OLIBERAL
BELÉM, DOMINGO, 23 DE NOVEMBRO DE 2014
MAGAZINE 11
sim
VICENTE CECIM
vicentefranzcecim@gmail.com
Pode o homem ir além do homem?
Interiormente livre, habito o Eu silencioso e permito que sua energia atue por meio de Seus instrumentos naturais
do, o ponto oculto de nós, que só se consente a nós em Relances, Vislumbres. Andara busca o homem além de si, fora de si: no Umanoh. O homem precisa se deixar cair do ponto insustentável onde se instalou para ter o direito de adquirir asas. Será durante a sua queda que irá descobrir sua leveza possível.
A resposta das Crianças
SRI AUROBINDO
E as Crianças, será que elas têm a resposta que os adultos não acham? Tudo indica que sim. Pois vejam só isto: quando eu estava escrevendo esta frase, lá em cima - ao longo da História, desde que o homem passou a se perguntar pelo seu Destino, pelo sentido & significado de sua existência no Universo – o meu neto Rafael Leonardo, que acaba de atingir os seis anos de idade e que ainda não sabe ler, chegou ao meu lado e disse: - Vovô, sabe uma coisa que é legal no futuro? É que a gente pode ir lá no futuro, pegar uma coisa, e levar para onde já não é mais futuro. E quando eu disse a ele que ia contar o que tinha me dito no jornal, ele acrescentou: - Vovô, e diz pras pessoas que o futuro é muito mais legal do que ficar na cidade. Acho que o que Rafael chama de cidade é a Civilização que construímos, cada vez mais artificializada e distanciada do naturalmente Sagrado, e o que ele entende por futuro é um tempo sem fronteiras no Tempo, em que o humano amplie a sua liberdade e realize, em si mesmo, a Máquina do Tempo, sonhado em seu livro por H. G. Wells.
V
ocê pode entender a perguntatítulo desta página como um membro da Espécie Humana perdido na multidão de indivíduos, ou como um Indivíduo, considerando a pergunta feita diretamente a você. Se ela se faz no masculino é apenas pelo vício de uma linguagem submetida pelo macho da espécie. E as mulheres devem entendê-la assim – Pode o humano ir além do humano? – e também é feita a elas, e a todos nós, enfim. Se não souber a resposta, não se sinta inferiorizado, ou inferiorizada: ao longo da História, desde que o homem passou a se perguntar pelo seu Destino, pelo sentido & significado de sua existência no Universo – ninguém conseguir dar uma resposta aceita por todos, unanimemente. E se praticamente todos concordam em responder à pergunta: - Sim, ninguém está de acordo sobre a forma como isso poderá ser feito. Os que responderam foram muitos. Já são tantos: Sonhadores-visionários, Filósofos, Cientistas, Místico, Poetas. Citemos alguns deles:
A resposta dos Sonhadores-visionários A mais recente resposta é dada pelos Sonhadores-visionários sobre o futuro da Tecnologia, da Cibercultura. Segundo eles, o homem irá além de si, aliás, já está indo, pela fusão do nosso organismo biológico com as máquinas: habitaremos um novo mundo onde o homem & a máquina, o real & o virtual haverão se tornado uma coisa só. Eles anunciam a chegada do estado pós-biológico, a materialização da consciência através da tecnologia, o homem como extensão do Universo. Um dos que já veem esse Futuro, William Gibson, autor de Neuromancer, diz: - A informação quer ser espacial, logo poderemos habitar infoespaços e entrar no ciberespaço - este não-espaço que é ainda espaço, e é mais, nos liberará porque seremos mentes pós-geográficas fora dos limites do tempo e da distância, pensamento elétrico viajando a velocidade da luz mais além da entropia. Gibson está apenas confirmando o que Buckminister Fuller dizia: - Começa com o Universo, se tu começas com o Universo logo te dás conta de que o planeta Terra é um sistema... e isso que nós dizemos que é a diferença entre o real e o virtual e entre o mecânico e o natural ou entre o natural e o artificial é uma divisão criada por nós, o ecossistema que criou uma flor ou os rizomas das árvores é o mesmo sistema ecológico que criou o microprocessador ou que agora está criando a rede fractal da Internet e que mostra as conexões e os padrões que estão funcionando na evolução... o que cria o homem também é natural, a diferença é que está sendo criado pelo desenho, através da consciência. São ideias precursoras do século XX/XXI. Recuando no tempo, vejamos o que antes destes outros disseram sobre a ultrapassagem do homem por si mesmo:
Altercultura: – O princípio está próximo Ainda no século XIX, outro filósofo, Arthur Schopenhauer, autor de O Mundo como Vontade e Representação/Die Welt als Wille und Volstellung deu a sua resposta. E também um cientista, Charles Darwin. Foram respostas diferentes. Segundo Schopenhauer, o homem pode ir além de si mesmo pela Individuação, isto é, se subtraindo, como individuo, à torrente cósmica que tudo arrasta na Vida: a Vontade.
A resposta dos Cientistas Já Darwin, o Cientista, dava uma resposta que parecia ser exatamente o oposto da de Schopenhauer: segundo ele, o homem progressivamente se ultrapassaria não como indivíduo mas como espécie e justamente pela vontade evolutiva do Universo.
A resposta dos Místicos Recuando ainda mais, lembremos as respostas dadas pelos Místicos: por Buda, cerca do século VI AC, no Oriente, e pelo próprio Cristo no Ocidente. Segundo Buda, o homem irá além de si quando conseguir sentir e entender o que chamamos de Realidade como Delusão, isto é, o existir de todo o Cosmos visível como uma ilusão que toda a Vida,
A resposta dos Filósofos No século XIX, Filósofos, como Friedrich Nietzsche, autor de Assim falava Zaratustra/Also Sprach Zarathustra, escreveu: - O homem é ponte sobre o abismo. Perigoso caminhar. Perigoso olhar para trás e parar. Nietzsche estava falando do além do homem, do über mensh, expressão que manipulada por Hitler se transformou em superhomem, para criar o mito da superioridade dos nazistas como originários da raça ariana – brutal deformação da verdade, através da qual transformaram em símbolo de Morte a própria Suástica - talvez a primeira síntese perfeita do Universo, concebida pelos Árias, povo muito Sábio que vivia ao norte da Índia há alguns milhares de anos e deu origem ao indianismo.
dos homens às estrelas, havendo atravessado o Véu de Maya, de Lá para Cá, tacitamente combinou perceber como Real. A evolução se dando pelo alcançar o Nirvana, saindo do círculo do nascimento e morte do Sansara, através das Quatro Nobres Verdades: - O sofrimento existe – a origem do sofrimento é o desejo – o sofrimento pode ser extinto - o fim do sofrimento se dá pela extinção do desejo. Cristo disse algo semelhante, mas não exatamente a mesma coisa – pois o Nirvana é, digamos, ser no não-ser, enquanto que o prometido Reino dos Céus do cristianismo é como que um ser além do ser, ou da vida material, como preferirem. O caminho indicado por Cristo é especificamente voltado para o humano e resume a extinção do sofrimento na recomendação: - Ama o teu próximo como a ti mesmo.
A resposta dos Poetas Esses, os Poetas, pelo menos quando têm em si o sentimento do Sagrado, como – no Brasil – João Guimarães Rosa e Manoel de Barros - não parecem ter nenhuma dúvida sobre a possibilidade do ir do homem além de si mesmo. Manoel de Barros, por exemplo, diz: Eu tenho em mim um sentimento de aldeia e dos
primórdios. Eu não caminho para o fim, eu caminho para as origens. E Rosa não deixa por menos: - A gente não morre, fica encantado.
A resposta de Andara E eu, o que poderia dizer sobre o assunto? Bem, eu tenho um sentimento xamânico da Vida, eu sou um Panteísta irrecuperável. E eu sou um sonhador desperto. E eu tenho um intenso sentimento de Presença do insondável Si no pequeno mim que sou. Mas devo tudo o que consegui expressar sobre o viver fazendo a minha Viagem a Andara e colhendo e recolhendo as respostas às perguntas que os meus livros vão fazendo pelo caminho. E assim é que não eu, mas Andara, através de um fragmento chamado Dom Fugaz, extraído do Manifesto Curau, se indagada sobre o homem poder ultrapassar a si mesmo, responderia: Andara não é Literatura: é Rarefação. Coisa que viaja por dentro e no sentido inverso: quer retornar dos dedos dos pés ao calcanhar do homem, ali onde ele é mais sensível à Hipótese Onírica e Lúdica e Naturalmente Sagrada da vida. Andara quer a Origem, o Antes do ponto em que tudo começou a se perder do To-
Sri Aurobindo Guardei para o fim o início da página Sim do próximo domingo, quando vamos manter mais um Diálogo com homens sábios – dessa vez com o mestre indiano, criador da Yoga Integral, Sri Aurobindo. Para você ir se preparando, antecipo aqui algo que ele escreveu sobre Os Instrumentos do Espírito:
A primeira necessidade para uma perfeição ativa de nosso ser é a purificação do atuar dos instrumentos que ele atualmente utiliza. O ser em si próprio é eternamente puro. A mente, o coração, a alma de desejo vital, a vida no corpo são os assentos da impureza. O objetivo não é uma pureza negativa, proibitiva, passiva ou aquietadora, mas uma pureza positiva, afirmativa, ativa. É uma total purificação de toda a complexa instrumentalidade em todas as partes de cada instrumento que é solicitada a nós pela perfeição integral. O siddha da perfeição integral tem que residir em um plano mais amplo da eterna pureza do Espírito além do bem e do mal. Para essa transformação, ele deve tornar consciente nele aquele poder do Espírito e supramente que é agora superconsciente para nossa mentalidade. Mas aquilo não pode atuar nele até que seu presente ser mental, vital e físico esteja libertado de sua ação inferior atual: essa purificação é a primeira necessidade. E agora me digam: não parece até que Aurobindo está confirmando as palavras do Rafael? E quando os Sonhadores-visionários adultos acima citados dizem que seremos mentes pós-geográficas fora dos limites do tempo – não é a mesma coisa que a criança Rafael diz? Os Surrealistas recomendavam: - Pais, contem seus sonhos aos seus filhos. E eu acrescento: - E, sobretudo, ouçam os sonhos dos seus filhos.
Kosmo Yoga