Revista da
ESMAM Escola Superior da Magistratura do Maranhão
Edições São Luís, v.10, n.10, jan./dez. 2016
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
REVISTA DA ESCOLA SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO MARANHÃO
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Conselho desta possibilidade de atuação cidadã com Editorial vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Des. Paulo Sérgio Velten Pereira
Segue-se, na análise aDes. princípio doutrina e legislação, no tocante ao Cleonesde Carvalho Cunha polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados Des. Lourival de Jesus Serejo Sousa os deveres comunais da proteção do meio ambiente,Des. quem legitimidade José tem de Ribamar Castro para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Juiz1Manoel Matos de Araújo Chaves Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o Holídice Cantanhede Barros que é cidadania, ao trazer que oJuiz título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Bibliotecária Hervandy Garcez dispositivo ser tido como não recepcionado pelaCosta vigente ordem constitucional. Bibliotecária Joseane dos Santos entende, como Comungada com esse ponto de vista, a Cantanhede doutrina majoritária expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Pareceristas corresponder a um de fiscalizar. Dr. Alexandre Dartanhan de Melo Guerra, Pontifícia Universidade Paulo Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia,Católica de que existeSãouma Alexandre Reisnormativa Siqueira Freire, Universidade São Paulo relevanteDr. incongruência com Pontifícia toda análise estendidaCatólica de até aqui, visto que a CRFB/88, emDr. seuMarcelo bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado Benacchio, Pontifícia Universidade Católica de Sãopara Pauloprover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um Dr. Sérgio Victor Tamer, Centro de Estudos Constitucionais e de Gestãocomplexo Pública mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Dra. Edith Maria Barbosa, Universidade Federal do Maranhão frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido MSc. Isadora Moraes Diniz, Tribunal de Justiça do Maranhão de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o Dra. Gonçalves França, Universidade Federal do Maranhão mínimo existencialLucylea de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! MSc. Vilma Moraes Heluy, Universidade Federal do Maranhão
Dra. de Freitas, Universidade Federal do Maranhão Sendo aoAna fimTereza e aoSilva cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nosDr. dá,Walber dada Lins a impossibilidade clara de restrição do conceito de Pontes, Universidade Federal do Maranhão cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar Des. Paulo Sérgio Velten Pereira, Tribunal de Justiça do Maranhão de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
ISSN impresso 1809-7375 ISSN eletrônico 1809-7375 São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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5 AÇÃOTodos POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL os textos são de responsabilidade de seus respectivos autores.
Não restam dúvidas quantoOrganizadores ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Hervandy Costa Garcez dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora Manoelle Moraes dos Santos dos meios de produção, consumo e descarte, dianteJoseane do crescimento vertiginoso e multipolarizado Cantanhede dos Santos das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Revisão Gramatical desta possibilidade de atuação Adeilson cidadã com vistas à conservação do patrimônio de Abreu Marques ambiental brasileiro. Diagramação Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao Carlos Sales Alves polo ativo da demanda numa leitura daEduardo CRFB/88 observados os deveres comunais José quem Isaac Carvalho Costa Júnior para propor uma ação da proteção do meio ambiente, tem legitimidade popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Capa quando em sua extensão define o Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência “Oao Cocar amarelo” de Joel DuMara. Participou da 8ª. Edição do que é cidadania, trazer que o(2015), título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Esmam Cultural - Espaço de cultura e arte no Judiciário - com dispositivo seraProjeto tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. exposição individual “O traço disciforme”. Técnica: Acrílica sobre tela. Comungada com esse Dimensões: ponto de100x80cm. vista, a Acervo doutrina majoritária Artístico Esmam. entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, Impressão apenas haveria legitimidade genuína deTEXGRAF pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Correspondências para: Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma Escola Superior dacom Magistratura do Estado do Maranhão relevante incongruência normativa toda análise estendida até aqui, visto que a Rua Búzios, s/n Calhau /de São Luís -MA Cep: 65071-700 CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência ações positivas do Estado para prover, e-mail: bibliotecaesmam@tjma.jus.br dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Endereço frágil sustentar que a cidadania se resume àeletrônico: comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o https://revistaesmam.tjma.jus.br/index.php/esmam mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! A Revista da ESMAM divulga assuntos de interesse jurídico e acadêmico. Todos os artigos são de
Sendo ao fimdose respectivos ao cabo, tal sendo restrição aversa à diretriz o texto responsabilidade autores, resguardados os direitos autoraisque e a liberdade de pensamento. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não Revista é sinônima de/ Escola cidadania especialmente ao se tratar da ESMAM Superioreleitoral, da Magistratura do Estado Maranhão. - v.Uma 10, n. 10. (jan./dez. 2016) –como São Luís: de tutela de matériado2016. ambiental. constituição a ESMAM, nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos Publicada anualmente a partir de 2005. Disponivél no formato eletrônico e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seua bojo o partir do volume 10, número 10. reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares ISSN impresso 1809-7375 ISSN eletrônico 1809-7375
1.Direito Periódico 2.pleitear Jurisprudência – Periódico I. Escola 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte –legítima para a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Superior da Magistratura do Estado do Maranhão. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, CDDirpara 340 ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da Esmam
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO Cleones Carvalho Cunha Presidente Maria das Graças de Castro Duarte Mendes Vice- Presidente Anildes de Jesus B. Chaves Cruz Corregedora-Geral da Justiça ESCOLA SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO MARANHÃO Jamil de Miranda Gedeon Neto Diretor Paulo Sério Velten Pereira Vice-Diretor
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
APRESENTAÇÃO
Já dizia Paulo Freire que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou construção. Imbuída deste espírito é que a Escola Superior da Magistratura do Estado do Maranhão promove o lançamento da versão impressa da mais recente edição da Revista Esmam, de número 10. O presente número tem como nota de frescor e inovação o fato de que foi originariamente disponibilizado ao público na versão eletrônica, no Portal sito em https://revistaesmam.tjma.jus.br/index.php/esmam, alinhando a produção da Esmam ao formato dos grandes periódicos nacionais e internacionais por meio da adoção de sistema de editoração eletrônica. Afinal, antenada com as exigências deste mundo cada vez mais veloz e tecnológico, não poderíamos deixar de manter nossa Escola na vanguarda da oferta de ferramentas que contribuam com a difusão do conhecimento gerado, em especial, pelos protagonistas do desenvolvimento do Judiciário maranhense: nossos(as) magistrados(as) e servidores(as), além de outros autores locais e nacionais de destaque. O layout elegante e eficiente contido na versão eletrônica foi, na presente versão impressa, mantido, proporcionando uma leitura confortável a fim de permitir ao leitor um exímio momento de reflexão e aprendizagem. Os artigos e julgados aqui selecionados oferecem uma boa amostra da principal finalidade deste projeto: fortalecer o Poder Judiciário do Maranhão como fonte ativa e produtiva do mais alto conhecimento jurídico.
Os direitos e garantias constitucionais estão presentes nos artigos 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL “Assentamento rural como um instrumento de concretização do acesso à terra”, Não Santos restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular e eficaz de Leandro Carvalho; “Ação popular e a garantia de direto um meio ambiente da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas ecologicamente equilibrado: participação democrática defesa de um mínimo dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dosem meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado existencial”, de Alexsandro Rahbani Aragão Feijó, Lucylea Gonçalves França das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na e Pedro Nilson Moreira e “A eficácia da gestão participativa e democrática propositura da ação, para a Viana; ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio no âmbito municipal: o princípio da participação popular”, de Guilherme Henrique ambiental brasileiro. Madeira Sampaio. Segue-se, na análise a princípio doutrinaPenal, e legislação, noostocante No terreno do Direito Penal ede Processo trazemos artigosao “Crime polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais e Castigo: dano mínimo pelolegitimidade juízo criminal no propor sistemauma brasileiro”, da proteçãodadofixação meio do ambiente, quem tem para ação de popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Sonia Maria Amaral Fernandes Ribeiro; “A aplicação do princípio da cooperação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o no processo penal”, de José Figueiredo de de Almeida; e “A construção que é cidadania, ao trazer que oEulálio título eleitoral é a prova cidadania, devendo este dos dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. círculos restaurativos como mecanismo alternativo de resolução de conflitos no Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como âmbito dos Especiais Criminais”, de Luana Duarte Assunção Freitas. expresso na Juizados lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr.,de Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, Seguindo nos temas instigantes da contemporaneidade, apresentamos apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger os artigos “Eutanásia e a dignidade da pessoa humana”, de Ticiany Gedeon corresponder a um de fiscalizar. Maciel Palácio; “Marco civil da internet: uma análise da neutralidade da rede”, de Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma Rogério Monteles da Costa; e “Dez anosanálise do Conselho Nacional Justiça: relevante incongruência normativa com toda estendida até aqui,de visto que a breve CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, balanço das ações de accountability do CNJ nos Tribunais de Justiça Estaduais”, de dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo Francisco Soares Reis Júnior.de existência mínima de dignidade humana. É mote constitucional da garantia frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação no sentido A preocupação com a realidade local sedocumental, faz presente nos artigos de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o “Educação em direitos humanos: a experiência de formação cidadã de crianças e de mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! adolescentes na Vila Ildemar, Município de Açailândia/MA”, de Fabrício Oliveira Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto Gomes; “A estratégia aplicada em tempos declara crisede– restrição uma abordagem no Tribunal constitucional nos dá, dada a impossibilidade do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de Justiça do Maranhão”, de Rosimary Carneiro Sousa; e “A gestão dos resíduos de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em sólidos na construção civil de São Luís/MAexpande e os instrumentos normativos vigentes”, uma realidade comunitária e diversificada, os horizontes dos direitos edeconceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Jéssica Silva de Jesus e João Vitor Mendes de Oliveira. reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares A interdisciplinaridade com ramos do Direito mais afastados da realidade do cotidiano do Judiciário maranhense é contemplada pelos artigos “O poder da 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos última palavra: perspectiva da ciência política §ante o tribunal constitucional”, ao patrimônio da União,uma do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. de Kassia do Carmo Brito da Silva; e “O teletrabalho e o direito à desconexão”,
de Camila Barbosa Almeida Melo. Por fim, trata de responsabilidade civil o artigo “A violação do bem jurídico tempo nas relações de consumo e a aplicabilidade do instituto da responsabilidade civil”, de Ingrid Costa Melo de Sousa Sampaio. Mas como nem só de artigos vive uma Revista, o saber jurídico aqui é também compartilhado na forma de decisões judiciais brilhantemente elaboradas, como se vê das sentenças dos juízes estaduais Angelo Antonio Alencar dos Santos e Artur Gustavo Azevedo do Nascimento, e dos acórdãos dos desembargadores do Egrégio Tribunal de Justiça do Maranhão, Paulo Sérgio Velten Pereira e João Santana Sousa. Convidamos à leitura desta Edição, desejando que seja útil e prazerosa, ao mesmo tempo em que convocamos a todos a contribuírem com as suas próximas edições, cujas regras de submissão podem ser encontradas na Seção “Sobre” (Diretrizes para autores). Conselho Editorial
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
SUMÁRIO
D
O U
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I
N A
AÇÃO POPULAR E A GARANTIA DE UM MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO: PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA EM DEFESA DE UM MÍNIMO EXISTENCIAL__________________________19 Alexsandro Rahbani Aragão Feijó Lucylea Gonçalves França Pedro Nilson Moreira Viana ASSENTAMENTO RURAL COMO UM INSTRUMENTO DE CONCRETIZAÇÃO DO ACESSO À TERRA___________________________35 Leandro Santos Carvalho A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO NO PROCESSO PENAL____________________________________________47 José Eulálio Figueiredo de Almeida CRIME E CASTIGO: DA FIXAÇÃO DO DANO MÍNIMO PELO JUÍZO CRIMINAL NO SISTEMA BRASILEIRO_______________________________67 Sônia Maria Amaral Fernandes Ribeiro A CONSTRUÇÃO DOS CÍRCULOS RESTAURATIVOS COMO MECANISMO ALTERNATIVO DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS__________________________________81 Luana Duarte Assunção de Freitas DEZ ANOS DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA: BREVE BALANÇO DAS AÇÕES DE ACCOUNTABILITY DO CNJ NOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA ESTADUAIS (2005-2015)___________________________________________97 Francisco Soares Reis Júnior EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS: A EXPERIÊNCIA COMUNITÁRIA DE FORMAÇÃO CIDADÃ DE CRIANÇAS E DE ADOLESCENTES NA VILA ILDEMAR, MUNICÍPIO DE AÇAILÂNDIA/MA_______________________121 Fabrício Oliveira Gomes A EFICÁCIA DA GESTÃO PARTICIPATIVA E DEMOCRÁTICA NO ÂMBITO MUNICIPAL: O PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR____________141 Guilherme Henrique Madeira Sampaio
A ESTRATÉGIA APLICADA EM TEMPOS DE CRISE – UMA ABORDAGEM 5NO AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MARANHÃO_______________________163 Rosimary Carneiro Sousa Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular dos atosDA administrativos. Permanecem, contudo, certas EUTANÁSIA Eno Acontrole DIGNIDADE PESSOA HUMANA_________________175 dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, Ticiany Gedeon Maciel Palácio consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao SÓLIDOS meio ambiente, da legitimidade CIVIL do cidadão na A GESTÃO DOS RESÍDUOS NA CONSTRUÇÃO DE SÃO propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização LUIS/MA E OS INSTRUMENTOS NORMATIVOS VIGENTES____________199 desta Jéssicapossibilidade Silva de Jesusde atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental João Vitorbrasileiro. Mendes de Oliveira análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao MARCOSegue-se, CIVIL DAnaINTERNET:_____________________________________215 polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Uma análise da neutralidade da rede da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação Rogério Monteles da Costa popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP lei nº4.717/65) a contundência quando em suaDA extensão define o O PODER DA–ÚLTIMA PALAVRA: UMA PERSPECTIVA CIÊNCIA que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este POLÍTICA ANTE O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL___________________235 dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Kássia do Carmo Brito da Silva Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely O TELETRABALHO E O DIREITO À DESCONEXÃO___________________247 Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, Camila Barbosa Almeida Melo apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um fiscalizar. A VIOLAÇÃO DOdeBEM JURÍDICO TEMPO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO E A APLICABILIDADE DO INSTITUTO Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma DA RESPONSABILIDADE CIVIL___________________________________267 relevante incongruência normativa com Ingrid Costa Melo de Sousa Sampaio toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre S E muitos, N T oEmeio N ambiente Ç A como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Ação Civil Pública________________________________________________285 de que, quando o meio ambiente deprecia de forma consequencial o Ângelo Antôniolesionado, Alencar dos Santos mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Ação de Guarda__________________________________________________323 Sendo Azevedo ao fim edoaoNascimento cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto Artur Gustavo constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania A C ÓqueRnãoDé sinônima à O de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos Apelação Civil____________________________________________________331 ePaulo conceitos marginalizadores Sérgio Velten Pereira de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Habeas Corpus___________________________________________________342 João Santana Sousa 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio daPARA União, doPUBLICAÇÃO Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresNORMAS DE ARTIGO_________________________351 so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
D OU T RINA
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
AÇÃO POPULAR E A GARANTIA DE UM MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO: PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA EM DEFESA DE UM MÍNIMO EXISTENCIAL Alexsandro Rahbani Aragão Feijó*1 Lucylea Gonçalves França** 2 Pedro Nilson Moreira Viana***3
RESUMO Este estudo propõe-se a analisar as peculiaridades da Ação Popular em benefício de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, enquanto possibilidade direta e eficaz de atuação social, diante do crescimento exacerbado e difuso da degradação do plurais ecossistemas pátrios. Neste contexto, é discutida a evolução constitucional em torno dos direitos sociais bem como sua positivação na CRFB/88 sob o primado da participação popular na construção histórica de tais garantias. Vislumbra da mesma forma a dimensão do espectro que o meio ambiente ocupa no texto constitucional e seus desdobramentos bem como a questão da legitimidade dos cidadãos, lato sensu, para propositura e ocupação do pólo processual passivo, tomando por base as divergências da doutrina pátria. Trouxe, como constatação, a debilitação do instrumento de ação popular na proteção do meio ambiente em virtude de seu amplo desconhecimento social, óbice ao fim social do instrumento em tela. Dessa forma, pode-se, em linhas gerais, a partir da perspectiva de um viés analítico-qualitativo, pelo prisma do estudo doutrinário majoritário, apontar a necessidade imediata de maior conhecimento desta possibilidade de atuação cidadã localizada nos principios constitucionais da publicidade e publicização com vistas à conservação dos ricos patrimônios ambientais do Brasil. Palavras-chave: Ação Popular. Meio ambiente equilibrado. Controle social.
*. Mestre em Direito pela Universidade de Fortaleza. Professor Assistente da Universidade Federal do Maranhão. Professor Tutor Assistente do Programa de Educação Tutorial – PET/Direito. Procurador do Município de São Luís. Email: alexrahbani@gmail.com; **. Doutora em Direito pela Universidad de Salamanca, Espanha. Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco. Membro do Programa de Pós Graduação (mestrado) de Energia e Ambiente da Universidade Federal do Maranhão. Professora do curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão. Tutora do Programa de Educação Tutorial – PET/ Direito UFMA. Email: lucyfranca03@hotmail.com; ***. Acadêmico de Direito pela Universidade Federal do Maranhão. Pesquisador do Programa de Educação Tutorial – PET/ Direito. Estagiário Forense pelo Tribunal Regional Federal da 1º Região. Email: pedro.moreira.viana@hotmail.com.
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1 INTRODUÇÃO 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Em uma realidade desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, restam dúvidas quanto eaomultipolarizado caráter de controle direto e eficaz ao diante doNão crescimento vertiginoso daspopular agressões sistemáticas da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, biodiversificado ecossistema pátrio, cumpre papel fundamental desta análisecertas reconhecer dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, aconsumo existência de intrumentos capazes de assegurar, minimamente que seja, um meio e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado ambiente equilibrado, no qual todosambiente, sejam sujeitos partícipes do hábeis a restaurar e das agressões sistemáticas ao meio da legitimidade cidadão na proteger as da bio-riquezas nopolo sentido precípuo de quenaopublicização meio ambiente é propositura ação, para aapontando ocupação do passivo e, sobretudo, desta possibilidade atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio elemento mínimo ede indissociável à existência digna de todos indivíduos. A Evolução ambiental brasileiro. histórica do constitucionalismo propicia para a análise maneira pela qual os Estados gradativamente reconhecem os direitos fundamentais e, consequentemente, ascendem às Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao garantias indispensáveis, especialmente, trataremos dedeveres elementos inerentes ao polo ativosociais da demanda numa leitura da CRFB/88 por observados comunais mínimo existencial digno da vidaquem humana, qual invariavelmente, meioação ambiente da proteção do meio ambiente, tempelo legitimidade para propor ouma não poderia deixar de ser imanente. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o indiscutível Estado justiça temdevendo de encarareste a exclusão que é cidadania, ao trazer [...] queparece o título eleitoralque é aum prova de de cidadania, um déficit humano que o corrói. A marginalização social cria dispositivo ser tido comosocial nãocomo recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como marginalidades no direito. A exclusão social é também exclusão do direito expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, [...] (CANOTILHO, 1999, p. 43).Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuínacom de pleito quando o dada direito político de eleger É a partir desse momento, a inauguração pela CRFB/88, no Brasil, corresponder a um de fiscalizar. em seu caráter dirigente, que a participação popular é fenômeno chave na construção social do(s) de mínimofica existencial tendo em vistaque que,existe historicamente Semconceito(s) maiores obstinações, claro, permissa vaenia, uma condicionadas, as necessidades a com seremtoda positivadas são flúidas e inconstantes. relevante incongruência normativa análise estendida até aqui, visto que a Cabe nesse sentido, apreciar a importância no positivas novo sentido de cidadania como luta CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigênciatrazida de ações do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo social por meio da ação popular, instrumento motriz de operação dessas transformações mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. que É este em tela e, primordialmente, da defesa dos ecossistemas, buscando demonstrar frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido é instrumento processual sine qua non na defesa do mínimo existencial ecológico visto de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o seu caráter democraticamente pordoexcelência quejurídico. permite Todos! participação no poder mínimo existencial de todos osdireto sujeitos ordenamento pela atividade fiscalizatória, através de uma análise qualitativa, sob o prisma descritivo/ exploratório, essencialmente bibliográfica. Sendo ao fim e aoteórica cabo, etal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de se vislumbra o reconhecimento dado aoaomeio ambiente cidadaniaAssim que nãoque é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente se tratar ecologicamente equilibrado comoUma direito fundamental social na constituição de tutela de matéria ambiental. constituição como a nossa, pautada eme seus uma realidade comunitária diversificada, expande os horizontes dos direitos desdobramentos com a Lei deeação popular, cumpre estabelecer a incapacidade estrutural edoconceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seuabojo o Estado de proteger todo o vasto ecossistema nacional, abraçando assim participação reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares coletiva nessa atividade, e a permissão do combate a atos desmedidos e desproporcionais, que comprometam a integridade do ambiente por meio da Lei nº 4.717/65. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para ou a declaração de nulidade de atos lesivos e de Transformando-nos então, depleitear fato aeanulação de direito, em fiscais dos atos públicos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresterceiros, indispensáveis tutelaoudos direitos emquetela, restam dúvidas quanto ao caráter so em juízo, será feita com o título à eleitoral, com documento a elenão corresponda.
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direto e eficaz da ação popular no controle dos atos, não somente administrativos, bem como ecologicamente lesivos, restando contudo, compreender como esta se desenrola na busca por este desenvolvimento sustentável, a saber dos sujeitos ativos e passivos legitimados, bem como da necessidade de publicização da ação popular na efetividade da tutela ambiental. 2 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA CONSTITUCIONAL DOS ESTADOS MODERNOS ATÉ A PERSPECTIVA DOS DIREITOS SOCIAIS: ESCORÇO DE SUA DELIMITAÇÃO A ideia primitiva de “contrato invisível” que impelia o ente coletivo, seja para Hobbes na defesa de uma segurança irretratável, ou para Rousseau na garantia da isonomia e da liberdade materiais, diga-se de passagem, é o fenômeno motriz que deu causa e base para a construção do que conhecemos como Estado moderno. Foi a partir das grandes revoluções liberais burguesas resultantes das transformações sócio-culturais e de meios de produção do liberalismo econômico, ao longo dos séculos XII e XVIII, que esses documentos criacionais de novas ordenações puderam romper com modelos como o Feudalismo e o Absolutismo, incompatíveis com as novas necessidades históricas, propondo ao homem europeu a formalização da trilogia: Liberdade, Fraternidade e Igualdade. A superação formal dos privilégios nobiliárquicos e clericais de certos conservadores e estamentais, pelo caráter progressivo, impessoal e individualista do Liberalismo político e econômico da ordem capitalista, representou a vanguarda do que se entende por direitos de primeira dimensão. De toda sorte, aqui, as Constituições oitocentistas representavam um “salto epistemológico” ao propiciarem um novo horizonte político, jurídico e econômico, conduzindo os Estados Nacionais na preservação de direitos individuais. Contudo, esses documentos limitaram-se ao fim e ao cabo a meramente representar, na forma, anseios ainda difíceis de serem alcançados materialmente. A vida fática, durante o século XIX na Europa, estava bem distante das cargas principiológicas das constituições em virtude do elitismo que contornava as relações de produção. À época, grandes aglomerações urbanas albergavam em condições insalúbres as massas operárias que eram assoladas pelas infrutíferas jornadas de trabalho. Expuseram-se, a partir da segunda grande Revolução Industrial, o desemprego e as degradantes condições de vida desejantes de uma reestruturação dilateral. De certo modo, portanto, é cabível concluir que a luta pelos direitos sociais inscreveu-se no cotidiano e na prática de países que se orgulhavam de
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ostentar textos constitucionais garantidores da liberdade. [...] As conquistas
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL dos direitos sociais, em muitas de suas experiências, foram frutos das
lutas de homens e mulheres concretamente inseridos em suas realidades
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz históricas, a democratização da própria liberdade. da ação popular no controle dos atosvisando administrativos. Permanecem, contudo,(GONÇALVES, certas p. 56-57). dúvidas quando se trata 2015, em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Nessasistemáticas nova lógica, de diversas lutas operárias, o Estado das agressões ao por meiomeio ambiente, da legitimidade do cidadão na foi pressionado a não somente preservardo as polo situações jurídicas consolidadas e, ainda mais, a propositura da ação, para a ocupação passivo e, sobretudo, na publicização intervir positivamente relações jurídicas e materializá-las no campo fático desta possibilidade decriando atuaçãonovas cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. cotidiano dos sujeitos por meio de serviços públicos de saúde, educação e políticas de pleno emprego (GONÇALVES, 2015, p. 66). A exclusão social engendrada pelo mercado Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante aoàqueles suscitou equacionalmente a responsabilidade estatal em prover especialmente polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais que não faziam parte da engrenagem Dessarte, os poderes públicos da proteção do meio ambiente, quemcapitalista. tem legitimidade para propor uma ação foram trazidos por intermédio da assistência nova fase popular?aÉinterceder possível destacar textualmente logo nos social: artigosinaugurava-se iniciais da Lei uma de Ação 1 do direito(LAP constitucional, a social. Popular – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este indigentes formavampela um grupo à parte de cidadãos de segunda classe dispositivo ser tido comoOsnão recepcionado vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como que o privados dos direitos mais importantes da cidadania. Afirmava-se expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely status da indigência implicava ‘primeiro, a perda da reputação, a perda da Meirelles, que em sínteseliberdade correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, pessoal, e por fim, a perda da liberdade pessoal pela cassação apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger do direito de voto’. O indigente tem, na prática, um direito à Assistência, corresponder a um de fiscalizar. mas [...] ele não pode mover uma ação para assegurar sua assistência [...].
(MARSHALL,fica 1967, p. 20). Sem maiores obstinações, claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a materialização direitos de sociais meio do da Estado ação positiva do Estado CRFB/88,Aem seu bojo, traz dos a dirigência açõespor positivas para prover, na sociedade, pela luta na perspectiva da solidariedade, com reconhecimento dentre muitos,seo deu meio ambiente como elemento compositor de umo complexo mote constitucional da garantia de existência mínima dignidadesão humana. É antes precípuo que estes sujeitos partícipes ou não dos ciclos de produção sujeitos, frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de tudo, participantes da ordem estatal e, portanto, legítimos do dever de prestação do de que, desmistificando quando lesionado, o meio ambiente deAforma consequencial o Estado, a concepção do direitodeprecia privilégio. partir dos direitos de segunda mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! dimensão, o Estado pôde interferir nas relações com o mercado e nas suas consequências sobre a organização da sociedade, a tessitura solidariedade, perceber Sendo ao fim e ao cabo,provocando tal restrição aversa da à diretriz que o ao texto que para assegurar livre exercício dos direitos de primeira dimensão é mister assegurar constitucional nos odá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar capacidades materiais para integrar socialmente o indivíduo. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Semedireitos políticos, asexpande pessoas não ter confiança em seus direitos uma realidade comunitária diversificada, ospodem horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o sendo pessoais; mas sem direitos sociais, os direitos políticos continuarão reconhecimento da pessoaumhumana e não humana como titulares sonho inatingível, uma ficção inútil ou uma piada cruel para grande parte daqueles a quem eles foram concedidos pela letra da lei. Se os direitos sociais não forem assegurados, os pobres e indolentes não poderão exercer 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos direitos políticosdosque formalmente (BAUMAN, ao patrimônio da União, do Distrito os Federal, dos Estados, Municípios[...] § 3º possuem A prova da [...]. cidadania, para ingres-2007, p. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Buscaram, então as constituições dirigentes, superar o déficit de integração, “convocando” o legislador infraconstitucional a estruturar naqueles termos o complexo legal para a execução fiel da tarefa de prover e emponderar uma vida digna como o direito para todos, com mínimos sociais escolhidos pela participação popular, ensejando transformações nas estruturas sócio-econômicas. Algumas esmolas que se dão a um homem nu nas ruas não cumprem as obrigações do Estado, que deve a todos os cidadãos uma subsistência assegurada, a alimentação, um vestuário conveniente e um género de vida que não seja contrário à saúde [...]. (MONTESQUIEU, 1993, p. 460).
O papel fundamental das constituições que institucionalizam os direitos de assistência social no século XX é criar e controlar principalmente as condições em que se dão as prestações, propiciando ipso facto um espaço de luta (representada em peso pelos movimentos sindicais) pela participação dos rumos do Estado, germinação do que pode-se tratar de controle democrático e participação popular dos atos públicos. 3 PARTICIPAÇÃO POPULAR NA CRFB/88 E A CONCRETIZAÇÃO DA IDEIA GARANTISTA DE UM MÍNIMO EXISTENCIAL: COMO DIMENSIONÁ-LO À LUZ DAS NOVAS NECESSIDADES AMBIENTAIS? No Brasil, a partir de um referencial histórico de todas as suas constituições, é com o trabalho de 1988 que se pode falar, de fato, em direitos sociais pluri-dimensionais. Significa dizer que a CRFB/88 consegue de maneira clara e prolixa assentar elementos, especialmente quanto dos princípios, direitos e garantias fundamentais1, que “desenham” um standard sobre o qual o legislador infraconstitucional e todos os outros sujeitos partícipes do ordenamento jurídico devem se guiar para a consolidação da superação de entraves sociais históricos: um verdadeiro plano para ser praticado com objetivos da construção de uma sociedade livre, justa e solidária sem marginalizados. A CRFB reconhece a condição delicada que a sociedade brasileira se encontrava, e de balanço, salvas as devidas proporções – ainda se encontra, e parte com a institucionalização de várias garantias positivas pelas quais o Estado brasileiro materializa, oferecendo assim condições para que haja eficácia plena na aplicabilidade de muitos outros direitos. O mínimo existencial se refere então aos direitos relacionados 1. Art.3º Constituem objetivos fundamentais da República: construir uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais. Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se[...] a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
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às necessidades sem as quais não é possível “viver como pessoa”. Em uma sociedade 5como AÇÃO POPULAR COMOde MEIO DE TUTELA AMBIENTAL a nossa, pelas palavras DarcyDIFUSO Ribeiro(1995), fica clara a extensa tarefa a ser desenvolvida pelas futuras gerações. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Elas [as classes sociais no Brasil] configuram um losango com um ápice dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, finíssimo, pouquíssimas vertiginoso pessoas, e um epescoço, que vai alargando consumo e descarte, diante dodecrescimento multipolarizado daqueles que se integram da no sistema econômico como trabalhadores das agressões sistemáticas ao meio ambiente, legitimidade do cidadão na e como isso como um funil invertido, em que propositura da ação, para regulares a ocupação do consumidores. polo passivoTudo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã vistas àmarginalizada conservação do patrimônio está a maior parte com da população, da economia e da sociedade, ambiental brasileiro. que não consegue empregos regulares nem ganhar o salário mínimo. (RIBEIRO, 1995, p. 213).
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativoEsses da demanda leitura da CRFB/88 observados os deveres comunaissociais direitosnuma ocupam espaço irretratável que perpassa desde aspectos da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma e econômicos como o trabalho, salário mínimo, alimentação, vestimenta, ação educação, popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação repouso e despesas importantes, como água e luz, e até prismas culturais. A importância Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o de aventureira”, descamba à lição trazida Ricardo queseé defini-lo, cidadania,“obstinação ao trazer quetamanha o título eleitoral é a prova de cidadania, devendopor este Torres. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como O mínimo existencial não possuiHumberto dicção constitucional própria, devendo-se expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em sínteseprocurá-lo correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, na idéia de liberdade, nos princípios da igualdade, do devido apenas haveria legitimidade genuína quandonos o direito processo legal,de da pleito livre iniciativa, direitos político humanos,de naseleger imunidades e corresponder a um de fiscalizar. privilégios do cidadão. Carece de conteúdo específico, podendo abranger qualquer direito, ainda que não seja fundamental. (TORRES, 1999, p. 144). Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida aqui,mínima visto queque a cada Portanto, em linhas gerais, o mínimo existencial é a até parcela CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, pessoa viver, guardado peloelemento Estado pelas programações que deve dentre necessita muitos, opara meio ambiente como compositor de umpositivas complexo desenvolver para queda seja possíveldealcançá-las. historicamente condicionadas, mote constitucional garantia existência Contudo, mínima de dignidade humana. É as necessidades a serem positivadas são mutantes e nos documental, reveses das no relações frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação sentidosociais, de que,e quando lesionado, meiosentido, ambiente deprecia de forma da consequencial o fluidas inconstantes. Cabe,onesse apreciar a importância participação popular mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! no Estado democrático de direito, inaugurado no Brasil pela CRFB/88, na definição de tais necessidades e como a ação popular, no nosso contexto democrático – pelo controle Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto administrativo dos atos do Estado, contribui na clara promoção da defesa meio ambiente. constitucional nos dá, dada a impossibilidade de restrição do do conceito de A participação popular nesse sentido tem início na constituinte de 1987/1988 marcada cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar pelo desejo redemocratização de resgate das liberdades que propiciou de tutela dedematéria ambiental. eUma constituição como a individuais nossa, pautada em uma comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos canaisrealidade que pudessem assegurar maior participação e controle dos cidadãos, sobretudo, enas conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o instituições públicas. reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Diversos segmentos populares da sociedade brasileira se engajaram, a exemplo das organizações de bairros e comunidades eclesiais, que após décadas de “amordaçadas”, 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítimacomo para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos social conseguiram exercer a cidadania prática concreta de luta e transformação ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresque, por meio das audiências públicas e emendas populares, inovariam um sentido de so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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direito na constitucionalização de demandas históricas como as do trabalho, alimentação, lazer e educação. Os movimentos que, de repente [...] foram os mediadores dessa redefinição do espaço público e do espaço privado trouxeram a questão da esfera privada como uma questão política e de politização. Trouxeram a questão das carências que atingiam as populações pobres, as mulheres, os negros, enfim, a questão da politização da esfera privada [...]. (CARDOSO, 2008, p. 88).
A ação popular nesse panorama, embora tenha sido instituída nos termos da Lei nº 4.717/65 – no seio da Ditadura Militar, apresentou-se como instrumento prático para a proteção de certos direitos difusos enquanto factualmente tivesse eficácia mínima, visto os muitos entraves políticos e conjunturais cediços da época. Fica claro que os movimentos populares engajados desde o processo constituinte no Brasil inauguraram a cidadania no sentido de luta e revolução social. Pode-se assim assentar que a constituinte “plantou” a semente do controle popular dos atos públicos2, trazendo aos sujeitos o sentido de participação da construção social, essencial para o desenvolvimento e eficácia do instrumento da ação popular numa roupagem democrática. De toda sorte, cabe hodiernamente a questão: em virtude das necessidades e do mínimo existencial serem historicamente condicionados, na lógica de uma sociedade globalizada não somente no sentido financeiro-econômico, mas primordialmente sócio-ambiental, é o meio ambiente um elemento a ser tido como mínimo, fundamental, do ponto de vista jurídico? 4 NECESSIDADE DA GARANTIA DE UM MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO COMO DIREITO FUNDAMENTAL SOCIAL: SEU ESPECTRO NA CRFB/88 Apresentado no título oitavo da CRFB/88, o meio ambiente e, entre diversas outras garantias sociais como a seguridade social, a saúde, a assistência, a educação, cultura, um capítulo reservado no qual é trazido, em linhas gerais, o reconhecimento formal da necessidade de manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado como assentado na inteligência jurisprudencial do TJSP em sede de apelação (Nº 035818898.2009.8.26.) que, em linhas gerais, assenta a imediata aplicação das reservas legais em propriedades rurais com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais destes imóveis, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos 2. O controle é necessário para possibilitar a verificação da regularidade da atuação da administração por parte dos administrados, impedindo a prática de atos ilegítimos, lesivos tanto ao indivíduo como à coletividade, e que também seja possível a reparação de tais danos, já que a administração atua visando o interesse público.
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ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção 5deAÇÃO POPULAR MEIO DIFUSO um DEmínimo TUTELA AMBIENTAL fauna silvestre e da COMO flora nativa que garantem ecológico na exploração da terra. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. contudo, certas Superadas as celeumas ideológicas em tornoPermanecem, do assunto, que é bem controverso, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, aconsumo solução para o impasse está claramente definida no texto constitucional, que muito e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado facilita o trabalho do legislador sendo capaz de orientar com excelência das agressões sistemáticas ao ordinário, meio ambiente, da legitimidade do cidadão na todas as atividadesdados sujeitos precípuo de propositura ação, para apartícipes ocupaçãodo do ordenamento, polo passivo e,apontando sobretudo,no nasentido publicização desta possibilidade demínimo atuaçãoàcidadã com digna vistasde à conservação do patrimônio meio ambiente como existência todos indivíduos. Especialmente, ambiental brasileiro. em meados do século XX, o meio ambiente começa a mostrar seus limites e seus efeitos colaterais são vistos e sentidos pela sociedade humana. A poluição cresce nas Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao comunidades locais e ganha internacionais. polo ativo da demanda numadimensões leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação É possível a partir destacar de movimentos comologo os resultantes Declaração de Ação Estocolmo popular? É textualmente nos artigosda iniciais da Lei de 1 sobre Desenvolvimento Ambiental Humano (1972) que oem reconhecimento de queo temos Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando sua extensão define um planeta e da de uma proteção do meio ambiente, que só é cidadania, aonecessidade trazer que o título eleitoral é ainternacional prova de cidadania, devendo esteelevou dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. o tema à categoria de um bem público global. Estados, então, passam a ter um papel próComungada com esse ponto de vista, eanadoutrina majoritária entende, como ativo na elaboração de normas internas, criação de normas transnacionais em prol expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely de uma efetiva proteção do meio ambiente humano. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína pleito quando o direito político de eleger seja O constituinte, atento a taisdequestões e à rica biodiversidade brasileira, corresponder a um de fiscalizar. ela em termos de fauna e flora, trata-os de maneira clara como necessidades básicas a promoçãoSem do bem comum de todos, humanos humanos, e primordial à sustentação maiores obstinações, fica claro,e não permissa vaenia, que existe uma da qualidade de vida, assegurando-os no artigo 225 daestendida Carta da República. Expressamente relevante incongruência normativa com toda análise até aqui, visto que a depreende queseu na bojo, buscatraz desse equilíbriodeecológico entre as os prover, processos de CRFB/88, em a dirigência ações positivas do espécies, Estado para dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo relação social, ainda que guiados que pelo rendimento econômico, devem preservá-lo, mote constitucional da solidariamente garantia de existência mínima de dignidadepela humana. É do além de estarem postos na qualidade de responsáveis restauração frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido balanço natural das espécies e de seus processos ecológicos essenciais, como traz José de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o Afonso Silva: de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! mínimo da existencial Processos ecológicos ambientais são aqueles que garantem o funcionamento
Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto dos ecossistemas e contribuem parade a salubridade rigidez do meiode ambiente constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara restrição edo conceito [...]. Sãode aqueles, indispensáveis à produção de alimentos e a outros cidadania que não é sinônima cidadania eleitoral, especialmente ao àsesaúde tratar aspectos da sobrevivência humana e do desenvolvimento de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada sustentado. em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos (SILVA, 2009, p. 250-253). e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Na medida em que a atividade primatitulares ratio tem a si imposta a tarefa reconhecimento da pessoa humana e não estatal humana– como da criação de espaços territoriais protetores de biodiversidade e da integridade de seu patrimônio físico-genético, bem como da fomentação de estudos técnicos de impacto 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulaçãoda ou aprodução declaração deenulidade de atos lesivos e, em fundacional, controle biologicamente responsável comercialização ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresespecífico, de promoção da educação e conscientização ambiental. so em juízo, seráafeita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Esse hiato entre a lei e a sua aplicabilidade no plano da eficácia social pode ser dirimido a partir de uma gestão eficiente e transparente do uso dos recursos destinados à educação, seja no ensino público ou privado, bem como do despertar da sociedade para o dever constitucional da responsabilidade compartilhada com a preservação dos recursos naturais e a superação do ceticismo com a crise ambiental e sociedade de risco.(CAÚLA, B; LUZ, F, 2013, p. 86-106)
Fica nítido que o dever positivo se estende não tão somente ao prisma institucional, mas sobretudo comunitário, demonstração da compreensão da complexidade dos ciclos de produção e de seus impactos na construção de uma sociedade mais ecologiamente íntegra e solidariamente responsável na gestão ética dos recursos naturais. [...] a preservação e a restauração desse processo ecológico é fundamental para a perpetuação da vida no planeta Terra. Trata-se da interação integrada das espécies da fauna, da flora, dos microorganismos, da água, do solo, do subsolo, do lençol freático, dos rios, das chuvas, do clima [...]. (SIRVINSKAS, 2003).
As expressões meio ambiente ecologicamente equilibrado e desenvolvimento econômico (art. 170, VI, da CRFB/88) trazem consigo a problemática quase dilateral em conciliar um e outro a serem sempre pautados em um planejamento contínuo, como ensina Luís P. Sirvinskas (2003, p. 145) “atendendo-se adequadamente às exigências de ambos e observando-se as suas interrelações particulares a cada contexto sócio-cultural, político, econômico e ecológico, dentro de uma dimensão tempo/espaço”. As medidas assecuratórias, expressas em faceres, manifestam o Poder público, no sentido de gênero, como operador primeiro na promoção desse mínimo existencial e de sua sustentabilidade atemporal. Porém, em um contexto comunitário, a CRFB/88 não hesita no “chamamento” da coletividade, no sentido da lição de Sirvinskas, pondo a ela o dever solidário, uma espécie de “simbiose” exercida reciprocamente na proteção do bem sustentador de toda ordem. Assim é que o Estado brasileiro, reconhecedor da incapacidade estrutural de proteger todo o vasto ecossistema nacional, abraça a participação coletiva nessa atividade. Neste contexto, a população encontra elementos que permitem o combate a atos desmedidos e desproporcionais, que comprometam a integridade do ambiente por meio da ação popular. Transforma‐se, então, em fiscal dos atos de terceiros, no sentido de realizar um senso de adequação entre os posicionamentos adotados pelos mesmos e os desejos e princípios, considerados relevantes e indispensáveis pela coletividade, revelando‐se oportuno e conveniente a análise da ação popular, enquanto possibilidade peculiar e direta de atuação da população na defesa de um meio ambiente hígido e equilibrado.
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55 AÇÃO AÇÃO POPULAR POPULAR COMO COMO MEIO MEIO DIFUSO DIFUSO DE DE TUTELA TUTELA AMBIENTAL AMBIENTAL Não restam dúvidas dúvidasquanto quantoaoaocaráter caráterdedecontrole controle popular direto e eficaz da Não restam popular direto e eficaz ação popular no no controle dosdos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas da ação popular controle atos administrativos. Permanecem, contudo, certas quando trata se emtrata umaem lógica dos meios de produção, consumo e dúvidas se quando uma desagregadora lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante vertiginoso do crescimento vertiginoso das e agressões multipolarizado descarte, diante do crescimento e multipolarizado sistemáticas das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio vistas à conservação ambiental brasileiro. do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao ativo da numa leitura observados ososdeveres deveres comunais da polo ativodemanda da demanda numa leituradada CRFB/88 CRFB/88 observados comunais proteção do meio ambiente, quemquem tem tem legitimidade para para propor uma ação É da proteção do meio ambiente, legitimidade propor uma popular? ação possível textualmente logo nos artigos iniciais Lei deda Ação Popular popular? destacar É possível destacar textualmente logo nos artigosdainiciais Lei de Ação (LAP 3 nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o Popular (LAP – lei – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, que é cidadania, ao trazer que oétítulo eleitoral é a prova devendo de cidadania, devendo esteser tido ao trazer que o título eleitoral a prova de cidadania, este dispositivo dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como de vista, anadoutrina expresso na liçãoTheodoro de Rodolfo Camargo expresso lição demajoritária Rodolfo deentende, Camargocomo Mancuso, Humberto Jr.,de Hely Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, em esíntese correspondem-se a Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de que direitos deveres, ipso facto, ideia direitoslegitimidade e deveres, ipso facto, haveriao legitimidade genuína de pleito apenasdehaveria genuína de apenas pleito quando direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores vaenia, queque existe umauma relevante maiores obstinações, obstinações,fica ficaclaro, claro,permissa permissa vaenia, existe relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, dentre meio ambiente como elemento compositor umconstitucional complexo da o meio muitos, ambienteo como elemento compositor de um complexo de mote mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É garantia de existência mínima de humana. É frágil sustentarno que a cidadania frágil sustentar que a cidadania se dignidade resume à comprovação documental, sentido se à comprovação no sentido de de que, quando lesionado, oo meio de resume que, quando lesionado, odocumental, meio ambiente deprecia forma consequencial ambiente deprecia de o mínimo existencial todos os sujeitos do mínimo existencial deforma todos consequencial os sujeitos do ordenamento jurídico.de Todos! ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional dá, edada a impossibilidade claraàde restrição conceito de Sendonos ao fim ao cabo, tal restrição aversa diretriz que odotexto constitucional cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é de tutela de decidadania matéria ambiental. Uma constituição comodeatutela nossa, pautadaambiental. em sinônima eleitoral, especialmente ao se tratar de matéria uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos Uma constituição como a nossa, uma realidade comunitária e diversificada, e conceitos marginalizadores de pautada primeiraem dimensão ao sustentar em seu bojo o expande os horizontes dos direitos marginalizadores reconhecimento da pessoa humanaeeconceitos não humana como titularesde primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos 3. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingrespatrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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de garantias, estas inerentes à uma existência para além dela, mínima necessarimanente jacente a um ecossistema equilibrado do qual inexoravelmente todos compartilhamos. No sentir de Eraldo Garcia Vitta (2000), assevera-se: A diferenciação do conceito de cidadão da ação popular na proteção de patrimônio público e de cidadão na proteção ambiental tem especial relevo normativo – a amplitude neste último caso há de ser vista em face das disposições constitucionais. (VITTA, 2000, p. 42).
Nesse passo que o uso do termo “qualquer cidadão”, no artigo 5º, LXXIII da CRFB/88, desprende-se da noção de restrição, ou seja, cidadão eleitor. A contrario sensu, de todo certo quis o legislador constitucional, dá maior incisão ao termo qualquer cidadão não exigindo, assim, a condição de cidadão eleitor para a propositura desta ação. Deve assim, a lei ordinária restringir-se ao desejo da Carta Magna na ampliação da noção de cidadania. Quando a ação popular trata da disponibilidade de composição do polo passivo, a priori, sob a égide de uma realidade social suporte de que a norma constitucional decidiu tutelar, refere-se a proposição contra pessoas públicas ou privadas. Como dão dicção os artigos 1º e 6º do referido diploma4 Muito embora os sujeitos passivos a que se referem os artigos acima, atinentes a atos lesivos ao patrimônio público, tendo em vista sua publicação em 1965, na vigência de outra Carta Magna e anterior à inclusão expressa do meio ambiente, sejam limitados, enquanto bem jurídico suscetível de proteção na CRFB/88, é sensível a amplitude maximizadora de sujeitos passivos dada pelo artigo 225 da Constituição quando traz responsabilização às pessoas físicas e jurídicas.5 Também fica evidente tal ampliação quando a Lei nº 9.605/98, no artigo 3º e seu respectivo parágrafo único, trazem que “as pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente [...], e que a responsabilidade dessas pessoas não exclui a de seus administradores”. Ao concatenar ante o exposto há de se perceber que o texto constitucional expande os limites da lei de ação popular primando evidentemente pela máxima efetividade da proteção ambiental, como assevera Heraldo Garcia Vitta [...] nada impede que a ação popular ambiental seja proposta apenas em relação ao particular, sem a participação estatal. Como se cuida de proteção 4. Art.1º.[...] da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista[...]empresas incorporadas ao seu patrimônio, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos; Art 6º. A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no art.1º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado[...]ou que por omissão, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo. 5. Art.225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado[...] §3.º As condutas e atividades consideradas lesivas sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados
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ao meio ambiente, aliás claro no art, 5º, LXXIII, do Texto Constitucional,
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DEdoTUTELA ela pode ser intentada em face particular eAMBIENTAL do Estado, indistintamente. (VITTA, 2000, p. 42).
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular nosorte, controle atosdeadministrativos. De toda na dos busca uma aplicaçãoPermanecem, eficaz da açãocontudo, popularcertas para o fim dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, estudado, é necessário que os sujeitos se percebam a si próprios como titulares legítimos consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado de pretensão e, sobretudo, do conhecimento do prórpio instrumento das tal agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão em na tela. Invariavelmente, é interessante alertar e atentar para a possibilidade de mudança, no propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta de atuação cidadã com vistas à conservação patrimônio que sepossibilidade refere à divulgação da ação popular, enquanto instumento do jurídico de defesa e ambiental brasileiro. proteção de um direito fundamental de terceira dimensão. Segue-se, naéanálise princípio dedos doutrina e legislação, tocantesocial, ao não Certamente, cediço aque boa parte sujeitos integrantes no do corpo polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais operadores direto do direito, é desconhecedor da utilidade da ação popular e dos resultados da proteção do meio ambiente, quem tem em legitimidade propor uma ação paira capazes de serem alcançados pela mesma, virtude dapara ignorância que ainda popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação sobre o jurisdicionado oriundo de 1 uma realidade social tecnicamente marginalizadora no Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o modo de ser nas ao mais variantes realidades sociais possíveis. que é cidadania, trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Isso ocorre umaasociedade de consciência deformada Comungada com esse ponto de em vista, doutrinadoentia, majoritária entende, como[...] em consequência, o destino dessa Humberto parcela majoritária da população, expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Theodoro Jr., Hely não é de nenhuma forma específica de ajuda para que ipso saia da miséria e da Meirelles, que em sínteseobjeto correspondem-se a ideia de direitos e deveres, facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger ignorância. (RIBEIRO, 1995, p. 218). corresponder a um de fiscalizar. É nesse passo que o “princípio da participação popular da defesa ambiental” tem como Sem maiores ficaverdadeira claro, permissa queContudo, existe uma propósito maior impedir aobstinações, formação de uma “falangevaenia, de mudos”. serão estes relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a realmente silenciosos? Ou talvez estariam estes mudos, por não terem conhecido o exercício CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, pleno de sua cidadania exigindo direitos fundamentais e civis, especialmente quando tomamos
dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo como prisma a evolução política de institucional nosso país? Muitos dessa falange mote constitucional da garantia existênciademínima de dignidade humana. É são desejosos de participação, muitoseembora não saibam como fazê‐lo. (SÉGUIN, frágil sustentar que a cidadania resumeainda à comprovação documental, no sentido 2002, de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o p. 287). mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Pecha esta que reflete nos pequenos resultados angariados via o instrumento Sendo aodiagnóstico fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz o texto da ação popular, da debilidade de uma sociedade queque nunca cultivou o constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cujo “protestar” perante agressões sistemáticas de atos que agridam os bens públicos, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar prognóstico é a inércia. Precisa-se, assim, de publicização do instrumento da ação de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em popular para a garantia efetiva do controle eexpande defesa doosmeio ambiente ipso facto, da uma realidade comunitária e diversificada, horizontes dose direitos garantia do mínimo social cuja de existência, passo que e sustenta, e conceitos marginalizadores primeiraironicamente, dimensão ao ao sustentar emnos seucria bojo o necessita de nós da para que exista. reconhecimento pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos 6ao CONCLUSÃO patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
Hodiernamente, a ação popular figura‐se como um dos instrumentos mais
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precisos e diretos de obtenção de uma proteção regularmente satisfatória dos bens jurídicos de titulares indeterminados, em especial assim a tutela do meio ambiente. Não obstante, o corpo social brasileiro ainda não se deu conta da necessidade de sua participação ativa em defesa de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, pautado no binômio desenvolvimento e preservação. Perdura, infelizmente, a falsa noção de que esta é atividade de exclusiva responsabilidade do Estado – poder público. Essa inatividade fragiliza a concretização do meio ambiente como direito social fundamental (mínimo existencial). É nesse rumo que se tem por vital a publicidade às formas jurídicas de atuação das comunidades na tutela efetiva ambiental, a serem somadas às atividades da sociedade civil organizada, tendo como aporte as múltiplas partes interessadas como os movimentos populares e a ação de organizações não governamentais na proteção desse bem jurídico inexorável à
existência digna, humana e não humana.
Especialmente quando cotidianamente apercebemos uma sistemática degradação ambiental enquanto um entrave generalizado e avassalador que parte desde uma perspectiva desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, sem deixar de lado, evidentemente, um viés sócio-cultural e antropológico no qual estamos inseridos. De forma que se entende a ação popular como meio fundamental, válido e, sobretudo, necessário, com vistas à amplitude da noção de cidadania e composição do polo ativo na tutela difusa do meio ambiente como mínimo existencial. É preciso ainda que passemos por um processo de publicização e conhecimento do instituto para que tal possa atender com a máxima eficácia possível a sua função social. AÇÃO POPULAR AND THE ASSUREMENT OF A BALANCED ENVIRONMENT: DEMOCRATIC PARTICIPATION IN ORDER TO DEFENSE AND DEVELOP A MINIMUM EXISTENTIAL BIAS ABSTRACT This analysis is directed to evaluate peculiarities on the Ação Popular in order to defense and develop a balanced environment for all species as a straight and efficient social instrument in light of the vertiginous and multi-polarized jeopardizations against the plural national ecosystems. Along with that track, it was intended to discuss the constitutional trajectory around the social rights as well as its positivation movement in the Republic’s Constitution/88 under the rule of popular participation in the historic building process of such guaranties. In the same intent, it proposes to analyze the spectrum that the environmental concerns hold in the constitution along with its consequences also and invariably through the legitimacy in respect of the concepts of citizenship, lato sensu, to the proposition and passive pole occupancy, based on the doctrinaire divergent points. As a first result, it’s prudent to recognize the weakness in such procedural Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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instrument, as to this proposes, mainly because of the wide spread lack of its social awareness. Therefore, 5starting AÇÃO POPULAR COMObias, MEIO DIFUSO DE in TUTELA from a analytic-qualitative through the majority doctrinaireAMBIENTAL views, it’s easy to point the immediate need for an amplification on the Ação popular as a possibility of citizenship honoris causa, Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz placed in popular the publicity publicize principles in order to promote contudo, a balanced certas environmental da ação no and controle dosconstitutional atos administrativos. Permanecem, life for human and not in Brazil. dúvidas quando sehuman trata species em uma lógica desagregadora dos meios de produção,
consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Key-words: Ação sistemáticas Popular. Balanced Social control. das agressões ao environment. meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. REFERÊNCIAS
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção Zygmunt. do meio ambiente, quem tem legitimidade propor ação BAUMAN, Tempos líquidos. Rio de Janeiro: Ed.para Jorge Zahar,uma 2007, p. 71. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP –José lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o CANOTILHO, Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 2. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este ed. Coimbra: Almedina, 1998, p. 43. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada esse ponto de vista,urbanos: a doutrina majoritária como CARDOSO, com R. Movimentos sociais balanço crítico.entende, In SORJ, B., and expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., HelyCEPS, ALMEIDA, MHT.orgs. Sociedade política no Brasil pós-6l. Rio de Janeiro: Meirelles, 2008, p. 88.que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de F. fiscalizar. CAÚLA, B. Q; LUZ, Direito a educação ambiental no curso superior: qual o alcance da norma constitucional diante do ceticismo? In: PADILHA,N; CAMPELLO, L; Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma FREITAS, V.(org). XXIInormativa Congresso do estendida CONPEDI/UNINOVE. São aPaulo: relevante incongruência comNacional toda análise até aqui, visto que FUNJAB, 86-106. CRFB/88, 2013, em seup.bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo GONÇALVES, Cláudia Maria dade Costa. Direitosmínima fundamentais sociais:humana. releituraÉde uma mote constitucional da garantia existência de dignidade constituição dirigente. Curitiba:se Juruá, 2015, p. 56-66. documental, no sentido frágil sustentar que a cidadania resume à comprovação de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o MARSHALL, T. H.de Cidadania, classe social e status. São Paulo: Todos! Zahar, 1967, p. 20. mínimo existencial todos os sujeitos do ordenamento jurídico. MONTESQUIEU. das leis. Paulo:aversa MartinàClaret, 1993, Sendo ao Do fimEspírito e ao cabo, tal São restrição diretriz quep.o460. texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de São RIBEIRO, Darcy .O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar Paulo:Companhia das ambiental. Letras, 1995, 213p. de tutela de matéria Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos SÉGUIN, O direito ambiental: nossa casa planetária. Rio em de Janeiro: e conceitosElida. marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar seu bojoForense, o 2002, p. 287. da pessoa humana e não humana como titulares reconhecimento SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 250-253. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresSIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. 2 ed., rev., atual. e ampl. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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São
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Paulo: Saraiva, 2003, p. 145. TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário:Os Direitos Humanos e a Tributação. Rio de Janeiro: Ediora Renovar, 1999, p. 144. VITTA, Heraldo Garcia. O meio ambiente e a ação popular. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 42.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
ASSENTAMENTO RURAL COMO UM INSTRUMENTO DE CONCRETIZAÇÃO DO ACESSO À TERRA Leandro Santos Carvalho*1 RESUMO O presente trabalho aborda a temática dos Assentamentos Rurais e as políticas públicas a eles atreladas. O propósito do estudo é avaliar a importância do instituto para a concretização do ideal de Reforma Agrária no País. A pesquisa constitui-se de uma revisão bibliográfica na qual, pelo método dedutivo, propõe-se uma abordagem sistêmica, visando demonstrar que o Assentamento Rural, em que pese as criticas, é um instrumento legal válido para promover a democratização do acesso à terra, estabilização de conflitos agrários e o desenvolvimento socioeconômico no campo. Utilizou-se da doutrina de alguns autores como Alves Filho (2012), Carvalho (2008), Falsarella (2012), Leite Filho (2012), Melo (2006). Conclui-se, por fim, que a hipótese levantada é válida, pois a ferramenta cumpre seu papel legal, mas deve-se ressalvar que há a necessidade de aprimoramento. Palavras-Chaves: Assentamento Rural. Instrumento. Democratização. Acesso à Terra.
1 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por escopo avaliar a importância do Assentamento Rural como instrumento de promoção da democratização do acesso à terra. Para Velasco (2010), com a expansão recente de direitos decorrente Estado Social Democrático de Direito, a propriedade passou a assumir uma conotação coletiva voltada: o direito de acesso à terra. Esse ideal democrático de acesso à terra no Brasil ganhou forma como o movimento por reforma agrária. Por essa dialética, dada à dificuldade estatuir a reforma agrária ampla no Brasil, emerge a necessidade se criar e implementar mecanismos legais para promover a igualdade substancial e, portanto, a integração social e o desenvolvimento econômico no campo, como forma de proporcionar dignidade e amenizar o problema do acesso à terra, base de conflitos agrários. Um desses mecanismos legais é o Projeto de Assentamento Rural. .Pós-Graduando em Direito Ambiental, Pós-Graduando em Direito Empresarial pela Universidade Candido Mendes e Graduado em Direito pela Universidade Paulista, Técnico Judiciário no Tribunal de Justiça do Maranhão. E-mail: leandro.santos. advogado@hotmail.com *
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Visto que a Constituição Federal de 1989 prevê a desapropriação por interesse 5social AÇÃO COMO MEIOo DIFUSO TUTELA AMBIENTAL paraPOPULAR fins de reforma agrária, Projeto deDE Assentamento Rural, previsto no art. 17, da LeiNão nº 8.629/93, foi instituído como um mecanismo legal poreuma série de restam dúvidas quanto ao caráter de controle popularque, direto eficaz políticas públicas, reordenar o uso da terra, estabelecer padrões sociais certas no campo e da ação popular no visa controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, gerar renda pela produção agrícola sustentável. dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Em que pese a patente ausência de Estado nos assentamentos rurais,na já se vê das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão avanços significativos na aquestão da do distribuição da e, terra; a pressão no processo propositura da ação, para ocupação polo passivo sobretudo, na social, publicização desta possibilidade de atuação vistasmuitas à conservação do patrimônio denominado de normatização de cidadã políticascom públicas, vezes é a mola propulsora para ambiental brasileiro. o combate ao descaso público em assentamentos rurais. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no fazer tocante ao Esta pesquisa se propõe, por meio de revisão bibliográfica, reflexões e polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais avaliar a importância do assentamento rural para a política de distribuição da terra no país. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É destacar textualmente logo nos artigos iniciais dasistêmico, Lei de Ação O possível método utilizado é o1 dedutivo, pois, a partir de um estudo busca-se Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o confirmar a hipótese de que o instituto é de fundamental importância para a concretização que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este do ideal de reforma dispositivo ser tido agrária. como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de a doutrina entende, como Dentre outros autores, foi vista, utilizada a doutrinamajoritária de Alves Filho (2012), Carvalho expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely (2008), Falsarella (2012), Leite Filho (2012), Melo (2006). Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. 2 DESENVOLVIMENTO Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante A incongruência normativa com toda análise estendida atésempre aqui, visto que bem a de terra, em uma visão determinista ou evolucionista, foi um CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, essencial importância para a humanidade, por isso sempre foi instrumento de inclusão dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo social e de desenvolvimento. mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação no descoberta sentido da Refletindo sobre esse pensamento, lembramo-nosdocumental, da euforia da de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o agricultura no período neolítico ou ainda, na visão determinista, o episódio de Moisés mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! guiando pelo deserto o povo hebreu, escravizado no Egito, para integrá-lo na terra prometida, onde poderia Sendo ao fim prosperar. e ao cabo,(ALMEIDA, tal restrição1993). aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de a Antiguidade, a propriedade foi concebida como propósito de poder, cidadaniaDesde que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar sobretudo o político; restrita aUma pouquíssimas pessoas, geralmente pertenciam à de tutela de matéria era ambiental. constituição comoque a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos burguesia. Os camponeses que tornavam a propriedade produtiva mal podiam desfrutar edos conceitos de primeira dimensão ao sustentar proveitosmarginalizadores que ela poderia proporcionar. (LEITE FILHO, 2012).em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Com a revolução industrial e a mecanização do campo, esses camponeses se viram ainda mais marginalizados, pois até o trabalho que exerceriam na propriedade 1. Art. 1.ºaQualquer cidadão será parte para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos passou ser executados por legítima maquinas. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
A mecanização no campo, associada ao capitalismo, fez com que surgisse a
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agroindústria, que passou a ter o latifúndio como imprescindível para a produção agrícola em grande escala. Assim, o crescimento da agroindústria e da influência que ela exerce na macroeconomia contribuiu para limitar ainda mais o acesso à terra. Num ensaio da Teoria Rawalsiana, a terra compõe a categoria de bens primários, aptos a atenderem as necessidades mais prementes do homem. Vista como um bem primário, a terra reivindicou uma finalidade mais nobre, então, foi nesse cenário em que se desenvolveu a democratização do acesso à terra e, por conseguinte, concebeu-se a ideia de função social da propriedade. Não é com menos importância que essa visão rawlsiana de bens primários impregna a Constituição Federal de função social. A terra, vista por esse ângulo, não poderia mais significar somente poder político, não poderia atender somente ao lucro, deveria, pois, contribuir para o desenvolvimento socioeconômico da maioria das pessoas. A proposição filosófica de Jonas (2004) coloca o desenvolvimento como uma forma de trazer comodidade para a humanidade. Em virtude disso arquitetou-se a proposta de desenvolvimento sustentável em que a utilização dos recursos do planeta deveria se gradativa a sua reposição natural e os recursos esgotáveis, isto é, aqueles cuja reposição natural não fosse possível, deveriam ser racionalizados. Com efeito, associando-se os postulados rawlsianos com os de Jonas, podemos entender que a terra é um bem primário, necessário ao desenvolvimento socioeconômico no campo, porém, esse desenvolvimento não pode ser irresponsável – função socioambienta. A má divisão de terras no Brasil, como na maior parte dos países, é um problema social. Historicamente, seja de domínio público ou privado, sempre houve vastas extensões de terras rurais improdutivas. Nesse sentido, Leite Filho ( 2012, p. 77), aponta: A propriedade da terra no Brasil sempre esteve associada à manutenção do poder político e à formas arcaicas de produção. Desde as Sesmarias, passando pelo “período extralegal” ou “das posses”39, pelas regularizações e vendas de terras pelos Estados após a Constituição de 1891, até o Estatuto da Terra de 64. O Brasil nunca teve uma política igualitária de distribuição de terras
O Brasil colonial concebeu-se por um modelo feudal em que a propriedade de terras era um sinônimo de poder, restrito a uma minoria. Tanto é que a colonização começou com apenas 14 capitanias, distribuídas a 12 donatários. (CARVALHO, 2008). Desde a década de 1960, o ideal de reforma agrária tomou forma no Brasil. O debate foi amplo e rompeu-se com o modelo tradicional latifundiário, criando-se a concepção de democratização do acesso à terra e redistribuição de riquezas. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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No entanto, a forte influência da agroindústria na econômica foi de encontro 5aoAÇÃO MEIOdaDIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL direitoPOPULAR de acesso à COMO terra e, diante reconhecida importância da agroindústria para macroeconomia, no Golpe Militar de 1964, a democratização do acesso à terra foi Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz desencorajada. da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, que o diante fortalecimento da industrialização provocou o êxodo rural, haja consumo Ocorreu e descarte, do crescimento vertiginoso e multipolarizado vista que as pessoas saíram do a cidade busca de melhores condições das agressões sistemáticas aocampo meio para ambiente, da em legitimidade do cidadão na de vida, prometida pelapara indústria. Comdo isso, debate enfraqueceu tema foi apagado, propositura da ação, a ocupação poloo passivo e, sobretudo,enao publicização desta vistas (MELLO, à conservação vindo possibilidade a se reproduzirdenoatuação início dacidadã décadacom de 1990. 2006).do patrimônio ambiental brasileiro. Nessa segunda etapa do debate, vislumbrando-se a impossibilidade imediata da Segue-se, na análise princípio de doutrina e legislação, no tocante aopropor verdadeira reforma agrária semaprejuízo econômico, o governo brasileiro resolveu polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais a democratização agrária pontual. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente nos artigos iniciais da Lei de Ação Aproveitando o ensejo e ainda logo o acaloramento do debate sobre o tema, o 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o constituinte alocou na Constituição Federal um título destinado à reforma agrária, elevando que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este ao grau constitucional a função da propriedade e a possibilidade de desapropriação dispositivo ser tido como não social recepcionado pela vigente ordem constitucional. para fins de reforma agrária. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely tópico foicorrespondem-se situado o Projetoa ideia de Assentamento Rural, instrumento Meirelles,Nesse que em síntese de direitos e deveres, ipso facto, legal destinado a materializar a desapropriação por interesse parapolítico fins de de reforma apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando social o direito elegeragrária ecorresponder promover a ademocratização do acesso à terra. um de fiscalizar. A criação de políticas públicas ao campo, que promovam integração Sem maiores obstinações, ficavoltadas claro, permissa vaenia, que existea uma social e desenvolvimento de comunidades marginalizadas no meio como relevante incongruência normativa com toda análise estendida atéagrícola aqui, visto queforma a de CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, estabilizar conflitos agrários e proporcionar dignidade humana, tornou-se de fundamental dentre muitos, o meioAgrário ambiente como elemento compositor de um complexo importância no Direito Brasileiro. mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar a cidadania se resume à Rural comprovação no sentido Nesse que contexto, o Assentamento revela-sedocumental, uma ferramenta de grande de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o País, importância disponível para autoridades públicas engajados na questão agrária do mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! uma vez que pela distribuição de terras será possível a uma comunidade assentada, simultaneamente, umcabo, grupotalsocial que aversa lhe permita a manutenção de suas Sendo aocompor fim e ao restrição à diretriz que o texto tradições, desenvolver-se economicamente, manter equilíbrio ecológico e promover a constitucional nos dá, dada a impossibilidade clarao de restrição do conceito de dignificação denão sua épessoa. cidadania que sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em É de alto relevo também a questão de conflitos Os dos conflitos agrários, uma realidade comunitária e diversificada, expande os agrários. horizontes direitos eobviamente, conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo surgem geralmente do choque de interesses entre latifundiários e semo terras, reconhecimento pessoa e nãosehumana comoinfluência titulares da mídia e da chamada mas o que se notadaé que, emhumana locais onde vê uma forte “opinião pública” com a questão agrária, os movimentos sociais por distribuição de terras se inflacionam. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresObserva-se também que o latifúndio, independente de sua produtividade, so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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por si
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só tem o poder causar essa inflação, a timidez da política pública reformista é outro fator de contribuição. Basta pensar que, enquanto tantas pessoas nativas do campo não têm terra para cultivar, uma só pessoa tem terra suficiente para ocupar dezenas. Assim, a junção desses fatores, quando em um só local, assume proporções muitas vezes violentas, o que faz instalarem-se os conflitos agrários. Desse modo, a atuação governamental imediata à instalação do conflito é de extrema importância, conquanto, verificando as condições necessárias, poderá o gestor instaurar o processo de desapropriação, pagar a indenização, instalar o Projeto de Assentamento e, com isso, estabilizar o conflito. Dito isto, chegamos ao ponto de avaliar o papel das políticas públicas para a concretização do ideal de redistribuição de terras. É patente que o processo denominado de Normatização de Políticas Públicas tem relevância para a implementação de um assentamento Rural, bem como para a sua manutenção. Os movimentos sociais, alavancados pela expansão do Estado Social Democrático, assumem grande importância no processo de normatização de políticas públicas. Políticas públicas são o conjunto de metas, ações e planos que os gestores públicos desenvolvem visando garantir o bem estar social. Trata-se de um processo desenvolvido por meio da mobilização. A sociedade tem uma demanda e a expressa de alguma forma até chegar ao conhecimento do Legislativo; este, por sua vez, debate e normatiza a demanda, enquanto o executivo executa essas metas e planos normatizados. (SEBRAE/MG, 2008). Um exemplo é a demanda por segurança: (a) a sociedade mobiliza-se cobrando segurança; (b) o executivo propõe emenda na lei orçamentária para alocar verba para realização de concurso público; (c) o legislativo observa o cenário financeiro do Estado e a real necessidade e aprova o concurso; (d) o executivo executa o concurso e admite novo pessoal para a segurança. As organizações sociais engajadas nos setores da política direcionam o legislador a discutir e implentar o direito social reivindicado. O Poder Legislativo, temendo perder a capacidade de representatividade, vê-se pressionado a dar uma resposta à sociedade; a pauta das ruas instantaneamente assumem forma no Congresso e os debates iniciam-se. Muitas vezes a matéria vira lei sem nem mesmo ter havido o debate amadurecido sobre o tema. Não repercutindo no Congresso, os tribunais assumem o dever dar resposta à sociedade, como no caso da união homoafetiva. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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Como exemplo desse direcionamento voltado ao âmbito do Congresso, 5temos AÇÃO POPULAR MEIO TUTELA AMBIENTAL a criação da LeiCOMO 8080/1900 (LeiDIFUSO OrgânicaDE da Saúde) e mais recentemente da Lei Complementar 135/2010 (Lei da Ficha Limpa). Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle administrativos. certas Prova maior desse dos fatoatos é a reforma agrária terPermanecem, sido incluída contudo, na pauta do legislador dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, constituinte. O próprio Plano Nacional da reforma agrária advém de um movimento consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado social organizado e encabeçado por entidades civis década de 1990, que resultou das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da na legitimidade do cidadão na na aprovação n. 8.629/93, a qual do prevê Projeto e, desobretudo, Assentamento Rural. proposituradadaLei ação, para a ocupação poloo passivo na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio de instrumento jurídico que materializa as normas programáticas ambientalTrata-se brasileiro. constitucionais e infraconstitucionais relativas ao ideal de reforma agrária, sendo um naprocesso análise achamado princípiodedenormatização doutrina e legislação, nopúblicas. tocante ao elemento Segue-se, derivado do de políticas polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção meio observa-se ambiente, que quem tem mais legitimidade paraepropor umaestiverem ação Comdoefeito, quanto organizados engajados os popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação movimentos populares, mais pressão exerceram em relação às autoridades públicas, o que 1 Popular (LAP – leianº4.717/65) contundência quando em sua extensão define o motiva uma maior atenção por aessas com relação às pautas reivindicadas. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordemdeconstitucional. Intelectuais engajados no direito permitem uma difusão opinião e fornecem Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, munição ao movimento social a ser articulado; são eles que desenvolvem ascomo ideias que expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely ganham corpo nas ruas e adentram no Congresso. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de doutorado, pleito quando o direito político elegerdo agir Daniela Melo, na sua tese de (2013), explica que adeteoria corresponder a um de fiscalizar. comunicativo de Habermas aplica-se a esse caso, conquanto o discurso produzindo na sociedadeSem reproduz-se forma de consenso social, gerando a normatização. maiores na obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a programáticas servem parâmetros mais uma vez a sociedade CRFB/88,As emnormas seu bojo, traz a dirigência dede ações positivaspara do Estado para prover, civil controle de ambiente eficiência como quantoelemento à atuação compositor do gestor. Por de extrema dentreexercer muitos, o meio deisso, um vê-se complexo importância a criaçãodadegarantia tais normas, conquanto,mínima estipulando metas retiram a conotação mote constitucional de existência de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido inteiramente abstrata de alguns direitos sociais, a exemplo o direito de acesso à terra no de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o campo. mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Em sendo assim, tanto o problema de implementação de um assentamento Sendo ao fimdee políticas ao cabo, públicas tal restrição que opelos textooutros quanto a precariedade nele aversa podem àserdiretriz controladas constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de poderes, mesmo população. cidadaniaouque não épela sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela Adeinsuficiência matéria ambiental. Uma constituição comosão a nossa, pautada em em de recursos e a ausência de Estado problemas recorrentes uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos assentamentos rurais, então, passemos a tecer comentários a esse respeito. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Como pontuado, a impossibilidade de reforma agrária completa imediata não permite o gestor público ignorar o preceito constitucional, da mesma forma que o problema de insuficiência de recursos para a implantação de todas as políticas públicas 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos atreladas Projeto de Assentamento Rural não permite§ 3ºaoA gestor abandonar propósito ao patrimônioao da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] prova da cidadania, para o ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. de inclusão social e de desenvolvimento econômico sustentável no campo. 40
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A validade racional desse argumento combate a critica de que o assentamento rural simplesmente maquia o problema maior da necessidade de reforma agrária. Diante isso, é possível evidenciar que caminho não é enxergar o assentamento rural como um conjunto de políticas públicas mal executadas. O conhecimento dos problemas é importante, mas o foco deve se fixar na solução, isto é, no aprimoramento do instrumento legal de inclusão e desenvolvimento que é o assentamento Rural. (ALVES FILHO, 2012). A integração é um processo de inclusão social em quer uma minoria propõe-se a aceitar o convívio sob a égide de regras e valores de um novo grupo social no qual se inserirá, podendo manter seus traços culturais. Assim, o assentamento rural é instrumento de integração. Observando o aspecto jurídico percebemos que, em matéria de política social, isto é, em matéria de norma programática, o Estado trabalha com a reserva do possível. A tese da reserva do possível diz basicamente que não é possível dar as pessoas tudo o que elas querem, pois dadas as circunstancias nem tudo é razoável. (FALSARELLA, 2012). Parte-se do pressuposto de que os recursos orçamentários do Estado são insuficientes para o desenvolvimento de todas as atividades garantidoras dos direitos sociais. (RIBEIRO, 2010). Logo, é evidente que, mesmo a integração social e o desenvolvimento econômico no campo sendo importantes, existem necessidades mais prementes a serem satisfeitas pelo Estado. Segundo Gilmar Mendes (2012), os direitos fundamentais sociais, por terem caráter prestacional, devem observar o cenário econômico do país, de maneira que o Estado garantirá sua prestação mediante a existência de dotações orçamentária; não existentes recursos suficientes, o Estado deve manter somente o seu núcleo essencial. O referido autor adverte que a proteção insuficiente de direitos sociais também é uma violação aos direitos fundamentais, haja vista que os direitos fundamentais comportam tanto a proibição do excesso quanto à proteção insuficiente. (MENDES, 2012). Assim, não é a insuficiência de recursos para implementação de infraestrutura, rede funcional de saúde e educação e, portanto, das políticas públicas que rodeiam o assentamento rural que lhe retira o propósito de integração e desenvolvimento no campo. (RIBEIRO, 2010). O instrumento é válido, mas precisa ser aprimorado. A falta de planejamento orçamentário, muitas vezes a fragilidade econômica e o abandono político impedem que o recurso chegue ao assentamento, o que lhe retira a credibilidade perante sociedade.
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É compreensível que existem necessidades mais prementes no Brasil do que 5promover AÇÃO POPULAR COMO AMBIENTAL a reforma agrária, masMEIO a teoriaDIFUSO da reservaDE do TUTELA possível não permite levar a questão ao descaso político, esvaziando o propósito concebido pelas políticas já normatizadas. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas pois Do ponto de vista jurídico, o assentamento rural não é ineficiente, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, fatores isto diante é, externos a sua constituição, a credibilidade. consumopolíticos, e descarte, do crescimento vertiginosoretirar-lhe e multipolarizado (CONTROLADORIA GERAL UNIÃO, 2015). das agressões sistemáticas ao DA meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Outro pensar ser desenvolvido: avalia-se que uma integração social e um desta possibilidade de deve atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio desenvolvimento econômico sustentável que sejam satisfatórios para as comunidades ambiental brasileiro. agrícolas seriam viáveis por uma priorização da política de reforma agrária pelo governo na análise de doutrina e legislação, no tocante ao brasileiro,Segue-se, principalmente com aa princípio maior destinação de recursos. polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem Nacional tem legitimidade para propor uma ação Segundo dados do Instituto de Colonização e Reforma Agrária popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Açãoa uma (INCRA), existem apenas 9.2561 assentamentos rurais no Brasil, o que equivale Popular (LAP – lei a contundência em sua extensão define área de ocupação denº4.717/65) pouco mais de 88,3 milhõesquando de hectares. Esses números são oínfimos que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este se considerarmos a extensão do recepcionado território e a população brasileira. dispositivo ser tido como não pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende,decomo Basta notar que a priorização da saúde pelo desenvolvimento programas expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely como o “Mais Médicos” e da integração urbana com o “Minha Casa Minha Vida” Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, foram significativos melhorias genuína e progresso nas respectivas áreas depolítico atuação. apenas haveriapara legitimidade de pleito quando o direito de eleger corresponder a um de fiscalizar. Portanto, para promover a integração e o desenvolvimento econômico das comunidades marginalizadas, dignidade, o governo Semagrícolas maiores obstinações, ficaproporcionando-lhes claro, permissa vaenia, que existe uma teria que estabelecer uma priorização da com política reforma agrária.até aqui, visto que a relevante incongruência normativa todade análise estendida CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Outro oaspecto de grandecomo relevoelemento é que, em virtude daderealidade brasileira, a dentre muitos, meio ambiente compositor um complexo efetividade da integração e do desenvolvimento seria possível em assentamentos mote constitucional da garantia de existência só mínima de dignidade humana. É rurais frágil sustentar a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido a longo e médioque prazo. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos Todos! Um exemplo disso éososujeitos Projeto do de ordenamento Assentamentojurídico. Canaã dos Carajás, no sudeste do Pará, que hoje, após 35 anos, é considerado um lugar próspero no qual, embora a ao atividade fim e ao essencial, cabo, tal possui restrição à diretriz que o texto mineraçãoSendo seja uma um aversa setor agrícola forte. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadaniaPesquisas, que não écomo sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao seapontam tratar que, a desenvolvida por José Jaconias da Silva (2011), de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em mesmo como a precariedade e uma taxa de evasão, a qualidade de vida em assentamentos uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos rurais melhora significativamente com o passar do tempo. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como Não se pode olvidar também a importância quetitulares a cooperação entre esferas de governo têm para sanar precariedade nas políticas públicas dos assentamentos rurais. Instrumentos como convênios, parcerias público-privada e incentivos fiscais têm-se 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos mostrado contornar a ausência de estado rurais e a ao patrimônio eficazes da União, dopara DistritoaFederal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º Aem provaassentamentos da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. reduzir o isolamento. 42
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3 CONCLUSÃO O estudo desenvolvido apontou que a distribuição de terras no Brasil abandou o modelo feudal somente a partir da segunda metade século XX. Concluiu-se também que a influência do Estado Social Democrático foi decisivo para o processo de evolução da questão agrária no país, além do que o conceito de bem primário rawlsiano deu o aporte necessário a definir-se a finalidade da terra no contexto agrário contemporâneo. O processo de normatização de políticas públicas tem um papel nobre na questão da implementação do ideal de reforma agrária no país, servindo por vezes de mecanismo de controle da ação ou omissão estatal. Nessa conjuntura, a Política de Reforma Agrária, se não priorizada, ao menos, não pode ser abandonada, independente das dificuldades financeira do estado, pois a proteção insuficiente é uma forma de violação a direito fundamental. Transplantada essa interpretação para o assentamento Rural, podemos concluir que após sua implantação o estado não pode simplesmente abandonar os assentados, deve dar suporte à manutenção do núcleo essencial de seus direitos fundamentais, de forma a permitir que o instrumento assentamento rural possa cumprir sua finalidade legal de promover a inclusão social e o desenvolvimento econômico de comunidades agrícolas marginalizadas. Por fim, tomando por embasamento as várias pesquisas realizadas em assentamento rurais e considerando os indicadores sociais apontados na maioria delas, podemos concluir que o assentamento rural, se não em grau máximo, mas em grau mediano, cumpre o seu papel de estabilização de conflitos, promoção da inclusão social e desenvolvimento econômico no campo. SETTLEMENT AS A RURAL LAND ACCESS THE ACHIEVEMENT OF INSTRUMENT
ABSTRACT This paper addresses the issue of Rural Settlements and public policies linked to them. The purpose of the study is to evaluate the importance of the Institute for the realization of the ideal of agrarian reform in Brazil. The research consists of a literature review in which the deductive method proposed is a systemic approach,
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seeking to demonstrate that the Rural Settlement, despite the criticism is a valid legal instrument to promote 5democratization AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL of access to land, stabilization of agrarianDE conflicts and Social-Economicin development in the field. He used the doctrine of authors like Alves Filho, 2012, Carvalho (2008), Falsarella (2012), Son Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Milk (2012), Melo no (2006 ). The dos conclusion, finally, that thePermanecem, hypothesis is valid , because da ação popular controle atos administrativos. contudo, certasthe tool
fulfill its legal role,sebuttrata mustem point outlógica that there is need for improvement. dúvidas quando uma desagregadora dos meios de produção,
consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Key words: Rural settlement. Instrument. Democratization. Access to Land. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. REFERÊNCIAS Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio quem legitimidade uma no açãocampo: ALVES FILHO, José ambiente, P. Dinâmicas dostem modos de vida epara saúdepropor ambiental popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação os projetos de desenvolvimento1 sustentável em assentamentos rurais no Estado de São Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o Paulo. Tese (Doutorado em Saúde Pública), Universidade de São Paulo, Programa de que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Pós-Graduação em Saúde Pública, São Paulo, pela 2012.vigente ordem constitucional. dispositivo ser tido como não recepcionado Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como BARREIRA, Cesar. Crônica de de Camargo um massacre anunciado: Eldorado dos Carajás. expresso na lição de Rodolfo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., HelySão Paulo Perspec, São Paulo,correspondem-se v.13, n.4 Oct./Dec. 1999. em: < http://www. Meirelles, que em síntese a ideia de Disponível direitos e deveres, ipso facto, scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-88391999000400015>. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de Acesso eleger em: corresponder a um de fiscalizar. 27 nov. 2015. Sem maioresantigo obstinações, fica claro, permissa que uma2. ed. BIBLIA SAGRADA: e novo testamento. Trad. Joãovaenia, Ferreira de existe Almeida. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a rev. e. atual. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio Federal ambiente como Disponível elemento compositor de um complexo BRASIL. Constituição de 1988. em: < http://www.planalto.gov.br/ mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 22 nov. 2015. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quandoJose lesionado, o meio ambiente de forma consequencial o CARVALHO, B. de. Verdadeira história deprecia das capitanias hereditárias. mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! MULTEMAPAS: São Paulo, 2008. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto CARVALHO, al. aReforma Agrária: aclara realidade de um assentamento rural. constitucional Simone nos dá, et. dada impossibilidade de restrição do conceito de CAMPO-TERRITÓRI. Revista de 4, n. 8, p. 67-97, 2009. cidadania que não é sinônima de geografia cidadaniaagrária, eleitoral,v. especialmente aoago. se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO. Manual avaliação uma realidade comunitária e diversificada, expandedeosmetodologia horizontes para dos direitos da execuçãomarginalizadores de programas de Governo. Disponível http://www.cgu.gov.br/ e conceitos de primeira dimensãoem: ao <sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Acesso em: 24 nov. Publicacoes/auditoria-e-fiscalizacao/arquivos/manual_aepg.pdf>. 2015. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração nulidade atos lesivos DALLARI, Dalmo deserá Abreu. Direitos humanos e cidadania. 2.deed. São dePaulo: ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresModerna, 2004. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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FALSARELLA, Christiane. Reserva do possível como aquilo que é razoável se exigir do Estado. Disponível em: < http://www.apeam.org.br/2012/controlsites/imgeditor/File/ Arquivo_tese%2028.pdf>. Acesso em 27 nov. 2015. INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMAR AGRÁRIA. Disponível em:< http://www.incra.gov.br/assentamento>. Acesso em: 27 nov. 2015. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Disponível em: < http://www.cidades.ibge.gov.br/painel/historico.php?lang=&codmun=150215&search= %7Ccanaa-dos-carajas>. Acesso em: 27 nov. 2015. JONAS, H. O princípio responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Trad. de Marijane Lisboa e Luiz Barros Montez. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora PUC-Rio, 2006. ______. O princípio vida: fundamentos para uma biologia filosófica. Trad. Carlos Almeida Pereira. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004. ______. Lei n. 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. Dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII,da Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ LEIS/L8629.htm>. Acesso em: 22 nov. 2015. LEITE FILHO, Antonio H. L. Reforma agrária e justiça social no campo: elementos para uma abordagem a partir da Teoria da Justiça de John Rawls. Dissertação (Mestrado em Direito Agrário), Universidade Federal do Goiás, Programa de Mestrado em Direito Agrário, Goiânia, 2012. LOPES, Brenner. et. al. Políticas públicas: conceitos e praticas. Belo Horizonte: SEBRAE/MG, 2008. v. 7. MARQUES, Benedito F. Justiça agrária, cidadania e inclusão social. Disponível em: <http://www.abda.com.br/texto/beneditofmarques.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2015. MARMELSTEIN, George. Curso de Direitos Fundamentais. São Paulo: editora Atlas, 2009. MELO, Paulo F. Evasão e rotatividade em assentamentos do Rio Grande do Sul. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Rural), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Mestrado em Direito Desenvolvimento Rural, Porto Alegre, 2006. MENDES, Gilmar F.; BRANCO, Paulo G. G. Curso de direito constitucional. 7. ed. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL RIBEIRO, Maria de F.A efetivação de políticas públicas e a escassez de recursos Não restamÂmbito dúvidasJurídico. quanto ao caráter deJaneiro. controleDisponível popular direto e eficaz financeiros. Revista Net, Rio de em:http:// da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_ dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, id=10522>. em 22 de nov. consumo e Acesso descarte, diante do 2015. crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na VELASCO, Shirlene M. Estado socialdo e democrático e o neoconstitucionalismo. propositura da ação, para a ocupação polo passivode e, direito sobretudo, na publicização Revista Opinião Filosófica, v. 1,cidadã n. 02, p.com 90-104, desta possibilidade de atuação vistasjul. à 2010. conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO NO PROCESSO PENAL José Eulálio Figueiredo de Almeida*1 RESUMO O presente estudo tem o objetivo de demonstrar que o princípio da cooperação (ou da colaboração) sempre gozou de destaque no processo penal brasileiro, não sendo, portanto, como apregoado pela doutrina do processo civil, uma novidade processual e legislativa, posto que já vem sendo aplicado em larga escala nas lides criminais, principalmente nas ações penais instauradas para a persecução dos delitos que dependem exclusivamente de prova oral. Aliás, a ideia da cooperação processual já podia ser vislumbrada, desde o Código Criminal do Império, que, na forma da Lei n.º 261, de 3/12/1841 (art. 25, § 3.º), permitia ao juiz de direito provocar e movimentar todas as provas que entendesse pertinentes para a formação de seu convencimento, independentemente de violação ao princípio da demanda. Palavras chave: Processo. Princípio. Cooperação Colaboração. Prova. Partes . Juiz.
1 INTRODUÇÃO Não é de hoje a preocupação dos julgadores em encontrar soluções efetivas para composição dos conflitos humanos, mormente quando a prova e a contraprova das alegações está ao alcance de qualquer uma das partes e, principalmente, do juiz, o qual nunca deve se afastar do dever de buscar, ainda que por iniciativa própria, o suprimento probatório para satisfazer e tranquilizar sua consciência, assim como para atender o interesse dos litigantes e o objetivo do processo. Mas não são todos os juízes brasileiros que pensam assim. Alguns, baseados em interpretação legislativa, entendem que o sistema acusatório não permite que o magistrado tome a iniciativa da produção da prova, muito menos interfira em sua produção. Apostam no fato de que o ônus da prova incumbe a quem alega (art. 156, caput, CPP) e que ao juiz é vedado sequer tomar a iniciativa de determinar, no curso da instrução criminal, ou antes de proferir sentença, a realização de diligência para dirimir dúvida sobre ponto relevante do processo. Do mesmo modo, defendem ser indevido ao juiz ordenar, de ofício, antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, em face da premente necessidade, moderada adequação e justa proporcionalidade da medida. . Professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Maranhão - UFMA. Juiz de Direito em São Luís. Membro da Academia Maranhense de Letras Jurídicas. Especialização em Processo Civil pela UFPE. Especialização em Ciências Criminais pelo UNICEUMA. Doutorando pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA *
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Porém não deve ser assim. É sabido que o processo penal fundamenta-se no interesse público da jurisdição. Partindo desse DE pressuposto, que nenhum juiz 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO TUTELAtem-se AMBIENTAL pode dizer o direito (jus dicere) aplicável à espécie se não realizar – ele mesmo – intensa restamoudúvidas quanto ao caráter controle popular direto e eficaz atividade Não cognitiva recognitiva a respeito dode fato criminalizado, diga-se, a propósito da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas do fato histórico delituoso que precisa ser reconstruído como um intrincado quebradúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, cabeça parae tranquilizar sua inquietação. consumo descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, legitimidade do cidadão na como Nessa perspectiva, pode-se dizer que odaônus da prova incumbe à parte, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização regra Esse é um o litigante consigodomesmo no interesse desta basilar. possibilidade de compromisso atuação cidadãque com vistas àassume conservação patrimônio do direito postulado ambiental brasileiro.em juízo. Contudo, o dever de prestar tutela jurisdicional de qualidade é do juiz. E, nesse particular, detém a liberdade de investigar os fatos, empenhando-se em Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, nosobre tocante ao diligenciar o esclarecimento sobre o que existe de obscuro ou nebuloso os mesmos. polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Espancada a dúvida, deve verificar a melhor maneira de empregar a prova produzida da do partes meio ambiente, quem uma nosproteção autos pelas em benefício da tem buscalegitimidade da verdade para real, propor que é um dosação objetivos popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação primordiais do processo penal acusatório. Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que oafirmar título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Destarte, é correto que o ônus da prova é um encargo-dever da parte dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. que pretende provar o fato alegado, posto que existe interesse personalíssimo Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como nessa empreitada, vale de dizer, uma de obrigação por forçaTheodoro de imperativo legal. A expresso na lição Rodolfo Camargoprocessual, Mancuso, Humberto Jr., Hely recalcitrância obrigada a produzir aa prova, litigante a pleiteá-la Meirelles, queda emparte síntese correspondem-se ideia deautoriza direitosoeoutro deveres, ipso facto, apenas genuínaseja de relevante pleito quando direito político de os eleger perantehaveria o juízo,legitimidade caso sua produção para ocorroborar também termos da corresponder a um de fiscalizar. sua pretensão postulatória. Sem fica inferir claro, permissa vaenia, quecabe existe uma de Nãomaiores obstanteobstinações, isso, é aceitável que ao juiz também a iniciativa relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que suprir as deficiências probatórias do ônus que compete à parte, determinando deaofício, CRFB/88, em aseu bojo, trazdea dirigência ações positivas do Estado para prover, por exemplo, realização diligênciasdeque venham, a partir da produção incompleta dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo da prova partidária, melhorar a compreensão ou espancar dúvidas e obscuridades a mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É respeito dos fatos que o ônus da prova, no caso da produção de provas frágil sustentar quecontrovertidos. a cidadania seÉresume à comprovação documental, no sentido insuficientes, deixa de ser ouma partes de para transformar-se emopoderde que, quando lesionado, meioobrigação ambientedas deprecia forma consequencial mínimo existencial todos os sujeitosseu do ordenamento jurídico.motivado, Todos! a partir das dever1 para o juiz, de tendente a regular livre convencimento circunstâncias desfavoráveis que dificultam a obtenção da prova ou dos entraves que a Sendo ao fimcria e ao tal restrição aversa à diretriz que o texto parte deliberadamente paracabo, sua apreciação. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não éde sinônima de cidadania eleitoral, 2 No dizer Guilherme de Souza Nucci : especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, osprovas horizontes direitos A iniciativa do magistrado expande na busca de pode serdos positiva, desde que e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo ele atue, sempre, com supedâneo em prova anterior, apresentada por oqualquer reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares das partes (...). O aspecto positivo advém da complementação da prova, quando iniciada por uma das partes. Ilustrando, ouve-se uma testemunha de
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio dahipóteses União, doprevistas Distrito nos Federal, dos209 Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres1. Vejam-se as arts. dos 149,Estados, 156, 196, e 225, do CPP. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 2. Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais. 2.ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 334, 2012.
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acusação, que fornece o nome de alguém, cuja inquirição é fundamental para a elucidação dos fatos; pode o magistrado determinar a sua oitiva, sem infringir sua imparcialidade.
Desse modo, o juiz se torna um coobrigado, diga-se um co-partícipe3, na produção da prova para melhor formar sua convicção a respeito do fato criminalizado, porque se entendermos o termo ação como sinônimo de movimento processual, englobaremos uma série de direitos, deveres e faculdades que competem não só às partes, mas também ao juiz, pois todos possuem legitimação para agir no processo. Dito de outro modo, todos são sujeitos processuais da relação jurídica em trâmite e, por via de consequência, possuem obrigações mútuas e direitos recíprocos, ainda que se veja nisso uma antinomia ou um paradoxo incomum. Nesse agir, o juiz se faz intérprete dos resíduos4 probatórios subjacentes que interessam, de forma indistinta, aos agentes processuais, tornando-se um elo entre as legítimas pretensões das partes que, sem a sua pronta intervenção, não passariam de um arremedo de interesses sem qualquer sentido. Basta ver que a própria exposição de motivos do Código de Processo Penal, no capítulo VII, atinente às provas, “atribui ao juiz a faculdade de iniciativa das provas complementares ou supletivas, quer no curso da instrução criminal, quer afinal, antes de proferir a sentença.” E mais adiante arma o magistrado de plenos poderes para adotar medidas probatórias no interesse do processo, ao afirmar que “o juiz deixará de ser um espectador inerte da produção de provas. Sua intervenção na atividade processual é permitida, não somente para dirigir a marcha da ação penal e julgar afinal, mas também para ordenar, de ofício, as provas que lhe parecerem úteis ao esclarecimento da verdade.” Pretende-se, com isso, defender que as garantias constitucionais do processo penal não podem privar alguém que se encontre em posição simétrica de paridade – no caso, a acusação, o acusado e a vítima – do sagrado direito à produção da prova, pois deve prevalecer o estado de cooperação ou colaboração processual entre eles, sendo que a decisão judicial contrária a esse entendimento fere de morte o princípio do contraditório, a garantia da inafastabilidade da tutela jurisdicional e o devido processo legal e, como tal, não atende ao modelo constitucional adotado pela Constituição Federal. Esse rito processual não pode ser jamais descurado pelo juiz, pois ele é o destinatário da prova e pode também determinar sua produção a qualquer tempo, porque 3. E não parte, porque jamais será afetado pelo provimento jurisdicional em sua esfera de direitos. 4. A palavra resíduos aqui empregada deve ser entendida como sinônima de valores. Significa dizer que o o objetivo do Juiz é obter informações precisas sobre algum fato ou circunstância, a fim de valorar, no momento certo, aquilo que, à primeira vista, não foi dado nenhuma importância pelas partes.
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seu ato não está sujeito a preclusões de qualquer natureza. Sua inércia, por outro lado, 5representa AÇÃO POPULAR COMO MEIO DE TUTELA AMBIENTAL a pulverização do direito queDIFUSO assegura tal postura, porque o magistrado também exerce uma função de natureza pública no processo, que o obriga a Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popularintervir direto esempre eficaz que o interesse em conflito esteja dos sendo pela parte que não pretende colaborar da ação popular no controle atosafistulado administrativos. Permanecem, contudo, certas para adúvidas averiguação construção do julgamento a ser quandodosefato tratae aemescorreita uma lógica desagregadora dos meios de elaborado. produção, Nisto consumo e descarte, diante cooperação do crescimento vertiginoso e multipolarizado reside a síntese da expressão judicial, porque o próprio juiz, como órgão das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na para encarregado de entregar a tutela jurisdicional, deixa de ser mera figura decorativa propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização se apresentar como coadjuvante dos atores principais da relação processual. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. O presente estudo tem, portanto, o objetivo de demonstrar que o princípio da cooperação (ou da colaboração) sempre gozou de destaque no processo penal Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao 5 brasileiro sendo,numa portanto, apregoado pela doutrina do comunais processo civil, polo ativo ,danão demanda leituracomo da CRFB/88 observados os deveres uma novidade posto quem que já tem vemlegitimidade sendo aplicado larga uma escalaação nas lides da proteção doprocessual, meio ambiente, paraempropor criminais, nastextualmente ações penaislogo instauradas parainiciais a persecução delitos que popular? Éprincipalmente possível destacar nos artigos da Leidos de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência sua extensão define já o podia dependem exclusivamente de prova oral. Aliás, aquando ideia daem cooperação processual que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este ser vislumbrada na redação cristalina dos arts. 130 e 378 do CPC/73, que permitiam ao dispositivo sere movimentar tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. juiz provocar todas as provas que entendesse pertinentes para a formação Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como de seu convencimento, independentemente de violação ao princípio da expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodorodemanda. Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a umDA de fiscalizar. 2 O PRINCÍPIO COOPERAÇÃO NO PROCESSO PENAL Sem maioresnos obstinações, fica claro,que permissa vaenia, que existe uma o qual Os romanos legaram o princípio continua atualíssimo, segundo relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que o ônus da prova compete ao demandante6. Melhor explicando, significa dizer que aa prova CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, do fato muitos, incumbeoameio quemambiente alega. Emcomo contrapartida, acusado cabe o direito inalienável dentre elementoao compositor de um complexo de arguir exceções ou dede defesa, vale dizer, contraprova. mote constitucional da meios garantia existência mínimadedeproduzir dignidade humana. ÉDessas assertivas, retira-se ensinamento de que a prova é umdocumental, meio de demonstrar frágil sustentar que aocidadania se resume à comprovação no sentido o fato de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o alegado/contrariado ou, pelo menos, de convencer o juiz a respeito da sua (in)existência mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! e (ir)relevância jurídica. Sendo assim, ao fim não e aopode cabo, tal restrição aversa à diretriz quedoo interesse texto do o juiz do processo penal, em nome constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de titular da persecução penal, desrespeitar as garantias constitucionais e processuais cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar asseguradas ao acusado e à vítima, pois a reconstrução do fato criminoso depende de de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em seus e da oitiva edediversificada, outras pessoasexpande (testemunhas) que possam uma depoimentos realidade comunitária os horizontes dos colaborar direitos para sua exata compreensão e livre de convencimento do julgador. e conceitos marginalizadores primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 5. O Código de Processo Penal do Império (Lei de 29/11/1832) trouxe a figura do Juiz inquisidor, dando-lhe amplos poderes para investigar fatos e ouvir réus, testemunhas e outras pessoas. Demais disso, a Lei n.º 261, de 3/12/1841 (art. 25, § 3º), conferia poderes aos Juízes Direito procederem de ofício “a todasouasa diligências necessárias, ouatos paralesivos sanar qualquer 1. Art. 1.º Qualquer cidadãodeserá partepara legítima para pleitear a anulação declaração de nulidade de nullidade, ou para mais amplo conhecimento da Estados, verdade,dos e circumstâncias no julgamento.” Foi mantida ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Municípios[...]que § 3ºpossam A provainfluir da cidadania, para ingresa redação com a ortografia original. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 6. Teodoro Mommsen. Derecho Penal Romano. 2.ª ed. Santa Fé de Bogotá, Colombia: Editorial Temis S/A, p. 275, 1999.
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Sobre esse importante papel triangular da atividade jurisdicional, Elpídio Donizetti discorre nos seguintes termos: 7
A doutrina brasileira importou do Direito europeu o princípio da cooperação (ou da colaboração), segundo o qual o processo seria o produto da atividade cooperativa triangular (entre o juiz e as partes). A moderna concepção processual (no sentido de que o processo é um meio de interesse público na busca da justa aplicação do ordenamento jurídico no caso concreto) exige um juiz ativo no centro da controvérsia e a participação ativa das partes, por meio da efetivação do caráter isonômico entre os sujeitos do processo. Trata-se, como já dito, de uma evolução do princípio do contraditório. O dever de cooperação estaria voltado eminentemente para o magistrado, de modo a orientar sua atuação como agente colaborador do processo, inclusive como participante ativo do contraditório, não mais se limitando a mero fiscal de regras. Não pode existir mais o juiz apático, que aguarda manifestações das partes para atuar (“ignorante institucionalizado”). Assim, o ativismo do juiz deve ser estimulado e, ao mesmo tempo, conciliado com o ativismo das partes, para que atenda à finalidade social do processo moderno. Torna-se necessário, pois, renovar mentalidades com o intuito de afastar o individualismo do processo, de modo que o papel de cada um dos operadores do direito seja o de cooperar com boa-fé numa eficiente administração da justiça. O processo deve, pois, ser um diálogo entre as partes e o juiz, e não necessariamente um combate ou um jogo de impulso egoístico.
A ideia é o compartilhamento das responsabilidades processuais não só das partes, mas também do juiz, visto que todos participam da mesma relação jurídica e precisam auxiliar-se mutuamente até o advento do provimento judicial definitivo, que deve ser objeto da contribuição perspícua de todos os atores do processo. Nesse diálogo triangular, princípios constitucionais e processuais como boa-fé, contraditório, ampla defesa, cooperação, razoabilidade e devido processo legal devem ser observados. Não é à toa que o novo CPC, adotando parâmetro ético e solidário da justiça, trouxe essa novidade em seu art. 6.º, in verbis:
7. Disponível em: http://elpidiodonizetti.jusbrasil.com.br/artigos/121940196/principio-da-cooperacao-ou-da-colaboracaoarts-5-e-10-do-projeto-do-novo-cpc.
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Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se
5 AÇÃO POPULAR COMO DIFUSO DEdeTUTELA obtenha, em MEIO tempo razoável, decisão mérito justaAMBIENTAL e efetiva.
Não restamdesse dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Na esteira pronunciamento, a regra novidadeira pode ser perfeitamente da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, aplicada ao processo penal, conforme se depreende da redação clarividentecertas do art. 3.º, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, do CPP. Mas mesmo que inexistisse a regra sobredita, o dever de colaboração das partes consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado edasdoagressões juiz no processo penal,aopara a descoberta da verdade, devedosercidadão observado, sistemáticas meio ambiente, da legitimidade na sem embargo, sempre representado nas entrelinhas procedimental e proposituraporque da ação, para a esteve ocupação do polo passivo e, sobretudo,danalei publicização desta possibilidade cidadã com cabendo vistas à ao conservação patrimônio nos atos processuaisdedoatuação dia a dia forense, gestor do do processo, no caso o ambiental brasileiro. magistrado, dar cumprimento a esse postulado impostergável. Segue-se, na análise a princípio deadoutrina e legislação, no tocante ao É que devemos sempre distinguir presunção do legislador, que é abstrata, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais e está contida na lei; e a presunção do juiz, que é concreta, e se materializa numa decisão. da proteção tem processual legitimidade para propor ação nem O ideal é que do nãomeio se façaambiente, durante a quem tramitação qualquer tipo deuma presunção, popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação de culpa,(LAP nem de inocência. Desse modo, fica fácil admitir produção, sem preconceito, 1 Popular – lei nº4.717/65) a contundência quando ema sua extensão define o de tipo de prova permitida em juízo paraé que se possa afirmar, devendo com segurança, quetodo é cidadania, ao trazer que o título eleitoral a prova de cidadania, este na sentença penal, um ou outronão estado jurídico. pela vigente ordem constitucional. dispositivo ser tido como recepcionado Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como 8 Como o renomado penalista argentino Eduardo M. Jr., Jauchen expresso na liçãoapostila de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Hely , em lapidar ensinança: Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger experiencia histórica demuestra tristemente que muchas veces el ciudadano se corresponder a um deLafiscalizar. ve no sólo amenazado por la contingenciade de ser víctima de un delito sino también
Sem maiores obstinações, fica claro, por permissa que políticas, existe uma de serlo de una pena arbitraria, oscuras vaenia, motivaciones vengativas, relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que aatrapado raciales, étnicas, discriminatorias, o incluso por verse sorpresivamente CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, en una situación que lo involucra equivocadamente y puede llegar a desencadenar dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional una da sentencia garantiaerrónea. de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Destarte, é de fundamental importância sabermos que a consequencial culpa deve ser osempre de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma provada. A inocência, ao contrário, deve sempre presumida desde os atos iniciais mínimo existencial de todos os sujeitos do ser ordenamento jurídico. Todos! da persecução penal. É exatamente o respeito ao princípio do contraditório que garante Sendodasaopremissas fim e aodeve cabo,sertalaplicada, restriçãocomo aversa à do diretriz que processual o texto em verificar qual fruto trabalho constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cooperação. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela Veja-se de matéria ambiental. Uma constituição nossa, pautada em que, quanto a isso, o art. 28, do CPP,como arma oa juiz do poder de discordar uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos das razões invocadas pelo representante do Ministério Público que pede arquivamento edoconceitos de primeira dimensão ao sustentar seuocorre bojo oquando inquérito marginalizadores policial ou de quaisquer peças de informação. A mesmaem regra reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares incide o caso da mutatio libelli (art. 384, § 1.º, do CPP). Trata-se, por certo, de função fiscalizadora do juiz tendente a preservar a correta aplicação do princípio da legalidade 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres8. Derechos del Imputado. 1.ª ed. Santa Fé: Rubinzal-Culzoni, p. 106, 2007. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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ou obrigatoriedade da ação penal que, no fundo, reflete cooperação penal judicial. Na mesma linha principiológica, temos a hipótese prevista no art. 383, do CPP, que trata da emendatio libelli. Aqui o Juiz colabora com as partes, adequando o tipo penal violado à exposição do fato criminoso contido na peça acusatória (art. 41, CPP), de tal modo que não se pode, com isso, apontar surpresa para a defesa, considerando que o réu não se defende da capitulação da infração penal, e sim do fato que lhe foi imputado. Examinando o modelo cooperativo na gestão do processo judicial, o articulista Pedro Gomez de Queiroz9 leciona: O princípio da cooperação cria deveres de conduta tanto para as partes como para o órgão jurisdicional, que assume uma dupla posição: mostra-se paritário na condução do processo, no diálogo processual e assimétrico no momento da decisão; não conduz o processo ignorando ou minimizando o papel das partes na divisão do trabalho, mas sim em uma posição paritária, com diálogo e equilíbrio.
A verdade processual não deve ser a afirmada pela acusação, muito menos a contraposta na defesa do acusado. Ela deve emergir do convencimento do juiz, a partir da intensa atividade processual desenvolvida em cooperação, dentro do papel dos sujeitos processuais na divisão das tarefas atribuídas a cada um deles. Para influenciar o convencimento do julgador, a verdade processual deve surgir da confirmação dos fatos denunciados (nulla accusatio sine probatione) ou da contrariedade a eles esboçada na defesa. Mas para isso, é indispensável que não só a acusação, mas também a defesa tenha completa liberdade na produção das provas10, o que deve ser amplamente garantido pelo juiz, posto que necessita estar sempre comprometido com a tese da verdade real (nulla probatio sine defensione), assegurando às partes o direito-poder de influenciar na resolução da controvérsia. Ocorre, na prática forense, uma tríplice interação proveniente do trabalho em conjunto que as partes e o magistrado desenvolvem mutuamente em cooperação processual. É, por assim dizer, atividade cognitiva comparticipativa, voltada para um único objetivo, que é a resolução da lide, cujo desfecho, por óbvio, se verifica por meio 9. In RIDB, Ano 3 (2014), nº 10, p. 8252. 10. De acordo com Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, “A parte que não tem o ônus da prova somente deve requerer a produção da contraprova quando temer que a parte onerada possa influir sobre o convencimento do juiz. Porém, o problema surge exatamente quando o juiz não admite a contraprova com base no argumento de que a parte onerada já o convenceu. (...) Mas o fato de o réu requerer a produção de uma prova que não lhe cabe, não significa um desejo de assumir o ônus da prova que grava o autor, mas sim a vontade de influir sobre o convencimento do juiz para demonstrar que o fato constitutivo não existe. De modo que a atitude do réu, em princípio, deve ser vista apenas como contraprova, e não como inversão unilateral do ônus da prova.” (Prova e Convicção. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 213 e 242, 2015).
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de decisão judicial de exclusiva atribuição e competência do juiz. Por essa razão, a 5cooperação AÇÃO POPULAR COMO MEIO DEser TUTELA AMBIENTAL judicial, como princípio de DIFUSO direito, deve vista como um dever dos sujeitos processuais. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atosCOMO administrativos. Permanecem, contudo, certas 3 A COOPERAÇÃO JUDICIAL DEVER DOS SUJEITOS PROCESSUAIS dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo Aegestão descarte, diante inobstante do crescimento vertiginoso e multipolarizado do processo, pertencer ao autogoverno do magistrado, não das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão pode excluir a opinião responsável e democrática das partes, pois ele – comonaagente propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização mediador do diálogo - deve o guardião da liberdade probatória dos desta possibilidade deprocessual atuação cidadã comservistas à conservação do patrimônio litigantes. ambiental brasileiro. Por essa na razão, a cooperação processual, mesmo de ser ao pensada Segue-se, análise a princípio de doutrina e antes legislação, no tocante legislativamente, já eranuma princípio aplicado no campo do direito penal. O juiz polo ativo da demanda leitura da CRFB/88 observados os processual deveres comunais da proteção ambiente, tem legitimidade para ação penal sempredo foimeio responsável peloquem preenchimento do abismo quepropor se abreuma entre as partes popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação no cumprimento da tarefa de produção da prova. Sua missão é fechar os interstícios 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quandoasem sua extensão define durante o probatórios com o objetivo de suplementar ou superar incertezas que surgem que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este adispositivo tramitaçãoser processual. tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto vista, da a doutrina doutrina11 majoritária entende,que como Muito embora existamdesetores e da jurisprudência preferem expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely oMeirelles, Juiz taciturno e abúlico ao invés do provedor, entendo que o mais atuante é o que que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, granjeia o interesse das partes pela prova desprezada garimpa sua de coleta onde os apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando oou direito político eleger litigantes nãoaviram desdobramento prático. Mas tudo deve ser feito sem que seja corresponder um deum fiscalizar. quebrada a harmonia dos elementos probatórios postos em evidência pelas partes. Não fica nem claro,aopermissa vaenia, que existeque uma me refiro,Sem commaiores isto, ao obstinações, juiz prestimoso, empedernido, mas àquele enxerga relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que nas sombras das provas produzidas pelas partes a imagem que necessita para aclarear CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, suas perplexidades. dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência de venha dignidade humana. É O escafandrista não espera que o objetomínima submerso à tona para resgatá-lo. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Ele mergulha emlesionado, águas profundas encontrá-lo superfície. Do omesmo de que, quando o meio para ambiente depreciae trazê-lo de formaà consequencial modo, juiz zeloso, que deve contribuir sempre para a justa solução do mínimooexistencial de cônscio todos osde sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! processo, deve buscar nos intervalos abstrusos da tramitação penal ou nas águas turvas Sendo ao fim e ao cabo, restrição aversa à diretriz que o texto da fonte probatória, a motivação paratal clarificar as abstrações que o impedem de chegar constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de ou à compreensão da realidade que envolve o fato ilícito, quer porque não o entendeu cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar porque as informações não são precisas; quer porque as partes não trouxeram aos autos de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em elementos suficientes para dilucidá-lo, ainda expande que estejaosimplícito. uma realidade comunitária e diversificada, horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Bom juiz, ao nosso sentir, não é o que permanece na superfície mirando o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares terreno fecundo da seara processual, mas o que, a exemplo do alpinista que sobe ao cume da montanha, coloca-se num plano superior para contemplar o panorama processual, a fim de1.ºadubar terreno será plantada cujadeárvore frondosa 1. Art. Qualquerocidadão seráonde parte legítima para pleitearaa semente anulação ou germinadora, a declaração de nulidade atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 11. Vide Aury Lopes Júnior, dentre todos, na obra Direito Processual Penal. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
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resultante dará frutos probatórios que alimentarão a sentença judicial de procedência ou de improcedência do pedido. Ninguém ignora que, para suprir as deficiências ou omissões da queixa ou da denúncia, o juiz possa solicitar, sponte sua, informações à Justiça Eleitoral sobre o cadastro biométrico do acusado, sua localização em face do último local onde exerceu o direito ao voto e outras informações importantes sobre o mesmo. Na mesma linha de raciocínio, ninguém pode achar absurda a iniciativa do juiz que, acometido da dúvida sobre ponto relevante do laudo de lesão corporal, por exemplo, convoca o perito para prestar esclarecimentos em juízo ou, por outro lado, encaminha-lhe expediente para pronunciar-se sobre a dubiedade. Nas duas hipóteses, é indispensável, porém, que o juiz comunique as partes sobre a iniciativa tomada, a fim de evitar possíveis surpresas e prejuízos de qualquer ordem. Visto isso, tomemos como exemplo, ainda, a hipótese frequente da parte que requer, como diligência, a oitiva de pessoa referida no depoimento das testemunhas (da acusação ou da defesa) inquiridas durante a instrução processual. É dever da parte que fizer tal requerimento fornecer o endereço e os elementos necessários para a identificação da mesma, acaso seja conhecida apenas alguma alcunha ou apelido de família e o processo não dispor de outras informações complementares. No que tange à outra parte, cumpre o dever de colaborar com o pleito, cuidando para que não seja apresentada resistência infundada à produção da mencionada prova. No tocante ao juiz, cabe zelar pelo efetivo cumprimento do princípio do direito à produção da prova, ainda que a parte contrária entenda que as provas produzidas já são necessárias para a formação do juízo de convencimento do magistrado, pois o ônus de provar o fato constitutivo imposto ao Ministério Público não elide o dever da produção de contraprova pelo réu. E mais se revela indiscutível a necessidade de produção da prova mencionada no exemplo supracitado, se a pessoa referida tiver sido também apontada, na própria denúncia ministerial, como autora da notitia criminis, mas por razões insondáveis não foi arrolada como testemunha nessa peça acusatória. O titular do jus persequendi in juditio não deve se insurgir contra o requerimento da defesa, nem abusar do poder que lhe confere a lei, tampouco criar embaraço à liberdade de decisão do juiz, pois, no dizer de Enrico Tullio Liebman12, “o processo não é negócio combinado em família”.
12. Eficácia e Autoridade da Sentença e Outros Escritos sobre a Coisa Julgada. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 125, 1984.
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Nesta perspectiva, fica evidente que todas as personagens do processo (partes e 5juiz) AÇÃO COMOpara MEIO DIFUSO DEda TUTELA tem oPOPULAR dever de colaborar o descobrimento verdade,AMBIENTAL posto que nisso repousa o fundamento do interesse processual. Discorrendo sobre o tema, professor argentino Não restam13dúvidas quanto ao caráter de controle popularodireto e eficaz José Cafferata , assim da ação popularNores no controle dospreleciona: atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, imparcialidad así entendida impone la necesidad de asegurar consumo e descarte,Procesalmente, diante do lacrescimento vertiginoso e multipolarizado la real igualdad de ambiente, posibilidadesda entre acusación y defensa para quena cada una das agressões sistemáticas ao meio legitimidade do cidadão pueda procurar – mediante afirmaciones y negaciones, ofrecimiento propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, naobtención, publicização desta possibilidade dey atuação vistas conservação do patrimônio control decidadã pruebas com de cargo y deà descargo, y alegaciones sobre la eficacia ambiental brasileiro. conviccional de todas ellas – desequilibrar los platillos de la balanza a favor de los intereses que cada una representa o encarna.
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativoCom da demanda os deveres comunais efeito, onuma novo leitura CódigodadeCRFB/88 Processoobservados Civil prescreve, em seu art. 7.º, regra da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação que se adapta perfeitamente à situação posta em evidência: popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) contundência emem sua extensão definedeodireitos É assegurada àsa partes paridade dequando tratamento relação ao exercício que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação dispositivo ser tido ecomo não recepcionado pela vigente ordem constitucional. de sanções ao juiz zelar pelo efetivo contraditório. Comungada com esse pontoprocessuais, de vista, competindo a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely processo judicial é o ambiente onde fotografadas iluminadas as Meirelles,Oque em síntese correspondem-se a ideia de são direitos e deveres, eipso facto, relações jurídicas em movimento paradedescobrimento dasdealegações apenas haveria legitimidade genuína pleito quando oe confirmação direito político eleger das partes. Na reconstrução dos fatos denunciados, o magistrado deve agir como o sábio corresponder a um de fiscalizar. historiador. Deve, por obrigação do cargo, transportar-se para o passado e caminhar na obstinações, claro, probatório permissa vaenia, que existe contramãoSem do maiores tempo em direção ao fica conjunto da infração penal, uma mantendo relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a do todo cuidado e paciência para não perder-se em algum labirinto ou encruzilhada CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, caliginoso, trepidante que precisa ser iluminado. dentre muitos, o meioe fatigante ambientecaminho como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade Sabe-se que a testemunha representa os olhos e os ouvidoshumana. do juiz. É Do juiz frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido que não viu e não ouviu nada sobre o episódio criminoso, porque não estava presente de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o no momento de sua consumação, que do precisa ser informado sobre os fatos. Portanto, mínimo existencial de todos os mas sujeitos ordenamento jurídico. Todos! ao determinar a produção de prova testemunhal14, de ofício ou a requerimento da parte, e ao ofim e ao cabo, talolhando restrição aversa à diretriz quedelito o texto perscrutarSendo o testigo, magistrado estará para trás, para a cena do imputado constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de do ao acusado, procurando ver e escutar aquilo que a testemunha viu e ouviu a respeito cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar mesmo, a fim de verificar se o réu é culpado ou inocente. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes direitos de Essa percepção se encontra nitidamente reproduzida na liçãodos irreprochável e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 13. Proceso Penal y Derechos Humanos: la influencia de la normativa supranacional sobre derechos humanos de nível constitucional en el proceso penal argentino. 2.ª ed. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Del Puerto, p. 41, 20011.
14. Para esclarecer a verdade sobre os fatos apontados na peça acusatória e rebatidos na defesa, o Juiz pode determinar, de 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ofício, a realização de qualquer diligência ou tipo de prova, como perícias, inspeções judiciais, acareações, reconhecimentos, ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresvistorias, exames, etc. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Javier Ignacio Baños e Fernando Buján15. Ouçamo-los:
La finalidad del proceso es, a no dudarlo, realizar la idea de justicia prometida en la Constitución. Pero para eso, es necesario, no perder nunca de vista que a la justicia tanto le interesa el castigo del culpable como la libertad del inocente. De lo que se deduce que si para proteger a la sociedad de la anarquía es necesario a veces, que el derecho ordene imponer penas, también lo es que el ordenamiento extreme todos los cuidados para la proteción del inocente.
Daí a impostergável necessidade de a liberdade racional do juiz em decidir, nessa hipótese, não se confundir, de forma alguma, com o que se convencionou chamar de discricionariedade, mas com o exercício dos poderes jurisdicionais, dentre os quais merece destaque o cognoscitivo, que permite a participação ativa do juiz na apuração dos fatos em virtude de determinado caso concreto. O consenso entre as partes e o juiz, para a produção dos meios probatórios, revela a faceta insofismável do princípio da comunhão das provas16. Eis aqui a síntese do princípio da busca da verdade real que, no caso vertente, revela a essência do princípio da cooperação ou da colaboração, posto que vivenciou-se no processo uma verdadeira democracia participativa. Em doutrina, embora se entenda que, em regra, compete às partes a iniciativa da produção das provas, prepondera largamente o entendimento de que cabe ao Juiz romper com a passividade judicial de mero espectador estático17, afastando-se, com isso, a cega e intransigente aplicação do princípio dispositivo, cuja observação ad extremum tolhe a liberdade de ação do magistrado no processo. Vejamos alguns lecionamentos a respeito: A experiência mostra que a imparcialidade não resulta comprometida quando, com serenidade e consciência da necessidade de instruir-se para melhor julgar, o juiz supre com iniciativas próprias as deficiências probatórias das partes. Os males de possíveis e excepcionais comportamentos passionais de algum juiz não 15. Garantías Constitucionales en el Proceso Penal. 1.ª ed. Buenos Aires: Editora Lajouane, p. 23, 2009. 16. Como alerta o inolvidável processualista Hélio Tornaghi: “Outra decorrência do princípio de comunhão da prova é a possibilidade de qualquer das partes retirar, dos meios oferecidos pelo adversário, argumentos em seu favor. O fato, por exemplo, de o Ministério Público ter trazido para os autos um documento não impede, como é óbvio, o defensor de mostrar que o conteúdo dele argúi em favor do réu.” (Curso de Processo Penal. Vol. I. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, p. 269/270, 1989). 17. Em sua monumental obra O Juiz. 3ª ed. Campinas: Millennium, p. 87, 2002, Edgard de Moura Bittencourt afirmou que: “O juiz – diz Augusto Duque – não deve ser figura inerte, como um chefe de Estado, em regime parlamentarista puro. (...). Fora da iniciativa da acusação ou da defesa, alguns juízes nada fazem, nada promovem para o andamento ou instrução dos processos. Se as partes param o processo, fica este parado mesmo. Se a instrução, na promoção das partes, fica insuficiente ou perplexa, nada faz o juiz para defini-la, mesmo quando isso é possível.”
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devem impressionar o sentido de fechar a todos os juízes, de modo absoluto, as
5 AÇÃO POPULAR COMO DIFUSO DE Rangel TUTELA AMBIENTAL portas de um MEIO sadio ativismo. (Cândido Dinamarco. Instituições de Direito Processual Civil, Volume III, 1.ª ed. São Paulo: Editora Malheiros, p. 54, 2001).
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle atos que, administrativos. contudo, Em nossodos sistema a um só tempo,Permanecem, concentra nas partes o ônuscertas da prova, mas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, não retira do juiz a tarefa de produzi-la de ofício sempre que entender necessário, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado o que precisa única forma de interpretaçãodo harmônica dessas das agressões sistemáticas ao existir, meio como ambiente, da legitimidade cidadão na regras, a colaboração entre partes e juiz, dentro do processo, na apuração dos fatos. propositura da ação, épara a ocupação doaspolo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro.Isso, porém, não quer dizer que a atividade instrutória deva ficar concentrada com exclusividade nas mãos das partes. Isto é, que o órgão judicial não possa
Segue-se, na análise a princípio de doutrina legislação,(Luiz no Rodrigues tocante ao atuar nesse terreno, ainda que em caráter esuplementar. Wambier polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais e Evaristo Aragão Santos. O Poder do Juiz e o Controle das Decisões Judiciais. da proteção do meioSãoambiente, quem temdos legitimidade para propor Paulo: Editora Revista Tribunais, p. 157/158, 2008). uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o títulooeleitoral a prova dedecidadania, devendo este No plano jurisprudencial, Superioré Tribunal Justiça firmou entendimento dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. no sentido de que o juiz tem a prerrogativa de determinar a produção de provas que reputar Comungada esse da ponto dedevista, doutrinaante majoritária entende, necessárias aocom deslinde causa, formaaresidual, a inércia das partescomo e no intuito expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely da reconstrução da prova do fato litigioso, para preservar o compromisso processual Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, com aapenas verdade. Os acórdãos abaixo transcritos esboçam essao direito realidade inatacável: haveria legitimidade genuína de pleito quando político de eleger corresponder a um de fiscalizar. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO.
Sem maiores obstinações, fica claro, CRIMINOSA permissa vaenia, que existe LATROCÍNIO, ASSOCIAÇÃO E CORRUPÇÃO DE uma MENORES. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a INICIATIVA INSTRUTÓRIA DO JUIZ NO PROCESSO PENAL. SISTEMA CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, ACUSATÓRIO. COMPATIBILIDADE. LIMITES. PODER RESIDUAL. dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo PARCIALMENTE mote constitucional RECURSO da garantia de existência PROVIDO. mínima de dignidade humana. É A estruturase acusatória processo penal pátrio impede que sobreponham frágil sustentar que a1.cidadania resume do à comprovação documental, no se sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mas em um mesmo sujeito processual as funções de defender, acusar e julgar, mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! não elimina, dada a natureza publicista do processo, a possibilidade de o juiz determinar, mediante fundamentação e sob contraditório, a realização
Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto de diligências ou a produção de meios de prova para a melhor reconstrução constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de dosde fatos, desde queeleitoral, assim proceda de modo residual e complementar cidadania que não éhistórica sinônima cidadania especialmente ao se tratar partes e comUma o cuidado de preservar sua imparcialidade. de tutela de matériaàsambiental. constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e assim, diversificada, ossehorizontes dossoberano direitosde dizer 2. Não fora restaria ao expande juiz, a quem outorga o poder e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o direito, lavar as mãos e reconhecer sua incapacidade de outorgar, como justeza reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares e justiça, a tutela jurisdicional postulada, seja para condenar, seja para absolver o acusado. Uma postura de tal jaez ilidiria o compromisso judicial com a verdade e com a justiça, sujeitando-o, sem qualquer reserva, ao resultado da atividade 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos instrutória dasdospartes, nem sempre suficiente para esclarecer, ao patrimônio da União, do Distrito Federal, Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, satisfatoriamente, para ingresso em juízo, será feita com o os título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. fatos sobre os quais se assenta a pretensão punitiva.
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3. O uso, pelo magistrado, de seus poderes instrutórios, presentes em inúmeros dispositivos do Código de Processo Penal, não autoriza, porém, posturas de vanguarda ou de protagonismo judicial. Assim, deve ser anulada a decisão da autoridade judiciária que, ao manter o recebimento da denúncia, determinou, imotivadamente, a oitiva de delegado e de inspetores de polícia, pois ao determinar, antes do início da instrução criminal, prova não urgente e não requerida pelas partes, o Juiz agiu em substituição aos litigantes. 4. Entretanto, deve ser prestigiada a atividade probatória deflagrada depois do término da audiência de instrução, quando, na própria ata, o Juiz determinou, de ofício, a oitiva de pessoas a que as testemunhas se referiram, de forma residual e em consonância com o art. 209, § 1.°, do CPP, para a correta verificação de fatos referidos durante a produção da prova oral. 5. Recurso ordinário parcialmente provido para declarar somente a nulidade da decisão que, ao ratificar o recebimento da denúncia, ordenou, de ofício, a oitiva de delegado e de inspetores de polícia, devendo tais depoimentos ser desentranhados dos autos do processo, sem prejuízo de que tais testemunhos sejam requeridos pelas partes, na fase do art. 402 do CPP, ou, justificadamente, determinados pelo Juiz, nos termos dos arts. 156 ou 209 do CPP.(RHC 58186/RJ, Sexta turma, Rel. Min. Rogério Schetti Cruz, j. 06/08/2015, DJe 15/09/2015).
RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. HOMICÍDIO TENTADO. NULIDADE NA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. NÃO INTIMAÇÃO DE TESTEMUNHA ARROLADA PELA DEFESA. ARGUIÇÃO EM MOMENTO OPORTUNO. DEMONSTRAÇÃO DO EFETIVO PREJUÍZO. PROVIMENTO DA IRRESIGNAÇÃO. 1. Considerando-se que o recorrente arguiu oportunamente a nulidade do feito pela falta de intimação e oitiva de testemunha arrolada pela defesa, bem como demonstrou a ocorrência do efetivo prejuízo, declaram-se nulos os atos praticados a partir da abertura de vista às partes para alegações finais, a fim de possibilitar o exercício da ampla defesa e do contraditório. 2. Recurso Especial provido. (STJ - Resp 737319/PE - Relator Min. Jorge Mussi - Quinta Turma - Dje 15/03/2010).
Como visto, ao juiz são conferidos muitos poderes no processo. Mas os mesmos devem ser exercidos com extrema cautela para não modificar ou alterar a intenção das partes, que é a demonstração real de suas alegações. Não pode o juiz, no trabalho de iniciativa probatória, criar um abismo entre o que entende e o que pretendem as partes, porque os litigantes, quando defendem seus direitos, se não colaboram para o
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funcionamento da Justiça, confiam que seus atos são fiscalizados e apreciados por um 5juiz AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL imparcial. Não restam dúvidas aquanto ao caráter controledos popular e eficaz O ideal é encontrar justa medida nade apuração fatos direto relevantes. O papel da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas do juiz, portanto, é suplementar a prova quando as partes olvidam o dever de produzi-la dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, satisfatoriamente, poucodiante importando se sua iniciativa, afinal, eaproveite ao autor ou ao consumo e descarte, do crescimento vertiginoso multipolarizado réu. O importante é manter-se e não quedar-se mudo diante indiferença das agressões sistemáticas ao neutro, meio ambiente, da legitimidade do da cidadão na das partes, pois da “ninguém seaexime do dever colaborar com o Poder Judiciário para o propositura ação, para ocupação do polodepassivo e, sobretudo, na publicização 18 com vistas à conservação do patrimônio desta possibilidade de atuação cidadã descobrimento da verdade” (art. 378 , NCPC), nem mesmo o juiz, visto que a expressão ambiental brasileiro. “ninguém”, colocada no início da redação do dispositivo invocado é pronome indefinido. Segue-se, na análise a princípio legislação, no tocante ao das Aliás, na conformidade do art. de 77,doutrina caput e einciso IV, NCPC, “é dever polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais partes e de todos aqueles que, de qualquer forma, participem do processo, cumprir com da proteção do meiojurisdicionais, ambiente, quem tem legitimidade para propor exatidão as decisões de natureza provisória ou final, e não uma criar ação embaraços popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação àPopular sua efetivação”. Pode parecer redundante, mas é imperioso dizer, novamente, (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão defineque o essa regra também seao aplica aoque magistrado como gestor do processo judicial, o qualeste não pode que é cidadania, trazer o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo ser autoritário, qualquer temor19 àspela partes. dispositivo ser nem tido incutir como não recepcionado vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, 3apenas CONCLUSÃO haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. O sistema judicial brasileiro é permeado de dispositivos que permitem o esforço simultâneo das partes e do juiz na claro, busca da verdadevaenia, real, porque reconstruir Sem maiores obstinações, fica permissa que existe uma fatos ocorridos no passado nãonormativa é tarefa simples para quemestendida é humano. relevante incongruência com toda análise atéEssa aqui,prodigalidade, visto que a no CRFB/88, seu bojo, traz a dirigência de ações positivas Estado epara prover, que entanto, nãoemimpede a resistência de determinados setores dadodoutrina do Judiciário dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo vêem na atuação pró-ativa do órgão judicial um estranho entrometimento, notadamente mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É quando toma iniciativas probatórias. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando ambiente depreciacom de forma consequencial o Mas o lesionado, juiz formal,o meio que pouco se importa o andamento da demanda, e mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! fica, como um ser faquírico, indiferente ao panorama processual também não agrada aos jurisdicionados, neme ao É que nãoàhádiretriz mais espaço Sendo ao fim ao Poder cabo, Judiciário. tal restrição aversa que o para textoo Juiz “invisível” no nos processo judicial. O magistradoclara da era ou conceito pós-moderna constitucional dá, dada a impossibilidade de moderna restrição do de tem de mostrarque seunão rosto, de envolver-se com oseleitoral, fatos da especialmente causa que estáaosubmetida cidadania é sinônima de cidadania se tratar a seu de tutela de sob matéria Uma dar constituição a nossa, pautadainjustas em ou julgamento, pena ambiental. de sua omissão margem acomo decisões tardinheiras, uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos inadequadas para o caso sub examine. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 18. O dispositivo conserva a mesma redação do art. 339 do CPC de 1973. 19. Para1.ºLuigi Ferrajoli, “Toda quelegítima um imputado inocente tem razão temer um quer de dizer isto está fora 1. Art. Qualquer cidadão serávez parte para pleitear a anulação ou para a declaração dejuiz, nulidade atosque lesivos da lógica do Estado de direito: o medo e mesmo só a desconfiança ou a não §segurança assinalam a falência da ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] 3º A provadodainocente cidadania, para ingresfunção mesma dafeita jurisdição a rupturaou doscom valores políticos que a legitimam.” (Direito e Razão: Teoria do Garantismo so em juízo, será com openal títuloeeleitoral, documento que a ele corresponda. Penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 441, 2002).
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Do mesmo modo, não há lugar no processo judicial para o juiz covarde ou timorato, que se torna refém das partes e da mídia. Não há também lugar para o juiz tirano, que impõe temor aos jurisdicionados e atropela os mais comezinhos direitos dos jurisdicionados. O processo judicial do nosso tempo exige um juiz moderado, participativo, atuante, denodado e conhecedor de seu papel como julgador. Mas para isso, deve estar atento a todo tipo de manobra que possa prejudicar sua atuação e das partes para a consecução dos objetivos do processo. No âmbito penal, essencialmente de natureza pública, a acusação está a cargo do Ministério Público, que é parte no processo. Por isso, não deve ter nenhum privilégio, muito menos influenciar na decisão judicial, insurgindo-se contra a produção de prova que não interesse à sua tese ou que entenda desnecessária para a formação do convencimento do magistrado. A defesa tem, por força de norma constitucional, as mesmas garantias que o Ministério Público20 possui no processo penal, não devendo, por essa razão, o juiz criminal privilegiar as pretensões do parquet em detrimento de requerimentos da defesa que visam colaborar ou cooperar para a construção de uma decisão justa, equilibrada, equânime, razoável e compatível com a ideia da pacificação social, como função primordial da atividade jurisdicional. Tudo deve ser devidamente ponderado pelo Juiz, com extrema cautela, prudência, independência, transparência e fundamentação, sem permitir interferências temerárias de qualquer uma das partes ou de terceiros. É muito fácil seguir a lei do menor esforço. Mas esse caminho não deve ser o mais cômodo para o juiz que quer manter as partes no plano do equilíbrio e da igualdade processual. A automação nos impede de pensar e de prever as consequências do ato impensado. A alegação a respeito de um fato criminalizado, manifestada por uma das partes no processo, ainda que não contestada pela outra, não pode ser a certeza do juiz. O correto é confrontar as versões apresentadas e sopesar as provas21 para estabelecer um juízo de convencimento. No campo probatório, repita-se, o papel do juiz deve ser de diálogo com as partes e os advogados. Neste imenso território de lugares e de atribuições, todos devem desenvolver intensa atividade processual, com o intuito de dissipar as ambiguidades e fugir do comodismo que os impede de estabelecer o elo com o passado para reconstituição 20. Tratando do tema da paridade de tratamento no processo penal entre o Ministério Público e a defesa, bem como das funções de cada um dos atores do processo, Luigi Ferrajoli enfatiza que “Se é indispensável que o juiz não tenha funções acusatórias, é igualmente essencial que a acusação pública não tenha funções judiciais.” (Op. Cit., p. 467). 21. A certeza que deve ter o Juiz para julgar a causa deve vinculá-lo unicamente à prova produzida nos autos por ambas as partes, e nunca por apenas uma delas isoladamente, pois nas preciosas palavras de Thomas Jefferson “a espada da lei não deve cair nunca senão sobre aqueles cuja culpabilidade é tão evidente que pode ser proclamada tanto por seus inimigos como por seus próprios amigos.”
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do fato criminoso. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL A relação causal aqui estabelecida não possui caráter coercitivo, mas Não erestam dúvidasposto quanto caráter controle popular direto participativo consensual, queaofixa umadefaixa de fronteira entre eoseficaz limites de da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas atuação de cada um dos integrantes da relação triangular. É essa linha divisória que dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, impede de ultrapassar limites de sua atividade jurisdicional para se colocar do consumoo juiz e descarte, dianteos do crescimento vertiginoso e multipolarizado lado de uma dassistemáticas partes em detrimento da outra. da legitimidade do cidadão na das agressões ao meio ambiente, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Afinal, o que caracteriza o regime processual democrático não é somente a desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio liberdade ambiental concedida brasileiro. às partes para produzirem a prova de suas alegações, mas o deverpoder de o juiz também exercitar concorrentemente sua jurisdição com o escopo de na análisedeaque princípio doutrina e legislação, no tocante ao contribuirSegue-se, para a descoberta o fato de típico, antijurídico e culpável se consumou e polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais foi praticado por quem é objeto da acusação. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É textualmente logo nos artigos iniciais da Lei dejudicial, Ação é de O possível dever dodestacar juiz, como administrador do processo e cooperador 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o para esclarecimento, prevenção, lealdade e de proteção. Por isso, deve contribuir sempre que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este adispositivo consecução legítimas pretensões probatórias das partes. serdas tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como Se a prova a ser produzida interessa ao autor e ao réu, o juiz não pode indeferiexpresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely la, ainda que uma das partes, ouvida previamente a respeito, se insurja contra Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, sua produção. Aquilegitimidade incide o denominado da aquisição, ocorre apenas haveria genuína deprincípio pleito quando o direitoque político de quando eleger uma mesma prova,aconforme seu resultado, pode beneficiar qualquer uma das partes, sem que corresponder um de fiscalizar. isso possa ser interpretado como inversão do ônus da prova. Daí porque o juiz não pode Sem maiores obstinações, claro, permissa sob vaenia, que existe umaa parte também indeferir a produção da provafica ou da contraprova, o argumento de que relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a requerente não possui legitimidade para requerê-la, nem lhe compete o ônus probatório. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, meioassim ambiente como elemento compositor um de complexo Caso oo juiz não entenda motu proprio, ou emdeface manifestação mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É 22 contrária do Ministério Público, cabe ao réu impetrar habeas corpus , sob o argumento frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que houve ampla defesa deprecia e do contraditório. Se, por outro olado, o de que, quandocerceamento lesionado, odameio ambiente de forma consequencial indeferimento da produção da sujeitos prova tiver como objetivo impedir o exercício do jus mínimo existencial de todos os do ordenamento jurídico. Todos! persequendi in juditio, compete ao titular da actio poenalis manejar o remédio heróico23 ao fim e aoo cabo, tal restrição adequadoSendo para assegurar-lhe exercício do direito aversa violado.à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de corpus node caso da impossibilidade da oitiva de testemunha arrolada cidadaniaCabe que habeas não é sinônima cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em pela parte, por não haver sido intimada a tempo de comparecer à audiência, deixando uma comunitária diversificada, expandenoosendereço horizontes dos direitos o juizrealidade de atender pedido parae proceder à intimação constante dos autos, e eouvi-la conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o esta oportunamente. Há quem aponte o cabimento de mandado de segurança para reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares hipótese, porque a presença do direito líquido e certo à produção da prova é indiscutível, 22. Há 1.º quem entendacidadão que é cabível também o mandado de segurança criminal, desde que direito violado seja 1. Art. Qualquer será parte legítima para pleitear a anulaçãoem oumatéria a declaração de nulidade deoatos lesivos líquido e certo,dae União, não esteja amparado por habeas corpus. dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresao patrimônio do Distrito Federal, dos Estados, 23. remédio constitucional aqui mencionado pode ser o mandado de segurança ou o habeas corpus, conforme a so emOjuízo, seráheróico feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. circunstância apresentada.
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considerando que a parte arrolou tempestivamente a testemunha, independentemente de ser imprescindível ou não seu depoimento. Também cabe habeas corpus, se for o caso de indeferimento de requerimento de oitiva de testemunha referida, porque o art. 209, § 1.º, do CPP, deixa uma margem de liberdade ao juiz para decidir sobre a conveniência da realização dessa diligência, circunstância que nem sempre é acompanhada de fundamentação sólida, nem coincide com o interesse processual da descoberta da verdade. Assim sendo, resta à parte prejudicada, notadamente o acusado, impetrar o habeas corpus alegando cerceamento de defesa, constrangimento ilegal, inobservância do devido processo legal e ofensa ao princípio do contraditório. Neste particular, entendo que a expressão “conveniente”24, mencionada no § 1.º , do art. 209, do CPP, é temerária, porque deixa ao exclusivo alvedrio do juiz a decisão sobre a oitiva da testemunha referida, conduta incompatível com a ideia de cooperação processual, que representa ofensa à distribuição dinâmica da prova e, acima de tudo, impedimento de atividade aberta à iniciativa, participação e proposição de elementos probatórios por parte dos interessados para garantir que a construção26 da sentença penal não seja algo arbitrário e se notabilize, no final do processo, como símbolo da probidade e da autoridade da coisa julgada. 25
Por conseguinte, não é razoável que o juiz, como guardião das portas de entrada da justiça penal, possa decidir sozinho que por elas não passa nada que o contrarie, porque essa atitude, longe de representar independência, imparcialidade e liberdade jurisdicional, configura completa arbitrariedade humana e o desejo de ocupar o lugar de Deus na vida terrena. Destarte, como premissa derradeira, concluo que o juiz deve se orgulhar do que fez para facilitar o esforço das partes na produção da prova de suas alegações, e não por ter permanecido inerte ante a claudicante marcha processual, que só serviu para mobilizar inultimente a máquina judiciária. Quando falamos na movimentação inútil da máquina judiciária, não queremos afirmar tão somente que a consequência do desleixo do juiz deve ser apenas a absolvição do acusado, mas também a sua condenação com base em frágeis elementos probatórios. É certo que, qualquer que seja a opção tomada pelo juiz, o mesmo será sempre 24. A expressão “conveniente” constante no parágrafo terá melhor emprego se for substituída por “relevante”, posto que não dará a ideia de que a decisão é algo que aproveitaria somente ao Juiz. 25. A prevalecer a diretriz prevista no parágrafo 1.º, do art. 209, do CPP, a redação deve ser modificada. 26. A redação da sentença é tarefa exclusiva do Juiz. Contudo, a construção das ideias que ela apresentará é obra que tem como base o conjunto probatório constante dos autos.
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alvo de ataques acerbos e de críticas virulentas por parte daqueles que não concordarem 5com AÇÃO POPULARadotado, COMOoMEIO DIFUSOpor DEcerto, TUTELA AMBIENTAL o procedimento que implicará, na afirmação da autonomia da jurisdiçãoNão como um atributo do exercício efetivo e regular da atividade restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto eestatal eficazpara a qual o magistrado incumbido. da ação popular no foi controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, preferível o juiz operoso ao desidioso, pois ainda que consumo De e qualquer descarte, modo, dianteé do crescimento vertiginoso e multipolarizado cometa excessosistemáticas em sua iniciativa probatória, fazendo alguma coisa para das agressões ao meio ambiente,estará da legitimidade do cidadão na que o processo nãodapasse apenas como maise,uma linha divisória entre as partes propositura ação,pelo paraJudiciário a ocupação do polo passivo sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã comdar vistas à conservação patrimônio em conflito. Não obstante isso, deve o juiz ciência às partes da do deliberação tomada, ambiental brasileiro. a fim de evitar surpresas desagradáveis e manter o equilíbrio processual e a paridade de armas entre elas. Em resumo, deve tomar a iniciativa da produção da prova residual Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao mantendo a possibilidade dasleitura partesdaexercer o contraditório emdeveres completa igualdade de polo ativo da demanda numa CRFB/88 observados os comunais condições. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Nesse– proceder jurisdicional não estaráquando havendo disparidade, Popular (LAP lei nº4.717/65) a contundência emnenhuma sua extensão define o mas o 27 devido cuidado para com aque adequação da situação jurídica reinante em relaçãoeste aos fatos que é cidadania, ao trazer o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. controvertidos, a partir da visão imparcial do juiz instrutor, que abandona o lugar de mero Comungada com esse de avista, a assimétrica doutrina majoritária entende, como sentinela processual paraponto assumir posição de cooperador judicial, sem que expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely se possa enxergar nisso uma inclinação ou preferência pela pretensão de qualquer uma Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, das partes. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um sem de fiscalizar. Trata-se, sombra de dúvida, de obrigação de cooperação e auxílio que o juiz deve Sem cumprir comoobstinações, gestor do processo. regra de confiança mútua uma tem como maiores fica claro,Essa permissa vaenia, que28 existe baliza o princípio da boa-fé, o qual impõe deveresestendida de cooperação os sujeitos relevante incongruência normativa com toda análise até aqui, entre visto que a processuais para fins colimados pelopositivas processo. CRFB/88, em seuobtenção bojo, trazdos a dirigência de ações do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido ABSTRACT de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos!
This study aims to demonstrate that the principle of cooperation (or collaboration) always highlight came in the Brazilian criminal procedure, therefore not, as proclaimed doctrine of civil procedure, a Sendo ao fim e ao and cabo, tal restrição aversa by à the diretriz que o texto novelty proceduralnos and dá, legislative, it is already beingclara applied a large scale criminal litigations, constitucional dada asince impossibilidade de onrestrição do in conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar especially in criminal cases brought for prosecution of offenses that rely solely on oral exam. In fact, the idea de tutela decooperation matéria could ambiental. constituição comocode a of nossa, pautada of procedural already beUma glimpsed from the criminal the empire, which,em according uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos to Law n.º 261 of 03/12/1841 (art. 25, § 3.º ), allowed the Judge Right trigger and move all the evidence e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o relevant to understand the formation of his decision, regardless of violation of the principle of demand.
reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares
27. Essa deve serserá entendida como uma decorrente direito material para dar efetividade 1. Art. 1.ºadequação Qualquer cidadão parte legítima paranecessidade pleitear a anulação ou ado declaração de nulidade de atos lesivos aos fins colimados pelodaprocesso penal. ao patrimônio União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres-
28. a propósito, Didier Júnior. de Direito Processual Civil: introdução ao direito processual civil, parte so emVeja-se, juízo, será feita comFredie o título eleitoral, ouCurso com documento que a ele corresponda. geral e processo de conhecimento. Vol. 1. 17.ª ed. Salvador: Ed. Jus Podium, p. 112, 2015.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
CRIME E CASTIGO: DA FIXAÇÃO DO DANO MÍNIMO PELO JUÍZO CRIMINAL NO SISTEMA BRASILEIRO Sônia Maria Amaral Fernandes Ribeiro*1 RESUMO Discute-se a aplicação do art.387, inc.IV, do CPC, pelo juízo criminal, frente às diversas teses contrárias. Apresentam-se argumentos em sentido inverso, que demonstram a viabilidade da aplicação da norma, posto que não viola o texto constitucional e tampouco os princípios. Conclui-se que a fixação do dano mínimo é um tributo à vítima, decorrente dos tratados internacionais assinados pelo Brasil. Palavras-chave: Dano mínimo. Aplicação da norma infraconstitucional. Benefício à vítima.
1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES Pode-se dizer que a responsabilização do ser humano pelos atos praticados tem início com o convívio em sociedade. Isto é, no momento que das relações surgiram conflitos de interesses, a par surgiram formas de responsabilização do ofensor. Sendo a responsabilização inicial exclusivamente penal, passo seguinte, com a Lex Aquilia de Damno, datada do final do século III a.C., apresentaram-se os primeiros parâmetros da responsabilidade civil extracontratual, ao permitir que a vítima de um dano injusto tivesse direito a receber uma compensação em dinheiro, fixando-se, assim, dois tipos de responsabilidade: a civil e a penal. Em que pese as responsabilidades civil e penal poderem ser impostas tendo como fonte um só fato, os pressupostos e os elementos que as compõem são diferenciados. Para efeitos de responsabilidade penal, há que se levar em conta se o fato é típico e antijurídico, porquanto pressupostos indispensáveis à caracterização da conduta criminosa. Além disso, para que o fato típico tenha como consequência a imposição da pena, outros elementos devem se apresentar: culpa em sentido amplo (culpa em sentido restrito e dolo); resultado jurídico2; nexo de causalidade entre conduta e resultado; e imputabilidade. Quanto à responsabilidade civil, num brevíssimo caminhar histórico, destacase que no Direito romano a identificação dos elementos que hoje a distinguem, a priori, . Juíza de Direito – TJMA. Mestra em Políticas Públicas – Universidade Federal do Maranhão/UFMA. Mestra em Ciências Jurídicas – Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa/FDUL. sonia.amaral@globo.com *
2. Adotou-se a expressão resultado jurídico, usada por Greco (2005, p.239), para contemplar tanto o resultado naturalístico, isto é, o que produz modificações visíveis no mundo exterior, quanto os crimes de mera conduta, que não produzem modificações visíveis no mundo exterior.
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eram dispensáveis, pois cada delito era autossuficiente na sua caracterização, e, somente 5com AÇÃO COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL a LexPOPULAR Aquilia, esses pressupostos começaram a ganhar relevância, visto que era necessárioNão nomear o elemento iniuria. restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Atualmente, são dos elementos constitutivosPermanecem, da responsabilidade civil: fato, da ação popular no controle atos administrativos. contudo, certas ilicitude, culpa, nexo de em causalidade e dano. Observa-se em de algumas situações, dúvidas quando se trata uma lógica desagregadora dosque, meios produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado existem elementos que podem não se fazerem presentes e, mesmo assim, persistir a das agressões sistemáticas ambiente, legitimidade do cidadão na responsabilidade do autor doao fatomeio que resultou no da dano. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo,caracterizados na publicização Feito esse registro, an passant, sobre os pressupostos dos dois desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio tipos de responsabilidade, é possível concluir liminarmente que alguns desses pressupostos ambiental brasileiro. têm o mesmo significado para ambos e outros são totalmente desconhecidos. Começa-se divergências. Segue-se, napelas análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativoOdapressuposto demanda numa leitura da CRFB/88 os deveres comunais da tipicidade, oriundoobservados da responsabilidade penal, não é da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor umaCivil ação– CC, é pressuposto afeto à responsabilidade civil, posto que o art. 186, do Código popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação norma aberta. Ou seja, toda vez1que o ato resultar em violação de direitos e causar danos Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o poderá ter como consequência devereleitoral de reparar, se de fazendo necessário queeste a conduta que é cidadania, ao trazer que ootítulo é a não prova cidadania, devendo esteja devidamente narecepcionado norma. dispositivo ser tidotipificada como não pela vigente ordem constitucional. De igual a imputabilidade é um elemento da responsabilidade Comungada com maneira, esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como penal expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Hely haver que não encontra similaridade na responsabilidade civil, uma vez que nestaJr.,poderá Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, obrigação de reparar, independente da condição pessoal do agente ofensor. apenas haveria legitimidade de pleito quando direito político de eleger Passa-se aos pontosgenuína de contato, no todo ou emoparte. corresponder a um de fiscalizar. A culpa, conceitualmente, não encontra diferenciação entre os dois tipos de responsabilidade. Todavia, a despeitofica dessa similitude, responsabilidade Sem maiores obstinações, claro, permissaa vaenia, que existecivil umaguarda posição à responsabilidade penal, quando da aplicação alguns relevanteantagônica incongruência normativa com toda análise estendida até aqui,em visto que a casos. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado prover, da Na esfera civil é possível admitir a responsabilidade objetiva, ou seja,para independente dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo existência de culpa, coisa impensável para efeitos penais. mote constitucional da garantia de existência mínimatanto de dignidade humana. É No que concerne ao nexo causal, contudo, a identificação conceitual, frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido quanto aplicação são plenas. há diferenciação o nexo causal, enquanto de que, de quando lesionado, o meioNão ambiente deprecia deentre forma consequencial o elemento da responsabilidade daquele exigido parajurídico. fins de responsabilidade civil. mínimo existencial de todos ospenal, sujeitos do ordenamento Todos! E mais, diferente da culpa, que por vezes sequer se apresenta e mesmo assim ao fim e aocivil, cabo, tal restrição aversa diretriz que o texto subsiste aSendo responsabilidade o nexo causal nos dois àtipos de responsabilização é constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de inafastável, sob pena de sequer existir crime ou ato ilícito. cidadaniaPor quefim, nãoquanto é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se semelhança, tratar às consequências do ato, também se verifica alguma de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em porque o ato ilícito cível e aeprática do crimeexpande apresentam resultadosdos consubstanciados uma realidade comunitária diversificada, os horizontes direitos em danos, diferenciando, porém, quanto à dimensão extensão: no o dano pessoal; e conceitos marginalizadores de primeira ao primeiro, sustentar em seu ébojo o no segundo, o dano da pode ser pessoal e sempre será social. reconhecimento pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima paraE pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos 2 RESPONSABILIDADES CIVIL PENAL: diferenças e semelhanças ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
A grande diferenciação entre a responsabilidade civil e a penal circunscreve-se
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à norma em que estão inseridas: as normas civis, afetas às lesões da esfera privada, dizem respeito à responsabilidade civil; e as normas penais, cuja lesão atinge a ordem pública, à responsabilidade penal. Como consequência, a responsabilidade penal seria de interesse da sociedade; ao passo que a civil diz respeito aos interesses do lesado. Não se quer dizer, entretanto, que o prejuízo imposto ao particular não interesse ao conjunto da sociedade. Ao contrário, toda lesão de direito, seja tipificada como crime, seja considerada ilícito civil, afeta o equilíbrio social, motivo pelo qual o Estado-juiz deve preocupar-se e conferir a correspondente reprimenda. O que se diz é que no ilícito civil o interesse é disponível, podendo ou não o lesado buscar restabelecer o status quo através da propositura da ação judicial competente. Já no ilícito penal, o Estado é quem toma a iniciativa, na maioria das vezes, promovendo a persecução criminal. Outra diferenciação estaria na intensidade da lesão passível de responsabilização. Mesmo considerando que ambas importam na violação de um dever jurídico ou na infração da lei, o ilícito penal se apresentaria com maior nível de gravidade em face do destinatário final da lesão, que é a própria sociedade, o que eleva à condição de maior relevância em razão dos valores em questão. Uma terceira diferença resta evidenciada pelo tipo de resposta que essas responsabilidades desencadeiam. Na responsabilidade civil, a forma de compensar o lesado se dá em termos patrimoniais, ou seja, o agente causador deve reparar o dano com diminuição do seu patrimônio em favor daquele. Na responsabilidade penal, o Estadojuiz confere uma pena ao acusado. Enfim, no primeiro caso, acionam-se mecanismos de reparação civil e, no segundo, movimenta-se o sistema repressivo estatal. Na responsabilidade penal, a norma correspondente, obediente ao princípio nulla poena sine lege, estabelece a tipificação de cada figura tida como criminosa. Na responsabilidade civil, o legislador apenas estabelece na legislação civil substantiva os parâmetros pelos quais a pessoa pode buscar a reparação. Sob outro prisma, a responsabilidade penal é pessoal, intransferível, sendo o réu o único a suportar seu ônus. Já no que concerne à responsabilidade civil, na ausência ou impossibilidade do autor do dano suportar o ressarcimento em prol da vítima com o seu patrimônio, os seus herdeiros ou responsáveis poderão ser demandados, porquanto é o patrimônio do devedor quem suporta a obrigação. O ônus de provar a culpa do acusado, excluídas ações criminais privadas, é sempre do Estado, em caso de responsabilidade penal; enquanto na esfera civil, como regra, este ônus será suportado por quem alega o dano1. A culpabilidade exigida para caracterização da responsabilidade civil permite 1. Art. 333. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
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uma leitura bem mais ampla do que na responsabilidade penal. Enquanto na primeira, por 5vezes, AÇÃO POPULAR COMO MEIOcomo DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL o elemento é até dispensado, na responsabilidade objetiva; no segundo, a depender Não do tipo de culpa, a reprimenda poderá ser excluída. restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz A imputabilidade também serve para traçar a diferença entre certas essas duas da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, responsabilidades. áreaemcível, a responsabilidade do menor de 18 anos, nos dúvidas quando seNa trata umaadmite-se lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante único, do crescimento vertiginoso e multipolarizado termos do artigo 928, parágrafo do CC; enquanto que na área criminal é imputável das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade apenas aquele que, ao cometer o crime, detinha idade mínima de do 18 cidadão anos, poisnaabaixo propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização dessa idade não se sujeita a pena, mas sim às medidas socioeducativas. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambientalRegistra-se, brasileiro. por fim, que o processo criminal guarda independência em relação ao processo cível, uma vez que os processos gerados para apurar as responsabilidades do réu nasSegue-se, esferas penal e cível,a em regra, podem correre de forma paralela, não ao havendo na análise princípio de doutrina legislação, no tocante polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais necessidade da vítima/autor aguardar uma eventual condenação criminal do acusado para da proteção do meio quem tem para propor uma ação só depois ingressar em ambiente, juízo para pleitear umalegitimidade reparação civil. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei dedo Ação Não obstante, se a decisão criminal convergir para a condenação acusado, Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o fará coisa julgada no juízo cível, convertendo-se em título executivo judicial; da que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo estemesma forma que alguns casos de absolvição impedempela nova discussão no juízo cível. dispositivo ser tido como não recepcionado vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos deveres, ipso facto, 3 SISTEMAS PROCESSUAIS DE REPARAÇÃO CIVILeEM FACE DO ILÍCITO apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger PENAL corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma infração penal pode originar dois tiposestendida de pretensão: aquela a relevante A incongruência normativa com toda análise até aqui, vistoque quebusca a punição pelo quetraz dá aensejo à ação a em quedoa Estado parte ofendida persegue a CRFB/88, emEstado, seu bojo, dirigência depenal; ações epositivas para prover, dentre muitos, o meio ambiente como na elemento compositor reparação causada pela lesão, que resulta ação civil ex delicto.de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar a cidadania se ilícito resumepenal à comprovação no sentido A açãoque civil em face do sustenta-se documental, em duas concepções teóricas de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o distintas, desenvolvidas por doutrinadores civilistas da Escola da Exegese: Toullier e mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Merlin. Sendo aoToullier fim e ao restrição aversa à diretriz quedeoilícito texto penal, Defendia quecabo, entre atalação criminal e a cível, nos casos constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de existe há total independência. Diferentemente, Merlin afirmava que entre as duas ações cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar nítida relação de dependência, posto que constituição a sentença penal fazacoisa julgada no juízo de tutela de matéria ambiental. Uma como nossa, pautada em cível, quanto aos fatoscomunitária e autoria, e há identidade de causa, de objeto e de partes ambas. uma realidade e diversificada, expande os horizontes dosentre direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o A conclusão de Toullier de que não hácomo identidade entre as ações, pois a ação reconhecimento da pessoa humanaerae não humana titulares penal visa à punição, e a ação civil à reparação. Em sendo assim, na actio civilis ex delicto o pedido é pela satisfação do dano; e, em alguns casos, nem mesmo há identidade de partes, que a cidadão ação cível pode ser para proposta herdeiros da vítima. 1. Art. 1.ºjáQualquer será parte legítima pleitear apelos anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresTodos os sistemas jurídicos mais ou menos, uma das so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com existentes documento queseguem, a ele corresponda.
tendências teóricas acima citadas, mas cada doutrinador promove divisões e adota 70
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nomenclaturas ao seu livre arbítrio, não havendo, pois, consenso, nesses tópicos. Tourinho Filho (1999, p.8), discorrendo sobre os sistemas processuais de reparação civil decorrente da prática de crime, prega a existência de quatro diferentes sistemas mundo afora, os quais nomina da seguinte forma: a) da confusão, b) da solidariedade, c) da livre escolha, d) da separação. No primeiro sistema, da confusão, é permitido que os dois pedidos de reparação – cível e criminal – integrem um só processo, e que sejam deduzidos no mesmo pedido. No segundo, da solidariedade, a pretensão do lesado pode até constar no mesmo processo, mas só que em pedidos distintos. No terceiro, da livre escolha, cabe ao ofendido a opção de buscar a reparação civil ainda no juízo criminal, ou deixar para pleitear no juízo cível. No quarto e último, da separação, o ofendido não desfruta da alternativa da livre escolha, sendo obrigatório que os processos corram em separado. Baltazar Júnior (2009, p.285), com pequena variação em relação à divisão proposta por Tourinho Filho, aponta os seguintes sistemas: a) união, onde haveria unidade de processos criminal e cível; b) separação absoluta ou independência total, em que entre as ações não persiste qualquer laço, salvo a permissão de utilização de provas emprestadas de um processo para outro; c) separação relativa ou independência relativa, em que a competência jurisdicional é diferenciada, ou seja, ao juiz criminal só é dada competência para processar e julgar a questão da responsabilidade penal; d) adesão, no qual é conferida ao juiz criminal competência ampla, mas é facultado à vítima optar pelo requerimento da indenização naquele juízo. A título de registro histórico, destaca-se, inicialmente, que o Código Criminal brasileiro de 1830 admitia a condenação à reparação dos danos na própria sentença criminal, podendo mesmo converter a prisão em trabalho, caso o réu não possuísse meios de pagar à vítima. No Código Civil em vigor (2002), a exemplo do Código Civil anterior (1916), observa-se que o legislador adotou uma mescla entre as duas teorias. Sobre influência da teoria de Merlin reconheceu-se que a sentença condenatória criminal faz coisa julgada no juízo cível; e com base na teoria de Toullier estabeleceu-se a independência entre as duas ações, fazendo com que estas possam tramitar paralelamente. Nesse sentido, vide o artigo 1.5252, da codificação de 1916; e o artigo 9353, da legislação civil substantiva em vigor. 2. Art. 1.525. A responsabilidade civil é independente da criminal; não se poderá, porém, questionar mais sobre a existência do fato, ou quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no crime. 3. Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.
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Afora isso, reforçando que a separação entre as ações cível e criminal é relativa, 5estabeleceu AÇÃO POPULAR COMO DIFUSO TUTELA o legislador que, seMEIO necessário, podeDE o julgador da AMBIENTAL esfera cível suspender o feito e aguardar o deslinde do processo penal, para então se posicionar. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas E mais:no hoje é possível afirmar que adota-se também o sistema de adesão, indicado dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, por Baltazar Júnior, uma vez que é permitido ao julgador, ainda na esfera criminal, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado fixar adas condenação réu à reparação civil. Todavia da essalegitimidade adesão é de do caráter relativo, agressões do sistemáticas ao meio ambiente, cidadão na pois permite somente a fixação valor dododano juízo criminal e remete ao juízo propositura da ação, para a do ocupação polomínimo passivopelo e, sobretudo, na publicização desta deréu atuação cidadã com vistas conservação do patrimônio cível apossibilidade condenação do ao pagamento integral da àreparação. ambiental brasileiro. Em conclusão, a legislação brasileira adotou o sistema da independência ou na análise a princípio de doutrina legislação, no separaçãoSegue-se, como regra, mas facultou ao juiz cível, noe julgamento da tocante ação exaodelicto, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais suspender o feito até o deslinde da ação criminal, o que torna essa independência mitigada da proteção do meio ambiente, quem tem na legitimidade para propor ação e, por fim, a partir das modificações recentes legislação adjetiva penal,uma foi introduzido popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação oPopular sistema(LAP de adesão relativa. 1 a contundência quando em sua extensão define o – lei nº4.717/65) que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com DO esseDANO pontoMÍNIMO de vista, PELO a doutrina majoritária entende, como 4 DA FIXAÇÃO JUÍZO CRIMINAL expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles,Aque em síntese correspondem-se a ideia direitos e deveres, ipsode facto, fixação do valor mínimo do dano pelodejuízo criminal, a título reparação apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger cível, não se trata de matéria pacificada, a despeito da clareza exposta no art. 387, inc.IV, corresponder a um de fiscalizar. do Código de Processo Penal - CPP. Sem maiores obstinações, fica brasileiros claro, permissa vaenia, que existe 4 Majoritariamente, os tribunais têm entendido que só é uma possível o relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a julgador fixá-los em termos materiais, com base nos seguintes argumentos: a uma, que CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, textualmente está aambiente tratar somente do dano material, poisdea um expressão “prejuízo dentre muitos,a oleimeio como elemento compositor complexo 5 sofrido pelo ofendidoda ” garantia afasta o dano moral; a mínima duas, que estruturalmente inviável ao mote constitucional de existência deédignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido juízo criminal fixar danos morais, sendo esta apuração somente possível no juízo cível. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial todos os sujeitos ordenamento jurídico. Todos! Em sentidodeoposto, crê-se que, do com as recentes modificações, os danos mínimos alcançam as duas variáveis: patrimonial e extrapatrimonial. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos a impossibilidade clara de restrição do conceito de Apesar de,dá, emdada termos usuais, se conferir às palavras ressarcimento, reparação e cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar indenização um tratamento igualitário, como se fossem sinônimas, tecnicamente, porém, de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em nãotutela têm o de mesmo significado. uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensãode ao todo sustentar em seu bojo osofrido, Considera-se ressarcimento o pagamento prejuízo material reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 4. Apelação nº 0029971-78.2010.8.26.0196 (TJ/SP), Apelação nº 0242211-21.2007.8.19.0001 (TJ/RJ), Apelação nº 7391415 (TJ/PR), Apelação nº 785.774-3 (TJ/PR). 5. apresentado FREITAS,Wladimir de Passos de. Condenação civil Ação de Penal funciona na 1. Argumento Art. 1.º Qualquer cidadãopelo serájuiz parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de na nulidade atosnão lesivos prática. Revista São Paulo, em: http://www.conjur.com.br/2009-set-06/condenacaoao patrimônio daConsultor União, do Jurídico. Distrito Federal, dosset.2009. 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abrangendo, pois, o dano emergente e os lucros cessantes, o principal e os acréscimos que adviriam com o tempo e com o emprego da coisa. Como reparação, entende-se a compensação pelo dano moral, a fim de minorar a dor sofrida pela vítima. Ao passo que indenização é termo reservado para a compensação do dano decorrente de ato lícito do Estado, mas lesivo ao particular. Ressarcimento e reparação, portanto, decorrem da prática do ato ilícito, e a indenização tem origem no ato lícito, em virtude do poder Estatal de sobrepor o interesse da coletividade ao do particular. Numa interpretação literal, se o artigo 387, IV, da lei processual penal, que estabelece o dano mínimo a ser fixado no juízo criminal, utiliza a expressão “reparação”, e se “reparação” guarda relação com a forma de compensar a vítima por danos morais enfrentados, não há porque excluir a possibilidade de fixação desse tipo de dano ainda na esfera criminal. Observa-se que, no artigo 64, do CPP, o legislador usa o termo ressarcimento para se referir à ação civil ex delicto, visando à reparação integral da lesão, por puro desapego à terminologia empregada pela doutrina em relação à palavra. Na verdade, apesar de falar em “ressarcimento”, por certo se refere à reparação em termos amplos, já que se trata de ação civil voltada à reparação no juízo cível. Solução diferente, com apego exagerado à literalidade da palavra, impediria a condenação do réu à reparação (danos morais) no juízo cível, em ação civil ex delicto, pois seria considerado como permitida só a ação voltada à compensação pelos danos materiais (ressarcimento). De qualquer maneira, se for considerada a textualidade da expressão utilizada pela norma, acredita-se que, com mais razão, o legislador, ao estabelecer a possibilidade do juízo criminal fixar a reparação por dano mínimo, o fez na perspectiva do dano moral, uma vez que usou o termo “reparação”. O segundo argumento, ou seja, de que o juízo criminal não tem meios de fixar os danos morais, demonstra ser ainda mais inconsistente, se se considerar que o juízo cível se vale do mesmo instrumental, qual seja, a prudente avaliação do julgador. Diferente dos danos materiais, em relação aos quais, não raro, o juiz tem de se valer do auxílio de peritos balizados para poder fixar o quantum devido; nos danos morais, todo e qualquer juiz, independente da área de competência, terá de se valer de boa dose de subjetivismo e dose condizente de discernimento na fixação de valor proporcional e razoável. Não bastasse tudo isso, que reforça não haver razão para afastar a fixação Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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dos danos morais no contexto da legislação processual penal, pensa-se que, quando da 5ocorrência AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DEnão TUTELA AMBIENTAL do ilícito penal, muitas vezes pode até restarem danos materiais, mas dificilmente deixará de existir a lesão extrapatrimonial. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular controle dos atos administrativos. Permanecem, certasmarcas Como no regra, a infração penal, mesmo que sem violência àcontudo, pessoa, deixa dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, indeléveis espírito dos que sofrem a lesão. Acredita-se que oe dano moral é quase que consumo no e descarte, diante do crescimento vertiginoso multipolarizado uma consequência automáticaaodomeio ilícitoambiente, penal, podendo mesmo acontecer sem que das agressões sistemáticas da legitimidade do cidadão naocorra dano material. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ainda quem defenda a impossibilidade de fixação de reparação civil, ambientalExiste brasileiro. em face de qualquer tipo de dano6, remetendo a integridade da matéria ao juízo cível, Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, enodatocante ao valendo-se dos seguintes argumentos: (a) ausência do contraditório ampla defesa, e polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais (b) violação do artigo 125, §1º, da Constituição Federal. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É destacar textualmente logo nos artigos iniciais danoLei de Ação A possível transgressão aos princípios constitucionais, estampados artigo 5º, LV, da 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o Constituição Federal – CF, que preveem, como direito fundamental, que os acusados que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este tenham acesso e à ampla defesa, no fatoconstitucional. da responsabilidade dispositivo ser ao tidocontraditório como não recepcionado pela residiria vigente ordem civil não integrar da açãodepenal. ao não integrar a peçaentende, de acusação, Comungada como objeto esse ponto vista,Logo, a doutrina majoritária comoquando oexpresso réu formulasse defesa, não restaria assegurado o contraditório e, portanto, a defesa na lição sua de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, não seria com a amplitude que a Constituição faculta. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger A CF, em seu inciso II, artigo 5º, estabelece que “ninguém será obrigado a fazer corresponder a um de fiscalizar. ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Mutatis mutandis, se existir lei maioresdeobstinações, ficanão claro, vaenia, que existe uma prevendo Sem a obrigação fazer a pessoa podepermissa se escusar. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88,Corolário em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado parao prover, ao dispositivo constitucional citado acima, tem-se artigo 3º, da dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo com Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/1942, mote constitucional da garantia existência mínima de É as modificações introduzidas peladeLei nº 12.376/2010), quedignidade preceitua humana. que “ninguém se frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial os sujeitos Todos! no artigo 387, Ora, todasde as todos exigências legaisdoe ordenamento consequênciasjurídico. estão previstas do CPP, dentre quais do magistrado fixar aversa o dano mínimo, existentes, Sendoasao fimo edever ao cabo, tal restrição à diretrizdesde que que o texto e, por certo, o direito réu de na sua defesa atentar a apresentação dos argumentos constitucional nos dá,dodada a impossibilidade clarapara de restrição do conceito de contrários a inexistência dos danos. cidadania que indiquem não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em O que comunitária se quer dizer,eem última palavra, é que,os gozando a norma publicidade uma realidade diversificada, expande horizontes dos de direitos epresumida, conceitos sendo marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo exigível a observância por todos, não pode o acusado dizer queodeixou reconhecimento da pessoa no humana e não humana como titulares de promover a sua defesa tocante à responsabilidade civil, e aponte cerceamento de defesa. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres6. Apelação nº feita 0004103-37.2011.8.17.0480 (TJ/PE), Apelação (TJ/RJ), Apelação nº so em juízo, será com o título eleitoral, ou com documento que anºele0056795-09.2009.8.19.0001 corresponda. 2023/2009 (TJ/RJ).
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Porém, é indispensável que o representante do Ministério Público requeira o direito em prol da vítima e o magistrado fixe o valor do dano mínimo, enquanto poder-dever, desde que presentes elementos suficientes para a condenação do acusado e comprovados os danos. Com relação ao advogado do querelante, entretanto, resta facultado o pedido de fixação de reparação do dano mínimo, uma vez que se trata de um poder-querer. Assim, cumprirá ao Ministério Público ou ao advogado do querelante, quando oferecer denúncia e queixa-crime, respectivamente, requerer de plano a fixação de dano mínimo, apontando provas nesse sentido; ao advogado de defesa compete, na peça de oposição, tentar afastar, por todos os meios cabíveis, a responsabilidade civil, também indicando provas no sentido oposto ao pleiteado pela vítima; e o julgador deve (não pode) fixar o dano mínimo, se comprovado. Todavia, entende-se que, para não caracterizar burla aos princípios constitucionais, o Ministério Público ou o advogado do querelante devem reduzir o pedido a termo, quando da apresentação da peça inicial, sob pena de, não deduzindo no que consistem os danos alegados, de fato inviabilizar a defesa plena do réu/querelado. No tocante à inconstitucionalidade do art.387, IV, do CPP, com fulcro no art. 125, §1º, da CF, que teria avançando sobre a competência dos tribunais estaduais ao conferir atribuições cíveis ao julgador da esfera criminal, quando a lei de organização judiciária estadual teria fixado somente competência criminal, pensa-se que não se sustenta. É fato que a Carta de 1988 estabeleceu a competência dos tribunais estaduais para organizar o Poder Judiciário de cada ente federado, podendo distribuir a competência por matéria por seus diversos juízes. Entretanto, não é dessa matéria que trata o artigo 387, IV, da legislação adjetiva penal. De fato, esse artigo trata de matéria processual, tanto que inserido no CPP, cuja competência é exclusiva da União. Seguindo essa direção, o STJ firmou jurisprudência7, afastando a inconstitucionalidade por esse argumento. Não bastasse isso, conclui-se que, a vingar posição em sentido contrário, representa também um quadro de confusão entre os diversos julgadores, ferindo o princípio da unicidade da jurisdição8. Na Justiça Estadual, nas instâncias iniciais, o juiz detém competência cível e criminal, o que resultaria, em tese, na possibilidade deste 7. A Constituição – ao outorgar, sem reserva, ao Estado-membro, o poder de definir a competência dos seus tribunais (art. 125, § 1º) – situou positivamente no âmbito da organização judiciária estadual a outorga do foro especial por prerrogativa de função, com as únicas limitações que decorram explícita ou implicitamente da própria CF. Desse modo, a matéria ficou subtraída do campo normativo da legislação processual ordinária: já não incide, portanto, na área da jurisdição dos Estadosmembros, o art. 87 do CPP.” (HC 70.474, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 17-8-1993, Primeira Turma, DJ de 24-9-1993). 8. A legislação processual pátria é uma e deve ser aplicada por todos os magistrados no território nacional.
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fixar o dano mínimo; enquanto o juiz criminal de entrância final, cujas competências são 5especializadas AÇÃO POPULAR MEIO DEnão TUTELA AMBIENTAL e detémCOMO atribuição cível DIFUSO ou criminal, poderia decidir da mesma forma. Nãocontexto restam dúvidas quanto ao caráter de controle diretonae eficaz No infraconstitucional, outras teses se popular apresentam tentativa de da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas inviabilizar a fixação do dano mínimo: que fere o princípio da inércia do juiz9 e que se dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, trata de pedido extra petita. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas meio ambiente, da prosperar. legitimidade do cidadão na Tais teses contráriasaotambém não merecem propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade dedano atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio A fixação do mínimo em favor da vítima é uma determinação legal e efeito ambiental brasileiro. da condenação, integrando o seu conteúdo decisório. Segue-se, na análise a princípio de doutrina contrários e legislação, no tocante Malgrado reconhecer-se que os argumentos à aplicação doao art.387, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais IV, do CPP, até aqui expostos, não se sustenta, é forçoso reconhecer que existem da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação outras teses que,Éapesar de não inviabilizar o dispositivo sobartigos comento, merece certa reflexão. popular? possível destacar textualmente logo nos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o Primeiro, quem o juiz criminal a fixardevendo o dano mínimo que é cidadania, ao há trazer quedefenda o títuloser eleitoral é a provaobrigado de cidadania, este em todo e qualquer a 2ª Seção do TRF1, nos Embargos Infringentes dispositivo ser processo, tido comocomo não entendeu recepcionado pela vigente ordem constitucional. nº 0000884-16.2009.4.3600, emde quevista, não havia sequer vítima determinada. Comungada com esse ponto a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely fato, que, apesar de aser um de poder/dever de o julgador fixar o dano Meirelles,De que emacredita-se síntese correspondem-se ideia direitos e deveres, ipso facto, mínimo, nos casos em que não há vítima determinada, óbvio não hádeque se cogitar apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando opor direito político eleger corresponder a um de fiscalizar. a fixação do dano mínimo sob o argumento de que o crime ofendeu genericamente a sociedade. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante O incongruência análise estendida que a uma propósito donormativa legisladorcom foi toda de conceder à vítima,até e aqui, não àvisto sociedade, CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, reparação mínima de imediato. Ademais, com relação à vítima indeterminada, o dano dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo perde dois elementosdaconstitutivos – certeza emínima pessoalidade –, descaracterizando mote constitucional garantia de existência de dignidade humana. É tal pressuposto inafastável quando se de reparação civil. documental, no sentido frágil sustentar que a cidadania se fala resume à comprovação de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o Segundo, de quetodos o Ministério carece dejurídico. legitimidade mínimo existencial os sujeitosPúblico do ordenamento Todos!para requerer a 10 fixação do dano mínimo, por conta de decisão pacificada pelo STF , que estabelece como sendo atribuição da Defensoria Pública, houver, promover a execução sentença Sendo ao fim e ao cabo, tal onde restrição aversa à diretriz que o da texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de condenatória ou ação civil ex delicto em favor daqueles considerados pobres, modificando, cidadania não é do sinônima em parte, aque aplicação dispostodenocidadania artigo 68,eleitoral, do CPP. especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos 9. Apelação nº 0004103-37.2011.8.17.0480 e conceitos marginalizadores de(TJ/PE) primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o 10. MINISTÉRIO PÚBLICO - AÇÃO CIVIL EX DELICTO - CÓDIGO PROCESSO PENAL, ART. 68 - NORMA reconhecimento da pessoa humana e não humana comoDEtitulares AINDA CONSTITUCIONAL - ESTÁGIO INTERMEDIÁRIO, DE CARÁTER TRANSITÓRIO, ENTRE A SITUAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE E O ESTADO DE INCONSTITUCIONALIDADE - A QUESTÃO DAS SITUAÇÕES CONSTITUCIONAIS IMPERFEITAS - SUBSISTÊNCIA, NO ESTADO DE SÃO PAULO, DO ART. 68 DO CPP, ATÉ QUE SEJA INSTITUÍDA E REGULARMENTE ORGANIZADA A DEFENSORIA PÚBLICA LOCAL RECURSO DE 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos- lesivos AGRAVO IMPROVIDO. - RE: 341717 Relator: CELSO DE Data de Julgamento: 05/08/2003, ao patrimônio da União, do(STF Distrito Federal, dosSP, Estados, dosMin. Municípios[...] § 3ºMELLO, A prova da cidadania, para ingresSegunda Turma, Data com de Publicação: DJe-040 DIVULG 04-03-2010 PUBLIC 05-03-2010 EMENT VOL-02392-03 PPso em juízo, será feita o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 00653 RSJADV mar., 2010, p. 40-41)
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Realmente, não pode o Ministério Público ingressar no juízo cível pleiteando reparação decorrente de ilícito penal em favor da vítima pobre. Porém, no que concerne à legitimidade do Ministério Público pleitear a fixação do dano mínimo quando do oferecimento da denúncia, acredita-se que a decisão da mais alta Corte de Justiça do país não lhe afasta tal atribuição e, desta feita, independente da condição socioeconômica da vítima. A decisão do Supremo Tribunal Federal não se põe em oposição, pois tem como destino unicamente a ação civil ex delicto, e fixação do dano mínimo haverá de ser pleiteado no corpo da denúncia. 5 CONCLUSÕES Em tempos mais recentes, tem crescido sobremaneira a preocupação com a vítima, direta ou indireta, do ilícito penal. Afinal, se por um lado, foi importante o combate às atrocidades dos castigos aplicados àqueles que cometiam delitos, a partir da humanização das penas e respeito à dignidade da pessoa humana; por outro, de algum tempo a sociedade se ressentia de ações voltadas às vítimas dos delitos. No Brasil, quanto à maior valorização da vítima do ilícito penal, visando tutelar também os seus interesses, exemplos de modificações legislativas nessa direção não faltam: multa reparatória11 a ser revertida em prol da vítima, prevista no Código de Trânsito Brasileiro - CTB; composição dos danos, prevista na Lei nº 9.099/95, em substituição à pena restritiva de liberdade12; Lei nº 9.807/99, que versa sobre o programa especial de proteção das vítimas ameaçadas; e a Lei nº 11.690/2008, que incluiu no CPP a previsão de assistência psicossocial, jurídica e à saúde, a ser custeada pelo ofensor ou pelo Estado. No campo normativo internacional, destaca-se a criação de dois mecanismos que conferem direitos às vítimas: Declaração dos Princípios Fundamentais de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder (Resolução 40/34, de 1985); e os Princípios e Diretrizes Básicos sobre o Direito das Vítimas de Violações das Normas Internacionais de Direitos Humanos e do Direito Internacional Humanitário a Interpor Recursos e Obter Reparações (Resolução 60/147, de 2005). 11. Lei nº 9.503/1997: “Artigo 297. A penalidade de multa reparatória consiste no pagamento, mediante depósito judicial em favor da vítima, ou seus sucessores, de quantia calculada com base no disposto no § 1º do artigo 49 do Código Penal, sempre que houver prejuízo material resultante do crime. § 1º A multa reparatória não poderá ser superior ao valor do prejuízo demonstrado no processo. § 2º Aplica-se à multa reparatória o disposto nos artigos 50 a 52 do Código Penal. § 3º Na indenização civil do dano, o valor da multa reparatória será descontado.” 12. Artigo 72. Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.
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Com relação à Resolução 40/34, realça-se que restou assegurada a rápida 5reparação AÇÃO POPULAR COMOpela MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL do prejuízo sofrido vítima, e pela Resolução 60/147 o direito à adequada, efetiva e célere reparação dos danos sofridos pela vítima. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos Permanecem, Nas resoluções citadas sãoadministrativos. claras as exigências para quecontudo, os paísescertas signatários dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, criem marcos normativos voltados à reparação das vítimas de danos decorrentes consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado de infrações penaissistemáticas e que as decisões se efetivem em da tempo razoável. do cidadão na das agressões ao meio ambiente, legitimidade propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Pari passodecom as orientações órgãos internacionais, bem como em desta possibilidade atuação cidadã comdos vistas à conservação do patrimônio observância ao disposto no artigo 245 da CF, o Brasil editou a Lei nº 9.807/99, instituindo ambiental brasileiro. normas de assistência e proteção às vítimas e testemunhas e, mais precisamente, em análise civil a princípio de doutrina legislação, relação aoSegue-se, direito dena reparação da vítima, o próprioeartigo 387, IVnodotocante CPP, aoaoadmitir polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais a fixação de dano mínimo pelo juízo criminal. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação E possível mais: com a Emenda Constitucional nº 45/2004, pelo acréscimo ao artigo 5º 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o do inciso LXXVIII, o direito de todos à duração razoável do processo foi considerado que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este como princípio dispositivo ser constitucional tido como nãofundamental. recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de a normas doutrinaasseguram majoritária comodireito Em conclusão, se, por umvista, lado as ao entende, infrator amplo expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely de defesa eque garantem quecorrespondem-se a execução da pena imposta ao ofensor se concretize Meirelles, em síntese a ideia de direitos e deveres, ipso facto,dentro dos marcos constitucionais; outro,de napleito atualidade, volta-se também à vitima, tentando apenas haveria legitimidadepor genuína quando o direito político de eleger minorar os danos em face do delito. corresponder a umenfrentados de fiscalizar. Com a aplicação do art.387, IV, dopermissa CPP, devevaenia, ser encarada pelos uma julgadores Sem efeito, maiores obstinações, fica claro, que existe da esfera criminal como normativa meio de proporcionar à vítima, de forma imediata, minoração relevante incongruência com toda análise estendida até aqui, vistoaque a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, do dano suportado por conta do crime. dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de os dignidade humana. É Afinal, como já exaustivamente demonstrado, argumentos contrários à frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido fixação do dano mínimo, por qualquer ângulo que se analise, não se sustentam. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos sujeitos do“prejuízo ordenamento jurídico. Todos! diz respeito a Resta evidente que os a expressão sofrido pelo ofendido” eventuais danos materiais e/ou morais; o juízo cível não dispõe de capacidade diferenciada Sendo ao fim emoral; ao cabo, aversa à diretriz que o atexto para quantificar o dano cabetalao restrição Ministério Público ou à vítima, depender, constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de requerer na denúncia/queixa-crime a fixação do dano mínimo quando da prolação cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar da sentença o que refuta a tese da ausência de contraditório e ampla de tutela condenatória, de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada emdefesa; não violaçãocomunitária do art. 125, e§1º, da CF, já que o art.387, do CPP, dos disciplina umahá realidade diversificada, expande os IV, horizontes direitosmatéria eprocessual, conceitos de marginalizadores de primeira dimensão aoviolação sustentardoem seu bojo competência exclusiva da União; não há principio daoinércia reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares do juiz e tampouco se trata pedido extra petita, posto que o julgador cumpre determinação legal e o dano mínimo é parte integrante do conteúdo decisório, e; não pode o Ministério Público ingressar com o pedido de reparação no juízo cível, mas pode, e deve, postular a 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos fixação dodadano oferecer a denúncia. ao patrimônio União,mínimo do Distritoquando Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Importante realçar que é indispensável que o Ministério Público ou o advogado do querelante requeiram tal fixação, para possibilitar que o réu/querelado conheça do pedido e exerça o contraditório. Todavia, entende-se que o juiz criminal não está obrigado a fixar o dano mínimo em toda e qualquer decisão, notadamente quando ficar comprovada a inexistência de danos ou for a vítima indeterminada. REFERÊNCIAS BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. A sentença penal de acordo com as leis de reforma. In: Guilherme de Sousa (Coord.). Reforma do processo penal. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2009. DIAS, José de Aguiar. Responsabilidade civil em debate. Rio de Janeiro: Forense, 1983. ______. Da responsabilidade civil. 11. ed. rev., atual. e aum. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. ______. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1944. v.1. ______. Da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1944. v.2. DOSTOIÉVSKI, Fiódor Mikháilovitch. Crime e castigo. Rio de Janeiro: Nova Cultura, 1993. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2005. v.1. JESUS, Damásio E.de. Direito penal: parte geral. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. LEMES, Alexandre Barbosa. Direito processual penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. v.1. LOURENÇO, Paula Meira. A função punitiva da responsabilidade civil. Coimbra: Ed. Coimbra, 2006. JARDIM, Afranio Silva. Direito processual penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1995.
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______. Código de processo penal interpretado. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2000. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL MUCCIO,Não Hidejalma. Curso de processo penal.de 2. controle ed. São Paulo: Método, restam dúvidas quanto ao caráter popular direto e2011. eficaz __________. Prática de processo penal: teoria e prática. 4. ed. São contudo, Paulo: Ed. HM, da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, certas 2005. dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressõesE.Magalhães. sistemáticas Direito ao meio ambiente, da legitimidade cidadão na NORONHA, penal. São Paulo: Saraiva, 1979.dov.1. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2013. ambiental brasileiro. PEDROSO, Fernando Almeida. Processo o direito de defesa: repercussão, Segue-se, na de análise a princípio depenal: doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais amplitude e limites. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo artigos iniciaiscivil: da Lei Açãodos SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas danos responsabilidade dade erosão Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o filtros da reparação à diluição danos. 4. ed.éSão Paulo: 2012.devendo este que é cidadania, ao trazer que odos título eleitoral a prova de Atlas, cidadania, dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. STOCO, Rui.com Tratado responsabilidade doutrina e jurisprudência. ed. São Comungada essedeponto de vista, a civil: doutrina majoritária entende,8.como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando oedireito político de civil. eleger8. ed. TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito das obrigações responsabilidade corresponder a um de fiscalizar. São Paulo: Método, 2013. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma THEODORO JÚNIOR, Humberto. Responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 3. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, ed. Rio de Janeiro: Aide, 1993. v.1. dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional garantiadadeCosta. existência mínima de21. dignidade humana. É TOURINHO FILHO,daFernando Processo penal. ed. São Paulo: Saraiva, frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido 1999. de que,v.2. quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! ______. Código de processo penal comentado. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. v.1. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional dada penal a impossibilidade de restrição do conceito de ______. Códigonos de dá, processo comentado. 2.clara ed. São Paulo: Saraiva, 1997. v.2. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em VALLER, Wladimir. A reparação do dano moral no Direito brasileiro.dos Sãodireitos Paulo: Ed. uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes E.V, 1994. marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o e conceitos reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares ZAFFARONI, Eugenio Raúl., PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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A CONSTRUÇÃO DOS CÍRCULOS RESTAURATIVOS COMO MECANISMO ALTERNATIVO DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS Luana Duarte Assunção de Freitas∗ 1 RESUMO O presente trabalho possui como escopo a explicitação acerca da Justiça Restaurativa, bem como de uma das suas práticas, denominada Círculos Restaurativos, expondo também os princípios e a forma que se dá a construção da referida prática restaurativa, e como sua aplicação pode ser uma medida viável e compatível juridicamente com a dinâmica processual dos Juizados Especiais Criminais. Esse estudo vem sendo trabalhado pelo grupo de pesquisa Sistema Punitivo e Violência de Gênero: ressignificando a cidadania a partir da Justiça Restaurativa, desenvolvida pelo Núcleo de Justiça Restaurativa – NEJUR, promovida pela Faculdade Pitágoras do Maranhão. Nesse sentido, ao partir de referências bibliográficas, valeu-se, de forma exordial, do método de pesquisa hermenêutico e fora adotado o método indutivo, visto que o referido estudo, para chegar à demonstração da verdade, partiu de fatos particulares. Palavras-Chave: Círculos Restaurativos. Juizados Especiais. Justiça Restaurativa.
1 INTRODUÇÃO Diante de um cenário de demasiada penalização e de inflexibilidade de princípios tais quais da obrigatoriedade da ação penal pública e da indisponibilidade, bem como, de outro lado, um cenário de comprovação do distanciamento, cada vez maior, do objetivo de criação e intensificação de uma harmonia social e diminuição da criminalidade, a Constituição Federal de 1988 previu a criação de juizados especiais criminais destinados ao tratamento de crimes de menor potencial ofensivo, e baseado – dentre outros – no princípio da disponibilidade, tendo como alternativa à aplicação de pena privativa de liberdade, a conciliação e a transação penal. Posteriormente, a Lei nº 9.099/95 entrou em vigor, dispondo acerca dos juizados especiais cíveis e criminais, prevendo uma dinâmica informal, baseada na oralidade, e institutos tais quais a transação penal, composição civil dos danos, e suspenção condicional do processo. . Graduanda em Direito e Bolsista de Iniciação Científica da Faculdade Pitágoras em São Luís- MA. Graduanda em Filosofia pela Universidade Federal do Maranhão – UFMA. Integrante do grupo de pesquisa Sistema Punitivo e Violência de Gênero: Ressignificando a cidadania a partir da justiça restaurativa desenvolvida pelo Núcleo de estudos sobre Justiça Restaurativa – NEJUR. luanafragosofreitas@hotmail.com *
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Este artigo, tem como escopo a explicitação de como se dá a construção dos 5círculos AÇÃOrestaurativos, POPULAR eCOMO MEIO DIFUSO DEcomo TUTELA quais seus princípios, bem de queAMBIENTAL forma sua utilização é viável e compatível juridicamente com a forma de enfrentamento crimes de menor Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle populardos direto e eficaz potencial ofensivo no âmbito juizados especiais Permanecem, criminais. da ação popular no controle dosdos atos administrativos. contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, círculo restaurativo é uma das práticas desenvolvidas com base no consumo e Odescarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado paradigma da Justiça Restaurativa, na comunicação não violenta, na reflexão, das agressões sistemáticas ao meiopautada ambiente, da legitimidade do cidadão na no empoderamento na autorresponsabilização, no propiciar de diálogo, na propositura da ação, das parapartes, a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta deeles atuação cidadãconstruídos com vistas objetivando à conservação do patrimônio escutapossibilidade empática, etc., vêm sendo a resolução de conflitos ambiental brasileiro. de maneira pacificada e eficaz. Com o propiciar de cooperação e engajamento entre os participantes, não só a reparação do dano sofrido se torna possível, como também a Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao reestruturação de relações intersubjetivas rompidas em razãoosdadeveres ação ofensiva – ordem polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados comunais patrimonial afetiva. da proteção edo meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Nesta questiona-se: de que forma a construção círculosdefine restaurativos 1 Popular (LAP – leifeita, nº4.717/65) a contundência quando em suados extensão o éque medida viável ao e compatível a dinâmica e institutos doseste Juizados é cidadania, trazer que o juridicamente título eleitoral écom a prova de cidadania, devendo Especiais Para tanto, compreende-se a necessidade de análise e interpretação dispositivoCriminais? ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como tais dos dispositivos da Lei nº 9.099/95, mais precisamente os que tratam de institutos expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., quais: transação penal, composição civil dos danos, e suspenção condicional doHely processo, Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, de acordo com os fins sociais a que eles se destinam. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma 2 A JUSTIÇA RESTAURATIVA relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em bojo,Restaurativa traz a dirigência açõesde positivas do Estadoàpara prover, A seu Justiça é um de modelo justiça destinada complementação dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo das finalidades do modelo de justiça tradicional. Como um modelo novo e em mote constitucionalsuadaconstrução garantia deestá existência mínima de não dignidade humana. desenvolvimento, desenvolvimento, possuindo, nesteÉpasso, frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido uma conceituação universalodeterminada. de que, quando lesionado, meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! A Organização das Nações Unidas (ONU) propôs a seguinte conceituação para Justiça Restaurativa: Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de A justiçaderestaurativa refere a umespecialmente processo para resolver crime, tendo cidadania que não é sinônima cidadaniaseeleitoral, ao se otratar como cerneUma corrigir os danos causados a de tutela de matéria ambiental. constituição como àsa vítimas, nossa, incentivar pautada infratores em se responsabilizarem suas ações muitas vezes,dos também, envolver a uma realidade comunitária e diversificada,porexpande ose,horizontes direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seudasbojo o é uma comunidade na resolução desse conflito. A participação partes reconhecimento da pessoaparte humana e não humana como titulares essencial do processo, a qual enfatiza a construção de relacionamentos, reconciliação e de desenvolvimento de acordos em torno de um resultado desejado entre as vítimas e agressor. [...] Através dele, a vítima, o infrator 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos a comunidade recuperaram algum§ controle o processo. Além disso, ao patrimônio da União, do Distrito eFederal, dos Estados, dos Municípios[...] 3º A provasobre da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que avezes ele corresponda. o próprio processo muitas pode transformar as relações entre a
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comunidade e o sistema de justiça como um todo. [Tradução livre] (Criminal Justice Handbook Series. Handbook on Restorative justice programmes, p. 6, 2015).
Para Ted e Bem Wachtel, e Terry O’Connell (2010), o termo “Justiça Restaurativa” é um termo genérico, enquanto que “Justiça Verdadeira” (‘Real Justice’) é uma marca registrada para um enfoque específico de justiça restaurativa. A Justiça Restaurativa contém uma gama de valores, objetivos e princípios claramente determinados. Dentre eles, pode-se destacar: instrumento de inclusão; reparação do dano; processo de empoderamento das partes; desenvolvimento do diálogo; respeito; responsabilidade. Segundo Howard Zehr (2010), a Justiça Restaurativa possui três dimensões, quais sejam: princípios e valores, comunidade, e as práticas restaurativas. Os princípios, ou ações-chave apontados por Zehr (2010), da Justiça Restaurativa são: 1.Focar os danos e consequentes necessidades da vítima, e também da comunidade e do ofensor. 2.Tratar das obrigações que resultam daqueles danos (as obrigações dos ofensores, bem como da comunidade e da sociedade). 3.Utilizar processos inclusivos, cooperativos. 4. Envolver a todos que tenham legítimo interesse na situação, incluindo vítimas, ofensores, membros da comunidade e da sociedade. 5.Corrigir os males.
A proposta da Justiça Restaurativa, como atuação de política pública, é a aplicação de medidas que visem à inclusão de todas as partes no processo de reconstrução das relações enfraquecidas, como a vítima, a comunidade, e o ofensor. Nesta feita, pretende-se que a manutenção da coesão social seja alcançada por meio de mecanismos capazes de fomentar o sentimento de comunidade (união), trabalhando no sentido de que a população é também responsável pela abertura de possibilidades de reconstrução de relações interpessoais enfraquecidas, é parte interessada na abordagem digna e eficaz acerca de tudo que envolve a quebra de relações intersubjetivas. Ademais, o principal escopo da Justiça Restaurativa é a reparação do dano causado. Diferentemente de simplesmente encontrar uma culpa e um culpado, o modelo de justiça em comento pretende reparar o dano causado. Tal medida é de essencial importância no que se refere à manutenção de uma harmonia social, visto que, com o acontecimento do ato ofensivo, é como se uma ferida fosse causada no organismo social. Assim, com cicatrização da mesma (reparação do dano), o organismo social mantearse-á inteiro novamente, harmonicamente mais saudável.
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Segundo Ted e Bem Wachtel, e Terry O’Connell, (2012): 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL
Verdadeiramente, o tribunal rouba o crime da vítima. O foco do processo
Não restam dúvidas quanto ao da caráter direto e eficaz é a determinação culpa de do controle infrator oupopular a aplicação da pena. Apesar de a da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas vítima ter sofrido o crime, a justiça define a infração como um crime contra dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, o estadodo e concede ao juiz e aovertiginoso júri o direito deeserem lenientes ou rígidos, de consumo e descarte, diante crescimento multipolarizado liberarem o infrator das consequências ou de ordenarem uma pena das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na severa. vítimas nãodo determinam nem têm voz significativa no resultado. propositura da ação, para As a ocupação polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio O Estado se põe como vítima dos delitos cometidos, posto que encara o ambiental brasileiro. acontecimento delituoso como um ferimento à norma. Porém, a verdadeira vítima do Segue-se, na análise princípio e legislação, no Esta, tocante acontecimento é aquela que deafato sofreudeasdoutrina consequências danosas. no ao entanto, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais é posta – no processo penal -, como mera espectadora da atuação do Estado. Não é da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação proposto à vítima a valorização que a mesma merece, importando-se popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais dapouco Lei decom Açãoos seus sentimentos, suas1pretensões, comquando o que ela dizer. O define processo Popular (LAPseus – leidesejos, nº4.717/65) a contundência emtem suaaextensão o a ser seguido é firme, ao rígido, portanto, contribuição significativa vítima, e que é cidadania, trazernão quecabendo, o título eleitoral é aaprova de cidadania, devendodaeste dispositivo como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. menos aindaser da tido comunidade. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo social Mancuso, A comunidade, organismo queHumberto também Theodoro sofre comJr.,osHely impactos Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, causados pelo acontecimento delituoso, sequer é compreendida como vítima no modelo apenas haveria legitimidade genuína políticodedeparticipação eleger de justiça consolidado atualmente. Esta de templeito aindaquando menos oa direito possibilidade e corresponder a um de fiscalizar. envolvimento dos procedimentos voltados à tomada de decisões. Sem obstinações, fica claro,partes permissa vaenia, que existe uma O maiores distanciamento das referidas (vítima e comunidade) ao processo relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a contribui quebojo, a justiça seja sentida por elas. Como meros espectadores, o CRFB/88,para em seu traz a não dirigência de ações positivas do Estado para prover, sentimento de que a justiça foi concretizada passa distante das suas percepções. dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Neste a Justiça Restaurativa propõe a realização deno umsentido processo de frágil sustentar quepasso, a cidadania se resume à comprovação documental, empoderamento das partes.o Desta forma, o processo passa a ser vivido pelasopartes, de que, quando lesionado, meio ambiente deprecia de forma consequencial mínimo existencial de todos os do ordenamento jurídico. Todos! demonstrando a importância dassujeitos suas contribuições. É dado às partes a oportunidade de solução do problema conforme suas necessidades e pretensões, e não em conformidade Sendo ao fimdoe Estado ao cabo, tal restrição diretriz quecom o texto com o ideal de solução – o qual pode, poraversa vezes, ànão condizer o almejado constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de pelas partes. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e3 CONSTRUINDO conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o OS CÍRCULOS RESTAURATIVOS reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares No âmbito da Justiça Restaurativa, encontram-se as práticas restaurativas, compreendidas, segundo Howard Zher (2010), como uma das três dimensões da Justiça 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Restaurativa. Porém, cabe lembrar que, segundo Ted e Bem Wachtel e Terry O’connell ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres(2010), construção das práticas antecede a formação conceitual da Justiça so em juízo,a será feita com o título eleitoral, ourestaurativas com documento que a ele corresponda.
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Restaurativa. As práticas restaurativas são diversas (v.g., reuniões restaurativas, círculos restaurativos, reunião de grupo familiar, círculos de construção de paz), utilizadas, conforme o próprio nome propõe, com o escopo de restaurar. A ocorrência de um fato ofensivo causa consequências danosas, seja no âmbito financeiro, emocional, social, etc., as quais necessitam ser restauradas, na medida em que relações intersubjetivas entre a vítima e o ofensor, ou entre o ofensor e membros da comunidade tenham sido fragilizadas. No Brasil, a observação dos valores e princípios da Justiça Restaurativa, bem como a utilização de práticas restaurativas teve como início o Projeto Justiça para o Século 21, inicialmente coordenado pelo juiz da 3ª Vara do Juizado Regional da Infância e Juventude de Porto Alegre, Leoberto Brancher. As práticas restaurativas foram construídas com o escopo de resolução de conflitos e pacificação de violências envolvendo adolescentes em conflito com a lei. Os círculos restaurativos foram utilizados, ainda, como forma de prevenção não só do cometimento de atos infracionais, mas de qualquer ato violento. Os círculos restaurativos são caracterizados como uma prática informal, e, conforme o caso, necessitam de uma equipe interdisciplinar (como por exemplo, psicólogos, assistentes sociais, educadores, clínicas de reabilitação) para proporcionar todo o apoio necessário às pessoas que estarão envolvidas nas práticas, e às suas necessidades, contribuindo para que o acordo elaborado pelas partes seja cumprido, por elas da melhor maneira possível. Enquanto uma das práticas restaurativas, os círculos apresentam elementos próprios, dentre eles: os valores universais de cada um (o facilitador pode pedir para que cada participante escreva em um papel um valor universal que considere de suma importância naquele momento, ou na sua vida, o qual será colocado no centro do círculo); o facilitador é pessoa capacitada que, por meio da escuta empática e da comunicação não violenta, auxilia os envolvidos durante o desenvolvimento do círculo, garantindo os princípios da Justiça Restaurativa. Em relatório do secretário-geral sobre Justiça Restaurativa e em relatório do Grupo de Especialistas em Justiça Restaurativa, em encontro ocorrido em Ottawa, de 29 de outubro a 1º de novembro de 2001, alguns dos elementos dos círculos restaurativos são conceituados, conforme se segue: 3. Resultado restaurativo significa um acordo construído no processo restaurativo. Resultados restaurativos incluem respostas e programas tais como reparação, restituição e serviço comunitário, objetivando atender as
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necessidades individuais e coletivas e responsabilidades das partes, bem
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DEdaTUTELA assim promover a reintegração vítima e do AMBIENTAL ofensor.
Não restam dúvidas quanto ao caráter deocontrole direto e eficaz 4. Partes significa a vítima, ofensor epopular quaisquer outros indivíduos ou da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas membros da comunidade afetados por um crime que podem estar envolvidos dúvidas quando se trata em emum uma lógica desagregadora dos meios de produção, processo restaurativo. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meiosignifica ambiente, da legitimidade do cidadão na justa e 5. Facilitador uma pessoa cujo papel é facilitar, de maneira propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização imparcial, a participação das pessoas afetadas e envolvidas num processo desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio restaurativo. ambiental brasileiro. Segue-se, análise a princípio e legislação, no restaurativos tocante ao é a Um dosnaprincipais objetivos de dadoutrina construção de círculos polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais construção de um acordo entre a vítima, o ofensor e membros da comunidade afetados, da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação que vise a reparar os danos sofridos. Os referidos danos podem ter sido tanto de popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Açãoordem 1 patrimonial, ordem emocional. Assim,quando a reparação ocorrer de oacordo Popular (LAPcomo – lei de nº4.717/65) a contundência em suadeverá extensão define com necessidades e possibilidades dos participantes, modo a reparar danos e, que éas cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova dede cidadania, devendooseste dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. mais ainda, restaurar laços intersubjetivos rompidos entre as partes, com base no respeito Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como e responsabilidade. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos eestimula deveres, ipso facto, de Ademais, a construção de círculos restaurativos a formação apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger uma comunidade participativa, cooperativa, engajada na reconstrução dos vínculos corresponder enfraquecidosa um comdeofiscalizar. acontecimento ofensivo, na reparação dos danos causado, possibilitando, assim, um ambiente de pacificação e harmonia. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a Segundo Costello, Joshua e Ted Wachtel (2012), resultados fazem parCRFB/88, em seuBob bojo, traz a dirigência de ações positivas doestes Estado para prover, te da utilização, que foi denominado eles de compositor um “processo e os três comdentre muitos, odomeio ambiente como por elemento de justo”, um complexo ponentes deste processo são: mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia deemforma consequencial Engajamento — envolver indivíduos decisões que os afetam oao escumínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! tarem seus pontos de vista e genuinamente levar em conta suas opiniões; Sendo ao fim eExplicação ao cabo,— tal restrição aversa à diretriz que o texto explicar o raciocínio por trás de uma decisão a todos os enconstitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de volvidosdeoucidadania afetados poreleitoral, ela; cidadania que não é sinônima especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Clareza de expectativas expande — assegurar todos entendam claramente uma uma realidade comunitária e diversificada, osque horizontes dos direitos decisãodee oprimeira que é esperado deles noaofuturo. e conceitos marginalizadores dimensão sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares O envolvimento direto em um processo de elaboração de um acordo, em que as opiniões são levadas em consideração a todo momento, bem como pensadas e 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos refletidas, resulta umFederal, engajamento por parte dos participantes ao patrimônio da União, doem Distrito dos Estados, maior dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, paraenvolvidos; ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. ainda, os componentes de explicação e clareza de expectativas, garantem a possibilidade 86
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de exposição de sentimentos, emoções, raciocínios e pretensões, e que as mesmas – e tudo mais pronunciado nos Círculos - serão compreendidas perfeitamente por todos os participantes do Círculo. 3.1 As etapas do Círculo Restaurativo Em um primeiro momento, anterior à própria construção dos círculos, existe a etapa de adequação. Nesta etapa, o facilitador, pessoa devidamente capacitada para construção e condução – de forma neutra – das práticas restaurativas, deve, de acordo com a situação fática trazida a ele, escolher qual a prática restaurativa mais adequada, a qual deverá ser utilizada. Tendo sido escolhido, portanto, durante a fase de adequação, o Círculo Restaurativo como a prática mais adequada para a situação, a primeira etapa de construção do círculo deverá ser a realização do pré-círculo. Nesta etapa o facilitador irá definir as pessoas que irão participar do círculo – o autor e o principal receptor do ato em questão, e aqueles que indiretamente foram impactados pelo ato e que são corresponsáveis pelo contexto em que o mesmo surgiu. Após, irá prepará-las, explicando a elas acerca das características da referida prática – como por exemplo, a voluntariedade, o respeito, a honestidade, a horizontalidade, a necessidade de escutar o outro. As pessoas, após serem informadas dos objetivos e da dinâmica do Círculo Restaurativo, deverão assinar o termo de consentimento, confirmando o entendimento acerca do explicado a ela, em duas vias, uma para o participante e outra para o facilitador. Ainda, é nesta etapa que o facilitador formula as perguntas que irá pronunciar aos participantes durante a segunda etapa – o círculo -, as mesmas devem ser feitas de forma clara e pronunciadas em uma linguagem acessível a todos os participantes. Estas perguntas possuem o condão de conduzir o círculo restaurativo, guiando as pessoas ali presentes a uma escuta empática, como por exemplo: “Como você está se sentindo? O que você ouviu ele dizer? Foi isso mesmo que você disse?”. As respostas devem sempre ser compreendidas, por isto questiona-se o que as pessoas ouviram o outro dizer, e se foi realmente isto que foi dito. Ainda, indaga-se, além dos sentimentos, as consequências geradas por determinado ato, o que se deseja receber e o que se deseja conceder ao outro. É na segunda etapa, chamada círculo, que estas perguntas devem ser ditas
pelo facilitador, direcionadas a todos os participantes do grupo; elas serão pronunciadas objetivando um direcionamento para a compreensão mútua, a autorresponsabilização e o acordo, como por exemplo: “O que você estava buscando quando fez aquele ato?”, “O que vocês gostariam de ver acontecer agora?”, “O que você gostaria de oferecer?” Durante esta etapa, cada pessoa envolvida – vítima, sociedade, ofensor – irá Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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expressar seus sentimentos, irá compartilhar o que está sentindo no momento, como se sentiu 5quando AÇÃO MEIO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL da POPULAR ocorrência doCOMO ato ofensivo, o que gostariaDE de receber, quais são suas necessidades, e o que gostaria de oferecer ao outro. Neste momento, por meio da fala, do compartilhamento do Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz que se sente e se no sentiu, por meio da escuta, do entendimento acerca doscontudo, sentimentos do outro, da ação popular controle dos atos administrativos. Permanecem, certas ocorre uma compreensão o quelógica favorece uma reestruturação ou estruturação de relações dúvidas quando se tratamútua, em uma desagregadora dos meios de produção, intersubjetivas fragilizadas. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado
das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na Desde primeira etapa, odofacilitador devee,fazer uso dana escuta empática, bem propositura da ação,apara a ocupação polo passivo sobretudo, publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio como da comunicação não violenta. Deve acolher os participantes, fazendo-os se sentir ambiental à vontade,brasileiro. em um ambiente seguro para exporem qualquer coisa. Para tanto, deve-se evitar o uso de adjetivos, não devendo haver julgamentos acerca de qualquer coisa dita Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao pelos participantes. O facilitador deve os participantes ajamcomunais com respeito e polo ativo da demanda numa leitura da solicitar CRFB/88que observados os deveres que não haja agressões durante a realização círculo. Casopara algum participante promova da proteção do meio ambiente, quem temdolegitimidade propor uma ação agressões outro, odestacar facilitador deve interromper círculo iniciais e remarcá-lo outra data. popular? Éaopossível textualmente logo noso artigos da Leipara de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o Ainda, objetiva-se que, nesteé a prova momento, ocorra devendo o processo que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral de cidadania, este de autorresponsabilização, se torne possível a construção de um acordo, ou dispositivo ser tido comopara nãoque recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto dea ser vista, a doutrina majoritária como consenso entre os participantes, construído, nesta etapa, porentende, eles e para eles. No expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely pelo decorrer do diálogo, desenvolvido por meio das respostas às perguntas elaboradas Meirelles, em sínteseque correspondem-se a ideia de direitos ipso facto, na facilitador,que pretende-se cada participante discorra sobree deveres, sua responsabilidade apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger concretização ou na concretização de uma reparação às consequências corresponder ado umato de danoso, fiscalizar. deste ato. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma Como resultado do acordo o plano de açãoaté será escrito, que relevante incongruência normativa comfirmado, toda análise estendida aqui, vistoem que a serão listadas as em ações futuro, com prazos determinados para que para aconteçam; CRFB/88, seu para bojo,otraz a dirigência de ações positivas do Estado prover, todos deverão estar deoacordo assinar ocomo plano elemento de ação. compositor de um complexo dentre muitos, meio eambiente mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É A que última etapa, chamada é voltada para no a concretização frágil sustentar a cidadania se resumepós-círculo, à comprovação documental, sentido do acordo. Ao término do ocírculo, será marcada a data realização do pós-círculo. de que, quando lesionado, meio ambiente deprecia de de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Não existe um distanciamento temporal pré-determinado, o qual irá depender de cada situação, a ser analisado pelo facilitador. Esta última etapa é construída com o propósito Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição à diretriz o texto de verificar o cumprimento do acordo elaborado na aversa etapa anterior, bemque como verificar se constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de ocidadania acordo está tendo resultados satisfatórios para todos os participantes. que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Todos irão avaliar os resultadosexpande do acordo os dos pontos negativos, uma realidade comunitária e diversificada, os firmado, horizontes direitos positivos do marginalizadores mesmo, e suas sugestões. Caso dimensão os resultados estejam satisfatórios, e conceitos de primeira ao não sustentar emsendo seu bojo o irá ser discutido da o que pode ser feito ou humana alteradocomo para que os resultados venham a ser reconhecimento pessoa humana e não titulares satisfatórios. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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4 A APLICABILIDADE DOS CÍRCULOS RESTAURATIVOS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS Em conformidade com o acima exposto, acerca dos princípios dos círculos restaurativos, ao observar os princípios que regem os juizados especiais criminais, e os objetivos pretendidos no mesmo, verifica-se a total compatibilidade da construção dos círculos com o ordenamento jurídico brasileiro no tratamento de crimes de menor potencial ofensivo. Para tanto, observa-se o previsto na Carta Magna acerca da criação dos juizados especiais: Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumariíssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;
Assim, a construção dos juizados especiais – sejam cíveis ou criminais – direcionam-se para um ambiente de informalidade relativa, em que proporciona e direciona à possibilidade de resolução do conflito por vias alternativas à privação de liberdade. Nesse sentido, a construção de círculos restaurativos não só coaduna com o procedimento sumaríssimo, de informalidade relativa, o qual impera nos juizados especiais, como também cumpre papel significante no atingimento do escopo de construção de paz – enquanto desenvolve o papel de integração social entre membros da comunidade, infrator e vítima -, de formulação de acordos – os quais são vivenciados mais fortemente pela vítima e infrator, posto que construídos por eles mesmos, e não apenas ofertados a eles -, e da fortificação da cidadania – por tudo exposto, bem como pela elevação do grau de autorresponsabilização. Interpretando certos dispositivos de forma sistêmica, e de acordo com os fins sociais a que eles se destinam, conforme art. 5º da LINDB, nota-se que os objetivos acima dispostos representam perfeitamente o espírito da Constituição Federal em vigor, a qual recebe apelido de “Constituição Cidadã”, porquanto claramente possui finalidade social de efetivação de direitos de cidadania, de direitos humanos, e de harmonia social. Não obstante imperar, no Direito Processual Penal brasileiro, o princípio
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da indisponibilidade e da obrigatoriedade da ação penal pública, a Lei nº 9.099/95, a 5qual AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELAdaAMBIENTAL dispõe sobre os juizados especiais, sob previsibilidade Constituição, trouxe a flexibilização dos referidos princípios, com a criação de um ambiente consenso, e Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular diretodee eficaz com a possibilidade da transação penal, da composição civil, e da suspenção condicional da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas do processo para se os trata crimes menor potencial ofensivo. dos meios de produção, dúvidas quando emdeuma lógica desagregadora consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Neste viés, observa-se o que dispõe os 70 a 74 do da referida das agressões sistemáticas ao meio ambiente, daartigos legitimidade cidadão Lei: na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Art. 70. cidadã Comparecendo o autoràdoconservação fato e a vítima,doe não sendo possível a desta possibilidade de atuação com vistas patrimônio realização imediata da audiência preliminar, será designada data próxima, ambiental brasileiro. da qual ambos sairão cientes.
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao Art. leitura 71. Na da falta do comparecimento dos envolvidos, a polo ativo da demanda numa CRFB/88 observadosdeos qualquer deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma Secretaria providenciará sua intimação e, se for o caso, a doação responsável popular? É possível destacar logo civil,textualmente na forma dos arts. 67 nos e 68 artigos desta Lei.iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer Art. que 72. o título eleitoralpreliminar, é a provapresente de cidadania, devendodoeste Na audiência o representante Ministério dispositivo ser tido comoPúblico, não recepcionado pela vigente ordem constitucional. o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely composição dos danos e dade aceitação aplicação Meirelles, que em sínteseda correspondem-se a ideia direitosdaeproposta deveres,deipso facto,imediata de pena não privativa de liberdade. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Art. 73. A conciliação será conduzida pelo Juiz ou por conciliador sob sua orientação. fica claro, permissa vaenia, que existe uma obstinações,
Sem maiores relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a Parágrafo único. Os são auxiliares da Justiça, recrutados, na CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência deconciliadores ações positivas do Estado para prover, forma da leicomo local, preferentemente entre bacharéis em Direito, excluídos os dentre muitos, o meio ambiente elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É que exerçam funções na administração da Justiça Criminal. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Art.o74. A composição danos civis reduzida a escrito e, homologada de que, quando lesionado, meio ambientedosdeprecia deserá forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.
Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nossódá,hádada a impossibilidade clara adepossibilidade restrição do conceito de da Não a previsibilidade, ou seja, de ocorrência cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar composição civil, como há a instrução de dever buscar-se, sempre que possível, a de tutela de dos matéria Umaobjetiva-se constituição a nossa, pautada em entre composição danosambiental. cíveis. Assim, quecomo o conflito seja solucionado, uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos infrator e vítima, na presença do Público, advogados e juiz, a elaboração e conceitos marginalizadores deMinistério primeira dimensão ao sustentar em com seu bojo o de um acordo entre infratorepara haja acomo reparação dos danos causados, o qual reconhecimento da vítima pessoaehumana nãoque humana titulares irá dar fim à instauração de um processo. Nesta audiência preliminar, na qual objetiva-se a formulação de um acordo
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3ºrestaurativos, A prova da cidadania, para ingres-prática entre vítima e infrator, é cabível a construção de círculos enquanto so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. restaurativa que possui o escopo de, ao final, se chegar a um acordo. Além, os acordos
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alcançados por meio da construção dos Círculos são mais dotados de participatividade dos integrantes da prática, porquanto são eles mesmos que constroem, passo a passo, voluntariamente, e com mais intensidade, os acordos que deverão ser cumpridos. Neste passo, a eficácia do acordo construído, ou seja, a probabilidade do seu cumprimento se demonstra maior, posto que os indivíduos se sentem mais confortáveis diante de um acordo que foi inteiramente construído por eles mesmos. Segundo E. Cordeiro, apud Luiz Augusto da Veiga Elias, Apesar de certo sucesso das penas alternativas que foram introduzidas no Código Penal brasileiro, e da suspensão do processo e transação penal no caso dos crimes de menor potencial ofensivo, é preciso resgatar a convivência pacífica no ambiente afetado pelo crime, em especial naquelas situações em que o ofensor e a vítima têm uma convivência próxima‟, lembra o juiz Asiel Henrique de Sousa, vice-presidente da Comissão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, instituída para estudar a implantação de um projeto-piloto em Brasília.
O autor já citado, ainda, assevera que: A metodologia restaurativa poderá ser empregada na construção da conciliação e da transação penal, a partir do espaço de consenso por ela introduzido, que permite o diálogo restaurativo, inclusive ampliando para contemplar outros conteúdos – emocionais, por exemplo – trazidos pelas partes e que podem ser colocados.
Portanto, bem mais que reparar danos patrimoniais, os círculos restaurativos objetivam a restauração dos laços intersubjetivos rompidos, com a prática de atos, pelo ofensor, que visem a uma restauração do conteúdo emocional que sofreu danos com o ato ofensivo. Além, conforme previsão do art. 76 da Lei nº 9.099/95, o membro do Ministério Público pode ofertar ao autor do fato um acordo, ou seja, é ofertado ao autor a possibilidade de o mesmo cumprir pena restritiva de direito ou efetuar o pagamento de multa, especificadas na proposta. Neste viés, perfeitamente cabível a construção do círculo restaurativo como ferramenta para a chegada a um acordo entre as partes, posto que possível que o mesmo seja revisto pelo Ministério Público e homologado pelo juiz; com maiores chances do
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referido acordo ser cumprido, uma vez que construídos pelo envolvimento das próprias 5partes. AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Dispõe ainda a dos referida Lei acerca da suspensão condicional docertas processo: da ação popular no controle atos administrativos. Permanecem, contudo, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, Art. 89. do Nos crescimento crimes em que avertiginoso pena mínima cominada for igual ou inferior consumo e descarte, diante e multipolarizado a umao ano, abrangidas ou não da por esta Lei, o Ministério Público, ao das agressões sistemáticas meio ambiente, legitimidade do cidadão naoferecer propositura da ação, para aa ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro desta possibilidade de atuação cidadã vistas conservação do patrimônio anos, desde que ocom acusado não àesteja sendo processado ou não tenha sido ambiental brasileiro. condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Códigono Penal). Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais § 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação do Juiz, este, recebendo a denúncia, poderá da suspender o processo, popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais Lei de Ação 1 submetendo o acusado a período prova, as seguintes condições: Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quandodeem suasob extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo; dispositivo ser tido comoI - não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como II - proibição de freqüentar determinados lugares; expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em sínteseIII correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Juiz; corresponder a um de fiscalizar. IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma informar e justificar suasanálise atividades. relevante incongruência normativa com toda estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, § 2º O Juizcomo poderáelemento especificarcompositor outras condições a quecomplexo fica subordinada dentre muitos, o meio ambiente de um a suspensão, desde que mínima adequadas fato e à situação mote constitucional da garantia de existência deaodignidade humana.pessoal É do acusado. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o § 3º os A suspensão revogada se,jurídico. no curso Todos! do prazo, o beneficiário mínimo existencial de todos sujeitos doserá ordenamento
vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo
Sendo ao fim ejustificado, ao cabo,a tal restrição aversa à diretriz que o texto reparação do dano. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de § 4º Adesuspensão ser revogada se o acusado vier a ser cidadania que não é sinônima cidadaniapoderá eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos qualquer outra condição imposta. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Frisa-se, aqui, a possibilidade de determinação, pelo juiz, de outras condições a que fica subordinada a suspensão condicional do processo. Ou seja, admite-se a adoção 1. 1.º Qualquer cidadão parte legítima para pleitear a anulação a declaração nulidade lesivos de Art. medidas além dasserá necessariamente previstas nosouincisos dode§1º do de art.atos89, mas que ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingrestenham a natureza, objetivos e valores condizentes com a finalidade social a que se propõe so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. o instituto da suspensão, e que sejam adequadas ao fato e à situação do acusado. 92
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Nesta feita, a participação em processo restaurativo, tal qual o círculo restaurativo – desde que seja da vontade das partes – e o cumprimento do acordo elaborado pelos participantes da prática, são medidas possíveis e adequadas segundo o previsto do §2,º do art. 89. Conforme anteriormente exposto, as características, princípios e valores da Justiça Restaurativa se coadunam perfeitamente à finalidade a que se propõe os juizados especiais criminais, bem como ao seu procedimento. Ademais, o acordo a ser elaborado na prática restaurativa em questão surge das necessidades e possibilidades dos participantes, ou seja, as próprias partes elaboram um acordo segundo o que podem oferecer e o que desejam receber. Este acordo, ademais, deve ser dotado de proporcionalidade, não sendo possível, nas práticas restaurativas, haver um acordo demasiado oneroso para um dos participantes, e nem desproporcional. É inegável que a dinâmica e os institutos trazidos pela Lei nº 9.099/95, que dispõe sobre os juizados especiais criminais, favorecem a prática da justiça consensual, por meio da despenalização; da flexibilização de princípios como a indisponibilidade e obrigatoriedade da ação penal pública; e da criação de um ambiente desburocratizado e informal, onde predomina a oralidade.
Porém, a resolução dos conflitos apenas por meio dos mecanismos da conciliação ou do oferecimento de um acordo elaborado unilateralmente é um engessamento das possibilidades de resolução de conflitos, mecanismos estes que se têm demonstrados insuficientes. Insuficientes mais ainda para as vítimas, que por vezes o que mais precisam é ter a reparação do conteúdo emocional – tipo de reparação esta que não é abrangida pelos mecanismos citados . 4 CONCLUSÃO Os juizados especiais criminais, regidos pela Lei nº 9.099/95, destinamse ao tratamento de crimes de menor potencial ofensivo, objetivando, por meio da despenalização e desburocratização, a diminuição da criminalidade, e, consequentemente, a criação e intensificação de uma harmonia social. Prevendo uma dinâmica informal, baseada na oralidade, e institutos tais quais a transação penal, composição civil dos danos, e suspenção condicional do processo, os juizados flexibilizaram princípios até então inabaláveis do Direito Processual Penal, como o princípio da indisponibilidade, e obrigatoriedade da ação penal pública. Desenvolvido com base no paradigma da Justiça Restaurativa, o círculo restaurativo é uma das diversas práticas restaurativas. Seu desenvolvimento é baseado na reflexão, no empoderamento dos participantes, na comunicação não violenta, na
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autorresponsabilização, no diálogo, na escuta empática. Pretende-se, com a construção 5dos AÇÃO POPULAR COMO MEIOdos DIFUSO TUTELA AMBIENTAL círculos restaurativos, a resolução conflitosDE de maneira eficaz e pacífica, chegandose a um acordo que deve ser construído, passo a passo, pelos participantes, de acordo Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz com suas necessidades e possibilidades; o acordo nãoPermanecem, pode ser, ainda, desproporcional e da ação popular no controle dos atos administrativos. contudo, certas demasiadamente oneroso a qualquer um dos participantes. dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Com o propiciarao de meio cooperação e engajamento entre osdo participantes, das agressões sistemáticas ambiente, da legitimidade cidadão nanão só apropositura reparação do dano sofrido se torna possível, como também a reestruturação de relações da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio intersubjetivas rompidas em razão da ação ofensiva, ou seja, a construção de círculos ambiental brasileiro. restaurativos possibilita não apenas o ressarcimento de um bem ou um valor, mas uma restauração de ordem afetiva, emocional, atuando além do que as medidas de resolução Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao de conflitos Lei nº 9.099/95 têm alcançado. polo ativo daexpressamente demanda numaprevistas leitura danaCRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação Assim, destacar tem-se que a construção restaurativos somente popular? É possível textualmente logodos noscírculos artigos iniciais da Leiédenão Ação compatível juridicamente com1 aacontundência dinâmica e quando os institutos juizados Popular (LAP – lei nº4.717/65) em sua dos extensão defineespeciais o criminais, comoao também umao alternativa viável de resolução de conflitos, que é cidadania, trazer que título eleitoral é a prova de cidadania, devendoque estegarante dispositivo ser tido como não recepcionado vigente ordem respostas constitucional. a possibilidade do sistema de justiça criminalpela oferecer diversas ao conflito, Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como conforme as peculiaridades do mesmo. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. 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Todos! nos Círculos Restaurativos como instrumento de efetivação dos direitos de cidadania. 2015.125 Sendo ao fim eemaoDireito) cabo, tal restrição aversa à diretriz texto f. Dissertação (Mestrado – Universidade de Santa Cruz doque Sul-o UNISC. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de Santa Cruz do Sul, 2015. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela Kay. de matéria ambiental. Umateoria constituição a nossa, PRANIS, Processos circulares: e prática.como São Paulo: Palaspautada Athena,em 2010. uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos WACHTEL, Ted; O’CONNELL, Terry; WACHTEL, Ben. Reuniões Justiça e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar emdeseu bojoRestauo reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares rativa: real justice (justiça verdadeira) e guia de reuniões restaurativas. 1. ed. Pensilvânia: INTERNATIONAL INSTITUTE FOR RESTORATIVE PRACTICES, 2010. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou aBob. declaração de nulidade de atos lesivos nas WACHTEL, Ted; WACHTEL, Joshua; COSTELLO, Círculos Restaurativos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresEscolas. Construindo um sentido de comunidade e melhorando o aprendizado. EUA: so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. International Institute for Restorative Practices, 2012.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
DEZ ANOS DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA: BREVE BALANÇO DAS AÇÕES DE ACCOUNTABILITY DO CNJ NOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA ESTADUAIS (2005-2015) Francisco Soares Reis Júnior*1 RESUMO A accountability é definida como uma instituição fundamental nas sociedades contemporâneas, em especial como contrapeso às limitações das democracias representativas. No caso do Poder Judiciário brasileiro, a accountability atua como mecanismo de enfrentamento à opacidade no exercício desse poder, bem como para corrigir os déficits de controle, de transparência e de eficiência. Enquanto os Tribunais de Justiça passaram a ter garantias de independência, os mecanismos internos de controle, sobretudo, as Corregedorias de Justiça, demonstraram ser insuficientes e disfuncionais para estabelecer limites, fixar metas e punir desvios de conduta. Nesse cenário, o Conselho Nacional de Justiça foi criado em 2004, com a função de remodelar a governança judicial dos tribunais e ser a agência central de accountability judicial. Sendo assim, este artigo se propõe a realizar um balanço das ações e dos programas do CNJ que tenham características de accountability, com enfoque no segmento do Tribunais de Justiça, para analisar se houve a formação de um modelo definido de accountability em sua primeira década de funcionamento. Palavras-Chave: Accountability. Conselho Nacional de Justiça. Tribunais de Justiça. Controle democrático.
1 INTRODUÇÃO A accountability é hoje o termo mais em voga quando se expressa a preocupação por fiscalização, supervisão, vigilância e restrições institucionais ao exercício do poder (SCHEDLER, 2003). As demandas para que os agentes públicos sejam accountable — isto é, obrigados institucionalmente a prestar contas pelos seus atos — só fazem sentido no contexto de uma democracia representativa. As limitações inerentes ao modelo de representação dão ensejo à formulação de mecanismos institucionais de controle, tanto através de eleições periódicas, quanto por meio da ação permanente de órgãos estatais e da sociedade civil. De maneira geral, a experiência contemporânea da accountability pode ser concebida como um salto na temática do controle do poder . Mestre em Ciência Política pela UFPI. Especialista em Direito Constitucional pela PUC/SP. Juiz de Direito do TJMA.
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político em direção à consolidação da cidadania. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Nas democracias emergentes, como o Brasil, o valor da democracia está Não dúvidas aodiretas. caráter de controle popularde direto e eficaz relativamente restam afirmado pelas quanto eleições Porém, as noções republicanismo e da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas de liberalismo são precárias, o que justifica que exista uma fraca rede de accountability dúvidas quando se trata 2003). em uma lógica desagregadora dos meios de produção, política (O´DONNELL, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao omeio cidadão na Nessa conjuntura, Poderambiente, Judiciárioda se legitimidade situa em uma do posição fundamental propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização de accountability para garantir a legitimidade do sistema político. Ocorre que se, por desta possibilidade de atuação cidadãa com vistas conservação patrimônio legal, um lado, o poder judicial protagoniza função maisàimportante de do accountability ambiental brasileiro. submetendo os poderes instituídos ao cumprimento de suas decisões, por outro lado, o judiciárioSegue-se, é o menosna accountable dos poderes do Estado, haja vista não análise a princípio de doutrina e legislação, no passar, tocanteem ao regra, por ter de proteger a ordem mesmo contra os a pressão poloeleições ativo daedemanda numa leitura dajurídica CRFB/88 observados deverespopular. comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação Para tanto, desenvolveu-se, como popular? É possível destacar textualmente logo nos valor artigosfundamental, iniciais da Leiadegarantia Ação da independência De fato,1 aacontundência Constituição quando brasileira atribuiu um oregime Popular (LAP –judicial. lei nº4.717/65) emde sua1988 extensão define de Poder Judiciário, através de garantias institucionais quesubstancial é cidadania,independência ao trazer que o ao título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. (autonomia financeira-administrativa e autogoverno), de garantias funcionais Comungada esse ponto salarial de vista, a doutrina majoritária entende, como (vitaliciedade,com irredutibilidade e inamovibilidade) e da proteção à imparcialidade. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Essa independência do Poder Judiciário, numa Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitostanto e deveres, ipsovisão facto, geral, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger entendida pela sua autonomia administrativa, quanto numa perspectiva individual, pela corresponder de fiscalizar. independênciaa um funcional dos magistrados, também se revelou determinante para que o serviço público prestado pelos juízes e pelos tribunais deva ser accountable em sua Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma forma e em sua práxis (RUSSELL, 2001). Acrescente-se, no caso percepção relevante incongruência normativa com toda análise estendida até brasileiro, aqui, visto aque a de crise doem poder decorrente conjunto problemas CRFB/88, seu judiciário bojo, traz a(SADEK, dirigência2003), de ações positivasdedoum Estado para de prover, que concorreram lentidão e como para a elemento ineficiência do sistemadejudicial brasileiro, tais dentre muitos, o para meioa ambiente compositor um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É como: a insuficiência de infra-estruturas judiciárias e de recursos humanos; o aumento frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido considerável de conflitos jurídicos resultantes da evolução do sistema jurídico; a falta de quando lesionado,a oexcessiva meio ambiente deprecia de consequencial o de que, recursos financeiros; burocratização dosforma procedimentos judiciais; a mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! opacidade judicial; e os elevados níveis de desperdícios e disfuncionalidades resultantes de uma estrutura burocrática 2007). aversa à diretriz que o texto Sendo ao fim e ao(DUARTE, cabo, tal restrição Emnos resposta a essas circunstâncias, o Brasil passou do porconceito uma reforma constitucional dá, dada a impossibilidade clara de restrição de do cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar Poder Judiciário, com a Emenda Constitucional nº 45/2004, a partir da qual se instituiu de tutela deNacional matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em da o Conselho de Justiça (CNJ), com a competência de exercer o controle uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o funcionais dos juízes. E, após sua primeira década, ele titulares vem se configurando como um reconhecimento da pessoa humana e não humana como órgão nacional de controle do Poder Judiciário, com a finalidade de dar uniformidade ao planejamento, à fiscalização e à disciplina dos serviços judiciários. Nocidadão planoserá departe fundo da atuação CNJ, encontra-se uma ricadediscussão 1. Art. 1.º Qualquer legítima para pleiteardo a anulação ou a declaração de nulidade atos lesivos sobre ao patrimônio da União, do Federal, dos de Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da ingresa implementação deDistrito mecanismos controle e de fiscalização, decidadania, modo para a lhe fornecer so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. um nítido desenho institucional como agência de accountability do Poder Judiciário 98
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(ROBL FILHO, 2012). Desse modo, este artigo se propõe a identificar as ações e os programas do CNJ que tenham características de accountability, com enfoque na atuação junto aos tribunais de justiça, para analisar se houve a formação de um modelo definido de accountability até o momento. Parte-se da hipótese de que o Conselho Nacional de Justiça instituiu uma série de ferramentas de controle e de sanção para os tribunais de justiça, por meio de uma política centralizada de planejamento e de supervisão, baseada na premissa de que a correção das falhas no serviço judiciário passava pela introdução e reformulação de processos internos, pelo enfoque na cultura gerencial e pelo alcance permanente de resultados. 2 ACCOUNTABILITY COMO CULTURA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA É possível ver a accountability como uma espécie de meio termo entre o mandato livre e o mandato imperativo1. Ela traz maior racionalidade ao sistema e aprofunda a sensação de legitimidade da representação política. Para Miguel (2005, p. 169), esse raciocínio traz uma descrição engenhosa do funcionamento da accountability, por fazer com que um governo representativo seja, de fato, o espaço em que o povo age através de seu governo, não simplesmente através da autorização necessária aos políticos (pelas eleições), mas pela criação de um espaço público multifuncional, no qual estejam presentes condições permanentes de expressão de opiniões e de contestações públicas, canais de comunicação entre políticos/eleitores, transparência dos atos de gestão pública, acesso à informação e previsão de sanções. Ocorre que, se é certo que a discussão atual sobre accountability tem suas origens recentes na Terceira Onda de Democratização, justificada na perspectiva de um aprofundamento da qualidade da democracia entre o período de 1974 e 1990, Miguel (2005, p. 169) alerta para as ameaças nos processos de concepção de instrumentos de accountability, mencionando que: É frequente, então, a adoção de estratégias de redução do significado da accountability, transformando a interlocução sobre as alternativas políticas em mera avaliação impressionista do impacto da ação governamental sobre a vida de cada indivíduo, como faz Downs (1957). Ou, então, limitando a accountability a formas de controle sobre corrupção, exilando de vez a apreciação de políticas substantivas, o que aparece, por exemplo, em documentos do Banco Mundial (WORLD BANK, 1999) ou influenciados 1. Concepção burkeana de representação.
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por sua perspectiva (SHAH, s/d; AFONSO, 1999).
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL NãoTais restam dúvidas quanto ao caráterpois de controle popular direto e mecanismos eficaz observações são importantes, reformas que instituam da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas de accountability, sem atender ao interesse político disseminado em diferentes grupos da dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, sociedade, tornam mais fácil a efetivação desses instrumentos de controle, mas ao preço consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado de o sentido da democracia. Nesse sentido, veja-se a influência determinante dasrebaixar agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na realizada pelo Mundial no processo de passivo reformae,dosobretudo, Poder Judiciário brasileiro, cujo propositura daBanco ação, para a ocupação do polo na publicização êxito criação de mecanismos controle, (2004,do p. 24), representaria desta na possibilidade de atuação de cidadã comsegundo vistas àCandeas conservação patrimônio ambiental brasileiro. uma reformulação do papel do Estado para que o Judiciário se torne uma externalidade não-prejudicial à expansão do mercado, contribuindo para que a litigiosidade se paute na na análise de doutrina e legislação, no tocante ao proteção àSegue-se, propriedade privadaaeprincípio aos contratos. polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais outra vertente quem de argumentos, O´Donnell apresenta da proteção Numa do meio ambiente, tem legitimidade para propor uma uma panorâmica ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação diferente sobre o sentido da accountability, na qual leva em consideração a relação entre 1 Popular (LAPdemocrática, – lei nº4.717/65) em suado extensão as tradições liberala econtundência republicana quando com a figura Estado2define . Para oele, os que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este países considerados novas poliarquias, como o Brasil, apresentam uma accountability dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. vertical assegurada pelasponto eleições mas majoritária há claros sinais de fragilidade Comungada com esse de democráticas, vista, a doutrina entende, como da accountability horizontal peladedeficiência dos componentes liberais e republicanos. expresso na lição de Rodolfo Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso A busca pela proteção de tais valores vem sendo perseguidafacto, por várias apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger formas institucionalizadas de accountability, abrindo o leque de experiência do controle corresponder a um de fiscalizar. político que ultrapassa os mecanismos tradicionais de controle burocrático. Portanto, deve-se considerar que obstinações, a accountability possui,permissa entre seus escopos a busca Sem maiores fica claro, vaenia, queprimários, existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a pela economia de recursos públicos, a eficiência e a honestidade. Mas há outros padrões CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, de desempenho que merecem consideração: qualidade dos serviços; maneira como tais dentre o meio ambiente elemento de umdecomplexo serviçosmuitos, são prestados; justiça nacomo distribuição de compositor benefícios; grau adequação dos mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É resultados dos programas às clientelas, etc. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado,dao meio ambiente deprecia forma consequencial o de O resultado influência de tais teoriasdefoi o acréscimo à noção mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! accountability de mecanismos de controles dos resultados da administração pública, sem que isso signifique ofensa aos valores tradicionais da accountability (democracia, Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto liberalismo e republicanismo), mas sim um salto dedequalidade constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara restriçãodo dopróprio conceitosistema de de controle, possibilitar a responsabilização Poder Público conforme o desempenho cidadaniaao que não é sinônima de cidadania do eleitoral, especialmente ao se tratar dos programas governamentais. seja, atualmente, a fixação de metas aosemagentes de tutela de matéria ambiental. Ou Uma constituição como a nossa, pautada uma realidade comunitáriafundamental e diversificada, expande os horizontes dos direitos públicos é um mecanismo da accountability, por possibilitar a aferição da eeficiência conceitosnamarginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o alocação de recursos e de pessoal. reconhecimento pessoado humana humana acomo titularessobre a accountability No da âmbito Podere não Judiciário, discussão 2. O´Donnell (1997, p. 52) sintetiza sua preocupação com a mesma questão posta por Madison e os federalistas: como 1. Art. 1.º Qualquer parteliberal legítima para pleitearrefreiem a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos construir poderes que,cidadão em um será espírito e republicano, as tentações usurpadores de outros poderes e que ainda ao patrimônio da União,democrática do Distrito Federal, dos Estados, § 3ºque A prova da cidadania, para ingres-que são a satisfaçam à demanda de propiciar governosdos nãoMunicípios[...] se esqueçam de são devedores frente àqueles so emde juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. fonte sua pretensão de governar?
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judicial, em especial da tradição norte-americana3, relaciona-se, necessariamente, com a independência judicial. E, dessa interação, surgem formas de accountability que se diferenciam da tipologia tradicional (vertical, horizontal, social e legal), de modo a criar uma classificação específica: accountability judicial decisional, accountability judicial comportamental e accountability judicial institucional (ROBL FILHO, 2013). Dito isso, fecha-se o ciclo teórico. E conclui-se que a noção de accountability visa a fortalecer o controle democrático sobre o poder político, na visão unânime dos autores, mas também os valores do liberalismo e do republicanismo, bem como a eficiência e a qualidade do serviço prestado. A compreensão de tais conceitos é imprescindível para se analisar o desenho institucional no qual foi criado o CNJ e a maneira como vem desempenhando suas funções nessa primeira década. 3 A ACCOUNTABILITY DO CNJ VISTA A PARTIR DOS ATOS DE SUA PRESIDÊNCIA E DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA De modo geral, a atuação do CNJ se expressou sob a influência marcante de seus Presidentes e Corregedores, os quais ajustaram a agenda do órgão e focaram nos assuntos que entenderam ser os mais importantes institucionalmente para o Conselho. Na gestão 2005/2007 (Ministro Nelson Jobim), a necessidade do CNJ foi instalar um modelo de accountability clássico, segundo o qual os deveres de informação e de transparência foram essenciais para a superveniente fiscalização e controle dos atos e dos serviços. Para tanto, havia a convicção da necessidade de modernização dos sistemas de gestão dos Tribunais de Justiça, para que se obtivessem informações confiáveis, as quais embasariam novos planos e projetos para o Poder Judiciário. Na gestão 2007/2009 (Ministro Gilmar Mendes), as ações do CNJ revelaram que o combate aos déficits de accountability no Judiciário demandava investimentos na criação de padrões linguísticos e comunicacionais uniformizados em todos os tribunais do país. Sem tais investimentos, não seria possível exigir o cumprimento dos deveres de prestar informações e de publicar os atos administrativos e judiciais. Com tais medidas, instaurou-se uma nova fase de administração: a da gestão baseada em dados estatísticos. Desde então, o CNJ assumiu sua atribuição constitucional de orientar o planejamento estratégico do Poder Judiciário nacional. Em termos de accountability, com a criação de núcleos, responsáveis pelo controle interno e pelo planejamento a médio e longo prazo das ações institucionais, criava-se espaço para um enfoque nos escopos finalísticos. De outro modo, a Corregedoria Nacional de Justiça revelou sérias limitações do CNJ na 3. Vide Ferejohn (1999) e Brody (2008).
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efetivação de suas diretrizes normativas de accountability. A realidade que persistia 5nos AÇÃO POPULAR COMO MEIO que, DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Tribunais de Justiça demonstrava pela amplitude territorial do país e por suas diferençasNão estruturais, o Conselho precisava reformular mais que seu plano de ações, restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz mas a própria de atuação do CNJ. O caminho encontrado pela certas Presidência da ação popularmetodologia no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, foi flexibilizar formulação do planejamento estratégico, solução viável dúvidas quandoa se trata em uma lógica desagregadora doscomo meiosúnica de produção, consumo diante do crescimento vertiginoso multipolarizado para mantere adescarte, legitimidade do Conselho no âmbito interno do ePoder Judiciário, através das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na dos da realização de encontros nacionais da magistratura, no qual todos Presidentes propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Tribunais se comprometiam a cumprir metas. Isso fortaleceu o CNJ tanto como órgão desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio gestor da governança ambiental brasileiro. judiciária brasileira, quanto como agência central de accountability do Poder Judiciário. Segue-se, na análise a princípio de doutrina legislação, no tocante ao da Um momento marcante no processo de einstalação e de consolidação polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais accountability a instituição Sistema Estatísticas do Poder Judiciário (SIESPJ), da proteção dofoimeio ambiente,doquem temdelegitimidade para propor uma ação cujos princípios foram enumerados na Resolução 76/2009, como gestão no popular? É possível destacar textualmente logo nosnºartigos iniciais da vetor Lei dedeAção 1 Poder Judiciário. Com efeito, a partir daquele ano,quando criaram-se normas para dar concretude Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este aos princípios da publicidade, da eficiência, da transparência, da obrigatoriedade de dispositivo como não recepcionado pela de vigente ordemdos constitucional. informação ser dostido dados estatísticos e da presunção veracidade dados estatísticos Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como para informados pelos Tribunais. Assim, reconheceu-se a importância das estatísticas expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely fundamentar emcorrespondem-se matéria de políticas públicas do Poder Judiciário, de modo Meirelles, quedecisões em síntese a ideia de direitos e deveres, ipso facto, que os dados estatísticos passaram a ser anualmente relatório “Justiça em apenas haveria legitimidade genuína de publicados pleito quando o direito no político de eleger Números”. corresponder a um de fiscalizar. Namaiores gestão obstinações, 2010/2012 (Ministro Peluso), a atuação institucional Sem fica claro,Cezar permissa vaenia, que existe uma do relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a Conselho expressou a adoção de novos rumos e a redução da pressão sobre os tribunais e CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, sobre a magistratura. As novas metas passaram a ser segmentadas e antecipadas para os dentre muitos, de o meio compositor um complexo anos seguintes, modoambiente a permitir como que oselemento tribunais tivessem maisdetempo de planejar e de mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É incluir no orçamento as ações que fossem auxiliar no cumprimento de tais objetivos. A frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido gestão marcada pela fase de tensões — dentro e foraconsequencial do Conselho Nacional de que,também quandoficou lesionado, o meio ambiente deprecia de forma o de Justiça — entre adePresidência e a Corregedoria Nacional de Justiça, mínimo existencial todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos!o que elevou os ânimos de toda a magistratura brasileira. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto Com gestão (Ministroclara Ayres sentido das ações constitucional nosadá, dada2012/2014 a impossibilidade de Britto), restriçãoo do conceito de do Conselho os princípios constitucionais motivaram aaocriação do CNJ: cidadania foi quefortalecer não é sinônima de cidadania eleitoral,que especialmente se tratar adedemocracia e a república. Nesse sentido, instituíra-se de contratação tutela de matéria ambiental. Uma constituição comoa avedação nossa, pautada em de uma realidade comunitária e diversificada, expande dos direitos pessoas com a “ficha suja”. Além disso, o CNJ passouosa horizontes considerar que, para alcançar euma conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojocombater o accountability orientada para a eficiência do serviço público, precisava-se reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares a principal causa da morosidade sistêmica da justiça brasileira: a sobrecarga de trabalho e o mau funcionamento da primeira instância. Para tanto, editaram-se resoluções que convergiam normas para regulamentar o atendimento prioritário ao primeiro grau nos 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Tribunais Justiça. ao patrimônio de da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
Por fim, na gestão 2014/2015 (Ministro Lewandowski), a análise não
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envolveu todo seu período de mandato, destacando-se o abrandamento da cobrança dos instrumentos fiscalizatórios, disciplinares e de desempenho, para focar em melhorias das condições de trabalho e no alcance de objetivos determinados, tais como a realização de audiências de custódia. 4 BALANÇO DAS AÇÕES DO CNJ NOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA Classificou-se a accountability do CNJ a partir de sua construção normativa e de suas ações/programas, sob o enfoque de seus escopos instrumentais e finalísticos. O fundamento para tal distinção relaciona-se ao propósito de cada espécie de controle. Definiu-se por escopo instrumental os aspectos de atividades-meio ou de comportamento dos magistrados e servidores (dentre os quais, estão: deveres de informação, transparência, motivação dos atos e o poder disciplinar/correicional). Quanto ao escopo finalístico, entendem-se as ações relacionadas à atividade-fim do Poder Judiciário, qual seja, a prestação jurisdicional para solução de conflitos e pacificação social (a obediência à lei, o dever de eficiência e a qualidade do serviço prestado) 5 AÇÕES COM ESCOPOS INSTRUMENTAIS 5.1 Informação e Transparência Em um modelo clássico de accountability, os deveres de informação e transparência dos agentes públicos têm dois propósitos bem definidos. O primeiro é de natureza instrumental, na medida em que o conhecimento público de todos os atos se revela essencial para a fiscalização e para o controle dos atos e serviços estatais, bem como para a elaboração e execução de sua gestão estratégica. O segundo propósito, não menos relevante, diz respeito ao próprio exercício de uma práxis administrativa orientada por uma cultura accountable na estrutura dessas instituições em relação à sociedade. Ao longo dessa década, houve mudanças substanciais nos Tribunais de Justiça quanto à produção de dados estatísticos, à divulgação de informações e à transparência dos atos administrativos e judiciais. Pode-se, sem receio de uma avaliação precoce, apontar essas áreas da accountability como as que mais demonstraram avanços no Poder Judiciário nacional. Para tanto, o uso e o acesso maciço da internet foram fatores que contribuíram de modo marcante para essa evolução. Em termos de accountability, a qualidade do modelo implantado é louvável, tendo em vista que, em sua engenharia institucional, previram-se órgãos de controle no planejamento dos indicadores, na implementação dos critérios padronizados, na administração da transmissão dos dados, na correção
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por erros materiais e de omissões dolosas e na divulgação dos resultados. No entanto, há espaço para o 5aperfeiçoamento AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL do sistema. Com efeito, a previsão do Comitê Gestor Nacional do SIESPJ era de que a sociedade civil organizada teria membros integrantes. Essa medida é salutar, uma vez que eo controle Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto eficaz social aprimora a criação de estatísticos que mais importamPermanecem, à população e influencia disseminação da ação popular noindicadores controle dos atos administrativos. contudo,nacertas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, dos resultados em diversos sítios eletrônicos além dos próprios do Poder Judiciário. Ocorre que, em suas consumo descarte, diante alusão do crescimento vertiginoso e multipolarizado nomeações, oe CNJ não fez qualquer à participação da sociedade, enfraquecendo, assim, o caráter
das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na accountable modelo. proposituradesse da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. 5.2 Da Inovação do Programa Justiça em Números Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais O relatório denominado em Números, produzido anualmente pelo CNJ, da proteção do meio ambiente, Justiça quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação constitui o produto de maior responsabilidade do Departamento de Pesquisa Judiciária 1 Popular (LAPa –partir lei nº4.717/65) a contundência em um sua diagnóstico extensão define o (DPJ), pois, e através dele, o Conselhoquando apresenta detalhado e que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este preciso da situação do Poder Judiciário nacional e propõe medidas que possam aprimorar dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. oComungada serviço judiciário para ponto o ano seguinte. existência está inserida no contexto com esse de vista,Aasua doutrina majoritária entende, como mais amplo danautilização de estatísticas comoMancuso, instrumentos indispensáveis orientar a expresso lição de Rodolfo de Camargo Humberto Theodoropara Jr., Hely formulação de em políticas no Poder Judiciário. Meirelles, que síntesepúblicas correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando odo direito Avalia-se que o projeto Justiça em Números CNJpolítico satisfazdeaseleger exigências corresponder a um de fiscalizar. contemporâneas de accountability, na medida em que o aprimoramento dos conceitos das variáveis indicadores estatísticos é realizado de maneira Semdos maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, compartilhada que existe umacom os Tribunais de Justiça. Há um rigor permanente na coleta e na consolidação dos dados relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a pelos CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, núcleos de estatística dos tribunais, e as informações do relatório anual estão abertas, em dentre muitos, o meio ambiente comoe àelemento compositor um concorda-se complexo com linguagem acessível, à análise pública crítica acadêmica. Pordeisso, mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É a afirmação da presidência do CNJ de que o Brasil se encontra em posição de vanguarda frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido na de estatísticas relaçãodeprecia aos demais países4consequencial . de temática que, quando lesionado,judiciais o meio em ambiente de forma o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! 5.3 Em Busca da Transparência Institucional no Poder Judiciário Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional dá, dadaoa CNJ impossibilidade clara de restrição do conceito de Durantenos a década, lançou diretrizes quanto à busca da transparência cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar institucional no Poder Judiciário. O modelo adotado levou em consideração a unicidade de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em desse poder, aocomunitária exigir a implementação de disciplina em temas concernentes uma realidade e diversificada, expande uniforme os horizontes dos direitos àe gestão da informação e das finanças, além da efetivação do princípio da bojo publicidade, conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu o oreconhecimento qual compreende a transparência, acessibilidade, e integridade das da pessoa humana e não humana comointegralidade titulares informações referentes à gestão administrativa e financeira da coisa pública5. Portanto, para além do dever de informar, o qual se satisfaz com a disponibilização oficial dos 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres4. Declaração do Ministro Lewandowski (CNJ, 2014, p. 16). so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 5. Justificativas elencadas na Resolução n. 79/2009 do CNJ.
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dados, o dever de transparência acresce o sentido de facilitação de acesso a todas as fontes de informação existentes. A transparência nos tribunais significou que a publicidade se tornou a regra e o sigilo tornou-se a exceção. Acontece que o CNJ não conseguiu implantar um padrão de divulgação das informações que fosse adotado e implantado por todos os tribunais. O resultado foi a permanência de uma autonomia nessas cortes, que se revela contraproducente e um óbice ao cumprimento integral das resoluções do CNJ. Não obstante a accountability dos tribunais, no que tange ao dever de transparência, ter sido intensamente alterada na última década, são imprescindíveis avanços quanto à facilitação da visualização e da intelecção dos dados divulgados. No caso do cumprimento da Resolução nº 151/2012, os Tribunais do Rio Grande do Sul, de Goiás e da Bahia simplesmente a desobedecem por não divulgar a relação das remunerações pagas com a identificação dos nomes das pessoas beneficiárias, sem que o CNJ tenha aplicado qualquer sanção administrativa aos respectivos presidentes. Informações complementares disponíveis na Internet Para fins de accountability, é importante compreender quais os principais serviços disponíveis à população e como está sua atualização e acessibilidade. Em março de 2008, a Corregedoria Nacional de Justiça apresentou um sistema de cadastro das serventias/secretarias judiciais e acompanhamento estatístico da produtividade dos magistrados de 1º grau dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal. Este programa resultou de uma pesquisa de grande relevância e foi denominado de Justiça Aberta. Este sistema de consulta facilita o acesso dos cidadãos a informações sobre a localização de varas cíveis, tribunais, cartórios e outras instituições a serviço do sistema judiciário do Brasil e sobre relatórios de produtividade das secretarias processuais. Através dele, estão disponíveis informações referentes aos anos de 2011 a 2015, quanto: i) ao 1º grau de jurisdição, relatórios de produtividade das serventias e dos magistrados; ii) ao 2º grau, dados quantitativos sobre votos, encaminhamentos e outras decisões de desembargadores; iii) a serventias extrajudiciais, aos dados sobre a produtividade dos cartórios e ofícios de notas, aos protestos e registros, e aos valores de arrecadação. O sistema Justiça Aberta pode se confundir com o Justiça em Números, porém enquanto esse tem um enfoque macroestrutural nos seus indicadores, o Justiça Aberta abrange informações de produtividade e litigiosidade individuais das varas e dos magistrados. Portanto, ambos são importantes ferramentas de accountability, mas o Justiça Aberta tem utilidade imediata ao cidadão comum, por conter dados que o afetam diretamente. Ocorre que a Corregedoria Nacional de Justiça, em junho de 2015, suspendeu a atualização do programa Justiça Aberta, sob a justificativa de que “os procedimentos para atualização de dados do sistema referentes à primeira e à segunda instância estão Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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sendo reavaliados pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ. Por este motivo, 5asAÇÃO POPULAR COMOnesses MEIOcasos DIFUSO DEser TUTELA AMBIENTAL informações apresentadas devem desconsideradas. No tocante às 6 serventiasNão extrajudiciais, a atualização de informações está ocorrendo normalmente” . restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Portanto, esse no sistema dedos consulta se encontra Permanecem, desatualizadocontudo, mesmocertas quanto às da ação popular controle atos administrativos. informações sobre localização serventias judiciais extrajudiciais, bem como dúvidas quando se atrata em uma das lógica desagregadora dose meios de produção, consumo e descarte, diante do ecrescimento vertiginoso e multipolarizado quanto à produtividade dos juízes à arrecadação dos cartórios extrajudiciais. Assim das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade dodecidadão na estão sendo, o número de processos julgados e a quantidade de casos na fila espera não propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização mais à disposição do cidadão, que ficou sem informações sobre a qualidade da gestão do desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio 7 Judiciário . ambiental brasileiro.
O paradoxo é que, justamente após a promulgação da Lei de Acesso à Informação, Segue-se, análise a princípio doutrina e legislação, no tocante ao dados em maio de 2012, a na qual obrigou todos os de entes da federação a manter bancos de polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais públicos com informações relevantes, a Corregedoria Nacional de Justiça suspendeu da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação seu programa de informação. Contudo, o Poder Judiciário, na ótica de Sordi, popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais dade LeiNeide de Ação 1 ex-diretora executiva do Departamento de Pesquisas do CNJ, foi oo poder Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quandoJudiciárias em sua extensão define que émenos se adequou referida legislação. “o CNJ criou umaeste comissão cidadania, ao trazerà que o título eleitoral Segundo é a prova ela, de cidadania, devendo dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. para a regulamentação, mas ela não avança por falta de prioridade ao tema. Não existe 8 Comungada com aesse ponto de àvista, a doutrina majoritária cobrança, embora Lei de Acesso Informação seja velhinha” . entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Não foiem somente Corregedoria Nacional dedireitos Justiça eque suspendeu um sistema Meirelles, que sínteseacorrespondem-se a ideia de deveres, ipso facto, vital dehaveria informação do Poder Judiciário. A presidência do CNJ também lançou uma apenas legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a umde deInformações fiscalizar. Processuais e Extraprocessuais (CNIPE), em 2012, Central Nacional na gestão do Ministro Cezar Peluso, para quem este seria um trabalho revolucionário maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia,“aque existeé um umagrande na históriaSem do Poder Judiciário nacional. Segundo o presidente, CNIPE relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a banco de dados nãotraz existe no país, de referente aos 91 tribunais CRFB/88, em seuque bojo, a dirigência ações positivas do Estadobrasileiros, para prover,que vai possibilitar ao cidadão tempocomo real verificar tem algum de processo, em qualquer dentre muitos, o meio em ambiente elementosecompositor um complexo Comarca, por meio da Internet. A ideia é dar mínima acesso edetransparência às informações mote constitucional garantia de existência dignidade humana. É 9 frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido judiciárias” . No entanto, logo após a solenidade de lançamento, foram firmados termos 10 de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o de adesão com oito Tribunais de Justiça , e esse sistema foi chamado pelo Presidente mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! do CNJ de “Google do Judiciário”11. Entretanto, a previsão de que o CNIPE funcionasse 12 integralmente de edois de 2014 ) não se realizou. efeito, o Sendodentro ao fim ao anos cabo,(até tal abril restrição aversa à diretriz que Com o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar 6. Nota final constante no link http://cnj.jus.br/programas-e-acoes/justica-aberta. Acesso em 05 de maio de 2016. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em em 05 7. Vide em http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/cnj-tira-do-ar-dados-sobre-a-produtividade-de-juizes/. Acesso de maiorealidade de 2016. uma comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos 8. da entrevista ao portal Uol/Congresso em foco, em dimensão 01/07/2015. Acesso em 05 de maio 2016.bojo o e Trecho conceitos marginalizadores de primeira ao sustentar emde seu reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 9. Vide em http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/58496-secretario-geral-do-cnj-fala-sobre-a-cnipe. Acesso em 04 de maio de 2016.
10. Com o TJDFT, TJSC, TJRS, TJSP, TJAM, TJAL, TJMS e TJPR. 11. Vide1.º emQualquer http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/58542-oito-tribunais-ja-aderem-a-cnipe-nesta-primeira-etapa. Acesso em 04 1. Art. cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos de patrimônio maio de 2016. ao da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres12. Asjuízo, únicas informações mencionam quedocumento se trata de que um asistema de busca de informações que abrangerá os so em será feita com ooficiais título eleitoral, ou com ele corresponda. Tribunais e Cartórios Judiciais e Extrajudiciais do país. Contudo, não existe qualquer link disponível.
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sistema, cujo valor de implantação foi de mais de R$ 40 milhões de reais, encontra-se desatualizado desde novembro de 201213. Com a alternância da presidência do CNJ, esse projeto milionário simplesmente foi esquecido pelas gestões subsequentes, significando, além de uma falha na continuidade do serviço público, uma marca de desperdício dos recursos financeiros aportados pelo CNJ. 5.4 Dever de Motivação A noção de accountability repercute sobre o dever de motivação nas ações do Poder Judiciário no que pertine à necessidade de apresentação e de justificação dos atos administrativos considerados discricionários, ou seja, aqueles atos em que há uma margem de escolha entre algumas alternativas legais de ação, possibilitando ao agente público decidir segundo um juízo de conveniência e de oportunidade. Os atos administrativos vinculados demandam um juízo de subsunção entre a situação fática e a prescrição na lei para se perquirir quanto à sua realização, e os atos judiciais são protegidos pela independência judicial e controlados por um sistema interno de revisão por via de recursos. Enquanto esses dois possuíam regras claras de accountability, os atos discricionários apresentavam, numa visão tradicional de Estado, uma margem considerável que escapava aos controles democráticos da accountability. Nesse sentido, justificou-se o fortalecimento de mecanismos que corrigissem esses déficits de controle, através da criação de normas que obrigaram os gestores públicos a atender a esse dever instrumental de accountability. No Poder Judiciário, o CNJ disciplinou medidas que aliaram o dever de informar ao dever de justificar as razões que motivaram a tomada de decisões em diversas áreas administrativas. Ao longo dessa década, destacaram-se as resoluções do CNJ que objetivaram a racionalização dos critérios quanto à força de trabalho e ao emprego de recursos orçamentários na aquisição de bens e na organização equitativa dos serviços. No primeiro bloco, o CNJ regulamentou os critérios objetivos para a promoção de magistrados por merecimento (Resoluções nº 06/2005 e 106/2010) e para a equalização da força de trabalho entre o primeiro e o segundo graus (Resolução nº 194/2014). Já no segundo bloco, criaram-se regras para a aquisição de veículos (Resolução nº 83/2009), para a construção e reforma de imóveis judiciários (Resolução nº 114/2010) e para a distribuição equitativa do orçamento nos órgãos de 1º e 2º graus dos Tribunais de Justiça (Resolução nº 195/2014).
13. Segundo a Coluna de Claudio Humberto do portal Diário do Poder, 25/11/2013. Ver em http://www.diariodopoder.com. br/noticia.php?i=6435226066. Acesso em 06 de maio de 2016.
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5.5 Atividade Punitiva e Correicional 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto caráter com de controle popular eficaz e o Dentre as expectativas que seao nutriram a instituição dodireto CNJ, ae correção da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas aprimoramento dos mecanismos relacionados ao poder disciplinar sobre os magistrados dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, e, em menor os servidores públicos,vertiginoso apresentavam-se à frente numa escala consumo e medida, descarte,sobre diante do crescimento e multipolarizado de Isso porque, conforme destaca a professora Sadek (2004, p. 6), na uma das dasprioridades. agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão causas da percepção sociala ocupação de uma crise no Poder Judiciário, no início dos anos 2000, era propositura da ação, para do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade atuação cidadãjudicial, com vistas conservação do patrimônio justamente o déficit de accountability mais àconcretamente, o fraco exercício do ambiental brasileiro. poder disciplinar nas corregedorias dos Tribunais de Justiça, o que teria provocado um aumento da corrosão do prestígio do Judiciário. No próprio judiciário, Tourinho Neto Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao criticava “o mal maior a indolência do juiz,observados a negligência contumaz, o arbítrio, a polo ativoque da demanda numaé leitura da CRFB/88 os deveres comunais prepotência, comportamento incompatível com a dignidade, a honra decoro de da proteção odomau meio ambiente, quem tem legitimidade para propor umae oação suas funções, a faltadestacar de serenidade, sem falar nanos corrupção”. popular? É possível textualmente logo artigos iniciais da Lei de Ação 1 PopularAssim, (LAP –olei nº4.717/65) a contundência em sua (EC extensão define oprimou modelo desenhado pela reformaquando do Judiciário nº 45/2004) que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este pela instituição, dentro da estrutura do CNJ, de uma Corregedoria Nacional de Justiça, dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. responsável as reclamações de qualquer entende, interessado, relativas Comungada por comreceber esse ponto de vista, eadenúncias, doutrina majoritária como aos magistrados e aos serviços judiciáriosMancuso, e por exercer funções executivas inspeção expresso na lição14 de Rodolfo de Camargo Humberto Theodoro Jr.,de Hely Meirelles, que geral em síntese ideia de direitos e deveres, ipso facto, e de correição (Art. correspondem-se 103-B, §5º, I e II, aCF/88). apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Quanto ao de aspecto disciplinar, o CNJ teve imprescindível papel no processo corresponder a um fiscalizar. de depuração ética da magistratura. Com efeito, entre 2006 e 2013, foram abertas 91 investigações contraobstinações, magistrados, aplicação 44 penas aposentadoria Sem maiores ficacom claro, permissadevaenia, que de existe uma 15 relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a compulsória . Além disso, a confirmação judicial pelo STF da competência disciplinar CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, primária da Corregedoria Nacional de Justiça justifica a conveniência e a necessidade dentre meio ambiente elemento compositor de um complexo de que omuitos, controleo punitivo continuecomo a ser desempenhado como prioridade pelo Conselho mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Nacional de Justiça. Contudo, pode-se afirmar que a atual gestão do CNJ restringiu e frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido 16 mitigou o emprego de alguns instrumentos accountability de que, quando lesionado, o meio ambiente de deprecia de formacomportamental consequencial o. Com isso, a Corregedoria Nacional desujeitos Justiça passou a ter uma intervenção subsidiária, seletiva mínimo existencial de todos os do ordenamento jurídico. Todos! e focalizada em questões macros do Poder Judiciário. A dúvida que perdura é se as Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto pelo corregedorias locais dos tribunais captaram a cultura de accountability introduzida constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de CNJ. E o desafio é saber se esse controle disciplinar será efetivo ao ponto de combater e cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar prevenir os desvios éticos e comportamentais dos magistrados e servidores. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária diversificada,aexpande os horizontes dos direitos No tocante ao carátere correicional, experiência de accountability do CNJ se e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 14. Por decorrência da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, o termo magistrado engloba os juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores. 15. Relatório da Corregedoria Nacional de pleitear Justiça do ano de 2014. 1. Conforme Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos 16. O Presidente CNJdo contesta percepção ao informar que 04 magistrados em ao patrimônio da do União, Distritoessa Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º Aforam provaaposentados da cidadania,compulsoriamente para ingres2015. emserá http://www.conjur.com.br/2016-fev-02/cnj-puniu-cinco-magistrados-afastou-outros-dois-2015. Acesso em 12 so em Ver juízo, feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. de maio de 2016.
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mostrou relativamente satisfatória, haja vista a realização de estudos analíticos das unidades judiciárias e administrativas dos Tribunais de Justiça, por meio de inspeções preventivas, a partir das quais vários procedimentos avulsos (Procedimentos de Controle Administrativo, Pedidos de Providência, Sindicâncias, Revisões Disciplinares, Avocações) foram instaurados, com objetivos de apurar ilegalidades específicas. E, nos casos de ineficiência das soluções pelos tribunais, a Corregedoria Nacional de Justiça protagonizou a realização de correições em diversos Tribunais de Justiça, entre os anos de 2013 e 2014, para apurar fatos determinados relacionados com deficiências graves nos serviços judiciais, administrativos ou notariais. Nessa situação, estão o Tribunal de Justiça do Piauí, do Amazonas e de Pernambuco, os quais demonstraram avanços e cumprimentos de parte das recomendações, ainda que persistam graves problemas estruturais. Contudo, há tribunais que só passaram por uma inspeção preventiva, tais como o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, do Rio Grande do Sul e de São Paulo. Nesses casos, por exemplo, as inspeções constataram vários serviços e atividades irregulares. Porém, a Corregedoria Nacional de Justiça não retornou, ainda que houvesse essa previsão nos relatórios finais das inspeções. Além do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, os quais constavam como novamente inspecionados pela Corregedoria Nacional, não se encontra qualquer publicação dos relatórios finais. Dessa forma, o trabalho do CNJ demonstrou sofrer resistência por parte dos Tribunais de Justiça de grande porte e de maior importância econômica. Isso justifica a crítica segundo a qual a atuação correicional da Corregedoria Nacional de Justiça ocorreu, ao longo dessa década, de maneira seletiva e mais incisiva em alguns Tribunais de Justiça em detrimento de outros. Numa avaliação geral, o modelo de accountability institucional criado pelo CNJ, com o escopo instrumental de correicionar as atividades administrativas, judiciais e notariais, atende ao princípio da legalidade. É exercido de maneira impessoal e técnica e tem auxiliado na identificação de irregularidades e no aprimoramento de rotinas, além disso, tem incentivado o planejamento estratégico e possibilitado formas de controle social por meio do recebimento de denúncias e da realização de audiências públicas. Um dos desafios é intronizar essas novas ações nos tribunais, após se ajustarem às determinações e recomendações, de modo que passem a integrar suas governanças administrativas. E, por último, criar canais de divulgação, no portal da internet, que facilitem o acompanhamento das providências tomadas em cada caso de falha ou desvio encontrado pela Corregedoria Nacional de Justiça nas inspeções e correições.
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6 BALANÇO DAS AÇÕES DO CNJ COM ESCOPOS FINALÍSTICOS 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL 6.1 Dever de Legalidade Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas CNJ com legitimidade criação de sua própria dúvidasNessa quandodécada, se trataoem umaexerceu lógica desagregadora dos ameios de produção, accountability legal, na medida definiu, emvertiginoso diversas áreas, as regras que orientam consumo e descarte, diante em do que crescimento e multipolarizado das agressões sistemáticas meio ambiente, da legitimidade do cidadão na as ações no Poder Judiciário ao nacional. Nesse sentido, foram disciplinadas, por exemplo, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização matérias sobre nepotismo (Resolução nº 07/2005), teto remuneratório dos magistrados desta possibilidade de atuaçãoproibição cidadã com vistasde à pessoas conservação (Resoluções nº 13 e 14/2006), de nomes vivasdo empatrimônio prédios do Poder ambiental brasileiro. Judiciário (Resoluções nº 52/2008 e 140/2011), sobre diárias de magistrados (Resolução nº 72/2009), concurso públicoa de ingresso magistrados (Resoluções nº 75/2009 e Segue-se, na análise princípio dede doutrina e legislação, no tocante ao 118/2010), notas eobservados de registroos(Resolução nº 80/2009), polo ativo daconcurso demandapara numadelegação leitura da de CRFB/88 deveres comunais da proteção (Resoluções do meio ambiente, tem legitimidade para propordeuma ação ficha precatórios nº 115 quem e 123/2010) e sobre contratação pessoas popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação limpa (Resolução nº 156/2012).1 Sendo assim, constata-se uma prerrogativa reforçada Popular – lei nº4.717/65) quando em extensão do CNJ (LAP em fiscalizar e controlara contundência os atos dos Tribunais de sua Justiça, sob odefine crivoode um que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este conceito amplo de legalidade. efeito, a atribuição do Conselho de criar um regime dispositivo ser tido como nãoCom recepcionado pela vigente ordem constitucional. jurídico específico Poderde Judiciário, desempenho de sua accountability, Comungada com para esse oponto vista, a no doutrina majoritária entende, como impôs obrigações sobrepostas aos Tribunais de Justiça, como naTheodoro hipótese das regras para expresso nalegais lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, construção de imóveis, os quais devem obedecer à lei geral de licitações (Lei nº 8.666/93) apenas haverianºlegitimidade e à Resolução 114/2010 dogenuína CNJ. de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. O equilíbrio desse modelo de accountability legal se deu pela atuação do Supremo Sem Tribunal Federal, o qual foi inúmeras vezesque paraexiste decidir maiores obstinações, ficaprovocado claro, permissa vaenia, umasobre a relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que constitucionalidade das inovações normativas do CNJ. Ilustrem-se com os casosado teto CRFB/88, em seu traz a dos dirigência de açõesquando positivas do Estado para prover, remuneratório e dobojo, subsídio magistrados, o STF suspendeu a eficácia do dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo artigo 2º, da Resolução nº 14/2006, que concedia um subteto inferior aos magistrados mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É estaduais, e do nepotismo, declarada integralmente constitucional. Contudo, o STF não frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido decidiu temas importantes, como a norma que regula a criação de varas e cargos de que, ainda quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o no âmbito judiciáriode (Resolução nº 184/2013 na ADI nº 5119) e a que estabelece critérios mínimodo existencial todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! para promoção por merecimento (Resolução nº 106/2010 na ADI nº 4510). Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto Desse modo, modelo de accountability legal com poderes constitucional nos dá,tem-se dada um a impossibilidade clara de restrição doamplos conceito de por parte do CNJ, qual vem disciplinando áreaseleitoral, estratégicas da organização, acesso e cidadania que onão é sinônima de cidadania especialmente ao se do tratar do da estrutura judiciária. E, com respaldo o Conselho de funcionamento tutela de matéria ambiental. Uma constituição comodoaSTF, nossa, pautada reafirmou em uma realidadede comunitária e diversificada, expande osdehorizontes a prevalência sua interpretação sobre a legalidade quaisquer dos atosdireitos relacionados eaos conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em bojo o de controles administrativo e financeiro do Poder Judiciário. Ocorreseu que, a partir reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 2014, o Conselho Nacional de Justiça tem se posicionado no sentido de que não deve atuar para solucionar todos os casos que afetam interesses individuais dos interessados. Nas palavras do atual presidente do Conselho, Ministro Ricardo Lewandowski: “um dos 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresmais altos da colegiados da República, sobretudo o mais alto colegiado do Poder Judiciário, so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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não pode tratar de questões individuais. Temos que tratar das questões macro 17. Como balanço geral dessa atuação do CNJ, conclui-se que se criaram regras para a correção das principais distorções na organização e no funcionamento dos serviços judiciários no Poder Judiciário. E, com sua recente postura seletiva no seu modo de intervir, o CNJ oportuniza, às corregedorias e às presidências dos tribunais, um novo espaço para demonstrar que podem aplicar a contento as ferramentas de accountability judicial institucional e comportamental. 6.2 Dever de Eficiência do Serviço Judiciário A crise do Poder Judiciário costuma se relacionar com sua morosidade, com sua incapacidade de dar respostas a contento a todas as demandas e com o baixo rendimento dos resultados apresentados em comparação com as despesas de manutenção deste Poder constituído. Por isso, o enfoque da eficiência é fundamental para o bom funcionamento do Judiciário e para reverter essa percepção social. A própria estruturação do CNJ pôs em prática uma mudança do enfoque burocrático para um enfoque gerencial na administração judiciária (NOGUEIRA, 2010). Em seus primeiros anos, a tônica da atuação do CNJ foi pela padronização e consolidação das informações. Segundo Oliveira (2015, p. 69), a utilização de dados coletados, como ferramenta básica de autoconhecimento e instrumento de tomada de decisão, representa um dos pontos fundamentais do movimento gerencialista. Com a implantação do sistema de tabelas processuais unificadas foi possível a padronização e a categorização dos processos judiciais existentes, possibilitando o conhecimento do fluxo processual dos Tribunais de Justiça, bem como um amplo campo de informações até então desconhecidos, tais como o número de casos novos, de processos julgados e casos pendentes. Esse enfoque quantitativo na coleta de dados gerenciais permitiu a elaboração de estudos estatísticos com abordagem macro, cujos resultados são publicados no relatório anual Justiça em Números, bem como de sistemas de dados de produtividade de cada magistrado e cada vara/juizado do país, numa perspectiva de apresentar o microssistema do judiciário através do sistema de consulta Justiça Aberta. A avaliação de Nogueira (2015, p. 68) constata que essa fase foi importante para o gerenciamento dos tribunais, porque proporcionou um processo de autoconhecimento que o CNJ ofereceu como apoio aos tribunais, num primeiro momento, ao se nivelar e, em seguida, atribuir-lhes metas voltadas para a melhoria dos níveis de eficiência.
17. Vide em http://www.espacovital.com.br/publicacao-31339-cnj-passaria-a-julgar-apenas-casosde-interesse-geral. Acesso em 18 de maio de 2016. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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A crítica que tomou espaço, quanto à essa exigência de coleta de dados, diz 5respeito AÇÃOaoPOPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL risco de esses estudos estatísticos se tornarem mais uma categoria de enfoque burocrático, uma vez ocasionam um excesso de medições que, em alguns casos, não Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz possuem objetivos (FRAGALE, 2007) e não sãoPermanecem, inter-relacionados comcertas muitos dos da ação popular no claros controle dos atos administrativos. contudo, projetos seja,desagregadora se a utilizaçãodos dasmeios estatísticas foi importante dúvidas desenvolvidos quando se tratapelo em CNJ. uma Ou lógica de produção, consumo e descarte, dianteNacional do crescimento multipolarizado na fase inicial do Conselho de Justiça,vertiginoso tais recursose devem ser empregados das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do políticas cidadão públicas. na como instrumento de resolução de problemas e de formulação de propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Como adverte Oliveira (2015): desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. As estatísticas do CNJ estão estagnadas nelas mesmas, pois há uma
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao supervalorização da exposição dos dados coletados por meio de seminários, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais reuniões equem relatórios alto padrão gráfico. Visualizauma um esforço da proteção do meio ambiente, temcom legitimidade para propor ação maior na divulgação desteslogo dados doartigos que propriamente utilização destas no popular? É possível destacar textualmente nos iniciais danaLei de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o processo de melhoria da eficiência. Aponta como um exemplo negativo a que é cidadania, ao trazer utilização que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dos rankings de eficiência dos tribunais, pois retiram do foco dos dispositivo ser tido comotribunais não recepcionado pela vigente ordem constitucional. os aspectos de melhorias e uniformização de padrões. Os tribunais Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como ficariam mais confusos com as dificuldades escolha das expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humbertona Theodoro Jr.,prioridades Hely e a da disputa recai apenas posição ealcançada ranking. Enquanto Meirelles, que em sínteseatenção correspondem-se a ideia denadireitos deveres,noipso facto, isso genuína deixa de lado os motivos que promoveram melhorias dificuldades apenas haveria legitimidade de pleito quando o direito político de ou eleger corresponder a um de fiscalizar. pelos tribunais na busca pela eficiência (Oliveira, 2015, p. 71). Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante normativa com todados análise aqui, visto que oa ponto Deincongruência fato, o CNJ tornou a publicação seus estendida relatórios até estatísticos como CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, alto do balanço anual de sua atuação, deixando de lado os motivos que promoveram dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo melhorias ou dificuldades pelos tribunais na busca pela de eficiência (OLIVEIRA, mote constitucional da garantia de existência mínima dignidade humana. É2015). Não um trabalho em cada tribunal, amparado nos dados estatísticos frágilhá sustentar que a regionalizado, cidadania se resume à comprovação documental, no sentido informados anualmente, com os propósitos corrigirdedistorções, incrementar orotinas de que, quando lesionado, o meio ambientede deprecia forma consequencial mínimo existencial deexitosas. todos os sujeitos do ordenamento jurídico.continuam Todos! agindo com e consolidar práticas O resultado é que os tribunais autonomia administrativa, sem retroalimentarem seus planejamentos com os seus ao fim e aonacabo, tal restrição aversa diretriz que o texto próprios Sendo dados estatísticos, permanente tentativa de àobedecer às metas traçadas constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de nacionalmente pelo CNJ. Portanto, o Conselho não demonstrou ser capaz de transformar, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar nessa década, a produção de informações estatísticas na elaboração de políticas de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em para solução dos problemas setoriais de cada Tribunal de Justiça. Mesmo dos numa perspectiva uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes direitos edeconceitos marginalizadores primeira que dimensão aoosustentar em seu bojo o não compreensão dos problemasdeestruturais assolam Sistema Judiciário, o CNJ reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares avançou no enfrentamento de diversas questões essenciais, tampouco na propositura de soluções concretas. verdade que CNJ compreendeu algumas atravancam o serviço 1. Art. 1.º É Qualquer cidadão seráoparte legítima para pleitear a anulação ou acausas declaraçãoque de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresjudiciário, como o uso predatório da justiça e o sistema recursal anacrônico, de modo so em juízo, será feita com oprotagonizou título eleitoral, ou com que a elenacional corresponda. pela conciliação, através que, desde 2006, umdocumento movimento 112
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do lançamento do Dia Nacional da Conciliação, cujo êxito deu ensejo à busca por mecanismos consensuais de solução de litígios (conciliação e mediação). A partir de 2010, foi instituída uma política nacional de tratamento de conflitos, com a criação de Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania - CEJUSCS por todos os Tribunais de Justiça. Segundo consta no portal do CNJ, todos os Tribunais de Justiça instalaram seus CEJUSCS nas capitais e nas maiores comarcas. A importância da adoção sistemática e ampla de soluções consensuais de conflitos foi reafirmada pela Resolução nº 198/2014, a qual dispõe sobre o planejamento e a gestão estratégica no âmbito do Poder Judiciário para o sexênio 2015-2020, de maneira a ressaltar a importância da efetividade na prestação jurisdicional e apontar como cenário desejado a justiça mais acessível, a desjudicialização e o descongestionamento do Poder Judiciário. Pelo que se observa, somente ao término de sua primeira década, o CNJ incluiu a estratégia da desjudicialização como uma meta na gestão dos Tribunais de Justiça. De fato, a premissa que orientou o CNJ no seu modelo de accountability focado na eficiência era de que os tribunais contavam com estruturas arcaicas, burocráticas, isoladas e pouco produtivas, por isso as ações de accountability foram voltadas à reformulação de processos internos e à adoção de ferramentas de planejamento estratégico. Nesse sentido, a partir do 2º Encontro Nacional do Judiciário, em 2009, o planejamento estratégico se direcionou ao alinhamento e nivelamento com o estabelecimento de metas nacionais, as quais eram ligadas, no mínimo, a um dos objetivos estratégicos. Apesar do desafio estabelecido de cumprir metas anuais, o CNJ acreditava estar legitimado por serem esses compromissos votados e aprovados pelos presidentes de todos os Tribunais de Justiça durante esses encontros anuais. Ocorre que a heterogeneidade dos tribunais, quanto ao nível de eficiência gerencial já instalado, foi determinante para o alcance ou o fracasso no cumprimento dessas metas anuais. Revelava também que as metas nacionais eram descontextualizadas das realidades regionais, o que provocava excesso de serviço e apreensão em alguns tribunais, enquanto outras cortes de justiça cumpriam as metas com maior funcionalidade e não avançavam em seus desafios locais. Fato é que, nos dois primeiros anos, foram indicadas 10 metas para o segmento da Justiça Estadual, cujo resultado foi considerado, num sentido geral, como desastroso (OLIVEIRA, 2015, p. 79). Algumas metas eram desafiadoras e demonstraram a fragilidade do judiciário estadual para a sua implantação. Como decorrência desse desempenho, a imprensa nacional elaborou diversas críticas, razão pela qual o CNJ considerou que aquela estratégia havia criado um grave problema de mensuração de produtividade (OLIVEIRA, 2015, p. 15), pois os indicadores das metas eram focados no curto prazo e não houve qualquer alinhamento com o planejamento orçamentário anual indispensável para a coordenação dos recursos nos projetos responsáveis pelo alcance desses objetivos. Como alternativa, a partir de 2011, houve uma revisão do modelo de metas proposto pelo próprio CNJ para adequar o foco estratégico nesses objetivos (OLIVEIRA, 2015): a) Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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definição de metas por segmentos do Judiciário (por exemplo, a Justiça Estadual poderia 5terAÇÃO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL metas POPULAR diferentes daCOMO Justiça Eleitoral); b) redução da quantidade de Metas (não havia mais a obrigatoriedade de ter dez metas por ano); c) antecipação da divulgação de metas Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz para os popular anos seguintes (divulgaram-se as metas dosPermanecem, anos de 2012contudo, e 2013),certas facilitando da ação no controle dos atos administrativos. adúvidas garantia de busca de recursos que seriam vinculados diretamente a quando se trata em uma orçamentários lógica desagregadora dos meios de produção, consumo descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado projetos deecumprimento das metas; d) foco nas metas não cumpridas em anos anteriores das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na e reconhecimento pelo cumprimento (visava garantir a continuidade dos esforços e propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização reconhecia os méritos das unidades judiciais que conseguiam o cumprimento). desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio A crítica mais recorrente a esse modelo de eficiência, como sinônimo de busca ambiental brasileiro. pela produtividade, relaciona-se ao conflito entre celeridade versus qualidade da prestação jurisdicional. Tal conflito enfatiza a superioridade quatitativa em relação à complexidade Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais das decisões judiciais. Como resposta, o CNJ passou a exigir o cumprimento de metas da proteçãoem do áreas meio que ambiente, quem tema legitimidade propor uma ação específicas demonstrassem efetividade dopara serviço judiciário, como o popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação julgamento de processos de improbidade administrativa, de corrupção e de homicídios. Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o Assim, o CNJ acreditava estar exigindo produtividade prioritária emeste questões que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova edeatenção cidadania, devendo com ampla repercussão social. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como Como saldo geral, a política de metas representou umas das principais ações de expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely accountability do CNJ, uma vez que, para além de buscar a celeridade no julgamento Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, de processos, na reorganização interna dos otribunais. Dessa de forma, apenas haveriaauxiliou legitimidade genuína de pleito quando direito político elegero CNJ passou a considerar para alcançar uma accountability orientada para a eficiência corresponder a um deque, fiscalizar. do serviço público, precisava combater a principal causa da morosidade sistêmica da Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma justiça brasileira: a sobrecarga de trabalho e o mau funcionamento da primeira instância. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que Para tanto, a Resolução nº 184/2013 passou a exigir que os anteprojetos de alei que CRFB/88, emaumento seu bojo,detraz a dirigência de ações positivassociais, do Estado para prover,estudo implicassem gastos com pessoal e encargos apresentassem dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo técnico fundamentado, forma de queexistência somente fossem casohumana. demonstrassem mote constitucional da de garantia mínimaapreciados de dignidade É estar tribunais dentro de um intervalo do seu respectivono ramo de Justiça frágilos sustentar que a cidadania se resumedeà confiança comprovação documental, sentido quanto Índicelesionado, de Produtividade Comparada da Justiça – IPC-Jus. Além disso, de que, ao quando o meio ambiente deprecia de forma consequencial o com mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! a finalidade de orientar a política nacional de atenção prioritária ao primeiro grau de jurisdição (Resolução nº 194/2014) e a distribuição proporcional do orçamento nos ao efim ao cabo, tal do restrição à diretriz que nº o texto órgãos doSendo primeiro do esegundo graus Poder aversa Judiciário (Resolução 195/2014), constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de previu-se a utilização dos novos índices de eficiência, como o Índice de Produtividade cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar dos Servidores da Área JudiciáriaUma IPS-Jud (o qual computa a média de processos de tutela de matéria ambiental. constituição como a nossa, pautada em baixados por servidor da área judiciária), o Índice de Atendimento Demanda uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontesàdos direitos IAD e(verifica conceitos dimensãopelo ao sustentar seu bojo o se omarginalizadores tribunal foi capazdedeprimeira baixar processos menos emem número equivalente reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares ao quantitativo de casos novos) e o Índice de Produtividade dos Magistrados IPM. Portanto, o modelo atual de accountability, focado na eficiência, utilizou-se de dados estatísticos produzidos para para orientar e programas 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima pleitearações a anulação ou a declaraçãoconcretos de nulidade deque atos repercutam lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresno funcionamento dos Tribunais de Justiça. Pode-se avaliar que, ao final de sua primeira so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. década, o CNJ promoveu uma substancial reformulação de padrões e de cultura 114
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accountable, cuja implantação vem sendo progressiva e mediada pela transparência, pela participação dos magistrados e servidores e por um controle social efetivo. 6.3 Dever de Qualidade A dimensão da qualidade do serviço público judiciário não é tarefa de fácil avaliação, porque as ações judiciárias produzem resultados intangíveis e as decisões judiciais envolvem partes distintas, que saem do processo litigioso com percepções diferentes, quando não opostas entre si. Em termos amplos, a qualidade é definida como um indicador geral, composto dos demais indicadores de desempenho, ou seja, um judiciário de qualidade seria aquele cujos recursos são geridos com eficiência, as demandas são julgadas com celeridade e seriedade, busca-se o amplo acesso aos usuários e a atenção a demandas com grande repercussão social ou com déficit de programas judiciários. Compreendido esse conceito, serão apresentadas as ações e programas do CNJ que visaram incrementar a qualidade do serviço judiciário, sem adentrar no campo da avaliação, por envolver outros ramos do conhecimento científico. Frise-se que foco do CNJ não foi a busca pela qualidade individual das decisões judiciais, porque já existiam instrumentos suficientes de controle e de correção, que compreendiam desde o sistema recursal, passando pelo recrutamento técnico e pela permanente capacitação do corpo de juízes, até a punição disciplinar dos magistrados com conhecimentos insuficientes para o desempenho da função. De fato, a dinâmica do Conselho Nacional de Justiça, ao assumir o papel de protagonista da governança judiciária, foi identificar as demandas que precisavam de atenção prioritária pelos órgãos de cúpula dos Tribunais de Justiça e de oferecer planos de ações que aprimorassem a prestação desses serviços judiciários e correlatos. Consultando-se o site oficial18, observam-se diversos programas capitaneados pelo CNJ ao longo dessa década, destacando-se os seguintes: Começar de Novo (Ressocialização de presos e egressos do sistema carcerário), Cidadania nos Presídios (Aplicação de alternativas penais com enfoque restaurativo), Violência contra a Mulher, Cadastro Nacional de Adoção, Assuntos Fundiários, Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas, Combate à Corrupção (Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro - Enccla); Fórum da Saúde (Monitoramento e resolução das demandas de assistência à Saúde), Audiência de Custódia (Análise inicial sobre o cabimento e a necessidade de prisão ou imposição de medidas alternativas), Redescobrindo os Juizados Especiais, Doar é Legal (Incentivo à doação de órgãos, células e tecidos), Segurança Pública (Estratégia Nacional de Justiça e Segurança 18. Vide em http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes. Acesso em 22 de maio de 2016.
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Pública Enasp) e Precatórios (Padronizar a gestão de precatórios nos tribunais). 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Considerando-se as temáticas abordadas, a criação desses programas revelou-se de vital importância a melhoria do serviço judiciário ou,e pelo Não restampara dúvidas quanto da ao qualidade caráter de controle popular direto eficazmenos, da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas para promover impactos positivos na imagem institucional dos Tribunais de Justiça e, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, principalmente, do próprio CNJ. Cada um desses programas recebeu um tratamento consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso multipolarizado especial quando de seus lançamentos por determinação doserespectivos Presidentes das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na epropositura Corregedores idealizadores. Porém, ainda que a avaliação de desempenho de cada da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização programa demande de umatuação estudo específico, que todos eles enfrentaram desta possibilidade cidadã compode-se vistas àafirmar conservação do patrimônio oambiental problema da descontinuidade administrativa, haja vista que deixaram de receber brasileiro. visibilidade e estrutura necessárias para a manutenção de seus resultados a partir do na análiseasaalternâncias princípio denadoutrina no tocante ao momentoSegue-se, em que ocorreram direçãoedolegislação, CNJ. polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 7 CONCLUSÃO Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como elementos não recepcionado pela vigente ordem constitucional. O artigo forneceu para aprofundar o conhecimento sobre o modelo Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária de accountability adotado pelo Conselho Nacional de Justiça, noentende, segmentocomo da Justiça expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Estadual, no período de 2005 a 2015, classificando as ações em dimensões instrumentais Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, eapenas finalísticas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Numa avaliação final, tem-se que o modelo de accountability do CNJ, adotado nessa década, decorreu exclusivamente de uma corrente teórica Gestada Sem não maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, queespecífica. existe uma pela histórica reclamação de crisecom no poder judiciário, impulsionada pelasque ideias relevante incongruência normativa toda análise estendida até aqui, visto a de CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, reforma do Estado e criada após um pacto republicano entre os três poderes instituídos, dentre muitos, o meio como elemento compositor de deum umlegítimo complexo o Conselho Nacional de ambiente Justiça desenvolveu ações decorrentes processo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É do de deliberação política entre seus conselheiros, mas sob forte liderança do presidente frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido STF. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimoAexistencial de todos os sujeitos do em ordenamento jurídico. Todos! aos valores do accountability do CNJ corrigiu, especial, falhas referentes republicanismo no âmbito do poder judiciário. Com efeito, os princípios constitucionais Sendo ao da fim e ao cabo, restrição nortearam aversa à diretriz que o texto da impessoalidade, moralidade e datal publicidade inúmeras ações programas constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de do Conselho. Para tanto, o CNJ ultrapassou os limites tradicionais da legalidade, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar na medida exercitou seu poder maneira intensa. Assim de tutelaemdeque matéria ambiental. Umaregulamentar constituição de como a nossa, pautada emsendo, constata-se quecomunitária o CNJ não se ateve aos padrões clássicos do liberalismo, o que pode uma realidade e diversificada, expande os horizontes dos direitos erepresentar conceitos uma marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojofacilitou o distorção em suas atribuições. E, quanto à democracia, o CNJ reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares o acesso à informação, à gestão compartilhada e à instalação de canais de controle social, mesmo sendo necessário o seu constante aprimoramento. tem-se o CNJ não conseguiu modelo 1. Art. 1.º Como Qualquer conclusão, cidadão será parte legítima que para pleitear a anulação ou a declaraçãoimplementar de nulidade de atosum lesivos ao patrimônio de da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova cidadania,relacionadas para ingresdefinido accountability aos Tribunais de Justiça, por darazões à so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
descontinuidade administrativa de suas ações, ao seu baixo grau de institucionalização 116
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e à seletividade de sua atuação, o que comprometeu a consolidação de um sistema homogêneo de regras e de práticas de accountability. ABSTRACT Accountability is defined as a fundamental institution in contemporary societies, especially as a counterweight to the limitations of representative democracies. In the case of the Brazilian judiciary, accountability acts as a coping mechanism to opacity in the exercise of that power, and to correct the deficits of control, transparency and efficiency. While the Courts of Justice have been given guarantees of independence, internal control mechanisms, particularly the internal affairs of Justice proved to be inadequate and dysfunctional to set limits, set targets and punish misconduct. In this scenario, the National Council of Justice was established in 2004 with the task of reshaping the legal governance of the courts and be the central agency for judicial accountability. Thus, this article aims to perform a balance of the actions and CNJ programs with accountability features, focusing on the segment of the Courts of Justice, to examine whether there was the formation of a defined model of accountability in the first decade of operation. Keywords: Accountability. National Council of Justice. Courts of Justice. Democratic control.
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5RULLI AÇÃONETO, POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE Judiciário TUTELAno AMBIENTAL Antonio. Controle Externo do Poder Brasil. Tese de doutoradoNão da Faculdade de Direito da USP. São Paulo: USP, 2007. restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas RUSSELL, PeterseH.trata Judicial the Age of Democracy Criticalde Perspectives from dúvidas quando emIndependence uma lógicaindesagregadora dos :meios produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Around the World. O’Brien University of Virginia Press, 2001. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, paraOaJudiciário ocupação em do polo passivo e, sobretudo, na publicização SADEK, Maria Teresa. debate. São Paulo: Ed. Sumaré, 2003. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. SAMPAIO, José Adércio Leite. O Conselho Nacional de Justiça e a Independência do Judiciário. Belo Horizonte: Dela Rey Editora, 2007. e legislação, no tocante ao Segue-se, na análise princípio de doutrina polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade The paraSelf-Restraining propor uma ação SCHEDLER, Andreas. “Conceptualizing Accountability” State: popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Power and Accountability in New Democracies. Ed. Andreas Schedler, Larry Diamond, Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o and Marc F. Plattner. Boulder and London: Lynne Rienner Publishers, 1999. este que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS: A EXPERIÊNCIA COMUNITÁRIA DE FORMAÇÃO CIDADÃ DE CRIANÇAS E DE ADOLESCENTES NA VILA ILDEMAR, MUNICÍPIO DE AÇAILÂNDIA/MA Fabrício Oliveira Gomes*1 RESUMO A educação em Direitos Humanos está voltada para a mudança social, direcionando-se ao pleno desenvolvimento humano e às suas potencialidades. Sua implementação dá-se por meio de um permanente processo de sensibilização e formação de consciência crítica, favorecendo o empoderamento de grupos sociais. O presente trabalho se situa no campo da educação não-formal em direitos humanos. O foco principal é analisar a experiência comunitária de formação cidadã realizada por uma Organização Não-Governamental no Município de Açailândia/MA. Defende-se a tese de que a formação realizada por ela pode ser entendida como um exemplo de Educação em Direitos Humanos, posto contribuir para uma prática reflexiva e o processo de empoderamento de crianças e de adolescentes. Palavras-chave: Direitos Humanos. Educação. Formação Cidadã.
1 INTRODUÇÃO O Centro de Defesa da Vida Carmen Bascarán (CDVDH), localizado no Município de Açailândia/MA, é uma organização com força comunitária e presença, principalmente, nos bairros Vila Ildemar e Vila Bom Jardim, tendo em cada um deles um Centro Comunitário, onde são desenvolvidas todas as ações da Instituição. Por meio de sua equipe de formação, o Centro busca sistematizar ações de conscientização popular e oferecer uma proposta educacional para a comunidade. A formação oferecida à comunidade contribui de maneira efetiva no cotidiano dos educandos, pois favorece o exercício da cidadania e o protagonismo social, estando dividida em três níveis: I, II e III. O objetivo deste artigo é apresentar a experiência comunitária de formação cidadã realizada na Vila Ildemar como exemplo de Educação em Direitos humanos, posto contribuir para a aquisição de uma consciência crítica de seus participantes e favorecer o *. Fabrício Oliveira Gomes; Bacharel em Direito e Especialista em Educação, Direitos Humanos e Diversidade, ambos, pela Universidade Federal do Pará; Comissário de Justiça da Infância e Juventude; E-mail: fogomes@tjma.jus.br
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o processo de empoderamento. Para tanto, focar-nos-emos apenas na análise do nível 5I, AÇÃO MEIO DEparticipação TUTELA AMBIENTAL por ser POPULAR aquele que, COMO hoje, conta comDIFUSO uma maior da comunidade local e também por ser onde são presenciados inúmeros casos de violações de direitos. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, 2consumo DIREITOS HUMANOS e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Na Europa,deapós a Guerra doscom Trinta Anos, com a assinatura dos tratados de desta possibilidade atuação cidadã vistas à conservação do patrimônio Münster Osnabrüc¹, dá-se início a um novo sistema político internacional, qual seja, ambientale brasileiro. aquele que reconheceria princípios como os de soberania estatal e o de Estado-nação. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante Logo em seguida, sob a influência dos filósofos iluministas (séculosaoXVII e polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais XVIII), retomou-se o conceito cidadão, pelos interligando-o à da proteção do meio ambiente,dequem temconsagrado legitimidade pararomanos, propor uma ação ideia de limite ao poder absoluto do rei. É neste momento, dizeres de Dalmo popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos nos iniciais da Lei de AçãoDallari 1 (2009), a pessoa humana, bem mais valioso quando da humanidade, começa define a ser colocada Popular que (LAP – lei nº4.717/65) a contundência em sua extensão o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este acima de qualquer outro valor. Surge, por conseguinte, a noção de dignidade humana, dispositivo ser espiritual tido comoimanente não recepcionado vigente ordem constitucional. que é um valor ao própriopela homem, também considerado o preceitoComungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como matriz em que se fundamentam os direitos humanos. Inexiste, portanto, a possibilidade expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely de definirmos direitos humanos sem o contexto Estado ee deveres, da sociedade, pois é ele Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia do de direitos ipso facto, consequência diversas fontes, dentre as quais, os costumes civilizações antigas, a apenas haveriadelegitimidade genuína de pleito quando o direitodepolítico de eleger produção jusfilosófica, a disseminação do cristianismo, etc. corresponder a um de fiscalizar. Em por nãofica ser este o objeto principal do nosso trabalho, filiamoSemapertada maioressíntese, obstinações, claro, permissa vaenia, que existe uma nos à definição de direitos humanos trazida pelo Professor Sampaio Penteado relevante incongruência normativa com toda análise estendidaNestor até aqui, visto que a Filho (2006), concebe CRFB/88, emque seu obojo, traz acomo: dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Um conjunto de prerrogativas e garantiasdocumental, inerentes ao homem, cuja finalidade frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial básica é o respeito à sua dignidade, tutelando-o contra os excessos dooEstado, mínimo existencial de todos os sujeitos ordenamento jurídico. estabelecendo umdo mínimo de condição de vida. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá,trazido dada apor impossibilidade de de restrição doúltima conceito de é o O conceito ele corrobora clara a ideia que, em análise, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar Estado o maior violador dos direitos humanos, necessitando, portando, o indivíduo de de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma especial, expressae no reconhecimento de um de dos prerrogativas uma tutela realidade comunitária diversificada, expande os conjunto horizontes direitos e de garantias inerentes ao homem.de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o e conceitos marginalizadores reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 3 EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresSegundo Programa de Educação em Direitos Humanos da Unesco, so em juízo, será feita comoo título eleitoral,Mundial ou com documento que a ele corresponda.
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primeira fase (2012), nos últimos anos, o Brasil tem avançado de forma significativa no campo da Educação em Direitos Humanos, tornando-se referência internacional na institucionalização de uma cultura de direitos humanos e sistemas educacionais formais e não formais. Mas o que vem a ser Educação em Direitos Humanos? Como dito alhures, os direitos humanos correspondem a um conjunto de prerrogativas e de garantias que devem ser asseguradas a todo cidadão, cuja finalidade principal é o respeito à sua dignidade. A pessoa humana, portanto, como lembra Dalmo Dallari (2004), bem mais valioso da humanidade, deve estar acima de qualquer outro valor. Não obstante os inúmeros instrumentos nacionais e internacionais surgidos ao longo dos anos com o objetivo promover os direitos humanos, dentre eles, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (Paris, 1948), a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (Nova York, 1989), a Declaração e Programa de Ação da Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância Correlatas (África do Sul, 2001), o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (2003), o Programa Nacional de Direitos Humanos (Decreto nº 7.037/2009), etc, eles continuam sendo recorrentemente violados. Recentemente, a Anistia Internacional, em seu relatório anual “O Estado dos Direitos Humanos no Mundo – 2015” apontou que o Brasil segue com casos graves de violações dos Direitos Humanos, destacando-se os altos números de mortos em operações policiais e a falta de um plano nacional para redução de homicídios. De acordo com o relatório, não foi possível calcular o número preciso de mortos durante a atuação da polícia nos Estados por falta de transparência. Também foram destacados no documento, que analisa as violações de Direitos Humanos em mais de 160 países e territórios, as chacinas em várias partes do Brasil, a impunidade, as más condições da população carcerária, os conflitos agrários, o problema da moradia, etc. Em meio a esse contexto, os direitos humanos simbolizam, nas palavras de Luigi Ferrajoli (2002): A lei do mais fraco contra a lei do mais forte, na expressão de um contrapoder em face dos absolutismos, que advenham do Estado, do setor privado ou mesmo da esfera doméstica.
Embora a conceituação de Educação em Direitos Humanos seja um tema em aberto, que tem suscitado extenso debate e, portanto, longe de um consenso entre os
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diferentes autores e perspectivas, vemo-la como uma educação voltada para a mudança 5social, AÇÃO MEIO DIFUSO DE TUTELA quePOPULAR se assenta naCOMO prática reflexiva e no empoderamento dasAMBIENTAL pessoas e grupos sociais. As aos direitos humanos no Brasil, apontadas Relatório da Nãorecentes restam violações dúvidas quanto ao caráter de controle popular diretonoe eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Anistia Internacional, deixam claro que não basta termos instrumentos jurídicos que visem dúvidas quando se trata em umaé preciso, lógica desagregadora meios de produção, a promover os direitos humanos, nos dizeres de dos Candau (2002), internalizá-los consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado no imaginário social, nas mentalidades individuais e coletivas, de modo sistemático e das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na consistente, modo, odoempoderamento e coletivo, especialmente propositura promovendo, da ação, paradesse a ocupação polo passivo e,individual sobretudo, na publicização dos sociais desfavorecidos ou discriminados. destagrupos possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambientalEm brasileiro. relação ao processo de internalização dos direitos humanos, Maués e Weyl (apud, ANCHANJO, 2014) entendem que a Educação em Direitos Humanos requer: Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação Refletir em torno das condições de possibilidades, reprodução e justificação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação das formas simbólicas, sociais e políticas permissivas, tornamo banal a 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensãoquedefine da natureza e vulgarizam diversasdevendo e naturalizam que é cidadania, ao trazer violação que o título eleitoral é a provaviolações de cidadania, esterelações de submissão, exclusão, exploração, discriminação, da violência, dispositivo ser tido comohumanas não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina preconceito, perseguição, enfim. majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade por genuína de corrobora pleito quando direito político deque eleger Esse entendimento, sua vez, com o de Tavares (2007), apresenta corresponder a um de fiscalizar. a Educação em Direitos Humanos como, na atualidade, uma ferramenta fundamental na construção da maiores formaçãoobstinações, cidadã, assim afirmação de direitos, pois uma possibilita Sem ficacomo claro,napermissa vaenia, que existe sensibilizar e conscientizar as pessoas importância do respeito ser que humano. relevante incongruência normativa compara todaaanálise estendida até aqui,ao visto a CRFB/88,Fritzsche em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, (apud, CANDAU, 2013), no desenvolvimento de suas 15 (quinze) dentre muitos, o meio ambiente como compositor de umque complexo teses sobre o que significa Educação em elemento Direitos Humanos, destaca ela deve visar mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É ao “empoderamento” das pessoas e de grupos sociais. No mesmo sentido, Candau frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido(2007) aponta ela umlesionado, processo que favorece a formação de sujeitos de direitos, a nível opessoal de que,ser quando o meio ambiente deprecia de forma consequencial emínimo coletivo, e articulade astodos dimensões ética,do político-social as práticas concretas. Assinala, existencial os sujeitos ordenamentoe jurídico. Todos! ainda, a referida autora que um elemento fundamental na educação em direitos humanos Sendo aodofim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto é o favorecimento processo de “empoderamento”. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de a formação cidadã realizada pelo Centro de Defesa da Vida de cidadaniaEscolhemos que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar Açailândia, no Centro Comunitáriocomo da Vila Ildemar, como objeto de tutela departicularmente, matéria ambiental. Uma constituição a nossa, pautada em de uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos nosso estudo, exatamente, por se propor a contribuir com a aquisição de uma consciência ecrítica conceitos marginalizadores departicular, primeira dimensão aoesustentar em seu ebojo o da comunidade local, em de crianças de adolescentes, a favorecer reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares o processo de empoderamento. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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4 O CENTRO DE DEFESA DA VIDA CARMEN BASCARÁN 4.1 Açailândia Antes de falarmos do histórico e da atuação do Centro de Defesa da Vida, convém conhecemos um pouco Açailândia, cidade onde ele possui sede e desenvolve a maioria de suas atividades. Embora fundada apenas em 06 de junho de 1981, quando se emancipou do município de Imperatriz, Açailândia surgiu em 1958, com as obras da BR-010, que mobilizou cerca de 1,2 mil trabalhadores para a região. A cidade está situada às margens da BR-010 (Federal) e da BR-222 (Estadual), ao sul do Maranhão, sendo cortada pelas ferrovias Carajás e Norte-Sul, localizada, portanto, no maior centro rodoferroviário do norte-nordeste. É o oitavo município mais populoso do Maranhão, com uma população em torno de 104.013 habitantes, segundo estimativa do IBGE (2010). A base da economia de Açailândia é a siderurgia, com a exportação de ferro gusa gerada por cinco indústrias instaladas no município, sendo, portanto, a sua principal fonte de renda. O comércio é forte na área urbana, onde há diversos estabelecimentos comerciais dos mais diversos ramos de produtos e serviços. Na zona rural, a pecuária tem um peso econômico considerável, concentrando o maior rebanho bovino e a maior produção leiteira do estado. De acordo com o senso de 2010 (IBGE), o município é dono de um PIB per capita de 12.567,81 reais, ficando atrás somente da capital, São Luís, que aparece com 17.703,61 reais, vindo em terceiro lugar a cidade de Imperatriz, com 8.562,28 reais. Considerando-se o PIB total, Açailândia é o terceiro do estado, com 1.307.215 mil reais, superado pelo da capital com 17.915.048 mil reais e o de Imperatriz com 2.119.619 mil reais. Apesar da forte atividade econômica em Açailândia e, inclusive, a cidade já ter sido apontada em uma reportagem especial da Revista Veja como “as 20 Metrópoles do Futuro”, ela apresenta um IDH – Índice de Desenvolvimento Humano – de 0,672 (IBGE, 2010), considerado médio dentro dos parâmetros estabelecidos para aferição desse indicador. De acordo com o Mapa da Pobreza e Desigualdade lançado pelo IBGE em 2003, o Índice de Incidência da Pobreza de Açailândia era de 58,66%, o que representa metade de sua população vivendo abaixo da linha da pobreza. A pobreza da população de Açailândia se reflete no fato de que, hoje, o Programa Federal de maior importância social no município é o Bolsa Família. Segundo o IBGE, em 2006, o programa atendeu a 8.817 famílias em situação de vulnerabilidade social. Em abril de 2016, segundo a CEF, foram atendidos pelo programa 11.341 famílias, o que Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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significa um aumento do número de beneficiados na ordem de 22,26% em relação a 2006. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL No que diz respeito à educação, segundo o IBGE (2012), o município conta com 85 escolas de ensino fundamental, escolas ensinopopular médio, 62 escolas de ensino Não restam dúvidas quanto ao18 caráter de de controle direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas pré-escolar. Em 2010, 37.127 pessoas frequentavam creche ou escola. Em 2012, esse dúvidas quando trata Em em relação uma lógica desagregadora meios de produção, número caiu parase 29.632. à educação superior, dos a cidade conta apenas com uma consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado universidade pública estadual (UEMA), o que leva os jovens que pretendem ingressar em das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na um curso superior a se deslocarem para que ficana a, publicização aproximadamente, propositura da ação, para a ocupação do Imperatriz, polo passivocidade e, sobretudo, 70 kmpossibilidade de Açailândia.de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio desta ambientalAbrasileiro. despeito de a vigente Constituição Brasileira proibir qualquer tipo de trabalho ao menor de 14 anos de idade, inclusive a aprendizagem, o senso do IBGE, realizado Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao em mostrou que,numa em Açailândia, 9.257 crianças, entre 10 e 13comunais anos de idade, polo2010, ativo da demanda leitura da CRFB/88 observados os deveres encontravam-se no mercado trabalho, sendo 1,7% total composto da proteção do inseridas meio ambiente, quemdetem legitimidade para desse propor uma ação por aquelas não frequentavam a escola. Não pornos acaso, o Maranhão ocupava, em 2014, a popular?que É possível destacar textualmente logo artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o 5º posição no ranking nacional de exploração do trabalho infantil, segundo levantamento que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este feito com base na Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios – PNAD. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Ainda no esse campo do trabalho, acordo comentende, lista divulgada Comungada com ponto de vista,Açailândia, a doutrinademajoritária como pelo Ministério Trabalho e Emprego, em 2014, estavaHumberto entre os municípios doHely Maranhão expresso nado lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Theodoro Jr., Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, com maior incidência de trabalho escravo. Em 2012, tal realidade já era apontada pela apenas haveria legitimidade genuína quando o direito político de eleger Comissão Pastoral da Terra que, em de seupleito relatório anual “Conflitos no Campo – Brasil corresponder a um de fiscalizar. 2011”, atribuiu à cidade o vergonhoso título de campeã em denúncias de trabalho escravo no Maranhão. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante Como incongruência normativade com toda análise estendida até aqui, visto que a visto, o município Açailândia/MA, embora apresente bons indicadores CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, econômicos, padece com graves problemas sociais e violações dos direitos humanos e, por dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo isso, Centro de Defesa da Vida,de assim como outras organizações não-governamentais mote oconstitucional da garantia existência mínima de dignidade humana. É que na cidade, possuemseum papelà fundamental defesa e nanopromoção frágilatuam sustentar que a cidadania resume comprovaçãona documental, sentido dos direitos de que, humanos. quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! 4.2 Histórico e atuação Sendo ao fim edoaoCDVDH/CB cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar apenas Centro de Defesa da Vidacomo e dos Direitos de tutela Inicialmente, de matéria ambiental. Uma constituição a nossa,Humanos pautada(CDVDH), em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos a organização não-governamental, sem fins lucrativos, fundada em 18 de novembro de e1996, conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seupara bojoerradicar o foi idealizada por um grupo de pessoas que decidiram contribuir reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares as graves violações aos direitos humanos que vinha sofrendo o povo mais humilde de Açailândia e de todo o Maranhão. Em 2010, espanhola Carmem Bascarán Collates, defensora 1. Art. 1.º Qualquer cidadãoem seráhomenagem parte legítima paraà pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, Estados, dos Municípios[...] A prova da cidadania, para ingresdos direitos humanos e uma dasdosfundadoras do Centro,§ 3ºele passou a agregar seu nome, so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
chamando-se, a partir de então, Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmem 126
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Bascaraán (CDVDH/CB). No ano de 2015, em visita ao município de Açailândia, Carmen concedeu entrevista à redação do “Boletim da Vida”, publicação periódica do Centro, declarando acerca de sua criação que: Não era uma aventura irreflexiva, precisou de muita escuta, estudo e dedicação para tomar forma e iniciar o caminho. Foram muitas noites na casa de uma ou outra pessoa, onde primeiro foram colocadas as preocupações que mais nos inquietavam. Estudamos quais eram os direitos humanos que mais eram vulnerados e por fim demos forma à ideia da criação do CDVDH.
Ainda segundo ela, “o CDVDH foi e deve continuar sendo uma luz em Açailândia”. De fato, na década de 90, Açailândia apresentava graves problemas sociais: 39% da população com 15 anos ou mais era analfabeta (FUNDAÇÃO VALE, 2006, p.5); apenas 27,88% da população era atendida pelo serviço de abastecimento de água, segundo o site Deepask; um número alarmante de pessoas não possuíam registro de nascimento; etc. O trecho abaixo, extraído da entrevista supracitada, descreve um pouco do caos social em que se encontrava a cidade naquela época: O caos e o descaso da administração eram terríveis, somente o centro da cidade estava calçado. As associações, sindicatos, etc, em sua maioria, estavam atrelados a políticos que faziam deles sua parcela privada para poder roubar tudo àquilo que podiam. Como as leis não eram cumpridas, o registro de nascimento era um luxo que não podiam usufruir todas as pessoas, e essa exclusão fazia com que os mais pobres nunca pudessem ser olhados como cidadãos de fato e de direito.
Com a entrada em cena do Centro, várias ações e projetos foram realizados com o objetivo de reverter esse quadro caótico que assolava o município, dentre eles destacamse: Campanha do Registro Civil, em parceria com outras entidades da sociedade civil, garantindo ao povo de Açailândia o direito à certidão de nascimento gratuita, conforme determina a lei (1997); Trabalho de conscientização e formação de agentes populares de cidadania nos bairros periféricos de Açailândia, embrião dos atuais Centros Comunitários do CDVDH/CB (1998); Campanha contra a corrupção eleitoral e administrativa (2000); Campanha pela Defensoria Pública no Estado do Maranhão, que culminou com a realização de concurso público para defensores no Estado (2001); Implantação do Projeto Balcão de Direitos, patrocinado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, voltado para assistência judiciária gratuita (2004); Apresentação, por meio de sua assessoria jurídica, Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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de 21 denúncias de trabalho escravo, envolvendo 403 trabalhadores, resultando em 08 5fazendas AÇÃOfiscalizadas POPULARe COMO MEIO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL 68 trabalhadores resgatadosDE (2009); Campanha de conscientização e oficinasNão sobrerestam o trabalho escravo, direitos humanos e os mecanismos de acesso à justiça dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz (2011); Projeto Encontros ComunitáriosPermanecem, para o Combate ao Tráfico Humano da ação Realização popular no do controle dos atos administrativos. contudo, certas (2015); dúvidas dentre quandooutros. se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo Hoje, e descarte, diante do crescimento vertiginoso multipolarizado após 20 anos de atuação do Centro de Defesa, sãoe perceptíveis os avanços das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na alcançados. Em 2010, segundo o IBGE, a taxa de analfabetismo entre a população propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização com 15 anos ou mais foi de que significa uma àredução de maisdodepatrimônio 50% em relação desta possibilidade de 17,02%, atuação ocidadã com vistas conservação àambiental taxa de 39% apresentada pela Fundação Vale em 2006. No ano de 2013, o percentual brasileiro. da população atendida pelo serviço de abastecimento de água, segundo o site Deepask, nade análise a princípio de doutrina e legislação, tocante ao na registrou Segue-se, um aumento 8,46%. Desde 1996, várias campanhas vêmno sendo realizadas polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais cidade no sentido de garantir o registro de nascimento à população, dentre elas, destacamos da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação apopular? impulsionada pelodestacar Centro de Defesa, no logo primeiro mês deiniciais sua atuação, segundo a É possível textualmente nos artigos da Leique, de Ação ONG Repórter resultou 1em mais de 6.800quando pessoas o seu registro. Popular (LAP –Brasil, lei nº4.717/65) a contundência emobtendo sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este tem O Centro de Defesa da Vida, portanto, ao longo desses anos de existência, dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. cumprido com a sua missão principal, que, segundo o seu Estatuto é: Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, Defender a vida, onde for mais ameaçada e os Direitos Humanos, onde forem apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger menos reconhecidos, com atenção privilegiada aos mais pobres, explorados corresponder a um de fiscalizar. e oprimidos. (CDVDH/CB, 2005, p. 13).
Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a o Centro é, atualmente, referência no combate ao trabalho CRFB/88,Não em por seu caso, bojo, traz a dirigência de açõesuma positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo escravo no Maranhão, tendo sua atuação estendida para outros municípios, a exemplo de mote da garantia existência desponta mínima de Santa constitucional Luzia, que, juntamente comdeAçailândia, no dignidade ranking dohumana. trabalho É escravo frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido no estado. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o Sobre a suadeatuação combate trabalho escravo, oportunas mínimo existencial todos osnosujeitos doao ordenamento jurídico. Todos! as palavras de D. Pedro Casaldáliga em carta divulgada durante a II Conferência Inter-participativa Sendo Escravo ao fim em e aoFazendas cabo, tale Carvoarias, restrição aversa à diretriz que o de texto sobre Trabalho realizada pelo Centro Defesa e constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de parceiros no ano de 2007, em Açailândia: cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos O Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia vem e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o causa titulares do trabalho digno, verdadeiramente reconhecimento da pessoaassumindo humana exemplarmente e não humanaacomo humano, denunciando o trabalho que desumaniza e conscientizando o povo trabalhador, mais concretamente nestas fazendas do latifúndio iníquo e nas carvoarias queimam as pessoas juntamente a lenha. (BASCARAN; 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítimaonde para pleitear a anulação ou a declaração de com nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito MOURA; Federal, dosTEIXEIRA. Estados, dos Municípios[...] 2007. p.13).§ 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Contudo, toda essa atuação exitosa do CDVDH/CB só tem sido possível devido, principalmente, à sua capacidade de agregar e mobilizar pessoas, em particular, por meio da formação cidadã. No tópico a seguir, passaremos à análise da experiência comunitária de formação realizada na Vila Ildemar, onde crianças e adolescentes, em situação de risco ou mesmo violadas em seus direitos, têm sido levadas a acreditarem no seu potencial, como agentes de transformação da própria vida e do mundo em que estão inseridas. 5 A EXPERIÊNCIA COMUNITÁRIA DE FORMAÇÃOCIDADÃ DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA VILA ILDEMAR 5.1 O Centro Comunitário da Vila Ildemar A criação do Centro Comunitário da Vila Ildemar, em 2007, é resultado de um trabalho de conscientização e de formação de agentes populares de cidadania nos bairros periféricos de Açailândia ao longo desses 20 anos de existência do CDVDH/CB, que culminou na criação de 04 (quatro) centros comunitários: Centro Comunitário da Vila Bom Jardim, Centro Comunitário da Vila Capelloza, Centro Comunitário da Vila Ildemar e Centro Comunitário do Jacú. Localizada a cerca de 7 km do centro da cidade de Açailândia, a Vila Ildemar concentra parte significativa da população do município, tendo sido considerada, em 2005, a maior Vila do Estado do Maranhão. O local onde se encontra o bairro era, no início da década de 90, uma grande roça de arroz popular, criada pela prefeitura da cidade para os mais necessitados do município. Não por acaso, a Vila ter recebido o nome do prefeito da época, Ildemar Gonçalves. Devido ao seu crescimento desordenado e à situação de vulnerabilidade social de sua população, a Vila Ildemar apresenta um grande número de casos de violações de direitos, a exemplo do tráfico de drogas, da prostituição e do trabalho infantis, da violência doméstica, etc. Neste sentido, confirmando a situação de vulnerabilidade social dos moradores do bairro, as palavras da agente de cidadania do Centro Comunitário “[...] a maioria participa dos programas sociais, bolsa escola, bolsa família, na verdade, tem gente que só ganha isso [...]”. Outro aspecto importante relacionado ao perfil dos educandos é a conformação familiar. De acordo com a agente: “Geralmente, são crianças e adolescentes criados pela avó ou só com a mãe e, ainda que morem com a mãe e o pai, acabam ficando sob a responsabilidade da avó[...]”. Em ralação às mães, ela ainda fez a seguinte observação
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“[...] são mães novas e com muitos filhos, geralmente, sem pai [...]”. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL No que diz respeito a sua organização, o Centro Comunitário possui uma agente de cidadania, formadadúvidas pelo Centro responsável por cuidar doe espaço, Não restam quantode aoDefesa, caráter de controle popular direto eficaz pela da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas organização das atividades culturais e pela mobilização dos educandos e da comunidade dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, para as atividades de formação. É ela, portanto, que estabelece o elo entre a comunidade consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado local e o CDVDH/CB. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na Háda três educadores sociais no Centro, sendoe,cada um responsável por um tipo propositura ação, para a ocupação do polo passivo sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio de atividade cultural: dança, teatro e capoeira. Há também a ginástica aeróbica, que é ambiental brasileiro. oferecida, preferencialmente, às mães das crianças e dos adolescentes que participam das atividades culturais. Ao todo, entre crianças e adolescentes, há, atualmente, 42 educandos Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao matriculados em uma ou maisleitura atividades. polo ativo da demanda numa da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor Em relação à matrícula e permanência dos educandos menoresuma nasação atividades popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação pelo culturais, é exigido dos mesmos1que participem dos espaços de formação oferecidos Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando suaeles extensão o Centro: palestras e formação mensal. Outra condição exigidaem é que estejamdefine regularmente que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este matriculados a escola e, além disso, tenhamordem um bom rendimento. dispositivo sere frequentando tido como não recepcionado pela vigente constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely eles tem que estar estudando, só estudando, ter um bom Meirelles, que em síntese[...] correspondem-se a ideia denãodireitos e deveres, ipsocomportamento, facto, fazergenuína de tudo para tirar uma boa nota e por mais que elesdenão tenham isso, apenas haveria legitimidade de pleito quando o direito político eleger a gente incentiva, nós não tiramos a criança da atividade [...] (Educador corresponder a um de fiscalizar. de Capoeira).
Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88,Éem seu traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, feito umbojo, acompanhamento escolar, inclusive, familiar. O educador de capoeira dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo afirma, ainda, que “os educandos, em sua maioria, melhoram o desempenho escolar, mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É porque sabem que passarem, no próximo ano estarãodocumental, fora.”. Todavia, “...na prática, frágil sustentar queseanão cidadania se resume à comprovação no sentido mesmo ninguémonunca ficou fora deprecia das atividades do Centro, porque oo nosso de que, reprovado, quando lesionado, meio ambiente de forma consequencial objetivo não é discriminar, inserir.”,dofinaliza ele. jurídico. Todos! mínimo existencial de todosmas os sujeitos ordenamento Embora a participação nas atividades culturais seja grande e, na maioria das Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto vezes, exceda capacidade a exemplo da dança segundo a educadora, constitucionalanos dá, dadaprevista, a impossibilidade clara de que, restrição do conceito de “Era para ter 15que educandos, mas há muito mais, porque eles querem e a comunidade precisa.”, cidadania não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar adeevasão, que circunstancial, é grande e dificulta o trabalho tutela mesmo de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa,realizado. pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o às vezes,etem que como dá muita criança, tem período que eles faltam reconhecimento da pessoa[...]humana nãoperíodo humana titulares muito, porque é período de soltar pipa, de rodar pião na rua, de jogar peteca, então, é um período em que eles dispersam muito, mas passado ele, o centro 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos fica legítima lotado para [...] pleitear (Educador de Capoeira). ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Ainda em relação à evasão das atividades, é esclarecedora a declaração da educadora de dança sobre as suas alunas: [...] as desistências acontecem, eles perdem o interesse, principalmente, porque são arrastados por coisas lá de fora, eu começo uma turma com 20 ou 15 e termino com 7, insistindo muito...as adolescentes daqui são muito levadas por essa questão da sexualidade, aflora nelas muito cedo... elas mesmo dizem que faltam porque estavam num determinado lugar com fulano...meninas de 13 ou 14 anos aqui, já praticam sexo a torta e a direita [...]
Outro fator que contribui para a evasão dos educandos, em particular, da capoeira, é o papel exercido por algumas pessoas ligadas à igreja, que, segundo o educador responsável pela atividade “[...] dizem que a capoeira é do diabo e os meninos acabam não vindo mais, passando o dia na rua e se envolvendo com coisas erradas [...]”. Indignado, finaliza dizendo [...] a gente luta para trazê-los para uma atividade socioeducativa e vem alguém dizer que não foram os negros que criaram a capoeira, foi o diabo, e o que acontece é que o menino sai, deixa a atividade e vai voltar para a vida que ele levava [...].
Apesar da dificuldade de mantê-los no Centro, e, por conseguinte, no processo de formação, alguns educandos são antigos e há muito vêm inseridos nas atividades, embora haja sempre novos alunos. Os educadores sociais, por exemplo, são resultado do trabalho desenvolvido pelo CDVDH/CB em outros bairros de Açailândia, sendo todos ex-participantes das atividades culturais realizadas pelos centros comunitários. Outra dificuldade encontrada pelo Centro é a ausência de recursos e a falta de apoio financeiro para a consecução de suas atividades. Existe uma equipe do CDVDH/ CB responsável pela captação de recursos, principalmente, por meio de editais lançados por entidades governamentais e não governamentais: “Nós esperamos ser lançado um edital, apresentamos um Projeto e ficamos torcendo para que ele seja aprovado”, diz a agente de cidadania local. Não ter um projeto aprovado dificulta o trabalhado realizado com os educandos, pois não há como, por exemplo, fornecer a eles um lanche durante as atividades culturais, o que contribui para o surgimento da falta de interesse e a consequente evasão dos mesmos. “Esse ano, a gente está sem projeto e, por isso, sem lanche... a maioria vem pelo lanche também, porque não tem em casa...”, afirma a agente de cidadania. No mesmo sentido:
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[...] tem criança que diz: Tia, hoje eu não vou conseguir fazer aula, e a gente pergunta o porquê, e ela dizde quecontrole na casa dela só havia arroz branco e por isso Não restam dúvidas quanto ao caráter popular direto e eficaz nãodos conseguiu comer[...] (Educadora de Dança). contudo, certas da ação popular no controle atos administrativos. Permanecem,
dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado O trabalhado realizado pelo ambiente, agente de cidadania e pelos do educadores é das agressões sistemáticas ao meio da legitimidade cidadão sociais na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização praticamente voluntário, pois passam meses sem receber, já que os projetos são a principal desta possibilidade com vistasque à conservação do patrimônio fonte de arrecadaçãode deatuação recursos:cidadã “[...] em tempos não tem projeto em curso, eu não ambiental brasileiro. venho para o Centro todo dia, porque preciso sobreviver, mas priorizo os dias em que há atividade Segue-se, [...]”, declara a agente. na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativoAinda da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deverescom comunais em relação aos projetos apresentados pelo CDVDH/CB o objetivo de da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação obter apoio financeiro, recentemente, o Centro Comunitário da Vila Ildemar foi beneficiado popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação com uma(LAP reforma patrocinada pela 1 Companhia Energética do Maranhão (Cemar). Segundo Popular – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o aque agente de cidadania, “[...] nos escrevemos os oitos projetos é cidadania, ao trazer que o título eleitorale ficamos é a provaentre de cidadania, devendoescolhidos, este em meio a 82 [...]”. dispositivo serconcorrentes tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esseembora ponto secundariamente, de vista, a doutrina majoritária como de As doações, também são umaentende, fonte importante expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely captação recursos paracorrespondem-se a manutenção do Centro e realização de suas O Meirelles,de que em síntese a ideia de direitos e deveres, ipsoatividades. facto, estatuto do CDVDH/CB, inclusive, em seu art. 5°,oitem b, apolítico figura do efetivo, apenas haveria legitimidade genuínaprevê de pleito quando direito desócio eleger como sendo aquele que, pessoa física e maior de 18 anos, queira contribuir de alguma corresponder a um de fiscalizar. maneira para a consecução dos objetivos da entidade. “[...] nós vivemos de doações, Sem maiores obstinações, fica claro, permissacomo vaenia, que existe se não tem doação, a gente fica arrastando o trabalho consegue [...]”,uma afirma o relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a educador de capoeira. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dificuldades, o Centro compositor é um espaçodeemumque os educandos dentre muitos, oApesar meio das ambiente como elemento complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É que querem estar. Em um tom comovente, revela a educadora de dança “Há crianças frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido dizem que passam a semana esperando pelas atividades, porque aqui encontram paz, de que, quando meio ambiente deprecia de forma consequencial sossego e isso dálesionado, um nó naogarganta da gente, um desespero [...].”De fato, nasovisitas mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! que fizemos ao Centro Comunitário, observamos sempre um número grande de crianças e de adolescentes, de estar acontecendo ou não alguma que atividade cultural, Sendo aoindependente fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz o texto conversando, ou mesmo usando o espaço para atividades. A esse de respeito, constitucionalbrincando nos dá, dada a impossibilidade clara deoutras restrição do conceito cidadania não de é sinônima esclarece aque agente cidadania:de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em As crianças têm uma consciência de que o espaço do Centro é delas, eles usam, uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos mas também cuidam, ajuntam o lixoao quesustentar jogam, arrumam o espaço e conceitos marginalizadores de primeira dimensão em seu bojodepois o que a gente eensina o mundo é deles, mas que eles têm que saber cuidar [...] reconhecimento da pessoausam humana não que humana como titulares O Centro é, será na prática, uma casa para muitos e/ou um espaço de refúgio 1. Art. 1.º Qualquer cidadão parte legítima parasegunda pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresda vida que levam, em particular, de constantes violações. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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5.2 A Formação cidadã A formação cidadã realizada pelo CDVDH/CB está divida em três níveis: Nível I – Voltado para os educandos das atividades culturais. Busca a promoção do protagonismo infanto-juvenil, bem como propor vivências de situações educativas que, aplicadas à família, buscarão construir comportamentos mais éticos, portanto, mais saudáveis. Nível II – Destinado à formação de lideranças dos bairros, propõe a continuidade do nível I, onde os pais dos educandos e a comunidade também passam a receber formação, a fim de desenvolver o senso de responsabilidade cidadã e ética no acompanhamento escolar de seus filhos e junto aos problemas de sua comunidade. Nível III – Em parceria com a Paróquia São João Batista, desenvolverá o projeto Rede de Cidadania, que busca capacitar agente de cidadania no espaço de dois anos, para atuarem no debate político, propiciando intervenção direta nos Conselhos Municipais, especialmente nas áreas do meio ambiente, da educação/cultura e da saúde, articulando e reforçando o protagonismo dos movimentos sociais de nosso município. Todavia, é no nível I que o Centro Comunitário da Vila Ildemar se destaca, por concentrar um número significativo de educandos e, por conseguinte, de relatos de violações de direitos. As atividades culturais de dança, de teatro e de capoeira não constituem fins em si mesmo, pois a intenção não é de [...] formar dançarinos, atores e capoeiristas, mas de formar cidadãos, crianças e adolescentes que tenham oportunidade de fazer uma atividade, de ter arte e de ter cultura...mas o que o centro oferece, de fato, é a possibilidade de você ter uma formação cidadã [...] (Educadora de dança).
No mesmo sentido, as palavras do educador de capoeira: [...] eles vêm para o Centro não é para aprenderem a arte da capoeira, mas, sim, para aprenderem a serem bons cidadãos, boas pessoas. O objetivo não é que eles saiam daqui capoeiristas, mas cidadãos [...]
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Elas acontecem durante a semana nos turno da manhã e da tarde e, eventualmente, 5podem AÇÃO POPULAR MEIO DIFUSO DE TUTELA sofrer algum tipoCOMO de alteração em razão de imprevistos, comoAMBIENTAL doença ou compromisso pessoal doNão educador social. restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular nocada controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo,descontraída, certas Antes de atividade cultural, é comum haver sempre um conversa dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, quando se apresenta um tema para a reflexão dos educandos consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para [...] a ocupação do exemplo, polo passivo na em publicização esse ano, por a gentee,tásobretudo, focando muito cima da reflexão no desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio início da aula, todo o dia de aula é trazido um texto para eles refletirem, são ambiental brasileiro. temas direcionados ao dia-a-dia deles [...] (Educador de Capoeira).
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Repetindo prática, de Dança declara: da proteção do meioa mesma ambiente, quema Educadora tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o aula aeleitoral gente tiraé5aou 10 minutos para refletir sobre alguma que é cidadania, ao trazer [...] quetoda o título prova de cidadania, devendo este coisa, cotidiano...maspela alinhado a isso tem a formação, que acontece todo dispositivo ser tido comocoisas nãodorecepcionado vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, doutrina majoritária entende, como mês, a gente trás umaa pessoa de fora, que fala sobre drogas, sobre o Estatuto expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., da Criança e do Adolescente, sobre gravidez na adolescência Hely [...] Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Mensalmente, é realizada uma atividade de formação, que abrange não só os educandos do Centro Comunitário, mas toda a comunidade local, que é mobilizada por Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma meio da agente de cidadania. Nem com sempre fácil o estendida trabalho de pois relevante incongruência normativa todaéanálise atémobilização, aqui, visto que a “[...] éCRFB/88, difícil trazê-los porquedeninguém quer estar ouvindo [...]” (agente de em seu para bojo,formação, traz a dirigência ações positivas do Estado para prover, cidadania). dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia existênciamensais mínimasãodevariados: dignidade humana. É na Os temas abordados nasde formações drogas, gravidez frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido adolescência, doenças sexualmente transmissíveis, violência doméstica, tráfico humano de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o emínimo trabalho escravo, sendo esteosúltimo principal eixo de atuação doTodos! CDVDH/CB: existencial de todos sujeitos do ordenamento jurídico. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto O Centro tem um eixo principal de combate, que é odo trabalho escravo, constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição conceito de esse é o nosso foco, paralelo a isso, a gente também luta contra aao violência doméstica, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente se tratar de tutela de matéria ambiental. Umadeconstituição como a nossa, pautada em violação sexual menores, etc [...] (Educador de Teatro). uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humanaanual e nãodohumana como titulares De acordo com relatório CDVDH/CB, de janeiro a dezembro de 2015, o Centro Comunitário da Vila Ildemar realizou 12 Encontros de Formação, perfazendo um total de 188 participantes. Em março de 2016, em referência ao Dia da Mulher, foi 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos realizado grande movimento mostrando que §o3ºdia nãoda écidadania, só de para receber ao patrimônio um da União, do Distrito Federal, dos“[...] Estados, dos Municípios[...] A prova ingres-flores, mas de respeito e deo título não eleitoral, violação dosdocumento direitosquedaa ele mulher”. (educadora de dança). so em juízo, será feita com ou com corresponda.
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É nos espaços de formação que os educandos têm a oportunidade de refletir sobre a vida e de identificar as diferentes violações de direitos a que estão submetidos. [...] a formação contribui muito, inclusive, nós já tivemos uma formação sobre drogas, sobre prostituição infantil, e eles conseguem identificar e apontar o que existe, por exemplo, na casa deles, cigarro, bebidas...começam a ligar uma coisa com a outra. (Agente de Cidadania)
De acordo com a educadora de dança, quando os alunos chegam ao Centro, apresentam-se tímidos e sem voz, mas na medida em que vão participando das atividades culturais e dos espaços de formação, “[...] eles vão se tornando pessoas empoderadas.”, afirma. De fato, nos dizeres de Candau (2008), “O ‘empoderamento’ começa por liberar a possibilidade, o poder, a potência que cada pessoa tem para que ela possa ser sujeito de sua vida e ator social.” e exatamente o que acontece a partir das atividades culturais e da formação realizadas pelo Centro. O empoderamento dos educandos é percebido, de acordo com os relatos obtidos por meio das entrevistas realizadas, em dois momentos: na mudança de comportamento e nas denúncias de violações de direitos sofridas por eles. A mudança de comportamento pode ser percebida, principalmente, na vida social dos educandos, no modo como eles passam a interagir com o mundo e as pessoas em sua volta. [...] já tivemos casos de crianças e adolescentes que estavam caminhando para a delinquência, mas que mudaram de vida a partir das atividades do centro, das conversas que sempre existem antes das atividades [...] (agente de cidadania).
De acordo com o educador de capoeira, é comum, durante as atividades, ouvir algum educando dizendo: “[...] que quer ser dono das naves [...]”, referindo-se ao traficante, que comanda as “naves” ou os “aviõezinhos”, que são aqueles que fazem a ponte entre o traficante e o consumidor de drogas. Todavia, a partir de uma prática reflexiva, com base em conversas sobre temas do cotidiano dos educandos, a exemplo das drogas, o educador abre caminho para o processo de empoderamento. Outra mudança observada na vida dos educandos foi em relação ao desempenho escolar, segundo a agente de cidadania, a maioria se torna mais frequente na escola e melhora as suas notas. Em relação à denúncia de violações de direitos sofridas pelos educandos, cumpre Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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destacar ser ela a única forma que eles encontram de reagir e de se contrapor aos abusos 5sofridos. AÇÃOAPOPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA regra é o predomínio do medo de denunciar, em razãoAMBIENTAL do receio do que possa vir a acontecer com eles, com os pais ou com parentes que, na maioria dase eficaz vezes, estão Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto envolvidos nos casos de violações. da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma encontramos lógica desagregadora dos meios de produção, Na atividade de dança, vários relatos de violações de direitos, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado em particular, de abuso sexual sofrido pelas educandas em seus lares: “[...] aqui, entre das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na as meninas, da tem casos deaviolações casa,passivo tem caso que a gente encaminhar propositura ação, para ocupação em do polo e, sobretudo, naprecisa publicização para Conselho, temdemeninas engravidam [...]”,à afirma a Educadora. Ela acrescenta destaopossibilidade atuaçãoque cidadã com vistas conservação do patrimônio dizendo embora sejam comuns os casos de abuso sexual, esse não é o único tipo ambientalque, brasileiro. de violação “[...] tem menino que usa drogas desde os 7 anos, porque é isso que tem em Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao casa, a mãe está presa, o pai é usuário, o irmão rouba [...]”. polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais No do teatro, também “[...]quem é comum que durante as atividades da proteção meio ambiente, tem legitimidade para propor crianças uma açãorelatem casos de falta de alimentação, violência física, declara o educador. afirma que popular? É possível destacar textualmente logosexual, nos artigos iniciais da Lei Ele de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o para relata tudo em um relatório e encaminha-o à diretoria executiva do CDVDH/CB que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este que as providências necessárias e cabíveis a cada caso sejam tomadas. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Durante visitas quedefizemos Centro Comunitário, percebemos que, no Comungada com as esse ponto vista, aaodoutrina majoritária entende, como decorrer atividades, cria-se vínculo de amizade muito Theodoro grande entre e expresso das na lição de Rodolfo de um Camargo Mancuso, Humberto Jr., educando Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, educador, uma relação de confiança, que facilita a identificação dos casos de violações apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger de direitos. corresponder a um de fiscalizar. [...] Para nós, eles falam, porque tem confiança na gente, a gente vai brincando,
Sem maiores obstinações, ficaouclaro, vaenia, existe uma passam dizendo que isso aquilo épermissa errado, ai, como eles que passam o dia aqui, relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a um bom tempo com a gente, acabam falando [...] (Agente de Cidadania). CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional daasgarantia mínima dedeclara dignidade humana.deÉdança: Confirmando palavrasdedaexistência agente de cidadania, a educadora frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do muito ordenamento Todos! Acontece um vínculo grande entrejurídico. eles e mim, às vezes, passa da relação educador e educando, tornamo-nos amigos, eles se abrem, a gente conversa,
Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto e eu aacabo me deparando com tanta que medo sinto impotente constitucional nos dá, dada impossibilidade clara decoisa, restrição conceito de[...]. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em De umcomunitária modo geral, embora na dança expande haja predomínio dos casos abuso sexual, uma realidade e diversificada, os horizontes dosdedireitos ae maioria ocorrências no Centro Comunitário, a agente conceitosdas marginalizadores de primeira dimensãosegundo ao sustentar em de seucidadania, bojo o são de agressão no lar, e mães violentos que se excedem ao corrigirem os seus filhos. reconhecimento da pais pessoa humana e não humana como titulares É inegável, portanto, que o CDVDH/CB, por meio do Centro Comunitário da Vila Ildemar, tem contribuído para que os seus educandos saibam se defender, tendo fé 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos nopatrimônio seu próprio potencial denunciando sofridos. ao da União, do Distrito eFederal, dos Estados,os dosabusos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS A experiência comunitária de formação cidadã realizada no Centro Comunitário da Vila Ildemar é, portanto, exemplo de Educação em Direitos Humanos, situando-se no campo da educação não-formal. Ela se configura como um permanente processo de sensibilização e formação de consciência crítica, possibilitando o empoderamento dos educandos. É, sem dúvida, uma educação para a vida, no sentido de garantir à dignidade das crianças e dos adolescentes que participam das atividades do Centro. O processo de reflexão ao qual são submetidos eleva a capacidade dos educandos de identificarem as violações de seus direitos e os encoraja a denunciar, contribuindo para que elas não se agravem ou mesmo tenham um fim. O nível I de formação, direcionado aos educandos das atividades culturais, concentra as suas atividades na área da prevenção, pois está direcionado a conscientização de crianças e de adolescentes em situação de vulnerabilidade social e que, por isso, são mais suscetíveis de sofrerem violações em seus direitos. A falta de recursos e de apoio do poder público não tem sido óbice para a realização das atividades culturais e de formação do Centro Comunitário, pois existe um convencimento por parte de seus colaboradores da importância do trabalho realizado e de que ele é capaz de mudar vidas, a exemplo da deles, que outrora foram alunos do Centro. Por fim, faz-se interessante que o Judiciário, na perspectiva da prevenção de violações de direitos da criança e do adolescente, firme parceria com organizações nãogovernamentais, a exemplo do CDVDH/CB, a fim de contribuir com a formação cidadã e, por conseguinte, com a educação em direitos humanos. Neste sentido, cabe ao juiz da Infância e Juventude, pessoalmente ou por meio do Comissariado da Infância e Juventude, intervir nesses espaços comunitários por meio de palestras, seminários, formações destinadas aos educadores sociais, etc, fortalecendo, desse modo, a rede de proteção dos direitos da criança e do adolescente.
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EDUCATIONONHUMANRIGHTS: A COMMUNITY EXPERIENCE CITIZEN 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL TRAINING CHILDREN AND TEENAGERS IN THE VILLAGE Ildemar, MUNICIPALITY OF Açailândia / MA. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, ABSTRACT consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Education in Human Rights is focusedcidadã on social change, to the full human development and desta possibilidade de atuação com vistasdirecting à conservação do patrimônio its potential.brasileiro. Its implementation takes place through an on going process of awareness and training of ambiental
critical awareness, promoting theem power ment of social groups. This work is in the field of non-formal na análise princípio de doutrina e legislação, no tocante education inSegue-se, human rights. The maina focus is to analyze the community experience of civic ao education polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais carried out by a non-governmental organization in the city of Açailândia/MA. Takes the view that the da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação training under taken by it can be understood as an example of Human Rights Education, since contribute popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação to reflective practice andnº4.717/65) the process of 1 empowerment of children and adolescents. Popular (LAP – lei a contundência quando em sua extensão define o
que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Keywords :Human Comungada comRights. esse Education. ponto deCitizen vista,training. a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. REFERÊNCIAS
Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com todaintrodutórios análise estendida até aqui,emdireitos visto que a ARCHANJO, Daniela Resende. Conceitos de educação CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, humanos. Curitiba, 2014.ambiente como elemento compositor de um complexo dentre muitos, o meio mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É _____________Açailândia e Santa Luzia lideram o ‘ranking’ do trabalho escravo no frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o MA. Disponível em: <http://grupo-lima.blogspot.com.br/2012/06/acailandia-e-santamínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! luzia-lideram-o.html>. Acesso em 19 maio. 2016. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto ___________A cidade Maranhão. Disponível em: <http://webcache. constitucional nos dá, Açailândia dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de googleusercontent.com/search?q=cache:http://www.acailandia.ma.gov.br/acidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar cidade&gws_rd=cr&ei=gd0bV9WtJcKbwATI67qICw>. Acesso em: 17 maio em 2016. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e____________Analfabetismo: conceitos marginalizadores de primeira dimensão sustentar por em seu bojo Veja taxa e número deao analfabetos cidade dooBrasil reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares - AÇAILÂNDIA, MA.Disponível em: <http://www.deepask.com/goes?page=acailandia/ MA-Confira-a-taxa-de-analfabetismo-no-seu-municipio> Acesso em 17 maio. 2016. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos BRASIL. dedosGeografia e Estatística em: ao patrimônio Instituto da União, doBrasileiro Distrito Federal, Estados, dos Municípios[...] § 3º(IBGE). A prova daDisponível cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. <http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=210005>. Acesso em 17 maio.
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A EFICÁCIA DA GESTÃO PARTICIPATIVA E DEMOCRÁTICA NO ÂMBITO MUNICIPAL: O PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR Guilherme Henrique Madeira Sampaio*1
RESUMO O objetivo geral do presente trabalho é abordar acerca da eficácia da gestão democrática e participativa dentro das decisões do poder público municipal. Por isso o estudo buscou responder o seguinte problema: qual a eficácia da gestão democrática e participativa dentro das decisões do poder público municipal, e de que forma a participação popular pode contribuir para a gestão pública municipal?. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e participativa, e os principais autores utilizados foram: Fonseca (1993), Novelino (2012), Pinheiro (2010), Rocha (2011) e Salles (2010). Com o presente trabalho, concluímos que é importante a participação do povo no desenvolvimento das políticas públicas e na fiscalização dos atos dos representantes do poder público. E como no município o povo está mais próximo das decisões e da execução dos projetos públicos, essa participação pode ser mais eficaz. A participação dos cidadãos é imprescindível para o desenvolvimento de um município, sendo necessária a sua inserção na administração pública, com a finalidade de alcançar toda a coletividade. A participação do povo nas decisões é um mecanismo fundamental para o desenvolvimento da democracia. Palavras-chave: Gestão Democrática. Participação Popular. Município.
1 INTRODUÇÃO O presente trabalho aborda acerca da eficácia da gestão democrática e participativa dentro das decisões do poder público municipal, haja vista ser de grande valia a participação do povo no desenvolvimento das políticas públicas e na fiscalização dos atos dos representantes do poder público. E como no município o povo está mais próximo das decisões e da execução dos projetos públicos, essa participação pode ser mais eficaz nessa esfera de governo. O tema possui grande relevância para o contexto social, tendo em vista ser a participação dos cidadãos imprescindível para o desenvolvimento de um município, sendo imprescindível a sua inserção na administração pública, com a finalidade de se . Especialista em Direito Civil e Processual Civil pelo Centro de Ensino Unificado de Teresina – CEUT, Especialista em Gestão Pública Municipal pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI, Graduado em Bacharelado em Direito pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI, e em Licenciatura em Filosofia pela Universidade Federal do Piauí-UFPI, Secretário Judicial no Fórum da Comarca de São João dos Patos/MA. Email: guilhermehms100@hotmail.com. *
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alcançar toda a coletividade, isto é, o bem-estar social. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL A participação do povo nas decisões é um mecanismo fundamental para o Não restam dúvidas quanto caráter de indicado controle popular direto e eficaz desenvolvimento da democracia. E oaolocal mais para a participação popular da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas édúvidas o município, pois a população está mais próxima das decisões. Ademais, é quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção,válido mencionar a cidadania é umdo doscrescimento fundamentosvertiginoso da Repúblicae Federativa do Brasil. consumo eque descarte, diante multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na Este estudo por finalidade as seguintesnaproblemáticas: propositura da ação, para tem a ocupação do polo responder passivo e, sobretudo, publicização qual adesta eficácia da gestão de democrática e participativa das decisões poder público possibilidade atuação cidadã com vistasdentro à conservação do do patrimônio ambiental brasileiro. municipal, e de que forma a participação popular pode contribuir para a gestão pública municipal? Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo daOdemanda leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais presentenuma trabalho possui como objetivo geral analisar de que que forma a da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação para participação popular através da gestão participativa e democrática, pode contribuir popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação aPopular gestão (LAP pública municipal. E como objetivos específicos, gestão participativa e 1 – lei nº4.717/65) a contundência quando emdefinir sua extensão define o democrática e participação popular; de participação que é cidadania, ao trazer que o título identificar eleitoral é aquais provaosdemecanismos cidadania, devendo este da população municipal; e verificar eficáciaordem da participação popular por dispositivono serpoder tido público como não recepcionado pela avigente constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a na doutrina majoritária entende, como meio da gestão democrática e participativa gestão pública municipal. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que síntesesecorrespondem-se a ideia de direitos deveres, ipsobibliográfica, facto, A em pesquisa desenvolveu basicamente atravésede pesquisa apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger e utilizou o seguinte material: legislação nacional pertinente, artigos e estudos de corresponder a um de O fiscalizar. profissionais da área. material foi obtido por meio de leis, livros e artigos. A pesquisa se desenvolveu da seguinte maneira: levantamento bibliográfico inerente ao tema; Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe umaestudo crítico doincongruência material doutrinário levantado; e análise legislação relevante normativa com todaobtenção análise estendida atéda aqui, visto quenacional a pertinente; e seleção e exame artigos. de ações positivas do Estado para prover, CRFB/88, em seu bojo, traz ade dirigência dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo A participação do povo nas decisões é um mecanismo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidadefundamental humana. Épara o frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido desenvolvimento da democracia. E o local mais indicado para a participação popular é o de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial município, pois a população está mais envolvida e próxima das decisões. Ademais, éo válido mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! do Brasil. mencionar que a cidadania é um dos fundamentos da República Federativa Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania queDEMOCRÁTICA não é sinônima deEcidadania eleitoral, especialmente ao se tratar 2 GESTÃO PARTICIPATIVA de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar seu bojo o entre A gestão participativa entre Estado e sociedade civil, e em principalmente reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares município e sociedade, devido ao caráter local da esfera municipal, pode atingir o fim almejado por toda a comunidade. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítimademocracia para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Podemos conceituar participativa como aquela decorrente do ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresprincípio da participação popular, estabelecida na Constituição Federal, e na legislação so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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infraconstitucional. Esta democracia participativa visa que todos os cidadãos utilizem as possibilidades de participação presentes em nosso ordenamento jurídico e, através delas ampliem o dever dos representantes do poder público: ouvir a sociedade e prestar contas de suas gestões. Diante desse contexto, discutiremos, nos tópicos a seguir, exercício da gestão participativa na gestão pública, de modo, que o povo possa contribuir e intervir na administração dos governantes; e após isso, mais especificadamente, sobre a gestão democrática e participativa, que nada mais é que uma administração pautada pela participação de todos os envolvidos no processo de decisão.
2.1 A Gestão Participativa na Gestão Pública O passar do tempo tem demonstrado que a participação popular está cada vez mais inserida no cenário da gestão pública. A participação da sociedade civil está cada vez mais ativa dentro do processo político de desenvolvimento social. As antigas formas autoritárias de gestão estão sendo substituídas por práticas, que permitem que os cidadãos possam participar ativamente da gestão pública, fiscalizando, cobrando e tomando iniciativas com o fito de fazer com que o poder público desenvolva políticas públicas voltadas para a resolução dos problemas sociais contemporâneos. Hoje, com a gestão participativa, o cidadão não é simplesmente aquele que recebe os benefícios oriundos do poder público, mas também, aquele que faz parte das decisões, exigindo a melhora e uma melhor aplicação dos recursos públicos nesses benefícios. O povo passa a ser o protagonista do desenvolvimento social. Do mesmo modo que é atribuído a cada cidadão o direito de se respeitar a dignidade da sua pessoa humana, é também assegurado o seu direito de participar de forma ativa da solução dos problemas que permeiam a sua comunidade. Senão vejamos a opinião de Rocha (2011, p.01): Por fim, podemos concluir que a participação veio a dar a tônica contemporânea da democracia no Brasil. Cumpre-se, portanto, examinar a participação popular enquanto requisito essencial à cidadania. Dentro dessa realidade e com base no texto da Declaração Universal de 1948, podemos fixar as linhas de um novo direito social em formação, representado pelo direito que tem cada pessoa a participar ativamente no processo de desenvolvimento de sua comunidade ou de seu município.
Dessa forma, percebe-se que a participação popular é requisito básico para Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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a existência da cidadania, pois cada cidadão tem o direito de participar ativamente do 5processo AÇÃO de POPULAR COMO do MEIO DIFUSO DE TUTELA desenvolvimento seu município, e não apenas AMBIENTAL por meio do voto, para a eleição Não de representantes. A população deve agir diretamente nasdireto decisões do poder, restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular e eficaz fiscalizando, cobrando e atuando. da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora de produção, Ademais, a própria Constituição Federal, de dos 1988,meios assegurou a participação consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado popular na gestão pública como direito à dignidade da pessoa humana, determinando que das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na opropositura regime político no para Brasil é não apenas o representativo, mas, também o participativo, da ação, a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização nos do art. 1º,deparágrafo único, ao preceituar “todo o poder emana do povo, destatermos possibilidade atuação cidadã com vistas à que conservação do patrimônio que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta ambiental brasileiro. Constituição”. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao problemas devem ser encarados de visão polo ativo daDestarte, demanda os numa leitura da sociais CRFB/88 observados os deveresdentro comunais integrada entre e a população. isso, faz-separa necessária implementação da proteção do gestores meio ambiente, quem E, tempara legitimidade proporauma ação de programas sociaisdestacar que incentivem a participação popular. popular? É possível textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o Outrossim, Estado, para que haja uma consolidação da cidadania, que é cidadania, ao trazeroque o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este deve dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. estar pautado sob uma nova égide, que busque desenvolver cada vez mais, uma cidadania Comungada com esse ponto de vista,a aparticipação doutrina majoritária como nos que põe como requisito fundamental, do povo naentende, gestão pública expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely diferentes níveis de atuação. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveriaDemocrática legitimidadeegenuína de pleito quando o direito político de eleger 2.2 A Gestão Participativa corresponder a um de fiscalizar. Como mencionado anteriormente, a democracia participativa tem por Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma objetivo que todos os cidadãos utilizem todasanálise as possibilidades expressas relevante incongruência normativa com toda estendida atéparticipativas aqui, visto que a no nosso ordenamento e, atravésdedelas, dever dospara representantes CRFB/88, em seu bojo,jurídico traz a dirigência açõesampliem positivasodo Estado prover, do poder a sociedade prestarelemento contas decompositor sua administração. dentrepúblico: muitos, ouvir o meio ambientee como de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Como uma gestãodocumental, democráticanoe sentido participativa, frágil sustentar que instrumentos a cidadania sevoltados resume àpara comprovação de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial podem-se citar os órgãos colegiados de política urbana, que podem ser definidoso como mínimo existencial de todos os sujeitos do as ordenamento jurídico. Todos! conselhos de desenvolvimento urbano; conferências voltadas para assuntos de interesse urbano, em que integrantes da sociedade discutem sobre temas relacionados ao Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto desenvolvimento por exemplo, e meio constitucional nosurbanístico, dá, dada a como, impossibilidade claratransporte de restrição do ambiente; conceito dedebates ecidadania audiências, é discutir acerca daseleitoral, políticasespecialmente implementadas gestores; que cujo não éfim sinônima de cidadania aopelos se tratar consulta em ambiental. que o município realiza um como levantamento a opinião de tutela pública, de matéria Uma constituição a nossa,sobre pautada em da uma realidade diversificada, expande os horizontes dos direitos população sobrecomunitária determinadoe assunto. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa e nãopopular humanadecomo titulares Temos, ainda, humana a iniciativa projeto de lei, projetos e programas urbanísticos, em que um número determinado de cidadãos pode apresentar uma proposta de lei ou projetos que serão voltados para o desenvolvimento urbano; gestão orçamentária 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos participativa, quando o município direciona uma parcela do orçamento público para que ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresa população votecome oopine acercaouda recursos, isto é, os cidadãos irão so em juízo, será feita título eleitoral, comdestinação documento quedesses a ele corresponda.
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opinar sobre os recursos orçamentários serão melhor aplicados; e, por fim, existem os organismos gestores das regiões metropolitanas e aglomerações urbanas. O planejamento participativo é um dos principais fatores para o sucesso de programas e projetos, pois a participação da população faz com que o planejamento corresponda aos anseios do povo; o levantamento dos problemas sociais serão mais concretos, visto que são os próprios prejudicados que os apontarão; o resultado será mais compatível com que é esperado pelos cidadãos; a sociedade se sente mais participativa, e passa a acompanhar e exigir a correta destinação dos recursos públicos, dentre outras vantagens. Com uma gestão urbana democrática, a administração pública passa a ter uma administração pautada pela transparência e eficiência de seus procedimentos, além de possibilitar uma mudança no modo de pensar das pessoas, pois estas passam a intervir mais na gestão urbana, o que permite que administração detecte os reais problemas que atingem o meio social, e direcionem políticas públicas, que terão resultados bem mais eficientes. Para essa gestão democrática e participativa, muitas práticas devem ser evitadas, pois em muitos municípios, verifica-se que os conselhos municipais estão sem representatividade e com péssimas estruturas de funcionamento, os projetos são apresentados em linguagens prolixas, e a comunidade é excluída das decisões. Dessa forma, o município precisa promover novas práticas de gestão, que agregue a sociedade como um todo e não fique centralizada nas mãos de uns poucos gestores. 3 O PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR E OS MECANISMOS DE DEMOCRACIA DIRETA A participação popular é um princípio previsto expressamente na Constituição Federal, que permite que os cidadãos, através de mecanismos típicos de democracia direta, possam participar ativamente das decisões oriundas do poder público, seja contribuindo com opiniões através de conselhos, consultas e audiências públicas, seja propondo um projeto de lei, ou direcionado os recursos do orçamento público. Dessa forma, apresentaremos o que é cidadania e o princípio da participação popular, e alguns dos diversos mecanismos de democracia direta, isto é, de instrumentos, que permitem que a população de um determinado município possa participar ativamente das decisões políticas, não apenas através do voto em épocas eleitorais, mas intervindo, fiscalizando e opinando sobre o direcionamento de políticas públicas e acerca dos reais problemas que permeiam as suas localidades.
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3.1 Cidadania e o Princípio da Participação Popular 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL NãoArestam dúvidas quanto ao caráter de administração controle popular diretoque e eficaz cidadania é fundamental para uma pública preze pela da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas opinião de seu povo, tendo em vista ser um dos fundamentos da República Federativa dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, do Brasil, consoante o inciso do artigo 1º da Constituição Para Viegas, consumo e descarte, dianteII,do crescimento vertiginosodaeRepública. multipolarizado “o Brasileiro é caracterizado por ser um Democrático de Direito, é das Estado agressões sistemáticas ao meio ambiente, da Estado legitimidade do cidadão na imprescindível que haja efetiva participação popular para que na se publicização dê legitimidade às propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, desta possibilidade atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio suas normas” (2003,de p. 1). ambiental brasileiro. Novelino completa esse conceito quando afirma que “a cidadania, enquanto análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao na conceito Segue-se, decorrentenado princípio do Estado Democrático de Direito, consiste polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais participação política do indivíduo nos negócios do Estado e até mesmo em outras áreas da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação de interesse público”destacar (2012, p. 375). popular? É possível textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o Assim, pode-se dizer que cidadania, Estado Democrático de Direito e que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este participação popular são conceitos que andam para haver um Estado dispositivo ser tido como não recepcionado pela juntos, vigente pois ordem constitucional. Democrático pautado cidadedeé de fundamental importância direta do Comungada com essenaponto vista, a doutrina majoritáriaa participação entende, como povo nas na decisões políticas naquelas queMancuso, afetam diretamente sua comunidade. expresso lição de Rodolfoe de Camargo Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, O Brasil adota ogenuína princípio Estado democrático direitode(CF/1988, apenas haveria legitimidade dedo pleito quando o direitode político eleger art. corresponder a um de fiscalizar. 1º, caput) e garante a soberania popular como único meio de legitimação do poder. É a partir daí que o princípio da participação popular encontra respaldo. E sobre a soberania maiores obstinações, fica claro, permissa(2012, vaenia, que existe uma popular éSem válido observar os ensinamentos de Novelino p.367): relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações para prover, Na busca pela conexão entre positivas democraciado e oEstado Estado de direito, o princípio dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo da soberania popular (CF, art. 1º, parágrafo único) se apresenta como uma mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É das vigas deste modelo, impondo uma organização e um exercício frágil sustentar que a cidadania semestras resume à comprovação documental, no sentido democráticos do Poder deprecia (ordem dodedomínio pelo povo). de que, quando lesionado, o meio ambiente forma legitimada consequencial o Na mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Constituição de 1988, este princípio é concretizado por diversos mecanismos que permitem a participação popular, direta e indireta, na fiscalização e
Sendo ao fim eformação ao cabo, tal restrição aversa à diretriz o texto da vontade do governo do Estado. Além que de votar e ser votado constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de (CF, art. 14), o cidadão pode se manifestar diretamente sobre determinados cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar temas – porUma meio de plebiscito, referendo iniciativapautada popular (CF, de tutela de matéria ambiental. constituição como aounossa, em art. 14, I a III) – e atuar, de forma direta, naos fiscalização da gestão da coisa pública uma realidade comunitária e diversificada, expande horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar emLXXIII) seu bojo res pública) – por meio da ação popular (CF, art. 5.º, . o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Neste dispositivo da Carta Magna, encontra-se o pilar do princípio da participação popular, garantia do Estado Democrático. A participação popular enquanto 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação a declaração de nulidade de atosde lesivos princípio constitucional é aquela participação do oucidadão com objetivo interesse ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingrescomum, ou seja, que vise o bem da coletividade. Segundo Oliveira Filho (2004, p.1): so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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A democracia participativa tem como premissa o interesse básico dos indivíduos na auto-determinação política e concebe a formação de vontade política de baixo para cima, num processo de estrutura com a participação de todos os cidadãos. O princípio político da participação, que inclui as modalidades legislativas e judiciais, está diretamente referido à legitimidade das instituições democráticas, de modo que a participação nas decisões administrativas tende a aproximar o administrado de todas as discussões e decisões em que seus interesses estejam diretamente envolvidos. Assim, temos entre as diretrizes gerais, a gestão democrática, e especialmente, a participação popular, como fundamento jurídico normativo que deve ser considerado pelo legislador e observado pelo administrador.
A democracia participativa, principalmente a municipal, deve ter por finalidade a inserção dos cidadãos na estrutura política de seu município, de modo que eles possam demonstrar os seus interesses, e estes sejam levados em consideração quando das decisões dos governantes, isto é, deve haver uma aproximação entre os interesses dos administradores e administrados. Por fim, é importante esclarecer que ser cidadão não pode ser definido como apenas receber os benefícios do progresso, mas de participar das decisões e do esforço para sua realização. A participação cidadã é vista como um processo que possui o poder de gerar uma nova maneira de organização social e de desenvolvimento de políticas públicas formuladas pela opinião direta do povo, ou seja, ela busca a democratização do poder acerca do uso de recursos financeiros e a implementação de políticas públicas. Para Rocha (2011,01): (...) conclui-se que o sucesso da atuação do Estado, no que tange à consolidação da cidadania, está absolutamente condicionado à tarefa de reinventar a atuação estatal sob uma nova lógica e referência. Essa referência é a concepção inovadora de cidadania que põe como requisito essencial a participação do cidadão na gestão pública nos seus três níveis de atuação .
Dessa forma, conclui-se que a participação popular é importante veículo para o desenvolvimento de qualquer esfera de governo, visto que é um direito previsto constitucionalmente e permite que os cidadãos, que são verdadeiros destinatários dos recursos oriundos do poder público, possam participar, exigir e fiscalizar um desempenho cada vez mais ativo dos gestores públicos. Por meio da participação dos cidadãos, estes deixam de ser meros expectadores das decisões dos seus representantes políticos, para se
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tornarem pessoas ativas dentro do processo decisório. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular controle dos Mecanismos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas 3.2 DemocracianoDireta e seus de Participação dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões ambiente, da legitimidade na O sistemáticas mecanismos aodemeio democracia direta contribuem do paracidadão intermediar as propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização opiniões entre a esfera pública e a sociedade civil, o que mantém os cidadãos atentos desta possibilidade de atuação comnos vistas à conservação do patrimônio e contribui os debates políticos.cidadã Quando processos de decisões há participações ambiental brasileiro. populares, os cidadãos tomam conhecimento da sua importância e passam a contribuir para a gestão pública, municipal, em virtude de estarem mais próximos Segue-se, na principalmente análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao dos indicandonuma os problemas o que facilita para a administração pologestores, ativo da demanda leitura dasociais, CRFB/88 observados os deveres comunaispública da ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação há no proteção momento do de meio direcionamento das políticas públicas. Quando em um município popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação uma participação social efetiva, a gestão pública acaba sendo melhor pautada pela 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o transparência, flexibilidade e agilidade. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. participação pode ser exercida diretamente meio da Comungada Acom esse pontopopular de vista, a doutrina majoritária entende,porcomo democracia direta,decom a utilização de mecanismos como o referendo, o plebiscito expresso na lição Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely ou a iniciativa assim como também podea ser exercida por meio de uma administração Meirelles,popular, que em síntese correspondem-se ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger pública participativa, que pode ocorrer por meio de subprefeituras, com a participação de corresponder a um de fiscalizar. cidadãos em conselhos públicos municipais, ou ainda através conselhos autônomos, que possuam a finalidade de fiscalizar e participar da administração nos assuntos que dizem Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma respeito toda coletividade, senão vejamos opiniãoestendida de Lenzaaté (2013, relevanteaincongruência normativa com todaaanálise aqui,p.1208): visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para A democracia participativa ou semidireta assimilada pela prover, CF/88 (arts. 1º, dentre muitos, o meio ambiente comoe elemento compositor decomo um complexo parágrafo único, 14) caracteriza-se, portanto, a base para que se mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É possa, na atualidade, falar em participação popular no poder por intermédio frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de um processo, no caso, o exercício da soberania que se instrumentaliza de que, quando lesionado, meiodoambiente forma consequencial o pelo poromeio plebiscito,deprecia referendo,deiniciativa popular, bem como mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! ajuizamento da ação popular. Sendo fim e ao semidireta, cabo, tal restrição aversa à diretriz Federal, que o texto Essaaodemocracia trazida pela Constituição nada mais constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de écidadania que a existência de instrumentos, como por exemplo, o plebiscito, o referendo que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar e a iniciativa queambiental. permitem que povo possa participar de decisões, de tutela popular, de matéria Uma constituição como diretamente a nossa, pautada em que auma princípio somente são cabíveis aos nossos representantes eleitos. dos direitos realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Por da suapessoa vez, Maria Silvia Pietro (1993) divide as formas de reconhecimento humana e nãoZanella humanaDi como titulares participação popular da seguinte forma: participação direta, como, por exemplo, a iniciativa popular, o referendo, o plebiscito; e participação indireta, como a participação 1. Art. 1.ºde Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos através conselhos. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com que a ele de corresponda. Pode-se, ainda, dividir osdocumento mecanismos participação popular da seguinte
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maneira: dentro da esfera do poder legislativo: a consulta prévia, audiências públicas, iniciativa popular, plebiscito ou referendo; no poder executivo: os conselhos municipais; e no poder judiciário: a ação popular. O plebiscito ocorre quando o Congresso Nacional, antes de aprovar uma lei, consulta previamente os cidadãos, para que estes opinem acerca de determinado assunto. Já no referendo, o Congresso Nacional primeiramente discute e aprova uma lei, para posteriormente submeter essa lei à uma consulta popular, quando a população opina no sentido de dizer se são favoráveis ou contra a nova lei. Um exemplo de referendo foi o realizado no ano de 2005, quando os cidadãos foram às urnas opinarem sobre manutenção ou não do Estatuto do Desarmamento, que proibia a venda de munições e armas. Consoante Viegas (2003, p. 01).: Tanto o plebiscito quanto o referendo são consultas feitas ao povo, para que este delibere sobre matérias relevantes de natureza constitucional, administrativa ou legislativa. No plebiscito há uma consulta prévia à população, de determinada matéria que será posteriormente submetida à apreciação do Congresso Nacional. O plebiscito precede uma decisão importante ou elaboração de uma lei ou reforma da constituição. Cinco anos após a Constituição de 1988, foi realizado um plebiscito para submeter à vontade popular qual seria a forma de governo, se continuaríamos com a forma republicana ou se nos transformaríamos numa monarquia, além de se questionar acerca da mudança, ou não, do sistema de governo, de presidencialista para parlamentarista. Sendo que, ao final a população escolheu a manutenção da forma e do sistema de governo preexistentes. O referendo é uma consulta posterior sobre determinado ato governamental, para que o povo ratifique ou rejeite tal ato, ou ainda, servirá para conceder eficácia ao ato, no caso de uma condição suspensiva ou para retirar sua eficácia, no caso de condição resolutiva.
Destarte, pode-se dizer que a principal diferença entre esses dois mecanismos é momento de manifestação da população, pois enquanto o plebiscito é uma consulta prévia, o referendo é uma consulta posterior. É valido esclarecer que apenas quem está no gozo dos seus direitos políticos, isto é, quem possui a capacidade de votar e ser votado pode participar do plebiscito ou do referendo. Já a iniciativa popular é a faculdade que têm os cidadãos de apresentar um projeto de lei, subscrito, por no mínimo, 1% (um por cento) do número de eleitores do país, distribuído ao menos por cinco estados da federação, com pelo menos três décimos
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de eleitores de cada um deles. A iniciativa popular para projeto de leis estaduais deve 5estar AÇÃO POPULAR COMO Federal MEIO DIFUSO DE TUTELA prevista na Constituição de cada estado membro,AMBIENTAL nos termos do art. 27, §4º. ComoNão exemplo, pode-se citar a Lei da Ficha Limpa, lei oriunda de umae iniciativa restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto eficaz da sociedade civil. no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas da ação popular dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, aos diante municípios, para a iniciativa popular deeprojeto de lei municipal, consumo e Quanto descarte, do crescimento vertiginoso multipolarizado faz-se necessária manifestação de aoambiente, menos 5%da(cinco) por cento do eleitorado das agressões sistemáticas ao meio legitimidade do cidadão na do propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização respectivo município, consoante se pode observar do art. 29, inciso XIII, da Constituição desta possibilidade deque atuação cidadã com vistaspopular à conservação do de patrimônio Federal, que preceitua é possível a “iniciativa de projetos lei de interesse ambiental brasileiro. específico do Município, da cidade ou de bairros, através de manifestação de, pelo menos, cinco porSegue-se, cento do eleitorado”. na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais do plebiscito, e iniciativa popular, mencionado da proteção Além do meio ambiente,referendo quem tem legitimidade paracomo propor uma açãoacima, apopular? audiência pública destacar é outro textualmente importante meio social na de administração É possível logode nosparticipação artigos iniciais da Lei Ação pública, pois é–através dela que 1oapovo pode manifestar Popular (LAP lei nº4.717/65) contundência quando as emsuas suaopiniões extensãodiretamente. define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Além já citados, temos também audiência pública como instrumento dispositivo ser tidodos como não recepcionado pelaa vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como de participação dos cidadãos, que nada mais é que um processo de participação aberto ao expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely povo, para que participe da decisão de assuntos públicos. Por meio dela, a população se Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, manifesta sobre a melhor forma de ser administrada, e controla a ação dos governantes. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Fonseca (2002, p.1)deafirma: corresponder a um fiscalizar. Esta modalidade participativa possibilita ao cidadão a obtenção de
Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma informaçõescom e conhecimento dasestendida ações da administração, bemque como relevante incongruência normativa toda análise até aqui, visto a a esta, a possibilidade de de avaliar a conveniência dasprover, suas ações, na CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência ações positivas doe intensidade Estado para medida quecomo estará administrando de forma compartilhada. dentre muitos, o meio ambiente elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É É na verdade uma forma de efetivação dos princípios do no Estado democrático frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o estará e de direito, pois o cidadão ao interagir com a administração mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! exercitando o poder. Sendo ao fim eA audiência ao cabo,pública, tal restrição aversa à diretriz quepopular, o texto como espécie do gênero participação constituiconstitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de se em importante vertente de prática democrática, tomada em sua plena cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar concepção doutrinária, que é a possibilidade de acesso e exercício do poder. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos A audiência pública se constitui em importante meio de obtenção de e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o cidadãotitulares para uma participação de resultados, reconhecimento da pessoainformações, humana eque nãocapacitam humanaocomo seja através da legitimação dos atos compartilhados com a administração, seja através de uma constante negociação democrática.
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Como mencionado, a audiência pública possibilita que a administração pública municipal colha informações acerca do trabalho que está sendo desenvolvimento pelo poder público, e quais são os anseios da população, para que com essas informações, as políticas públicas sejam melhor direcionadas e atendam as reais necessidade do município. Outro instrumento para uma gestão municipal participativa são os conselhos municipais e setoriais, que podem ser definidos como órgãos colegiados que funcionam como verdadeiros canais de participação popular, pois são compostos de representantes do poder público e da sociedade civil, e tem por meta principal assegurar a participação da comunidade na elaboração de políticas públicas. Quanto a esses conselho é importante relatar a opinião de Salles (2010, p. 45): A crença no papel relevante dos conselhos quanto aos dois processos – descentralização e democratização – deriva de suas características: o fato de estarem vinculados ao Poder Executivo (o que retira desse Poder a exclusividade da decisão, portanto descentraliza) e o fato de neles estarem representados os setores organizados da sociedade .
Esses mecanismos são necessários, porque nosso país ainda carece bastante de políticas públicas que atendam a real necessidade da população. Isso porque a gestão democrática e participativa não é valorizada, pois se fosse, as políticas públicas estariam voltadas por completo para o desenvolvimento social, e estariam atendendo de forma mais plena aos anseios sociais. É importante destacar que há três tipos de conselhos municipais. O primeiro deles é o conselho de programas, ligados a programas governamentais concretos, como o conselho municipal de alimentação escolar; depois temos o conselho de políticas, que estão vinculados às políticas públicas, como os conselhos de direitos da criança e do adolescente; e, por fim, os conselhos temáticos, como o conselho municipal de transportes, dentre outros. Além dos mecanismos de participação popular já citados, temos o orçamento participativo. Elaborar o orçamento público é prever e determinar as receitas e despesas públicas, através de uma aprovação legislativa. A distribuição dos recursos orçamentários gera dúvidas nos gestores públicos no tocante ao emprego mencionados recursos, tendo em vista que são muitos problemas para recursos escassos. Os gestores muitas vezes não sabem definir quais áreas são as mais escassas e que mais precisam do direcionamento de políticas públicas. E uma forma de contornar essa situação é o orçamento participativo, em que município permite que a sociedade opine acerca de quais áreas são deficientes e necessitam com mais urgência dos recursos públicos. Para Costa (2002, p. 01): Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL O orçamento público, segundo essa perspectiva, faz crescer em importância
a participação popular na gestão orçamentária, posto que, pelo menos
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz presumivelmente, consignará justamente as grandes demandas sociais, da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas levadas às assembléias populares, discutidas democraticamente e dotadas, dúvidas quando se trata por emessa umarazão, lógica desagregadora dos meios de produção, de maior legitimidade. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Alguns de municípios utilizam desse mecanismo, sempre após uma ampla desta possibilidade atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio consulta sociedade organizada. Como exemplo, pode-se citar o município de Porto ambientalà brasileiro. Alegre, que foi a pioneira, sendo que depois de sua adesão o projeto só aumentou e Segue-se, naaderiram. análise a Para princípio doutrina e legislação, tocante ao do muitas outras cidades Sallesde(2010, p. 90). os aspectosnomais relevantes polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais orçamento participativo são: da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quandodecisório em suaquanto extensão (...) a democratização do processo a umdefine aspectoocrucial, que é cidadania, ao trazer aque o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este das distribuição de recursos; mais do que isso, trata-se da submissão dispositivo ser tido comoestruturas não recepcionado pela vigente ordem constitucional. do Estado ao controle direto da população, gerando alteração Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como das significativa das relações Estado-sociedade; a inversão das prioridades expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely políticas públicas, colocando, por intermédio do sistema de notas, os bairros Meirelles, que em síntesemais correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, carentes como os de atendimento prioritário; e a função pedagógica em apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando oa direito político relação à Democracia participativa; participação crescedeà eleger medida que se corresponder a um de fiscalizar. desenvolve, seus resultados aparecem e a população passa a acreditar na sua efetividade.
Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência ações positivas do Estadoo processo para prover, Destarte, observa-se que comde o orçamento participativo, decisório dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexoquanto passa a englobar também a sociedade civil, na medida em que ela está opinando mote constitucional da garantia de existência dignidade É à distribuição de recursos, possibilitando que omínima dinheirodepúblico seja humana. melhor utilizado frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido edeatenda as reais necessidade da ambiente população. Com odeorçamento público municipal que, quando lesionado, o meio deprecia forma consequencial o participativo, a população pode identificar problemas jurídico. sociais que as rodeiam, e opina mínimo existencial de todos os sujeitos do os ordenamento Todos! de que forma o orçamento público pode ser distribuído para a resolução desses problemas. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar 4deOtutela MUNICÍPIO E Aambiental. GESTÃOUma DEMOCRÁTICA E PARTICIPATIVA de matéria constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o O município, como oshumana demais entes reconhecimento da pessoa assim humana e não comopolíticos, titulares quais sejam, estados e União, possui autonomia administrativa e financeira, o que permite que em seu âmbito de atuação que é (a esfera local), os cidadãos, por estarem mais próximos dos governantes, 1. Art. 1.º Qualquer será parte democrática legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivosacerca possam propor cidadão uma gestão e participativa mais eficaz, para opinar ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresda destinação de políticas públicas e cobrar efetivamente uma gestão de qualidade dos so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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gestores públicos municipais, pautada pela transparência e diálogo. Assim, comentaremos acerca da gestão municipal e suas peculiaridades, que devido a nossa Constituição Federal de 1988 possui autonomia frente às esferas estadual e federal; o Estatuto da Cidade que menciona alguns instrumentos de gestão participativa e democrática que deverão ser aplicados na administração municipal, como por exemplo, o Plano Diretor; e por fim acerca da gestão participativa e o município, que dentre as esferas de governo, é a que está mais próxima dos cidadãos, o que acaba por facilitar uma maior participação popular. 4.1 Gestão Municipal e suas peculiaridades A atual Constituição da República Federativa do Brasil deu forças ao poder local e atribuiu ao município a competência sobre a política de desenvolvimento das cidades, conforme se pode extrair da redação do art. 291*. Um dos instrumentos que atribui autonomia e responsabilidade no desenvolvimento da gestão urbana é o Estatuto da Cidade, que prevê a elaboração de um plano diretor, como mecanismo básico para o desenvolvimento e expansão urbana, plano esse que necessita ser desenvolvido através de um processo participativo, que envolva a sociedade, consoante o determinado no art. 392*, do Estatuto da Cidade. E para isso faz-se necessário a elaboração de debates entre os diferentes setores sociais. Com a Carta Magna de 1988, o município possui autonomia política, isto é, capacidade de autogoverno; administrativa, pois é ele próprio quem organiza as suas atividades, gere e presta os serviços de sua competência; e financeira, visto que, possui capacidade para instituir e arrecadar seus próprios tributos. Essas prerrogativas foram de grande valia para o desenvolvimento do município, tendo em vista que a questão das finanças públicas locais pode atrapalhar a gestão democrática e participativa. A distribuição desigual de recursos poderia comprometer a democracia nas cidades menos favorecidas economicamente, o que provocaria um desequilíbrio ente elas. Senão vejamos a opinião de Salles (2010, p. 23): De forma sintética podemos dizer que a descentralização de recursos sem a descentralização do poder decisório não garante a Democracia no nível local; 1 Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos: (…). 2. Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2o desta Lei.
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a descentralização de recursos sem o poder de decisão pouco adianta. Um
aspectoMEIO importante relacionado isso e que precisamos destacar é quanto 5 AÇÃO POPULAR COMO DIFUSO DEaTUTELA AMBIENTAL
o formato das relações entre o Governo Federal e os níveis subnacionais
qualifica a Democracia. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, forma, percebe-se que a Constituição de 1988 fez dos consumo e Dessa descarte, diante do crescimento vertiginosoFederal e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão municípios entes autônomos, assim como o é a União e os estados, além de ter na imposto propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização uma nova reparticipação tributária, que arrecadou enormes ganhos aos municípios. desta possibilidade de como atuação à conservação do patrimônio Os municípios, assim os cidadã demaiscom entesvistas políticos, possuem autonomia própria e ambiental brasileiro. capacidade de gerir e administrar as comunidades locais. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais 4.2 Estatuto do da meio Cidade e o Planoquem Diretor da proteção ambiente, tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o O Estatuto Cidade tem como principais fundamentos: direito este à cidade e que é cidadania, ao trazerdaque o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo àdispositivo cidadania,ser quetido compreende acesso de todos os vigente cidadãosordem aos direitos mínimos, para como nãoo recepcionado pela constitucional. Comungada com essecomo pontopordeexemplo, vista, a odoutrina entende, como se ter uma vida digna, acesso a majoritária uma moradia e a um saneamento expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., básico; atendimento às funções sociais da cidade e da propriedade urbana;Hely e a gestão Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, democrática, quando se reconhece que para o desenvolvimento urbano, faz-se necessário apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger uma ação conjunto todos os agentes sociais. É essa gestão democrática que corresponder a um deentre fiscalizar. permite a população interferir diretamente na gestão urbano, propondo melhores para os problemasSem sociais urbanos e opinandofica na claro, destinação dos recursos maiores obstinações, permissa vaenia, públicos. que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a cuja O Estatuto da Cidade oferece ao município uma série de instrumentos, CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, finalidade é buscar o desenvolvimento comcompositor mais equidade e sustentabilidade. dentre muitos, o meio ambiente como urbano elemento de um complexo E como exemplos desses instrumentos, que precisam expressamente previstos mote constitucional da garantia de existência mínimaestar de dignidade humana. É no plano diretor, pode-se citar os instrumentos gestão democrática participativa. frágil sustentar que a cidadania se resume à para comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado,destacar o meio ambiente deprecia formadetermina consequencial É importante que o Estatuto da de Cidade que aogestão mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! orçamentária participativa deva ser um instrumento de planejamento municipal e a realizaçãoSendo de audiência é considerada condição obrigatória aprovação ao fimpública e ao cabo, tal restrição aversa à diretrizpara quea sua o texto pela câmara de município. Outrossim, o supramencionado estatuto constitucional nosvereadores dá, dada ado impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar enumera alguns instrumentos para implementar a gestão democrática, tais como órgão de tutela dedematéria Uma constituição como a nossa, pautada acerca em de colegiados políticaambiental. urbana; debates, audiências, consultas e conferências uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos assuntos que digam respeito ao interesse urbano; e a iniciativa popular de projeto de lei e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o ereconhecimento de plano, programas e projetos de edesenvolvimento urbano. Segundo MAZZA (2014), da pessoa humana não humana como titulares o Estatuto da Cidade estabelece normas de ordem pública e interesse social, que regulam o uso da propriedade urbana, em prol do bem coletivo e do bem estar dos cidadãos. No mesmo Oliveira Filho (2004, 1. Art. 1.º sentido Qualquer cidadão será parte legítima para p.01) pleitear assegura: a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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A tendência da administração pública em sobrepor os seus atos ao consentimento do cidadão vem sendo substituídas por novos modelos de gestão em que o papel do cidadão passa de mero espectador para colaborador ativo, co-gestor, prestador e fiscalizador. Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, tem havido no país uma tendência a proliferação dos sistemas de gestão democrática, mediante a criação de conselhos, comissões, comitês. A Constituição estabeleceu expressamente sistemas de gestão democráticos em vários campos da administração pública, o que inclui o planejamento participativo, mediante a cooperação das associações representativas no planejamento municipal, como preceito a ser observado pelos municípios (art. 29, XII) .
O novo modelo de administração pública, pautado na gestão democrática e participativa, preza pela participação ativa dos cidadãos, que atua na fiscalização dos atos do poder público e participa da tomada de decisões, e não no autoritarismo, em que apenas a opinião dos governantes é que devem prevalecer, ou seja, o povo deixa de ser um sujeito passivo, para ser um sujeito ativo, que opina, exige e fiscaliza a atuação dos seus representantes. Ainda é válido mencionar que o referido estatuto integra planejamento, gestão e controle social ao definir que o município se desenvolve pela ação de uma série de agentes, que devem ter atividades participativas na formulação e execução dos programas e projetos de desenvolvimento urbano. E essa gestão se exterioriza pelo plano diretor que, segundo Pinheiro (2010), é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.
4.3 Gestão Participativa e a Esfera Municipal A participação dos cidadãos é imprescindível para o desenvolvimento de um município, sendo de suma importância a sua inserção na administração pública, com a finalidade de alcançar toda a coletividade. E o local mais indicado para a participação popular é o município, pois o povo está mais envolvido e próximo das decisões, como bem assevera Salles (2010, p. 18): Além disso, os cidadãos se interessam mais pelos problemas que lhes dizem respeito mais de perto. A indissociabilidade entre descentralização e Democracia tem sido questionada na literatura, em razão de fenômenos observáveis em nossa realidade. Podemos lembrar alguns exemplos: se a descentralização de competências ocorre sem distinção para todos os
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municípios e entre esses há muitas disparidades de recursos materiais e
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO aumentará DE TUTELA AMBIENTAL humanos, tal procedimento ainda mais tais desníveis, inclusive entre as respectivas populações. Se há a descentralização de recursos, mas
Não restam dúvidas quanto ao continua caráter concentrado de controlenopopular diretopouco e eficaz o poder decisório nível federal, ou nada terá da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas avançado na democratização. dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e Os descarte, do crescimento vertiginoso e multipolarizado cidadãosdiante estão mais envolvidos com os problemas que lhe rodeiam mais das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade cidadão Ademais na de perto, por isso é que a administração municipal interessa mais do às pessoas. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização é válido mencionar que é mais fácil exercer um controle sobre as atividades do prefeito desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio eambiental da câmara de vereadores, do que em autoridades mais distantes da esfera municipal. brasileiro. Vejamos a opinião de Petruci (2004, p.2) acerca da participação popular no âmbito municipal: Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Nos termosquem como concebida a participação popular pelauma nossa ação Constituição da proteção do meio ambiente, tem legitimidade para propor Federal, ela poderá -logo ou melhor, deveráiniciais - ter lugar os níveis de popular? É possível destacar textualmente nos artigos daem Leitodos de Ação 1 do poder político. Mas o nível local é, por excelência, seu habitat exercício Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o A proximidade comunidades menoresdevendo - a grandeeste maioria dos que é cidadania, ao trazer natural. que o título eleitoralque é aasprova de cidadania, portanto - permite entre o povo e osconstitucional. governantes é elemento dispositivo ser tido comomunicípios, não recepcionado pela vigente ordem incentivador e facilitador da participação. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, É em nível local, como de nospleito municípios, a participação população apenas haveria legitimidade genuína quando que o direito político dedaeleger corresponder a um de fiscalizar. pode ser mais eficaz, pois os problemas estão mais próximos da administração, e povo pode externá-los e exigir sua resolução com mais facilidade. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa toda análise até aqui, visto queser a mais Pode-se dizer que é nocom município que aestendida participação popular pode CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, eficaz, tendo em vista a maior uniformidade na composição de cada comunidade local, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo em comparação com da os demais governamentais (estados e União), bem como mote constitucional garantiaentes de existência mínima de dignidade humana. É pelo maior número de interesses comuns dos integrantes do seiodocumental, social. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o A participação nasdodecisões é um jurídico. importante instrumento para o mínimo existencial de todosdo os povo sujeitos ordenamento Todos! aprofundamento da democracia, pois com a descentralização, consequentemente, há Sendomaior ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto uma dinâmica de participação. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar entre A gestão participativa entre estado e sociedade civil, e principalmente de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em juntos município e sociedade, devido ao caráter local da esfera municipal, podem atingir uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos o fim almejado por toda a comunidade. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e nãopública humana como titulares Ademais, a administração municipal, com o passar dos anos, vem inserindo cada vez a participação popular em suas decisões, isso porque os cidadãos estão impondo a cada dia o exercício dos seus direitos, e como a esfera municipal é menor, 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos tendo por da comparação a esfera estadual e federal, o povo acabada cidadania, ficando para mais próximo ao patrimônio União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. e mais participativo das decisões. Exemplo disso é o orçamento participativo, pois em 156
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alguns Municípios os prefeitos elaboram o orçamento após uma consulta à sociedade organizada. Os aspectos mais importantes desse tipo de orçamento são: a democratização do processo decisório; a intervenção das prioridades das políticas públicas; e a função pedagógica em relação à democracia participativa. Destarte, podemos concluir que a gestão participativa e democrática do povo nas decisões do poder público é essencial para o desenvolvimento de políticas públicas de maior aplicabilidade para os anseios sociais e para o exercício de uma fiscalização mais rígida sobre os atos dos representantes do poder público, e como no município, o povo está mais próximo das decisões e da execução dos projetos públicos, essa participação pode ser ainda maior e consequentemente mais eficaz. 5 METODOLOGIA A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, tendo em vista ter sido realizado um levantamento da bibliografia já publicada em forma de livros e artigos acerca do tema em estudo, qual seja, a eficácia da gestão democrática e participativa no âmbito municipal e o princípio da participação popular. Segundo Abreu (2010, p. 45), “a pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos” Marconi ainda é mais completo quando diz que a pesquisa bibliográfica “trata do levantamento de toda a bibliografia já publicada em forma de livros, revistas científicas, publicações avulsas, imprensa escrita, periódicos, anais, trabalhos científicos etc.” (2001, p. 56). Assim, pode-se dizer que a pesquisa bibliográfica é o levantamento e análise de obras já publicadas, com o objetivo de se chegar a um conclusão acerca de um determinado tema. Utilizou-se o seguinte material: legislação nacional pertinente, artigos e estudos de profissionais da área. O material foi obtido por meio de: leis, livros e artigos. A pesquisa se desenvolveu da seguinte maneira: levantamento bibliográfico inerente ao tema; estudo crítico do material doutrinário levantado; obtenção e análise da legislação nacional pertinente; e seleção e exame de artigos. Destarte, pode-se dizer que quanto a legislação nacional foram utilizados a Lei do Estatuto da Cidade, e a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, e como livros e artigos, utilizou-se estudiosos que se preocuparam com o tema em análise.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando em trabalho, uma lógica desagregadora dos ameios de produção, Comseo trata presente pode-se concluir que participação popular está consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado cada vez mais presente na gestão pública municipal. A participação social está cada vez das sistemáticas meio de ambiente, da legitimidade doformas cidadão na maisagressões ativa dentro do processoaopolítico desenvolvimento social. As autoritárias propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização de gestão estão dando a práticas os cidadãos participar desta possibilidade delugar atuação cidadãque compermitem vistas à que conservação do possam patrimônio ativamente da gestão pública, fiscalizando e cobrando do poder público o desempenho ambiental brasileiro. de suas funções com qualidade. Outrossim, a própria Constituição Federal de 1988 na análise a princípio doutrina e legislação, no tocantedaaopessoa assegurouSegue-se, a participação popular na gestãodepública como direito à dignidade polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais humana, estabelecendo que o regime político no Brasil é além do representativo. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente nos artigos iniciais Lei deuma Açãogestão Concluiu-se, ainda, que oslogo instrumentos voltadosda para 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o democrática e participativa, são os órgãos colegiados de política urbana; as conferências que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este voltadas para de interesse urbano; apela consulta pública; iniciativa popular de dispositivo serassuntos tido como não recepcionado vigente ordema constitucional. projeto de lei,com projetos programas urbanísticos; referendo; a gestão Comungada esse eponto de vista, a doutrinao plebiscito majoritáriae oentende, como orçamentária participativa, que o município direciona uma parcela Jr., do Hely orçamento expresso na lição de Rodolfoem de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Meirelles, queque emasíntese correspondem-se ideia de e deveres, facto,dentre público para população vote e opine aacerca da direitos destinação dessesipso recursos, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger outros. corresponder a um de fiscalizar. Ademais, os mecanismos de democracia direta contribuem para intermediar Sem maiores obstinações, claro, permissa vaenia, que nos existe uma de as opiniões entre a esfera pública efica a sociedade civil, pois quando processos relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a decisões há participações dos cidadãos, estes tomam conhecimento da sua importância e CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, passam a contribuir para a gestão pública, principalmente municipal. dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo O planejamento participativo é mínima um dosdeprincipios importantes mote constitucional da garantia de existência dignidademais humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido para o sucesso de programas e projetos, pois a participação popular possibilita que o de que, quandocorresponda lesionado, oaos meio ambiente deprecia forma consequencial o planejamento anseios do povo, pois de o levantamento dos problemas mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! sociais serão mais concretos. Com uma gestão urbana democrática e participativa, a administração umataladministração mais àtransparente e eficiente. Sendopública ao fimpassa e aoa ter cabo, restrição aversa diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de da A participação popular pode ser exercida diretamente por meio cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar democracia direta, com a utilização de mecanismos como o referendo, o plebiscito ou a de tutela popular, de matéria ambiental. Uma pode constituição como nossa, pautada em iniciativa assim como também ser exercida porameio de uma administração uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos pública participativa, que podedeocorrer pordimensão meio de subprefeituras, participação e conceitos marginalizadores primeira ao sustentar emcom seua bojo o de cidadãos em conselhos aindatitulares através conselhos autônomos, reconhecimento da pessoa públicos humana emunicipais, não humanaoucomo que possuam a finalidade de fiscalizar e participar da administração nos assuntos que dizem respeito a toda coletividade. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distritotambém, Federal, dos que Estados, dosuma Municípios[...] 3º A prova da cidadania, para ingresConclui-se, para gestão§municipal participativa eficiente so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. faz-se necessária a implantação de conselhos municipais e setoriais, que são órgãos
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colegiados que funcionam como verdadeiros canais de participação popular. E, além deles, o orçamento participativo, em que o município permite que a sociedade opine sobre quais áreas são as mais deficientes e necessitam com mais urgência dos recursos públicos. Concluiu-se, ainda, que é no município que a participação popular pode ser mais eficaz, em razão da maior uniformidade na composição de cada comunidade local, bem como pelo maior número de interesses comuns dos integrantes do seio social. Destarte, pode-se dizer que a gestão participativa e democrática do povo nas decisões do poder público é de fundamental importância para o desenvolvimento de políticas públicas de maior aplicabilidade e para o exercício de uma fiscalização mais rígida sobre os atos dos representantes do poder público, e como no município, a população está mais perto da tomada de decisões e da execução dos projetos públicos, essa participação pode ser ainda maior e, consequentemente, mais eficaz. A participação do povo é essencial para o desenvolvimento de um município, sendo de grande importância a sua inserção na gestão pública, com o objetivo de se alcançar toda a coletividade. ABSTRACT The overall objective of this study is to discuss about the effectiveness of democratic and participatory management in the decisions of the municipal government. So the study sought to answer the following question: What is the effectiveness of democratic and participatory management in the decisions of the municipal government, and how popular participation can contribute to the municipal public administration?. The methodology used in this bibliographic and participatory research, and the principal authors were: Fonseca (1993), Novelino (2012), Pinheiro (2010), Rocha (2011) and Salles (2010). With this work completed, it is important for people’s participation in the development of public policies and monitoring of the acts of public officials. And as in the city, the people are closer to the decisions and implementation of public projects, such participation can be more effective. Citizen participation is essential for the development of a municipality, requiring their inclusion in public administration, in order to reach the entire community. The people taking part in decisions is a key mechanism for the development of democracy. Key-words: Democratic Management. Popular Participation. Municipality.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
A ESTRATÉGIA APLICADA EM TEMPOS DE CRISE – UMA ABORDAGEM NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MARANHÃO Rosimary Carneiro Sousa*1 RESUMO Ultimamente o cenário brasileiro vem revelando momentos de crise econômica causada pelas recessões advindas das medidas tomadas pelo Governo, que vem atribuindo a responsabilidade à crise econômica internacional como a causa das dificuldades ora enfrentadas. Sem dúvida a adaptação do Brasil no processo de globalização lhe rendeu alguns benefícios, assim como contribuiu em algum momento para esta atual situação. Porém, o que se observa é que o País é o principal responsável pela situação e vem colhendo a herança da má gestão econômica ao longo dos anos. Esta crise afeta a economia brasileira de forma gradativa e as mais diversas organizações públicas e privadas. Os efeitos desta veem se alastrando nos últimos quatro anos no âmbito do Tribunal de Justiça do Maranhão, provocando greves de servidores e gerando um clima organizacional desfavorável. Os problemas giram principalmente em torno da execução do planejamento orçamentário que vem enfrentando dificuldades para cumprir o orçamento de forma a contemplar as principais despesas e, ao mesmo tempo, se adequar às exigências legais, o ápice da crise concerne às despesas com pessoal o que leva à cobrança por parte dos servidores, que vislumbram o cumprimento, principalmente, de ações judiciais que envolvem sua remuneração. Diante deste contexto, qual estratégia aplicar para vencer a crise diante da atual situação? Este trabalho tem o objetivo de abordar, no aspecto crítico, os vários aspectos do pensamento estratégico, a fim de levantar uma reflexão sobre as estratégias usadas pelo Tribunal de Justiça do Maranhão no combate à crise enfrentada na atual conjuntura.
Palavras-chave: Estratégia. Crise.Planejamento. Organizações Públicas.Gestão.
1 INTRODUÇÃO A Abordagem Conceitual da Administração, elaborada pelos mais diversos autores, traz no sentido mais restrito da palavra o ato de gerenciar, gerir um negócio a fim de alcançar determinado objetivo. Durante vários anos, este conceito esteve mais visivelmente relacionado com as empresas privadas. Entretanto, com o decorrer do tempo, o termo administrar com todas as estratégias e conceitos de planejamento .Rosimary Carneiro Sousa. Especialista em Gestão Pública e Contabilidade Pública. Tribunal de Justiça do Maranhão. Técnica Judiciária. Email:rocsousa@tjma.jus.br *
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usados para alcançar um fim, evoluiu no campo da administração pública através de 5estudos, AÇÃOpesquisas POPULAR COMO MEIO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL e experiências, ganhando um DE espaço significativo na esfera pública, quando seNão tratarestam de suadúvidas aplicabilidade na gestão dos recursos públicos. Valeeressaltar quanto ao caráter de controle popular direto eficaz que adaaplicação do conceito gerencial entidades públicas tomou grande impulso ação popular no controle dos atosnas administrativos. Permanecem, contudo, certas com a criação Lei Complementar nº 101/2000, que estabelece públicas dúvidas da quando se trata em uma lógica desagregadora dosnormas meiosde definanças produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, emergindo assim, uma nova visão para das agressões sistemáticas aoameio ambiente, da legitimidade do cidadão na a gestão pública, passando-se considerar de forma mais responsável a transparência propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização e as implicações da má administração dos recursos públicos, observando-se o rigor da desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio Lei. Assim,brasileiro. a Lei Complementar nº 101/2000 foi de certa forma uma ferramenta que ambiental contribuiu para ajudar no combate à corrupção tão presente no Brasil, quando se trata de administração de recursos públicos. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais públicos,quem a partir dolegitimidade século XX, passaram a seuma preocupar da proteção Os do gestores meio ambiente, tem para propor ação mais com o planejamento e com as estratégias alogo serem para atingirem popular? É possível destacar textualmente nos adotadas artigos iniciais da Lei de entre Ação outras 1 Popular – lei nº4.717/65) a contundência extensão o coisas os(LAP princípios da administração pública, quando descritosemnosua Art. 37 da define Carta Magna: que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, entre outros. A gestão dispositivo ser tidotomou como uma não recepcionado pela complexa vigente ordem constitucional.pública dos bens públicos perspectiva mais e a administração Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como assumiu postura gerencial considerar a correta aplicação dos recursos públicos, expressouma na lição de Rodolfo de ao Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely antes deveras na forma de como o governo lidava com o dinheiro público. Meirelles, quenegligenciada em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, O gestor, a partir deste ponto, passa de a aplicar o conhecimento elaboração apenas haveria legitimidade genuína pleito quando o direito gerencial político denaeleger corresponder umpermitam de fiscalizar. de estratégias aque o alcance dos resultados em prol do bem coletivo, a fim de buscar evitar as sanções impostas pela Lei. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência comotoda análise referencial estendida atépara aqui,asvisto que a de A estratégianormativa “determina conceito atividades CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, negócios de uma empresa e provê as diretrizes para coordenar essas atividades, de dentre muitos, o meio ambiente como elementomutante compositor de um complexo forma que a empresa possa lidar com o ambiente e exercer influência sobre ele. mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É A estratégia articula o ambiente preferido da empresa e o tipo de organização frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentidoque ela está se esforçando pra ser.”o(Hiroyuki Itami apud D.Besanko, M.Shanley, de que, quando lesionado, meio ambiente deprecia de formaD.Dranove, consequencial o S. Schaefer, 2007, p.27). mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Acompanhando evolução estratégica na esfera pública, a Sendo ao fim e ao acabo, tal restrição aversa à diretriz que oobserva-se texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de necessidade de reformulação na aplicação destes conceitos para que alcancem seus cidadania não égarantindo sinônima de cidadania se tratar da objetivos eque metas, uma gestão eleitoral, centrada especialmente nas bases da ao transparência, de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada integração do planejamento e do orçamento, do controle e da avaliação de novosem projetos uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos ee programas que visem à prestação de serviços à sociedade. conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 2 O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO NO TJMA 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos O planejamento é indispensável para que§as avancem rumo ao ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] 3º Aestratégias prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. alcance dos objetivos de uma organização. Ressalta-se que as várias literaturas que
tratam do assunto consideram três tipos de planejamento: o estratégico, o tático e o 164
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operacional. O planejamento estratégico, aqui tratado, “é a metodologia administrativa que possibilita ao executivo estabelecer o rumo a ser seguido pela empresa, visando obter um nível de otimização na interação da empresa com seu ambiente, onde estão os fatores externos ou não controláveis” (Oliveira, 2012, p.76). Logo, a partir do conceito observa-se que o planejamento estratégico refere-se aos objetivos de longo prazo. O Tribunal de Justiça do Maranhão, Órgão do Poder Judiciário, cuja missão institucional é “exercer o controle da constitucionalidade das leis e demais atos normativos, zelando pela eficácia dos direitos e garantias individuais, difusos e coletivos, dos direitos sociais e políticos, quando provocados para este fim, cabendo-lhes administrar de forma autônoma os cargos, funções e serviços da justiça e suas dotações orçamentárias” (Relatório de Gestão, 2013, p.3) iniciou o processo de planejamento estratégico no ano de 2009, motivado pela ideia de uma gestão continuada, a partir de um planejamento ao longo prazo, além da necessidade de estabelecer metas específicas e a obtenção de controle, através de planos de ações. A criação deste planejamento estratégico contemplou a publicação da Resolução nº 49, de 18 de dezembro de 2007, pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização (GESPUBLICA). A partir daí, com a criação do Núcleo de Planejamento Estratégico (NPE) e o auxílio da Fundação Getúlio Vargas (FGV), instituição renomada em consultoria do país, criaram-se as bases do planejamento estratégico. No ano de 2010, realizou-se então o I Encontro de Gestão Estratégica do Tribunal de Justiça do Maranhão e elaborou-se o planejamento estratégico com vigência para os anos de 2010-2014, definindo inicialmente a missão, a visão e os valores do Poder Judiciário, principais pontos considerados por vários autores como de suma importância para que se obtenha uma estratégia clara, sustentável e tangível, então conforme disposto no Relatório de Gestão (2014. p.4), as mesmas foram assim definidas: Missão: “Garantir a justiça, dirimindo conflitos de forma efetiva e acessível à sociedade, contribuindo para o fortalecimento do Estado Democrático de Direito”. Visão: “Ser reconhecido como Instituição ágil e efetiva na solução dos conflitos em sociedade, conjugando tratamento humanizado com práticas modernas de gestão e uso eficaz de tecnologia”. Valores: Ética, Transparência, Excelência dos Serviços, Valorização das pessoas, Justiça e Comprometimento.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Em consonância ao grau de importância que é a elaboração de um plano Não restam dúvidas quanto caráter dee controle popular direto e eficaz estratégico para a contemplação das ao estratégias o alcance dos programas estatais na da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, qual a organização se destina a Constituição Federal no seu Art. 165, nacertas seção que dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, trata “Dos Orçamentos”, contribuiu para o planejamento das entidades públicas quando consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado num processo integrado de alocação recursos,da envolveu atividades de planejamento das agressões sistemáticas ao meio de ambiente, legitimidade do cidadão na epropositura orçamento, contemplando três iniciativas do Poder Executivo: Plano Plurianual da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias Lei Orçamentária Anual (LOA). desta possibilidade de atuação cidadã com(LDO) vistas eàaconservação do patrimônio ambiental brasileiro. Estes instrumentos de planejamento são muito importantes, uma vez que as entidades públicas têm obrigações definidas constitucionalmente para com o Estado, conhecidas Segue-se, na análise a princípio doutrina e legislação, no tocante como atividades complementares, a saber: de ‘Obter receitas públicas, criar créditoaopúblico polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais (endividamento), planejar e gerar orçamento público e para despender pública” da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade propordespesa uma ação (Jund, 2008, p.22). destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação popular? É possível Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o O planejamento, sereleitoral compreendido “um processo racional que é cidadania, ao trazer que opara título é a provacomo de cidadania, devendo este para definir objetivos e determinar meios para alcançá-los, o atendimento das dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigentepressupõe ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como seguintes características: expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely • Diagnóstico da situação existente; Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, • Identificação de bens e serviços; apenas haveria legitimidade genuínadas denecessidades pleito quando o direito político de eleger Definição clara dos objetivos para a ação; corresponder a um de• fiscalizar. •
Discriminação e quantificação das metas e seus custos;
Sem maiores claro,obtidos; permissa vaenia, que existe uma • obstinações, Avaliação dosfica resultados relevante incongruência normativa com toda análise estendida • Trabalho integrado.” (Jund, 2008, p.130) até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo A administração se utiliza de ferramentas planejamento, mote constitucional da garantiapública de existência mínima de dignidadede humana. É como: o PPA, aque LDO e a LOA,seos quais,à após elaborados pelos órgãos públicos, são frágil sustentar a cidadania resume comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, primando o meio ambiente deprecia de forma consequencial o Isto, apresentados à população, pelo princípio constitucional da publicidade. mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! após se submeterem à avaliação de várias etapas que incluem fatores como decisões que serão tomadas, disponibilidade de recursos, definição dos programas de governo e tudo Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto mais que implicar estratégicas definidas governo. Sendo que constitucional nos nas dá, diretrizes dada a impossibilidade clara depelo restrição do conceito deo PPA écidadania considerado principal instrumento de planejamento ao longo prazo, um período que onão é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente aopor se tratar de 4tutela (quatro) e este “estabelecerá forma regionalizada, as diretrizes, os em objetivos de anos matéria ambiental. Umadeconstituição como a nossa, pautada uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e metas da administração pública para as despesas de capital e outras delas decorrentes, ee para conceitos marginalizadores de de primeira ao sustentar o as relativas aos processos duraçãodimensão continuada” (Art. 165,em § 1ºseu dabojo CF/1988). reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares O Planejamento Estratégico (PE) no Tribunal de Justiça do Maranhão, atendendo à importância do PPA, é também elaborado para um período de 4 (quatro) anos contribuindo consideravelmente na obtenção de vários resultados positivos 1. Art.e1.ºvem Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, Estados, dosque Municípios[...] § 3º Aoprova da cidadania, ingrespara a organização, tendo nosdos membros compõem NPE pessoasparaatuantes em so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. relação aos controles. Estes se empenham na realização de reuniões periódicas a fim 166
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de discutirem os principais problemas enfrentados, pelas mais diversas áreas e setores e em seguida propõem planos de ações para corrigir as principais dificuldades relatadas pelos setores. O NPE (Núcleo de Planejamento Estratégico) iniciou a preparação de um novo planejamento estratégico para implementação em 2015-2019, contemplando através da realização de seminários com participação dos servidores do Poder Judiciário a visão de: “Gestão Estratégica com Balanced Scorecard”, “Gerenciamento de Projetos” e “Implantação do Escritório de Projetos” (Relatório de Gestão 2013, p.5). Uma das principais estratégias usadas para incentivar o alcance dos objetivos e o cumprimento de sua missão institucional foi a criação da GPJ (Gratificação de Produtividade Judiciária) que é um valor remuneratório anual que contempla os diversos setores que cumprirem as metas específicas pré-estabelecidas anualmente. Periodicamente, são lançados os resultados alcançados no portal do órgão e ,assim, os setores vão acompanhando o seu desempenho em relação ao cumprimento das metas. A GPJ funciona como um incentivo para que o servidor colabore com mais afinco para o cumprimento da missão do órgão. Desta forma, vários mutirões foram realizados com a finalidade de julgar processos há muito tempo estagnados, a liberação de processos tornou-se mais célere e serviços foram ampliados, entre outras coisas. 3 A CRISE ESTABELECIDA NA EXECUÇÃO DAS DESPESAS COM PESSOAL Como já visto anteriormente, a eficiência e a eficácia fazem parte dos princípios constitucionais que regem a administração pública e que estão diretamente ligados ao desempenho dos servidores e gestores que compõe a organização pública. Se por um lado observa-se que a GPJ funcionou como incentivo para o alcance de melhores práticas e a busca pela excelência, por outro lado, outros inconvenientes institucionais foram criados e ironicamente referem-se a problemas com planejamento. Esses problemas tomaram um aspecto preocupante a partir do ano de 2013. O PPA, como dito anteriormente, é um dos principais instrumentos de planejamento e como tal, no Tribunal de Justiça do Maranhão, por meio da Coordenação de Orçamento busca-se entre os vários cargos de direção o apoio para os estabelecimentos das metas e prioridades da administração, a fim de possibilitar a execução satisfatória do orçamento. O que foi verificado, ao longo do tempo, é que ainda existe, entre os gestores, a dificuldade de se efetuar um planejamento consistente e bem elaborado, que minimize as distorções quando da execução orçamentária. Na elaboração da Proposta Orçamentária do orgão, é lançado no portal da transparência o Orçamento Participativo
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para cumprimento dos ditames da Lei 101/2000 que trata da responsabilidade fiscal, 5mas AÇÃO POPULAR MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL também para queCOMO haja envolvimento dos servidores, o que também contempla a participação dos gestores, quanto às principais ações que desejam executar longo dos Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto eao eficaz anos. O popular que observou-se nados análise principais problemas é quecontudo, estas ações às vezes, da ação no controle atos dos administrativos. Permanecem, certas não são devidamente estruturadas quando, enfim, é aprovada a proposta orçamentária, dúvidas quando se trata em uma elógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante crescimento vertiginoso multipolarizado passando assim, para a fase da do execução orçamentária, surgeme então outras demandas das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do para cidadão na que não foram contempladas no planejamento e estas contribuem os atropelos propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização financeiros da execução do Orçamento, além de compras de materiais que às vezes não desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio levam em consideração ambiental brasileiro. a real necessidade e o custo benefício. Outro ponto relevante refere-se à falta de consideração das ameaças na formulação do Planejamento exemplo destas, pode-se citaraoque em Segue-se, na análiseOrçamentário. a princípio deComo doutrina e legislação, no tocante polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais meados dos anos de 2009 já se ouvia se falar em diversas ações judiciais que estavam da proteção do pelos meio servidores ambiente, em quem tem aos legitimidade pararemuneratórios propor uma ação sendo impostas relação seus direitos e isto não popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação foi contemplado quando da elaboração da proposta orçamentária ao longo dos anos. Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o O que ocorreu devido à inobservância ameaças foi que, que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a provadestas de cidadania, devendo esteno ano de 2012, várias destas ações julgadaspela e tiveram implantação na folha de dispositivo ser tido como não foram recepcionado vigentesua ordem constitucional. pagamento, da mesma. problemamajoritária alastrou-seentende, e piorou na mudança Comungadacausando com esseo inchaço ponto de vista, a Odoutrina como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely de gestão ocorrida em dezembro de 2013, tendo como consequências nos últimos dois Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia deque direitos e deveres, ipso facto,e ainda anos problemas como: insatisfação dos servidores têm suas ações julgadas apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político eleger em não foram implantadas em folha, impossibilidade de nomear servidoresdeaprovados corresponder a um de fiscalizar. concursos, suspensão de pagamento de GPJ (Gratificação de Produtividade Judiciária) e outros Sem direitos, não implantação da GAJ Administrativa maiores obstinações, fica claro,(Gratificação permissa vaenia, que existe Judiciária) uma para alguns servidores, entre outras medidas. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência positivas do Estadovem paraenfrentando prover, Como resultado, o Tribunaldedeações Justiça do Maranhão a dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo crise na gestão do planejamento orçamentário e se encontra pressionado a adotar várias mote constitucional da garantia de existência humana. É (seis estratégias que o mantenham dentro do limite mínima de gastodededignidade pessoal que é de 6% frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido por cento) da receita corrente líquida para o Judiciário, os ditames daoLei de de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia deconforme forma consequencial Responsabilidade (LRF) nº 101/2000, que regulamentou disposto no Art.169 mínimo existencialFiscal de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. oTodos! da CF/88. Porém, vale ressaltar que o orgão depende também da arrecadação do Estado Sendo ao do fimlimite e aodecabo, tal exigido restriçãopela aversa diretriz quedaso dificuldades texto para se fixar dentro pessoal Lei, oà que apesar constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito enfrentadas, este ainda se encontra dentro dos ditames legais impostos pela LRFdeno que cidadania quelimites não é com sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar se refere aos pessoal. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Vale ressaltar que desobediênciaexpande ao enquadramento dos dos limites legais leva uma realidade comunitária e adiversificada, os horizontes direitos às seguintes marginalizadores medidas previstasde nosprimeira §§ 3º e 4º, do art. 169, da CF/1988: redução e conceitos dimensão ao sustentar em seu bojo ode pelo menos 20% das despesas cargos em humana comissão e funções de confiança, exoneração reconhecimento da pessoacom humana e não como titulares dos servidores não-estáveis e a possibilidade do servidor estável perder o cargo, se as medidas adotadas anteriormente não assegurar o cumprimento da determinação legal. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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4 REFLEXOS DO PENSAMENTO ESTRATÉGICO NO TJMA Tomando-se por base as pesquisas e estudos dos vários estudiosos do pensamento estratégico, como Mintzberg, Ahlstrand, Lampel (2010) e Wright (2010), entre outros que muito contribuíram para os estudos da estratégia e analisando os vários modelos de escolas: Design, Planejamento, Posicionamento, Empreendedorismo, Cognitiva, Aprendizado, Poder, Cultural, Ambiental e Configuração, busca-se identificar os reflexos destes pensamentos dentro do Tribunal de Justiça do Maranhão, avaliando a importância das várias escolas de pensamento estratégico. A Abordagem Clássica, segundo a visão dos autores, contempla as escolas de design, planejamento e posicionamento. Fazendo uma análise sobre esta abordagem no Tribunal de Justiça do Maranhão, pode-se identificar sua presença na existência de um planejamento estratégico com missão, visão e valores definidos, este planejamento é formalmente elaborado e acompanhado e as estratégias definidas através da elaboração de objetivos e metas a serem alcançadas, sendo os resultados devidamente auditados em comparabilidade com as metas inicialmente estabelecidas, característica que se reflete na escola de planejamento. No que tange a escola de posicionamento, é possível identificar no Tribunal de Justiça do Maranhão, através de pesquisas externas realizadas por servidores, que este é um orgão que dispõe de vantagem competitiva em relação a outros tribunais estaduais e até mesmo em relação a outros órgãos públicos estaduais, uma vez que investe em tecnologia, desenvolvendo sistemas internos que auxiliam na prestação de serviços e na execução das tarefas, como por exemplo, o Sistema DIGIDOC que funciona como uma espécie de protocolo e, ao mesmo tempo, como sistema de controle dos vários processos administrativos que tramitam no órgão, possibilitando o acompanhamento dos mesmos e servindo como objeto de controle para a medição das metas estabelecidas pelo NPE (Núcleo de Planejamento Estratégico). Outro ponto importante que reflete vantagem competitiva está nos termos remuneratórios, que mesmo diante das atuais dificuldades, apresenta remuneração superior em comparação a outros tribunais estaduais, conforme estudos internos realizados por servidores da área orçamentária do orgão. O Tribunal de Justiça do Maranhão também se destaca quanto ao investimento em treinamento aos seus servidores, visando à eficiência e a eficácia na prestação dos serviços. A Abordagem Processual, segundo as literaturas que tratam do assunto, reflete-se no órgão pelas características das escolas: Cultural e de Aprendizado. A Escola de Aprendizado se reflete nas estratégias emergentes que o órgão vem tomando para sanar suas dificuldades de execução orçamentária, como por exemplo: medidas como redução de custos com pessoal e controle de gastos com material de expediente. Estas estratégias refletem um processo de aprendizado mútuo entre os gestores e os servidores,
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através da execução das ações regidas pelas intenções dos gestores e tem seus reflexos 5noAÇÃO POPULAR COMO MEIOvárias DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL clima organizacional, provocando reivindicações sindicais através de greves. Também vale ressaltar a presença da Escola Cultural, quando se observar Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto ao e eficaz odaclima organizacional do dos órgão torna possívelPermanecem, identificar que as estratégias ação popular no controle atosseadministrativos. contudo, certas são influenciadas pelas um grupo por desembargadores juízes, e assim, dúvidas quando se crenças trata emdeuma lógicaformado desagregadora dos meios de eprodução, consumo diante crescimento vertiginoso e multipolarizado geralmentee asdescarte, estratégias visamdobeneficiar as funções jurisdicionais em detrimento às das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na administrativas e gerenciais, emergindo assim a explicação para ainda se negligenciar propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização fatores como a importância do planejamento e da análise de custos voltadas para a desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio economicidade adequada. ambiental brasileiro. Na abordagem sistêmica, destaca-se aqui a Escola de Poder. No que diz respeito aSegue-se, esta abordagem, umaponto muito ser considerado é o reflexo na análise princípio derelevante doutrina ea legislação, no tocante ao do polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais poder de negociação do Tribunal de Justiça do Maranhão, junto à SEPLAN (Secretária da do Planejamento meio ambiente, quem tem legitimidade para àpropor umadeação de proteção Estado do e Orçamento), no que tange captação recursos popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação financeiros para a implantação das estratégias que envolvem as despesas de custeio. Em Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o anos anteriores, era possível identificar uma éautonomia maior do Tribunal de Justiça que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral a prova de cidadania, devendo este do Maranhão negociar governo recursos que permitissem ao órgão a tomada dispositivo seraotido como com não orecepcionado pela vigente ordem constitucional. de decisões em aos vários projetos, entre eles os que envolvem a folha de Comungada comrelação esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely pagamento. Observa-se que, atualmente, houve uma redução deste poder de negociação Meirelles, síntese a ideia direitos e deveres, ipso facto, e o Tribunalque deem Justiça do correspondem-se Maranhão (TJMA) se vêde pressionado constantemente a revisar apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger suas estratégias. O poder de negociação ,neste caso, envolve questões políticas e devem corresponder a um de fiscalizar. ser tratadas com o comprometimento presencial da atual gestão, junto ao governo, o que é relevante e praticado órgão. fica claro, permissa vaenia, que existe uma Sem maiores pelo obstinações, A abordagem evolucionária reflete no órgão através da aEscola relevante incongruência normativa com toda se análise estendida até aqui, visto que CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Empreendedora, o TJMA, mesmo com as dificuldades ainda apresentadas de dentre muitos, vem o meio ambiente como de processo um complexo planejamento, mantendo junto aos elemento gestores ocompositor incentivo ao estratégico mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É a fim de proporcionar mudanças cada vez mais eficazes e eficientes que cumpram a frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido sua missão institucional, isso é facilmente identificado se avaliássemos o TJMA há de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o uns 5 (cinco) anos de no todos que condiz à prestação de serviços, valorização mínimo existencial os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! de servidores, eficiência nos processos, entre outras mudanças. Inclusive ressaltando a realização Sendo ao fimpúblico e ao cabo, tal restrição diretriz o texto do primeiro concurso do órgão no ano deaversa 2004,àpelo entãoque gestor da época, constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de desembargador Milton de Souza Coutinho, visando ocupar os cargos por servidores cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar estáveis proporcionando maior qualificação na prestação dos serviços. A partir daí, de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em várias outras iniciativas exemplificam esta abordagem: criação dodos plano de cargos uma realidade comunitária e diversificada, expande os ahorizontes direitos ee salários, disponibilidade de de capacitação paraem os seu servidores, conceitosamarginalizadores detreinamentos primeira dimensão ao sustentar bojo o entre outras que demonstram a intenção do gestor. reconhecimento da pessoa humana evisionária não humana como titulares No TJMA, é possível também identificar características da Escola Ambiental verificando as análises do ambiente para identificar oportunidades e possíveis ameaças 1. 1.º Qualquer será parteno legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade Neste de atos lesivos queArt.venham a cidadão se interpor cumprimento eficiente da sua missão. sentido, o ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresTribunal de Justiça do Maranhão tomou medidas voltadas para a responsabilidade so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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social, como: “Melhorias no Sistema de atendimento e Conciliação – ATTENDE com agendamento de audiências online, Elaboração e disponibilização do site institucional da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar – CEMULHER (...)” (Relatório de Gestão 2014, p.27). A Escola da Configuração nesta abordagem evolucionária também deixa reflexos nas estratégias utilizadas pelo TJMA ao verificarmos que mesmo com a mudança de gestão que ocorre a cada biênio, a prestação de serviços do órgão vem se mantendo estável quanto à proposta de inovação e eficiência na melhoria dos processos que norteiam a principal atividade do ente que é a jurisdicional e isto é observável quanto às medidas adotadas para este fim, como por exemplo: “A utilização de tecnologia virtual para a criação de salas de vídeo conferência, disponibilização de certidões negativas de 1º grau com emissão online, informatização dos postos de conciliação das unidades judiciais no interior do Estado e disponibilização de internet livre no Fórum Desembargador Sarney Costa em São Luís (...)” (Relatório de Gestão 2014, pág.27). 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho buscou identificar, no Tribunal de Justiça do Maranhão, a aplicação da estratégia na solução das dificuldades enfrentadas ao longo dos anos pelos gestores, além de possibilitar analisar as várias medidas tomadas pelo órgão em comparação às escolas de pensamento estratégico proposta pelos estudiosos que tratam do assunto e, assim, foi possível identificar no órgão características que equivalem às abordagens: Clássica, Processual, Sistêmica e Evolucionária. Conclui-se que, em termos de planejamento estratégico, o órgão já deu os primeiros passos rumo à aplicabilidade de uma administração gerencial voltada para o planejamento e análise dos resultados, mesmo porque existe o dever anual e legal de prestação de contas. Porém, devido a problemas como mudança de gestão e, consequentemente, troca de cargos de direção, o planejamento, por diversas vezes, fica comprometido, por perder a consistência de um trabalho que se iniciou em uma gestão e não teve continuidade ou foi negligenciado em outra. Desta forma, mesmo considerando o fato dos gestores já se encontrarem com uma visão empreendedora, não se pode afirmar que o TJMA esteja num nível estratégico adequado. Sabe-se que os aspectos jurisdicionais cabem à atividade fim do órgão e que a falta de direcionamento de foco para a área administrativo- financeira, no que tange ao incentivo de práticas gerenciais de controle de custos, ainda pode ser o principal problema que faça o TJMA não alcançar ainda o posicionamento estratégico satisfatório.
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ABSTRACT 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Lately is revealing moments of economic crisis caused by thecontudo, recession certas resulting from da açãoBrazilian popularscenario no controle dos atos administrativos. Permanecem, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, the measures taken by the government, which is giving the responsibility to the international economic consumo descarte, diante now do faced. crescimento multipolarizado crisis as the ecause of the difficulties No doubt vertiginoso the adaptation eof Brazil in the globalization das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na process earned him some benefits, as well as contributed at some point to this current situation. However, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização what observed is thatde the atuação country iscidadã primarily responsible the situation and been reaping the destaispossibilidade com vistas àforconservação do has patrimônio legacy of economic mismanagement over the years. This crisis affects the Brazilian economy gradually ambiental brasileiro.
and most diverse public and private organizations. The effects of this, see spreading in the last four years na análise a princípio tocante aoclimate. in the CourtSegue-se, of Maranhao, causing strikes serversde anddoutrina creating eanlegislação, unfavorable no organizational polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais The problems revolve mainly around the implementation of the budget planning that has struggled to da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação meet the budget in order to include the major expenses and at the same time fit the legal requirements, popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação the height(LAP of the crisis the compensation of employees leadsextensão to recovery by theoservers, 1 Popular – lei concerns nº4.717/65) a contundência quandowhich em sua define looking out over theao fulfillment mainly of lawsuits involving their compensation. this context, que é cidadania, trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania,Given devendo este what strategy to apply overcome facing the current situation?ordem This paper aims to address the dispositivo ser totido como the nãocrisis recepcionado pela vigente constitucional. Comungada esse ponto vista, thinking a doutrina majoritária entende,oncomo critical aspect ofcom the various aspects de of strategic in order to raise a reflection the strategies expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely used by the Court in Maranhão combating the crisis faced at this juncture.
Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Keywords: Strategy, crisis planning, Public Organizations, management.
Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, REFERÊNCIAS dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido BRASIL. Presidência da República. Constituição da República do o de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de formaFederativa consequencial Brasil 1988. Disponível <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ mínimodeexistencial de todosem: os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! constituicaocompilado.htm> acesso em 12 .jun.2015. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional dá, dada aD.impossibilidade clara de restrição conceitodadeEstraBESANKO D.,nos DRANOVE SHANLEY M.,SCHAEFER S. A do Economia cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar tégia. 5.Eed Ed. Porto Alegre: Editora Bookman, 2007. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos CONSELHO NACIONAL DEdeJUSTIÇA, nº 49 de 18 de e conceitos marginalizadores primeira Resolução dimensão ao sustentar emdezembro seu bojo de o 2007. Disponíveldaem: reconhecimento pessoa humana e não humana como titulares < http://www.cnj.jus.br/images/stories/docs_cnj/resolucao/rescnj_49.pdf> Acesso em 11 jun. 2015 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para Rio ingresJUND, Sérgio. Administração, Orçamento e Contabilidade Pública. 3. ed. de so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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________.______________, Lei 4.320 de 17 de março de 1964, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4320.htm> Acesso em 11 jun. 2015. ________.______________, Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm> Acesso em 10 jun.2015. MINTZBERG Henry, AHLSTRAND Bruce, LAMPEL, Joseph. Safári da Estratégia: um roteiro pela Selva do Planejamento Estratégico, 2 ed. Porto Alegre: Bookman 2010. OLIVEIRA, Djalma de Pinho Rebouças de. Estratégia e Vantagem Competitiva: como estabelecer, implementar e avaliar, 8 ed. São Paulo: Atlas, 2012. ________.______________, Relatório de Gestão 2013. Disponível em: <http:// gerenciador.tjma.jus.br/app/webroot/files/publicacao/404252/relatorio_tjma__2012_2013_site_18122013_0907.pdf> Acesso em 10 jun. 2015. ________.______________, Relatório de Gestão 2014. Disponível em: <http:// gerenciador.tjma.jus.br/app/webroot/files/publicacao/11309/20120402_documentos_ anexados_prest._de_contas_tj.pdf> WRIGHT, Peter, KROLL, Mark J., PARNELL John. Administração Estratégica: conceitos. São Paulo: Atlas, 2010.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
EUTANÁSIA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Ticiany Gedeon Maciel Palácio*1
RESUMO O presente artigo versa sobre eutanásia e suas implicações na esfera da dignidade humana. Buscou-se analisar o ordenamento jurídico de outros países, a exemplo da Bélgica, Holanda e Alemanha, além de destacar seu tratamento no Brasil e em Portugal. Nesta apresentação de diferentes formas em que o tema é enfrentado nos países, destaca-se para a possibilidade de enfrentá-lo como uma necessidade de controle (Holanda e Bélgica) e outra com a necessidade de se punir as práticas tidas por excessivas (Brasil, Portugal, Alemanha). Diante da fixação do sistema brasileiro em que se considera a eutanásia um crime, demonstrase como o tema ainda é pouco discutido nos tribunais, havendo uma falta de transparência por parte dos organismos médicos e hospitais sobre procedimentos em que se detecta a pratica de eutanásia, tornando-a uma pratica comum e sem controle no Brasil.
Palavras – Chaves: Eutanásia. Dignidade da Pessoa Humana. Direito Comparado.
1 INTRODUÇÃO A eutanásia consiste em um dos mais difíceis temas a serem enfrentados por um jurista, por envolver questões filosóficas, éticas, religiosas e, dentre as questões jurídicas, estar-se diante do direito à vida, e à dignidade da pessoa humana. Decisões acerca da vida e morte, de ordem existencial dificilmente são tratadas em normas abstratas, isto porque a particularidade de cada situação individual pode estar contemplada em uma norma de caráter abstrato aplicável para todos, tanto que até a presente data, tem-se inúmeros casos que fogem às regras, tais situações tiveram que ser solucionadas pelos tribunais de cada país. Ademais, devido às questões religiosas, éticas, e filosóficas estarem ligadas ao tema em que se pretende criar norma penal, dificuldades são detectadas em cada . Juíza de Direito Titular da 2ª Vara Cível do Termo Judiciário de São José de Ribamar, Comarca da Ilha de São Luís. Doutoranda e Mestranda em Ciências Jurídicas, Universidade Autónoma de Lisboa. Especialista em Direito Notarial e Registral Imobiliário pela Universidade Anhenguera. Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Mackenzie e Especialista em Direito Tributário pelo Centro Universitário. MBA em Poder Judicário pela Fundação Getúlio Vargas – FGV. Email: ticymaciel@hotmail.com. *
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situação posta em análise, não havendo consenso sobre o aspecto jurídico-penal. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL O objeto do presente artigo consiste em comparar como a eutanásia é tratada em restamnormas dúvidasdequanto ao da caráter deeutanásica controle popular diretoque e eficaz países queNão adotaram controle prática e em países adotaram o da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas sistema repressivo, nos quais a eutanásia constitui crime. dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo Inicialmente, e descarte, cabe diante do historicamente crescimento vertiginoso e multipolarizado situar o tema, eis que este traz fundamento das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão em na tribos teórico ao que se vai defender. Assim, vale lembrar que a eutanásia já acontecia propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização indígenas, quando uma obrigação do filho comà oconservação pai idoso dedoo fazer “adormecer desta possibilidade de atuação cidadã compara vistas patrimônio suave e definitivamente”. ambiental brasileiro. No séculonaXX, mas aprecisamente em 1920,e Karl Binding AlfredaoHoche, Segue-se, análise princípio de doutrina legislação, no etocante professores direito penal ética médica escreveram a criticada obra “Autorização polo ativo dadedemanda numaeleitura da CRFB/88 observados os deveres comunais do da proteção dodameio tem legitimidade para que propor uma ação aniquilamento vida ambiente, indigna dequem ser vivida”, na qual afirmam o suicídio não pode popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei Ação vida. ser punido, porque é a expressão1 da soberania que o homem tem sobre suadeprópria Popular – lei nº4.717/65) a contundência quandodaem suana extensão defineeuropeia o Referida(LAP obra serviu de instrumento para o nascimento ideia comunidade que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este de que existe nãonão merece ser vividapela e, portanto, pode ser eliminada sendo a dispositivo servida tidoque como recepcionado vigente ordem constitucional. eutanásia um com favor esse e, logo, não passível punida.majoritária entende, como Comungada ponto de vista,deaser doutrina expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Binding, vidas humanas perdemeadeveres, qualidade serem um Meirelles,Para que em sínteseexistem correspondem-se a ideiaque de direitos ipsodefacto, bem jurídico, que a sua continuidade a sociedade para a de pessoa perde o apenas haveriasendo legitimidade genuína de pleitopara quando o direitoepolítico eleger valor, surgindoa um a figura da vida sem valor, aqueles que têm doença ou ferimentos e que corresponder de fiscalizar. tenham condição de expressar sua vontade, devem fazê-lo, optando pela morte. Mas e os obstinações, fica claro, incuráveisSem que maiores não são capazes de exprimir suas permissa vontades?vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88,Em em1922, seu bojo, dirigência de ações Estadoepara prover, dois traz anosaapós a publicação dopositivas estudo dedo Binding Hoche, o governo dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo da Rússia determina a morte de 117 crianças portadoras de uma doença rara e incurável. A mote constitucional garantia de existência de dignidade humana. É decisão é, segundo as da autoridades, “inspirada pormínima sentimento de humanidade com respeito frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido adeessas condenadaso ameio morrer depois deprecia de um cruel sofrimento” (ROXIN,o 2000, que, crianças quando lesionado, ambiente de forma consequencial p.9-38). mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! A obra ao “Autorização do aniquilamento vida indigna de que ser vivida” Sendo fim e ao cabo, tal restrição da aversa à diretriz o texto traz o conceito de vidanos semdá, valor e, portanto, sem proteção jurídica. Tal conceito foi transportado constitucional dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de pelo Governo como base do programa Ação T4, em relação ao à vida de doentes cidadania que do nãoReich é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente se tratar de tutelaincuráveis. de matériaNo ambiental. Uma constituição a nossa, pautada em e da mentais entanto, tal programa geroucomo tamanho protesto da igreja uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos comunidade que durou somente um ano e onze meses, nunca foi dada forma legal, mas eainda conceitos marginalizadores odeprograma primeirade dimensão sustentar bojo mentais o assim extraoficialmente eutanásiaaovitimou 275em milseu doentes reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares e físicos incuráveis (ROXIN, 2000, p.9-38). Esta concepção está fora da ideia de eutanásia, trata-se muito mais de matar, no
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos interesse coletividade, pessoas capazes com vontade viver, mas para queingressofram de ao patrimônioda da União, do Distrito Federal, dos Estados, doseMunicípios[...] § 3º A de prova da cidadania, doenças incuráveis. Ocorre que os sociais nacionalistas so em juízo,mentais será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. praticaram além de tudo
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o que já foi proposto por qualquer pessoa, por meio de um decreto confidencial. Toda essa celeuma gerou ainda mais perturbação na discussão do tema, um receio da comunidade jurídica quanto à legalização da eutanásia, haja vista essas nefastas experiências e a forma como a norma pode vir a ser utilizada. Por outro lado, a criminalização não parece ser a solução, já que, mesmo assim a eutanásia ocorre e pode vir a punir pessoas dentro de situações que não parecem de todo justas ante a gravidade da doença o grande sofrimento que esta venha impôr à pessoa, bem como a afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana, dentro de um ambiente de consentimento. 1.2 CONCEITO DE EUTANÁSIA, ORTOTANÁSIA e DISTANÁSIA Do ponto de vista etimológico, a palavra eutanásia significa boa morte ou morte sem dor, proveniente do termo grego “eu” que significa “bom” e thanatos, que consiste em “morte”. A eutanásia, assim, seria a ação ou omissão que gera a morte de um indivíduo ainda que seja com o fim de retirar-lhe do sofrimento. (BARBAS, 2009, p .81). Para Iberê Anselmo Garcia (2007, p.254), a eutanásia seria as diversas práticas de abreviação da vida de um doente por motivos humanitários. Luís Roberto Barroso (2015) já conceitua a eutanásia dizendo ser a ação médica intencional de apressar ou provocar a morte – com exclusiva finalidade benevolente de pessoa que se envolve em situação considerada irreversível e incurável, consoante os padrões médicos vigentes, e que padeça de intensos sofrimentos físicos e psíquicos. Este último conceito, no entanto, está restrito à atividade médica realizada em pacientes terminais cuja morte é inevitável, excluindo-se as situações da eutanásia passiva, consistente na omissão indireta sem intenção de provocar morte, razão pela qual os dois primeiros conceitos mais amplos são melhores para definição da eutanásia. Segundo a professora Stela Barbas (2009, p.81), por eutanásia entende-se a ação ou omissão que provoca a morte de um ser humano, embora com o intuito de lhe retirar o sofrimento. Por outro lado, continua a doutora Stela Barbas (2009, p.81), a distanásia consiste no adiamento do momento da morte de um doente que se encontra em fase terminal, através do recurso a tratamentos desproporcionais, escusados e supérfluos para a sua cura. Essa prorrogação do tempo de vida pode ser inclusive obtida por meio de muito sofrimento. É, ainda segundo Stela Barbas, a obstinação terapêutica. Tem-se, ainda, o conceito dado por Claus Roxin (2000, p.9-38), segundo o qual eutanásia é a ajuda prestada a uma pessoa gravemente doente, a seu pedido ou, pelo Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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menos, em consideração a sua vontade presumida, no intuito de lhe possibilitar uma morte 5compatível AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL com sua concepção de dignidade humana. Não restam dúvidas quanto caráter de controle popular direto e eficaz O prestigiado penalista aindaaofaz a distinção entre eutanásia em sentido amplo e da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas eutanásia em sentido estrito, esta última ocorre quando a ajuda prestada após o início do dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, processo nos casos quecrescimento a morte, comvertiginoso ou sem ajuda, iminente. Em sentido consumo dee morte, descarte, dianteemdo e émultipolarizado amplo, seria a eutanásia quando se contribui parada a morte de uma pessoa que, apesar das agressões sistemáticas ao meio ambiente, legitimidade do cidadão na de poder viver da mais tempo, – real ou presumidamente – pôr na fimpublicização à sua vida, já tida propositura ação, para pretende a ocupação do polo passivo e, sobretudo, desta de causa atuação comcausado vistas àpela conservação como possibilidade insuportável por do cidadã sofrimento doença. do patrimônio ambiental brasileiro. Por fim, destacou Roxin (2000, p.9-38) que fora deste conceito está o abandono na interrupção análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante do doenteSegue-se, à morte, por ou ausência de tratamento, estes casos seriamaoaqueles polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais mencionados que perturbam a discussão do tema, porquanto prática chamada por da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação eutanásia, distante do seutextualmente fundamentologo verdadeiro. popular? Émas possível destacar nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão o Outra classificação dada por Claus Roxin (2000, p.9-38) foi adefine de dividir a que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este eutanásia em cinco grupos, quais sejam: a eutanásia pura, eutanásia indireta, eutanásia dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. passiva,a eutanásia ativaponto e a eutanásia Na majoritária primeira, ministram-se os meios Comungada com esse de vista, precoce. a doutrina entende, como lenitivos não possuem o efeito de diminuir o tempo de vida; na segunda,Jr., são aplicadas expresso que na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Hely Meirelles, que em síntese de direitos deveres, ipso facto, da medidas lenitivas sobre ocorrespondem-se doente, apesar adeideia poderem elas eantecipar a ocorrência apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger morte; a terceira hipótese ocorre quando uma pessoa de confiança, em regra médico ou corresponder a um fiscalizar. seus ajudantes, masdetambém pode ser um parente, se omite em prolongar a vida que se aproximaSem do fim. É o caso de renunciar a umapermissa cirurgia ou a um que tratamento intensivo, maiores obstinações, fica claro, vaenia, existe uma capaz de incongruência prolongar a vida da pessoa. quarto casoestendida seria a morte dada a alguém relevante normativa comOtoda análise até aqui, visto que a que está a morrer estadeúltima geralmente por lei. E o quinto CRFB/88, emou seugravemente bojo, traz adoente, dirigência açõesépositivas do punida Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo caso seria o deixar morrer recém-nascidos gravemente deformados. Ocorre que este mote da eutanásia, garantia de mínima denão dignidade humana. segundo É últimoconstitucional não é bem uma já existência que o recém-nascido possui vontade, frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido entendimento de Claus Roxin (2000, p. 9-38). de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial todosser osvoluntária, sujeitos doainda, ordenamento Todos! A eutanásiadepode quando jurídico. há o consentimento expresso e informado e não voluntária, quando não há o consentimento da pessoa. Já a ortotanásia Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto significa, etimologicamente,”morte,correta”, do grego que de significa constitucional nos dá, dada a impossibilidadeproveniente clara de restrição do orto, conceito “correta,” thanatus significa a morte natural, cidadania eque não é que sinônima de “morte”. cidadaniaPortanto, eleitoral,seria especialmente ao seo que tratarestá em causa é a redução ou interrupção tratamentos inúteis e desproporcionados de tutela de matéria ambiental. de Uma constituição como a nossa, pautadadestinados em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos a prolongar a vida de um doente terminal para além do que seria natural. A ortotanásia, eportanto, conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em natural seu bojodeo morte ocorre somente quando já se está em curso o processo reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares (BARBAS, 2009, p.90). De qualquer forma, denota-se que, tanto a ortotanásia quando a distanásia
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será partedebelar legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos busca apresentam soluções para a morte. No entanto, enquanto a ortotanásia ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresuma solução confortável e possível, certaque qualidade de vida do doente. A distanásia so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou comcom documento a ele corresponda.
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fomenta a prolongação da vida a qualquer custo. Em outras palavras, e para melhor compreensão, a vida com qualidade versus a vida em quantidade (BARBAS, 2009, p.90). Tem-se, ainda, o suicídio assistido que consiste no ato de tirar a própria vida com auxílio ou assistência de um terceiro, o ato do terceiro seria colaborativo, como dar informações, promover as condições necessárias para realização do evento morte. 1.3 DIREITO COMPARADO 1.3.1 Bélgica Na Bélgica, a eutanásia é permitida desde 2002 para os adultos. Em 2014, a eutanásia foi estendida às crianças. Na legislação belga, no procedimento de eutanásia deve existir a “vontade deliberada e repetida” do paciente, podendo haver juízo de retratação, a qualquer momento. O paciente deve estar com doença irreversível, grave e incurável e ter sofrimentos físicos e psíquicos. A eutanásia é solicitada pelo paciente por meio de petição, por escrito. O paciente pode deixar sua vontade expressa e por escrito designando um representante que será seu interlocutor junto ao médico. Este termo de consentimento tem validade por cinco anos, sendo extremamente importante para os casos de incapacidade. O médico tem a obrigação legal de informar o paciente sobre seu prognóstico, devendo consultar outro médico especialista para confirmação do caráter irreversível. A vontade antecipada do paciente não vincula o médico, é a chamada objeção de consciência. Neste ponto, devemos destacar o que diz a resolução CFM 1.995/2012 brasileira que diz que o médico deve levar em consideração as diretivas antecipadas de vontade do paciente, sem, contudo, descuidar do caráter irreversível da situação, como ocorre na Bélgica. Após a realização do procedimento, o médico deve notificar a comissão estatal de controle e avaliação da eutanásia (FCEC). Na Bélgica, são registrados por ano 1.500 mortes em razão de eutanásia. Recentemente, a lei que permite a eutanásia foi estendida para crianças, não houve limite de idade, dizendo a lei somente que a criança precisa ter discernimento. Da mesma forma que ocorre com os adultos, a doença da criança deve ser irreversível, deve haver o sofrimento físico. Está previsto uma avaliação psicológica e psiquiátrica para verificar a capacidade de discernimento e, por último, deve haver o consentimento paterno. O prazo entre o pedido e a execução da eutanásia é de, no mínimo, um mês. Como essa extensão legal é recente, ainda não se tem uma avaliação das
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consequências desta, contudo, parece-me perigosa a ideia de “discernimento” em 5crianças AÇÃOde POPULAR DIFUSO DEoTUTELA AMBIENTAL tenra idade.COMO Parece MEIO difícil diferenciar-se que se trata de real discernimento pessoal deNão umarestam criança ou o que seria fruto de influências parentais mesmo religiosas dúvidas quanto ao caráter de controle popular ou direto e eficaz temporárias. A no maturidade, é bem verdade, chega Permanecem, em tempo diferente cada ser da ação popular controle dos atos administrativos. contudo,para certas humano, mas admitir-se maturidade suficiente em criança a permitir uma decisão dúvidas quando se trata haver em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, do crescimento vertiginoso e multipolarizado desta natureza é perigosadiante e extremada, até mesmo porque o sistema belga ainda apresenta das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade necessidade de melhorias e, como todo processo, existem falhas. do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade atuação cidadãa com vistas à conservação Em 2004, de a FCEC sugeriu criação da LEIF – Fórum do de patrimônio Informação para ambiental brasileiro. o término da vida, um programa com especialistas em cuidados paliativos. O objetivo teria sido criar um serviço que poderia ser referência para os profissionais da saúde Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao especializados em cuidados paliativos e eutanásia, promovendo o aumento de polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais conhecimento médicos interessados por meio de treinamentos nestauma área ação da saúde. da proteção dodos meio ambiente, quem tem legitimidade para propor popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Contudo, nem tudo é1 só elogios, apesar de terema sua FCEC aumentado Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando extensão define em o oito anos comunicações de que práticas de eleitoral eutanásias saúde. este No que se que éas cidadania, ao trazer o título é apelos provaprofissionais de cidadania,da devendo refere a seu próprio e controle institucional, relatórios não fornecem dispositivo ser tido funcionamento como não recepcionado pela vigente seus ordem constitucional. Comungada comcontribuam esse pontocom de ovista, a doutrina majoritária como ao informações que desenvolvimento legislativo,entende, nem dá feedback expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely profissional médico, bem como não contribui com informação para o público em geral Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, e para as políticas de controle sobre a Comissão – FCEC (ADAMS; WEUERS, 2015, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger p.121-139). corresponder a um de fiscalizar. Vale ainda ressaltar que afica instituição FCEC, vaenia, infelizmente, não uma tem dado Sem maiores obstinações, claro, permissa que existe indicação específica quenormativa estimulecom a consulta aos estendida especialistas da LEIF quando relevante incongruência toda análise até aqui, visto que a da intenção prática da eutanásia. Ou seja,dea ações Comissão que tem por razão existência a CRFB/88,deem seu bojo, traz a dirigência positivas do Estado paradeprover, dentre muitos, o meio ambiente elemento compositor de um complexo produção de transparência quando como da prática de eutanásia, tem demonstrado ter falta de mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade transparência, sendo esta essencial para estabelecer nos profissionais humana. da saúde É o senso frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de responsabilidade para ter um comportamento ético nesta situação e reportar os casos de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o àmínimo Comissão. Todas essas informações dos estudos de Maurice existencial de todos os sujeitossão dofruto ordenamento jurídico. Todos!Adams e Heleen Weyers (2015). Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar 2.2. Holanda de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, os horizontes doseutanásias, direitos que A Holanda tem experiência de maisexpande de 30 anos de prática de eforam conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu o são realizadas devido a autorizações judiciais. A eutanásia e o suicídio bojo assistido reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares permitidos por lei desde 2002. Neste país, o legislador concluiu que os meios tradicionais de proteção da vida através de uma rigorosa proibição penal da eutanásia não impedem os médicos de acabarem com vida e,para por isso,a anulação criaram legaisdepara incentivar 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será partealegítima pleitear ou mecanismos a declaração de nulidade atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresos médicos a submeter a prática da eutanásia a uma supervisão e controle externo. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Os requisitos legais são parecidos com os apresentados acima quando falou-se sobre o tratamento jurídico na Bélgica, com algumas poucas diferenças, até porque a legislação belga inspirou-se muito na holandesa. Na Holanda, o controle da eutanásia é feito por comissões, compostas por juristas e médicos especialistas em ética para verificação se os requisitos necessários estão presentes ao caso. Na Holanda, os menores entre 12 e 16 anos podem recorrer à eutanásia com o consentimento dos pais. Não é demais acrescentar que, na Holanda, existem clínicas particulares que realizam o procedimento de eutanásia, além de serviços em domicílio. Um dos requisitos no país em comento é que o peticionante tem que residir na Holanda. Interessante notar que, em 1984, o Conselho da Associação Médica posicionouse no sentido de que a eutanásia consistia em um fato na prática médica e que os profissionais, como um todo, deveriam buscar uma solução aceitável para o problema. Para o conselho, a eutanásia deveria ser uma opção em alguns casos. Na verdade, entendeu-se que o conflito estava entre a obrigação do médico de proteger a vida e a obrigação do médico de aliviar o sofrimento de seu paciente. Em algumas situações, o conflito de deveres leva o profissional a escolher um dos deveres, mesmo que isto signifique fazer algo que está proibido por lei. Diante deste quadro, iniciaram-se os requerimentos aos médicos para análise dos casos aos quais lhes era exigida uma decisão. Isso só ocorre porque aos médicos cabe a compreensão de que assim não seriam processados. Assim, a partir de 1987, iniciouse a confecção de normas sobre eutanásias criadas a partir da interface entre a profissão médica e as decisões das Cortes Judiciais Holandesas. Desse movimento, surgiu, em 2002, a legislação que codificou os arranjos judiciais que criaram certas condições para possibilitar o término da vida por médicos na Holanda. As condições são: o pedido voluntário do paciente; a condição de sofrimento insuportável ou sem perspectiva de melhora; médico e paciente convencidos de que não há alternativa razoável para a situação do paciente; o médico deve consultar, pelo menos, outro médico que deve ver o paciente ou dar uma opinião por escrito sobre a situação do paciente; o médico realiza a eutanásia ou providencia assistência ao suicídio com atenção e cuidados médicos. 2.3 Análise do sistema holandês e belga O sistema de controle belga e holandês, a uma primeira impressão, pode parecer que não denota muita pressão, em face da “ausência” de uma sanção dos médicos, já que, dificilmente, há casos em que se chega a processar o médico. No entanto, a obrigação legal de informar consiste em uma forma de controle, já que será reportado o comportamento Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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tomado. O sistema de relatório obrigatório tanto pode induzir os médicos a não praticarem 5quando AÇÃOasPOPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL regras não permitirem quanto levar à prática adequada e legal da eutanásia. Não restam quanto caráter de controle popular direto e eficaz Além disso,dúvidas o uso cada vezao mais frequente de consultores treinados não só é da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas uma forma avançada de supervisão e controle como também forma institucionalizada dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, de transmitir relevantes aos médicos.vertiginoso Esse sistemaedemultipolarizado controle e supervisão consumo e informações descarte, diante do crescimento parece ser maissistemáticas eficaz do queaoum sistema concentrado em encontrar das agressões meio ambiente, da legitimidade do alguém cidadãopara na punir naqueles poucos casos que transgressão que acontece eutanásia.na publicização propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e,nasobretudo, desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio principal característica do controle holandês de eutanásia é não focar no ambientalAbrasileiro. controle repressivo, mas sim no aumento da transparência da prática médica. E deixando na em análise a princípio doutrina e legislação, tocante ao “não o médicoSegue-se, saber que, casos dúbios, odecomportamento dele foinoconsiderado polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais aceitável.” Este sistema terá mais sucesso em alcançar alto nível de conformidade. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? ÉDiante possível destacar textualmente noseartigos iniciais da (2015, Lei de Ação desse quadro, Maurice logo Adams Heleen Eeyers p.121-139) 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o afirmam que o sistema de controle e supervisão belga e holandês não tem liberado que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este médicos de ser processos, ao não contrário, tem sujeitado os médicos uma análise de seus dispositivo tido como recepcionado pela vigente ordema constitucional. comportamentos, a umadeatenção à prática destes, mais Comungada comlevando esse ponto vista, do a público doutrinaquanto majoritária entende, comoque em qualquer outro país outros continentes. expresso na lição deeuropeu Rodolfoou dede Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, Interessante notar que, por de meio dosquando relatórios, denota-se quedemuitos apenas haveria legitimidade genuína pleito o direito político eleger casos considerados corresponder apelos um deespecialistas fiscalizar. como eutanásia, não são assim considerados pelos médicos que, ao serem perguntados como classificaria seu comportamento, não indicam Sem maioresquando obstinações, fica claro, permissa existemas umasim de a prática de eutanásia da aplicação de doses maisvaenia, altas deque morfina, relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a sedação paliativa para alívio da dor. Isso ocorreu em 99 % dos casos. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor um complexo Em 1997, a Associação Real Médica Holandesa, comdesuporte financeiro do mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. Ministério da Saúde, iniciou um programa experimental para providenciar umÉ corpo frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de conselheiros SCEN. Em 2002, de umforma relatório feito ao ministério de que, quando treinados. lesionado, Nascia o meiooambiente deprecia consequencial o da saúdeexistencial avaliou odeprograma como essencial porque jurídico. contribuiTodos! com a qualidade do mínimo todos os sujeitos do ordenamento cuidado conectado à eutanásia. O comitê entendeu que, graças ao SCEN, a qualidade da Sendo ao fim e destes ao cabo, tal restrição aversa à diretriz o médicos texto de consultoria e os relatórios melhoraram muito quando levadosque pelos constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de família. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela Uma de matéria ambiental. Uma das constituição a nossa, pautada emdo que das maiores vantagens comissõescomo consiste na transparência uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos estes fazem. Antes de 1998, os relatórios a respeito das decisões tomadasdireitos ficavam nas emãos conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o das autoridades, praticamente nada vinha a público sobre o que faziam, como e reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares por que faziam. Os relatórios anuais são minas de informações sobre a qualidade dos procedimentos e quantidades. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos 2.4patrimônio Brevíssimo estudo acerca Tribunal§ Europeu Direitos Humanos ao da União, do Distrito Federal,da dos posição Estados, dosdo Municípios[...] 3º A prova da de cidadania, para ingresnos defeita eutanásia queouatuou so emcasos juízo, será com o títuloem eleitoral, com documento que a ele corresponda.
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Em 2002, O TEDH decidiu o caso Diane Pretty (pessoa acometida de grave doença degenerativa e incurável, estando paralítica e pleiteante que o marido auxiliasse em seu ato suicida), entendendo que o art. 2º, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, protege o direito à vida, não podendo este direito ser interpretado como direito oposto, ou seja, direito de morrer com ajuda de terceiros em casos de sofrimento e mesmo com o consentimento. O TEDH negou a Diane Pretty o pedido de imunidade, confirmando assim a decisão do Reino Unido (ARAÚJO, 2015. p.215-244). Nos argumentos utilizados, o TEDH diz que a proibição à tortura e aos maus tratos, prevista no art. 3º da CEDH, não pode ser interpretada, de forma que o Estado seja obrigado a interromper uma vida, simplesmente por esta pessoa estar acometida de doença grave que lhe traz sofrimento. Neste mesmo julgamento, a Corte Europeia, examinando o art. 47 que protege a vida privada, salienta que o comando também protege o direito a desenvolvimento da personalidade, entendendo que o Estado não pode usar o direito penal para fazer ingerência na vida privada do indivíduo.
Sem negar a extensão do direito à vida, previsto no art. 2º da Convenção, a Corte entendeu que o art. 8º deve ser interpretado segundo a noção de qualidade de vida. Assim, um fim de vida indigno e penoso é uma vulneração ao respeito à vida privada. Entretanto, pode existir ingerência de uma lei, sempre que esta for fruto de uma sociedade democrática. Ou seja, admite a possibilidade, mas afirma a necessidade de regulamentação legal.
Mais recentemente, em 2011, o TEDH, ao analisar o caso Hass Suiça, manteve o entendimento de 2002 do caso Pretty Reino Unido, e considera que o Estado tem o dever de proteger a vida, principalmente no caso de impedimento da formação de vontade. No caso, o cidadão suíço sofria há 20 anos de caso grave de bipolaridade, não obteve de nenhum médico prescrição de droga letal e os tribunais suíços negaram-lhe o direito de receber auxílio ao suicídio. Recentemente, em 14.05.2013, o TEDH analisou o caso Alda Gross Suíça. Este é o caso de Alda, uma idosa de 82 anos, que buscou o suicídio assistido pelo fato de não mais suportar o sofrimento da velhice, em razão do declínio de suas faculdades físicas e mentais, mas ela não conseguiu autorização, embora tivesse plena capacidade de exprimir sua vontade. Trata-se de uma pessoa em perfeita saúde que não queria mais viver.
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Neste caso, o TEDH decidiu: “não se deve forçar, prolongar a velhice ou vida 5em AÇÃO COMO MEIO DIFUSO físicas DE TUTELA AMBIENTAL estadoPOPULAR de extrema decadência das atividades e mentais avançadas que entram em conflito com as noções dominantes de autonomia e de identidade pessoal”. Decidiu o Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz TED quepopular é um dever dos Estados estabelecer normasPermanecem, legais completas e que certas a falta delas da ação no controle dos atos administrativos. contudo, ofende direito àsevida privada. dúvidasoquando trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Começamos, portanto, a vislumbrar mudanças significativas no entendimento das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na do TEDH nodatema eutanásia, admitindo aoe,direito à dignidade humana do que propositura ação, para a ocupação do peso polo maior passivo sobretudo, na publicização desta de atuação com vistas à conservação do patrimônio direitopossibilidade à vida, em casos em que acidadã vida levada demonstra um sofrimento psíquico e físico ambiental brasileiro. muito elevado, mesmo quando este sofrimento não advenha de uma doença terminal. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor umaalemão ação 2.5.proteção Brevíssimo comentário sobre o tratamento da eutanásia no direito popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Alemanha de hoje, a 1eutanásia ativa é indiscutível, casoextensão de punição, nosotermos PopularNa (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua define 1 trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este que é cidadania, ao do §216 do StGB . O dever de curar do médico, o tabu do homicídio, medos, lembrança dispositivo como não pela vigente ordem constitucional. do programaserdetido eutanásia, do recepcionado nazismo, constituem barreiras fortes a que se dê um Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como passo para a abertura disso como ocorre na Bélgica e na Holanda. Uma regulamentação expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely legislativa queem exigisse fundamentaçãoa ideia documentada presençaipso de um segundo Meirelles, que sínteseuma correspondem-se de direitose ea deveres, facto, médico diminuiria as críticas.genuína de pleito quando o direito político de eleger apenas haveria legitimidade corresponder a um de fiscalizar. Em novembro de 1996, o Tribunal Alemão decidiu da seguinte forma sobre a matéria:Sem “Uma medicação lenitiva, do ponto de vista terapêutico, maiores obstinações, ficanecessária claro, permissa vaenia, que existe uma em correspondência à vontade declaradacom ou presumida doestendida paciente, até nãoaqui, deixavisto de ser permitida relevante incongruência normativa toda análise que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, em caso de morte do paciente, se a aceleração deste resultado surgir como efeito colateral dentre muitos, mas o meio elemento compositor de dos um Médicos complexodecidiu não almejado, cujoambiente risco foi como assumido”. A Câmara Federal mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. na mesma linha: “No caso de pessoas que estão a morrer, o alívio da dor podeÉser tão frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido importante, que seja permitido aceitar uma diminuição possivelmente inevitável”. de que, quando lesionado, o meio ambiente depreciadadevida forma consequencial o De acordo com outradeopinião, homicídio, mas este seriaTodos! impunível em virtude mínimo existencial todos oshaveria sujeitoso do ordenamento jurídico. do consentimento ou do consentimento presumido. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto O Bundesgerichtshoft deixou a questãoclara em aberto, havendo umadeterceira constitucional nos dá, dada a impossibilidade de restrição do ainda conceito opinião deque que não ocorreria um homicídio punível. E se o especialmente paciente não puder declarar cidadania é sinônima de cidadania eleitoral, ao semais tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em sua vontade, defendem que vale a vontade presumida, sendo esta a decisão na qual uma realidade comunitária diversificada, expande os horizontes dos direitos se leva em consideração nãoe só suas anteriores declarações, como também o grau de eproximidade conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o da morte, a probabilidade e a medida da redução da vida, bem como a reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares intensidade dos sofrimentos a serem suportados. Na eutanásia indireta, resta o problema sobre sua permissão nos casos de grave
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres1. StGB – feita Homicídio pedido. {1} – ou Secom o autor foi determinado realizar o homicídio por pedido expresso e sério so §216º em juízo, será com o atítulo eleitoral, documento que a eleacorresponda. de quem foi morto, será imposta pena privativa de liberdade de seis meses a cinco anos. (2) A tentativa é punível. “O leitor.
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dor do paciente ou estados análogos de grave sofrimento como sufocamentos. Como se denota, a Alemanha adota um sistema repressivo, com várias interpretações, de acordo com o caso, nos quais o consentimento sempre é levado em consideração e no qual a discussão parece ser presente no meio jurídico e no meio médico. 3 EUTANÁSIA, DISTANÁSIA E ORTOTANÁSIA NA ORDEM JURÍDICA PORTUGUESA Os casos de eutanásia no Código Penal português são enfrentados aplicandose o tipo penal do homicídio privilegiado, homicídio em geral, incitamento, ajuda ao suicídio ou homicídio a pedido da vítima. No primeiro caso, homicídio privilegiado, previsto no art. 133 do CP português, a eutanásia é compreendida como homicídio praticado pelo agente, estando este dominado por “compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral que diminua sensivelmente a sua culpa”. Segundo esta norma, denota-se que não está prevista a necessidade de consentimento da vítima, ou seja, mesmo que haja consentimento do doente, a eutanásia é crime em Portugal, subsumindo-se ao tipo penal do homicídio privilegiado. A base legal desta norma consiste a tutela do bem jurídico - vida humana. Acrescente-se que inaplicável o disposto no art. 38, do CP, que trata que o consentimento só exclui a ilicitude do fato quando se reportar a interesses jurídicos disponíveis, o que não se aplica ao caso vida humana. Entretanto, existe a atenuação especial da pena prevista no art. 72º, do CP2. No sistema jurídico penal português, os casos de eutanásia em que está ausente o fato do autor estar dominado pela compaixão ou piedade referida no art. 133, aplicase o tipo do homicídio previsto no art. 131. Existe também a possibilidade do próprio doente promover a sua morte com ajuda de um partícipe, estar-se–á, neste caso, diante do incitamento ao suicídio. O incitamento ocorre quando o terceiro incentiva, induz, compele ou convence a vítima à prática do delito influenciando na formação da vontade de alguém. A segunda modalidade está a denotar a ajuda material à prática de suicídio. No caso da conduta 2. Neste estudo comparado, importante salientar que a eutanásia, pela legislação brasileira, é tratada como homicídio simples previsto no art. 121 do CP, qualquer que seja a eutanásia, ou seja,na forma ativa, passiva ou a ortotanásia quando praticada como crime comissivo por omissão. Ressalte-se que ao aceitar esse entendimento, entende-se o médico como garante da vida do seu paciente, nos termos do art. 13, §2º., o que torna o não evitara morte, um crime comissivo por omissão. Trataremos melhor do tema em capítulo específico.
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visando à morte, quando praticada por terceiro, mas a pedido da vítima, responde o 5terceiro AÇÃOpor POPULAR MEIO DE termos TUTELA AMBIENTAL homicídio COMO e não auxílio aoDIFUSO suicídio, nos previstos no art. 134, do CP, posto queNão não restam é o próprio doente que pratica a ação ou a omissão, mas simeterceiro. dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, O chamado homicídio a pedido da vítima possui uma atenuação dacertas pena ainda dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, maior que o caso de homicídio privilegiado, dando ênfase ao elemento autonomia consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado da vontade, ao aspecto do consentimento. Se o doente voluntariamente das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da decidir legitimidade do cidadãoresignar-se na àpropositura sua situação renunciar meios quedolhe permitam o sofrimento, prolongando a da eação, para aaocupação polo passivo aliviar e, sobretudo, na publicização desta atuação que cidadã com respeitar vistas à aconservação do patrimônio agonia,possibilidade diz o sistemadeportuguês deve-se decisão tomada. ambiental brasileiro. O sistema penal português baseia tal entendimento na Constituição portuguesa na análise a princípio de doutrina e legislação, tocantee de ao culto, na qual seSegue-se, prevê o direito à liberdade, liberdade de consciência, deno religião polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais à reserva da intimidade da vida provada e familiar, à integridade pessoal, bem como no da proteção do meio ambiente, tem legitimidade para propor uma ação princípio da autonomia da vontadequem privada. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP – lei nesse nº4.717/65) contundência extensão define o da Também sentidoa rege o n.1, doquando art. 41,emdosuaCódigo Deontológico que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Ordem dos ser Médicos: “respeitar escrupulosamente as opções filosóficas dispositivo tido como não recepcionado pela vigente ordem religiosas, constitucional. ou ideológicascom e osesse interesses doente.” majoritária Nessa mesma seara, ocomo art. 18 da Comungada ponto legítimos de vista, do a doutrina entende, Declaração dos Direitos do Homem (1948), o Pacto Internacional expresso na Universal lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., das HelyNações Meirelles, queosemDireitos sínteseCivis correspondem-se a ideiaede direitos deveres, ipso facto, para Unidas sobre e Políticos (1966) o art. 8, daeConvenção Europeia apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger proteção dos direitos dos homens das liberdades fundamentais (1950). corresponder a um de fiscalizar. As razões que levam a pessoa a tomar a decisão pela morte com sofrimento obstinações, claro, permissa vaenia, quee existe umaque se podem serSem dasmaiores mais variadas, desde fica religiosas, éticas, psicológicas o respeito relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que deve à vontade da pessoa se deve ao fato de Direito não competir entrar nessaa seara CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, intima, mas tão osomente nos casoscomo em que não há compositor expressão dadevontade do indivíduo, dentre muitos, meio ambiente elemento um complexo sendo-lhe imposta. Ao da ortotanásia, professora Stela BarbasÉ(2009, mote constitucional daadentrar garantiaaodetema existência mínimaade dignidade humana. p.90) importante epistemológico o seguinte: frágil faz sustentar que acorte cidadania se resume àdizendo comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! posição que a de que a “solução”, ou talvez dizendo, o Sendo ao fim eA minha ao cabo, tal é restrição aversa à diretriz quemelhor o texto meioapara atingir o fim desejado nem pela eutanásia ede nem pela constitucional nos dá, dada impossibilidade clara não de passa restrição do conceito distanásia. e salvoeleitoral, o devido respeito por quem defende contraria, cidadania que não é sinônima de Julgo cidadania especialmente ao se tese tratar de tutela de matéria ambiental. Uma éconstituição como eadesde nossa, quando a morte inevitável e iminente quepautada respeitadaem a vontade uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos do doente ou do seu representante legal, o recurso aos cuidados paliativos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o destinados a diminuir o sofrimento mesmo que impliquem o risco de reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares encurtar a vida do doente e a renúncia a procedimentos desproporcionados ou escusados é a forma de assegurar dignidade no morrer.
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Assim, apesar de Portugal possuir um sistema repressivo de encarar a eutanásia, a própria leitura constitucional tem permitido, com base na garantia de dignidade ao morrer e no princípio do consentimento informado, permitir-se a escolha pelo não uso de recursos destinados ao prolongamento da vida com extremo sofrimento, isto quando inevitável a morte. 3.1. Princípio da autonomia privada e consentimento informado É certo afirmar que a prática da ortotanásia está protegida pelo princípio da autonomia da vontade do doente e pela exigência do consentimento informado. Por autonomia privada, entende-se o poder de autodeterminação dentro dos limites legais nas relações com as outras pessoas. Ao conceber-se a pessoa como protagonista de suas decisões e responsável pelo seu próprio destino, concede-se à pessoa dignidade humana em seu sentido mais amplo e a dignidade constitui fundamento da Carta da República Portuguesa, expressão maior dos direitos fundamentais. Alexandre de Moraes (2007, p.46-47) preconiza: A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável pela própria vida e traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo um mínimo vulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais , mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.
A dignidade da pessoa humana traz três preceitos ínsitos, quais sejam, o respeito à integridade física e psíquica do individuo, a consideração pelos pressupostos mínimos para exercício da vida e o respeito pelas condições mínimas de liberdade e convivência social (MORAES, 2006, p.12). Maria Celina Bodin de Moraes (1991, p.4) acrescenta ao tema importante entendimento que merece ser aqui replicado: Problema maior do Direito tem sido, justamente, o de estabelecer um compromisso aceitável entre os valores fundamentais comuns, capazes de fornecer os enquadramentos éticos e morais nos quais as leis se inspiram, e espaços de liberdade, os mais amplos possíveis, de modo a permitir a cada um a escolha de seus atos e a condução de sua vida em particular, de sua trajetória individual, de seu projeto de vida.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Dentro do contexto do princípio da liberdade individual consubstanciado na Não de restam dúvidas quanto escolhas, ao carátersem de controle populardedireto e eficaz possibilidade realizar as próprias interferências qualquer natureza, da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas permitindo-se que cada um siga com seu projeto de vida com melhor lhe convier em dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, uma perspectiva de privacidade exercíciovertiginoso da vida privada, existe o direito de consumo e descarte, diante doe livre crescimento e multipolarizado exercer esta liberdade ciente das múltiplas possibilidades existentes,douma explanação das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade cidadão na das possibilidades tratamento. propositura da disponíveis ação, para a de ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio consegue-se um consentimento genuíno, com concordância legítima ambientalAssim, brasileiro. da situação e os resultados que dela advirão. O princípio da decisão informada ou Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao sobre consentimento informado impõe aos médicos e cuidadores os esclarecimentos polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres tratamentos, cirurgias, medicações e seus efeitos e possibilidades e êxito doscomunais procedimentos da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma açãotodo o indicados, aos quais deve o paciente ir voluntariamente, podendo suspender popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação tratamento ou procedimento, no1 exercício de suaquando autonomia. Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de devendo este O consentimento informado encontra-se no cidadania, capítulo II, da Convenção, dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. sobre os Direitos e davista, Biomedicina, 4 de abril entende, de 1997, como no qual se Comungada com do esseHomem ponto de a doutrinademajoritária consagra a necessidade de qualquer intervenção “noHumberto domínio Theodoro da saúde”Jr., serHely precedida expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, de um consentimento informado e esclarecido, comoe ser respeitado o possível Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideiaassim de direitos deveres, ipso facto, apenas haveria3 legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger dissentimento. corresponder a um de fiscalizar. Pode-se fundamentar a proteção do consentimento informado também através Sem maiores obstinações, ficaart. claro, vaenia, existe uma da Constituição republicana portuguesa, 27 epermissa 25, o Código Penalque português, o Código relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a 4 Civil, no art. 340 e a Lei da Base da Saúde, no art. 70, art. 81, n. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido 3.2. Tratamento pelo sistema português de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o O tratamento a respeito do consentimento nojurídico. direito português mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento Todos! encontra-se 5 no art. 38 , n. 2 do Código Penal, comando que estabelece requisitos para a validade Sendo ao para fim fins e aodecabo, tal restrição aversaNeste à diretriz que ovimos texto que o do consentimento exclusão da ilicitude. comando, constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de SOBRE matéria ambiental. Uma constituição como[Ema linha] nossa, pautada em 3. CONVENÇÃO OS DIREITOS DO HOMEM E DA BIOMEDICINA. [Consult 10 dez 2015]. Disponível em: http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhregionais/convbiologiaNOVO.html. uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos 4. 340. 1. O acto lesivo dos direitos de de outrem é lícito, desde que este tenha lesão.seu 2. O bojo consentimento do e Art. conceitos marginalizadores primeira dimensão ao consentido sustentarnaem o lesado não exclui, porém, a ilicitude do acto, quando este for contrário a uma proibição legal ou aos bons costumes. 3. Temreconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares se por consentida a lesão, quando esta se deu no interesse do lesado e de acordo com a sua vontade presumível art. 70, art. 81, n. 1 e n. 2
5. Art. 38, do Código Penal Português: 2 - O consentimento pode ser expresso por qualquer meio que traduza uma vontade séria, livre esclarecida do titular do interesse pode ser livremente revogado até àlesivos execução do 1. Art. 1.º eQualquer cidadão será parte legítimajuridicamente para pleitear protegido, a anulaçãoeou a declaração de nulidade de atos facto. PORTUGAL, Decreto Lei n.ºFederal, 48 de 15dos de Estados, março dedos 1995, [Em linha] [Consult 17 mar 2016]. Disponível em: http:// ao patrimônio da União, do Distrito Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingreswww.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?artigo_id=109A0156&nid=109&tabela=leis&pagina=1&ficha=1&nvers so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. ao=#artigo.
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consentimento deve exprimir a vontade séria, livre e fundada em informações a respeito do que se procederá. O consentimento pode ser também presumido, expresso ou testemunhado. O Código Penal português segue a trilha do entendimento de que os bens jurídicos saúde e corpo são livremente disponíveis pelo seu titular, razão pela qual o consentimento exclui a ilicitude, com exceção de quando a situação contrarie os bons costumes. Quando dos crimes contra a integridade física inscritos nos artigos 143 e seguintes do CP, consta no n. 2, do art. 1496, devem ser considerados os motivos ou a finalidade que o agente possuía com a ação ou da vítima, bem como os meios empregados e a amplitude previsível da ofensa. Esses elementos serviriam para dimensionar o ataque aos bons costumes. As intervenções cirúrgicas devem ser feitas somente por médicos, com fins terapêuticos e segundo o protocolo médico. O art. 1567, do CP, prevê a necessidade de consentimento, sob pena do tratamento médico ser considerado crime contra a liberdade pessoal do paciente. Ou seja, entende o sistema português que o médico não pode ser responsabilizado se o paciente não concorda com a prática de distanásia, o prolongamento de sua vida por meio de tratamentos, medicamentos ou cirurgias, com sofrimento deste. Esta visão respeita o sistema constitucional posto que esta possui como princípio fundamental a dignidade da pessoa humana. Além deste princípio, a autonomia da vontade, a liberdade, o direito a integridade física, moral, o princípio da identidade individual, todos são respeitados na medida em que não se pune a ortotanásia e nem o dissentimento quanto à prática de distanásia. O consentimento informado foi a solução encontrada pelo sistema português para harmonizar as regras que visam proteger o valor da dignidade humana no momento da morte. (art. 24 e art. 1, 13, 7 e 26 da CF), isto porque a pessoa é a medida e o fim de todo direito. Poder de autodeterminação da própria vida, capacidade de gerir sua vida de acordo com sua liberdade e consciência, não só nos momentos da existência, mas nos derradeiros momentos da vida. Viver ou sobreviver a qualquer custo? A qualquer preço sem dignidade. 6. Art. 149, do Código Penal Português: 2 - Para decidir se a ofensa ao corpo ou à saúde contraria os bons costumes tomamse em conta, nomeadamente, os motivos e os fins do agente ou do ofendido, bem como os meios empregados e a amplitude previsível da ofensa. PORTUGAL, Decreto Lei n.º 48 de 15 de março de 1995, [Em linha] [Consult 17 mar 2016]. Disponível em: <http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?artigo_id=109A0156&nid=109&tabela=leis&pa gina=1&ficha=1&nversao=#artigo.> 7. As pessoas indicadas no artigo 150.º que, em vista das finalidades nele apontadas, realizarem intervenções ou tratamentos sem consentimento do paciente são punidas com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa. PORTUGAL, Decreto Lei n.º 48 de 15 de março de 1995,[Em linha] [Consult 17 mar 2016]. Disponível em:<http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_ mostra_articulado.php?artigo_id=109A0156&nid=109&tabela=leis&pagina=1&ficha=1&nversao=#artigo>.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL 4 ENQUADRAMENTO JURÍDICO DA EUTANÁSIA NO BRASIL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, sistema jurídico brasileiro, a eutanásia ativa, ou seja, quando consumo Em e princípio, descarte, pelo diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade cidadão na seu o agente pratica ato que abrevia a vida de pessoa a pedido deste edoa fim de aliviar propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização sofrimento, consiste em conduta descrita no tipo do homicídio descrito no art. 121, do desta possibilidade de atuação cidadã comsubsume-se vistas à conservação patrimônio CP. Neste mesmo enquadramento jurídico, a prática da do eutanásia passiva e a ambiental brasileiro. ortotanásia, já que crimes comissivos por omissão. Segundo este entendimento, o médico assume o Segue-se, papel de garante da vida de seu paciente nos termos do art.no 13,tocante §2º doao CP. na análise a princípio de doutrina e legislação, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Quanto à eutanásia indireta, aquela em é praticada mediante da proteção do meio ambiente, quem qual tem seja, legitimidade paraque propor uma ação apopular? aplicação de sedativo paratextualmente alívio do sofrimento em dose que da pode ao lento É possível destacar logo nos artigos iniciais Lei levar de Ação 1 desencadeamento morte é considerada atípica,quando por alguns argumento de que Popular (LAP – leidanº4.717/65) a contundência em sob sua oextensão define o esta que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este modalidade seria socialmente aceita. Assim, temos que no Brasil, a eutanásia, ortotanásia dispositivo tido como não penais recepcionado e o suicídio ser assistido são tipos previstospela nosvigente artigos ordem 121, §1ºconstitucional. e 122 do CP, sendo Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como que a eutanásia é tipificada como homicídio privilegiado. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles,Conforme que em síntese correspondem-se de direitos e deveres, ipsoofacto, exposição de motivosa ideia do Código Penal de 1940, homicídio apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger privilegiado prevê o motivo social ou moral, podendo ser entendido que a compaixão, corresponder a um de fiscalizar. ante o irremediável sofrimento da vítima esteja compreendido na noção de motivo social ou Sem moral.maiores A Resolução 1.805/2006 estabelece que “é permitido médico obstinações, fica claro, permissa vaenia, que ao existe umalimitar ou suspender procedimentos e tratamentos prolonguem vida dovisto doente relevante incongruência normativa com todaque análise estendidaaaté aqui, queem a fase CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, terminal, de enfermidade grave ou incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu dentre muitos,legal”. o meio ambiente elemento compositor um XXI, complexo representante O Código de como Ética médica dispõe, em seude inciso capítulo 1, mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É por sua vez, a seguinte dicção, in litteris: frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! XXI – Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará
diagnósticos e terapêuticos Sendo ao fim ea realização ao cabo,detalprocedimentos restrição aversa à diretriz que o desnecessários texto e propiciará aos pacientes clara sob sua todos cuidados de paliativos constitucional nos dá, dada a impossibilidade de atenção restrição doosconceito apropriados.” No citadoeleitoral, código, noespecialmente art. 41, existe norma veda que cidadania que não é sinônima de cidadania ao se que tratar o médico abrevie a vida do paciente, ainda que a pedido desteem ou de seu de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada representante legal, vedando, por conseguinte, a eutanásia. Interessante uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos notar que no parágrafo único do art. 41 acima citado, o Código e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo ode Ética nos humana casos de como doença titulares incurável e terminal, deve o médico reconhecimento da pessoaestabelece humanaque e não oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos seu representante ao patrimônio da União, do Distrito de Federal, dos Estados, doslegal. Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Esse comando proíbe também a distanásia e leva em consideração a vontade do paciente, criando a possibilidade de uma eutanásia passiva, por exemplo. No entanto, no parágrafo único do art. 41, estatui-se que nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnosticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal. Vê-se, claramente, que esse parágrafo único abre uma porta para a descriminalização da eutanásia passiva, proibindo a distanásia sem consentimento do paciente. A Res. 1.995/2012 dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade do paciente, determinando que “nas decisões sobre cuidados e tratamento de pacientes que se encontram incapazes de comunicar-se, ou de expressar de maneira livre e independente suas vontades, o médico levará em consideração suas diretivas antecipadas de vontade.” O Conselho Federal de Medicina, no art. 2º, da Lei 10.241/1999, estabelece os direitos dos usuários dos serviços de saúde do estado, dentre eles: VII – consentir ou recusar, de forma livre, voluntária e esclarecida, com adequada informação, procedimentos diagnósticos ou terapêuticos a serem nele realizados;
Recusar tratamento doloroso ou extraordinário para tentar prolongar a vida e optar pelo local de morte tornou-se direito do paciente por meio de resolução, avizinhando-se no sistema jurídico brasileiro a abertura já encontrada em países europeus. No entanto, em que pese essas disposições contidas em resoluções e códigos de éticas da categoria médica, o projeto do Código Penal de dezembro de 2012, na contramão dessas diretrizes, manteve a figura do homicídio privilegiado, do suicídio assistido, enquanto crimes para a eutanásia e figuras afins, criando, ainda, atipicidade penal para a ortotanásia, somente. Segue o texto para análise mais profunda: §6º - no âmbito dos cuidados paliativos aplicados a pessoa em estado terminal ou com doença grave irreversível, não há crime quando o agente deixar de fazer uso de meios extraordinários, desde que haja consentimento da pessoa ou, em sua impossibilidade, do cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão. §7º - A situação de morte iminente e inevitável ou de doença irreversível, no caso do parágrafo anterior, deve ser previamente atestada por dois médicos.
Assim, vimos que a legislação brasileira sobre a matéria ainda é muito tímida, permitindo que situações sejam apreciadas e enquadradas de forma injusta e sem levar em consideração o princípio da autonomia da vontade e o consentimento do paciente, afrontando princípios da dignidade da pessoa humana como o direito à vida digna, direito a uma morte digna, direito a ter respeitada sua crença religiosa, direito sobre sua própria vida. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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Na verdade, tem-se muito a avançar no tema, ainda, e as dúvidas e angústias dos 5profissionais AÇÃO POPULAR COMOquanto MEIOàsDIFUSO TUTELA AMBIENTAL do setor médico questõesDE éticas que envolvem o tema perduram sem que Não a legislação traga uma resposta a contento. Por meio do estudo do direito restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz comparado, pode-se denotardos queatos emadministrativos. alguns países que legalizaram contudo, a eutanásia, soluções da ação popular no controle Permanecem, certas interessantes foram encontradas, necessidade dedos passar pordeuma junta médica dúvidas quando se trata em uma como lógicaa desagregadora meios produção, consumo e descarte, diante do que crescimento para aprovação do procedimento se pretendevertiginoso e estudo see amultipolarizado situação do paciente das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão nae vida, permite que se realize o que este deseja, tudo para equilibrar os valores dignidade propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização ética e compaixão. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao 5 CONCLUSÃO polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meiorelatório ambiente, quem tem legitimidade para umadaação O presente apresenta o tema da eutanásia e opropor princípio dignidade popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação da pessoa humana e vem trazer,1 por meio do estudo comparado com o sistema adotado Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define pela Bélgica, Holanda, Alemanha, Portugal e Brasil, a compreensão de que oso países que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este adotam sistemas repressivos da recepcionado prática de eutanásia ou sistema de controle desta prática dispositivo ser tido como não pela vigente ordem constitucional. de acordo comcom sua esse história, cultura, crenças costumes. Comungada ponto de vista, a edoutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely o temacorrespondem-se mexe com o imaginário pessoas, que têm que lidar com Meirelles,De quefato, em síntese a ideia dedas direitos e deveres, ipso facto, questões filosóficas, religiosas, culturais e até aquando históriao direito para determinar forma como apenas haveria legitimidade genuína de pleito político dea eleger lidar com a questão. Alemanha, por exemplo, o exemplo trágico da Ação T4 fez corresponder a um de Na fiscalizar. com que o país adotasse o sistema repressivo, contudo a jurisprudência vem lidando de maiores obstinações, fica claro, isto permissa existe muito uma mais diferentesSem formas com cada caso apresentado, porquevaenia, a vida que apresenta relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a para diversidade do que as normas conseguem prever e isto foi apresentado no relatório CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, demonstrar a dificuldade enfrentadacomo pelo sistema repressivo quando do capítulo referente dentre muitos, o meio ambiente elemento compositor de um complexo ao sistema alemão. da garantia de existência mínima de dignidade humana. É mote constitucional frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Não muito diferente ocorreambiente com os países quedeadotaram o sistema de controle de que, quando lesionado, o meio deprecia forma consequencial o da eutanásia, com ade diferença que sedodiminuiu o tabujurídico. sobre oTodos! assunto, bem como a mínimo existencial todos osde sujeitos ordenamento tentativa dos médicos de encobrir a prática, já que esta foi aceita como prática médica ao fim e Para ao cabo, restrição aversa à diretriz que o de texto para alívioSendo do sofrimento. evitartal excessos, adotou vários instrumentos controle, constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de de como órgãos especiais, a exigência do consentimento da pessoa, a necessidade cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar acompanhamento do processo por dois médicos dentre outros e mesmo assim a batalha de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em para transparência da prática da eutanásia expande continua os umhorizontes desafio constante e cheio de uma arealidade comunitária e diversificada, dos direitos casos limitesmarginalizadores que colocam emde cheque entendimentos antes formados. Parabojo demonstrar e conceitos primeira dimensão ao sustentar em seu o isso, contém o relatório casos decididos Tribunal reconhecimento da pessoa humana e não pelo humana comoEuropeu titulares de Direitos Humanos e sua virada de entendimento recente. Ressaltou-se que, Bélgica e na aHolanda, há adepermissão dalesivos realização 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será partena legítima para pleitear anulação ou onde a declaração nulidade de atos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresdesta prática, deve-se obedecer alguns requisitos, como o dever de acompanhamento por so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
uma junta médica para aprovação do procedimento que se pretende, além da realização 192
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de um estudo para averiguar a situação do paciente. Tudo isso para garantir-se que tudo seja realizado dentro da busca pelo tênue equilíbrio dos valores dignidade e vida, ética e compaixão. Para que o procedimento seja realizado, é necessário ainda que a doença seja grave, irreversível e incurável importando em sofrimentos físicos e psíquicos. Ao longo dos anos de experiência da Bélgica e Holanda com o sistema de controle, estes concluem que o sistema repressivo e uma rigorosa proibição penal da eutanásia não impedem a pratica da eutanásia, motivo que os fizeram adotar e buscar o aperfeiçoamento, por meio de mecanismos legais do sistema de controle e, para tanto, incentivam os médicos a submetem a prática da eutanásia a uma supervisão e controle externo. Por outro lado, a jurisprudência alemã considera decisivo o direito à autodeterminação e, por isso, a vontade presumida do paciente. Concede-se a todos a oportunidade de transformar a sua concepção pessoal de um tratamento condizente com a dignidade humana na linha mestra de um tratamento médico, bastando uma disposição do paciente, formulada com clareza e renovada anualmente. Se o paciente não deixou por escrito sua disposição, sua vontade presumida devera ser procurada através de outros indícios. Se a situação permanecer incerta, Claus Roxin, discordando do BGH e de Merkel e Hoerster devem decidir-se em favor dos indícios mais fortes. Quanto aos países em que se detiveram mais o estudo a fim de entender a atual situação da eutanásia e o entendimento jurídico acerca do tema foram Portugal e Brasil. No primeiro, adotou-se um sistema repressivo, entretanto, já foi reconhecido que se o doente decidir voluntariamente resignar-se à sua situação e renunciar a meios que lhe permitam aliviar o sofrimento prolongado e a agonia, deve-se respeitar a decisão tomada. O sistema penal português baseia tal entendimento na Constituição Portuguesa na qual se prevê o direito à liberdade, liberdade de consciência, de religião e de culto, à reserva da intimidade da vida provada e familiar, à integridade pessoal, bem como no princípio da autonomia da vontade privada. O consentimento informado, segundo Stela Barbas, foi a solução encontrada pelo sistema português para harmonizar as regras que visam a proteger o valor dignidade humana no momento da morte. (art. 24 e art. 1, 13, 7 e 26 da CF), isto porque a pessoa é a medida e o fim de todo direito, harmonizando as regras de direito penal com a Constituição Portuguesa que prevê a dignidade humana como princípio estruturante e o poder de autodeterminação da própria vida, capacidade de gerir sua vida de acordo com sua liberdade e consciência, não só nos momentos da existência, mas nos derradeiros momentos da vida. No entanto, no Brasil, a matéria ainda é tratada de forma tímida e com muitas Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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disparidades, o que favorece decisões contraditórias no âmbito dos Tribunais, uma vez 5que, AÇÃO POPULAR COMO DIFUSO TUTELAdaAMBIENTAL na maioria das vezes, nãoMEIO há abertura paraDE o princípio autonomia da vontade e o consentimento do paciente, violando a sua dignidade e relegando situação Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular diretoa euma eficaz ainda mais vulnerável e de sofrimento. Além de colocarem os médicos em uma situação da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas de insegurança suas lógica dúvidasdesagregadora e angústias edos levando uma total falta de dúvidas quando aumentando se trata em uma meiosade produção, consumo e descarte, do crescimento vertiginoso e multipolarizado transparência quanto às diante corriqueiras e diárias práticas de eutanásia, principalmente nas das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na instituições de saúde ligas ao SUS. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade atuação cidadã com conservação patrimônio De todos osdepaíses estudados, ondevistas menosà se encontrou do material de pesquisa ambiental brasileiro. quanto a decisões judiciais sobre o tema foi no Brasil, bem como encontrou-se artigos onde se defende a simples repressão da prática sem aprofundamento das questões éticas Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao que o temanuma e a possibilidade de se estar ferindo um dacomunais pessoa humana polosurgem ativo dacom demanda leitura da CRFB/88 observados osdireito deveres adaterproteção uma vidadosem sofrimento extremo poder autodeterminar-se neste uma sentido. meio ambiente, quem etem legitimidade para propor ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Deste– modo, é impensável, no atual estágio haverdefine uma oespécie Popular (LAP lei nº4.717/65) a contundência quandodeemevolução, sua extensão de ao enfrentar esta que temática, nos casos em que não ocorredevendo a eutanásia quetabu é cidadania, ao trazer o títuloque eleitoral é a prova de cidadania, este ativa, dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. ela ocorre no modo passivo e sem o devido tratamento quanto à matéria, concluindo-se Comungada comdeesse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, pela necessidade enfrentamento da questão pelo meio acadêmico, pelas como associações expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Helya falta de médicos, pela comunidade, pelo poder legislativo, não se pode mais permitir Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, de transparecia e a obscuridade continue a encobrir largamente praticada apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando ao eutanásia direito político de eleger no Brasil, sem quedesequer números possam vir a ser apresentados para demonstrar corresponder a um fiscalizar. cientificamente sua ocorrência, muito pelo medo que os médicos possuem de enfrentarem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma processosSem judiciais. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a eutanásia, é uma prática quepositivas faz partedo doEstado cotidiano médicos e CRFB/88,Aem seu bojo,portanto, traz a dirigência de ações parados prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo que merece atenção do Poder Legislativo e Judiciário, ainda mais por envolver questões mote constitucional da ser garantia de eexistência mínima humana. É tão caras e sensíveis ao humano adentrar no aspectodededignidade sua dignidade e autonomia frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido da vontade, principalmente no Brasil e deve haver uma comoção maior por parte da de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o comunidade em geral neste os sentido, posto que há uma jurídico. omissão Todos! clara dos legisladores mínimo existencial de todos sujeitos do ordenamento sobre a matéria no Brasil. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania ABSTRACTque não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos The present article runs upon euthanasia its consequences related to humanityem dignity. was examined e conceitos marginalizadores de and primeira dimensão ao sustentar seu Itbojo o the judicial system of countries such e asnão Belgium, Netherlands, and Germany, as well as highlighting reconhecimento daother pessoa humana humana como titulares
its approach in Brazil and Portugal. In this presentation of different manners in which the theme is discussed in the countries it is highlighted that the possibility of facing the subject as a necessity of controlling 1. Art. 1.º Qualquer cidadão seráand parteother legítima pleitear aof anulação ou a declaração de nulidade atos lesivos(Brazil, (Netherlands and Belgium) as apara necessity punishing the practices that aredeexcessive ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresPortugal, and Germany). Before the settling of the Brazilian system in which the euthanasia is a crime, so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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it is demonstrated that there isn’t enough discussion about the theme in the courts yet, showing a lack of transparence from the medical organisms and hospitals about procedures in which the practice of euthanasia is detected, making its practice common and out of control in Brazil. Key words: Euthanasia. Humanity dignity. Comparative law.
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5GRECO, AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA Rogério. Curso de Direito Penal. Parte Geral. v. I. 16 AMBIENTAL ed. Ed. Impetus: Rio de Janeiro, 2014. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas LEAL-HENRIQUES, Manuel de Oliveira. SANTOS, Manuel José Carilho de Simas. dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Código Penal. v. l1. 2 ed. Lisboa: Cia dos Livros, 1995. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura ação,Renato. para a ocupação doEutanásico. polo passivoEutanásia e, sobretudo, na publicização MARCÃO, da Flávio Homicídio e ortotanásia no desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio anteprojeto do Código Penal. Revista dos Tribunais, v. 763/1999, 1999. ambiental brasileiro. MAURICE Adams, na Heleen Weyers. Supervision and Control in Euthanasia Law: Segue-se, análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Going Dutch?. King’s Law Journal. v. 23 (03 jun 2015). da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. São Paulo: Editora Atlas, Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o 2007. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. MORAES, caracterização da dignidade da como pessoa ComungadaMaria com Celia esse Bodin ponto de. de Avista, a doutrinajurídica majoritária entende, expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., humana – revista trimestral de direito civil, n. 9, p. 3-24, 2002.In: Princípios Hely de direito Meirelles, que em síntese a ideia de direitos e deveres, ipso facto, civil contemporâneo. Rio correspondem-se de janeiro: Renovar, 2006. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. MORAES, Maria Celina Bodin de. A caminho de um Direito Civil Constitucional. Estado, Direito e Sociedade. Rio de Janeiro: Departamento de Direito PUC-RIO, Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que da existe uma V. 1, p. 4, 1991. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre o meio ambiente elemento compositor de um1966. complexo PACTOmuitos, INTERNACIONAL SOBREcomo DIREITOS CIVIL E POLÍTICOS. Disponível mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É em: em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm.> Acesso frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido 5deset. 2015. que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! ROXIN, Claus. A apreciação jurídico-penal da Eutanásia. Revista Brasileira de Sendo ao fim e ao cabo, tal (out/dez restrição2000). aversa à diretriz que o texto Ciências Criminais. São Paulo, v.8, n.32 constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima ROXIN, Claus. Derecho Penal,de t. I,cidadania p. 65. eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos ROXIN, Claus – Problemas Fundamentais de Direito ao Penal, v. II, Lisboa: e conceitos marginalizadores de primeira dimensão sustentar em seu Universidade bojo o de Direitos e Ciência Jurídica, 1993.e não humana como titulares reconhecimento da pessoa humana SILVA, Germano Marques da - Direito Penal Português. Teoria do crime. Lisboa: 1. Art. 1.º QualquerCatólica cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Universidade Editora, 2012. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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ZAFARRONI, Eugenio; PIERANGELLI, José Henrique . Da Tentativa: Doutrina e Jurisprudência. 6. ed., São Paulo: Editora RT, 2000. ISBN 85.203.1927-0.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA CONSTRUÇÃO CIVIL DE SÃO LUIS/MA E OS INSTRUMENTOS NORMATIVOS VIGENTES Jéssica Silva de Jesus*1 João Vitor Mendes de Oliveira**2 RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo fazer um diagnóstico do inadequado gerenciamento de resíduos sólidos oriundos da construção civil de São Luís/MA e os impactos danosos e por vezes irreparáveis para o meio ambiente. Esse diagnóstico buscará ser construído a partir de uma análise dos instrumentos normativos que urgem como uma alternativa para tal problemática, no âmbito nacional e local. Frente a esta perspectiva, busca-se compreender esses instrumentos normativos e suas diretrizes e alternativas possíveis para a aplicação da gestão sustentável tais como a gestão compartilhada, a reciclagem, a logística reversa, os incentivos creditícios, a educação ambiental e a coleta seletiva. Por fim, constrói-se uma análise acerca da gestão sustentável dos resíduos sólidos da construção civil – RCC – frente à realidade de gestão dos resíduos da construção civil.
Palavras-Chave: Construção civil e resíduos sólidos. Instrumentos normativos. Gestão sustentável
1 INTRODUÇÃO Segundo pesquisa publicada pela Associação de Investidores Estrangeiros no Setor Imobiliário (2012), o Brasil será o segundo melhor mercado imobiliário do mundo na atração de investidores estrangeiros. Em São Luís/MA, somente entre 2003 e 2009 o número de construções dobrou e, nos últimos cinco anos, novos empreendimentos e construtoras nacionais foram atraídos para o Maranhão (CBIC, 2011). O acelerado desenvolvimento da construção civil gera reconhecidos impactos socioeconômicos, tal como a destinação inadequada do . Advogada atuante no ramo de Direito Ambiental e Empresarial, graduada na Universidade Federal do Maranhão – UFMA
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. Advogado atuante no ramo de Direito Ambiental, Civil e Administrativo, graduado na Universidade Federal do Maranhão – UFMA e pós-graduando em Direito Ambiental pela Universidade Federal do Paraná. **
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grande volume de resíduos gerados em atividades de construção, renovação e 5demolição AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL de edificações e infraestrutura urbanas. NãoPara restam quanto carátercorreta de controle popular direto e eficaz quedúvidas se efetue umaaogestão e sustentável desses resíduos é da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas necessário ater-se aos instrumentos normativos de âmbito nacional e local vigentes dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, referentes à matéria. Dentre eles, destacam-se a Resolução 307, do CONAMA consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado (Conselho Nacional do Meio a Lei da Municipal nº 4653/2006 e a na Política das agressões sistemáticas ao Ambiente), meio ambiente, legitimidade do cidadão Nacional Esses instrumentos estabelecem diretrizes e meios propositurados da Resíduos ação, para Sólidos. a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização viáveis de efetivação dessa gestão, por àexemplo, os planos de gestão, a desta possibilidade de atuação cidadã como, com vistas conservação do patrimônio ambiental brasileiro. responsabilidade compartilhada, a reciclagem e outros. Conforme preleciona Patrícia (2011), dasaovias de Segue-se, na análise a princípio de Iglecias doutrina Lemos e legislação, nouma tocante efetivação gestão numa correta dos da resíduos sólidos é a responsabilidade civil póspolo ativo dadademanda leitura CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação consumo. Esta é caracterizada pela responsabilidade do fabricante ou importador, popular? É possível destacar textualmente nos produto artigos iniciais da Leiser deconsumido, Ação de arcar com os ônus da gestão ambientallogo de seu caso, após 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o não possa ser direcionado ao lixo comum (LEMOS, 2011). A indústria da construção, que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este através de sua cadeia produtiva, é uma daspela maiores causadoras desse ônus. Com dispositivo ser tido como não recepcionado vigente ordem constitucional. isso, alguns dispositivos dos instrumentos normativos já citadosentende, ganhamcomo destaque e Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária contribuem de forma significativa para aMancuso, aplicação da gestão sustentável. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. 2 CONSTRUÇÃO CIVIL E RESÍDUOS SÓLIDOS Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com registrando toda análise estendida até aqui, visto queem a suas A construção civil vem incremento consistente CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, atividades nos últimos anos, deixando para trás décadas de dificuldades. Em 2010, dentre o meiorecorde, ambiente compositor dedo umPIB complexo atingiumuitos, desempenho comcomo PIB elemento correspondente a 5,3% total do país. mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Este ano, segundo pesquisa publicada pela Associação de Investidores Estrangeiros frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido no Imobiliário, o Brasil será ambiente o segundodeprecia melhor de mercado do omundo de Setor que, quando lesionado, o meio forma imobiliário consequencial na atração de investidores 2012).Todos! mínimo existencial de todosestrangeiros os sujeitos do(SINDUSCON, ordenamento jurídico. No Nordeste, o crescimento é acelerado por acaso região foi Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversae ànão diretriz que oa texto aconstitucional que mais ampliou número de empregosclara formais na última década. Em nos dá, odada a impossibilidade de restrição do conceito de São Luís/MA, somente entre 2003 2009, o eleitoral, número especialmente de construções cidadania que não é sinônima de ecidadania ao dobrou se tratare, nos de tutelacinco de matéria constituição como a nossa, pautada em últimos anos, aambiental. economiaUma ganhou fôlego com os novos empreendimentos e uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos construtoras nacionais atraídas para o Maranhão. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Em da contrapartida, a urbanização e ocomo rápido adensamento da cidade têm reconhecimento pessoa humana e não humana titulares provocado inúmeros problemas para a destinação do grande volume de resíduos gerados em atividades de construção, renovação e demolição de edificações e 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear ou a declaração de nulidade de atos lesivos infraestrutura urbanas, condicionando osa anulação gestores públicos a adotarem soluções ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresmais eficazes para a gestão desses resíduos. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE, 2010), foram produzidos no Brasil cerca de 60,8 toneladas de resíduos sólidos no ano de 2010. Desses, parte significativa é encaminhada a aterros sanitários com capacidade insuficiente e de estrutura precária, bem como levada a rios, córregos e terrenos baldios, atingindo o meio ambiente local. No município de São Luís/MA, a realidade é semelhante à nacional, sendo destinadas ao aterro sanitário da cidade (Aterro da Ribeira) 1,4 toneladas de “lixo” por dia. Segundo a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMAM, 2010), 34% do total desse lixo é resíduo de construção e demolição (RCD). O restante dos resíduos não recolhidos é lançado a céu aberto e nas matas, rios e mangues da cidade. No aterro sanitário da Ribeira, por exemplo, há um ineficaz controle operacional que não atende à legislação ambiental vigente, o que tem gerado uma série de danos ao meio ambiente, dentre eles a contaminação da bacia do rio Tibiri (SEMMAM, 2010). O gerenciamento adequado desses resíduos ainda encontra obstáculos pela ausência de cultura de separação e pelo aumento de novos tipos de materiais (CONAMA, 2002). Nesse contexto, a gestão de resíduos é uma ferramenta indispensável que tem como principal meta reduzir suas quantidades nos canteiros de obra, viabilizando a destinação e reutilização, além de monitorá-los, desde a sua geração até seu destino final, evitando, com isso, a disposição inadequada em rios, mangues, áreas verdes e livres, e demais áreas de preservação ambiental. Para tanto, foram instituídos instrumentos normativos que dispõem de ferramentas cujo objetivo é incentivar e permitir o manuseio adequado dos resíduos em questão, tendo em vista o bem estar geral. 3 INSTRUMENTOS NORMATIVOS VIGENTES Na última década, foram criados alguns dispositivos normativos locais e gerais com o intuito de efetivar e regular a gestão dos resíduos sólidos, em especial os provenientes da construção civil. A priori, o Conama, em 2002, estabeleceu a Resolução n.º 307 que dispunha sobre diretrizes, critérios, procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil e ações necessárias para minimizar os impactos ambientais (CONAMA, 2002). Conforme a resolução, os geradores, pessoas, físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, responsáveis por atividades ou empreendimentos que gerem os resíduos definidos pela mesma, deverão ter como objetivo principal a não Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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geração de resíduos e, secundariamente, a redução, a reutilização, a reciclagem e a 5destinação AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DEaterros TUTELA AMBIENTAL final desses que não poderá abranger de resíduos domiciliares, áreas de Não “botarestam fora”,dúvidas encostas, corpos d’água, lotes vagos e áreas protegidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz por lei. da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando trata os emmunicípios uma lógicae desagregadora dos devem meios de produção, Parasetanto, o Distrito Federal elaborar o Plano consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil que contemplaria das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na o Programa de Resíduos Construção Civil.na publicização propositurade daGerenciamento ação, para a ocupação do polo da passivo e, sobretudo, desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio Além disso, nesse plano deverá constar o cadastramento de áreas, ambiental brasileiro. públicas ou privadas, aptas para recebimento, triagem e armazenamento temporário de pequenos volumes; açõesa princípio de orientação, de fiscalização controle Segue-se, na análise de doutrina e legislação,enodetocante ao dos agentes açõesleitura educativas visando reduzir aosgeração de resíduos e polo ativoenvolvidos; da demandaenuma da CRFB/88 observados deveres comunais da proteção ado ambiente, tem Municipal, legitimidadeimplementado para propor uma ação possibilitar suameio segregação. O quem Programa e coordenado popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação pelos municípios e pelo Distrito Federal, deverá estabelecer meios para o exercício 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando sua extensão define o das responsabilidades dos pequenos geradores. Já os em Projetos de Gerenciamento, que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este implementados e coordenados por geradorespela de médio e pequeno porte, definirão os dispositivo ser tido como não recepcionado vigente ordem constitucional. procedimentos necessários para manejo e destinação ambientalmente Comungada com esse ponto deovista, a doutrina majoritária entende, adequados como dos resíduos. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, Esses projetos genuína devem seguir as quando seguintes etapaspolítico previstas no art. 8º apenas haveria legitimidade de pleito o direito de eleger da Resolução: identificação corresponder a um de fiscalizar.dos resíduos (caracterização); triagem, respeitadas as classes de resíduos; acondicionamento, confinamento dos resíduos, pelos Sem maiores obstinações, ficade claro, permissatransporte, vaenia, que existe uma geradores, após a geração até a etapa transporte; conforme normas relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a técnicas vigentes para o transporte de resíduos; e destinação final adequada. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, A resolução em questão passou a vigorar em janeiro de 2003 e definiu dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É prazos para que os municípios e o Distrito Federal elaborassem seus planos frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido integrados de gestão (12 meses); os médios e grandes geradores incluíssem os de que, quando lesionado, o nos meioprojetos ambiente de forma consequencial o Projetos de Gerenciamento de deprecia obras a serem submetidos à aprovação mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! ou ao licenciamento dos órgãos competentes (24 meses); e para que os municípios e o Distrito Federal cessem de resíduos de construção civilo em aterros Sendo ao fim e aoa disposição cabo, tal restrição aversa à diretriz que texto de resíduos domiciliares e em áreas de “bota clara fora” de (18restrição meses).do conceito de constitucional nos dá, dada a impossibilidade cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar entanto, esses prazos foram cumpridos a riscapautada pelo município de tutela deNo matéria ambiental. Uma não constituição como a nossa, em de Luís/MA, de modo que a implementação dos planosdos e direitos projetos de umaSão realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes gerenciamento, assim como de a cessão disposição dos resíduos da bojo construção e conceitos marginalizadores primeiradadimensão ao sustentar em seu o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares civil em aterros sanitários e “lixões” ainda figuram como uma realidade distante. Ainda com o intuito de regular e efetivar a gestão dos resíduos sólidos, em âmbito local, vigora a legítima Lei n°. cria a gestão 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte para4.653/2006, pleitear a anulaçãoque ou a declaração de nulidadesustentável de atos lesivos dos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresresíduos da construção civil de São Luís/MA e o plano integrado de gerenciamento so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. desses resíduos. 202
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Tal diploma estabelece os locais em que deverão ser depositados os resíduos, visando sua triagem, reutilização, reciclagem, ou destinação mais adequada. Assim como a previsão da Resolução nº. 307, essa lei também estabeleceu que os resíduos da construção civil não poderão ser dispostos em: áreas de “bota fora“; encostas; corpos d’água e cursos de água; lotes vagos; passeios, vias e outras áreas públicas; áreas não licenciadas; áreas protegidas por Lei. O plano integrado de gerenciamento, cujo objetivo é a correta disposição e o disciplinamento dos fluxos e dos agentes envolvidos, contempla o Programa Municipal de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil, no caso de pequenos geradores e Projetos de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil, quando se trata de médios e grandes geradores. O plano integrado é corporificado no sistema de gestão sustentável que é constituído por um conjunto de áreas e ações tais como Pontos de Entrega para Pequenos Volumes de Resíduos da Construção Civil e Resíduos Volumosos, Disque Coleta para Pequenos Volumes, Áreas para Recepção de grandes volumes, ações para a informação e educação ambiental dos munícipes, dos transportadores de resíduos e das instituições sociais multiplicadoras, definidas em programas específicos. A gestão dos resíduos de pequenos volumes deverá ser feita pelo programa municipal. Para implementação do mesmo, deverão ser criadas Unidades de Recebimentos de Pequenos Volumes – URPV’s, isto é, áreas livres reservadas ao uso público, com o objetivo de sua recuperação nos aspectos paisagísticos e ambientais. Já os projetos de gerenciamento, deverão ser implementados pelos geradores de grandes volumes de resíduos da construção civil, públicos ou privados, cujos empreendimentos requeiram a expedição de alvará de aprovação e execução de edificação nova, de reforma ou reconstrução, de demolição, de muros de arrimos e de movimento de terra. Segundo o disposto na lei ordinária, são responsáveis pela gestão dos resíduos os Geradores de Resíduos da Construção Civil. Os resíduos das atividades de construção, reformas, reparos e demolições, bem como aqueles resultantes dos serviços preliminares de remoção de vegetação e escavação de solos, ficam sob a responsabilidade dos Transportadores de Resíduos da Construção Civil e os Receptores de Resíduos da Construção Civil e Resíduos Volumosos, no exercício de suas respectivas atividades. Os Resíduos da Construção Civil devem ser integralmente triados pelos geradores ou nas áreas receptoras, segundo a classificação definida pelas resoluções CONAMA nº 307 e nº 348 e devem receber a destinação prevista
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nestas resoluções e nas Normas Técnicas Brasileiras. A lei ainda prevê a criação 5doAÇÃO COMO MEIO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL NúcleoPOPULAR Permanente de Gestão – NPG, DE responsável pela coordenação das ações integradas previstas no Plano Integrado de Gerenciamento. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dososatos administrativos. Permanecem, certas Quem infringir dispositivos estabelecidos nestacontudo, lei e nas normas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, dela decorrentes estará sujeito à multa; embargo; apreensão de equipamentos; consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado suspensão porsistemáticas até 15 diasaodomeio exercício da atividade; e cassação do alvará das agressões ambiente, da legitimidade do cidadão na de autorização ouação, funcionamento da atividade. propositura da para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã comdispositivos, vistas à conservação dofoi patrimônio Em consonância com esses em 2010 publicada a ambiental brasileiro. Política Nacional dos Resíduos Sólidos (Lei n. 12.305/2010). Segue-se, na análisecontém a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao Esse dispositivo princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais metas e ações adotados pelo Governo Federal, isoladamente ou em regime de da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação cooperação com estados, Federal, municípios particulares. popular? É possível destacarDistrito textualmente logo nos artigosou iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAPAlguns – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define dos princípios norteadores da Política Nacional do oMeio que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Ambiente são comuns ao Direito Ambiental, tais como a prevenção e o poluidor dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. pagador. O com principio prevenção busca reduzir ou eliminar entende, as causascomo de ações Comungada esse da ponto de vista, a doutrina majoritária suscetíveis de alterar o meiodeambiente, pois a simples reparação, em muitos casos, expresso na lição de Rodolfo Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely se mostraque deempouca sempre incerta e, de quando Meirelles, síntesevalia correspondem-se a ideia direitospossível, e deveres,excessivamente ipso facto, apenas haveria legitimidade genuínadode poluidor-pagador, pleito quando o direito de de eleger onerosa. Ademais, o principio nas político palavras Michel corresponder a um de fiscalizar. Prieur, “visa imputar ao poluidor o custo social da poluição não somente sobre bens e pessoas, mas sobre toda a natureza”, isto é, não objetiva tolerar a poluição Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma medianteincongruência um preço, nem apenas com compensar os danos causados ao meio relevante normativa toda análise estendida até aqui, visto ambiente, que a mas sim, em evitar danotraz (MILARÉ, 2012). CRFB/88, seu obojo, a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como ainda elemento um complexo Além desses, a política se compositor baseia na de cooperação entre as mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido da sociedade; na responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos; de que, quando lesionado, o meiocompartilhada ambiente deprecia de forma consequencial o na visão sistêmica quedeconsidera as variáveis ambiental,jurídico. social, cultural, mínimo existencial todos os sujeitos do ordenamento Todos! econômica, tecnológica e de saúde pública; e no reconhecimento do resíduo sólido reutilizável Sendo ao um fim bem e ao econômico cabo, tal restrição aversa à diretriz quedeo trabalho texto e e reciclável como e de valor social, gerador constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de renda e promotor de cidadania. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela deOs matéria ambiental. Uma da constituição comoimplicam a nossa, pautada em na principais objetivos política que diretamente uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos gestão dos resíduos da construção civil são a tutela da qualidade ambiental; eestímulo conceitosà marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar seu bojo adoção de padrões sustentáveis de produção e em consumo deobens reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares e serviços; a gestão integrada de resíduos sólidos, isto é, ações que levam em consideração as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, sob o1. prisma do desenvolvimento sustentável; a articulação entre as diferentes esferas Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresdo poder público, e destas com o setor empresarial, com vistas à cooperação so em juízo,eserá feita com o título ou comintegrada documento que corresponda. técnica financeira paraeleitoral, a gestão dea ele resíduos sólidos; e o incentivo ao 204
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desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos. Para tanto, alguns instrumentos previstos figuram como essenciais ao gerenciamento dos resíduos da construção civil, tais como: os planos de resíduos sólidos, o sistema da logística reversa, a cooperação técnica e financeira entre os setores públicos e privados; a fiscalização ambiental; os incentivos fiscais, financeiros e creditícios; o Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais; a educação ambiental; a coleta seletiva, dentre outros. Esses planos buscam o diagnóstico da situação dos resíduos, estabelecendo metas, normas e meios de geri-los de forma mais adequada. O plano de gerenciamento previsto menciona expressamente as empresas de construção civil como responsáveis pela elaboração do mesmo. E a elaboração dos planos estaduais e municipais é condição para que estes tenham acesso aos recursos da União referentes à gestão ou para que sejam beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades federais de crédito ou fomento. Dentro desse rol de instrumentos, a logística reversa é definida pela própria política como: O conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.
Ademais, as medidas indutoras e linhas de financiamento deverão atender, prioritariamente, às iniciativas de: prevenção e redução da geração de resíduos sólidos no processo produtivo; desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos. Essas medidas indutoras e linhas de financiamento foram materializadas por meio do “Manual de gestão de resíduos da construção civil (Vol 1 e 2)” (UFOP, 2005), elaborado em conjunto pelo Ministério do Meio Ambiente, Governo Federal, Caixa Econômica e Ministério das Cidades. O primeiro volume é dirigido aos agentes envolvidos na gestão e no manejo dos resíduos da construção civil. Busca tornar acessíveis técnicas e procedimentos de gestão que, com base em experiências realizadas em alguns municípios brasileiros, exemplificam, passo a passo, como implantar um sistema de gestão de resíduos da construção civil. O segundo volume, por sua vez, apresenta
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a modalidade de financiamento, que visa à criação de mecanismos financeiros de 5apoio AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO AMBIENTAL a iniciativas decorrentes da assunção deDE umaTUTELA nova postura ambiental. NãoConforme restam dúvidas quanto ao ao caráter de controle direto e eficaz a política cabe Distrito Federalpopular e aos municípios, a gestão da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas das integrada dos resíduos sólidos gerados nos respectivos territórios, sem prejuízo dúvidas quandodesecontrole trata eme uma lógica desagregadora meios de produção, competências fiscalização bem como dados responsabilidade do gerador consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado pelo gerenciamento de resíduos, consoante o estabelecido nesta Lei. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação polo passivo e, sobretudo, na publicização Enquanto isso, cabe aosdo estados promover a organização e execução das desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio funções públicas de interesse comum, relacionadas à gestão dos resíduos sólidos ambiental brasileiro. nas regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões; e fiscalizar as atividades dos geradores sujeitas a licenciamento Segue-se, na análise a princípio de doutrinaambiental. e legislação, no tocante ao polo ativo daAlém demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais de prever a competência dos estados, municípios e Distrito da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação Federal, a política determina que estes, juntamente com a União, setor empresarial e popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 aPopular coletividade, responsáveis pela efetividade das suas ações em prol da política (LAP – são lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o nacional. Por sua o titular dos serviços decidadania, limpeza urbana e de manejo que é cidadania, aovez, trazer que o título eleitoral épúblicos a prova de devendo este dispositivo tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. de resíduosser sólidos é responsável pela organização e prestação direta ou indireta Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como desses serviços. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely É em relevante ressaltar que a apolítica nacional tambémipso dispõe Meirelles, que síntese correspondem-se ideia de direitos e deveres, facto,que a apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger contratação de serviços para o manejo de resíduos sólidos, ou de disposição final corresponder a um de fiscalizar. de rejeitos não isenta as pessoas físicas ou jurídicas, geradoras dos mesmos, da responsabilidade por danos que vierem a ser provocados pelo gerenciamento Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma inadequado dos respectivos resíduos rejeitos. relevante incongruência normativa comou toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas Estado para prover, A política também restringe a disposição finaldodesses resíduos, proibindo dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo a disposição dos mesmos em praias, no mar ou quaisquer corpos hídricos; e in mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É natura a céu aberto, excetuadoseosresume resíduos de mineração. frágil sustentar que a cidadania à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de consequencial o Nesse contexto a Lei de Crimes Ambientaisforma (Lei nº. 9.605/98), utilizada mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! de forma complementar, surge como meio de punir os que contrariam os dispositivos da política nacional. legal pune com reclusão de 1(um) 5 (cinco) Sendo ao fimEsse e aodiploma cabo, tal restrição aversa à diretriz que o atexto anos o lançamento de dada resíduos sólidos em desacordo leis ou constitucional nos dá, a impossibilidade clara de com restrição do regulamentos. conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente se tratar Todo esse aparato normativo institui ferramentas viáveisaopara efetivação de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em de uma gestão sustentável e que devem ser utilizadas o mais breve possível uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos tendo em vista a realidade local vigente, bem como os problemas desta. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 4 GESTÃO ATUAL E GESTÃO SUSTENTÁVEL
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresO procedimento adequado possibilitar uma maior gestão so em juízo, será feita com o título eleitoral, mais ou com documento que apara ele corresponda.
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sustentável, de maneira clara, seria a adoção de sistemas legais de compensação das externalidades ambientas. Estas geram uma discrepância, a chamada “falha de mercado”, pela qual as empresas acabam tendo um custo de produção maior que os preços de venda, o que é contraproducente e impraticável. Sistemas legais de compensação estes que deveriam resultar de um código estatal (tratando em sua maioria de parâmetros para a produção e emissão de poluentes, ou tributos de cunho extrafiscal que garantiriam o equilíbrio), por um lado, e da responsabilidade civil (responsabilidade civil pós-consumo), do outro (LEMOS, 2011). A responsabilidade civil pós-consumo é conceituada como o compromisso do fabricante ou importador de arcar com os ônus da gestão ambiental de seu produto caso, após ser consumido, não possa ser direcionado ao lixo comum (DIAS, 2010). Diz respeito a todas as pessoas e entes envolvidos no ciclo de fabricação de um produto até a sua distribuição. A responsabilidade se dá, segundo o art.3º, IV da PNRS por uma “série de etapas que envolvem o desenvolvimento do produto, a obtenção de matériasprimas e insumos, o processo produtivo, o consumo e a disposição final”. Funciona como medida para minimizar, ou quem sabe eliminar, os danos ambientais que decorrem da destinação inadequada de resíduos sólidos. O consumidor, por sua vez, pagará não apenas pelo produto, mas por sua destinação final adequada, através da responsabilidade compartilhada, segundo tratada na lei nº 12.305. A prática foi iniciada pela Resolução nº 257/1999, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que determinou a responsabilidade pós-consumo de pilhas e baterias aos produtores. Os resíduos sólidos são gerados, em grande parte, por perdas ocorridas através de um uso incorreto dos recursos necessários para a execução da edificação, ou até pela compra em quantidades superiores dos mesmos. Isso representa, acima de tudo, uma ineficiência, pois os custos de ocorrência do desperdício são substancialmente maiores que os necessários para preveni-los. Exatamente por este fato, para um sistema que integre o gerenciamento de resíduos sólidos tenha total eficácia, é necessária, a priori, uma política ambiental que caminhe em direção contrária a este desperdício, de maneira sustentável (SCHALCH, 2002). A indústria da construção, apesar de ser uma das bases para o desenvolvimento do país e da economia, é uma das maiores causadoras de impactos ambientais, através de sua cadeia produtiva, movimentando terras, matérias primas, ou, pela disposição de maneira incorreta dos resíduos que gera. Ao se analisar dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento - SNIS (2009) percebe-se que a coleta de resíduos da construção civil, chamados de RCC, ocorre de maneira
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direta ou por contratação de terceiros, sendo esta segunda mais comum. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL No âmbito nacional, a maioria dos aterros sanitários não possui Não restampara dúvidas quanto caráter produzidos, de controle popular direto e eficaz estrutura suficiente abarcar os ao resíduos que chegaram à marca de da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas 60,8 toneladas em 2010 (JACOBI e BESEN, 2011). Desse modo, o dano ao meio dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, ambiente local é inevitável e São Luís se torna apenas um reflexo desse panorama consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado maior. No município de São 1,4 toneladas de lixo diárias destinadas das agressões sistemáticas ao Luís, meio das ambiente, da legitimidade do cidadão na ao aterro sanitário da cidade (Aterro da 34%e,do total é resíduo de construção propositura da ação, para a ocupação doRibeira), polo passivo sobretudo, na publicização edesta demolição (RCD).deOatuação restantecidadã dos resíduos não recolhidos é lançado a céu aberto e possibilidade com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. nas matas, rios e mangues da cidade. No Aterro da Ribeira, há um ineficaz controle operacional que não atende à legislação ambiental vigente, o que tem gerado uma Segue-se, na análise a princípio doutrina e legislação, tocante aoTibiri, série de danos ao meio ambiente, dentrede eles a contaminação da no bacia do rio polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais do da Prata e da Praia do Meio PEQUENO, da Rio proteção do meio ambiente, quem(JORNAL tem legitimidade para 2008). propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais Leiadecoletividade Ação Os danos ambientais são difusos e, por isso, afetamdatoda 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o (COLOMBO, 2006). Por essa razão, é custoso fazer com que consumidores que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este edispositivo produtores em não acordo tornando toda a produção eficiente. Para isso, é serentrem tido como recepcionado pela vigente ordem constitucional. necessária aplicação dispositivos e seus instrumentos já citados, Comungadaa com esse dos ponto de vista, anormativos doutrina majoritária entende, como tais comonaalição reciclagem, logística reversa, educação ambiental, a coleta seletiva, e expresso de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, os incentivos fiscais, financeiros e creditícios. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger políticas de gestão de resíduos, por sua vez, devem considerar as corresponderAs a um de fiscalizar. dimensões políticas, econômicas, ambientais, culturais e sociais, tendo, como Semdemaiores fica claro, permissa Este vaenia, que existe uma base, antes tudo, oobstinações, desenvolvimento sustentável. concilia, exatamente, a relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a necessidade de controlar os danos ambientais do país, com o crescimento econômico. CRFB/88, seu bojo, a dirigência de ações do Estado para prover, A logísticaem reversa, portraz exemplo, tem como basepositivas o princípio da prevenção, evitando dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo omote danoconstitucional que viria a ser gerado pelo meio ambiente. da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a se resume comprovação sentido Ademais,cidadania a reciclagem é àbenéfica não documental, apenas no no ponto de vista de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o ambiental, mas também sob o ponto de vista econômico, pois diminui as despesas mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! geradas com o desperdício, podendo até, com a criação de um núcleo especializado, gerar renda. umcabo, estudo pela Escola Politécnica da USP, SendoAtravés ao fim de e ao tal realizado restrição aversa à diretriz que o texto verifica-se quenos as principais da reciclagem âmbitododaconceito construção constitucional dá, dada aaplicações impossibilidade clara de no restrição de civil cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar são a pavimentação, a utilização como agregado para o concreto não estrutural, o de tutela de matéria ambiental. Uma constituição comoema construções nossa, pautada cascalhamento de estradas, o preenchimento de vazios ou oem reforço uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos de aterros, além da utilização em argamassas (PIASSI, 2008). e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento pessoa humana e não humana comonaturais, titulares transformam fonte de Taisda alternativas preservam os recursos despesa em fonte de renda, quando possível e vem a impedir a contaminação de novas áreas que viriam a ser usadas para o despejo (RESENDE, 2009). Nos últimos 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos dez anos, várias mudanças ocorreram na economia e no mundo e fizeram com que ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresdiversas empresas suas estratégias, buscando ascensão no mundo so em juízo, será feita com oreorganizassem título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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capitalista. Empresas passaram a reaproveitar os resíduos, visando não apenas a lucro como esta sustentabilidade. Assim, surge como instrumento para a gestão sustentável a logística reversa, que consiste em uma série de ações com o objetivo de facilitar o retorno dos resíduos ao próprio fabricante, para que sejam tratados ou reaproveitados em novos produtos. Ao se tratar de maneira particular sobre o setor de construção civil, percebe-se o interesse de competitividade ainda em crescimento, assim como as poucas indústrias que demonstram iniciativas para reaproveitamento de seus resíduos. Porém, alguns resultados já podem ser observados, como na questão dos resíduos de gesso, por exemplo. Em São Paulo, algumas ATTs (Áreas de Transbordo e Triagem) recebem o gesso a granel, concentram o material em uma baia e semanalmente a carga é destinada a algumas cimenteiras, segundo o diretor da I&T (Informações e Técnicas em Construção Civil), Tarcísio de Paula Pinto. A reutilização dos resíduos de gesso na fabricação de cimento é feita na fase final de moagem do clínquer (em substituição à gipsita “in natura”) para retardar a pega do cimento (SINDUSCON, 2012). Os produtos e resíduos gerados, na sistemática da logística reversa, se relacionam com a responsabilidade pós-consumo já citada, pois se forma uma visão ampla de sua responsabilidade por todo o ciclo de vida deste produto, não se restringindo apenas à sua vida útil, mas pensando nos impactos ambientais, possibilidades de desenvolvimento sustentável, e custos para reciclagem, por exemplo. A legislação ambiental tem influenciado muitas empresas a decidir por instrumentos como a reciclagem e a logística reversa, com a reutilização de seus produtos, aparecendo avant-garde de suas concorrentes (RESENDE, 2009). Contribui para a promoção da sustentabilidade, sistematizando o fluxo de resíduos de produtos e bens no fim de sua vida útil, descartados por qualquer motivo ou que já se encontrem obsoletos, tornando-se necessários e úteis novamente. Para que sejam aplicadas todas as mudanças trazidas às empresas e construtoras e à gestão sustentável de seus resíduos sólidos, torna-se necessária, a educação ambiental, de maneira que inclua todos os outros instrumentos. Nos termos da Lei 9.795/1999, a educação ambiental, como instrumento para plena aplicação e alcance do desenvolvimento sustentável e da gestão sustentável, consiste nos processos através dos quais o indivíduo e a sociedade em si constroem seus conhecimentos, valores e habilidades, através, principalmente, de ações voltadas para esta sustentabilidade e conservação do meio ambiente, além da melhora na qualidade de vida. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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Sua importância é crescente e, de acordo com a própria legislação, 5recomenda-se AÇÃO POPULAR COMO MEIO TUTELA AMBIENTAL que esteja presente emDIFUSO todos osDE níveis do processo educativo, sendo componente essencial na educação nacional, seja de maneira formal através de Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto ou e eficaz palestras, açõesnoe controle workshops. da ação popular dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em lógica desagregadora dos meios Nesse processouma de educação e sua atuação ampla,deo produção, Poder Público consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado tem o dever de definir políticas que versem sobre temas ambientais, promovendo das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na esta educação ambiental todos do ospolo níveis. É importante, também, que os meios propositura da ação, para a em ocupação passivo e, sobretudo, na publicização de comunicação mídia, com a imprensa, colaborem de efetiva, desta possibilidadededemassa, atuaçãoa cidadã vistas à conservação do maneira patrimônio ambiental brasileiro. possibilitando a obtenção de informações e práticas relacionadas ao tema, de modo a incorporar a preocupação com o meio ambiente no dia a dia da sociedade. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao próprionuma âmbito dasdaempresas indústrias, os para os quais a educação polo ativo daNo demanda leitura CRFB/88eobservados deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação ao ambiental tem ainda maior importância devido à elevada relevância que possuem popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação produzirem um número maior1 de resíduos e produtos, é importante que promovam Popular (LAP – lei nº4.717/65)dea seus contundência quandodemonstrando em sua extensão o programas para capacitação trabalhadores, as define repercussões que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este do seu próprio processo dispositivo ser tido comoprodutivo. não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada Acom esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como educação ambiental é guiada por vários princípios que, de maneira expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely subjetiva, norteiam todo o sistema para sua aplicação. Objetiva, acima de tudo Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, estimular uma legitimidade consciência genuína crítica sobre a problemática ambiental e apenas haveria de pleito quando o direito político na de sociedade eleger nas empresas,a um comdea fiscalizar. finalidade, específica do desenvolvimento sustentável e todos corresponder os seus efeitos (JACOB, 2003). Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma Por se tratar de um com tematoda recente, falta de até informação relevante incongruência normativa análisea estendida aqui, vistonão que aapenas dificulta impede a evolução da gestão sustentável resíduos e, prover, acima disso, CRFB/88,como em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas dos do Estado para sua necessidade. A própria coleta seletiva, que compositor surge comodemeio organização dentre muitos, o meio ambiente como elemento um de complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É destes resíduos para posterior reaproveitamento, em qualquer destas hipóteses já frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido estudadas, é um dos principais pontos citados através da educação ambiental, e a de que, lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o base de quando todo o processo. mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! O fundamento da coleta seletiva é a separação, pela população, ou, no Sendo ao fim e pelas ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o recicláveis texto caso da construção civil, construtoras ou empresas, dos materiais constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito desendo de acordo com a natureza. É um instrumento aplicado de forma paulatina, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar iniciado a campanha informativa da educação mostrando a de tutela com de matéria ambiental. Uma constituição como aambiental, nossa, pautada em importância mesma parae odiversificada, posterior reaproveitamento dos resíduos. uma realidadedacomunitária expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojoe ogestão No que tange os incentivos creditícios, o manual de manejo reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares dos resíduos sólidos da construção civil, como já citado no tópico anterior, é composto por dois volumes. O primeiro volume busca tornar acessíveis técnicas e1. procedimentos deserágestão. Para tantoa anulação estabelece uma deanálise minuciosa Art. 1.º Qualquer cidadão parte legítima para pleitear ou a declaração nulidade de atos lesivos dos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresagentes envolvidos na geração, transporte e recepção dos resíduos da construção so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. e demolição, da estimativa da quantidade de resíduos da construção e demolição 210
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gerada no município e dos impactos ambientais e econômicos. Deve haver também a instituição de um plano integrado de gerenciamento que contemple estratégia de implantação das ações, estruturação do sistema de gestão sustentável para os resíduos da construção civil e resíduos volumosos, o licenciamento das atividades, bem como a operação do novo sistema de gestão. Por fim, delimita as soluções suscetíveis ao financiamento tais como a implantação ou ampliação de instalações físicas destinadas à recepção, transbordo e triagem; instalações físicas para reciclagem; aterros para destinação final; a aquisição de materiais, equipamentos ou veículos para o acondicionamento, a coleta, a transformação e o destino dos resíduos da construção civil e resíduos volumosos; e a execução de ações complementares de educação ambiental e participação comunitária. Já o segundo volume define os procedimentos para a solicitação de financiamento. Estes procedimentos incluem os requisitos técnicos e legais do aspecto social, de engenharia, da viabilidade econômica financeira, de aspectos jurídicos do empreendimento, de risco de crédito do proponente, bem como das condicionantes para a contratação da operação de crédito e condições, procedimentos e documentação a ser apresentada. Depois de cumpridos todos esses requisitos os entes responsáveis irão avaliar as propostas e estabelecer o enquadramento das mesmas nas diretrizes da política de financiamento e saneamento ambiental e selecionarão as propostas habilitadas para contratação no âmbito do orçamento do FGTS do ano corrente. Para que se analise como é possível o gerenciamento sustentável dos resíduos sólidos da construção civil, podem ser citados casos bem sucedidos. É o que ocorre em São José do Rio Preto, interior do estado de São Paulo, na qual caçambas, com mil toneladas diárias de RCC são levadas a usinas de reciclagem, se transformando em importante matéria prima, aproveitadas de maneiras diferenciadas. Antes de tudo, os resíduos são separados pela sua natureza. O concreto, por exemplo, é moído e transformado em pedriscos. Em se tratar da questão financeira, o cálculo é de que a usina custou uma quantia média de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para ser construída, enquanto rende, anualmente, o valor de R$ 1.400.000,00 (um milhão e quatrocentos mil reais) (BIANCHINI,2011). Poucas são as empresas que compreendem o valor que o segundo produto de suas empresas – o RCC, no caso - é material passível de gerar alta eficiência econômica. O problema, porém, vai além do desconhecimento dos produtores, com ênfase na falta de incentivo para esta espécie de uso dos resíduos, Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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sem a motivação necessária legislação atual 5 AÇÃO POPULAR COMOpela MEIO DIFUSO DEbrasileira. TUTELA AMBIENTAL Com isso, é possível verificar a viabilidade bem como a efetividade da Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz gestão sustentável sobre ados atual gestão dos resíduos em âmbitocontudo, nacionalcertas e local. da ação popular no controle atos administrativos. Permanecem, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do Luís/MA patrimônioproduz O acelerado crescimento da construção civil de São ambiental brasileiro. um grande volume de resíduos sólidos e o incorreto gerenciamento desses resíduos acaba porSegue-se, gerar impactos danosos e por de vezes irreparáveis para onomeio ambiente. na análise a princípio doutrina e legislação, tocante ao polo ativo daCom demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais isso, os instrumentos normativos urgem como uma alternativa da proteção do meio ambiente, quem tem normativos legitimidadede para propornacional uma ação para tal problema. Esses instrumentos âmbito e local popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação estabelecem diretrizes e alternativas viáveis para a aplicação da gestão sustentável Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o tais a gestão compartilhada, a reciclagem, a logística reversa, os incentivos que écomo cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este creditícios, a educação ambiental e a coletapela seletiva. dispositivo ser tido como não recepcionado vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como Diante de tal realidade, a gestão sustentável resíduos sólidos da expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humbertodos Theodoro Jr., Hely construção civil RCC correspondem-se – se torna um meio necessário frente à realidade de gestão Meirelles, que em–síntese a ideia de direitos e deveres, ipso facto, dos resíduos construção genuína civil emdeâmbito local. político de eleger apenas haveriadalegitimidade pleito nacional quando oedireito corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica WASTE claro, permissa vaenia, que existe OF umaSÃO THE MANAGEMENT OF SOLID IN CONSTRUCTION relevanteLUÍS incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que / MA AND REGULATORY INSTRUMENTS IN FORCE a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É ABSTRACT frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! This paper has a goal to make a diagnosis of the inadequate management of solid Sendo aofrom fim econstruction ao cabo, talinrestrição aversa à diretriz quedangerous o texto and waste originated São Luís / MA, and the constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito sometimes irreparable impacts of those in the environment. This diagnosisdewill be cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar built fromdeanmatéria analysis of the normative instruments came pautada as an alternative de tutela ambiental. Uma constituição comothat a nossa, em to therealidade problem,comunitária both nationwide and locally. Facing perspective, we seek to uma e diversificada, expande os this horizontes dos direitos understand these instrumentsdeand the possible alternatives for em the seu implementation e conceitos marginalizadores primeira dimensão ao sustentar bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares of sustainable management, such as recycling, reverse logistics, incentives, environmental education and selecting the trash. Finally, it’s built na analysis regarding sustainable management of solid waste in construction, opposing the 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos reality of the actual management. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Keywords: Construction and solid waste. Normative Instruments. Sustainable Management. REFERENCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE LIMPEZA PÚBLICA E RESÍDUOS ESPECIAIS. Disponível em: <http://www.abrelpe.org.br>. Acesso em: 20 out. 2014. BIANCHINI, Amanda. Estudo Laboratorial do uso do entulho de construção civil na regularização de bases para pavimentação. Rio Grande do Sul, 2011. BRASÍLIA. Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências. BRASÍLIA. Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. BRASÍLIA. Lei 9.795/1999, de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. BRASIL. Manual de Manejo e gestão dos resíduos sólidos da construção civil. Brasília, 2005. Disponível em:<http://www.em.ufop.br/ceamb/petamb/cariboost_ files/manual_res_construc_civil_vol1.pdf>. Acesso em: 25 de março de 2012. BRÜGGER, Paula. Educação ou adestramento ambiental ?. Coleção Teses. Florianópolis, Letras Contemporâneas,1994 CAMARA BRASILEIRA DA INSDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO (CBIC). Brasil vira o 2° melhor mercado imobiliário no mundo. Disponível em: <https://www. cbic.org.br/sala-de-imprensa/noticia/brasil-vira-o-2-melhor-mercado-imobiliariono-mundo>. Acesso em: 27.ago.2016. CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. Resolução nº 307, de 5 de julho de 2002. Estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil. COLOMBO, Silvana. Dano Ambiental. Portal Boletim Jurídico, 2006. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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DIAS, Karina Clark Barcellos. Responsabilidade ambiental pós-consumo: 5Aspectos AÇÃO POPULAR DIFUSO Preventivos.COMO Rio deMEIO Janeiro, 2010. DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quantoConstrução ao caráter deCivil: controle popular direto e eficaz INFORMATIVO ECONÔMICO. Desempenho e Perspectivas – da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). Brasília, 2011. dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado JACOB, Pedrosistemáticas Roberto; BESEN, Rizpah.daGestão de resíduos sólidosna em São das agressões ao meioGina ambiente, legitimidade do cidadão Paulo: desafios da sustentabilidade. 2011. propositura da ação, para a ocupação doSão poloPaulo, passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio JACOB, Educação Ambiental, Cidadania e Sustentabilidade. São Paulo, ambientalPedro. brasileiro. 2003. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo demanda numa da CRFB/88 observados deveres comunais JORNAL da PEQUENO. Semaleitura discute estratégias de gestãoosdos resíduos sólidos da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação na Bacia do Parnaíba. Disponível em: <http://edicao.jornalpequeno.com.br/ popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação impresso/2008/08/28/sema-discute-estrategias-de-gestao-dos-residuos-solidos-na1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o bacia-do-parnaiba/>. Acesso em: 28.ago.2008. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. LEMOS, Patricia Faga ponto Iglecias. sólidos emajoritária responsabilidade pósComungada com esse de Resíduos vista, a doutrina entende,civil como consumo. Paulo: Revista Tribunais, 2011.Humberto Theodoro Jr., Hely expresso naSão lição de Rodolfo dedos Camargo Mancuso, Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, MILARÉ, Édis.legitimidade Direito do genuína ambiente: jurisprudência, glossário. 10. ed. apenas haveria de doutrina, pleito quando o direito político de eleger atual. ampl. São Revista dos Tribunais, 2012. corresponder a umPaulo: de fiscalizar. maiores obstinações, fica claro,ambiental permissa como vaenia, queestratégia existe uma PIASSI, Sem Cristiane de Oliveira. A educação uma global relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a de evitar danos. Belo Horizonte, 2008. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meioAbreu. ambiente como elemento compositor de umNacomplexo RESENDE, Fabricia Gerenciamento de Resíduos Sólidos Indústria da mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Construção Civil. São Luis, Maranhão. 2009. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o SÃO LUIS. Lei nº de 4.653 deos21sujeitos de agosto de 2006. Cria o Sistema de Gestão mínimo existencial todos do ordenamento jurídico. Todos! Sustentável de Resíduos da Construção Civil e Resíduos Volumosos, e o Plano IntegradoSendo de Gerenciamento de Resíduos da Construção no que município ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à Civil diretriz o textode São Luís/MA enos dá dá, outras constitucional dadaprovidências. a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a Sólidos. nossa, pautada em São SCHALCH, Valdir. Gestão e Gerenciamento de Resíduos São Carlos, uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos Paulo, 2002. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento pessoa humana não humana como titulares SECRETARIA da MUNICIPAL DE eMEIO AMBIENTE. Disponível em: <http:// www.saoluis.ma.gov.br/semmam>. Acesso em: 27.ago.2016. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos SINDUSCON MARANHÃO. Ano 1, Nº 1, Novembro. 2008. Disponível em: ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres<http://www.sindusconma.com.br/revista/rev_sind_01/index.html> Acesso em so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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MARCO CIVIL DA INTERNET: Uma análise da neutralidade da rede Rogério Monteles da Costa*1
RESUMO O presente artigo pretende abordar o tema do Marco Civil da Internet fazendo uma análise da regulamentação da internet no Brasil, desde sua origem, até o debate sobre as questões sobre a neutralidade e o bloqueio de aplicativos. O referencial teórico foi constituído dos trabalhos dos pesquisadores e doutrinadores da área. A metodologia aplicada fez da análise de textos escritos e obras sobre os temas abordados.
Palavras-chave: Internet. Marco Civil. Neutralidade. Bloqueio de aplicativos. Franquias
1 INTRODUÇÃO A internet tornou-se um serviço indispensável para a vida moderna e, como tal, as discussões sobre a sua regulamentação, por meio do Marco Civil da Internet (Lei n.º 12.965/2014), atende a uma necessidade da própria sociedade em ver fixadas as bases normativas mínimas para tratar os efeitos do uso de referido serviço. Nesse quadro de necessidade de regulação, a comunidade jurídica precisa conhecer com mais detalhes a própria natureza da rede e o seu Marco Civil diante dos desafios que os operadores do direito passam a experimentar frente aos novos conflitos decorrente da utilização da rede, como as questões referentes ao bloqueio de aplicativos e de acesso ao serviço após o esgotamento da franquia de dados. Razão pela qual este artigo pretende lançar luzes sobre o tema e contribuir para o debate sobre a internet, sua utilização e as recentes questões sobre sua neutralidade e bloqueio dos aplicativos e de acesso ao serviço ao término da franquia de dados.
. Juiz de Direito titular do Juizado Especial Cível e Criminal Juiz de Direito titular do Juizado Especial Cível e Criminal
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2 O CONCEITO DE INTERNET 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não caráter deda controle direto e eficaz Arestam palavradúvidas internetquanto é uma ao diminuição palavrapopular em inglês internetworking, da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, que significa entre redes, salientando o aspecto de comunicação entrecertas redes que dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, caracteriza esta rede mundial, ou rede das redes. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio(Marco ambiente, legitimidade do cidadão na como A Lei n.º 12.695/20014 Civilda da Internet) conceitua a internet propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização sendo o sistema constituído do conjunto de protocolos lógicos, estruturado em escala desta possibilidade de atuação cidadãcom com vistas à conservação do apatrimônio mundial para uso público e irrestrito, a finalidade de possibilitar comunicação de ambiental brasileiro. dados entre terminais por meio de diferentes redes. Segue-se, na análise princípio doutrina e legislação, no tocante ao A internet não é aserviço de de telecomunicações. Conforme a Portaria nº polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais 148, de 31 de maio de 1995 do Ministério das Comunicações, é conceituada como da proteção do meio ambiente, tem atividade legitimidade propor auma serviço de valor adicionado, ou quem seja, uma que para acrescenta, um ação serviço de popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o relacionadas ao ao acesso, apresentação, ou recuperação que é cidadania, trazerarmazenamento, que o título eleitoral é a prova demovimentação cidadania, devendo este de informações. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada Ocom esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, comoUnidas Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely (ONU), porque meio Resolução HRC 20/13,a ideia de 5 de dee20122, considera o acesso Meirelles, em da síntese correspondem-se de julho direitos deveres, ipso facto, àapenas internet um relevante fatorgenuína habilitador no exercício direitos humanos (GATTO, haveria legitimidade de pleito quando o de direito político de eleger 2014). corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruênciaHISTÓRICOS normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a 3 ANTECEDENTES CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia mínima de dignidade É de A internet, quando defoiexistência concebida, foi pensada comohumana. uma rede frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido computadores que não têm uma central, e isso quer dizer que se houvesse uma central de quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o da ela que, estaria vulnerável e se fosse atingida haveria problema grave de indisponibilidade mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! rede. Entender que a internet é uma rede sem uma central é relevante, pois outro reflexo disso é que se o Poder Judiciário ordenar um conteúdo ar, não que existeo um servidor Sendo ao fim e ao cabo, tal tirar restrição aversa àdodiretriz texto apenas, ou seja,nos dificulta a execução da ordem. clara de restrição do conceito de constitucional dá, dada a impossibilidade cidadania que é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao seGuerra tratar Fria, O não desenvolvimento da internet remonta ao auge da de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em especificamente surgiu em e1969, nos Estados Unidos, como um dos projeto de defesa uma realidade comunitária diversificada, expande os horizontes direitos que interligava laboratórios dedepesquisa se chamava (Advanced e conceitos marginalizadores primeirae dimensão ao ARPAnet sustentar em seu bojoResearch o Projects Agency),daem outras palavras, a internet fruto titulares de um projeto de comunicação reconhecimento pessoa humana e não humanaécomo militar. Em 1980, surgiu a internet acadêmica. A internet passou a ser utilizada
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos empatrimônio estudosda União, acadêmicos, pesquisadores a §trocar email. Mas para experimentou ao do Distrito Federal, dos Estados, começaram dos Municípios[...] 3º A prova da cidadania, ingresum crescimento após ou o com anodocumento de 1992 a liberação para uso comercial. so em grande juízo, será feita com o título eleitoral, que acom ele corresponda.
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(MARCONDES, 2012). A internet só se tornou atraente ao público em geral graças ao Dr. Tim Berners-Lee, que criou o conceito de hiperlinks e a Marc Andreessen, que produziu o primeiro navegador gráfico - programa que faz a intermediação entre os servidores de internet e o computador do usuário. (BELMIRO, 2014). Já em 1990 surgiu a World Wide Web. A partir do ano 2000 surgiram novas tecnologias, como a WEB 2.0 - termo usado pela primeira vez em 2004 - pode ser definida como um ambiente social e tecnológico de participação e interação positiva entre usuários, onde o foco da rede passou dos negócios para o usuário e sua interação nas redes sociais (TARAPANOFF, 2015). Na atualidade, fala-se na internet das coisas, ou seja, ter internet em tudo, no ar condicionado, na luz, na televisão, na geladeira. Estima-se que no ano de 2015 a internet tenha atingido o número de 3,3 bilhões de usuários, conforme os dados da Rede Nacional de Pesquisa1. 4 A ARQUITETURA DA INTERNET, PROTOCOLOS E REGISTROS A internet está estrutura de forma que os usuários finais (PC´s, servidores Web, servidores de correio eletrônico, etc) conectam-se à ela por meio de uma rede de acesso. Quem conecta o usuário à rede de acesso é o provedor de internet (ISP). Os ISP’s estão no nível mais baixo da hierarquia. Provedores de internet são por exemplo: OI, Claro, Embratel, VIVO, etc. Por sua vez, o provedor de internet está conectado a um outro provedor, denominado provedor de backbone de internet que são estruturas de rede capazes de manipular grandes volumes de informações, constituídas basicamente por roteadores de tráfego interligados por circuitos de alta velocidade que, de fato, colocam o usuário final na internet (KROUSE e ROSS, 2006). Na arquitetura da internet, a interligação das redes de acesso somente foi possível pela padronização de protocolos de comunicação, fazendo com que os computadores dos usuários finais conversem com os computadores dos provedores de internet e estes conversem com os provedores de backbone de internet. A intermediação entre o computador do usuário e a rede de acesso, como ensinam KROUSE e ROSS executam protocolos: Os sistemas [usuários] finais executam protocolos que controlam o envio e o recebimento de informações. O TCP (Transmission Control Protocol - Protocolo de Controle de Transmissão) e o IP (Internet Protocol 1. Disponível em https://www.rnp.br
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Protocolo da Internet) são dois dos mais importantes da Internet. O
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL protocolo IP especifica o formato dos pacotes que são conhecidos como TCP/IP.
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, protocolodiante IP (internet protocol) é vertiginoso o protocolo principal para identificar consumo e Odescarte, do crescimento e multipolarizado um da rede. O número (internet protocol) identifica o equipamento que está das usuário agressões sistemáticas ao IP meio ambiente, da legitimidade do cidadão na na rede. Toda quepara alguém se conecta à internet meio de umnaprovedor de internet propositura davez ação, a ocupação do polo passivopor e, sobretudo, publicização desta de um atuação cidadã com vistas à conservação (ISP), possibilidade este vai atribuir número temporário à máquina, o númerodoIP.patrimônio ambiental brasileiro. O crescimento da internet também fez surgir um Sistema de Nomes de Domínio (DNS)naemanálise razão ada dificuldade de localizar o servidor de ondeaoviria a Segue-se, princípio de doutrina e legislação, no tocante informação número IP.leitura Assim,daoCRFB/88 DNS organiza máquinas (denominadas polo ativo dapelo demanda numa observados os deveres comunais hosts) da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação em domínios e após faz o mapeamento dos nomes de hosts em endereços IP. Esse popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação procedimento é necessário pela1 singela razão que é mais fácil guardar nomes do que Popular números.(LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Portanto, se não existisse o sistema DNS, os acessos navegador da web dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordemvia constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como para uma página específica iria tornar-se mais trabalhoso. Acaso o usuário desejasse expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., acessar, por exemplo, o site da Universidade de Fortaleza (UNIFOR), teria Hely que digitar Meirelles, que em síntese ideia de direitos e deveres, facto,IP sob no seu navegador web o correspondem-se seguinte número aIP: 200.253.187.111 que é oipso número apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger ocorresponder qual está registrado o domínio da Universidade de Fortaleza no órgão competente a um de fiscalizar. no Brasil, que denomina-se Registro.Br, responsável pelo registro e manutenção dos nomes deSem domínios queobstinações, usam o .br. fica claro, permissa vaenia, que existe uma maiores relevante incongruência normativa com análise até aqui, quena a rede, A atividade na internet, emtoda regra, nãoestendida é anônima. Apósvisto entrar CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, em todos os sites que são visitados peloelemento usuário vai ficar um de registro, um rastro que dentre muitos, o meio ambiente como compositor um complexo émote o número IP que lhe foi atribuído pelo provedor de de internet (ISP).humana. O provedor constitucional da garantia de existência mínima dignidade É de internet (ISP) éque quem tem a atribuição fornecer o número IP (internet protocol) frágil sustentar a cidadania se resume de à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio de analogia, forma consequencial simultaneamente com o acesso. Esseambiente número deprecia IP, em uma seria mais ouomenos mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! como se fosse a placa de um carro, identifica o veículo, todavia não o motorista. A propriedade fundamental desses números é que que devem ser únicos Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa IP´s à diretriz o texto em nível global. Isso que não deverão existir dois dispositivos conectados à constitucional nos dá,quer dadadizer a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar internet que compartilhem o mesmo endereço IP. (MARTINEZ, 2014). de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Justamente nessee ponto reside umexpande dos problemas da internet. esgotamento uma realidade comunitária diversificada, os horizontes dosOdireitos dos númerosmarginalizadores de endereço IP.deCom a chamada “Internet das Coisas”, e conceitos primeira dimensão ao sustentar em seu todo bojo otipo de dispositivo, não apenas computadores ouhumana telefones, estarão conectados e serão capazes reconhecimento da pessoa humana e não como titulares de responder a seu controle a distância através da rede e o fato de não haver mais endereços IP disponíveis para novas redes exige a criação de um novo protocolo, 1. Art. 1.º Qualquer serágarantir parte legítima para pleitear a anulação ou nulidade atos lesivos 20 ou chamado IPv6 cidadão que irá o desenvolvimento daa declaração internetdepara os depróximos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres30 anos. 2014). so em juízo, (MAJÓ, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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5 REGISTROS DE CONEXÃO E REGISTRO DE APLICAÇÃO DE INTERNET O registro de conexão, ou seja, o conjunto de informações referentes à data e hora de início e término de uma conexão à internet, sua duração e o endereço IP utilizado pelo terminal para o envio e recebimento de pacotes de dados é uma informação que deve ficar guardada pelo provedor de internet. Com o número IP atribuído, o usuário inicia o acesso à rede, utilizando aplicações de internet. Aplicações de internet são o conjunto de funcionalidades que podem ser acessadas por meio de um terminal conectado à internet. Aplicações de internet são, por exemplo, Facebook, Gmail, Google, WatsApp etc. Acessar uma aplicação da internet também deixa um rastro, um registro. Tal registro denomina-se registro de aplicação. O registro de aplicação é o conjunto de informações referentes à data e hora de uso de uma determinada aplicação de internet a partir de um determinado endereço IP. Os registros, seja o registro de conexão ou o registro de aplicação são denominados no jargão da informática como log. Assim, existe o log de conexão e exige o log de aplicação. A Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) determina a obrigatoriedade por parte do provedor de internet (também chamado provedor de conexão) e do provedor de aplicação da guarda desses registros por um tempo mínimo determinado. Para o log de conexão (também chamado registro de conexão) o provedor de internet deve guardálo por até 1 (um) ano. Já para o provedor de aplicação, a obrigação é de guardar o log de aplicação (ou registros de acesso a aplicações de internet) pelo prazo de 6 (seis) meses (Marco Civil da Internet, artigos 13 e 15, respectivamente). Assim, o anonimato na rede não é uma garantia absoluta, haja vista que todo equipamento que entra na rede recebe um número IP. Exemplificando, um usuário conecta-se à internet pelo seu provedor (por exemplo, NET, VIVO, OI, CLARO, TIM, GVT, etc.), recebe o IP n.º 174.125.34.5, acessa a aplicação Facebook, e lá publica um comentário ofensivo. O Facebook (provedor de aplicação) é obrigado a informar o número IP e o usuário que postou o comentário. De posse do número IP, o provedor de conexão é obrigado a informar qual usuário tinha esse número IP naquele momento (Marco Civil da Internet, art. 13). Daí a razão pela qual o prazo para a guarda dos registros são diferentes, uma vez que a busca inicia no provedor da aplicação é somente após se passa ao provedor de conexão. Contudo, não desconhecemos que há formas de dificultar ou mesmo impedir que se descubra o número IP de uma máquina, ou seja, de um terminal na rede. O uso Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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de servidores proxy por exemplo, dificulta a localização do número IP. Basicamente os 5servidores AÇÃO POPULAR COMO MEIO DE TUTELA AMBIENTAL de Proxy funcionam assim: oDIFUSO usuário entra na rede mundial de computadores através deNão um restam servidor de proxy e esta máquina agirá como um agente de comunicação, dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz fazendo a intermediação a internet e os computadores rede local. da ação popular no controleentre dos atos administrativos. Permanecem,dacontudo, certasAssim, quando equipamento da uma rede lógica local pede uma informação da internet, na verdade dúvidas um quando se trata em desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado quem efetivamente faz a solicitação na rede é o computador em que está instalado o das agressões sistemáticas aoagente meio de ambiente, da legitimidade cidadão naque faz servidor de proxy, o chamado comunicação, pois é essedo computador propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização a requisição à internet. Assim que a informação é obtida da internet é repassada pelo desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio computador onde está o servidor de proxy ao computador da rede local interna que fez a ambiental brasileiro. requisição. Portanto, os computadores da rede local interna não estão de fato disponíveis para a internet, apenas um computador, está instalado o servidor de proxy, Segue-se, na análise a princípioonde de doutrina e legislação, no tocante ao é que polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais está conectado à internet. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação Várias questões surgir logo a partir tal constatação. Podemos suscitar, popular? É possível destacar podem textualmente nosde artigos iniciais da Lei de Ação desde logo, um– questionamento: caso de ilícito cometido porextensão meio dadefine rede mundial Popular (LAP lei nº4.717/65)1 aem contundência quando em sua o de atribuir responsabilidade a seu autor? A denúncia quecomputadores é cidadania, ao(internet), trazer quecomo o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este vai dispositivo comodonão recepcionado pelaseria vigente ordem constitucional. ser feita em ser facetido do dono computador? Como resolvida a questão, por exemplo, Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como de um computador compartilhado? expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Naem medida que a internet aganha usuários essas questões Meirelles, que sínteseem correspondem-se ideia mais de direitos e deveres, ipso facto,tendem aapenas levantar debates especialmente nasdeáreas no tocante à responsabilidade haveria legitimidade genuína pleitocível quando o direito político de elegercivil e corresponder a um de afiscalizar. penal para identificar autoria da infração penal. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a 6 COMITÊ GESTOR DA INTERNET CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional garantia existência mínima de dignidade humana. É A internetdachegou ao de Brasil em 1988, como seu início nos EUA era também frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido restrita a universidades e aos centros de pesquisas, até que a Portaria n. 295, de 20.7.1995, de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o do Ministério das Comunicações liberoudosua exploração comercial. (ALMEIDA, 2002). mínimo existencial de todos os sujeitos ordenamento jurídico. Todos! Efetivamente a internet começou no Brasil quando a Fundação de Pesquisas fim e(Fapesp) ao cabo, restrição aversa à diretriz que o texto do EstadoSendo de SãoaoPaulo e otalLaboratório Nacional de Computação Científica constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito deno Rio (unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação localizada cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de ligaram ambiental. às instituições de pesquisa nos EUA. duas instituições também de Janeiro) tutela desematéria Uma constituição como As a nossa, pautada em incentivaram centros de pesquisa a fazerem o mesmo. (GETSCHKO, 2014). uma realidadeoutros comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos Posteriormente, marginalizadoresocorreu de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo a criação da Rede Nacional de Pesquisao(RNP) reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares e Tecnológico (CNPq) ligada ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico com a função de disseminar o uso da internet para fins educacionais e sociais.
Emcidadão 1995,serápor daparaPortaria Interministerial dede31 maio de 1. Art. 1.º Qualquer partemeio legítima pleitear a anulação ou a declaraçãon° de 147, nulidade atos de lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] 3º A prova da cidadania, para ingres1995, os Ministérios das Comunicações e da Ciência e§ Tecnologia, foi criado o Comitê so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. Gestor da Internet (CGI.br), que passou a envolver-se efetivamente nas decisões 220
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referentes à implantação, à administração e ao uso da internet no país. O Comitê é um grupo de pessoas que inclui governo e sociedade civil, criado originalmente com 9 (nove) membros, mas ampliado pelo Decreto n.º 4.829/2003 para 21 (vinte e um) membros. O CGI.br é composto por: (i) 9 (nove) membros do setor governamental, a saber: 1 (um) representante do Ministério da Ciência e Tecnologia, que será seu coordenador; 1 (um) representante da Casa Civil da Presidência da República; 1 (um) representante do Ministério das Comunicações; 1 (um) representante do Ministério da Defesa; 1 (um) representante do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; 1 (um) representante do Ministério do Planejamento, Orçamento e gestão; 1 (um) representante da Agência Nacional de Telecomunicações; 1 (um) representante do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; e 1 (um) representante do Fórum Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência e Tecnologia; (ii) 1 (um) representante de notório saber em assuntos de Internet, indicado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia com mandato de três anos, permitida a recondução e vedada a indicação de suplente; Não só o setor público participa do comitê gestor, ele é integrado também por (iii) 4 (quatro) representantes do setor empresarial, cuja indicação será efetivada por meio da constituição de um colégio eleitoral, que elegerá, por votação não-secreta, os representantes dos seguintes segmentos: a) do seguimento de provedores de acesso e conteúdo da internet; b) seguimento de provedores de infraestrutura de telecomunicações; c) seguimento da indústria de bens de informática, de bens de telecomunicações e de software; e; d) do seguimento setor empresarial usuário; Participam ainda do comitê (iv) 4 (quatro) representantes do terceiro setor cuja indicação será efetivada por meio da constituição de um colégio eleitoral formado por entidades de representação pertinentes ao terceiro setor, que elegerá, por votação não-secreta, os respectivos representantes; e, por fim, (v) 3 (três) representantes da comunidade científica e tecnológica cuja indicação será efetivada por meio da constituição de um colégio eleitoral formado por entidades de representação pertinentes à comunidade científica e tecnológica, que elegerá, por votação não-secreta, os respectivos representantes A participação no CGIbr é considerada como de relevante interesse público e não ensejará qualquer espécie de remuneração. Esse grupo de pessoas de vários seguimentos é que controla a internet no Brasil. O Comitê Gestor da Internet (CGI.br) é o órgão responsável, dentre outras coisas a atribuir a faixa de números IP´s que o Brasil irá utilizar.
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7 CONTROLE DA INTERNET 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle direto eficaz pode Há a necessidade de controle da internet, hajapopular vista que esteeserviço daser açãoutilizado popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, para a prática do chamado cybercrime. Conforme matériacertas publicada dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, no Jornal Folha de São Paulo, em 2013, o mundo perdeu US$ 445 bi com o crime consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado este já é o terceiro crime que mais prejuízo do ao cidadão mundo depois dascibernético agressõesesistemáticas ao meio ambiente, da causa legitimidade na do 2 narcotráfico e da falsificação (de marcas de propriedade intelectual). propositura da ação, para a ocupação do poloe passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuaçãocom cidadã com vistas à conservação do rede patrimônio A preocupação segurança é uma constante na mundial de ambiental brasileiro. computadores, pois segundo dados do Centro de Estudos, Resposta e Tratamento de Incidentes de Segurança Brasil (CERT.br), que subordinado Segue-se, na análise anoprincípio de doutrinaórgão e legislação, no tocanteaoaoComitê Gestor Internet numa CGIbr,leitura em 2015, ocorreram 722.205 incidentes reportados3, polo ativo da demanda da CRFB/88 observados os deveres comunais dadivididos proteção nos do seguintes meio ambiente, tipos4: quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação scan (54,17%): 1 notificações de varreduras em redes de computadores, Popular (LAP (i) – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o com o intuito ao detrazer identificar quais eleitoral computadores estão ativos e quais serviços que é cidadania, que o título é a prova de cidadania, devendo este estão sendo disponibilizados É amplamente atacantes para identificar dispositivo ser tido comopor nãoeles. recepcionado pelautilizado vigente por ordem constitucional. Comungada de vista, a doutrina entende,aos como potenciais com alvos,esse poisponto permite associar possíveismajoritária vulnerabilidades serviços expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely habilitados em um computador; Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, fraude (23,37%): ato ardiloso, enganoso, má-fé, com apenas haveria(ii) legitimidade genuína qualquer de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. intuito de lesar ou ludibriar outrem, ou de não cumprir determinado dever; logro. Esta categoria engloba as notificações de tentativas de fraudes, ou seja, de incidentes em Semuma maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma que ocorre tentativa de obter vantagem; relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a (iii)bojo, web (9,09%): um casodeparticular de ataque visando especificamente CRFB/88, em seu traz a dirigência ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo o comprometimento de servidores web ou desfigurações de páginas na internet. mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É (6,61%): notificações de atividades maliciosas relacionadas frágil sustentar(iv) queworm a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido processo automatizado de ambiente propagação de códigos maliciosos na rede. o decom que,oquando lesionado, o meio deprecia de forma consequencial mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! (v) DoS - Denial of Service (3,51%): notificações de ataques de negação de serviço, onde o atacante utiliza um computador ou um conjunto de computadores Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto para tirar de nos operação um serviço, computador ou rede. constitucional dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que (vi) não outros é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao enquadram se tratar nas (2,91%): notificações de incidentes que não se decategorias tutela de anteriores. matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos (vii) invasão (0,34%): um ataque bem sucedido que resulte acesso e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seuno bojo o não autorizado a um ou rede. reconhecimento dacomputador pessoa humana e não humana como titulares 2. Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, 09 jun. 2014. Disponível em http://folha.com/no1467110 Acesso em 26 jul 2016. 1. 3.Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Disponível em http://www.cert.br/stats/incidentes/. Acesso em 03/08/2016. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres4. Disponível em http://www.cert.br/stats/incidentes/2015-jan-dec/tipos-ataque.html. Acesso em 03/08/2016. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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8 A NEUTRALIDADE DA REDE A necessidade de controle da internet implica necessariamente conhecer o seu princípio basilar, que é o princípio da neutralidade da rede. Em entrevista à Revista FONTE, Demi Getschko, considerado um dos pais da internet brasileira, afirma que: “a rede nasceu neutra, permitindo comunicação direta entre origem e destino da informação, sem admitir que alguém no meio do ambiente filtre ou bloqueie os dados que trafegam” (GETSCHKO, 2014). A neutralidade, portanto, é um dos pilares do Marco Civil da Internet (os outros são a privacidade de usuários e a liberdade de expressão). Neutralidade na internet significa que os pacotes de dados que circulam pela rede devem ser tratados de forma isonômica, sem distinção por conteúdo, origem, destino, serviço, terminal ou aplicação. Isso garante que os provedores de conexão, por exemplo, não possam cobrar a mais para enviar vídeos em vez de mensagens de correio eletrônico ou permitir o acesso a determinado site e negá-lo a outro. A neutralidade da internet é, portanto, a discussão do quantum de interferência (também chamada de discriminação) que pode ser impresso ao tráfego nela cursado, sendo tanto mais neutra uma rede quanto menor a interferência (NORI, 2014). O princípio da neutralidade de rede está expressamente previsto no Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) representado pela garantia de tratamento isonômico dos pacotes de dados pelas redes dos sistemas autônomos sem degradação nem discriminação por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação (Marco Civil da internet, Art. 9º). A discriminação é qualquer ação que implique bloqueio, redirecionamento, filtragem e/ou diferenciação de pacotes de dados na internet. Já a degradação é o resultado da ação que interfere no tráfego propositalmente, prejudicando de qualquer forma a transmissão de pacotes de dados na internet. Fábio Nori afirma que há basicamente quatro formas de analisar a interferência no tráfego em uma rede de dados: a) há redes sem qualquer interferência; b) redes com interferência dentro de limites tecnicamente aceitáveis e previamente definidos por regras; c) redes em que há uma avaliação caso a caso das interferências impostas; e d) redes em que há livre acordo entre as partes para determinar a interferência imposta ao tráfego (NORI, 2014). O Brasil não adotou a primeira forma de discriminação (nenhuma interferência), porque para que se mantenha a integridade da rede é necessário interferir no tráfego. A interferência dentro de limites aceitáveis e previamente definidos por Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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regras é a opção adotada pelo Brasil, Estados Unidos, Chile e Europa (NORI, 2014). 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Outra forma de interferência na rede é a avaliação caso a caso, seja pelo órgão regulador ou pelo Poderquanto Judiciário. Considerado o grande dinamismo da internet, Não restam dúvidas ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas essa situação sempre ocorrerá dado que não é possível ao legislador ter a previsão de dúvidas quando senas trata em poderá uma lógica desagregadora dos meios de produção, todas as hipóteses quais ocorrer a interferência. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado A última formaaodemeio interferência na da rede se dá com do o livre acordo das agressões sistemáticas ambiente, legitimidade cidadão na entre as partes, aplicados em atemas bemdoespecíficos, por exemplo, a remoção de propositura da ação, para ocupação polo passivocomo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de aatuação vistas à direito conservação do patrimônio determinado conteúdo pedidocidadã de um com interessado, ao esquecimento, remoção ambiental brasileiro. de conteúdo considerado ilícito ou, ainda, serviços de bloqueio ou filtro parentais. A Lei 12.965/2014 permite, de emdoutrina certos casos, que haja discriminação. Segue-se, na análise a princípio e legislação, no atocante ao Todavia, critérios taisleitura comodapara a preservação da os estabilidade, segurança e polo ativoimpõe da demanda numa CRFB/88 observados deveres comunais da proteção doda meio quem legitimidade propor funcionalidade redeambiente, (Marco Civil da tem Internet, artigo 3º,para inciso V). uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação A –degradação ou 1discriminação está regulamentada decreto Popular (LAP lei nº4.717/65) a contundênciajáquando em sua extensãopor define o do presidente da República, exige que sejam ouvidos o Comitê Gestor da Internet (CGIbr) que é cidadania, ao trazer eque o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este edispositivo Agência Nacional Telecomunicações (ANATEL). Além disso,constitucional. somente poderá ser ser tido de como não recepcionado pela vigente ordem Comungada de vista, a doutrina majoritária entende,doscomo admitido nos com casosesse de (i)ponto requisitos técnicos indispensáveis à prestação serviços e expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely aplicações; e (ii) priorização dos serviços de emergência. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, O Decreto n.º 8.771, dede11pleito de maio de o2016, dispõe sobre as exceções apenas haveria legitimidade genuína quando direito político de eleger do princípio da neutralidade da rede e trata ainda dos procedimentos para a guarda e corresponder a um de fiscalizar. proteção dos dados por provedores de conexão e provedor de aplicação. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma Conforme normativa o referidocom Decreto regulamentar, possível ocorrer a relevante incongruência toda análise estendida atéé aqui, visto que a discriminação ou degradação de tráfego,deexcepcionalmente, razãopara de: prover, (i) requisitos CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência ações positivas doem Estado dentre o meio àambiente elemento compositor de umoucomplexo técnicosmuitos, indispensáveis prestaçãocomo adequada de serviços e aplicações (ii) priorização mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É de serviços de emergência. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Os requisitos indispensáveis à prestação de serviços e de que, quando lesionado,técnicos o meio ambiente deprecia de formaadequada consequencial o aplicações são os decorrentes de: a) tratamento de questões deTodos! segurança de redes, mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. tais como restrição ao envio de mensagens em massa (spam) e controle de ataques de Sendo ao fim ao cabo, tal à diretriz o texto negação de serviço; e b)e tratamento de restrição situaçõesaversa excepcionais de que congestionamento constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de e em de redes, tais como rotas alternativas em casos de interrupções de rota principal cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar situações de tutela de de emergência. matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes direitos Incumbe à Agência Nacional de Telecomunicações - Anateldos fiscalizar e apurar einfrações conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o que quanto aos requisitos técnicos. No entanto, permite a norma regulamentar reconhecimento da pessoa humana humana titulares haja o gerenciamento de redes, come onão objetivo decomo preservar sua estabilidade, segurança e funcionalidade para a adequada prestação de serviços e aplicações na internet. Nesse caso, deve ser explicitado ao usuário os motivos do gerenciamento, como por exemplo: 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos a) patrimônio indicando nosdocontratos dedosprestação de serviço§ 3ºosA prova motivos; ou b) ao da União, Distrito Federal, Estados, dos Municípios[...] da cidadania, para divulgando ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. informações referentes às práticas de gerenciamento. 224
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Além da interferência na rede por requisitos técnicos, é possível haver a degradação ou discriminação para priorização de serviços de emergência. O Decreto n.º 8.771/2016 explicita que serviços de emergência são os decorrentes de: a) comunicações destinadas aos prestadores dos serviços de emergência, conforme regulamentação da Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel; ou b) comunicações necessárias para informar a população em situações de risco de desastre, de emergência ou de estado de calamidade pública. A permissão para haver gerenciamento da rede abre caminho para que, no Brasil, seja possível o bloqueio de aplicações bem como o bloqueio de acesso ao serviço após o término da franquia contatada.. Fábio Nori (2014) defende que somente pode haver a interferência na rede quando tal interferências tem o objetivo de assegurar a integridade da rede, pois esse é um objeto tutelado pelo ordenamento jurídico, pela Lei Geral de Telecomunicações (Art. 79. A Agência regulará as obrigações de universalização e de continuidade atribuídas às prestadoras de serviço no regime público. [...] § 2° Obrigações de continuidade são as que objetivam possibilitar aos usuários dos serviços sua fruição de forma ininterrupta, sem paralisações injustificadas, devendo os serviços estar à disposição dos usuários, em condições adequadas de uso.). Há, ainda, o caso da Resolução 614 da Anatel que aprova o Regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia e dá outras providências.5 Como visto, há a possibilidade de discriminação e degradação com a redução da franquia de dados. Importante notar que tais normas foram editadas antes do Marco Civil da Internet, deixando claro que a preocupação com a qualidade do serviço prestado já era tutelada pelo ordenamento jurídico. A exceção do princípio da neutralidade, com a redução da velocidade após o consumo da franquia contratada, é admissível e encontra respaldo na Constituição de 1988, dispõe que toda atividade econômica deverá ser regida por certos princípios, dentre os quais a defesa do consumidor.6 Também encontra amparo no Marco Civil da Internet, já que é medida que objetiva a manutenção da qualidade da conexão à internet, sendo este um direito do usuário do serviço.7 5. Art. 63. O Plano de Serviço deve conter, no mínimo, as seguintes características: [...] § 1º O Plano de Serviço que contemplar franquia de consumo deve assegurar ao Assinante, após o consumo integral da franquia contratada, a continuidade da prestação do serviço, mediante: I - pagamento adicional pelo consumo excedente, mantidas as demais condições de prestação do serviço; ou, II - redução da velocidade contratada, sem cobrança adicional pelo consumo excedente. 6. Assim dispõe o inciso V do artigo 170 da Constituição de 1988 (CF/88: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) V - defesa do consumidor; (...)” 7. MCI: “Art. 7o O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao usuário são assegurados os seguintes direitos:
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O próprio Regulamento do Marco Civil da Internet, Decreto n.º 8.771/2014, 5em AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL seu artigo 6º, permite o gerenciamento de redes com o objetivo de preservar sua funcionalidade observados os parâmetros regulatórios do Comitê Gestor da Internet Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz (CGIbr). da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma que lógica de produção, Portanto, conclui-se nãodesagregadora será possíveldos ao meios promovedor de acesso à consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado internet (ISP) utilizar o gerenciamento de tráfego, para, por exemplo, bloquear a internet das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na após a utilização da franquia contratada. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação patrimônio O próprio Marco Civil da Internet (MCI) dispõe que do é vedado o bloqueio ambiental brasileiro. de pacotes de dados (MCI: “Art. 9º. O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao sem por conteúdo, origemdaeCRFB/88 destino, serviço, terminal ou aplicação. polo distinção ativo da demanda numa leitura observados os deveres comunais (...) § 3o provisão conexão à internet, ou gratuita, bempropor como uma na transmissão, da Na proteção do de meio ambiente, quem onerosa tem legitimidade para ação comutação ou roteamento, vedado bloquear, ouda analisar o conteúdo popular? É possível destacaré textualmente logomonitorar, nos artigosfiltrar iniciais Lei de Ação 1 Popular (LAP lei nº4.717/65) a ocontundência quando em sua extensão define o dos pacotes de–dados, respeitado disposto neste artigo”.) que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este O regulamento do recepcionado Marco Civil da 8.771/2016, em seu dispositivo ser tido como não pelaInternet, vigenteDecreto ordem constitucional. artigo 9º, estabelece condutas aosaresponsáveis pela transmissão, Comungada com esse pontovedadas de vista, doutrina majoritária entende,comutação como ou roteamento aos de provedores de Camargo aplicação,Mancuso, que: expresso na elição Rodolfo de Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, a) comprometam o caráter público e irrestrito dopolítico acesso de à internet apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito eleger e os fundamentos, os princípios e os objetivos do uso da internet no país; corresponder a um de fiscalizar.
b) priorizem pacotes de dados em razão de arranjos comerciais; ou Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma c) privilegiem aplicações ofertadas pelo próprio relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui,responsável visto que a pela transmissão, comutação oupositivas pelo roteamento ou por empresas CRFB/88, em seu bojo, traz a pela dirigência de ações do Estado para prover, dentre muitos, integrantes o meio ambiente como elemento compositor de um complexo de seu grupo econômico. mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É A legislação aindaseimpõe provedores de acesso à no internet (ISP) a frágil sustentar que a cidadania resumeaos à comprovação documental, sentido observância de que as ofertas comerciais e osdeprecia modelos de de forma cobrança de acesso à internet de que, quando lesionado, o meio ambiente consequencial o devem uma de do natureza aberta, jurídico. plural e diversa, mínimopreservar existencial de internet todos osúnica, sujeitos ordenamento Todos! compreendida como um meio para a promoção do desenvolvimento humano, econômico, social e Sendo ao fim e aao cabo, talderestrição aversa inclusiva à diretrize não quediscriminatória o texto cultural, contribuindo para construção uma sociedade constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de (MCI, artigo. 10). cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar entanto, a Agência de como Telecomunicações - Anatel de tutela deNo matéria ambiental. Uma Nacional constituição a nossa, pautada em não uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos vê ilegalidade no bloqueio do serviço após o consumo de franquia de dados. Tal econclusão conceitospodermos marginalizadores ao Zero sustentar emde seuPorto bojo Alegre/ o extrair de da primeira entrevistadimensão ao Jornal Hora, reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares RS, da Superintendente de Relações com Consumidores da agência, Elisa Leonel, que perguntada sobre o bloqueio da internet após o consumo da franquia da dados, esclareceu: 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso será feitadacom o títulocontratada eleitoral, ou documento que(...)” a ele corresponda. (...)em V -juízo, manutenção qualidade da com conexão à internet;
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Zero Hora: Especialistas em direito digital e entidades de defesa do consumidor afirmam que cortar a internet após o consumo total da franquia é ilegal, conforme o Marco Civil da Internet. Qual a opinião da Anatel sobre o bloqueio? Elisa: A leitura da Anatel, que já é compartilhada com outros órgãos do governo, é de que o Marco Civil da Internet não impede que as prestadoras exijam a contraprestação do serviço. Então, há duas formas de se fazer isso nos serviços de telecomunicações. Uma é faturado depois de um consumo livre, como no serviço de voz pós-pago, em que o usuário vai consumindo e, no final do mês, paga um valor relativo ao número de minutos que consumiu. No caso da internet, as operadoras optaram por um modelo de franquia, em que o usuário contrata um pacote e, ao final, precisa contratar pacotes adicionais ou o serviço será interrompido. Então, na nossa interpretação, não há nenhum descumprimento do Marco Civil da Internet ao se estabelecer a cobrança de uma franquia e a interrupção do serviço ao final da franquia. Isso já é um modelo adotado no serviço de voz pré-pago, e nós não entendemos que isso afronta o Marco Civil.
Outra questão que se encontra na ordem do dia para a comunidade jurídica e sobre a possibilidade de, nada obstante o princípio da neutralidade da rede, haver o bloqueio de uma aplicação, em especifico Com criação da internet e as novas tecnologias relativas a ela, houve uma mudança significativa da forma como as pessoas se comunicam hoje em dia. Entre todas elas uma se destaca: é o aplicativo chamado WhatsApp. O WhatsApp é um aplicativo de mensagens instantâneas de voz e de texto capaz de enviar imagens e documentos em PDF, além de fazer ligações grátis por meio de uma conexão com a internet. A gratuidade, bem como a facilidade em seu uso, foram grandes atrativos para adesão da população brasileira e mundial. No Brasil, já são mais de 100 milhões de usuários e no mundo inteiro já passou de 1 bilhão de pessoas que utilizam o serviço8. Já é disparado o aplicativo de mensagens mais utilizado, possuindo 200 milhões de usuários a mais que o segundo colocado, que é o Messenger, ambas pertencentes ao mesmo proprietário: o Facebook. No Brasil, o aplicativo WhatsAppjá foi objeto de bloqueio, ou seja, os provedores de conexão foram obrigados a interferir na neutralidade da rede para não 8. Jornal Folha de São Paulo. São Paulo/SP, fev.2016. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/tec/2016/02/1736093whatsapp-chega-a-1-bilhao-de-usuarios.shtml. Acesso em 03/08/2016.
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permitir nenhuma COMO computador sediado no Brasil tivesse como acessar o WhatsApp. 5 AÇÃOque POPULAR MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Inicialmente, tivemos o bloqueio determinado pelo juiz Luis Moura Correia, Não dúvidas quanto ao de –controle popular diretofeita e eficaz da Central de restam inquéritos da comarca de caráter Teresina PI. A determinação através de da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas mandado, expedido em 11/02/2015, ocorreu devido à recusa da empresa em fornecer dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora9 dos meios de produção, informações a umadoinvestigação . A decisão foi modificada pelo consumo e relacionadas descarte, diante crescimentopolicial vertiginoso e multipolarizado desembargador Raimundo Nonato Costa Alencar, do Tribunaldodecidadão Justiça na do Piauí das agressões sistemáticas ao meiodaambiente, da legitimidade propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização (TJ-PI), que entendeu que as empresas telefônicas e nem seus usuários poderiam ser desta possibilidade de 10atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio penalizados neste caso . ambiental brasileiro. Em 16 de dezembro de 2015, as operadoras de telefonia móvel foram novamente intimadas a bloquear o aplicativo de mensagens WhatsApp emaotodo o Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais território nacional por 48 horas. A determinação partiu da 1ª Vara de São Bernardo do da proteçãoatravés do meio quem tem legitimidade para propor uma ação Campo/SP, de ambiente, uma decisão da juíza Sandra Regina Nostre Marques, o motivo popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação seria uma recusa do WhatsApp 1em fornecer informações para uma investigação policial Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o 11 que desde ao 2013 . que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este que évinha cidadania, trazer dispositivo ser como nãodorecepcionado pelao vigente ordem constitucional. Na tido madrugada dia seguinte, desembargador Xavier de Souza, Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como da 11ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, concedeu liminar determinando o expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely restabelecimento do serviço. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, Segundo o comunicado desembargador entendeudeque, “em face apenas haveria legitimidade genuínado deTJ-SP, pleito oquando o direito político eleger corresponder a um de fiscalizar. dos princípios constitucionais, não se mostra razoável que milhões de usuários sejam afetados em decorrência da inércia da empresa”12. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma O terceiro bloqueio, 02/05/2016 de visto uma que decisão relevante incongruência normativarealizado com toda em análise estendidaadveio até aqui, a do juiz Marcelem Maia Montalvão, da Vara Criminal Lagarto,doem Sergipe. magistrado CRFB/88, seu bojo, traz a dirigência de açõesde positivas Estado para O prover, dentre o meio ambiente comodaelemento compositor deendossado um complexo atendeumuitos, a um pedido de medida cautelar Polícia Federal, que foi por parecer mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade É não do Ministério Público. O pedido foi feito porque o Facebook, dono dohumana. WhatsApp, frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido cumpriu uma decisão judicial anterior de compartilhar informações que subsidiariam de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o uma investigação A sujeitos recusa já resultado anteriormente mínimo existencialcriminal. de todos os do havia ordenamento jurídico. Todos! na prisão do 13 presidente do Facebook para América Latina . Sendo ao 03 fimdee maio ao cabo, tal restrição aversa à Ricardo diretriz que o texto No dia seguinte, o desembargador Múcio Santana de constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em 9. Matéria divulgada no Portal de Notícias G1 Disponível em: http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2015/12/operadorasuma realidade comunitária e diversificada, Acesso expande os horizontes dos direitos sao-intimadas-bloquear-whatsapp-no-brasil-por-48-horas.html. em 03/08/2016. e10.conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Matéria divulgada no Portal de Notícias G1. Disponível em http://g1.globo.com/pi/piaui/noticia/2015/02/desembargadorreconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares do-pi-derruba-decisao-que-mandava-tirar-whatsapp-do-ar.html. Acesso em 03/08/2016. 11. Matéria divulgada no Portal de Notícias G1. Disponível em http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2015/12/operadorassao-intimadas-bloquear-whatsapp-no-brasil-por-48-horas.html. Acesso em 03/08/2016. 12. Matéria divulgada no Portal de legítima Notícias para JOTA. Disponível emouhttp://jota.uol.com.br/tj-sp-concede-liminar-para1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte pleitear a anulação a declaração de nulidade de atos lesivos desbloquear-whatsapp. em 03/08/2016. ao patrimônio da União,Acesso do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres-
13. Matéria no Portal de eleitoral, Notícias ou G1.com Disponível em que (http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2016/05/justica-doso em juízo, divulgada será feita com o título documento a ele corresponda. sergipe-manda-operadoras-bloquearem-whatsapp.html, Acesso em 03/08/2016.
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Abreu Lima, do Tribunal de Justiça de Sergipe, atendendo a um pedido de reconsideração determinou o desbloqueio do aplicativo. O teor da decisão não foi divulgado devido ao processo correr em segredo de justiça, mas na parte que foi divulgada ele alega que o bloqueio causou um caos social em todo território nacional, com dificuldades de atividade laborativa, lazer, família, etc14. O 4º bloqueio foi determinado em 19/07/2016 pela juíza Daniela Barbosa Assunção de Souza, juíza da 2ª Vara Criminal da comarca de Duque de Caxias – RJ, após o Facebook (dono do WhatsApp) recusar-se a cumprir uma decisão judicial e fornecer informações para uma investigação policial15. Novamente foi determinado o desbloqueio. A novidade é que embora o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro também tivesse deliberado pelo retorno do funcionamento do aplicativo em grau de recurso, a efetiva e primeira decisão para o desbloqueio adveio de uma decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Ricardo Lewandowski na tarde do dia 19/07/201616. O desbloqueio dessa vez foi determinado através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) número 403, impetrada pelo Partido Popular Socialista, inicialmente em contraposição decisão do juiz da comarca de Lagarto - SE e posteriormente aditada para que fosse incluída a decisão da juíza da comarca de Duque de Caxias – RJ. A decisão do eminente ministro presidente do Supremo Tribunal Federal se baseou na proteção do preceito constitucional violado, qual seja o Artigo 5º inciso IX, CF que assevera: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:, […] IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.
O ministro também fundamenta sua decisão em princípios do próprio Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), que em no seu artigo 3º, incisos I e assim dispõe: 14. Revista Consultor Jurídico. 3 mai. 2016. Disponível em http://www.conjur.com.br/2016-mai-03/desembargador-tjdetermina-desbloqueio-whatsapp. Acesso em 03/08/2016. 15. Matéria divulgada no Portal de Notícias G1. Disponível em http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2016/07/whatsappdeve-ser-bloqueado-decide-justica-do-rio.html. Acesso em 03/08/2016. 16. Revista Consultor Jurídico. 19 de jul 2016. Disponível em http://www.conjur.com.br/2016-jul-19/tj-rj-tambem-concedeliminar-desbloquear-whatsapp. Acesso em 03/08/2016.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL
Art. 3oA disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios:
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz I - dos garantia liberdade de expressão, comunicação e manifestação de da ação popular no controle atos da administrativos. Permanecem, contudo, certas nos termos da Constituição dúvidas quando se trata pensamento, em uma lógica desagregadora dosFederal; meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado [...] das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na - preservação estabilidade, e funcionalidade da rede, por propositura da ação, paraVa ocupação doda polo passivo e,segurança sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio meio de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e pelo ambiental brasileiro. estímulo ao uso de boas práticas; Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo daReforçando demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais o argumento da importância do WhatsApp como meio de da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma açãouso até comunicação no Brasil, o ministro Ricardo Lewandowski ainda destaca o seu popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação mesmo e despachos judiciais. quando em sua extensão define o 1 Popularpara (LAPintimações – lei nº4.717/65) a contundência que é cidadania, ao de trazer quepareceu o título eleitoral é a prova de cidadania,odevendo Além tudo, ao ministro, desproporcional bloqueioeste em todo dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. território nacional de uma importante ferramenta de comunicação em relação ao motivo Comungada com de esse ponto de vista, a doutrina entende, como da que lhe deu causa forma indefinida como estava namajoritária decisão objeto do aditamento expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely ADPF n. 403. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria de pleito quando ode direito político de eleger As legitimidade decisões que genuína ordenaram aos provedores acesso bloquear o WhatsApp corresponder a um de fiscalizar. tiveram, em geral, por base o Marco Civil da Internet que dispõe no seu artigo 10: Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a acesso Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, a aplicações de internet de que trata esta Lei, bem como de dados pessoais dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É intimidade, da vida àprivada, da honra documental, e da imagem das partes direta ou frágil sustentar que a cidadania se resume comprovação no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente indiretamente envolvidas.deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo fim e aaorequisição cabo, talderestrição aversa diretrizque quehaja o texto Nãoao atendida formações, a leiàpermite a aplicação constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de elas a de sanções que tendem a coagir o provedor de aplicação a cumpri-la, dentre cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar interdição da atividade conforme prevê o artigo 12 do Marco Civil da Internet: de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Art. 12. Sem prejuízo das demais sanções cíveis, criminais ou administrativas, reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares as infrações às normas previstas nos arts. 10 e 11 ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções, aplicadas de forma isolada ou cumulativa:
1. Art. 1.º Qualquer cidadão seráIparte legítima paracom pleitear a anulação a declaração de nulidade de atos lesivos - advertência, indicação deouprazo para adoção de medidas corretivas; ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres- multaoudecom atédocumento 10% (dezquepor cento) do faturamento do grupo econômico so em juízo, será feita com o títuloIIeleitoral, a ele corresponda.
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no Brasil no seu último exercício, excluídos os tributos, considerados a condição econômica do infrator e o princípio da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção; III - suspensão temporária das atividades que envolvam os atos previstos no art. 11; ou IV - proibição de exercício das atividades que envolvam os atos previstos no art. 11. Parágrafo único. Tratando-se de empresa estrangeira, responde solidariamente pelo pagamento da multa de que trata o caput sua filial, sucursal, escritório ou estabelecimento situado no País.
Nada obstante, a discussão sobre as questões técnicas sobre ser possível a obtenção da informação, isso levanta uma discussão, a saber, se pode ser possível a um empreendedor desenvolver uma atividade econômica no Brasil em desconformidade com as leis do pais. Está é outra questão que enseja uma discussão sobre o princípio da neutralidade da rede que a comunidade jurídica irá trabalhar em um futuro breve. 9 CONSIDERAÇÕES FINAIS Como visto, as questões sobre neutralidade da rede são relevantes e ensejam da comunidade jurídica o devido debate para que o ordenamento jurídico encontre resposta para os novos conflitos que irão surgir a partir do uso da rede mundial de computadores. Entender como a internet funciona e ter uma visão geral sobre os conflitos que surgirão da sua execução, notadamente a possibilidade de bloqueio de aplicativos e bloqueio de acessos após o encerramento da franquia de dados são de extrema importância para a comunidade jurídica. Filiamo-nos àqueles que e ntendem não ser possível o bloqueio do acesso à internet ao término da franquia de dados, nada obstante ser possível interferir na rede para preservar a própria integralidade do sistema. Por outro lado, entendemos como possível o bloqueio de aplicações quando não atendida a ordem judicial de busca por informações, haja vista que, ao empreendedor que optou por atuar no mercado brasileiro, incumbe, segundo nossa Constituição, a observância da soberania nacional e cumprimento de ordem judicial e expressão da soberania do país.
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ABSTRACT
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL This article aims to address the issue of Internet Civil Marco doing an analysis of internet regulation in Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Brazil, its origin to the debate theadministrativos. issues of neutralityPermanecem, and application contudo, blocking. The theoretical da açãofrom popular no controle dosonatos certas frameworkquando was made of the of lógica researchers and scholars ofdos the meios area. Thedemethodology dúvidas seuptrata emwork uma desagregadora produção, applied made the analysis of written diante texts and do works on the coveredvertiginoso spa. consumo e descarte, crescimento e multipolarizado
das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação,Civil paraMarco. a ocupação do Applications polo passivo e, sobretudo, Key words - Internet. Neutrality. lock. Franchises. na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro.
REFERÊNCIAS Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção André do meio ambiente, temAlegitimidade propor uma ação ALMEIDA, Augusto Lins quem da Costa. propaganda para eleitoral na Internet. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Revista Jus Navigandi, Teresina,ano 7,n. 60. Disponível em: <https://jus.com.br/ 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o artigos/3472>. Acesso em: 23 jul. 2016. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. BURNS. J.H.,com HART, the Principles of Morals and Legislation. Comungada esseH.L.A. ponto Introducion de vista, atodoutrina majoritária entende, como Oxford: 1996 expressoPress. na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria genuína dede pleito quando direitoa político de eleger BRASIL. Lei nºlegitimidade 12.965, de 23 de abril 2014. Dispõeo sobre organização dos corresponder a um de fiscalizar. serviços de telecomunicações, a criação e funcionamento de um órgão regulador e outros aspectos institucionais, nos termos da Emenda Constitucional 8, deuma 1995. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que nºexiste Diário Oficial da República Federativa do Brasil, DF, 151, n.ºque 77, a24 relevante incongruência normativa com toda análiseBrasília, estendida atéano aqui, visto abr. 2014. Seção p. 1. traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, CRFB/88, em seuI,bojo, dentre o meiodeambiente como elemento compositor de umgarantias, complexo ______.muitos, Lei nº 9.472, 16 de julho de 1997. Estabelece princípios, direitos mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É do e deveres para o uso da Internet no Brasil. Diário Oficial da República Federativa frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Brasil, Brasília, DF, 17 jul. 1997. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! ______. Portaria nº 148, de 31 de maio de 1995. Aprova a Norma nº 004/95 - Uso da Rede Pública de ao Telecomunicações acesso à Internet. Oficial República Sendo fim e ao cabo,para tal restrição aversa àDiário diretriz que odatexto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito Federativa do Brasil, Brasília, DF, n.º 104, 01 jun. 1995. Seção I, p. 7876. de cidadania que nãon.ºé 4.829/2003. sinônima deDispõe cidadania eleitoral, especialmente ao se da tratar ______. Decreto sobre a criação do Comitê Gestor Internet de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em no Brasil - CGIbr, sobre o modelo de governança da Internet no Brasil, e dá outras uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos providências. Diário Oficial dadeRepública dosustentar Brasil, Brasília, e conceitos marginalizadores primeira Federativa dimensão ao em seu DF, bojo04o set. 2003. Seção I, p.da 24.pessoa humana e não humana como titulares reconhecimento CARLONI, Giovanna Louise Bodin De Saint-Ange Comnene. Privacidade e 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitearem:<&. a anulação Acessado ou a declaração de nulidade de atos lesivos Inovação na Era do Big Data. Disponível em 02.08.2016. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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5MARTINEZ, AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL Carlos. Entrevista à Revista Fonte.DE Belo Horizonte, v. 11, 2014. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz MAJÓ, Ernesto.no Entrevista à Revista Fonte. Belo Horizonte, v. 11,2014. da ação popular controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado NORI, Fabio. Uma breve discussão sobre a neutralidade da internet segundo o das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade cidadão marco civil. Governança da internet e a atuação brasileira. Revistado Fonte, v.11,na Belo propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Horizonte, p. 79 – 84, 2014. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. NOZICK, Robert. Anarchy, State, and Utopia. Nova York. Basic Books. 1974 Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais OLIVEIRA, Pablo Camarço. Concepções de Justiça em Chaim Perelman e John da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação Rawls. Curitiba. Editora CRV. 2015. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o PERELMAN, Ética Tradução de Maria Ermantina.devendo São Paulo: que é cidadania,Chaim. ao trazer queeoDireito. título eleitoral é a prova de cidadania, este Martins Fontes. 1996. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na liçãoKira de Rodolfo Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely TARAPANOFF, (Org.). de Análise da informação para tomada de decisão: desafios Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, e soluções/[livro eletrônico] Curitiba: InterSaberes, 2015. página 25. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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O PODER DA ÚLTIMA PALAVRA: UMA PERSPECTIVA DA CIÊNCIA POLÍTICA ANTE O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Kássia do Carmo Brito da Silva*1
RESUMO O Tribunal Constitucional Brasileiro traz consigo o poder de guarda da Constituição, legitimamente investido da atribuição de resolver conflitos dando sobre eles a última palavra, a partir da interpretação constitucional. Sob a perspectiva da Ciência Política, na fronteira entre o Direito e a Política, analisaremos os limites da atribuição institucional do Supremo Tribunal Federal no Estado de Direito, e num tempo de discussões sobre a crise do Judiciário brasileiro, revisitamos a teoria da separação de poderes que atravessa o curso da história, consagra-se no movimento constitucionalista e encontra o derradeiro dilema na atuação prática do papel do Judiciário na vida social. Palavra-chave: Tribunal constitucional. Separação de poderes. Democracia.
1 INTRODUÇÃO No sistema de Justiça brasileiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem a atribuição constitucional de ser o guardião da Constituição, enquanto Lei Maior do Estado; mas para além do exaustivo rol de suas competências disposto no artigo 102 e outras características de seu funcionamento nos artigos 103 e 103-A da Constituição da República, o poder das decisões dessa Corte sugere que os seus onze ministros também governam, ao darem a última palavra sobre o que podem ou não fazer os mais altos gestores do país e mesmo os cidadãos, num crescente controle de constitucionalidade que, de algum modo, pode interferir nas leis produzidas pelo Legislativo, questionar atos normativos editados pelo Executivo e tudo isto independente de adesão de vontade da maioria do jurisdicionado ou dos demais poderes. (SADEK. 2004). Essa autonomia do Judiciário, conquistada, sobretudo, a partir do texto constitucional de 1988, é analisada no âmbito das Ciências Sociais como uma “inclinação do Direito de tornar-se pragmático, embaçando as fronteiras entre o Direito e a política” (SADEK. 2004) e nos inspira a refletir sobre os limites dessa atuação imposta, pelo menos em teoria, pela separação de poderes enquanto princípio básico do nosso estado . Jornalista. Graduanda em Direito, da Universidade Federal do Maranhão. Servidora efetiva do Tribunal de Justiça do Maranhão, lotada na Escola Superior da Magistratura do Estado do Maranhão. *
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constitucional1. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Assim, ao adentrarmos no paradigma do Estado Democrático de Direito, Nãomostra-se restam dúvidas quanto caráter decomo controle popular também direto e eficaz essa relação cada vez maisao complexa, desafiadora é a situação da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dos tribunais constitucionais que são chamados a dar última palavra em diversos conflitos dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, econsumo cuja prestação jurisdicional sobremaneira nas edecisões políticas. e descarte, diantepode do interferir crescimento vertiginoso multipolarizado das agressões sistemáticas meio ambiente, da legitimidade do cidadão na É pelo rastro deaosua história, sua atividade jurisprudencial, o constante propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização fenômeno da judicialização política e pelo híbrido modelo de controle de desta possibilidade de atuaçãodacidadã com vistasseu à conservação do patrimônio constitucionalidade ambiental brasileiro.(ARANTES, 1997, p 65) que observamos como o Supremo Tribunal Federal tem, em verdade, exercido com protagonismo um papel político (ARANTES, 2 a princípio de doutrina e legislação, no tocante aopara o 1997, p 9)Segue-se, que nos na fazanálise repensar a referência de Montesquieu e abrir caminho polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais horizonte apontado por Tocqueville, de crescente relevância do Judiciário a partir da dodo meio ambiente, quem tem atribuição legitimidade para propor uma ação da proteção engenharia presidencialismo e pela institucional daquele Poder, de popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação examinar a constitucionalidade de leis e atos administrativos. Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Diante órbita do campo Ciências via pela qual dispositivo ser tido da como não própria recepcionado pela das vigente ordemSociais, constitucional. propomos dessa crescente centralidade política de que entende, é dotada como a atividade Comungadaa análise com esse ponto de vista, a doutrina majoritária hermenêutica do de Supremo Federal, de imediato os expresso na lição Rodolfo Tribunal de Camargo Mancuso, Humbertoressaltamos, Theodoro Jr.,também, Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, reflexos de nossa decisão constituinte pela forma de Estado Federal na qual o Poder apenas haveria de federal, pleito quando o direito político de eleger para Judiciário – por legitimidade meio da Cortegenuína de justiça com caráter supremo – alavanca-se corresponder a um de fiscalizar. espaço estrategicamente central no pacto federativo, uma vez que “é chamado a operar o equilíbrio de maiores toda a ordem, a estritafica conformidade dos poderes União e dos Estados Sem obstinações, claro, permissa vaenia,daque existe uma com os princípios básicos da Constituição” 2012, p 196). relevante incongruência normativa com toda(BONAVIDES, análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Nãoo émeio nossoambiente objetivo como questionar importância ou legitimidade do Tribunal dentre muitos, elemento compositor de um complexo Constitucional: passaremos longededoexistência debate quemínima pôs emdelados distintos Carl Schmitt e mote constitucional da garantia dignidade humana. É 3 Hans ; antes como oà STF, no âmbitodocumental, de sua legitimidade, frágil Kelsen sustentar que aobservaremos cidadania se resume comprovação no sentidoreporta de que, quando o meio ambiente deprecia de forma consequencial o ao nosso Estado lesionado, Democrático um verdadeiro dilema que é de prezar pela autonomia e mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! independência das decisões daqueles que envergam a toga, e, ao mesmo tempo, lançar sempre o olhar cuidadoso aos limites dessa criatividade legislativa do guardião da Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto Constituição República. constitucionaldanos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. constituição a nossa, 1. Artigo 2º, Constituição de 1988: “São PoderesUma da União, independentes ecomo harmônicos entre si, opautada Legislativo,em o Executivo euma o Judiciário”. realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos 2. do Poder Judiciáriode na obra de Montesquieu: “dos três o de julgar de algum e Percebemos conceitosa noção marginalizadores primeira dimensão aopoderes, sustentar em éseu bojomodo o nulo”. Montesquieu. Do Espírito Leis, II,humana cap. VI. e não humana como titulares reconhecimento dadas pessoa 3. Carl Schmitt, com a perspectiva de defesa da Constituição operada por órgão político, apresenta o documento constitucional como um conjunto de decisões políticas fundamentais e leis constitucionais, que são ato de vontade do titular do Poder Constituinte, no qual o protetor dessa decisão política: o chefe do Poder Executivo, na pessoa do Füher, poderia decretar o Estado “estado coinstitucional” proteger Constituição. Noutro Kelsen, com 1. Art.de 1.ºExceção, Qualquersuspendendo cidadão seráeste parte legítima para pleitear apara anulação ou a própria declaração de nulidade de atosgiro, lesivos sua Norma Hipotético a respaldar todas asdos normas inferiores, §propõe a legitimidade mesma da Constituição ao patrimônio da União,Fundamental, do Distrito Federal, dos Estados, Municípios[...] 3º A prova da cidadania, para ingresemem serjuízo, fundamento de com validade, com supremacia bastante, dissociada de fundamento so será feita o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.sociológico e político, a ser guardada legitimamente por um Tribunal Constitucional.
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2 SEPARAÇÃO DE PODERES: CONTRA A TIRANIA OU A SERVIÇO DA DOGMÁTICA O tema da separação de poderes vem sendo discutido por cientistas sociais e jurisconsultos, em linha de raciocínio que atravessou momentos históricos distintos e se prestou a distintas finalidades. Platão inaugura a ideia de separação de poderes na sua discussão sobre a pólis perfeita, na qual cada pessoa deveria exercer uma função dentro do grupo social. Mais tarde, Aristóteles – discípulo de Platão – dá contornos específicos à distribuição de funções quando promove uma investigação à constituição do Estado, para verificar como assegurar a felicidade coletiva. Essa concepção de divisão funcional pode ser também vislumbrada na obra de Locke, até chegar a célebre definição de Montesquieu: A divisão segundo o critério funcional é a célebre “separação de poderes”, que consiste em distinguir três funções estatais, quais sejam, legislação, administração e jurisdição, que devem ser atribuídas a três órgão autônomos entre si, que as exercerão com exclusividade, foi esboçada pela primeira vez por Aristóteles, na obra “Política”, detalhada posteriormente, por John Locke, no Segundo Tratado de Governo Civil, que também reconheceu três funções distintas, entre elas a executiva, consistente em aplicar a força pública no interno, para assegurar a ordem e o direito, e a federativa, consistente em manter relações com outros Estados, especialmente por meio de alianças. E, finalmente, consagrada na obra de Montesquieu O Espírito das Leis, a quem devemos a divisão e distribuição clássicas, tornando-se princípio fundamental da organização política liberal e transformando-se em dogma pelo art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, e é prevista no art. 2º de nossa Constituição Federal. (MORA,. 2007, p 385).
Por essa visão de Montesquieu, a acepção da teoria foi acolhida pelo movimento constitucionalista, numa tentativa de resguardar as liberdades individuais e livrar os cidadãos da tirania do monarca. (DALLARI, 2012, p 214). É no século XIX que, a partir da Teoria de Separação de Poderes, pretendese aumentar a eficiência estatal, com distribuição de funções entre seus órgãos. Nessa perspectiva, teóricos do estado aduzem que a doutrina da separação de poderes fora convertida em dogma, numa tentativa de evitar governos absolutos, inclusive positivando
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essa necessidade nas constituições que surgiram nos Estados Modernos. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada na França, restam dúvidas quanto caráter de controletraz popular direto eda eficaz em 1789,Não marco temporal clássico doao constitucionalismo, a exigência separação da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas de poderes com ênfase ao limite do poder estatal, associando fortemente essa doutrina à dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, ideia de Estado Democrático Direito, de onde severtiginoso extrai o engenhoso sistema de freios consumo e descarte, diantede do crescimento e multipolarizado edas contrapesos enquanto umaoesquema teorético que divide os atosdoestatais emna gerais e agressões –sistemáticas meio ambiente, da legitimidade cidadão especiais. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio O Poder Legislativo atuando para a generalidade, emitindo regras gerais e ambiental brasileiro. abstratas, abrindo espaço a atuação do Poder Executivo, que por meio de atos especiais Segue-se, na análise a princípio doutrina e legislação, tocante ao pelo age em prol de concretizar questões da vidadesocial, limitado pelo ato no geral praticado polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Legislativo. O Poder Judiciário teria atuação em caso de exorbitância de qualquer dos da proteção do meiofiscalizadora, ambiente, quem tem legitimidade para propor uma açãodentro poderes, em atuação imprimindo pressão a que cada um permaneça popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação de sua esfera 2012,quando p 218).em sua extensão define o 1 Popular (LAPde– competência. lei nº4.717/65)(DALLARI, a contundência que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Diante evoluções da sociedadepela que vigente criaram ordem novas exigências à limitação dispositivo ser tidodas como não recepcionado constitucional. dos poderes do Estado interpenetração destes, a nos indicar Comungada com esse percebe-se ponto de constante vista, a doutrina majoritária entende, como que a separação poderes alardeada em nossaMancuso, Constituição é apenas formal Jr., e aHely serviço de expresso nadelição de Rodolfo de Camargo Humberto Theodoro Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, uma dogmática que aliou essa doutrina à democracia. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger complexa, em que se habilitam distintas gerações de direitos corresponderNuma a um sociedade de fiscalizar. fundamentais a serem resguardados, o princípio de Separação de Poderes encontra um Sem maiores fica claro, permissa vaenia, que existe uma dilema que o expõe em obstinações, sua fragilidade. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em bojo, traz ade dirigência de sujeitos ações positivas do Estado para prover, A seu hermenêutica princípios à ponderação, impetra ao Judiciário dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo a qualidade de instância estrategicamente chamada a dirimir esses conflitos na estrutura mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É constitucional do Estado, e a Separação de Poderes que outrora se referia à mera repartição frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de competência, servindo ào própria limitaçãodeprecia do poder passa a ser espaço de que, quando lesionado, meio ambiente deestatal, forma consequencial o de discussão na seara dededireitos fundamentais e controle jurisdicional de políticas públicas, mínimo existencial todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! quando se busca a legitimidade de quem pode resolver, em última instância, obstáculos Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto levantados à concretização desses direitos. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em 3uma PODER JUDICIÁRIO, CRIATIVA E CONTROLE DE realidade comunitáriaHERMENÊUTICA e diversificada, expande os horizontes dos direitos eCONSTITUCIONALIDADE conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Há referências que emergem da obra de Maquiavel já considerando a
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos autonomia Judiciário que, dos como poder independente, agiria em nome próprio, ao patrimônio dado União, do Distrito Federal, Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. poupando a figura do rei - quando da intervenção de litígios – de lidar com aqueles que
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não tinham seus pleitos acolhidos. (DALLARI, 2012, p 216). Noutro giro, o debate político-jurídico contemporâneo faz referência a certa ascensão do Judiciário ao imprimir a rubrica do fenômeno de judicialização da política, caracterizado pela crescente intervenção desse Poder na tomada de decisões políticas que nos vinculam coletivamente. O Supremo, órgão de cúpula do Judiciário, galgou relevância a partir da República e o recorte histórico demonstra como ele mantém-se numa posição estratégica diante da arquitetura institucional dos poderes. Para buscarmos a raiz desta questão é necessário voltarmos ao período de redemocratização do país, via Constituição de 1988. A Constituição de 1988 representou um passo importante no sentido de garantir a independência e a autonomia do Judiciário. O princípio da independência dos poderes tornou-se efetivo e não meramente nominal. Foi assegurada autonomia administrativa e financeira ao Judiciário, cabendo a este competência para elaborar o seu próprio orçamento, a ser submetido ao Congresso Nacional conjuntamente com o do Executivo. No que se refere à estrutura, houve ampla reorganização e redefinição de atribuições nos vários organismos que compõem o Poder Judiciário (SADEK, 1995, p 10).
As decisões políticas da constituinte, ali delineadas, nos permitem reconhecer que a instituição judiciária passaria a figurar com centralidade e agir com uma repercussão tamanha na vida social e política. O tipo de sistema presidencialista adotado, imbricado ao princípio de separação e independência dos poderes teve seu peso nessa ampliação de potência do Judiciário. De um lado gerou fortalecimento do Legislativo, com ampliação de sua capacidade de fiscalizar e controlar o Executivo, de outro, facultou ao Executivo legislar por meio de medidas provisórias, tensionando os poderes. O resultado disso para o Judiciário foi o aumento de sua responsabilidade potencial de exercer a mediação política, e controlar a constitucionalidade dos atos legislativos e de governo. O argumento específico é que a forma de controle constitucional sempre ocupou lugar estratégico nessas mudanças e sua evolução, do sistema puramente difuso da Constituição de 1981 até o sistema híbrido que temos hoje, revela um outro aspecto, correspondente, desta difícil equação:
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a centralização de poderes no Governo central exigiu que também se
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE concentrasse a competência de TUTELA controle da AMBIENTAL constitucionalidade das leis
na instância superior do Judiciário, não porque o STF poderia ser melhor
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz controlado Poder central, mas porque a lógica da forma difusa era da ação popular no controle dos atospelo administrativos. Permanecem, contudo, certas com a desagregadora lógica de um Executivo forte, comandante das políticas dúvidas quando se trata incompatível em uma lógica dos meios de produção, do Estado. concentração são lados da mesma moeda. consumo e descarte, diante do Centralização crescimentoe vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio1997, ambiente, (ARANTES. p 67). da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Bem sabemos que o controle de constitucionalidade, na realidade brasileira, Segue-se, na análise Pode a princípio de doutrina e legislação,nonotrabalho tocantedeaoanálise não está restrito ao Judiciário. ser realizado pelo Legislativo, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais para das comissões, por exemplo, e pelo Poder Executivo, na figura do veto presidencial, da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação citarmos uma situação. Então, mesmo observada que essa distribuição da possibilidade popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação de exercer controle fale-nos, em 1 última análise, que toda essa engenharia institucional Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o tem objetivo fundamental prezar pelaésupremacia constitucional, é necessário que écomo cidadania, ao trazer que o título eleitoral a prova de cidadania, devendo este analisar queser hátido um como movimento de ampliação do vigente efeito das decisões de controle de dispositivo não recepcionado pela ordem constitucional. Comungada com esse ponto deprojeção vista, aultra doutrina entende, como constitucionalidade difuso, dando partesmajoritária em lugar do tradicional efeito inter expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Hely partes desse tipo controle, possibilitando o cabimento de reclamação Jr., constitucional Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, por certo efeito erga omnes. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponderIsto a um de fiscalizar. repercute em uma crescente “objetivação do controle” que acaba por conferir grande força à atividade jurisprudencial dos tribunais e, cada vez mais, alavancar Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma para o topo a atuação prática do Judiciário naanálise vida social. (LENZA, 2015, p. que 338). relevante incongruência normativa com toda estendida até aqui, visto a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Trocando as lentes para outro foco de análise, diremos que a ampliação dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo de direitos sociais da garantidos pela Constituição numhumana. movimento mote constitucional garantia de existência mínimadede1988, dignidade É de constitucionalização de direitos, também sucessivo aumento das áreas de frágil sustentar que a cidadania se propiciou resume à comprovação documental, no sentido atuação Judiciário na arena pública. de que, do quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Além disso, as transformações de caráter institucional desse Poder manobradas na Constituição ampliação da autonomia, somando Sendo ao fim e ao também cabo, talsignificaram restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de uma centralidade estratégica do Judiciário na vida social, o que reforça o protagonismo cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar político desse Poder e de seus integrantes: de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os ahorizontes dos direitos O STF, como órgão de cúpula, passou ter atribuições predominantemente e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo oTribunal constitucionais. Logo abaixo na hierarquia foi criado o Superior reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares de Justiça que incorporou parte das atribuições antes concentradas no STF. [...] O STF teve sua competência ampliada na área constitucional, tendo em legítima vista a para criação do amandado injunção de e onulidade considerável alargamento 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte pleitear anulação oudea declaração de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito do Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresnúmero de agentes legitimados a propor ação de inconstitucionalidade so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento a ele corresponda. (anteriormente atribuiçãoque exclusiva do procurador-geral da República). Foi
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também lhe dada competência para julgar originariamente as causas em que a magistratura é direta ou indiretamente interessada. (SADEK, 1995, p 11).
Nesse corolário de implicações do ganho de autonomia e força política do Judiciário, sucessivos têm sido os precedentes jurisprudenciais a reforçar que o papel desse Poder, na análise de casos concretos sobre a aplicação de políticas públicas, em verdadeira atividade criativa do magistrado - enquanto intérprete - não ofenderia o princípio basilar de separação de poderes. A via hermenêutica confere, muitas vezes, a proximidade acentuada entre julgadores e legisladores, apontando-nos que o avanço nesse debate de interpenetração de poderes, com ampliação da esfera de atuação do Judiciário, deve se direcionar a buscar, em verdade, os limites democráticos dessa interferência. [...] quando se fala dos juízes como criadores do direito, afirma-se nada mais do que uma óbvia banalidade, um truísmo privado de significado: é natural que toda interpretação seja criativa e toda interpretação judiciária ‘law-making’ [...] Mas a verdadeira discussão se inicia apenas neste ponto. Ela verte não sobre a alternativa criatividade, mas (como já disse) sobre o grau de criatividade e os modos, limites e legitimidade da criatividade judicial. (CAPPELLETTI, 1993, p 24-25).
Vejamos alguns direcionamentos recentes da jurisprudência da Corte: O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal.4.
O STF também já se pronunciou sobre a questão de conflito de interesses entre entes, admitindo como regra hermenêutica a interpretação conforme a Constituição: Compete ao Judiciário, no conflito de interesses, fazer valer a vontade concreta da lei [...]. Para isso, há de interpretar a lei ou a Constituição, sem que isso implique ofensa ao princípio da independência e harmonia dos Poderes 5.
4. RE 669.635 AgR, rel. min. Dias Toffoli, j. 17-3-2015, 2ª T, DJE de 13-4-2015 5. AI 410.096 AgR, rel. min. Roberto Barroso, j. 14-4-2015, 1ª T, DJE de 6-5-2015
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Em outra recente manifestação do Supremo, percebemos a influência do 5Judiciário AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL na imposição de políticas públicas: Não restam dúvidas quanto ao caráter deàcontrole popular direto e eficazde fazer, É lícito ao Judiciário impor Administração Pública obrigação da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, em estabelecimentos prisionais. Supremacia da da pessoa humana consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e dignidade multipolarizado 6 que legitima . das agressões sistemáticas ao meioa intervenção ambiente,judicial da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Essa relação de força da Corte constitucional opera-se não somente por parte da atividade em movimento, que legitima o STFnoa tocante realizar ao controle Segue-se,hermenêutica na análise a princípio de doutrina e legislação, jurisdicional de políticas públicas que isso observados infrinja princípio constitucional, polo ativo da demanda numa leiturasem da CRFB/88 os deveres comunais mas da proteçãosobremaneira, do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação delineia-se por meio da característica do controle de constitucionalidade popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação das por ele exercido. Em nosso sistema, o controle jurisdicional da constitucionalidade 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o leis se dá em um modelo híbrido, que acolhe a forma americana e europeia. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tidosecomo nãoresumo, recepcionado pela vigenteé que ordem constitucional. O que traz por nessa perspectiva, o Judiciário realiza tanto Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como controle concreto, em que a constitucionalidade de uma lei é observada por qualquer expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely magistrado, incidentalmente, quanto controle abstrato, aquele cuja demanda nasce Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, direto no Supremo e dispõe de um rol de legitimados ingressar compolítico as açõesdeespecíficas apenas haveria legitimidade genuína de pleitopara quando o direito eleger na busca de reconhecer de declarar a constitucionalidade ou arguir o corresponder a um deinconstitucionalidade, fiscalizar. descumprimento de um preceito fundamental. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma A introdução, pela Constituição de 1988, da açãoaté deaqui, inconstitucionalidade relevante incongruência normativa com toda análise estendida visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, ao por omissão (ADO) e o mandado de injunção, possibilitou ao Judiciário catapultar-se dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo centro de decisões políticas importantes que agravam a fragilidade dogmática da clássica mote constitucional separação de poderes.da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando ambiente deprecia forma consequencial o por Isto lesionado, porque, nao meio prática, uma ação diretadede inconstitucionalidade, mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! omissão de um ato legislativo necessário à aplicabilidade da lei, autoriza o STF a comunicarSendo o Legislativo, inclusive estipulando prazo razoável, para edição de norma. ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto Foi o que aconteceu com a ADO em relação à inércia Complementar paradefixação constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de de Lei restrição do conceito do procedimento de novos municípios, por exemplo. cidadania que nãode criação é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o 4reconhecimento CONCLUSÃOda pessoa humana e não humana como titulares Ao adentrarmos no paradigma do Estado Democrático de Direito, a teoria de separação de poderes logrou feição dogmática, positivada enquanto princípio 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 6. RE 592.581, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 13-8-2015, P, DJE de 1º-2-2016, com repercussão geral.
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constitucional em nossa Lei Maior. A despeito de todo o esquema doutrinário que busca reconhecer a atribuição do Poder Judiciário, sobretudo da Corte constitucional, resta-nos sopesar o poder da última palavra em consonância com nossas bases democráticas. É preciso pontuar: não é porque os ministros do STF não foram eleitos por sufrágio, como os parlamentares, por exemplo, que eles deixam de ter legitimidade. A legitimidade advém do próprio texto constitucional e a Constituição tem supremacia suficiente para tal. [...] princípio fundamental “todo poder estatal origina-se do povo” exige compreender não só o Parlamento mas também o Tribunal constitucional como representante do povo. A representação ocorre, decerto, de modo diferente. O Parlamento representa o cidadão politicamente, o Tribunal constitucional argumentativamente. […] A vida cotidiana do funcionamento parlamentar oculta o perigo que maiorias se imponham desconsideradamente, emoções determinem o acontecimento, dinheiro e relações de poder dominem e sejam cometidas faltas graves. Um Tribunal que se dirige contra tal não se dirige contra o povo senão, em nome do povo, contra seus representantes políticos. Ele não só faz valer negativamente que o processo político, segundo critérios jurídico-humanos e jurídicofundamentais, fracassou mas também exige positivamente que os cidadãos aprovem os argumentos do Tribunal se eles aceitarem um discurso jurídicoconstitucional racional. (ALEXY, 1999, p 55-56).
Assim, mesmo que funcionalmente falando, aqueles que envergam a toga não se prendam à adesão de vontade de uma maioria jurisdicional, isto não significa, por expressão de lógica mecânica, que eles estão autorizados a decidir pelo mero “livre convencimento do juiz”, a qualquer custo. Indo mais adiante, diremos que o exercício da hermenêutica constitucional atrelado à competência legítima do Judiciário de controlar as normas que têm validade no nosso sistema jurídico, não autoriza que diante dos casos, muitas vezes difíceis - que nos embaçam a visão entre Direito e Política - se operem decisões que lancem a estrutura democrática de organização do Estado - que tanto nos custou enquanto sociedade - a uma intervenção irônica de um único poder que dá a última palavra, e a partir daquilo mesmo que protege (a Constituição), utilize como instrumento de retórica. Parafraseando Gustavo Zagrebelsky (2011, p. 43), não podemos sacrificar
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os próprios valores democráticos desde que a sua morte se opere democraticamente. 5Temos, AÇÃOpois, POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL o maior limite institucional do Supremo Tribunal Federal. NãoEm restam dúvidas quanto ao caráter controlejulgador-legislador popular direto e eficaz outras palavras, é dizer que ode binômio é fato em da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas nossos tribunais, e a contribuição efetiva que podemos acrescer a este debate não é mais dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, se isto se opera ou não nadiante Justiçado brasileira, mas atévertiginoso que ponto o eguardião da Constituição consumo e descarte, crescimento multipolarizado pode manusearsistemáticas sua interpretação para,ambiente, ao dizer qual norma é válida ou não em das agressões ao meio da legitimidade do cidadão na nosso ordenamento, recortar princípiosdo fundamentais na órbita da vida social, ou propositura danão ação, para a ocupação polo passivoee,interfir sobretudo, na publicização desta atuação de cidadã com vistas à conservação do patrimônio talhar possibilidade a Constituiçãode a pretexto adequação dela ao clamor das ruas. ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao THE LAST WORD POWER : A PERSPECTIVE OF POLITICAL SCIENCE ANTE polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação CONSTITUTIONAL COURTS popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este ABSTRACT dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely The Brazilian constitutional court carries with it the power to guard the Constitution, legitimately invested Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, assigning resolve legitimidade conflicts on giving them de the pleito last word, from o thedireito constitutional apenas haveria genuína quando políticointerpretation. de eleger From the perspective of political science, on the border between law and policy, we will analyze the limits of corresponder a um de fiscalizar.
institutional assignment of the Supreme Court in the rule of law, and a discussion of time on the Brazilian Semwe maiores obstinações, fica claro, permissa que the existe uma judiciary crisis, revisit the theory of separation of powers whichvaenia, runs through course of history, relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a of the consecrated in the constitutionalist movement and is the ultimate dilemma in practical application CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, judiciary’s role in social life.
dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Keywords: Constitucional court. Separation of powers. Democracy documental, no sentido frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! REFERÊNCIAS Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar ALEXY, Direitos fundamentais no Estado Constitucional Democrático: de tutela Robert. de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada emrelação entre direitos docomunitária homem, direitos fundamentais, democracia e jurisdição uma realidade e diversificada, expande os horizontes dosconstitucional. direitos Revista de Direito Administrativo, n. 217. 1999. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares ARANTES, Rogério Bastos. Judiciário e política no Brasil. Sumaré-SP: Fapesp/Educ, 1997. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, Constituição ou com documentoda queRepública a ele corresponda. BRASIL. Constituição (1988). Federativa do Brasil.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
O TELETRABALHO E O DIREITO À DESCONEXÃO Camila Barbosa Almeida Melo*1
RESUMO O presente trabalho tem como objetivo analisar a realidade da proteção ao trabalhador que não cumpre sua jornada de trabalho no âmbito da empresa, tema este relativamente novo na seara trabalhista, haja vista a evolução da tecnologia. O teletrabalho configura-se um instituto de grande repercussão na saúde e segurança dos trabalhadores, pois a empresa passa a adentrar no âmbito pessoal do empregado, além de sua relevância para a ciência jurídica e social. Será abordado o conceito de teletrabalho, a figura da parassubordinação, e também haverá a análise do que seja o direito à desconexão e sua realidade no ordenamento jurídico brasileiro e a importância da limitação da jornada diária de trabalho. Todavia, o direito ao descanso, à desconexão completa do seu trabalho são imprescindíveis à vida saudável do empregado. Palavras-chave: Teletrabalho. Subordinação. Direito à Desconexão. Limitação da Jornada.
1 INTRODUÇÃO O modo de execução das atividades laborais sofre relevantes modificações com o passar do tempo, fazendo com que o homem se adapte às suas novas ferramentas de trabalho. A partir das evoluções tecnológicas, o mercado vislumbra transformações que afetam a seara trabalhista. O teletrabalho é uma novidade trazida por estas mudanças. O funcionário que antes estava vinculado ao ambiente físico da empresa na qual trabalha, hoje pode executar seus serviços na sua própria residência. Junto a esta comodidade surge a flexibilização da jornada de trabalho, fazendo com que a empresa esteja intimamente relacionada com o âmbito pessoal do empregado. O teletrabalho é uma realidade em ascensão no Brasil, especialmente nas regiões Sul e Sudeste e, apesar da dificuldade em se definir de forma clara e pacífica em virtude . Bacharel em Direito – ICF, advogada militante na comarca de São Francisco do Maranhão, pós-graduada em Direito do Trabalho. *
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da falta de norma regulamentadora sobre o tema, a doutrina utiliza alguns elementos 5ditos AÇÃO POPULAR COMOquais MEIO DIFUSO DE TUTELA como imprescindíveis, sejam, o trabalho realizadoAMBIENTAL a distância e o uso de meios de Não telecomunicação. restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, A proteção à intimidade e privacidade do teletrabalhador é um direitocertas individual, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, o qual consiste em não ser incomodado por intromissões externas em sua vida privada consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado que eventualmente possam lhe causar constrangimento. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na Dessarte, o Direito do Trabalho, sendo um instrumento de proteção propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo,garantidor na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio dos direitos humanos dos empregados, não deve se abster diante da flexibilização da ambiental jornada debrasileiro. trabalho dos funcionários que vivenciam esta realidade, mas sim integrá-los à proteção do limite da jornada de trabalho, sendo incabível pensar que não poderá haver Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao limitação da dificuldade de sedaidentificar jornada trabalhada. Aocomunais mesmo tempo polo ativodiante da demanda numa leitura CRFB/88aobservados os deveres em que se permite queambiente, o trabalho quem seja executado a distância, o controle deve ação ocorrer do da proteção do meio tem legitimidade para propor uma mesmo popular?modo. É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 PopularCom (LAPas– inovações lei nº4.717/65) a contundência quandomostra-se em sua extensão define o viável tecnológicas, o teletrabalho uma ferramenta que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este para reduzir ser custos competitividade empresarial. As transformações trazidas dispositivo tidoe aumentar como nãoa recepcionado pela vigente ordem constitucional. através desta com realidade a sociedade para uma revisão no tocantecomo às relações Comungada esse direcionam ponto de vista, a doutrina majoritária entende, existentes empregador. Todavia, oHumberto direito aoTheodoro descanso Jr., (à desconexão expresso naentre liçãoempregado de Rodolfoe de Camargo Mancuso, Hely Meirelles, que emtrabalho) síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, completa do seu são imprescindíveis à vida saudável do empregado. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Por ser umde ambiente mais confortável e flexível, o teletrabalho mostra-se um corresponder a um fiscalizar. elemento ameaçador às garantias trabalhistas galgadas pela humanidade, uma vez que a facilidadeSem de localização, execução efica comunicação poderávaenia, ressurgir nova ideia de maiores obstinações, claro, permissa queuma existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a escravidão: a tecnológica. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Apesar de sua evidente o tema abordado de é pouco difundido para dentre muitos, o meio ambienteimportância, como elemento compositor um complexo as pessoas de um modo geral. A de partir desse entendimento, a pesquisahumana. propostaÉ é uma mote constitucional da garantia existência mínima de dignidade importante oportunidade de fomentar as àreflexões acercadocumental, dos mecanismos existentes frágil sustentar que a cidadania se resume comprovação no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o de para que o direito à desconexão, ao trabalho possa, efetivamente, alcançar sua função mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! amparo. Somente através ações concretas de proteção tocante ao Sendo ao fim de e ao cabo, tal restrição aversaao àteletrabalhador diretriz que onotexto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de seu direito à desconexão, conseguiremos conter os abusos decorrentes de sua flexibilidade cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar na jornada de trabalho, de forma que é fundamental tomarmos conhecimento dos de tutela de legais matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em mecanismos a serem utilizados. uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa e não humana como titulares 2 SUBORDINAÇÃO E Ohumana TELETRABALHO 1. Art. 1.º Por Qualquer cidadão parte legítima para a anulação ou a declaração nulidade de atos meio da será subordinação, opleitear empregador controla o de empregado e lesivos impõe sua ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresvontade a ele. Quando não há subordinação, há autonomia, na qual o empregado presta so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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serviços utilizando suas próprias regras, não caracterizando relação de emprego. Os teletrabalhadores, diferente do que pensam, podem estar mais subordinados do que os empregados que laboram no ambiente físico da empresa, devido à utilização de tecnologias que permitem ao empregador fiscalizar seus empregados a distância e em tempo integral. Neste sentido, aduz Estrada: Como acontecia com o trabalhador a domicílio na época pré-industrial e agora com o moderno teletrabalhador com o computador pessoal volta-se a propor a falsa imagem de um trabalhador aparentemente livre de diretrizes e controles sobre a prestação, desvinculado dos ritmos de trabalho, aparentemente autônomo usuário de uma tecnologia da qual é o único gestor competente. Porém, esta visão, é às vezes só uma miragem, pois, encontramse submetidos a uma dependência tão intensa ou mais que se estivessem trabalhando nos locais da empresa. A utilização de novas tecnologias pode supor algumas vezes uma maior autonomia do teletrabalhador, mas também em vários casos o nascimento de um novo taylorismo via computador.1
Luiz Carlos Amorim Robortela2 acredita que “os equipamentos modernos permitem, a distância, a conexão permanente do trabalhador com a empresa; até as pausas, descansos e horas de atividade podem ser determinados previamente através do computador”. Ou seja, a volta ao lar presenciada nos dias de hoje não significa menos tempo na empresa, mas, ao contrário, a empresa chegando ao lar. Parte da doutrina acredita que o avanço tecnológico sujeita o empregado a maiores controles por parte do empregador. Assim acredita Gerhardt: Com o avanço das telecomunicações, via telefone celular ou telefax, institui-se a ‘telessubordinação’ ou ‘teledisponibilidade’, que não se compara ao trabalho em domicílio dos primórdios da industrialização. Os equipamentos modernos permitem, a distância, a conexão permanente do trabalhador com a empresa; até as pausas, descansos e horas de atividade podem ser determinados previamente através do computador. Por essa razão, seria temerário afirmar, como verdade absoluta, que o teletrabalho faz desaparecer ou diminuir a subordinação. Está demonstrado que pode tornar até mais amplo o poder diretivo da empresa. É claro que a subordinação 1. ESTRADA, Samuel Martín Pino. O Teletrabalho: breve análise jurídica. Justiça do Trabalho. São Paulo, v.21, nº248, 2006. p.155. 2. ROBORTELA, Luiz Carlos Amorim. O moderno direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1994. p.146.
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não é tipificada pela obrigação de cumprir horários ou prestar serviços em
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DEcom TUTELA AMBIENTAL determinado estabelecimento, observância de ordens e instruções superiores, exatamente porque tais atributos inexistem em algumas
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz situações. Mas certamente a novaPermanecem, tecnologia torna ainda mais irrelevantes da ação popular no controle dos atos administrativos. contudo, certas 3 circunstâncias. dúvidas quando se trata essas em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na A tecnologia permite que o do empresário acompanhe o trabalhador de qualquer propositura da ação, para a ocupação polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio lugar, podendo enviar instruções, cobranças, ordens, como se estivessem no mesmo ambiental brasileiro. lugar. Existem programas que registram os passos do empregado na rede, como o horário em que o mesmo ligou e desligou o computador, a duração de cada tarefa executada, suas Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao pausas, quantos minutos o mouse etc. os suadeveres própriacomunais ferramenta de polo ativo da demanda numa leitura permanece da CRFB/88estático, observados trabalho é usada para aambiente, sua fiscalização. distanciamento e da proteção do meio quem O tem legitimidade geográfico para proporentre umaempregado ação empregador não diminui a subordinação, gerenciamento de suas funções não resta popular? É possível destacar textualmentepois logoo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o comprometido. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este A análise do teletrabalho demanda um estudo atento ordem e aprofundado acerca do que dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente constitucional. se considera por trabalho realizado pessoa natural, subordinado, pessoal, não eventual Comungada com esse ponto de por vista, a doutrina majoritária entende, como eexpresso oneroso,nanão devendo ser resumido à verificação fatos em formas petrificadas lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, dos Humberto Theodoro Jr., Hely no Meirelles, emver síntese correspondem-se a ideiaanalisando de direitos ea deveres, ipso facto, tempo, masque sim, ampliados seus horizontes, íntima relação da pessoa apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político com seus direitos. Deve-se priorizar os fatos. De acordo com Fincato: de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, ficarumos claro,daspermissa quenotoriamente existe uma quando Face aos novos relações vaenia, de trabalho, relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto eque a influenciadas pela inserção das Tecnologias de Comunicação Informação, CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, vemos que alguns dos elementos caracterizadores da relação de emprego dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo podem estar, algumas oportunidades, um tanto tênues, rarefeitos, mote constitucional da garantia de em existência mínima de dignidade humana. É o que não exclui presença e apreciação4. documental, no sentido frágil sustentar que a cidadania se sua resume à comprovação de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! A subordinação poderá sim existir no teletrabalho, posto que a comunicação direta Sendo ao fim e ao cabo, restrição aversa à diretriz que o fazendo texto uso entre empregado e empregador pode tal ser substituída por contatos indiretos, constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de meios de comunicação. Essa diferente forma de comunicação não torna tão de aparente cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar a subordinação, tendo como consequência a contratação de muitos profissionais como de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em autônomos por comunitária subjugarem einexistir os elementos para ados configuração uma realidade diversificada, expandeessenciais os horizontes direitos da relação de emprego. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento pessoa humana humana como titulares Ademais,daimportante se faze não finalizar o debate sobre subordinação com o art. 6º, parágrafo único da CLT, modificado recentemente, o qual determina que os meios 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos 3. RobertadoColtro. Relação dedos emprego, e futuro: uma§ perspectiva em âmbito brasileiro. São ao GERHARDT, patrimônio da União, Distrito Federal, Estados,internet dos Municípios[...] 3º A prova dacrítica cidadania, para ingresPaulo. LTr. 2002. p.80 so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 4. FINCATO, Denise Pires. Teletrabalho: uma análise laboral. Justiça do Trabalho. São Paulo. V.20. nº 236. p.49.
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telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio. Em razão da presença de certa autonomia, alguns doutrinadores acreditam que a subordinação no teletrabalho se dá de forma mitigada, posto que os poderes do empregador são exercidos a distância. Todavia, teletrabalho não é profissão, mas uma modalidade de prestação de serviços. Tal como os empregados presenciais, que estão fisicamente mais próximos de seus superiores, a intensidade da subordinação varia de acordo com o caso concreto, sendo necessário delimitar a natureza e o grau de subordinação a qual pode ser executada mediante emails, webcam, além de escutas ambientais e sistemas mais sofisticados. 3 PARASSUBORDINAÇÃO O teletrabalho traz a ideia de distanciamento, dando a impressão de que não configuraria numa relação de emprego por haver divergências quanto à existência da subordinação. Parte da doutrina entende que no teletrabalho existe a figura da parassubordinação, ou seja, uma subordinação indireta, quando o empregado não está vinculado ao seu empregador de maneira pessoal, mas por meio de um computador. Essa subordinação possui feição de autonomia. Sérgio Pinto Martins defende a parassubordinação, pois aduz que “na telessubordinação, há subordinação à distância, uma subordinação mais tênue do que a normal. Entretanto, o empregado pode ter o controle da sua atividade por intermédio do próprio computador, por número de toques, por produção, por relatórios, etc.”5 Sobre o referido instituto, Alice Monteiro de Barros aduz: Os trabalhadores, nesse caso, não são subordinados, mas prestam uma colaboração contínua e coordenada à empresa e, por motivos fáticos e de desnível econômico, contratam seus serviços com estas em condições de inferioridade, sob a modalidade de contratos civis ou mercantis, como o de obra, prestação de serviços profissionais, transporte, etc., sem, entretanto, possuírem uma efetiva liberdade negocial. Propõe-se para o trabalho parassubordinado uma tutela adequada, sem a intensidade prevista no trabalho subordinado e sem a ausência de tutela eficaz que ainda caracteriza o trabalho autônomo.6 5. MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários à CLT. 7ed. São Paulo. Atlas. 2004. 6. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho, 2 ed. São Paulo: LTr, 2007, p.281.
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Na opinião de Amauri Mascaro Nascimento: 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quantoparassubordinado ao caráter de controle e eficazentre o O trabalho é uma popular categoria direto intermediária da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas autônomo e o subordinado, abrangendo tipos de trabalho que não se dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, enquadram em vertiginoso uma das duas tradicionais, consumo e descarte, diante do exatamente crescimento e modalidades multipolarizado entreaoas meio quais seambiente, situam, como representação comercial, o trabalho das agressões sistemáticas da alegitimidade do cidadão na dos outras atividades atípicas, quais o trabalho é propositura da ação, para profissionais a ocupação liberais do poloe passivo e, sobretudo, nanas publicização desta possibilidade de atuação com vistas à conservação do patrimônio prestadocidadã com pessoalidade, continuidade e coordenação. Seria a hipótese, ambiental brasileiro. se cabível, do trabalho autônomo com características assemelháveis ao trabalho subordinado.7
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao Importante ressaltar o ordenamento brasileiro não comunais possui previsão polo ativo da demanda numa que leitura da CRFB/88 jurídico observados os deveres da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação é dita acerca do instituto da parassubordinação. Ou seja, não há meio termo: ou a relação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação de trabalho ou de emprego. Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o Diante da instituto, deve-se visualizar a subordinação mediante que é cidadania, aofragilidade trazer que odo título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este outros prismas, casocomo contrário, haverá riscospela de se desproteger relação jurídica dispositivo ser tido não recepcionado vigente ordem uma constitucional. Comungada empregatícia.com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger 4 O TELETRABALHO corresponder a um de fiscalizar. Semomaiores obstinações, fica claro,vem permissa vaenia, os quemeios existedeuma Com passar do tempo, a sociedade aperfeiçoando evolução relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a do trabalho, buscando torná-lo menos penoso possível, e nesta evolução, surgiu o CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, teletrabalho, figura esta cada vez mais comum no ambiente laboral. O crescimento dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo dos urbanos da faz garantia com quedeo existência trabalho a mínima distânciadeseja interessante aos olhos motecentros constitucional dignidade humana. É do empregador, haja não haver a necessidade de deslocamento do no empregado frágil sustentar quevista a cidadania se resume à comprovação documental, sentido para de que, quando lesionado, o meiointernos, ambienteenxugamento deprecia de da forma consequencial o a empresa, diminuição de gastos infraestrutura da empresa, mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! representando uma alternativa de flexibilizar o trabalho. Vários intelectuais de décadas remotas previram o que ocorre nos dias de hoje, dentre eles, Monteiro Lobato, que assim Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto dispôs: constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima dedará cidadania eleitoral, especialmente se tratar O que se é o seguinte: o radiotransporte tornaráaoinútil o corre-corre de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada eme voltar atual. Em vez de ir todos os dias o empregado para o escritório uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos pendurado num bonde que desliza sobre barulhentas rodas de aço, fará ele e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o serviço em casa e o radiará para o escritório. Em suma: trabalhará à reconhecimento da pessoao seu humana e não humana como titulares 8 distância.
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres7. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 413. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 8. LOBATO, Monteiro. Onda verde: O presidente negro. 8. Ed. São Paulo. Brasiliense, 1957
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Durante o século XX, o mundo voltou seus olhos para a Ásia, a qual possuía uma empresa automobilística japonesa que criou um modelo de produção que poderia ser a salvação dos problemas enfrentados na época. Nessa empresa, adota-se uma linha de produção mais esguia, utilizando máquinas sofisticadas que reduzem o número de empregados, passando a investir mais no empregado em várias funções e mais complexas do que antes, requerendo maior qualificação. Este modelo é contrário ao conhecido fordismo, caracterizado pelo trabalho repetitivo e de pouca qualificação. O modelo em questão, toyotista, para eliminar custos, passou a usar o trabalho à distância, com a delegação de funções a terceiros, diminuindo o âmbito produtivo da empresa. Com o objetivo de garantir grande produção com menores custos e enxugamento do quadro de pessoal, concluiu-se que não seria necessário o deslocamento do trabalhador até a empresa, o que eliminaria despesas para ambas as partes. Diante desse pensamento, Estrada assevera: Com o teletrabalho já se permite a volta do trabalho em casa como acontecia com o artesanato, com a diferença de que, em vez das unidades produtivas (oficinas) estarem separadas estão unidas com a ajuda da telemática, devido a que a matéria-prima não são materiais e sim imateriais: as informações9.
O teletrabalho é uma forma de trabalho descentralizado, partindo do pressuposto de que vários trabalhos poderiam ser executados a distância, ou seja, nas casas dos trabalhadores ou em outra área da empresa ou seja, a sua configuração não determina um local específico para trabalhar, sendo definido de acordo com as peculiaridades das atividades envolvidas, além das necessidades da empresa. Além disso, a interferência tecnológica é uma das características centrais do teletrabalho. Etimologicamente falando, teletrabalho é a reunião das palavras grega e latina telou e tripaliare, as quais significam respectivamente, “longe” e “trabalho”. Pedreira também conceitua o referido instituto ao dizer que “Teletrabalho é a atividade do trabalhador desenvolvida total ou parcialmente em locais distantes da sede principal da empresa, de forma telemática. Total ou parcialmente, porque há trabalho exercido em parte na sede da empresa e em parte em locais dela distantes”10. Teletrabalho, também dito trabalho remoto, significa, literalmente, trabalho a distância. Concretamente, trata-se de trabalho que é realizado quando se está a utilizar equipamentos que permitem o trabalho efetivo tenha efeito num lugar diferente do que é 9. ESTRADA, idem, p. 143.
10. PEDREIRA. Pinho. O Teletrabalho. Revista LTr. São Paulo. V.64. nº 05. 2000, p.584. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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ocupado pela pessoa que o está a realizar. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Vale destacar que o teletrabalho requer profissionais dotados de capacidade autorregulatória, comdúvidas eficiência para desenvolver suas funções na direto ausência de superior Não restam quanto ao caráter deascontrole popular e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas hierárquico por perto para fiscalizar. O perfil do teletrabalhador dependerá do tipo de dúvidas se trata sendo em uma desagregadora meios deemprodução, serviço aquando ser executado, quelógica os mais comuns são osdos realizados casa. Exige-se consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado do trabalhador a distância uma maior mobilidade pessoal e autodisciplina, visto que está das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na longe dos olhares seusa ocupação superiores, desempenhar suasnaatividades de forma propositura da ação,depara dodevendo polo passivo e, sobretudo, publicização planejada, além de controlar o tempo a execução de suas tarefas. desta possibilidade de atuação cidadãpara com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. 5 VANTAGENS E na DESVANTAGENS Segue-se, análise a princípioDO de TELETRABALHO doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação o teletrabalho numa empresa em iniciais modificar relevante popular?Implantar É possível destacar textualmente logoconsiste nos artigos da de Leiforma de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define a forma de organização das funções empresariais, além da infraestrutura. Alémo disso, que é cidadania, ao trazernaque o título é a prova de cidadania, este cabe percebe-se alterações vida do eleitoral trabalhador, inclusive social. devendo Inicialmente dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. mencionar um dos principais benefícios do teletrabalho, qual seja, a flexibilidade do Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como horário Nessade perspectiva, Salomão Resedá dispõe: expressodonaempregado. lição de Rodolfo Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Falar em teletrabalho é reportar-se à ideia de flexibilização do tempo de corresponder a um de fiscalizar. exercício da atividade laboral. Há, portanto, o desaparecimento da divisão
outrora evidente o tempo destinado ao exercício profissão Sem maiores obstinações, ficaentre claro, permissa vaenia, que da existe umae aquele relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a como voltado para o lazer. Hoje em dia esta inserção pode ser interpretada CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, um prolongamento da jornada de trabalho. O que importa não é o tempo de dentre muitos, o meio ambiente como compositor 11 um complexo trabalho, mas sim aselemento metas a serem alcançadas.de mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, Neste quando lesionado, o meio ambiente deprecia forma consequencial o sentido, Almiro Eduardo e Valdete Soutode aduzem: mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Várias vantagens costumam ser apresentadas como decorrência do
Sendo ao fim eteletrabalho, ao cabo, dentre tal restrição aversadoà estresse; diretrizaumento que o do texto elas: diminuição bem-estar; constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito detrânsito maior disponibilidade para a família; solução dos problemas de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar e estacionamento (especialmente nas grandes cidades); diminuição de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em de despesas; possibilidade de poder o seudos ritmo de trabalho e, uma realidade comunitária e diversificada, expande oscontrolar horizontes direitos consequentemente, com mais tempo livre. e conceitos marginalizadores de primeiraterdimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoaEntretanto, humana para e não humana como titulares que essas vantagens possam ser percebidas também pelo empregado, e não somente pelo empregador, um elemento indispensável é 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres11. RESEDÁ, Salomão. Teletrabalho: novas oportunidades para o trabalho flexível: seleção de funcionários, benefícios e so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. desafios, novas tecnologias de comunicação. São Paulo. Atlas. 1996, p.45.
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que seja observada a limitação do tempo que é dedicado ao trabalho. Isso por que uma das desvantagens mais apontadas nessa forma de trabalho é a dificuldade em separar a vida profissional da vida pessoal, o que implica, a um só tempo, a ausência de limitação do tempo dedicado ao trabalho e, logicamente, a ausência de desconexão.12
Insta consignar que a mobilidade do empregado, ou seja, sua possibilidade de realizar suas tarefas nos ambientes antes improváveis, não significa que o mesmo não esteja à disposição do empregador. Nestes termos, Salomão Resedá aduz: Não se deve usar a liberdade do empregado, decorrente da mobilidade tecnológica, para justificar que este não está à disposição da empresa quando conectado a um laptop. O fato de ter mobilidade física, não quer dizer que este não esteja vinculado à empresa. Não se deve confundir a disponibilidade física com a disponibilidade virtual.13
Adriana Araújo Martins também cita alguns benefícios que o teletrabalho possui: I – eliminação ou redução do deslocamento casa-trabalho (tempo e distância); II – redução de gasto com combustível; III – redução ou eliminação do estresse do trânsito; IV – economia com vestimentas apropriadas ao local de trabalho; V – economia com as refeições e VI – aumento da qualidade de vida.14
O teletrabalho proporciona uma economia de tempo, além de reduzir desgastes psicológicos e físicos causados pelos grandes centros urbanos. Como o trabalho agora está sendo realizado em casa, pode-se dizer que as ideias estão mais tranquilas, tornando, assim, o trabalho mais produtivo e eficiente. Ainda existem benefícios para a sociedade, quais sejam, redução do número de veículos circulando nas ruas e redução da poluição. O empregado que não labora no ambiente físico da empresa possui maior tempo livre para dedicar-se ao lazer e à família. Ademais, aumenta-se a empregabilidade de pessoas portadoras de deficiência e mulheres que já tenham filhos, além da inclusão social 12. SEVERO, Almiro Eduardo de Almeida e Valdete Souto. Direito à Desconexão nas Relações Sociais de Trabalho. São Paulo: LTr, 2014, p. 54. 13. RESEDÁ, Salomão. O direito à desconexão: uma realidade no teletrabalho. Disponível em: http://www.buscalegis.ufsc. br/arquivos/trabalho3.lia.pdf Acessado em maio de 2015, p.13. 14. MELO, Adriana Araújo Martins. Teletrabalho: uma alternativa de organização do trabalho no Superior Tribunal de Justiça. 2009. 61 f. monografia (Conclusão de Curso de Especialização em Gestão Judiciária). Brasília. UNB, 2009, p.16.
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de trabalhadores com necessidades especiais, mas capazes de interagir na sociedade, 5tornando-se AÇÃO POPULAR COMOcom MEIO DIFUSO TUTELAà AMBIENTAL aptas a concorrer qualquer outroDE trabalhador vaga de emprego. Sob o prisma econômico, há uma diminuição de gastos esporádicos, como alimentação Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficazfora de casa, vestuário, etc., e recorrentes, combustível. da ação popular no controle dos atoscomo administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidasOquando se trata em uma lógica desagregadora de produção, empregador também presencia a diminuiçãodos de meios problemas relacionados à consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado ausência ao trabalho por motivos diversos e menor rotatividade de funcionários. Além das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na disso, passará exigir empregados vez mais especializados. propositura daaação, para a ocupaçãocada do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio Vale ressaltar que as próprias vantagens acima mencionadas podem acarretar ambiental brasileiro. malefícios para o empregado. Quanto à flexibilidade do horário, Adriana Araújo dispõe que “se o trabalhador não souber administrar o seu tempo, ele pode ultrapassar as horas Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao previamente seu local de trabalho que estaria dedicando à execução polo ativo da estabelecidas demanda numaemleitura da CRFB/88 observados os deveres comunais 15 de tarefas” . da suas proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular?Importante É possívelquestão destacarque textualmente logo nos artigos iniciais da Lei deve ser mencionada é a dificuldade quedeo Ação empregado 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o terá de se associar e sindicalizar, posto que trabalhará sozinho, sem o convívio com que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este outros empregados. portanto, perda dapela identidade dos indivíduos, dispositivo ser tido Haverá, como não recepcionado vigenteorganizacional ordem constitucional. pois não maiscom haverá comunicação entre eles. Como consequência, os empregados Comungada esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como terão menos de seusdeempregadores, haja Humberto vista a impossibilidade de reunião expresso“força” na liçãodiante de Rodolfo Camargo Mancuso, Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, daqueles. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Diantea da de se estar em sua residência, na maioria dos casos, há uma corresponder umvantagem de fiscalizar. certa dificuldade em se contabilizar o período em que o empregado trabalhou além da sua Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe jornada normal, ocasionando uma confusão entre os referidos ambientes e auma crescente relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto a e consequente possibilidade de se prolongar o número de horas trabalhadas.que O trabalho CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, executado na residência do trabalhador também exige auto-disciplina por parte do dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mesmo, pois deve-se,daagora, diferenciar o ambiente familiar do laboral.humana. É mote constitucional garantia de existência mínima de dignidade frágil sustentar queportanto, a cidadania se resume à comprovação documental, noossentido Altera-se, a estrutura familiar, pois, na maioria dos casos, empregados de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o em não possuem um ambiente adequado para a execução de suas atividades, acarretando mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! dificuldades para se concentrar. 16 Além umae desvantagem apresentada por àFincato éque o fato de que o Sendodisso, ao fim ao cabo, tal restrição aversa diretriz o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de pois empregado poderá se sentir isolado e receoso de não ser indicado a promoções, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar sua participação na empresa está menos visível, quando comparado aos colegas que de tutela de matériapresencial. ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em trabalham de modo uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos Cabemarginalizadores analisar que o de Estado possui maiores dificuldades fiscalizar as e conceitos primeira dimensão ao sustentar em em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares atividades com o aumento de teletrabalhadores no que diz respeito às normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, impedindo, desta forma, o cumprimento da legislação protecionista.
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres15. MELO, idem, p.27. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 16. FINCATO, idem, 2004, p.48.
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6 O DIREITO À DESCONEXÃO O trabalho está diretamente relacionado à existência humana, possuindo relevante valor social, sendo um dos fatores determinantes para uma vida digna, sendo também um elemento formador do ser social. O direito ao lazer, medida limitadora da jornada de trabalho, não consiste apenas numa questão de humanidade, mas também indispensável para que sejamos seres sociais e sociáveis. A evolução tecnológica traz imensuráveis pontos positivos para o empregado, empregador e até para a sociedade. Todavia, não poderá ser trazida ao ambiente de trabalho sem haver limites. O teletrabalho dificulta analisar as demonstrações do poder empregatício na relação de emprego, camuflando, em algumas vezes, a subordinação, e por consequência, a relação empregatícia. Em virtude disso, a doutrina defende o direito à desconexão, que nasce da moderna relação entre tecnologia e trabalho, consistindo no direito a não trabalhar ou a desconectar-se do seu trabalho para que este não o escravize, já que há uma linha tênue entre este e seus momentos de folga. De acordo com Mendonça, é o direito a “se desconectar completamente da empresa, ou seja, desligar o computador, o telefone, o bip, ou qualquer que seja o meio pelo qual ele se comunique com o seu empregador”.17 Em seu artigo “Do Direito à Desconexão do Trabalho”, Souto Maior aborda a importância do referido tema (importante mencionar no presente estudo que a expressão “Direito à Desconexão” foi criada por este doutrinador): A pertinência situa-se no próprio fato de que ao falar em desconexão faz-se um paralelo entre a tecnologia, que é fator determinante da vida moderna, e o trabalho humano, com o objetivo de vislumbrar um direito do homem de não trabalhar, ou, como dito, metaforicamente, o direito a se desconectar do trabalho. Mas esta preocupação é em si mesma um paradoxo, revelando, como dito, as contradições que marcam o nosso “mundo do trabalho”. A primeira contradição está, exatamente, na preocupação com um não trabalho em um mundo que tem como traço marcante a inquietação com o desemprego a segunda, diz respeito ao fato de que, como se tem 17. MENDONÇA, Talita Rodrigues. O Teletrabalho e o Direito à Desconexão como forma de garantir o gozo do Intervalo Intrajornada. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 6. Região. Recife, PE, v.19, n. 36, p. 238 jan/dez/2009.
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dito por aí à boca pequena, é o avanço tecnológico que está roubando o
5 AÇÃO POPULAR COMO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL trabalhoMEIO do homem, mas, porDE outro lado, como se verá, é a tecnologia que tem escravizado o homem ao trabalho. Em terceiro plano, em termos das
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz contradições, releva notar que se a tecnologia proporciona ao homem uma da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas quasedesagregadora infinita de se informar e de estar dúvidas quando se trata possibilidade em uma lógica dos meios de atualizado produção,com seu tempo, de lado, é esta vertiginoso mesma tecnologia que, também, escraviza o consumo e descarte, diante dooutro crescimento e multipolarizado das agressões sistemáticas ao em meio daselegitimidade dopara cidadão na espaço homem umaambiente, necessidade de manter informado, não perder propositura da ação, para no a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização mercado de trabalho. E, por fim, ainda no que tange às contradições que desta possibilidade de atuação cidadãimportante com vistas à conservação donopatrimônio o tema sugere, recordar que o trabalho, prisma da filosofia ambiental brasileiro.
moderna, e conforme reconhecem vários ordenamentos jurídicos, dignifica o homem mas sob outro ângulo, é eo legislação, trabalho que retira esta dignidade do Segue-se, na análise a princípio de doutrina no tocante ao homem, impondo-lhe limitesobservados enquanto pessoa na medida em que avança polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 os deveres comunais 18 propor uma ação da proteção do meio ambiente, tem elegitimidade para sobre a suaquem intimidade a sua vida privada.
popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer querealizada o título eleitoral é ado prova de cidadania, devendo este do Caso a fiscalização por parte empregador extrapole os limites dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. razoável, ultrapassando a vida privada do teletrabalhador, é justa a aplicação do jus Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como resistentiae. Como afirma Coutinho: expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Propugna-se hodiernamente não mais um suposto direito de resistir, mas corresponder a um de fiscalizar. um dever de desobedecer quando a ordem acarrete a prática de um delito, que cause dano à integridade moral ouvaenia, física do que empregado de outrem, Sem maiores obstinações, fica claro, permissa existeouuma que esteja em desacordo com as estendida regras de segurança higieneque do trabalho, relevante incongruência normativa com toda análise até aqui,e visto a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, sejam condutas nocivas ou gerem perigo grave, ou quem o ordena não dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexoincorrer tenha competência para a determinação, podendo o trabalhador mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É em responsabilidade pelo ato ilegal praticado. Igualmente restaria afastada frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido a necessidade de cumprimento ao cumprimento do de que, quando lesionado, o meio ambiente depreciadedeordens formaalheias consequencial o contrato, que tenham pertinência à vida particular do empregado, como, mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! por exemplo, afetem sua liberdade religiosa, suas ideias, sua vida sexual ou Sendo ao fim epolítica. ao cabo, tal restrição aversamas à não diretriz o texto Afinal, O trabalho pode ser dirigido, a vida que do empregado. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito desua vida o empregado não se despe da sua personalidade, não abre mão da cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar íntima ao celebrar com o empregador um contrato de trabalho.19
de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Referida da resistência, correlacionada ao direito desconexão é, mais uma vez, reconhecimento pessoa humana e não humana como àtitulares defendida por Souto Maior: 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos 18. Disponíveldaem: <htp://nucleotrabalhistacalvet.com.br/artigos/Do%Direito%20%C3%A0%20Desconex%C3%A3o%20 ao patrimônio União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresdo%20Trabalho%20%-%20Jorge%20Luiz%20Souto%20Maior.pdf> Acesso em 15 maio 2016. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 19. COUTINHO, Aldacy Rachid. Poder Punitivo Trabalhista. São Paulo: LTr 1999, p. 104-105.
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Na era da informática, o homem está sendo transformado em sua essência: está se criando o homem cibernético. Se não for, portanto, por uma questão de responsabilidade social, que se pense no problema da desconexão do trabalho, então, como uma forma do homem (enquanto gênero humano) encontrar-se a si mesmo, para que consiga ser pai, mãe, filho, amigo; para que leia livros, assista filmes, etc.; para que tenha tempo para rir, chorar, se emocionar... não se adquire a plenitude do ser sem o sentimento. Este sentimento, aliás, é essencial até mesmo para que, ao retornar ao trabalho, o trabalhador consiga, enfim, enxergar as pessoas que estão à sua volta. A distância do trabalho permite até mesmo que a pessoa se veja no trabalho e consiga, então, avaliar criticamente sua postura, o que é essencial para, por mais paradoxal que pareça, atingir uma melhor eficiência no trabalho, mesmo que não seja este propósito primordial da presente preocupação. Desconectar-se do trabalho, nesta perspectiva, é essencial até mesmo para que se possa tomar conhecimento da realidade dos problemas sociais e para se ativar na luta pela alteração dessa realidade.20
O empregador poderá exercer o seu poder sobre a prestação de serviços sem necessidade de desrespeitar os direitos do teletrabalhador, ou seja, pode-se fixar os mesmos limites impostos ao trabalhador presencial. É cabível até mesmo uma vigilância prévia e moderada, de modo impessoal, sobre ferramentas de comunicação à disposição do teletrabalhador (e-mail corporativo, por exemplo). Se faz necessária, portanto, uma regulamentação acerca dos limites impostos ao teletrabalhador, para não incorrer em insegurança jurídica. O teletrabalhador deve possuir um limite de jornada também. Havendo a contagem da jornada executada a distância, será possível estabelecer intervalos laborais. 7 O PODER FISCALIZATÓRIO NO TELETRABALHO O empregador possui uma série de prerrogativas decorrentes do contrato, com o objetivo de acompanhar a prestação de serviços e vigiar o ambiente de trabalho. No teletrabalho, o controle pode também ser exercido desconectado, por meio 20. SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Do Direito à Desconexão do Trabalho. Justiça do Trabalho. São Paulo, SP, v. 20, n. 238, 2003, p.22-23.
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de registros do tempo de trabalho efetivo, pausas e erros por meio do software. Há várias 5maneiras AÇÃO do POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE De TUTELA empregador fiscalizar o teletrabalhador. acordo AMBIENTAL com o caso específico, o controle poderá se intensificar, comparando-se ao trabalho presencial, umae eficaz vez que não Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto seria cabível a instalação dedos equipamentos intensivosPermanecem, de controle nocontudo, trabalhocertas presencial. da ação popular no controle atos administrativos. Em virtude disso,sedeve-se limites para que odos empregador extrapole de dúvidas quando trata emestabelecer uma lógica desagregadora meios de não produção, consumo e âmbito descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado seu poder no do trabalho a distância. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na A instalação de mecanismos depolo controle deverá ser feita com bastante cautela, propositura da ação, para a ocupação do passivo e, sobretudo, na publicização pois empregador correrá o riscocidadã de adentrar na esfera privada do empregado, atentando destao possibilidade de atuação com vistas à conservação do patrimônio contra a sua intimidade e dignidade. Não há motivos para se instalar aparelhos para a ambiental brasileiro. captação de áudios, vídeos e tempo ocioso do empregado, pois será inevitável o registro Segue-se, na análise a princípio depelos doutrina e legislação, nodo tocante ao de situações inconvenientes não abrangidos poderes de controle empregador. polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais SoutodoMaior da proteção meioassevera: ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o trabalho, esta situação só se justifica que é cidadania, ao trazer No queambiente o título de eleitoral é aevidentemente, prova de cidadania, devendo este nos dispositivo ser tido comorestritos não recepcionado pela vigente ordem constitucional. limites da manutenção da segurança. Fora deste limite, as câmeras Comungada com esse ponto vista, doutrina entende, como o que, servem de apenas paraa manter sob majoritária extremo controle o empregado, expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., evidentemente, não se insere dentro do poder de direção doHely empregador, Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, ferindo, por consequência o direito à intimidade do empregado. 21 apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Importante ressaltar que a violação à intimidade do trabalhador nãouma é o único Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe problema causado pelo normativa uso de meios de controle indevidos fiscalização relevante incongruência com toda análise estendida atépara aqui,avisto que a da execução intensa utilização meios para controlar o empregado CRFB/88,de emserviços. seu bojo,Atraz a dirigência dede ações positivas do Estado para prover,podem dentre muitos, meio ambiente como elemento compositor complexo ocasionar efeitoso psicológicos negativos no mesmo, levando-o de ao um medo, pois possui a mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É sensação de estar sendo observado e controlado a todo o momento. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido que o oreceio ser punido obriga trabalhador a laborar de que, Assevera-se quando lesionado, meio de ambiente deprecia de oforma consequencial o mais intensamente. O patrão passará a fornecer trabalho ejurídico. seu empregado mínimo existencial de todos os sujeitos domais ordenamento Todos! não poderá ter mais tempos ociosos, uma vez que a inércia também está sendo registrada. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto De acordo Resedá, “o fantástico mundo passa a transformarconstitucional noscom dá, dada a impossibilidade clarada detecnologia restrição do conceito de 22 se no vilãoque do próprio homem”.de Neste sentido, o referido autor diz: ao se tratar cidadania não é sinônima cidadania eleitoral, especialmente de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos Estar em própriodimensão ninho’, desfrutando do ambiente e conceitos marginalizadores de ‘seu primeira ao sustentar em seufamiliar bojo ofaz com o teletrabalhador não contabilize o tempo gasto diante dos afazeres reconhecimento da pessoaquehumana e não humana como titulares profissionais. A linha entre o lapso temporal destinado ao lazer e ao trabalho passa a ser tênue demais implicando na confusão entre estes dois ambientes,
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingres21. SOUTO MAIOR, idem, I2003, p. 21. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. 22. RESEDÁ. Idem, p. 163.
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o que certamente ocasionará uma real possibilidade de prolongamento da jornada de trabalho.23
Em razão disso, pode surgir a chamada escravidão tecnológica, a qual explica Viana: “O teletrabalho, que parece desconectar o empregado das ordens diretas do empregador, não o impede de sofrer cobranças constantes, através da própria máquina. Na verdade, a volta ao lar que hoje se ensaia não significa menos tempo na empresa mas – ao contrário – a empresa chegando ao lar.”24
Devido ao distanciamento físico entre empregado e empregador, o controle, muitas vezes, se dá por meio de metas. Sendo assim, o empregador aumentará o número de metas a serem cumpridas pelo teletrabalho, sob o argumento deste possuir mais tempo disponível. Em virtude disso, a falsa sensação de tempo livre do empregador e a intensa fiscalização, acarretam no aumento do domínio do empregador sobre seu empregado. 8 O DIREITO À DESCONEXÃO E A LIMITAÇÃO DE JORNADA DO TELETRABALHADOR Cabe destacar, inicialmente, que o empregador poderá exercer o seu poder sobre a prestação de serviços sem necessidade de desrespeitar os direitos do teletrabalhador, ou seja, pode-se fixar os mesmos limites impostos ao trabalhador presencial. É cabível até mesmo uma vigilância prévia e moderada, de modo impessoal, sobre ferramentas de comunicação à disposição do teletrabalhador (email corporativo, por exemplo). Se faz necessária, portanto, uma regulamentação acerca dos limites impostos ao teletrabalhador, para não incorrer em insegurança jurídica. É incabível cogitar a ideia de não ser possível a limitação da jornada de trabalho do teletrabalhador utilizando o argumento das dificuldades de se quantificá-la. O avanço tecnológico permite que, ao mesmo tempo em que se permite que a prestação de serviços seja realizada fora do ambiente da empresa, é possível que o controle seja feito do mesmo modo. Frise-se que o encargo de se provar as horas trabalhadas é do empregador. A grande problemática que envolve o tema em análise é a grande disponibilidade do teletrabalhador. Uma vez que o empregado possa exercer o seu serviço em qualquer lugar, desde que haja conexão por computador, haverá vinculação à empresa de forma 23. RESEDÁ, ibidem, p.164. 24. VIANA, Márcio Túlio. A proteção social do trabalhador no mundo globalizado; o direito do trabalho no limiar do século XXI. Revista LTr: Legislação do Trabalho. São Paulo, SP, v. 63, 1999, p. 888.
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virtual, existindo, dessa forma, uma maior disponibilidade ao empregador, e este, por sua 5vez, AÇÃO MEIO DIFUSO AMBIENTAL sairá POPULAR do ambienteCOMO da empresa e adentrará naDE vidaTUTELA do seu empregado. Todavia, o teletrabalho não dificulta a correta fiscalização acerca doecumprimento Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, dos intervalos. O teletrabalhador deve possuir um limite de jornada também.certas Havendo a dúvidas se trata em uma lógica desagregadora meios de produção, contagemquando da jornada executada a distância, será possível dos estabelecer intervalos laborais. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado Neste sentido, AlmiroaoEduardo e Valdete Souto aduzem: do cidadão na das agressões sistemáticas meio ambiente, da legitimidade propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio No trabalho prestado fora do ambiente da empresa, o trabalhador não está ambiental brasileiro. sob o controle direto do empregador, mas nem por isso pode ser obrigado a
Segue-se, na análise a princípio de constitucional doutrina e legislação, trabalhar além do limite de oito horasno portocante dia. Essaao afirmação polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres decorre do fato singelo de que a Constituição optou por comunais chancelar e alçar à da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação condição de norma fundamental a regra de limitação da jornada considerada popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 25 como parâmetro em vários países ocidentais. 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Do mesmo modo,ponto a exigência de utilização denominados “smartcomo fones”, por Comungada com esse de vista, a doutrinadosmajoritária entende, meio dosna quais empregado recebe o tempo inteiroHumberto e-mails relacionados trabalho, expresso liçãoo de Rodolfo de Camargo Mancuso, Theodoro Jr.,ao Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, implica evidente quebra do direito à desconexão, para o que a legislação trabalhista apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger sequer tem resposta adequada. corresponder a um de fiscalizar. Deve-se, portanto, adotar critérios de solidariedade, justiça, valorização do trabalho eSem da dignidade da pessoa humana, fazendo com que as regras sejam uma analisadas maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a sob a ótica da coletividade, em que o homem não é uma máquina, mas um ser no mundo. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É 9 CONCLUSÃO frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimoAs existencial os sujeitos do ordenamento Todos! formas de detodos execução do trabalho sofreramjurídico. diversas mudanças com o desenvolvimento da sociedade. Com a tecnologia, o empregado volta a trabalhar no seu aodefim e ao assalariada. cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto ambiente Sendo familiar, maneira constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de Com uma grande necessidade de se especialmente adaptar conceitos cidadania queisso, nãosurgiu é sinônima de cidadania eleitoral, ao eseregras tratarà nova de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada emque os realidade vivida, beneficiando, portanto, o trabalhador, não podendo desobrigar uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos avanços científicos cumpram com sua função social. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o Detentorda depessoa inúmeros atrativos, teletrabalho uma realidade e será cada vez reconhecimento humana e nãoohumana comoétitulares mais presente. Deve-se, portanto, abrir debates legislativos pautados em três temas: o enquadramento do teletrabalho nos requisitos da relação de emprego, sobretudo no que 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso emSEVERO, juízo, seráAlmiro feita com o título com documento que p. a ele 25. Eduardo deeleitoral, Almeida ou e Valdete Souto. Idem, 54. corresponda.
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diz respeito à subordinação e pessoalidade, os limites da fiscalização no ambiente de trabalho e a garantia dos trabalhadores presenciais aos que trabalham a distância, no que se refere ao controle da jornada laboral. Enquanto isso não corre, espera-se um alargamento dos conceitos, com o objetivo de enquadrar o teletrabalhador, posto que, muitas vezes, o empregador invade a vida privada do seu empregado com o intuito de controlar sua produção acarretando num trabalho desregrado, pairando, muitas vezes, numa escravidão virtual. Deve-se assegurar o registro da jornada do teletrabalhador, sendo este um dos objetivos mais perseguidos pelo trabalhador. A diminuição do estresse, o maior convívio com a família, a desnecessidade de se enfrentar o trânsito são os maiores atrativos do teletrabalho, todavia, não há apenas benefícios, infelizmente. A garantia de um tempo maior só ocorrerá se também lhe for garantido o direito a se desconectar do trabalho. O não trabalho, nos dias atuais, e principalmente na figura do teletrabalho, é um fator de resgate da natureza humana, posto que, na era da tecnologia, o homem está se tornando escravo da máquina. No teletrabalho, será papel do legislador evidenciar as relações de poder, repensando os institutos clássicos aos novos modos de produção sem se perder em seus enunciados. ABSTRACT This study aims to analyze the reality of protection to workers who do not meet their working hours within the company, this relatively new topic in labor harvest, given the evolution of technology. Telework sets up an institute of great impact on the health and safety of workers because the company will enter the employee’s personal level, as well as their relevance to the legal and social science. Will address the concept of telework, the figure of parassubordinação and there will also be an analysis of what the right to disconnect and its reality in the Brazilian legal system and the importance of limiting the workday. However, the right to rest, the complete disconnection of their work are essential to employee healthy life. Keywords: Telecommuting. Subordination. Right to Disconnect. Limiting Journey.
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Trabalho. São Paulo, v.21, n. 248, 2006. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL FINCATO, Denise Pires. Teletrabalho: análise laboral.popular Justiça direto do Trabalho. Não restam dúvidas quanto aouma caráter de controle e eficazSão Paulo. nº 236. da açãoV.20. popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante Relação do crescimento vertiginoso e multipolarizado GERHARDT, Roberta Coltro. de emprego, internet e futuro: uma perspectiva das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na crítica em âmbito brasileiro. São Paulo. LTr. 2002. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio JARDIM, Carla Carrara da Silva. O teletrabalho e suas atuais Modalidades. São ambiental brasileiro. Paulo: LTr/ Biblioteca LTr Digital 2.0, 2004. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo demandaOnda numaverde: leituraOda CRFB/88negro. observados deveres LOBATO,da Monteiro. presidente 8. Ed. os São Paulo.comunais Brasiliense, da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação 1957. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o MARTINS, Sérgio Pinto.que Comentários à CLT.é 7ed. SãodePaulo. Atlas.devendo 2004. este que é cidadania, ao trazer o título eleitoral a prova cidadania, dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. MELO, Adriana uma alternativa de entende, organização do Comungada comAraújo esse Martins. ponto deTeletrabalho: vista, a doutrina majoritária como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely trabalho no Superior Tribunal de Justiça. 2009. 61 f. monografia (Conclusão de Curso Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, de Especialização em Gestão Judiciária). Brasília. UNB, 2009. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. MENDONÇA, Talita Rodrigues. O Teletrabalho e o direito à desconexão como forma de garantir o gozo do intervalo intrajornada. Revista do Tribunal douma Trabalho Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia,Regional que existe da 6. Região. Recife, PE,normativa v.19, n. 36, 2009. relevante incongruência com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o Amauri meio ambiente umed.complexo NASCIMENTO, Mascaro.como Cursoelemento de direitocompositor do trabalho.de19. São Paulo: mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Saraiva, 2004. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o PEDREIRA. Pinho.de O todos Teletrabalho. Revista LTr. São Paulo. V.64.Todos! nº 05. 2000. mínimo existencial os sujeitos do ordenamento jurídico. ao fim e ao àcabo, tal restrição aversa à no diretriz que o texto RESEDÁ,Sendo Salomão. O direito desconexão: uma realidade teletrabalho. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/arquivos/trabalho3.lia.pdf> cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional 18 ed. Paulo: LTr, uma realidade comunitária e diversificada, expande ospositivo. horizontes dosSão direitos e2005. conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares RESEDÁ, Salomão. Teletrabalho: novas oportunidades para o trabalho flexível: seleção de funcionários, benefícios e desafios, novas tecnologias de comunicação. São 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Paulo. Atlas. 1996. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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ROBORTELA, Luiz Carlos Amorim. O moderno direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1994. SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Do direito à desconexão do trabalho. Justiça do Trabalho. São Paulo, SP, v. 20, n. 238, 2003. SEVERO, Almiro Eduardo de Almeida e Valdete Souto. Direito à desconexão nas relações sociais de trabalho. LTr, 2014. VIANA, Márcio Túlio. A proteção social do trabalhador no mundo globalizado; o direito do trabalho no limiar do século XXI. Revista LTr: Legislação do Trabalho. São Paulo, SP, v. 63, 1999.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
A VIOLAÇÃO DO BEM JURÍDICO TEMPO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO E A APLICABILIDADE DO INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL Ingrid Costa Melo de Sousa Sampaio*1 RESUMO O presente artigo tem por objetivo evidenciar a aplicabilidade do instituto da responsabilidade civil às situações em que o consumidor tem seu tempo pessoal violado. Parte-se do pressuposto de que o tempo é um bem relevante para o ser humano e, portanto, carecedor de tutela jurídica. Demonstra-se a possibilidade de enquadramento da violação do tempo como hipótese de dano indenizável bem como o modo de aplicação do consagrado instituto em demandas dessa natureza e seus efeitos práticos. Palavras-chave: Responsabilidade civil. Violação do tempo útil. Relação de Consumo.
1 INTRODUÇÃO As relações de consumo fazem parte do nosso dia a dia. Em poucos segundos são firmados contratos pela Internet, por exemplo. Junto às facilidades para aquisição de produtos e serviços, surgem os problemas de consumo. Produto que extrapola o prazo de entrega, serviço prestado em desconformidade com o contratado e cobranças indevidas são apenas alguns exemplos do que os consumidores enfrentam diariamente. Não bastasse o desconforto natural causado por essas situações, a solução para demandas dessa natureza costuma demorar. Os fornecedores de produtos e serviços investem bastante em campanhas publicitárias a fim de angariar clientes. Entretanto, quando o consumidor se vê diante de um problema os recursos parecem sempre escassos: o sistema está fora do ar, o funcionário do setor está ocupado, não há assistência na região. O tempo do consumidor parece não ter valor para o fornecedor. São inúmeras ligações, protocolos e reclamações até que um chamado seja atendido. Direitos básicos do consumidor são constantemente violados e surge a pergunta: não seria justa uma . Pós-graduanda em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura Federal no Rio Grande do Sul (ESMAFE-RS), Especialista em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e Bacharela em Direito pela Faculdade do Maranhão (FACAM); Técnica Judiciária no Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA); E-mail: ingridcmsampaio@gmail. com *
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uma reparação por esse tempo desperdiçado? 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL A frequência com que o consumidor é exposto a situações que desprezam o seu tempo exploram seus recursos fazdireto do tema relevante. Nãoe restam dúvidas quanto aoprodutivos caráter de indevidamente controle popular e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Uma solução é necessária e urgente a fim de coibir essa prática corriqueira no mercado dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, de consumo. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado O presente artigoao visa a explorar o entendimento doutrinário e jurisprudencial das agressões sistemáticas meio ambiente, da legitimidade do cidadão na já existente da a ação, fim depara evidenciar o tempo bem jurídico assim como destacar a propositura a ocupação do polocomo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas da à conservação do patrimônio possibilidade de aplicação do consagrado instituto responsabilidade civil na hipótese ambiental brasileiro. de violação do tempo útil (livre) do consumidor. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda da CRFB/88 observados deveres comunais 2 O TEMPO COMOnuma BEMleitura JURÍDICO E SUA TUTELAosNO ORDENAMENTO da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação JURÍDICO PÁTRIO popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Paratidodiscutir qualquer assunto pela no Direito, é necessário entender sua dispositivo ser como não recepcionado vigente ordem constitucional. relevância a sociedade, esta sua fonte criadora e principal área como de atuação. Comungadapara com esse pontopois de évista, a doutrina majoritária entende, Dentre várias coisas, o Direitodepreocupa-se com a tutela dos chamados bens. Mas afinal, expresso na lição de Rodolfo Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, o que é bem? apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger acordo com o dicionário Houaiss (2016), bem é “aquilo que traz alívio, corresponderDe a um de fiscalizar. vantagens, bem-estar”. (BEM, 2016). Sob uma perspectiva econômica, o mesmo Dicionário conceitua como “tudo que tem utilidade material, prática, Sem maioresbem obstinações, fica oclaro, permissa vaenia, que existe umae valor relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a fiduciário”. Do ponto de vista jurídico, o vernáculo é definido como “coisa, corpórea CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, ou incorpórea, da esfera econômica ou moral, suscetível de uma apropriação legal; tudo dentre muitos, o meio ambiente como compositor um complexo aquilo que é propriedade de alguém”. Deelemento maneira mais concisa,de o Dicionário Michaelis mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É (2016) atribui à palavra bem o significado de “benefício; proveito ou utilidade; frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido propriedade ou domínio”. de que, quando lesionado,(BEM, o meio2016). ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos doembora ordenamento jurídico. Todos! Sendo assim, percebe-se que, perpasse inúmeras esferas e assim seu conceito de algum modo sofra adaptações, falar em “bem” é falar em algo material ou Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto imaterial para onos qualdá,a coletividade atribui valorclara em razão das qualidades a ele inerentes constitucional dada a impossibilidade de restrição do conceito de ou por ele que disponibilizadas e que suscetíveleleitoral, de apropriação pelo homem. cidadania não é sinônima deécidadania especialmente ao se tratar de tutela deBem matéria ambiental. constituição como a do nossa, pautada eem jurídico, por seuUma turno, é bem de interesse ser humano que, por uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos consequência, interessa ao Direito. É tudo aquilo que pode constituir objeto de Direito e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o ereconhecimento que, por isso, merece atenção e tutela. da pessoa humana e não humana como titulares Na lição de Roxin:
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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[...] Podem-se definir os bens jurídicos como circunstâncias reais dadas ou finalidades necessárias para uma vida segura e livre, que garanta a todos os direitos humanos e civis de cada um na sociedade ou para o funcionamento de um sistema estatal que se baseia nestes objetivos. (ROXIN, 2009, p. 18-19).
Bem jurídico é, portanto, aquilo que proporciona ao homem, direta ou indiretamente, qualidade de vida. Cezar Bitencourt (2012, p. 44) reconhece que “os bens jurídicos são bens vitais da sociedade e do indivíduo, que merecem proteção legal exatamente em razão de sua significação social”. Essa assertiva reforça o pensamento de que o parâmetro valorativo do bem se encontra na sociedade. Diante dos conceitos apresentados, seria possível afirmar que o tempo é um bem jurídico? Ora, sem dúvidas o tempo traz a sensação de bem-estar e inúmeras vantagens para o homem. A ideia de tempo ultrapassa a simples unidade de medida de duração e se revela uma fonte de atividades que lhe trazem proveito e utilidades pessoais. Estudar, trabalhar, descansar, desfrutar da companhia de entes queridos e exercitar o corpo são exemplos de atividades que requerem tempo e trazem benefícios ao ser humano. Ademais, é indiscutível que o tempo é propriedade de cada indivíduo. Não é à toa que comumente utilizamos o verbo ‘ter’ ao nos referirmos a ele. O pensamento de apropriação é natural e até inconsciente. Por fim, é evidente que a coletividade atribui ao tempo grande valor, sendo a expressão “tempo é dinheiro” apenas uma demonstração simplista disso. Acerca dessa máxima quase universal – tempo é dinheiro – a física sueca Bodil Jönson apud Dessaune (2011) faz interessante crítica, defendendo não o dinheiro, mas o próprio tempo como padrão-ouro da vida. Em outras palavras, ela sugere que o tempo é o maior capital que o homem possui, pois pode ser convertido em dinheiro, em relações humanas, em interação com o meio ambiente, em conhecimento e em aprofundamento de sentimentos. Esse pensamento reforça ainda mais a ideia do tempo como um bem. Sendo assim, é possível dizer que o tempo é um bem que satisfaz as necessidades do homem e lhe proporciona qualidade de vida, sendo, portanto de interesse jurídico e carecedor de tutela. O renomado civilista Pablo Stolze corrobora esse entendimento:
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Na perspectiva mais difundida, “dinâmica” (ou seja, em movimento), o
5 AÇÃO POPULAR COMO DIFUSO AMBIENTAL tempo MEIO é um “fato jurídicoDE em TUTELA sentido estrito ordinário”, ou seja, um acontecimento natural, apto a deflagrar efeitos na órbita do Direito, como
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz já tivemos, a oportunidade de escrever: [...]. Emcertas perspectiva da ação popular no controle dos atosinclusive, administrativos. Permanecem, contudo, o tempodesagregadora é um valor, um relevante bem, de proteção dúvidas quando se trata “estática”, em uma lógica dos meios depassível produção, jurídica.do [Destaque nosso] Durante anos, a doutrina, especialmente aquela consumo e descarte, diante crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cuidou cidadão na dedicada ao estudo da responsabilidade civil, não de perceber a propositura da ação, para importância a ocupaçãododotempo polo passivo e, sobretudo, na publicização como um bem jurídico merecedor de indiscutível desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio tutela. Sucede que, nos últimos anos, este panorama tem se modificado. ambiental brasileiro. (STOLZE, 2016).
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais modo, o tempo,quem compreendido como relevante bem jurídico, deve ser da proteção Deste do meio ambiente, tem legitimidade para propor uma ação protegido violação por parte de terceiros. Ocorre que, apesar de da suaLei importância popular? Édapossível destacar textualmente logo nos artigos iniciais de Ação e da Popular – lei nº4.717/65) a contundência sua extensão protegido define o pelo evidente(LAP necessidade de tutela, 1esse bem jurídicoquando não foiem explicitamente que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este tenha ordenamento jurídico brasileiro. Todavia, isso não significa que seu valor tempo dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. passado despercebido pelo legislador. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como A Constituição no artigo 5º, inciso LXXVIII, dispõe: expresso na lição de RodolfoFederal, de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, corresponder a um de fiscalizar. garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
Sem maiores obstinações, claro, àpermissa vaenia,à igualdade, que existe uma e à inviolabilidadefica do direito vida, à liberdade, à segurança relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a propriedade, nos termos seguintes: CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, LXXVIII acomo todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a dentre muitos, o meio ambiente elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido sua tramitação. [Destaque nosso] de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Consagrado como princípio da razoável duração do processo ou da Sendo ao supramencionado fim e ao cabo, talvisa restrição à diretriz o texto celeridade, o artigo garantiraversa a efetividade do que processo para que constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de as partes envolvidas tenham seus conflitos dirimidos em tempo suficiente para cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar que a Justiça de de fatomatéria seja alcançada. de tutela ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande dos direitos A alteração constitucional trazida pela ECosnºhorizontes 45/2004 revela duas coisas: ea)conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o tão o tempo é essencial para satisfação do indivíduo; e b) o tempo vinha sendo reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares desrespeitado nos processos judiciais e administrativos e trazendo tantos prejuízos àqueles que ansiavam por soluções que se fez necessária uma garantia constitucional nesse sentido. Com isso, nota-se quepleitear o legislador reconhece a nulidade importância da rápida 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para a anulação ou a declaração de de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingressolução das demandas e consequentemente o valor do tempo (ou de seu decurso) para so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. o ser humano. 270
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A esse respeito, Mendes, Coelho e Branco afirmam: A duração indefinida ou ilimitada do processo judicial afeta não apenas e de forma direta a ideia de proteção judicial efetiva, como também compromete de modo decisivo a proteção da dignidade da pessoa humana, na medida em que permite a transformação do ser humano em objeto dos processos estatais. Dessarte, a Constituição conferiu significado especial ao princípio da dignidade humana como postulado essencial da ordem constitucional (art. 1º, III, da CF/88). [...] O Estado está vinculado ao dever de respeito e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas ou humilhações. (MENDES; COELHO; BRANCO, 2010, p. 597-598)
Segundo os autores, violar o tempo do ser humano, desrespeitando a duração razoável do processo, constitui ofensa à dignidade da pessoa humana. Sendo assim, cabe ao Estado proteger o indivíduo desse tipo de ofensa e humilhação. Embora o texto constitucional já revele bastante o valor dado ao tempo pelo ordenamento jurídico, ainda que indiretamente, ele não é o único. Para exemplificar, o Código de Processo Penal, no artigo 10, estabelece o prazo para conclusão de um inquérito. Art. 10 – O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.
O prazo determinado tem estreita relação com a liberdade do indivíduo que está sendo investigado. Não seria incorreto dizer que essa é a principal razão pela qual o Código estipula um tempo limite para conclusão do inquérito. No entanto, mesmo para o indiciado solto, há o prazo máximo de 30 (trinta) dias para conclusão do procedimento administrativo. Isso demonstra a preocupação do legislador com o mais breve desfecho da investigação a fim de evitar prejuízos em virtude do decurso do tempo no que tange: 1) às provas, que por vezes se perdem no decorrer tempo, 2) à vítima e à sociedade, que clamam por rápidos esclarecimentos e providências e para as quais lentidão é sinônimo de descaso; e 3) ao próprio indiciado, que não pode ficar ilimitadamente refém do procedimento investigativo. Nota-se, mais uma vez, a importância do tempo dedicado à resolução de determinada situação e o quanto o seu prolongamento pode gerar danos Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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ao indivíduo. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Nesse mesmo sentido, é possível citar o Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seurestam artigodúvidas 18, no qual determina o prazo máximopopular de 30 (trinta) para que Não quanto ao caráter de controle direto edias eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas o fornecedor solucione problemas relativos a vício de produto. Ao estipular esse prazo, dúvidas quando se em uma lógica dos meios de produção, o CDC concede umtrata período mínimo paradesagregadora o fornecedor resolver a demanda e máximo consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado para o consumidor suportar o infortúnio. É um tempo razoável para que ambas as partes, das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na dentro de suas respectivas limitações, enfrentem do vício de qualidade ou propositura da ação, para a ocupação do polo passivoa e,questão sobretudo, na publicização quantidade do produto. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. O legislador foi bem sucedido ao fixar simultaneamente o prazo para solução do vício e as medidas cabíveis em caso de descumprimento. Com isso, ele Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao expressa relevância tempo paradaoCRFB/88 ser humano, impondoosao fornecedor um tempo polo ativoada demandado numa leitura observados deveres comunais limite para que não seambiente, sujeite a quem exigências ainda maiores porpropor parte uma do consumidor. da proteção do meio tem legitimidade para ação Assim, é compelido a apresentar prazoda mais possível, popular?o fornecedor É possível destacar textualmente logouma nossolução artigos no iniciais Leibreve de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o trazendo o mínimo de prejuízos ao indivíduo por conta do lapso temporal. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Portido fim,como cumpre a Leipela estadual nº ordem 7.806/2002, que estabelece dispositivo ser nãomencionar recepcionado vigente constitucional. prazo máximocom paraesse o atendimento clientes de estabelecimentos bancários no Estado Comungada ponto de aos vista, a doutrina majoritária entende, como do Maranhão, conforme se constata no art.Mancuso, 1º da referida Lei: Theodoro Jr., Hely expresso na lição de Rodolfo de Camargo Humberto Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Art. 1º. Os estabelecimentos bancários que prestam serviços no Estado do corresponder a um de fiscalizar. Maranhão são obrigados a atender, no tempo máximo de trinta minutos,
Sem maiores obstinações, ficaestiverem claro, permissa que prestados existe uma os usuários que em fila paravaenia, os serviços no guichê. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a (MARANHÃO, 2002). CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É Observa-se, com esta Lei, a nítida valorização do tempono dosentido consumidor, frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, em específico. lei,ambiente o tempo máximo de 30 (trinta) minutos de que, quandoDeterminar, lesionado, opor meio deprecia de de espera forma consequencial o em uma existencial fila de banco uma resposta sensível ao anseio dos consumidores mínimo deétodos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! que podem e necessitam ser tratados com respeito pelos fornecedores. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto Com avanço tecnologia e a clara disponibilidade aparatos constitucional nosodá, dada adaimpossibilidade de restriçãode doinúmeros conceito de digitais queque tornam comunicação e o desempenho de especialmente atividades cadaaovez cidadania não éa sinônima de cidadania eleitoral, semais tratarrápido, adeespera emambiental. uma fila não temconstituição outra justificativa descaso por em parte dos tutelaexcessiva de matéria Uma como senão a nossa, pautada uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos fornecedores, nesse caso, as instituições bancárias. O atendimento rápido e eficiente é etotalmente conceitosviável, marginalizadores dimensão ao mostra sustentar em seu bojo o de modo quedeo primeira mandamento legal se coerente. reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Percebe-se, assim, que o tempo já vem sendo tratado pelo ordenamento brasileiro como bem jurídico relevante para o indivíduo e para sociedade. Tal tratamento, ainda que implícito, retrata o seu para valor para a coletividade e deserve como 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima pleitear a anulação ou a declaração nulidade de atosfundamento lesivos ao patrimônio União,específica, do Distrito Federal, dos Estados, Municípios[...] § 3º A provade da consumo. cidadania, para ingrespara a sua datutela sobretudo nodosâmbito das relações so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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3 A VIOLAÇÃO DO TEMPO COMO HIPÓTESE DE DANO INDENIZÁVEL E A APLICABILIDADE DO INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL NAS RELAÇÕES DE CONSUMO O decurso do tempo é inevitável, porém o modo pelo qual ele transcorrerá, ou seja, como ele será efetivamente utilizado, compete a cada indivíduo decidir. Nas relações consumeristas, contudo, o consumidor muitas vezes não tem a opção de decidir pela melhor utilização de seu tempo. Explico: o consumidor, com toda vulnerabilidade que lhe é inerente, se depara constantemente em situações em que é forçado a gastar seu tempo com problemas causados pelo fornecedor. Ao desperdício de tempo pelo consumidor, Dessaune (2011, p.11) dá o nome de “desvio produtivo do consumidor”. Ele explica que o ser humano é dotado de competências constitucionalmente protegidas – conhecimentos, habilidades e atitudes – e quando o consumidor se vê impelido a resolver problemas cotidianos criados pelos fornecedores, ele acaba redirecionando essas competências de modo indesejado. O tempo que o consumidor poderia investir em estudo, desenvolvimento pessoal, erudição, treinamento, experiência profissional ou em qualquer outra atividade de seu livre interesse (lazer, religião, descanso, convívio social, etc.) é involuntariamente desviado para a resolução de demandas de consumo. Fazer uma ou duas ligações para reclamar de falha na prestação de um serviço é aceitável, mas ficar preso em casa por vários sábados consecutivos aguardando que o fornecedor envie um técnico para aferir a qualidade do serviço e apresentar uma solução, não parece razoável. Há nítido desvio das competências (ou recursos produtivos) do consumidor. Dessaune (2011) explica que a missão implícita de todo e qualquer fornecedor é liberar os recursos produtivos do consumidor. Isso significa que o fornecedor deve dar ao consumidor um produto final que lhe possibilite empregar o seu tempo e as suas competências nas atividades de sua preferência, colaborando assim para sua existência digna. Quando o fornecedor coloca no mercado um produto ou serviço defeituoso ou viciado, ou ainda, quando exerce práticas abusivas, ele viola esse dever e ocasiona danos ao consumidor. Acerca do conceito de dano, Venosa ensina: Dano consiste no prejuízo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou coletivo, moral ou material, ou melhor, econômico ou não econômico. A noção de dano sempre foi objeto de muita controvérsia. Na noção de dano está sempre presente a noção de prejuízo. [...] Em concepção mais moderna,
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pode-se entender que a expressão dano injusto traduz a mesma noção
5 AÇÃO POPULAR COMO DIFUSO DE TUTELA de lesãoMEIO a um interesse, expressão que torna AMBIENTAL mais própria modernamente, tendo em vista o vulto que tomou a responsabilidade civil. (VENOSA,
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz 2009, 33, grifo nosso). da ação popular no controle dosp.atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado O autor explica ao quemeio o dano é geralmente associado àdoideia de prejuízo, à das agressões sistemáticas ambiente, da legitimidade cidadão na violação de da umação, interesse. tempo édoum interesse. e vantajoso para propositura para a O ocupação polo passivo Ée, importante, sobretudo, naútil publicização odesta homem. O fornecedor que extravia tempovistas do consumidor lhe causa prejuízo, lesa o possibilidade de atuação cidadão com à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. seu interesse e consequentemente lhe causa dano. A despeito da falta de tutela de explícita doetempo pessoal do indivíduo Segue-se, na análise a princípio doutrina legislação, no tocante ao no ordenamento jurídico brasileiro, queda para alguns juristas seriaossuficiente para afastar seu polo ativo da demanda numa leitura CRFB/88 observados deveres comunais enquadramento conceito de dano, cumpre que opara instituto da responsabilidade da proteção do no meio ambiente, quem tem salientar legitimidade propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigosde iniciais Lei de Ação civil sofreu evoluções que possibilitaram o surgimento novasdahipóteses de danos 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o indenizáveis. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Schreiber explica fenômeno da erosão dos filtros tradicionais da reparação, dispositivo ser tido como nãoo recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, segundo o qual os pressupostos da responsabilidade civil relacionados àcomo imputação expresso de Rodolfo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely do dever na de lição indenizar (culpade e Camargo nexo causal) perderam relevância em virtude “de uma Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, certa ascensão daquele elemento que consiste, a um só tempo, no objetivo e na ratio da apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger reparação: o dano” (2014, p. 83). corresponder a um de fiscalizar.
Nota-se que o dano de per si torna-se protagonista, sendo elemento claro, vaenia, quedos existe suficienteSem paramaiores atrair aobstinações, atuação das fica cortes empermissa amparo às vítimas maisuma variados relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a no infortúnios. O alargamento da definição de dano fundamenta-se especialmente CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, princípio da dignidade pessoa como humana, o qual compositor atua como cláusula geral de tutela dentre muitos, o meio da ambiente elemento de um complexo da personalidade. Nesse contexto, perfeitamente possível, e já vemhumana. inclusiveÉ sendo mote constitucional da garantia deéexistência mínima de dignidade reconhecido porque alguns tribunais dano decorrente da perda do frágil sustentar a cidadania se pátrios, resume ào comprovação documental, no tempo sentidoútil do de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o consumidor. mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Admitindo-se a violação do tempo nas relações de consumo como hipótese de dano indenizável, surge o questionamento de como aplicado instituto da Sendo ao fim e então ao cabo, tal restrição aversa à seria diretriz que oo texto responsabilidade constitucional noscivil dá, nesse dada caso. a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania especialmente se relações tratar de Levando em consideração que eleitoral, a responsabilidade civilaonas de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em consumo em regra é objetiva, os pressupostos para oos surgimento dever de reparar uma realidade comunitária e diversificada, expande horizontesdodos direitos são: conduta,marginalizadores dano e nexo de de causalidade. Sendo a perda do tempo dano, e conceitos primeira dimensão ao sustentar emútil seuobojo o quais seriam as condutas necessárias paraeanão aplicação instituto? reconhecimento da pessoa humana humanadocomo titulares A responsabilidade civil nas relações de consumo condiciona-se à existência de fato do produto ou serviço, de vício do produto ou serviço ou de práticas abusivas por parte do 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos fornecedor. portanto, condutas praticadas pelos capazes de ensejar ao patrimônio daEssas União,são, do Distrito Federal,asdos Estados, dos Municípios[...] § 3º fornecedores A prova da cidadania, para ingreso dano decorrente dao perda do tempo livre do consumidor. Dessaune esclarece: so em juízo, será feita com título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Em outras palavras se um fornecedor violar o seu dever jurídico originário – fornecendo ao consumidor um produto ou um serviço viciado/defeituoso –, ou mesmo se aquele cometer outros atos ilícitos – especialmente expondo este a uma prática abusiva legalmente vedada – e, em qualquer dessas hipóteses, ocasionar um “desvio produtivo” ao consumidor, entendo que nascerá para o primeiro, em tese, o dever jurídico sucessivo de indenizar tal dano que causou ao segundo, da mesma maneira que surgirá para este o direito subjetivo de exigir daquele uma compensação pecuniária compatível com o prejuízo irreversível que sofreu. (DESSAUNE, 2011, p. 135).
Por fim, é fundamental a relação de causalidade entre a conduta praticada pelo fornecedor e o desvio produtivo do consumidor. Isto é, o fato ou o vício do produto ou serviço ou a prática abusiva do fornecedor devem causar transtornos à rotina do consumidor, de modo que este é compelido a gastar seu tempo na resolução do problema. Ilustrando, o consumidor que adquire impressora que reproduz de forma desalinhada e com machas está diante de uma violação do dever jurídico originário do fornecedor, o qual colocou no mercado um produto com vício de qualidade. Nesse caso, deve o fornecedor sanar o vício no prazo de trinta dias. Caso isso não ocorra, o consumidor pode, por exemplo, exigir a substituição do produto por outro da mesma espécie em perfeitas condições de uso. Embora a situação narrada pareça simples e de fácil solução, no dia a dia pode se transformar em um grande problema. O fornecedor se nega a receber o produto para conserto sob a justificativa de que o problema foi causado por mau uso. Depois de algumas tentativas, aceita encaminhá-lo para assistência técnica. Semanas se passam e nenhum posicionamento é dado. Expira o prazo de trinta dias. O consumidor aguarda mais. Insatisfeito, requer a troca do produto, porém o fornecedor se recusa alegando que ele deve aguardar o retorno da assistência. O produto é entregue e, com pouco tempo, apresenta o mesmo problema. Aborrecido, o cliente pede o dinheiro de volta e o ciclo se reinicia. São inúmeros telefonemas, e-mails e idas ao estabelecimento até que o problema seja solucionado. Não restam dúvidas de que o consumidor é lesado não apenas pelo inconveniente de comprar um produto com vício, mas principalmente pelo tempo gasto até que uma solução seja de fato apresentada. Vale destacar recente decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais: APELAÇÃO CÍVEL - DANO MORAL - RELAÇÃO DE CONSUMO - TROCA DE PRODUTO - PERDA DE TEMPO - DESVIO DE PRODUTIVIDADE - LESÃO A DIREITO DE PERSONALIDADE. Não sendo o vício do produto sanado no prazo legal pode o consumidor optar pela substituição deste por outro da mesma espécie, em perfeitas
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condições de uso (inteligência do artigo 18 do CDC). Sofre lesão a direito
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL de personalidade o consumidor submetido à verdadeira via crucis para tentar exigir do fornecedor o cumprimento de sua obrigação,
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz consistente entrega do bem adquirido de acordo com as especificações da ação popular no controle dos atosna administrativos. Permanecem, contudo, certas e em desagregadora perfeitas condições uso. Adeperda de tempo do dúvidas quando se trata contratadas em uma lógica dosdemeios produção, consumidor antes tratada como mero aborrecimento começou a ser consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meioindenizável ambiente,por daparte legitimidade do cidadão considerada dos Tribunais de Justiça,navez que propositura da ação, para não a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização são raros os casos em que o consumidor é tratado com extremo desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio descaso pelo Fornecedor. [Destaque nosso] A indenização por danos ambiental brasileiro. morais deve ser fixada com observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. casos dee responsabilidade contratualaoos juros Segue-se, na análise a princípio deNos doutrina legislação, no tocante de mora incidem a partir daobservados citação. (TJ-MG - AC: 10145120165884001 polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma açãoCâmaras MG, Relator: Estevão Lucchesi. Data de Julgamento: 23/05/2014, popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Cíveis /114ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 30/05/2014).
Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser como não recepcionado pela vigente constitucional. De tido acordo com esse julgado, percebe-se que ordem o penoso trajeto percorrido Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como pelo consumidor até ver seu problema solucionado – isto é, ter em mãos produto expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr.,um Hely sem qualquer – constitui lesão a direito de personalidade. O julgador Meirelles, quevício em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso reforça facto, que, antigamente, a perda de tempo do consumidor considerada aborrecimento, apenas haveria legitimidade genuína de pleitoera quando o direitomero político de eleger mas corresponder de fiscalizar. hoje é hipótesea um de dano indenizável em razão do descaso e despreparo dos fornecedores. Outro julgado, desta vezfica do claro, Tribunal de Justiça do Rio Janeiro, Sem maiores obstinações, permissa vaenia, quedeexiste umareforça que a resistência do fornecedor emcom solucionar problema referente a vício relevante incongruência normativa toda análise estendida até aqui, visto de queproduto, a consiste emem conduta ensejadora de dano de moral: CRFB/88, seu bojo, traz a dirigência ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É AGRAVO APELAÇÃOdocumental, CÍVEL. TELEVISÃO. VÍCIO DO frágil sustentar que a cidadania se INOMINADO. resume à comprovação no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o PRODUTO. GARANTIA ESTENDIDA. NEGATIVA DE DEVOLUÇÃO mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! DA QUANTIA PAGA, SUBSTITUIÇÃO E CONSERTO DO PRODUTO. CONDUTA ABUSIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. PERDA
Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto DO TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR. QUEBRA DA CONFIANÇA. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de A responsabilidade civileleitoral, do fornecedor de produto defeituoso independe cidadania que não é sinônima de cidadania especialmente ao se tratar da comprovação de culpa de qualquer dos componentes da cadeia de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como um a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos de consumo, porquanto objetiva e elidida apenas se comprovada a e conceitos marginalizadores de primeira dimensão sustentar em moral, seu bojo o excludente do nexo causal. [...] É ao geradora de dano a resistência reconhecimento da pessoainjustificada humana e do nãofornecedor humana de como titulares bem de consumo durável, em substituir
o produto ou devolver o valor do preço pago, em desrespeito aos direitos do consumidor hipossuficiente, compelido a recorrer ao Poder 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos para ter resguardado§ 3º direito previsto em ao patrimônio da União, do Distrito Judiciário Federal, dos Estados, dos Municípios[...] A provaexpressamente da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. lei. Hipótese que não se amolda ao mero inadimplemento contratual.
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[Destaque nosso] Conhecimento e desprovimento do Agravo Inominado. (TJ-RJ - APL: 00040935620098190011 RJ 0004093-56.2009.8.19.0011, Relator: DES. ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA, Data de Julgamento: 16/04/2013, NONA CAMARA CIVEL, Data de Publicação: 02/08/2013)
Situação semelhante ocorre quando o fornecedor coloca no mercado produto ou serviço que não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, ocasionado o denominado acidente de consumo, e, procurado para tomar providências acerca do acontecimento – produto ou serviço defeituoso – demora de maneira excessiva. Importante observar que fato é o prejuízo extrínseco ao bem, ou seja, aquilo que sai da esfera do produto ou serviço e atinge ao consumidor. Exemplo de fato do serviço é a demora na expedição de carta de anuência para a baixa de protesto de título já quitado. Sabe-se que cabe ao devedor a baixa do protesto, mas para isso ele precisa da carta de anuência do credor. Se este não expede a carta, fica o consumidor impossibilitado de promover a baixa no protesto, o que equivale à manutenção indevida em cadastros de inadimplentes, visto que causa o mesmo efeito. O prejuízo, nesse caso, não diz respeito ao produto ou serviço. Trata-se de dano que vai além, isto é, atinge ao consumidor que é quem sofre diretamente os efeitos da manutenção indevida do protesto. Vejamos: CONSUMIDOR. PROTESTO. CARTA DE ANUÊNCIA. DEMORA NA EXPEDIÇÃO. FATO DO SERVIÇO. DANO MORAL. VALOR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. 1. Constitui fato do serviço a demora na expedição de carta de anuência para a baixa de protesto de título já quitado, apto a ensejar dano moral pela injusta permanência da inscrição. [Destacou-se] 2. A reparação de danos morais razoável e proporcional deve ser mantida. 3. Recurso conhecido, mas improvido. 4. Recorrente vencido arcará com custas processuais. Sem honorários eis que ausentes contrarrazões. (TJ-DF - ACJ: 20140310105777 DF 0010577-71.2014.8.07.0003, Relator: FLÁVIO AUGUSTO MARTINS LEITE, Data de Julgamento: 26/08/2014, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Publicação: Publicado no DJE: 27/08/2014. Pág.: 259)
Se o consumidor, tendo quitado o débito, dirige-se ao fornecedor para comunicar o pagamento e requerer a carta de anuência e este pede prazo para entrega da carta mas não o cumpre, de modo que consumidor é compelido a reforçar o pedido reiteradamente até que a solicitação seja atendida, verifica-se a ocorrência de desvio produtivo do consumidor. Há, portanto, dever de indenizar por dois motivos: a) pela Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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injusta permanência da inscrição após a quitação do débito (fato do serviço); e b) pelo 5tempo AÇÃO POPULAR MEIO TUTELAde AMBIENTAL livre gasto pelo COMO consumidor paraDIFUSO o simplesDE recebimento uma carta de anuência (dano decorrente da perda do tempo útil). Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Porno fim, elucidando a possibilidade de responsabilização civil por perda do dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, tempo útil decorrente de prática abusiva pelo fornecedor, temos a situação corriqueira consumo diante do de crescimento vertiginoso e multipolarizado de inclusãoe dedescarte, seguros em faturas cartão de crédito ou conta telefônica, sem que o das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na consumidor solicite ou autorize voluntariamente. Esses seguros geralmente garantem propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização odesta pagamento de indenização emcidadã caso decom perda de renda, morte oudo invalidez, cobertura possibilidade de atuação vistas à conservação patrimônio em caso debrasileiro. roubo do cartão, proteção à imóvel residencial e participação em sorteios ambiental mensais de prêmios. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao os CRFB/88 benefícios,observados se o serviço é fornecido e cobrado polo ativo daEmbora demandasejam numamuitos leitura da os deveres comunais sem solicitação resta configurada a prática abusivapara constante artigo da proteção do prévia, meio ambiente, quem tem legitimidade propor no uma ação39, III, do CDC. É Por outro lado, se otextualmente consumidor adquire serviçoiniciais persuadido pelo fornecedor, popular? possível destacar logo noso artigos da Lei de Ação Popular lei nº4.717/65)1 aseja contundência quando em sua aextensão define sem que(LAP essa –verdadeiramente sua vontade, verifica-se ocorrência da oprática que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo vedada no inciso IV, do artigo 39, do CDC, a qual consiste em prevalecer-se daeste fraqueza dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. ou ignorância do consumidor. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como TendodeoRodolfo consumidor constatado o fornecimento serviço não solicitado, expresso na lição de Camargo Mancuso, Humbertode Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, como no caso narrado, ele normalmente entra em contato com o fornecedor para que apenas legitimidade pleitopela quando o direito epolítico de eleger exclua haveria o serviço, haja vistagenuína que nãodeoptou contratação por óbvio não deseja corresponder a um de fiscalizar. sua continuidade. Ocorre que o fornecedor, embora exercendo evidente prática abusiva, insiste emSem enumerar as obstinações, vantagens dofica produto serviço para nãoque atender maiores claro,oupermissa vaenia, existea solicitação uma do cliente.incongruência Este, então, normativa reforça o com pedido cancelamento, que éque protelado relevante todainicial análisedeestendida até aqui,o visto a pelo fornecedor inúmeras maneiras. de Técnica bastante comum é apara transferência CRFB/88, em seudebojo, traz a dirigência ações positivas do Estado prover, de dentre o meio ambiente comofuncionários elemento compositor de um complexo ligaçõesmuitos, entre diferentes setores, cujos a cada instante tentam convencer o mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É consumidor a permanecer com o produto/serviço não requisitado. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido O consumidor se exonera ou serviço indesejado de que, quando lesionado, odificilmente meio ambiente depreciadodeproduto forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! logo na primeira tentativa. São vários contatos por chat, e-mail, serviço de atendimento ao consumidor (SAC), e às vezes até pessoalmente, até que a reclamação seja deferida. Sendoalém ao fim e ao cabo, tal abusiva restriçãonoaversa à diretriz que o otexto O fornecedor, de cometer prática mercado de consumo, que por si constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de só já é um ilícito, dificulta sobremaneira a pretensão do consumidor de permanecer cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar apenas com queambiental. efetivamente Com isso, a rotina do consumidor de tutela deaquilo matéria Umapactuou. constituição comoaltera a nossa, pautada em euma desperdiça seucomunitária tempo por conta de uma prática que sequer deveria ter realidade e diversificada, expande os horizontes dosacontecido, direitos por eexpressa conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o vedação legal. reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares A violação do tempo pessoal do consumidor se caracteriza pelo desgaste físico e mental por ele suportado em razão de fato ou vício do produto/serviço ou em virtude adoção de prática abusiva pelo fornecedor. indivíduo deixa de deatos desempenhar 1. Art. 1.ºda Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ouO a declaração de nulidade lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresatividades de sua preferência e exercer suas competências como melhor lhe convém, so em juízo, será feitaatenção com o título eleitoral, com documentoque que ana elemaioria corresponda. desviando sua para um ou contratempo das vezes sequer contribuiu 278
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para que ocorresse. Assim, tendo em vista as inúmeras dificuldades enfrentadas pelo consumidor, acentuadas pela conduta não colaborativa do fornecedor, a perda do tempo livre, hoje, é considerada dano indenizável e não mais um mero aborrecimento, sendo necessária tão somente a demonstração do nexo de causalidade entre a conduta do fornecedor e o dano, qual seja: o desperdício do tempo. 4 OBJETIVOS E EFEITOS PRÁTICOS DA APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL NA HIPÓTESE DE PERDA DO TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR É bem verdade que muitos consumidores são vencidos pelo cansaço, aceitando as imposições dos fornecedores e os empecilhos por eles colocados quando chamados à solução de conflitos de consumo. Contudo, uma parcela ainda pequena de consumidores busca o Judiciário a fim de ver respeitado e reparado o seu tempo pessoal. Mas, quais seriam os objetivos e efeitos práticos das decisões que asseguram essa reparação pelo tempo perdido? A decisão que julga procedente o pedido de indenização por perda do tempo útil do consumidor visa, em primeiro lugar, reparar o prejuízo sofrido por aquele consumidor específico. Ou seja, compensar o tempo por ele desperdiçado em razão mau atendimento dispensado pelo fornecedor. Em segundo plano, a decisão visa promover respeito ao tempo do consumidor (coletividade), uma vez que o reconhece como bem carecedor de tutela jurídica e cuja violação enseja reparação civil. Assim, ao condenar o fornecedor, evidencia-se que sua conduta não está de acordo com os princípios norteadores das relações de consumo, estimulando-o a adoção de outra postura. Nesta senda, objetiva-se a prevenção de danos futuros, aplicando o caráter punitivo pedagógico da responsabilidade civil. Uma das consequências mais alarmantes do julgamento favorável de ações desse tipo é o aumento descontrolado do número de demandas e o abarrotamento do já sobrecarregado Judiciário brasileiro, uma vez que as situações narradas como ensejadoras de perda do tempo útil são vivenciadas por um contingente enorme de consumidores todos os dias. Se consumidores e advogados em geral percebem que ações semelhantes estão sendo julgadas procedentes, é possível que a quantidade de ações pleiteando reparação pelo tempo desperdiçado suba vertiginosamente. Todavia, antes de considerar essa consequência negativa o suficiente para justificar a improcedência de todas as ações indenizatórias da perda do tempo útil do consumidor, deve-se ponderar as demais consequências das decisões favoráveis. Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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Dessaune (2011) explica que a falta de tutela jurídica das situações de 5desvio AÇÃOprodutivo POPULAR MEIO DE TUTELA AMBIENTAL do COMO consumidor temDIFUSO quatro efeitos: a) propagação e banalização dessas situações perniciosas; b) continuidade e agravamento paulatino dessas situações Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz danosas no mercado de consumo; aumento do nível de frustração, irritação e estresse da ação popular no controle dos atosc)administrativos. Permanecem, contudo, certas do consumidor afastamento do consumidor sua busca por realizar-se dúvidas quandobrasileiro; se trata emd)uma lógica desagregadora dosdemeios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado como ser humano. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na Assim, concluirdo quepolo a decisão assegura a na reparação pelo tempo propositura da ação, pode-se para a ocupação passivoque e, sobretudo, publicização livre a propagação, de condutas danosas destadesperdiçado possibilidadeevita de atuação cidadã banalização com vistas àe agravamento conservação do patrimônio por parte dos fornecedores e compensa a frustração, irritação e estresse do consumidor, ambiental brasileiro. promovendo seu bem-estar e dignidade como ser humano. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao que aleitura aplicação do instituto da responsabilidade na hipótese polo ativo daConclui-se demanda numa da CRFB/88 observados os deveres civil comunais de do consumidor temlegitimidade caráter compensatório principalmente, da violação proteção do dotempo meio útil ambiente, quem tem para propore, uma ação preventivo, almejando que, textualmente por meio daslogo decisões favoráveis promovido popular? É possível destacar nos artigos iniciaisseja da Lei de Ação mais 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em suao extensão o equilíbrio nas relações consumeristas. Busca-se especialmente bem-estardefine e a dignidade que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este do consumidor, os quais têm estreita relação com o modo pelo qual seu tempo é utilizado. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely 5 CONCLUSÃO Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger relações de consumo fazem parte do nosso dia a dia. Rapidamente corresponderAs a um de fiscalizar. firmamos contratos, adquirimos produtos e serviços, somos expostos a ofertas e Sem Em maiores fica claro, permissa vaenia,de que existe uma publicidades. ritmoobstinações, também crescente surgem os problemas consumo, os quais relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a não costumam ser resolvidos em tempo hábil. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Os ofornecedores não demonstram preocupação em de solucionar depressa os dentre muitos, meio ambiente como elemento compositor um complexo problemas que lhe são Os consumidores, outro lado,humana. são obrigados mote constitucional daapresentados. garantia de existência mínima por de dignidade É afrágil gastar na solução demandassede consumo o tempo quedocumental, poderiam realizar outras sustentar que de a cidadania resume à comprovação no sentido de que, quando meiocontexto, ambientesurge deprecia de forma consequencial o atividades de seulesionado, interesse. oNesse a discussão quanto à possibilidade mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! de reparação do tempo desperdiçado pelo consumidor na resolução de problemas de consumo. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nosdemonstrado dá, dada a impossibilidade clara restrição do conceito de uma Resta que o tempo é um bemdejurídico merecedor de tutela, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar vez que pertence ao indivíduo, gera a sensação de bem-estar, satisfaz as necessidades de tutela edeé facilmente matéria ambiental. Uma constituição nossa, pautada em da humanas convertido em vantagens de como cunhoamaterial ou não. Apesar uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos ausência de marginalizadores previsão legal específica, a proteção do tempo é evidenciada em diversos e conceitos de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o dispositivos normativos, Constituição Federal. reconhecimento da pessoainclusive humana na e não humana como titulares Nas relações de consumo verifica-se constante afronta ao chamado tempo útil do indivíduo, isto é, ao tempo pessoal e livre de cada consumidor. Por essa razão, 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos surge a necessidade de intervenção estatal na figura do Estado-juiz para assegurar ao ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresconsumidor práticas comerciais so em juízo, será feita com o título eleitoral, oueficientes. com documento que a ele corresponda.
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Com tantos avanços tecnológicos e com a rotina atribulada característica do século XXI, a perda do tempo útil pelo consumidor não se trata de mero aborrecimento, mas de hipótese de dano indenizável, como bem vem adotando parte dos tribunais brasileiros. Condenar civilmente o fornecedor que ignora o tempo do consumidor e não coopera para que suas solicitações sejam atendidas, desviando seus recursos produtivos e limitando sua liberdade – de administrar convenientemente seu tempo, de desempenhar seus afazeres, de investir em relações afetivas, conhecimento ou lazer – é medida necessária para que essa prática já tão corriqueira não se perpetue sob formas ainda mais desrespeitosas. Embora julgadores e doutrinadores mais tradicionais ainda encontrem resistência em aplicar o instituto da responsabilidade civil em matérias dessa natureza, este é certamente um grande passo na promoção do respeito e valorização do consumidor. VIOLATION OF TIME IN CONSUMER RELATIONS AND THE APPLICABILITY OF CIVIL LIABILITY ABSTRACT This article aims to show the applicability of civil liability institute to situations where the consumer has his personal time violated. It starts from the assumption that time is relevant for humans and therefore needs legal protection. It demonstrates the possibility of the violation of time be considered a hypothesis of compensable damage as well as the way of application of the liability institute in cases like this and its practical effects. Keywords: Civil liability. Loss of useful time. Consumer relationship.
REFERÊNCIAS BEM. In: Grande Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Disponível em: <http:// houaiss.uol.com.br/busca?palavra=bem>. Acesso em: 10 ago. 2016. BEM. In: Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portuguesportugues&palavra=bem>. Acesso em: 10 ago. 2016. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
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5BRASIL. AÇÃO POPULAR DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL ConstituiçãoCOMO FederalMEIO de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz constituicaocompilado.htm>. em: 18 ago 2016. da ação popular no controle dosAcesso atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, BRASIL. 3.689,do de 3crescimento de outubro de 1941. Código de Processo Penal. consumo Decreto-Lei e descarte, nºdiante vertiginoso e multipolarizado Disponivel em:sistemáticas <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689.htm>. das agressões ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na Acesso em: da 18ação, ago 2016. propositura para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. DESSAUNE, Marcos. Desvio produtivo do consumidor: o prejuízo do tempo desperdiçado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais MARANHÃO. n° ambiente, 7.806, de 26 de dezembro de 2002. para Dispõe sobreuma sanções da proteção do Lei meio quem tem legitimidade propor ação administrativas a estabelecimentos bancários infratores do direito do consumidor. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Disponível em:– <http://www.procon.ma.gov.br/estadual/>. em: 18define ago 2016. Popular (LAP lei nº4.717/65)1 a contundência quando emAcesso sua extensão o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este MENDES, COELHO, Inocêncio BRANCO, Paulo Gustavo dispositivo Gilmar ser tidoFerreira; como não recepcionado pela Mártires; vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, Gonet. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em correspondem-se a ideia direitosdoe deveres, ipso facto, ROXIN, Claus. A síntese proteção de bens jurídicos comodefunção Direito Penal. 2. ed. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. corresponder a um de fiscalizar. SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas responsabilidade civil: da erosão Sem maiores obstinações, fica claro,dapermissa vaenia, que existe uma dos filtros à diluição dos danos. 5. ed. São Atlas,estendida 2013. até aqui, visto que a relevante incongruência normativa comPaulo: toda análise CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, STOLZE, Pablo. Responsabilidade civil pela perdacompositor do tempo. Disponível em: <http:// dentre muitos, o meio ambiente como elemento de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É jus.com.br/artigos/23925>. Acesso em: 10 ago. 2016. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando meio ambiente deprecia de forma o VENOSA, Sílviolesionado, de Salvo. oDireito civil: responsabilidade civil. consequencial 9. ed. São Paulo: mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Atlas, 2009. Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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SENTENÃ&#x2021; AS
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
Processo n. 682-45.2014.8.10.0022 Requerente(s): Ministério Público do Estado do Maranhão Requerido(s): Gleide Lima Santos e outros
“[...] 2. Trata-se de ação civil pública em que se alega que os requeridos (ora recorrentes) à época, respectivamente, Prefeito, Secretário Municipal do Meio Rural e Secretário Municipal de Planejamento, Infra-estrutura e Meio Ambiente - permitiram a utilização de vários veículos e máquinas de propriedade da Municipalidade, bem como do trabalho de servidores públicos, para a realização de serviços particulares no interior da “Granja Jacqueline”, de propriedade do genitor do alcaide [...] 5. Não se pode perder de vista que o uso da coisa pública em benefício particular, mormente em situações de que acabam levando a agressões físicas a particulares e a seu patrimônio (destaques nos trechos acima recortados), subverte de maneira grave e indelével a figura do gestor do erário em gestor do patrimônio privado, aniquilando, em suas raízes mais essenciais, a premissa do mandato político conferido pelo povo através das eleições. [...] (Trechos extraídos do julgamento do REsp 1013275/SC - Relator(a) Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA - Data do Julgamento 17/08/2010 - Data da Publicação/ Fonte DJe 20/09/2010).
SENTENÇA 1. RELATÓRIO: Trata-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO em face de GLEIDE LIMA SANTOS e OUTROS, todos já devidamente qualificados nos autos em epígrafe. O Parquet alega que o cidadão Sininger Vidal de Oliveira Neto formulou representação acompanhada de uma mídia em CD, que contém vídeos de obras
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de recuperação de estradas sendo realizadas por maquinário a serviço da Prefeitura de 5Açailândia AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA no que seria a Fazenda Copacabana, situada na zonaAMBIENTAL rural deste Município, de propriedade de Davaldísio Moreira dos Santos e da prefeita Santos. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popularGleide direto Lima e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas que,uma primeiramente, foi ajuizadados umameios ação de e apreensão dúvidas quando seRelata trata em lógica desagregadora debusca produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado (processo n. 4532-44.2013.8.10.0022), na qual foi determinada preliminarmente uma das agressõesnosistemáticas ao do meio ambiente, da da medida, legitimidade do cidadão na de averiguação imóvel, antes deferimento de sorte que o Oficial propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Justiça teria constatado a realização de obras recentes de terraplanagem nos locais desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio apresentados nos vídeos, embora já não houvesse no local, veículos ou funcionários. ambiental brasileiro. queafoi instaurado o Inquérito Civil n. 02/2013 – 1ª PJ/AÇAI Segue-se,Informa na análise princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais para a apuração das supostas ilicitudes, no qual se procedeu à oitiva de testemunhas que da proteção do meio ambiente, de quem tem legitimidade para propor uma ação teriam confirmado a realização melhoramentos em estrada que somente dá acesso popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação à sede da fazenda, bem como no curral da propriedade, fazendo uso das máquinas e Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o motoristas da Prefeitura. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. que a de equipe (dos quaisentende, três sãocomo servidores Comungada com Aduz esse ponto vista,dea motoristas doutrina majoritária expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely efetivos do Município de Açailândia) realizou as obras durante trinta dias no povoado Meirelles, que em síntese a ideia de direitos e deveres, ipso facto,as três Novo Bacabal, onde ficacorrespondem-se a fazenda mencionada, tendo como ponto de partida apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger vias de acesso do imóvel da prefeita. corresponder a um de fiscalizar. O MPobstinações, estima os prejuízos causados ao erário emque R$ 160.315,69 Sem maiores fica claro, permissa vaenia, existe uma(cento erelevante sessentaincongruência mil, trezentosnormativa e quinzecom reaistoda e sessenta e nove centavos), considerando o análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, custo de aluguel dos veículos, o salário mensal dos operadores, e o custo do combustível dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo consumido na operação. mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Imputa aos demandados prática das ilicitudes: a)oGleide de que, quando lesionado, o meio ambientea deprecia deseguintes forma consequencial Lima esposa do proprietário doordenamento imóvel beneficiado gestora pública do mínimoSantos, existencial de todos os sujeitos do jurídico. eTodos! Município de Açailândia, teria se locupletado ilicitamente com a valorização de seu Sendo ao do fimuso e ao cabo, tal restrição aversa diretriz que o texto imóvel decorrente de máquinas e do trabalho de àservidores públicos (art. 9º, constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de IV, e art. 10, XIII, da Lei n. 8.429/92); e teria violado os princípios da impessoalidade cidadania que nãonaé Administração sinônima de cidadania tratar b) e da moralidade Públicaeleitoral, (art. 11,especialmente caput, da Leiao n. se 8.429/92); de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Wagner de Castro Nascimento, secretário municipal infraestratura e urbanismo, uma realidade comunitária e diversificada, expande osdehorizontes dos direitos responsável pelo planejamento das obras de recuperação de estradas vicinais e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o no Município, teriada incluído no programa via como que serve exclusivamente de acesso reconhecimento pessoa humana e não uma humana titulares à nova sede da Fazenda Copacabana, permitindo o uso dos bens públicos em proveito de particular (art. 10, XIII, da Lei n. 8.429/92); e teria violado com a mesma conduta 1. 1.º Qualquer que cidadão será partealegítima para pleitear a anulação ou a (ar. declaração de atos lesivos os Art. princípios regem Administração Pública 11, de danulidade Lei n. 8.429/92); c) ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresAdão Gomes da Silva, assessor técnico do Gabinete da Prefeita, teria atuado como so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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encarregado de obras, agindo com autonomia ao determinar a extensão das obras ao curral da propriedade, com a colocação de piçarra em seu interior, assim incorrendo em violação do art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92); d) Dalvadísio Moreira Santos, esposo da prefeita e também proprietário da fazenda, que acompanhava a realização das obras, estaria equiparado aos agentes públicos (art. 3º, da Lei n. 8.429/92) ao concorrer para a prática do ato de improbidade descrito ou dele se beneficiar (art. 9º, IV; art. 10, XIII; e art. 11, caput, da Lei n. 8.429/92). Requer a condenação dos requeridos nas penas do art. 12, da Lei n. 8.429/92, consoante as condutas imputadas. Instrui a exordial com documentos, às fls. 21-367. Os réus foram devidamente notificados (fls. 370-377v.) para a apresentação de defesa preliminar. Wagner Nascimento apresentou a sua manifestação às fls. 382-416, acompanhada de documentos às fls. 417-451, e os demais demandados se manifestaram em petição única, às fls. 457-473. A decisão de recebimento da inicial foi proferida às fls. 480-482. Os réus foram então citados, conforme mandados e certidões de fls. 483-489. O requerido Wagner Nascimento junta cópia do agravo de instrumento interposto contra a decisão de recebimento da petição inicial, às fls. 491-511. Gleide Santos, Adão da Silva e Dalvadísio dos Santos apresentam contestação, às fls. 513-527, em suma, argumentando: a) que o inquérito civil instaurado pelo MP foi motivado pelo CD de vídeos entregue de forma anônima, o que demonstraria a precariedade dos documentos que instruem a inicial; b) que as obras foram realizadas em benefícios de vários povoados da região para efeito de escoamento da produção rural e de mobilidade; c) que denúncia contra a prefeita tem o intuito de denegrir a sua imagem política; d) que o Ministério Público não demonstrou o elemento subjetivo dos atos de improbidade (dolo ou culpa); e) que não ficou caracterizado prejuízo ao erário; f) que o inquérito foi inaugurado com base em vídeos realizados dentro de propriedade privada, o que atesta a sua ilicitude; g) que os vídeos foram gravados de forma anônima, e seriam prova ilícita, que contamina todo o conteúdo do processo, por aplicação da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, e; h) que foram violados os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa, do sigilo e da
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impossibilidade de auto-incriminação. Assim pugnam pela improcedência dos pedidos. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Pordúvidas seu turno, Wagner Nascimento na peça Não restam quantooaoréu caráter de controle populardefende-se direto e eficaz contestatória 529-544, sustentando, em síntese: a) que contudo, planejoucertas e escolheu da ação populardenofls. controle dos atos administrativos. Permanecem, por meioquando de critérios técnicos as lógica estradas vicinais contempladas os serviços de dúvidas se trata em uma desagregadora dos meios com de produção, consumo e descarte,nodiante crescimento vertiginoso e multipolarizado reparo e manutenção ano dedo 2013; b) que a maioria das estradas vicinais previstas das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão no projeto de recuperação passa por dentro de propriedades privadas, sendo,naporém, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização consideradas servidões rurais de utilidade pública; c) que não deu ordem para que se desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio executassem serviços em estrada de acesso ou dentro do curral da Fazenda Copacabana; ambiental brasileiro. d) que Adão Silva agia ao seu bel prazer, sem cumprir o cronograma elaborado pela SecretariaSegue-se, de Infraestrutura que tem esubordinados não cumprem na análisee Urbanismo; a princípio dee)doutrina legislação, noque tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais suas determinações, por ocuparem cargos de confiança da chefe do Executivo, e; f) da do que meiodeu ambiente, quem tem legitimidade para propor sem umaautorização ação queproteção a filmagem azo às investigações é clandestina, realizada popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação das partes envolvidas. Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este do Ministério Público, às fls. 545-558. dispositivo ser tidoRéplica como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. 560. majoritária entende, como Comungada com Despacho esse pontosaneador, de vista,àsa fls. doutrina expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, facto, a Decisão que rejeitou a produção de prova pericial ipso e designou apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger audiência de instrução e julgamento, às fls. 573-573v. corresponder a um de fiscalizar. Decisão monocrática pelo Desembargador Jamil Gedeon Sem maiores obstinações, fica prolatada claro, permissa vaenia, que existe uma Neto, queincongruência negou seguimento ao recurso agravo de instrumento aviado relevante normativa com todadeanálise estendida até aqui, visto quepelo a réu CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Wagner Nascimento, juntada às fls. 575-579. dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucionalAta dada garantia de existência mínima de dignidade audiência de instrução e julgamento, às fls.humana. 632-647Ée 659. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o memoriais (fls. 663-671), o Parquet reitera as imputações aos mínimo existencialEm de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! réus e o pedido de condenação nas sanções do art. 12, da Lei n. 8.429/92, exceto Sendo ao e ao cabo, tal restrição à diretriz que o texto quanto a Wagner de fim Castro Nascimento, diante daaversa não comprovação de dolo ou culpa. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito defulcro Também pugna pelo afastamento provisório da prefeita Gleide Santos, com cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar no art. 273, I, do CPC. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos Alegações finais de Wagner Nascimento, às fls. 673-682, e dosodemais e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo réus, às fls. 691-707, todos reiterando argumentos contestatórios já declinados e reconhecimento da pessoa humana e nãoos humana como titulares pugnando pela improcedência dos pedidos. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parteos legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Vieram autos conclusos. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Eis a súmula do necessário. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO: Antes de adentrar ao mérito, convém analisar a questão preliminar argüida pelos réus. Essencialmente, pretendem a anulação do processo, em vista de ter sido motivado por investigação do Ministério Público baseada em provas supostamente ilícitas. Contudo, a argüição preliminar não prospera. Não existe óbice a que o Ministério Público, ao receber notícia merecedora de investigação, ainda que anônima, faça o seu sopesamento, e passe a atuar de forma a verificar a verossimilhança do fato narrado. No caso em apreço, a existência de fato grave e indícios consistentes da prática de uso de veículos públicos e de servidores públicos municipais em obra particular, retratado em vídeo, objeto de apuração nestes autos, já representavam à época justa causa para a instauração do inquérito civil. A investigação decorrente de fatos noticiados por meio de denúncia anônima, inclusive, é autorizada pela Lei Orgânica do Ministério Público (Lei Complementar n. 97/2010) e pela Resolução n. 23/2007, do Conselho Nacional do Ministério Público. Nesse sentido, reproduzo a ementa de precedente do STJ: ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DESEGURANÇA. INQUÉRITO CIVIL ABERTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO COM BASE EM DENÚNCIA ANÔNIMA. POSSIBILIDADE. 1. Recurso ordinário no qual se discute a possibilidade de o Ministério Público instaurar inquérito civil para apurar a veracidade de fraudes em procedimentos licitatórios, que foram informadas por meio de denúncia anônima. 2. A Lei n. 8.625/1993, lei orgânica do Ministério Público, e a Resolução n. 23/2007 do Conselho Nacional do Ministério Público autorizam a atuação investigatória do parquet, no âmbito administrativo, em caso de denúncia anônima. Precedente: RMS30.510/RJ, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe10/02/2010. 3. No caso, o parquet instaurou inquérito civil com base em denúncia anônima que continham indícios que supostamente caracterizariam fraudes em procedimentos licitatórios, bem como baseou-se em notícia determinada que é objeto em outros inquéritos civis. 4. Recurso ordinário não provido. (STJ - RMS: 37166 SP 2012/0026401-3, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 09/04/2013, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/04/2013).
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5 AÇÃO POPULAR COMO civil MEIO DIFUSO DEadministrativo TUTELA AMBIENTAL O inquérito é procedimento restrito ao âmbito do
MinistérioNão Público pordúvidas meio do qual se informação os restam quanto aocolhem caráterelementos de controledepopular diretoe econvicção, eficaz quais, casodos demonstrem a possibilidade da existência de algum da açãoeventualmente, popular no controle atos administrativos. Permanecem, contudo, certasilícito, podem ensejo ajuizamento de ação civil pública.dos A sua instauração, portanto, dúvidasdar quando seao trata em uma lógica desagregadora meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado é prerrogativa do Ministério Público, instituição à qual compete a defesa da ordem das agressões sistemáticas ao meio ambiente, legitimidade do cidadão na jurídica, do regime democrático e dos interessesdasociais e individuais indisponíveis. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio Também, sustenta-se a ilicitude da filmagem usada como prova por ambiental brasileiro. ter sido realizada dentro de propriedade privada e sem autorização das partes Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo daodemanda leitura da CRFB/88 observados os deverespor comunais envolvidas, que terianuma contaminado de ilicitude todo o processo, aplicação da da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada. Percebe-se aqui uma contradição em que popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação incorrem os réus. Tentam demonstrar a ilicitude da prova sob o fundamento de ter Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o sido realizada em propriedade particular seméoaconsentimento dos proprietários, que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral prova de cidadania, devendo este mas, ao mesmo tempo, tratarem do mérito da causa, insistem na idéia de que as obras dispositivo ser tidoaocomo não recepcionado pela vigente ordem constitucional. foram realizadas em vias públicas ou nas vias que traspassam fazendas Comungada comsomente esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely forma de acesso a outros imóveis rurais. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleitoanônimas, quando o direito político de eleger Ora, as filmagens, embora permitem concluir claramente corresponder a um de fiscalizar. que foram feitas pelo condutor de um veículo em serviço na obra de recuperação das estradas, Sem tal como se observa nos vídeos constantes da vaenia, mídia de CDexiste anexada maiores obstinações, fica claro, permissa que uma às fls. 24 dos autos. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente de um complexo Portanto, cai porcomo terra elemento a alegaçãocompositor de clandestinidade da gravação, na mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É medida em que fora realizada por pessoa que tinha livre acesso ao ambiente retratado. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Para além do fato de a filmagem ter sido deprecia feita porde pessoa a ingressar de que, quando lesionado, o meio ambiente formaautorizada consequencial o na propriedade, não vislumbra na espécie qualquerjurídico. tipo de Todos! violação aos direitos mínimo existencial desetodos os sujeitos do ordenamento fundamentais dos réus, haja vista que o cinegrafista se limita a registrar o trabalho ao fim e ao cabo, tal custeado restrição com aversa à diretriz que osem texto da equipeSendo de recuperação de estradas, dinheiro público, incorrer constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de em violação da intimidade, da vida privada e da imagem pessoal dos demandados. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Nesse norte, conforme leciona César Mariano Silva apud uma realidade comunitária e diversificada, expande os Dario horizontes dos da direitos Luig Almeida Mota: e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares O Supremo Tribunal Federal tem entendido que, quando alguém, utilizandose de meios técnicos de gravação de sons ou imagens, procede à captação 1. Art. 1.º Qualquer cidadão parte legítima para pleitear a anulação ou apúblico declaraçãoou deaberto, nulidade de atosteremos lesivos uma ouserá interceptação ambiental em lugar não ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresprova ilícita, pois não haverá violação ao direito de intimidade de outrem, so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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justamente pela natureza do local. Atualmente, a polícia e outros órgãos estatais ou particulares vêm-se valendo de filmagens de crimes, tais como os ocorridos no metrô, em lojas, etc. esse meio técnico de gravação está sendo utilizado para a salvaguarda de interesses legítimos, em evidente exercício regular de direito. Assim, o criminoso nunca poderá argüir ilicitude dessa prova. (MOTA, Luig Almeida. O fenômeno da interceptação ambiental. Conteúdo Jurídico, Brasilia: 16 abr. 2013. Disponível em: <http:// www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.42988&seo=1>. Acesso em: 10 ago. 2015).
Ademais, importa ressaltar o entendimento ponderado de que é injustificável, no Estado de Direito, o uso dos direitos fundamentais individuais, verdadeiras liberdades negativas oponíveis ao Estado, como forma de se evitar as sanções pela prática de ilicitudes, pois, neste caso, afigura-se um inconcebível abuso de direito, que não se coaduna com o espírito da Constituição da República. A propósito, menciono o escólio de Roberto Avena, in verbis: Nesse contexto, pertinente o ensinamento de Alexandre de Moraes, ao referir que “as liberdades públicas não podem ser escudo protetivo da prática de atividade ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito. Dessa forma, aqueles que, ao praticarem atos ilícitos, inobservarem as liberdades públicas de terceiras pessoas e da própria sociedade, desrespeitando a própria dignidade da pessoa humana, não poderão invocar, posteriormente, a ilicitude de determinadas provas para afastar suas responsabilidades civil(AVENA, e crimi Norberto Cláudio Pâncaro. Processo penal: esquematizado. 5. ed. São Paulo: Método, 2013. p. 471).
O doutrinador ainda faz considerações especificamente acerca da tutela jurídica que a Carta Magna reserva às interceptações ambientais de sons e imagens, explicando que, via de regra, esse tipo de registro não implica em violação ao direito de intimidade. Nas palavras do autor:
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Em nível de Constituição Federal, não existe tutela direta das interceptações
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DEcomo TUTELA AMBIENTAL ambientais lato sensu, diferentemente, se viu, das interceptações telefônicas, nas quais, existe tutela específica, embora parcial (não abrange as gravações),
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz art. 5º, dos XII. atos Sendo assim, a questãoPermanecem, relacionada à licitude oucertas ilicitude dos da ação popular no no controle administrativos. contudo, de sons e imagens devedos ser analisada, dúvidas quando seregistros trata emambientais uma lógica desagregadora meios de unicamente, produção, frente à regra do art.do 5º, crescimento X, da Carta Magna, que incorpora proteção genérica à consumo e descarte, diante vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas meio ambiente, dacontrário legitimidade cidadão na inciso intimidade,aodispositivo este que, ao do quedo ocorre no citado propositura da ação,XII, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização não ressalva a possibilidade de ordem judicial como forma de possibilitar desta possibilidadea de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio violação da privacidade. ambiental brasileiro. contexto, é de se indagar: as formas ambientais no de tocante registro importam, Segue-se,Neste na análise a princípio de doutrina e legislação, ao indistintamente e emdaqualquer caso,observados na violação ao à intimidade polo ativo da demanda numa leitura CRFB/88 osdireito deveres comunaistutelado da proteção do meio tem para propor umanegativa. ação Na pela ambiente, Constituiçãoquem Federal no legitimidade art. 5º, X? A resposta afigura-se popular? É possívelatualidade, destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação é 1consolidado o entendimento no sentido de que nenhuma das Popular (LAP – leiformas nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o de interceptações ambientais lato sensu importa, necessariamente, que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este violação direito da intimidade. Até pode ser constitucional. que haja essa violação, dispositivo ser tidoemcomo nãoaorecepcionado pela vigente ordem não é de considerado e sim amajoritária exceção. (AVENA, Norberto Comungada com mas esseisso ponto vista, aregra, doutrina entende, comoCláudio Processo penal: esquematizado. 5. ed. São Paulo: Método, expresso na lição dePâncaro. Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr.,2013. Helyp. 489). Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade dereferida, pleito quando o direito de ao eleger Segundo agenuína doutrina somente haverápolítico violação direito da corresponder a um de fiscalizar. intimidade, quando for realizada a gravação em ambiente no qual exista expectativa de privacidade, ou quando a gravação feitapermissa com violação de confiança Sem maiores obstinações, ficafor claro, vaenia, que existe decorrente uma de relações interpessoais ou de relações profissionais. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento um complexo No caso, não houve gravaçõescompositor de voz oudeimagem dos réus em mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É qualquer situação que pudesse comprometer a incolumidade da sua privacidade e frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido intimidade constitucionalmente tuteladas, logo, sob nenhum enfoque é possível falar de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o em prova ilícita capaz de invalidar o processo, jurídico. até porque os fatos apurados mínimo existencial de todos os sujeitostodo do ordenamento Todos! foram confirmados por outros meios de prova igualmente lícitos (derivados de fontes independentes source), meio de declaração pública da Sendo –independent ao fim e ao cabo, tal inclusive restrição por aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito deautos. Prefeita Municipal em programa de rádio veiculado nesta cidade e carreada aos cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria Uma constituição como a nossa, pautadaaem Porambiental. oportuno, relembre-se que os réus também respondem processo uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos em tramitação no Tribunal de Justiça do Maranhão com vistas à apuração dos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojomesmos o fatos na seara criminal. Nahumana egrégiaecorte, ao tratarcomo da preliminar reconhecimento da pessoa não humana titulares que argüia a ilicitude das gravações de vídeo, a decisão de recebimento da denúncia a rejeitou, consignando o seguinte: 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresPorém, não vislumbro no presente caso, qualquer violação às normas so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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constitucionais (art. 5º, inciso LVI, CF/88), pois, conforme relatado pela Procuradoria Geral de Justiça, as filmagens foram feitas por servidor público municipal (motorista da prefeitura), que estava em serviço, no local onde se realizava as obras, mediante o uso de bens e servidores públicos. O Sr. Sininger Vidal de Oliveira (blogueiro daquela municipalidade), apresentou naquele Órgão ministerial, um CD contendo gravações em vídeo, de máquinas e servidores municipais, realizando obras de terraplanagem no interior da Fazenda Copacabana, sendo que referida mídia,nada mais é do que a noticia criminis dada por qualquer do povo à autoridade competente para apurar o delito. Ademais, em cumprimento de mandado de busca e apreensão, expedido na Ação Cautelar de Busca e Apreensão nº 4532-44.2013.8.10.0022 (fls. 405/416), os Oficiais de Justiça Emerson Arley Rodrigues Santos e José Valber Aguiar, lavraram às fls. 416, Auto de Constatação Circunstanciado, onde os mesmos informam que: “(...) pudemos constatar que na Fazenda COPACABANA, não foi encontrado nenhum veículo, máquina ou ainda caminhões de propriedade do Município de Açailândia - MA, da mesma forma também não foi encontrado nenhum servidor do município trabalhando dentro da fazenda, porém foram localizados os trabalhadores, Sr. Edivan Santiago Lima, Sr. Hortel Almeida da Silva, Sr. Kenedy Pereira Silva e Sr. Caíque Sousa Ramos, todos tratoristas que estavam fazendo um trabalho de plantio de pastos, numa área de aproximadamente 1500 m², próxima a uma das sedes da fazenda, com dois tratores de esteira do MODELO D - 50, tais trabalhadores informaram que são empregados do Sr. Hilton, empresário e fazendeiro da cidade de Açailândia - MA, e que os tratores também são de propriedade do mesmo, não foi possível obter mais informações sobre tais trabalhadores, tendo em vista estes não estarem portando seus respectivos documentos de identificação, certificamos ainda que foi observado na fazenda COPACABANA desde a entrada, até o seu final, uma estrada toda piçarrada com extensão de 11km, aparentemente feita há muito pouco tempo, conforme demonstrado nas imagens em anexo, com espessura variando entre 15cm a 20 cm de piçarra, conforme amostragens realizadas por toda a sua extensão, também foi constatado a construção de (01) um açude, este em fase de término, medindo cerca de 250 m², foi verificado ainda dentro da fazenda uma pequena área de lazer com mesas de concreto e uma área recém construída toda coberta, medindo aproximadamente cerca de 30 m², certificamos que toda a extensão da estrada medida neste auto foi feito dentro da propriedade, pois não foi constado nenhuma benfeitoria no povoado ao lado da fazenda.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL Em anexo a este auto, segue fotos eDE filmagens realizadas, exclusivamente, dentro da propriedade rural, e certidão emitida pelo Cartório de 1º Ofício, desta cidade, Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz que tal administrativos. imóvel não está registrado em seuscontudo, registros.”certas da ação popular no informando controle dos atos Permanecem, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, do crescimento vertiginoso multipolarizado Diantediante disso, entendo que não merece prosperarea alegação de uso de prova das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na ilícita para persecução da ação penal. (TJ-MA - Procedimento Investigatório propositura da ação,Criminal para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização (PIC-MP) : 0228762014 MA 0004002-72.2014.8.10.0000. Relator: desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio JOÃO SANTANA SOUSA, Data de Julgamento: 26/05/2015, PRIMEIRA ambiental brasileiro. CÂMARA CRIMINAL).
Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa não leitura da CRFB/88 observadosgenéricas os deveresde comunais Também prosperam as alegações violação aos da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação de princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa, à míngua popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação indicação precisa da suposta violação, pois os princípios e regras de direito processual Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o foram devidamente observados no processo Foi facultado às partes que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral éjudicial a provaem de curso. cidadania, devendo este ao longo deser toda a instrução direito à manifestação sobre petições e documentos, dispositivo tido como nãoorecepcionado pela vigente ordem constitucional. bem como ocom direito produzir as provas necessárias à descoberta verdade, à Comungada essedeponto de vista, a doutrina majoritária entende,dacomo expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely exceção daquelas impertinentes ou manifestamente protelatórias. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade de pleito quando o suscitadas, direito político deao eleger Afastadasgenuína as questões preliminares passo exame corresponder a um de fiscalizar. do mérito. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma Conforme já exposto, demanda em que o que Ministério relevante incongruência normativa com todatrata-se análise de estendida até aqui, visto a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Público Estadual atribui aos réus a prática de ato de improbidade consistente na dentre muitos, o meio ambiente como em elemento compositor de um complexo utilização de bens e serviços públicos proveito de particular. Fundamentando a mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É pretensão com base na Lei de Improbidade Administrativa, requer a condenação da frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido prefeita de Açailândia (Gleide Santos –atualmente afastada do cargo) e de seu oesposo de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial (Dalvadísio Santos), do então Secretário dejurídico. Municipal de Obras (Wagner mínimo existencial debem todoscomo os sujeitos do ordenamento Todos! Nascimento) e do assessor especial da prefeita (Adão Gomes da Silva), encarregados, Sendo aodofim e ao cabo, etal aversa diretriz das que obras. o texto respectivamente, planejamento da restrição coordenação da àexecução constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não Sem é sinônima cidadania eleitoral, especialmente se tratar maioresdedificuldades, percebe-se que assisteaoparcial razão ao de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Órgão Ministerial em seu pleito. A prova que acompanha a inicial, consubstanciada uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos nas peças dos autos do Inquérito Civil n.dimensão 02/2013ao –1ªsustentar PJ/AÇAI, e conceitos marginalizadores de primeira em demonstram seu bojo o que máquinas pesadas à Prefeitura Municipal de Açailândia, ou contratadas reconhecimento da pertencentes pessoa humana e não humana como titulares para servir aos objetivos da Municipalidade, estavam sendo utilizadas na realização de obras de recuperação de via de acesso e do curral situados dentro da Fazenda 1. Art. 1.º Qualquerde cidadão será parte legítima pleitear a anulação ou a declaração nulidade deGleide atos lesivos Copacabana, propriedade do para requerido Dalvadísio e da dePrefeita Santos, ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingressob a supervisão de Adão da Silva. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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A gravação das imagens, feita a partir de um veículo em serviço na obra, principia já na BR-222, retratando a placa de identificação da Fazenda Copacabana, bem como os trechos em recuperação na estrada interna e curral da propriedade. As máquinas de terraplenagem ocupadas nos trabalhos ostentam adesivos da Prefeitura de Açailândia com a logomarca da gestão municipal. Outrossim, a realização das obras de recuperação da vicinal e do curral na propriedade privada foi confirmada, na audiência de instrução e julgamento, pelos depoimentos dos servidores públicos municipais que compunham a equipe da Secretaria de Obras, os quais enfatizam o propósito particular daqueles trabalhos ao relatarem que a recuperação da vicinal foi feita de forma mais completa apenas no trecho compreendido nos limites da propriedade da Prefeita Municipal, sendo que, a partir dali, limitaram-se a tapar os buracos existentes na via. Em seu depoimento, a testemunha Denis Cristian Gartner, servidor público efetivo no cargo de motorista, relatou (fls. 636-637): “Que fora realizadosaproximadamente30km de obras na Fazenda Copacapana; que as obras foram nas estradas de acesso bem como no interior da fazenda e curral; que foi realizado o empiçarramento de um acesso exclusivo a uma nova sede da fazenda; [...] que todas as máquinas utilizadas na obra da Fazenda Copacabana, ou pertenciam ao Município de Açailândia ou estavam alugadas a serviço desta prefeitura
(fls. 638-639):
Em igual sentido, o servidor público Ubiran Sousa Costa, afirmou “Que as máquinas pertenciamntratadasaopor Municípioeste;[...] ou que foi colocada piçarra dentro de um curral que fica no interior da Fazenda Copacabana; [...] que foi feita uma estrada de acesso a uma nova sede da Fazenda Copacabana; que tal estrada concede acesso exclusivo a uma nova sede construída; [...] que recebeu ordem de Adão para colocar piçarra do início da vicinal até o final da sede da Fazenda Copacabana; que depois deveria apenas colocar piçarra nos . buracos existente
E ainda, do depoimento de Antônio Carlos Nascimento da Silva, extrai-se o seguinte (fls. 640-641): “que trabalhou na Fazenda Copacabana dirig branco; que a caçamba era de
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propriedade da Prefeitura de Açailândia; [...] que viu a colocação de piçarra dentro
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO TUTELA AMBIENTAL de um curral que ficavaDIFUSO no interiorDE da Fazenda Copacabana; que tal serviço foi feito pela equipe que lá estava; [...] que reparada uma via que dá acesso à nova
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz construída; [...]administrativos. que foi colocada piçarra integralmente em todo o percurso da ação popular no sede controle dos atos Permanecem, contudo, certas estrada a Fazenda dúvidas quando sedatrata ematé uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas meio ambiente, legitimidade do cidadão na na O uso deao bens públicos e dodatrabalho de servidores públicos propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização execução de obra em proveito particular ficou evidenciado não apenas pelos vídeos desta possibilidade atuação cidadã com vistas do patrimônio e depoimentos dosdefuncionários envolvidos nasà conservação atividades, mas também foram ambiental brasileiro. reconhecidos pela então gestora, em entrevista a uma emissora de rádio local, ocasião em que comparou as benfeitorias realizadas na sua epropriedade rural, por meio Segue-se, na análise a princípio de doutrina legislação, no tocante ao do uso recursos do erário, outros serviçosobservados públicos colocados disposição da polode ativo da demanda numacom leitura da CRFB/88 os deveresàcomunais da proteçãopela do administração meio ambiente,municipal. quem tem legitimidade para propor uma ação sociedade popular? É possívelDiante destacar textualmente logoresta nos indene artigos iniciais da Lei desses elementos, de dúvidas quedeaAção realização 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o das obras, cujo enfoque deveria ser a consecução dos fins da Administração Pública, que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este propiciando maior benefício possível à coletividade, desvirtuou-se em serviço dispositivo sero tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. destinado prioritariamente à satisfação interesses privados entende, dos proprietários Comungada com esse ponto de vista, dos a doutrina majoritária como da Fazenda Copacabana. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína aderecuperação pleito quando direito políticodedeacesso elegerà sede Além de realizar daovia exclusiva corresponder a um de fiscalizar. e a recuperação do curral, os depoimentos são consistentes no sentido de que a efetiva restauração da obstinações, estrada vicinal limitada ao perímetro contido Fazenda Sem maiores ficafoi claro, permissa vaenia, que existenauma Copacabana, sendo que nos trechoscom exteriores a estaestendida propriedade nada visto foi feito relevante incongruência normativa toda análise até aqui, quealém a do tapamento dosseu buracos. Evidencia-se engodo a cabo pelos réus CRFB/88, em bojo, traz a dirigênciao de açõeslevado positivas do Estado para responsáveis prover, dentre muitos, da o obra, meio pois ambiente como esconder elementoocompositor demeramente um complexo pela execução pretendiam seu propósito egoístico mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É de com o subterfúgio de que haveria benefício comum através da reforma da estrada frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido acesso a outras propriedades. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Com isso, tenho por comprovadas as alegações do Órgão Ministerial, à exceçãoSendo das imputações ao cabo, requerido Wagner Nascimento, consoante ao fim e ao tal restrição aversa à diretriz que o explicitarei texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de adiante. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição dos como a nossa, pautada em Compreendido o delineamento fatos, passa-se a examinar a uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos presença dos requisitos caracterizadores da improbidade administrativa no tocante e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o areconhecimento cada um dos corréus. da pessoa humana e não humana como titulares Marçal Justen Filho define o ato de improbidade administrativa, 1. Art. 1.º Qualquertermos, cidadão seráipsis parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos nos seguintes litteris: ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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A improbidade administrativa consiste na ação ou omissão violadora do dever constitucional de moralidade no exercício da função pública, que acarreta a imposição de sanções civis, administrativas e penais, de modo cumulativo ou não, tal como definido em lei. (JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 8. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 1010).
Já a jurista Maria Sylvia Zanella Di Pietro, perscrutando os elementos essenciais do ato de improbidade, preleciona que devem estar presentes quatro requisitos, quais sejam: a) deve figurar como sujeito passivo uma das entidades referidas no art. 1º, da LIA; b) na condição de sujeito ativo, deve estar um agente público ou terceiro que tenha concorrido para a prática de ato de improbidade ou dele tenha obtido proveito (arts. 2º e 3º); c) é também imprescindível a ocorrência de ato danoso ímprobo, causador de enriquecimento ilícito para o sujeito ativo (art. 9º), e/ou de prejuízo para o erário (art. 10), e/ou de atentado contra os princípios da Administração Pública (art. 11); d) e, por fim, é necessária a constatação do elemento subjetivo (dolo ou culpa), consoante a consolidada jurisprudência do STJ (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella; Direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas). É mister que o caso concreto revele esses quatro elementos para que se verifique a existência do ato de improbidade. No que concerne à ré Gleide Lima Santos, observa-se que era detentora de mandado eletivo municipal à época dos acontecimentos, sendo enquadrada como agente público, passível de ser sancionada de acordo com a Lei de Improbidade de Administrativa, haja vista que assume a condição de sujeito ativo da conduta ímproba. Ademais, não se questiona que os prejuízos da má conduta foram suportados pela administração direta do Município de Açailândia, que na presente hipótese, assume a posição de sujeito passivo. O ente público sofreu decréscimo patrimonial decorrente do emprego de máquinas, veículos e combustível de sua propriedade ou colocados à sua disposição por meio de contratos administrativos, bem como em decorrência do emprego de servidores públicos efetivos no desenvolvimento de atividades cuja finalidade era gerar benefício econômico-patrimonial para a ré, através das benfeitorias em sua fazenda, que necessariamente repercutem em valorização da propriedade. Também importa estabelecer a conduta transgressora do dever de probidade perpetrada pela requerida.
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Apregoa o art. 9º, inciso IV, da Lei n. 8.429/92, que constitui ato de 5improbidade AÇÃO POPULAR COMOimportando MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL administrativa, enriquecimento ilícito, auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz emprego ou atividade nas entidades mencionadas Permanecem, no art. 1º da LIA, e, notadamente, da ação popular no controle dos atos administrativos. contudo, certas utilizar, obra se outrata serviço máquinas, ou material dúvidas em quando em particular, uma lógicaveículos, desagregadora dos equipamentos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de entidades públicas, bem das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na por como o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros contratados propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização essas entidades. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Waldo Fazzio Júnior deslinda a essência do dispositivo nessas palavras,Segue-se, verbis: na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma eação Cuida-se, aqui, da disposição para proveito particular de coisas pessoas em popular? É possívelserviços destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação descoincidentes com suas respectivas funções públicas. O agente público Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que assim labora está-se portado como proprietário, não como gestor público. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este cuidanão de coisa pública compela o desvelo que ordem imprimiria ao cuidado das suas; dispositivo ser tidoNão como recepcionado vigente constitucional. a coisade pública. Comungada com faz essesuaponto vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, Nesse ponto, o núcleo verbal é utilizar. O agente públicoipso o fazfacto, em obra ou apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger serviço particular. Utiliza veículos, máquinas, equipamentos ou material de corresponder a um de fiscalizar. qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de entidade compreendida na Administração diretapermissa ou indireta,vaenia, ou ainda pessoas Sem maiores obstinações,Pública fica claro, que existejurídicas uma com participação de dinheiro público. Também está compreendido, dispositivo, relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, vistonoque a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, o uso do trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros contratados dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor um complexo por esses entes. (FAZZIO JR., Waldo. Improbidadedeadministrativa: doutrina, mote constitucionallegislação da garantia de existência mínima de dignidade humana. É e jurisprudência. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2015. pp. 165-166).
frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o depreende-se que todo gestor públicoTodos! tem o dever jurídico mínimo existencialPortanto, de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. de zelar pelo patrimônio público que lhe é confiado, gerindo-o de forma transparente, ao fimdo e bem ao cabo, tal restrição aversaaoàente diretriz que ao o qual textoserve. buscandoSendo a realização comum, e em lealdade público constitucional nos Odá,escopo dada adaimpossibilidade clara de restrição do conceito norma legal é garantir a incolumidade da coisade pública cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar em face dos gestores desonestos, que, movidos por repugnantes propósitos de de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em enriquecimento pessoal, utilizam-se indevidamente dos os bens e serviçosdos da Administração, uma realidade comunitária e diversificada, expande horizontes direitos em desprestígio aos princípiosdedaprimeira moralidade, legalidade, impessoalidade, eficiência, e conceitos marginalizadores dimensão ao sustentar em seu bojo o ereconhecimento outros norteadores de toda atividade da pessoa humana e nãoadministrativa. humana como titulares A conduta ilegal perpetrada pela então prefeita ficou suficientemente
1. Art. 1.º Qualquer legítima para pleitear a anulação a declaração deanulidade atos lesivos demonstrada nocidadão cursoserá daparte instrução do presente feito.ouRessalte-se prova de consubstanciada ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresna mídia de áudio de fls. 58, cuja transcrição foi juntada às fls. 60-62, em que a então so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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chefe do Poder Executivo, diretamente favorecida pelas obras, profere declarações de menoscabo ao Parquet que então investigava as irregularidades, e, de forma enviesada, assume os atos que lhe eram/são imputados, comparando-os à prestação dos serviços públicos de saúde e de coleta de lixo: “- Eu quero aqui dizer que a minha fazenda, a minha fazenda... porque todo mundo em Açailândia conhece minha vida e sabe que o doutor Dalvadísio tem uma fazenda grande, muito grande, no Córrego Novo, cheia de boi... ta lá, mas foi comprada com o suor dele, ganhado na medicina porque é um médico de excelência.” “-Chegou na minha fazenda um mandado de uma ação de busca e apreensão, porque esses desocupados chegam na Promotoria dizendo que tem trator trabalhando pra mim.” “- Eu quero dizer aqui que a Prefeita de Açailândia já fez mais de trezentos quilômetros de estradas vicinais, porque eu sei que tem criança lá que não vai pra escola porque o transporte que tá alugado pela Secretaria de Educação não pode levar o aluno. E eu investi, e foi feit “- No entanto, promotor, juiz, manda mandado de busca e apreensão sem me ouvir. Quer dizer então que, dentro desse raciocínio aqui, se eu adoecer hoje, eu não posso ir ao SESP, porque se eu for no SESP vai ta amanhã no jornal: „Prefeita de Açailândia própr?”io‟ “- Quer dizer que, dentro desse raciocínio aqui, o carro do lixo não pode pegar o lixo na minha porta não, porque eu não posso usar a máquina? Eu exijo respeito com a minha pessoa. Isso aqui, esse tipo de ação aqui, ela traz desconfiança para o setor jurídico... eu tô te
Outrossim, a prefeita, embora não negue a realização das obras, argumenta na contestação que foram realizadas em benefícios de vários povoados da região para efeito de escoamento da produção rural e de mobilidade. Contudo, esse raciocínio não se coaduna com a prova dos autos. Consoante a transcrição dos depoimentos alhures, os funcionários públicos que trabalharam na execução do projeto foram categóricos ao asseverarem que as obras visavam à reparação das vias internas e do curral da fazenda da Prefeita, inclusive na via que serve exclusivamente como acesso para a sede da propriedade.
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Procedeu-se à mera operação-buraco”“tapano trech vicinal que extrapolava os limites 5doAÇÃO COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL imóvelPOPULAR da demanda. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz conduta da gestora pública, que recorre à condição decertas ordenadora da ação popular no Essa controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, de despesa e busca favorecimento pessoal, amolda-se dos perfeitamente à tipificação do dúvidas quando se otrata em uma lógica desagregadora meios de produção, consumo e descarte, diante do utilizou crescimento vertiginoso multipolarizado art. 9º, IV, da LIA, porque a agente ilegalmente bens eeservidores públicos em das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na obra particular e com isso obteve enriquecimento ilícito, materializado no acréscimo propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização patrimonial decorrente da valorização de seu imóvel. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Por final, doutrina e consolidada jurisprudência do STJ entendem como indispensável elemento subjetivodepara caracterização do ato ímprobo, Segue-se, nao análise a princípio doutrina e legislação, no tocante aosendo polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais exigido dolo, para os tipos que importem em enriquecimento ilícito ou em violação da dodameio ambiente, quem temmenos, legitimidade para os propor ação aosproteção princípios Administração, e, pelo culpa, para tipos uma que descrevem popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação condutas lesivas ao erário. Nesse diapasão: Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este E PROCESSUAL CIVIL. ART. 535constitucional. DO CPC. ALEGAÇÃO dispositivo ser tidoADMINISTRATIVO como não recepcionado pela vigente ordem SÚMULA ADMINISTRATIVA. Comungada com GENÉRICA. esse ponto de vista, a284/STF. doutrinaIMPROBIDADE majoritária entende, como expresso na lição deINEXISTÊNCIA Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely 1. É DE CARACTERIZAÇÃO DE DOLO E MÁ-FÉ. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, assente nesta Corte Superior o entendimento segundo o qual, para que seja apenas haveria legitimidade genuína de pleito quandodooréu direito reconhecida a tipificação da conduta comopolítico incurso de naseleger previsões da corresponder a um de fiscalizar. Lei de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado no dolo para os tipos previstos nos arts. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma 9º e 11 e, ao menos, pelacom culpa, nasanálise hipóteses do art. até 10. aqui, 2. Novisto caso dos as relevante incongruência normativa toda estendida queautos, a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, premissas fáticas assentadas pela origem dão conta de que o ex-prefeito demitiu dentre muitos, o meio ambienteservidores como elemento compositor de um complexo irregularmente públicos, sob o entendimento de “estar atendendo às mote constitucionaldisposições da garantia de existência mínima de dignidade humana. Épessoal da Lei de Responsabilidade Fiscal, ao reduzir as despesas com frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido desnecessário”. Não havendo comprovação do dolo de prejudicar os lesados, de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o ao erário, e que, tampouco, “o agente público agiu mínimo existencialoudefavorecer todos osterceiros, sujeitosdano do ordenamento jurídico. Todos! visando outro fim que não o bem público”. 3.
Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos Adá, dadaconsoante a impossibilidade clara do deato restrição do conceito de má-fé, cediço, é premissa ilegal e ímprobo; e a ilegalidade cidadania que não sóé sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em os princípios constitucionais da Administração Pública, coadjuvados pela uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos má-intençãode do primeira administrador. Precedente: REsp 1.149.427/SC, e conceitos marginalizadores dimensão ao sustentar em seu bojoRel. o Min. Fux,humana Primeirae Turma, julgadocomo em 17.08.2010, reconhecimento daLuiz pessoa não humana titulares DJe 09.09.2010. Agravo regimental improvido. (AgRg no Agravo em Recurso Especial nº 81766/MG (2011/0200520-2), 2ª Turma do STJ, Rel. Humberto Martins. j. 07.08.2012, 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parteDJe legítima para pleitear(grifei). a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos unânime, 14.08.2012). ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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O exercício da função pública é condicionado por princípios e regras que se resumem naquele que é tido como o fim último da Administração: a satisfação do interesse público. Dessarte, o agente a serviço de órgão ou entidade da Administração direta ou indireta, de qualquer dos Poderes ou esferas de governo, deve se esmerar em bem desempenhar as suas funções, visando sempre o interesse coletivo. É inadmissível a inobservância do dever de diligenciar para a manutenção da integridade do patrimônio público. Com lastro nessas concepções, verifica-se, na espécie, a presença de dolo. Em que pesem as alegações da requerida, o seu dolo na utilização dos bens e servidores públicos municipais para atender a seus fins particulares restou evidente já que tinha ciência de que os veículos e máquinas eram públicos e de que os funcionários eram vinculados ao Município, portanto, estando afetados exclusivamente para atender aos interesses públicos municipais, não sendo disponibilizados para a satisfação de interesses particulares da administradora pública. A ré tinha elementos suficientes para saber que estava agindo em desconformidade com a lei e com o interesse público, por isso, no caso em questão fica patente o agir reprovável que a Lei de improbidade administrativa objetiva reprimir. Destarte, é forçoso reconhecer que a ordenadora de despesas conduziuse deliberadamente em afronta às normas legais, com manifestação volitiva consciente direcionada à conduta comissiva censurada pelo ordenamento jurídico, sendo expresso o elemento subjetivo doloso, e, portanto, configurada a improbidade. No que tange ao demandado Dalvadísio Moreira dos Santos, muito embora não exerça qualquer função pública, equipara-se à condição de agente público, em virtude da concepção extensiva adotada pelo art. 3º da LIA, segundo o qual as disposições da lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta. Neste contexto, o co-proprietário da fazenda ilegalmente favorecida com obras públicas ocupa também a posição de sujeito ativo do ato de improbidade, na medida em que auferiu benefício econômico na mesma proporção que sua cônjuge, a então prefeita municipal. Também no caso do réu Dalvadísio dos Santos, os prejuízos da conduta ímproba foram suportados pela administração direta do Município de Açailândia, que figura como sujeito passivo. Ao se valer de combustível, máquinas e veículos públicos, bem como ao se utilizar de servidores públicos efetivos no desenvolvimento
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de obras e serviços em sua fazenda, com o fito de locupletar-se ilicitamente, o réu 5conseqüentemente AÇÃO POPULAR COMO MEIOaoDIFUSO causou prejuízo erário. DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz determinar ainda que a conduta transgressora do dever de da ação popular no Importa controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas probidade perpetrada em terdos concorrido a prática do dúvidas quando se tratapelo emdemandado uma lógica consiste desagregadora meios depara produção, consumo e descarte, diante dopor crescimento e multipolarizado ato de improbidade capitaneado sua esposa vertiginoso e, sendo co-proprietário da fazenda, das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na dele se beneficiou tanto quanto a gestora do Município. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio A abalizada doutrina de Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves ambiental brasileiro. ensina que é insuficiente a mera obtenção de benefício pelo particular a partir de conduta alheia, doSegue-se, agente público. Necessária se faz demonstração do liame na análise a princípio deadoutrina e legislação, nosubjetivo, tocante aoverbis: polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem legitimidade para propordauma ação Assim, constatado que tem o terceiro tinha conhecimento origem ilícita do popular? É possívelbenefício destacarauferido textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação – pois a inadmissibilidade da responsabilidade objetiva, Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o além de não ter amparo legal, em muito comprometeria a segurança das relações que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este ele passível de sofrer as sanções no art. 12 da dispositivo ser tidojurídicas como –estará não recepcionado pela vigente ordemcominadas constitucional. 8.429/1992. É preciso, portanto, seja demonstrada presença do Comungada com Lei essen.ponto de vista, a doutrina majoritária entende,a como expresso na lição deliame Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., subjetivo entre o terceiro e o agente público, não a meraHely obtenção de Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideiacuja de direitos e deveres, ipso desconhecida. facto, benefício a partir da conduta alheia, ilicitude era simplesmente apenas haveria legitimidade pleito quando direito político de elegerde mera Esse liame genuína subjetivo,de à evidência, não é o necessário em se tratamento corresponder a um de fiscalizar. pretensão de ressarcimento dos danos causados ao erário, sendo plenamente possível a condenação agentepermissa público evaenia, do terceiro pelo ato, Sem maiores obstinações, ficadoclaro, quebeneficiado existe uma como devedores que estendida inexista umaté liame prévio relevante incongruência normativasolidários, com todaainda análise aqui, vistoentre que eles. a [...] CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, (GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 367).
mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido O demandado nas mesmas que a requerida de que, quando lesionado, o meioincidiu ambiente deprecia condutas de forma típicas consequencial o Gleide previstas no oosart. 9º, inciso IV, da Lei n. jurídico. 8.429/92,Todos! que constituem atos mínimoSantos, existencial de todos sujeitos do ordenamento de improbidade administrativa propiciadores de enriquecimento ilícito. Dessa forma, Sendo ao fim e ao cabo, tal indevida restrição em aversa à diretriz o mandatária texto também auferiu vantagem patrimonial conluio com a que então constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito do Município de Açailândia. Tinha conhecimento das obras que se realizavamdeem sua cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral,máquinas especialmente ao se tratar propriedade particular, com a utilização de veículos, e material (combustível) de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em de ou à disposição da Municipalidade, utilização trabalho de umapropriedade realidade comunitária e diversificada, expande ose da horizontes dosdodireitos servidores empregados ou terceiros contratados pelo governo municipal. e conceitospúblicos, marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares A priori, impõe-se ao gestor público o dever de agir segundo os estritos ditames da legalidade, zelando pelo patrimônio público que lhe é confiado, 1. Art. 1.º Qualquer a cidadão será parte do legítima paracomum; pleitear a anulação a declaração de nulidade de atos lesivos e objetivando realização bem mas, ou apesar de ter suas relações regidas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingrespelo princípio da autonomia da vontade, o particular também é alcançado pelo dever so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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de probidade. Espera-se de qualquer pessoa a observância do dever geral de abstenção (neminem lædere), isto é, não lesar a outrem: nem a terceira pessoa, nem à Administração Pública. O fim almejado pela lei, ao possibilitar a responsabilização do particular, é evitar que este, em conchavo com agente público, pratique as condutas ilícitas de improbidade, ficando desonerados das sanções civis previstas na LIA. Com a adoção desse entendimento, preserva-se a coisa pública em face também daqueles que se aliam aos gestores desonestos em seus propósitos de enriquecimento pessoal por meio da indevida utilização dos bens e serviços da Administração Pública. A ilicitude da utilização indevida do patrimônio público ficou suficientemente demonstrada no curso da instrução processual, tal como já expus acima. Cumpre apenas demonstrar que o réu Dalvadísio, além de ter sido favorecido pela obras, tinha conhecimento delas, bem como do seu caráter ilícito. Nos depoimentos colhidos dos funcionários públicos que trabalharam na execução do projeto, além de afirmarem que as obras visavam à reparação das vias internas e do curral da fazenda Copacabana, inclusive na via que serve exclusivamente como acesso para a sede da propriedade, registrou-se que o esposo da prefeita foi visto em algumas ocasiões na fazenda supervisionando os trabalhos. Reverberam essa conclusão os excertos extraídos do depoimento de Denis Cristian Gartner, na AIJ: “Que durante a obra viu na Fazenda Copacabana o Sr. Dalvadísio e um de seus filhos; [...] que o Sr. Dalvadísio e o filho andavam pela obra e viam a execução dos trabalhos”.
Ainda, Ubiran Sousa Costa testemunhou: “Que a Fazenda Copacabana pertenceencontrouo Sr.ao Sr. Da Dalvadísio por três oportunidades enquanto r
Do mesmo modo, o servidor público Antônio Carlos Nascimento da Silva declarou: “Que o depoente viu o Sr. Dalvadísio, mas Dalvadísio observava a realização dos serviços”.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Dessarte, não de apenas o favorecimento requerido Não restam dúvidas evidencia-se quanto ao caráter controle popular direto edoeficaz decorrente da conduta de suados esposa, mas também ficou claramentecontudo, demonstrado da ação popular no controle atos administrativos. Permanecem, certaso liame subjetivo, haja vista que em acompanhou a obra por máquinas e dúvidas quando se trata uma lógicapessoalmente desagregadora dos executada meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento e àmultipolarizado funcionários públicos em sua fazenda. A condutavertiginoso conforma-se tipificação do art. 9º, das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do da cidadão na IV, da LIA, para além da ofensa patente aos princípios norteadores Administração propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Pública (art. 11, da LIA). desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. A despeito das alegações declinadas na contestação, o dolo do réu restou evidenciado, já análise que tinha ciência de os veículos e máquinas eram públicos Segue-se, na a princípio deque doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais e de que os funcionários eram vinculados ao Município, de modo que o proveito da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação obtido com sua utilização é ilícito. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o requerido dispunha de elementos para saber que que é cidadania, aoO trazer que o título eleitoral é a prova suficientes de cidadania, devendo estelogrou benefícios com a lei e com interesse público, por isso, no caso dispositivo em ser desconformidade tido como não recepcionado pelaovigente ordem constitucional. em questão fica o agirde reprovável que a Leimajoritária de improbidade administrativa Comungada compatente esse ponto vista, a doutrina entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely objetiva reprimir. Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade de pleito quandoque o direito político de conduziu-se eleger Destarte, genuína é forçoso reconhecer o demandado corresponder a um de fiscalizar. deliberadamente em afronta às normas legais, com manifestação volitiva consciente direcionada à conduta censurada pelopermissa ordenamento jurídico, sendouma expresso Sem maiorescomissiva obstinações, fica claro, vaenia, que existe orelevante elemento subjetivo doloso, e, portanto, a improbidade. incongruência normativa com toda configurada análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente comoaelemento de essenciais um complexo Cumpre determinar presença compositor dos elementos do ato de mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. improbidade administrativa também quanto ao requerido Adão Gomes daÉSilva. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Cuida-se de pessoa que, à época fatos, ocupava deconsequencial Assessor Técnico de que, quando lesionado, o meiodos ambiente deprecia odecargo forma o do Gabinete da Prefeita Municipal, podendo ser caracterizado mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico.como Todos!agente público, suscetível às sanções cominadas na Lei n. 8.429/1992, na posição de sujeito ativo Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto da conduta ímproba. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não Apesar é sinônima cidadania eleitoral, especialmente se tratar de sedeindividualizar as condutas de cadaao agente, todas as de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em condutas se relacionam aos mesmos fatos, que, naturalmente, geraram conseqüências uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos em prejuízomarginalizadores da mesma entidade no caso, é a administração Município e conceitos de que, primeira dimensão ao sustentar direta em seudobojo o de Açailândia, da sujeito perpetradas. reconhecimento pessoapassivo humana das e nãoilicitudes humana como titularesO ente público sofreu decréscimo patrimonial decorrente do emprego de máquinas, veículos e combustível de sua propriedade ou colocados à sua disposição, bem como em decorrência do emprego 1. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima no para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos de Art. servidores públicos efetivos desenvolvimento de atividades cuja finalidade ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresera gerar benefício econômico-patrimonial para a prefeita municipal e seu esposo, so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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através da recuperação de estradas e instalações da fazenda, sob a supervisão direta do requerido Adão da Silva. Diferentemente do que se apurou em relação aos réus Gleide Santos e Dalvadísio dos Santos, a conduta transgressora do dever de probidade perpetrada por Adão da Silva não parece ter-lhe trazido proveito econômico-financeiro direto, mas apenas aos primeiros. Por essa razão, a sua conduta incide no tipo do art. 10, XIII, da Lei n. 8.429/1992, o qual preceitua que constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades públicas, e, notadamente, permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de entidade pública, bem como o trabalho de servidor público, empregados ou terceiros contratados pela Administração. A doutrina explica que, na figura descrita no inciso XIII do art. 10, da LIA, o agente público não utiliza, mas instrumentaliza a utilização daquilo que é público em favor de terceiros, in verbis: Permitir significa não impedir, ação denotativa de concordância, consentimento, pelo menos de não resistência. [...] No inciso XII do art. 10, a permissão reprovável dirige-se á utilização do patrimônio material e pessoal em obra ou serviço particular A figura assemelha-se à descrita no art. 9º, inciso IV, mas são diferenciadas porque a obra ou serviço particular, aqui, é de terceiro. Naquele dispositivo, o beneficiário é o próprio agente público. (FAZZIO JR., Waldo. Improbidade administrativa: doutrina, legislação e jurisprudência. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2015. pp. 165-166).
O servidor público a quem é confiada a guarda de bens públicos e a posição de chefia de outros servidores não pode perder de vista que é remunerado para atuar em consonância com a lei, sendo antijurídica a conduta que desborda os lindes normativos. Nesse diapasão, a vedação legal ao uso do patrimônio público vai além do uso que aproveita somente ao agente público, compreendendo também a permissão de utilização indevida em proveito de terceiros.
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Destaque-se o seguinte julgado: 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Apelação cível. Administrativo. Improbidade. Uso indevido de maquinário e Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz públicos. Construção de obraPermanecem, particular. Constitui ato decertas improbidade da ação popular no servidores controle dos atos administrativos. contudo, violador princípios da legalidade e moralidade, como também dúvidas quando seadministrativa, trata em uma lógicadosdesagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do aocrescimento vertiginoso e 8.429/92, multipolarizado causador de dano erário, ex vi dos arts. 10 da Lei a autorização de das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na utilização do maquinário e servidores públicos para fins particulares (construção de propositura da ação,obra para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização privada). A dosimetria da sanção deve obedecer aos princípios da razoabilidade desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio e proporcionalidade, a fim de penalizar o agente praticante do ato ímprobo, ambiental brasileiro. considerando a gravidade da conduta e eficácia da pena. Negaram provimento
–AC 1.0210.06.035197-5/001 –Rel. Des. Fernandoao Botelho. Segue-se,aonarecurso. análise(TJMG a princípio de doutrina e legislação, no tocante polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais j. 10/02/2011). da proteção do meio ambiente, de quem tem legitimidade propor uma de ação Na condição encarregado das obraspara de recuperação vicinais popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação aprovadas pela Secretaria Municipal de Infraestrutura, Adão da Silva desvirtuou a Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o finalidade pública do projeto, e determinou da restauração daseste estradas que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral éaarealização prova de cidadania, devendo internas da ser Fazenda Copacabana, entre as quais inclui ordem a via deconstitucional. acesso exclusivo à dispositivo tido como não recepcionado pela se vigente nova sede, e com a realização dos trabalhos melhoramento no curral da propriedade. Comungada esse ponto de vista, adedoutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Helydo réu, O acervo probatório coligido aos autos comprova cabalmente a participação Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, responsável pela determinação de que se utilizasse o maquinário e os servidores apenas haveria legitimidade de obra pleitodequando o direito político de eleger públicos municipais sob suagenuína chefia na interesse particular. corresponder a um de fiscalizar.
Do que ficou consignado na atapermissa da Audiência de Instrução e Julgamento, Sem maiores obstinações, fica claro, vaenia, que existe uma destacam-se as declarações a seguir, relevante incongruência normativa compela todacontundência: análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente comoqueelemento um complexo “Que não pode afirmar se era o Sr.compositor Adão obras nade fazenda; Que nas imagens mote constitucionalaparece da garantia de existência mínima de dignidade humana. É o Sr. Adão gesticulando como se estivesse indicando ações(depoimentoaos frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido executoresdeSiniger da Vidal de Oliveira Neto) de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! “Que o dono do imóvel cobrava o aluguel do Sr. Adão; [...] que tinha como
Sendo aochefe fim imediato e ao cabo, tal restrição à diretriz quecomo o texto o Sr. Adão; [...] que naaversa obra quem se intitulava assessor da constitucional nos prefeita dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de e que mandava na obra era o Sr. Adão e não o Sr. Wagner, independente cidadania que não de é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar qualquer.(depoimentodeterminaçãoDenisCristian deste” Gartner) de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos “Que foi colocado piçarra dimensão dentro de ao umsustentar curra Copacabana; que taloserviço e conceitos marginalizadores de primeira em seu bojo feito pela equipeeque estava; que foi o Sr. Adão que determinou a colocação reconhecimento dafoi pessoa humana nãoláhumana como titulares de piçarra no curral da Fazenda Copacabana; [...] que nunca recebeu nenhuma determinação do Sr. Wagner a respeito da obra em questão; que o Sr. Adão disse 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parteque legítima para pleitear a anulação ou acontas declaração nulidade lesivos inclusive o depoente deveria prestar da de obra com de eleatos e não com o Sr. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresWagner; [...] que o depoente deveria prestar contas da obra ao Sr. Wagner, mas so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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o Sr. Adão falou ao depoente que quem mandava lá era ele e a prefeita, e que as contas deveriam ser prestadas somente a ele, Adão; [...] que recebeu ordem do Adão para colocar piçarra no início da estrada vicinal até o final da sede da Fazenda Copacabana”(depoimento. de Ubiran Sousa Costa) “Que viu a colocação de piçarranteriordentroda de u Fazenda Copacabana; que tal serviço foi feito pela equipe que lá estava; que foi o Sr. Adão que determinou a colocação de piçarra no curral da fazenda Copacabana; [...] que foi Adão que deu ordem para realizar o trabalho dentro da sede da Fazenda Copacabana; [...] que Adão falou na obra que quem mandava era ele e a prefeita”(depoimento. de Antônio Carlos Nascimento da Silva)
Os funcionários públicos foram assertivos em seus depoimentos, relatando que as obras visavam à reparação das vias internas e do curral da fazenda, e que eram executadas sob a batuta do assessor especial da prefeita, a quem os servidores prestavam contas de suas atividades. O réu, servidor público, ocupante de cargo de chefia, praticou a conduta tipificada no art. 10, XIII, da Lei n. 8.429/92, porque planejou e executou obra ou serviço particular com a utilização ilegal de veículos, máquinas, material e servidores públicos, favorecendo o enriquecimento ilícito de outras pessoas. Conforme já aludido, o exercício da função pública é condicionado por princípios e regras que se resumem naquele que é tido como o fim último da Administração: a satisfação do interesse público. Dessarte, o agente a serviço de órgão ou entidade da Administração direta ou indireta, de qualquer dos Poderes ou esferas de governo, deve se esmerar em bem desempenhar as suas funções, visando sempre o interesse coletivo. É inadmissível a inobservância do dever de diligenciar para a manutenção da integridade do patrimônio público. Embora seja suficiente a ação culposa para que se configurem as hipóteses previstas no art. 10 da Lei de Improbidade, infiro que o réu Adão da Silva incorreu de forma dolosa da conduta reprovada pelo diploma legal. Era o encarregado dos serviços de recuperação de vicinais e, nessa condição, tinha o dever legal de velar para que a coisa pública fosse gerida de forma correta, alinhada com os princípios constitucionais e administrativos. Contudo, contrariando essa expectativa, o réu amparou-se nos poderes que detinha em razão da posição de chefia, ordenando ele próprio a utilização dos bens e servidores públicos municipais para atender finalidade inteiramente desatrelada da legalidade e da moralidade administrativa.
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5 AÇÃO POPULAR COMO DIFUSOconcluo DE TUTELA AMBIENTAL Diante dessasMEIO circunstâncias, que o agente público comportou-
se de forma incontestavelmente desonesta, imoral, manifestação volitiva consciente Não restam dúvidas quanto ao caráter de com controle popular direto e eficaz direcionada à conduta comissiva condenável frente às previsões dacontudo, Lei de Improbidade da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, certas Administrativa, mormente que concerne aos atos que em prejuízo ao dúvidas quando se trata em no uma lógica desagregadora dos implicam meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento e multipolarizado erário. À vista disso, é indiscutível a presença dovertiginoso elemento anímico consubstanciado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na no dolo. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio A respeito da configuração de improbidade pela utilização de bens ambiental brasileiro. públicos em benefício de particulares, colaciono julgado de caso análogo ao analisado no presente feito: na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao Segue-se, polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE popular? É possívelADMINISTRATIVA destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação CONTRA A EX-PREFEITA DO MUNICÍPIO DE Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o MOSSORÓ, O GERENTE DE INFRAESTRUTURA que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral EXECUTIVO é a prova de cidadania, devendo este DA MUNICIPAL DO DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE dispositivo ser tidoSECRETÁRIA como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. DE TERCEIRA PRELIMINARES DEcomo NULIDADE Comungada com Eesse ponto de PESSOA vista, aPARTICULAR. doutrina majoritária entende, expresso na lição deDA Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely SENTENÇA SUSCITADA EM APELAÇÃO ANTE A INCOMPETÊNCIA Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, DO JUÍZO DO PRIMEIRO GRAU PARA PROCESSAR E JULGAR A AÇÃO apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger DIANTE DA PRERROGATIVA DE FORO DE UM DOS IMPUTADOS E corresponder a um de fiscalizar.
POR CERCEAMENTO DE DEFESA EM VISTA DO ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO SEM COLETA TODAS PROVAS. Sem maiores obstinações,PROCESSUAL fica claro, permissa vaenia,DEque existeASuma REJEITADAS. MÉRITO: DISPONIBILIZAÇÃO GRACIOSA EQUIPAMENTOS relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui,DEvisto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de PERTENCENTES ações positivas do para prover, E RECURSOS PÚBLICOS AOEstado MUNICÍPIO (VEÍCULOS, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um MÁQUINAS, COMBUSTÍVEL E TRABALHADORES) complexo PARA USO EM mote constitucionalPROPRIEDADE da garantia de existência mínima de dignidade humana. É PARTICULAR. PARQUE DE VAQUEJADA LOCALIZADO frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido NO MUNICÍPIO BARAÚNA. CONDUTA DO AGENTE PÚBLICO de que, quando lesionado, o meioDE ambiente deprecia de forma consequencial o DO BENEFÍCIO DE TERCEIROS. CONFIRMADA. mínimo existencialMUNICÍPIO de todos osEMsujeitos do ordenamento jurídico. Todos! MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO EM RELAÇÃO AO GERENTE EXECUTIVO DA Sendo aoSECRETÁRIA fim e ao cabo, tal restrição aversa àBENEFICIADO. diretriz que IMPROBIDADE o texto MUNICIPAL E AO PARTICULAR constitucional nos ADMINISTRATIVA dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito CARACTERIZADA. ATO TIPIFICADO NO de ART. 10, cidadania que não CAPUT, é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar INCISOS XII E XIII. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES PREVISTAS de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em NA LEI AUSÊNCIA DEosPROVA DA PARTICIPAÇÃO uma realidade comunitáriaNºe 8.429/92. diversificada, expande horizontes dos direitos DA PREFEITA MUNICIPAL ATO IMPROBO. SENTENÇA e conceitos marginalizadores de primeiraNO dimensão ao sustentar em seuREFORMADA bojo o PARTE. CONHECIMENTO E PROVIMENTO reconhecimento daEM pessoa humana e não humana como titularesPARCIAL DA APELAÇÃO. 1 - A disposição graciosa de equipamentos e recursos municipal (veículos, máquinas, combustível e trabalhadores) em prol de particular pelo agente 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade atos lesivos público, além de causar prejuízo ao erário, implicando em de conduta tipificada ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresno art. 10, caput, incisos XII e XIII, da Lei nº 8.429/92, viola os princípios so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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constitucionais da moralidade impessoalidade e legalidade, devendo o autor responder pela prática de improbidade administrativa; 2. O particular que pleiteia favorecimento ao agente público e se beneficia indevidamente de recursos da Administração municipal está sujeito às sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa (art. 3º da LIA); 3. Não pode o agente público ser responsabilizado por improbidade administrativa se não teve participação, direta ou indireta, no ato ímprobo. (Apelação Cível nº 2013.021623-2, 3ª Câmara Cível do TJRN, Rel. Convocado Herval Sampaio. unânime, DJe 27.08.2014).
Finalmente, quanto ao réu Wagner de Castro Nascimento, não desponta dos autos prova bastante para demonstrar a sua responsabilidade subjetiva pela prática dos atos ímprobos sob investigação. As testemunhas ouvidas em audiência foram uníssonas em afirmar que não recebiam ordens diretas dele, pois quem de fato exercia a chefia imediata da equipe era Adão da Silva, que supervisionava e dava instruções acerca da execução dos trabalhos e ordenou diretamente as obras no curral e na estrada de acesso à sede da fazenda. Em que pese o planejamento do projeto de recuperação de vicinais ter sido realizado por Wagner Nascimento, haja vista que era o então Secretário de Obras e Infraestrutura do Município de Açailândia, não realizava a supervisão direta da execução do projeto e, portanto, não existem indícios factíveis que permitam inferir que ele tinha conhecimento das ilicitudes perpetradas. O elemento subjetivo integra as tipificações de improbidade. A responsabilidade é sempre subjetiva. Não é punível nos termos da LIA a inabilidade ou despreparo do administrador. Na verdade, não há prova sequer do nexo de causalidade que ligue diretamente qualquer conduta comissiva ou omissiva do réu aos atos de improbidade administrativa, caso em que o juízo será inevitavelmente de improcedência. 3. DOSIMETRIA: Na forma do art. 37, § 4º, da Constituição Federal, deve haver a gradação das reprimendas a serem impostas aos agentes ímprobos. Nesse diapasão, o art. 12, parágrafo único, da Lei n. 8.429/1992 informa quais os critérios que devem ser considerados para que se efetive a mencionada gradação: a extensão do dano
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causado e o proveito patrimonial do agente. 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Pordúvidas todo oquanto exposto, requeridos Gleide Santos, Dalvadísio Não restam ao aos caráter de controle popular direto e eficaz dos Santos e Adão no dacontrole Silva devem impingidos asPermanecem, penas cominadas nocertas art. 12, da da ação popular dos atosser administrativos. contudo, LIA, consoante os trata referidos critérios dosimetria, que forma em dúvidas quando se em uma lógicadedesagregadora dos vêm meiosganhando de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado precedentes colhidos da jurisprudência do STJ. das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação,Além para da a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização consideração das circunstâncias fáticas do caso concreto, desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio sopesando a extensão do dano causado ao ente público e do proveito patrimonial ambiental brasileiro. eventualmente obtido pelo agente, exsurgem como princípios balizadores da aplicação da pena a Segue-se, razoabilidade e a proporcionalidade entre o ato ímprobo cometido pelo na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante aoagente polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais e a penalidade imposta. A cumulação das penas não é obrigatória, mas facultativa, a da proteção meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação depender dosdocritérios de dosimetria. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o veja-se o que tem assentado o egrégio STJ em precedentes que é cidadania, aoNessa trazer senda, que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este jurisprudenciais: dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição deADMINISTRATIVO. Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely NO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATO DE IMPROBIDADE apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger ADMINISTRATIVA. DOSIMETRIA DA PENA. DECISÃO FUNDAMENTADA. corresponder a um de fiscalizar. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO E PROBATÓRIO CONSTANTE DOS AUTOS. INVIABILIDADE NA VIA ELEITA. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, queRECURSAL existe uma SÚMULA 7/STJ. 1. O art. 12análise da Lei nº 8.429/1992, seuvisto parágrafo relevante incongruência normativa com toda estendida até em aqui, que a único, CRFB/88, em seu bojo, traz aque dirigência Estado paradeprover, estabelece na fixaçãode dasações penaspositivas relativas àdo prática de atos improbidade dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo administrativa, devem ser levados em conta a extensão do dano causado, mote constitucionalassim da garantia de existência mínima de dignidade humana. É como o proveito patrimonial obtido pelo agente. 2. A esse respeito, a frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido jurisprudência deste sodalício prescreve é precisoconsequencial analisar a razoabilidade de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia que de forma o a proporcionalidade à gravidade do atoTodos! ímprobo e à cominação mínimo existencialede todos os sujeitosem dorelação ordenamento jurídico. das penalidades, as quais podem ocorrer de maneira cumulativa ou não. Sendo aoPrecedentes fim e ao do cabo, restrição à diretriz o textofático e STJ.tal 3. No caso emaversa concreto, com baseque no conjunto constitucional nos probatório dá, dada constante a impossibilidade clara de restrição do conceito de dos autos, o Tribunal a quo consignou que não se comprovou cidadania que não nos é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar autos, de modo satisfatório, proveito patrimonial auferido diretamente pelo de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em recorrido agido com o propósito vantagem indevida ou beneficiar uma realidade comunitáriaouetenha diversificada, expandedeosobter horizontes dos direitos diretamente pessoas a ele vinculadas. revista e conceitos marginalizadores de primeira dimensãoEsta ao conclusão sustentar não empode seu ser bojo o sem análise das provas nos autos, o que é inviável na via recursal reconhecimento danova pessoa humana e nãoconstantes humana como titulares eleita a teor da Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no Recurso Especial nº 1319480/SP (2011/0281840-7), 2ª Turma do STJ, Rel. Mauro 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte Marques. legítima paraj.pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de (grifei) atos lesivos Campbell 15.08.2013, unânime, DJe 22.08.2013) ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PAGAMENTOS EFETUADOS POR ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA, MEDIANTE DEPÓSITO EM CONTA-CORRENTE, À OFICIAL DE JUSTIÇA. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. OFENSA AOS ARTS. 165, 458 E 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. ART. 12 DA LEI Nº 8.429/92. APLICAÇÃO DAS PENALIDADES. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE RESPEITADO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA Nº 7 DO STJ. 1. Sobre a alegada ofensa aos artigos 165, 458, II, e 535, II, do CPC, nota-se que o acórdão da Corte de origem foi claro e harmônico ao decidir as questões suscitadas pela recorrente. Não se vislumbra, portanto, omissão, obscuridade ou contradição no acórdão recorrido capaz de tornar nula a decisão impugnada no especial, porquanto a Corte de origem apreciou a demanda de modo suficiente, havendo se pronunciado acerca de todas as questões relevantes para o deslinde da controvérsia. 2. No que tange à presença dos elementos subjetivos exigidos para a configuração da conduta enquanto ato de improbidade administrativa, verifica-se que o Tribunal a quo, a partir dos elementos fáticos e probatórios constantes dos autos, constatou que os recorrentes agiram com dolo, requisito exigido para a subsunção da conduta ao comando normativo descrito no art. 9º, inciso I, da Lei 8.429/92. 3. Em síntese, na espécie, a instância ordinária esclareceu que os recorrentes depositavam valores em prol de Oficiais de Justiça (chamados com um tanto de eufemismo como “gratificações”) com o objetivo de obter maior celeridade no cumprimento dos mandados judiciais em processos patrocinados pelo escritório, daí porque não há que se falar na inexistência do elemento subjetivo. Destaco, ainda que a 2ª Turma deste sodalício já entendeu pela configuração efetiva da conduta enquanto ato de improbidade administrativa em situação semelhante, nos termos do seguinte precedente: AgRg nos EDcl nos EDcl no Ag 1272677/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 04.11.2010, DJe 02.02.2011. 4. No que tange à proporcionalidade das penas aplicadas, embora seja cediço nesta Corte Superior que as sanções do art. 12 da Lei nº 8.429/92 não são necessariamente cumulativas e que cabe ao magistrado a sua dosimetria (conforme se depreende do parágrafo único do citado dispositivo), também é certo que a pena fixada em juízo de proporcionalidade e com base em critérios como a extensão do dano e/ ou o proveito patrimonial obtido pelo agente não pode ser revista por esta Corte em sede de recurso especial, ante o óbice da Súmula nº 7 do STJ. Precedentes do STJ. 5. Por fim, eventual divergência dos fundamentos aqui adotados em relação às teses adotadas em outro julgado pela 1ª Turma deste sodalício deve ser analisada em via processual própria, nos termos do art. 546 do CPC e ainda do art. 266 do RISTJ. 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no Recurso Especial nº 1305243/RS (2010/0173432-6), 2ª Turma do STJ, Rel. Mauro Campbell Marques. j. 16.05.2013, unânime, DJe 22.05.2013) (grifei). Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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5ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULARIMPROBIDADE COMO MEIOADMINISTRATIVA. DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL DOSIMETRIA DAS SANÇÕES APLICADAS POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REEXAME DE FATOS E Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz PROVAS. SÚMULA 7/STJ. 1. À luzatos de abalizada doutrina: “A probidade administrativa é uma forma da ação popular no controle dos administrativos. Permanecem, contudo, certas de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição, pune o ímprobo dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios deque produção, consumo e descarte, vertiginoso e multipolarizado com a suspensão de direitosdiante políticosdo (art.crescimento 37, § 4º). A probidade administrativa consiste no dever de das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão o ‘funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suasna funções, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio queira favorecer’. O desrespeito a esse dever é que caracteriza a improbidade administrativa. Cuidaambiental brasileiro. se de uma imoralidade administrativa qualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificadaSegue-se, pelo dano aona erário e correspondente ao ímprobo ou a outrem in José análise a princípiovantagem de doutrina e legislação, no (...)” tocante aoAfonso polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2005, p. da do meio ambiente, previstas quem tem legitimidade para propor uma ação 669.proteção 2. A aplicação das penalidades no art. 12 da Lei nº
popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o 8.429/1992 exige que o magistrado considere, no caso concreto, “a extensão do dano causado, assim que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este como o proveito pelo agente” (conforme previsão expressa no parágrafo único dispositivo serpatrimonial tido comoobtido não recepcionado pela vigente ordem constitucional. do referido artigo). é preciso e a proporcionalidade em relação Comungada com Assim, esse ponto deanalisar vista, a razoabilidade doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely à gravidade do ato ímprobo e à cominação das penalidades, as quais podem ocorrer de maneira Meirelles, em síntese correspondem-se a ideia de direitosRel. e deveres, ipso facto, cumulativaque ou não (Precedente: AgRg no REsp 1.242.939/SP, Min. Herman Benjamin, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Segunda Turma, julgado em 24.05.2011, DJe 30.05.2011). 3. A aplicação das sanções ocorreu de corresponder a um de fiscalizar. forma fundamentada e razoável, incidindo, no caso, a Súmula 7/STJ. Precedentes: REsp 1.173.845/ MG, Rel. Min. Benjamin, Segunda em 08.06.2010, DJeexiste 27.04.2011; SemHerman maiores obstinações, ficaTurma, claro,julgado permissa vaenia, que uma AgRg no AREsp 19.850/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Segunda Turma, julgado emque 06.09.2011, relevante incongruência normativa com todaMarques, análise estendida até aqui, visto a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, DJe 14.09.2011.
dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucionalAgravo da garantia deimprovido. existência mínima de dignidade regimental (AgRg no Agravo em Recursohumana. Especial nºÉ176178/ frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido PI (2012/0096678-3), 2ª Turma do STJ, Rel. Humberto Martins. j. 26.06.2012, de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencialunânime, de todosDJe os 29.06.2012) sujeitos do (grifei) ordenamento jurídico. Todos! Sendo aoAfim e ao cabo, talSantos, restriçãonoaversa à diretriz que o de texto ré Gleide Lima exercício do mandato prefeita constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito municipal, cometeu ato de improbidade consistente na utilização, em obra oude serviço cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar particular, de veículos, máquinas, equipamentos e material de qualquer natureza, de de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em propriedade à disposiçãoe do Município expande de Açailândia, bem como trabalho de uma realidadeoucomunitária diversificada, os horizontes dos odireitos servidores empregados ou terceiros contratados por essa e conceitospúblicos, marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar ementidade seu bojo(ilicitude o capitulada no art. 9º, IV, humana da Lei n. 8.429/92), locupletando-se reconhecimento da pessoa e não humana como titulares ilicitamente com a valorização de seu patrimônio pessoal. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão parte objeto legítima para a anulação a declaração de nulidade de atos lesivos Osserá fatos dapleitear demanda suboujudice afiguram-se de expressiva ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresgravidade, na medida em que a utilização do grande número de máquinas, combustível so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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e servidores públicos em desvio de finalidade, por prazo de até trinta dias, com o objetivo de enriquecer-se ilegalmente, demonstra uma tremenda falta de escrúpulos e total desprezo pela res publica. No caso, estão presentes razões fáticas e jurídicas que justificam a imposição das sanções mais rigorosas cominadas no art. 12, I, da LIA. O Superior Tribunal de Justiça, ao examinar lide envolvendo improbidade administrativa que resultou em enriquecimento ilícito, proferiu acórdão de onde extrai este excerto, digno de destaque: “Os atos de improbidade que importem em en normalmente sujeitam o agente a todas as sanções previstas no art. 12, I, pois referidos atos sempre são dolosos e ferem o interesse público, ocupando o mais alto ‘degrau’ da escala de reprovabilidade.”(REsp 1195828/MA, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/09/2010, DJe 04/10/2010).
Avaliando a gravidade das ações perpetradas pela então Prefeita, que procedeu deliberadamente em prejuízo do ente federado, considero justa e adequada, segundo os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a aplicação cumulativa das penas de perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Por seu turno, o réu Dalvadísio dos Santos, submetido à LIA por força do art. 3º, mesmo não sendo agente público, concorreu para a prática do ato de improbidade e dele se beneficiou de forma direta, a partir da utilização, em obra ou serviço particular, de veículos, máquinas, equipamentos e material, de propriedade ou à disposição de entidade pública, bem como o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros contratados por essa entidade (ilicitude capitulada no art. 9º, IV, da Lei n. 8.429/92), locupletando-se ilicitamente com a valorização de seu patrimônio pessoal. Tanto quanto a conduta imputada à prefeita, a de seu esposo revelase de expressiva gravidade, na medida em que a utilização do grande número de máquinas, combustível e servidores públicos em desvio de finalidade, por prazo de até trinta dias, com o objetivo de enriquecer-se ilegalmente, demonstra uma tremenda
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falta de escrúpulos e total desprezo pela res publica. No caso, estão presentes razões 5fáticas AÇÃO POPULAR MEIO DIFUSOde DEsanções TUTELA AMBIENTAL e jurídicas queCOMO justificam a imposição mais rigorosas cominadas no art. 12,Não I, da LIA. restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas a gravidade das ações perpetradas requerido, que dúvidas quando seAvaliando trata em uma lógica desagregadora dos meiospelo de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado procedeu dolosamente em prejuízo do ente federado (acompanhou pessoalmente a das agressões sistemáticas meio ambiente, legitimidade do justa cidadão na execução das obras que lheao trouxeram proveitodailícito), considero e adequada, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização segundo os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a aplicação cumulativa das desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio penas de perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento ambiental brasileiro. integral do dano, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com onaPoder ou receber benefícios ou incentivos Segue-se, análisePúblico a princípio de doutrina e legislação, no tocantefiscais ao ou polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais creditícios. Não lhe é aplicável, contudo, a pena de perda da função pública por não da tememprego legitimidade para propor uma ação ser proteção ocupantedo de meio cargo,ambiente, mandato,quem função, ou atividade pública. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o o demandado da Silva, no exercício do cargo de provimento que é cidadania, aoJá trazer que o títuloAdão eleitoral é a prova de cidadania, devendo este em comissãoser detido Assessor do Gabinetepela da Prefeita, ato de improbidade dispositivo comoEspecial não recepcionado vigente cometeu ordem constitucional. consistente permitir utilização, em obra ou serviçomajoritária particular, de veículos,como máquinas, Comungadaemcom esse aponto de vista, a doutrina entende, expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely equipamentos e material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição do Meirelles, em síntese correspondem-se a ideia direitos e públicos, deveres, ipso facto, ou Municípioque de Açailândia, bem como o trabalho dedeservidores empregados apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger terceiros contratados por essa entidade (ilicitude capitulada no art. 10, XIII, da Lei n. corresponder a um de fiscalizar. 8.429/92). Embora não se tenha notícia de que o agente tenha obtido enriquecimento ilícito, ficou prejuízo ao fica erário. Semprovado maioresoobstinações, claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz anesta dirigência de ações positivas do Estado para prover, Também hipótese, tem-se conduta execrável, de inegável dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo gravidade. O demandado permitiu a utilização do grande número de máquinas, combustível mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É por e servidores públicos, sob sua responsabilidade direta, em desvio de finalidade, frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido prazo até trinta dias, com o objetivo de favorecer terceiras pessoas, o de que,dequando lesionado, o meio ambiente deprecia ilegalmente de forma consequencial o que demonstra a sua total desprezo pela res publica. No caso, mínimo existencial de falta todosde osescrúpulos sujeitos do eordenamento jurídico. Todos! estão presentes razões fáticas e jurídicas que justificam a imposição das penalidades Sendo cominadas ao fim e ao mais rigorosas no cabo, art. 12,talII,restrição da LIA. aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não Avaliando é sinônimaade cidadaniadas eleitoral, especialmente se tratar gravidade ações perpetradas peloaoagente público, de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em que dolosamente adotou comportamento em prejuízo do ente federado a quem uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos devia lealdade, considero justa e adequada, segundo os princípios da proporcionalidade e e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o razoabilidade, aplicação cumulativa sanções de ressarcimento integral do dano, reconhecimentoa da pessoa humana e nãodas humana como titulares perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos 1. Art. 1.ºou Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos fiscais creditícios, direta ou indiretamente. ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Relativamente ao ressarcimento dos prejuízos infligidos ao Município de Açailândia, é oportuno arrazoar que os condenados têm responsabilidade solidária passiva, respondendo, cada um deles, pelo integral adimplemento do crédito que se constitui em favor do erário. Colhem-se do acervo do STJ os julgados cujas ementas, cito abaixo: ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. GARANTIA DE EVENTUAL EXECUÇÃO. LIMITES. VALOR DO DANO AO ERÁRIO, ACRESCIDO DE POSSÍVEL IMPOSIÇÃO DE MULTA CIVIL, ESTIMADO PELO AUTOR DA AÇÃO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ATÉ A INSTAURAÇÃO DE LIQÜIDAÇÃO. PODERES DE CAUTELA E DE CONDUÇÃO DO FEITO PELOS MAGISTRADOS. OBSERVÂNCIA DE PRECEITOS LEGAIS SOBRE VEDAÇÃO À INDISPONIBILIDADE. 1. É pacífico nesta Corte Superior entendimento segundo o qual a indisponibilidade de bens deve recair sobre o patrimônio dos réus em ação de improbidade administrativa de modo suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao erário, levando-se em consideração, ainda, o valor de possível multa civil como sanção autônoma. Precedentes. 2. Na espécie, o Ministério Público Federal quantifica inicialmente o prejuízo ao erário na esfera de vinte e cinco milhões de reais. Esta é, portanto, a quantia a ser levada em conta na decretação de indisponibilidade dos bens, não esquecendo o valor do pedido de condenação em multa civil, se houver (vedação ao excesso de cautela). 3. Ocorre que, contando a ação civil pública com vinte e cinco réus, e dado o desenvolvimento incipiente da instrução processual, não é possível aferir, agora, o grau de participação de cada parte na consecução de eventuais condutas ímprobas. 4. Daí porque aplica-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, até a liqüidação, devem permanecer bloqueados tanto quantos bens foram bastantes para dar cabo da execução em caso de procedência da ação, na medida em que vigora entre os réus uma responsabilidade do tipo solidária. Precedentes. 5. Deixe-se claro, entretanto, que ao juiz responsável pela condução do processo cabe guardar atenção, entre outros, aos preceitos legais que resguardam certas espécies patrimoniais contra a indisponibilidade, mediante atuação processual dos interessados - a quem caberá, p. ex., fazer prova que determinadas quantias estão destinadas a seu mínimo existencial. 6. Recurso especial provido. (REsp 1195828/MA, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/09/2010, DJe 04/10/2010).
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ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
5 AÇÃO POPULAR MEIO DE TUTELA AMBIENTAL LEI COMO N. 8.429/92. ATODIFUSO DE IMPROBIDADE. REPARAÇÃO DE DANOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DOSIMETRIA DA PENA. CABIMENTO.
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Os atosdos de atos improbidade que importem em enriquecimento da ação popular no 1. controle administrativos. Permanecem, contudo,ilícito certas(art. 9º) sujeitam o agente a todas as sanções previstas no art. 12, I, pois dúvidas quando senormalmente trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, referidos atos sempre são dolosos e vertiginoso ferem o interesse ocupando o mais consumo e descarte, diante do crescimento e público, multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão namesmo alto ‘degrau’ da escala de reprovabilidade. Todos são prejudicados, até propositura da ação,ospara a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização agentes do ato ímprobo, porque, quer queiram ou não, estão inseridos na desta possibilidadesociedade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio que não respeitam. 2. Na reparação de danos prevista no inciso I do ambiental brasileiro.
art. 12 da Lei n. 8.429/92, deverá o julgador considerar o dano ao erário público, nãoanálise apenas oaefetivo ganho auferido pelo agente do ímprobo, Segue-se,e na princípio deilícito doutrina e legislação, noato tocante ao porque referida norma busca o agente não só pelo polo ativo da demanda numa leitura da punir CRFB/88 observados os proveito deveres econômico comunais obtido da proteção do meio ambiente, tem legitimidade para perpetrada propor uma ação ilicitamente, masquem pela prática da conduta dolosa, em ferimento ao popular? É possíveldever destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação de probidade. 3. Na hipótese em que sejam vários os agentes, cada um 1 Popular (LAP – leiagindo nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o em determinado campo de atuação, mas de cujos atos resultem o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este à Administração Pública, correta a condenação solidária de todos na dispositivo ser tidodano como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. patrimônio e indenização danos causados. Comungada com restituição esse pontodode vista, a público doutrina majoritáriapelos entende, como 4.
expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, facto, Rel. Recursos especiais conhecidos em parte e improvidos. (REspipso 678599/MG, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em corresponder a um 24/10/2006, de fiscalizar. DJ 15/05/2007).
Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma RECURSO IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. relevante incongruência normativaESPECIAL. com toda análise estendida até aqui, visto que a RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo LIMITE DA CONSTRIÇÃO. QUANTUM SUFICIENTE AO INTEGRAL mote constitucionalRESSARCIMENTO da garantia de existência dignidade humana. É do DO DANO.mínima 1. No ato de de improbidade administrativa frágil sustentar quequal a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido resulta prejuízo, a responsabilidade dos agentes em concurso é solidária. de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o 2. É defeso indisponibilidade de bens alcançar o débito Todos! total em relação a cada um mínimo existencial de todos aos sujeitos do ordenamento jurídico. dos co-obrigados, ante a proibição legal do excesso na cautela. 3. Os patrimônios
sãocabo, franqueados à cautelar,aversa tanto quanto for possível Sendo aoexistentes fim e ao tal restrição à diretriz que odeterminar, texto até constitucional nos adá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito medida da responsabilidade de seus titulares obrigados à reparaçãode do dano, cidadania que não seus é sinônima delegais cidadania eleitoral, especialmente aoincompatibilidade se tratar acréscimos e à multa, não havendo, como não há, de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em qualquer entre a solidariedade passiva e as obrigações divisíveis. 2. Recurso especial uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos improvido. (REsp 1119458/RO, Rel. Ministro HAMILTON e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seuCARVALHIDO, bojo o TURMA, julgado em 13/04/2010, DJe 29/04/2010). reconhecimento daPRIMEIRA pessoa humana e não humana como titulares
4. PEDIDO DE AFASTAMENTO PROVISÓRIO: 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresO Parquet pede o afastamento provisório da requerida gestora, so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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antes do trânsito em julgado da sentença. Sustenta que, no curso da instrução processual, desvelou-se que a gestora teria praticado atos que configurariam coação contra os servidores públicos que testemunharam em juízo. Justifica que estão presentes os requisitos para o acolhimento do pedido, isto é, o periculum in mora e o fumus boni juris. Argúi que permitir que a prefeita prossiga no exercício de suas funções possibilita novas lesões ao patrimônio público, enriquecimento ilícito, e o desrespeito aos princípios da Administração Pública. Neste ponto, divirjo do entendimento do Órgão Ministerial. Basta um olhar atendo ao regramento trazido pelo art. 20 e parágrafo único da Lei de improbidade para se concluir pela impossibilidade de acolhimento do pleito. Para melhor compreensão da questão, transcrevo a literalidade dos dispositivos: Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória. Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual. (grifei)
Em consonância com o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF), a lei federal prevê como regra a permanência do agente na função pública e a conservação do gozo dos direito políticos enquanto não transitada em julgado a sentença condenatória por improbidade administrativa. Somente por via de exceção, a autoridade administrativa ou judicial poderá determinar o afastamento do agente na hipótese exclusiva em que a medida se mostrar necessária à instrução processual. Nessa linha, mostra-se inviável, por absoluta desnecessidade, o afastamento cautelar da gestora. Ora, já findou a instrução processual, sendo que foram ouvidas as testemunhas arroladas pelo autor e pelos réus, além de as partes terem exercido amplamente o direito de defesa ao produzirem as provas que julgaram convenientes. Assim, não há falar, mesmo que hipoteticamente, em prejuízo para a instrução processual ocasionado pela ré no exercício da função pública.
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5 AÇÃO POPULAR COMOdaMEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL A adoção medida é eminentemente excepcional, e carece de fundamentação calcada na demonstração do fumus bonis juris e no periculum in mora Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz (consoante previsão do art.dos 273, caput, do CPC). Todavia, está ausente o perigo da ação popular no controle atos administrativos. Permanecem, contudo, certas atual ou iminente de prejuízo parauma a instrução do processo. dos meios de produção, dúvidas quando se trata em lógica desagregadora consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, legitimidade do cidadão na Convém colacionar a posiçãodadoutrinária a respeito: propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio Trata-se de medida pertinente quando o agente público, acusado de improbidade ambiental brasileiro. administrativa, pode, em razão da posição administrativa que ocupa, adotar atitudes
p. de ex.,doutrina fazendo desaparecer documentos ou destruindo Segue-se,prejudiciais na análiseà ainstrução, princípio e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais outras provas, intimidando testemunhas, enfim, transtornando a regular colheita da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor doutrina, uma ação da prova. (FAZZIO JR., Waldo. Improbidade administrativa: legislação popular? É possívele destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação jurisprudência. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 380) Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este doutrina igualmente, para a prudência recomendável na dispositivo ser tidoAcomo não alerta, recepcionado pela vigente ordem constitucional. apreciação pedidos quando se tratar de agente entende, político no exercício Comungadadecom esse dessa pontonatureza de vista, a doutrina majoritária como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely de mandato eletivo, dado o caráter transitório da função pública: Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína pleito quando o direito político de eleger A observância dessasde exigências se mostra ainda mais pertinente em casos de corresponder a um de fiscalizar. mandato eletivo, cuja suspensão, considerada a temporariedade do cargo e a natural demora na instrução de ações de improbidade, na prática, acarretar Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, pode, que existe uma a própria perda definitiva. Nesta hipótese, aquela situação excepcionalidade relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui,devisto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a tão dirigência ações positivas do Estado para prover, se configura somente de com a demonstração de um comportamento do agente dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo público que, no exercício de suas funções públicas e em virtude dele, importe mote constitucionalefetiva da garantia existência mínima (FAZZIO de dignidade humana. É ameaça àdeinstrução do processo. JR., Waldo. Improbidade frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido administrativa: doutrina, legislação e jurisprudência. 3. ed. São Paulo: Atlas, de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o p. 383) mínimo existencial2015. de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos!
Sendo aoColijo fim e precedentes ao cabo, taldo restrição à diretriz que interpretação o texto STJ queaversa dão guarida a essa constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de restritiva do dispositivo legal: cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em AGRAVO REGIMENTAL EM MEDIDA CAUTELAR - AFASTAMENTO DE uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos PREFEITO MUNICIPAL AÇÃO DE IMPROBIDADE e conceitos marginalizadores de primeira- dimensão ao sustentar emADMINISTRATIVA seu bojo o RECURSO ESPECIAL ADMITIDO REQUISITOS LEGAIS PARA A reconhecimento da- pessoa humana e não humana como- titulares CONCESSÃO DA LIMINAR CONFIGURADOS - RAZÕES RECURSAIS INCAPAZES DE INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos - AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Havendo duas ações delesivos improbidade ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresadministrativa contra a autoridade pública, além das respectivas ações penais so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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instauradas, a análise dos pressupostos que justificaram a decretação de seu afastamento deve ficar adstrita à decisão impugnada e aos contornos da lide. 2. Embora a ausência de efeitos práticos, não se justificaria o indeferimento da atribuição de efeito suspensivo ao recurso especial tão-apenas em face da subsistência do afastamento na esfera criminal, decretada em ação penal que não guarda correlação com os fatos apurados na ação de improbidade em questão. 3. A análise dos requisitos autorizadores do afastamento (art. 20, § único, Lei 8.429/92), em face de sua excepcionalidade, apenas se justifica quando haja efetivamente riscos de que a permanência no cargo da autoridade submetida à investigação implique obstrução da instrução processual. 4. Apresentada a documentação que ensejou a propositura da ação de improbidade administrativa, para a apuração de falsificação de teor ideológico de Portaria e constatando-se que quatro das seis testemunhas, arroladas na inicial da ação de improbidade, não se encontram sob a esfera administrativa da Prefeitura, não se caracteriza o receio de coação em função do exercício do cargo. 5. A concessão de liminar inaudita altera parte se justifica quando a demora no provimento possa acarretar prejuízos ao requerente ou ineficácia de seu provimento final. Ademais, a providência não impõe restrição ao princípio do contraditório, mas tão-somente posterga no tempo a oitiva da parte contrária. 6. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg na MC: 8810 AL 2004/0111726-6, Relator: Ministra DENISE ARRUDA, Data de Julgamento: 28/09/2004, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 22.11.2004 p. 264). (grifei) PROCESSUAL CIVIL. LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AFASTAMENTO DE PREFEITO. INTERPRETAÇAO DO ART. 20, DA LEI Nº 8429/92. 1. O art. 20, da Lei nº 8429, do ano de 1992, só há de ser aplicado em situação excepcional, isto é, quando, mediante fatos incontroversos, existir prova suficiente de que o agente público ou a autoridade administrativa está provocando sérias dificuldades para a instrução processual. 2. Por ser medida extrema, com capacidade de suspender mandato eletivo, a interpretação do dispositivo que a rege é restrita, sem qualquer condição de ser ampliada. (STJ, AgRg na MC 3048/BA, PRIMEIRA TURMA, Ministro JOSÉ DELGADO, DJ 06/11/2000). (grifei)
Em arremate a respeito do cabimento de antecipação de tutela, no campo da ação civil pública de improbidade, assim se manifesta a doutrina: A bem de ver, nas ações de improbidade a antecipação recairá sobre os efeitos desconstitutivos ou mandamentais, não propriamente sobre os efeitos condenatórios.
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Realmente, no que diz respeito às sanções do art. 12, como já afirmado,
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA nenhuma possibilidade de antecipação haverá AMBIENTAL em razão da cláusula de
presunção de não culpabilidade. [...] (GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério
Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz Administrativa.Permanecem, 8. ed. São Paulo: Saraiva, certas 2014. p. 367). da ação popular no Pacheco. controleImprobidade dos atos administrativos. contudo, dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, À vista da ausência dos requisitos autorizadores da medida, não consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na prospera o pedido de antecipação da tutela para afastamento do cargo. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade5.deDISPOSITIVO: atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. o exposto, na forma do artigo 269, I, no do tocante CPC, JULGO Segue-se,Ante na análise a princípio de doutrina e legislação, ao PARCIALMENTE OS PEDIDOS na Inicial, nos polo ativo da demandaPROCEDENTES numa leitura da CRFB/88 observadosformulados os deveres comunais da proteção ambiente, quem tem para propor uma para açãoimpor termos do art.do12meio da Lei n. 8.429/92 e art. 37,legitimidade § 4º da Constituição Federal, popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação aos réus as sanções que passo 1a individualizar: Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este Lima Santos: dispositivo ser tidoI) comoGleide não recepcionado pela vigente ordem constitucional. ilicitamenteentende, ao seu patrimônio, Comungada com a) esse perda ponto dos de valores vista, a acrescidos doutrina majoritária como serem apurados via liquidação de sentença; expresso na lição dea Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína deintegral pleito quando o direito político de eleger b) ressarcimento do dano causado ao erário no valor corresponder a um de de R$ fiscalizar. 160.315,69 (cento e sessenta mil, trezentos e quinze reais e sessenta e nove centavos), atualizado; Sem maiores obstinações, fica claro, devidamente permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a c) perda da funçãode pública; CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de umdecomplexo d) suspensão dos direitos políticos pelo prazo 10 (dez) anos; mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar quee) a cidadania se resume à comprovação pagamento de multa civil no valordocumental, equivalente ano3 sentido (três) vezes o de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o valor do acréscimo patrimonial verificado na Fazenda Copacabana, mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! a ser apurado via liquidação de Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos sentença dá, dada a(vinculado; impossibilidade clara de„a‟) restrição do conceito de a alínea cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria Uma constituição comoPúblico a nossa, em f) ambiental. proibição de contratar com o Poder ou pautada receber benefícios uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos ou incentivos oudimensão creditícios, ou indiretamente, e conceitos marginalizadores de fiscais primeira ao direta sustentar em seu bojo o ainda por humana intermédio de humana pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, reconhecimento daque pessoa e não como titulares pelo prazo de 10 (dez) anos. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão seráDalvadísio parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos AI) Moreira dos Santos: ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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a) perda dos valores acrescidos ilicitamente ao seu patrimônio, a serem apurados via liquidação de sentença; b) ressarcimento integral do dano causado ao erário no valor de R$ 160.315,69 (cento e sessenta mil, trezentos e quinze reais e sessenta e nove centavos), devidamente atualizado c) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 10 (dez) anos; d) pagamento de multa civil no valor equivalente a 3 (três) vezes o valor do acréscimo patrimonial verificado na Fazenda Copacabana, a ser apurado via liquidação de sentença (vinculado a alínea „a‟); e) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, pelo prazo de 10 (dez) anos. BI) Adão Gomes da Silva: a) ressarcimento integral do dano causado ao erário no valor de R$ 160.315,69 (cento e sessenta mil, trezentos e quinze reais e sessenta e nove centavos), devidamente atualizado; b) perda da função pública; c) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (oito) anos; d) pagamento de multa civil equivalente a 2 (duas) vezes o valor do dano causado ao erário –R$ 320.631,38 (trezentos e vinte mil, seiscentos e trinta e um reais e trinta e oito centavos), devidamente atualizado; e) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL A responsabilidade ressarcimento danosdireto causados ao erário Não restam dúvidas quanto aopelo caráter de controledos popular e eficaz édasolidária entrenooscontrole três condenados. ação popular dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante Custas pelosdo réuscrescimento condenados.vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação,Publique-se. para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Registre-se. Intimem-se. desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Transitada em julgado a presente sentença, oficie-se ao TRE-MA, para as providências do art. 15, V, eaart. 37, § 4º, CF. Ademais, oficie-se à ProcuradoriaSegue-se, na análise princípio deda doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Geral do Município de Açailândia, com cópia desta sentença, para os fins de direito; da meio ambiente, quem Inidôneas tem legitimidade para propor ação pela ao proteção Cadastro do Nacional de Empresas e Suspensas (CEIS),uma mantido popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Controladoria-Geral da União; ao Cadastro Nacional de Condenados por Ato de Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o Improbidade Administrativa e por que éimplique (CNCIAI), que é cidadania, ao trazer que o título Ato eleitoral a prova deinelegibilidade cidadania, devendo este na forma da Resolução n. 44/2007, do Conselho Nacional Justiça. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigentede ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição deApós, Rodolfo de Camargo Theodoro arquivem-se os Mancuso, autos comHumberto as cautelas legais. Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Açailândia, MA, 1º/09/2015. corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma Antonio Alencar Santos relevante incongruência Angelo normativa com toda análisedos estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, Juiz de Direito dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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PROCESSO Nº XX/2010 AÇÃO: Ação de Guarda REQUERENTE: Ministério Público em favor de L. R. S. e M. S. S. REQUERIDA: K. S. S. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO
Aos 12 (doze) dias do mês de maio de 2010, às 12:00 horas, na sala das audiências, da Comarca de São Domingos do Azeitão, presente o MM. Juiz de Direito desta Comarca, Dr. ARTUR GUSTAVO AZEVEDO DO NASCIMENTO, comigo, Técnica Judiciária. Pelo MM. Juiz foi determinado ao Oficial de Justiça que apregoasse as partes, constatados presentes os senhores L. R. S. e M. S. S., e a Requerida K. S. S., acompanhada de sua Advogada, Dra. LUCIANE RODRIGUES DA SILVA. Presente também o membro do Ministério Público, Dr. FRANCISCO FERNANDO DE MORAIS MENESES FILHO. Aberta a audiência, o membro do Ministério Público manifestou-se contrariamente à homologação da proposta de acordo das fls. 80-81, reiterando o pedido que fora formulado nas fls. 73-75. Em seguida, o MM. Juiz prolatou a seguinte sentença: “Relatório : O Ministério Público, em assistência a L. R. S. e M. S. S., ajuizou ação de guarda em desfavor de K. S. S.. Em suma, afirmam que em julho de 2007 mudaram-se para São Paulo e deixaram sua filha M. L. aos cuidados da Requerida, e que a partir de maio de 2009 a Requerida não mais permitiu os pais manterem contato telefônico com sua filha. Pleiteiam a intervenção judicial para que a menor retorne a sua família natural. Foi deferida medida liminar para assegurar aos Requerentes o direito de visitar a filha M. L., por duas horas diárias, com a supervisão de Assistente Social. Citada, a Requerida apresentou contestação (fls. 16-21). Elaborado estudo de caso (fls. 70-72). Em 05.05.2010 realizou-se audiência, na qual esboçou-se um acordo de visitação da menor M. L. pelos Requerentes, a depender da manifestação do Ministério Público (fls. 80-81). É o que
importa relatar. Passo a decidir. Fundamentação: A demanda tem como escopo o retorno da guarda da menor M. L., hoje com quatro anos de idade, a sua família natural que, por determinado tempo, a atribuiu informal e provisoriamente à Requerida. Cabe consignar, inicialmente, que os Requerentes aquiesceram sobre a concessão da guarda provisória da filha M. L. à Requerida. As razões advieram
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do fato da necessidade da mãe M. S. S. realizar tratamento médico em Teresina5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL PI, e da mudança da família biológica para São Paulo. Compulsando os autos, percebe-se que os elementos colacionados o substrato necessário a concluir Não restam dúvidas quanto ao caráterdão de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas que os pais da menor jamais tiveram a intenção de abandonar sua filha ou deixádúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, la de forma sob os do cuidados da Requerida. O relatório elaborado pela consumo e definitiva descarte, diante crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na Assistente Social que acompanhou as visitas preliminares constatou o seguinte: propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização “Dentre os dias visitados se percebeu somente no primeiro dia a resistência da criança desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio em não querer aproximação com sua família natural, ressaltando que após a retirada da ambiental brasileiro. criança da residência a convivência entre a criança, os pais e irmãos biológicos ocorreu Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao de forma entre conversas, brincadeiras e poses para fotos. Quandocomunais saímos da casa polo ativonatural da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres (família adotiva) com aambiente, criança, o quem relacionamento aconteceupara normalmente, como também da proteção do meio tem legitimidade propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação quando não saímos por algumas 1dificuldades que a criança tem pelo apego afetivo a família Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o da Sta. K.S.S. Osao momentos se passou dentro residência. Ela brincou comeste os irmãos que é cidadania, trazer queque o título eleitoral é ada prova de cidadania, devendo dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. e também com a mãe biológica. Toda a família da Sta. K.S.S demonstra gostar muito da Comungada essetoda ponto de vista, aonde doutrina entende, como com a criança como com também a vizinhança, vir quemajoritária existe um laço harmônios expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely criança, mas deixar de ressaltar que os pais biológicos também demonstraram Meirelles, quenão emposso síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger amor, tranqüilidade, paciência, com a criança neste processo.” (fl. 70). Já o relatório corresponder a um de fiscalizar. psicológico descreve: “K. S. S., atendida no Centro de Referência da Assistência Social – CRAS, no diamaiores 04 de fevereiro de 2010, queixavaenia, ao atendimento psicológico, o Sem obstinações, ficatrouxe claro,como permissa que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a medo de perder a guarda de sua filha de criação para seus pais biológicos. Segundo relatos CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, da paciente, suaofilha criação, a como menorelemento M. L. S. compositor S. de 4 (quatro) anos de idade, teria dentre muitos, meiode ambiente de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. sido exposta a discussões sobre sua guarda por diversas vezes, fazendo com que aÉcriança frágil sustentar que a cidadania resume documental, no sentido apresentasse comportamento quese até entãoà comprovação não eram apresentados como: disfunção do
de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o sono, insegurança constante, principalmente de serjurídico. levada por seus pais biológicos. mínimo existenciale medo de todos os sujeitos do ordenamento Todos!
Segundo K. S. S. tais comportamentos começaram a aparecer depois que os pais biológicos Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto da criança demonstrarão interesse por sua guarda, e quedeisso estaria do afetando no equilíbrio constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara restrição conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar emocional da criança e consequentemente na sua saúde psicológica. Após acompanhar a de tutela de matéria ambiental. constituição a nossa, pautada visita domiciliar dos pais biológicosUma da criança, no dia como 05 de março de 2010, foi em percebido uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos pouco damarginalizadores dinâmica familiar de da primeira paciente, chamando o fatoem da menor M. oL. S. S. eumconceitos dimensão atenção ao sustentar seu bojo reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares não apresentar nenhum dos comportamentos descritos por sua mãe de criação, relatados no primeiro atendimento psicológico, como medo e insegurança. A criança apresentou-se de forma tranqüila e brincou durante o tempo em que com seus irmãos biológicos. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítimatodo para pleitear a anulação ou a esteve declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresDurante todo o tempo de visitação K. S. S. também esteve presente. No decorrer de toda a so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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visitação não foi percebido a presença de fatores de risco que possam estar comprometendo a saúde psicológica da criança.” (fl. 71) Logo, os relatórios Social e Psicológico (fls. 70-71) demonstram que não há impedimentos para que a guarda da menor M. L. seja exercida pelos seus pais biológicos. Nesse diapasão, verifica-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe claramente como regra, que toda criança ou adolescente tem o direito de ser criado e educado dentro de sua família. Não se ajustando à família biológica por motivo expressamente comprovado capaz de comprometer a convivência familiar do menor é que, excepcionalmente, será levado à família substituta. Assim dispõe a lei nº 8.069/1990: “Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.” Destaco a recente Lei nº 12.010 de 03.08.2009, que passou a reger o tema da seguinte forma: Art. 1o Esta Lei dispõe sobre o aperfeiçoamento da sistemática prevista para garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes, na forma prevista pela Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e do Adolescente. § 1o A intervenção estatal, em observância ao disposto no caput do art. 226 da Constituição Federal, será prioritariamente voltada à orientação, apoio e promoção social da família natural, junto à qual a criança e o adolescente devem permanecer, ressalvada
absoluta impossibilidade, demonstrada por decisão judicial fundamentada. § 2o Na impossibilidade de permanência na família natural, a criança e o adolescente serão colocados sob adoção, tutela ou guarda, observadas as regras e princípios contidos na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, e na Constituição Federal. (sem grifos no original) Ora, o princípio da proteção integral da criança coloca seus interesses em posição de destaque em relação a demais interesses juridicamente tutelados. O seu direito de ser criada no pela família natural é regra, sendo que a substituição da família original, seja de forma temporária ou definitiva, é medida extrema, que exige comprovação plena dos riscos aos seus interesses – devendo a absoluta impossibilidade da permanência da criança ou adolescente ser demonstrada por decisão judicial fundamentada. Reforço que retirar o direito dos pais biológicos de criar, sustentar e dar amor a sua prole equivale a condenar o filho à condição de
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órfão de pais vivos, além de violar direitos básicos da criança previstos no art. 227 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL da Carta da República que prima pela obrigatoriedade da família em prover o infante com elementos irão dar substrato à sua direto formação pessoal. Não todos restamos dúvidas quantoque ao caráter de controle popular e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Nesse sentido é a jurisprudência: “Civil. Estatuto da Criança e do Adolescente. Guarda dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, de Menor. Revogação. Biológica. Prevalência. Substituta. Medida consumo e descarte,Cabimento. diante doMãe crescimento vertiginosoFamília e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na e a Excepcional. Correta é a decisão que revoga a guarda de menor em família substituta, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização coloca no seio de sua família biológica, pois é direito do menor ser criado e educado nesta, só desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio se justificando a prevalência em família substituta em casos extremamente excepcionais.” ambiental brasileiro. (TJDFT, APE38599, Relator Lecir Manoel da Luz, 4ª Turma Cível, julgado em Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao 04/10/1999, DJ 17/11/1999 p. 30). ainda, que fato dos Requerentes polo ativo da demanda numa leitura daPercebe-se, CRFB/88 observados osodeveres comunais nãoproteção disporem financeiros dapropor Requerida da do dos meiorecursos ambiente, quem temequiparados legitimidadeaos para uma não açãotem o popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação condão de modificar a guarda do menor. Há comprovação suficiente nos autos a Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o embasar a tese ao detrazer que, que mesmo emeleitoral condições financeiras adversas, mesmo que é cidadania, o título é a prova de cidadania, devendo estetendo dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. que se sacrificar para cuidar de seus outros dois filhos, os Requerentes não Comungada de convívio vista, a doutrina desistiram decom ter aesse filhaponto M. L. no familiar emajoritária superaramentende, todos oscomo obstáculos expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely para tentar reaver a guarda definitiva daa infante. Nesse ponto é aplicável o art. 23 Meirelles, que em síntese correspondem-se ideia de direitos e deveres, ipso facto,
apenas haveria legitimidade de pleito quando o direito materiais político denão eleger do ECA, que reza: Art. 23. genuína A falta ou a carência de recursos constitui corresponder a um de fiscalizar. motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder. Noutro diapasão, é maiores obstinações, fica vaenia, que existe uma no inegávelSem que a Requerida K. claro, teve permissa participação fundamental relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a desenvolvimento sócio-afetivo do menor M.positivas L., antedo o Estado fato depara a terprover, sob os seus CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo cuidados durante tempo razoável. Contudo, a falta de harmonia com os pais mote constitucional da se garantia existência mínimapara de dignidade humana. É biológicos em prol de buscarde a melhor educação a infante afeta o equilíbrio frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido emocional que alesionado, criança deve ter, ambiente principalmente, primeiros anos de de que, quando o meio deprecianos deseus forma consequencial o vida. mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Isto sem falar no fato de que a demora na resolução da lide enseja desgaste de todo
o tipo, Sendo perfazendo situações podem ao fimcom e aoque cabo,ocorram tal restrição aversa desagradáveis à diretriz que oque texto comprometer nos tododá, o desenvolvimento da criança, como a ocorrência policial constitucional dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de de fl. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar 27 datada de 25.01.2010, que em nada contribui para a melhor solução do problema. de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Essa realidade turbulência em nada ajuda a infante em sua formação. Muito contrário, uma comunitária e diversificada, expande os horizontes dospelo direitos eacaba conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o gerando maior confusão e angústia. No caso, embora o Estatuto da Criança reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares e do Adolescente recomende a oitiva do infante, tenho a mesma por dispensada pois a menor não está apta a decidir sobre o que realmente deseja, seja pelas 1. Art. 1.º Qualquer será parte legítima para pleitear a anulação ou aidade declaração(quatro de nulidadeanos), de atos lesivos limitações de cidadão maturidade inerentes à sua tenra seja pela ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresfragilidade de seu estado emocional, seja, ainda, pelos indícios de submissão a so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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processo de alienação parental por parte da Requerida. A alienação parental consiste no ato de influenciar criança para que tenha uma imagem negativa com relação aos seus pais, pondo em xeque a afetividade que deve nortear a relação entre pais e filhos e comprometendo a convivência entre ambos. Como encontros impostos de modo tarifado não alimentam o estreitamento dos vínculos afetivos, a tendência é o arrefecimento da cumplicidade que só a convivência traz. Afrouxandose os elos de afetividade, ocorre o distanciamento, tornando as visitas rarefeitas. Com isso, os encontros acabam protocolares: uma obrigação para os pais e, muitas vezes, um suplício para o filho. Também em razão das limitações de maturidade inerentes à idade da infante, é infrutífera a argumentação ou negociação acerca da aproximação para com os pais biológicos. Não se negociam os laços de parentesco. Procurar pura e simplesmente argumentar com a criança ou o adolescente sobre a sua vontade pode gerar uma massa opaca de palavras e uma esfera de negociação infinita que termine por inviabilizar a aproximação desejada com os pais biológicos. A aproximação entre os pais biológicos e a menor deve ocorrer de forma natural, sem exposição de razões e justificativas que originaram o distanciamento. Ainda que a criança não manifeste seu desejo de permanecer com seus pais biológicos, tenho que esta é a medida recomendada, posto que averiguada a inexistência de riscos reais para a criança. A orientação jurisprudencial conclui no mesmo sentido acima esposado: “ECA – Guarda de Menor – Princípio Protetivo – Interesse da Criança – Família Substituta – Excepcionalidade – Direito de Visita – Necessidade de Estabilização Emocional do Infante. 1. É certo que os interesses da criança devem se sobrepor a quaisquer outros interesses juridicamente tutelados, em consonância com o princípio da proteção integral da criança. Com isso, é direito da criança ser criada no seio de sua família biológica. Substituir a família original, temporária ou definitivamente, é medida excepcional, carecedora de prova insofismável a recomendar a saída do infante para uma família substituta, ante situação de risco devidamente comprovada. 2. A relação sócio-afetiva entre filho e mãe ainda não restou estabilizada, porquanto mister se faz afastar, temporariamente, a família substituta do convívio com o infante até que parecer técnico ateste a integração emocional do menor com sua família natural. 3. Apelação não provida. Unânime.” (TJDFT. 20010130024999APE, Relatora Desa. Maria Beatriz Parrilha, 4ª Turma Cível, julgado em 26/03/2007). Por todo o exposto, e principalmente atento ao que dispõe o art. 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o art. 1º, § 1º da Lei nº 12.010 de
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03.08.2009 e aos relatórios Social e Psicológico (fls. 70-71), determino que a menor 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL M. L. deve retornar ao seio de sua família natural, para conviver com seus pais biológicos e restam irmãos.dúvidas Dispositivo: pedidodireto formulado Não quanto aoLogo, caráterACOLHO de controleopopular e eficaz pelos da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Requerentes, e, nos termos do art. 269, inc. I, do Código de Processo Civil, extingo dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, o processoecom resolução do mérito, para determinar que aeguarda da menor M. L. consumo descarte, diante do crescimento vertiginoso multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na S.. Se S. S. seja atribuída aos Requerentes, seus pais biológicos L. R. S e M. S. propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização necessário, expeça-se o respectivo mandado de busca e apreensão, podendo, se
desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio necessário, o Oficial de Justiça requisitar reforço policial, devendo todavia adotar ambiental brasileiro.
as cautelas para que a diligência seja cumprida da forma mais discreta e não Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao truculenta, o da interesse daobservados menor. Sem custas comunais (art. 12 da Lei polo ativo dasempre demandaatendendo numa leitura CRFB/88 os deveres Estadual nº do 9.109/2009). Sem quem honorários. Publicado para em audiência. da proteção meio ambiente, tem legitimidade propor umaRegistre-se. ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Partes intimadas em audiência.” Do que, para constar, lavrei este termo, que lido e Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o achado conforme, vai devidamente assinado. Eu,.............................., Sarah que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo esteYelena
dispositivo ser tido Técnica como não recepcionado vigente ordem constitucional. Araújo de Morais, Judiciária, lavreipela e digitei. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely JUIZ DEnaDIREITO: __________________________________________________ Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger MINISTÉRIO PÚBLICO: _____________________________________________ corresponder a um de fiscalizar.
Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma REQUERENTE: ______________________________________________________ relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, REQUERENTE: ______________________________________________________ dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É REQUERIDA: _______________________________________________________ frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o ADVOGADA: __________________________________________________________ mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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AC OR DÃO
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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APELAÇÃO CÍVEL nº 2047-93.2003.8.10.0031 (36.283/2013 – Chapadinha) Relator : Desembargador Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA Apelante : Soares e Coelho Ltda. Advogado : Dr. Josivaldo Oliveira Lopes Apelada : Liquigás Distribuidora S/A. Advogados : Dra. Mirella Parada Martins e outros Acórdão nº : ________________ EMENTA –INDEVIDA ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO. RESILIÇÃO UNILATERAL DE CONTRATO. QUEBRA DO DEVER DE CONFIANÇA. DANOS MORAIS COMPROVADOS. LUCROS CESSANTES DESCONECTADOS DO FATO ANTIJURÍDICO. 1. As condições da ação devem ser analisadas em tese, com base nas simples afirmações feitas pelo autor na petição inicial, e não com referência à prova dos autos, o que envolve exame de mérito da demanda. 2. Frustrada a confiança depositada em ajuste que foi abrupta e unilateralmente resilido, com efeitos negativos à imagem e credibilidade empresarial da demandante, devida é a compensação pelos danos morais comprovadamente suportados. 3. Inexistentes (e sequer postulados) danos materiais emergentes da resilição unilateral do contrato, não há falar em ressarcimento pela cessação de lucros, que precisam estar conectados com a situação fática sob exame e presos ao nexo de causalidade. 4. Apelo conhecido e parcialmente provido, como consequência do efeito translativo. Unanimidade. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os Senhores Desembargadores da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por votação unânime, em conhecer, de acordo com o parecer da PGJ, e dar parcial provimento ao Recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator.
Participaram do julgamento, além do Relator, os Senhores Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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Desembargadores JORGE RACHID Mubárack Maluf e JOSÉ JORGE 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Figueiredo dos Anjos. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no Procuradoria controle dos atos administrativos. contudo, certas Funcionou pela Geral de JustiçaPermanecem, o Dr. Francisco Chagas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, Barros de Sousa. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na São Luís (MA), 12passivo de abril de 2016 na publicização propositura da ação, para a ocupação do polo e, sobretudo, desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Desemb. Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA Relator Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define oTrataRELATÓRIO –Desemb. Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA (relator): que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este sede Apelação interposta em face da sentença Juízo ordem da 1ª Vara de Chapadinha, dispositivo ser tido como não recepcionado pelado vigente constitucional. que extinguiu o processo semderesolução de méritomajoritária por entender que acomo Apelada é Comungada com esse ponto vista, a doutrina entende, expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely parte ilegítima para figurar no polo passivo da lide, uma vez que não participou Meirelles, quede em trespasse síntese correspondem-se de direitos ipso empresária facto, do contrato firmado entrea ideia a Apelante e eadeveres, sociedade apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger Próspero Veras &de Cia Ltda. (fls. 245/247). corresponder a um fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa que existe Em seu Recurso, a Apelante sustenta, em síntese, quevaenia, foi seduzida pelauma Apelada relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a a deixar o contrato que tinha com a Nacional Gás e a adquirir o estabelecimento CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, empresarial Veras como para passar a revender os de produtos da Apelada dentre muitos,deo Próspero meio ambiente elemento compositor um complexo em região, sendo que a abrupta contrato moteChapadinha constitucionale da garantia de existência mínimainterrupção de dignidadedohumana. É pela frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido Apelada causou- lhe prejuízos morais e materiais, estes na modalidade de lucros de que, quando meio ambiente deprecia forma consequencial o cessantes. Pede,lesionado, assim, a oreforma da sentença (fls.de 293/321). mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos!
Em contrarrazões, a eApelada em aversa síntese,à diretriz que não Sendo ao fim ao cabo,sustenta, tal restrição queparticipou o texto do constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de não contrato firmado entre a Apelante e a empresa Próspero Veras, razão pela qual cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar pode ser responsável pelo pagamento de indenização decorrente do rompimento de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em do a prova testemunhal produzida de instrução revela que umavínculo; realidadeque comunitária e diversificada, expandenaosfase horizontes dos direitos os fatos narrados na inicial de não são verdadeiros; que está em correta a sentença e conceitos marginalizadores primeira dimensão aoe sustentar seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares ao reconhecer a ilegitimidade passiva ad causam. Pugna pelo improvimento do Apelo (fls. 370/377). 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos Parecer PGJ do é apenas pelodosconhecimento do Recurso 357/359). ao patrimônioda da União, Distrito Federal, Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova(fls. da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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É o relatório. VOTO –Desemb. Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA (relator): Presentes os pressupostos intrínsecos de admissibilidade, concernentes ao cabimento, egitimidade e interesse recursais, assim como os extrínsecos relativos à empestividade, regularidade formal e preparo, conheço do Recurso. Legitimidade, ativa e passiva, dizia ENRICO TULLIO LIEBMAN, tem relação com a “pertinência subjetiva,demaneiraqueestasomenteda podeação”serproposta por aquele que se “afirma titular”darelaçãojurídico-material, e, de igual modo, somente pode ser proposta em face do “responsável por,sempresuportarsegundo o relação ou a situação de direito material “afirmada , repitaem- se, juízo”apenas “afirmada”(DESTEFENNI,emjuízoMarcos. Curso de processo civil, vol.1., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 101-105). Portanto, essas condições, conforme a “teoria da,devemasserção analisadas,vale dizer,emcomtese”basenassimples afirmações feitas pelo autor na petição inicial. Nada mais que isso. Nessa fase, não se analisa documento ou qualquer outra prova dos autos, na medida em que isso envolve análise de mérito. Logo, se a Apelante diz que os danos que sofreu deveram-se às atitudes da Apelada, que a teria seduzido para uma parceria precocemente encerrada, não pode haver dúvida que, se acaso comprovados os fatos “afirmados– analisadosemjuízo “em tese”–,caberámesmo à Apelada suportar os efeitos de eventual sentença condenatória, pois a ela –e a mais ninguém –é atribuída uma conduta violadora do dever de confiança e, portanto, contrária ao direito. Assim, constitui erro de julgamento o acolhimento de preliminar de ilegitimidade passiva, ao fundamento de que a “a ação fora propost quem não participou do negócio jurídico firmado entre a requerente e a empresa Próspero Veras(fl.236),e juízoCiaimpregnado.Ltdadeconteúdo.” meritório e que despreza, sem verificação, a possibilidade de eventual descumprimento, pela Apelada, de deveres laterais ou anexos de conduta que não precisam estar consignados em contrato. Forte nessas razões, e porque presentes os pressupostos de admissibilidade Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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recursais, reformo a sentença de base por entender que as alegações vertidas na 5inicial, AÇÃOexaminadas POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL apenas in status assertionis, como devem ser examinadas para finsNão de restam mera aferição das condições da controle ação, evidenciam a legitimidade dúvidas quanto ao caráter de popular direto e eficaz passiva da Apelada para ados causa. da ação popular no controle atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, do crescimento vertiginoso e multipolarizado Ato contínuo, estandodiante a demanda em condições de imediato julgamento, com a das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na instrução aplicação translativo (CPC/2015, proposituraprocessual da ação, pararealizada, a ocupaçãopor do polo passivodoe, efeito sobretudo, na publicização art. §3º I), passo de logo ao com julgamento mérito dadolide, consoante a desta1.013 possibilidade de atuação cidadã vistas à de conservação patrimônio ambiental brasileiro. fundamentação a seguir. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao Analisando a prova produzida autos, emobservados seu conjunto, é possível abstrair, polo ativo da demanda numa leituranos da CRFB/88 os deveres comunais com segurança, que ambiente, a Apelantequem revendia, em Chapadinha e região, produtos da proteção do meio tem legitimidade para propor umaosação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação da Nacional Gás, empresa concorrente da Apelada, e que, após adquirir o Popular (LAP – lei empresarial nº4.717/65)1 a da contundência quando em sua extensão estabelecimento revendedora Próspero Veras &define Cia.o Ltda. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este (conforme termo compromisso de fls. pela 41/43), a Apelante deixou o negócio dispositivo ser tidode como não recepcionado vigente ordem constitucional. com a Nacional passoudea revender, ainda que por um curto lapsocomo temporal, Comungada comGás, essee ponto vista, a doutrina majoritária entende, expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely os produtos Tropigás, de titularidade da Apelada Liquigás Distribuidora S/A. Meirelles, síntese ideia de direitos e deveres, ipso facto, eram (sucessoraque deemAgip docorrespondem-se Brasil S/A.), aprodutos que antes do trespasse apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger revendidos Prospero corresponder pela a um de fiscalizar.Veras, encerrando suas atividades comerciais na sequência. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa compara todaaanálise estendida aqui, para visto aque a Com efeito, sobre a venda anterior Nacional Gás, eaté depois Apelada, CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, adentre testemunha Jesus Lopes informou que: “comprava requerente muitos,Maria o meiodeambiente comoSoares elemento compositor de um complexo [Apelante] o produto da marca Nacional Gás, de posteriormente adquirindo mote constitucional da garantia de existência mínima dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido quando era vendido da marca(fl.184). Tropigás pel de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! O engenheiro civil Hilberto Gonçalves Dantas, de seu turno, afirmou que: “sabe da compra pelaaorequerente da Próspero Veras, passando a revender produtos Sendo fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de Tropigás, hoje Liquigás; que se recorda que no ato da posse da revendedora cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar haviam representantes da Tropigás, além do Sr. Próspero Veras; que por ser de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em ouma único engenheiro civil eresidente no Município a acompanhar realidade comunitária diversificada, expande ospassou horizontes dos direitos o Sr. Cloves [representante legal da nos imóveis nos quais implantada e conceitos marginalizadores de Apelante] primeira dimensão ao sustentar emseria seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares a nova programação visual, desta feita da Tropigás; que depois de 02 (dois) ou 03 (três) meses de trabalho foi informado pelo Sr. Cloves que ocorrera o distrato (...); que sempre havia uma pessoa da Tropigás que coordenava a transição; 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos que o próprio funcionário dos daEstados, Tropigás(fl.185). diretriz ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Municípios[...] § 3º dava A prova daas cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Já a testemunha Francisco das Chagas Almeida de Carvalho, sobre os mesmos fatos, declarou que: “o Sr.conseguiuClovesaconcessão da Nacional Gás, vindo, no ano seguinte, a alcançar a concessão da Tropigás; que o período de utilização da marca Tropigás foi de.E esseapenasdepoimento, prestado02(dois) sob compromisso e sem contradita, adveio de “quem fazia o transport Luís para Chapadinha, da Distribuidora Tropigás, assim como da Nacional Gás, para a requerente(fl.186)[Apelante]”. Afastando qualquer dúvida quanto à existência de um vínculo de colaboração interempresarial entre os demandantes (cuja validade não depende de forma especial, cf. art. 107 do Código Civil, podendo, inclusive, ser verbal), a testemunha Francisco das Chagas chegou a reiterar que: “os botijões eram recebido diretamente na empresa requerente; que a distribuição da empresa requerente para o depósito era feita por outros caminhões; (...) que não fez qualquer viagem para a empresa Próspero Veras; que lhe eram repassadas notas fiscais em nome da Soares & Coelho Ltda. [Apelante] dos botijões que iaDeclarando,buscarainda, em que: “os prédios da requerente forameque“apóspintad o distrato, a requerente(fl.186). ‘fechou as port Não bastassem esses depoimentos, por si satisfatórios para a caracterização de uma efetiva colaboração empresarial entre Apelante e Apelada, assim como do seu brusco rompimento, a testemunha Laécio Bessa do Nascimento, cujo depoimento também não foi objeto de contradita, afirmou perante o Juízo, com riqueza de detalhes, que: “houve um contatolovesda(gerenteTropigásdarequer ente); quecomem o C razão da Próspero Veras estar, na época, sendo posta à venda, a requerida procurou o Sr. Cloves para que este capitaneasse a marca Tropigás na região; que foram para São Luís para tratar desse assunto: Cloves, Brito (gerente da Tropigás), Próspero e Alexandre (gerente operacional da Tropigás); que dessa reunião saiu um acordo, sendo repassadas vantagens para sair da Nacional Gás e revender os produtos da Tropigás; que em seguida foi procedido ao inventário dos bens da empresa Próspero Veras com vistas à venda à requerente; que o próprio depoente trabalhou neste inventário, juntamente com Edilton (motorista da Próspero Veras) e Alexandre (representante da Tropigás); que este procedimento durou cerca de um mês e meio, vindo a funcionar normalmente; que não demorou muito, cerca de 20 (vinte) dias, para vir a determinação da Tropigás para que fosse feito o distrato, devolvendo a Revista da Esmam, São Luís, v. 10, n. 10, jan./dez. 2016
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revenda à empresa Próspero(fls.182). Veras” 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Ora, se aNão Apelante adquiriu os bens que guarneciam o fundo de comércio restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da empresa que revendia da Apelada na regiãocontudo, (Próspero Veras), da ação popular no controleos dosprodutos atos administrativos. Permanecem, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, deixando a comercialização, na mesma área, dos produtos de uma distribuidora consumo e descarte, do crescimento vertiginoso concorrente (Nacionaldiante Gás) para passar a revender apenaseosmultipolarizado da própria Apelada, das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na àpropositura evidênciadaque as litigantes vislumbraram uma vantajosa e lucrativa ação,ambas para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização oportunidade de negócio na cidadã empreitada, aindaà que à custa do do patrimônio contrato com a desta possibilidade de atuação com vistas conservação ambiental Nacional brasileiro. Gás. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao E essa agressiva operação comercial não pode ser simplesmente negada pela polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais Apelada, depoimentos acima transcritos contrato da proteçãoquando do meioosambiente, quem tem legitimidade parasubsidiam propor umaoação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação escrito de fls. 41/43 dos autos, revelando que a Apelante efetivamente ampliou 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando sua extensão o seu estabelecimento empresarial para revender os em botijões de gásdefine da Apelada, que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este negócio que faserecepcionado de tratativas, a ser constitucional. executado, mesmo dispositivo serfoi tidoalém comodanão pelachegando vigente ordem que por um breve período tempo. Comungada com esse pontodede vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, em síntese ideia de direitos e deveres, ipso Portanto, que legítima era acorrespondem-se expectativa daaApelante em prosseguir comfacto, o negócio apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger de revenda de botijões de gás, expectativa que foi abruptamente frustrada pela corresponder a um de fiscalizar. Apelada com a quebra da confiança depositada. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante normativa com toda análise estendida até aqui, Svisto queLaISBOA, O direitoincongruência privado do atual momento histórico, anota ROBERTO ENISE CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, desenvolvendo virtualidades da cláusula da boa-fé inserta no dentre muitos, o as meio ambiente como elementogeral compositor de objetiva um complexo art. do CódigodaCivil pátrio, contemplamínima a reparação de danos por violação mote422 constitucional garantia de existência de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido dos direitos decorrentes da expectativa gerada no confiante, o que pode se dar de quando lesionado, o meio ambiente de forma consequencial o ou porque, meio de uma proteção positiva (deverdeprecia de assegurar a justa expectativa) mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! através de uma proteção negativa (pagamento de indenização) (In: Confiança contratual. Sãoao Paulo, 2012,talp.restrição 160). aversa à diretriz que o texto Sendo fim eAtlas, ao cabo, constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania não é sinônima cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar Concebidaque atualmente comode relação jurídica complexa, a relação obrigacional, de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em como além dos deveres de prestação, abriga deveres laterais de comportamento uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos efeito da incidência da cláusula geral dadimensão boa-fé objetiva, agregando-se aí aonoção e conceitos marginalizadores de primeira ao sustentar em seu bojo de confiança. Conforme JORGEeCnão ESA FERREIRA SILVA: “À -boaféfoientão reconhecimento da pessoa humana humana comoDA titulares conduzida e reconduzida uma série de eficácias, prévias à constituição do vínculo, contemporâneas da execução e até posteriores à realização da prestação, que, 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos napatrimônio ideia de confiança, de seus mais boa-fé e ao da União, do Distritoencontraram Federal, dos Estados,um dos Municípios[...] § 3º Aimportantes(In: prova da cidadania, para A ingresso juízo, será positiva feita com o título ou com documento que a ele corresponda. a em violação do eleitoral, contrato. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 48). 336
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É nessa perspectiva, que a confiança, enquanto dever lateral ou anexo de conduta, destina-se não apenas a impor uma determinada prestação, mas também, e sobretudo, a impedir que se provoque danos à pessoa ou aos bens da contraparte. Os comportamentos pautados pela boa-fé devem ser estimulados, pois na realidade hodierna não é mais tolerável que um sujeito crie expectativas no outro e depois venha atuar em sentido contrário, muitas vezes se beneficiando dessa última posição, em autêntico venire contra factum proprium, traduzindo o exercício de posição jurídica em contradição com o comportamento anteriormente assumido. Forte nesses modelos dogmáticos, tenho como contrária à boa-fé a conduta da Apelada que, sinalizando para a Apelante com um negócio vantajoso, rompe abrupta e injustificadamente uma parceria comercial com pouco tempo de iniciada, iludindo a confiança da Apelante, com efeitos negativos à sua imagem e credibilidade empresarial, a ponto de a Recorrente ter que encerrar suas atividades, como também se vê dos depoimentos colhidos na audiência de instrução. A testemunha Maria de Jesus Lopes Soares, por exemplo, informou que pouco tempo depois de iniciada a operação comercial com a Apelada: “(...) teve a de que a empresa requerente [Apelante] tinha falido (...) que a requerente, depois desse fato, não mais(fl.184) . voltou a vender gás Nessa mesma senda, Hilberto Gonçalves Dantas disse “que o que foi na época era a dúvida se o Sr. Cloves tinha dado calote, gerando ainda dúvidas se este mesmo senhor tinha tentado ficar com as duas marcas (Butano e Tropigás), ou ainda se ele ‘tinha[maior]dadoque aum(flperna”.185)passo. Ainda sobre a repercussão negativa da repentina interrupção da distribuição de gás pela Apelada, Francisco das Chagas declarou que: “após o distrato, ‘fechou as portas’; que existiamrequerente tinhacomen ‘quebrado’, e que a Tropigás(fl. 186)o . tinha rej Por fim, o gerente Laécio do Nascimento informou em Juízo que: “diante d reviravolta, inclusive com a informação de que a empresa havia quebrado, ficou
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a requerente sem operar no mercado de gás, refazendo o inventário de bens, 5desta AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL feita Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz para que foidos necessário; que em Permanecem, virtude da devolução, demitiu da açãodevolver popular noo controle atos administrativos. contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, funcionários (...); que outra consequência foi a rejeição da Nacional Gás, consumo e descarte, do crescimento e multipolarizado empresa para a qual diante a requerente revendia; vertiginoso que foram criadas ilações acerca das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na do que tinha ‘de que a empresa [quequebra propositura da ocorrido, ação, para aalgumas ocupaçãomaldosas, do polo passivo e, sobretudo, na tinha publicização as pernas]”(fl. 182). desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Como facilmente se abstrai dos depoimentos, a ruptura da entrega de botijões Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao logo apósdaodemanda início de umleitura novo da negócio, para ambascomunais as partes, foi polo ativo numa CRFB/88vantajoso observados os deveres efetivamente para a imagem empresarial da Apelante –interesse jurídico da proteção doruinosa meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação digno de tutela, cf. art. 5º X da CF –,que passou a figurar no imaginário de Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência em sua extensão define ofalida, consumidores e fornecedores locais como quando uma sociedade empresária que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este caloteira, de cumprirpela compromissos e deconstitucional. realizar o cálculo dispositivoimprudente, ser tido comoincapaz não recepcionado vigente ordem empresarial comesse o mínimo eficiência (circunstâncias que ricocheteiam Comungada com ponto dedevista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely ao no próprio administrador da sociedade, que fica com a imagem associada Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, negócio fracassado e com fama de mau gestor), gerando o sentimento coletivo apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger de precauçãoa um e desconfiança, corresponder de fiscalizar. com exponencial dificuldade para a realização de novos empreendimentos, máxime em se considerando que a repercussão maiores obstinações, fica claro, permissado vaenia, quena existe negativaSem do fato ocorreu numa cidade do interior Estado, qualuma todos se relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a conhecem e os comentários depreciativos difundem-se com mais rapidez e CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, facilidade, com efeitos deletérios para a empresária, cuja boa imagem é vital dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo para sobrevivência no mercado. mote sua constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial Assim, sendo certa a possibilidade de a pessoa jurídica experimentar danoomoral mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! relativo à violação da sua honra objetiva (CC, art. 52 e Súmula 227 do STJ), fixo o valor da ao reparação R$ 50.000,00 (cinquenta reais), Sendo fim e aoemcabo, tal restrição aversa à mil diretriz quemontante o texto que constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de art. considero proporcional à gravidade da conduta e à extensão do dano (CC, cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar 944), bem como alinhado com os modelos jurisdicionais advindos da Corte de de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Superposição situações geradoras deexpande danos morais à pessoados jurídica uma realidade para comunitária e diversificada, os horizontes direitos(AgRg no AREsp marginalizadores 700.828/SP, Rel.deMin. Luisdimensão Felipe Salomão e REsp. 1.407907/SC, e conceitos primeira ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Rel. Min. Marco Buzzi). Juros de mora a contar de 9/4/2003, data da interrupção do fornecimento dos botijões pela Apelada (Súmula 54 do STJ). Correção monetária, deste arbitramento (Súmula 362 do STJ). 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso juízo, será de feita com o títulomateriais eleitoral, ou com documento que na a ele corresponda. Oempedido danos formulado inicial restringiu-se aos lucros
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cessantes, modalidade de perdas e danos impossível de se deferir na espécie, uma vez que a Apelante, diante da prematura resilição unilateral do contrato pela Apelada, encerrou suas atividades comerciais em caráter definitivo, chegando mesmo a alienar o seu estabelecimento empresarial para terceiro, sem ao menos mencionar a existência de lucro no curto período de vigência da colaboração empresarial. Também não há razoabilidade no fato de a Apelante projetar sua pretensão de recebimento de lucros cessantes nos ganhos que a Próspero Veras auferia quando revendia os botijões da Apelada, pois o potencial de lucratividade, denominado de aviamento, no dizer de FÁBIO ULHOA COELHO, é atributo da empresa, decorre da capacidade de organização e administração do empreendedor que está à frente do negócio. Não é propriedade da sociedade empresária que simplesmente acompanha o contrato de trespasse (In: Curso de direito comercial, vol. 1: direito de empresa, 15.ed., São Paulo: Saraiva, 2011, p. 117). Lucros cessantes, ensinava o imorredouro AGOSTINHO ALVIM, é sempre uma presunção do que o credor razoavelmente deixou de receber, em razão do evento danoso, durante o tempo em que ficou impossibilitado de exercer determinada atividade remunerada, levando-se em conta como os fatos se desenrolariam dentro do seu curso normal, tendo-se em vista os antecedentes (In: Da inexecução das obrigações e suas consequências. 5 ed., São Paulo: Saraiva, 1980, p. 189-190). Seu termo final é o do ressarcimento dos danos emergentes. Recomposta a situação por meio da indenização, tem-se por finda a razão da frustração do lucro. Daí porque, dizia ALVIM, admitir que houve lucro cessante é uma “ideia que se existência mesma(Ob. citdo.,p. 191)prejuízo”.Nessalinhade raciocínio, considerando que a Apelante sequer formulou pedido de ressarcimento de danos materiais emergentes –como eventual consequência da abrupta resilição contratual por parte da Apelada –, o lucro cessante que pede está desconectado da situação fática, é um dado meramente hipotético, que não tem nada de razoável. Uma vez que a causa do dano foi a resilição unilateral do contrato de colaboração empresarial por parte da Apelada, mais adequado seria o pedido de suspensão dos efeitos da denúncia unilateral por prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos realizados pela Apelante (CC, art. 473) ou, subsidiariamente, o ressarcimento desses investimentos.
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É com base na regra do art. 473 do CC que se obsta esse tipo de abuso de direito, 5que AÇÃO POPULAR MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL se impede, comoCOMO pontifica PAULO MAGALHÃES NASSER , “o exercíci direitos potestativos forma ilegítima, lesiva àpopular expectativa à Não de restam dúvidas quantoantijurídica ao caráter deecontrole direto ee eficaz confiança do outro contratante naadministrativos. solidez da relação jurídica,contudo, fatores certamente da ação popular no controle dos atos Permanecem, certas dúvidas quando se trata em uma desagregadora para dos meios de produção, relevantes quando da decisão delógica fazer investimentos a execução do contrato. consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado A norma posta é pertinente e vai ao encontro dos princípios que norteiam os das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na contratos direito(In: Onerosidadebrasileiro”excessivanocontrato civil. São propositurano da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Paulo: Saraiva, 2011, Cap. 5,cidadã p. 6). com vistas à conservação do patrimônio desta possibilidade de atuação ambiental brasileiro. Mas mesmo esse pleito, só seria possível na espécie, se a Apelante não tivesse Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao tornado efeito o contrato de trespasse, conforme demonstra documento de polo ativosem da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os devereso comunais fl. restabelecendo voluntariamente status quo ante, o afastamento da 44, proteção do meio ambiente, quem temo legitimidade para com propor uma ação da popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos da Lei de Ação possibilidade de ressarcimento dos investimentos queiniciais realizou para ampliação 1 Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o do estabelecimento empresarial. que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Frise-se, porcom fim,esse queponto não de há vista, comoa responsabilizar a Apelada Comungada doutrina majoritária entende,pelos comodanos expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Helyque as decorrentes do fim do contrato de revenda com a Nacional Gás, uma vez Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, perdas e danos, incluindo os lucros cessantes, precisam estar presos ao nexo de apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger causalidade art.fiscalizar. 403). E a Apelada, como visto acima, só é responsável pela corresponder (CC, a um de intempestiva resilição unilateral do negócio de revenda, ato que efetivamente obstinações, claro, permissa vaenia, que existe uma estava naSem sua maiores esfera de autonomiafica privada. relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, A decisão de deixar revendacomo da Nacional para prospectar nova e mais dentre muitos, o meio aambiente elementoGás compositor de um complexo vantajosa oportunidade de negócio foi da própria que humana. deve arcar mote constitucional da garantia de existência mínimaApelante, de dignidade É com frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido as consequências da má escolha. A alegaçãosóé argumento válido para amparar de que, da quando lesionado, o meio ambienteprematura deprecia dedaforma consequencial a tese impossibilidade de resilição avença, lesiva queo foi à mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! confiança depositada. Não constitui, porém, alegação idônea para transferir para a Apelada responsabilidade decisão empresarial da Apelante, a quem Sendo ao fim e ao cabo, por tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de verdadeiramente coube decidir por não dar mais cumprimento ao contrato cidadania que nãofirmado é sinônima cidadania se tratar Gás. de colaboração comdesua antigaeleitoral, parceiraespecialmente comercial, aaoNacional de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em Portanto, a pretensão indenizatória comoexpande consequência desse fato pode ser uma realidade comunitária e diversificada, os horizontes dos não direitos acolhida. e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares Ante o exposto, conheço, de acordo com o Parecer Ministerial, e dou parcial provimento ao Recurso para, reformando a sentença, julgar procedente em parte 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos a ação, condenando a Apelada ao pagamento de indenização por danos morais ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda. no valor de R$ 50 mil, nos termos da fundamentação supra. 340
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Condeno, ainda, a Apelada ao pagamento das despesas processuais que a Apelante antecipou e honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor da condenação, considerando os parâmetros do art. 85 §2º do CPC/2015, em especial o lugar o grau de zelo profissional do advogado da Apelante, o trabalho desenvolvido (elaboração de petição inicial, comparecimento à audiência e interposição de Recurso) e o local da prestação do serviço. É como voto. Sala das Sessões da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em 12 de abril de 2016. Desemb. Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA Relator
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Nº Único: 0005266-56.2016.8.10.0000 5Habeas AÇÃOCorpus POPULAR COMO MEIO DIFUSO TUTELA AMBIENTAL Nº 029445/2016 –Dom PedroDE (MA) Habeas Corpus Nº dúvidas 029445/2016 Pedro Não restam quanto–Dom ao caráter de (MA) controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata: em uma lógica desagregadora dos meios de produção, Paciente Francisco Carneiro de Sousa consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso multipolarizado Impetrante : Paulo Fernando Ribeiro da Silvae(OAB/PI nº 13350) das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão Impetrado : Juízo de Direito da Comarca de Dom Pedro/MAna propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização Incidência Penal de atuação : Art. 129, § 9º,com do Código Penal Brasileiro. desta possibilidade cidadã vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, naEMENTA. análise a princípio e legislação,PENAL. no tocanteHABEAS ao PENALde Edoutrina PROCESSUAL polo ativo da demandaCORPUS. numa leituraCRIME da CRFB/88 observados os deveres comunais LESÃO CORPORAL COMETIDO da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação CONTRA EX-COMPANHEIRA. popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciaisPRESENÇA da Lei de Ação DOS 1 REQUISITOS DA PRISÃO Popular (LAP – lei nº4.717/65) a contundência quandoPREVENTIVA em sua extensão(ART. define o312 E que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo 313, INCISO III, DO CÓDIGO DE PROCESSO este PENAL). dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. DESCUMPRIMENTO DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE Comungada com esseURGÊNCIA. ponto de vista, a doutrinaGRAVES. majoritária PERICULOSIDADE entende, como AMEAÇAS expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely DOcorrespondem-se AGENTE. RISCO GARANTIA Meirelles, que em síntese a ideia deCONCRETO. direitos e deveres, ipso facto, DA ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de CONDIÇÕES fiscalizar. PESSOAIS FAVORÁVEIS. INSUFICIÊNCIA. ORDEM DENEGADA. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência com toda análise estendida até aqui, que a com 1. normativa A manutenção da prisão preventiva dovisto paciente, CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, o fim de resguardar a integridade física de ex-companheira, dentre muitos, o meioquando ambiente como elemento compositor de complexo ele descumpre, reiteradamente, as um medidas protetivas mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. impostas, é providência que se impõe para garantia daÉordem pública. se resume à comprovação documental, no sentido frágil sustentar que a cidadania de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o condições subjetivas favoráveis do paciente, por si mínimo existencial de2. todosAs os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! sós, não têm o condão de obstaculizar a custódia cautelar, quando requisitos autorizadores. Precedente Sendo ao fim e ao presente cabo, talosrestrição aversa à diretriz que o texto STJ. constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de 3. Ordem denegada. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de–primeira dimensãoeao sustentar os empresentes seu bojo autos, o ACÓRDÃO Vistos, relatados discutidos reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares acordam os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Maranhão, unanimemente e de acordo com o parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça, denegou a ordem impetrada, nos termos do voto do 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresdesembargador relator. so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores João Santana Sousa, José Bernardo Silva Rodrigues e Antonio Fernando Bayma Araújo (presidente). Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. Selene Coelho de Lacerda. São Luís (MA), 02 de agosto de 2016. JOÃO SANTANA SOUSA Desembargador Relator RELATÓRIO Trata-se de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado pelo advogado Paulo Fernando Ribeiro da Silva, em favor do paciente Francisco Carneiro de Sousa, contra ato proveniente do Juízo de Direito da Comarca de Dom Pedro/MA. Sustenta o impetrante que o paciente encontra-se custodiado desde 04/07/2016, em razão de descumprimento de medidas protetivas de urgência. Aduz que, por meio de ordem judicial, o paciente ficou impedido de se aproximar de sua ex-companheira, bem como de sua família, no limite de 300 (trezentos) metros em sua residência e de 100 (cem) metros em locais públicos, além da proibição de manter contato por quaisquer meios de comunicação. Prossegue ressaltando que o narrado no Boletim de Ocorrência não condiz com a realidade, porquanto em momento algum proferiu qualquer ameaça à vítima. Relata que o decreto preventivo utilizou termos genéricos e hipotéticos, os quais são inidôneos para justificar a medida excepcional.
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Destaca que o paciente é primário, possui bons antecedentes, 5bem AÇÃO POPULAR MEIO DIFUSO DEeventual TUTELA AMBIENTAL como residênciaCOMO fixa, além do que, em uma condenação fará jus a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito. Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando seCom trata tais em argumentos, uma lógica desagregadora dos meios de produção, requer a concessão da ordem, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado liminarmente, revogando a prisão preventiva, com imposição de medidas das agressões ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão cautelares (art.sistemáticas 319, do Código de Processo Penal) e expedindo-se alvará dena propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização soltura em favor dodepaciente. desta possibilidade atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Instruiu a inicial com o documento de fls. 18/29. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação os autos para eminente Desembargador Antônio popular? É possívelDistribuídos destacar textualmente logo onos artigos iniciais da Lei de Ação Fernando Bayma este1 antes de apreciar a liminar, requereu informações Popular (LAP – leiAraújo, nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o da que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este autoridade coatora. dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com Prestadas esse pontoasde vista, a doutrina majoritária entende,coatora como informações, às fls. 35/36, a autoridade expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely informou o paciente foi preso no diaa04/07/2016, em edecorrência inúmeros Meirelles, que que em síntese correspondem-se ideia de direitos deveres, ipsodefacto, descumprimentos de medidas protetivas de urgência, pelodeMinistério apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o solicitadas direito político eleger corresponder a um de fiscalizar. Público em favor da vítima, Maria Vanilde de Sousa. Sem maiores obstinações, claro,mesmo permissa vaenia, que existe uma Comunica que o fica paciente, advertido a cumprir relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a rigorosamente as bojo, medidas nos representação nºpara 1291CRFB/88, em seu traz impostas a dirigência deautos açõesda positivas do Estado prover, 96.2015.8.10.0085, requeridas Delegado decompositor Polícia, continuou a importunar a dentre muitos, o meio ambientepelo como elemento de um complexo mote constitucional de existência mínima de dignidade humana. É ofendida e ameaçar da suagarantia ex-companheira. frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente de forma consequencial Prossegue noticiando que,deprecia finalizado o Inquérito Policial, o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor do paciente pelo crime capitulado no art. Código Penal e art. 7º, inciso I da que Lei nº Sendo ao129, fim §e 9º, ao do cabo, tal restrição aversa à diretriz o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de 11.340/2006. cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. constituição como a nossa, Acrescenta queUma o acusado responde a outra açãopautada penal naem uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos Comarca, o nº 116-67.2015.8.10.0085, em queao foisustentar denunciado pelabojo mesma e conceitossob marginalizadores de primeira dimensão em seu o tipificação penaldacontra mesma vítima. reconhecimento pessoaa humana e não humana como titulares Finaliza asseverando que as condutas perpetradas pelo acusado
1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte para pleitear a anulação ou a declaração nulidade de atos lesivos são corriqueiras contra sualegítima ex-companheira, destacando quedese iniciaram com ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresagressões verbais e, de forma progressiva e perigosa, transformaram-se em so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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agressões físicas graves. Redistribuído o feito, nos termos da certidão exarada à fl. 37. Às fls. 39/41, indeferi o pleito liminar. O Parquet, em parecer da lavra da Procuradora de Justiça Maria dos Remédios F. Serra, às fls. 43/47, opinou pela denegação da ordem impetrada. É o Relatório. VOTO Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, contra ato proveniente do Juízo de Direito da Comarca de Dom Pedro/MA, impetrado pelo advogado Francisco Carneiro de Sousa, em favor do paciente Francisco Carneiro de Sousa, em razão da prática do crime tipificado no art. 129, § 9º, do Código Penal. Inicialmente, cumpre destacar que com a modificação trazida pela lei 12.403/11, a prisão preventiva somente deverá ser decretada em casos excepcionais, quando as demais medidas cautelares não sejam suficientes para garantir a efetividade do processo. Com efeito, constato que a prisão preventiva do paciente é a única medida capaz de impedir as suas reiterações em desfavor da vítima, eis que o agressor claramente não se vê intimidado pelas imposições estabelecidas pelo Poder Judiciário, razão pela qual não se mostra suficiente a aplicação das medidas previstas no art. 319, do Código de Processo Penal. No caso em apreço, verifica-se que as decisões constantes às fls. 21/23 e 24/26, encontram-se devidamente fundamentadas, de acordo com o previsto no art. 312 e 313, inciso III, ambos do Código de Processo Penal, in verbis: “(Compulsando...) os autos, verifica-se que o representado mesmo devidamente ciente das medidas protetivas de urgência
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deferidas por este Juízo, bem como advertido que em caso de 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIOde DIFUSO DE TUTELA descumprimento tais medidas poderia AMBIENTAL ser decretada sua
prisão preventiva, a vítima, forma que Não restam dúvidas quanto aocontinua caráter deameaçando controle popular diretodee eficaz ultimados ratio deve serPermanecem, levada em consideração, da ação popular no acontrole atosprisional administrativos. contudo, certas como razoável ao caso emdos telameios (..). de produção, dúvidas quando semedida trata emjusta umaelógica desagregadora consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao lente, meio ambiente, cidadão na No caso em a conduta da do legitimidade representadododemonstra propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização umacidadã vez solto, capazàde continuar do perturbando desta possibilidadeque de ele, atuação comévistas conservação patrimônio a quietude social, ameaçando e agredindo a vítima, seus ambiental brasileiro. familiares e amigos. Assim, a sua prisão torna -se necessária Segue-se,para na análise a princípio de doutrina no tocante a garantia da ordem públicae elegislação, para a aplicação dasao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais medidas protetivas que foram impostas e concedidas à vítima, da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação forma textualmente dos arts. 282,logo inciso e 313,iniciais incisoda III, ambos do popular? É possívelnadestacar nos I,artigos Lei de Ação 1 (destacou-se) Popular (LAP – leiCPP”.(fls. nº4.717/65)24/25) a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido“(...) como recepcionado pela vigente ordem constitucional. Hánão indícios de materialidade e testemunhas. Os indícios Comungada com da esseautoria ponto restaram de vista, demonstrados a doutrina majoritária entende, pelos depoimentoscomo acostados expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely aos autos e já plenamente declinados na decisão que decretou a Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, prisão preventiva dopleito réu. (...) apenas haveria legitimidade genuína de quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Concluídas as investigações pela autoridade policial, Sem maiores obstinações, claro,depermissa que existedelitiva, uma reiteraram-se os fica indícios autoria evaenia, materialidade relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a bem como a necessidade de garantir uma CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivasadoordem Estadopública, para prover, vez que há indícios que o réu possa praticar delitos dentre muitos, o meio ambiente comode elemento compositor de umnovos complexo natureza, o que mínima denota periculosidade do agente” mote constitucionaldadamesma garantia de existência de dignidade humana. É frágil sustentar que(fls...21/22))(destacou.-se) a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Nota-se, pois, que, nas decisões, restou devidamente fundamentada necessidade da segregação cautelar do àpaciente, Sendoaao fim e ao cabo, tal restrição aversa diretriz com que oo fito textode proteger a integridade físicaa da vítima. constitucional nos dá, dada impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria Uma que constituição como a nossa, pautada em É deambiental. se mencionar o paciente, malgrado ciente das medidas uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos protetivas urgência impostas, vem descumprindo-as reiteradamente, ressaltando e conceitosdemarginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o areconhecimento autoridade da pessoa humana e não humana como titulares coatora, nas informações prestadas às fls. 35/36, que “as condutas do ex-companheira, já são corriqueiras, eis que iniciaram-se com 1. Art. 1.º Qualquer cidadão legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos em lesivos agressões verbais e,será de parte forma progressiva e perigosa, transformaram-se ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresagressões físicas graves, fatos estes que ensejaram corretamente a decretação so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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da preventiva, conforme previsto no art. 313, inciso III, do Código de Processo Penal. Neste sentido, confira-se: HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO ORIGINÁRIA. SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO ORDINÁRIO CABÍVEL. IMPOSSIBILIDADE. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. ALEGADA INAPLICABILIDADE DA LEI MARIA DA PENHA, NEGATIVA DE AUTORIA, DESNECESSIDADE DA CONSTRIÇÃO E EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA. QUESTÕES NÃO DEBATIDAS NO ACÓRDÃO COMBATIDO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. PRISÃO PREVENTIVA. DESCUMPRIMENTO DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA. HIPÓTESE AUTORIZADORA DA SEGREGAÇÃO ANTECIPADA. AMEAÇAS GRAVES. PERSONALIDADE VIOLENTA E PERICULOSIDADE DO AGENTE. REITERAÇÃO DELITIVA. RISCO CONCRETO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. RÉU QUE PERMANECE FORAGIDO. NECESSIDADE DE ASSEGURAR A CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL E DE GARANTIR A APLICAÇÃO DA LEI PENAL. CUSTÓDIA JUSTIFICADA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. COAÇÃO ILEGAL NÃO DEMONSTRADA. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. (...) 3. Nos termos do inciso III, do art. 313 do CPP, com a redação dada pela Lei 11.340/06, a prisão preventiva poderá ser decretada “se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência”. 4. Evidenciado que o paciente, mesmo após cientificado da ordem judicial que o proibia de aproximar-se de sua ex-companheira e com ela manter qualquer tipo de contato, retornou à sua residência, onde ingressou violentamente, danificou bem lá existente e proferiu ameaças de morte contra a ofendida, resta clara a imprescindibilidade da custódia para acautelar a ordem pública e social. 5. A necessidade de proteger a integridade física e psíquica da vítima e de cessar a reiteração delitiva, que no caso não é mera presunção, mas risco concreto, são
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indicativas do periculum libertatis exigido para a constrição 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DEpessoais TUTELAfavoráveis AMBIENTAL processual. 6. (...)DIFUSO Condições não têm, em princípio, o condão de, isoladamente, revogar a prisão cautelar, Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz há nosdos autos suficientes a demonstrar a necessidade da ação popular no se controle atoselementos administrativos. Permanecem, contudo, certas custódia. Habeas corpus não conhecido. (STJ, HC 308510 dúvidas quando seda trata em uma8.lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento e multipolarizado PR 2014/0288688-0 Ministrovertiginoso JORGE MUSSI 19/03/2015 T5 das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na QUINTA TURMA) propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio Por derradeiro, no tocante à alegação de que o paciente ambiental brasileiro. ostenta predicativos subjetivos favoráveis, constata-se que, conforme remansosa Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocantea custódia ao jurisprudência, tal fundamento, per si, não tem o condão de obstaculizar polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais cautelar, quando presente os requisitos autorizadores. da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação 1 o seguinte julgado: destacar Popular (LAP – leiVale nº4.717/65) a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tidoPENAL como não recepcionado pela vigenteCORPUS ordem constitucional. E PROCESSUAL. HABEAS SUBSTITUTIVO Comungada com DE esseRECURSO ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely CRIME DE ROUBO. PRISÃO PREVENTIVA. NECESSIDADE Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, DA CUSTÓDIA DEMONSTRADA. CONDIÇÕES PESSOAIS apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger IRRELEVÂNCIA. 1. (...) 5. As condições corresponder a um FAVORÁVEIS. de fiscalizar. pessoais favoráveis do acusado não têm o condão de, por si sós, Sem maiores obstinações, fica claro, vaenia, quese existe umaoutros inviabilizar a decretação da permissa custódia preventiva, existem relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a elementos nos autos que respaldam a medida constritiva. 6. Habeas CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, corpus não conhecido. (STJ - compositor HC: 314893deSP dentre muitos, o meio ambiente como elemento um2015/0015348-9, complexo Ministro GURGEL DE FARIA, Data humana. de Julgamento: mote constitucionalRelator: da garantia de existência mínima de dignidade É frágil sustentar que19/03/2015, a cidadania seT5resume à comprovação documental, no sentido - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o 06/04/2015). mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! comaversa o parecer ministerial, Sendo aoAnte fim oe exposto, ao cabo,de talacordo restrição à diretriz que o DENEGO texto aconstitucional ordem impetrada. nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. É como voto. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o dashumana Sessõese não da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de reconhecimento daSala pessoa humana como titulares Justiça do Maranhão, em São Luís, 02 de agosto de 2016. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima paraSANTANA pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos JOÃO SOUSA ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresDesembargador Relator so em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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NORM AS PA R A P UBLICAÇ ÃO DE ARTIGO S
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO DE ARTIGOS O Conselho Editorial da Revista da Esmam aceita artigos inéditos para publicação. A Comissão Editorial da Revista da Esmam estabelece as seguintes normas para publicação de artigos: 1 ELEMENTOS PRÉ-TEXTUAIS a) Título e subtítulo (se houver). Deve ser conciso e claro, expressando o conteúdo do artigo. O título e o subtítulo deverão ser apresentados em letras maiúsculas, fonte Times New Roman, tamanho 12, em negrito e centralizado; b) Nome dos autores – informar o nome do (s) autor (es), por extenso, evitando abreviaturas. No caso de mais de um autor, colocar um nome abaixo do outro em ordem alfabética, com apenas as iniciais em letras maiúsculas, fonte Times New Roman, tamanho 12, em negrito e centralizado. Separar o nome dos autores do título do artigo com 2 espaços em branco. Informar os seguintes dados sobre o(s) autor (es): Nome completo (evitar abreviaturas); titulação; instituição; cargo/função que desempenha(m) e e-mail em nota de rodapé; c) Resumo – deve ser incluído um resumo informativo (ABNT NBR 6028:2003 – Resumo), de aproximadamente 250 palavras, em português, fonte 10, com entrelinhas, simples e precedido da palavra Resumo negritado e margeada à esquerda. Separar o resumo do nome dos autores com dois espaços em branco. d) Palavras-chave – termos indicativos do conteúdo do artigo. Esses termos devem ser separados por ponto e precedidos pela expressão Palavras-chave negritada. Separar as palavras-chave do resumo com um espaço em branco. Utilizar de três a cinco termos.
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2 ELEMENTOS TEXTUAIS 5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL NãoCorpo restamdo dúvidas ao caráter deNBR controle popular direto e eficaz de 2.1 artigoquanto (conforme ABNT 6022:2003 – Apresentação da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas Artigos de Periódicos) estruturado em: introdução, desenvolvimento, conclusão e dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, referências. No caso de divisão em seções, sua ordenação deverá seguir o sistema consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado de progressiva ao (ABNT 6024:2012 - Numeração progressiva dasnumeração agressões sistemáticas meio NBR ambiente, da legitimidade do cidadão na das seções de um documento). Para citações no texto, utilizar o sistema Autor/Data, propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã –com vistas à conservação do em patrimônio conforme ABNT NBR 10520:2002 Apresentação de citações documento. ambiental brasileiro. O texto deverá ser apresentado utilizando a fonte Times New Roman, tamanho 12, com espaço 1,5 entrelinhas e nas citações longas tamanho 10, entrelinhas. Os Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao trabalhos devem ter de 10 aleitura 20 páginas, a saber: polo ativo da demanda numa da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção a) doIntrodução meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação b)–Desenvolvimento Popular (LAP lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este c) Conclusão dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na de Rodolfo de Camargo Mancuso, Theodoro Jr., Hely 2.2lição Notas de rodapé deverão conterHumberto exclusivamente informações Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, adicionais ao texto original. apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. 3 ELEMENTOS PÓS-TEXTUAIS Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88,Os emelementos seu bojo, traz a dirigência deconstituídos ações positivas pós-textuais são de:do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo a) Título subtítulo houver) mínima em língua (inglês);É mote constitucional da egarantia de(se existência de estrangeira dignidade humana. b) que Resumo em língua estrangeira (Abstract). A palavranoAbstract frágil sustentar a cidadania se resume à comprovação documental, sentido deve negritada e margeada de que, quando ser lesionado, o meio ambienteà esquerda. deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. c) Palavras-chave (Keywords) – Tradução das Todos! palavras-chave em língua estrangeira; Sendo ao fim e ao -cabo, tal restrição aversa à diretriz que com o texto d) Referências deverão estar normalizadas de acordo a NBR constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de 6023 – Informação e Documentação: Referências, elaboração cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar da ABNT. O título Uma da obra (título dacomo revista, livro, entre outros) de tutela de matéria ambiental. constituição a nossa, pautada em em itálico, evitando o uso do negrito citadas uma realidade comunitária e diversificada, expandeouossublinhado. horizontes As dosfontes direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o devem seguir a ABNT NBR 6023:2002, seguindo sistema Autor/ reconhecimento Data. da pessoa humana e não humana como titulares As referências devem conter todos os dados necessários à identificação da publicação. 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS a) Não será editado mais de um artigo do mesmo autor, em um único número da revista; b) O autor não receberá qualquer remuneração pela cessão e publicação de artigo; c) Ao encaminhar os originais, o (s) autor (es) cede(m) os direitos de publicação para a Revista da Esmam; d) Não paginar o artigo; e) O arquivo deverá ser encaminhado em formato compatível com o Sistema Windows. Os artigos deverão ser digitados em Word e apresentar as seguintes especificações: Fonte Times New Roman – Tamanho 12; com espaço entrelinhas 1,5 e nas citações longas tamanho 10, entrelinhas 1.0, recuo de 4 cm da margem esquerda. As margens esquerda e superior de 3,0 cm e margens direita e inferior com 2,0 cm; f) Não serão publicados artigos com menos de 10 (dez) ou com mais de 20 (vinte) páginas e que façam mera reprodução de pareceres ou discursos.
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5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares 1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
Este número da revista foi composto no formato 180x250mm, na fonte Time News Romam, corpo 12, impresso em papel offset 75g/m, capa em papel cartão supremo 250g , pela gráfica TEXGRAF.
5 AÇÃO POPULAR COMO MEIO DIFUSO DE TUTELA AMBIENTAL Não restam dúvidas quanto ao caráter de controle popular direto e eficaz da ação popular no controle dos atos administrativos. Permanecem, contudo, certas dúvidas quando se trata em uma lógica desagregadora dos meios de produção, consumo e descarte, diante do crescimento vertiginoso e multipolarizado das agressões sistemáticas ao meio ambiente, da legitimidade do cidadão na propositura da ação, para a ocupação do polo passivo e, sobretudo, na publicização desta possibilidade de atuação cidadã com vistas à conservação do patrimônio ambiental brasileiro. Segue-se, na análise a princípio de doutrina e legislação, no tocante ao polo ativo da demanda numa leitura da CRFB/88 observados os deveres comunais da proteção do meio ambiente, quem tem legitimidade para propor uma ação popular? É possível destacar textualmente logo nos artigos iniciais da Lei de Ação Popular (LAP – lei nº4.717/65)1 a contundência quando em sua extensão define o que é cidadania, ao trazer que o título eleitoral é a prova de cidadania, devendo este dispositivo ser tido como não recepcionado pela vigente ordem constitucional. Comungada com esse ponto de vista, a doutrina majoritária entende, como expresso na lição de Rodolfo de Camargo Mancuso, Humberto Theodoro Jr., Hely Meirelles, que em síntese correspondem-se a ideia de direitos e deveres, ipso facto, apenas haveria legitimidade genuína de pleito quando o direito político de eleger corresponder a um de fiscalizar. Sem maiores obstinações, fica claro, permissa vaenia, que existe uma relevante incongruência normativa com toda análise estendida até aqui, visto que a CRFB/88, em seu bojo, traz a dirigência de ações positivas do Estado para prover, dentre muitos, o meio ambiente como elemento compositor de um complexo mote constitucional da garantia de existência mínima de dignidade humana. É frágil sustentar que a cidadania se resume à comprovação documental, no sentido de que, quando lesionado, o meio ambiente deprecia de forma consequencial o mínimo existencial de todos os sujeitos do ordenamento jurídico. Todos! Sendo ao fim e ao cabo, tal restrição aversa à diretriz que o texto constitucional nos dá, dada a impossibilidade clara de restrição do conceito de cidadania que não é sinônima de cidadania eleitoral, especialmente ao se tratar de tutela de matéria ambiental. Uma constituição como a nossa, pautada em uma realidade comunitária e diversificada, expande os horizontes dos direitos e conceitos marginalizadores de primeira dimensão ao sustentar em seu bojo o reconhecimento da pessoa humana e não humana como titulares
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1. Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios[...] § 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.