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Indígenas na Política
Após o Ato Adicional de 1834, responsável por substituir a Constituição de 1824, foram criadas as Assembleias Legislativas Provinciais. Por meio delas, era possível elaborar leis sem serem submissas ao Imperador, possibilitando admitir e demitir funcionários públicos e arquitetar suas próprias leis. Apesar disso, o primeiro representante indígena foi eleito no ano de 1982, mais de 140 anos depois. Quebrando esse paradigma, Mário Juruna - primeiro deputado federal indígena do Brasil - nasceu em 1943, na cidade de Barra do Garças, no Mato Grosso. Outrossim, Juruna tornou-se cacique de sua tribo aos 17 anos, período em que teve os primeiros contatos com o povo branco. Contudo, insatisfeito com a forma que seu povo era tratado, resolveu entrar no âmbito político em busca de respeito e dignidade para a sua tribo.
“Sou homem do povo, sou homem de campo, quando me criei não encontrei nem um branco, não encontrei nem um avião, nem automóvel, nem estrada; onde me criei era sertão” (JURUNA, 1982)
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Mário também comentou sobre a forte pressão que o povo indígena sofre: “hoje eu encontro muito pressão contra índio, e invasor, e estrada. A gente está recebendo muita pressão.” Durante seu mandato como Deputado Federal, Juruna ficou conhecido como um homem desconfiado e questionador, pois além de não confiar na palavra de um homem branco, levava consigo um gravador portátil, com o objetivo de gravar suas conversas sobre assuntos relacionados ao seu trabalho, e denunciando outros políticos que não cumpriam com suas promessas. Na Câmara Federal, a sua trajetória foi marcada pela luta em prol da demarcação de terras indígenas, divulgando todo o abuso que seu povo vinha sofrendo há séculos. Criou, também, a Comissão Permanente do Índio no Congresso Nacional, que contribuiu para que questões indígenas atingissem nível nacional e recebessem sua devida importância. Entretanto, Mário Juruna veio à óbito em 17 de julho de 2002, aos 59 anos, vítima de diabetes, tendo seu corpo velado no Congresso Nacional como homenagem à sua carreira inspi-
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radora para o povo tupiniquim. Casos como esse devem aumentar nos próximos anos: estatísticas mostram um crescente número de candidatos indígenas para prefeito e vereador. As eleições de 2018 ilustram isso, uma vez que foram registradas 2.111 candidaturas indígenas pelo Brasil, um acréscimo de 80% nas suas inscrições em relação a 2016 (quando o número se aproximava a 1.175). Desses concorrentes a vagas públicas, destacam-se os oito candidatos eleitos para prefeitura em primeiro turno, sendo quatro da região Norte, dois do Nordeste e um do Sul. Esses representam um acréscimo de 33% ao total de prefeitos eleitos em primeiro turno em 2016. Além disso, somando-se o segundo turno, dois prefeitos indígenas juntaram-se ao índice. Tais dados indicam uma positiva correlação entre a crescente candidatura de indígenas e o seu recebimento pela população. Todavia, ainda é notável o fato de que as eleições ocorram em cidades majoritariamente indígenas, com pouca diversidade cultural. Ademais, as cidades com prefeitos indígenas representam 0,14% do total das cidades do território brasileiro. Junto desse crescente engajamento e aceitação de indígenas no executivo e legislativo, estados com menor presença de nativos na política passaram a crescer nesse aspecto. O Rio Grande do Sul - diferentemente do Norte do Brasil - vinha com uma baixa participação desse grupo, contudo, as últimas eleições mostraram uma - lenta, mas existente - mudança de pensamento. O Estado contou com um total de 125 candidatos, dos quais dois são para prefeito e três para vice-prefeito. Esses - comparados aos de 2016 (69) - retratam um aumento de 81%. A pesquisadora Flavia Miranda Falcão - a partir dos números de candidaturas indígenas para cargos políticos no Rio Grande do Sul - argumenta que o mesmo reflete a baixa população nativa do estado:
"(O número de candidaturas) É baixíssimo, mas é proporcional à população autodeclarada indígena no Rio Grande do Sul no Censo de 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Esses 125 candidatos indígenas correspondem a 0,35% do total de registros de candidaturas em todos os municípios do Rio Grande do Sul, aos cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador, nestas eleições de 2020. Essa proporção é um pouco superior aos 0,3% da população autodeclarada indígena no Estado. O problema é a população indígena do RS ser tão baixa” (FALCÃO, 2020)
De forma semelhante, houve, em 2018, o primeiro indígena candidato à
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vice-presidência do Brasil, representado por Sônia Guajajara (PSOL). Sendo inicialmente indicada pelo setor ecossocialista do partido, a maranhense foi oficialmente lançada para chapa no dia 3 de fevereiro de 2018. Além disso, Guajajara participou de sessões do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, além de ser uma das convidadas a falar na Conferência Mundial do Clima - lutando pelo bem-estar ecológico. Com base nessas estatísticas, a FUNAI - Fundação Nacional do Índio - age buscando melhorar a representatividade dos povos nativos na política. Para tanto, a fundação planeja efetuar a criação de um Conselho Nacional de Política Indigenista. Além disso, a FUNAI possui diversos outros conselhos para diferentes temáticas indígenas, como educação, saúde e cultura.
Ailton Krenak e sua representatividade nacional dos números na época, Ailton pressagiou “se continuar nesse passo, nós vamos entrar no ano 2000 com umas três pessoas”, felizmente, isso não ocorreu. Além disso, Krenak tem grande representatividade no âmbito internacional, ao passo que criou a organização não governamental “Núcleo de Cultura Indígena”, desenvolvida no ano de 1985, cujo objetivo é promover essa cultura. Durante a assembleia de 1987, que tinha como objetivo desenvolver a constituição de 1988, Ailton Krenak (como representante indígena) foi o autor de uma ação marcante na história. Enquanto dialogava no plenário do Congresso Nacional, pintou seu rosto com pasta de jenipapo (tinta preta) - demonstrando luto pelo retrocesso dos direitos políticos indígenas e defendendo que não identifiquem as tribos indígenas como um povo inimigo dos interesses econômicos do Brasil, pois carregam estereótipos de um povo preguiçoso e acomodado.
Ailton Krenak é um filósofo ambientalista e indígena brasileiro, nascido no estado de Minas Gerais no ano de 1953, faz parte do grupo indígena denominado Krenak. Ao passar dos anos, a quantidade de participantes desta tribo foi diminuindo (no início do século XX eram cerca de 5 mil, em 1920 reduziu para 600 e em 1989 chegou a 130 indivíduos). Ao notar essa declinação
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Augusto C. H. P. Garcia Diogo B. Diedrich Vitor Martini
No livro “Ideias para adiar o fim do mundo”, Krenak cita a dificuldade das famílias Krenak - entre outros povos indígenas - diante da tensão com o Estado. Ailton descreve que essa situação não é totalmente recente, pois, há anos, o Brasil vem instituindo mudanças políticas que atingem intensamente diversas comunidades indígenas. Por isso, essas tribos buscam que o governo assegure os direitos constituídos perante suas terras. Atualmente, Krenak voltou ao estado de Minas Gerais, mais próximo de seu povo, e atua em sua organização “Núcleo de Cultura Indígena”, desenvolvendo desde 1998 o Festival de Dança e Cultura Indígena - um evento que procura fazer o intercâmbio entre diferentes etnias nativas e delas com os não-indígenas. Ademais, no ano 2017, trabalhou no documentário “Ailton Krenak: o sonho da pedra”. A obra é dirigida por Marco Altberg e representa a trajetória de vida do ativista. A partir disso, é possível diferenciar dois segmentos na luta indígena na política. Uma - abordada ao longo do texto - busca pela presença de indígenas dentro das instituições públicas. A outra, pela representação indígena - políticos que defendam as causas desse grupo. Apesar da porcentagem de indígenas na política se manter constante comparado à população, a influência exercida dentro dos órgãos públicos federais ainda é baixa, acarretando em desvantagens nos embates que envolvem questões indígenas. Esse, por sua vez, representa - e deve ser - o motivo da luta dos direitos indígenas.
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