preconceito e outra sobre a imagem da mulher na mídia. Criando uma base para que as gerações mais novas possam ir além do
RENAN XAVIER
Apesar da temática séria, a peça utiliza músicas em ritmos bem brasileiros e letras cômicas para animar e prender a atenção dos estudantes
que é oferecido hoje, a partir da busca por veículos alternativos e do questionamento dos mais tradicionais, a intenção das oficinas é mostrar o potencial dos meios de comunicação e incentivar seu uso para transformar a sociedade. “Isso faz com que a criança cresça e demande da população e dos meios de comunicação mais respeito aos direitos básicos”, explica. A fácil compreensão do tema por crianças e adolescentes tem sido um incentivo, não só para Glock, mas também para a Cia Burlesca, aqui no DF. No caso das oficinas, algumas atividades práticas em que os alunos localizam notícias com algum tipo de manipulação, comprovavam o olhar crítico em desenvolvimento. Já nas peças, apesar de o ambiente nem sempre possibilitar o diálogo direto com a plateia, os comentários dos alunos são o suficiente para perceber que a ideia foi passada com clareza. “Foi a primeira vez que tivemos este tipo de discussão na escola e achei muito inteligente a maneira como a companhia trouxe isso. O teatro prende a gente. Mudou o jeito como olhamos para os sites que antes considerávamos confiáveis. Foi tipo um tapa na cara”, conta Madalena Braga, estudante do 2º ano no Centro de Ensino Médio 02 do Gama.
MAIS PROGRAMAS O projeto Eco@r Jovem, promovido pelo Instituto Marista de Assistência Social (Imas), é outro expoente da educomunicação no DF. Com o objetivo de promover uma formação sobre os meios de comunicação e incentivar o protagonismo juvenil, o projeto realiza oficinas que, trabalhando temas de relevância social, tratam de leitura crítica e produção de conteúdo para diferentes mídias. No ano passado, quatro escolas públicas receberam o projeto, a partir de uma parceria do Imas com o Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente do DF (CDCA/DF). Alunos de dois Centros de Ensino Médio de Ceilândia, um de São Sebastião e outro de Sobradinho aprenderam sobre a importância da participação social e puderam exercitar a leitura crítica para, também, expressarem suas opiniões. “O principal objetivo é valorizar as ideias dos adolescentes. A escola muitas vezes não trabalha isso e os alunos têm medo até de fazer perguntas”, explica Fernanda Carmo, jornalista responsável pelo projeto. A próxima edição do Eco@r está prevista para começar ainda no segundo semestre deste ano, contemplando ainda mais escolas e alunos. u
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CARREIRA
O LUGAR DAS MULHERES N
Alunas começam a ser aceitas nas instituições de ensino superior militar, ma parte do cotidian
A
ANNA CAROLINE MAGALHÃES
cochambradas, fracas e favorecidas. Esses são alguns dos nomes que estudantes homens das academias militares dão às mulheres que também estudam nas instituições. A passos lentos, a Academia da Força Aérea (AFA), a Escola Naval e a Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), ligada ao exército, começam a abrir as portas para mulheres. Entretanto, nem sempre estudantes, chamados de aspirantes pela Marinha e de cadetes pela Aeronáutica e Exército, estão preparados para recebê-las. A AFA foi a pioneira em aceitar mulheres. Puderam ser intendentes - função administrativa - em 1996 e aviadoras em 2003, mas ainda não podem ser da infantaria. A marinha abriu a primeira turma feminina em 2014. Já a Aman vai permitir o ingresso de mulheres em 2017, devido à lei 12.705, de agosto de 2012, que permite que mulheres atuem como combatentes do Exército Brasileiro em áreas antes restritas aos homens. A medida teve o intuito de incentivar e aumentar a prenseça feminina nas forças armadas do Brasil. Alojamentos foram separados e as instalações, adaptadas para oferecer suporte às mulheres. Porém, alunos homens questionam se elas se encaixam nos padrões de mérito do militarismo, as funções que deveriam exercer e qual a melhor postura a adotar. Em entrevista ao Campus, um cadete da AFA
que prefere não ser identificado, explica as brincadeiras que costumam fazer com as alunas. “Brincamos que elas só conseguem passar nas missões por tentarem seduzir instrutores, que sendo mulher é tudo mais fácil”, conta. De acordo com uma aluna da AFA, que também preferiu não ser identificada, a mulher tem que provar o porquê de estar ali, ao contrário dos homens, que não têm a competência questionada pelos demais colegas. “No exercício de campanha (atividade feita em acampamento), muitos estudantes viraram para mim e falaram que eu não iria aguentar a mochila que tínhamos que carregar porque eu era mulher e magra”, conta. Após conseguir cumprir a atividade, ela afirma que o problema se repetiu no paraquedismo. “Acharam que eu não ia dar conta do peso de tudo que precisamos carregar. Novamente eu consegui”. A média de alunos por turma na AFA é de, aproximadamente, 120 homens para 15 mulheres. Na turma de aviadores de 2014, por exemplo, há apenas uma aviadora em meio a 109 homens. Assim, a adaptação das mulheres se torna ainda mais difícil. Primeiro por serem minoria. Segundo por estarem em um ambiente simbolicamente masculino, em que os alunos, principalmente os que vieram da Epcar (ensino médio da Aeronáutica, em que as mulheres não são aceitas), estão acostumados a lidar apenas com MAYNA RUGGIERO
homens. As próprias mulheres se cobram mais na tentativa de conseguir espaço. “Nós mesmas exigimos que sejamos mais resistentes e duronas que os homens’’, afirma outra intendente. De acordo com ela, os colegas têm dificuldades até de entender as limitações femininas. “Nossas atividades físicas são um pouco diferentes em virtude das limitações físicas e biológicas. Alguns cadetes encaram isso como vantagem”. Correr menos tempo e fazer flexão de maneira diferente são exemplos de “benefícios” que as mulheres têm. “Alguns acham até que não deveríamos estar aqui, que mulher não sabe pilotar, não é capaz de ter voz de comando ou firmeza de atitudes”, desabafa. Uma aviadora da AFA contou em entrevista ao Campus que, durante o período de adaptação, os erros são notados mais em mulheres do que em homens. “Cadetes reclamam que as revistas de uniforme, por exemplo, são mais tranquilas para nós, mas é o contrário. Por eles reclamarem, acabam cobrando mais da gente”. Além disso, se a mulher se machucar ou solicitar dispensa já é alvo de piadas. “Nos chamam de acochambradas, como se passassem a mão na nossa cabeça ou não aguentássemos como eles”. Para facilitar a convivência, ela explica que é melhor encarar algumas coisas como brincadeira e, quando os alunos passam dos limites, conversar isoladamente com cada um. “Em grupo, um influencia o outro, fica mais difícil conversar”. Além disso, a estudante afirma que hoje é praticamente vista como homem. A psicóloga e pesquisadora Emilia Takahashi explica em seu artigo Homens e Mulheres em Campo que é comum a mulher ter que sair da identidade feminina, ou seja, conhecida principalmente por noções de delicadeza e fragilidade, para assumir, em primeiro plano, a identidade militar, entendida pelo senso comum como masculina, e ser vista em nível de igualdade pelos
As primeiras 12 alunas da Escola Naval
demais colegas. O mesmo acontece na Escola Naval. Aspirantes também sentem dificuldades de aceitação por parte de homens. “Com a entrada de mulheres, o ambiente acabou mudando, eles perderam a liberdade, agora têm que tomar cuidado com o que falam ou fazem, por exemplo”, explica uma aspirante da segunda turma de mulheres. Outro incômodo é em relação aos cursos. As mulheres já entram como intendentes, enquanto os homens têm o direito de escolher no final do segundo ano se querem ser intendentes, fuzileiros ou fazer parte do corpo armado. Devido à intendência ser a área mais cobiçada (partes administrativas), a aspirante relata que eles ficam incomodados com o fato de as mulheres já entrarem direto para a intendência. Embora a Marinha tenha sido a pioneira em admitir mulheres em suas fileiras e declarar essencial a participação delas nas atividades, foi apenas em 2014 que alunas puderam ingressar na Escola Naval. Foram 12 mulheres e
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NAS ACADEMIAS MILITARES
as colegas homens não estão preparados para recebê-las. O preconceito faz no das estudantes INPRESS/DIVULGAÇÃO
870 homens, ou seja, o quadro feminino representa apenas 1,36% do total de estudantes. Ser minoria reflete-se no comportamento de todos. “Já ouvi homens se queixando de não poderem mais tirar a camisa nos corredores ao final da rotina de estudos, porque agora há mulheres aqui”, afirma uma aspirante. “Parece que invadimos o espaço deles, então precisamos provar que somos boas tanto quanto eles ou até melhores”. Além disso, ela relata que mulheres estão sempre em foco. “Uma vez um aspirante me chamou atenção por estar com o celular dentro da blusa. Achei que foi um tanto desnecessário, pois tenho certeza que se fosse um homem ele não teria reparado que o celular estava lá.” Já a Aman, ensino superior do Exército, ainda não aceita mulheres no corpo de alunos. No segundo semestre de 2016 serão abertas vagas destinadas a mulheres para cursar o terceiro ano na Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx). Assim, entrarão na
Aman em 2018 para os cursos de Material Bélico e Intendência. Ainda não se sabe a quantidade de vagas. Um oficial do Exército, formado pela Aman, afirma que não há mais motivos para mulheres ficarem de fora da Academia e diz apoiar a iniciativa, mas com ressalvas. Segundo ele, é preciso que as avaliações e exercícios físicos não tenham diferenças para que o mérito militar seja mantido. “Não pode haver tratamento especial”, enfatiza. “Toda hierarquia é baseada em mérito, se você põe padrões distintos para obter os mesmos resultados, não dá certo. Não pode ter índices diferenciados de treinamento físico nem cobranças mais leves em acampamentos”. Para um cadete da Aman, as medidas que estão sendo tomadas para receber as mulheres são tímidas. “Falam pouco por aqui sobre como vai ser quando elas entrarem. Imagino que seja como na AFA e na Escola Naval”. O cadete estima que serão abertas no máximo 60 vagas. De acordo com ele, as normas disciplinares são rígidas, então dificilmente haverá preconceito. Entretanto, quando questionado sobre mulheres entrarem em combate ou integrarem os outros cursos oferecidos pela Aman, ele afirma ser contra. “A atividade militar combatente exige muito do vigor físico e rusticidade. Há situaçoes de combate que não têm espaço para as mulheres”. Agora, resta saber como vão recebê-las em 2017. Para entrar em alguma das academias, é preciso se submeter a uma prova objetiva, inspeção de saúde e teste de aptidão física. Os aprovados recebem remuneração, alimentação, vestuário e assistência médica. Os cursos duram em média quatro anos e funcionam em regime de internato. Junto com a formação acadêmica, estudantes recebem também treinamento militar. Outra alternativa para fazer parte das academias é ter feito o ensino médio em algumas das escolas militares Escola Preparatória de Cadetes do Ar
(Epcar); Colégio Naval ou Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx). Entretanto, apenas homens podem participar. A EsPCEx, que possui o terceiro ano do ensino médio, abrirá em 2016 vagas para participação feminina, as outras escolas ainda não têm previsão. DESDE A GUERRA A passos lentos, as mulheres brasileiras conseguiram espaço no militarismo. Em 1943, durante a 2ª Guerra Mundial, puderam fazer parte do
Exército, em 1980 conseguiram entrar na Marinha e, dois anos depois, começaram na Aeronáutica. A participação, de início tímido, foi aumentando com o passar dos anos. Hoje, 14% do quadro de militares da Força Aérea Brasileira é formado por mulheres. No exército, esse número cai para 4%. Já a marinha, que completa este ano 35 anos de participação feminina, possui 11% de militares mulheres. Agora, falta percorrer um longo caminho para chegar perto da metade. u
SAIBA MAIS As Academias Militares do Brasil são as instituições de ensino superior público oferecidas pelas forças armadas. Em regime de internato, os aspirantes da Escola Naval e os cadetes da Academia da Força Aérea e da Academia Militar de Agulhas Negras têm formação acadêmica e militar, de acordo com a instituição e opção de curso escolhido. Ao final de quatro anos, os estudantes se tornam oficiais militares. Para entrar em algumas das instituições é preciso cumprir as exigências físicas de cada força armada e ser aprovado em avaliações escritas e físicas. Academia da Força Aérea (AFA) A Escola de Aviação Militar foi inaugurada em 1919. Os aviões da escola, vindos para o Brasil em 1919 e 1920, eram franceses, da 1ª Guerra Mundial. Em 1968, após o primeiro voo de instrução de cadetes, a escola da Aeronáutica passou a ser chamada de Academia da Força Aérea. Atualmente, a AFA oferece formação de aviadores e oficiais intendentes para homens e mulheres e de oficiais de infantaria somente para homens. Onde: Pirassununga, interior de São Paulo.
Escola Naval É a mais antiga das instituições de nível superior do país. Foi criada em 1782, em Lisboa, Portugal. Em 1808 veio para o Brasil e instalou-se no Rio de Janeiro. Tem o propósito de formar Oficiais da Marinha para os postos das carreiras dos Corpos da Armada (CA) e Fuzileiros Navais (CFN) para homens e de Intendentes da Marinha (CIM) para ambos os sexos. Onde: Ilha de Villegagnon, Rio de Janeiro Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) Inaugurada em 1790 em Lisboa, Portugal, a Aman, ligada ao Exército, veio para o Brasil em 1808 devido a transferência da corte imperial para o país. Tem como missão formar aspirantes a oficiais das Armas, do Serviço de Intendência e do Quadro de Material Bélico do Exército habilitando-o para os cargos de Tenente e Capitão não aperfeiçoado. Além de graduação em Ciências Militares e início da formação do chefe militar. Atualmente, apenas homens integram a academia. Onde: Resende, Rio de Janeiro.
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CIDADE
OS ESQUECIDOS Cinco anos após impasse entre índios e construtoras no Noroeste, 18 famílias continuam a viver no local à espera de uma nova área
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ANA CAROLINA BARDINI E LOYANE ALVES
o lado dos prédios novos, nobres e bonitos do Setor Noroeste, especificamente na quadra nove, há um barraco de madeira improvisado com uma placa de “Cortase cabelo”. Quem cuida desse estabelecimento é o índio Djauan e, logo atrás, no espaço onde ainda há um pouco do que resta da mata nativa, estão as tribos Kariri-Xocó e Tuxá. Djauan faz parte das 18 famílias que ainda vivem no pequeno terreno próximo aos prédios e obras, em condições difíceis. Delimitada por cercas, a tribo é rodeada por lixo e entulho das construções, e o alimento é comprado com a renda que os poucos que trabalham fora conseguem. A situação era bem diferente cinco anos atrás. Antes de começarem as obras do Setor Noroeste, os índios ocupavam toda a região e usufruiam de um espaço maior. No entanto, após o início das construções, eles foram obrigados a desistir da área que, segundo eles, os abrigou por 18 anos. Ednalva, índia da tribo Tuxá, diz que hoje vive de restos e esmola, pois o espaço onde plantavam foi ocupado pelos prédios: “Antigamente aqui tinham 40 pés de café, graviola, milho, hoje têm só dois e nos alimentamos do que ganhamos”. A cacique Ivanice Tanoné da tribo Kariri-Xocó, conta que a escolha do terreno não foi ao acaso. “Quando cheguei aqui eu sentia a presença dos meus ancestrais por onde eu passava e em cada árvore que eu tocava. Até hoje eu sinto”, conta. Para a tribo, o sentimento agora é de insegurança e caos. “Eu perco o sono toda noite preocupada com o que vai acontecer, porque eu sou a responsável por todos aqui”, diz a cacique. Ednalva Tuxá diz que dorme “com um olho aberto e outro fechado”, porque depois das construções não há mais paz. A todo momento passam carros e pessoas observando os índios e seus terrenos: “Mal durmo à noite, pois o barraco é de madeira. Morro de medo de alguém chegar aqui e botar fogo”.
A cacique Ivanice conta que teve que pagar um advogado para entrar com um processo e tentar manter a área. Após várias negociações foi firmado um acordo com a Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap). Além de doar um terreno de 22,08 hectares, aproximadamente 220mil m² (o que equivale a quase 20 campos de futebol), a Terracap se propôs a elaborar todos os projetos das edificações que servirão aos índios. Também há a proposta de construir, até abril de 2016, 16 unidades habitacionais com a infraestrutura de sistema de distribuição de energia, abastecimento de água, captação de esgoto, cercamento do perímetro, além da construção de um centro de convivência e ocas. A área doada fica localizada entre o viveiro de mudas da Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap) e o Parque Nacional de Brasília, mas, até o momento, nenhuma obra foi iniciada, o que preocupa a cacique da tribo. “Vamos entrar na época de chuvas em breve e aí eles não vão conseguir construir nada”, diz. Além de não ter mais condições de pagar o
advogado, a tribo não tem mais informações sobre o andamento do processo. A Fundação Nacional dos Índios (Funai) não deu mais informações, pois, após o acordo, o orgão deixou de acompanhar o caso, por não se tratar mais de um território indígena. Para a Funai, um terreno só é considerado reserva indígena após um extenso estudo feito por antropólogos no local. Isso aconteceu no Noroeste, porém não foi encontrado nenhum indício para que a área seja considerada um território indígena. Por esse motivo a tribo não tem recursos para cobrar o início das obras. “O que resta é esperar que o terreno seja entregue no prazo”, diz a cacique. A tribo Tuxá, composta por uma família de oito pessoas, aceitou o acordo, mas, após a demora da resolução do caso, Ednalva diz que não quer mais sair de lá. Segundo ela, a sua tribo foi a primeira a chegar à área em 1975, quando ela tinha apenas sete anos de idade. Com muito esforço, conseguiu manter a vida ali, como dava. Apesar de todas as dificuldades, ela está muito apegada ao local. Segundo a Terracap, das 18 famíLOYANE ALVES
Cacique Ivanice Tanoné lamenta o descaso das autoridades com os povos indígenas e diz que a solução é esperar, pois não há mais nada a fazer
lias que moram no local, duas não aceitaram o acordo, mas novas medidas serão tomadas para se chegar num entendimento. Tão logo as obras da nova área estejam consolidadas, a Agência irá procurar os responsáveis para novamente tentar firmar um acordo, necessário à completa desocupação do Setor Noroeste. As famílias que não aceitaram o acordo alegam que a área onde vivem é um santuário e por isso não podem abandonar o local. Sobre as obras não terem começado ainda, a Terracap explica em nota enviada ao Campus que “o convênio que prevê o repasse financeiro para construção de todas as obras relacionadas no interior da nova reserva está em fase final de assinatura. A Novacap vai realizar a licitação para contratação da empresa que irá executar as obras. Somente após a contratação da empresa é possível estipular previsão de data de conclusão das obras. ” A cacique Kariri conta ainda que existem mais três tribos indígenas, e uma quilombola que vivem nas mesmas condições. Alguns trabalham com reciclagem, e assim vão levando a vida. A terra foi homologada no governo Lula, e, enquanto não forem realocados, os índios permanecem lá, com a insegurança de que a qualquer momento pode acontecer algo com as pessoas e com os barracos. Enquanto aguardam o novo terreno os índios continuam batalhando para manter as tradições milenares da tribo, que carrega consigo muita história, sabedoria e cultura. Apesar das dificuldades, a cacique conta que cinco pessoas da tribo Kariri-Xocó estão estudando na UnB e mais cinco conseguem trabalhar fora para garantir o sustento dos filhos. “Eu digo a eles que têm que estudar, estamos na capital do país, tem oportunidade, vai estudar”. Já a tribo Tuxá vive como pode: “É difícil, mas vou reclamar de que? Tanta gente sofrendo em hospital. Dou graças a Deus por ter ainda gente que nos ajuda”, conta Ednalva. u
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MEIO AMBIENTE
LIXO MISTURADO Cooperativas do DF reclamam da falta de eficiência da coleta seletiva
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ANA GABRIELA BRAZ
o galpão de 510m² localizado na entrada da região, 16 catadoras de lixo dividem espaço com sacos gigantes de garrafas pet, latas de refrigerante, papel e recipientes de vidro. O espaço abriga uma das centrais de triagem de materiais recicláveis do Distrito Federal, a cooperativa Central de Reciclagem do Varjão (CRV). O trabalho consiste em separar o lixo útil da pilha de rejeitos despejados. Há alguns meses, no entanto, resíduos como retalhos de roupa, plantas secas, resto de comida e fraldas descartáveis têm chegado ao local com frequência cada vez maior. “Eu já encontrei até galinha em uma das sacolas”, conta a cooperativada responsável pelo local, Ana Carla Rodrigues. O caso não é exclusivo da CRV. De acordo com a diretora-presidente da Central de Cooperativas de Materiais Recicláveis do DF (Centcoop), Aline Sousa, vários catadores reclamam de receberem, em excesso, resíduos não recicláveis. “A coleta não tem nada de seletiva. O plano de recolhimento do lixo é errado pois se baseia no peso e material reciclável não pesa, então as empresas coletam rejeito para ganhar mais”, afirma a diretora. Em 2013, o Serviço de Limpeza Urbana (SLU) lançou um edital que previa a contratação de quatro empresas para realizarem a coleta, o transporte e a descarga de resíduos sólidos recicláveis domiciliares, institucionais e comerciais das áreas urbanas e rurais do DF. Hoje, somente duas companhias estão com o contrato ativo, a Coleta Geral Conexões (CGC) e a Valor Ambiental. Depois de recolherem o lixo de cada região, os caminhões se dirigem às coordenações de limpeza do SLU para pesagem do material apanhado e posteriormente o entregam às cooperativas. O peso estimado de cada caminhão da coleta seletiva é de 4,5 a 5,5 toneladas, e o da convencional pode chegar a 15 toneladas. Os dados do balanço anual de coleta seletiva apontaram que, em 2014, o preço por tonela-
ALANA MARTINEZ
Catadores reclamam de receberem resíduos não recicláveis misturados aos materiais recolhidos na coleta seletiva
da variou entre R$ 154,25 e R$ 433,71, dependendo da região. Com as queixas, o SLU passou a supervisionar a pesagem dos veículos e os que estivessem acima do peso esperado seriam investigados e poderiam sofrer penalidades. “A gente começou a fazer a mesma rota que alguns deles faziam para ver se estavam pegando algum lixo além do seletivo. Caso fosse confirmado, autuaríamos a empresa”, explica o assessor especial da Diretoria Técnica do SLU, Fernando Mendes. Apesar disso, o gerente da CGC, Tiago Pontes, argumenta que os caminhões só recolhem o lixo nos horários de coleta: “O papel da empresa é passar nas ruas da cidade e catar o resíduo que o usuário dispõe. Mas a coleta seletiva é um programa novo para muitas regiões do DF, e a população ainda não tem uma boa educação ambiental a respeito do descarte correto do lixo.” Gilmar Clementino da Silva trabalha com o lixo desde os sete anos. Começou no Lixão da Estrutural, saiu para servir o exército, mas retornou para o ramo da reciclagem nove anos depois: “Não sei se é sina ou destino”, diz ele. Há cerca de 15 anos, Silva e outros 30 catadores começaram a trabalhar
na Cooperativa do Distrito Federal e Entorno (Cooperdife), cooperativa estabelecida no SLU de Sobradinho I. Até o ano passado, a central de triagem só trabalhava com compostagem do lixo convencional, mas passou a fazer a coleta seletiva após a implantação do programa integrado no DF. “Nos primeiros quatro meses foi muito bom, mas foi caindo a qualidade do lixo reci-
clável e hoje ele representa apenas 2% do nosso faturamento”, afirmou. “Se a gente dependesse dela para viver, já tínhamos morrido de fome.” O SLU estuda um novo plano de ações previsto para entrar em vigor a partir do ano que vem, com o objetivo de aperfeiçoar o sistema de descarte do lixo no DF. Dentre elas, uma mudança no método de pagamento das empresas que atuam com a coleta seletiva. Segundo Mendes, existem duas possibilidades para substituir o mecanismo de pesagem. “O pagamento poderá ser feito por rota: os caminhões terão de ser equipados com GPS para termos o controle do percurso e da quilometragem; ou por quantidade de funcionários e de equipamentos. Independente da escolha, haverá controle por parte do governo de Brasília”, afirma. Também estão incluídas ações para a conclusão das obras do aterro oeste, construção de centros de triagem do lixo reciclável, instalação de pontos de entrega de resíduos da construção civil e demolição, de pontos de entrega voluntária para resíduos de volumes médio e pequeno e a intensificação de campanha publicitária sobre a coleta seletiva. u ALANA MARTINEZ
Gilmar da Silva é catador e presidente da cooperativa Cooperdife e trabalha com resíduos orgânicos e recicláveis
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CULTURA
DA FICÇÃO À REALIDADE Jovens se reúnem em clubes para recriar cenas famosas de livros e conversar sobre suas sagas favoritas
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RAPHAELE CAIXETA
se tivesse uma maneira de tranformar a ficção em realidade? Incorporar personagens, reviver cenas marcantes dos livros e viver como seu herói da ficção? É isso que centenas de jovens e adolescentes escolheram fazer nas tardes de domingo em Brasília. Quem passa pelo Parque da Cidade no final de semana corre o risco de esbarrar com jovens engajados em atividades como olimpíadas, aulas de poções e feitiços e disparo de arco e flecha. Muitos se vestem a caráter, com capas esvoaçantes, camisetas personalizadas, bonés do acampamento e até mesmo vassouras entre as pernas. Para que tudo aconteça existe um trabalho árduo feito por uma equipe organizadora. Com mais de 12 mil membros no Facebook, o Clube do Livro é um dos grupos de fãs mais antigo e ativo do Distrito Federal. Fundado em 2011, logo após o final da saga Harry Potter nos cinemas, o grupo tem o intuito de reunir jovens e adolescentes para atividades práticas, que vão além da discussão e imitam acontecimentos da ficção. O grupo ainda incentiva a leitura, já que quem frequenta o Clube se envolve também com outras obras literárias juvenis.
Segundo Diego Batista, um dos fundadores e líder do grupo, o propósito do Clube do Livro é justamente fazer com que os fãs tenham a oportunidade de trazer para a realidade vivências da ficção. Lice Alburquerque, 19 anos, frequenta o Clube do Livro desde fevereiro deste ano, e para ela o Clube mudou sua vida. “Tanto a parte social, em que eu conheci várias pessoas, quanto a parte cultural, na qual eu tive contato com outras obras. Além do lado físico, porque eu acabo saindo de casa para me exercitar, participar das olimpíadas e dos jogos de quadribol. Então, mudou minha vida de maneira muito completa.” Nem só de Harry Potter e Percy Jackson os frequentadores do grupo vivem. Com o crescimento do mercado infanto-juvenil, os livros voltados para temáticas fantasiosas ou distópicas têm ocupado cada vez mais espaço. Os participantes do grupo estão sempre atentos ao surgimento de novas obras para adicionar às discussões e até desenvolver atividades práticas desses livros. Obras como Jogos Vorazes e Divergente também fazem parte do dia-a-dia dos membros. Os eventos práticos ocorrem durante todo o ano, mas existem alguns ALANA MARTINEZ
Lice Albuquerque, integrante do Clube do Livro, treina arco e flecha para a Olimpíada de Semi-deuses que acontecerá em janeiro
O QUE É? HARRY POTTER • Torneio Tribuxo - Competição entre três das maiores escolas do mundo bruxo - Hogwarts, Beaxbatons, Durmstrangs. • Quadribol - Jogo popular no qual os jogadores marcam pontos montados em vassouras. Para marcar pontos é preciso acertar bolas em arcos suspensos e capturar uma esfera dourada, que vale a maior pontuação. • Taça das Casas - Os alunos de Hogwarts são divididos em Casas de acordo com a personalidade e durante o ano letivo os bruxos competem pela taça. Os pontos são dados ou retirados por professores e monitores de acordo com o desempenho e comportamento.
PERCY JACKSON • Acampamento Meio-Sangue - Acampamento onde adolescentes semideuses passam as férias ou todo o ano treinando para batalhas. • Olimpíada de semi-deuses - Não é uma atividade oficial da saga, mas reúne atividades praticadas nos livros como tiro ao alvo e caça à bandeira - jogo em que um grupo tenta roubar o bandeira do outro. meses voltados para atividades mais complexas e de maior apelo no Clube. Em janeiro é realizado o mês Jackson, época na qual são feitas atividades ligadas à saga Percy Jackson. As atividades vão desde o Acampamento MeioSangue até Olimpíada de Semi-deuses e caça à bandeira. Julho, o mês mais esperado, é um mês todo voltado para aficionados em Harry Potter. Acontece o Torneio Tribuxo, Taça das Casas e o mês é fechado com um Baile de Inverno, que marca também o aniversário do Clube, no dia 16 de julho. BRUXOS DO CERRADO Mas o Clube do Livro não é o único grupo que organiza atividades como essa no Distrito Federal. Fundado há um ano, o Bruxos do Cerrado é totalmente voltado para as aventuras de Harry Potter. Segundo Romário Costa, um dos líderes e organizadores do grupo, muitos dos que participam do Bruxos do Cerrado faziam parte do Clube do Livro, mas sentiram falta de algo mais centrado na saga do bruxo.
Também com ponto de encontro no Parque da Cidade, o grupo se organiza para realizar atividades de Quadribol, Taça das Casas e também o Torneio Tribuxo. Ivone Mineiro, de 40 anos, participa do grupo Bruxos do Cerrado desde sua fundação, junto com os dois filhos Igor e Sinara Mineiro. A mãe conta que começou a frequentar as atividades do clube por influência dos filhos, que sempre foram muito ligados a esse tipo de leitura, e com o tempo começou a criar interesse e participar mais ativamente. Hoje Ivone participa do Bruxos do Cerrado com regularidade e é até referência dentro do grupo. Em relação à idade ela garante que não faz diferença. Para os filhos, participar das atividades junto à mãe é divertido. Projetos como esses geralmente estão presentes nas redes sociais, e os membros usam grupos no Facebook para se articular e marcar os encontros. Os líderes dos dois grupos garantem que participar do grupo é fácil. “É só chegar e participar”, afirma Batista. u
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EMPREENDEDORISMO
INOVAÇÃO NO TRABALHO Empresas utilizam elementos de jogos para motivar equipes e alcançar melhores resultados
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BEATRIZ QUEIROZ
magine ser um lutador de Ultimate Fighting Championship (UFC) e ter a oportunidade de conquistar um cinturão. Essa é a realidade da equipe de vendas da Sasse Produtos Promocionais, empresa de referência nacional no ramo, com unidades no Distrito Federal, São Paulo e Santa Catarina. Com objetivo de criar uma cultura voltada para resultados dentro do ambiente empresarial, os executivos comerciais se tornaram lutadores e passaram a viver o Ultimate Sasse Championship. Foram espalhados banners com fotos das pessoas vestidas de lutadores e apelidos que remetem aos ringues. A empresa investiu também em outros tipos de comunicação interna personalizados, como cartões de visita e camisetas. Foi desenvolvida uma campanha de vendas baseada em meritocracia e colaboração. Para medir os resultados da campanha, o gerente comercial da Sasse Gabriel Machado criou indicadores, que são formas de avaliação de desempenho, e metas comerciais, assim como um sistema de peso para o cálculo de cada indicador.
‘‘A gamificação deve fazer parte da cultura da empresa” Dessa forma, ele pôde mostrar aos funcionários que “o importante não era apenas o volume de vendas, mas também o esforço e a dedicação na busca pelo resultado”, conta o gerente comercial. “Queríamos que todos tivessem melhores resultados. Porém, sem perder o espírito de equipe.” A utilização de elementos de jogos para motivar uma equipe a gerar melhores resultados é conhecida como gamificação. Ela serve para incentivar as pessoas a fazerem algo que elas não
BEATRIZ QUEIROZ
querem e busca resolver um problema, conta o estudante do último semestre de Design Caio Costa, que está escrevendo o trabalho de conclusão de curso sobre a relação entre design e gamificação. “Um dos poderes dessa prática é tornar divertido algo que é chato”, explica. Caio lembra que quando você faz um processo de gamificação, você não está necessariamente criando um jogo. “São coisas diferentes. O objetivo do jogo está dentro do mesmo e da gamificação está fora. Por mais que a finalidade seja motivar as pessoas, você não faz a gamificação só por fazer, você tem que querer um resultado com isso. O jogo você joga só por jogar”. Michael Haxton, sócio e Diretor de Planejamento da Look’n Feel, agência de comunicação com sede no DF, acredita que é necessário “jogar para encontrar uma solução, criar uma experiência, engajar e abrir os horizontes”. Ele conta que consegue aplicar a técnica de diferentes formas dentro da Look’n Feel, desde treinamentos internos até projetos para clientes. Para fazer com que o blog da agência voltasse a ser usado, Haxton resolveu fazer um processo de gamificação. Conhecida como O Torneio, a atividade dividia a equipe em regiões, dentro de uma temática medieval. Cada grupo deveria entregar um mínimo mensal de textos. O engajamento gerado nas mídias e o número de publicações eram convertidos em pontos, os quais indicavam as regiões que receberiam os prêmios mensais e final. Segundo o sócio da agência, os maiores índices do blog foram durante o período do Torneio. Haxton lembra que na infância as pessoas costumam jogar, se divertir e aprender, mas que a fase adulta diminui esse comportamento. Mas acredita que sempre existe a vontade de jogar e isso pode ser aproveitado no ambiente empresarial. “Acredito que trabalhar pode ser mais divertido e que jogar é uma forma de alcançar isso.”
Roberto “Fica Tranquilo” Coelho foi o melhor vendedor de agosto: ele tem a posse do cinturão até o final de setembro e vai defender o título nos próximos meses
Em busca de modificar o comportamento dos membros em relação à estratégia e com base nos interesses da equipe, a empresa júnior de Engenharia de Produção da UnB, Grupo Gestão (GG), criou a Copa do Mundo do GG. A ideia era deixar o Planejamento Estratégico mais claro e visível para os estudantes que trabalham na empresa, de forma que eles consigam acompanhar a evolução de todas as áreas e da estratégia. O painel consiste em um campo de futebol dividido em campos menores nos quais ficam as equipes, que são divididas de acordo com as áreas da empresa. Cada time tem um boneco uniformizado que começa como criança e cresce de acordo com a evolução da área. Existe um tubo que é preenchido por miçangas coloridas de acordo com as metas que foram batidas. Além disso, as áreas recebem pontos de acordo com a participação em cursos e palestras relacionadas à empresa, oferecidas por outras organizações, mas que não fazem parte da obrigação de um funcionário. “A gamificação é muito importante na comunicação da estratégia e isso tem um impacto no cumprimen-
to das atividades estratégicas. O painel influencia também a motivação dos membros, porque eles veem onde têm que chegar, visto que ele torna as coisas mais claras e que clareza é um fator motivacional”, explica o presidente do Grupo Gestão, Rafael Rodeiro. Ele também conta que a gamificação traz uma competitividade e faz um membro querer ser melhor que o outro em busca de premiações. Mas a competição não é a única forma de trabalhar com isso. Existe também o lado de cooperação, no qual as pessoas precisam colaborar para chegar ao resultado final. O formato da gamificação depende diretamente do perfil das pessoas que serão envolvidas e da forma como elas trabalham. Tudo pode ser gamificado, mas gamificar nem sempre é a melhor solução. Para começar é necessário ter um objetivo claro, conta Haxton. Ele acredita que é preciso ter um ambiente favorável, entender como se faz um jogo, quais os componentes necessários e pensar nas formas de mensurar os resultados. Além disso, ele lembra que não é só gamificar, é preciso acompanhar. “A gamificação deve fazer parte da cultura da empresa”, afirma. u
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PERFIL
Página 12 Nada linear LUDIMILA MAMEDES
“O
lá, o Gabriel está aí?”, perguntei para uma moça que estava abrindo as portas da Casa X. “Quem? Não tem nenhum Gabriel aqui não”, disse ela. “Uai, o Gabriel, Mestre de Cerimônia da Casa X”, “Ah! O Higor! Pode entrar, ele está aqui”. Higor Gabriel Araujo acha que dois nomes próprios não devem ser compostos, por isso, poucos sabem o primeiro nome dele. Em um banheiro pequeno e abafado, com pouca ventilação, Araújo veste a fantasia e faz sua própria maquiagem. Muitas camadas de pancake, blush e rímel, e pronto, dez minutos, Araújo torna-se um oficial Mestre de Cerimônia da Xuxa. Não há como negar que a maioria das pessoas que possuem Facebook passam ao menos cinco minutos descendo a barra da linha do tempo. E foi nesse hábito tão comum que Araújo viu um anúncio de que iria abrir uma Casa X (casa de festas infantis da Xuxa) em Brasília. Para compor a equipe, estavam sendo selecionados jovens para concorrerem a uma vaga de Mestre de Cerimônia (popularmente conhecido como “Paquito”). Araújo é aquela pessoa que você pode não só contar por aí que já teve uma Tekpix e Mestre de Cerimônia da Casa X, mas que também é estudante de Mecatrônica, já participou de um projeto sobre microrobôs aéreos e mês que vem vai começar uma pesquisa sobre interferência de campos eletromagnéticos em sistemas eletrônicos. Além de ser faixa azul de kung fu, ele faz boxe e LUDIMILA MAMEDES é DJ. Araújo chega uma hora antes da festa à Casa X começar. Ele é quem coordena todos os outros recreadores da festa, que são os personagens do mundo do programa da Xuxa, como o Tchutchucão. O Mestre de Cerimônia é responsável por manter o cronograma no decorrer da festa. Ele faz brincadeiras com crianças e convidados. A festa acaba quando o aniversariante e seus pais aparecem na famosa nave espacial da Xuxa (sim, igual aquela do programa de TV). Araujo chega a participar de dez festas por mês na Casa X. Tem dia em que mesmo depois de uma noite
de evento, ele ainda vai se encontrar com amigos, e o descanso pleno fica guardado para o domingo.Esse vasto campo de interesse gerou um hábito considerado pelos amigos meio inconveniente. “Ele tem mania de achar que está sempre certo. Ele gosta de saber de todos os assuntos, quer ser o médico de todo mundo”, diz a amiga de infância Rayanne Poletti. Se você discordar, se prepare, ele bate o pé no chão e insiste no seu argumento e, se estiver errado, ele vai dar um jeito de ficar por cima. Em meio à grade curricular pesada do curso de Engenharia Mecatrônica, conciliar a faculdade com estágio na área é uma tarefa bem difícil. “O Gabe brinca que faz Engenharia porque é a única coisa que ele não é tão bom”, diz Anna Magalhães, amiga da infância. “O fato de fazer Engenharia é porque, além de gostar muito da área, é uma coisa que eu não sei e não poderia aprender sozinho. Se fizesse algum curso relacionado à arte, que é uma área na qual naturalmente já tenho muito contato, eu não me sentiria desafiado”, diz Araujo. Mas ele sempre vai dar um jeito de encontrar uma maneira de equilibrar seus prazeres, de ser uma pessoa que desde cedo esteve ligada naturalmente à arte e à curiosidade pela tecnologia que surgiu com o tempo. “Sei lá como a mente dele funciona”, diz Magalhães. “O lado de engenheiro que eu vejo no Gabe é por ser curioso quanto a tudo. Mas ele não vai se prender somente a isso, ele tem interesse sobre muita coisa”. Mas Araujo não precisa passar o resto da vida inerte ao que diz o diploma dele. Planos de carreira tradicionais estão perdendo força e cada vez mais trabalho está se tornando sinônimo de prazer. “Eu vejo o Gabe como publicitário, historiador, promoter, ele é bom em exatas, humanas. É injusto com essas pessoas terem a obrigação de se encaixarem em uma única função”, diz a amiga. Pessoas como Araujo são capazes de começar uma conversa em italiano e terminar em francês, de cursar Engenharia Mecatrônica e serem Mestre de Cerimônia da Casa X, sem o menor problema. u
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Suplemento
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SAÚDE FEMININA
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SAÚDE
SEXUALIDADE DE MULHER
Lésbicas e bissexuais vão menos ao ginecologista LUANA PEREIRA
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epois que começaram a se relacionar com mulheres, as estudantes Fernanda Vieira e Jordhanna Cavalcante, ambas de 18 anos, não foram mais ao ginecologista. “Tenho medo da forma como serei tratada e receio que o médico não esteja preparado para me atender”, diz Cavalcante. Já Vieira conta antes acreditava não ser necessário ir às consultas ginecológicas tendo relações somente com mulheres. “Por não ter risco de gravidez e por achar que era mais difícil pegar doenças sexualmente transmissíveis. Mas hoje sei que também preciso ir, inclusive planejo marcar uma consulta assim que puder”, diz. O caso das estudantes de Serviço Social não é único. Segundo a pesquisa Prevenção às DST/Aids para Mulheres que Fazem Sexo com Mulheres – Experiências, Desafios e Oportunidades, realizada pelo Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids de São Paulo em 2004, 144 lésbicas e bissexuais foram consultadas e 53,1% não realiza-
vam consulta ginecológica anualmente. Entre os motivos pelos quais mulheres lésbicas evitam consultas ginecológicas estão o medo de reações negativas de médicos caso revelem sua orientação sexual, a falta de conhecimento dos médicos de questões que podem ser relevantes para lésbicas e a baixa percepção do risco de contrair DSTs e alguns tipos de câncer. Rebecca Religare e Mariana Mota, que estão em um relacionamento há um ano e seis meses, contam que desde que começaram a namorar vão juntas ao ginecologista e sempre se estressam com o atendimento. “É recorrente, sempre que vamos em consultas ginecológicas voltamos com dor de cabeça para casa. Eles não estão preparados para nos atender”, diz Mota, frustrada. Rebecca Religare conta que na primeira vez que foi ao ginecologista, assim que informou ao médico que era lésbica, a reação dele foi dar risada e dizer: “Mas você só vai ficar no ‘roçaroça’? Então o que está fazendo aqui?”, LUANA PEREIRA
Jordhanna Cavalcante e Fernanda Vieira pararam de ir ao ginecologista, mas prometem que voltarão em breve aos consultórios
Realizam consulta ginecológica anualmente
��� ���
Sim Não
53%
47%
Contou ao médico ser lésbica ou bissexual Sim Não
49%
51%
Fonte: Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids de São Paulo
ela ficou indignada. “Também fiquei confusa. Por me relacionar com mulheres eu não precisaria ir ao médico? De acordo com esse ginecologista, sim. Ele me disse que as chances de eu pegar alguma doença com mulheres era mínima”. O casal acredita que falta informação e formação aos profissionais de saúde em relação às questões que envolvem a população de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros (LGBTTT). É FUNDAMENTAL SE CONSULTAR “Independente de qual seja a sua orientação sexual, é fundamental que qualquer mulher se consulte ao menos uma vez ao ano com o médico ginecologista”, afirma Alysson Zanatta, professor de ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. “Lésbicas e bissexuais também precisam fazer exame de rotina, como o Papanicolau, que ajuda a prevenir ou detectar câncer de colo do útero”, explica.
Outra questão importante é a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Segundo a pesquisa do Centro de Referência e Treinamento DST/Aids, apenas 2% das mulheres que têm relação sexual com outras mulheres se protegem. Segundo Zanatta, as principais DSTs (hepatite, HIV, sífilis) podem ser transmitidas quando há contato entre fluidos corpóreos (secreção vaginal, saliva, urina, por exemplo), ou especialmente quando há contato entre fluidos corpóreos e feridas ou lesões sangrantes. “Recomendamos especial atenção para que se evite contato direto com fluidos corpóreos durante as relações sexuais”, informa o ginecologista. Sexo oral e atividade sexual envolvendo dedos-vagina ou dedos-ânus, ou brinquedos sexuais, sem os devidos cuidados também podem transmitir doenças.
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RES QUE AMAM MULHERES
a por acreditarem em despreparo médico FELIPE SOUSA
ta que questões de gênero e sexualidade não costumam ser pautadas durante a formação profissional em saúde. O Ministério da Saúde lançou no início deste mês uma etapa da campanha “Políticas de Equidade. Para Tratar Bem De Todos”. O foco está na atenção à saúde de mulheres lésbicas e bissexuais. A mobilização tem por objetivo acabar com o atendimento ginecológico baseado no pressuposto de que todas as mulheres são heterossexuais ou precisam de atenção ligada à reprodução. Para analisar o acesso à saúde da população LGBT no SUS, junto à campanha está em andamento uma pesquisa financiada pelo Ministério da Saúde e coordenada pela Univer-
sidade de Brasília, com a participação de pesquisadores de mais seis universidades e da Fiocruz Pernambuco. O estudo vai mapear o atendimento nos serviços médicos, na perspectiva dos usuários, profissionais e gestores para orientar melhorias na qualidade da atenção integral oferecida a essa população. Os resultados terão abrangência nacional e devem ser apresentados em 2016. u
SAIBA MAIS Rebecca Religare e Mariana Mota vão ao ginecologista juntas desde que começaram a se relacionar e relatam sofrer com o despreparo médico
É IMPORTANTE SAIR DO ARMÁRIO Segundo Guilhermina Cunha, vice-presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) da Secretaria de Direitos Humanos, muitas mulheres ocultam sua orientação sexual por vergonha ou por acreditarem não ser necessário. “É importante sair do armário para o profissional que está te atendendo porque há especificidades que envolvem a saúde sexual de lésbicas e bissexuais que precisam ser abordadas, como os métodos preventivos de DSTs.” Ainda de acordo com a pesquisa realizada pelo Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids de São Paulo, apenas 49% das respondentes contou para médicos ser lésbica ou bissexual e 29,6% destes profissionais não deram atenção ao fato, 21,1% reagiram negativamente e 5,6% se mostraram surpresos. Das que não contaram, 91,3% justificaram sentir desconforto
frente ao profissional de saúde, e 8,7% inibição. Sobre o atendimento, a vice-presidente da ABGLT completa: “Primeiro médicos ginecológicos não levam em consideração outras formas de fazer sexo além da falocêntrica. Segundo, temem fazer exames de toque por acreditarem que por não termos relações sexuais com homens ainda somos virgens. Terceiro, e pior, muitos alegam que por não fazermos sexo com homens não corremos riscos”. PELO FIM DO DESPREPARO MÉDICO “É necessário que os profissionais de saúde tenham em seus currículos acadêmicos disciplinas que abranjam não só as especificidades da população LGBTTT, como também a humanização do atendimento, que hoje vemos que é falho”, explica Guilhermina Cunha. O Ministério da Saúde realizou em 2012 uma pesquisa com 207 professores de 144 escolas médicas brasileiras, e apon-
COMO SE PROTEGER DE DSTs • Faça testes e consultas regularmente. Se tiver parceira, a incentive a fazer também. • No mezanino da Rodoviária do Plano Piloto, o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) distribui camisinha masculina e feminina além de fazer teste de HIV e hepatite gratuitamente. • Pratique sexo seguro. Utilize métodos preventivos e não compartilhe brinquedos sexuais. Caso os utilize, use-os com camisinhas e limpe-os antes e após cada uso. • Higienize sempre as mãos, tenha álcool-gel na bolsa, mantenha as unhas cortadas e não retire cutícula horas antes da relação sexual. COMO DENUNCIAR Em caso de negligência ou abuso médico, encaminhe a denúncia ao Conselho Regional de Medicina (CRM), com o relato dos fatos, o nome do médico ou da instituição, data e local. É necessário que os documentos estejam devidamente identificados e assinados. A denúncia pode ser feita pessoalmente, na sede do Conselho ou nas delegacias regionais, ou por carta, enviando a documentação anexada para o endereço da sede. No DF, a sede do CRM fica no Setor de Indústrias Gráficas (SIG), Quadra 01, Centro Empresarial Parque Brasília, 2º Andar, Sala 202.
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CAMPUS
Brasília, setembro de 2015
SAÚDE
GINECOLOGIA DAS PLANTAS Mulheres utilizam chás, óleos e tinturas naturais como alternativa a tratamentos convencionais RAFAELLA PANCERI
E
m tempos de liberdade feminina, a ginecologia natural ou autônoma pode ser uma aliada nos tratamentos e diagnósticos convencionais: ao invés de remédios, chás, óleos, tinturas e mudanças na dieta são os protagonistas no alívio de dores físicas e controle de infecções. A ginecologia autônoma tem como base o princípio de que cada pessoa conhece seu corpo como ninguém. Nesse contexto, os profissionais de saúde são apenas mediadores de qualquer tratamento ou processo de cura. Entusiastas da área defendem que a medicina convencional não é a única verdadeira e apostam no equilíbrio físico, emocional e espiritual para prevenir doenças. As praticantes do método alternativo não descartam idas ao consultório médico e nem pregam abandono total dos remédios. A ideia é depender o mínimo possível deles e treinar o equilíbrio autônomo do corpo. O fator preço pode ser um problema para quem precisa cuidar da saúde, mas não para quem opta por seguir os
‘‘Cada planta reage de maneira diferente em cada organismo” caminhos alternativos à medicina. Em substituição a remédios comprados em farmácias, chás de canela, orégano, sálvia, louro e gengibre são aliados para curar cólicas menstruais, sintomas da menopausa e até mesmo regular o ciclo menstrual. Plantas como a malva e o alho são aliadas no controle de infecções vaginais provocadas por fungos, assim como o vinagre, capaz de regular o pH da região. A arruda, por exemplo, é uma planta utilizada no tratamento de cólicas, entretanto, pode ser tóxica ao organismo quando consumida em grandes quantidades. “Pode ser perigoso praticar sem
LOYANE ALVES
supervisão médica se a pessoa busca informações e não se preocupa com a fonte”, afirma Patrícia Loraine, adepta da medicina alternativa. Ela aprendeu sobre propriedades terapêuticas das plantas em livros, pesquisas na web e com a família: “Eu sempre tive preferência pelos cuidados naturais com a saúde. A minha avó usava ervas e isso chamava minha atenção”. Os benefícios de optar pela ginecologia alternativa, diz Loraine, são vários. Os métodos de autoconhecimento ajudam a identificar infecções e alterações no corpo precocemente. Além disso, fica mais fácil monitorar a saúde geral do corpo por meio de sinais dados pela menstruação e pelo muco vaginal. Entre mulheres como ela, a adesão à ginecologia natural se deve, em grande parte, ao casamento entre saúde, prazer e desenvolvimento espiritual. Juliana Floriano coordena workshops de ginecologia autônoma há seis anos, no Brasil e em outros países da América Latina, e expõe os benefícios das oficinas. “A longo prazo, há uma melhora na saúde. O tratamento natural dura mais tempo e tem menor custo”, argumenta. Para Floriano, cuidados naturais com a saúde são sinônimo de depender o mínimo possível da indústria farmacêutica e cosmética e apostar no bem estar pessoal. Ela reconhece que recorrer à medicina é necessário. “O parto cesáreo pode salvar a vida de algumas mulheres e métodos de diagnóstico como o Papanicolau podem prevenir doenças”, diz. Ela é cautelosa quanto à divulgação de receitas caseiras na internet: “Cada planta reage de maneira diferente em cada organismo. É preciso tomar cuidado com a fonte e com a dosagem, pois as plantas são remédio, mas podem ser veneno”. CONHECIMENTO EMPÍRICO Apesar de ser formada em medicina chinesa e praticar acupuntura e
Patricia Lorrane defende que a ginecologia natural é um caminho de autoconhecimento e resgate das especificidades do corpo feminino fitoterapia, Mariana Almeida não de-
fende o abandono completo da medicina convencional: “É importante realizar os exames de rotina uma vez ao ano. Caso aconteça algo que a mulher não se sinta capaz de resolver, a procura ao médico é necessária”. A grande vantagem da ginecologia natural é a mulher poder se cuidar com métodos naturais e ser o piloto de sua fertilidade e sexualidade, diz. Para ela, usar os métodos naturais de cura e tratamento depende do nível de confiança e, principalmente, de prática. “Quanto mais você se estuda, menos necessidade tem do olhar médico”, avalia. Apesar de guiarem mulheres no caminho do autoconhecimento, os tratamentos alternativos podem maquiar doenças sérias como a endomentriose. “Chá de chia e chá verde melhoram a cólica, mas enquanto isso a doença pode estar em desenvolvimento dentro do útero”, esclarece José Miguel de Deus, professor do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal de Goiás. O médico não defende uma oposição absoluta entre medicina natural e convencional, mas alerta para os problemas de saúde autolimitados, ou seja, que melhoram com o tempo, repouso e dieta equilibrada. Ele exemplifica: “Em relação à menopausa, muitas mu-
lheres não têm sintomas. Quando têm, muita gente melhora porque iria melhorar mesmo”. O ginecologista defende que, sem pesquisa, é difícil dosar a efetividade dos métodos “naturebas” e, inclusive, saber se eles não prejudicam a saúde. Ele não rejeita a fitoterapia e reconhece o poder da vontade interna das pacientes. “Tomar um remédio sem acreditar na cura não ajuda”, diz. “A crença também conta muito”. Ele relata casos extremos de mulheres que não procuraram tratamento médico para miomas e tumores. Quando decidiram ir ao consultório para buscar ajuda, estavam com anemia profunda, por conta do excesso de menstruação. Nesses casos, o risco de comprometer todo o sistema reprodutivo era alto. José de Deus não exclui a efetividade dos métodos naturais, mas pondera: “É preciso ter pesquisa para se certificar se eles funcionam ou se trata-se apenas de efeito placebo, da crença, da fé”. u