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NúmeRo 421 aNo 45
A MÍDIA DE CEILÂNDIA Cidade-satélite ganha jornal, TV na internet e agência de notícias
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MUDANÇA DE MARCA Projeto aprovado na Câmara Legislativa tenta coibir o uso
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iNClUSÃO
LEITURA EM RISCO Biblioteca Braille Dorina Nowill, em Taguatinga, pode fechar por falta de segurança
CONSTRUÇÃO
OBRAS PARADAS NO DF Crise econômica causa atrasos em reformas na Rodoviária do Plano Piloto e na Praça Sul
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CARTA dO EdiTOR
NA filA
Bárbara Cruz Editora-chefe
No meio jornalístico, repórter novo e inexperiente é chamado de “foca”. Porém, antes mesmo de merecer o status há um longo caminho a se percorrer. Temos aqui uma chance ímpar de experimentar, testar coisas novas, enfrentar problemas. É o momento de ousar, de errar, de aprender e de, ao final de cada edição, deixar o experimento pra trás e começar tudo de novo. É para isso que um laboratório serve. Durante a produção desta edição, nos deparamos com desafios a cada etapa. Encontrar e selecionar pautas eram um empecilho singular. Quais seriam nossos critérios de escolha? Por que priorizaríamos um assunto sobre outro? Ao final, decidimos que escreveríamos sobre aquilo que gostaríamos de ler e temas sobre os quais gostaríamos de escrever. Superada essa primeira barreira, vinha a parte prática em si: procurar informações, personagens, especialistas.
Fotografar, formular perguntas, entrevistar. Passar para o papel – de forma clara e objetiva como manda o bom jornalismo – dias de contato com o tema escolhido. Seja a dedicação de uma mulher para conservar as obras de um grande artista brasileiro, seja mostrar como a mídia e o jornalismo cidadão podem fazer a diferença em uma comunidade. Seja analisar gastos indevidos do governo distrital, seja as demissões na obra de reforma da rodoviária. A diversidade de histórias reflete a diversidade da equipe que faz o jornal. Não importa o tema, o Campus é feito com muita dedicação, suor, noites mal dormidas, pesquisa atrás de pesquisa. Ao final do semestre, levamos conosco não só o conhecimento e aprendizado que em breve usaremos como focas e repórteres; saímos com a formação pessoal, acadêmica, profissional que nos acompanhará para o resto de nossas vidas.
MEMÓRiA
OMBUdSMAN*
Com a proximidade do Dia do Trabalho, nesta edição entrevistamos os funcionários terceirizados da Universidade de Brasília para saber como é o
Cláudio Sousa Jardineiro 37 anos
“Depende da gestão da UnB. Às vezes começa bom, mas vai piorando. Os salários começam a atrasar e fica complicado.”
Rudá Moreira
Após cinco meses de folga, os leitores do Campus voltam a ter em mãos uma nova edição. Apesar da diminuição de páginas, foi entregue um produto com boa variedade de conteúdo. O projeto sofreu inovações interessantes, como a seção “Na fila”. A diagramação dinamiza a leitura e conversa bem com a página. A forma circular para os retratos lembra conversas online e desperta o interesse. Outra feliz escolha gráfica foi a identidade visual de artes e boxes nas matérias. A existência de um padrão transmite notoriedade e deixa o tabloide esteticamente superior. Na capa, a foto chama a atenção. A composição da imagem somado à ausência de cores gera melancolia e vende muito bem a matéria e o jornal. Pena o fotógrafo não ter sido creditado. O leitor encontra nas páginas 4 e 5 uma matéria bem escrita, recheada de personagens interessantes, peculiares, entrelaçados a uma narrativa que explica o problema.
Entretanto, o gráfico revela um equívoco grave: o aumento percentual correto das solicitações de abrigo de sírios no DF seria de 5.300%, de acordo com as informações e não 530% estampados na capa, no sutiã e no texto da reportagem. Um erro de milhares de pontos percentuais simplesmente não pode passar batido por repórter, editor, professores, revisores e editor-chefe. Um leitor mais atento não vai deixar passar. Outros erros de revisão ficaram menos evidentes, mas não menos importantes. O chapéu da matéria dentro do jornal deve ser o mesmo da capa. As viúvas apareceram mais que o aceitável. O til voltou a correr, incomodando a leitura. Mesmo sendo um problema da gráfica, a responsabilidade é de quem assina pelo jornal. É importante estar atento aos detalhes. São eles que enaltecem ou diminuem um trabalho. Mas tudo é aprendizado e o semestre está apenas começando.
antônia Souza Faxineira 45 anos
“Eu acho bom, a equipe é boa, as pessoas são boas, nunca tive nenhum problema com a empresa.” Na edição 355 do Campus, de janeiro de 2011, a reportagem Pontos para a inclusão, de Letícia Correia e Nathália Koslyk, tratava do lançamento do livro Revelando autores em Braille, primeiro feito por deficientes visuais de Brasília. A obra foi desenvolvida em parceria com a Biblioteca Braille Dorina Nowill, em Taguatinga. Nesta edição, o Campus destaca a situação da biblioteca, que hoje ameaça fechar as portas por falta de segurança.
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Funcionário da manutenção 52 anos
“Chego aqui às 8h e saio às 17h. Não tenho nada a reclamar da empresa, apesar de não termos recebido o reajuste, que foi aprovado em janeiro.”
Francisco Silva
EXPEdiENTE Editora-chefe: Bárbara Cruz Secretário de redação: Vitor Pantoja Editores: Gabriel aragão, Luiza antonelli e Wenderson oliveira Repórteres: Giselle Cintra, igor Nogueira, Lydia assad, maria Paula abreu e marja Gomes Diretor de arte e foto: matheus Bastos Fotógrafo: José artur Lautert
Bernardo Silva
amanda Venício, anna Luiza Felix, Bárbara Cruz, Bianca marinho, Luiza antonelli, maria Paula abreu, matheus Bastos, Wenderson oliveira Monitoras: Juliana Perissé e Bruna Lima Professores: ana Carolina Kalume e Solano Nascimento Jornalista: José Luiz da Silva Colorprint
maquinista 49 anos
Jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação da
Universidade de Brasília
“Eu gosto de trabalhar aqui. É muito trabalho, é muita sujeira, mas a gente tá aqui pra trabalhar, né? A gente faz o que pode.”
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maRKeTiNG e PoLíTiCa
PADRONIZAÇÃO DOS LOGOS IGOR NOGUEIRA
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empre que ocorre uma mudança de gestão à frente do Governo do Distrito Federal (GDF), uma nova identidade visual é criada. Isso quer dizer que um novo conjunto de cores e símbolos passa a representar o GDF nos mais variados meios. Seja em um papel timbrado ou em anúncios publicitários veiculados na imprensa. Geralmente, esses novos símbolos incorporados à identidade visual do governo possuem relação com a campanha eleitoral do candidato vencedor. Diante dos pedidos constantes para que as mudanças e gastos parassem de ocorrer, o deputado distrital Prof. Reginaldo Veras (PDT) encaminhou para apreciação da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) um projeto de lei que impede as gestões do GDF de criar novos símbolos e cores para representar o governo. Segundo o deputado, utilizar as cores da campanha eleitoral em símbolos oficiais é prejudicial ao princípio de impessoalidade. Ele argumenta
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que no período eleitoral as marcas do governo são proibidas de serem utilizadas, o que caracterizaria a existência de promoções políticas e pessoais dos governantes-candidatos incorporadas à identidade visual. “Tudo isso tem um custo gigantesco com retorno zero na eficiência administrativa e na função social. Logo, é jogar dinheiro público fora.” O projeto foi aprovado no plenário da CLDF por unanimidade e aguarda veto ou sanção do governador Rodrigo Rollemberg (PSB). A proposta, no entanto, não prevê que as empresas públicas possuam as mesmas regras para modificação de identidade visual. Isto porque, de acordo com o autor do PL, as empresas estão inseridas em uma lógica de mercado e precisam estar atualizadas. “Diferentemente do GDF, elas possuem concorrentes”, afirma. Atualmente a logomarca do governo do Distrito Federal leva o centro da bandeira de Brasília. O conceito “Governo de Brasília” substitui Governo
DIVULGAÇÃO/ANNA CLÉA MADURO
Reginaldo Veras (PDT) propôs projeto de lei para padronização das logomarcas do governo.
do Distrito Federal na identidade visual. A logo do governo anterior já foi removida de todos os carros oficiais, ônibus coletivos, placas e documentos, ficando apenas a inscrição GDF em preto, sem qualquer imagem relacionada à tipografia.
Ao contrário dos símbolos de Estado, que são instituídos por lei e inalteráveis, os símbolos do governo não são perpétuos e costumavam mudar sempre que uma nova gestão assume o governo. Se a nova lei for sancionada, no DF isso não vai mais ocorrer.
HISTÓRICO DE MUDANÇAS Conheça as logomarcas usadas por governadores do DF desde a década de 1990 Cristovam Buarque (1995-1998) – o hoje senador pelo PDT governou o DF quando era do PT. A marca do governo levava a estátua dos dois candangos em branco, dentro de um círculo vermelho, cor historicamente usada pelo Partido dos Trabalhadores
Joaquim Roriz (1999-2006) – o político do PRTB foi eleito para dois mandatos pelo PMDB. Sua logomarca exibia uma das mais importantes obras do político: a ponte Juscelino Kubitschek. Nas cores, destaca-se o azul, cor usada por Roriz para se contrapor ao vermelho do PT.
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José Roberto Arruda (2007-2010) - atualmente no PR, foi governador eleito pelo DEM). A cor predominante na identidade visual de sua campanha eleitoral era o verde, que acabou migrando para a nova logomarca do governo. O símbolo com uma estrutura do Palácio da Alvorada estilizada foi usado na campanha e também na logomarca. Agnelo Queiroz (2011-2014) – o petista surpreendeu com uma logomarca colorida, que não trazia símbolos de Brasília, como era costume. Eram três pessoas de mãos dadas, em cores distintas, sem ligação conhecida com o partido ou a campanha de Agnelo.
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SaTÉLiTeS
CEILÂNDIA VISTA PO D
GISELLE CINTRA
ois profissionais da área de comunicação, um publicitário e um jornalista, trabalhavam juntos numa administração regional do Distrito Federal. Saíram de lá e decidiram montar o seu próprio negócio, atuando de forma independente. A história parece normal, no entanto, diferentemente do que fazem grandes empresas de comunicação, Leonardo Barros e Rodrigo Almeida não pensaram em construir um negócio no centro da capital. Em Ceilândia, a cerca de 30 quilômetros do Plano Piloto, os jovens criaram em 2014 uma agência de publicidade e propaganda, começando assim um grupo de mídia comunitária – o Gênios Comunicação - que hoje inclui um jornal, uma agência de notícias e uma TV. Os dois sócios resolveram investir o que lucravam com a agência em veículos de comunicação criados por eles mesmos. Com o apoio de patrocinadores e empresários, foi concebido o jornal Tribuna de Ceilândia. Sua primeira edição foi impressa em março deste ano com uma tiragem de 10 mil exemplares, distribuídos gratuitamente em toda a região. A segunda edição do jornal sairá com 20 mil exemplares e a pretensão é aumentar o número a cada publicação.
Os conteúdos são feitos por uma equipe formada por sete funcionários, quatro estagiários e diversos colaboradores que se revezam durante a semana. Essa mesma equipe também cuida da menina dos olhos da dupla, que se chama TV Ceilândia, o embrião de uma televisão na internet voltada especialmente para a região. Ela iria ser lançada entre maio e junho deste ano, mas Almeida e Barros não puderam esperar e colocaram algumas ideias em prática. Assim, no começo de março, criaram uma página no Facebook que, com o uso do Youtube, mostra os primeiros vídeos produzidos pelo grupo. Em cinco dias, mais de mil pessoas curtiram a fanpage. Depois, a dupla começou a receber visitas de autoridades, moradores, estudantes e profissionais de comunicação interessados em participar do projeto. O público já pode acessar no Facebook o conteúdo da TV Ceilândia. A equipe realizou a cobertura do aniversário de 44 anos da cidade e também o Miss Ceilândia 2015. Existe na página também, uma entrevista com o governador Rodrigo Rollemberg e o apresentador Henrique Chaves, do programa Balanço Geral, que falam sobre a iniciativa da criação da TV. Com entusiasmo, Almeida fala JOSÉ ARTUR LAUTERT
Os criadores da TV Ceilândia Leonardo Barros e Rodrigo Almeida no escritório da Agência Gênios.
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que estão abrindo espaço a todos que quiserem ser voluntários: “Sem exceção, estamos tanto dando oportunidade para os universitários poderem estagiar, quanto abrindo a porta para os profissionais que quiserem participar, como colaboradores e parceiros”. A ideia é ter uma programação com esporte, cultura, desenvolvimento social, economia, cobertura policial, hu-
“As demandas dos moradores vêm aumentando, daí a necessidade de produzir mais conteúdo” mor, automobilismo e música. Para fazer a TV, a dupla está observando potenciais colaboradores. Nessa busca encontraram os criadores do Ceilândia Muita Treta, uma página no Facebook que trata com humor, usando montagens de fotos e vídeos, acontecimentos e notícias da cidade. “Quando decidimos zoar com os problemas, cobramos também melhorias, com isso a Administração toma providências”, explica Naldo Lopes, um dos criadores da página. Ele e os amigos Rafael Melo e Michael Israel aceitaram colaborar com a TV Ceilândia. “Vamos entrar com quadro de humor estilo CQC, só que somos melhores”, brinca Naldo, fazendo referência ao programa Custe o que Custar da Rede Bandeirantes. Barros conta que outros programas já estão acertados. Segundo ele, o humorista ceilandense Bororó irá apresentar o programa Risos & Risadas. Haverá também, o Made in Ceilândia que vai falar de pessoas que produzem artesanato e exportam produtos para outras cidades e até mesmo outros países. Já o Para onde eu vou? irá mostrar locais dentro da cidade que os moradores pouco conhecem e podem visitar. Os parceiros da TV vão cobrir notícias e eventos sobre a região. Segun-
do Almeida, os programas vão mostrar acontecimentos nos condomínios Pôr de Sol e Sol Nascente, esta última considerada a maior favela da América Latina. Farão também a cobertura da Festa dos Padroeiros, tradicional celebração religiosa promovida em Ceilândia, e vão abordar notícias de conteúdo policial, econômico, cultural e humorístico na cidade. Além da TV, a Agência Ceilândia de Notícias também está no Facebook. É um espaço aberto para contribuições de moradores e profissionais da comunicação que mostra o que está sendo reportado pela grande mídia sobre a região. Acaba servindo também a jornalistas e outras pessoas que querem mostrar o seu trabalho. “Temos certeza que vamos descobrir muitos talentos através da agência. É uma coisa para a cidade”, afirma Almeida. Apesar de ter 600 mil habitantes e ter a maior população de uma reJOSÉ ARTUR LAUTERT
Os estagiários Clebia Fogaça, Christopher Braz e Bené Alves se preparam para a gravação do dia.
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POR OUTRO OLHAR JOSÉ ARTUR LAUTERT
Durante a manhã de um sábado, a TV Ceilândia acompanha a reunião de um grupo de moradores
gião administrativa do DF, Ceilândia assistiu ao fechamento de veículos de comunicação por falta de patrocínio. O Jornal de Ceilândia, periódico fundado em 1999, parou de circular no ano passado. Segundo Everaldo Souto, responsável pelo jornal, é muito difícil de se manter um negócio sem apoio de empresários ou do governo. Um dos sobreviventes é O Diário de Ceilândia. Criado em 2010, tem sua versão apenas na internet e é atualizado diariamente com notícias sobre a cidade. O jornal tem enfrentado os mesmos problemas que um veículo independente, a falta de recursos. “A maior dificuldade é a falta de recurso material e pessoal, as demandas dos moradores vêm aumentando, com isso a necessidade de produzir mais conteúdo também, e muitas vezes ficamos de mãos atadas”, conta Douglas Protázio, responsável pelo jornal. Para Almeida, uma das principais dificuldades enfrentadas é em relação ao custo de equipamentos, pois muitos materiais de uso profissional, como câmera fotográfica e microfones, custam caro. Com isso, a equipe tem que se articular para conseguir trabalhar com a escassez de materiais. Para garantirem recursos para o Grupo Gênios Comu-
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nicação, Almeida e Barros pretendem buscar, além dos anunciantes, ajuda governamental por meio de programas de incentivo à mídia comunitária. O professor e coordenador do Programa Comunicação Comunitária da UnB, Fernando Oliveira Paulino, explica que existem estratégias governamentais para incentivar a sustentação e o funcionamento dessas mídias. “Há países que desenvolveram fundos de mídia comunitária. Existem também editais para fazer chamadas e conseguir distribuir recursos para alcançar essa sustentabilidade das mídias. Isso pode ser uma saída, desde que pautados em critérios objetivos para evitar que os recursos públicos sejam destinados de uma maneira aleatória. Uma outra possibilidade é a parceria entre mídia comunitária e a mídia pública”, afirma Paulino. A população recebeu bem a TV Ceilândia. “A iniciativa da criação foi muito boa, até mesmo para serem divulgadas as coisas que há aqui, porque a mídia de fora só mostra o que não é bom”, diz Tchesco Santos. que tem 48 anos e mora na cidade há 12. O teólogo e ex-conselheiro tutelar Domingos Francisco chegou à cidade um ano após a fundação de Ceilândia e valoriza
a criação de uma mídia local. Para ele, a presença de meios de comunicação na comunidade levará moradores a discernirem melhor as notícias. “Ceilândia tem cultura, história e, acima de tudo, tem raízes. A TV vai nos beneficiar porque ela vai retratar e expressar aquilo que a comunidade local precisa falar.” O jornalista Rodrigo Almeida reforça: “O que mais me motiva a continuar são duas coisas, a primeira é o amor pela cidade. Ela tem suas peculiaridades, e as pessoas que nascem aqui crescem com muita dificuldade, mas correm atrás daquilo que sonham. O outro motivo foi a necessidade de se ter veículos de comunicação. A gente fica feliz pelo retorno que estamos recebendo, pois até pessoas de fora de Ceilândia estão acreditando no projeto”. UMA HORA COM A EQUIPE O Campus acompanhou o trabalho de uma equipe da TV Ceilândia na manhã de 10 de março. Primeiro, os estagiários Christopher Braz, Clebia Fogaça e Bené Alves se reuniram no escritório do Gênios e conversaram animados sobre o evento que iriam cobrir, uma reunião de um grupo de moradores da Frente Pacificadora de Ceilândia. Dali foram para a casa onde o encontro estava ocorrendo. Chamados por moradores de ‘os meninos da TV’, os três foram muito bem recebidos e atraíram curiosos. Conversaram com moradores e uma parlamentar que estavam na reunião e gravaram entrevistas. O tempo ia passando e a quantidade de pessoas, diminuindo. Após o término do encontro, faltava à repórter Clebia finalizar a matéria, gravando um texto. No entanto, o vento forte foi um obstáculo inesperado. Depois de risadas provocadas pelo cabelo no rosto de Clebia, que impedia a gravação, o grupo voltou para o escritório para editar o material e colocálo na internet.
NO CINEMA DIVULGAÇÃO
O filme Branco Sai, Preto Fica, lançado em 2014, retrata o dia a dia de dois homens de Ceilândia, um paraplégico e outro com uma perna amputada. O diretor e roteirista Adirley Queirós investe em uma história fantasiosa para preencher a narrativa documental. O nome do filme partiu de um fato que aconteceu em 1986 em um baile de black music em Ceilândia. Policiais chegam ao local e um deles grita “branco sai, preto fica”, culminando em um tiroteio sangrento. A história verídica é resgatada em cenas ficcionais, nas quais um terceiro personagem chega do ano de 2073 para recolher provas contra o Estado. O longa-metragem venceu 11 prêmios no Festival de Brasília de 2014, entre eles o de melhor filme, e foi selecionado por vários festivais internacionais.
ACESSE TV CEILÂNDIA JORNAL TRIBUNA DE CEILÂNDIA AGÊNCIA CEILÂNDIA DE NOTÍCIAS
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iNCLUSÃo
MARJA GOMES
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Biblioteca Braille Dorina Nowill é referência para o ensino especial no Brasil. Ela é a única pública do Distrito Federal que possui obras voltadas para o atendimento de deficientes visuais. Depois de 20 anos de existência, ela corre o risco de fechar por falta de segurança. A biblioteca funcionava na Escola Classe 06 de Taguatinga e, em 2006, recebeu autorização da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEDF) para operar no Centro Cultural Teatro da Praça, próximo à Praça do Relógio, em Taguatinga. Essa mudança ampliou o acesso aos frequentadores e acompanhantes, mas trouxe problemas: usuários de drogas e menores infratores estão constantemente próximos ao local. São mais de 90 deficientes visuais atendidos mensalmente, além de visitantes eventuais. Eles contam com empréstimo de livros, orientação em pesquisas e projetos literários, aulas de informática, alfabetização Braille, oficinas educacionais, eventos culturais e contação de histórias. A biblioteca possui um acervo de mais de dois mil volumes de livros e 650 audiolivros. Valdecy Brandão, 53 anos, é deficiente visual e há dez anos participa de atividades, como dança, canto e infor-
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mática. Ela diz que isso proporciona melhora na autoestima. “A biblioteca é um apoio, uma referência. Nós aprendemos coisas que fazem bem para o corpo, alma e coração”, conta. Prêmios expostos na parede mostram a importância do trabalho realizado na integração de deficientes visuais na sociedade. Entretanto, a biblioteca não conta com um termo de convênio com a Administração de Taguatinga. Consequentemente, o local existe de fato, mas não de direito. Pela falta de regularização, ela deixa de receber benefícios concedidos às bibliotecas públicas do DF. Algum dos problemas enfrentados são a falta assistência para a manutenção de equipamentos e instalações e vigilantes que garantam a segurança do local, que já foi, por várias vezes, invadido e depredado por criminosos. Além da falta de recursos para despesas básicas como internet, que é paga pelos próprios funcionários. Para que a situação seja resolvida, é necessário assinatura do Termo de Compromisso, pelas Secretarias de Educação e Cultura do Distrito Federal e pela Administração Regional de Taguatinga. As responsabilidades seriam divididas da seguinte forma: a SecreJOSÉ ARTUR LAUTERT
“A leitura em Braille é o resgate da cidadania”, diz Dinorá Couto, fundadora da biblioteca.
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taria de Educação disponibilizaria infraestrutura adequada aos usuários e professores capacitados para o ensino do Braille; caberia à Secretaria de Cultura ampliar o acervo da biblioteca e a realizar atividades culturais no local; e à Administração de Taguatinga segurança, limpeza e manutenção das instalações do local. A cada mudança de governo um novo termo é proposto e, até agora, nenhum foi assinado. De acordo com a Administração de Taguatinga, o termo deve passar, primeiramente, pela SEDF, proprietária do local. Atualmente, a Secretaria de Educação já fornece professores, funcionários de limpeza e pagamento de despesas como água e luz, porém ainda não há segurança para os usuários. Fundadora da biblioteca, Dinorá Couto, 61 anos, diz que providencias devem ser tomadas urgentemente. “Nós temos que resguardar a vida de quem não pode se defender. Eu não gostaria de mudar. O local é bom e nós chegamos a um ponto em que a biblioteca não pode andar para trás. Temos que seguir em frente e ampliar os serviços, mas dessa forma não há garantias de que podemos continuar.” Segundo ela, funcionários já foram surpreendidos por criminosos e roubados em pleno horário de trabalho.
A fundadora precisou trancar portas e aguardar a chegada do vigilante da biblioteca vizinha, a Biblioteca Pública de Taguatinga, para garantir a segurança de quem estava no local. Os usuários lamentam. Francisco de Paula, 67 anos, é deficiente visual e frequenta a biblioteca há mais de dez anos. “Aqui, eu aprendi a ler o Braille e escrever pelo computador. Hoje sou poeta e escritor. Se fecharem, não teremos mais quem nos ajude a ampliar nossos horizontes e mostrar que somos capazes de fazer muitas coisas.” Para a professora de ensino especial Ligia Marino, 52 anos, a situação é insustentável. Ela acredita que o fechamento da biblioteca representa um atraso na luta pela igualdade de direitos dos deficientes visuais. “Essas pessoas já têm a vida limitada, são poucos os recursos que garantem a cidadania e o acesso à informação. Além do espaço de estudo, existe a oportunidade de convivência e poucos lugares prestam esse serviço.” Segundo a Secretaria de Educação, o último requerimento, apresentado em março deste ano, segue em tramitação no tempo regulamentar, mas não há previsão de data para a assinatura. Enquanto isso, a biblioteca permanece em funcionamento pelo esforço pessoal de sua equipe.
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CoNSTRUÇÃo
OBRAS SEM FUTURO LYDIA ASSAD
O
número de obras públicas paradas no Distrito Federal já chega a 20. A reforma da Rodoviária do Plano Piloto, por exemplo, está paralizada desde dezembro de 2014. O maior terminal de passageiros de Brasília, onde trafegam cerca de 700 mil pessoas por dia, segundo dados da Novacap, contava na obra de reforma, até novembro de 2014, com cerca de 200 trabalhadores. Hoje, a obra tem menos de 20 funcionários, responsáveis pela diminuição de perdas causadas pela paralisação da obra. O engenheiro Jair Rodrigues, dono da empresa Técnica Construções, responsável pela reforma da Rodoviária, afirma que quando a obra for retomada, os prazos precisarão ser reavaliados. “Para terminar a obra a tempo, precisaremos de, pelo menos, mais dois anos com 120 funcionários no canteiro, trabalhando diariamente”, afirma o empresário. A realidade assusta trabalhadores. “Os chefes aqui já não sabem mais o que fazer. Um monte de gente já foi mandada embora na obra”, conta Marcos Oliveira, um dos funcionários que ainda está trabalhando na construção. “Está tudo parado há muito tempo, e a gente tem medo de sair também.” Jair Rodrigues conta que está sem receber desde setembro. “Paramos a obra em janeiro porque não estávamos recebendo mais dinheiro do Governo do Distrito Federal (GDF). Já tiramos mais de 80% dos funcionários da obra porque é impossível manter a reforma sem pagamento.” Ele afirma que menos de 10% dos reparos que estão previstos no projeto aprovado pela Novacap foram executados. Segundo presidente do Sindicato da Construção Civil do Distrito Federal (Sinduscon-DF), Luis Carlos Botelho, a maioria das obras está parada por falta de verba do governo e dificuldade que as empresas têm tido para obter o reconhecimento de débitos junto ao GDF. A grande maioria dos contratos firmados não podem ser executados
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LYDIA ASSAD
que o GDF deve hoje cerca de R$160 milhões às construtoras. O impacto da falta desse dinheiro atinge diretamente os trabalhadores do setor. Empresas com contratos de construções e manutenção com o GDF, são pequenas e médias que não têm estrutura para passar por uma crise e acabam demitindo funcionários por não conseguirem pagar as folhas de pagamento. Até março deste ano, foram demitidos 9.889 trabalhadores do setor, segundo dados do Sindicato dos Trabalhadores Indústria da Construção Civil e Mobiliário de Brasília. Em sua maioria, esse contingente é representado por trabalhadores que prestavam serviço nas obras do DF.
obras será necessário dois anos com 120 trabalhadores no canteiro”, diz Jair Rodrigues.
porque as empresas não têm dinheiro para manter os funcionários e para comprar materiais de construção. A diretoria de edificações da Novacap, setor da empresa responsável por algumas das obras do GDF, apresentou documentos que mostraram que apenas as obras do Complexo Cultural de Samambaia e as contempladas nos contratos de manutenção dos elevadores e escadas rolantes do Hospital de Base já voltaram a ser feitas. Quanto
às obras da diretoria de Urbanização do órgão, foi divulgado pela assessoria que apenas as operações de tapa buraco estão sendo executadas. Além dessas, obras como a dos Albergues, da reforma do estádio Nilson Nelson, da escola Porto Rico e das pistas de skate nas Regiões Administrativas estão estagnadas desde novembro do ano passado. A Associação Brasiliense de Construtores (Asbraco) afirmou em nota LYDIA ASSAD
Os poucos funcionários que continuam na obra da Praça Sul, em frente ao Conic, trabalham na manutenção do que já foi feito, para diminuir as perdas da estagnação.
DECLÍNIO DO SETOR Funcionários demitidos, 200 obras paradas e 50 empresas com falência decretada revelam o mal momento da indústria da Construção Civil do Distrito Federal. Muitas empresas ainda se deparam com a burocracia para conseguir o reconhecimento dos débitos por parte do GDF. Segundo assessoria do Sinduscon, a tendência é que esses números aumentem muito ainda em 2015. “Não temos como prever como será o ano, mas sabemos que será de muita dificuldade. Não há previsão nenhuma de melhora para o setor”, afirma o presidente do Sinduscon-DF, Luis Botelho. O desempenho econômico brasileiro caminha atrelado à realidade da Construção Civil. De acordo com dados divulgados pela Câmara Brasileira da Construção Civil (CBIC), a queda estimada da indústria da Construção para o ano de 2015 será de no mínimo 5%. O corte previsto no número de funcionários será de mais de 300 mil postos em todo o país. Luis Botelho é enfático na previsão. “É realístico pensar em profundas pioras para o setor para os próximos três meses. Não há um aporte de mudanças que tragam a possibilidade de qualquer que seja a melhora.”
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PaTRimÔNio
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ACERVO FUNDAÇÃO ATHOS BULCÃO
LEGADO E PRESERVAÇÃO
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MARIA PAULA ABREU
aléria Cabral pergunta para o mestre de obras: “Quem é o pedreiro mais criativo aqui?”. Ela visita uma casa que irá receber um painel de azulejos de Athos Bulcão. Em seguida, a produtora cultural, que é responsável pela preservação e manutenção das obras do artista, comunica as regras de montagem para o funcionário, dá a liberdade para que pense junto com ela a disposição das cores e formas no painel. Exatamente como Athos fazia quando ainda ia visitar as obras que iriam receber seus notáveis azulejos. Antiga amiga do pioneiro cujas criações marcam a arquitetura de Brasília, Valéria Cabral é a atual secretária executiva da Fundação Athos Bulcão. Matemática de formação, o relacionamento com os números foi breve. Já com as artes data desde a infância. BÁRBARA CRUZ
Valéria fala sobre os serviços prestados pela Fundação e sobre sua amizade com Athos.
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Criada na 308 sul, frequentou o antigo Teatro Galpão - espaço que revelou diversos atores e diretores na capital. Aos 15 anos já trabalhava com a memorável atriz Dulcina de Morais, ajudou a angariar fundos para o que hoje é a Faculdade de Artes Dulcina de Morais em Brasília. Desde então seu ativismo cultural se manteve e hoje se mostra na conservação das obras de seu simbólico professor Athos. MANTER VIVA A OBRA A vastidão de obras do artista na cidade é comprovada com um breve passeio pelos principais pontos turísticos de Brasília. Além destas, que estão presentes em espaços públicos, há as obras em residências particulares. O Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional (IPHAN) catalogou todas as obras presentes no DF. A Fundação tem ciência de outras fora da capital, mas Athos trabalhou tantos anos antes do órgão existir que algumas ainda estão sendo descobertas. Assim como aconteceu com um painel assinado instalado na Avenida Vieira Souto, no Rio de Janeiro, que recentemente a Fundação se certificou da veracidade e adicionou ao conjunto de criações do artista. Valéria acredita que nem Bulcão mantinha um registro com todas as peças produzidas instaladas Brasil a fora. Ocasionalmente é necessário restaurar um azulejo ou outro, seja por conta do desgaste do tempo ou por incidentes que acabam por causar algum dano. Também é necessário estar atento às intervenções ou adulterações não permitidas. É importante ter ciência que os frutos do artista são vastos e todo cuidado é pouco. Tais características levam a guardiã a contar com ajuda de olheiros que informam da
necessidade de manutenção em algum local. Não são olheiros oficiais, são admiradores do trabalho do artista, muitas vezes desconhecidos, que enviam à Fundação fotos e mensagens sobre os trabalhos com os quais se deparam por onde passam. Foi através de uma dessas mensagens que Valéria viu que um famoso restaurante em São Paulo havia coberto metade da obra de Athos com um balcão para dar suporte a uma feira. “Uma coisa que não é para ser”, disse. “Pedimos gentilmente para que retirassem a feira dalí, o que foi feito”. Há uma série de acordos realizados antes da instalação de um painel de Bulcão que devem ser cumpridos pelo local ou pessoa que encomenda um trabalho dele, como por exemplo não interferir na imagem da obra com nenhum objeto fixo ou cortar os azulejos, já que é uma obra de arte. Em outro caso, Valéria conta, a intenção foi preservar a obra, mas a realização foi desjeitosa. Para evitar atritos de um certo carrinho de café ou qualquer outra coisa que pudesse entrar em choque com o azulejo e quebrar, o Quartel General do Exército aqui na capital instalou uma fina barra de metal para proteger o painel do artista instalado num auditório em que recebe palestras e uma série de outros eventos. Além disso, a barra foi parafusada no próprio azulejo. Para alguém que cuida das criações como se fossem extensões do próprio amigo, aquilo foi um desastre. Felizmente, a equipe do quartel se mostrou aberta e disponível para reparar o erro. Afinal, os próprios militares afirmaram que a intenção foi de garantir a integridade da obra, mas que desconheciam que a ideia estava inadequada. Em geral, afirma o IPHAN, o fator
ACERVO FUNDAÇÃO ATHOS BULCÃO
Athos Bulcão instrui um funcionário criativo nas obras do Hospital Sarah.
que mais prejudica a conservação de patrimônios culturais é o desconhecimento. Não é usual encontrar pessoas que saibam o que há para ser preservado, nem como e por quê preservar. Valéria possui aparato legal para notificar órgão públicos ou privados caso a obra de Athos seja danificada, mas como ela diz, seria bem melhor se os responsáveis já cuidassem da maneira correta. Dentre as ações que culminaram inclusive no tombamento das obras do artista, Valéria também foi responsável por tornar a vida e obra de Athos bulcão conteúdo obrigatório no ensino fundamental no DF, contribuindo para uma próxima geração de adultos conhecedora da importância da preservação patrimonial artística.
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