REVISTA
maio/2011
Cidadão do século 21
A importância de articular habilidades e competências com as diferentes áreas do conhecimento
Ler para compreender
A leitura como suporte para a compreensão do mundo
Escolas Inovadoras
Você está pronto para a escola conectada com o mundo, que propõe aprendizagens significativas e forma alunos críticos e pró–ativos?
Artigos • A educação transforma ou reproduz a sociedade? • O que esperar de um mundo mais veloz do que a luz?
anĂşncio
2 maio 2011
anĂşncio
maio 2011
3
Conselho Editorial: Marcos Mello Luciana Mello Produção: Projeto Comunicação (41) 3022 3687 redacao@projetocomunicacao.com Editora-Chefe: Melissa Castellano
07
editorial
08
Bate-Papo
12
Habilidades e Competências
Colaboradores: Celso Antunes Mario Sergio Cortella
Divulgação
Reportagem: Brisa Teixeira Luciana Zenti Rosiane Correia de Freitas
Revisão: Maikon Kempinski Projeto Gráfico: Celso Arimatéia Diagramação e Arte-Final: Goretti Carlos
Numa entrevista exclusiva, José Pacheco, o criador da Escola da Ponte propõe uma reflexão sobre mudanças prementes no currículo da escola, na formação pessoal e social do aluno, no espaço mobiliário das instituições e na relação das famílias com a escola.
Empreendedorismo, trabalho em equipe, responsabilidade social, comunicação oral e autoliderança são algumas das habilidades e competências fundamentais para o cidadão do século 21. Você sabe como articulá-las com as diferentes áreas do conhecimento?
Ilustrações: Daniel Klein Marcos de Melo Fotos: AI/Guilherme Pupo Dreamstime.com/Yuri Arcurs iStockphoto.com/Luoman Shutterstock/Laurence Gough Shutterstock/PhotoCreate Shutterstock/Photocriate
Divulgação
Ilustração de Capa: Marcos de Melo sobre foto de iStockphoto.com/Caracter Design; Shutterstock/Ajt
16
Escolas Inovadoras
Futuro Eventos A Revista Educador Educar é uma publicação da Futuro Eventos. Todos os direitos reservados. Rua Rolândia, 1281 – Pinhais (PR) (41) 3033 8100 www.futuroeventos.com.br
4 maio 4 maio 2011
Você está pronto para a escola que está aberta para a sociedade, propõe aprendizagens significativas, motiva os alunos a aprender ativamente, forma cidadãos críticos e preparados para interagir com o planeta de maneira integral? Bem-vindo ao mundo das escolas inovadoras!
22
Ler para compreender
28
Mais veloz que a luz
A leitura deixou de ser apenas um instrumento de alfabetização. Ela ocupa cada vez mais espaço como suporte para a compreensão do mundo.
O educador Celso Antunes questiona o “aprender a viver” e o despertar da sensibilidade do aprendiz para que ele se torne protagonista de seu tempo.
34 30
Tecnologia
38
Para pensar
40
Liderar é preciso
Divulgação
Divulgação
Índice
Comportamento
O bullying é a mais cruel face da violência escolar. Saber reconhecê-lo e combatê-lo é uma tarefa de todos: professores, pais, funcionários e alunos.
Dos livros às redes sociais: professores e alunos dividindo diferentes realidades em sala de aula.
O educador Mário Sérgio Cortella discute sobre a educação que transforma e reproduz a sociedade.
Dentro da sala de aula, é necessário instigar, orientar e formar novas lideranças. Fora dela, é preciso colaborar para uma melhor organização da instituição de ensino.
44
42
Três em um
46
Livros e filmes
Sustentabilidade
O desenvolvimento sustentável é o grande desafio da sociedade. E a educação, o caminho pelo qual chegaremos lá.
Uma seleção de livros e filmes para você reciclar o repertório.
Divulgação
Especialistas de três países debatem sobre a utilização da avaliação como instrumento de gestão, tanto no aspecto político quanto no pedagógico.
maio 2011
5
6 maio 2011
Editorial
Quando assumimos a Direção do Educador/Educar, em Dezembro de 2009, sabíamos da imensa responsabilidade em recolocar esse evento no lugar de destaque que ele sempre teve. Até então, haviam sido realizadas 16 edições do Educador/Educar e, a partir de 2010, coube a Futuro Eventos a missão de efetivá-lo como o maior evento da América Latina. Para isso, desde o início estabelecemos um planejamento a curto, médio e longo prazo que vem sendo periodicamente avaliado com o intuito de atingirmos, a cada momento, um degrau a mais da nossa aspiração. Nosso foco está voltado para um evento sólido, sustentável e que atenda os anseios de participantes dos congressos e seminários, visitantes das feiras, expositores, palestrantes, patrocinadores, apoiadores, fornecedores e imprensa especializada. O lançamento da Revista Educador Educar, neste ano, marca um momento interessante de registro e divulgação dos fatos, dos profissionais e negócios que estarão envolvidos, ano a ano, nesse evento. A ideia é ter uma edição voltada para as situações temáticas propostas nos congressos e seminários e, ainda, no momento que precede a realização e no encaminhamento para a próxima edição, mostrar o que foi feito e o que pretendemos para o ano seguinte. Ótima leitura a todos!
Luciana Mello e Marcos Mello Futuro Eventos
maio 2011
7
Bate-Papo
É preciso ousar para mudar
Professores do mundo todo visitam a Escola da Ponte, em Portugal, e se surpreendem com tanta inovação. Hoje, José Pacheco, o idealizador da instituição, fundada em 1976, está aposentado e deixou-se “colonizar” pelo Brasil. Nesta entrevista exclusiva para a Revista Educador Educar, José Pacheco nos leva a refletir sobre mudanças urgentes que precisam ocorrer no currículo da escola, na formação pessoal e social do aluno, no espaço mobiliário das instituições e na relação das famílias com a escola.
8 maio 2011
O educador José Pacheco deixou-se “colonizar” pelo Brasil
É preciso ser ousado e quebrar muitas regras para tornar uma escola inovadora?
Que disciplinas são imprescindíveis para o aluno de hoje?
José Pacheco: Para tentar acabar com
NA vida. Em vez de nos preocuparmos
a possibilidade de erigir uma escola em mito, direi que, em 1976, a escola funcionava num velho edifício contíguo a uma lixeira. As poucas carteiras com buraco para o tinteiro ameaçavam desfazer-se. O banheiro estava em ruínas e não tinha porta. Havia classes de “lixo”,
Pacheco: Não se prepara para a vida, mas com a acumulação cognitiva de conteúdos, que são inutilidades para debitar em provas, e que a memória (porque é inteligente) esquecerá, talvez devêssemos incluir no currículo muito mais formação pessoal e social, a aprendizagem da convivencialidade. Talvez seja necessário
em sua maioria constituídas por alunos
aprender a se alimentar para escapar à
com idade para sair da escola, mas que
tentação do fast-food. Talvez aprender a
não sabiam ler. Os pais dos alunos não
resistir ao consumismo e, efetivamente,
apareciam na escola. Havia alunos que
respeitar o ambiente. Talvez aprender a
batiam em professores. Estávamos no fim
resistir à violência urbana, sem depender
de uma ditadura de 48 anos. Foi preciso
de novelas, big brothers e outras aliena-
ousadia, trabalho em equipe e apoio da
ções. Talvez desenvolver a sensibilidade
comunidade para fundamentarmos teo-
e o sentido estético para saber distinguir
ricamente tudo aquilo que mudamos na
entre música e o lixo sonoro com que a
nossa prática.
mídia nos bombardeia.
“Aquilo que na Ponte se faz não deverá ser clonado. Nada se repete. Cada escola é diferente de outra escola. Não há segredo para o ‘sucesso’.”
maio 2011
9
Bate-Papo
“Já não faz sentido alguém prescrever um currículo único para diferentes realidades sociais e culturais. Sobretudo num país como o Brasil. As escolas deverão ser produtoras e não reprodutoras de currículo, trabalhando a partir de necessidades concretas, fazendo mediações para a prática de currículo subjetivo.”
E a alfabetização digital? Pacheco: Obrigatória ela será, mas não como vem acontecendo. As escolas converteram-se ao mundo digital, mas mantêm e reforçam práticas de ensino obsoletas. No improviso e imediatismo das “novas” práticas, o insucesso mantém-se e prospera. Lousas digitais e quadros interativos são mera cosmética, para disfarçar a manutenção da mesmice. As escolas poderiam esvaziar os chamados “laboratórios de informática” e disponibilizar, em todos os seus espaços, instrumentos de pesquisa, ajudando os jovens a analisar criticamente a informação que recolhem. Mais do que cumprir o papel de censor, os professores deveriam ensinar os seus alunos a selecionar conteúdos e
sidades concretas, fazendo mediações
do professor autenticidade: um professor
para a prática de currículo subjetivo.
não ensina aquilo que diz; um professor
Cada ser humano é único e irrepetível.
ensina aquilo que é.
Cada aluno deveria poder construir o seu currículo, em processos de autoconstrução do conhecimento, apoiado em mediadores que o orientasse na busca de informação. Porém será necessário prevenir alguns equívocos provocados por certas modas pedagógicas – nem sempre a aprendizagem tem de partir das necessidades do aluno.
Quais são as principais barreiras da escola tradicional para se tornar uma escola adaptada ao mundo atual? Pacheco: A primeira barreira é o professor autossuficiente, autocentrado,
A arquitetura das escolas precisa mudar? Pacheco: A arquitetura escolar ainda hoje se inspira num modelo do século XVIII. Em 1976, adotamos o chamado modelo de escolas de “área aberta”, libertando a criança da rigidez dos espaços e do mobiliário tradicionais. É preciso procurar o ambiente que encoraje uma melhor comunicação entre alunos e professores; mobilizar os professores para o trabalho em equipe; facilitar a adaptação da organização escolar às diferenças individuais e à contínua aquisição de conhecimentos, a fim de permitir os reagrupamentos fun-
a comunicar.
solitário. Professor sozinho na sala de
Como deveria ser o currículo desse novo século?
mais de um século. Mas a cultura e o
Pacheco: É requerido às escolas que edu-
formação reprodutora desse modelo. Não
quem para o consumo, para o ambiente,
sei se é o medo que impede a mudança,
para a saúde, para o trânsito, para a ci-
há muito tempo necessária. Talvez seja
dadania. O conjunto de saberes que uma
acomodação. Talvez a burocracia reine
escola deve abordar deveria depender
sobre a pedagogia nos órgãos de decisão
das peculiaridades do seu entorno, con-
e falte competência àqueles que detêm a
textualizado na sociedade globalizada.
responsabilidade de tomar decisões de
Já não faz sentido alguém prescrever um
política educativa. Talvez falte dignidade
currículo único para diferentes realida-
profissional para muitos professores.
des sociais e culturas. Sobretudo num
Ou talvez seja conveniente às elites
país como o Brasil. As escolas deverão
que a reprodução da ignorância e das
ser produtoras e não reprodutoras de
desigualdades sociais perdure. Talvez os
Emília e na Ponte caminhos possíveis
currículo, trabalhando a partir de neces-
obstáculos desapareçam quando se exigir
para melhorar a educação e o mundo. No
10 maio 2011
aula é algo que já não faz sentido há peso da tradição são reforçados por uma
cionais de alunos; estimular nas crianças a multiplicação dos contatos pessoais; e facilitar múltiplas e diversas organizações, transformações temporárias (por vezes permanentes), permitir as mais variadas modificações, dando assim flexibilidade não só aos diferentes modos de organização escolar, como também aos diferentes tipos de pedagogia.
O que o senhor tem visto de mais inovador por aqui? Pacheco: Eu tive oportunidade de conhecer muitos professores e escolas de países europeus, que veem em Reggio
José Pacheco sobre o Brasil: “Sinto-me um privilegiado por encontrar tanta generosidade
“Não se prepara para a vida, mas NA vida.”
Os excelentes profissionais que nelas la-
tutores dos seus filhos a qualquer hora
butam possuem saberes suficientes para
de qualquer dia, sem prejuízo no trabalho
romper o círculo vicioso do insucesso. E
dos professores.
Brasil, onde me encontro, contam-se por
compreenderam que o seu país não pa-
centenas as escolas que trabalham inspi-
dece de carência de recursos – o Brasil
radas na Escola da Ponte; são milhares
gere mal ou desperdiça recursos.
os professores e as universidades que es-
O modelo da Escola da Ponte pode ser seguido por outras escolas? Pacheco: Aquilo que na Ponte se faz não deverá ser clonado. Nada se repete. Cada
mas não inútil. E, quando me apercebi de
Uma boa relação entre a escola e a família faz realmente diferença?
que o Brasil tem os professores certos a
Pacheco: Ouvimos falar da crise das
trabalhar de modo errado, deixei-me “co-
instituições e, em particular, da crise
lonizar” pelo Brasil. Encontrei professo-
da instituição família. Muitas crianças
res com salário indigno e estatuto social
chegam às escolas já destruídas por pais
depreciado, que dão sentido às suas vidas
inseguros, permissivos ou prepotentes.
dando sentido à vida das crianças e das
Num tempo de narcisismo exacerbado,
escolas. Sinto-me um privilegiado por
muitos pais esquecem-se de educar os
encontrar tanta generosidade e ousadia
filhos e consideram as escolas depósitos
dades de ensinar, a assumir autonomia e
responsável. Decidi juntar-me a eles, para
de alunos. Na Ponte, a existência de
efetuar mudanças, também poderão fazer
acabar com os discursos miserabilistas
tutores permite maior aproximação.
de todos os seus alunos seres mais sábios,
e provar que este país tem boas escolas.
Os pais dos alunos são recebidos pelos
pessoas mais felizes. Em equipe!
tudam a nossa escola. Estou aposentado,
escola é diferente de outra escola. Não há segredo para o “sucesso”. Na Ponte, apenas fizemos perguntas: Por que razão há alunos que não aprendem? Por que razão as aulas duram 50 minutos? Buscamos respostas e substituímos os absurdos por soluções. Se os professores de outras escolas se dispuserem a rever as suas práticas, a identificar as suas dificul-
maio 2011
11
Habilidades e Competências
por Rosiane Correia de Freitas
Cidadão do século 21
Algumas habilidades e competências se tornam cada vez mais necessárias no mundo atual. E a escola precisa desenvolvê-las de forma articulada com as áreas do conhecimento.
12 maio 2011
Daniel Klein
Não importa o ano em que o aluno entre na escola, algumas coisas continuarão sendo sempre iguais: dois mais dois serão sempre quatro; as leis de Newton continuarão sendo aplicadas da mesma maneira na Física; e Pedro Álvares Cabral continuará tendo chegado ao Brasil em 1500. No entanto, mudam as gerações e também o mundo em torno da sala de aula. E, claro, os educadores precisam se adaptar a cada momento para preparar seus alunos para o mundo real. Especialistas em educação concordam que o cidadão do século 21, que está em formação em nossas escolas, precisa dominar, além do conhecimento formal, algumas competências e habilidades que o ajudarão em sua carreira e na sua vida como um todo. maio 2011
13
Habilidades e Competências
Mas quais são essas habilidades? Como
que os alunos de hoje também precisam
fazer para que os estudantes desenvol-
desenvolver acentuada capacidade de
vam as competências necessárias? Essas
trabalhar em equipe. “Hoje nem video
são as perguntas que alguns estudiosos
game se joga sozinho”, brinca o profes-
vêm tentando responder.
sor. “Todas as atividades são sociais. O
Há competências que são consideradas fundamentais. É o caso do empreen-
aluno vai precisar saber trabalhar neste mundo”, diz.
dedorismo, por exemplo. Hoje, o aluno
E para trabalhar com outras pessoas
tem de chegar ao mercado de trabalho
é essencial saber se expressar bem. “A
disposto não apenas a obedecer: precisa
comunicação oral é a competência que
saber criar, inventar, “fazer a diferença”.
fará com que o aluno interaja mais com
“É uma competência essencial para
outros atores sociais, possibilitando-lhe
sobreviver em uma sociedade que abre
conquistar maior ou menor sucesso, de-
espaços de crescimento para quem é
pendendo de como e o quanto consegue
visionário, sabe planejar, criar e execu-
se comunicar oralmente”, ensina.
tar. Caso contrário, ele será um mero executor de ações empreendidas por ter-
Gestão do tempo
ceiros”, afirma Nilbo Ribeiro Nogueira,
Outra característica do século 21 que
mestre em Educação pela Universidade
influencia a vida dos jovens – e, portanto,
de São Paulo (USP).
precisa estar presente na mente dos educadores – é a gestão do tempo. Segundo
Questionar
o consultor Christian Barbosa, autor de
A inovação faz parte desse pacote. E
livros sobre gerenciamento de tempo e
também deve estar presente
produtividade, pesquisas mostram que
Competências do cidadão do século 21, segundo Eduardo Shinyashiki
no processo educativo. “O
80% das pessoas desperdiçam de 30 mi-
que se quer é que o aluno
nutos a três horas de seu tempo por dia.
tenha a capacidade de pensar,
“Algumas empresas ainda têm a cultura
Ser – inteligência emocional, capacidade de lidar com sentimentos, controlar reações e lidar com situações de conflito. Fazer – capacidade de inovar e de criar. Relacionar – competência social, habilidade para se relacionar, para lidar com outras pessoas, para se comunicar. Pensar – capacidade de pensar, de aprender, relacionada à cognição.
de reavaliar, de se reinven-
de valorizar o empregado que fica depois
tar”, diz o consultor Eduardo
do horário, como se isso fosse indicativo
Shinyashiki. Para ele, o padrão
de que ele tem muito que fazer. Mas
autoritário de ensino, que não
as empresas que estão se preparando
permite o questionamento,
para ser mais produtivas sabem que o
impede que a troca em sala de
profissional que tem tempo para viver,
aula seja mais prazerosa e de-
que planeja e usa bem o tempo é mais
safiadora para os estudantes.
produtivo”, ensina.
14 maio 2011
“Eu sempre pergunto para os meus
Um dos temas mais prementes hoje
colegas professores se há outra forma de
em todo o mundo é a questão ambiental.
fazer o que estamos fazendo. E eu mesmo
E aqui o discurso tem de ser aplicado
respondo: sim, há tantas formas quanto
na prática. “Já presenciei projetos sobre
a gente quiser”, opina.
meio ambiente em que foram expostas
Doutor em Comunicação e autor de
várias maquetes feitas de isopor e, ao
livros sobre o ambiente corporativo, o
final da exposição, todas foram jogadas
professor da USP Luli Radfahrer diz
no lixo. Como o professor admitiu o uso e
o descarte do isopor, que permanecerá no
pais na escola faz parte das atribuições
ambiente por cerca de 100 anos?”, indaga
de um professor e requer competência.
Nilbo Nogueira. No mesmo sentido, a
É obrigação da escola informar os pais
responsabilidade social é outro tema a ser
em relação à educação de seus filhos”,
desenvolvido. “Tal qual o meio ambiente,
afirma o professor.
considero a responsabilidade social uma questão primeiro de consciência e depois de atitude”, afirma.
Dez competências para ensinar, segundo Philippe Perrenoud
1- Organizar e dirigir situações de aprendizagem. 2- Administrar a progressão das aprendizagens. 3- Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação. 4- Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho. 5- Trabalhar em equipe. 6- Participar da administração escolar. 7- Informar e envolver os pais.
E o professor, como fica? Com o “novo aluno” do século 21,
Para Nogueira, outro fator muito
quais são as mudanças que o professor
importante é a inteligência emocional.
tem de fazer? De acordo com Perrenoud,
“Relacionar-se bem e plenamente com as
o docente também precisa desenvolver
pessoas, independentemente da emoção
novas competências para desempenhar
que estamos (nós e elas) vivenciando, é
com eficiência o papel de ensinar. A
precioso para ter um comportamento de
tecnologia é um componente importan-
relacionamento o mais linear possível”.
te nesta nova sala de aula. Mas, para
Aqui, especialmente, há um desafio para
o especialista em mídia digital Luli Ra-
os professores. “Nós, professores, não
dfahrer, os alunos já têm familiaridade
fomos educados formalmente na escola
com produtos tecnológicos. São os pro-
para desenvolver esta inteligência emo-
fessores que precisam “correr atrás”. “O
cional. Portanto, se não desenvolvermos
professor é que precisa entender que as
primeiramente em nós, como seremos
ferramentas tecnológicas estão aí. Ele
capazes de trabalhar com a educação
precisa conhecê-las, precisa aprender a
emocional de nossos alunos?”, diz.
ser professor nesse mundo”, recomenda.
Finanças
tências necessárias para se tornar um
Já para Nilbo Nogueira, as compeOutro tema, por fim, destacado
melhor docente podem ser resumidas
pelos especialistas é a necessidade de
em dois pontos: comunicação eficaz e
apostar mais na educação financeira
flexibilidade. Ele aponta que o professor
das crianças. “Nosso país só vai dar
precisa ver o processo comunicativo
certo quando as pessoas aprenderem
como uma via de mão dupla, em que é
a fazer uso consciente do dinheiro. Em
permitida a troca. “Para tanto, o profes-
Cingapura, crianças de cinco anos já
sor precisa entender e desenvolver uma
têm aulas de educação financeira”, diz
nova linguagem, que é aquela utilizada
Christian Barbosa.
pelos alunos. Caso contrário não haverá
8- Utilizar novas tecnologias.
E os pais, querendo ver tudo isso sen-
comunicação e, sem esta, não ocorrerá a
do desenvolvido em seus filhos, cobram
aprendizagem”, alerta. Nogueira também
9- Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão.
das escolas. De acordo com o sociólogo
recomenda aos professores que sejam
suíço Philippe Perrenoud, especializado
flexíveis “no sentido de mudar rotas,
em educação, essa cobrança é positiva e
aceitar desafios, experimentar novas
a escola precisa estar aberta a uma par-
possibilidades pedagógicas, se atualizar
ticipação maior das famílias. Mais do que
e, principalmente, inovar em função das
isso, deve incentivar tal atitude. “Nos dias
necessidades comportamentais desta
de hoje, o dever de informar e envolver os
nova geração de alunos”.
10- Administrar a própria formação.
maio 2011
15
Escolas Inovadoras
por Brisa Teixeira
Inovação ou acomodação:
de qual sua lado escola está? 16 maio 2011
Escola inovadora é aquela que aprende com o aluno e não a que apenas tenta ensinar. É a escola que forma alunos pró-ativos, com visão crítica, na qual os professores prepararam seus alunos para interagir com o mundo de maneira integral.
“O que as pessoas mais temem é dar um novo passo, pronunciar uma nova palavra.” Quando trazemos o pensamento do escritor russo Fiódor Dostoiévski para dentro dos muros escolares, percebemos que ele espelha parte da realidade escolar. Apenas parte. Isso porque a escola também é terreno fértil para aqueles capazes de inovar, articular mudanças e projetar o futuro. Mas, afinal, o que faz uma escola ser inovadora? Alguns exemplos clássicos, como a Escola da Ponte, de Portugal, e a italiana Reggio Emília – onde as classes não são divididas por paredes e a arte é utilizada para dar significado e sentido ao mundo em que os alunos vivem –, povoam o imaginário dos que trabalham com educação.
“Para cada modelo de escola inovadora, deve-se ter a formulação de um currículo que dê suporte à forma de organização do trabalho pedagógico escolhido.” Marcos Cordiolli maio 2011
17
Escolas Inovadoras No entanto, muitos educadores defendem que os modelos da Ponte e da Reggio Emília foram formulados em contextos históricos e sociais específicos e não podem ser copiados e aplicados em outras escolas sem um ajuste e uma correlação com a realidade das mesmas. “Suas experiências são importantes e devem servir de referência, mas não constituem exemplos esquemáticos prontos que podem ser transpostos no tempo e no espaço”, afirma Marcos Cordiolli, consultor em gestão do trabalho pedagógico e proposições curriculares na Educação Básica. Há quem ache, diz o consultor, que inovação pedagógica tem a ver com mudanças no currículo ou com a introdução de novas disciplinas. “Para cada modelo de escola inovadora deve-se ter a formulação de um currículo que dê suporte à forma de organização do trabalho pedagógico escolhido”.
a aprender ativamente, a pesquisar o
Colocar em prática É preciso ousar. Mas só ter ideias não basta. Quantas escolas deixam seus projetos na gaveta? “É preciso envolver e mobilizar a comunidade escolar. Colocar as inovações em prática, promover diversas experimentações, avaliar cada passo para reformular o que não está funcionando e aprimorar o que está bom”, aponta Cordiolli. Há vários modos de se conceituar uma escola inovadora e isso, segundo Carlos Cury, doutor em Educação, tem uma variação no tempo e no espaço. “O que chamamos de escola tradicional já foi, um dia, logo após a Revolução Francesa, uma escola inovadora. Pode ser inovadora hoje uma escola que faça um projeto pedagógico em equipe e busque a interdisciplinaridade. Mas ela só será inovadora se tais mudanças de fato se efetivarem.”
tempo todo, a serem pró-ativos, a tomar iniciativas e a saber interagir. Moran ainda defende que uma boa escola precisa de menos aulas informativas e mais atividades de pesquisa, experimentação, desafios e projetos. Precisa ainda fomentar “redes de aprendizagem, entre professores e entre alunos; que aprendam com os que estão perto e também longe, conectados, com os mais experientes ajudando os que têm mais dificuldades”.
Escola particular Foi pensando nas necessidades das escolas particulares que buscam a diferenciação e o trabalho pedagógico articulado com o mundo atual que a Aymará Educação desenvolveu o Programa Escola Inovadora, cujo pré-lançamento acontece no evento Educador/Educar deste ano.
Aprendizagem significativa Para José Manuel Moran, pesquisador em educação humanista inovadora, não há lugar para a escola enclausurada na repetição, centrada na fala do professor, nas aulas de 50 minutos e na aprendizagem passiva. “A escola necessita incorporar uma mentalidade aberta para o mundo, para a vida. Num mundo com tantas possibilidades interessantes de aprender, como podemos ter tantos alunos que não sabem ler, interpretar, pesquisar, escrever?”, questiona. Segundo ele, a escola inovadora é um conjunto de espaços ricos em aprendizagens significativas, presenciais e digitais, que motivam os alunos
O Programa Escola Inovadora é baseado em três eixos transversais muito significativos: a Literatura, as Competências para o Século 21 e a Tecnologia. A inovação do produto está na articulação desses eixos com os conteúdos curriculares. A proposta traz uma série de serviços de apoio aos educadores e às escolas, complementando os recursos didáticos impressos e virtuais. O eixo Literatura, com a sua riqueza e diversidade de gêneros textuais, apresenta atividades que visam formar alunos leitores e alunos cidadãos, a partir dos valores presentes nas narrativas literárias de todas as histórias. Os livros didáticos
“Pode ser inovadora uma escola que faça um projeto pedagógico em equipe e busque a interdisciplinaridade. Mas ela só será inovadora se tais mudanças de fato se efetivarem.” Carlos Cury 18 maio 2011
A escola inovadora promove aprendizagens significativas, presenciais e digitais, que motivam os alunos a aprender ativamente, a serem pró-ativos, a tomar iniciativas e a saber interagir.
Conflito de gerações
das áreas do conhecimento fazem remissões diretas às histórias literárias, articulando os saberes curriculares com as narrativas, permitindo melhor compreensão por parte dos alunos. O eixo Competências para o Século 21 traz a educação para o contexto do mundo atual, articulando protagonismo e cidadania, com foco em temas-chave, como empreendedorismo, autoliderança, comunicação oral, trabalho em equipe, administração do tempo, responsabilidade com o meio ambiente e sustentabilidade, responsabilidade social, educação para o consumo e educação financeira. Tais temas fazem parte dos desafios enfrentados por muitas escolas, que agora passam a contar com uma solução formatada e articulada com as áreas do conhecimento. O eixo Tecnologia amplia as atividades dos materiais impressos, trazendo para um ambiente virtual de aprendizagem funcionalidades de rede social monitorada. Este ambiente, chamado de “Plug Escola Inovadora”, traz objetos interativos de aprendizagem articulados com livros didáticos, projetos e atividades. Há também o canal “TV Escola Inovadora”, uma área especial para educadores, com orientações metodológicas, cursos de capacitação e ambiente colaborativo para troca de experiências e projetos com outros educadores. A articulação é uma das características intrínsecas do Programa Escola Inovadora. Afinal, a escola particular cada vez mais busca a desfragmentação das disciplinas, o diálogo entre as Competências para o Século 21 e a identidade do aluno, entre a tecnologia e a compreensão global ou leitura de mundo que deve ser desenvolvida pelos alunos. Mais do que isso, o Programa articula a forte demanda das famílias com uma solução educacional que pode auxiliar, e muito, a intencionalidade pedagógica das escolas (saiba mais sobre
O conflito de gerações é um dos pontos que deve ser levado em consideração, segundo Benne Catanante, psicóloga e consultora organizacional, na hora de pensar em inovar. Para ela, o mundo está vivendo um fenômeno novo, em que o maior desafio é reconhecer que as crianças atualmente já vêm com uma consciência de mundo muito mais ampla do que quando esse professor tinha a mesma idade. Segundo Benne, muitos professores ainda atuam com base na hierarquia vertical da transmissão do conhecimento, na qual se sentem superiores ao aluno e exigem respeito com base nessa premissa equivocada. “Um educador experiente e bastante humilde consegue reconhecer essa essa diferença e estimular a troca na diversidade, enriquecendo a todos, principalmente a si”.
o Programa Escola Inovadora na página 20).
maio 2011
19
Escolas Inovadoras
De olho no futuro
AI/Guilherme Pupo
André Caldeira, diretor-presidente da Aymará Educação, fala sobre o Programa Escola Inovadora e as razões da proposta da empresa para articular Literatura, Competências para o Século 21 e Tecnologia com as áreas do conhecimento.
Quais os principais objetivos do Programa Escola Inovadora? Nosso maior objetivo é apresentar para escolas particulares uma solução nova, diferenciada, que venha ao encontro do que as famílias e, por consequên-
André Caldeira
cia, as escolas buscam: um programa pedagógico que desenvolva competências fundamentais, como leitura, protagonismo, cidadania e uso adequado da tecnologia, de acordo com o currículo e as áreas do conhecimento.
Para quem é destinado esse programa? Para escolas particulares que buscam soluções de vanguarda, inovação e diferenciação em sua proposta pedagógica e nos materiais didáticos adotados. São escolas preocupadas em oferecer educação de altíssima qualidade e que, além disso, estão atentas às novas tecnologias e às competências que os alunos devem desenvolver, tanto em termos pessoais como em termos curriculares.
Qual a expectativa da aceitação das famílias? Hoje, mais do que nunca, a escola ocupa um papel muito importante na formação de uma criança, principalmente em uma sociedade em que os pais têm cada vez menos tempo para se dedicarem à educação dos seus filhos e, por isso, buscam soluções cada vez mais eficazes. Os pais querem ter certeza de que os filhos estão sendo adequadamente preparados e de que suas competências essenciais estão sendo desenvolvidas. Os pais querem ver em seus filhos o aprendizado dos saberes tradicionais, mas, tão importante quanto, querem que seus filhos aprendam a ler o mundo, que sejam leitores autônomos, que se conheçam e expressem da melhor forma suas potencialidades, que sejam cidadãos ativos e responsáveis, que façam uso adequado e consciente da tecnologia. E o Programa Escola Inovadora traz exatamente esta proposta.
Como a leitura e a literatura estão contempladas neste programa? A Aymará Educação tem uma experiência grande e reconhecida em leitura e literatura. Acreditamos que, ao desenvolver um aluno leitor, estamos criando um trampolim no processo de aprendizagem do aluno. Como leitor autônomo, este
Articulação é a palavra-chave do Programa Escola Inovadora. Articulamos os conteúdos curriculares com literatura, com competências relevantes para o século 21 e com tecnologia.” A ndré Caldeira 20 maio 2011
aluno certamente vai entender melhor seu mundo, vai aprofundar suas ideias, questionar pontos de vista e compreender melhor, inclusive, as áreas do conhecimento.
O Programa Escola Inovadora é voltado para escolas que buscam recursos pedagógicos que desenvolvam competências fundamentais, como leitura, protagonismo, cidadania e uso adequado da tecnologia, de acordo com o currículo e as áreas do conhecimento. A ndré Caldeira
O Programa dá grande ênfase à articulação. Por quê? Articulação é a palavra-chave do Programa Escola Inovadora. Articulamos as áreas do conhecimento com literatura, com competências relevantes para o século 21 e com tecnologia. E tudo isso
Sobre a Aymará Educação
também é articulado com serviços pedagógicos diferenciados e consistentes, que dão apoio constante para educadores e escolas adotantes do Programa.
A escola interessada terá que comprar todos os recursos? Cada escola é diferente e está inserida em uma realidade diferente. Por isso nosso conceito oferece flexibilidade de adoção, com opções de recursos modularizadas, para procurar atender às necessidades individuais de cada escola.
Quem são os profissionais envolvidos na produção do material? Para a produção do Programa Escola Inovadora, contamos com um time de talentos formado por mais de 80 pessoas. A abordagem da equipe é a de uma empresa de educação, que trabalha o editorial em conjunto com a tecnologia educacional. Toda a produção é feita com a preocupação de que tudo o que estamos criando e desenvolvendo seja o melhor possível. Para isso, investimos muito em sondagens e pesquisas formais, nas principais praças do País, para entender as forças e para ajudar na concepção do
A Aymará Educação acredita na educação para a transformação das pessoas, escolas, empresas e cidades. Com esse foco, iniciou suas atividades em 2005 com o propósito de investir em projetos diferenciados e inovadores, desenvolvendo produtos e serviços em diversas mídias e atendendo os mais variados públicos: de escolas públicas e privadas, da Educação Infantil ao Ensino Médio, a instituições de Ensino Superior, na modalidade EAD. Desenvolve também materiais didáticos para educação especial e para a formação de professores. Para o mercado corporativo, produz conteúdo específico e adaptado à realidade das empresas, além de outros recursos didáticos próprios. Na área editorial, tem em seu portfólio livros didáticos, paradidáticos, transdidáticos (Coleção Cidade Educadora), de literatura, obras de referência, audiolivros e livros para educação a distância, educação de jovens e adultos e educação especial. Na área de tecnologia educacional, oferece soluções inovadoras e convergentes, que incluem conteúdos interativos (e-learnings), Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs), audiolivros, vídeos educativos, redes sociais e outras ferramentas. Para saber mais, acesse: www.aymara.com.br.
Programa Cidade Educadora. maio 2011
21
Leitura
por Brisa Teixeira
Leitura: janela
aberta para o mundo A leitura deixou de ser apenas um instrumento de alfabetização. Ela ocupa cada vez mais espaço como suporte para a compreensão do mundo. 22 maio 2011
“Quando o leitor se sente próximo do texto, mais facilmente ele se deixa envolver pelo que lê e seguramente vai querer ler mais e mais”. Marta Morais da Costa
“Meus filhos terão computadores, sim, mas antes terão livros”. Essa frase, quem diria, foi dita certa vez pelo multimilionário da informática Bill Gates. Ele sabe muito bem o fascínio que a tecnologia desperta nas crianças, mas destaca a preocupação de que ela não deve substituir o livro. Os baixos números da leitura no Brasil – onde 45% da população é classificada como “não leitora”, ou seja, não leu nenhum livro no período de um ano – têm mobilizado educadores, mídia e governo em ações a favor da melhoria dos índices e da qualidade da leitura nas escolas brasileiras. Já a população leitora lê, em média, 1,3 livro
AI/Guilherme Pupo
por ano. Quando incluídas as obras didáticas e pedagógicas, o número sobe para 4,7.
Os dados estão na pesquisa “Retratos
atuação mais competente do leitor. Isso
da leitura no Brasil”, feita com 5.012
tudo incentivado com atividades lúdicas,
pessoas em 311 municípios de todos os
criativas e mobilizadoras da sensibilidade
Estados, em 2007. A mesma pesquisa
e do imaginário dos leitores”.
revela que a maior influência para a formação do hábito da leitura vem dos pais, e é na escola que o hábito se consolida. Para Marta Morais da Costa, doutora
Marta Morais da Costa
em Literatura Brasileira pela Univer-
Divulgação
sidade de São Paulo (USP) e diretora do conselho pedagógico da Aymará Educação, uma das maneiras de incentivar a formação de novos leitores e o amadurecimento dos já existentes é a valorização da leitura de diferentes gêneros textuais, que irá amadurecer no leitor diferentes habilidades. “Se à
Sandra Bozza
leitura de textos verbais for acrescida a leitura de diferentes linguagens – a visual, a gestual, a de movimentos, por exemplo –, cresce a possibilidade de uma
Culpa da metodologia A educadora Sandra Bozza – professora de Linguística, Metodologia de Ensino da Língua Portuguesa, Literatura Infantil e Práticas Alfabetizadoras – acredita que o pouco interesse pela leitura por parte dos alunos brasileiros tem sua origem na metodologia do ensino de Língua Portuguesa. E isso, segundo ela, vem desde a Educação Infantil. Sandra explica que, não raro, as crianças de algumas escolas são colocadas em situação de aprendizagem da gramática normativa ou de sílabas e palavras e, como isso não é do universo vivenciado pelo aluno (não está nas mídias eletrônicas nem no cotidiano familiar, por exemplo), não se estabelece relação entre o ato social da leitura e aquilo que o aluno é obrigado a
Dificuldades dos brasileiros
vivenciar em situação de aprendizagem
17% leem muito devagar
escolar. “Somente um professor que é
7% não compreendem o que leem 11% não têm paciência para ler 7% não têm concentração
capaz de compreender o valor social da leitura e da escrita será capaz de ensinar a ler e a escrever com competência”.
Fonte: Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, 2007.
maio 2011
23
anĂşncio
24 maio 2011
anĂşncio
maio 2011
25
Leitura
O brasileiro não lê 54% por falta de tempo
34% possuem outras preferências 19% por desinteresse 18% por falta de dinheiro 15% por falta de bibliotecas Fonte: Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, 2007.
Práticas de letramento
1
Criar um ambiente de letramento Na cultura contemporânea, muitos são os suportes e textos que circulam no cotidiano. Cartazes, folhetos, imagens, publicidades, jornais, revistas, contas, documentos e muitos outros exemplos. Usando esse material, o professor estimula práticas leitoras variadas, reais e de uso social.
Fonte: Marta Morais da Costa.
26 maio 2011
2
Dar o exemplo Um professor que não demonstra em sua prática que a leitura, os livros e as múltiplas linguagens são de seu interesse e fazem parte de sua atividade diária, terá muita dificuldade em convencer e demonstrar que ler é uma ação necessária para o crescimento pessoal, cultural e social.
3
Compartilhar leituras Professores são mediadores do conhecimento e interlocutores maduros para a troca de experiências de leitura e de significações resultantes da ação de interpretar. Rodas de conversa, clubes de leitura, relatos sobre textos lidos e apreciados, resenhas críticas oralizadas e troca de informações (escritas ou não) constituem formas de trabalhar para obter um compartilhamento de textos e significações.
45% da população brasileira é classificada como “não leitora”, ou seja, não leu nenhum livro no período de um ano.
A descoberta de cada um “A leitura tem de ser uma descoberta pessoal”, defende Gabriel Perissé, doutor em Filosofia da Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). “Kafka dizia que cada um tem de ser a sua própria lição de casa. Cada
ampliação do imaginário, a vivência das
como é o computador, a televisão e outras
emoções e a potencialização dos afetos.
mídias”.
“Se isso acontece desde o início da vida, facilitam-se a promoção da leitura e a aproximação com a literatura.”
Professor leitor “Estar atualizado nas questões sobre a formação do leitor e estar continua-
Visão ampla
mente formando-se leitor são exigências
leitor precisa criar-se como leitor e cada
Na opinião da professora Sandra
naturais para um bom professor. Afinal,
um pode começar por onde quiser”. Isso
Bozza, crianças da Educação Infantil
quanto mais consistente e amadurecida
significa procurar expor-se aos livros,
podem se interessar pela leitura quando
for a capacidade do professor de interpre-
deixar-se conquistar por eles, visitar
são levadas a conhecer parlendas (rimas
tar textos, melhores serão suas condições
livrarias, frequentar bibliotecas e arriscar
infantis para divertir), poemas, trava-
para tornar leitores os seus alunos”, diz
essa ou aquela leitura.
línguas, adivinhas e letras de músicas.
Marta. Para ela, a formação de um leitor
O educador Geraldo Almeida, doutor
Já no Ensino Fundamental, o professor
é ilimitada e interminável, e um bom
em Teoria Literária pela Universidade
terá de levar, para serem refletidos na
professor não se constitui sem a compe-
Federal do Paraná (UFPR), indica leitu-
sala, textos que circulam socialmente,
tência leitora. “Como formar leitores se
ras diferentes daquelas propostas pelas
cuja discussão seja sobre as ideias que o
o profissional encarregado dessa função
escolas. Para ele, nada como a liberdade
texto veicula e sobre como os conteúdos
não lê com eficácia nem gosta de fazê-
de escolha. Deixar o aluno ler o que ele
de Língua Portuguesa se organizam
-lo?”, pergunta.
quiser. “Ninguém começa lendo Machado
para tornar o texto claro e coeso. “Com
E o mais importante nesta jornada é
de Assis. Muitas crianças e adolescentes
essa ação sistemática, o aluno pode
que professores leitores têm habilidades
começam com histórias em quadrinhos.
constatar que ler pode ser interessante
para argumentar, fascinar e produzir em
Isso já é um bom começo”, acredita.
e dinâmico, pois a diversidade de textos
sala de aula um ambiente favorável ao
Para a escritora Benita Prieto, a con-
trabalhados proporcionará uma visão
diálogo e à provocação intelectual. São
tação de histórias também é fundamental
mais ampla da realidade social. Isso
mágicos que transformam textos abstra-
no processo de formação dos leitores. Ela
refletirá diretamente na relação do aluno
tos em histórias inesquecíveis e ajudam
ajuda o desenvolvimento do raciocínio, a
com a escrita e fará com que a escola seja
a enriquecer a já fértil cultura brasileira
construção do pensamento estruturado, a
apenas mais uma janela para o mundo,
também pela palavra escrita.
4
Diversificação de suportes Textos em diferentes suportes (telas, impressos, corpos, objetos, por exemplo) exigem do leitor diferentes posturas, modos de ler e de atribuir significados. A familiarização com essa produção cultural amplia horizontes e resulta em maturação leitora e segurança expressiva.
5
Seleção e adequação de textos Um bom profissional formador de leitores tem bom repertório cultural, capaz de lhe fornecer exemplos diversificados e que podem ser adequados a diferentes públicos e situações. Quando o leitor se sente próximo do texto, mais facilmente se deixa envolver pelo que lê e seguramente vai querer ler mais e mais.
6
Planejamento de práticas leitoras Um bom projeto para a formação de leitores não abre mão de planejamento prévio. Saber quais leitores atingir, suas situações e conhecimentos anteriores (“capital cultural”), o grau progressivo de dificuldades a serem vencidas, os objetivos, o material adequado à idade e ao interesse dos leitores iniciantes, o entusiasmo do mediador e seu conhecimento sobre a leitura são qualidades indispensáveis para um bom projeto de formação de leitores.
maio 2011
27
Opinião
por CELSO ANTUNES
O que esperar de um mundo Escrevo com meu computador apoia-
Há um abismo de diferenças entre
permanecerá se nenhuma força ou ação a
do em uma mesa. Sobre o tampo de vidro
existir e viver, ainda que, na pressa com
tirar de seu lugar. O pedaço de madeira,
que o ampara, existe também um pedaço
que percebemos as palavras, poucos no-
ao contrário, não existia até se tornar
de granito que encontrei em minha ca-
tem essa desigualdade. O existir é frio,
árvore ou arbusto e assim atravessar o
minhada de ontem. Enquanto escrevo,
sem emoções, incapaz de sentimentos e
ciclo de uma existência, que o levará à
lanço um furtivo e enciumado olhar a essa
percepções. Viver é bem mais que existir,
inevitável transformação. Hoje é pedaço
rocha. Descubro os belos veios escuros
ainda que a existência possa ser perene
de pau, amanhã poderá ser tampa de uma
que se desenham na massa quase branca.
e a vida sempre transitória. O cérebro de
caixa ou alimento e, um dia, vermes se
Esse pedaço de granito é real, autêntico
um cão talvez não cogite sobre a diferen-
encarregarão de seu fim.
e belo. Ele efetivamente existe.
ça entre existir e viver, mas todo cérebro
Lá fora, no jardim, Negus, meu que-
humano percebe a diferença.
Uma pessoa, tal como um cão, cumpre também um ciclo existencial e, quem
rido e velho vira-lata, espera impaciente
“Existir” vem do latim existere e sig-
sabe, continuará a existir por meio de
por meu assobio que o convida para uma
nifica ter uma existência real. Uma pedra,
sua obra, se fará presente em alguma
volta. Vez por outra emite um tímido
um pedaço de madeira e uma pessoa
saudade ou lembrança algum tempo após
grunhido, como a me lembrar de que
que olhamos possuem existência real e,
sua extinção. Para a pedra, existir é sina
não devo esquecer o passeio. Finjo que
dessa forma, podemos tocá-los, mas en-
perene, para a madeira, circunstância
o ignoro, mas meu olhar o descobre ali,
tre eles existem diferenças substanciais.
atemporal, e para o homem, uma possi-
estático e atento. Esse cão é real, autênti-
A pedra não possui vida e foi formada
bilidade que se prolonga muito ou pouco,
co e belo. Ele não apenas existe, ele vive.
geologicamente, impassível ao tempo ali
mas que resiste à vida e se perpetua em
28 maio 2011
mais veloz que a luz? obra ou se esfumaça na lembrança.
as pessoas existem mais intensamente
Este ensino é hoje possível e nele
“Viver” também tem origem latina e
quando aprendem a viver. É esse o magní-
acreditamos. Não é necessário que se
vivere expressa a ideia de possuir vida,
fico sentido das palavras de Oscar Wilde:
realize a cruel verdade declamada pelo
quase como o existir. Mas viver é bem
“Viver é a coisa mais rara do mundo, a
poeta Francisco Otaviano há muitos anos:
mais que apenas existir. Viver expressa
maior parte das pessoas apenas existe”.
“Quem passou a vida em brancas
precisar ser arquiteto, escultor, fotógrafo
Mas o que significa “aprender a viver”?
ou músico – aprender a admirar os velhos
E, com essa singela pergunta, alcan-
monumentos, deliciar-se em museus e
ça-se a resposta para o título. Ensinar a
exposições de pintura, arrepiar-se de
viver é saber despertar a sensibilidade do
emoção ao assistir a concertos. Viver é
aprendiz e, dessa forma, fazê-lo protago-
anular a solidão por sentir plenamente a
nista efetivo de seu tempo. Ensinar a vi-
natureza e o mundo que se transforma.
ver é se valer dos recentes estudos sobre
fome de sabedoria. Viver significa – sem
É muito breve o viver e há muito a
a mente humana e ajudá-lo a administrar
aprender, mas quem não aprende na
e domar sua atenção. Quem aprende a ser
verdade não vive, não existe. A pedra não
extremamente atento, quem tem olhos
aprende a ser pedra, o pedaço de madeira
e ouvidos abertos à plena sensibilidade
não precisa aprender a ser o que é, mas
sabe viver.
nuvens e em plácido repouso adormeceu, quem não sentiu o frio da desgraça, quem passou pela vida e não sofreu foi espectro de homem, não foi homem, só passou pela vida, não viveu.”
Divulgação
desejo de usufruir, vontade de aprender,
Celso Antunes Educador maio 2011
29
Tecnologia
por Brisa Teixeira
Do livro às
mídias sociais Professores e alunos: diferentes realidades dividindo o mesmo espaço na sala de aula.
Alberto tem 15 anos e está se preparando para o retorno às aulas depois de dois meses intensos de férias. Nesse período, ele viajou para a casa de seus primos e passou a maior parte de seu tempo livre no bate-papo na Internet, fazendo download de músicas, visitando os vídeos mais procurados do YouTube, tuitando e postando fotos das férias nas redes sociais. Depois de curtir muito, Alberto já estava com saudades da escola e não via a hora de encontrar seus amigos e, é claro, mostrar o seu novo celular que tira fotos e também filma. Chegando à escola, ele cumprimenta seus amigos e ansioso espera a primeira aula.
30 maio 2011
A aula é de Geografia e rapidamente Alberto se lembra do dia em que estava com seus primos explorando as páginas do Google Earth, no qual foi possível visualizar a distância entre a sua casa e a de seus primos. Passados mais de 20 minutos de aula, Alberto sente um desconforto e, já cansado, percebe que nos próximos 30 minutos restantes professor e alunos passarão a aula lendo o livro didático e anotando no caderno o que foi passado no quadro. Assim que termina a aula, Alberto decide falar com o professor e pergunta: “Professor, quando vamos utilizar o computador?”. O professor imediatamente se lembra da última reunião da escola, quando a diretora disse que não seria possível para este ano preparar a sala de informática, fato que causou a ele grande alívio, pois não precisaria mudar seu método de ensino. Nesse momento ficou evidente a realidade de dois mundos distintos: a do professor, parado no tempo, e a dos alunos, que voa na mesma velocidade que as inovações tecnológicas. Essa história, embora fictícia, ainda é a realidade de muitas escolas brasileiras,
“Quando minha geração desaparecer, não haverá mais esta exclusão digital no que diz respeito ao acesso. Mas, na sociedade da Internet, o complicado não é saber navegar, mas saber aonde ir, onde buscar o que se quer encontrar e o que fazer com o que se encontra. Isso requer educação.”*
Manuel Castells *Entrevista do sociólogo para o jornal espanhol El País, em janeiro de 2008
maio 2011
31
Tecnologia
Informações disponíveis precisam de seleção rigorosa “Se os telefones celulares são usados em apoio à aprendizagem do estudante, essa atividade é recomendada. Se ela interfere negativamente, não é. Muitas escolas ainda têm uma política de ‘nenhum telefone celular’. Não acho que isso seja uma boa ideia a longo prazo.” David Thornburg
sejam elas públicas ou particulares. Para o americano David Thornburg, um dos maiores especialistas mundiais em tecnologia na educação, o ideal é que se tenha computadores disponíveis sempre que necessário na escola e que as tecnologias trazidas pelos alunos, como os smartphones, sejam usadas como recursos de aprendizagem. Mas de nada adianta, diz ele, que isso ocorra se os professores não perceberem a importância da tecnologia para as crianças e adolescentes. “Primeiro, os professores precisam ser usuários eficazes da tecnologia, saber utilizá-la e entender o seu uso no ambiente educacional.” Quem concorda com ele é Sonia Cristina Vermelho, doutora em Educação. Para ela, quem faz, explora e atribui significado aos artefatos midiáticos e tecnológicos são as pessoas que os utilizam. Tal apropriação é fortemente marcada por um processo de identificação, que “abre as portas” para situações de aprendizagem muito ricas e criativas.
32 maio 2011
A facilidade de acesso à Internet requer dos professores a promoção de formas de seleção das informações disponíveis. “Apenas parte do conteúdo que está na Internet tem lastro acadêmico ou de confiabilidade. Não se trata de censura, mas de orientar a busca de sites que disponibilizam saberes respaldados por instituições acadêmicas ou por especialistas”, defende Marcos Cordiolli. Estudantes, segundo ele, precisam aprender a compreender e a produzir textos nos gêneros linguísticos das plataformas digitais, como os posts de blogs, de comunicadores instantâneos como o MSN, de miniblogs como o Facebook e Twitter, mensagens de SMS e de e-mails e ainda as composições para as homepages. “Eles precisam dominar estes gêneros para produzir e disponibilizar conteúdos.” Com professores e alunos adaptados aos novos meios de ensinar e aprender, a escola, explica Cordiolli, vai se consolidar como um espaço de aprendizagem de linguagem, de reflexão crítica, de sistematização e produção de conhecimentos. “Os pais e professores serão os que vão coordenar processos e orientar os filhos e estudantes a construir conhecimentos para além das informações e devem estar vigilantes aos perigos das vias digitais”, alerta o educador. Neste contexto, continua ele, a superação dos limites disciplinares potencializa as ações educativas, pois os temas de estudos podem ser tratados de diferentes formas, sendo que o controle dos conteúdos e das linguagens não está mais restrito aos professores.
Dicas de livros e site LIVROS: • “Uma Escola Sem/Com Futuro – Educação e Multimídia”, de Nelson De Luca Preto, Ed. Ibepex • “Novas Tecnologias de Informação e Comunicação em Redes Educativas. Diálogos entre Praticantes da Educação”, organização de Josias Pereira, Ed. ERD • “Tecnologia e Educação – As Mídias na Prática Docente, organização de Wendel Freire, Ed. WAK Editora
SITE: • www.webparaeducadores.blogspot.com, um blog sobre como utilizar as tecnologias na educação.
Flexibilidade Para Marcos Cordiolli, mestre em Educação pela PUC-SP, na medida em que a organização do trabalho pedagógico na sala de aula for flexibilizada e aberta, melhor será a condição de interação entre a escola e as tecnologias. “Na escola, as formas de tratamento dos conteúdos sobre a sociedade, a natureza, os esportes e a arte estão mudando rapidamente, graças aos materiais disponibilizados na nuvem digital”, explica. A dificuldade maior, acredita Cordiolli, está nas formas e nas condições em que professores e currículos estão se adaptando a esta nova situação.
nais, como Geogebra e Celestia, estão
e redirecionamento estratégico Marcos
disponíveis gratuitamente.”
Telles. Ele ressalta que nenhum professor resiste à mudança porque se trata de uma
Inovação Embora possa ser agradável para cada criança ter um computador na escola, isso pode não ter qualquer impacto sobre a educação se as ferramentas não forem utilizadas com eficácia. A observação é de Thornburg, que defende que as grandes mudanças devem ocorrer no aspecto pedagógico e não no tecnológico. O desafio, diz ele, é estabelecer uma política que todos entendam a respeito do uso eficaz dessas ferramentas. “Se os telefones celulares são usados em apoio
“Se não forem bem feitas, estas
à aprendizagem do estudante, essa ati-
mudanças no currículo e no plano peda-
vidade é recomendada. Se ela interfere
gógico podem levar ao desperdício de
negativamente, não é. Muitas escolas
investimentos”, afirma David Thornburg.
ainda têm uma política de ‘nenhum tele-
É preciso, segundo ele, estar atento às
fone celular’. Eu não acho que isso seja
oportunidades oferecidas pelos softwa-
uma boa ideia a longo prazo.”
res. Ele exemplifica que há muitos pro-
Usar tecnologia em sala de aula requer
gramas poderosos que estão disponíveis
infraestrutura, atividades pedagógicas e
sem nenhum custo, levando as escolas a
um modelo mental aberto à inovação, não
economizar muito dinheiro por muitos
só por parte do professor, mas de diretores
anos. “O OpenOffice é um software livre
e coordenadores. “Sem o claro envolvi-
que faz tudo o que você faria com progra-
mento da direção, dificilmente a adoção
mas comerciais como o Microsoft Office.
de inovações será bem-sucedida numa
Além disso, bons programas educacio-
escola”, acredita o consultor em mudança
mudança. “Ele resiste, legitimamente, às perdas e inseguranças normalmente associadas às mudanças. Por isso, o processo de adoção de tecnologia em sala de aula tem que ser visto, desenhado e gerido como um processo de mudança.” Em relação aos alunos, a aceitação é imediata, pois a proposta possibilita a prática e o desenvolvimento da criatividade de forma lúdica. A opinião é da educadora Silvana Zilli, especializada em robótica. Segundo ela, o professor deve saber organizar e estimular situações de aprendizagem, promover trabalhos em equipe, usar os recursos tecnológicos e outros materiais relacionados, a fim de promover seu uso efetivo aplicado à metodologia orientada ao trabalho educacional. “O professor, ao trabalhar com a robótica educacional, por exemplo, tem um papel de facilitador e mediador durante todo o processo. Para isso, além de promover a aprendizagem, ele deve favorecer aspectos sociais, propondo desafios e estimulando uma ampla reflexão dos conceitos que envolvem o trabalho, propiciando o desenvolvimento da análise crítica”, explica Silvana. maio 2011
33
Comportamento
Isto é problema seu por Luciana Zenti
O bullying é a mais perversa face da violência escolar. Saber reconhecer e combater esse tipo de ação é uma tarefa de todos: professores, pais, funcionários e alunos.
Se você trabalha com educação,
tão” – justamente o significado da palavra
Em outras palavras: o bullying é
certamente já ouviu a palavra bullying.
inglesa bully, que deu origem ao termo
um problema seu. E de todos nós. “A
Nos últimos meses, o tema tomou conta
conhecido hoje como bullying. A ação, no
sociedade tem se conscientizado sobre a
das rodas de discussão em torno de dois
entanto, nem sempre envolve apenas dois
gravidade desse tipo de violência”, diz a
casos bastante graves. Austrália, março
alunos. Muitas vezes a agressão contra a
pedagoga Aloma Felizardo, que, ao lado
de 2011. Um vídeo que mostra uma briga
vítima é feita por um grupo que se forma
de Elenice, fundou o programa Bullying
de escola ganhou o mundo pela Internet.
na própria escola e passa a agir contra
e ciber bullying : o combate de todo
Nas imagens, um garoto coloca um ponto
determinado estudante.
brasileiro. Por meio de palestras, levam informações a professores de diversas
final na perseguição que sofria agredido por um colega menor (saiba mais no box
Problema antigo
partes do Brasil. Para elas, a tragédia
da p. 37). Rio de Janeiro, abril de 2011.
O bullying sempre existiu. O que
no Rio de Janeiro acordou o Brasil para
Uma tragédia envolvendo um ex-aluno
chama a atenção é que os casos têm se
o problema. “Infelizmente este será um
de escola pública, suposta vítima de
tornado cada vez mais frequentes. “A
marco nacional e internacional”, lamenta
bullying, chocou o País. Doze crianças
violência escolar vem crescendo há muito
Elenice.
foram mortas a tiros.
tempo, mas só agora estamos tendo co-
O assunto é tão sério que foi incluído
Diante dessas notícias, o questiona-
nhecimento”, alerta a psicopedagoga Ele-
em uma pesquisa nacional do Instituto
mento é inevitável: você, como professor,
nice Silva, autora do livro Corredores de
Brasileiro de Geografia e Estatística
se sente 100% preparado para lidar com
Justiça, que trata do combate ao bullying.
(IBGE) sobre a saúde dos estudantes,
esse tipo de violência na sua escola? O
Por isso, a formação de professores e de
divulgada no ano passado. O estudo fez
bullying é uma agressão física ou emo-
toda a equipe que trabalha nas escolas
um retrato do bullying em 6.780 escolas
cional que se caracteriza pela escolha de
é primordial. “Antigamente o papel da
brasileiras, a partir de respostas forne-
um alvo. Acontece de forma repetitiva e
escola era ensinar. Hoje é preciso se
cidas por alunos do 9° ano do Ensino
envolve o desequilíbrio de forças entre os
preocupar também com a socialização,
Fundamental, e mostrou que 25,4% já
envolvidos. Nessa forma de violência es-
que influencia no comportamento e na
foram vítimas desse tipo de violência. Os
colar, há sempre o mais fraco e o “valen-
cidadania”, completa Elenice.
casos mais graves, em que a agressão é
34 maio 2011
Marcos de Mello
Dicas de livros e site
Livros: constante, afetam 5,4% dos estudantes.
campanha Aprender sem medo, que é
Na maioria, meninos de escolas privadas.
desenvolvida em sintonia com as ações
Entre as capitais, a campeã da violência
globais. O foco está na formação de pro-
é o Distrito Federal, seguido por Belo
fessores e no desenvolvimento de progra-
Horizonte e Curitiba.
mas preventivos que trabalham também
Outra pesquisa recente foi realizada
com os estudantes e suas famílias. A
pela organização não governamental Plan
ideia é envolver toda a sociedade para
International, que trabalha com o desen-
que seja possível criar um ambiente de
volvimento da criança e do adolescente
aprendizagem seguro, justo e solidário.
em 60 países. Os números mostram que
A pesquisa também chama a atenção
o bullying faz parte de um clima genera-
para um dado interessante. A maior parte
lizado de violência no ambiente escolar.
dos casos acontece com adolescentes de
Dos jovens que responderam à pesquisa,
idade entre 11 e 15 anos. “Na entrada
70% afirmaram ter presenciado cenas
da adolescência, as meninas começam
de agressões entre colegas. Outros 30%
a formar ‘panelinhas’ muito fechadas e
afirmaram terem sido vítimas pelo me-
podem isolar alguma colega”, explica o
nos uma vez, e 10% sofreram agressões
psicólogo Marcos Meier, que é mestre
frequentes. Dados bastante próximos dos
em Educação pela Universidade Federal
apresentados pelo IBGE.
do Paraná (UFPR). “Já os meninos fazem
No Brasil, a ONG lançou em 2008 a
• “Ciberbullying: Difamação na Velocidade da Luz”, de Aloma Ribeito Felizardo, Ed. Willem Books. • “Corredores de Justiça: Combatendo a prática do bullying nas escolas, educando uma sociedade para a paz”, de Elenice Silva, Ed. do autor. • “Bullying escolar: perguntas e respostas”, de José Augusto Pedra e Cleo Fontes, Ed. Artmed. • “Bullying: o que você precisa saber”, de Lélio Braga Calhau, Ed. Impetus
site:
• No www.plan.org você encontra diversas publicações produzidas pela Plan Brasil direcionadas a professores e pais.
o bullying por meio da agressão física. maio 2011
35
Comportamento
“A maior dificuldade para acabar com o bullying é que muitas pessoas, inclusive pais e professores, acreditam que se trata apenas de uma brincadeira da idade, saudável para o amadurecimento das crianças” Aloma Felizardo vezes chega a acreditar que merece ser
caem, mas há casos em que o isolamento
perseguida por ser diferente. Na escola,
faz com que o aluno tenha um rendimento
tenta se proteger procurando a presença
acima do que vinha apresentando.
de um adulto. Pede ao professor para fi-
Em casa, o aluno perseguido pode
car em sala de aula na hora do recreio ou
apresentar dificuldades para dormir, ter
está sempre na biblioteca. Nos trabalhos
pesadelos e reclamar da escola ou da
ou jogos, é a última a ser escolhida pelo
professora – evita, assim, denunciar os
grupo. Nunca faz perguntas nem tem dú-
colegas e sofrer mais ataques. Nunca é
vidas. O desempenho escolar muda e as
convidado para festas nem traz colegas
faltas são constantes. Em geral, as notas
em casa. Em casos extremos, a criança muda de escola, abandona os estudos e pode tentar o suicídio.
O cenário da violência Aprenda a reconhecer os atores envolvidos na prática de bullying. Vítima – apresenta alguma característica diferente, um traço físico marcante, algum tipo de necessidade especial, o modo de se vestir. A obesidade é uma causa comum. Também podem ser alvos alunos com poder aquisitivo superior ao dos colegas ou meninas que se destacam pela beleza. Costumam ser pessoas tímidas, inseguras e passivas. Agressor – sempre espera que todos façam suas vontades. Tem dificuldade em se adaptar a regras e aceitar limites. Algumas vezes vem de família na qual o comportamento agressivo é tolerado e há pouco afeto. Busca obter popularidade junto aos colegas e ser aceito pelo grupo de referência. É reconhecido à medida que seus atos são observados e consentidos pela omissão das testemunhas. Testemunhas – os alunos que assistem às agressões também fazem parte do cenário e contribuem para a manutenção da violência escolar. São a grande maioria da escola. Temem serem as próximas vítimas, por isso se calam. Mas sofrem por se sentirem inseguros e incomodados. 36 maio 2011
Mal geral Quando a violência se instala na escola, todos são prejudicados: quem provoca, quem sofre e quem assiste. Por isso o educador Marcos Meier defende que a escola esteja permanentemente atenta. “Um simples apelido pode ser uma porta de entrada para o bullying”, diz. Quando
Mitos comuns sobre o bullying
Se você, como professor, já disse ou ouviu alguma destas frases, fique atento. Levar o problema a sério é o primeiro passo para mantê-lo fora da sua escola. • O bullying sempre existiu. Por que eu deveria me incomodar com isso se os alunos sempre se resolveram sozinhos? A violência escolar não é novidade, mas está mais forte e conta com outros mecanismos, como o ciberbullying. Além disso, as famílias estão mais ausentes, o que incita a escola a trabalhar uma educação fundamentada em valores. “As ações pedagógicas devem ser aplicadas de acordo com as características sociais e culturais de cada escola”, diz a pedagoga Aloma. • Isto faz parte da idade, é apenas uma fase que daqui a pouco passa. O bullying não acontece apenas na idade escolar. Se não for combatido, pode ser levado pelo agressor para toda a vida adulta, afetando o ambiente nas universidades e no trabalho. “Vivemos em sociedade e precisamos, desde cedo, aprender a conviver com os outros respeitando as diferenças”, diz a psicopedagoga Elenice. • É um problema do aluno que está sendo provocado. Ele é que deve reagir. É papel do educador fazer sua parte para construir um ambiente escolar saudável. “O desequilíbrio de forças é muito grande. Tem que haver respaldo dos pais, da coordenação e dos professores. Não é só a vítima que tem que reagir”, diz o educador Marcos Meier.
Reprodução
ASSISTA NA INTERNET Quer saber mais sobre a história de Casey Heynes, o estudante australiano que ficou conhecido na internet após se defender de bullying? Por meio do código BEETAG abaixo, você pode assistir no seu celular a uma reportagem em que Casey e os envolvidos no caso se pronunciam. Para assistir, basta seguir os passos a seguir. 1. Com o seu celular, acesse www.phdmobi.com 2. Faça o download do leitor de códigos 2D 3. Abra o aplicativo e use a câmera (scan) 4. Mire ou fotografe o código 2D acima 5. Pronto. Você será direcionado ao conteúdo.
o professor não dá importância ao fato,
dificuldade para acabar com o bullying é
brincadeira de mau gosto é chamada de
repassa aos alunos a mensagem de que
que muitas pessoas, inclusive pais e pro-
bullying”. É preciso deixar claro que a
aquilo é uma atitude aceitável. Com isso,
fessores, acreditam que se trata apenas
ação que ocorre uma única vez não faz
inicia-se um círculo vicioso. “Colegas pró-
de uma brincadeira da idade, saudável
parte desse conceito de violência escolar.
ximos do agressor repetem o mau com-
para o amadurecimento das crianças”,
Independentemente da razão que
portamento e passam também a agredir
diz Aloma. “Outras vezes a expressão
leva essas crianças e adolescentes a
o colega mais frágil”, completa. “A maior
é banalizada e qualquer briguinha ou
agredir de forma tão cruel colegas tão próximos, a escola tem o poder de trans-
Ciberbullying: o inimigo virtual Quando o aluno usa recursos tecnológicos – como o computador ou celular – para agredir sua vítima, está praticando o ciberbullying. Trata-se de uma versão moderna da violência escolar. Difere do bullying por se propagar mais rapidamente, muitas vezes sem que o agressor seja identificado. As armas usadas são os e-mails com conteúdo maldoso, as mensagens anônimas enviadas pelo celular e os falsos perfis construídos em redes sociais como Orkut, Facebook e Twitter. Costumam ser divulgadas pelo agressor fotomontagens e informações sigilosas ou mentirosas sobre o colega, que acabam se espalhando entre os colegas de escola com a velocidade de um vírus. Em pouco tempo, o boato vira “verdade”. O que muitos alunos desconhecem é que a publicação de conteúdo falso na Internet é crime. E os pais, detentores da guarda dos filhos menores de idade, é que podem pagar por esses atos. “É preciso promover a conscientização sobre o uso ético, seguro e responsável das ferramentas disponíveis na Internet”, alerta a pedagoga Aloma Felizardo. O desafio é mostrar aos alunos que as agressões virtuais têm o mesmo efeito daquelas que acontecem na vida real. “Se um aluno rouba a senha de um colega, é como se estivesse roubando o dinheiro da mochila dessa pessoa”, destaca.
formar essa realidade. Um olhar atento deve recair sobre os autores da violência. “Não podemos esquecer que esses agressores são crianças e adolescentes”, lembra Marcos. Punir apenas não resolve o problema, pois faz com que eles se revoltem e mantenham o mesmo comportamento quando estão longe dos olhos dos adultos. “O ideal é que a escola assuma a responsabilidade de educar esse jovem para que ele realmente entenda que suas atitudes provocam dor no outro”, completa. Ou seja, proteger a vítima é o primeiro passo. Mas a escola só estará livre do bullying se os agressores forem vistos como alunos que também precisam de ajuda e de atenção. “O papel da escola é estar preparada. Ser um porto seguro para formar e capacitar cidadãos fortes, que irão marcar sua geração por meio da ética e da cidadania”, conclui Elenice. maio 2011
37
Para Pensar
por Mario Sergio Cortella
A educação transforma e Qual é a sua escolha?* Há uma natureza contraditória das
qualitativa da escola em nosso país.
como nossa sociedade se organiza, é
instituições sociais e, aí, a possibilidade
Para um otimismo crítico, o educador
construir coletivamente os espaços efe-
de mudanças; a Educação tem uma fun-
tem um papel político/pedagógico, ou
tivos de inovação na prática educativa
ção conservadora e uma função inovado-
seja, nossa atividade não é neutra nem
que cada um desenvolve na sua própria
ra ao mesmo tempo.
absolutamente circunscrita. A educação
instituição.
A escola pode, sim, servir para re-
escolar e os educadores têm, assim,
Assim desponta mais fortemente hoje
produzir as injustiças, mas, concomitan-
uma autonomia relativa, que pode ser
uma preocupação: não basta reafirmar
temente, é também capaz de funcionar
representada pela inserção da escola no
que o aumento da quantidade de cidadãos
como instrumento para mudanças; as
interior da sociedade como uma via de
na escola pública leva a uma queda da
elites a utilizam para garantir seu poder,
mão dupla, e não como em um otimismo
qualidade de ensino (com as causas já
mas, por não ser asséptica, ela também
ingênuo (com a escola totalmente inde-
apontadas); é preciso pensar uma nova
serve para enfrentá-las. As elites con-
pendente) nem um pessimismo ingênuo
qualidade para uma nova escola, em uma
trolam o sistema educacional, contro-
(com ela dominada inteiramente).
sociedade que começa, paulatinamente,
lando salários, condições de trabalho,
Os educadores estão, dessa forma,
a erigir a Educação como um direito sub-
burocracia etc., estruturando, com isso,
mergulhados nessa dupla faceta; nossa
jetivo de Cidadania e, portanto, inerente
a conservação; porém, mesmo que não
autonomia é relativa e, evidentemente,
a cada sujeito, a cada pessoa.
queira, a Educação por elas permitida
nossa determinação também é. Por isso
Fortalece-se a percepção de que, no
contém espaços de inovação a partir das
não é uma questão menor pensar nossa
momento em que as classes trabalhado-
contradições sociais. Não é casual que as
prática nessa contradição; o prioritário,
ras passam a frequentar mais amiúde os
elites evitem ao máximo a universalização
para aqueles que discordam da forma
bancos escolares, os paradigmas pedagó-
38 maio 2011
reproduz a sociedade. gicos em execução são insuficientes para
acesso. Não se confunda qualidade com
A democratização do saber deve se
dar conta plenamente desse direito social
privilégio; em uma democracia plena, só
revelar, então, como objetivo último da
e democrático.
há qualidade quando todas e todos estão
escola pública, na educação da classe
incluídos; do contrário, é privilégio.
trabalhadora (agora a frequentando em
A qualidade tem que ser tratada junto
Essa qualidade social, por sua vez,
maior número) com uma sólida base
rado o antigo e discricionário dilema da
carece de uma tradução em qualidade de
científica, formação crítica de cidadania
quantidade X qualidade. A democratiza-
ensino e, assim, a formação do educador
e solidariedade de classe social.
ção do acesso e da permanência deve ser
necessita abranger o elemento técnico
absorvida como um sinal de qualidade
de especialização em uma área do saber
social.
(e a capacitação contínua) e também a
A qualidade na Educação passa, ne-
dimensão pedagógica da capacidade de
cessariamente, pela quantidade. Em uma
ensinar. A discussão sobre tal dimensão
democracia plena, quantidade é sinal de
envolve ainda temas mais amplos, como
qualidade social; se a quantidade total
a democratização da relação professor/
não é atendida, não se pode falar em qua-
aluno, a democratização da relação dos
lidade. Afinal, a qualidade não é obtida
educadores entre si e com as instâncias
por índices de rendimento unicamente
dirigentes, a gestão democrática englo-
em relação àqueles que frequentam
bando as comunidades e, por fim, como
escolas, mas pela diminuição drástica
objetivo político/social mais equânime, a
da evasão e pela democratização do
democratização do saber.
Divulgação
com a quantidade, não pode ser revigo-
Mario Sergio Cortella *Fragmentos, rearranjados pelo autor, de: CORTELLA, Mario Sergio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos. 13. ed. São Paulo: Cortez, 2009.
maio 2011
39
Gestão
por Rosiane Correia de Freitas
Liderar para fazer
acontecer
Doutor em Ciências da Educação, Júlio Furtado diz que é “inconcebível” um professor que não seja líder. Dentro da sala de aula, é preciso orientar os alunos e formar novas lideranças. Fora dela, é necessário colaborar para uma melhor organização da instituição de ensino.
Imagine uma sala de aula. Lá estão os alunos, o quadro-negro, as carteiras e também, é claro, o professor. Imagine que o professor tem domínio do conteúdo e os estudantes estão prontos a ouvi-lo. A campainha toca. Tudo está pronto para a aula começar. No entanto, falta um elemento para termos certeza de que o processo de educação será bem-sucedido. Do que se trata? Estamos falando da capacidade do professor em transformar aquele momento em algo instigante, que faça os alunos se engajarem no processo. A boa condução de uma aula é um fator que está ligado diretamente a uma das principais competências exigidas de um professor: a liderança. Ser um líder em sala de aula, porém, não esgota todo o papel que a liderança desempenha na vida profissional de um educador. O professor deve ser um líder em tempo integral, não pode abrir mão dessa característica em nenhum momento. “Essa liderança se expressa por meio do planejamento das atividades, da implantação de um clima participativo e favorável à aprendizagem, da garantia de que as tarefas serão desenvolvidas e do cumprimento dos prazos, entre outros pontos”, afirma Júlio Furtado, doutor em Ciências da Educação pela Universidade de Havana e reitor do Centro Universitário Uniabeu, no Rio de Janeiro. “É inconcebível um professor que não seja um líder. A ação educativa no ambiente escolar pressupõe liderança”, afirma Furtado. Para ele, a liderança exigida de um professor é necessária para “fazer acontecer” e se divide em duas partes. Por um lado, existe a liderança dentro de sala. Por outro, o professor precisa saber tomar a frente dentro da 40 maio 2011
Daniel Klein sobre foto de iStockphoto.com/Skynesher
própria organização, fazer com que as
não dando essa oportunidade apenas
coisas aconteçam da melhor maneira na
àqueles que parecem ter naturalmente
instituição de ensino em que trabalha. Ou
uma disposição para serem líderes. Não
seja: é necessário ter liderança também
se trata, afinal, de criar líderes e lidera-
fora da sala de aula.
dos, mas, sim, de dar a chance para que
Júlio Furtado explica que, para a
todos conheçam plenamente o seu poten-
escola, é fundamental ter profissionais
cial e o levem ao máximo grau possível.
com esse perfil. “Organizacionalmente,
Furtado dá algumas dicas de como
a escola não funciona sem uma liderança
isso pode ser integrado à prática cotidia-
que facilite e promova a construção e ma-
na da sala de aula. Para ele, estimular o
nutenção coletiva de um projeto político-
trabalho em equipe é fundamental. Mas
-pedagógico. É por meio desse projeto
é preciso tomar alguns cuidados: garan-
que a liderança da escola faz acontecer,
tir que os grupos não sejam sempre os
mobilizando todos os envolvidos no
mesmos e que os líderes dentro de cada
processo escolar (família, professores,
equipe também se alternem. “Essas são
alunos e comunidade próxima)”, diz.
ações essenciais do professor que se
Reitor da Universidade de Lisboa, o professor português Antônio Nóvoa
propõe a desenvolver a liderança em seus alunos”, afirma.
concorda com a necessidade de liderança
Formar líderes dentro da sala de aula,
dentro da organização da escola. E vai
de acordo com Furtado, acaba sendo uma
mais longe. Diz que é necessário haver
das principais metas do bom professor. E
líderes mesmo entre os professores,
isso se consegue insistindo dia a dia na
levando todo o corpo docente a funcio-
criação de um ambiente que permita aos
nar melhor por meio do exemplo e da
alunos se desenvolverem. Como se faz
iniciativa. “É urgentíssimo consolidar
isso? “Propondo atividades em que os
lideranças profissionais nas escolas, com
alunos tenham a oportunidade de liderar.
base nos professores mais competentes e
Essas atividades precisam deixar claras
mais prestigiados, de forma a enquadrar
as atribuições do líder e como ele deve
os ‘menos capazes’ e a definir práticas de
agir. Devem, também, permitir a autoava-
avaliação do trabalho docente”, afirmou
liação do aluno para que ele perceba os
em entrevista recente.
pontos em que precisa melhorar”, ensina
Já a liderança dentro da sala de
o professor.
aula, diz Furtado, concretiza-se no de-
Assim como os alunos, portanto, o
senvolvimento do potencial de liderança
professor também vai exercitando a sua
dos alunos. Cabe ao professor dar aos
liderança no dia a dia e aprendendo com
estudantes a chance de desenvolver seus
ela. Afinal, educação, como se sabe, é um
talentos e permitir que todos, democrati-
aprendizado contínuo, até mesmo para
camente, possam exercitar sua liderança,
os líderes. maio 2011
41
Avaliação
Três em
um
Especialistas de três países debatem sobre a utilização da avaliação como instrumento de gestão, tanto no aspecto político quanto no pedagógico.
Avaliar é o ato de investigar a qualidade, mensurar, documentar, analisar e estabelecer planos de ação. Os sistemas de gestão não podem trabalhar com garantias de que encontrarão o resultado esperado. No entanto, mensurar de forma constante a avaliação de todos os processos escolares (incluídos aí serviços e produtos) é uma ação fundamental para aqueles que buscam a melhoria e a inovação em nome do crescimento e da continuidade das instituições de ensino. Mas como usar a avaliação como processo de gestão?
42 maio 2011
Divulgação Divulgação
Divulgação
Quem transforma é a gestão Cipriano Luckesi (Brasil)
Sem esquecer a voz dos sujeitos Almerindo Afonso (Portugal)
Professor do Programa de pós-graduação da Faculdade de Educação (FACED) e Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Professor associado da Universidade do Minho diretor do Mestrado em Sociologia da Educação e Políticas
Em qualquer tipo de gestão, a avaliação, por si, sempre foi e sempre será um recurso que subsidia o processo. A avaliação, por si, não resolve nada; quem resolve é a gestão. O que ela faz, então? Ela investiga a qualidade dos resultados de uma ação e oferece essa informação ao gestor, para que este atue da forma mais adequada frente aos objetivos que se tenha. Isso significa que ela subsidia a gestão de um projeto. Caso o gestor deseje efetivamente produzir resultados significativos, a avaliação é sua aliada. Nesse caso, necessita ser aplicada como uma investigação, o que exige recursos metodológicos próprios da pesquisa. Isso implica que os instrumentos de coleta de dados a respeito do desempenho dos educandos devem ser elaborados segundo as regras da metodologia científica. Nenhuma investigação será realizada com êxito se o investigador assumir definições prévias arbitrárias à pesquisa. Hoje, infelizmente, em nossas escolas, os instrumentos de coleta de dados para a avaliação são insatisfatórios do ponto de vista metodológico, o que leva o avaliador e, consequentemente, o gestor ao engano, seja na leitura da realidade ou na intervenção. Desse modo, os instrumentos não auxiliam a gestão.
A avaliação tem sido um instrumento importante para ajudar na tomada de decisões políticas, em diferentes âmbitos e patamares dos sistemas educacionais. O que me preocupa é a utilização de formas de avaliação que dão grande importância aos resultados mensuráveis e aos indicadores quantitativos (o que alguns autores chamam de “governo pelos números”), desvalorizando os processos concretos, esquecendo a voz dos sujeitos e dispensando a participação e o diálogo político – que não pode deixar de reconhecer os antagonismos presentes numa sociedade aberta e democrática. No contexto pedagógico, a avaliação pode ser um instrumento de discriminação negativa, de seleção e de reforço das desigualdades ou, pelo contrário, ser uma oportunidade para o autoconhecimento e o desenvolvimento pessoal e coletivo, ajudando na emancipação dos sujeitos. Entre muitos outros fatores, há que se ter em conta que existem constrangimentos que pesam sobre a ação dos educadores e professores, sendo muito importante a existência de compromissos políticos e educacionais na busca de uma sociedade mais justa e igualitária. Por isso, diferentes formas de avaliação servem a diferentes objetivos, e estes são, frequentemente, contraditórios.
Mais rigor e preciosismo Charles Hadji (França)
Professor emérito da Universidade Pierre Mendès France Grenoble 2 de Filosofia
Na medida em que a avaliação permite obter informações de retorno (o feedback) sobre o andamento de um processo, ela é, por essência, uma ferramenta de regulamentação. Regular significa intervir no curso de um mecanismo para mantê-lo dentro de certos limites ou dirigi-lo para certos padrões, os quais definem o objetivo de um trabalho finalizado. Para conduzir o processo, deve-se ter: uma visão clara do objetivo; fazer um balanço periódico para saber onde se está e ajustar suas ações às informações recolhidas. Sempre se pode melhorar, seja no nível político ou educacional. Só são necessários mais rigor e precisão no levantamento das informações recebidas. Por exemplo, procurando-se indicadores mais relevantes ou avaliações mais informativas e objetivas que nos levarão a um resultado mais justo e útil.
maio 2011
43
iStockphoto.com/Luoman
Sustentabilidade
Educação verde por Luciana Zenti
O desenvolvimento sustentável é um dos grandes desafios da sociedade. E a educação, o caminho pelo qual chegaremos lá. Sustentabilidade. A palavra é compri-
Mozart Ramos, autor do livro “Educação
necessidades no presente, mas sem
da, mas o significado pode ser resumido
Sustentável”, e conselheiro do movimen-
comprometer que as futuras gerações
como a combinação de crescimento eco-
to nacional Todos Pela Educação.
também satisfaçam suas necessidades.
nômico com desenvolvimento social e o
O termo sustentabilidade foi usado
uso racional dos recursos naturais.E o
pela primeira vez em 1987, quando a
que tem a educação a ver com isso? Para
primeira ministra da Noruega Gro Brun-
Educar para sustentabilidade signifi-
ser alcançada e incorporada no nosso dia
dtland – então presidente de uma comis-
ca preparar pessoas de todas as idades
a dia, a sustentabilidade prevê a adoção
são das Nações Unidas – publicou o livro
para assumir a responsabilidade de criar
de novos hábitos e atitudes. E um dos ca-
“Our Common Future” (Nosso Futuro em
um futuro melhor. É nas escolas que
minhos para isso é a educação das novas
Comum, em tradução livre). Nesta obra,
nascerá uma sociedade preparada para
gerações - que tem nas mãos a oportu-
ela traça um paralelo entre progresso e
atuar de maneira sustentável.
nidade de mudar a forma como vivemos
meio ambiente e mostra que é possível
A educação informal é outra impor-
até hoje. “Educar é fundamental. Não se
que os países cresçam sem esgotar os
tante aliada nessa mudança de compor-
trata do único vetor a influenciar o modo
recursos naturais. Também cunhou o
tamento. É o que acredita a Unesco,
como vivemos e a gerar desenvolvimento
conceito, até hoje popular, sobre desen-
a agência das Nações Unidas para a
econômico e social, mas com certeza é o
volvimento sustentável. A ideia é que
educação, a ciência e a cultura.
mais importante”, acredita o educador
nosso padrão de consumo atenda nossas
44 maio 2011
O papel da educação
Como forma de mobilizar um grande
Dicas de livros • “Educação Sustentável”, de Mozart Ramos, Ed. Altana. • “Educar para a sustentabilidade: uma contribuição à Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável”, de Moacir Gadotti, Ed. Instituto Paulo Freire.
A abordagem da susten-
Apesar de muitas universidades ainda
tabilidade deve estar próxima
não terem acordado para a importância
da realidade diária dos alunos,
da capacitação para o ensino da susten-
desenvolver o pensamento crí-
tabilidade, algumas organizações não
tico e estimular a capacidade de encontrar soluções para os problemas que enfrentamos atualmente. A base de todo esse trabalho está na constru-
ção de princípios e valores. A palavra é respeito. Ao próximo, à diversidade, ao meio ambiente, aos recursos naturais e número de pessoas em torno desta causa, a Unesco decretou o período entre 2005 e 2014 como a Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável. A meta é divulgar um conceito mais amplo de aprendizagem, que busca o equilíbrio entre o bem-estar humano e econômico com as tradições culturais e o respeito aos recursos naturais. Preparar professores e outros multiplicadores a lidar com o tema da sustentabilidade é um dos objetivos da Unesco. Não há receita pronta, mas uma mudança de postura das próprias escolas que devem incluir, de forma transversal,
às gerações presentes e futuras.
Educação ambiental Para a pedagoga Lucy Duró, que integra o Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Atividade Pedagógica da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), é preciso que o professor amplie o campo de visão de seus alunos para que eles entendam os impactos de suas ações no meio ambiente. “Não tenho dúvidas de que a escola pode estimular a mudança de comportamento”, diz. “Mas esse trabalho está diretamente ligado à formação dos professores”, completa.
governamentais começaram a fazer sua parte. É o caso da Fundação SOS Mata Atlântica. Por meio do Programa Mata Atlântica Vai à Escola, professores de escolas do Estado de São Paulo que atuam no Ensino Fundamental estão sendo preparados a trabalhar com seus alunos temas que envolvem a conservação do Meio Ambiente. Os educadores recebem material pedagógico e sugestões de atividades para serem aplicadas em sala de aula. A proposta é que cada professor trabalhe a educação ambiental dentro da sua disciplina ou de projetos pedagógicos que já existem. “O meio ambiente está em tudo que rodeia uma pessoa, então na escola deve ser assim também. Dessa forma, o professor de Português, Matemática ou qualquer outra disciplina consegue inserir o tema nas suas aulas”, explica Beatriz Siqueira, coordenadora do programa.
a discussão sobre assuntos importantes neste nosso século, como consumo responsável, esgotamento de recursos naturais e combate à pobreza. Segundo Celso Schenkel, coordenador de Ciências e Meio Ambiente Unesco no Brasil, é preciso que a sustentabilidade faça parte dos currículos. Não se trata de criar uma nova disciplina e, sim, inserir o tema nas diferentes matérias para que possamos construir uma visão do que é desenvolvimento sustentável. “Nós ainda estamos trabalhando em caixinhas. É preciso acabar com essa divisão e ver quais são os pontos de contato nas várias áreas de conhecimento que podem convergir e estabelecer novos parâmetros para as questões de produção, consumo, distribuição de trabalho e renda”, explica
Em sala de aula Conheça alguns macrotemas que devem ser incluídos no planejamento da Educação para o Desenvolvimento Sustentável. Sociedade – É importante que os alunos conheçam como funcionam as instituições sociais e os sistemas democráticos e participativos. Assim será possível que eles entendam o papel dos governos no desenvolvimento social e, no futuro, exerçam o direito do voto com responsabilidade. A dimensão social inclui os seguintes temas: direitos humanos, paz e segurança, igualdade de gêneros, diversidade cultural e saúde. Meio ambiente – Os alunos devem ser conscientizados sobre a utilização dos recursos naturais e os efeitos das atividades econômicas no meio ambiente. Também devem
compreender que as questões ambientais são o elemento primordial no desenvolvimento de políticas sociais e econômicas. A dimensão social inclui os seguintes temas: recursos naturais (água, energia, agricultura e biodiversidade), mudança climática e aquecimento global, desenvolvimento rural, urbanização sustentável e prevenção de desastres. Economia – A escola deve abordar a questão do crescimento econômico e de seus impactos na sociedade e no meio ambiente. Além disso, deve incentivar que os alunos reduzam seu consumo individual e coletivo. A dimensão econômica inclui os seguintes temas: redução da pobreza, responsabilidade das empresas e economia global de mercado.
Fonte: Texto adaptado da publicação Década da Educação das Nações Unidas para um Desenvolvimento Sustentável, 2005-2014: documento final do esquema internacional de implementação. Brasília: UNESCO, 2005.
Celso. maio 2011
45
Livros e Filmes
Não pode faltar na sua biblioteca A arte de ler ou como resistir a adversidade O livro da antropóloga francesa Michèle Petit apresenta dezenas de testemunhos de jovens sobre a importância da leitura na formação do sujeito e o papel que ela desempenha em contextos de crise. Comentando experiências de mediadores de leitura, a autora investiga as diferentes maneiras pelas quais a forma narrativa pode atuar como educadora da sensibilidade, ao mesmo tempo em que se afirma como instrumento de resistência ao caos interior e à exclusão social. Dica de
Betina Prieto
Editora 34 |Preço sugerido: R$ 46,00
Produzindo texto com “velhas” e “novas” tecnologias
Dica de
Marcos Cordiolli
O livro de Glaucia Brito e Paulo Negri indica maneiras para o professor aplicar as novas tecnologias da comunicação e informação e valoriza instrumentos antigos que, muitas vezes, o educador pensa em abandonar. Pró Infantil Editora | Preço sugerido: R$ 26,00
Para ver e rever Dica de
David Thornburg
Título original: Entre les Murs Lançamento: 2007 (França) Direção: Laurent Cantet Atores: François Bégaudeau, Nassim Amrabt, Laura Baquela, Cherif Bounaïdja Rachedi. Duração: 128 min Gênero: Drama
46 maio 2011
Entre os Muros da Escola Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, em 2008, o filme francês “Entre os muros da escola” retrata a experiência de um professor do Ensino Fundamental com uma turma de alunos que pode ser encontrada em qualquer escola do mundo: alunos desinteressados, agressivos e bagunceiros. O professor tem de lidar não só com a falta de interesse dos alunos, mas também com as diferenças sociais e o choque entre as culturas africana, árabe, asiática e europeia dentro das quatro paredes da sala de aula.
Dica de
Betina Prieto
NA WEB
A escola mata a criatividade? O especialista em criatividade Sir Ken Robinson nos desafia a repensar a escola e defende uma revisão radical dos sistemas escolares que devem cultivar a criatividade e reconhecer os diferentes tipos de inteligências. (em inglês) www.ted.com/talks/lang/eng/ken_robinson_says_schools_kill_creativity.html
Curta na escola “Curta na escola” (www.curtanaescola.org.br) é uma rede colaborativa para o uso de curtas-metragens brasileiros em salas de aula.
maio 2011
47
anĂşncio