Revista In form@ção Volume 4 Nº 6

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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) Inform@ção [Recurso eletrônico]: A revista digital do CEFOR/SEDUC / Secretaria de Educação do Estado do Pará, Centro de Formação de Profissionais da Educação Básica do Estado do Pará. – v. 4, n. 6 (.d e z 2019) - . - Belém: SEDUC/CEFOR, 2019 [on-line]. ISSN: 2448-1106 1. Educação – Periódicos. 2. Formações - Periódicos I. Secretaria de Educação do Estado do Pará. II. Centro de Formação de Profissionais da Educação Básica do Estado do Pará. CDD:370 CDU: 37(05) Ficha catalográfica elaborada por Nathalya Marinho da Silva – CRB-2/1665


S U M Á R I O

IMPACTOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO PARÁ: DA AÇÃO À REFLEXÃO

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Glaucia de Nazaré Baia e Silva e Pedro Franco de Sá INTRODUÇÃO AO SCRATCH 1.4 PARA PROFESSORES

29

Adriana da Conceição Barros do Rosário A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO ENSINO DE BIOLOGIA: A IMPORTÂNCIA DESTA NA DESCONSTRUÇÃO DE PADRÕES FÍSICOS ACEITOS SOCIALMENTE

43

Ainá Cunha Romeiro, Valdenice Barros da Silva Moscoso e Ivoneide Maria da Silva INTENCIONALIDADES E CAMINHOS NA INICIAÇÃO CIENTÍFICA: PRÁTICA PEDAGÓGICA DA ESCOLA ESTADUAL PROF. DEUZUITA PEREIRA DE QUEIROZ

54

Josidalva de Almeida Batista, Maria da Conceição Ribeiro Troitinho e Aerton Francisco Lima TEXTO E DISCURSO NO ENSINO E APRENDIZAGEM DE LÍNGUA INGLESA

66

Lívina Martins Boothão e Silvia Helena Benchimol Barros QUE PROFESSORES ESTAMOS NOS TORNANDO? PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO E AS PEDAGOGIAS PROGRESSISTAS

81

Maria das Graças Moura Santos, Dhemersson Warly Santos Costa e Carlos Augusto Silva e Silva A UTILIZAÇÃO DE CARTÕES RESPOSTAS PARA IDENTIFICAR DEFICIÊNCIAS NA APRENDIZAGEM

93

Gilson Tadeu Pinto de Andrade e Mauricio dos Santos Macedo GESTÃO DE PROCESSOS: UMA ANÁLISE DA COORDENAÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA SEDUC/PA NO ANO DE 2010.

105

Nícolas Pinto Alves ESTADO DO CONHECIMENTO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA NO BRASIL: TEMAS, DILEMAS E PARADOXOS NAS PRODUÇÕES ACADÊMICO-CIENTÍFICAS

122

Raimundo Nonato de Pádua Câncio

SABERES E DIVERSIDADES DA EXPRESSÃO ARTÍSTICA NA AMAZÔNIA PARAENSE

142

Silene Trópico e Silva A CONTEXTUALIZAÇÃO NO ENSINO DE BIOLOGIA: AULAS DE HISTOLOGIA HUMANA COM ENFOQUE CTS Valdenice Moscoso, Cristina de Barros Nunes e Ivoneide Maria da Silva

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E X P E D I E N T E

A Revista InForm@ção é uma publicação online de periodicidade semestral, destinada à publicação de relatos de experiências e artigos científicos de autoria dos professores e servidores da Secretaria de Estado de Educação do Pará, em especial os que atuam nas escolas da rede estadual, com objetivo de socializar experiências e resultados de pesquisas, reconhecendo e valorizando as contribuições empíricas e teóricas dos autores. GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ Helder Zahluth Barbalho SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO Leila Carvalho Freire SECRETARIA ADJUNTA DE ENSINO Ana Paulo Renato CENTRO DE FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA DO ESTADO DO PARÁ Francisco Augusto Lima Paes EQUIPE REVISTA INFORM@ÇÃO Autor Corporativo: Centro de Formação dos Profissionais da Educação do Estado do Pará Endereço: Rua Gama Abreu, 256 - Bairro de Nazaré Belém – Pará CEP: 66.015-130 E-mail: cefor.seduc@gmail.com E-mail da Revista: ceforrevista@gmail.com Telefone: 091 3230-4050

EDITORES

PARECERISTAS AD HOC

Nádia Eliane Cortez Brasil Ocimar Marcelo Souza de Carvalho

Prof. Ma. Daniela de Nazaré Torres de Barros Prof. Me. Dionísio José da Costa Sá Prof. Dra. Elizabete Pereira Pires Prof. Dr. Evandro dos Santos Paiva Feio Prof. Dr. Gesson José Mendes Lima Prof. Ma. Gláucia de Nazaré Baía e Silva Prof. Me. Ival Rabêlo Barbosa Júnior Prof. Dr. Luciano Augusto da Silva Melo Prof. Dra. Maíra Oliveira Maia Prof. Dra. Mara Franco de Sá Prof. Ma. Marília Frade Martins Prof. Ma. Missilene Silva Barreto Prof. Dr. Mauro Márcio Tavares da Silva Prof. Dr. Raimundo William Tavares Júnior Prof. Dr. Roberto Araújo Martins Prof. Me. Roberto Pinheiro Araújo Prof. Dra. Rosineide de Souza Jucá Prof. Dra. Sandra Lúcia Paris

CONSELHO EDITORIAL André Luís Pereira de Freitas Francisco Augusto Lima Paes Nádia Eliane Cortez Brasil Ocimar Marcelo Souza de Carvalho Roberto Pinheiro Araujó DIAGRAMAÇÃO E CAPA André Freitas PERIOCIDADE: semestral ENDEREÇO ELETRÔNICO: https://issuu.com/cefor


A P R E S E N T A Ç Ã O

A Revista InForm@ção é um periódico científico editado e publicado pelo Centro de Formação dos Profissionais da Educação Básica do Estado do Pará – CEFOR/SEDUC. As edições são semestrais e disponibilizadas na rede mundial de computadores. Destinada à publicação de relatos de experiências e artigos científicos de autoria dos professores e servidores da Secretaria de Estado de Educação do Pará, em especial os que atuam nas escolas da rede estadual, a revista tem como objetivo socializar experiências e resultados de pesquisas, reconhecendo e valorizando as contribuições empíricas e teóricas dos autores. Trata-se de uma iniciativa de valorização da atividade intelectual de nossos professores e servidores. A Revista Inform@ção completa seu quarto aniversário este ano. Lançada em outubro de 2015, o periódico apresenta notável crescimento junto com o próprio CEFOR, afinal, são histórias que se entrelaçam, sempre com a marca da interiorização, com olhar para além da Região Metropolitana de Belém. Formar professores é a meta do Centro e a revista, por sua vez, traz para os formadores os saberes científicos e empíricos dos professores da rede que militam no chão da escola, tecendo um diálogo respeitoso e de reconhecimento, em um aprender contínuo, com alternância do lugar de quem ensina-aprende-ensina. Atualmente, o periódico possui duas categorias de trabalhos – Relatos de Experiência e Artigos Científicos. Os autores podem optar por oito Eixos Temáticos, a saber: Gestão e Políticas Públicas em Educação; Saberes, Diversidades e Práticas de Ensino na Educação Básica; Currículo e Avaliação da Aprendizagem na Educação Básica; Formação de Professores; História e Memória da Educação na Amazônia; Ensino, Aprendizagem, Metodologias para a Educação Básica; Trabalho e Educação Profissional e Educação e Inclusão. O aniversário da Revista InForm@ção marca também sua retomada. Por motivos alheios ao CEFOR, houve um hiato nas edições, os dois números de 2018 e o primeiro de 2019 não foram publicados. Felizmente, os entraves foram superados e com entusiasmo a revista chega à sexta edição, com 12 trabalhos analisados e aprovados pelo corpo de avaliadores. A seguir, apresentamos, por meio de breves comentários, um pouco de cada um deles. A professora Adriana da Conceição Barros do Rosário, autora de INTRODUÇÃO AO SCRATCH 1.4 PARA PROFESSORES, relata a experiência de uma oficina de introdução à linguagem de programação Scratch 1.4, realizada com professores da educação básica, o 2


qual teve como objetivo introduzir conceitos da linguagem de programação scratch, apresentar o seu potencial para a criação de objetos de aprendizagem e validar as metodologias que foram propostas. Já os docentes Ainá Cunha Romeiro, Valdenice Barros da Silva Moscoso, Ivoneide Maria da Silva produziram o artigo A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO ENSINO DE BIOLOGIA: A IMPORTÂNCIA DESTA NA DESCONSTRUÇÃO DE PADRÕES FÍSICOS ACEITOS SOCIALMENTE, que aborda a importância da escola como espaço fundamental na formação de valores e discussão de questões sociais importantes para os seres humanos, sendo a continuidade da formação conferida pela família e demais entidades sociais. Em termos de política de formação de professores, os pesquisadores Glaucia de Nazaré Baía e Silva e Pedro Franco de Sá, no artigo intitulado IMPACTOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO PARÁ: DA AÇÃO À REFLEXÃO, descrevem as ações e o registro da formação de professores em serviço, empreendidas pela Secretaria de Estado de Educação do Pará (SEDUC-PA), no final da década de noventa. O estudo permitiu analisar a formação docente em processo e constrói uma reflexão sobre quais parcerias poderiam ser consolidadas com objetivo de melhorar a qualidade da formação dos professores, em especial os que atuam nos rincões do Estado do Pará, algumas vezes completamente esquecidos por aqueles que constroem e executam políticas públicas. Para tratar da pesquisa científica, o texto INTENCIONALIDADES E CAMINHOS NA INICIAÇÃO CIENTÍFICA: PRÁTICA PEDAGÓGICA DA ESCOLA ESTADUAL PROF. DEUZUITA PEREIRA DE QUEIROZ, produzido por Josidalva de Almeida Batista, Maria da Conceição Ribeiro Troitinho e Aerton Francisco Lima, discute intencionalidades e caminhos na iniciação científica percorridos pelos discentes, docentes e equipe técnica da Escola Estadual Prof. Deuzuita Pereira de Queiroz, localizada em Redenção-PA. Os pesquisadores sugerem que os resultados encontrados indicam um caminho promissor na construção de novos saberes e no fortalecimento do protagonismo juvenil a partir de um trabalho multidisciplinar. No que tange ao ensino de língua estrangeira na Educação Básica, a revista apresenta o artigo TEXTO E DISCURSO NO ENSINO E APRENDIZAGEM DE LÍNGUA INGLESA, das autoras Lívina Martins Boothão e Silvia Helena Benchimol Barros. Para as pesquisadoras, o ensino-aprendizagem de língua inglesa nos dias atuais exige do professor, cada vez mais, uma postura prática e reflexiva sobre o contexto educacional e a 3


compreensão do aprendiz como agente crítico, participativo e controlador de seu processo de aprendizagem. O estudo sustenta que a aprendizagem de uma língua estrangeira, por meio de textos contextualmente situados, valoriza a reflexão sobre os discursos neles contidos, fomenta a formação de leitores críticos, reforça as identidades dos aprendizes e propicia a percepção de uma convivência global em que as diferenças são enriquecedoras e não representam estereótipos de dominação, superioridade e inferioridade. A região oeste do Estado, centrada na cidade de Altamira, é representada pelo estudo QUE PROFESSORES ESTAMOS NOS TORNANDO? PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO E AS PEDAGOGIAS PROGRESSISTAS, elaborado pelos pesquisadores Maria das Graças Moura Santos, Dhemersson Warly Santos Costa e Carlos Augusto Silva e Silva. No artigo, os educadores traçam discussões sobre a produção de subjetividades em discursos e enunciados por meio das teorizações construídas por Michel Foucault. Nelas, os professores (pedagogos) são pensados como construtos sociais que foram/são fabricados por diversos discursos atravessados pelas pedagogias progressistas nos documentos oficiais. Para tanto, foram acionados fragmentos textuais de alunos do curso de pedagogia da UFPA/Campus Altamira, bem como o projeto político-pedagógico do referido curso, a fim de pensar como a docência é produzida a partir de discursos progressistas. Já o município de Bujaru traz o texto A UTILIZAÇÃO DE CARTÕES RESPOSTAS PARA IDENTIFICAR DEFICIÊNCIAS NA APRENDIZAGEM, de autoria de Gilson Tadeu Pinto de Andrade e Mauricio dos Santos Macedo. Nele, os docentes apresentam um relato de experiência em uma escola do município. Os dois professores (um de Química e outro de Matemática) buscaram analisar o rendimento dos alunos a partir das respostas usadas nos testes, utilizando o cartão resposta. A ideia era encontrar e, em seguida, organizar grupos de alunos com as mesmas dificuldades de aprendizagem e, com isso, fazer outros exercícios já direcionados em cima das deficiências encontradas no primeiro momento. Os resultados encontrados pelos autores foram satisfatórios, pois notaram uma significativa evolução em determinado assunto analisado após aplicação da metodologia. Em termos de eficácia em processos administrativos, o artigo GESTÃO DE PROCESSOS: UMA ANÁLISE DA COORDENAÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA SEDUC/PA NO ANO DE 2010, escrito pelo especialista Nícolas Pinto Alves, debruça-se sobre a gestão de processos que tramitaram na Coordenação de Educação Infantil – CEINF da Secretaria de Estado de Educação do Pará em 2010. O autor propõe possibilidades, de

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curto a longo prazo, com intuito de otimizar processos, visando a uma gestão eficiente da administração pública que perpassa por uma ênfase na transparência. A educação indígena também se faz presente, nesta edição, no trabalho construído pelo

educador

Raimundo

Nonato

de

Pádua

Câncio,

intitulado

ESTADO

DO

CONHECIMENTO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA NO BRASIL: TEMAS, DILEMAS E PARADOXOS NAS PRODUÇÕES ACADÊMICO-CIENTÍFICAS. O estudo, caracterizado como analítico e descritivo, tem como objetivo sistematizar a produção acadêmico-científica em torno da educação indígena no país no período de 2002 a 2015. Para tanto, utiliza como parâmetro os estudos que relacionam essa temática ao póscolonialismo, à teoria decolonial e ao ocidentalismo. Uma das conclusões do autor aponta que a carência de estudos de base decolonial, na perspectiva pós-colonial, indica a necessidade de desenvolver pedagogias decoloniais que questionem e desconstruam as estruturas de poder racializado, moderno e colonial, a partir de uma proposta de intervenção e ação sociopolítica transformadora. A educação especial não poderia ficar de fora e é tema da pesquisa realizada pela professora Sandra Conceição do Nascimento em LEIS, DECRETOS, RESOLUÇÕES, PORTARIAS E A EDUCAÇÃO DE SURDOS NO BRASIL, artigo que busca identificar as principais filosofias utilizadas na educação de Surdos no Brasil em virtude das legislações formuladas, promulgadas e implementadas. A pesquisa foi realizada por meio de levantamento bibliográfico relacionado ao tema, a partir de citações presentes nas legislações referentes à educação de Surdos desde 1835, ano em que foi criado o projeto de lei do deputado Cornélio Ferreira França para o ensino de cegos e surdos-mudos, até os dias atuais. Verificou-se que, no decorrer dos anos, houve a implementação da filosofia oralista, a comunicação total e o bilinguismo no Brasil. O ensino híbrido também é contemplado no relato de experiência SABERES E DIVERSIDADES DA EXPRESSÃO ARTÍSTICA NA AMAZÔNIA PARAENSE, da autora Silene Trópico e Silva, o qual sistematiza a prática de ensino desenvolvida no Sistema Educacional Interativo – SEI. Aulas presenciais interativas, mediadas pela tecnologia satelital, são ministradas aos alunos matriculados na 1° ano do ensino médio regular de 15 localidades da zona rural, pertencentes a 34 comunidades e vilas do interior do Estado. Situado no eixo temático Saberes, Diversidades e Práticas de Ensino na Educação Básica, o presente relato descreve o processo expressivo do aprendiz conduzido em aula de Arte, a fim de apontar os mecanismos migratórios utilizados por eles enquanto articulavam o uso de 5


códigos culturais, saberes e diversidades da expressão artística e a realidade de diferentes localidades da Amazônia paraense. Por fim, o texto A CONTEXTUALIZAÇÃO NO ENSINO DE BIOLOGIA: AULAS DE HISTOLOGIA HUMANA COM ENFOQUE CT, de Valdenice Moscoso, Cristina de Barros Nunes e Ivoneide Maria da Silva, apresenta um interessante relato de prática das autoras em contexto escolar. O estudo avaliou a aplicação do enfoque CTS para o ensino do conteúdo de Histologia Humana, como uma opção metodológica que tem como objetivo o aluno ativo e construtor de seu conhecimento no processo de ensino e aprendizagem, capacitando-os a transitar entre o conhecimento científico e as peculiaridades do mundo, a partir do levantamento de situações-problema. Assim, os alunos foram instigados a questionar e a buscar seus próprios conhecimentos (aprender a aprender). Os editores da Revista InForm@ção agradecem aos autores, avaliadores e demais parceiros que se empenharam para tornar possível esta edição, celebrando o aniversário e o reavivamento do periódico do CEFOR, espaço de compartilhamento de saberes sobre a Educação Básica na rede pública paraense.

Marcelo Carvalho

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IMPACTOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO PARÁ: DA AÇÃO À REFLEXÃO

Glaucia de Nazaré Baia e Silva 1 Pedro Franco de Sá2

RESUMO Este artigo traz a descrição das ações e o registro da formação de professores em serviço, empreendidas pela Secretaria de Estado de Educação do Pará (SEDUC-PA), no final da década de noventa. Partiu-se de uma pesquisa acadêmico-científica, que teve como corpus uma pesquisa documental em três documentos oficiais, da referida secretaria, como: o Programa de Capacitação e Habilitação para Professores Leigos; o Plano Estadual de Educação 1999 a 2001 e o Relatório Final. Definiu-se como questão norteadora o seguinte questionamento: As ações e propostas nos Documentos sobre a formação de professores em serviço impactaram no desenvolvimento de uma política de formação de professores no Estado do Pará? Aqui se pretende ponutuar a realização de uma análise descritiva, com abordagem qualitativa, complementada em dados quantitativos, a fim de torná-los registros de uma ação de formação pós-LDB (nº 9.394/96). Para a elaboração textual definiu-se os seguintes construtos de análise com condicionantes pré-formação e desenvolvimento da formação: político-administrativo, acadêmico-pedagógico e tempo-formação. Este estudo revelou que as ações impactaram na política de formação de professores em serviço, dando base às ações posteriores, porém não houve uma ação efetiva de continuidade por parte da Secretaria de Estado de Educação. Palavras-chave: Formação de Professores. Programa de capacitação. Pesquisa documental.

1- Introdução O cenário de início da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de nº 9394/96, em que determina a formação em nível superior a todos os professores da educação básica, trouxe grandes desafios à Secretaria de Estado de Educação (SEDUC), que se viu pressionada a fomentar um programa especial de formação aos professores leigos atuantes na rede estadual. A proposta de formação de Professores no Estado do Pará começou a ser elaborada, em 1997, por uma equipe de profissionais da própria Secretaria de Educação, ligada ao Departamento de Recursos Humanos (DRH). Pode-se deduzir que esta ação se constituiu como reflexo da imposição da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases Educação Nacional. Para o termo leigo, não se encontrou nenhum conceito nos três documentos pesquisados. Dessa forma, buscou-se o conceito em Menezes e Santos (2002), os quais se referem aos “Professores sem qualificação pedagógica”, mas se amplia a leitura informando que: 1 Pedagoga na Secretaria de Estado de Educação desde 2008, Mestrado em Educação pela Universidade do Estado do Pará, glauciabaia@yahoo.com.br 2 Professor da Universidade do Estado do Pará e Orientador do referido trabalho, pedro.franco.sa@gmail.com

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A existência de professores leigos é comum em países do terceiro mundo, nas áreas mais pobres e, principalmente, na zona rural. No Brasil, a existência de professores leigos é mais comum nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde muitos deles estudaram apenas até a 4ª série e a maior parte não terminou o ensino fundamental (antigo 1º grau). Em 1999, cerca de 30%, dos 456 mil professores de ensino fundamental no Norte, Nordeste e Centro-Oeste não tinham habilitação para lecionar. Ainda, de acordo com dados do MEC, do universo de professores leigos existentes no País, na mesma época, cerca de 113 mil não haviam concluído sequer o ensino fundamental. (MENEZES & SANTOS, 2002, IN: AGENCIA EDUCABRASIL, 2014).

No registro desses autores, por força da LDB, para acabar com o perfil do professor leigo, o Ministério da Educação (MEC) lançou, em 1999, o Proformação (Programa de Formação de Professores em Exercício). Curso em nível médio, com habilitação em Magistério, na modalidade de educação a distância, por meio da TV Escola, com duração de dois anos. Seu objetivo era oferecer curso para professores que atuavam nas quatro séries iniciais e alfabetização das escolas da rede pública das regiões norte, nordeste e centro-oeste. Não foram encontrados registros do Proformação no Pará, porém há marcações de cursos a Distância, através da TV Escola, nos relatórios do CTRH, nos quais não se menciona o Proformação. Por esse viés, Professores Leigos eram todos os que não adquiriram a escolaridade de Nivel Médio Magistério, especialmente, mas em determinação legal seria necessário obter o Nivel Superior em Licenciatura Plena, definido como o mais adequado para estar no exercício da função docente. Nos dois documentos, Programa de Formação e Plano Estadual de Educação, constam a realização de um levantamento da demanda de professores leigos na rede estadual de ensino. Percebeu-se um quadro de qualificação docente díspar no Estado do Pará, pois havia três perfis de profissionais docentes: estavam no cargo de professor e não possuíam o 1º e o 2º graus, à época, completos, correspondentes ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio, respectivamente, assim como tinham professores com o ensino médio técnico. Aponta-se que essas ações de formação, empreendidas pela Secretaria de Estado de Educação do Pará, fazem parte dos destaques deste trabalho. Como estrategia destacase a participação de profissionais que trabalharam em prol da formação em serviço de professores da rede estadual de ensino. Como procedimentos metodológicos adotou-se a pesquisa documental. Para tal, foram analisados três documentos: o Programa de Capacitação e Habilitação para Professores Leigos; o Plano Estadual de Educação 1999 a 2001 e o relatório final de execução. Aqui se pretende uma postura descritiva, de abordagem 8


qualitativa, complementada com dados quantitativos, a fim de torná-los um texto histórico, pós-LDB. No levantamento da pesquisa de campo, foram encontrados três documentos que podem ser destacados como uma política de formação de professores em serviço, com algumas interveniências. Por documento, entende-se “o termo documentum, derivado de docere ‘ensinar’”, que evoluído, assumiu o significado de ‘provas’. Com a escola positivista o documento triunfou como prova histórica, corpus da pesquisa histórica, por entender que “o documento não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é o produto da sociedade que o fabricou”. (LE GOFF, 1992, p. 102) Com esse entendimento, espera-se buscar os ensinamentos nos registros desses documentos e constituí-los como produto de um trabalho executado com uma equipe que se propôs ao desafio da eliminação da categoria de professores leigos. O corpus de análise parte do Programa de Professores Leigos, com os cinco Projetos de Formação de Professores Leigos, do Plano Estadual de Educação 1999 a 2003 e do Relatório Final, deste programa. Adotou-se também, as definições de Gil (2010, p. 65) sobre a pesquisa documental como fundamento para esta seção. Trata-se de uma pesquisa “ex-post-facto”. Foram elaborados dados estatísticos com as informações disponibilizadas. Os documentos receberam uma leitura inicial, para reconhecimentos dos aspectos estratégicos e a transcrição literal das informações pertinentes à análise e à construção dos dados quantitativos. Para a elaboração textual, definiu-se os seguintes construtos de análise: Condicionantes pré-formação e desenvolvimento da formação, construto políticoadministrativo, acadêmico-pedagógico e tempo-formação. Estes estarão descritos no decorrer do texto, mas não retratados de maneira didática, como aparecem no quadro, mas estarão dispostos na intertextualidade do material. Por constructo, define-se como “construção puramente mental, criada a partir de elementos mais simples para ser parte de uma teoria” (www.dicio.com.br).

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Quadro 01 Categorias de Análise dos Documentos Condicionantes

Construtos

Pré-formação

Políticoadministrativos

Princípio jurídico: Leis, Projetos elaborados; Recursos financeiros.

Acadêmicopedagógicos

Definição da matriz curricular, Processo seletivo, Planejamento e Avaliação, Material didático e conteúdo. Tempo-formação Definição do funcionamento e infraestrutura física e tecnológica. Fonte: Elaboração da autora.

Desenvolvimento da Formação Recursos humanos; Infraestrutura física e tecnológica. Atividades de formação: Estratégias teóricometodológicas Operacionalização da formação

Nessa perspectiva, seguiu-se com a pergunta norteadora: Os documentos sobre a formação de professores em serviço impactaram no desenvolvimento de uma política de formação de professores no Estado do Pará? Defende-se que esta questão pode suscitar uma discussão diante dos documentos descritos, pois se percebeu eventos que registram a atuação efetiva do Centro de Treinamento de Recursos Humanos (CTRH) para a realização da formação para o Estado do Pará, nos anos 90 e 2000. Para o construto político-administrativo adotou-se como condicionantes préformação: os princípios jurídicos; os cinco projetos de formação; o Plano plurianual e os Recursos financeiros; a Base de dados e as condicionantes de desenvolvimento: os Recursos humanos; os Polos de Formação e Infraestrutura física e tecnológica, descritas a partir daqui. 2- Discussão e Análise

2.1 - Construto Político-Administrativo: Condicionantes Pré-Formação Como princípio jurídico parte-se do conceito de Mello (2000, apud, FAZOLI, 2007, p.15) quando o define que: Princípio [...] é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. (MELLO, 2000, apud, FAZOLI, 2007, p.15)

Dessa forma, afirma-se que os princípios jurídicos das reformas educacionais correspondem ao que estava sendo apresentado pelas mudanças governamentais no 10


Estado do Pará. Na década de 80 e 90 viu-se surgir na legislação nacional novas formas de ver os estados e os municípios e a própria União. O campo educacional sofreu mudanças significativas, reflexo do amplo conjunto de reformas com a chamada trilogia das leis: Emenda constitucional nº 14, de 12/1996, a Lei de Diretrizes e Bases da educação Nacional (LDB) – lei nº 9394/96, de 20/12/96 e o Fundo de Manutenção de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF), instituído pela lei nº 9424, de 24/12/96. (VEIGA; CABRAL, 2002, p. 28)

Segundo Maués, as reformas educacionais implantadas na década de 1990 têm como princípio determinações reformistas do estado, visto que: A definição dessas políticas está ligada às exigências criadas pelas mudanças econômicas e sociais resultantes da globalização, dos avanços científicos e tecnológicos e do papel que o mercado vem assumindo na esfera social. Todo esse conjunto de fatores tem demandado reformas no Estado, dentre elas às que se passam na educação. (MAUÉS, 2003, p.1)

Quanto aos professores a autora complementa, afirmando que: As políticas educacionais incidiram fortemente sobre o docente, enquanto protagonista privilegiado do processo educacional. A preocupação com a formação desse profissional passou a ser uma constante nas agendas dos diferentes países e nas reformas empreendidas, enquanto maneira de operacionalizar os objetivos pretendidos em relação ao novo papel esperado da escola que passou a seguir novas regulações estabelecidas pelo processo de mundialização. (MAUÉS, 2003, p.1)

Dessa forma, é possivel imprimir que como princípio jurídico, a Secretaria de Estado de Educação elaborou o Plano Estadual de Educação de 1999 a 2003, o qual corrobora com as preleções de Maués, quando define que: Enquanto se fortalece e se conclui o processo de municipalização do ensino fundamental capacitando os municípios para gerenciarem com eficácia e eficiência essa modalidade de ensino, preocupa-se a SEDUC com a reforma do ensino médio e a educação profissional [...] a integração da educação com o desenvolvimento econômico, condição básica para o próprio desenvolvimento sócio-econômico do país. (PARÁ, 1999)

No Plano Estadual, o eixo “A formação e Valorização do Magistério” faz alusão ao trabalho da Secretaria iniciado em 1997, de um estudo diagnóstico coordenado por uma equipe da própria SEDUC-PA. 11


Os resultados desse estudo diagnóstico apontavam para a necessidade de promover mudanças nos indicadores levantados, apresentando como uma das tarefas prioritárias as definições de diretrizes para a elaboração de Formação e Valorização do Magistério com metas a serem implantadas em 1998 e implementadas na gestão 1999 a 2002. (PARÁ, 1999)

Assim a SEDUC-PA entrega à gestão governamental, em 1998, um Programa de Capacitação e Habilitação para Professores Leigos, do qual foram criados vários Projetos com o objetivo de qualificar e eliminar da rede de ensino estadual a categoria de professores leigos. Esses projetos estavam sob a coordenação do Centro de Treinamento de Recursos Humanos “Prof. Arthur Porto” – CTRH, em articulação com o Departamento de Ensino Supletivo, ambos vinculados a SEDUC-PA. A secretaria, como gestora dos projetos, defendia a formação pedagógica necessária à melhoria da qualidade da prática em sala de aula, como veremos a seguir. Ao se estudar os documentos, verificou-se que os registros sobre os projetos aparecem tanto nas propostas da SEDUC-PA, quanto no Plano Estadual de Educação 2002. Pode-se afirmar também, que as informações do Programa de Formação apresentavam mais indícios que as do Plano, contudo, há dados incongruentes nestes documentos. Cada projeto apresentado a seguir visava atender públicos específicos do quadro de docentes leigos da rede estadual de ensino, a saber: I – Capacitação para Professores Leigos em nível do Ensino Fundamental – através do Sistema de Ensino a Distância; II – Habilitação para Professores Leigos em nível do Ensino Médio – Modalidade Normal; III – Habilitação para Professores Leigos em nível de Complementação Pedagógica do Ensino Médio – Modalidade Normal; IV - Habilitação para Professores Leigos em nível de Complementação Pedagógica do Ensino Superior – Licenciatura Plena; V – Licenciatura Plena; Com a divulgação desses cursos, a rede municipal manifestou interesse e juntamente com o processo de municipalização estava agregada a parceria pela formação de professores. Pelos documentos ficaram definidos alguns polos de formação com a inclusão dos professores das Secretarias Municipais de Educação (SEMED). Nesse ínterim identificou-se no relatório, a comunicação com a rede municipal e informações da existência 12


de outro programa de formação de professores, o Projeto Gavião I e II. Destaca-se que os professores da rede municipal e da rede estadual participaram desses projetos, que era também de elevação da escolaridade, mas o que se percebeu é que não houve continuidade e nem a garantia de atendimento a clientela necessitada. Subtende-se como princípio jurídico também o Plano Plurianual 2000/2003, contudo, que obedecia ao Decreto Estadual nº 2.208/04/97, para que as propostas de formação dos Programas de Capacitação fossem desenvolvidas. O Projeto I caberia atender a Professores que possuíam o ensino fundamental incompleto, os quais trabalhavam com turmas de Préescolar e Ensino Fundamental de 1ª à 4ª séries. Sua execução ficou sob a responsabilidade do Centro de Estudos Supletivos, vinculado ao Departamento de Ensino Supletivo da SEDUC-PA (CES/DESU). Os cursos dos Projetos II e III direcionaram-se ao público que possuíam Ensino Fundamental completo, Ensino Médio Incompleto ou possuíam cursos Técnicos, trabalhavam com turmas de 1ª a 4ª séries e 5ª a 8ª séries. Este projeto foi assumido pelo próprio CTRH, com equipe de formadores e técnicos volantes para acompanhar a formação. Na proposta do Programa de Capacitação e Habilitação dos professores leigos, os cursos IV e V aconteceram mediante Convênio com a Universidade do Estado do Pará, e demais universidades, para os professores que não possuíam Ensino Superior ou tinham graduação, mas cursos bacharelados. Quanto ao financiamento a provisão maior seria viabilizada do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), no valor estimado de R$ 24.223.993,25 (Vinte e quatro milhões, duzentos e vinte e três mil, novecentos e noventa e três reais e vinte e cinco centavos). Outros recursos foram viabilizados para a implementação da formação, segundo os documentos, com: R$ 3.372.320,00 (três milhões, trezentos e setenta e dois mil e trezentos e vinte reais) do Tesouro do Estado e do Programa Pará-URBE3, no valor de R$ 13.839.100,00 (treze milhões, oitocentos e trinta e nove mil e cem reais). Observou-se no escopo dos documentos estudados, que esses recursos foram investidos em material didático, passagens e diárias aos professores-alunos, professores-formadores e técnicos da SEDUC, auxílio formação e Programa de Apoio ao Desenvolvimento Municipal e melhoria da Infraestrutura Regional do Estado do Pará – Pará-Urbe, parcialmente financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), tem como objetivo melhorar o marco institucional, legal e financeiro das prefeituras, assim como a qualidade e cobertura dos serviços prestados às comunidades. Iniciado em 2002, o Programa previu investir US$ 166 milhões de dólares. O BID concedeu um empréstimo de US$ 48 milhões para a primeira etapa do Programa. www.cobrape.com.br – acessado em 10 junho de 2015. 3

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material impresso aos professores-alunos. O quadro abaixo representa a formatação da proposta dos cursos e de cada público a ser atendido. As informações prestadas nos documentos demonstram que os cursos foram desenvolvidos em anos diferentes, mas em períodos coincidentes, devido ao público que estudava nos períodos de férias e recessos escolares. O ano de 1999 representa o ano em que todos os cursos estavam em pleno desenvolvimento, mas em 2000, apesar de atender apenas três cursos, foi o ano com maior provisão de investimentos. Os cursos II, habilitação em Magistério, e V, habilitação em nível superior, foram realizados em quatro anos e receberam maiores provimentos. Os cursos I, III e IV foram realizados em dois anos. O curso III, de complementação pedagógica foi o que menos recebeu investimentos, devido ao numero pequeno de professores. Como último condicionante pré-formação, para o construto político-administrativo adotou-se a base de dados como instrumentos de registros de informações sobre os professores da rede estadual. A diagnose realizada pela SEDUC-PA levantou informações sobre a qualificação docente e percebeu que era preciso também verificar as potencialidades de execução das agências formadoras, visto que dois últimos projetos não estavam sob sua responsabilidade. Os dados do Censo escolar de 1996, segundo os relatórios acessados, apontavam que na região norte e nordeste 57.566 professores tinham apenas o Ensino Fundamental e 14.956 com nível médio. Segundo, Camargo “somente 5,3% eram exercidas por docentes com formação em nível superior, o que pode ser interpretado como uma decorrência da reduzida oferta de cursos de nível superior na região” (2013, p.5). Para Cunha et al (2007, p. 08) “tal situação se explica, em parte pela ausência de políticas públicas que permitam a interiorização de instituições de ensino superior de grande porte”. Como resultado do levantamento de dados, indicava-se que a secretaria possuía cinco categorias de docente em sala de aula, conforme gráfico 01 a seguir:

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Gráfico 01 – Professores na Rede de Ensino Estadual em 1997 Nível fundamental incompleto 10%

Magistério, sem Licenciatura 59%

Nível fundamental completo 19% Nível médio, sem Magistério 2% Graduado, sem Licenciatura 10%

Fonte: SEDUC/1998

Quadro 02 – Categoria de Docentes Leigos em 1997 Escolaridade Nível fundamental incompleto Nível fundamental completo Nível médio, sem Magistério

Nº de professore s 527 965 120

Graduado, sem Licenciatura

487

Magistério, sem Licenciatura Total de professores

3.000

Cursos

Instituição Formadora

I – Capacitação Nivel Fundamental II – Habilitação em Nível Médio – Modalidade Normal III – Complementação Pedagógica Nivel Médio Modalidade Normal IV – Complementação Pedagógica Nivel Superior – Licenciatura Plena V - Licenciatura Plena

CTRH/CES/DESU

5.099

CTRH/CES/DESU CTRH/CES/DESU Convenio previsto SEDUC/UEPA Convenio previsto SEDUC/UEPA

Fonte: Produzidos a partir dos documentos.

A demanda apresentada, tanto no gráfico 01 quanto no quadro 02, demonstra que o número de professores sem licenciatura inicialmente chegava a 3.487 profissionais, pois neste espectro temos professores com bacharelado, os quais foram denominados de graduados sem licenciatura, para estes houve indicação do curso de complementação pedagógica. Os 1.612 professores restantes precisavam primeiro, completar o ensino médio para depois adentrar no ensino superior. A análise dos documentos reflete a ausência de 15


dados mais precisos, ou seja, o número real de professores na rede a serem formados, bem como as especificações dos sujeitos dos cursos III e IV, quais os cursos técnicos ou científicos e as graduações referidas por área, porém o diagnóstico das ações estava correto. Afirmava-se qual a formação necessária e seu público alvo, contudo, a quantidade ficou fragilizada com a entrada da rede municipal. Pode-se demonstrar um comparativo do Plano Estadual e do programa da SEDUC-PA que conduz essa suposição. TABELA 01 – Comparação entre Documentos da SEDUC-PA e PEE Escolaridade

Programa de Formação SEDUC

Nível fundamental incompleto

527

Plano Estadual de Educação 1999 - 2003 490

Nível fundamental completo

965

979

Nível médio, sem Magistério

120

120

Graduado, sem Licenciatura

487

487

Magistério, sem Licenciatura

3.000

5.390

Total de professores

5.099

7.466

Fonte: Produzidos pela autora.

Os documentos refletem um descompasso no que diz respeito ao quantitativo. A demanda apresentada ao Plano Estadual possui um quantitativo superior ao do Programa da SEDUC-PA, que já estava em execução, de acordo com cronograma físico apresentado. No Plano de Educação a diagnose da SEDUC-PA aparece “apresentando como uma das tarefas prioritárias a definição de diretrizes para a elaboração de um programa de Formação e Valorização do Magistério com metas a serem implantadas” (PARÁ, 1999, p. 18). Demonstra-se que os dois documentos estavam concatenados, porém as nuances para o desenvolvimento da formação de professores não refletiam o que estava em percurso na Secretaria e o descrito no Plano de Educação. As definições do Plano se mantiveram para a Formação com apenas 01 (uma) das 16 (dezesseis) Diretrizes Gerais, alocada no “Programa 3 – Ensino e Qualidade na Educação”, com apenas 01 (uma) das seis metas definidas e 01 (uma) das 12 “Ações Básicas” estabelecidas para o mesmo prognóstico, todas descritas a seguir:

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Objetivos: Realizar cursos de capacitação e reciclagem para os profissionais do magistério da rede estadual principalmente diretores, professores (sobretudo leigos) e secretários da escola. Metas: Capacitar 100% dos professores leigos da rede estadual, 75% dos gestores de escolas e 50% do pessoal administrativo das escolas e unidades administrativas. Ações básicas: Realização do curso de habilitação de Professores Leigos do Ensino Fundamental em Nível Médio e de Complementação de Estudos para os Professores da rede estadual. (PARÁ, 1999, p. 18; 32 e 33)

Ainda

atenta

ao

construto

político-administrativo,

discorreremos

sobre

os

Condicionantes: Desenvolvimento da Formação com os indicadores: Recursos Humanos; Polos de Formação, Infraestrutura física e Tecnológica. 2.2 - Construto Político-Administrativo: Desenvolvimento da Formação. Os registros indicam que a formação docente se estabeleceu em vários municípiospolos, com apoio de uma equipe interdisciplinar, destinada à execução dos trabalhos de realização dos cursos. No escopo do Programa apareceu descrito no item VII – Recursos Humanos, conferidos cinco espectros administrativos: Quadro 03 – RECURSOS HUMANOS PARA A FORMAÇÃO RECURSOS HUMANOS Coordenação geral

VÍNCULO CTRH

Coordenação de polo

SEDUC LOCAL

Supervisão volante

CTRH

08 Técnicos

CTRH

65 Professores

SEDUC/CTRH

AÇÕES CORRELATAS Coube à Direção geral do CTRH Responsável local pelo desenvolvimento dos cursos, dando apoio administrativo e pedagógico. Suporte técnico, administrativo e pedagógico à coordenação local. Avaliação da viabilidade de execução da formação nos polos. Atividades de Docência

Fonte: SEDUC/1998 – produzido a partir dos documentos.

O referido quadro retrata a equipe de trabalho da Secretaria, por meio do CTRH. Os dois cursos de nível superior, devido suas especificidades, não foram descritos no escopo do Programa, logo não teremos condições de descrevê-los nessa oportunidade. A coordenação geral estava sob a responsabilidade do CTRH como Centro de Treinamento, com uma ação, pedagógica e administrativa, autônoma à SEDUC, embora financeiramente respondesse diretamente à Coordenação de Recursos Humanos, a Subsecretaria de educação e a Diretoria de Ensino.

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Quadro 04 – RECURSOS HUMANOS POR CURSO

CURSOS I – Capacitação em Nivel Fundamental II – Habilitação em Nível Médio – Modalidade Normal III – Complementação Pedagógica Modalidade Normal

RECURSOS HUMANOS PREVISTOS 13 coordenações de 01 Coordenação geral polos Professores20 coordenações de 65 formadores polos 01 coordenação de 07 técnicos volantes polos

Fonte: SEDUC-PA/1998 – produzidos pela autora.

Conforme programado nos três projetos, dispunha-se de uma equipe de 34 coordenadores e a equipe do CRTH, com os técnicos volantes e Professores-formadores selecionados para a função. O intuito no primeiro curso era garantir uma formação mista, presencial e a distância e os dois sequenciais eram totalmente presenciais, por módulo. A formação demandou o deslocamento da equipe por vários polos para monitoramento e avaliação. Consta em relatório um processo seletivo curricular para professores-formadores, com os requisitos: formação, experiência e disponibilidade. A composição dos técnicos volantes foi por designação da Secretaria. Destaca-se que essas ações não foram apresentadas no escopo do documento do Programa. a) Polos de Formação: Segundo os documentos, os critérios de escolha para instituir os polos pautavam-se em infraestrutura, o número expressivo de professores-alunos em cada turma, o acesso e deslocamento para professores-cursistas e professores-formadores. Foram implantados 24 polos de formação inicialmente, contudo, contava-se com apenas dois polos contínuos, o de Marituba e Marabá. O gráfico 02 a seguir diz respeito à informação da distribuição dos cursos nos 24 (vinte e quatro) polos. Pode-se ler que o Curso II – Habilitação em Nível Médio – Modalidade Normal foi o que mais atendeu à formação. Quatro polos ofertaram somente a formação de Nivel fundamental. Sete polos garantiram a oferta, oferecendo a sequência do Ensino Fundamental e Médio e apenas Marituba e Marabá ofertaram a sequência dos três cursos. Destaque para a oferta de Marabá que apesar de ter aumentado a oferta de 15 para 18 municípios, a média de atendimento foi reduzida. A distribuição prevista das turmas em cada polo, vamos observar a seguir:

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Gráfico 02 PROVISÃO DOS CURSOS NOS POLOS Polos de Formação

24

11 7 4

curso I

2 curso II

curso I e II

curso I, II e III

total

Fonte: Elaborado pela autora A gráfico 02 demonstra a distribuição das turmas para funcionamento em 24 polos. Destes, 07 (sete) polos, com o curso II – Habilitação em Nível Médio – Modalidade Normal, atendeu professores do próprio município, dessa forma pode-se afirmar que 269 (duzentos e sessenta e nove) professores não precisaram de deslocamento, estes não se repetem. Os demais polos e cursos tiveram um fluxo de professores cursistas que dificultaram a análise, para podermos precisar quantos professores passaram pela formação e em qual curso, visto que Capanema, Cametá e Viseu demonstram uma diminuição no atendimento de um curso para o outro. Ou seja, pelas propostas do programa haveria a indução de continuidade do nível fundamental para o médio obviamente, o que caracterizaria uma continuidade da formação dos professores, porém, no relatório vimos que não aconteceu como o previsto.

b) Infraestrutura Física e Tecnológica Foi possível perceber que, para o curso I – Capacitação em Nivel Fundamental, por meio do Decreto nº 2.208, de 17 de abril de 1997, determinava-se a utilização do Centro de Estudos Supletivos. Isso significou que as atividades receberam apoio a distância, como consta em relatório. No escopo desse projeto estava descrito o “Projeto Recepção”,

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caracterizado como encontros presenciais, logo se supõe que os locais de encontros nos treze polos foram as escolas sedes estaduais de cada município. Para o curso II – Habilitação em Nível Médio – Modalidade Normal e o curso III – Complementação Pedagógica - Modalidade Normal definiu-se atividades presenciais por módulo. No que diz respeito ao item acima, verificou-se poucos registros, tanto no Programa da SEDUC-PA quanto no Plano Estadual de Educação, não se fazia referência a esses aspectos. O que se tem em documento está registrado no relatório. As escolas aparecem como locus de formação. Algumas se tornaram espaço de hospedagem e para a alimentação e para professores-formadores e alunos. As informações pertinentes à infraestrutura foram encontradas no relatório final de execução. Quando havia o convênio com a rede municipal, uma casa era designada para os professores-formadores apenas para hospedagem, vimos que a alimentação em todos os polos ocorria nas escolas. Vimos indicios de que a alimentação era confeccionada pelos agentes de cozinha da escola, assim como o apoio operacional para limpeza e manutenção do espaço. Para o construto acadêmico-pedagógico adotou-se como condicionantes préformação: a matriz curricular, o processo seletivo, o material didático e o conteúdo, o planejamento e a avaliação. Para os condicionantes de desenvolvimento adotou-se as atividades de formação, as estratégias teórico-metodológicas e os fundamentos filosóficos e epistemológicos. 3 - Construto Acadêmico-Pedagógico De acordo com as provisões do Programa era preciso adequar a formação às especificidades da clientela, e garantir a continuidade, visto que: Diante da imensa área territorial do Estado do Pará e considerando o perfil desse profissional, optou-se por desenvolver em Nível Fundamental, uma capacitação que respeitasse a individualidade e da disponibilidade deste Professor, oferecendo-lhe um ensino a distância, com momentos presenciais, que facilitarão a conciliação da sua vida profissional e pessoal, e posteriormente, a continuação de seus estudos em nível de Habilitação. (DOCUMENTO BASE, DRH/CTRH, 1998)

Um aspecto definido em documentos foi o início e finalização dos projetos, pois se pretendia habilitar todos os profissionais em questão até ao final de 2002. Com essa projeção, a SEDUC-PA estaria na década da educação com seu quadro docente em consonância com a legislação em vigor, pois estes mesmos grupos de professores seriam acolhidos nos cursos de nível superior encaminhados às Universidades. Contudo, o desafio 20


estava posto e se sabia que seria uma tarefa hercúlea, pois o processo de municipalização do ensino era apenas um dos temas subjacentes na política que demandava o redimensionamento nas ações, como foi verificado nos documentos. As três matrizes descritas a seguir foram de responsabilidade do CTRH.

a) Curso I - Capacitação para Professores Leigos em nível de Ensino Fundamental de 1ª a 8ª séries Para esse curso previa-se realizá-lo no período de 19 de outubro de 1998 a 25 de abril de 1999, de acordo com o Projeto desse curso. Efetivamente verificou-se nos documentos que foi executado de novembro de 1998 a julho de 1999, conforme relatório final. Esse primeiro curso contou com uma carga horária de 540h inicialmente, distribuído em dois módulos, presencial com 144h e a distância com 396h, porém acrescentou-se a disciplina Inglês, conforme relatório, somando 80h, totalizando um curso de 620h.

b) Curso II – Habilitação para Professores Leigos em nível do Ensino Médio – Modalidade Normal Para esse curso assumiu-se como meta habilitar 965 (novecentos e sessenta e cinco) professores leigos. Teve-se como objetivo “proporcionar aos professores a continuidade dos estudos, através da habilitação em Nível Médio – modalidade Normal, objetivando melhor desempenho no exercício da função docente”. Aqui a escolaridade era nível fundamental e ensino médio incompleto. A carga horária destinada foi de 2.720 horas (Duas mil, setecentos e vinte horas), constituídas em seis módulos intervalares. Essa matriz foi organizada e aprovada pelo Conselho Estadual de Educação, através da Resolução nº 237, de fevereiro de 1999. Primeiramente, obedeceu-se às diretrizes nacionais do Ensino Médio, conforme estabelecido pelo Conselho Nacional de Educação em Resolução nº 03/1998-CNE, para a Base Comum. Quanto à Parte Diversificada, adotou-se as disciplinas do Curso Magistério, conforme apresentado na matriz.

c) Curso III – Habilitação para Professores Leigos em nível de Complementação Pedagógica do Ensino Médio – Modalidade Normal Este projeto teve como meta habilitar 120 professores da rede estadual de ensino, que trabalhavam com o ensino fundamental, possuíam nível médio, mas não estavam aptos para o magistério. Pretendia-se oferecer complementação pedagógica com estudos para a

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área do ensino. A execução da formação de estabeleceu em três etapas, conforme matriz analisada. Para esse projeto foram criados dois polos de formação: Marabá com oferta para 44 municípios e matricularam-se 47 professores, houve três desistências neste polo, e o segundo aconteceu em Marituba, nas instalações do próprio CTRH, com oferta para 17 municípios e contou a matricula de 52 professores, com duas desistências. Verificou-se, conforme descrito no relatório, que as desistências foram devido à aposentadoria e também em decorrência de aprovação em vestibular. 4 - Processo de Composição de Turma Efetivamente não houve seleção, porém para participar dos cursos foram criados critérios e formas de ingresso aos professores-alunos. As inscrições ocorriam por meio das Unidades Regionais de Educação (URE), devendo o candidato apresentar os documentos comprobatórios: contracheque e histórico escolar. Quando aprovado, os docentes tinham a garantia de continuidade, conforme descrito no documento base: “Os professores-cursistas aprovados prosseguem seus estudos no Curso de Habilitação para Professores Leigos em nível do Ensino Médio – Modalidade Normal”. Percebeu-se que havia a indicação de exclusão dos docentes no município onde foi consagrada a municipalização do ensino fundamental. Contudo, após revisão da diagnose, percebeu-se a necessidade parcerias entre municípios e SEDUC-PA, por negociação com as próprias secretarias. (PARÁ, 1998) 5 - O Planejamento e a Avaliação O CTRH, durante o primeiro semestre de 1998, realizou a seleção dos professoresformadores e definiu os técnicos volantes, para a assessoria pedagógica e fiscalização da formação. A partir desse período, começaram a realizar reuniões de trabalho, “para esclarecimento dos objetivos a que se propunha o projeto, elaboração de planos de cursos e material didático de acordo com as disciplinas”. (PARÁ, 1998, p. 03) De acordo com o relatório final, foi realizado um encontro em Marituba, locus do CTRH, com coordenadores locais e supervisores volantes, para serem discutidas e organizadas as estratégias de implantação dos cursos. Os pontos principais de reunião foram os planos de cursos, as atribuições do Supervisor Volante e de que forma se dariam as prestações de contas dos professores-alunos, das bolsas-alimentação e reembolso de 22


passagens. Com a definição dos polos, o CTRH indicou os funcionários para visitarem antecipadamente cada local, para validarem as demandas, organizarem os locais e a infraestrutura para funcionamento das aulas. Ainda no relatório, verificou-se que as disciplinas foram agrupadas por afinidades, tanto no curso II quanto no III, a fim de possibilitar um aprendizado melhor aos professoresalunos. O trabalho dos supervisores volantes foi pouco registrado, mas se destaca que previam ações de acompanhamento do planejamento das disciplinas e aos instrutores, do aprendizado dos alunos e desempenho do apoio local. Contudo, essas referências não estavam bem definidas no escopo do programa. Houve destaque para esse profissional quanto as suas tarefas, mas não a seus instrumentos de acompanhamento e avaliação. 6- Recursos Didáticos e o Conteúdo Os registros não apresentam quais seriam os materiais e os conteúdos para serem usados pelos professores-formadores, mas deixam como indício a utilização de textos impressos, apostilas, vídeos temáticos, livros didáticos, músicas, jogos e dramatização. Quanto aos conteúdos, está subentendida a utilização de materiais já produzidos pela equipe do Centro de Estudos Supletivos, principalmente no primeiro projeto, além de livros didáticos. Essa ausência nos faz pensar que caberia ao professor formador assumir essa tarefa, de pesquisa, elaboração e manutenção dos materiais destinados aos professoresalunos. 7- Atividades-Formação: Estratégias Teórico-Metodológicas Para a operacionalização dos projetos, foi prevista a utilização de várias estratégias e metodologias. As matrizes curriculares foram elaboradas por módulos: presencial e a distância, procurando atender às especificidades dos professores-alunos. De acordo com o planejado as atividades deveriam acontecer conforme o cronograma físico a seguir. CRONOGRAMA FÍSICO Projetos Curso I Curso II Curso III

1998

1999

2000

2001

Jul 98 a abril 99 Jul 98, Jan/Fev./Jul 99, Jan/fev/Jul 00, Jan/Fev 01

2002 Curso IV e V

Jul.98, Jan./fev/Jul.99

FONTE: Documento Base - CTRH/1998.

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A metodologia de trabalho dos professores-formadores adotada, não estava descrita no documento operacionalmente. Pode-se afirmar que aconteceram atividades presenciais, com aulas expositivas, leitura e exposição textual. As atividades acadêmicas estavam previstas para os períodos de férias e de recesso escolar, exceto o curso I, com uma carga horária de 10h diárias, de aulas intensivas, conforme apresentado no programa. Foram executadas cerca de 10 (dez) etapas presenciais no primeiro curso e nos demais 13 etapas. Em relatório verificou-se o registro de texto, vídeo e dramatização, o que se supõe uma dinamicidade às atividades. No primeiro curso, os encontros foram presenciais mensais, com cinco dias de aulas consecutivas, os quais somaram 50 dias letivos de aulas, além da etapa de realização das provas. As aulas eram realizadas em 13 polos de formação, os quais atenderam a 95 municípios, para 527 vagas. Em cada polo havia um coordenador local e a coordenação geral ficava em Belém. Os professores-formadores, em número de 65 docentes, desenvolviam suas atividades, distribuídos nos polos, com acompanhamento técnico da equipe do CTRH, os quais faziam visitas de monitoramento para conversar com os professores-alunos, a fim de colher informações sobre as aulas recebidas. Ao analisar os documentos, projeto e relatório de execução, verificou-se que o curso I foi uma estratégia adotada pela secretaria para dar suporte ao professor, que por não ter completado o Ensino Fundamental em tempo hábil, precisava fazê-lo imediatamente. A saída encontrada foi aplicar-lhe a prova de avaliação do Centro de Estudos Supletivos do Departamento de Ensino Supletivo (CES/DESU), responsável pela aplicação de prova em massa no Estado, entretanto para aquele que era professor, ou seja, funcionário da rede, precisava assumir uma prova direcionada ao público alvo. Afirma-se que os módulos caracterizaram-se como reforço escolar para que o professor-aluno pudesse fazer a prova do CES/DESU, aprovar-se, e assim ter o documento do

Ensino

Fundamental.

Deduz-se

também

que

aqui

pode

estar

posto

uma

responsabilização muito maior aos professores-alunos do que por parte da secretaria, pois àqueles que não conseguiam aprovação deixavam de ser atendidos, pois não havia mais tempo para recuperação de estudos, ou mesmo se já estavam próximo da aposentadoria não havia estímulos à continuidade. Segundo o Projeto II, a matriz disciplinar deveria acolher a seis diretrizes para a formação, das quais destacamos as mais significativas para serem analisadas a posteriori, 24


mas se indica que a questão basilar estava direcionada à “articulação teoria e prática”, às “competências de diferentes naturezas” e “pensar e tomar decisões”(DOCUMENTO BASE, DRH/CTRH, 1998). Contudo, pode-se induzir que os dois últimos projetos receberam parte das orientações da Resolução 03/98, do Conselho Nacional de Educação, a qual dispõe sobre as diretrizes do ensino médio, visto que tivemos a distribuição curricular conforme as diretrizes por área de conhecimento, mas foi decidido ainda adotar na Parte Diversificada as disciplinas do Curso Magistério4 em vigor, à época. As orientações acima foram indicadas, tanto para o projeto II quanto para o projeto III, os dois mantiveram a mesma estrutura de desenvolvimento das atividades, sob a mesma dinâmica de trabalho. De acordo com o relatório de execução, “a linha metodológica adotada enfatizou a técnica do ‘aprender fazendo’, através da teorização da prática”. Essas questões pretende-se descrever e analisar no construto a seguir. 8 - Fundamentos Filosóficos e Epistemológicos Para Freitas (1999), os programas de formação de professores, nessa época, são reflexos desde o final da década de 1970, das reformas educativas levado a cabo no Brasil e na América Latina, as quais assumiram o objetivo de adequar o sistema educacional ao processo de reestruturação produtiva. Embora a autora trate de cursos de licenciatura, podemos aproximar os mesmos princípios e a assunção de diferentes propostas para a formação de professores, como é o caso desses três projetos. Não foi a intenção discutir esses fatores, mas não podemos deixar de vê-los como “elemento impulsionador e realizador dessas reformas”. Como indicador de mudança da própria escola e da sociedade. (FREITAS, 1999, p. 01), Percebeu-se, que os documentos, ora estudados, apresentam alguns desses indícios, mas que ainda carecem de aprofundamentos. Foi preciso estabelecer indexações com as informações pertinentes em cada documento, visto que as informações estão distribuídas em vários eixos. Nessa perspectiva os princípios filosóficos e epistemológicos podem-se indicar estão a) A articulação teoria e prática como eixo central da concepção de formação de professores como profissionais prático-reflexivos; A SEDUC-PA não extinguiu o curso magistério. Atualmente, mantém esse formato de formação de professores com o “Ensino Médio - Magistério Indígena”.

4

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b) Um determinado tipo de preparo profissional, que leve o professor a tomar decisões, que implicam competências de diferentes naturezas, relacionadas ao “saber”, ao “saber fazer” e ao “saber explicar o fazer”, explorando a importância de cada uma das competências e a articulação entre elas. e) O pensar e tomar decisões, que desenvolve o fazer, mas também o “saber fazer” e a compreensão do que “para que fazer”, articulando a reflexão sobre “o que” “como” e para que” ensinar, de tal forma que possa garantir aos seus alunos, o acesso e boas condições de aprendizagens. (DOCUMENTO BASE, DRH/CTRH, 1998)

Como as competências atuam como a “mediação entre o aqui e agora (local de formação) e outros espaços (a sala de aula)”, o sucesso do modelo de formação docente depende da qualidade e da coerência das situações de aprendizagem que o professor experiencia durante sua formação, pois o aprendizado gerado nesse processo, de acordo com a formação recebida, possibilitará que o futuro professor coloque em prática o que apreendeu quando atuar como docente. Registra-se que não foram delimitados os referenciais para esse fazer da relação teoria e prática, nem para o saber fazer, neste sentido, induz-se que algumas leituras são possíveis, visto que o contexto histórico buscava referenciais em Perrenoud (2001), o qual corroborava com essas políticas, pois afirmava que os saberes estão intimamente ligados a uma ação pragmática, mesmo que nas incertezas procuramos orientação para as nossas ações. Assim pode-se perceber que os discursos das alíneas acima pautaram-se por uma formação pragmática. Considerações Finais Vimos que os saberes docentes são matizados pelo professor devido à multiplicidade do próprio trabalho, por atuar em várias frentes teóricas e metodológicas, portanto, não há um saber específico, mas saberes, incluindo saber-fazer, o saber da experiência e a relação intrínseca com as teorias científicas, pode se considerar como maiores impactos à formação, a valorização do saber docente. A ação do Consórcio referenciada no documento norteador do atual Plano de Formação Docente do Estado do Pará, reafimou o esforço construído pela Secretaria de Estado de Educação (SEDUC-PA) e as Universidades, no que diz respeito à formação de professores, em vista do Consórcio, a fim de oferecerem formação aos docentes das redes de ensino. De acordo com o documento foi percebido avanços com os cursos oferecidos sob a forma de Consórcio, envolvendo várias Instituições de Ensino Superior (IES). 26


Entende-se que o estudo permitiu analisar a formação docente, a partir de seu processo de formação em serviço e que as parcerias possam ser concretizadas com vistas à melhoria da qualidade da formação e do desenvolvimento dos professores, em especial dos que atuam nos rincões do Estado do Pará, algumas vezes, completamente esquecidos por aqueles que constroem e executam políticas públicas que visam melhorar a vida dos seus habitantes. Percebeu-se que os estudos sobre os impactos da formação docente no Pará são insipientes. Não há estudos que reverberem uma avaliação longitudinal, com o objetivo de trazer à comunidade acadêmica sua relevância científica, uma vez que se precisa ampliar o universo de informações confiantes à reflexão da prática docente e da formação profissional, em prol de uma educação de qualidade humana, técnica, ética e política. Um aspecto que despertou a atenção foi que aos programas de formação de professores em serviço, há insuficiência de investimentos em pesquisas, principalmente na região norte. Não foram reconhecidos, no programa do Consórcio SEDUC/UEPA, recursos destinados à pesquisa, vimos ações pontuais de “avaliação” em processo, mas não com foco em produção de trabalho científico e de avaliação com o intuito de reestruturar o trabalho docente, entre outras questões.

Para isso, é preciso que haja uma discussão política global, que contemple desde a formação inicial e continuada, até as condições de trabalho, salário, carreira e organização da categoria, estudo de egresso, a formação do formador, para que a educação seja concebida como prática social em um processo lógico de emancipação. Com essa maturidade, considera-se plausível que a formação de professores, como agentes sociais responsáveis, ocorra num processo formativo, orgânico e unitário e que se desenvolva na perspectiva de uma educação crítica e emancipadora. Propõem-se, portanto, indicadores de qualidade para o acompanhamento e avaliação, com alguns princípios: a) construção e domínio sólido dos saberes da docência (saberes disciplinares e curriculares, saberes da formação pedagógica, saberes da experiência profissional e saberes da cultura e do mundo vivido na prática social); e b) unicidade entre teoria e prática.

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REFERÊNCIAS CAMARGO, Arlete Maria Monte de. Tendências e dilemas nas políticas públicas de formação de professores para as séries iniciais: o caso do Pará. 2004. 291f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Educação, Belo Horizonte, MG, 2004 FREITAS. H. C. L. de. A (Nova) Política de Formação de Professores: A Prioridade Postergada. Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p. 1203-1230, out. 2007 Disponível em http://www.cedes.unicamp.br/ acessado em 12 de outubro de 2014 GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. LE GOFF, Jacques. História e memória. Tradução Bernardo Leitão [et al.] -- Campinas, SP Editora da UNICAMP, 1992. MAUÉS, O. C. Reformas internacionais da educação e formação de professores Cadernos de Pesquisa, nº.118. 2003 MENEZES, E. T. de. e SANTOS, T. H. dos. ."Professores leigos" (verbete). Dicionário Interativo da Educação Brasileira - EducaBrasil. São Paulo: Midiamix Editora, 2002, http://www.educabrasil.com.br/eb/dic/dicionario.asp?id=92, visitado em 4/11/2014. MELLO, C. A. B. de. Curso de Direito Administrativo. Ed. Malheiros Editores, São Paulo 2000 IN: FAZOLI, C. E. de Freitas. Princípios Administrativos. Revista UNIARA, 2007 PARÁ. Auditoria Operacional Piloto: Capacitação e Habilitação de Professores Leigos. Processo nº 2008/52253-8. Tribunal de Contas do Estado do Pará. Outubro/2008. PARÁ, Documento Base “Programa de Capacitação e Habilitação para Professores Leigos”. Departamento de Recursos Humanos/Centro de Treinamento de Recursos Humanos, Marituba-Pará, 1998. PARÁ, Lei N° 7.442, de 2 de Julho de 2010/ Disponivel em www.seduc.pa.gov.br PARÁ, Plano Estadual de Educação 1999-2003, Belém 1999. PARÁ, Relatório de Execução. Departamento de Recursos Humanos/Centro de Treinamento de Recursos Humanos, Marituba-Pará S/D. PARÁ, IOEPA 3792, Resolução 001/2014, SEDUC, o Centro de Formação de Profissionais da Educação Básica do Estado do Pará - CEFOR-PA, responsável pela formação inicial e continuada dos docentes em exercício da função e da formação continuada dos demais trabalhadores da rede pública de ensino do Pará. www.ioepa.gov.br Acessado em 03/12/2015. PERRENOUD, P. Ensinar: agir na urgência. Tradução Claudia Schilling. Porto Alegre Artmed. Editora, 2001; _______________. A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: profissionalização e razão pedagógica. Porto Alegre Artmed. Editora, 2002. 28


INTRODUÇÃO AO SCRATCH 1.4 PARA PROFESSORES Adriana da Conceição Barros do Rosário1 RESUMO O artigo apresenta o relato de experiência de uma oficina de introdução a linguagem de programação scratch 1.4 realizada com professores da educação básica que teve o objetivo de introduzir conceitos da linguagem de programação scratch, apresentar o seu potencial para a criação de objetos de aprendizagem e validar as metodologias que foram propostas. Esta oficina é parte do produto educacional que está sendo concebido e que será resultado de uma pesquisa de mestrado. Os professores participantes da oficina realizaram todas as atividades que envolveram o uso da metodologia de rotação por estações, computação desplugada, programação e resolução de desafios, as atividades foram realizadas em equipe. Por meio da observação participante e de uma matriz de avaliação da oficina aplicada aos professores percebemos que os objetivos traçados foram alcançados e que as atividades que envolvem o processo criativo necessitam de um maior período de tempo para aprimoramento e conclusão das atividades. Em virtude de algumas perguntas sobre sequências de programações que surgiram ao longo da oficina poderíamos criar mini lições em scracth em formato de vídeo aula para contribuir com a aprendizagem da linguagem de programação, inclusive a distância e assim enriquecer o produto final desta pesquisa. PALAVRAS-CHAVE: Scratch. Objetos de aprendizagem. Ensino. Educação Básica. INTRODUÇÃO Este relato de experiência apresenta o resultado da oficina “Introdução ao Scratch 1.4 para professores”, que teve o objetivo de introduzir conceitos da linguagem de programação scratch, apresentar seu potencial para a criação de objetos de aprendizagem (OA) aos professores e validar as metodologias que foram propostas. Esta oficina é parte do produto educacional que está sendo concebido e que será resultado da pesquisa “A Linguagem de Programação Scratch para criar objetos de aprendizagem com alunos de graduação do curso de Pedagogia: uma estratégia de ensino”, desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-graduação Criatividade e Inovação em Metodologias do Ensino Superior (PPGCIMES) da Universidade Federal do Pará (UFPA), orientada pelo Prof. Dr. Márcio Lima do Nascimento. Mestranda em Ensino do Programa de Pós-Graduação Criatividade e Inovação em Metodologias de Ensino Superior (PPGCIMES) da Universidade Federal do Pará (UFPA) e professora na Secretaria Municipal de Educação de Bragança (SEMED) e técnica em educação na Secretaria Estadual de Educação do Pará (SEDUC) no município de Bragança. E-mail: adriana.silvabarros@yahoo.com.br. 1

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As mudanças ocorridas em nossa sociedade principalmente com relação ao uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) tem gerado novas formas de aprender. As crianças já nascem sendo fotografadas ou filmadas por câmeras digitais, tablets e celulares. De forma que, estes artefatos e muitos outros como computadores, notebooks, impressoras, smarts tvs e variados softwares de entretenimento fazem parte do cotidiano dessas crianças muito antes delas adentrarem no mundo escolar, e assim, influenciam e modificam o processo de aprendizagem. Desse modo, estes artefatos podem ser usados como estratégias de ensino para ampliar as possibilidades de aprendizagem dos alunos, e nesse contexto, as tecnologias podem ser facilitadoras no ensino. De acordo com Valente (1993, p. 3), “a implantação da informática na educação consiste basicamente de quatro ingredientes: o computador, o software educativo, o professor capacitado para usar o computador como ferramenta educacional e o aluno. O computador foi inserido na escola a partir de programas oriundo do Ministério de Educação (MEC), inicialmente por meio de uma abordagem instrucionista que ocorre quando o computador assume o papel de máquina de ensinar informatizando processos tradicionais de transmissão de conhecimento. O computador na abordagem instrucionista foi o ponto de partida para novas reflexões, novas possibilidades. A partir do seu uso como ferramenta educacional o aluno interage com o computador e passa a criar imagens, textos, apresentações, músicas, animações, entre outros, ou seja, o aluno cria comandos e o computador executa, propiciando a construção do conhecimento. Este modo de uso do computador ficou conhecido como abordagem construcionista apresentada por Papert (1988). O software educativo tem importante papel no processo de construção de conhecimento, e quando permite criar, produzir, programar, construir “coisas”, ele pode ser usado na abordagem construcionista. A linguagem de programação scratch é baseada em blocos que se encaixam, empregados pelo usuário para expressar as suas ideias. Essa linguagem foi criada em 2007 pelo grupo de pesquisa Lifelong Kindergarten do MIT Media Lab do Massachusetts Institute of Technology (MIT), liderado pelo professor PhD Michel Resnick. É voltada para a produção de projetos, envolvendo histórias animadas, jogos, situações problemas, desafios, tutoriais e o que a imaginação permitir. O scratch foi concebido com o objetivo desenvolver a

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criatividade e o raciocínio lógico, além do censo coletivo, o gosto pelo estudo de matemática e facilitar o ensino de programação. O processo de criação dos projetos é apresentado por meio de quatro elementos fundamentais que Resnick (2014) denominou de “4 Ps da aprendizagem criativa”: •

Projetos: as pessoas trabalham ativamente quando estão envolvidas em projetos significativos;

Parcerias: atividades colaborativas e compartilhamento de ideias impulsionam a aprendizagem que ocorre naturalmente;

Paixão: quando pessoas trabalham em projetos significativos investem mais tempo, persistem nos desafios e aprendem mais neste processo;

Pensar brincando: a aprendizagem deve envolver experiências divertidas, como: testar coisas novas, assumir riscos e repetir tarefas até alcançar os objetivos. Os 4 Ps da aprendizagem criativa estão alinhados a abordagem construcionista, pois

“enfatiza o valor da criação de projetos que sejam significativos para os alunos, de maneira divertida e em colaboração com os colegas” (RESNICK, 2014, p. 2), ao interagir com o objeto computador por meio da linguagem scratch. Os 4 Ps da aprendizagem criativa orientam a construção dos projetos no scratch, de acordo com a imagem abaixo:

Imagem I: Os 4 Ps da Aprendizagem Criativa Fonte: Resnick (2014)

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Ao criar projetos, as pessoas se envolvem na espiral da aprendizagem criativa quando imaginam o que querem fazer, criam um projeto baseado em suas ideias, brincam com seu projeto, compartilham com seus pares e refletem sobre a sua criação e seu processo de construção, levando em consideração o que pode ser aprimorado, imaginado e criado novamente. Assim, nesse processo, as pessoas desenvolvem o pensamento criativo. Os projetos compartilhados podem ser o ponto de partida para novas ideias e novos projetos. Resnick (2014) chama esta ação de pegar a programação de um projeto e adaptar, retirando ou acrescentando blocos de comandos de programação para dar origem a novos projetos de remixagem ou remixar projetos. Conforme Lima e Santos (2014, p. 313), o scratch “é muito mais acessível do que outras linguagens de programação, isso acontece pela utilização de uma interface gráfica que permite que cada projeto seja montado como blocos de montar, lembrando o Lego”. Zopo (2017) afirma que o scratch: É acessível a um público inexperiente em linguagens de programação, e erros de sintaxe são difíceis de acontecer, pois é mais intuitivo, uma vez que a comunicação entre quem está programando e o computador se dá por meio de soltar e arrastar os blocos com encaixe das peças. Caso as peças não se fixem é sinal de que a programação não está adequada. (ZOPPO, 2017, p. 67)

Ainda, segundo Lima e Santos (2014), o scratch é uma linguagem de programação de fácil uso o que pode favorecer a elaboração dos projetos, mesmo que o usuário não seja um especialista na área. Este foi o primeiro motivo para a escolha do scratch, pois o público da oficina são professores da educação básica e provavelmente não tiveram ensino de programação em sua formação inicial. A linguagem de programação scratch pode ser manuseada diretamente no site https://scratch.mit.edu/ ou pode ser feito o download do executável para ser instalado no computador e, usado no modo off-line, o que elimina a dificuldade de aplicação se houver ausência de internet. Este foi o segundo motivo para a escolha do desta linguagem. De forma que, a interface gráfica que facilita a interação com o programa e a possibilidade de seu uso sem internet, foram motivações para a escolha desta linguagem para desenvolver a oficina.

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Imagem II: Interface gráfica do Scratch Fonte: https://scratch.mit.edu/

O trabalho desenvolvido com a linguagem de programação scratch está de acordo com as seguintes competências gerais da Base Nacional Comum Curricular (BNCC/2018): comunicação, pensamento científico, crítico e criativo e cultura digital. O quadro abaixo apresenta as competências gerais desenvolvidas por meio do uso do scratch. COMPETÊNCIAS GERAIS DA BNCC/2018 Comunicação

Pensamento científico, crítico e criativo

Cultura digital

A competência comunicação envolve o uso das diferentes linguagens: verbal, corporal, sonora e digital. Ao criar projetos no scratch a linguagem verbal é utilizada por meio da fala dos personagens, a linguagem visual é acionada por meio das cores dos blocos de comando que indicam as diferentes funções dos objetos programados, a linguagem sonora é utilizada para emitir sons que indicam onomatopeias no diálogo dos personagens, sons característicos de jogos conferindo emoção as ações pospostas no jogo e a linguagem digital é experimentada, pois por meio do uso da linguagem de programação scratch para a criação de variados projetos.

Ao criar projetos no scratch o pensamento científico, crítico e criativo é desenvolvido por meio da exploração de ideias ao combinar, testar e executar blocos de comandos para programar ações no objeto que está sendo programado, avaliar as programações criadas para atingir as metas propostas e alcançadas, desenvolver o raciocínio lógico por meio da sequência de passos planejado. Criar variáveis, avaliar e testar possíveis falhas nos projetos. Expressar o pensamento criativo por meio dos projetos criados no scratch.

Ao criar projetos no scratch a competência cultura digital é desenvolvida por meio criação de produtos multimídias, tais como: histórias animadas, jogos, tutorias, desafios que podem ser utilizados para ensino de conteúdos curriculares, programação ou para entretenimento. Utilização de linguagem de programação, compreensão e escrita de algoritmos, utilizar passos básicos de algoritmos para resolver questões. Além, de fomentar o protagonismo do indivíduo que deixa ser apenas um consumidor, mas um produtor de cultura digital.

Quadro 1: Competências gerais da BNCC/2018 Fonte: Adaptado da BNCC (2018)

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Para que tais competências sejam desenvolvidas por meio desta linguagem de programação é necessário que o quarto ingrediente (o professor), que torna possível o uso da informática na educação, seja formado para o uso desta. Este é o primeiro, que deve experimentar por meio desta oficina e das atividades proposta, o desenvolvimento das competências. Pois o professor que desenvolver habilidades para o uso da linguagem de programação scratch estará apto para a construção de jogos, animações, simuladores e consequentemente para o ensino de programação. Os projetos realizados no scratch podem adquirir o caráter educacional, quando são criados para o ensino de conteúdos curriculares, assumindo a função de objetos de aprendizagem. De acordo com Beahr (2009, p. 65), objeto de aprendizagem é “qualquer material digital, como por exemplo, texto, animações, vídeos, imagens, aplicações, páginas na web, de forma isolada ou em combinação com fins educacionais”. Conforme Beck (2001, p.1), objeto de aprendizagem é “qualquer recurso digital que possa ser reutilizado para o suporte ao ensino”. E Tarouco (2003), define objeto de aprendizagem como: Qualquer recurso, suplementar ao processo de aprendizagem, que pode ser reusado para apoiar a aprendizagem. O termo objeto educacional (learning objects) geralmente aplica-se a materiais educacionais projetados e construídos em pequenos conjuntos com vistas a maximizar as situações de aprendizagem onde o recurso pode ser reutilizado. A ideia básica é a de que os objetos sejam como blocos com os quais será construído o contexto de aprendizagem. (TAROUCO, 2003, p. 2).

Nas definições acima, o potencial de ensino é destacado pelos autores, deixando claro o principal uso dos objetos de aprendizagem. Para aplicar um OA com eficácia, o professor deve escolher um tipo que seja adequado aos objetivos de aprendizagem e ao conteúdo que se pretende ensinar, assim, facilitará a aprendizagem do conteúdo selecionado. O jogo digital quando é concebido para ensinar conteúdos curriculares, similarmente, pode assumir a função de objetos de aprendizagem. Para Souza (2010, p.19), “um aspecto importante que tem sido abordado no âmbito das tecnologias educacionais é a utilização de jogos educativos como objetos de aprendizagem”. Além disso, “os jogos proporcionam desafios e ambientes visualmente atrativos, com a utilização de sons e imagens que motivam e estimulam o interesse, a atenção, a concentração e a memória do usuário”

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(BALBINO et al, 2009, p. 2). De forma que, o jogo educativo digital igualmente pode ser aplicado como recurso pedagógico na perspectiva de objetos de aprendizagem. Neste contexto a introdução dos conceitos da linguagem de programação scratch aos professores, é imprescindível para aprender programar, verificar o seu potencial para a criação de objetos de aprendizagem e validar as metodologias que foram propostas. A oficina “Introdução ao Scratch 1.4 para professores” A ambientação da linguagem de programação scratch, a função das categorias e dos blocos de comando foram apresentadas aos professores por meio da metodologia Rotação por Estações. Silva et al (2016), denominam Rotação por Estações como uma: Proposta metodológica na qual há disposição de diferentes atividades em estações (mesas ou bancadas) de forma simultânea, sendo que cada uma aborda um tema distinto, porém correlacionado com os demais, de forma que não sejam interdependentes, não havendo assim uma sequência obrigatória à realização. (SILVA et al, 2016, p. 3)

Inspirado no método postulado por Silva et al (2016), propomos a atividade 1 da oficina, por meio da construção de quatro estações. Ao chegar, os professores escolheram as estações e naturalmente as equipes foram sendo formadas em torno das estações. Organizados em equipes nas estações, os professores conheceram as categorias e os blocos de comando da linguagem de programação scratch por meio da computação desplugada, que consiste em ensinar os fundamentos da computação, por meio de atividades, sem o uso do computador (Bell et al, 2011). As equipes passaram por todas as estações para montar as programações com blocos, que foram impressos coloridos em papel de gramatura 180, para destacar as cores das categorias e dos blocos de comando que estavam embaralhados na mesa. Os professores foram incentivados a observar as diferentes programações nas estações. O trabalho foi realizado de acordo com os cards de programações. Na estação 1, os professores experimentaram a escolha de um cenário e dois objetos para programar a mudança de traje, e se tocar na borda da área de trabalho, retornar e fazer isso usando a condicional “sempre”. Os dois objetos apresentavam a mesma programação.

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Imagem III: Estação 1 - Programação dos objetos gato e morcego Fonte: Autora (Abril, 2019)

Na estação 2, os professores experimentaram a escolha de um cenário e um objeto. Programaram as setas do teclado para movimentar o objeto nas direções para cima, para baixo, para a direita e para a esquerda, conforme a programação abaixo.

Imagem IV: Estação 2 - Programação das setas do teclado Fonte: Autora (Abril, 2019)

Na estação 3, os professores experimentaram a edição de um cenário utilizando o editor de pintura do scratch, e escolheram um objeto para programar a mudança de cor, inserção de som e utilizar a condição sempre para os eventos se repetirem na programação.

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Imagem V: Estação 3 - Programação do objeto borboleta Fonte: Autora (Abril, 2019)

Na estação 4, os professores escolheram um palco e um objeto para programar. Experimentaram a categoria sensor por meio do bloco “pergunte e espere” que permite o objeto fazer perguntas e esperar a resposta, o restante da programação utilizam categorias e blocos de comando utilizado nas estações anteriores.

Imagem VI: Estação 4 - Programação do objeto gato Fonte: Autora (Abril, 2019)

O objetivo desta atividade foi ambientar os professores na linguagem de programação scratch sem o uso do computador a assim, facilitar a aprendizagem da linguagem ao usar o computador.

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Nesta atividade os professores tiveram o primeiro contato com os blocos de programação por meio da computação desplugada. Guiados pelas cores dos blocos, conseguiram montar as programações sem muitas dificuldades e a cada estação instigávamos sobre o que eles identificavam de diferente nas programações e quais movimentos eles imaginavam que aconteceria com os objetos a partir da leitura indicativa de cada bloco. Os professores falaram sobre os diferentes blocos, apontaram as direções do movimento dos objetos e o que eles achavam que ia acontecer quando estivessem programando no computador. Na atividade 2 iniciamos o processo de instalação da linguagem de programação scratch nos computadores dos professores. Optamos em levar o executável do programa para evitar problemas com a ausência de internet no momento da oficina, e com auxílio de um data show, instalamos o executável em uma máquina para que os professores pudessem observar o processo e experimentarem o processo de instalação em seus computadores. Em seguida, pedimos que criassem pastas na área de trabalho para armazenar os projetos que seriam criados ao longo da oficina. A maioria dos professores conseguiram realizar a instalação sem maiores dificuldades e orientamos aqueles que não conseguiram realizar a instalação sozinhos. Ainda organizados em equipe nas estações, iniciamos a atividade 3 que consistia em criar as programações no computador de acordo com os cards de programação visto na atividade 1. Desta vez, eram os cards que se movimentavam nas estações e conforme as equipes iam concluindo as programações, os cards eram repassados para as próximas estações e assim, seguindo esta sequência de atividades, os professores construíram as quatro programações propostas nos cards. Ao executar as programações os professores percebiam os movimentos, sons, fala dos personagens e condicionais que foram programados por eles. Neste momento, os professores foram incentivados para remixar os projetos. Remixar projetos significa olhar para os blocos de programação e combinar com outros blocos para inserir novos movimentos, nova aparência, fala e som ao objeto programado. O momento de remixagem de projetos foi um dos processos mais ricos da oficina, pois os professores experimentaram na prática os primeiros conceitos de programação e passaram a inserir os blocos de comando nos projetos já construídos criando novas sequências de programação para dar novos movimentos, sons, aparência, fala aos objetos programados. 38


Ao olhar para as programações que utilizavam os sensores de pergunta e resposta, movimento das setas do teclado e condicionais, os instigamos em falar se ao utilizarem aquelas determinadas sequências de programação que tipo objetos de aprendizagem poderiam criar. Neste momento, emergiram várias ideias sobre vários conteúdos e os professores perceberam que é possível programar objetos de aprendizagem por meio da linguagem de programação scratch mesmo sem serem especialistas na área.

Imagem VII: Atividade 3 - Programações no computador com os cards de programação Fonte: Autora (Abril, 2019)

A última atividade consistiu em um desafio aos professores que deveria ser solucionado em equipe. Apresentamos a execução de um objeto de aprendizagem aos professores, refletimos sobre as etapas do OA que envolvia conteúdo do componente curricular matemática e pedimos que eles, com base nas sequências de comando apresentadas ao longo da oficina, falassem quais categorias e blocos de comandos eles imaginavam que foram utilizados na construção do objeto de aprendizagem apresentado. Conforme os professores iam falando sobre quais blocos eram necessários para construção do objeto de aprendizagem, íamos escrevendo no quadro a programação e refletindo sobre a sequência apresentada por eles. Então, liberamos um tempo para que eles trabalhassem em equipe e criassem as programações. Passamos nas estações para tirar as dúvidas que iam surgindo, incentivamos a execução dos programas criado pelos professores para que eles mesmo percebessem como seus projetos estavam ficando. No final da atividade os professores apresentaram suas programações. Percebemos que para esta atividade é necessário mais tempo, pois mais tempo é primordial para o aprimoramento das programações. Para concluir passamos aos professores uma matriz de avaliação dos pontos da oficina, como tempo em cada atividade, eficácia da sequência das atividades e metodologia 39


aplicada. Os pontos foram avaliados por meio de conceitos que vão do regular ao excelente, e também tinha um espaço para que os professores escrevessem sugestões para aprimorar as atividades. Nenhum dos itens foram avaliado com Regular, a maioria dos itens foram avaliados com Bom e Excelente e as sugestões foram com relação ao tempo destinado as atividades nas estações, em especial a última atividade. CONSIDERAÇÕES FINAIS As atividades apresentadas na oficina “Introdução ao Scratch 1.4 para professores” foram concebidas de modo a alcançar os objetivos da oficina. Por meio de observação participante e matriz de avaliação aplicada aos professores, percebemos que as metodologias que envolveram a rotação por estações e a computação desplugada possibilitaram a aprendizagem dos conteúdos. A remixagem dos projetos proposto nas atividades incentivou a criatividade e o protagonismo dos professores no processo de construção das programações e para este tipo de atividade é necessário um tempo maior nas estações. Em alguns momentos os professores perguntaram como criar determinados movimentos ou ações nos objetos, esta busca nos motivou a desenvolver minilições em formato de videoaula que serão criadas, aplicadas e validadas na próxima oficina, pois pensamos que as minilições podem contribuir com o processo de construção de novos projetos apoiando a aprendizagem, inclusive a distância. As ideias de objetos de aprendizagem apresentados pelos professores a partir das sequências de programações, nos fizeram perceber que os professores conseguiram compreender o potencial da linguagem de programação scratch para a criação de objetos de aprendizagem. Pensamos que da forma como as atividades foram planejadas e executadas na oficina, os objetivos traçados foram alcançados e os professores conheceram os conceitos iniciais da linguagem de programação scratch, compreenderam o seu potencial para a criação de objetos de aprendizagem e as metodologias utilizadas contribuíram para o alcance desses objetivos, mas que necessita de alguns ajustes com relação ao tempo nas estações e nas atividades que envolvem a criatividade.

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A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO ENSINO DE BIOLOGIA: A IMPORTÂNCIA DESTA NA DESCONSTRUÇÃO DE PADRÕES FÍSICOS ACEITOS SOCIALMENTE

Ainá Cunha Romeiro1, Valdenice Barros da Silva Moscoso2, Ivoneide Maria da Silva3

RESUMO O artigo faz referência à importância da escola como um dos espaços principais na formação de valores e discussão de questões sociais importantes para os seres humanos, sendo a continuidade da formação conferida pela família e demais entidades sociais. Nesse sentido, focaliza-se no papel social da educação de modo que seja viabilizada a discussão de questões sociais que envolvem o corpo humano, caracterizadas pelo preconceito e pela discriminação no dia a dia de maneira a instigar os alunos a produzirem um olhar que vá além dos conteúdos vistos em sala promovendo um ensino conectado aos contextos escolares e sociais, buscando-se conciliar os temas de complexidade social. Palavras-Chave: Papel social da escola. Formação do professor. Preconceitos. INTRODUÇÃO As funções sociais da escola se transformam ao longo do tempo de acordo com a realidade sócio-histórica (Gomes, 2014). Na atualidade, processos de urbanização levaram a modificações em importantes espaços de interação social, tais como a família e a vizinhança, tornando a escola um dos principais espaços na formação de valores e na discussão de questões sociais e educacionais, sendo a continuidade da formação conferida pela família e demais entidades sociais (Alves, 2001). Destacando a forte influência da escola na vida social, Bueno (2001) a considera um “espaço social privilegiado de convivência e um ponto de referência fundamental para a constituição das identidades dos alunos”. Compreende-se que o Estado Democrático de Direito da República Federativa do Brasil pauta-se, por meio das leis nacionais e dos Tratados Internacionais dos quais é signatário, nos Direitos Humanos, tendência mundial após o predomínio de conquistas,

1 Graduanda de Ciências Biológicas no Instituto de Ciências Biológicas (ICB), Universidade Federal do Pará (UFPA), Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID). ainaromeiro97@gmail.com 2

Professora da Secretaria de Educação do Estado do Pará, Supervisora do PIBID no ICB, UFPA.v.moscoso27@gmail.com 3 Professora Pesquisadora e Coordenadora do PIBID/Biologia no ICB, UFPA.

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expansão, domínio, escravização e indignidade das pessoas que estavam em lados opostos aos que detinham o poder (BRASIL, 2009). Por conseguinte, é preciso visualizar tais Direitos como frutos do avanço social mundial para que a pessoa passe a ter a maior proteção. No entanto, o poder de influência midiática, através dos meios de comunicação, difunde a construção de estereótipos, ou seja, padrões de aceitação e moldes para os seres humanos, sendo as temáticas acerca do corpo humano vivenciadas de forma completamente oposta à democratização e criando a indústria da beleza, fortemente difundida pelos meios de comunicação, bem como a vinculação de aspectos físicos com virtudes e capacidades pessoais (SILVA, 2014). Tais fatores têm levado a dilaceração da autoestima de crianças e jovens que moldam seus corpos e, consequentemente, a atitudes e pensamentos, abdicando de suas essências individuais para adequarem-se socialmente e acabam, com isso, perpetuando preconceitos e inconformidades com a forma física, fator que gera uma auto rejeição altamente prejudicial. Nesse sentido, este estudo foca no papel social da educação, em consonância com os Direitos Humanos, de modo que seja viabilizada de maneira a esclarecer questões sociais que envolvem o corpo humano, caracterizadas pelo preconceito e pela discriminação no dia a dia, de maneira a instigar os alunos a produzirem um olhar que vá além dos conteúdos vistos em sala de aula, capacitando-os a associar seus conhecimentos de forma interdisciplinar e promovendo um ensino conectado aos contextos escolares e sociais. Neste contexto buscou-se, conciliar os temas de complexidade social relacionados à obesidade e uso de piercings com o ensino do tecido conjuntivo adiposo e cartilaginoso. Destaca-se também que o preconceito e a ausência de informações é o principal fator gerador das rejeições sociais, pois a visão dos cidadãos ainda é tradicional e temerosa com relação à diversidade atual e a crescente inclusão e valorização dos Direitos Humanos em forma de respeito para todos. Sendo, em virtude disso, completamente necessário tratar de temáticas que fazem parte da realidade social, sendo o âmbito de conhecimentos biológicos, considerado um meio propício de ensinar aos alunos o respeito e a inclusão, na compreensão de que o conhecimento liberta de taxativos e danosos padrões. Portanto, as instituições sociais precisam coexistir em harmonia de modo que haja prevalência do respeito às diferenças. O devido esclarecimento sobre estas diferenças representa a maneira mais propícia de transmitir conhecimento e eliminar intolerâncias.

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O Papel Social da Educação A educação é um processo contínuo que possibilita ao indivíduo, sua formação integral, com o propósito de prepará-lo, de forma consciente e crítica, para intervir na sociedade. Nesse sentido, ao longo da Educação Básica, as aprendizagens essenciais definidas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) devem concorrer para assegurar aos estudantes o desenvolvimento de dez competências gerais, que consubstanciam, no âmbito pedagógico, os direitos de aprendizagem e desenvolvimento. Na BNCC, competência é definida como a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho. Ao definir essas competências, a BNCC reconhece que a “educação deve afirmar valores e estimular ações que contribuam para a transformação da sociedade, tornando-a mais humana, socialmente justa e, também, voltada para a preservação da natureza” (BRASIL, 2013), mostrando-se também alinhada à Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). Conforme o pensamento pedagógico autônomo de Paulo Freire: Você, eu, um sem-número de educadores sabemos todos que a educação não é a chave das transformações do mundo, mas sabemos também que as mudanças do mundo são um quefazer educativo em si mesmas. Sabemos que a educação não pode tudo, mas pode alguma coisa. Sua força reside exatamente na sua fraqueza. Cabe a nós pôr sua força a serviço de nossos sonhos. (1991, p. 126)

Nesse cerne, a temática do papel social da educação se consolida entre os pensadores e profissionais educacionais sendo considerada, expressamente, o melhor método atual de propiciar a qualidade educacional ao país, em consonância com a formação de cidadãos e seres pensantes capazes de atuar socialmente e transformar a realidade em que vivem. Constitucionalmente, esta previsão encontra-se expressamente no artigo 205 que prevê: A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação no trabalho (BRASIL, 1988).

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Isso representa combater estereótipos e reiteradas exclusões, somando esforços à estrutura social no fortalecimento de um estado democrático de direito, no qual todos possam ser titulares de direitos e deveres para a cidadania e o efetivo desenvolvimento da qualidade de vida e do bem estar geral das comunidades, propiciando a efetivação do princípio constitucional máximo da dignidade da pessoa humana. De tal maneira, a escola em todos os níveis e modalidades da Educação Básica (infantil, fundamental e médio) possui como papel o cumprimento de sua função social mais profunda e urgente de formar cidadãos e espaços de cidadania preparando para a vida social, sendo este objetivo representado pela construção de um ambiente favorável para a ampla participação acompanhado do repasse e do incentivo a conhecimentos, condutas, valores e vivências que desenvolvam sua formação humana e social gerando um estudante solidário, crítico, com compreensão social, ético e participativo.

A Formação do Professor Vislumbrando essa educação que forma para a cidadania é fundamental compreender a formação do professor. Nas contribuições de Santos (2014), a formação do professor aponta para práticas e saberes que não correspondem com o seu cotidiano, com a realidade de sua escola e a real possibilidade de execução do que foi abordado. Nos estudos do autor foram observadas dificuldades de contextualização com o cotidiano, principalmente de formações voltadas para Educação infantil. Deve-se compreender o “aprender a ser professor” como um processo a longo prazo, construído por meio de experiências diárias, pois, no fazer docente, é possível aprender a lidar com as diversidades encontradas na sala de aula, como destaca Nóvoa: A formação não se constrói por acumulação de (cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir a pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência (1997, p.25).

Neste seguimento, as análises de Tardif (2002) esclarecem que o professor não pode ser somente alguém que aplica conhecimentos produzidos, determinados por mecanismos sociais. Contrário a isso, o professor é um ator social, assume sua prática a partir de observações e reflexões, a fim de reestruturá-la. 46


Nesta perspectiva, é necessário que o ensino vise uma aprendizagem de caráter inovador, contextualizado, questionador, crítico, ético, reflexivo, aplicável interdisciplinar e integrado à comunidade e à escola (BIZZO, 2007). Para este ensino os alunos devem se confrontar com experimentos de caráter investigativo e diante de fenômenos de estudo, expor suas próprias concepções. É fundamental que o aluno consiga propor uma explicação e confrontá-la com o conhecimento científico estabelecido, gerando um conflito cognitivo, um dos motivos da evolução conceitual (LEPIENSK; PINHO, 2011). A pesquisa assessora a atividade profissional quando assumida de forma crítica e reflexiva, com a finalidade de proporcionar orientações metodológicas na construção de novos saberes e autonomia para lidar com questões variadas, assim como combate os preconceitos ao abrir espaço para o conhecimento, ampliando perspectivas tanto do profissional quanto de seus discentes. Para isso, no exercício da docência e na construção da identidade docente, são necessárias situações que estimulem a reflexão e a construção do conhecimento. Assim, Freire (2011) ressalta que ensinar exige do professor pesquisa e atitudes críticas sobre sua pratica. A Insustentável Leveza do Ensino de Biologia Considerando a BNCC, a configuração do currículo escolar dos ensinos fundamental e médio deve ser objeto de intensos debates, para que a escola possa desempenhar seu papel na formação de cidadãos. Como parte desse processo, o conhecimento biológico deve contribuir para que cada indivíduo seja capaz de usar o que aprendeu em situações individuais e coletivas. Diante desse contexto, é incontestável a importância do ensino da Biologia nas séries básicas de ensino, visto que esta abrange o funcionamento dos organismos vivos desde a escala molecular e celular até níveis populacionais. Desta forma, é válido buscar compreender a formação corpórea de cada ser, e como ela varia de acordo com fatores genéticos, ambientais, hormonais e emocionais. No aspecto genético, o psicólogo norte-americano Willian Sheldon (1898-1977), dedicou sua vida a estudar os tipos físicos humanos e os classificou em três tipos:

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(a) o Ectomorfo é naturalmente magro, com baixo percentual de gordura, tem dificuldade em ganho de peso, em massa muscular ou gordura, possui uma estrutura óssea estreita, ombros curtos, cintura fina e uma caixa torácica estreita; (b) o Mesomorfo apresenta facilidade no ganho e perda de peso, quer seja massa muscular ou gordura,possui estrutura óssea ideal, tem os ombros largos e a cintura estreita, além de uma caixa torácica larga e (c) o Endomorfo possui muita facilidade em ganhar peso, é naturalmente pesado, tem os ombros largos, caixa torácica e cintura largas. Apesar de ganhar peso com muita facilidade, normalmente o peso que ganha é mais gordura do que músculo, tendo sempre dificuldade para perdê-lo, principalmente para perder gordura. A influência ambiental na formação corpórea advém das interações do indivíduo com o meio ao qual está inserido, e como estas interações influenciam em seu modo de vida, não esquecendo também de aspectos climáticos que podem alterar a fisiologia corporal (BRASIL, 2008). Os impactos hormonais e emocionais na formação corpórea podem ser bastante pronunciados durante a pré-adolescência e adolescência (BRASIL, 2008). A produção hormonal é exacerbada neste período, o que, além de interferir na altura do indivíduo, proporciona o desenvolvimento das características sexuais secundárias, em ambos os sexos. Fatores emocionais podem estar relacionados a casos de transtornos alimentares, associados ou não a desordens neurológicas, podendo também interferir na produção de hormônios, como o cortisol (conhecido como hormônio do estresse), que atua na retenção de líquidos no corpo. A noção de tais conhecimentos pelos estudantes é de extrema valia, pois levanta questões de cunho social, sobre suas aparências físicas e alterações sofridas pelos seus corpos, sendo algumas dela ainda hoje vistas na sociedade de forma precipitada e gerando situações preconceituosas. A AÇÃO As atividades propostas neste estudo foram elaboradas e discutidas junto ao grupo PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência) de biologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFPA (Universidade Federal do Pará), envolvendo bolsistas do

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PIBID, professoras supervisoras e a coordenadora do Laboratório de Pesquisa e Ensino em Biologia (LAPENBIO). O programa PIBID oportuniza uma articulação entre a universidade e as escolas, permitindo a troca e o compartilhamento de ações, estimulando o envolvimento dos graduandos em licenciatura no exercício da prática docente, contribuindo para a excelência na formação de professores para o ensino de Ciências e Biologia. Foi elaborada uma aula de biologia, para os alunos do 3º ano do Ensino Médio da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio “Lauro Sodré”, sobre histologia humana, especificamente acerca do Tecido Conjuntivo Adiposo e Tecido Cartilaginoso. Buscando estreitar a relação entre estes conteúdos e a vivência do aluno, de modo a torná-la mais interessante, optou-se por dar uma abordagem social ao tema. Foi focado todo o conteúdo biológico, porém utilizando uma abordagem de cunho social. Desta forma, tornou-se essencial o uso de recursos áudio-visuais, como vídeos voltados para questões de alta e complexa relevância a cada um destes temas. No caso do Tecido Adiposo, foram realizados apontamentos sobre obesidade e as perspectivas sociais e culturais que tangem tal problema, sobretudo durante a adolescência. Há uma face, questões que permeiam a saúde, por outra face, questões que implicam na percepção de tais jovens acerca de sua imagem física. Sobre o Tecido Cartilaginoso, tratouse do uso de piercings, um tema de alta relevância quando se trata de um público-alvo composto por jovens. Pilares estéticos que são passíveis ao aparecimento de enfermidades como o surgimento de quelóides ou infecções devido às más condições de implantação. Os temas levaram a discussões e suscitaram questionamentos por parte dos estudantes que permitiram a inserção do conteúdo teórico de forma mais participativa. A atividade foi ministrada em duas turmas, totalizando 80 alunos. Krasilchik (2004) infere que a Biologia pode ser uma das disciplinas mais relevantes e merecedoras da atenção dos alunos, ou uma das mais insignificantes, dependendo do que for ensinado e a forma como isso for feito. A autora chama a atenção dos professores de Biologia para as questões: o que ensinar e como ensinar? Ela destaca que o professor deve atentar para o significado da Ciência e da Tecnologia, evitando posturas alienantes. Mais uma vez faz-se imprescindível o fomento do ensino da biologia, como entendimento de caráter biológico, social e psicológico aos jovens, visto que tal faixa etária compreende indivíduos de constantes variações emocionais e psicológicas, e, portanto, estão mais suscetíveis a situações complexas. Neste cerne, afirma Freire:

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Faz parte igualmente do pensar certo a rejeição mais decidida a qualquer forma de discriminação. A prática preconceituosa de raça, de classe, de gênero ofende a substantividade do ser humano e nega radicalmente a democracia (2011, p. 37).

O jovem enfrenta duas situações básicas em relação à autoimagem: a imagem de seu corpo perante si mesmo e perante os outros, o que influencia em seus hábitos de saúde. O professor deve atuar de forma a ajudar os jovens no entendimento de que nesta faixa etária os corpos passam por mudanças, e cada pessoa possui um biotipo diferente, e que a busca pela imagem estereotipada promovida pela mídia nem sempre lhe trará benefícios. Tais significados de estereótipos também precisam ser aprendidos, pois estes possuem caracteres positivos e negativos. Trata-se de um conjunto de características pessoais, traços de personalidade ou comportamentos de um grupo de indivíduos, que são partilhadas por um grupo social ou cultural. O professor pode e deve ser atuante no processo de desconstrução destes conceitos absorvidos no contexto cultural/social, e sobre a percepção de seus alunos sobre suas próprias imagens. Vygotsky (2001, p. 46), não a define como algo imóvel, no qual o indivíduo apenas é condicionado à encaixar-se nos padrões pré instaurados, mas sim como um meio de trocas e ressignificados, recriações. Portanto, a vida social permeia um processo dinâmico. Por conseguinte neste contexto de constantes trocas, a criança inicia sua formação, primeiramente junto à sua família, e posteriormente inserida no âmbito escolar, trazendo consigo vivências de seus primeiros anos de convívio. Nesta etapa, tanto na família quanto na escola, a criança fará aquisições elementares que a permearão durante toda a sua vida. Considerações Finais Por ser considerada como a base para o desenvolvimento da nação e da sociedade brasileira, a democratização da escola é um desafio que promove a reestruturação educacional para a cidadania e a qualidade do ensino devendo ser adotada com afinco, através do comprometimento e competência pelo Estado, por todos os profissionais da área educacional e, sobretudo, pelos professores. A educação em seu mais amplo aspecto tratase de uma via de mão-dupla, onde os profissionais da área e seus alunos permeiam constantes e inúmeras trocas de ensino-aprendizagem, e o papel do educador faz-se imprescindível em instigar seus aprendizes à curiosidade, à sede de conhecimento, do

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aprender não somente por aprender, mas sim pela alta relevância de seu significado e das contribuições trazidas à formação cognitiva do ser, como aponta Freire: Antes de qualquer tentativa de discussão de técnicas, de materiais, de métodos para uma aula dinâmica assim, é preciso, indispensável mesmo, que o professor se ache “repousado” no saber de que a pedra fundamental é a curiosidade do ser humano. É ela que me faz perguntar, conhecer, atuar, mais perguntar, re-conhecer. (2007, p. 86)

Destarte, em meio a tanta complexidade que modela e firma a gama educacional, é possível se afirmar sua notória e imprescindível importância, onde a instituição de ensino não trabalha sozinha, mas em conjunto com toda a esfera ao qual o indivíduo está inserido, de acordo com Leontiev: Cada indivíduo aprende a ser um homem. O que a natureza lhe dá quando nasce não lhe basta para viver em sociedade. É ainda preciso adquirir o que foi alcançado no decurso do desenvolvimento histórico da sociedade humana. (1978, p.267).

Na atualidade, vivemos em uma sociedade em que os alunos têm acesso a muita informação, porém não estão conseguindo filtrar o que realmente será útil para a sua vida. Partindo dessa conclusão, cabe ao professor das diferentes disciplinas, em especial de Ciências e Biologia, que tratam dos fenômenos da vida, tornar essa aprendizagem de fato significativa. O conhecimento precisa ter validade e sentido na vida dos alunos, pois somente assim será possível entender o processamento das teorias e a forma como a Ciência, em especial a Biologia, se manifesta na vida de cada indivíduo. Entretanto para que isso realmente aconteça é fundamental que ao preparar suas aulas os docentes se fundamentem na teoria da aprendizagem significativa (TAS), a fim de que o aprendiz seja capaz de dar significados às informações obtidas e consiga utilizar seu conhecimento em diferentes contextos. Nesse sentido, é importante refletir sobre o papel do professor enquanto agente socializador do conhecimento e da escola enquanto instituição marcada por interesses sociais e educacionais para estimular a atividade educativa a fim de se obter uma população consciente e crítica diante das escolhas e decisões a serem tomadas. Somente assim teremos o tão sonhado “protagonismo juvenil”, objetivo principal da BNCC.

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REFERÊNCIAS

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TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. VYGOTSKY, L.S. et al. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 2001.

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INTENCIONALIDADES E CAMINHOS NA INICIAÇÃO CIENTÍFICA: PRÁTICA PEDAGÓGICA DA ESCOLA ESTADUAL PROF. DEUZUITA PEREIRA DE QUEIROZ Josidalva de Almeida Batista1 Maria da Conceição Ribeiro Troitinho2 Aerton Francisco Lima3 RESUMO Este artigo discute intencionalidades e caminhos na iniciação científica percorridos pelos discentes, docentes e equipe técnica da Escola Estadual Prof. Deuzuita Pereira de Queiroz, localizada em Redenção-PA. As propostas de trabalho descritas compõem um grupo de atividades desenvolvidas visando oportunizar aos discentes o fortalecimento da autonomia, bem como o prazer em investigar fenômenos ou objetos a partir da pesquisa, garantindo assim que esses atuem de forma mais ativa em sua aprendizagem, deixando de agir como meros repetidores de conhecimentos já existentes. A fundamentação teórica da prática pedagógica se baseia nos pressupostos teóricos de Ausubel, Freire, Chassot e Martins. Dentre as ações desenvolvidas, registra-se: formação de alunos e professores, planejamento e execução de feira de ciências, desenvolvimento e apresentação de projetos de iniciação científica, participação em feiras regionais e premiação de alunos. Os resultados encontrados indicam um caminho promissor na construção de novos saberes e no fortalecimento do protagonismo juvenil a partir de um trabalho multidisciplinar. Também se ressalta que os avanços nessa trajetória podem vir a incentivar outras unidades de ensino a priorizar a iniciação científica no âmbito escolar e consequentemente o pensamento científico, crítico e criativo. Palavras-chave: Iniciação Científica. Construção de saberes. Protagonismo juvenil. Introdução O presente trabalho tem como objetivo descrever um relato de experiências vivenciado na Escola Estadual de Ensino Médio Professora Deuzuita Pereira de Queiroz, localizada na cidade de Redenção no Sudeste paraense, a qual surgiu a partir de inquietações da Equipe Pedagógica e dos docentes diante de certa apatia dos discente frente as práticas pedagógicas desenvolvidas. Ademais nas feiras cientificas escolares reproduziam-se trabalhos desconectados da realidade que não favorecia o fortalecimento do pensamento crítico, não proporcionavam reflexão sobre a produção do trabalho científico, bem como não traziam nenhum benefício significativo a comunidade local. Técnica em Educação vinculada a SEDUC/PA. Especialista em Educação em Ciências e Matemática pela UFPA. Aluna do Programa de Mestrado em Educação em Ciências e Matemática da UNIFESSPA. josidalvaalmeida@yahoo.com.br

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Técnica em Educação vinculada a SEDUC/PA. Especialista em Gestão Escolar pela UFPA. Aluna Especial do Programa de Mestrado em Educação em Ciências e Matemática da UNIFESSPA.mcrtroitinho@hotmail.com 2

Professor Vinculado a SEDUC/PA. Licenciado em Química e Especialista em Educação em Ciências e Matemática pela UFPA.

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Diante dessa realidade buscou-se motivar os discentes através de palestras, orientações em grupos e individuas sobre as etapas de construção do trabalho científico, o que ascendeu o desejo de buscar algo novo que trouxesse benefícios a si próprio e a comunidade escolar. A partir daí surgiram várias ideias apontadas pelos educandos, formaram-se os grupos de trabalho, e iniciaram as pesquisas sobre temas de interesses dos alunos. A cada etapa do trabalho, as dúvidas eram orientadas pela a equipe técnica e pelos professores regentes. As pesquisas foram realizadas ao longo do bimestre e após testada e aprovadas, foram demonstradas a comunidade através de exposições dos experimentos em uma feira de ciências na Escola. Assim, percebe-se a necessidade de repensar a educação paraense e refletir sobre as práticas desenvolvidas. Nesse contexto, faz-se necessário e relevante o debate sobre ações pedagógicas que garantam aprendizagem significativa aos adolescentes e jovens matriculados no Ensino Médio em nosso Estado. Conforme Chassot (2016), os educadores têm a responsabilidade de atuar de forma que os discentes se transformem em homens e mulheres mais críticos, agentes de transformações do mundo em que vivemos. Nessa dinâmica, observa-se que a globalização e os avanços tecnológicos, têm proporcionados a expansão e a facilidade de acesso ao conhecimento às mais diversas classes sociais e aqueles que estão em lugares mais longínquos, causando assim, uma ligeira variação na forma de aprender e ensinar, consequentes da complexidade informações disponíveis. Nesse contexto atual, a globalização configura-se como uma rede complexa de processos afetando diversas nuances da vida do indivíduo, tais como: a cultura, educação, comportamento, saúde, etc. (GIDDENS, 2000). Um desses processos é a democratização do conhecimento que está em constante falseamento de hipóteses, para parafrasear Karl Popper, garantindo a constante evolução do conhecimento e emancipação do indivíduo (FREIRE, 1999, SANTOS; MENESES, 2010). Dessa forma, a escola, compreendida como um espaço genuíno de produção do conhecimento, não pode executar suas ações de forma mecânica, sem considerar o potencial intelectual de cada educando, as necessidades locais e seu compromisso social. Acredita-se que uma das principais barreiras para a efetivação de uma prática significativa que promova a construção de novos saberes, é a ausência de incentivos ao educando para explorar todas as possibilidades intelectuais, além de fortalecer o sentimento de responsabilidade social a partir de suas descobertas. Para isso, a prática docente, deve promover momentos em que os discentes possam verificar as necessidades da sociedade 55


local e o quê estes podem criar para suprir tais necessidades. Além de promover esses espaços, os educandos devem ser orientados sobre as técnicas e normas de produção do conhecimento científico. Nessa perspectiva, a E.E.E.M. Professora Deuzuita Pereira de Queiroz vem desenvolvendo nos últimos anos atividades específicas de incentivo à iniciação científica, priorizando a construção de novos saberes e estimulando a sistematização de conhecimentos produzidos. Logo, esse trabalho justifica-se pela análise dos resultados apresentados nas Feiras de Ciências ou Mostras Científicas na unidade escolar dos últimos cinco anos, sendo verificado que as propostas desenvolvidas contemplavam de forma minoritária a produção e construção de novos saberes. Assim, o foco principal dos trabalhos expostos era a transmissão de conhecimentos e informações já produzidos. Além disso, registrou-se uma baixa sistematização dos trabalhos e das novas pesquisas produzidas na comunidade local. Dessa forma, percebeu-se como urgente a abertura de espaço produção e divulgação de novos conhecimentos neste espaço educativo. Reflexão teórica sobre a pesquisa na aprendizagem significativa. A criança, naturalmente é um ser curioso. Porém, na medida em que o indivíduo cresce, seja pela ausência de auxílio para encontrar respostas às suas indagações, ou pela gama de conteúdos programáticos a ser cumprido em cada ano/série estudado, ou ainda, em consequência da submissão a metodologias tradicionais, seu potencial investigativo tende a ser reduzido. [...] os indivíduos vão crescendo, deixam de fazer perguntas por medo de serem ridicularizados e, com isso, passam a ser menos curiosos. Aprender a pensar, então, teria a ver com “dar asas à imaginação”, “não impor limites ao pensamento”, “pensar qualquer coisa, por mais absurda que ela possa parecer”, pois, “como você já sabe, pensar sem bloqueios é muito importante para ser um cientista” (AZEVEDO, 2013, p. 5).

As práticas educacionais tradicionais tendem a moldar os aprendentes engessando assim, sua capacidade investigativa, na medida em que compreende o professor como detentor do conhecimento e o aluno como mero receptor. Nesse sentido, tendências pedagógicas discutem a necessidade de superar tal posicionamento, especialmente no cenário atual, onde discentes precisam atuar como participativos e críticos ante as novas tecnologias de informação e comunicação. 56


Portanto, é nosso entendimento que o conceito de gestão da aprendizagem traga o aprendente para o centro da cena da educação a partir do princípio de que o sujeito faz parte do mundo, desde o início da sua existência. Porém, o mundo não faz parte do sujeito sem que ele o perceba. Por meio da aprendência o mundo passa a fazer parte do sujeito. A existência do mundo não depende da existência do sujeito, mas a existência de cada coisa ou fenômeno do mundo para o sujeito depende de alguma aprendência. (MARTINS, 2017, p.91).

Deste modo, aprender no contexto atual é mais do que reproduzir informações, é construir saberes numa relação dialógica com o mundo, dando sentido e significado a existência das práticas desenvolvidas. A aprendizagem nessa proposta pedagógica visa estimular a iniciação científica, a comprovação dos saberes empíricos e a construção de conhecimentos baseados na pesquisa e não na reprodução. Essa compreensão incitou no âmbito escolar a análise de ações pedagógicas desenvolvidas. Destacou-se como prática estimulante da construção de conhecimentos, a realização de trabalhos para apresentação na Feira de Ciências. Pois, compreende-se que não há construção de novos saberes sem aquisição de conhecimentos teóricos e experiências empíricas que proporcionem aos educados seu protagonismo estudantil. [...] não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade (FREIRE, 1999, p. 32).

Ausubel (2002) e Freire (1999) são aportes teóricos desse artigo por acreditarem que a aprendizagem significativa permitirá a construção de novos saberes tendo como base a ampliação das ideias e dos conhecimentos já existentes. O conceito de aprendizagem significativa, centrada na perspectiva construtivista, implica, necessariamente, o trabalho simbólico de ‘significar’ a parcela da realidade que se conhece. As aprendizagens que os alunos realizam na escola serão significativas à medida que conseguirem estabelecer relações substantivas e nãoarbitrárias entre os conteúdos escolares e os conhecimentos previamente construídos por eles, num processo de articulação de novos significados (MEC/SEF, 1997, p. 38).

Segundo Ministério da Educação – MEC (2006), as Feiras de Ciências são eventos sociais, científicos e culturais em que os discentes apresentam seus projetos e ao mesmo tempo dialogam com a comunidade, trocam experiências, oportunizando discussão sobre saberes e métodos realizados. Nesse mesmo sentido, a partir desse trabalho, houve 57


também o estímulo a docentes que já desenvolvem pesquisas em salas de aulas, auxiliandoos no registro dessas produções a partir da sistematização do saber produzido. A nossa cultura é muito oral. Falamos muito e escrevemos pouco e incentivamos menos ainda nossos alunos a escrever. Entendo que à escola cabe ser, além de espaço de fala, um espaço de produção escrita, pois é isso que consolida o processo argumentativo. Se os alunos conseguem colocar adequadamente no papel as suas ideias com clareza e empregando razoavelmente os códigos da língua materna é porque essas ideias estão claras para eles. (MORAES, 2004, p. 46).

A escola, uma instituição social, tem como papel principal formar cidadãos atuantes, críticos e aptos a perceberem o mundo sentirem-se parte desse mundo e a partir desse sentimento de pertença, deve estimular os discentes a agirem de maneira a transformar a si mesmo e o outro. A linguagem escrita é fundamental para que as crianças, adolescentes e jovens possam colocar suas ideias no papel e a partir desses registros fortalecer a prática da cultura escrita no âmbito social. Dentre tantas possibilidades, destaca-se que a pesquisa teórica e prática se bem conduzidas oportunizam aos aprendentes a prática da escrita e a sistematização do conhecimento produzido. Investigando e construindo novos saberes: metodologia na prática diária A E.E.E.M. Professora Deuzuita Pereira de Queiroz encontra-se localizada na Rua 34, setor Oeste, na cidade de Redenção-PA, próxima a Avenida Santa Tereza, uma das principais avenidas da cidade. Atualmente atende aproximadamente 1.500 alunos nos turnos: matutino, vespertino e noturno. Figura 1- Fachada da Escola Deuzuita

Fonte: Arquivo da Escola

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Inicialmente, na análise dessa ação pedagógica optou-se por relacionar seus resultados com os objetivos da unidade escolar delineados no Projeto Político Pedagógico. Conforme o Projeto Político Pedagógico da Escola Estadual de Ensino Médio Professora Deuzuita Pereira de Queiroz: a escola mantém relação estreita e dialógica com a sociedade. Desse modo, a formação dos educandos contempla a preparação para compreender e intervir em sua comunidade. Então, a aprendizagem deve partir de problemas reais. E, sobretudo, responder aos desafios da sociedade na busca da transformação. Entende-se ainda que os educandos constituam uma população diversificada, o que estimula a necessidade de atentar-se às diferentes percepções e vivências do mundo, do conhecimento e das relações sociais. (P.P.P. ESCOLA DEUZUITA PEREIRA DE QUEIROZ, 2017, p. 11 e 12).

Anualmente a escola desenvolve a Feira de Ciências com apresentações e exposições de trabalhos científicos e culturais à comunidade. Entretanto, a avaliação das práticas realizadas tem conduzido à comunidade escolar a desenvolver ações pedagógicas que primem pela iniciação científica e a sistematização dos conhecimentos produzidos. Logo, a intencionalidade dessa proposta esteve nas discussões do início do ano letivo e em outros encontros pedagógicos. As reuniões e encontros da comunidade escolar direcionavam as intencionalidades da inserção da pesquisa no fazer pedagógico, bem como do estímulo a aprender a aprender, especialmente a partir das experiências prévias do alunado. Nesse sentido, docentes e equipe pedagógica planejaram em 2017 a proposta pedagógica da Feira de Ciências, com o tema: Ideias que geram conhecimento para um futuro melhor. Além de estimular a apresentação de práticas que podem melhorar o futuro, incentivou-se a iniciação científica ao propor a exposição de pesquisas e produções originais à comunidade. Inicialmente, realizaram-se nos três turnos a formação e a orientação sobre a proposta através de seminários e discussões sobre a importância do protagonismo juvenil na aprendizagem. Cada turma deveria iniciar sua proposta a partir de debates sobre percepções e indagações dos problemas da comunidade para pesquisar e construir soluções criativas e contextualizadas a sua realidade social. Assim, os temas e títulos dos trabalhos foram estabelecidos tendo como referência a contextualização e as potencialidades de iniciação científica. Em muitos casos testaramse os conhecimentos populares dentro de métodos científicos. Em outros grupos, optou-se por construir aplicativos e soluções tecnológicas que facilitassem a vida diária e solucionasse as problemáticas encontradas. 59


Para direcionar o trabalho, foi proposto o preenchimento do Plano de Pesquisa. Esse documento indicava elementos norteadores do trabalho a ser realizado: título, problematização, hipótese, objetivo, metodologia e bibliografia. Além disso, estimulou-se a utilização do “Diário de Bordo” pelos grupos de trabalho. Esse instrumento permite os registros – escrito e fotográfico – das pesquisas, dos encontros e dos debates de cada turma facilitando a avaliação da prática desenvolvida. Mantendo a perspectiva da sistematização do saber produzido, as turmas deveriam apresentar na data da exposição o relatório final do trabalho realizado. Nesse documento deveriam ser encontradas informações sobre a trajetória da pesquisa se houve ou não flexibilidade ao plano proposto, bem como as considerações do grupo sobre a temática estudada. Desde as reuniões iniciais até a entrega das propostas de trabalho verificou-se o anseio dos discentes em produzir, em conhecer, em saber mais sobre as mais diferentes temáticas. Os trabalhos desenvolvidos contemplaram diversas propostas: criação de aplicativos, estudos para implantação de uma praça sustentável, pesquisas sobre a construção de geradores alternativos de energia, estímulo à atividade física, reutilização da água em horta orgânica, reutilização de materiais, cuidado com o meio ambiente, entre outros. De forma que foram apresentados 38 experiências nas diferentes áreas do conhecimento. Todas desenvolvidas a partir da identificação da problemática, levantamento bibliográfico, coleta e interpretação de dados, sistematização dos resultados em registros escritos e exposição oral sobre as etapas da pesquisa e o produto final. Cada turma apresentou um trabalho. Dentre esses, destacamos a seguir três projetos. Projeto “Power Bike”, orientado pelo professor P14, surgiu da necessidade de produzir uma energia sustentável pelos praticantes de ciclismo. Os discentes estudaram possibilidades para gerar energia elétrica a partir da rotação da roda da bicicleta. Os educando realizaram pesquisas bibliográficas e entrevistaram pessoas da comunidade e professores na busca de conhecimentos específicos para desenvolver sua proposta científica. Já o Projeto “Movimento é Vida”, focado nos conhecimentos explorados na disciplina de Educação Física buscou alternativas para iniciação esportivas em comunidades de baixa Conforme orientação da revista, os professores foram identificados por referência, preservando seu nome e sua identificação.

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renda. Os alunos realizaram pesquisas de campo por meio de entrevistas com pais de crianças carentes. Posteriormente, os alunos analisaram materiais alternativos para a prática esportiva na comunidade visitada. Assim, orientados pelo professor P2 confeccionaram bolas, redes e cordas elásticas a partir de materiais de baixo custo. Outro destaque foi o Projeto “Soluções Sustentáveis” para o ambiente escolar, onde foram observados problemas na Unidade de Ensino, tais como resíduos produzidos e desperdício diário de água expelida pelos climatizadores de ar das salas de aula. Essa pesquisa iniciou a partir de questionamentos sobre os procedimentos adotados e buscando alternativas tendo como foco o estímulo a adoção de condutas ecologicamente corretas nesse espaço educacional. Esse trabalho foi orientado pela Professora P3. Os alunos apresentaram uma proposta de construção de uma horta orgânica na própria escola a partir da reutilização da água expelida pelas centrais de ar e pelo reuso de garrafas de plástico que eram descartadas. No período que antecedeu a feira percebeu-se certa ansiedade por parte da maioria dos educandos no sentido de buscar informações sobre como realizar suas pesquisas, como diferenciar um conhecimento científico do conhecimento do senso comum, o quê seria um plano de pesquisa, um diário de bordo, como abordar o assunto pesquisado, entre outros. A cada etapa da pesquisa ficava evidente a construção da autonomia, o prazer pela investigação, dentre outras iniciativas inovadoras por parte dos membros de cada grupo. Sobre o trabalho desenvolvido, registram-se trechos dos depoimentos presentes nos documentos apresentados por alunos e professores: “Identificamos ainda a relevância em investir na execução de ações e projetos de conscientização da comunidade escolar, principalmente dos alunos, no sentido de mudança de hábitos, incentivando o zelo para com o patrimônio escolar, e na compreensão de que a escola é um bem de todos e que deve ser cuidada por todos.”. (Trecho extraído de Relatório Final do 3º ano C Vespertino constando nos arquivos da Feira de Ciências da Escola Deuzuita Pereira de Queiroz, 2017).

Outro relatório final de pesquisa destaca que o aprender se torna mais eficaz quando o discente é protagonista da busca pelo conhecimento. “Esse projeto (a proposta dos discentes) poderá diminuir os gastos de água, e assim, gerar uma boa economia. A turma teve um grande aprendizado com o projeto, levando assim, para a sua vida, colocando em prática não só na escola, mas em casa.”. (Trecho extraído de Relatório Final do 2º ano C Matutino constando nos arquivos da Feira de Ciências da Escola Deuzuita Pereira de Queiroz, 2017).

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Além disso, o projeto desenvolvido pela turma do 1° ano A vespertino, que fizeram pesquisa sobre geração de energia, cujo relato abaixo reforça a importância da autonomia na produção do conhecimento. “Pela euforia da turma em realizar o projeto, conclui-se que os objetivos foram atingidos, já a partir da execução, uma vez que os alunos foram instigados, durante o processo a buscarem conhecimentos na área de produção e distribuição de energia. Além disso, realizaram uma experiência direta com raios expandidos em gás argônio. O que resultou em acúmulo de conhecimentos que pode servir de base para futuros projetos, na área de energia. (Trecho extraído de Relatório Final do 1º ano A Vespertino constando nos arquivos da Feira de Ciências da Escola Deuzuita Pereira de Queiroz, 2017).

Nesse contexto, registra-se o envolvimento de professores de diferentes áreas no trabalho de pesquisa, na orientação aos discentes, já que a proposta da Feira de Ciências contemplou a participação direta de todas as áreas de ensino do Ensino Médio da Escola. Este trabalho proporcionou as ações pedagógicas a ultrapassarem os muros escolares. Em todas as pesquisas foram evidenciadas o envolvimento da comunidade externa à escola, desde os debates iniciais sobre a pesquisas ao patrocínio e a presença maciça na apresentação final do trabalho. Esse envolvimento é perceptível na análise dos Diários de Bordo produzidos, onde encontramos imagens, entrevistas e registros de pesquisa em diferentes locais de estudo e investigação. O trabalho não se limitou ao ambiente escolar e o espaço da sala de aula. Os alunos que visitaram fazendas, lixões, depósitos em busca de material para estudo e realização de seus trabalhos. Além disso, algumas turmas aplicaram questionários a grupos específicos e tais colaboradores retornaram a unidade escolar para compreensão e análise dos resultados da pesquisa realizada. Essa estreita ligação de pesquisa dos alunos com a comunidade permitiu a produção de saberes com conexões e aplicações em seu cotidiano, tal como indica os depoimentos citados acima. De acordo com Pozo (1997), o conceito de aprendizagem significativa evidencia-se quando um novo dado passa a ser incorporado à estrutura cognitiva do aluno. Ou seja, a nova informação, a nova descoberta encontra relação com o conhecimento que o discente já possui e assim passa a integrá-la. Dessa forma, o saber construído passa a ter significado e pode ser acessado pelo aluno em sua prática cotidiana na medida em que resolve problemas de seu entorno. Ou ainda, na medida em que usa esse conhecimento como base para aprender cada vez mais. Assim, refletindo sobre as impressões iniciais dessa prática, pudemos vivenciar no ambiente escolar a proposta de aprendizagem significativa ao estimular a construção de saberes a 62


partir de temas relevantes ao cotidiano do educando. E, assim, envolver e instigar discentes nas busca de novos conhecimentos e soluções para um futuro mais digno e justo. Ainda como resultado dessa ação, outras atividades semelhantes foram desenvolvidas no ano de 2018 que instigaram a iniciação científica e a produção de novos saberes. Essas novas propostas bem como as pesquisas realizadas em 2017 foram submetidas à Mostra Científica do Sul e Sudeste do Pará – MOCISSPA, evento realizado em Marabá pela Universidade do Sul e Sudeste do Pará – UNIFESSPA. Em dupla de apresentadores orais, a escola concorreu em quatro categorias distintas, a saber: Ciências Exatas, Linguagem, Engenharias e Ciências Humanas. Sendo premiados nas quatro categorias, três primeiros e um segundo lugar, além de duas bolsas de iniciação científica do Capes. Destacando-se como projeto premiado evidencia-se o projeto Microscópio Caseiro, desenvolvido por discentes do 3º ano do Ensino Médio, orientados pelo professor P4. Nessa proposta foi desenvolvido um modelo de microscópio a baixo custo possibilitando sua utilização nas escolas públicas que normalmente não dispõem de tal instrumento nas aulas de Biologia. Tal ferramenta poderia permitir uma associação mais eficaz da teoria com a prática e consequentemente uma aprendizagem mais significativa aos discentes. Em 2019, as atividades não se encerraram, continuam ainda mais fortes com o incentivo recebido. A divulgação das premiações, bem como o apoio a pesquisa motivaram demais discentes a engajarem nessa proposta e buscar novos caminhos para uma aprendizagem mais autônoma e significativa. Considerações Finais Ao analisar os caminhos percorridos no incentivo a iniciação científica, percebeu-se que os resultados constituíram uma oportunidade ímpar no estímulo, na construção de saberes e no estreitamento do conhecimento produzido na escola com sua aplicabilidade na sociedade. A análise dos relatos de experiências, das etapas dos trabalhos e tecendo uma breve comparação dos trabalhos apresentados nesse ano com práticas desenvolvidas nos anos anteriores são perceptíveis avanços no que tange a proximidade das propostas desenvolvidas com as necessidades da realidade vivenciada pelos discentes. Os trabalhos apresentados refletiram o exercício dos educandos na pesquisa sistematizada sobre o objeto a ser investigado. Desse modo, reforça-se o objetivo da 63


Unidade Escolar em estimular a autonomia, o protagonismo estudantil e a busca por novos conhecimentos, a partir de uma aprendizagem significativa. Acredita-se que a execução de ações pedagógicas semelhantes a essas devem acontecer frequentemente, pois envolvimento dos discentes, a produção de conhecimentos nas descobertas realizadas, a participação da comunidade dentre outros aspectos apresentados indicam que se está no caminho certo. Sabe-se que ainda tem-se muito a fazer para que os índices de desenvolvimento educacional sejam considerados satisfatórios, por isso essa investigação não se encerra neste ponto. Pelo contrário, ficam registradas considerações parciais e os avanços desta trajetória como incentivo aqueles que anseiam em participar desse estudo e desejam priorizar a iniciação científica no Ensino Médio no Estado do Pará.

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REFERÊNCIAS AUSUBEL, David. Adquisicion y Retención congnitiva. Paidós: Barcelona, 2002.

del

Conocimento:

Una

perspectiva

AZEVEDO, Celicina Borges. Metodologia científica ao alcance de todos. 3. ed. Barueri: Manole, 2013. CHASSOT, Ático. Alfabetização científica. Ijuí: Unijuí, 2017. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.

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necessários

à

prática

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 11ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999. GIDDENS, Anthony. O mundo na era Barata. Lisboa: Editora Presença, 2000.

da

globalização.

Tradução

de

Saul

MARTINS, José Lauro. Enquanto uns ensinam, outros navegam. Porto Alegre: Editora Fi, 2017. MEC/SEF. Parâmetros curriculares nacionais: curriculares nacionais (Vol. 1). Brasília, 1997.

Introdução

aos

parâmetros

MEC/SEB. Programa Nacional de Apoio às Feiras de Ciências da Educação Básica: Fenaceb. Brasília, 2006. MORAES, Roque; LIMA, Valderez. Pesquisa em sala de aula: tendências para a educação em novos tempos. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004. POZO, Juan Ignacio. Teorías cognitivas del aprendizaje. Espanha: Morata, 1997. PPP, Projeto Político Pedagógico da Escola Estadual de Ensino Professora Deuzuita Pereira de Queiroz, Redenção-PA, 50 páginas, 2017.

Médio

PRIMEIRA SÉRIE A, Vespertino. Relatório Final: Geração de energia. Redenção-PA, 2017. SANTOS, Boaventura de Souza & MENESES, Paula. Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010.

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TEXTO E DISCURSO NO ENSINO E APRENDIZAGEM DE LÍNGUA INGLESA

RESUMO

Lívina Martins Boothão1 Silvia Helena Benchimol Barros2

O ensino - aprendizagem de língua inglesa nos dias atuais exige do professor, cada vez mais, uma postura prática e reflexiva sobre o contexto educacional e a compreensão do aprendiz como agente crítico, participativo e controlador de seu processo de aprendizagem. Com esta convicção o presente artigo objetiva refletir sobre a importância do texto e do discurso no ensino da língua estrangeira, considerando sua dinamicidade e seu potencial enriquecedor na construção e desenvolvimento de habilidades e competências linguísticas e considera o gênero textual como instrumento de conscientização e autonomização. A pesquisa qualitativa aqui desenvolvida, dá-se por meio de estudo bibliográfico e exploratório (GIL, 2008) e utiliza preceitos teóricos de autores de relevância nos estudos da linguagem, nomeadamente, Bakhtin (1997, 2016), Saussure (1972), Marcushi (2005), Halliday (2004), Fairclough (1992, 2016), que servem de suporte para o desenvolvimento de práticas educativas no ensino de línguas estrangeiras. Tais pressupostos corroboram o acompanhamento da dinâmica da realidade contemporânea e possibilitam o uso dos recursos textuais e tecnológicos que atualmente são disponibilizados por diversas vias para o pleno desenvolvimento do ensino e aprendizagem. Os resultados deste estudo traduzem-se em considerações aprofundadas com base em fundamentos teóricos assentados na prática docente. Palavras-chave: Professor reflexivo. Aluno crítico. Recursos. Contexto social. Sala de aula. Introdução Conscientes de que todo o trabalho em sala de aula deve ter efetiva significação para o aluno (AUSUBEL, 1963, 2000) e que este aspecto é relevante aos professores em suas práticas de ensino, desenvolvemos este artigo com o objetivo de refletir sobre a importância do texto e do discurso no ensino da língua estrangeira, considerando sua dinamicidade e impacto sobre as práticas sociais e desta forma reafirmando seu potencial enriquecedor na construção e desenvolvimento de habilidades e competências linguísticas. O estudo tem ainda como propósito, considerar o gênero textual como instrumento de conscientização e autonomização do aprendiz a medida em que o insere efetivamente em seu contexto cultural. Trabalhar com textos e discurso na sala de aula significa potencializar o docente, por meio de valiosas ferramentas, para o desenvolvimento das habilidades dos alunos na língua estrangeira, pois ambos – texto e discurso – permitem 1 1

Especialista em Língua Inglesa e Literatura - Faculdade Brasil Amazônia - Professora de língua Inglesa efetiva da Rede Estadual de Ensino do Estado do Pará. E-mail: liv.martins@hotmail.com Doutora em Tradução e Terminologia – UNL/UA Portugal; Professora efetiva da Universidade Federal do Pará – FALE/Bragança; áreas de pesquisa e atuação: Tradução; Terminologia e Linguística Aplicada. Vinculada ao PARFOR LI e LP desde 2010. E-mail: silviabenchimol@hotmail.com

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que os discentes

tragam para o ambiente escolar, vivências

de seu cotidiano,

e,

concomitantemente, levem práticas da sala de aula para o seu convívio social, assumindo uma postura crítica, podendo consolidar e implementar essas práticas ou ressignificá-las. Neste sentido, o trabalho do professor de língua estrangeira deve ser desenvolvido a partir do conhecimento do contexto social dos alunos para que a aprendizagem seja efetiva. É mister, nesta tarefa, que o docente se utilize das oportunidades de explorar interações sócio-comunicativas autênticas, já que a língua se faz presente em todas as situações comunicativas, seja na oralidade, gestualidade ou na escrita, através da sonoridade, no diálogo face a face, nas interações mediadas pelas redes sociais, na mídia de modo geral e todas as possíveis manifestações interacionais, sempre através de um gênero discursivo (BAKHTIN, 1997). No presente artigo, recorremos aos postulados de teóricos como Saussure (1972) e seus estudos clássicos sobre o uso da linguagem, onde propõe a emblemática distinção entre langue e parole, a primeira como um sistema de signos e formas interligadas que determina normativamente cada ato particular da fala e a segunda como emprego individual da língua; Bakhtin (1997, 2016) o qual desenvolveu ideias sobre os gêneros textuais e discurso, aproximando a língua como uma realidade concreta e não como uma abstração científica; Halliday (2004), precursor dos estudos funcionais da linguagem, que introduz significativo estudo sobre a Linguística Sistêmico Funcional, percebendo a língua como uma atividade dinâmica e social, modelada pelas situações contextuais e assim ultrapassando os limites da sintaxe ao nível das sentenças e evoluindo para a análise do texto em suas dimensões intra e extralinguísticas; Marcuschi (2005) que aborda a língua em uma perspectiva de gênero classificando-a como fenômeno histórico interligado à vida cultural e social; Fairclough (2016) com suas pesquisas sobre discurso e mudança social e a fonte documental dos PCNs de Língua Inglesa (1999) com as abordagens apresentadas sobre o ensino-aprendizagem. A partir destes aportes teóricos e objetivos expostos, traçamos a organização sequencial deste texto iniciando com a abordagem do texto como recurso pleno de possibilidades para o ensino de língua estrangeira (LE). Em seguida tratamos das expectativas de construção e desenvolvimento de habilidades e competências de aprendizagem de LE na contemporaneidade; focalizando o papel do aprendiz de LE, em seguida apresentamos conceitos correlatos ao texto e ao discurso, considerando o lugar do

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discurso no ensino de LE. Finalmente, trazemos considerações sobre a língua inglesa como força libertadora e sobre o ensino e aprendizagem de LE mediados pelos recursos digitais. Metodologicamente, este trabalho adota o paradigma da pesquisa bibliográfica e exploratória (GIL, 2008), motivada por nossas inquietações e experiências profissionais. Tivemos a preocupação de selecionar textos de referência para a construção de um panorama diacrônico dos estudos da linguagem incluindo textos seminais clássicos e contemporâneos. Primeiramente, foi nossa intenção relembrar suscintamente a origem do ensino e aprendizagem de língua inglesa para refletir sobre o papel do texto na trajetória cambiante da profusão de métodos de ensino a partir do século XX, selecionando alguns momentos icônicos. Posteriormente abordamos, com ênfase, a concepção pós-método por entendermos que toda a prática de ensino se estrutura sobre uma base teórica, não necessariamente anterior à esta prática. Defendemos também a liberdade de opções metodológicas e estratégicas por parte do docente, o qual tem a real percepção e experiência precisas e genuínas de seu contexto. Esta realidade o isenta de quaisquer submissões escravizadoras aos rigores metodológicos. O desdobramento do artigo faz referências ao texto e ao discurso, analisando o perfil dos alunos e professores de língua inglesa na atualidade e sobre as competências que precisam ser alcançadas para a compreensão da língua estrangeira como uma força libertadora e, no caso de uma língua de projeção global, capaz de fazê-los ascender cultural e socialmente. Por fim, o artigo faz abordagens sobre o ensino e aprendizagem de língua inglesa por meio dos recursos digitais. A era digital, um tema bastante atual, demanda discussões que ultrapassem os rasos limites das tendências contemporâneas e da introdução de ferramentas motivacionais sem a devida atenção aos seus efetivos benefícios em termos de fomento e qualidade da aprendizagem em aulas de língua inglesa. O texto como recurso pleno de possibilidades no ensino de LE Muito se questionou ao longo de várias décadas sobre a eficácia dos métodos de ensino de Língua Inglesa que levassem os aprendizes ao uso competente do idioma. Fazemos aqui uma breve reflexão sobre o significado de três termos comumente confundidos por sua estreita relação – abordagem, método, estratégias ou técnicas. A abordagem descreve o conjunto mais alargado de ideias e concepções filosóficas e 68


científicas que situam natureza do ensino. Localiza, neste caso, paradigmas defendidos por teóricos e estudiosos da linguagem. O método corresponde à sistematização e ordenação de passos que devem conduzir à concretização dos princípios da abordagem onde se situa. Ele apresenta de forma orgânica, coerente e factível, os objetivos, conteúdos e papeis dos agentes implicados na materialização das ideias subjacentes. As estratégias ou técnicas de ensino estão mais sob o controle docente e fazem parte de seu repertório de possibilidades de execução de objetivos em sala de aula, os quais devem, evidentemente, ser consistentes com o método. A seleção e manipulação das estratégias pelo docente em sala de aula são justificadas pela avaliação de seu público alvo e de seus objetivos circunstanciais. Portanto, as estratégias e ou técnicas “dependem do professor, da sua perícia individual e da composição da turma” (ANTHONY, 2011). Ao longo da trajetória do ensino de línguas estrangeiras, os métodos surgem com o objetivo de melhor ensiná-las, respeitando-se as especificidades de cada momento histórico, das localizações geográficas e de quais objetivos, para tal ensino, se tinham à época. Larsen - Freeman e Richards & Rodgers (apud ABRAHÃO, 2015) foram autores que buscaram a compreensão dos métodos e passaram a estudá-los e descrevê-los com detalhes. Destacam-se historicamente: gramática-tradução, método direto, audiolingual (audiovisual) situacional, silencioso, comunitário, sugestopédia e resposta física total, incluindo as abordagens oral, natural e comunicativa. Muitos destes métodos ainda estão na base da prática docente de muitos professores, refletindo-se especialmente na seleção de estratégias e atividades. Esta é uma constatação em abrangência global, considerando-se o domínio do ensino das línguas estrangeiras. A exemplo disto, podemos referir o método da gramática-tradução ainda bastante presente no ensino fundamental e médio e, o audiolingual que continua sendo o sustentáculo de algumas franquias internacionais, além da abordagem comunicativa “que tem orientado o processo de ensino e aprendizagem de línguas em variados contextos públicos e privados”. (op.cit.). No século passado, mais acentuadamente durante a década de 1990, os linguistas passaram a questionar a eficiência do método como pilar de orientação da prática docente, o que a seguir, sedimentou as bases da abordagem comunicativa – mais flexível do ponto de vista do rigor formal – e da era pós-método. Uma das principais características dos métodos é que estes impõem conteúdos, procedimentos e técnicas, geralmente desassociados da realidade dos alunos. A abordagem comunicativa é mais flexível, atenta 69


para o contexto e para o público alvo em questão. Para Kumaravadivelu (2003), há pontos de encontro entre a abordagem comunicativa e o período pós-método principalmente no que se refere ao ensino da gramática. O pós-método defende como necessário promover a conscientização linguística do aprendiz, que deve ser estimulado a descobrir as regularidades linguísticas de forma intuitiva. A abordagem comunicativa propõe igualmente a necessidade de se oferecer condições para a aprendizagem consciente das regularidades linguísticas, especialmente quando requeridas pelo aprendiz, e que o ensino da gramática seja sempre realizado dentro do nível discursivo e pragmático. (KUMARAVADIVELU, 2003 apud ABRAHÃO, 2015 p. 34)

Outro ponto de convergência é que ambos defendem que o ensino de língua estrangeira seja contextualizado e que o aluno seja valorizado e assuma um papel ativo no processo de ensino e aprendizagem. Assim, depreende-se que as regras não devem ser o ponto de partida para a exemplificação de excertos do discurso, mas sim o sentido inverso, isto é, o discurso deve conduzir à análise e compreensão das regras de funcionamento da língua pelo próprio aprendiz, conforme afirma Abrahão (2015). A realidade contemporânea aponta para a inaplicabilidade rígida de métodos que não contemplem as diferenças e especificidades contextuais e, o papel crítico-reflexivo está principalmente nas mãos de gestores e docentes. Afirma Silva (2004 p. 2) que “não há método soberano, fórmulas ou estratégias universais”. Segundo Silva (op.cit) pois na prática, os fatos diferem daquilo que ditam os métodos, pois professores, alunos e contextos são únicos, apresentando suas peculiaridades e idiossincrasias. O pós-método confere essa importância ao contexto de ensino, desfaz o paradigma das fórmulas prontas que se encaixam em qualquer lugar e circunstância, retrai-se de uma postura filosófica essencialista no contexto educacional e rompe com a postura uniformizante e globalizante das estratégias e soluções únicas que atendem às mesmas necessidades de educadores e educandos. Assim, o professor passou a reavaliar a sua prática e redimensionar seu papel neste cenário de complexidade caótica (MORIN, 1996). O que lhe é útil na nova conjuntura é relativizar, contextualizar e pensar nos sujeitos com suas diferenças. O professor detentor dos conhecimentos, há algumas décadas já vem cedendo lugar ao mediador que valoriza e estimula a autonomização, a participação dos alunos no processo ensino aprendizagem e, reflexivamente, se colocam as indagações sobre o que, para que, como e para quem ensinar.

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Este retrospecto trás de volta ao foco do presente artigo a importância do texto, manifesto pelos gêneros linguístico-discursivos e utilizado como ferramenta de auto reconhecimento e localização cultural e identitária dos aprendizes. É este aspecto que procuramos observar nessa trajetória de métodos que se estendeu ao longo da história do ensino de LE. Alguns autores como Finocchiaro e Brumft (1983) e Leffa (2008) comentam o papel do texto dentro dos principais métodos abordados possibilitando-nos sintetizá-los no quadro (1) abaixo.

Principais Métodos

Gramática e Tradução Método Direto Audiolingualismo

Papel do texto Importância nula do texto. Uso de palavras descontextualizadas. Ênfase na tradução e memorização de regras gramaticais e vocabulário. Tradução e versão de itens lexicais isolados. Sem finalidades sócio-comunicativas. Ênfase no texto oral. Uso de diálogos situacionais memorizados e pequenos trechos de leitura obedecendo a sequência de ouvir e falar como prioritárias e ler e escrever como secundárias. Foco no texto oral, baseado na premissa língua é fala, não é escrita. Ler e escrever são posteriores à competência da fala. A ideia de língua como prática social ainda é limitada pois a competência da fala per se não implica em negociação de sentidos. A presença da memorização ainda é marcante.

Contextualização e comunicação são as premissas básicas. Prevê plena e variada utilização de textos tanto escritos quanto orais, condizentes com a realidade dos alunos. Prioridade à expressão dos sentidos. Competência comunicativa em Abordagem comunicativa relevo, nas premissas funcionalistas. Integração das quatro habilidades e estímulos complexos. Redução do foco na forma e destaque à competência estratégica. Quadro - 1. Papel do Texto nos Métodos de Ensino de LE. Nota: Sintetização de informações produzida pelas autoras do artigo.

“Os saberes contemporâneos se baseiam na pragmática, na linguística textual, na análise do discurso, na pedagogia crítica de Paulo Freire.” (Lima, 2010 p. 48). Com o advento dos estudos de linguística textual, análise do discurso, pragmática e estudos de tradução, a textualidade vem à tona como um fator decisivo na construção dos significados. Desta forma, “fora do texto e do contexto não há significado”. (Lima, 2010, p. 48). O ensino de língua inglesa, busca atualmente capacitar o aprendiz a ler e compreender de maneira crítica por diferentes tipos e gêneros e por diversos meios: oral, escrito em jornais, rádio, televisão, internet, em mais de um registro linguístico, como o literário, o científico, etc. (...) Os gêneros não são instrumentos estanques e enrijecedores da ação criativa. Caracterizam-se como eventos textuais altamente maleáveis dinâmicos e plásticos. Surgem emparelhados a necessidades e atividades socioculturais, bem como na relação com inovações tecnológicas, o que é facilmente perceptível ao se considerar

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a quantidade de gêneros textuais hoje existentes em relação a sociedades anteriores à comunidade escrita. (MARCUSCHI, 2005, p. 19).

O texto em suas diversas modalidades, representado por diversos gêneros, suportes e canais propicia aos alunos um estudo da língua mais prazeroso e dinâmico, com uma gama mais ampla de possiblidades que irão enriquecer cada vez mais os seus conhecimentos de forma real e genuína. O texto é, portanto, um recurso indispensável no estudo da língua inglesa, com ele o professor tem a possibilidade de trabalhar qualquer conteúdo temático ou estrutural da língua, por vias verbais (oral ou escrita). É pertinente ressaltar que o texto não é apenas um instrumento de ensino dos aspectos linguísticos e da compreensão superficial de informações, marcadores de coesão e coerência. As possibilidades de exploração de um gênero abrem perspectivas de reflexão sobre temáticas de conscientização sobre questões interculturais, identitárias, temas da atualidade, sua função social, os ambientes de circulação e contextos de cultura e situação. Conforme propõe Bazerman (2006), os textos são vistos como formas de vida e ação e não apenas formas textuais “os gêneros são frames para a ação social”. Bazerman (op.cit, p. 23 ). Ainda nesta perspectiva, Halliday (2004) em seus estudos sobre a linguística sistêmico funcional, faz a abordagem da língua como “função”, por considerar o uso da gramática como meio de produção de significados. Sob esta ótica, a língua deixa de ser meramente um conjunto de regras que devem ser seguidas passando a ser considerada como um sistema dotado de significados. Para Eggis & Martin (1996), o uso da língua é, também, funcional e a função da linguagem é produzir significados; esses significados são influenciados pelo contexto social e cultural em que são negociados; o uso da língua produz significados através de escolhas. A língua então manifesta-se como um conjunto de escolhas que foram feitas por seus usuários dentro de determinadas situações contextuais e culturais. Halliday, (op. cit) pontua ainda, que tudo o que é dito ou escrito aparece em algum contexto de uso. É o uso da língua que dá forma ao sistema, a linguagem é fruto das necessidades humanas e a maneira como foi organizada é funcional, portanto, a gramática sistêmico funcional é natural e não arbitrária, pois tudo nela pode ser explicado. Saussure (1972) não considerava a fala acessível ao estudo sistemático, por acreditar que ela era uma atividade individual: “Os indivíduos usam uma língua de formas imprevisíveis, de acordo com seus desejos e suas intenções, uma (langue) que é em si mesma sistemática e social. Saussure (ibdem), por este posicionamento, é duramente 72


criticado pelos sociolinguístas, pois afirmam que o uso da linguagem é moldado socialmente e não de forma individual. Estes sustentam que a variação no uso da linguagem é sistemática e acessível ao estudo científico e que aquilo que a torna sistemática é sua correlação com variáveis sociais (FAIRCLOUGH, 2016 pg. 94). A língua varia de acordo com o tipo de relações sociais que se estabelece entre os falantes de uma comunidade. É neste sentido que reafirmamos que no ensino de língua inglesa, o texto em suas diversas modalidades é um recurso valioso para o aprendizado do idioma, por estar ele repleto de possibilidades de exploração didática das expressões da linguagem. A este respeito refere-se Lima, O ensino de línguas estrangeiras deve ser organizado em torno do estudo do texto (texto de todos os tipos e gêneros, em seu sentido mais amplo e profundo, no nível do discurso, implicando o conhecimento da noção dinâmica de textualidade e discursividade), uma vez que o texto faz girar todas as dimensões deste ensino: lexical, gramatical, semântica, estética, política, cultural... (LIMA, 2010, p. 51).

As expectativas de construção e desenvolvimento de habilidades e competências do aprendiz de LE na contemporaneidade Os parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) apresentam uma proposta quanto as habilidades e competências que precisam ser alcançadas no ensino de língua estrangeiras. “A comunicação como ferramenta imprescindível no mundo moderno” [...] (Brasil, 1999 p. 132). A este respeito, é pertinente mencionar as competências listadas no documento por meio do qual espera-se que o aprendiz alcance durante o estudo da Língua Inglesa: 1. “Saber distinguir entre as variantes linguísticas”; 2. “escolher o registro adequado à situação na qual se processa a comunicação”; 3. “escolher o vocábulo que melhor reflita a ideia de que pretenda comunicar”; 4. “compreender de que forma determinada expressão pode ser interpretada em razão de aspectos sociais e/ou culturais”; 5. “compreender em que medida os enunciados refletem a forma de ser, pensar, agir e sentir do que produz”; 6. “utilizar os mecanismos de coerência e coesão em língua estrangeira (oral e ou escrita). Todos os textos referentes a produção e à recepção e qualquer idioma regem-se por princípios gerais de coerência e coesão e por isso, somos capazes de entender e sermos entendidos”;

73


7. “utilizar as estratégias verbais e não verbais para compensar falhas na comunicação (como fato de não ser capaz de recordar, momentaneamente, uma forma gramatical ou lexical), para favorecer a efetiva comunicação e alcançar o efeito pretendido (falar mais lentamente, ou enfatizando certas palavras, de maneira proposital, para obter determinados efeitos teóricos, por exemplo)”. É possível observar que os aspectos gramaticais não são os únicos a serem contemplados no processo ensino-aprendizagem, de línguas, mas é necessário o domínio destes componentes associados ao domínio das competências sociolinguísticas para que se possa afirmar que um determinado indivíduo possui competência comunicativa. Do professor de língua Inglesa também se espera o desenvolvimento de competências e habilidades. Em primeiro lugar é necessário que o professor saiba a língua e seu sistema, nenhum professor será capaz de conduzir o aluno ao aprendizado se ele próprio não domina o uso da língua. Ele precisa fazer uso do idioma, caso contrário estará abrindo mão de sua própria formação e trabalhando a língua como abstração. Em segundo lugar, o professor precisa ser includente, e só conseguirá sê-lo através do comprometimento com o seu trabalho. Afirma Leffa (2009,p. 114) “o professor de língua estrangeira, para ser includente, precisa levar em consideração três aspectos que considero essenciais: o saber, o desejo e ação”. De fato, o professor carrega uma enorme responsabilidade no processo ensino – aprendizagem. Ele mediará as interações sociais e processos afetivos e cognitivos relacionados à língua e à sua ambiência de ensino de LE. Caberá ao docente o empenho em fomentar, resgatar e manter os níveis motivacionais que estão na base da aprendizagem efetiva e que acreditamos têm diretas implicações com os trabalhos com texto. O aprendiz de LE de nosso tempo Embora o papel do professor seja de extrema importância no processo ensinoaprendizagem, espera-se que o aprendiz de língua estrangeira na atualidade seja mais autônomo e passe a entender que não se aprende uma língua estrangeira, especialmente com o status de língua global, apenas na escola. A sala de aula, tão somente, não é capaz de formar um individuo proficiente no idioma. Portanto, o contato com a língua estrangeira deve ser variado e intensificado, o quanto possível, fazendo uso das situações comunicativas com outros falantes para que desenvolva satisfatoriamente suas habilidades de aprendizagem. “Fica claro que os aprendizes mais bem-sucedidos não ficam restritos à 74


sala de aula, mas vão além, procuram oportunidades de interagir com outros falantes e buscam formas diversas de uso da língua” (PAIVA, 2014, p. 39). Desenvolver uma visão crítica diante do mundo que o cerca também é algo importante a ser considerado. O aluno atual não é um sujeito passivo, como se apresentava nos moldes da educação tradicional, onde lhe cabiam a reprodução sem reflexão ou propósitos de transformação pessoal e de seu entorno. Ensinar a língua Inglesa também transborda a mera abordagem dos conteúdos propostos em um currículo previamente pensado. As orientações trazidas pelos PCN conduzem o professor de Língua Inglesa à integração das quatro habilidades linguísticas (reading, speaking, writing and listening). O texto e o discurso a partir de uma perspectiva de gênero é, portanto, uma ferramenta indispensável na prática pedagógica do professor, permitindo que os alunos aprendam de uma forma bastante diversificada e interessante. O lugar do discurso no ensino de LE Para Fairclough (2016), o discurso está associado à prática social, uma vez que qualquer que seja o seu uso, este encontra nas diversas esferas da sociedade o seu legítimo espaço de atualização, situando-se em diversas organizações sejam elas educacionais, econômicas, governamentais, da sociedade civil ou outras. A sala de aula, como extensão da sociedade impõe ao professor conhecer o que ocorre dentro e fora dela. Igualmente importante é agregar o conhecimento empírico e as contribuições que o aluno traz para dentro da sala de aula empoderando-o a transformar a si próprio e a sociedade. A prática discursiva é constitutiva tanto de maneira convencional como criativa: contribui para reproduzir a sociedade (identidades sociais, relações sociais, sistemas de conhecimentos e crença) como é, mas também contribui para transformá-la. Por exemplo, as entidades de professores e alunos e as relações entre elas, que estão no centro de um sistema de educação, dependendo da consistência e da durabilidade de padrões de fala no interior e no exterior dessas relações para sua reprodução. Porém, elas estão abertas a transformações que podem originar-se parcialmente no discurso: na fala da sala de aula, do parquinho, da sala de professores, do debate educacional e assim por diante. FAIRCLOUGH ( 2016, p.96).

Embora os gêneros do discurso sejam um reflexo do agir e ser de uma determinada sociedade, a língua estrangeira surge com força de libertação e transposição por contribuir

75


para o desenvolvimento que coloca o indivíduo em patamar global com poder emancipador tanto em termos pessoais quanto profissionais. A língua Inglesa como força libertadora Os PCN (1999), abordam a Língua Inglesa como meio de libertação, a este respeito, se fundamenta na pedagogia de Paulo Freire que objetiva habilitar o aluno para ‘ler o mundo”. Freire afirma que “trata-se de aprender a ler a realidade e conhecê-la para em seguida poder reescrever essa realidade (transformá-la). Freire (1987, p. 44 apud PCN, 1999 p. 39). O documento prossegue apontando que a força libertadora permite que as pessoas escolham entre as diversas possibilidades que lhes são apresentadas, mas que para escolher a melhor parte é necessário ter olhos esclarecidos para ver, ou seja, ter uma mente aberta, desprovida de preconceitos, falsos nacionalismos que podem impedir o desenvolvimento da sua cidadania dentro do seu meio social e no mundo. A Língua Inglesa permite ao aprendiz não só o acesso à informação, mais também o desenvolvimento da sua consciência crítica diante do mundo que o cerca. Ele torna-se sujeito atuante, e não apenas passivo. A existência, porque humana não pode ser muda, silenciosa, nem tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras verdadeiras. Com que os homens transformam o mundo. Existir, humanamente, é propiciar o mundo é modificá-lo. O mundo propiciado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar” FREIRE (1987, p. 44)

É incontestável que o tempo muda e com ele as maneiras de conceber o conhecimento, as aspirações pessoais, as noções de certo e errado, as formas os estilos e o modo de enxergar as coisas. Em um mundo globalizado como em que vivemos, onde nações encontram-se conectadas pela internet, e a divulgação e compartilhamento do conhecimento ocorre em tempo real, as mudanças no ensino de língua inglesa tornam-se cada vez mais frequentes e rápidas. Este fenômeno torna mais difícil ao professor enquadrar os seus aprendizes dentro de um escopo em que estejam claras as perspectivas de como, quando e do que aprender. Estes fatos justificam a impossibilidade de um controle por parte do docente ou dos elaboradores de currículos de ensino no sentido de definir objetos de aprendizagem. Pode-se quando muito estabelecer objetivos de ensino que irão se materializar e transformar de acordo com fatores contextuais imprevisíveis. Há um permanente desafio no ensino de línguas quanto a estabelecer um segmento linguístico que 76


possa ser adotado como uma unidade operacional a ser ofertada aos alunos. Entende-se, assim, que a língua, como tudo no universo é composta de partes que podem ser divididas em partes menores, que estas ainda podem ser reconfiguradas em outros objetos perpassa o que hoje é denominado como objetos de aprendizagem. Dividir a língua em segmentos não significa absolutamente isolar um segmento do outro; pelo contrário, é fundamental que os segmentos, depois de recortados, tenham a capacidade de serem reagrupados, quer voltando a configuração anterior, quer principalmente gerando a possiblidade de novas configurações. (LEFFA, 2006, p. 3).

A citação acima corrobora o pensamento de que didaticamente a fragmentação é um recurso importante para que o input seja melhor assimilado, sem que constitua ausência de contextualização. Ensino e aprendizagem de LE mediada pelos recursos digitais Com o advento do computador e da tecnologia da informação, houve uma grande mudança nas relações sociais. As informações pela Internet permitem a comunicação entre seus usuários em tempo real dando-lhes a possiblidade de enviar e receber rapidamente as informações de qualquer natureza, assim como a oportunidade de transmitir sons e imagens. As tecnologias digitais de informação e comunicação estão presentes no nosso cotidiano, mediando diversas práticas sociais, e na educação o seu uso tem se tornando cada vez mais frequente, especialmente no ensino aprendizagem de Língua estrangeira – inglês, pois facilitam o acesso de professores e alunos neste idioma com grandes acervos de textos e hipertextos dos mais variados. De acordo com Motta- Roth (2009, p. 270), o ensino de LE deve propiciar ao aprendiz o uso dos recursos tecnológicos para inseri-lo em uma sociedade tecnológica, “pautada por uma economia dita globalizada”. Em concordância defende Souza (2010) A internet coloca à disposição de seus usuários uma ampla gama de recursos para a comunicação, graças a eles a comunicação mediada por computador tem possibilitado o contato entre membros de diferentes culturas a despeito das mais significativas distâncias geográficas”. (SOUZA, 2010 p. 16).

O uso da internet possibilita também a interação em Língua inglesa com pessoas de diferentes partes do planeta, em diversas situações comunicativas permitindo a prática do idioma em contextos reais de uso. Há uma gama extensa de exemplos de recursos 77


tecnológicos que professores e alunos podem utilizar, e que estão em constante mudança: Correio eletrônico, (e-mail), Redes sociais, domínios multiusuário (MVDSs), blogs, WebQuests on-line que são “ambientes virtuais de aprendizagem colaborativa on-line, que permitem o desenvolvimento de projetos de pesquisa pelo uso da web e seus recursos” (DIAS, 2010, p. 363) Isto posto, revela-se importante ampliar o uso dos recursos digitais nas aulas de Língua inglesa e propor atividades e projetos culturais que proporcionem aos alunos um maior contato com este universo digital, com a finalidade de dar a eles a oportunidade de se engajarem como sujeitos críticos na sociedade. O aluno que faz um bom uso desses recursos, não apenas garante seu acesso a novos equipamentos e programas, mas pode utilizá-los mais efetiva e responsavelmente em seus contextos sociais. Considerações finais Este artigo estabeleceu como objetivo refletir sobre a importância do texto e do discurso no ensino da língua estrangeira considerando aspectos tais como sua dinamicidade e seu potencial enriquecedor na construção e desenvolvimento de habilidades e competências linguísticas, além de considerar o gênero textual como instrumento de conscientização e autonomização. Neste sentido amparou-se nos estudos sobre o texto e discurso, que são ferramentas significativas e úteis para o ensino de língua estrangeira. Consideramos que o aprofundamento propiciado pelas leituras de aporte e as relações feitas entre os elementos constituintes deste artigo confirmam a hipótese de que a utilização das potencialidades do texto com seus discursos e ideologias subliminares, permitem ao docente proporcionar um estudo mais motivador, prazeroso e diversificado. Na base desta conclusão está o fato dos gêneros textuais favorecerem a abordagem de ampla diversificação de conteúdos estruturais e temáticos sem abandonar uma perspectiva de utilização da língua em contextos autênticos – sejam estes gêneros orais ou escritos – os textos também tem a potencialidade de inserir os alunos em um universo real que lhes é significativo e familiar. Os estudo nos favoreceu consolidar a percepção de que a criação de um elo afetivo entre discente e conteúdo, atrai o primeiro para uma participação mais efetiva, fomentando sua autonomização e criticidade. Um outro fator que emerge claramente na prática docente, e que ressaltamos neste estudo, é que a utilização dos recursos tecnológicos e digitais ocupa lugar de relevo no contexto contemporâneo do ensino por estes possibilitarem ao aluno de língua inglesa 78

o contato com outras culturas em diversas situações comunicativas,


permitindo a prática intercultural. Para além destas vantagens, entendemos que os recursos tecnológicos amparados pela gestão crítica de seus benefícios, possibilita acesso à diversidade e constante atualização ao expor o aluno à um universo incalculável de tipologias de textos e gêneros. Por fim, o estudo nos permite sustentar que a aprendizagem de uma língua estrangeira por meio de textos contextualmente situados, que valorizem a reflexão sobre os discursos neles contidos, fomenta a formação de leitores críticos, reforça as identidades dos aprendizes e propicia a percepção de uma convivência global onde as diferenças são enriquecedoras e não representam estereótipos de dominação, superioridade e inferioridade. REFERÊNCIAS ABRAHÃO, Maria Helena Vieira. EntreLínguas, v.1,n.1, p.25-41, jan/jun.2015. ANTHONY, Edward. Abordagem método e técnica. Acessível em http://www.helb.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=187:a . 2011. AUSUBEL, David. The psychology of meaningful verbal learning. New York: Grune & Stratton,1963. _________. The acquisition and retention of knowledge. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers. 2000. BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. Os gêneros do discurso. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. _________. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra; BAZERMAN, Charles. Gêneros textuais, tipificação e interação. Orgs. BAZERMAN, Charles. Gêneros textuais, tipificação e interação. Orgs. DIONÍZIO, Angela Paiva; Trad. HOFFNAGEL, Judith Chambliss.2 ed. São Paulo: Cortez, 2006. BRANDÃO, Helena. Introdução à análise do discurso- 3ª ed. rev – Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2012. 117 p. BRASIL. Secretaria de Educação. Parâmetros curriculares nacionais. Língua inglesa. – Brasília: MEC, 1999. DIAS, Reinildes. Webquests no processo de aprendizagem de L2 no meio online. In: Paiva, Menezes, Vera Lucia (Org.). Interação e aprendizagem em ambiente virtual. 2 ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010, p. 359-394. EGGIS,S. & MARTIN J, Genres and registers of discourse. In: VAN DIJK, T.A. ed. Discourse: a multidisciplinar introduction. London: Sage, 1996. FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. 2ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2016. 338 p. __________. Discourse and social change. Cambridge: Polity, 1992. FINOCCHIARO, Mary. & BRUMFT, Christopher. The functional-notional approach: From theory to practice. New York: Oxford University Press, 1983. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido, 17ª, ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, (o mundo, hoje, v. 21). 107p. GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008. 79


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QUE PROFESSORES ESTAMOS NOS TORNANDO? PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO E AS PEDAGOGIAS PROGRESSISTAS1

RESUMO

Maria das Graças Moura Santos2 Dhemersson Warly Santos Costa3 Carlos Augusto Silva e Silva4

Este trabalho tem como objetivo traçar discussões sobre a produção de subjetividades docente a partir de discursos e enunciados sob as teorizações de Michel Foucault em que os professores pedagogos são pensados como construtos sociais que foram/são fabricados por diversos discursos atravessados pelas pedagogias progressistas nos documentos oficiais. Para tanto foram acionados fragmentos textuais de alunos do curso de pedagogia da UFPA/Campus Altamira, bem como o projeto político pedagógico do referido curso a fim de pensar como a docência é produzida a partir de discursos progressistas, nos quais estão contidos definições e modos de ser professor. Nesse sentido lançamos mão do seguinte questionamento: que professores se querem formar? A partir destes apontamentos poderemos trabalhar algumas questões tidas como verídicas que fabricam o professor de pedagogia, que os criam a seguir uma receita de como ser um bom professor, e, por fim, problematizar possibilidades outras de ser professor, inclusive abrindo a oportunidade para estranhar todos esses modelos e criar novas maneiras. Palavras-Chave: Professores. Formação de professores. Produção de subjetividades. Discurso. INTRODUÇÃO Acrescente uma colher de alegria, uma xícara bem grande de mansidão, meio quilo de inteligência, um litro de transformador social, uma pitada de motivação, carisma a gosto. Bata tudo no currículo. Leve a graduação por quatro anos. Pronto, formado um bom professor. Agora é só servir nas escolas. (Dhemersson Santos) Esta pesquisa compõe parte de um Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado a faculdade de Educação da Universidade Federal do Pará, campus de Altamira, como requisito para obtenção do título de licenciado em pedagogia, cujo título foi o retrato falado do professor: discursos que fabricam professores. 2 Formada em Pedagogia pela Universidade Federal do Pará, campus de Altamira (2017). Especialização em andamento em Políticas Educacionais e Saberes Docentes pela Faculdade de Educação UFPA/Altamira. Email: gracamoura76@gmail.com. 3 Possui graduação em licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Pará (2016) campus de Altamira-PA. Atualmente é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciências e Matemáticas pela UFPA. Email: dhemerson-santos@hotmail.com. 4 Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Pará (2014). Atualmente é aluno de Mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas, Universidade Federal do Pará. Email: carlosaugusto.s02@gmail.com. 1

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Os discursos que interpelam os atributos de um professor são variados. Produzidos ao longo da história, eles estão ligados as condições econômicas, sociais e culturais de cada sociedade. Não se pode ao certo demarcar um momento, um ponto de partida de construção do discurso, o que se sabe é que o discurso é produzido na história e reproduzido pelos mais diversos meios de propagação, reverberando em práticas discursivas, e não discursivas, que ao longo da história tem formatado a imagem do professor. Tais práticas estão pulverizadas nos mais diversos suportes que nos interpelam rotineiramente, são “textos jornalísticos, acadêmicos, narrativas religiosas, populares, propagandas, novelas, músicas, filmes, documentos jurídicos, materiais didáticos” (CHAVES, 2016, p. 219). Nesse sentido, destacamos que os cursos de formação de professores também ocupam um lugar de destaque na fabricação de professores. A receita do bom professor é significada dentro das grades de um currículo político pedagógico que tem a finalidade de expressar o perfil do professor que a instituição almeja formar, operando práticas discursivas e não discursivas que inventam, fabricam, engendram, criam, produzem e reproduzem formas de ser professor. Muitas dessas formas ou fôrmas são conhecidas no campo educacional como tendências pedagógicas. A hipótese que nos movimenta nesta pesquisa é que os cursos de formação de professores de pedagogia são atravessados por uma tendência pedagógica progressista, a qual produz regimes de verdades, reverberando em práticas discursivas e não discursivas que determinam uma receita de ser professor. Assim, o presente artigo teve como objetivo analisar o Projeto Político Pedagógico do Curso de Pedagogia da Universidade Federal do Pará, campus de Altamira, a fim de fomentar o debate sobre a produção de subjetividades do licenciando em pedagogia, tendo como foco de pesquisa e análise os discursos progressistas que atravessam o currículo, bem como os alunos, que produzem regimes de verdades sobre o sujeito professor. Além disso, os professores em formação foram acionados através de um questionário para dizer mais sobre. A vista disso foi escolhida as contribuições teóricas sobre discurso, enunciados, regimes de verdades e processos de subjetivação com Foucault5 nos livros arqueologia do saber e ordem do discurso (2005).

Durante o processo foram realizados recortes de

materiais para serem analisados, sendo: fragmentos de escritas de estudantes de pedagogia: trata-se de um instrumento composto com frases pequenas a partir de termos 82


indutores

que

devem

dezessete licenciandos

do

ser

complementadas.

sétimo

período

do

Participaram

Curso

de

desta

etapa

Licenciatura

em

Pedagogia, os quais expressavam, de acordo com suas ideias e referências, o que estes entendem sobre ser um bom professor. O segundo recorte foi realizado no Projeto Político Pedagógico do Curso de Licenciatura em Pedagogia: documento oficial que caracteriza a partir de diversas regulamentações

a

caracterização

do

curso

supracitado

e

dos

estudantes.

Priorizando trazer para análise os objetivos, perfil do aluno e as competências e habilidades,

ao entender

com

Bastos

(2014,

p.

29)

que

estes

documentos

que

prescrevem

“apresentam-se como um conjunto de regras, e determinações determinada

forma

de moralidade,

ou

seja:

preceitos, valores,

atitudes

e

práticas que são impressas e requisitadas aos sujeitos a serem formados”. As tendências pedagógicas e a subjetivação docente do professor de Pedagogia A produção de subjetividades aqui é pensada não como algo idiossincrático, ou seja, uma identidade que compõe a natureza humana a partir de uma essência, mas, sobretudo, como

um

processo

social

e

histórico

que

atravessa

essa

produção, que monta e se desmonta a partir de diversos fatores constituintes de uma malha discursiva que está presente nas relações. É importante compreender que a subjetivação está para além do sujeito no centro de uma identidade fixa, monolítica, ela está para o campo da produção, isto é, o sujeito é produzido, fabricado a partir dos seus encontros com uma cultura, uma história, uma universidade, políticas, currículos... A vida, transformando-se no tempo e no espaço (SANTOS; BRITO; SILVA, 2016). É nesse sentido que essa ideia aqui é reforçada pelas lentes foucaultianas, com a ideia de subjetivação amplamente tracejada nos seus escritos.

Para Foucault a

subjetivação nunca está acabada, ela se forma a partir de processos produtivos, que criam práticas discursivas e o próprio sujeito que é subjetivado e fixado (FOUCAULT, 2012).

O autor aqui é utilizado como uma caixa de ferramenta teórica e prática para ajudar a pensar reverberações discursivas na formação docente, muito menos como puro respaldo teórico, porém, buscando com e a partir da teoria quebrar muros, transitar por entre saberes.

5

83


Na mesma esteira, Foucault informa que o sujeito não é substancial, um vaso de barro, acabado, definido, moldado apenas por um único artesão, ao contrário ele é mutante, transita pela vida moldando-se pelas múltiplas mãos que o atravessam (FISCHER, 2002). Pensando com Deleuze e Guattari, a subjetividade é “produzida, maquinada, transformada, modelada ou mesmo adaptada” (SANTOS; BRITO; SILVA, 2016, p. 8). Nesse sentido, Maknamara (2016, p. 200) explica que: A subjetividade, portanto, deixa de ser entendida como “aquele lugar seguro e estável” que a teoria do sujeito nos levou a crer, para ser pensada como socialmente construída, como dialógica, como inscrita na superfície do corpo, (...) como resultado de práticas episódicas de auto-exposição, em locais e épocas particulares.

O que interessava a Foucault era saber como o sujeito se constitui, e muito mais do que lançar mão da pergunta identitária: quem sou eu, mas no que estou me tornando. A última pergunta pode ser facilmente deslocada para o campo da docência, e é o que nos propomos a problematizar no referido trabalho, que professores estamos nos tornando? Essa pergunta alavanca-se com maior potência quando pensamos alguns meios que produzem esses professores e suas subjetividades, em especial o objeto de investigação desta pesquisa, os discursos progressistas. Diversas tendências pedagógicas foram desenvolvidas ao longo da história para sistematizar uma possível formação de professores interligada aos anseios da época. Foram movimentos teóricos, políticos e sociais que influenciaram diretamente no processo educacional, especificamente na formação de professores (VALENZUELA; CUNHA; GUIMARÃES, 2015). As tendências pedagógicas passaram por vários processos de desenvolvimento, e foram divididas em dois grandes grupos, a pedagogia liberal e a progressista. A pedagogia liberal6, embora nos remeta ao entendimento de algo livre democrático

voltado

para

as

questões

sociais,

era

na

verdade

centrada

no

desenvolvimento individual, principalmente para a classe burguesa, deixando de fora do direito à educação aos menos favorecidos economicamente. A escola tinha a função de preparar o intelectual do aluno para que ele assumisse as responsabilidades que a ele compete mediante a imposição que o sistema político e econômico a categoriza de acordo com a sua posição social (ZANLORENZI; NASCIMENTO, 2017). Pode ser didaticamente dividida em quatro períodos denominados de: Pedagogia Tradicional, Pedagogia Renovada – diretiva, Não-Renovada e a Tecnicista. 6

84


O professor era o centro, uma das suas maneiras de disciplinar é o autoritarismo, negando ao aluno possibilidades interagir com o professor e de refletir. As aulas eram expositivas, prevalecendo o método memorialístico e, ainda, numa perspectiva de repetição voltada especificamente ao aprendizado mecânico (OLIVEIRA, 2016). Nesse cenário tradicional a escola foi/é pensada a partir de materiais pedagógicos como livros e cartilhas, a qual o aluno era um sujeito passivo, pois não havia uma valorização da realidade vivenciada no cotidiano. Nas figuras ficam nítidas as distinções de função de ambos os personagens, o professor proativo no sentido de ser detentor do conhecimento, e aluno aquele que deverá obedecer e seguir as ordenanças do professor. A comunicação sobre assuntos fora do contexto educacional entre eles deveria ser a mínima possível e, jamais, qualquer envolvimento afetivo, mesmo que seja sutil, pelo contrário, a disciplina se dá para fazer com que os alunos fossem silenciados e subordinados (OLIVEIRA, 2016). No que tange a Tendência Progressista7, Luckesi (2012) sinaliza que esta busca a transformação da sociedade, surgindo o aspecto político na educação, a qual objetiva, por meio da reflexão crítica, estimular o aluno para a liberdade de aprender com base na criticidade, e, ainda, consciente para entender seu papel na sociedade como cidadão ativo e reflexivo sobre as questões gerais que permeiam seu entorno. As tendências progressistas quebraram os paradigmas que nortearam a educação durante muito tempo, tornando-se um marco na educação, por apresentar um novo método de educação e por acreditar que o homem é um ser social, cultural capaz de transformar o meio em que vive (GARCIA, 2001). Configurou-se como um verdadeiro contraste ao modelo de educação implantada na tendência liberal, pois lutava pela desvinculação da ideia imbricada nas questões burocráticas, como os conteúdos e currículo por acreditar que esse processo era pouco produtivo (OLIVEIRA, 2016). Nesse percurso, Paulo Freire tornou-se a grande referência para educação a partir de

sua

pedagogia,

atuando

como

“fundadores/instauradores

de

discursividades” (FOUCAULT, 2012), Divide-se em três grandes períodos: a Pedagogia Libertadora, libertaria e a Critico social dos Conteúdos

7

85


os quais atuam como criadores de referência para produzir verdades, no caso, Paulo Freire defendia que o processo educacional deveria ser de acordo com a realidade de cada indivíduo, ou seja, não somente transferir conhecimento, mas sim mediá-lo, pois o ensinar “não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou na sua construção” (LUCKESI, 2012). Dessa forma, as ideias progressistas de educação, influenciadas principalmente por Paulo Freire, acabaram por produzir práticas discursivas de como ser um bom professor. Este agora é um sujeito cauteloso e observador, sua função é coordenar as atividades baseadas sempre em temas geradores criando possibilidade de autonomia e a liberdade de expressão, estimulando o educando a valorização do cotidiano de acordo com meio social no qual ele pertence. Tais discursos foram aceitos como verdades pela academia e incorporados nos currículos dos cursos de formação de professores, que colocam em tela a imagem do professor progressista, crítico e reflexivo (GARCIA, 2001). O PPC (Projeto Pedagógico do Curso) é o documento formal que sistematiza o perfil do professor que o curso deseja formar. Os ataques, aceites, diálogos, se estabelecem entre vários jogos de verdades, entre eles a Resolução CNE/ CP Nº 1, de 15 de Maio de 2006 que institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, Licenciatura Plena e com a Resolução 3.186, de 28 de junho de 2004, do CONSEPE/UFPA, que estabelece o projeto político pedagógico do curso de pedagogia da Universidade Federal

do

Pará,

Campus

Altamira,

nele

está

imbuído os objetivos, bem como as competências e habilidades exigidas, ou seja, o perfil que delineia o sujeito professor. Trata-se de um documento vasto, pouco homogêneo, que estabelece a partir dos enunciados a característica de um curso de pedagogia desejável, e, é claro, de um professor pedagogo que naturaliza tais delineios como um modelo, rejeitando outros que não estejam atrelados ao documento, e se estiverem, rejeita-se aqueles que vão de desencontro de um bom professor. O sujeito professor se coloca em posições morais, que agem sobre o perfil de profissional, melhorando-o e transformando-o no que se deseja. Sendo assim o PPC da Faculdade de Pedagogia quer um produto final, onde nele estejam esboçadas as seguintes competências e habilidades:

86


ü Compreensão ampla e consistente do fenômeno e da prática educativa que se materializa em diferentes espaços, contextos e especificidades; ü Atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; ü Fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do Ensino Fundamental, assim como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização na idade própria; ü Trabalhar em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em diversos níveis e modalidades do processo educativo; ü Apreensão do processo de construção do conhecimento da educação infantil inseridas em seus contextos social e cultural. ü Capacidade de estabelecer diálogo entre a área educacional e as demais áreas do conhecimento; ü Capacidade de elaborar e desenvolver metodologias, estratégias e materiais pedagógicos adequados ao desenvolvimento do trabalho educativo para classes de Educação Infantil, séries iniciais no Ensino Fundamental, Educação de Jovens e Adultos, Educação Indígena, Educação do Campo, Educação Ambiental tendo em vista as características dos alunos e seu meio social; ü Trabalhar em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em diversos níveis e modalidades do processo educativo; ü Aplicar modos de ensinar diferentes linguagens, Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano, particularmente de crianças; ü - relacionar as linguagens dos meios de comunicação aplicadas à educação, nos processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das tecnologias de informação e comunicação adequadas ao desenvolvimento de aprendizagens significativas; ü Capacidade de atuar na gestão, desenvolvimento e avaliação de projetos educativos em diferentes contextos da prática profissional; ü Capacidade de identificar problemas socioculturais e socioambientais com postura investigativa integrativa e propositiva em face de realidades complexas estabelecendo diálogo entre as demais áreas do conhecimento. (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DO CURSO, p. 22).

Não se quer discutir cada uma das seguintes habilidades e competências, mas perceber que não há algo oculto nelas, ou verdades por de trás, pelo contrário, os enunciados estão claramente escritos falados, esboçados, (CHAVES, 2014). Há de se pensar que o recorte feito, tem muito a ver com o que vimos e sentimos, nada tem a ver com um PPC certo ou errado. No entanto, não significa que estamos neutros nestes recortes, mas no sentido de argumentar a produção do professor pedagogo doravante aos documentos, no caso, o PPC como um documento que não mais produz verdades absolutas, mas inventadas, portanto, abandonamos a ideia de documento que se quer reconstruir o real a partir da memória de fundadores (FOUCAULT, 2012), mas tomamos 87


como uma peça de uma grande engrenagem, que ao desmontá-la, pode se perceber o perfil do professor dentro do discurso como uma invenção no contexto histórico, tornando o “PPC como uma maquinaria engendrada para controlar, regular, normalizar e disciplinar (BASTOS, 2014, p. 98). Essa ideia trazida sobre o PPC por Bastos (2014) pode ser percebida no seguinte excerto do documento analisado: Nessa direção, as diretrizes metodológicas adotadas pelo curso, visando a formação de professores será orientada para o desenvolvimento das competências científicas e profissionais. Para tanto, o curso será um espaço de comunicação, reflexão, interação e intervenção, considerando as distintas dimensões da atuação profissional do pedagogo. Nesse contexto, são indispensáveis conceitos como interdisciplinaridade, flexibilidade didática, que visam precisamente a orientar a formação docente para o objetivo do desenvolvimento de competências. (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DO CURSO, p. 24).

Nele, percebemos que a formação de professores será diretamente direcionada a partir de dois desenvolvimentos, o científico e o profissional, sendo indispensáveis os seguintes conceitos: interdisciplinaridade e flexibilidade. Portanto, o discurso sempre estará nesta luta de poder, em que aparecerá aquela formação mais adequada que se acredita. Outro documento importante para ser trazido para analise é a RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 15 DE MAIO DE 2006. A qual exemplifica as aptidões de um professor egresso, mais precisamente do licenciado em pedagogia: I - atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; II - compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos, de forma a contribuir, para o seu desenvolvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social; III - fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do Ensino Fundamental, assim como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização na idade própria; IV - trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em diversos níveis e modalidades do processo educativo; V - reconhecer e respeitar as manifestações e necessidades físicas, cognitivas, emocionais, afetivas dos educandos nas suas relações individuais e coletivas; VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano; VII - relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação, nos processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das tecnologias de informação e comunicação adequadas ao desenvolvimento de aprendizagens significativas; VIII - promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa, a família e a comunidade; IX - identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a contribuir para superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras; X demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras; XI - desenvolver

88


trabalho em equipe, estabelecendo diálogo entre a área educacional e as demais áreas do conhecimento; XII - participar da gestão das instituições contribuindo para elaboração, implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico; XIII - participar da gestão das instituições planejando, executando, acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais, em ambientes escolares e não-escolares; XIV - realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre alunos e alunas e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas experiências nãoescolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em diferentes meios ambiental- (*) Resolução CNE/CP 1/2006. Diário Oficial da União, Brasília, 16 de maio de 2006, Seção 1, p. 11. 2 ecológicos; sobre propostas curriculares; e sobre organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas; XV - utilizar, com propriedade, instrumentos próprios para construção de conhecimentos pedagógicos e científicos; XVI - estudar, aplicar criticamente as diretrizes curriculares e outras determinações legais que lhe caiba implantar, executar, avaliar e encaminhar o resultado de sua avaliação às instâncias competentes

Destaca-se que não se pode negar que o curso de formação de professores de pedagogia da UFPA, campus Altamira, tem obtido êxito na missão de formar professores com base nos pressupostos estabelecidos no PPC. Tal afirmação decorre da análise realizada nos questionários com os discentes do curso, como podemos vislumbrar nos fragmentos abaixo: Ser um bom professor é ter um olhar atento para lidar com as adversidades dos alunos e principalmente um olhar atencioso para as dificuldades (Alunx 16). Ser professor é contribuir para a formação do sujeito (Alunx 10). Ser professor é ser mediador do conhecimento nas relações de ensino (Alunx 03). Docência é o planejamento educacional voltado à determinada realidade. Ser um professor é pensar nas necessidades de sua comunidade. Quando penso em ser professor logo me vem em mente o desafio de trabalhar coletivamente as transformações. Ministrar aula é valorizar o conhecimento de meu educando. O conhecimento de um professor deve ser sobre o contexto histórico do desenvolvimento de seu país, porque se faz necessário a consciência crítica da realidade social excludente (Alunx 07).

Nos fragmentos pontuamos falas que vão ao encontro com as teorias de Paulo Freire, sendo este o autor mais citado pelos alunos como o teórico com maior influência na sua formação. Destaca-se que muitos outros pensadores idealizaram a educação, e em cada época se consolidou um modelo e formas bem diferentes de se trabalhar os métodos educativos. Nesse processo a economia, a política, religião e a cultura influenciavam diretamente ou indiretamente no processo educacional (LUCKESI, 2012) A Pedagogia Progressista, como afirma Chaves (2013) é um verdadeiro caminho a partir de discursos heterogêneos num panorama geral, porém homogêneos no seu sentido mais micro. Muito mais do que tipologia ou correntes ideológicas, elas indicaram formas de 89


ser, fazer, produzir, formar um bom professor. Na Pedagogia Progressista, há uma infinidade de discursos e enunciados que busca de maneira direta fomentar práticas, e condutas de um bom professor, para tanto este deve ser crítico e reflexivo da própria prática, dele levar a elevar seus pupilos ao status quo de aluno cidadão, capaz de entender os fenômenos científicos, culturais e sociais da sociedade, criticando-os, na busca por um mundo melhor (GARCIA, 2001). Tal tendência ressoa como verdades nos cursos de formação de professores. Tenta aparecer de maneira fechada cada um com as suas práticas, mas acabam se sobrepondo, misturam-se, gerando discursos “que renasce em cada um dos seus pontos, absolutamente novo e inocente, e que reaparece sem cessar em todo o seu frescor (FOUCAULT, 2012, p. 23). Sendo assim, essas questões sobre as tendências são possíveis pensar os professores como sujeito histórico, que se entrelaça e é entrelaçado em sistemas e regimes de verdades postos em mecanismos de poder (BRITO, 2015). Se todos esses discursos não tornarem-se “reais” na prática em sala de aula sobre o ser professor que produziram anseios, vontades e desejos, logo, se o modelo não for alcançado, certamente será o professor alvo de apontamentos negativos pelos outros ou por si, pelo fato de não estarem seguindo o traje de ser um bom professor. A intenção nesta pesquisa não foi proceder a um juízo de valor da tendência progressista, hegemonizando-a ou desqualificando-a, mas, sobretudo, importa aqui demonstrar que os discursos da teoria pedagógica progressista atravessam o currículo do curso de Pedagogia da Universidade Federal do Pará, campus de Altamira, promovendo regimes de verdades, que resultam em práticas discursivas e não discursivas sobre ser professor. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta pesquisa não nos delimitamos na pergunta sobre o que é o professor progressista, mas como ele é fabricado. Assim, os currículos oficiais dos cursos de formação de professores são potentes máquinas de subjetivação, os quais, através dos seus discursos, declinam regimes de verdades sobre o professor progressista. É importante destacar que o currículo é apenas uma expressão material desta realidade. Existe uma série de outros dispositivos que subjetivam o professor como sujeito 90


progressista, mais que isso, impõe não somente esta, mas uma série de outras identidades do professor. Ao final da pesquisa, percebe-se que o currículo do curso de pedagogia da Universidade Federal do Pará, campus de Altamira, declina para uma formação progressista, inspirados principalmente pelos ensinos de Paulo Freire. A produção do discurso do professor progressista já está incorporada na subjetividade de muitos docentes, como foi possível vislumbrar na fala dos discentes do sétimo ano. Todavia, a sala de aula é um campo heterogêneo, compostos de indivíduos singulares, múltiplos em seus modos de habitar o mundo. Os encontros que uma sala de aula proporciona ao professor são capazes de derrubar todos os regimes de verdades estabelecidas, fissurar os modelos, os dogmas e os currículos. Uma identidade docente progressista não resiste à diferença, a violência dos encontros em uma sala de aula quebra estas armaduras. Portanto, uma possibilidade é criar para si novas armas, e criar para si novas formas de ser professor, resistindo a possíveis identidades que determina uma verdade, uma forma de viver no mundo, ou seja, que aprisionam a vida. Não as negar, pois elas estão disseminadas no campo social, mas transitar por entre identidades, vidas e mundos.

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REFERÊNCIAS

BASTOS, S. N. Retrato falado do professor de biologia: ciência e docência em discurso. 2014. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Pará. BRITO, I. B. Ser professor de ciências e matemática: regimes de verdade e processos de subjetivação. 2015. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Pará. CHAVES, S. N. Um currículo para despertar adultos e adormecer crianças. In: CHAVES, Sílvia N.; SILVA, Carlos Aldemir F.; BRITO, Maria R. (Org.). Cultura e Subjetividade: Perspectivas em Debate. 1ed.São Paulo: Editora Livraria da Física, 2016, v. 1, p. 215-226. FOUCAULT, M. A Arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense, 2012. FOUCAULT, Ml. Ordem do discurso (A). Edições Loyola, 1996. FIGUEIREDO, N. O. S. MÍDIA, CULTURA E IDENTIDADE: FRAGMENTOS DE UM OLHAR. Revista Memento, v. 4, n. 2, 2014. GARCIA, M. M. A. O sujeito emancipado nas pedagogias críticas. Educação e Realidade, v. 26, n. 2, p. 31-50, 2001. LUCKESI, C. C. Tendências pedagógicas na prática escolar. ______. Filosofia da Educação. São Paulo: Cortez, 2012. MAKNAMARA, M. Breve Narrativa de ser monstro. In: CHAVES, Sílvia N.; SILVA, Carlos Aldemir F.; BRITO, Maria R.. (Org.). Cultura e Subjetividade: Perspectivas em Debate. 1ed.São Paulo: Editora Livraria da Física, 2016, v. 1, p. 215-226. OLIVEIRA, D. A. A escola na contemporaneidade: reflexões sobre suas funções sociais, política e pedagógica. 2016. SANTOS, H. S. S. ; BRITO, M. R. ; SILVA, C. A. S. . Processos de subjetivação no ensino de ciências: a sexualidade para além do sexo biológico no desenho animado 'os pinguins de madagascar'. Revista de Ensino de Biologia da Associação Brasileira de Ensino de Biologia (SBEnBio), v. 9, p. 4878-4887, 2016. VALENZUELA, S. T.; CUNHA, M. Z.; GUIMARÃES, L. Dossiê Literatura e Educação: panorama histórico, análise, discussão, relatos de experiências, tendências e perspectivas. Literartes, n. 4, p. 8-11, 2015. ZANLORENZI, C. M. P.; NASCIMENTO, M. I. M. A revista A Escola e a educação brasileira no início do século xx. Imagens da Educação, v. 7, n. 1, p. 24, 2017.

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A UTILIZAÇÃO DE CARTÕES RESPOSTAS PARA IDENTIFICAR DEFICIÊNCIAS NA APRENDIZAGEM Gilson Tadeu Pinto de Andrade1 Mauricio dos Santos Macedo2

RESUMO Aproveitando a experiência profissional dos professores, tanto em sala de aula, um sendo professor de Química e outro sendo professor de Matemática, quanto na pratica de computação, foi realizado um trabalho para melhorar a análise do rendimento dos alunos a partir das respostas usadas nos testes utilizando o cartão resposta. A ideia era encontrar, em seguida organizar, grupos de alunos com as mesmas dificuldades de aprendizagem, com isso fazer outros exercícios já direcionados em cima das deficiências encontradas no primeiro momento. Assim é possível detectar e trabalhar as deficiências no processo de ensino-aprendizagem. E o trabalho do professor fica mais direcionado em cima dessas deficiências. A pesquisa aconteceu na escola estadual Dom Mário de Miranda Vilas Boas no município de Bujaru, no estado do Pará. Foi usada uma turma de 37 alunos na pesquisa. O teste inicial aconteceu com a disciplina de Química, mas pode ser feita com qualquer disciplina, desde que tenha a interação entre os professores dessa disciplina e a equipe da pesquisa. Os resultados foram bastante satisfatórios, pois tanto o professor quanto o aluno perceberam sua evolução no determinado assunto analisado depois da metodologia implementada pelo professor juntos aos alunos e a utilização do cartão resposta. Palavras-chave: Computação. Cartão. Aprendizagem. Deficiências. 1. INTRODUÇÃO O processo de ensino-aprendizagem depende de muita habilidade dos atores envolvidos, tanto os que ensinam quanto os que estão a aprender. Dentro desse contexto, a tecnologia está para melhorar essa relação. E o uso de computadores e seus recursos ampliam o leque de opções para buscar melhores soluções para o ensino de determinado tema. De acordo com Bastos (2002: [...] a informática pode contribuir com a educação no sentido em que oferece recursos que podem valorizar e tratar o erro, numa visão construtivista. Com os softwares educativos, que são desenvolvidos com os objetivos educacionais, a informática também oferece ferramentas capazes de auxiliar o professor a entender e motivar o aluno na busca de novos conhecimentos, respeitando a individualidade de cada aluno, e ao mesmo tempo, aproveitando características comuns existentes no dado grupo a que se propõe trabalhar (BASTOS, 2002, p. 22 e 23)

A ideia da pesquisa foi gerar um produto que não dependa da internet, pois muitas escolas ainda não têm acesso fácil a conexão com provedores de internet. Mas com um Professor de Química pela SEDUC-PA, Licenciatura em Computação. E-mail: tjpaquimica@gmail.com Professor de Matemática pela SEDUC-PA, Mestre em Ensino de Matemática-UEP. mauriciodosmacedo@gmail.com

1 2

E-mail:

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scanner3de mesa, um script4 em shell5 para controlá-lo, um código java6 para ler, interpretar os cartões respostas e criar um simples relatório em txt7 ou html8, pode-se identificar deficiências apresentadas por grupos de alunos dentro do conteúdo ministrado. Essa é uma alternativa que vem sendo discutida nas revistas do SISPAE (Sistema Paraense de Avaliação Educacional), que avalia o ensino no estado do Pará. Logo, o foco da nossa pesquisa é voltado para melhorar o ensino e aprendizagem, e com isso melhorar os resultados dessas avaliações locais e nacionais. Figura 1: Scanner

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

Figura 2: Script

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

Aparelho de leitura ótica que permite converter imagens, fotos, ilustrações e textos em papel, num formato digital que pode ser manipulado em computador. 4 Texto com uma série de instruções escritas para serem executadas por um programa de computador. 5 Interpretador de instruções e comandos do Linux. 6 Linguagem de programação interpretada e orientada a objetos. 7 Um arquivo de texto. 8 Linguagem de programação que utilizamos para desenvolver sites para internet. 3

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Figura 3: Relatรณrio

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

Figura 4: Cartรฃo resposta

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

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Figura 5: Janela do sistema de leitor de cartão

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

E através das deficiências encontradas ir montando novas atividades para melhorar o entendimento dos alunos quanto a determinados assuntos. 2. A MOTIVAÇÃO PARA A PESQUISA O desafio dos educadores hoje é fazer os alunos se concentrarem. Quando analisamos as escolas públicas o desafio é maior, visto que os recursos que as escolas possuem são poucos e nem sempre “atraentes” aos alunos. Borba (2003) afirma O conhecimento não é produzido somente por humanos, mas também por atores não humanos. As tecnologias são produtos humanos, e são impregnadas de humanidade, e reciprocamente o ser humano é impregnado de tecnologia. Neste sentido, o conhecimento produzido é consignado pelas tecnologias (BORBA, 2003, p. 305)

A escola normalmente possui computador, muitas têm laboratórios de informática, mas nem sempre possuem internet. Na escola que fizemos a pesquisa, escola estadual de ensino fundamental e médio Dom Mário de Miranda Vilas Boas, localizada no município de Bujaru, interior do Pará, existe pouco acesso dos alunos à internet. Uma das reclamações dos professores é quanto a quantidade de alunos em sala de aula. Os efeitos imediatos da estrutura da sala de aula para a sua saúde são os relatos de 96


insônia, ansiedade, irritação e estresse, aspectos agravados com a precariedade da estrutura escolar, conforme observado por Brito e Gomes: Os/as professores/as têm de lidar com as variabilidades ligadas aos recursos materiais, que vão desde a falta de conservação das instalações do prédio da escola, à falta ou péssimas condições de materiais como: cadeiras, carteiras, livros, materiais didáticos; da falta de água até a falta de papel, giz e apagador. A carência ou as más condições dos recursos materiais faz com que atividades aparentemente simples se transformem em verdadeiros desafios, sobretudo se considerarmos as várias jornadas de trabalho assumidas. (BRITO e GOMES, 2006, p.56):

Na escola que fizemos a pesquisa, escola Dom Mário de Miranda Vilas Boas, a média de alunos por turma são de 40 alunos. A parte mais difícil no processo de ensino-aprendizagem para o professor é detectar as deficiências de cada aluno da turma, pois fica difícil analisar aluno por aluno quando a turma é grande. Visando facilitar essa detecção de deficiências é que pensamos numa análise em cima dos cartões respostas nas avaliações dos alunos. O cartão resposta será visto como uma ferramenta de construção do conhecimento, ou melhor, será o primeiro passo nessa construção de conhecimento e detecção das dificuldades dos alunos. A metodologia que auxiliou o processo de ensino-aprendizagem a partir do instrumento avaliativo cartão resposta, foi a Resolução de Problemas. Através desta metodologia, os alunos iniciaram um processo de desenvolvimento das habilidades, visando a construção de uma sociedade mais justa, ética, democrática, responsável, inclusiva, sustentável e solidária. A perspectiva apresentada por Calderano (2010) sobre avaliação pode ser citada aqui como forma de refletir sobre este processo no campo profissional: Compreender o que se passa dentro da lógica do senso comum, dialogar com essa lógica reconhecendo-a por dentro, identificar seus “pontos frágeis” constituem uma condição indispensável para – do ponto de vista subjetivo da avaliação – transformar praticas cotidianas pouco refletidas em práticas orgânicas, aguçando o desejo de superação das debilidades encontradas nesse cotidiano. Do ponto de vista objetivo da avaliação, e condição para gerar as condições necessárias para tal superação tanto do ponto vista micro quanto macro da avaliação. (CALDERANO, 2010, p.46;47)

Quando distribuímos as questões numa prova ou teste por competências e habilidades ficará mais fácil de percebemos as deficiências através de suas respostas no cartão resposta. Assim conseguiremos agrupar alunos com dificuldades de aprendizagem semelhantes. Então, partindo dessa ideia, criamos um programa para gerar relatórios a partir do cartão resposta. Serão esses relatórios que facilitarão o ensino-aprendizagem em sala de aula.

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3. METODOLOGIA Primeiro criamos o programa para ler o cartão resposta. Depois escolhemos algumas habilidades e competências na disciplina de Química. Lembrando que pode ser feito com qualquer disciplina. No código em java relacionamos as questões marcadas nos cartões, com partes do conteúdo programático, desejando-se verificar o percentual de domínio do aluno. Após a análise dos resultados do primeiro teste, focamos algumas deficiências em comum dos alunos, na qual selecionamos a “baixa interpretação” de texto para fazermos um trabalho específico. Como a interpretação é base para a análise de questões que envolvem cálculo e raciocínio lógico, criamos um aplicativo em HTML e Javascript9, no qual é de fácil instalação tanto nos computadores quanto em smarthfones10, e que trabalha em fases, onde o aluno só avança uma fase se conseguir acertar as atividades propostas na sequência. Dividimos a atividade geral em três fases. Na primeira fase o aluno completa lacunas com o acompanhamento do texto, como na figura 6. Com isso começamos a fortalecer a habilidade da leitura do aluno. Figura 6: Modelo de atividade da primeira fase.

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

9

É uma linguagem de programação baseada em scripts. É um telefone celular que inclui programas executados num sistema operacional, equivalente aos computadores.

10

98


Na segunda fase o aluno completa lacunas, mas agora sem a presença do texto, assim trabalhamos a habilidade de relembrar o texto usado na primeira fase. Com isso percebemos se o aluno conseguiu unir a ideia da palavra com o seu significado. Um exemplo dessa atividade está na Figura 7. Figura 7: Modelo de atividade da segunda fase.

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

Na terceira fase o aluno responde com Verdadeiro ou Falso, como na

figura 8.

Nessa etapa o aluno já tem a competência para afirmar sua resposta de acordo com o conhecimento que foi adquirido nas fases anteriores, com isso a habilidade de “interpretar” é trabalhada com o aluno. Assim estabelecemos o processo de ensino-aprendizagem. Figura 8: Modelo de atividade da terceira fase.

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

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No final das fases o aluno irá ver sua porcentagem de acertos e com isso ele percebe sua aprendizagem. Isso está identificado na figura 9.

Figura 8: Janela com o percentual de acertos.

Fonte: Pesquisa dos autores (2017)

Quando constatamos progresso, referente ao conteúdo, pode-se novamente agrupar outros

alunos

que

mostraram

deficiência

na

segunda

análise.

Faz-se

novamente a estratégia, verificando-se seus progressos, a partir dos cartões. A vantagem principal de se utilizar os cartões, está na velocidade de se determinar a deficiência dos alunos. A outra vantagem é de não precisar acessar internet ou computadores de última linha. Em um período de quatro dias foram feitas análises em várias turmas do ensino médio, procurando determinar as deficiências dentro do conteúdo de “Polímeros”, relacionado a disciplina Química. A nossa pesquisa ficou concentrada numa turma do terceiro ano do ensino médio, onde participaram 37 alunos nos testes aplicados. Depois de aplicado os testes partimos para a verificação dos relatórios. Desses relatórios monta-se nova estratégia de ensino. Por fim analisamos a eficiência do uso cartão de resposta no auxílio do processo de ensino-aprendizagem.

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ANÁLISE DE RESULTADOS No quesito importância da ferramenta, tivemos que 55,17% compreenderam essa importância elevando-se para 86,49% em um segundo momento.

Sobre o aluno compreender a relação existente entre monômeros e polímeros, tivemos 34,48% dos alunos compreendendo no primeiro momento e 67,57% no segundo.

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Sobre diferenciar os polímeros naturais dos sintéticos, saímos de uma situação inicial de 41,38% dos alunos compreendendo para 59,46%.

Na definição de plástico, uma boa parte dos alunos tiveram esta compreensão, no primeiro momento 82,76%, aumentando esta quantidade para 91,89%.

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O último gráfico mostra que a maioria conseguiu diferenciar as estruturas das cadeias poliméricas 93,10%, e em um segundo momento todos os alunos reconheciam os polímeros de cadeias lineares, ramificadas e reticuladas.

Apesar de ser conteúdo de Química, onde os alunos, do ensino médio, apresentam grandes dificuldades de compreensão, o recurso utilizado, aliado a vídeos, que exigiam do aluno total atenção e concentração, trouxe grandes avanços na relação entre eles próprios e entre eles e a metodologia, pois pelo pouco tempo de trabalho que tinham, precisavam retirar as informações necessárias para a compreensão do conteúdo. O cartão resposta foi o facilitador para fazermos as análises da aprendizagem dos alunos envolvidos na pesquisa. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Quando pensamos neste trabalho, o objetivo era criar uma ferramenta que auxiliasse os professores a terem resultados dos alunos com mais facilidade, principalmente nas avaliações, e com isso buscar metodologias de ensino para ajudar os alunos a superar essas dificuldades.

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Os professores que estão fazendo uso do recurso na escola Dom Mário de Miranda Vilas Boas, em Bujaru, estão sentindo o progresso dos seus alunos, e avaliam como positivo o auxílio do cartão resposta e os relatórios para ajudá-los no trabalho dentro do processo de avaliação. O projeto então é mais um recurso para a escola e os professores. E os recursos sempre são bem-vindos para motivar os alunos no processo de ensino e aprendizagem. E os professores terão uma excelente ferramenta para auxiliá-los nessa etapa difícil da aprendizagem que é “reconhecer as dificuldades” dos alunos. Os resultados estão mostrando que nosso objetivo está sendo alcançado dentro da escola. Esperamos que mais professores possam conhecer e usar o nosso trabalho. E como a pesquisa não para, já estamos trabalhando num novo projeto aonde usaremos o celular para captar as respostas do cartão resposta. Assim esperamos produzir resultados ainda mais rápidos para a escola.

REFERENCIAS BASTOS, Maria Helena Câmara. Pro PatriaLaboremos: Joaquim José de Menezes Vieira (1848 – 1897). Editora EDUSF: Bragança Paulista/SP. 2002. BORBA, M.C., PENTEADO, M.G. Informática e Educação Matemática. Belo Horizonte. 2003. CALDERANO, Maria da Assunção. Avaliação da aprendizagem escolar: riscos e necessidades dentro do processo de formação de professores DALBEN, Angela Imaculada. L. F. (Org.) Convergências e tensões no campo da formação e do trabalho docente. (Coleção Didática e Prática do Ensino) Belo Horizonte: Autêntica, 2010. GOMES, Luciana & BRITO, Jussara. Desafios e possibilidades ao trabalho docente e à sua relação com a saúde. Estudos e Pesquisas em Psicologia, UERJ, RJ, ano 6, n.1, 1ºsemestre de 2006.

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GESTÃO DE PROCESSOS: UMA ANÁLISE DA COORDENAÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA SEDUC/PA NO ANO DE 2010 Nícolas Pinto Alves1 RESUMO O presente artigo tem como objetivo investigar a gestão de processos que tramitaram na Coordenação de Educação Infantil – CEINF que está vinculada a Diretoria de Educação Infantil e Ensino Fundamental – DEINF da Secretaria Adjunta de Ensino – SAEN da Secretaria de Estado de Educação do Pará - SEDUC. Para isso, utilizou-se da metodologia de caráter quali-quantitativa, tendo sida, inicialmente, realizada a pesquisa bibliográfica e, posteriormente, a pesquisa de cunho documental, assim como um estudo de caso com aplicação de questionários junto aos servidores e usuários da CEINF no ano de 2010. Foram consideradas e analisas as variáveis: Transparência na Tramitação de Processos, Tempo de Tramitação de Processo e Formação Continuada dos Servidores da CEINF e como as mesmas influenciaram na gestão de tramitação de processos sob a ótica dos servidores e usuários que se configuram o público-alvo da pesquisa. Os artigos em questão propõem algumas possibilidades no sentido de otimizar a gestão de processos tanto no curto como a longo prazo visando uma gestão mais eficiente para a administração púbica que perpassa por uma ênfase na transparência da gestão pública estadual. Palavras-Chave: Gestão. Processos. Tramitação.

1. INTRODUÇÃO Eficiência, eficácia, compromisso, ética e celeridade são itens que orientam o serviço público na busca de resultados na prestação de serviços. No entanto, o cotidiano nos órgãos públicos é marcado por inúmeros limites, sendo um deles a morosidade no fluxo de processos. O presente artigo examina o assunto e suas variáveis a partir do relato de experiência no setor da Coordenadoria de Educação Infantil - CEINF da Secretaria de Estado de Educação do Pará, no ano de 2010. Para este estudo será utilizada metodologia de caráter quali-quantitativa, tendo sida realizada a pesquisa bibliográfica e documental e um estudo de caso com aplicação de questionários junto aos servidores e usuários da CEINF. O trabalho identifica os pontos de estrangulamentos e sugere alternativa para melhorar a qualidade dos serviços prestados por esta coordenação. Sobre o recurso estudo de caso, Teixeira (2009, p. 27) adverte que o mesmo possibilita reduzir a distância entre a teoria e os dados, entre o contexto e a ação. E ainda colide com a experiência pessoal (...) as experiências pessoais do pesquisador são elementos importantes na análise e compreensão dos fenômenos estudados. 1

Secretaria de Estado de Educação; Especialista em Metodologia do Ensino Superior – UEPA; npastm@gmail.com

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Objetivou-se observar o cotidiano do setor para obter subsídios para determinar as categorias que serviriam de análise para a elaboração do questionário. A amostra é composta por 39 informantes consultadas para a avaliação sobre o fluxo de processos. Todos os técnicos em educação (total de 13 funcionários) preencheram os questionários, vinculados a CEINF totalizando 12 (doze) servidores da coordenação e 27 usuários (diretores de escola, professores, técnicos administrativos, etc) que compareceram a Coordenação nos meses de setembro a dezembro de 2010. A coleta de dados dos usuários apresentou algumas dificuldades, pois além do número reduzido, muitos usuários não aceitaram participar da pesquisa. A alegação foi a falta de tempo, por terem de se dirigir aos demais setores. Para tentar obter o maior número possível de questionários utilizou-se como estratégia o envio e recebimento dos mesmos por meio do correio eletrônico (e-mail). Esta estratégia logrou êxito, possibilitou a coleta de 25 (vinte e cinco) questionários. Os elementos que norteiam o questionário são: transparência na tramitação de processo, tempo de tramitação de processo, formação continuada dos servidores da CEINF e estrutura organizacional da SEDUC. A motivação para abordar este tema deve-se ao fato de estar vinculado a uma instituição pública. A vivência na rotina administrativa, a morosidade no fluxo de processos e as respectivas reclamações dos usuários dispararam o gatilho para a elaboração do presente estudo. O serviço público22 de qualidade é direito essencial para os cidadãos brasileiros. Prestá-lo com qualidade é um escopo a ser perseguido pela administração pública em geral, que desde a década de 1990 vem implantando mecanismos gerenciais do setor privado.

REFORMA ADMINISTRATIVA - BREVE HISTÓRICO O serviço público, em parte, é considerado pelos usuários brasileiros como ineficiente. As alegações são as mais diversas: má qualidade no atendimento, morosidade

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No texto constitucional brasileiro o termo serviço público segundo Medeiros (2009) foi utilizado pela primeira vez em 1934 e, de lá para cá, passou a figurar em todas as Constituições. O serviço público de qualidade é o um direito estabelecido pelo art. 37 da Constituição Federal de 1988 a todos os usuários pautados nos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Este último inserido por meio da Emenda Constitucional de n° 19, de 1998 na tentativa de otimizar o serviço público.

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e falho, Batista (1996, p.7) interpreta que um dos problemas crônicos do setor público no Brasil é a predominância de uma prática gerencial fundamentada em estruturas com excessivos níveis hierárquicos e departamentos. Isso gera lentidão administrativa, comunicação formal, burocrática e lenta, além de serviços e produtos que não satisfazem à população. Para Bresser Pereira (2009, p. 12) ao investigar a administração pública no Brasil assinala que o Estado brasileiro passou por duas grandes reformas administrativas – a burocrática, iniciada em 1937, e a gerencial, que começa em 1995. A primeira ocorreu no primeiro governo Vargas e teve como objetivo transformar a administração pública brasileira que até então era patrimonial em um universo profissional baseado no Estado de direito e na competitividade técnica; mas amplamente visava tornar o aparelho do estado efetivo, capaz de garantir seu próprio sistema constitucional-legal. Já em relação à segunda reforma que teve início no último quartel do século XX, no Estado Democrático Social europeu com o objetivo de tornar o aparelho do Estado mais eficiente. Araújo (2008: p.39) concorda que o conceito de serviço público deriva do tipo de Estado vigente no momento histórico. A reforma burocrática aconteceu pouco após a grande depressão de 1929. O Brasil passava por mudanças significativas na economia intensificando o processo de industrialização. A administração burocrática foi decisiva para superar a administração patrimonial que confundia público com o particular. Bresser Pereira (1996, p.10) ressalta que naquele momento histórico a administração pública burocrática clássica foi adotada por ser uma alternativa superior à administração patrimonial do Estado. Os princípios da administração burocrática clássica foram introduzidos no país através da criação, em 1936, do DASP – Departamento Administrativo do Serviço Público. A criação do DASP representou não apenas a primeira reforma administrativa do país, com a implantação da administração pública burocrática, mas também a afirmação dos princípios centralizadores e hierárquicos da burocracia clássica, enquanto administração gerencial apresentou a sua primeira manifestação em 1938 com a criação da primeira autarquia, Pereira (1996, p. 6). Ao refletir sobre o contexto do final do século, assombrado por diversas crises econômicas mundiais no setor de energia, o Brasil viveu um período de estagnação de renda per capita e da alta inflação sem precedentes. Uma crise da forma burocrática pela qual o Estado é administrado e que era urgente montar uma administração não apenas profissional, mas também eficiente e orientada para o atendimento das demandas dos cidadãos, Pereira 107


(1996, p. 2). Surge, então, a administração pública gerencial com dois objetivos bem delineados: promover o ajuste fiscal dos entes da federal, bem como tornar mais eficiente a administração pública mediante sua modernização. A grande qualidade da administração pública burocrática é a segurança e efetividade. Por isso, no núcleo estratégico, onde estas características são muito importantes, ela deverá estar ainda presente, em conjunto com a administração pública gerencial. Nos demais setores, onde o requisito de eficiência é fundamental, dado o grande número de servidores e cidadãos-clientes ou usuários envolvidos, o peso da administração pública burocrática deve diminuir. LEGISLAÇÃO CONSTITUCIONAL Na atual Constituição Federal de 1988, o caput do artigo 175 faz menção ao termo destacando a responsabilidade do poder público na sua oferta, pois “Incumbe ao poder público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços público”. Já o art. 37 da Constituição Federal de 1988 no seu caput determina que o serviço público Obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” visando prestar um serviço de qualidade. Este mesmo artigo em seu desdobramento do inciso XXII ressalta que “A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: I - as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, e interna, da qualidade dos serviços; II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII” como forma de prestar um serviço público eficiente.

O princípio da eficiência, implementado pela Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998, trouxe uma nova perspectiva de administração pública no Brasil, emergindo o Estado Gerencial. Outro princípio fundamental que surgiu como o advento da administração pública gerencial está assegurado na Emenda Constitucional nº 45 de 30 de dezembro de 2004. O Art. 5º, Inciso LXXIII essa Emenda determina que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. Estes dois últimos princípios constitucionais, apesar do tempo que estão vigorando são pouco observados pelos servidores públicos em geral, visto que é muito comum 108


encontrar órgãos públicos, na atualidade, que ainda adotam a tendência burocrática como a predominante. A SEDUC é um exemplo. A SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PARÁ E A GESTÃO DE PROCESSO. A Secretaria de Educação do Estado do Pará foi criada por meio da Lei Nº 400, de agosto de 1951 publicada no Diário Oficial de 06/09/1951 como se observa no caput do Art. 1º “Ficam criadas as Secretarias de Estado do Interior e Justiça, de Economia e Finanças, de Obras, Terras e Viação, de saúde pública e Educação e Cultura”. Durante sua história a SEDUC vivenciou muitas mudanças e, atualmente, segundo a Coordenadoria de Recursos Humanos – CRH possui mais de 30 mil funcionários vinculados. O Decreto nº 1.078, de 22 de junho de 2004, publicada no Diário Oficial em 23/07/2004, instituiu a última organização legal da Secretaria, todavia na prática verifica-se outra estrutura organizacional com características distintas do oficial. Esta diferença entre a estrutura oficial e estrutura real causa um grande entrave no desenvolvimento de práticas que primam pelo princípio da eficiência na administração pública. Os setores que trabalham para atender tal princípio devem atentar para a estrutura oficial. A estrutura da SEDUC é integrada por três Secretarias Adjuntas: Gestão, Logística e Ensino. Esta última, por sua vez, é dividida em sete Coordenadorias dentre elas a Coordenadoria de Educação Infantil e Fundamental – CEINF. Entretanto, na prática temos a Diretoria de Educação Infantil e Ensino Fundamental – DEINF que corresponde a CEINF, que é composta pela Coordenação de Educação Infantil e Coordenação de Ensino Fundamental.

A GESTÃO DE PROCESSO NA COORDENAÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL – CEINF. O sistema interno responsável pela logística de gestão dos processos chama-se SIIG Sistemas Integrados SEDUC que vem sendo, paulatinamente, automatizado com inclusão de novas ferramentas e possibilitando a informatização dos serviços vinculados a SEDUC. Estas ferramentas são disponíveis aos funcionários cadastrados. O sistema possibilita verificar a tramitação, bem como análise de processos entre outros serviços. Entretanto, para acompanhamento dos processos pelos usuários a SEDUC possui dois caminhos: acessar o link(http://www.seduc.pa.gov.br/siig_portal/view/protocolo/) 109


no sitio da SEDUC, mas as informações são superficiais, pois possibilita apenas informar o local onde se encontra, sem informar quanto tempo estar no setor, nem mesmo o responsável pelo processo. O uso da ferramenta é pouco difundido pela Secretaria, como será possível observar na análise dos questionários. A segunda forma de acompanhar os processos é o deslocamento até a sede da SEDUC localizada na Avenida Augusto Montenegro km 10. Entretanto, os setores só atendem se estiverem com a ficha de acompanhamento atualizada. Para isso, os usuários têm de se submeter às filas do protocolo, mesmo que seja para uma rápida impressão. O acesso aos processos pode ser feito somente no horário das 8h às 14h, de segunda a quinta-feira, horário de funcionamento do protocolo. Dividimos a análise das quatro questões centrais dos questionários em dois grupos: funcionários e usuários. Iniciaremos pela análise dos dados dos funcionários. Destaca-se que durante os meses de setembro á dezembro de 2010, 168 processos foram analisados. TRANSPARÊNCIA NA TRAMITAÇÃO DE PROCESSOS Quando questionados sobre como os técnicos em educação avaliavam acesso a tramitação de processo, sete funcionários afirmaram que tinham acesso aos processos. Todos estes estavam cadastrado no SIIG. Todavia, cinco informaram que tinham dificuldades em acessar processo pelo fato de não terem sido cadastrados no SIIG. Dentre as respostas dos pesquisados destaca-se: Quem está cadastrado no SIIG não tem problema para acessar qualquer processo, mas quem ainda não tem a senha para acessar o SIIG tem que contar com a bondade dos colegas”. Técnica em educação Y. É interessante destacar que os cadastros dos técnicos em educação são feitos pela chefia. E esta somente disponibiliza o cadastro aos técnicos que o solicitam. Esta atitude faz com que haja diminuição do número de técnicos aptos a analisarem processos, o que ocasiona uma sobrecarga aos técnicos que possuem cadastro no SIIG. O ideal seria que todos os técnicos fossem cadastrados no SIIG, visto que todos possuem as mesmas atribuições. Quando questionado acerca dos assuntos mais solicitados no setor percebe-se que há uma grande diversidade de temas como se observa no gráfico 1 logo abaixo: Gráfico 1 Tipos de processos mais comuns apontados pelos técnicos em educação da CEINF 110


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12

12

10

9

9

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6

4

4

4

3

2

2

0 Solicitação de Solicitação de Renovação ou Solicitação de Solicitação de Solicitação de Solicitação de Pagamento de diárias passagens solicitação de bolsa de materiais reforma materiais de palestrantes convêncio estudos permanentes consumo

Fonte: Questionários dos Funcionários da CEINF.

Entres os temas apresentados no gráfico supracitado predominam: solicitação de passagens e solicitação viagens. Os tópicos referentes à estrutura física das unidades de educação infantil ficaram entre os temas menos solicitados. TEMPO DE TRAMITAÇÃO DE PROCESSO A primeira questão intitula-se: Como você avalia o tempo de tramitação dos processos na CEINF?. Os 12 técnicos em educação da CEINF foram unânimes em afirmar que o tempo de tramitação é muito longo, como se pode comprovar na fala do técnico em educação A: O tempo de tramitação dos processos na SEDUC é muito grande e na CEINF não é diferente, pois não temos um tempo máximo para emitir parecer e, às vezes, somos questionados pela chefia imediata acerca de um ou outro processo.

Já o técnico em educação B adverte que: O tempo de tramitação é muito longo, tanto para os usuários, como para os funcionários. Tem processo com mais de seis meses que ainda está na CEINF. Essa situação é vivenciada na SEDUC e a nossa Coordenação também se inclui nesse contexto.

Quando se trata do tempo de tramitação dos processos, os funcionários da CEINF avaliam que é muito extenso e não tem diferença entre servidores e usuários. A situação ocorre pelo fato de não haver normatização do tempo necessário para tramitação do processo até o seu desfecho. Quando questionado acerca do tempo de tramitação de processos de outras coordenações e diretorias, observou-se que nove técnicos em educação seguiram a mesma tendência da questão anterior, e indicaram que há uma demora demasiada de outras

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diretorias e coordenadorias em emitir parecer. A fala do técnico em educação C destaca essa situação. Como não existem regras estabelecendo o tempo máximo de tramitação por tipo de processo, e nem por permanência por setores verifica-se que os setores não são pressionados a emitir parecer, e com isso cada setor estabelece o sue próprio tempo de tramitação de processo. Uns levam meses com processos.

Entretanto, três técnicos avaliaram que as coordenações e diretorias apresentam um tempo normal no que se refere à tramitação de processo. Essa afirmativa pode ser observada na fala do técnico em educação D: Pela demanda de atividades dentro da SEDUC, acredito que os departamentos têm correspondido relativamente bem, pois nós temos diversas atribuições, e analisar processos é somente uma delas. Ainda tem o problema de número reduzido de funcionários.

A pergunta seguinte do questionário indagou os técnicos em educação acerca de existir um tempo máximo para análise de processo. Assim como já havia acontecido anteriormente verificou-se que todos os entrevistados afirmaram que não existe qualquer documento que estabeleça o tempo máximo de tramitação de processo por setor ou por assunto. A respeito desse questionamento ressalta-se a fala do técnico em educação E: Essa questão de tempo máximo para despachar processo é um problema crônico na SEDUC, bem como na CEINF, pois não existem documentos oficiais formalizando o tempo máximo por setor e por assunto. Com isso, despachamos de acordo com o nosso bom senso.

Outra fala significativa foi identificada na afirmativa do técnico em educação F: Não existe controle de tempo que cada processo pode passar na CEINF. Essa realidade está presente em toda a SEDUC. Quando acessamos o SIIG, o máximo que visualizamos sobre a questão do tempo é o período estimado de tramitação do processo que, na maioria das vezes, não é respeitado.

Em relação ao tema os funcionários da CEINF são críticos, e consideram a falta de controle e regras como um dos fatores que mais influenciam no tempo de tramitação de processos. A última pergunta que trata dessa categoria tem como finalidade avaliar a participação da Coordenação, no sentido de promover o melhor fluxo de processos. Para essa indagação obteve-se um equilíbrio nas respostas, pois sete técnicos afirmaram que a coordenação da CEINF não tem se empenhado para melhorar o fluxo de processos, enquanto que cinco técnicos afirmaram que a coordenação tem desempenhado um bom trabalho no sentido de melhorar o fluxo de processos. 112


Foram selecionadas algumas falas que ressaltam essa dicotomia que envolve a presente questão. A coordenação da CEINF raramente nos questiona sobre os processos que estão sob nossa responsabilidade, e esse fato acaba gerando um certo conforto para alguns colegas de trabalho prejudicando, as vezes, a reputação do nosso setor,(Técnico em educação G.)

Para o técnico em educação H a situação é diferente como se pode observar: A coordenadora da educação infantil regularmente nos questiona sobre o andamento de processos, mas alguns amigos da CEINF não se preocupam em emitir parecer, somente quando os interessados vêm a nossa coordenação pedindo informação.

A questão é polêmica no cotidiano da CEINF, e como se observou nas falas dos técnicos supracitados, existem divergências entre os servidores da CEINF. Entretanto, é necessário ressaltar que sete servidores afirmaram que a coordenação da CEINF não otimiza o fluxo de processos. Para Osório (2005: p. 02) que existem diferenças entre administrador e gestor. [...] O novo gestor tem mais liberdade, atua mais horizontalmente, está mais comprometido com resultados do que propriamente como o processo. Pereira (1996: p. 12) comunga do mesmo pensamento quando afirma que uma das principais responsabilidades dos gestores é a administração por resultados. Seguindo analisando os resultados do questionário dos técnicos em educação farse-á um estudo das falas referentes à estrutura organizacional da SEDUC. ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA SEDUC Sobre a estrutura organizacional foram realizados dois questionamentos: 1) Como você avalia, fisicamente, a organização das coordenações e diretorias da SEDUC? 2) E se a CEINF apresenta infraestrutura necessária para que os técnicos possam desenvolver suas atividades com eficiência? Quando indagados pela organização das coordenações e diretorias dez técnicos afirmaram que a atual disposição é considerada como adequada para a estrutura da SEDUC. O técnico em educação J destaca que “A atual organização dos setores da SEDUC é mais acessível”. Todavia, dois discordaram destacando que “A Diretoria Financeira que atualmente encontra-se no segundo andar, deveria se deslocar para o térreo, pois existem outras gerências que necessitam de informações da Diretoria” (Técnico em Educação K).

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Entretanto, quando questionados se a CEINF apresentava infraestrutura para desenvolverem suas atividades com eficiência, a resposta foi bem diferente, pois todos os técnicos afirmaram que as condições são precárias, como se verifica no relato do técnico em educação L: Nesse aspecto a CEINF tem muitas dificuldades, pois para essa coordenação são disponibilizados somente cinco computadores para treze funcionários e a maioria trabalha pelo turno da manhã. Dessa forma, é muito comum colegas de trabalhos ficarem sem computador para trabalhar (Técnico em educação L).

O técnico em educação M ratifica as precárias condições da infraestrutura da CEINF: A falta de infraestrutura é tão grande que atividades simples como a impressão de documentos se torna um desafio, pois quando tem papel não tem tinta na impressora, e vice e versa, como podemos desenvolver um trabalho de qualidade nessas circunstâncias? (Técnico em Educação M).

Segundo Osório (2005: p. 12) falar em eficiência, qualidade, e todos os demais pilares da boa gestão pública, sem antes passarmos pela consolidação de uma máquina administrativa estável e bem estruturada, é, no mínimo, incorrer num intolerável equívoco discursivo. A infraestrutura tem sido apontada como um entrave no desenvolvimento das tarefas no cotidiano da CEINF. A situação compromete a produtividade dos técnicos em educação. Reivindicações para melhoria desse aspecto na CEINF são constantes, e alguns avanços têm ocorrido como, por exemplo, a instalação de duas impressoras laser, todavia ainda está muito aquém das condições ideais. FORMAÇÃO CONTINUADA DOS SERVIDORES DA CEINF O presente item tem como objetivo observar como os técnicos em educação da CEINF analisam a formação continuada promovida pela SEDUC. Foram realizadas duas indagações: 1) Como você avalia a formação continuada disponibilizada aos servidores da CEINF? 2) E como você avalia a formação continuada disponibilizada aos servidores da CEINF para operacionalizar o SIIG? Quando questionados acerca da avaliação da formação continuada promovida pela SEDUC aos servidores da CEINF, notou-se que a avaliação foi considerada positiva, visto que nove técnicos afirmaram que a SEDUC tem realizado formações aos técnicos da CEINF. Nesse sentido destacou-se a fala do técnico em educação N: Tivemos boas formações este ano na CEINF. Destaco a formação promovida pela professora Ana Tancredi sobre as diretrizes curriculares para a educação infantil. Foi um momento que agregou muito em nossa formação,” (Técnico em Educação N).

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Porém, três técnicos afirmaram que a formação continuada poderia ser melhor. Para o técnico em educação O “a formação deste ano foi boa, mas poderia ter sido melhor, posto o intervalo entre as formações ser muito grande”. É interessante sublinhar que as formações ocorridas na CEINF resultam do esforço da Coordenação de Educação Infantil, bem como da Direção de Educação Infantil e Ensino Fundamental, que se empenham para garantir o direito aos servidores públicos deste setor. Em relação à avaliação da formação continuada disponibilizada aos servidores da CEINF para operacionalizar o SIIG verificou-se um cenário inverso em relação às respostas da questão anterior, pois todos os técnicos asseguraram que não receberam formação para operacionalizar o SIIG. O relato do técnico em educação P é contundente: Desde a minha posse, a cerca de dois anos, não tive qualquer formação para manusear o SIIG e até hoje sinto dificuldades com algumas ferramentas. Não consigo me apropriar de todos os recursos disponíveis do SIIG pelo fato de não ter participado de formação para operá-lo (Técnico em Educação P).

Outra fala significativa que ratifica a situação por parte da SEDUC no intuito de oferecer formação para manusear o SIIG é evidenciada no discurso do técnico M: Não teve nenhum treinamento para se trabalhar com o SIIG, tudo que sei é graças aos amigos de trabalho, principalmente os que já estavam na SEDUC quando cheguei. Na verdade quando cheguei não houve muita recepção não me foi apresentada sequer a estrutura da SEDUC, tem setor que desconheço suas funções (Técnico em Educação M).

Sobre a formação do servidor é necessário um processo de formação, reconhecendo que os funcionários públicos são fundamentais para o êxito da Administração Pública. Para o serviço público seja voltado para as necessidades da população é necessário um processo de valorização funcional, enquanto Osório (2005: p. 04) avalia que sem profissionalização adequada, não se pode falar na possibilidade de uma administração competitiva e moderna. Para finalizar a análise dos dados do questionário dos servidores far-se-á uma avaliação do campo Outras Considerações. Este campo foi utilizado por oito técnicos, e todos enfatizaram a importância de ter uma remuneração melhor, como se destaca na fala do técnico em educação J. Espero que com a aprovação do Plano de Cargos, Carreiras e Salários (PCCR) da SEDUC nossa remuneração melhore, pois já tivemos dois colegas que foram trabalhar em emprego por apresentar melhores condições de salário.

Posteriormente, confrontar-se-á as informações coletadas entre os servidores e os usuários em algumas categorias.

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A RESPOSTA DOS USUÁRIOS Apesar de alguns problemas na coleta dos questionários dos usuários conseguiuse recolher vinte e cinco deles. Existem algumas mudanças em relação aos questionários aplicados aos técnicos em educação da CEINF. A primeira delas é a presença de uma identificação mais detalhada como: profissão, município de origem e o motivo de vinda à CEINF. A segunda mudança é o fato de apresentarem somente três questões: transparência na tramitação de processos, tempo de tramitação de processo e estrutura organizacional da SEDUC. Antes da análise das categorias apresentar-se-á o perfil dos usuários por meio dos campos contidos na identificação. Gráfico 2 Usuários por profissão

Fonte: Questionários dos usuários.

Observa-se, por meio do gráfico 2, a predominância dos técnicos em educação e dos professores na responsabilidade de acompanhar a tramitação de processos. O gráfico 3 informa a origem destes usuários. Gráfico 3 Usuários por município de origem

Fonte: Questionários dos usuários.

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Observa-se, mediante os dados do gráfico 3, que a maioria dos interessados é de Belém. Esse fenômeno é facilmente explicado pelo fato de a zona metropolitana de Belém deter a maioria das escolas vinculadas a SEDUC. A seguir observar-se-á os motivos que trazem esses usuários a CEINF. Gráfico 4 Usuários por motivo de vinda a CEINF

Fonte: Questionários dos usuários.

Verifica-se que o maior motivo para vinda dos usuários à CEINF é simplesmente acompanhar a tramitação de processo, ou seja, conferir o porquê na morosidade na tramitação de processo. Após esse breve perfil dos usuários da CEINF far-se-á estudo das falas dos mesmos por categoria iniciando pela transparência na tramitação de processos.

TRANSPARÊNCIA NA TRAMITAÇÃO DE PROCESSO Esta temática é configurada em três perguntas, a saber: 1) Como você avalia o acesso a tramitação de processo na CEINF? 2) Como é o acesso a tramitação de processo via o sitio da SEDUC (http://www.seduc.pa.gov.br/siig_portal/view/protocolo/)? 3) E como você avalia as informações dos servidores da CEINF sobre a tramitação de processo? Todas as indagações foram respondidas. Em relação à primeira pergunta houve onze entrevistados que afirmaram que na CEINF tiveram amplo acesso aos processos. Entretanto, catorze alegaram que o acesso a tramitação de processo é limitada, como se observa na fala do usuário B: Quando estive na Coordenação de Educação atrás do meu processo a técnica em educação não sabia me informar quais os motivos para passar tanto tempo neste

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setor. Isso com certeza pode ser considerado como falta de transparência (Usuária B).

Selecionou-se uma fala dos usuários que avaliaram positivamente a tramitação de processo na CEINF: Todas as vezes que estive na CEINF para ver o andamento dos meus processos os técnicos em educação sempre me informaram muito bem. Já chegaram a me ligar informando que estava faltando alguns documentos importantes (Usuária C).

Saraiva (2002: p.198) adverte que o papel social das organizações públicas deve passar também pela transparência de informações a sociedade. É importante ressaltar que o cidadão brasileiro é o cliente do serviço público que se queixa da falta de acessibilidade aos serviços públicos e também de sua ineficiência. Quando questionados sobre o acesso a tramitação de processos via sitio da SEDUC (http://www.seduc.pa.gov.br/siig_portal/view/protocolo/) a maioria, vinte e dois dos entrevistados alegam desconhecer a existência desse tipo de serviço, o que provoca uma surpresa. Para expressar essa situação destacou-se a fala do usuário D que afirmou “não sabia que a SEDUC tinha protocolo on-line”. Este fato ocorre pela pouca divulgação desse serviço, assim como a dificuldade de encontrar esse link no sitio da SEDUC. Todavia, para os três usuários que alegaram conhecer este serviço no sitio da SEDUC foram unânimes em afirmar que as informações prestadas são superficiais. Como se observa na fala do usuário E: Com muitas dificuldades descobri que existia o protocolo on-line no site da SEDUC, pois em nenhum momento ninguém, de nenhum setor da SEDUC informou a existência do serviço. Mas, apesar da existência dele as informações são insuficientes, não esclarece. por exemplo, os setores que passaram, nem quanto tempo por setor (Usuário E).

Quando indagados sobre as informações dos servidores da CEINF acerca da tramitação de processo quinze usuários afirmaram estar satisfeitos com as informações prestadas pela CEINF ratificada pela fala do usuário F traduzindo essa realidade “Fui bem atendida e me explicaram direitinho como andava o meu processo”. Entretanto, dez usuários alegaram insatisfação no atendimento dos técnicos em educação da CEINF. “Não fiquei satisfeito com as informações repassadas, porque não me informaram a causa de tanta demora” (Usurário G). Observou-se que em relação a essa temática é necessário ampliar o acesso dos usuários em seus respectivos processos. Uma ferramenta que poderia ser otimizada é o protocolo on-line, que necessita ter mais visibilidade e ser mais detalhado. 118


TEMPO DE TRAMITAÇÃO DE PROCESSO Esta questão possui somente uma indagação intitulada “O tempo de tramitação dos processos é satisfatório?”. Todos os usuários preencheram esse campo. Houve uma unanimidade dos entrevistados em reconhecer que o tempo de tramitação dos processos apresenta uma enorme morosidade. Quando dei entrada no meu processo no protocolo recebi uma guia de tramitação que determinava um tempo estimado de 30 dias, mas já se passaram mais de noventa dias e ainda não tive resposta da minha solicitação. Isso é uma falta de respeito (Usuário H).

Outra fala muito significativa sobre o assunto é a da usuária D que ressalta que “não há controle do tempo por parte dos setores. Existem setores que passam mês, e outro que são alguns dias”. Esse fenômeno já havia sido detectado pelos técnicos em educação, visto que a SEDUC não apresenta normas que estabeleçam tempo máximo por setor e assunto. A queixa pela morosidade na tramitação é sem dúvida a mais frequente entre os entrevistados. A fala do usuário J traduz todo esse descontentamento. “O tempo de tramitação de processos em todos os setores da SEDUC é muito longo, e o pior é que percebemos que não existe um tempo máximo estabelecido”. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo além de identificar os pontos críticos apontar alternativas de solução para aperfeiçoar a tramitação de processos na CEINF. Existem limites de inúmeras ordens: como a ausência de um estudo sobre organização e método, que poderia incrementar a rotina do fluxo de processo no setor examinado. O mesmo poderia avaliar a complexidade do assunto numa das secretarias com grande demanda, como é a SEDUC, que rivaliza com a pasta de Saúde em contingente de servidores. O estudo ajudaria a estabelecer as dinâmicas dos processos e a definição de prazos. Notaram-se ainda problemas com relação à ausência de um PCCR dos servidores, que provoca descontentamento por conta da remuneração, considerada baixa. Há limites ainda com relação à infraestrutura e política de formação e divulgação do sistema de controle online dos processos. 119


Em longo prazo seria necessária uma reforma da estrutura organizacional da SEDUC que possibilitasse dispor os setores que tratam do mesmo assunto num mesmo espaço físico, ou seja, num mesmo andar um próximo do outro bem como minimizar a departamentalização. É necessário também fazer um amplo estudo dos assuntos que tramitam na SEDUC visando estabelecer normais legais que possibilite determinar tempo máximo para emitir parecer, bem como estabelecer o fluxograma para organização da tramitação de processo, pois atualmente é muito comum processos passarem por setores que não compete analisálos Após identificação das variáveis que influenciam na morosidade da tramitação dos processos da CEINF, elenca-se algumas possibilidades para otimizar a prestação de serviço. Em curto prazo observou-se que os usuários queixam-se da falta de transparência na tramitação de processo. Para superar esse problema sugere-se que seja disponibilizado em destaque no sitio da SEDUC o link do protocolo on-line com informações detalhadas, pois, atualmente, este link está em um espaço de difícil acesso. Essa modificação seria muito importante, pois minimizaria a questão do tempo, visto que o usuário teria acesso às informações como o tempo que o processo está em determinado setor possibilitando ao usuário questionar o técnico em educação responsável pelo processo. A plataforma utilizada pelo SIIG é a mesma que possibilita o acesso aos e-mails pelos servidores da SEDUC. Então, poder-se-ia criar um serviço que encaminhasse uma mensagem eletrônica para o e-mail do técnico em educação toda vez que o mesmo recebesse um novo processo para analisar. Estas são algumas contribuições no intuito de melhorar os serviços prestados pela CEINF aos seus inúmeros usuários.

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REFERÊNCIAS ARAÚJO, Sarah Maria Linhares De. Taxas e Tarifas no Serviço Público. UFPR. Curitiba, 2008. BATISTA, Fábio Ferreira, XAVIER, Antonio Carlos da Ressurreição, MARRA, Fátima, LONGO, Rose Mary Juliano (Org.). Passos para o Gerenciamento Efetivo de Processos no Setor Público: Aplicações Práticas. IPEA. Brasília. 1996. __________. DIREITO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO. Ed. Revista dos Tribunais. São Paulo, 18 ed. 1993. OSÓRIO, Fábio Medina. Novos Rumos da Gestão Pública Brasileira: Dificuldades Teóricas ou Operacionais?. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado, n. 1. março/abril/maio de 2005. PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Da Administração Pública Burocrática à Gerencial. Revista do Serviço Público, n. 47. janeiro/abril de 1996. __________. Os Primeiros Passos da Reforma Gerencial do Estado de 1995. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado, n. 16. dezembro/janeiro/fevereiro de 2009. SARAIVA, Luiz Alex Silva. Cultura Organizacional em Ambiente Burocrático. Revista de Administração Contemporânea. v. 6, n. 1 (2002) TEIXEIRA, Elizabeth. As Três Metodologias: acadêmica, da ciência e da pesquisa. Vozes. 6 ed. Petrópolis, RJ. 2009.

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ESTADO DO CONHECIMENTO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA NO BRASIL: TEMAS, DILEMAS E PARADOXOS NAS PRODUÇÕES ACADÊMICO-CIENTÍFICAS Raimundo Nonato de Pádua Câncio1 RESUMO O objetivo deste estudo, caracterizado como analítico e descritivo, acerca do Estado do Conhecimento sobre a Educação Escolar Indígena no Brasil, foi sistematizar a produção acadêmico-científica em torno do tema, no período de 2002 a 2015, tendo como parâmetros os estudos que relacionam essa temática ao pós-colonialismo, à teoria decolonial e ao ocidentalismo. O levantamento, contendo 290 fontes documentais, foi realizado com base no banco de Dissertações e Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Após a sistematização das fontes em banco de dados, estes foram agrupados em campos temáticos centrais. Neste texto, discutem-se os dados quantitativos provenientes das questões levantadas e os focos de interesse das investigações. Procura-se identificar, em diferentes áreas do conhecimento, os campos temáticos mais abordados, as regiões e as instituições nas quais foram defendidos os estudos, os desenhos metodológicos e os referenciais teóricos nos trabalhos cujas temáticas, em sentido amplo, têm relação com os processos de introdução da instituição escolar em territórios indígenas e suas implicações. Palavras-chave: Estado do Conhecimento. Educação Escolar Indígena. Processos Educativos. Introdução Há que se reconhecer no país significativas propostas para a efetivação de uma escola indígena2 diferenciada e de qualidade, o que é recebido como perspectivas de mudança no sistema educacional brasileiro. Entretanto, é preciso ter consciência de que para que isso realmente se efetive faz-se necessário que as instituições e os órgãos responsáveis compreendam a necessidade de se pensar esta educação a partir de novas dinâmicas,concepções e mecanismos. Os descompassos historicamente observados entre as políticas públicas educativas para as populações indígenas têm suscitado interesse de muitos pesquisadores. Mesmo assim a Educação Escolar Indígena (EEI) ainda é uma temática marginal, seja na atenção às políticas públicas, nas produções acadêmicas, seja nas práticas direcionadas a este campo do conhecimento. A literatura especializada sobre a Educação em territórios indígenas tem evidenciado a necessidade de conhecer e acompanhar o desenvolvimento

Doutor em Educação pela Universidade Federal do Pará; Mestre em Educação pela Universidade doEstado do Pará; Especialista em Ensino-Aprendizagem do português; Graduado em Letras (Língua Portuguesa)pela Universidade Federal do Pará. E-mail: nonatocancio@hotmail.com 2 Tassinari (2001) conceitua as escolas indígenas como “espaços de fronteira, entendidos como espaços de trânsito, articulação e troca de conhecimentos, assim como espaços de incompreensões e de redefinições identitária dos grupos envolvidos nesse processo, índios e não-índios”. 1

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dos processos educativos e as transformações provocadas a partir deles. Neste sentido, considerando a produção do conhecimento, a análise do campo investigativo é fundamental neste tempo de ameaça de direitos, em que muitos agentes políticos têm fundamentado seus discursos em pensamentos que reforçam a exclusão. Considerando tais questões, é indispensável, pois, questionar as possibilidades e condições de produção do conhecimento pelos textos que se permite publicar e circular. Nessa direção, este estudo sistematizou a produção acadêmica defendida em programas de pós-graduação das instituições do país entre os anos de 2002-2015, com base no banco de Dissertações e Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Para tanto, estruturou-se um banco de dados com 290 trabalhos. O levantamento permitiu sistematizar os trabalhos com a preocupação de mapear quais regiões do país concentram maior número de estudos sobre o tema; os focos de interesses das investigações; as perspectivas metodológicas utilizadas e os procedimentos mais adotados. Tomou-se como referência estudo anterior, um inventário comentado de Dissertações e Teses, levantamento coordenado por Grupioni (2003), que catalogou e sistematizou um total de 78 trabalhos, sendo 33 Dissertações e 21 Teses, defendidos nas instituições brasileiras no período de 1978 a 2002. Nesta pesquisa seguimos alguns caminhos e também fizemos opções, tendo em vista os objetivos delimitados. Para a escolha das instituições onde foi realizada a pesquisa de Dissertações e Teses, optamos por pesquisar o banco de dados dos programas de pósgraduação de cinco instituições, entre públicas e privadas, de cada região do país, com destaque às primeiras. Consideramos as instituições que de alguma forma desenvolvem estudos com populações indígenas, com destaque para os trabalhos que abordam a Educação, de acordo com a demanda registrada em um levantamento preliminar. Ao partir deste parâmetro, optamos por pesquisar as produções das universidades, noperíodo de 2002 a 2015, nas mesmas áreas inicialmente propostas por Grupioni (2003). O levantamento sobre o Estado do Conhecimento da Educação Escolar Indígena no Brasil, nas cinco instituições, agrupadas por região, foi realizado mediante pesquisa no banco de Dissertações e Teses da Capes. Estes primeiros dados aqui sistematizados dialogam com os dados do levantamento de Grupioni (2003).Foram definidos subdescritores, além do descritor base Educação Escolar Indígena, os quais ajudaram a direcionar as buscas a serem realizadas, quais sejam: Educação Escolar Indígena X Pós-colonialismo, Educação Escolar Indígena X Teoria Decolonial, e Educação Escolar Indígena X Ocidentalismo. Esse 123


recorte ajudou a constituir um panorama do que se tem produzido nas regiões, nos programas de pós-graduação das instituições pesquisados, sobre a temática, no período delimitado. A ideia é verificar as aproximações dos estudos sobre Educação Escolar Indígena com a teoria pós-colonial e o pensamento decolonial. Consideramos este construto teórico fundamental, já que a colonialidade se mantém viva nos manuais de aprendizagem, nos critérios para os trabalhos acadêmicos, na cultura, no senso comum, na autoimagem dos povos, nas aspirações dos sujeitos, e em tantos outros aspectos de nossa experiência moderna (MALDONADO-TORRES, 2007, p. 131). Eles também ajudam a refletir sobre a histórica desagregação social e marginalização vivenciados pelos povos indígenas, além de servir de base para a avaliação das profundas transformações ocasionadas pela invasão capitalista nos territórios indígenas. Desta forma, a pesquisa das Dissertações e Teses foi realizada exclusivamente em meio eletrônico (internet), cobrindo o período compreendido entre os anos 2002 a 2015, e resultou em um total de 290 trabalhos catalogados, sendo 217 Dissertações e 73 Teses. O banco de Dissertações e Teses da Capes possibilitou uma pesquisa alternativa por autor, assunto, e também por filtros de busca, como ano da defesa dos trabalhos e nível/modalidade: mestrado ou doutorado. Alguns dos trabalhos selecionados não dispunham de determinadas informações importantes, ou mesmo fundamentais, para melhor aprofundamento da pesquisa, como: temas, resumo, área de conhecimento, palavras-chave e paginação. Muitos resumos não mostravam com precisão as abordagens, correntes teóricas adotadas e a metodologia utilizada; quando isto acontecia, consultávamos o texto completo, quando disponibilizado no banco da Capes.

1. Estado do Conhecimento e o Panorama da Educação Escolar Indígena no Brasil Para Morosini e Fernandes (2014, p. 155-158), o Estado de Conhecimento se traduz em uma “identificação, registro, categorização que levem à reflexão e síntese sobre a produção científica de uma determinada área, em um determinado espaço de tempo, congregando periódicos, teses, dissertações e livros sobre uma temática específica”. Tratase de capturar “uma visão ampla e atual dos movimentos da pesquisa ligados ao objeto da investigação que pretendemos desenvolver”.

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Como um movimento inicial antes de adentrar a uma pesquisa, o Estado do Conhecimento ajuda orientar os passos da investigação, a produção intelectual e os conhecimentos acerca dos estudos relacionados ao objeto de pesquisa. É, portanto, um estudo basilar para futuros passos dentro da pesquisa pretendida. Permite-nos entrar em contato com os movimentos atuais acerca do objeto de investigação, oferecendo-nos uma noção abrangente do nível de interesse acadêmico e direcionando, com mais exatidão, para itens a ser explorados – reforço de resultados encontrados ou criação de novos ângulos para o tema de estudo – abrindo assim, inúmeras oportunidades de enriquecimento do estudo. Nesse sentido, a construção do Estado de Conhecimento, fornece um mapeamento das ideias já existentes, dando-nos segurança sobre fontes de estudo, apontando subtemas passíveis de maior exploração ou, até mesmo, fazendo-nos compreender silêncios significativos a respeito do tema de estudo (MOROSINI; FERNANDES, 2014, p. 158).

Conforme evidencia Romanowisk&Ens (2006), os estudos do tipo Estado do Conhecimento ou Estados da Arte também podem significar contribuição importantes na constituição do campo teórico de uma área de conhecimento, pois procuram identificar os aportes significativos da construção da teoria eprática pedagógica, apontar as restrições sobre o campo em que se move a pesquisa, as suas lacunas de disseminação, além de identificar experiências inovadoras investigadas que apontem alternativas de solução para os problemas da prática e reconhecer as contribuições da pesquisa na constituição de propostas na área focalizada. Ao realizar pesquisa sobre o Estado da Arte da Alfabetização no Brasil, no período de 1954 a 1986, Soares (1987) também justifica a relevância dos trabalhos dessa natureza. Para ela, essa compreensão do Estado de Conhecimentosobre um tema, em determinado momento, é necessária no processo de evolução da ciência,afim de que se ordene periodicamente o conjunto de informações e resultados já obtidos,“ordenação que permita indicação das possibilidades de integração de diferentes perspectivas, aparentemente autônomas, a identificação de duplicações ou contradições, e a determinaçãode lacunas e vieses” (SOARES, 1987, p. 3). Em seu inventário comentado de Dissertações e Teses sobre Educação Escolar Indígena no Brasil, no período de 1978 a 2002, Grupioni (2003, p. 201) destaca que esse levantamento pode ser útil para aqueles que desenvolvem investigações com esse tema, bem como para os que trabalham com a escola e com populações indígenas, pois dão acesso a trabalhos “cuja circulação costuma ser restrita e de difícil acesso, mas que

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normalmente potencializam nossa reflexão e ampliam nossa compreensão dos fenômenos sociais emquestão”. Romanowisk&Ens (2006, p. 45) também observam que os dados coletados em estudos do tipo Estado da Arte indicam a atenção que os pesquisadores dão à temática, além de apontar para que aspectos da área da educação volta a ser a preocupação dos pesquisadores. Nesse aspecto, os dados levantados por Grupioni (2003), em sua pesquisa sobre Dissertações e Teses defendidas sobre a Educação Escolar Indígena, no período de 1978 a 2012, foram muito importantes, pois mostram que na década de 90 do século XX a questão da educação para os povos indígenas ganhou relevância, não só do movimento indígena e das entidades da sociedade civil, mas também na academia. Isso, para ele, contribui sobremaneira para colocar a educação escolar indígena no rol das questões prioritárias do movimento indígena contemporâneo. Acerca das informações disponíveis sobre a temática em voga, os dados de 2014, divulgados pelo MEC/Inep3, mostram que havia no Brasil 216.766 estudantes indígenas; 2.972 escolas4 indígenas, em média 73 alunos por escola; e cerca de 16.384 professores no total, entre os quais 90% eram indígenas. Considerando os recursos do FUNDEB e os programas do FNDE, cada aluno indígena significava um investimento médio, ao longo de um ano, de aproximadamente R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Estima-se, portanto, um total próximo a um bilhão de reais vinculado à educação escolar de crianças, jovens e adultos indígenas em todo o Brasil. Das escolas indígenas registradas no censo, apenas 2.180 (70,7%) funcionavam em prédios próprios, 663 em galpões (21,5%) e 242 (7,8%) em outros locais. Somente 219 (7,1%) tinham abastecimento de água da rede pública; 1.205 (39%) usavam água de rios, fontes e igarapés, 1.243 (43%) de poços artesianos ou cisternas e 318 (10,3%) não dispunham de abastecimento de água. É nesse contexto de posicionamentos ideológicos, não raro divergentes, que as populações indígenas no Brasil têm reivindicado uma escola indígena que lhes sirva de instrumento para a construção de projetos autônomos de futuro, dando-lhes acesso a conhecimentos necessários para um novo tipo de interlocução com o mundo de fora da aldeia (GRUPIONI, 2006). A inserção das escolas indígenas no sistema de ensino do país

Resumo técnico do Censo Escolar da Educação Básica 2013, publicado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, em 2014. Até então, foram os últimos dados divulgados pelo INEP. 4 Dessas escolas, 1.530 escolas (49,6%) ofereciam a educação infantil, 2.877 (93,2%) os anos iniciais do ensino fundamental, 1.384 (44,9%) os anos finais do ensino fundamental, 366 (11,9%) o ensino médio, 12 (0,4%) a educação profissional e 768 (24,9%) a educação de jovens e adultos (EJA) (BRASIL, 2014). 3

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fez com que fosse configurada a educação escolar indígena como modalidade de ensino. Com isso, houve a criação da categoria escola indígena, o que exige com que esta se torne diferente das outras escolas existentes no país. Tal fato obrigou também as instituições mantenedoras a se organizarem para que pudessem olhar para o novo contexto social, na perspectiva da diversidade cultural, observando-se novos instrumentos democráticos que garantissem o atendimento dos direitos à cidadania. No Brasil, o processo educativo sempre figurou, desde a colonização, como elemento relevante nas formas de contato dos brancos em relação aos índios. No entanto, esta educação foi tradicionalmente empregada com o objetivo de impor a cultura dos colonizadores. E tais esforços estavam presentes nos processos de catequização dos jesuítas até as políticas de integração. Na América Latina, esta lógica também situa a questão indígena no cenário de marginalização, haja vista que para os neoliberais os povos indígenas não acompanham e não atendem à dinâmica capitalista, em face da dinâmica da economia global. Dito isto, as políticas internas tendem a uma lógica focada no mercado competitivo, com foco na globalização. A diversidade cultural é ignorada pelos neoliberais, embora ela seja marcada e resista historicamente, o que pode ser observado nas conquistas resultantes dos movimentos indígenas. No Brasil, desde o século XVI, a oferta de programas de educação escolar aos povos indígenas esteve pautada pela catequização, civilização e integração forçada dos índios à sociedade nacional. Dos missionários jesuítas aos positivistas do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), do ensino catequético ao ensino bilíngue, foi predominante o objetivo de negar a diferença e fazer com que eles se transformassem em algo diferente do que eram. Nesse processo, a introdução da escola entre os povos indígenas serviu de instrumento de imposição de valores alheios e negação de identidades e culturas diferenciadas. Podemos dizer, portanto, que a introdução da educação escolar nos territórios indígenas foi forte instrumento com fins de “domesticação” das populações, como negação de suas identidades, de suas qualidades étnicas e culturais, desejando-as submissas para assim promover a integração no projeto idealista de integração nacional. Em contraposição, hoje evidenciamos um discurso acadêmico que se vale dos exemplos do passado com fins de promover instrumentos, por meio da escola, que lhes tragam de volta o “sentimento de pertencimento étnico, resgatando valores, práticas e histórias esmaecidas pelo tempo e pela imposição de outros padrões socioculturais” (GRUPIONI, 2006, p. 43). 127


Desde a década de 1970, há estudos que indicam que experiências de Educação Escolar Indígena diferenciada têm se efetivado no Brasil. Essas experiências ganham reconhecimento jurídico e estatal com a Constituição de 1988 e as legislações específicas que a seguem. As adequações às realidades indígenas tomam forma a partir da década de 1970, quando especialistas em diversas áreas, especialmente antropólogos, linguistas e pedagogos começam a assessorar a construção de projetos escolares alternativos em algumas escolas indígenas. Essa mobilização crescente é fortificada pela Constituição de 1988, quando representantes indígenas e aliados fazem passar artigos específicos que regulamentam os seus direitos diferenciados. Entre eles, o Artigo 210 (Título VIII, Capítulo III, Seção I) (BRASIL,1988), que assegura no ensino fundamental “às comunidades indígenas também a utilizaçãode suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem”. A seguir, a Lei Federal N.°9.394/1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), irá atribuir dois artigos às condições especiais da escola indígena, definindo, no Artigo 78 do Título VIII, que: O Sistema de Ensino da União, com a colaboração das agências federais de fomento à cultura e de assistência aos índios, desenvolverá programas integrados de ensino e pesquisa, para oferta de educação escolar bilíngue e intercultural aos povos indígenas, com os seguintes objetivos: I - proporcionar aos índios, suas comunidades e povos, a recuperação de suas memórias históricas; a reafirmação de suas identidades étnicas; a valorização de suas línguas e ciências; II - garantir aos índios, suas comunidades e povos, o acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos da sociedade nacional e demais sociedades indígenas e não-índias (BRASIL, 1997).

Por sua vez, o Parecer N.° 14/1999 do Conselho Nacional de Educação CNE/CEB,a Resolução CEB N.° 3/1999, o Plano Nacional de Educação, Lei N.° 10.172 de 09/01/2001 e novo Plano Nacional de Educação, Lei N.º 13.005 de 25/06/2014, reafirmam as mesmas disposições, definindo diretrizes e metas específicas para a escola indígena. Dentre elas, destaca-se o reconhecimento administrativo da categoria escola indígena no sistema de ensino; a ênfase na formação de professores indígenas e produção de materiais didáticos específicos; o reconhecimento de programas e currículos específicos e a adaptação do projeto escolar à realidade indígena. O CNE deliberou que cabe à União legislar, definir diretrizes e políticas nacionais, apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino para o provimento de programas de educação intercultural e de formação de professores indígenas, além de criar programas específicos de auxílio ao desenvolvimento da educação para as populações indígenas. Aos 128


Estados competirá a responsabilidade pela oferta e execução da Educação Escolar Indígena, diretamente ou por regime de colaboração com seus municípios, integrando as escolas indígenas como unidades próprias, autônomas e específicas no sistema estadual e provendo-as com recursos humanos, materiais e financeiros, além de instituir e regulamentar o magistério indígena. A Resolução Nº 3/1999 e o Parecer N.º 14/99 do CNE, em conjunto, contribuíram para integrar o conjugado de normas e legislação nacional que evidenciam o respeito do direito dos povos indígenas e a aspiração a uma educação diferenciada, composta por princípios que, de modo geral, ensejam atender a extrema heterogeneidade de casos vivenciados pelos povos indígenas contemporâneos no Brasil. Procurando atender essa necessidade movida pelos preceitos da diferença e especificidade, o Ministério da Educação (MEC) publicou o Referencial Curricular Nacional para a Escola Indígena (RCNEI), em 1998. Esse referencial está voltado prioritariamente aos professores indígenas e aos técnicos das Secretarias Estaduais de Educação, responsáveis pela implementação de programas educativos junto aos povos indígenas. Desta forma, criam-se condições legais, jurídicas e administrativas com atribuição de competências e reconhecimento da categoria indígena no sistema de ensino. É necessário, assim, assegurar a inclusão da língua, da cultura e dos saberes indígenas no projeto curricular dessas escolas e o respeito à particularidade étnica e cultural das populações, reunindo alunos e professores de mesma etnia em seu projeto, execução e gestão. São características da escola indígena: São características da escola indígena: a interculturalidade5, o bilinguismo ou multilinguismo, a especificidade, a diferenciação e a participação comunitária. A escola indígena passa agora a ser definida como diferenciada, específica, bilíngue6 e intercultural, nomenclaturas que tentam dar conta da complexidade das questões que envolvem a Educação Escolar Indígena. Embora, na maioria das vezes, os discursos oficiais se pautem nesta perspectiva e mesmo que o espaço da diversidade esteja definido formalmente nos documentos que orientam a prática educativa, ainda é bastante evidente que a educação escolar para os A interculturalidade, conceito discutido posteriormente, considera a diversidade cultural no processo de ensino e aprendizagem. A escola devetrabalhar com os valores, saberes tradicionais e práticas de cada povo e garantir o acesso aos conhecimentose tecnologias da sociedade, relevantes para o processo de interação e participação cidadã na sociedadenacional (BRASIL/SECAD, 2007, p. 20). 6 O ensino bilíngue foi adotado como estratégico para o efetivo aprendizado do português e dos valores dasociedade dominante: valorizava-se a língua indígena porque ela era a chave para o aprendizado da língua nacional. A escola em áreas indígenas servia, assim, para a promoção da homogeneização cultural. 5

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povos indígenas é reduzida a lições ou unidades didáticas pontuais e incidentes. Os estudantes são “intimados” a fazer parte de uma sociedade urbana, europeizada, “branca”e ideal. As populações indígenas são concebidas como monoculturais no espaço e no tempo. Dessa forma, a escola legitima a dominação e submete os alunos às intimações da vidaurbana. É, pois, a partir deste cenário mais amplo que podemos vislumbrar a construção inicial de um Estado do Conhecimento para a Educação Escolar Indígena. A ideia deste estudo foi também evidenciar nas produções os modos de desconstrução de um saber-poder que sustenta as bases cientificistas ocidentais como modelo central e produtor de conhecimento. Os autores da corrente pós-colonial e da linha contestatória modernidade/colonialidade/decolonialidade, que procuram descolonizar esse saber-poder, são fundamentais para indicar caminhos que fundamentem as críticas sobre as práticas e ações com base na ideia hegemônica de um poder que silencia o conhecimento de povos indígenas. A interface destes campos epistemológicos então se faz necessária para que se possa melhor refletir sobre as relações de poder advindas da herança colonial e do imperialismo econômico e cultural, uma vez que os mecanismos de controle do poder e as formas de saber ajudam também a definir alguns dos dispositivos de dominação que oocidente instalou na América, cujo exercício de desprendimento muitas vezes é árduo.

2. O que dizem os dados catalogados sobre a Educação Escolar Indígena no Brasil? O levantamento realizado por Grupioni (2003) evidenciou muitos temas e problemas enfocados nas Dissertações e Teses reunidas em seu inventário sobre a educação escolar para os povos indígenas. Chama atenção, no período estudado pelo autor (1978-2002), a grande dispersão de trabalhos defendidos em diferentes regiões e instituições do país. Mas o que mudou nas produções sobre a temática a partir de 2002 até 2015? Os dados levantados em sua pesquisa serão utilizados neste estudo como uma possível continuidade das observações engendradas e como forma de estabelecer um possível diálogo entre as informações levantadas, no período de 2002 a 2015, considerando a especificidade dos descritores utilizados no estudo: Educação Escolar Indígena X Pós-colonialismo, Educação Escolar Indígena X Teoria Decolonial, e Educação Escolar Indígena X Ocidentalismo. Cabe observar, mais uma vez, que os critérios adotados na pesquisa de Grupioni (2003), correspondente ao período de 1978 a 2002, não são os mesmos seguidos neste 130


estudo, já que o autor busca sistematizar um inventário. Entretanto, mesmo com os refinamentos adotados, descritos anteriormente, buscamos estabelecer relações para que, a partir daí, tenhamos uma panorâmica parcial dos trabalhos produzidos sobre esta temática em 44 anos, desde o primeiro trabalho defendido nesta abordagem. Grupioni (2003, p. 199) observou que no decorrer dos anos 90 do século XX, notadamente na segunda metade dessa década, o número de trabalhos foi ampliado significativamente no meio acadêmico, o que pode ser comprovado no quadro 1 abaixo. Para comprovar esta evolução nas produções acadêmicas foi realizado o mesmo levantamento, no período de 2002 a 2015, no Banco de Dissertações e Teses da CAPES, considerandose apenas as instituições selecionadas para o estudo. O quadro 2 é, portanto, uma continuidade das observações realizadas por Grupioni no quadro 1. Fica comprovado no quadro 2 que é a partir da segunda metade da primeira década do século XXI que a questão da Educação Escolar Indígena ganhou maior relevância no meio acadêmico. Porém, é a partir de 2009 que este tema volta a ganhar mais visibilidade. Destaca-se no período de 2002 a 2015 a expressiva produção acadêmica com a temática no ano de 2007, com 27 trabalhos; em 2009 foram anotadas 26 produções; em 2011 foram registrados 24 trabalhos; em 2012 observou-se uma produção de 33 trabalhos; e em 2015 foram registradas 32 produções, defendidas nos programas de pós-graduação do país. Isto nos permite dizer que a temática Educação Escolar Indígena, nos últimos sete anos, passa a ganhar mais interesse e mais notoriedade nas academias.

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Ao observamos as produções que abordam a temática no período de 2002 a 2015, por região, estatística não levantada por Grupioni (2003), verificamos que a Região Norte produziu o maior quantitativo de Dissertações do país, 64 Dissertações; seguida da Região Centro-Oeste, com 49 Dissertações; da Região Sul, com 48 Dissertações; e da Região Sudeste, com 31 produções defendidas. No entanto, ao verificarmos a produção de Teses, a Região Norte aparece em último lugar7 com a menor produção, apenas 4, seguida da Região Sul, com apenas 9 trabalhos acerca desta temática. A maior quantidade de Teses foi produzida na Região Sudeste, apresentando 28 trabalhos; seguida da Região CentroOeste, com 17 Teses; e da Região Nordeste, com apenas 15 trabalhos. Gráfico 1: Distribuição de Teses e Dissertações produzidas por região no período de 2002 a 2015. TESES 70

DISSERTAÇÕES

64

60

49

50

48

40 30

25

20 10

28

15

31

17 9

4

0

REGIÃO NORTE

REGIÃO NORDESTE

REGIÃO CENTRO- REGIÃO SUDESTE OESTE

REGIÃO SUL

Fonte:Câncio (2017).

No que diz respeito às regiões do país nas quais se concentram maior número de pesquisas sobre o tema, observou-se que as produções que abordam a temática, no período 7

Essa questão também decorre dos poucos programas de doutoramento da Região Norte.

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de 2002 a 2015, estão concentradas na Região Norte, pois nesta região foi produzido o maior quantitativo de Dissertações no país, 64 Dissertações; seguida da Região CentroOeste, com 49 Dissertações; da Região Sul, com 48; e da Região Sudeste, com 31 produções defendidas. No entanto, em contraponto, verificou-se que na produção de Teses a Região Norte aparece em último lugar8, como a que menos produziu neste gênero, com apenas 4 produçoes, seguida da Região Sul, com apenas 9 trabalhos acerca desta temática. A maior quantidade de Teses foi produzida na Região Sudeste, apresentando 28 trabalhos; seguida da Região Centro-Oeste, com 17 Teses; e da Região Nordeste, com 15 trabalhos apenas. O maior número de defesas se deu, portanto, nas instituições da Região Norte, dados que podem ser conferidos no quadro a seguir.

Quadro 3 -Dissertações e Teses defendidas por Região e por Universidades (2002 a 2015) REGIÃO

REGIÃO NORTE Total Região Norte

UNIVERSIDADE

UFPA/PA UFAM/AM UFAC/AC UFT/TO UFRA/PA

UFPE/PE UFBA/BA REGIÃO NORDESTE UFC/CE UFRN/RN UFPB/PB Total Região Nordeste

REGIÃO CENTROOESTE Total Região CentroOeste

REGIÃO SUDESTE

8

UNB/DF UFG/GO UFMS/MS UCB/DF UFMT/MT USP/SP UFMG/MG UFRJ/RJ UNICAMP/SP UNESP/SP

DISSERTAÇÃO

TESE

TOTAL

11 9 3 5 3

7 3 3 9 6

18 12 6 14 9

14 36 4 8 64 10 6 2 3 4 25 11 8 11 18 49

2 1 1 4 3 4 3 3 2 15 9 5 1 2 17

16 37 4 9 68 13 17 5 6 6 40 20 13 12 20 66

Este dado decorre do baixo número de programas de pós-graduação com doutorado na Região Norte do país.

133


Total Região Sudeste

REGIÃO SUL Total Região Sul

UFRS/RS UFPR/PR UFSC/SC PUCRS/RS UEM/PR

Total Geral de Trabalhos pesquisados no Brasil (2002-2015) - CAPES

31 14 5 15 2 12 48

28 2 1 3 1 2 9

59 16 6 18 3 14 55

217

73

290

Fonte:Câncio, 2017.

Ainda considerando o quadro 3 e a pesquisa realizada no período de 2002 a 2015, de acordo com os descritores adotados no estudo, verificou-se que foram defendidas nas instituições pesquisadas, de acordo com a região, 217 Dissertações e 73 Teses, perfazendo um total de 290 trabalhos defendidos. Quando reunimos os trabalhos por Universidades, também agrupados segundo a região a que pertencem, verificamos que alguns programas de Pós-graduação se destacam pelo volume de trabalhos defendidos com esta temática. Em contravenção, na Região Norte, por exemplo, o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) possui a maior quantidade de Dissertações defendidas com a temática Educação Escolar Indígena (ligadas aos descritores do estudo) no país, 36 trabalhos. Na Região Centro-Oestedestaca-se a Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) como a segunda maior instituição do país a realizar defesas de Dissertações com esta temática, com 18 trabalhos. Na Região Sul destaca-se a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) como a terceira maior instituição do país a realizar defesas de Dissertações com esta temática, com 15 trabalhos; seguida da Universidade Federal de São Paulo (USP), na Região Sudeste, com 11 trabalhos, e da Universidade Federal do Pernambuco (UFPE), com 10 trabalhos. As regiões Centro-Oeste e Sudeste destacam-se no país como as regiões onde mais foram defendidas Teses com este tema, quando relacionadas aos descritores adotados. Foram defendidas 9 Teses, tanto na Universidade de Brasília (UNB) quanto na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Na Região Nordeste destacamos 4 Teses defendidas na Universidade Federal da Bahia (UFBA); na Região Sul, identificamos 3 trabalhos defendidos na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); na Região Norte, foram registrados apenas 2 Teses defendidas na Universidade Federal do Pará (UFPA) com a temática em questão. 134


A observação em torno dos campos temáticos nos trabalhos estudados evidenciaram que as políticas públicas educacionais no contexto da Educação Escolar Indígena despontam como questão principal, pois aparecem em maior escala tanto nas Dissertações quanto nas Teses defendidas nos programas. Registrou-se também a recorrência a temas relacionados aos processos educativos em territórios indígenas; ao ensino de Língua Portuguesa; e aos trabalhos atrelados à relação educação, identidade étnica e prática pedagógica. Como paradoxo, chama atenção a escassa produção de trabalhos, especialmente de Teses, que abordam questões como a Educação Escolar Indígena na perspectiva da inclusão;estudos psicológicos em territórios indígenas; a criança, o brinquedo e as brincadeiras indígenas; a questão das identidades coletivas, das novas tecnologias e da literatura em contextos indígenas. Pode-se, ainda, verificar, na multiplicidade e pluralidade de enfoques e perspectivas teóricas adotadas, que a maioria dos trabalhos interligam os campos da ciência: Educação/Antropologia/Linguística e Letras/Sociologia, caracterizando, dessa forma, a construção de trabalhos a partir de enfoques multidisciplinares. A seguir, o quadro 4 evidencia os campos temáticos relacionados à Educação Escolar Indígena nas Dissertações e Teses, no período de 2002 a 2015. Quadro 4 - Campos Temáticos relacionados à Educação Escolar Indígena evidenciados nasDissertações e Teses (2002-2015) DISSERTAÇÕES

TESES

TOTAL

EEI ↔ Políticas Públicas para a EEI EEI ↔ Sujeitos, Cultura e Processos Educativos

33 35

12 9

45 44

EEI ↔ Ensino de Língua

21

9

30

EEI ↔ Educação e Identidade Étnica

20

5

25

EEI ↔ Processo de Escolarização da População Indígena EEI ↔ Prática Pedagógica

11

8

19

18

8

26

EEI ↔ Processo de Colonização e Ocidentalização EEI ↔ Educação Matemática

11 7

3 3

13 10

EEI ↔ Crianças Indígenas EEI ↔ Educação e Meio Ambiente EEI ↔ Etnia e Gênero

9 8 3

2 1 2

11 9 5

EEI ↔ Identidade Étnica EEI ↔ Identidade e Linguagem EEI ↔ Educação Multicultural

3 3

5 -

5 3 3

EEI ↔ Currículo

9

-

9

E.E.I. E CAMPOS TEMÁTICA OBSERVADOS

135


EEI ↔ Gestão Escolar

3

-

3

EEI ↔ Práticas Discursivas EEI ↔ Representações Sociais EEI ↔ Corporeidade

3 2 4

1 -

4 2 4

EEI ↔ Na Perspectiva da Inclusão EEI ↔ Criança, Brinquedos e Brincadeiras EEI ↔ Ensino de Psicologia

1 2 1

-

1 2 1

EEI ↔ Identidades Coletivas EEI ↔ Artesanato EEI ↔ Novas Tecnologias

2 1 1

-

2 1 1

EEI ↔ Literatura Indígena EEI ↔ Pós-colonialismo

2 1

1

2 2

EEI ↔ Decolonialidade

-

3

3

Fonte:Câncio, 2017.

No quadro 4 é possível verificar que a Educação Escolar Indígena sob o olhar da teoria pós-colonial mostra-se apenas em uma tese, e que somente há registro da aproximação dessa temática a uma abordagem fundamentada no pensamento decolonial, no período pesquisado, em 3 Teses. Ou seja, o levantamento mostra a carência de discussões sobre a Educação Escolar Indígena na perspectiva da decolonialidade (3 Teses) e do pós-colonialismo(1 Dissertação e 1 Tese), propostas epistêmicas, teóricas e metodológicas que podem subsidiar na compreensão das relações de poder instauradas a partir do poder, ser, saber e status cosmogônico aos povos indígenas. Com relação à perspectiva metodológica mais utilizada nas Dissertações e os procedimentos adotados nos estudos, verificamos que há maior recorrência à Pesquisa Etnográfica e à pesquisa do tipo Estudo de Caso. Nessas pesquisas, a abordagem mais recorrente é a abordagem qualitativa. A entrevistaé o instrumento de coleta de dados mais recorrente, seguida da observação participante, da análise documental, dos questionários e das fotografias, além de outros menos utilizados nos estudos observados. Nas Teses pesquisadas, evidenciamos que o tipo de pesquisa mais recorrente é o Estudo de Caso do Tipo Etnográfico e, na mesma proporção, a Pesquisa Etnográfica. A Pesquisa Bibliográfica e o Estudo Comparativo aparecem na sequência com menor frequência na caracterização dada aos estudos realizados. A entrevistaé o instrumento de pesquisa mais empregado nas teses, seguido da análise documental, da observação participante, do diário de campo, da utilização de fotografias e de depoimentos.

136


A análise das distribuições das Dissertações e Teses por área disciplinar mostrou que as defesas são mais recorrentes nos programas de pós-graduação em Educação. Seguem, como pós-graduações que mais recorrem à temática, as de Linguística e as de Antropologia. Todavia, os programas que menos se voltam às pesquisas relacionadas à Educação Escolar Indígena são os de Semiótica e de Educação Física, registrando número bastante inexpressivo de produções nessas áreas. Foram evidenciados programas novos que pesquisam a temática, como os de Direito, História, Desenvolvimento Sustentável e Estudos Comparados das Américas, conforme pode ser verificado no quadro 5 a seguir:

Quadro 5 - Distribuição das Dissertações e Teses sobre Educação Escolar Indígena por área disciplinar (1978-2002) – (2002-2015). ÁREA DE PÓSGRADUAÇÃO

EDUCAÇÃO LINGUÍSTICA ANTROPOLOGIA SEMIÓTICA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA GEOGRAFIA PSICOLOGIA LETRAS EDUCAÇÃO FÍSICA SOCIOLOGIA CIÊNCIAS SOCIAIS DIREITO HISTÓRIA DESENVOL. SUST. DO TRÓPICO ÚMIDO ESTUDOS COMP. SOBRE AS AMÉRCAS TOTAL COMPARATIVO DE DISSERTAÇÕES E TESES ENTRE PERÍODOS TOTAL GERAL - PERÍODO (1978 a 2015) período: 37 ANOS Fonte:Câncio, 2017.

DISSERTAÇÕES

TESES

GRUPIONI

CÂNCIO

19782002

20022015

30 9 10 2 1 1 -

116 18 19 8 2 3 16 2 8 2 5 2

19782002 7 4 2 3 1 1 1 1 1 -

-

3

53

204 257

GRUPIO NI

CÂNCIO

20022015

TOTAL COMPARATIVO GERAL DE PRODUÇÕES

GRUPION CÂNCIO I

20022015

34 9 5 3 2 5 2 2 2 3 3

19782002 37 13 12 3 3 1 1 1 1 1 1 -

-

2

-

5

21

72

74

276

93

150 27 24 8 5 5 21 4 10 4 8 5

350

137


O comparativo das Dissertações produzidas mostrou que houve um salto qualitativo no quantitativo de produções, pois no período de 2002 a 2015, se relacionado ao período de 1978 a 2002 (GRUPIONI, 2003), o número de produções quase quadruplicou. No período de 1978-2002 foram produzidas 53 Dissertações. A partir de 2002 a 2015 essa produção evolui para 204. Entretanto, esse quantitativo é menos expressivo no número de Teses produzidas. De 1978 a 2002, registrou-se a produção de 21 Teses. No período de 2002 a 2015, essa produção aumentou para 72. A opção pela construção dos trabalhos numa perspectiva crítica foi evidente, em suas diferentes configurações. Mesmo que de forma não muito expressiva, a Educação Escolar Indígena tem sido admitida como um componente importante no processo de transformação social e de construção da democracia em que redistribuição e reconhecimento se articulam. A natureza do social é recorrente nos trabalhos observados, aspecto que perpassa a maioria das produções analisadas. Mignolo (2008, p. 289) defende a opção decolonial como uma opção epistêmica que exige ser política e epistemicamente desobediente para poder “desnaturalizar a construção racial e imperial da identidade no mundo moderno em uma economia capitalista”. Nesta perspectiva, o pensamento decolonial pressupõe sempre a diferença colonial, a abertura e liberdade de pensamentos e formas de viver outras, um desprendimento da retórica da modernidade e de seu imaginário imperial.

Conclusão De forma geral, este estudo sobre o Estado do Conhecimento da Educação Escolar Indígena no Brasil, cujo objetivo foi sistematizar a produção acadêmico-científica em torno da Educação Escolar Indígena, dando ênfase ao período de 2002 a 2015, e tendo como parâmetros os estudos que relacionam essa temática ao pós-colonialismo, à teoria decolonial e ao ocidentalismo, possibilitou estruturar um banco de dados com 290 fontes documentais e apontou que essa temática nos últimos sete anos tem despertado certo interesse e mais notoriedade nas academias. Isto pode estar atrelado à problemática mais ampla da inclusão dalíngua, da cultura e dos saberes indígenas no projeto curricular das escolas e ao respeito àparticularidade étnica e cultural dos povos indígenas. No que diz respeito às regiões do país nas quais se 138


concentra o maior número de pesquisas sobre o tema, os dados revelaram que a Região Norte produziu o maior quantitativo de Dissertações, seguida da Região Centro-Oeste e da Região Sul. No entanto, em contraponto, verificamos que com relação à produção de Teses, a Região Norte aparece em último lugar como a menos produtiva, devido ao baixo número de programas de pós-graduação com doutorado. A maior quantidade de Teses foi produzida na Região Centro-Oeste e na Região Sudeste, seguidas da Região Nordeste. A observação em torno dos campos temáticos nesses trabalhos evidenciou que as políticas públicas educacionais no contexto da educação escolar indígena despontam como questão principal, aparecendo em maior escala tanto nas Dissertações quanto nas Teses defendidas nos programas. Registramos também a recorrência a temas relacionados aos processos educativos em territórios indígenas; ao ensino de Língua Portuguesa; e aos trabalhos atrelados à relação educação, identidade étnica e prática pedagógica. Como paradoxo, chamou atenção a pouca produção de trabalhos, especialmente de Teses, abordando questões como Educação Escolar Indígena na perspectiva da inclusão; estudos psicológicos em territórios indígenas; a criança, o brinquedo e as brincadeiras indígenas; a questão das identidades coletivas; das novas tecnologias e da literatura em contextos indígenas. Vale observar ainda que predominam em grande escala os estudos empíricos aos teóricos. Com relação à perspectiva metodológica mais utilizada nas dissertações e os procedimentos adotados nos estudos, verificou-se que há maior recorrência à Pesquisa Etnográfica e à pesquisa do tipo Estudo de Caso. A abordagem mais recursiva foi a abordagem qualitativa. A entrevista foi o instrumento mais recorrente, seguido da observação participante, da análise documental, dos questionários e das fotografias, além de outros menos utilizados nos estudos observados. As teses pesquisadas evidenciaram que o tipo de pesquisa mais recorrente foi o Estudo de Caso do Tipo Etnográfico e, na mesma proporção, a Pesquisa Etnográfica. A Pesquisa Bibliográfica e o Estudo Comparativo aparecem na sequência com menor frequência na caracterização dada aos estudos realizados. A entrevista foi o instrumento de pesquisa mais empregado, seguido da análise documental, da observação participante, do diário de campo, da utilização de fotografias e de depoimentos. A análise das distribuições das Dissertações e Teses por área disciplinar mostrou que as defesas são mais recorrentes nos programas de pós-graduação em

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Educação. Seguem, como pós-graduações que mais recorrem à temática, as de Linguística e Antropologia. Todavia, os programas que menos se voltam às pesquisas relacionadas à Educação Escolar Indígena são os de Semiótica e de Educação Física, registrando número bastante inexpressivo de produções nessas áreas. Foram evidenciados programas novos que pesquisam a temática,como os de Direito, História, Desenvolvimento Sustentável e Estudos Comparados das Américas. O comparativo das Dissertações produzidas mostrou que houve um salto qualitativo no quantitativo de produções, pois no período de 2002 a 2015, se relacionado ao período de 1978 a 2002 (GRUPIONI, 2003), o número de produções aumentou de forma significativa. Foi possível constatar também que a maior visibilidade da temática se dá no campo interdisciplinar, mesmo que estes trabalhos sejam oriundos, em maior escala, da Educação e da Antropologia. A carência de estudos na perspectiva pós-colonial e com base na teoria decolonial indica a necessidade de desenvolver pedagogias decoloniais que questionem a ordem atual, que desvelem os padrões de poder racializado, moderno e colonial que alimenta o projeto neoliberal, que gerem intervenção e ação sociopolítica transformadora. A opção decolonial requer, portanto, uma atenção especial às contribuições e às implicações das histórias locais, das histórias negadas, marginalizadas e subalternizadas pelos agentes do capital. Mesmo que essas teorias apareçam timidamente, a abordagem temática na perspectiva crítica foi evidente nos trabalhos pesquisados, em suas diferentes configurações, tendo assumido a Educação Escolar Indígena como um componente importante dos processosde transformação social e de construção de democracias em que redistribuição ereconhecimento se articulam. A natureza do social foi recorrente nos trabalhos observados, este aspecto perpassa pela grande maioria das produções analisadas. Em síntese, espera-se que este estudo possa contribuir para o debate e produza outros trabalhos cujas preocupações daqueles que se interessem seja desvelar os processos e compreender as questões que afligem o direito à educação escolar para os povos indígenas.

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REFERÊNCIAS BRASIL.Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LEI No. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. D.O. U. de 23 de dezembro de 1996, Brasília, v. único, p. 207, 1997. _______. Secretaria de Educação Fundamental.Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas. Brasília: MEC/SEF, 1998. _______. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP. Censo Escolar da Educação Básica 2014: resumo técnico. Brasília: O Instituto, 2014. GRUPIONI, L. D. B. Contextualizando o campo da formação de professores indígenas no Brasil. In.: Formação de professores indígenas: repensando trajetórias. (Org.) GRUPIONI, L. D. B. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2006. _______. A Educação Indígena na Academia: inventário comentado de dissertações e teses sobre educação escolar indígena no Brasil (1978-2002). Em Aberto, Brasília, v. 20, n.76, p. 197-238, fev. 2003. MIGNOLO, W. D. Desobediência epistêmica: a opção descolonial e o significado de identidade em política. Cadernos de Letra da UFF, n. 34, 2008, pp. 287-324. MOROSINI, Marília Costa; FERNANDES,Cleoni Maria Barboza. Estado do Conhecimento: conceitos, finalidades e interlocuções. Educação Por Escrito, Porto Alegre, v. 5, n. 2, p. 154-164, jul.-dez. 2014. ROMANOWSKI, Joana Paulin; ENS, Romilda Teodora As pesquisas denominadas do tipo "Estado da Arte" em Educação Revista Diálogo Educacional, vol. 6, núm. 19, septiembrediciembre,Pontifícia Universidade Católica do Paraná Curitiba, Brasil, 2006, p. 37-50. SOARES, M. Alfabetização no Brasil:O Estado do conhecimento. Brasília: INEP/MEC, 1987.

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SABERES E DIVERSIDADES DA EXPRESSÃO ARTÍSTICA NA AMAZÔNIA PARAENSE Silene Trópico e Silva1 Resumo: O presente relato de experiência sistematiza a prática de ensino desenvolvida no Sistema Educacional Interativo – SEI. Voltada aos alunos matriculados na 1° ano do ensino médio regular de 15 localidades da zona rural, pertencentes a 34 comunidades e vilas do interior do Estado. As aulas foram ministradas em sala de aula interativa de ensino presencial mediado por tecnologia satelital. Situado no eixo temático "Saberes, Diversidades e Práticas de Ensino na Educação Básica", o presente relato descreve o processo expressivos do aprendiz conduzido em aula de arte, a fim de apontar os mecanismos migratórios utilizados por eles enquanto articulavam o uso de códigos culturais, saberes e diversidades da expressão artística e a realidade de diferentes localidades da Amazônia paraense. Por ser notória a capacidade desse aprendiz em se expressar por meio da arte, movido tanto pela habilidade em dominar diferentes linguagens artísticas quanto pela capacidade de compreender fenômenos artísticos, acreditamos que os resultados desta experiência poderão inspirar outros professores de arte de articular as linguagens artísticas e os códigos culturais, saberes e diversidades para fruir sobre a expressão artística da Amazônia paraense. Palavras-Chave: Arte. Educação Musical. Ensino Médio. Tecnologia Digital. INTRODUÇÃO Nas artes primitivas, a expressão artística representa tanto os afetos quanto a originalidade de uma produção, assim otimizar oportunidades significativas e valiosas ao exercício da expressividade artística, numa perspectiva estética pautada na dialética e ancorada na historicidade crítica em arte, valoriza tanto a realidade sociocultural do estudante quanto suas diferentes visões de mundo (FREITAS, 2013). Na intenção de desenvolver a percepção sensível do estudante, buscamos elaborar aulas que articulassem diferentes visões de mundo a partir de contextos diferenciados (históricos, sociais e culturais). Sobre a abordagem de diferentes contextos, é importante observar que a adoção de procedimentos de ensino linear e não linear é um meio de mover o estudante para explorar a expressão artística de diferentes tempos e espaços (FONTERRADA, 2008). Já Mateiro e Ilari (2011) fomentam a discussão, apresentando a necessidade do docente de criar um percurso amplo e multifacetado para o aprendiz pensar e realizar atividades em um ambiente de aprendizagem menos estático ou codificado. Das proposições de autores que conduziram processos criativos em arte, 1Sistema

Educacional Interativo (SEI/SEDUC-PA), Doutoranda em Artes (PPGARTES/UFPA), mestre em Artes, e-mail: silenetropico@hotmail.com.

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destacamos a abordagem de Ostrower (2001) que admite ser a consciência da pessoa sobre o mundo social um meio de desenvolver sua sensibilidade artística, recuperar valores, enfrentando a massificação da arte e a alienação do aprendiz cuja criatividade é influenciada tanto pelas informações interessantes que o aluno recebe na escola quanto pela necessidade inata de intuir. Com isso, a sensibilidade do indivíduo é aculturada e por sua vez orienta o como fazer e o imaginar individual. Culturalmente seletiva, a sensibilidade guia o indivíduo nas considerações do que para ele seria importante ou necessário para alcançar certas metas de vida (OSTROWER, 2001, p. 17).

Depreende-se da literatura que o desenvolvimento da percepção sensível que precede o processo de aculturação pode ser mediado pela inter-relação entre o pensamento do aprendiz e os diferentes contextos por meio da associação (SALLES, 2008); dessa forma, o propositor de arte idealiza seu processo criativo ao realizar conexões amplas e multifacetadas, ou seja, enquanto observa os fenômenos, formula hipóteses que, ao serem testadas, geram associações diversas por envolverem processos interativos entre erro e acaso. Com a oportunidade de o aprendiz conduzir um processo expressivo a partir da tomada de consciência de sua identidade social e cultural, procuramos motivar o aluno a explorar a diversidade de saberes e a singularidade cultural de seu entorno, posto que o ser humano é, ao mesmo tempo, singular e múltiplo na medida em que realiza assimilações entre culturas, integrando saberes e técnicas, ideias, costumes, alimentação e indivíduos vindos de fora. Devemos ver também que todo ser, mesmo aquele fechado na mais banal das vidas, constitui ele próprio um cosmo. Traz em si multiplicidades interiores, personalidades virtuais, uma infinidade de personagens quiméricos, uma poliexistência no real e no imaginário, no sono e na vigília, na obediência e na transgressão, no ostensivo e no secreto, balbucios embrionários em suas cavidades e profundezas insondáveis (MORIN, 2000, p. 57).

Sendo assim, considerando as potencialidades do educando, o presente relato de experiência tem como objetivos: descrever os processos expressivos sistematizados em aulas de arte; e apontar os mecanismos migratórios utilizados pelo grupo estudantil de ensino médio enquanto articulava códigos culturais, saberes e diversidades de expressão artística e a realidade de diferentes localidades da Amazônia paraense, tendo o aluno como protagonista em sala de aula conforme sugere a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018).

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DESENVOLVIMENTO

Ambiência pedagógica Participaram das aulas, alunos matriculados na 1° ano do ensino médio regular que se encontram na faixa etária de 17 a 52 anos. O ensino foi ofertado em 15 municípios do estado2 paraense, alcançando 34 comunidades cuja sala de aula possui um professor mediador que acompanha os alunos nas vilas e comunidades; essas aulas são ministradas do Centro de Mídias em Belém, onde funciona o Sistema Educacional Interativo (SEI) 3, por meio de docência compartilhada, isto é, no momento de transmissão dos conteúdos, um professor atua como ministrante enquanto o outro acompanha o chat; no primeiro horário, é ministrado o conteúdo de artes visuais e no segundo, música. Nas comunidades e vilas, as aulas são recebidas em salas equipadas com antena de comunicação bidirecional via satélite, nas quais foram instalados equipamentos tecnológicos como, por exemplo: TV com câmera, aparelho receptor/transmissor de sinal via satélite, microfone, computador para acesso de professores e alunos ao chat interativo e também quadro branco, mesas, cadeiras e ventiladores ou ar-condicionado. Na sala de aula interativa, localizada no Centro de Mídias em Belém, transmitimos aulas de um estúdio equipado com: 3 câmeras posicionadas de forma equilibrada, 4 monitores, caixa de som, espaço para uso da ferramenta digital de Chroma Key (cenário virtual), um mesa com cadeira, caneta, quadro digital e microfone de lapela para o professor ministrante; além disso, há uma mesa com cadeira e computador para o professor colaborador4 atender o chat interativo durante a transmissão da aula.

As 34 comunidades estão localizadas em:(1) Alenquer – Comunidade Mamiá, Santo Antônio das Gertrudes, Pacoval; (2) Bagre – Comunidade Balieiro e Mapuá/Vila Santa Cruz; (3) Cachoeira do Piriá – Comunidade Cigana, Vila Enche Concha e Vila do Baixinho; (4) Medicilândia – Km 95 Norte; (5) Pacajá – Montes Belos/Zona Rural Ladário, Vila Bom Jardim e Assentamento HP Castanheira; (6) Placas – Vila Novo Paraíso, Km 221, Km 200 e Comunidade Ouro Verde; (7) Portel – Vila Acangatá e Vila Gomes; (8) São Miguel do Guamá – Comunidade Montes Belos e Santana do Urucurí; (9) Tucuruí – Assentamento Pastor Antenor Km 50, Fazendas Reunidas, Ilha Água Fria, Trans Bom Jesus Km 72 fazenda Conspel, Transcametá km 30 mais 17 Km da Vicinal Agrovila de Itacoroa, Ilha Palmos Canal do Km 24 Lago da HUE Tucuruí; (10) Uruará – Vila Bela Vista, Vila Canaã; (11) Curralinho – Comunidade Menino Jesus; (12) Dom Elizeu – Rio Acampamento, União e Vila Nazaré; (13) Goianésia do Pará – Vila Porto Novo; (14) Muaná – Vila São Miguel do Pracuúba; (15) Vitória do Xingu – Cobra Choca. 3 O SEI é um projeto voltado ao Ensino Médio Regular que utiliza metodologia híbrida e presencial, pautada na tecnologia digital para potencializar o uso de objetos de aprendizagem com a TV interativa entre outros; ademais, a tecnologia satelital permite o diálogo simultâneo de áudio e vídeo com comunidades distantes do Centro de Mídias localizado em Belém (PARÁ, 2017). 4 O professor colaborador é também professor ministrante do componente de artes, mas no momento atuou no apoio da aula para esclarecer dúvidas via chat interativo. 2

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Descrição dos recursos midiáticos O professor ministrante conta com os seguintes recursos midiáticos: Cartelas que podem conter textos e imagens reproduzidas na TV interativa; TV interativa para projetar as cartelas, escrever na tela branca com o uso da caneta digital, acessar links da internet e utilizar jogos interativos para exemplificar de maneira lúdica o conteúdo ministrado em sala de aula; e Vídeos para auxiliar o professor a introduzir, contextualizar, exemplificar e concluir a exposição de um conteúdo. Ao empregar o recurso vídeo, o docente pode selecionar vídeos da internet, produzir um vídeo a partir da seleção de imagem e som e idealizar um roteiro para apresentar uma animação em 2D/3D; outro material que pode ser idealizado pelo docente são as gravações internas e externas que são formas ilustrativas de propor experimentos, entrevistas, pesquisas e visitas exploratórias. Ainda se conta com o Chroma Key que permite a substituição do plano de fundo verde por um cenário virtual em vídeo, imagem ou cartela; com o Canal Alpha que permite que objetos ilustrados ou animações apareçam na frente, ou atrás do professor sem o plano de fundo, no Chroma Key ou mesmo na mesa do professor; e com a Realidade Aumentada que possibilita a visualização de objetos 3D com auxílio de uma base de projeção, contribuindo para dinamizar as aulas e despertar o interesse dos alunos. Para a realização das aulas que embasam este relato, utilizamos: TV Interativa para projetar cartelas e acessar o link virtual de edição de partituras online denominado Flat; Caneta digital; Cartelas; Vídeos coletados da internet; e o Chroma Key para projeção de um laboratório de música que serviu para demonstrar, na prática, como improvisar e compor melodia, ritmo e harmonia com instrumentos de percussão regionais (tambor, chocalho, pau de chuva e cocos), interpretados por músicos amadores convidados e pela professora com a flauta transversal (vide imagens). IMAGEM 1 - Quadro Digital

Fonte: SEI/SEDUC-PA.

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IMAGEM 2 - Caneta digital e cartela

Fonte: SEI/SEDUC-PA. IMAGEM 3- Link interativo "Flat"

Fonte: SEI/SEDUC-PA. IMAGEM 4 – Vídeo da internet

Fonte: Youtube IMAGEM 5 – Chroma Key

Fonte: SEI/SEDUC-PA

146


Percurso metodológico de elaboração das aulas Foram ministradas seis aulas de Arte nos meses de junho e agosto de 2018 no turno da manhã em: 14/6/2018, 28/6/2018 e 9/8/2018 seguida do trabalho extraclasse conduzido pelo grupo estudantil nas comunidades e vilas no dia 23/8/2018; três das aulas foram tematizadas a partir das artes visuais5 e três foram a partir da música, para ambas as tematizações houve alinhamento com as linguagens da dança e do teatro. As aulas tematizadas, a partir do conteúdo de música, geraram a atividade artística extraclasse dos saberes e diversidades expressivas em artes, fruto deste relato. Na sua elaboração, buscamos estabelecer um alinhamento com a Matriz de Referência do Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM) 20186 em “Linguagens, Códigos e suas Tecnologias”, explorando a competência de área 4 que é “Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e da própria identidade"; para tanto, foi selecionada a "habilidade 13 – Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos". No planejamento curricular anual do SEI, foi eleito para área de linguagens o tema "Saberes e Memória", articulado ao segundo bimestre pelo eixo "Social e Cultural" comum da área. No componente de artes, o subtema do bimestre foi "As Linguagens Artísticas no Tempo e no Espaço" e a partir daí, pensamos na elaboração de um processo expressivo e autoral em artes, dentro do subtema propomos conhecer elementos da linguagem artística em diferentes atividades, caracterizando a arte com sistemas de comunicação e códigos culturais; conhecer elementos da linguagem artística em atividades de apreciação, improvisação e composição para caracterizar a arte a partir de sistemas de comunicação e códigos culturais; e revisar os objetos do conhecimento.

A estrutura da aula ministrada Para estruturação da aula no estúdio, foi estabelecida a execução de diferentes etapas para sua condução: na introdução de 2 minutos, apresentamos o conteúdo do dia e aguardamos a chamada da aula, elaborada pela equipe de produção VAT/SA7, para então 5Conforme

organização de aula por meio de docência compartilhada, as aulas de Artes Visuais foram ministradas pelo Prof. Ms. Helder Fabrício Ribeiro e as aulas de Música que constituem este relato de experiência foram ministradas por mim. 6Matriz de referência ENEM, 2018. http://download.inep.gov.br/ download/ enem/ matriz_referencia. pdf. 7A VAT/SA é uma empresa de Tecnologia da Informação, especializada em elaborar e executar projetos de educação em massa e comunicação corporativa. Constituída por uma equipe multidisciplinar formada por profissionais de televisão e de roteiro pedagógico voltado ao ambiente virtual. Sua atribuição no SEI envolve

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explanar o conteúdo da aula em 23 minutos; em seguida, a produção da VAT/SA fez a chamada da atividade e explicamos o exercício relacionado à aula, oferecendo ao aluno um tempo de 15 minutos para resolução da tarefa. Eu, o professor de apoio no chat, o professor mediador (a) e os alunos participamos de forma simultânea na interatividade; nesse momento, os alunos apresentaram as atividades resolvidas e esclarecemos as dúvidas sobre o assunto durante 15 minutos; finalizamos resumindo em 2 minutos o aprendizado do dia. O processo expressivo e autoral em Artes Durante as aulas (N=38), o aluno foi incentivado a explorar a expressão artística da idade primitiva, antiga e clássica para construir argumentos e elaborar uma proposta artística autoral, livre e criativa. Considerando a identidade e cultura vivenciada na zona rural, desenvolveram um roteiro para executar a proposta respondendo as questões norteadoras a fim de traçar um percurso autoral; posteriormente, foram encorajados a associar os períodos estudados da história da música com diferentes linguagens artísticas próximas ao contexto da cultural deles, conforme estrutura elaborada no auxílio da produção do processo expressivo, criativo e autoral em artes (Quadro 1). QUADRO 1 – Trajetória de elaboração do processo expressivo em artes Processo expressivo criativo e autoral em artes Questões norteadoras Qual a história? O que eu vejo hoje que eu não via antes? Quais mudanças aconteceram e quais novidades poderiam ser expressas em artes? Seriam novas formas de falar, pensar, ou de se manifestar?

Temas Questões do cotidiano ou de geração de renda

Recursos/Linguagens artísticas

Lutas sociais

Recursos de produção em audiovisual Edição e composição com imagem e sons em aplicativos ou computador

Crenças sociais, religiosas e culturais

Apresentação sem o uso de recursos tecnológicos

Como vou fazer minha apresentação?

Linguagens artísticas Artes Visuais Dança Música Teatro

O que eu trago para reflexão?

Fonte: acervo próprio. otimizar as aulas idealizadas pelos docentes ministrantes, para isso,a equipe composta por diversos profissionais realiza produção de conteúdo, gravação de externa, transmissão de conteúdos e pós produção, sendo, portanto, imprescindível receber o material de aula com vinte e dois dias de antecedência para garantir a qualidade e eficiência na produção e transmissão do material idealizado pelo professor do SEI. Disponível em <https://www.vat.com.br/ grupo>. Acesso em 8 de maio de 2019. 8 A símbolo indica que o número de aulas ministradas.

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A partir da estruturação do percurso expressivo, os grupos exploraram a expressividade artística de sua localidade, trabalhando com duas, ou mais linguagens da arte como se apresenta na próxima seção.

A Culminância Embora, para uma parte das comunidades e vilas (N= 9) tenha sido difícil para os grupos disponibilizarem o trabalho extraclasse em vídeo, via internet (devido o baixo uso do smartphone e a conexão instável da ferramenta), ressaltamos que essa dificuldade não se estende às aulas ministradas e interatividades, pois elas são transmitidas e recebidas simultaneamente via satélite; nas comunidades e vilas em que não foi possível disponibilizar o trabalho dos alunos via internet, a apresentação ocorreu na sala de aula e foi avaliada pelo professor mediador. Entre os trabalhos conduzidos e enviados por gravação no celular e disponibilizados via internet, destacaram-se as atividades de seis localidades do Pará: Cachoeira do Piriá, Dom Elizeu, Placas, Pacajá, São Miguel do Guamá e Tucuruí descritos a seguir. Em Cachoeira do Piriá, os alunos da Vila Enche Concha elaboraram um musical a partir da temática "Prostituição"; na condução de um processo expressivo, criativo e autoral em arte, articularam a temática com aspectos expressivos da idade primitiva e antiga por meio da música, dança e teatro. O trabalho foi apresentado na sala de aula por uma aluna e em seguida, o celular foi ativado para executar o playback da música "Eu era" (Marcos e Belutti) entoada por parte do grupo para significar a dramatização, a dança e a expressão corporal coreografada. Na primeira cena, aparece uma aluna se penteando e se maquiando para sair com as amigas; do encontro festivo delas, surge a ideia de ir pra balada a fim de ingerir bebidas, fumar cigarros e curtir com os “caras”; no decorrer da cena, as amigas e os homens tratam a personagem prostituída como um objeto e a abandonam. Ao se perceber descartada e usada, a personagem prostituída se deprime e, jogada no chão, recorda-se da infância; nesse momento, acontece a brincadeira de roda e o abraço materno para fomentar a reflexão do grupo sobre princípios e valores sociais que emergem dos sonhos e fantasias da personagem prostituída.

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IMAGEM 6 – Cachoeira do Piriá

Fonte: acervo próprio.

No município de Dom Elizeu, os alunos da Vila Nazaré elegeram o tema "Desmatamento" em forma de protesto lúdico e imagético motivado pelo alto índice desse tipo de crime ambiental que preocupa os moradores da área. Eles realizaram a performance empregando linguagens artísticas por movimento corporal, vocalização de ruídos, imitação dos sons dos pássaros e expressão coreografada. Para aproximar o contexto da mata amazônica paraense com questões sociais e culturais o grupo confeccionou uma escultura de isopor para representar a serra elétrica; fantoches de pássaros com TNT e papelão; e túnicas verdes de TNT para simbolizar a mata. No desenvolvimento, o trabalho extraclasse apresentado pela professora mediadora, seguiu com a entrada da serra e o corte da mata, enfatizado pela sonoplastia vocal do grupo que imitou o som da serra e a dor sentida pela mata; com o desmatamento, surge a sonorização dos pássaros, representados por fantoches, manuseados por eles, que entram em cena e correm atrás das serras e as silenciam. Ao final, o grupo dos pássaros realiza seu manifesto perante a ação inexplicável do Homem.

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IMAGEM 7 – Dom Elizeu

Fonte: acervo próprio.

No município de Placas, a comunidade do Km 221 realizou uma interpretação musical com instrumento de percussão alternativo para expressar a meta de possuir uma banda de fanfarra na comunidade; na condução do processo artístico, associaram aspectos sociais e culturais vivenciados no cotidiano com as lutas sociais da idade primitiva, antiga e clássica. Para realizar a atividade, escolheram um ritmo que se aproximou do funk sertanejo e reciclaram alguns materiais do ambiente para produzir sons como: garrafão plástico (N=2), balde (N=1) e cabo de vassoura (N=1); depois de muitos ensaios, a apresentação filmada fora da escola, iniciou com a apresentação do tema "Fanfarra de Placas" por uma aluna, seguida pela interpretação instrumental do grupo fazendo uma reflexão sobre diferenças sociais e dificuldades de acesso a bens culturais, manifestando o desejo de mover políticas públicas de incentivo à cultura nessa localidade. IMAGEM 8 – Placas.

Fonte: acervo próprio.

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No município de São Miguel do Guamá, a comunidade Bela Vista do Jeju escolheu otema "Estudar é o melhor para mim", ressaltando as dificuldades enfrentadas no cotidiano escolar. A apresentação articulou arte primitiva e antiga para enfatizar, por meio da linguagem musical, crenças e metas do grupo sobre o direito de aprender e sobre a necessidade de obter sucesso com o aprendizado. Para conduzir um processo artístico expressivo, o grupo elaborou uma paródia ensaiada em sala; durante a interpretação da música, os alunos contaram com o acompanhamento de um playback de uma música não identificada e executada no celular, cuja letra elaborada se encontra no Quadro 2. QUADRO 2 – Paródia da Comunidade Bela Vista do Jeju Estudar é o melhor pra mim Paródia da Comunidade Bela Vista do Jeju Relaxa que a escola é sua e também é minha/ então cuida dela, porque o caso é sério/ Aprende a respeitar o seu professor/ e também ao mediador/ Na Bela Vista eu acordo cedo/ pois eu sei o que é melhor pra mim/ Vou estudar/vou melhorar/ para meus objetivos poder alcançar. Posso até sair na manhã fria/ mas eu sei o que é melhor pra mim/Pra me educar/pra me ensinar/pra buscar o melhor pra mim. Tô estudando qual é a sua?/ Tem vários alunos que precisam estudar/então eu vou/ me esforçar/ Eu aprendi a me dedicar/Na Bela Vista eu vim estudar/ não vou faltar/ vou estudar/vou estudar. Fonte: acervo próprio. IMAGEM 9 – São Miguel do Guamá

Fonte: acervo próprio.

No município de São Miguel do Guamá, o grupo estudantil da comunidade Santana do Urucuri explorou a temática "Preconceito, racismo e desigualdade social" que associou com crenças sociais e culturais presentes no cotidiano juvenil; para elaborar a interpretação musical, o grupo selecionou a música "Eu sei de cor" (Marília Mendonça) e criou uma 152


paródia, ensaiada e interpretada na sala de aula pelos cantores e pelo violão acústico. Com a composição da letra refletiram sobre o preconceito racial (Quadro 3). QUADRO 3 – Paródia da Comunidade Santana do Urucuri Essa desigualdade eu sei de cor Comunidade estudantil Santana do Urucuri É já tá ficando chato pois é/ Esse teu preconceito pois é/A pedra que eu estou te ensinando/ é sobre o respeito que está faltando. Essa desigualdade eu sei de cor/ Tomo cuidado pra não ficar pior/O segundo passo é me ofender/o terceiro vai ser me bater/ Se o que dói em mim doesse em você Refrão (2X) Deixa/deixa mesmo de ser arrogante/ abandona esse racismo agora/ Vamos encher o mundo de amor/ e toda diferença manda embora. Fonte: acervo próprio. IMAGEM 10 – Comunidade Santana do Urucuri

Fonte: acervo próprio.

No município de Pacajá, a comunidade estudantil Montes Belos idealizou três temas diferentes: compromisso ético (gravidez e o casamento); respeito à diversidade de gênero; e preconceito racial, todos conduzidos pelos alunos por meio do teatro documentário gravado e editado no celular com o App "Kinemaster". Com o uso desse aplicativo, exploraram a sonorização ambiental, inseriram fundo musical e criaram designer com cores e letras próprio das Artes Visuais para apresentação do tema dos participantes e da moral de suas teatralizações; para conduzir o processo em artes, os grupos elaboraram: roteiro, caracterização dos personagens, figurinos, sons ambientais e fundo musical. O grupo 1 refletiu sobre o tema "Compromisso ético: gravidez e o casamento" para associar questões do cotidiano com lutas sociais encenadas em uma fazenda.

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A dramatização retratou a fúria do pai na delegacia ao descobrir a gravidez da filha, em seguida, a cena mostra o pai chegando com o delegado na casa do namorado e o obrigando a assumir a responsabilidade; após o pai e o delegado conduzirem o casal para igreja, o padre pergunta se o rapaz casa de boa vontade. Ao expressar seu desagrado, o noivo é cutucado pela arma do pai e termina aceitando o enlace. A peça finaliza com a saída da família para comemorar e com a projeção da moral da história no vídeo produzido pelo grupo "Engravidou tem que casar”. IMAGEM 10 – São Miguel do Guamá.

Fonte: acervo próprio.

O tema do grupo 2 foi "Respeito à diversidade de gênero"

teatralizado para

problematizar o drama juvenil perante o preconceito de familiares e colegas da escola, evidenciando tanto situações vivenciadas no cotidiano quanto a luta social das minorias. O desenvolvimento do processo expressivo gerou um roteiro de dramatização, seguido da reflexão dos participantes ao final da produção em forma de depoimento, conforme se observa abaixo: Cada qual tem sua estrutura de vida, estrutura genética e psíquica e acima de tudo está envolvido com sua crença, valor, cultura e realidade social, econômica e espiritual de forma diferenciada. Hoje gays, lésbicas, transexuais e outros, organizam-se saindo de seus guetos, reivindicando aquilo que lhe é de direito e responsabilizando-se pela construção de sua própria história. Buscando tornarem-se cidadãos conscientes de seus direitos e deveres, lutam contra o preconceito e discriminação social contra os homossexuais. Essa situação apresenta-se como atitude de extrema crueldade, pois gera sentimentos intensos de menos valia, baixa estima e depressão que muitas vezes dão a sensação de despersonalização que podem levá-los ao suicídio induzido, consciente ou não (relato da estudante da comunidade de Pacajá no documentário).

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IMAGEM 11 – Pacajá.

Fonte: acervo próprio.

Refletindo sobre o tema "Preconceito racial" o grupo 3 conceituou o preconceito da seguinte forma: Preconceito racial é toda e qualquer forma de expressão que discrimina uma etnia e cultura por considerá-la inferior ou menos capaz (relato do grupo 3).

Em seguida, os alunos dramatizaram três situações de discriminação e preconceito vivenciados em lugares públicos. Na cena 1, o personagem negro, ao esbarrar numa garota, percebe que ela rapidamente se limpa com um guardanapo que retira numa das mesas. Na cena 2, uma jovem negra se senta perto de um conhecido e o cumprimenta, mas o jovem não responde e troca de cadeira para se manter afastado dela. A cena 3 inicia na lanchonete com a chegada de duas jovens que se incomodam com a presença de um negro e passam a fazer piadas com a cor do personagem chegando ao ponto de o chamar de macaco; irritado, o personagem negro pede satisfação e as garotas chamam o segurança que joga o personagem para fora do estabelecimento. No final da dramatização apresentam a seguinte reflexão. O vídeo mostra várias coisas que acontecem com os negros de nosso país, preconceito racial é crime e precisa ser combatido, só existe uma raça, a raça humana. As diferenças entre pele e cabelo não definem uma pessoa o que nos define é o nosso caráter. Eu respeito a sua cor de pele, respeite a minha também (relato no documentário do grupo 3).

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IMAGEM 12 – Pacajá

Fonte: acervo próprio.

No município de Tucuruí os alunos da Fazenda Conspel, escolheram a temática "Celebrar o cultivo da terra nossa geração de renda" que articularam com a arte primitiva, antiga e clássica. A partir da exploração de movimentos dançados, coreografados e encenados, elaboraram uma intervenção artística com a composição de uma paródia acompanhada por instrumento de percussão alternativo, violonista e de um grupo de cantores. Para produzir a paródia, selecionaram a música "Remove a minha pedra" (Aline Barros) a fim de discutir a geração de renda, alinhada à expressividade primitiva dos rituais de celebração das colheitas e da fonte de renda da comunidade que é o queijo. A paródia produzida pelos estudantes da Fazenda Conspel foi reproduzida no Quadro 3. QUADRO 3 – Paródia da Fazenda Conspel.

Celebrar o cultivo da terra nossa geração de renda Comunidade estudantil Fazenda Conspel Pra você que mora na cidade no interior tem muito mais felicidade/ É bonito ver a luz do dia/ a noite a luz da lua faz companhia/ tem muita diferença da cidade. Com nossos passos ao redor/assim a nossa vida é bem melhor/ e um novo dia eu sei que vai chegar/Ouvir o galo a cantar/ e sentir a brisa me tocar/ e com alegria eu vou trabalhar. Cultivar a minha terra/ pro alimento do consumo/A criação do gado/ é o sustento da

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família/ A produção do queijo/ é a fonte de renda/ que entrega na cidade/ e exporta para fora/ os produtos daqui. Fonte: acervo próprio. IMAGEM 13 – Fazenda Conspel

Fonte: acervo próprio.

CONSIDERAÇÕES FINAIS É interessante perceber os mecanismos migratórios evidenciados na revisitação de diferentes épocas da história primitiva, antiga e clássica; esses aspectos históricos foram utilizados pelos alunos tanto para contextualizar os processos históricos de diferentes épocas estudadas quanto para perceber e argumentar sobre as transformações dessas visões de mundo ao longo do tempo até na contemporaneidade, trazendo inclusive a reflexão sobre o processo de aculturação que sofremos com o passar do tempo. Percebemos também que o envolvimento do aluno com a atividade proposta ocorreu quando validaram as informações recebidas nas aulas como ideias suas enquanto vivenciaram as linguagens artísticas de maneira híbrida, protagonizando o momento, Notase que a motivação para permanecer conectado com a arte fora do horário da aula foi movida pela necessidade que sentiram de atualizar informações consideradas interessantes e pela oportunidade de elaborar respostas menos estáticas ou codificadas. Além disso, a oportunidade que tiveram de dialogar com os períodos históricos estudados propiciou a elaboração de argumentos a partir de elementos coletados da cultura local com destaque ao interesse juvenil por dispositivos da tecnologia digital na forma de playback, aplicativos de edição audiovisual e uso do celular para produção e interpretação de material audiovisual.

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Enfatizamos, assim, que a capacidade de elaborar um processo expressivo em artes foi movida pela habilidade do educando em dominar diferentes linguagens artísticas para compreender fenômenos artísticos e dessa forma, acreditamos que relatos como esses podem servir de motivação para um trabalho mais efetivo da arte articulando diferentes linguagens artísticas com códigos culturais, saberes e diversidades para fruir sobre a expressão artística da Amazônia paraense e fomentar o protagonismo tão esperado pelos alunos e considerado pelos diversos documentos educacionais vigentes. REFERÊNCIAS BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Ministério da Educação e Cultura. Brasília, DF: MEC, 2018. ______. ENEM 2018 – Exame Nacional do Ensino Médio. INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Ministério da Educação. Brasília, 2018. Disponível em: <http://download.inep.gov.br/download/enem/matriz _referencia.pdf> Acesso em maio de 2019. FREITAS, Philippe Curimbaba. Adorno: A dialética da expressão na música tonal, ANAIS. Simpósio de Estética e Filosofia da Música, Porto Alegre, v.1, n.1, p. 339-356, 2013. FONTERRADA, Marisa Trench de Oliveira. De tramas e fios: um ensaio sobre música e educação. 2. ed. São Paulo: Editora UNESP; Rio de Janeiro: Funarte, 2008. MATEIRO, Teresa; ILARI, Beatriz (Org.). Pedagogias em Educação Musical [Livro eletrônico]. Curitiba: Intersaberes, 2012. (Série Educação Musical). MORIN, Edgar. Os setes saberes necessários à educação do futuro. 2. ed. São Paulo: Editora Cortês, 2000. OSTROWER, Fayga. Criatividade e Processos de Criação. 15. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2001. SALLES, Cecília Almeida. Redes da Criação: Construção da Obra de Arte. 2. ed. São Paulo: Editora Horizonte, 2008. PARÁ. Plano de Implementação do Sistema Educacional Interativo – SEI. Governo do Estado do Pará, Secretaria de Educação do Estado do Pará. Belém do Pará, 2017. VAT/SA. Tecnologia da Informação S.A. Site, 2019. Disponível em: <https://www.vat .com.br/grupo>. Acesso em 8 de maio de 2019.

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A CONTEXTUALIZAÇÃO NO ENSINO DE BIOLOGIA: AULAS DE HISTOLOGIA HUMANA COM ENFOQUE CTS Valdenice Moscoso1 Cristina de Barros Nunes 2 Ivoneide Maria da Silva3

RESUMO: Atualmente, o professor de Biologia se vê diante do desafio de abordar uma gama imensa de conteúdos durante o ano letivo, e inseri-los no cotidiano da sala de aula. Com uma carga horária reduzida e horários limitados de hora-atividade muitos professores se desmotivam e tornam suas aulas meros momentos de exposição de conteúdo, de sua parte, e fixação deste, por parte dos alunos. O objetivo desse estudo foi avaliar a aplicação do enfoque CTS para o ensino do conteúdo de Histologia Humana, como uma alternativa que torne o aluno ativo no processo de ensino-aprendizagem, capacitando-os a transitar entre o conhecimento científico e as peculiaridades do mundo que os cerca, através do levantamento de situações-problema. Assim, os alunos foram instigados a questionar e a buscar seus próprios conhecimentos (aprender a aprender). PALAVRAS-CHAVE: Ensino de Biologia, Contextualização, Histologia Humana.

INTRODUÇÃO O campo da Biologia vem ganhando destaque entre as ciências de ponta e os avanços científicos nesta área marcam sensivelmente a sociedade, desde o século passado (GIASSI, 2009). Desse modo, o ensino de Biologia tem grande relevância para a vida de todo cidadão, e as escolas têm a função de contribuir para que esse conhecimento chegue a todas as pessoas. Entretanto as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (Brasil, 2008, p. 17) complementam que, apesar de a Biologia fazer parte do dia-a-dia da população, “o ensino dessa disciplina encontra-se tão distanciado da realidade que não permite à população perceber o vínculo estreito existente entre o que é estudado na disciplina Biologia e o cotidiano”. Para o autor, essa dicotomia entre o ensino e a vida dos estudantes precisa ser superada e o processo educativo precisa oferecer a necessária integração ao mundo contemporâneo com todas as suas exigências. Pesquisas de autores como Chassot (1990), Schnetzler (2002), Marques (2002), Morin (2003), Maldaner (2007), Santos e Silva (2007), entre outros, apontam que ainda

1Professora

da Secretaria de Educação do Estado do Pará (SEDUC). E-mail: v.moscoso27@gmail.com 2 Professoras Pesquisadoras; Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal do Pará. E-mails: cristina.barros.nunes@gmail.com, isilva@ufpa.br

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vivenciamos um ensino fragmentado, descontextualizado, que interfere e dificulta o processo educativo. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio - PCNEM (Brasil, 1999,

p.13)

também

descrevem

que

temos

um

ensino

“descontextualizado,

compartimentalizado e baseado no acúmulo de informações”. O ensino de Ciências e Biologia deve reconhecer a real possibilidade de entender o conhecimento científico e a sua importância na formação dos alunos, uma vez que ele contribui efetivamente para a ampliação da capacidade de compreensão e atuação no mundo em que vivemos. Partindo do princípio de que ensinar Ciências e Biologia no mundo atual deve constituir uma das prioridades para todas as escolas, que devem investir na edificação de uma população consciente e crítica diante das escolhas e decisões a serem tomadas. Estes disciplinas mostram diretamente as características físicas do mundo em que vivemos e suas necessidades. Nesta perspectiva, é necessário que o ensino vise uma aprendizagem de caráter inovador, contextualizado, questionador, crítico, ético, reflexivo, aplicável interdisciplinar e integrado à comunidade e à escola (BIZZO, 2007). De acordo com esse contexto, é inegável o fato de que o processo de aprendizagem constitui um grande desafio para os educadores. Krasilchik (2005), chama a atenção dos professores de Biologia para as questões: o que ensinar e como ensinar? Ela destaca que o professor deve atentar para o significado da Ciência e da Tecnologia, evitando posturas alienantes. Segundo o psicólogo norte-americano D. P. Ausubel, quando o conteúdo escolar a ser aprendido não consegue ligar-se a algo já conhecido, ocorre o que Ausubel chama de aprendizagem mecânica, ou seja, quando as novas informações são aprendidas sem interagir com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva. Assim, a pessoa decora fórmulas, leis, mas esquece após a avaliação. Para que a aprendizagem significativa ocorra é preciso entender um processo de modificação do conhecimento, em vez de comportamento em um sentido externo e observável, e reconhecer a importância que os processos mentais têm nesse desenvolvimento. As idéias de Ausubel também se caracterizam por basearem-se em uma reflexão específica sobre a aprendizagem escolar e o ensino, em vez de tentar somente generalizar e transferir à aprendizagem escolar conceitos ou princípios explicativos extraídos de outras situações ou contextos de aprendizagem. Para haver aprendizagem significativa são necessárias duas condições. Em primeiro lugar, o aluno precisa ter uma disposição para aprender: se o indivíduo quiser memorizar o conteúdo arbitrária e literalmente, então a 160


aprendizagem será mecânica. Em segundo, o conteúdo escolar a ser aprendido tem que ser potencialmente significativo, ou seja, ele tem que ser lógica e psicologicamente significativo: o significado lógico depende somente da natureza do conteúdo, e o significado psicológico é uma experiência que cada indivíduo tem. Cada aprendiz faz uma filtragem dos conteúdos que têm significado ou não para si próprio Os estudantes reagem de forma diferente ao estudo dos conteúdos. A metodologia que funciona para uma turma pode não funcionar em outra e, às vezes, até em uma mesma turma as reações são diferentes. Há alunos que se preocupam apenas em passar de ano, ou seja sua única preocupação é o resultado, traduzido pelas notas, demonstrando um relacionamento bem superficial com o conteúdo. Porém, há também aqueles que buscam esclarecimentos mais profundos, que pesquisam, questionam e analisam os conteúdos ministrados buscando atingir uma visão mais ampla do conhecimento. Krasilchik (2005, p. 12), descreve quatro níveis de alfabetização biológica: 1º - Nominal – quando o estudante reconhece o termo, mas não sabe seu significado biológico. 2º - Funcional – quando os termos memorizados são definidos corretamente, sem que os estudantes compreendam seu significado. 3º - Estrutural – quando os estudantes são capazes de explicar adequadamente, em suas próprias palavras e baseando-se em experiências pessoais, os conceitos biológicos. 4º - Multidimensional – quando os estudantes aplicam o conhecimento e habilidades adquiridas, relacionando-as com o conhecimento de outras áreas, para resolver problemas reais.

Os alunos ao concluírem o Ensino Médio devem atingir o 4º nível de alfabetização biológica, ou seja, além de compreender os conceitos básicos da disciplina, devem estar capacitados a articular o seu pensamento de forma independente, aplicando seu conhecimento na vida e intervindo para resolver os problemas. Se isso de fato acontecesse, os estudantes estariam contemplando as cinco competências exigidas pelo Enem e mais preparados para interpretar até mesmo as questões consideradas mais complexas. São elas: Competência 1: Dominar linguagens (DL) Dominar a norma culta da Língua Portuguesa e fazer uso das linguagens matemática, artística e científica e das línguas espanhola e inglesa. Competência 2: Compreender fenômenos (CF) Construir e aplicar conceitos das várias áreas do conhecimento para a compreensão de fenômenos naturais, de processos histórico-geográficos, da produção tecnológica e das manifestações artísticas. Competência 3: Enfrentar situações-problema (SP) Selecionar, organizar, relacionar, interpretar dados e informações representados de diferentes formas, para tomar decisões e enfrentar situações problema.

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Competência 4: Construir argumentação (CA) Relacionar informações, representadas em diferentes formas, e conhecimentos disponíveis em situações concretas, para construir argumentação consistente. Competência 5: Elaborar propostas (EP) Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para elaboração de propostas de intervenção solidária na realidade, respeitando os valores humanos e considerando a diversidade sociocultural.

Essas cinco competências são avaliadas nas quatro áreas de conhecimento do Enem (Ciências Humanas e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias, Linguagens, Códigos e suas Tecnologias e Matemática, Códigos e suas Tecnologias) e também na Redação. Desse modo, os conhecimentos biológicos, se compreendidos como produtos históricos indispensáveis à compreensão da prática social, podem contribuir para revelar a realidade concreta de forma crítica e explicitar as possibilidades de atuação dos sujeitos no processo de transformação desta realidade (LIBÂNEO, 1983). Para enfrentar esses desafios e contradições, o ensino de Biologia deveria se pautar pela alfabetização científica. Esse conceito implica três dimensões: a aquisição de um vocabulário básico de conceitos científicos, a compreensão da natureza do método científico, a compreensão da natureza do método científico e a compreensão sobre o impacto da ciência e da tecnologia sobre os indivíduos e a sociedade (BRASIL, 2006). Diante deste contexto, Vasconcelos et al. (2002), relata que vivemos no Brasil uma situação paradoxal quanto ao ensino de Ciências e Biologia, pois, apesar de ninguém ser capaz de negar a importância social de abordar, em todos os níveis pedagógicos, o conhecimento científico e biotecnológico, na prática cotidiana das escolas este ainda tem sido o mais ausente. Diante do exposto, o objetivo desse trabalho foi diversificar as modalidades didáticas utilizadas em sala de aula nos conteúdos de Histologia Humana, por meio de alternativas que torne o aluno ativo no processo de ensino-aprendizagem, capacitando-os a transitar entre o conhecimento científico e as peculiaridades do mundo que os cerca, através do levantamento de situações-problema. Assim, os alunos são instigados a questionar e a buscar seus próprios conhecimentos (aprender a aprender).

1. A ABORDAGEM CTS NO ENSINO DE CIÊNCIAS No Brasil, a abordagem CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade) aparece durante a década de oitenta no contexto curricular do ensino de Ciências, cujo um dos objetivos era 162


o de analisar as implicações sociais do desenvolvimento científico e tecnológico (KRASILCHIK, 1987). Para Santos e Schnetzler (2003), a inter-relação CTS é importante por permitir aos alunos associarem a sua compreensão pessoal do mundo científico com o construído pelo homem na forma de tecnologia e o seu dia- a- dia. Segundo Santos e Mortimer (2002), a principal proposição dos currículos com ênfase na abordagem CTS está na tentativa de disponibilizar aos estudantes as representações que lhes possibilitem agir, tomar decisões e compreender o que está em jogo

no

discurso

dos

especialistas.

O

enfoque

pretende

desencadear

a substituição do currículo convencional de Ciências Naturais, centrado na preparação para cursos universitários e considerado pouco interessante e relevante pelos estudantes, por um currículo centrado no desenvolvimento de conhecimentos, capacidade e atitudes úteis para a vida diária dos mesmos e acima de tudo, preocupado com a responsabilidade social em processos coletivos de tomada de decisão sobre assuntos relacionados com Ciência e Tecnologia (REIS, 2004). Silva e Carvalho (2007) destacam que a possibilidade de desenvolver trabalhos educativos que considerem a discussão de questões sociocientíficas controversas em sala de aula oferece excelentes oportunidades para aproximar-se das reais condições de produção da Ciência. Diante disso, a característica distintiva do ensino na abordagem CTS está direcionada à prática científica e tecnológica, diretamente ligada à formação da cidadania. Uma educação voltada para preparar e responsabilizar o cidadão na tomada de decisões, entendendo a Ciência e a Tecnologia como um processo social onde elementos como valores morais, crenças, interesses profissionais, pressões econômicas, entre outros, desempenham um papel decisivo para criar e estabilizar ideias científicas e objetos tecnológicos (CARVALHO; MION; SOUZA, 2005). Para os defensores desta abordagem, tanto a alfabetização científica e tecnológica quanto o letramento científico estão em consonância com o objetivo de formação para a cidadania, requeridos pelos órgãos oficiais de educação no Brasil, pois contemplam a apropriação pelo estudante de conceitos fundamentais da disciplina, valorizando a leitura, a interpretação e a análise crítica dos problemas do cotidiano relacionados com os conceitos aprendidos (AMARAL; XAVIER; MACIEL, 2009). De acordo com Santos e Mortimer (2002), alfabetizar os cidadãos em ciência e tecnologia é hoje uma necessidade do mundo contemporâneo. A esse respeito, Bazzo (1998) aborda que o cidadão merece aprender ler e entender – muito mais do que conceitos 163


estanques – a ciência e a tecnologia, com suas implicações e consequências, para poder ser elemento participante nas decisões de ordem política e social que influenciarão o futuro das próximas gerações. Por essas e outras razões aparecem manifestações em defesa da mudança nos conteúdos desenvolvidos no Ensino de Ciências na escola, assim como ocorreu em outras épocas, como nos anos 50 e 70, quando o ensino adaptou- se ao modelo de sociedade de pós-guerra e sociedade industrial, respectivamente. Se considerarmos que a escola pode contribuir para a formação dos cidadãos, o Ensino de Ciências, de alguma forma, deve cumprir seu papel na compreensão dos fenômenos e tecnologias presentes em nosso mundo. Entretanto para que isso ocorra, é necessário rever a forma de ministrar esses conteúdos nos ensinos Fundamental e Médio a fim de atender às necessidades de uma sociedade que mudou e está constantemente mudando. Nesse sentido, entende-se que o papel do professor como mediador neste processo de ensino e aprendizagem é fundamental. Este deve promover uma boa interação em sala de aula, incentivando a liberdade intelectual, estimulando o pensamento crítico, a criatividade e a comunicação entre os alunos, colaborando para a autonomia destes (ACEVEDO, 1996). Deste modo, a abordagem CTS propõe uma maior autonomia tanto dos professores quanto dos alunos em busca de uma educação cidadã. 2. A ação As atividades foram planejadas em reuniões semanais envolvendo alunos do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFPA (Universidade Federal do Pará), bolsistas do PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência), professoras supervisoras e a coordenadora do Laboratório de Pesquisa e Ensino em Biologia. Esse programa oportuniza uma articulação entre a Universidade e as Escolas, permitindo a troca e o compartilhamento de ações, estimulando o envolvimento dos graduandos em licenciatura no exercício da prática docente, contribuindo para a excelência na formação de professores para o ensino de Ciências e Biologia. O estudo de Histologia para o ensino básico ainda está longe da realidade do aluno, pois é consideravelmente complexo e extenso, sobretudo pela sua composição, funcionalidade e de como este pode ser integralizado ao nível de sistemas corpóreos. Diante disso, todas as aulas foram elaboradas buscando-se estabelecer uma contextualização dos tópicos, tornando-os significativos socialmente, de forma que os alunos pudessem ser

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agentes de transformação social em um processo de educação problematizadora que resgatasse o papel da formação da cidadania. O desenvolvimento das atividades ocorreu durante o ano letivo de 2016, entre os meses de abril e junho, na Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio “Lauro Sodré”. Foram contempladas cinco turmas de alunos do 3º ano do Ensino Médio, que se preparavam para o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio). Os quatro tecidos (Epitelial, Conjuntivo, Muscular e Nervoso) foram abordados em cinco aulas de 2:30h, sendo o tecido conjuntivo abordado em dois momentos. No primeiro, foram trabalhados os conteúdos de tecido adiposo e cartilaginoso e no segundo momento o tecido ósseo e o hematopoiético. A aula de Tecido Epitelial iniciou projetando imagens de pessoas tatuadas e abordando o tema tatuagem em uma abordagem histórica, sociocultural e biológica. Os alunos foram estimulados a debater e opinar sobre as seguintes questões: • • •

Quais significados vocês atribuem a tatuagem? Alguém da turma tem uma ou conhece alguém que tenha tatuagem? Você ou a pessoa que conhece já sofreram algum tipo de discriminação por conta disso? Por que um risco de caneta na pele sai com a lavagem e uma tatuagem não? Estas questões suscitaram uma discussão acalorada e abriram oportunidades

para que o conteúdo teórico fosse apresentado de uma forma bem dinâmica. A aula de tecido conjuntivo abordou os temas obesidade, uso de piercings, doenças do tecido hematopoiético e o uso indiscriminado de aparelhos ortodônticos. A aula de tecido adiposo foi iniciada com a animação “Como a obesidade acontece”, disponível em https://www.youtube.com/watch?v=BLNJycA9o6Y&feature=youtu.be que aborda a questão da obesidade na adolescência. Em seguida os alunos, principalmente do sexo feminino, deram suas opiniões e fizeram alguns relatos a respeito do assunto. Padrões sociais de beleza e auto-estima foram discutidos. A mesma temática foi mantida na explanação sobre tecido cartilaginoso onde foram mostradas várias imagens de pessoas com piercings e sua associação com quelóides. A aula de tecido ósseo iniciou-se com uma reportagem sobre a utilização de aparelhos dentários falsos e os prejuízos que esse uso inadequado pode acarretar para a saúde bucal e corporal. Assim como problematizar a partir de comentários em um site sobre a afirmação que “aparelhos falsos é coisa de pobre”. A partir da discussão, foi explicada a

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fisiologia da mobilidade dos dentes durante um tratamento dentário durante a qual foram levantadas questões que permitiram a exposição do conteúdo teórico. Na aula de tecido hematopoiético foram discutidas algumas doenças relacionadas ao sangue e em seguida foi projetado o resultado de dois hemogramas completos, um de um adolescente que foi submetido a um procedimento de quimioterapia e outro de cachorro, com seus respectivos valores de referência para que os alunos pudessem analisar. A aula de tecido muscular fez relação do conteúdo com o uso de esteroides anabolizantes, suas implicações na saúde do corpo e influência no conceito de beleza da sociedade. A aula foi dividida em quatro momentos: No primeiro, logo no início da aula, foi mostrado um vídeo sobre a história do descobrimento dos esteroides anabolizantes, a sua fabricação sintética, seu funcionamento no corpo, seu uso para o aumento da massa muscular entre atletas e pessoas que frequentam academias e seus efeitos colaterais quando usados sem orientação e de forma exagerada. No segundo momento, abriu-se um pequeno debate para discutir os pontos importantes do vídeo e ouvir a opinião dos alunos que quisessem se expressar. Nesse momento, foram colocadas algumas questões para que pudessem analisar: ● O que são esteróides? Como eles atuam no nosso corpo? ● Quais são as complicações à saúde com o uso de esteroides? ● O que motiva o uso dessas substâncias em nossa sociedade? A busca pelo corpo ideal?! ● Como você vê a influência da mídia em relação ao modelo de corpo “bonito” na sua vivência social? O terceiro momento foi baseado em uma apresentação de slides dos aspectos científicos e específicos da aula sobre os diferentes tipos de tecidos musculares do nosso corpo, os tipos de proteínas envolvidos nos movimentos de contração e relaxamento dos músculos, antagonismo muscular, contrações isotônicas e isométricas, fermentação láctica dos músculos e no quarto e último momento, foi solicitado aos alunos que escrevessem em uma folha de papel um pequeno texto acerca da nossa discussão em sala. Na aula de tecido nervoso primeiramente foi abordada uma problemática envolvendo o assunto e que faz parte do cotidiano de algumas pessoas, as doenças degenerativas (Alzheimer e Esclerose Múltipla, entre outras) em que o tecido nervoso é atingido e acaba trazendo grandes problemas de saúde. Nessa parte introdutória, foi explicado o que é uma doença degenerativa, sua epidemiologia, etiologia, tipos, suas

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características junto com os exames técnicos que são de suma importância para ajudar no diagnóstico. Também foi abordado onde e porque ocorrem. Além disso, foram apresentados vídeos de pessoas portadoras de doenças degenerativas com o objetivo de mostrar a importância de se ter o conhecimento das mesmas, para saber como tratar pessoas portadoras com respeito e sem preconceito na sociedade, ajudando-as a conseguir seu espaço com mais dignidade. Em seguida, em uma aula expositiva, foi abordado sobre neurônios, tipos de neurônios e sua estrutura, células de schwann, bainha de mielina, células da glia, transmissão do impulso nervoso, regeneração das fibras nervosas, sinapse e mediadores químicos. Ao final de todas as aulas, questões de provas anteriores do ENEM ou semelhantes a elas eram projetadas e discutidas.

3 RESULTADOS As aulas foram pensadas e planejadas para se trabalhar os conteúdos de Histologia Humana com os alunos do 3º ano do Ensino Médio de uma forma diferente daquela que se vinha trabalhando nos anos anteriores e na qual não se percebia uma aprendizagem significativa. “Desde que comecei a ministrar aulas de Biologia a minha grande preocupação sempre foi o vestibular, o conteúdo de Histologia Humana, para mim não passava de pré-requisito para a Fisiologia humana”, afirmou a professora das turmas. O pensamento de ministrar os conteúdos visando simples e unicamente o vestibular parece ser compartilhada por um grande número de professores. Autores como Chassot, (1990); Krasilchik, (2005); Maldaner, (2007) observam que em suas pesquisas ainda encontram um ensino sem conexão com o cotidiano, em geral, preocupado com o vestibular. Os autores chamam a atenção de que uma das grandes perdas do Ensino Médio é justamente essa preocupação com os conteúdos em função do vestibular, pois, devido a ele, aspectos relevantes para a vida do estudante deixam de ser tratados. Através dessa prática, pôde se perceber que mesmo o conteúdo de Histologia, aparentemente muito teórico e de difícil contextualização com o dia a dia dos estudantes, pode se tornar interessante, dependendo da metodologia empregada. Essa afirmação corrobora o pensamento de Krasilchik (2005), quando firma que a Biologia pode ser uma das disciplinas mais relevantes e merecedora da atenção dos educandos ou uma das mais insignificantes, dependendo do que for ensinado e de como isso for feito. É consenso entre os autores Krasilchik (2005), Marandino et al. (2005), Sacristán (2000), Torres et al. (2007)

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e Delizoicov (2000) que o conteúdo e a metodologia estão intimamente relacionados, tanto para o ensino quanto para a aprendizagem. Essa constatação também pôde ser reforçada pelos depoimentos de alguns alunos, durante a aula de tecido epitelial, quando foi feita a eles a seguinte pergunta: Você acredita que a dinâmica proposta na aula, começando com uma discussão aberta sobre o tema tatuagem, seguida por uma exposição dialogada sobre tecido epitelial e finalizando com aplicação de exercícios, foi significativa para o melhor entendimento do conteúdo especifico? “Foi importante porque prezou a participação dos alunos, a gente pôde dar nossa opinião e no final a gente pôde fixar a matéria fazendo questões”. “Eu acho que o primeiro assunto foi mais simples porque a gente conseguiu interagir logo com ele, pra gente poder ter uma intimidade e interagir no resto das coisas, ele teve uma explicação muito boa e quando a gente chega pra fazer o exercício no final, significa que a gente entendeu bastante coisa”. “Eu achei interessante, porque normalmente quando a gente aprende só a teoria, quando é dada muita teoria a gente não consegue relacionar com a nossa vida e assim quando foi falado sobre o contexto social sobre a tatuagem a gente conseguiu levar o fator da tatuagem já para o tecido epitelial, pra gente conseguir entender como funcionava o sistema. Eu achei interessante”.

Além da mudança na metodologia empregada para o ensino de Histologia, um outro fator que contribuiu de forma significativa para melhorar o aprendizado foi o tempo disponibilizado para as aulas. Todas as atividades foram desenvolvidas aos sábados e, apesar de terem sido planejadas aulas de aproximadamente duas horas, esse tempo, na maioria das vezes, foi estendido. Isso foi muito importante porque oportunizou a participação dos alunos tirando os mesmos da situação de meros ouvintes. De acordo com uma pesquisa realizada por Giassi, (2009) com professores de Criciúma – SC a maioria deles reclama que a duração de cada aula é pequena para tratar de um assunto dentro de uma lógica didático pedagógica, ou seja, com início, meio e fim, havendo a necessidade de interromper quando parece estar começando a “engrenar” com o aluno. Acreditamos que o maior tempo de aula disponível para a realização das atividades foi essencial para que os estudantes pudessem expor suas ideias e opiniões. Além disso, o fato de ser sempre o mesmo grupo e esse grupo contar com um número menor de alunos (em torno de 30 alunos) do que habitualmente encontrado nas turmas, contribuiu para se estabelecer uma interação maior entre eles, evitando a preocupação e o medo de possíveis críticas por parte dos colegas. De acordo com Rossasi e Polinarski (2007), o processo ensino-aprendizagem é dinâmico e coletivo, exigindo para isso, parcerias entre professor/aluno e aluno/aluno e o

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professor poderá optar por várias modalidades didáticas para estabelecer essas relações dialógicas. Apesar das aulas terem sido, a maior parte do tempo, expositivas, o que geralmente reduz a interação professor/aluno, as discussões em torno dos conceitos tornouas mais agradáveis e interessantes, desafiando a imaginação dos estudantes. Através da modalidade didática de discussão foi possível utilizar aprendizagem colaborativa e cooperativa. Para Torres e Irala (2007) esta modalidade tem o potencial de promover uma aprendizagem mais ativa por meio do estímulo ao pensamento crítico; ao desenvolvimento de capacidades de interação, negociação de informações e resolução de problemas. Essa forma de ensinar e aprender torna os alunos mais responsáveis por sua aprendizagem, levando-os a assimilar conceitos e construir conhecimento de uma maneira mais autônoma: uma das ideias centrais que ela encerra é a de que o conhecimento é construído socialmente, na interação entre pessoas e não pela transferência do professor para o aluno. Portanto rejeita fortemente a metodologia de reprodução do conhecimento, que coloca o aluno como sujeito passivo no processo de ensino aprendizagem. (TORRES; IRALA, 2007).

Outros dois fatores bastante relevantes e de grande importância para o sucesso dessa atividade foi, sem dúvida, a parceria entre a professora coordenadora e as professoras supervisoras e os bolsistas do PIBID. Em geral, os bolsistas do programa PIBID planejam aulas diversificadas que procuram estimular a curiosidade dos alunos, permitindo que os mesmos aprimorem, construam e reconstruam seus conceitos, além de apreender de modo significativo o conteúdo ministrado. Essa troca de ideias e experiências, possibilita, principalmente ao professor supervisor, que está à frente das turmas, iniciar um processo de reflexão das suas atitudes, durante o qual se pode vivenciar um novo jeito de ensinar e aprender e, mediante a nova experiência, revê sua maneira de ser e fazer. Essa capacidade de inovar, transformar e, criar novos procedimentos e alternativas para as ações planejadas proporcionam estratégias didáticas significativas e produtoras de sentido aos alunos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Para alguns conteúdos a contextualização no Ensino de Biologia não é fácil, nem tampouco simples, especialmente quando leva o professor a lidar com questões que extrapolam os conteúdos previstos nos planejamentos. Exige criatividade e disposição do professor para lidar com o novo. Todo o planejamento é feito antes do início das aulas, levando em consideração apenas o que será cobrado no vestibular. O ideal seria, no início 169


do ano letivo realizar uma diagnose nas turmas e solicitar dos alunos os conteúdos que eles desejam trabalhar, isso implicaria trazer o conteúdo para a realidade deles tornando a aprendizagem significativa, além de reduzir a desmotivação, um dos grandes empecilhos para o aproveitamento escolar. A educação escolar deve proporcionar aos estudantes a possibilidade de resolver situações que precisam enfrentar no dia-a-dia, torná-lo capaz de usar o conteúdo em prol de si mesmo. Embora saibamos que isso nem sempre é uma tarefa fácil, a escola deve, pelo menos, tentar favorecer essa transição. A fim de que o aprendizado se torne algo prazeroso e os alunos se sintam desafiados a buscar o conhecimento.

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