Diagnóstico de expectativas e necessidades iduais de formação
Colecção Metodologias
Formação para a Inclusão. Guia Metodológico.
IDENTIFICAR Necessidades
PREPARAR aIntervenção
ACOMPANHAR aIntervenção
Diagnóstico social e dasdinâmicas territoriais
Construção da intervençãoformativa
Acompanhamento dos/asformandos/as
Diagnóstico de expectativas enecessidades individuais de formação
Definição da estratégia avaliativa
Acompanhamen to daformação em contexto detrabalho
Diagnóstico denecessidades deformação eoportunidades do mercado de trabalho
Definição emobilização dos meios humanos emateriais
RECONHECER Processos eResultados
Avaliação daintervenção
Ao longo deste ponto, procuramos abordar as seguintes questões: a) Quais os factores em jogo na abordagem a potenciais formandos/as? b) Qual a abordagem mais adequada aopúblico-alvo? c) Que meios utilizar no sentido de mobilizar o público-alvo para aformação? d) Quais as mais adequadas estratégias de contacto com os/as potenciais formandos/as? e) Como realizar o diagnóstico individual de necessidades deformação? f) Como potenciar os dadosrecolhidos? g) Como mobilizar os sistemas oficiais de reconhecimento, validação ecertificação?
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a) Quais os factores em jogo na abordagem a potenciais formandos/as?
O processo de diagnóstico social realizado, se verdadeiramente participado, levou a um contacto efectivo com, pelo menos, um grupo reduzido do público-alvo envolvido na obtenção de dados de diagnóstico do contexto sob intervenção. Este grupo é constituído por potenciais formandos/as e deve ser, igualmente, meio privilegiado de chegar a outros potenciais formandos/as pertencentes aopúblico-alvo. Habitualmente, os projectos de formação utilizam estratégias pouco adequadas de divulgação das acções e de atracção e mobilização das populações pouco escolarizadas. E tal acontece, frequentemente, devido àinexistência de umdiagnóstico de necessidadesque permita umaidentificação do perfil pessoale social dospúblicos-alvo, bem comode abordagens mais participativas. Havendo, por parte das entidades, uma preocupação em conceber e em desenvolver projectos de formação de acordo com o que se diagnostica como sendo as necessidades de formação, em termosde desenvolvimento de competências, descura-se, não raras vezes, um conjunto de indicadores de caracterização social a partir dos quais é possível identificar as melhores formas de divulgar, mobilizar e motivar para e durante a acção formativa, sendo que esses indicadores se revelam também úteis ao acompanhamento, comoveremosadiante
No que respeita à mobilização de grupos sociais desfavorecidos para um projecto de formação/inserção, dever-se-á sempre partir da perspectiva da montanha que vaiaMaomé!
Naturalmente que o facto de se procurar conciliar as motivações e interesses individuais com as necessidades do mercado, aumenta as possibilidades de a proposta formativa ser atractiva, porque, efectivamente, a exclusão social configura uma diversidade de situações tipo/grupos que revelam necessidades de formaçãoe inserçãoespecíficas.
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No entanto, talpode não sersuficiente se considerarmosque tendencialmente osgrupos em situaçãode desvantagem: 1.Têm pouca apetência paraacções de formação, frequentemente associadas auma experiência escolar mal sucedidae/ou vivida hámuito tempo; algunsvivenciaram mesmo umpercurso escolar fortementenegativo. 2.Tendem a associar/suspeitar que a abordagem formativa é em tudo semelhante à escolar mais tradicional ou a uma experiência formativa vivida com as mesmas características (em sala, pouco dinâmica, fortemente meritocrática, muito teórica, centrada nas matérias, alheia aos seus contextos de vida, penalizadora dos seus modos de vida, sem ligação com o mundo do trabalho etc.). 3.Têm baixa auto-estima escolar, desvalorizando as suas capacidades para adquirir novos conhecimentos e interiorizando sentimentos de descrença relativamente à possibilidade de inserçãosócio-profissional. 4.Frequentemente, não têm amínima representação de um projecto de vida profissional próprio ou têmexpectativas desajustadasou irrealistas. 5. Emmuitas situações, existiráausência de hábitosdetrabalho. 6.A frequência de uma acção de formação com objectivos/resultados a médio ou longo prazo em termos de inserçãosocioprofissional é algoque dificilmente secompatibiliza com apredisposição que alguns grupos revelam para o presentismo (Alão & Neves Cabral, 1993), uma ausência de perspectivação e empenhamento em projectos a longo prazo, cuja origem se relaciona, entre outras, com aexperiência de acumulaçãode insucessos. 7.Os seus modos, ritmos e locais de vida são percepcionados como incompatíveis com a frequência de uma acção de formação; se o espaço formativo se situa num espaço exterior ao seu bairro, normalmente égrande a resistênciaem frequentá-lo, agravadacom a frequente deficiente rede detransportes públicosnecessária àsdevidasdeslocações. 8.As suas relações comas instituições emgeral são pautadas por afastamento, desconhecimento edesconfiança. Este conjunto de factores de bloqueio releva, por um lado, de uma auto-imagem desfavorável e, por outro, de representações negativas sobre as instituições na sua generalidade, e os espaços de ensinoaprendizagem, emparticular.
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b) Qual a abordagem mais adequada ao público-alvo? Todas estas predisposições, representações, modos de ser e de estar que caracterizam os grupos deverão ser consideradas no momento em que se tomam opções metodológicas e pedagógicas na concepção do projectoformativoe noseu desenvolvimento.
No entanto, é fundamental, já no momento da promoção e na divulgação da intervenção formativa, adequar a abordagem a essas mesmas especificidades. O potencial formando deverá, na medida do possível, ser convencido de que aproposta que lhe é feita contraria aquilo que são assuas concepções. Se pensarmos que a frequência de uma acção de formação é já um factor de inserção (para muitos, uma primeira experiência de inserção), percebemos que a importância da divulgação e da promoção não deverá ser subestimada.A mobilização paraa formação éjá um grande passo paraas pessoas emsituação deexclusão.
Um bom estudo diagnóstico que integre indicadores de caracterização psicossocial dará elementos importantes à estratégia de sedução e mobilização paraaformação.
O sucesso da mobilização e sensibilização dos/as formandos/as decorre em larga medida, do seu primeiro contacto com a entidade. Esse primeiro contacto acontece no diagnóstico social prévio. O simples facto de os sujeitos serem envolvidos na identificação das suas necessidades, interesses e expectativas potencia desde já um interconhecimento e uma implicação/responsabilização pelas intervenções quese vieremaconcretizar. Tal resulta mais fácil e eficaz quando a intervenção formativa está enraizada no terreno a nível local/comunitário e se integra num plano de intervenção social mais vasta (permitindo uma intervenção social integrada).
Tendo a entidade como principal actividade a formação, deverá na medida do possível assumir-secomo “porta aberta”, como um espaço de apoio à inserção, informando, orientandoe encaminhandopara outrasentidades as mais variadas situações-problema, quando não fazem parte do seu domínio específico de intervenção.
Este carácter de “loja”, para além das evidentes vantagens que proporciona àpopulação, permite à entidade ganhos emtermos de reconhecimentoe confiança, facilitandoo seu esforço de aproximaçãoe
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de mobilização da população para iniciativas consideradas úteis e adequadas às suas necessidades. As entidades com historial de intervenção social terão facilitada a abordagem, na medida em que beneficiarão já dealguma confiança porpartedos públicos. c) Que meios utilizar no sentido de mobilizar o público-alvo para aformação?
O contacto e articulação comoutras instituições de intervenção social, accionado ou aprofundado já no momento do diagnóstico social, deve criar canais de comunicação e de trabalho em parceria. A estratégia de divulgação devetambém ela beneficiardessas sinergias criadascom asinstituições locais. > A divulgação daintervenção formativa serámais eficaz se realizada em locais-chave, designadamente nas instalações das entidades parceirase noutras locais tais como Juntas de Freguesia, Centros de Saúde, Centros Comunitários, Centros Recreativos, Desportivos, IPSS locais, Paróquias, Escolas, espaços comerciais, pontos deencontro narua, etc. > Deverão ser envolvidos também actores-chave, que poderão estar ou não relacionados com os referidos locais/organizações. Existem, não raras vezes, líderes ou pessoas na comunidade (por vezes pares), com particular poder de influência, que deverão ser importantes e privilegiados veículos de transmissão de informação e persuasão. Em contextos relativamente pequenos (bairro, freguesia, pequeno concelho), a estratégia de “passar a palavra” resulta extremamente eficaz. Estas entidades/actores-chave devem ser veículo de divulgação, mas também da própria sinalização de potenciais formandos/as acontactar/convidar pela entidade.A sinalização de“candidatos” assume maior premência para entidades formadoras sem implantação local ou comunitária e com menor acesso e conhecimento do público-alvo. > Os meios a utilizar são determinantes. Eles deverão ser variados. (i) Para além de uma abordagem directa, de rua, indo ao encontro das pessoas, informando-as, sensibilizando-as e incitando-as à participação, (ii) também o recurso a cartazes e a folhetos colocados em locais estratégicos será adequado (tendo em atenção, todavia, o níveis de literacia da população). A concepção desses materiais deverá revestir-se de particulares cuidados: deverão ser apelativos em termos de imagem, utilizando uma linguagem simples, contendo toda a informação necessária de forma sintética e adequada. (iii) O recurso a sessões de esclarecimento poderá ser útil, podendo nesse contexto a apresentação da proposta formativa ser mais aprofundada. Esse poderá também ser um espaço privilegiado para
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desmistificar todos os eventuais pré-conceitos e, simultaneamente, mais um momento de auscultação de potenciais formandos/as quanto às suas necessidades e expectativas. (iv) A sensibilização e mobilização por via de um evento recreativo promovido pela entidade formadora poderá ser bastante eficaz, designadamente, sefor aoencontro dos seusinteresses culturais, musicais,desportivos, etc. Resumidamente, poder-se-ão sintetizar osseguintes aspectos parao domínio específicoda divulgação e promoção daintervençãoformativa:
> A estratégia promocional deverá ser orientada por dados de caracterização pessoal e social,adequada ao perfildo público-alvo eseu contexto
> Considerar que tendencialmente os grupos sociais desfavorecidos reúnem um conjunto de predisposições pouco favoráveis à concretização de um projecto deformação > A mobilização para umaacção de formação representa para estes públicos, e por si só, um esforço de inserção (para muitos, um primeira experiência de inserção). A entidade formadora deverá colocar em prática, desde este momento, aquela que considera ser a sua abordagem diferenciadora e àmedida dospúblicos > A entidade formadora deverá nesta fase dar sinais de que a proposta formativa que ofereceé distintiva daspráticas tradicionais edesconstruir todos preconceitos que constituamresistência àadesãoà proposta formativa > Privilegiaro contactodirecto coma população > Ter cuidados especiais na concepção dos materiais de divulgação no sentido de serem atractivos, de fácil apropriação ecompreensão e adequados aos níveis de literacia doseu target > Potenciarparcerias, designadamente, comentidades e interlocutores-chave locais, quer no apoio à divulgação e promoção, quer na própria sinalização de potenciais formandos/as > A entidade formadora deverá, na medida do possível, implantar-se na comunidade, não apenas na qualidade de formadora mas como entidade de apoio à inserção social, devendo para tal munir-se de todas as informações necessárias ao apoio directo ou encaminhamento das pessoas na resolução de todos os problemas quedecorramdasua condiçãosocial
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Com base nestaspremissas, é importantegizar um breveplano de abordagem, tendo em consideração, designadamente: Tipo de abordagem
Datas
Actores aenvolver
Contacto directo (conversas de rua) Distribuição de panfletos no contacto directo Distribuição de panfletos nas caixasdo correio Distribuição de panfletos em locais-chave Local Local ... Afixação de cartazes em locais-chave Local Local ... Sinalização de potenciais formandos/as Quem sinaliza Quem sinaliza ... Outras
Outras
Outras
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Desta abordagem deve resultar uma lista de potenciais formandos/as. Muitos deles, na melhor das hipóteses, foram já convidados pessoalmente, alguns conhecidos durante o diagnóstico social, outros nos contactos directos nas abordagens pessoais. Outros ainda foram sinalizados pelas entidades parceiras. Esta listaé abase do posterioraprofundamento de contactocom os,potenciais formandos/as.
d) Quais as mais adequadas estratégias de contacto com os/as potenciais formandos/as? Após um processo cuidado e participado de promoção e divulgação da acção a empreender, a entidade encontra-se na posse de uma lista de potenciais formandos/as que é necessário contactar num curto prazo. A entidade possui,à partida, umconjunto de requisitosmínimos identificados noprocesso de diagnóstico social a partir de uma delimitação e caracterização do público-alvo da intervenção. Estes critérios não deverão ser excessivamente rígidos e exclusivos, de forma a que o processo de selecção não resulte ele próprio em mais um momento de exclusão das pessoas que se apresentam. Recomenda-se que se encontre a situação adequada entre a definição prévia de condições mínimas e uma perspectiva de flexibilidade quando setornam necessáriosalgunsajustamentos. Cada pessoa deve ser convidada a uma primeira conversa. Este primeiro contacto deve ser uma entrevista comosseguintes objectivos: a)Propor o desafio de participar na procura de propostas de formação e emprego realistas e que respondam àssuasprópriasnecessidades b) Conhecer asuasituação faceao emprego/formação,interessese expectativas c) Conhecer oseu interesse/adesão faceà proposta deintegrar uma intervençãoformativa d)Analisar, em conjunto, a exequibilidade da participação na intervenção formativa, avaliando pontos fortes efracos, dificuldades presentese futuras eformas de asultrapassar,etc. e)Caso nãohaja interesse deuma ou de ambas aspartes nesta participação, analisar em conjunto propostas alternativas, não desperdiçando a oportunidade (às vezes, escassa) de encaminhar/ orientar um cidadãoem situação deexclusão social Caso a pessoaconvidada não possaou nãoqueira participar numaintervenção formativa, aentidade deve responsabilizar-se por procurar propostas alternativas para onde o encaminhar. As entidades parceiras, formais ou informais, jogam aqui denovo um importante papel na procura destas propostas alternativas deinserção. Quando se considere adequado, a informação recolhida nas entrevistas pode ser complementada com informação a solicitarà entidade quesinalizou o potencialformando, quando sejaeste o caso, cumprindo sempre aestritaobrigação de confidencialidadee respeitopelapessoa. Este contacto com os potenciais formandos/as deve resultar numa base de dados organizados e sistematizados de forma acessível e imediata, para aqual é desejável a criação e alimentação de uma
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ferramenta informática para o efeito. Caso não exista, é indispensável a criação, de raiz, de bases de dados nas quais se podem introduzire actualizar informaçõesde forma simples e acessível à maioria dos utilizadores8.
De facto, inicia-se, neste momento, o preenchimento de uma Ficha Individual, com diversas áreas de exploração que poderão vir aser preenchidas ao longo dotempo, àmedida da relação estabelecida entre a entidade formadora/gestora e apessoa que agora se apresenta. Esta informação pode limitar-se aeste processo de selecção e (re)encaminhamento para outra entidade e/oualternativa de inserção, ou pode vir a aprofundar-se com a inserção do formando na intervenção formativa, aprofundando os dados pessoais no processode balanço decompetências, bem comona relação deacompanhamento durante e após o processoformativo. Numa base dedados de Formandos/as, devem constaros dados recolhidosnestas primeiras entrevistas, designadamente com osseguintescampos9:
Ficha individual(I) - Nome - Morada - CódigoPostal - Telefone -Sexo - Idade(por escalões) - Grupo-alvo (porcategorias) - Nívelde escolaridade(por categorias) - Nívelde qualificação - ExperiênciaProfissional - Rendimentos - Agregadofamiliar -Dimensão - Agregadofamiliar -Idades
-Agregado familiar - Ocupação - Nº dependentesacargo - Idades dependentes acargo -Cuidados específicos dependentes acargo - Alternativas de guarda dependentes - Onde teve conhecimento da formação - Interesse na formação - Expectativas face àformação - Expectativas profissionais -Disponibilidade de horário (tempo parcial/inteiro)
8É relativamente simples a construção de formulários através das aplicações para construção de base de dados das várias marcas informáticas,
instaladas previamente namaioria dos computadores, uma vez queexistem modelos pré-definidose adaptáveis eindicações de ajudaao utilizador. A sua utilização posterior é ainda mais simples. Constitui-se também prática cada vez mais usual a aquisição, junto de empresas informáticas especializadas, de produtosfeitos àmedidadas necessidades einteresses. 9Esta Ficha Individual,como referido, vaisendo preenchida aolongo do envolvimentodo formando coma equipa/intervenção formativa.Desta forma, os campos vão sendo preenchidos à medida da fase do processo formativo, pelo que optámos por apresentar os campos de preenchimento divididos pelas fases emque aparecem. Àmedida que sevai aprofundando arelação, vai-se completandotoda a ficha,campos actuais eanteriores.
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A informação recolhida através destes instrumentos, deve ser tratada pelos Técnicos de Acompanhamento, que iniciamaqui o processode relação, conhecimento, construção e reforçode confiança pessoal como basedo acompanhamento individualdos/asFormandos/as.
e) Como realizar o diagnóstico individual de necessidades de formação? Após o primeiro enquadramento, de informação e esclarecimento de expectativas, é necessário iniciar um processo de orientação individual, permitindo, quer a Formandos, quer à entidade/parceria formadora, determinar onde se situa cada Formando/a, do ponto de vista das competências, conhecimentos, interesses,expectativas edificuldades.
Neste momento, há a tomar opções relativas ao tipo de orientação que se vai realizar, com base nos objectivos que se pretendem alcançar com este processo, bem como no tempo que se pretende despender no mesmo.É importante reforçarque vale apena “perder” algumtempo com cadaformando, como importante factorde sucesso formativopelos elementos queproporciona ao formandoe à equipa e pela adequaçãoda proposta formativaque dele resulta. Há que procurar, como participante, estabelecer uma relação entre o seu perfil vocacional pessoal, oseu projecto profissional e de vida e o projecto de formação possível. Para tal, é necessária uma recolha de informação mais aprofundada, que tem em mira a identificação e o reconhecimento de competências e conhecimentos adquiridos, designadamente em contextos não formais e informais. O balanço de competências afigura-se como técnicae conceptualmente adequadoao presente contexto.
O Balanço de Competências Se em qualquer experiência deeducação, direccionada paraqualquer nível etário, as práticaseducativas devem partir e centrar-se nas concepções e conhecimentos do formando, esta questão coloca-se com
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maior premência quando estamos perante educação e formação dirigida a adultos, nomeadamente os pouco escolarizados. Todas as pessoas, de meios desfavorecidos ou não, possuem um conjunto de competências, normalmente saberes práticos, que foram adquirindo ao longo da vida, quer nas experiências profissionais anteriores, quer em contextos não formais e informais do seu dia-a-dia. Estas competências devem ser conhecidas e aproveitadas pois podem e devem ser transferidas para novas experiências profissionais.Este processodesigna-se balanço decompetências. Junto de grupos em situação de desvantagem, esta questão reveste-se de enorme importância porduas grandes razões. Por um lado, não possuem muitas qualificações formais que possam apresentar para obterem um posto de trabalho mais qualificado, oque não obsta aque tenham desenvolvido importantes competências na experiênciaprofissional detida. Por outro lado, são precisamenteestes públicos osque têm maior dificuldade em tomar consciência e valorizar as suas próprias capacidades e, depois de as identificar, relacioná-las com a profissão que desejam exercer. Torna-se, portanto, necessário e indispensável fazer o balanço, rentabilizar, reconhecer e valorizar saberes, competências, atitudes, comportamentos, como condição para os ajudar a tomar decisões de formação pessoal, social, profissional com consequências ao nível da sua empregabilidade e inserção socioprofissional (Imaginário, 1995, p.62).
Realizar balanços de competências apresenta muitas virtualidades com variados públicos-alvo. Destaquese, por exemplo,a sua importânciajunto de mulheresadultas sem experiênciasprofissionais formais. Detêm um património de competências adquiridas com a actividade de doméstica e com dependentes a cargo (crianças, idosos): competências associadas à gestão de pessoas (organização de actividades, para si e para outros); competências associadas à gestão do espaço (organização, arrumação, limpeza); competências associadas à gestão de stocks (O que temos? O que precisamos? O que falta comprar? O que podemos comprar?); etc. Énecessário, então, identificá-laspara serem mobilizadasnuma experiência profissional(cf. Jordão,1997).
Tomar consciência dos conhecimentos e saberes práticos que os/as Formandos/aspossuem é, também, o primeiro passo para se definirem as necessidades individuais de formação. Parte-se da intenção de avaliar os adquiridos mas também as lacunas, tendo em conta competências esperadas para o exercício de determinada função ou competências transversais necessárias a qualquer experiência profissional. Em alguns casos, o balanço de competências pode levar à conclusão que determinado sujeito possui as competências mobilizáveis e utilizáveis em contexto de trabalho, sem que necessite de mais formação, sendo que,assim, semelhora arelação custo-benefício dasiniciativas deformação. Nestescasos, opapel
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do Técnico de Inserção centra-se na procura de posto de trabalho a ocupar de imediato e sob acompanhamento temporário,contratualizadocom entidade empregadorae empregado. Por outro lado, o balanço de competências inicia ou dá seguimento a um processo de autoconhecimento que deve levar à construção de um projecto profissional individual, levando a que a formação, integrada nesse projecto, seja perspectivada a longo prazo. O balanço de competências permite, mais facilmente, que se organize a formação à medida das necessidades das pessoas e das necessidades profissionais, beneficiando-se quer o sucesso dos participantes quer a eficácia da formação. O carácter de maior adequação da formação às necessidades dos indivíduos, ou seja, o carácter de individualização da formação, torna-se muito pertinente quanto mais “em risco” se encontra apopulação-alvo daformação. O processode balançode competênciasassume, assim,asseguintesgrandes finalidades: > Reconhecer conhecimentose competências adquiridosao longoda vida > Produzir evidênciasdesses mesmos adquiridos > Ser ponto departida para aconstrução curricular
O processo debalanço de competênciasdeve ter umenfoque individual, na medida em que se pretende que o participante faça uma análise aprofundada dos seus adquiridos e da forma de os transferir para novas actividadesprofissionais. Todavia, considera-se também vantajoso articular momentos de trabalho individual com momentos de trabalho em grupo, desde que se salvaguarde o respeito pela privacidade de cada participante. Um trabalho, feito com outras pessoas em situações de vida semelhantes, de reflexão conjunta sobre experiências passadas e sobre as aprendizagens feitas com elas, pode ser facilitador do autoconhecimento. Assentando na exploração de histórias de vida, em momentos individuais e em grupo, este processo constitui-se, também, comoum primeiro momentoformativo de trabalhoem grupo, iniciando-seaqui a dinâmica dogrupo deformação.
O processo de balanço de competências deve envolver métodos e instrumentos diversificados. A utilização de várias metodologias e instrumentos não deve ser feita de forma padronizada para todos os
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sujeitos, sendo que os instrumentos vão sendo utilizados com cada sujeito quando o processo o exige, quer nos momentosde trabalho individual,quer nosde grupo. Tendo como principal objectivo reconhecer e validar conhecimentos e competências adquiridas, este processo deve implementar-se em torno de quê? Ou seja, com que base se faz esta procura e identificação? De facto, não se pode iniciar umprocesso destes sem um referencial de partida, sob pena de se tentar identificações no vazio, o que dificulta em muito esta tarefa, quer para os técnicos, quer para osparticipantes. O processo de balanço de competências deve ser desenvolvido com base no Referencial de Competências-Chave (RCC) da Educação e Formação de Adultos(Alonso, 2002). Esteé um referencial completo e coerente, integrado num sistema nacional, legal e legítimo de reconhecimento, validação e certificação de conhecimentose competências noâmbito da educaçãoe formação deadultos. Tendo em mira que aproposta metodológico presenteneste Guia sepauta, também, pelacertificação de adquiridos, prévios e posteriores ao processo formativo, este referencial é indispensável para a integração da soluçãoformativa aconstruircom soluções oficiaisde certificaçãodeadquiridos. Perspectivado o balanço de competências desta forma, compreende-se que estamos perante uma tarefa fundamental e complexa, que não se resume a uma entrevista de conhecimento individual. Este momento deve organizar-se com detalhe e deve considerar-se já como um momento formativo. A articulação de momentos individuais com momentos em grupo, bem como a escolha dos instrumentos adequados, perspectiva a necessidade de montar um dispositivo equivalente a um mini-plano de formação. Este momentode trabalho despoleta,também, a criaçãodo grupo de formação, oque reforça asuaimportância. Como referido anteriormente, o balanço de competências é um processo adequado às pessoas e às situações, podendo ser abordado e implementado a partir de múltiplos ângulos. Neste contexto, não é possível apresentar uma metodologia padronizada e fechada. É múltipla, aliás, a bibliografia sobre o assunto, quer do ponto de vista teórico, quer prático10, sendo que esta metodologia tem adquirido protagonismo crescente em Portugal e autonomia conceptual e metodológica que justifica manuais específicos. Este trabalho deidentificar e reconhecercompetências incorporadas aolongo da vida, supõe e exigeum acompanhamento extremamente complexo e mobilizador de múltiplas competências, métodos e técnicas. Neste contexto, propõe-se o estabelecimento de uma parceria com um Centro de Reconhecimento e Validação de Competências (Centro de RVCC), partilhando esforços e competências na implementação correcta ecuidada deste processo.
10 Cf. referências bibliográficase Comunidade dePráticas Formação paraa Inclusão.
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De facto, e a menos que a entidade formadora se sinta totalmente à vontade na implementação desta metodologia, consideramos que a mobilização do trabalho em parceria com entidades competentes constitui-se comoa opçãomais adequadae maiseficaz.
É importante salvaguardar, todavia, a profunda implicação da entidade formadora/gestora neste processo, em especial através da figura do Técnico de Acompanhamento. De facto, este deve estar implicado no desenvolvimento do processo, dado o seu papel preponderante no desenvolvimento de todo o processo formativo seguinte, bem como no estabelecimento de relações de confiança com os participantes. Esta implicaçãoe articulação daentidade formadora como Centro deRVCC parceiro deve ser cuidadosamentedelineada epreparada. f) Como potenciar os dados recolhidos?
As informações recolhidas neste processo permitem um conjunto de dados individuais que evidenciam as potencialidades e necessidades de formação escolar, técnico-prática e sociocultural de cada formando. Ainformaçãorecolhida deve materializar-se em doistipos de produtos: -Dados pessoais,que permitem continuara alimentar aFicha Individual. -Portfolio Pessoal, compilando asevidências que comprovam os conhecimentos e competências identificados, e queservirão também parasuportar o processode certificação decompetências.
Toda a informação recolhida neste processo, deve ser depois mobilizada no desenho e estruturação da solução formativaem funçãodo Referencialde Competências-Chave.
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Dados Pessoais Os dados pessoais recolhidos permitem alimentar aFicha Individual iniciada anteriormente11, nomeadamente osseguintescampos:
Ficha individual(II) (adaptado de Jordão,1997; CESIS,2004) - Escolaridade - Último nívelfrequentado - LocaleAno - Qualificação - Cursofrequentado - Localeano - ExperiênciaProfissional - Funçõesdesempenhadas (referircada uma) - Actividadesdesenvolvidas (referircada uma) - Competências - Técnicas - Pessoaisesociais - Atributosfísicos (lista) - Tem umaboaaparência - Boaaudição - Visão normal(sem auxílio,comauxílio) - Bonsreflexos - Capaz delevantar objectospesados - Visão normaldecor - Boacoordenação mão/olho - Capazdese concentrar - Capazde trabalharem alturas Etc…
A recolha deinformação pessoal doformando, designadamente noque diz respeitoa condições devida, é um importante momento de levantamento de necessidades sociais básicas. É importante, desde este
11 Esta Ficha individual, como referido, vai sendo preenchida ao longo do envolvimento do formando com a equipa/intervenção formativa. Desta
forma, os campos vão sendo preenchidos à medida da fase do processo formativo, pelo que optámos por apresentar os campos de preenchimento divididos pelasfasesem que aparecem.
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momento, começar a trabalhar com cada participante a resolução das necessidades sociais que podem colidir ou mesmo comprometer a frequência e sucesso da experiência formativa. Há que fazê-lo envolvendo o próprio formando, mobilizando também os serviços de parceiros ou outros intervenientes locais. O Técnico de Acompanhamento não tem por missão resolver problemas individuais emergentes, mas sim apoiar o formando na procura dos meios para os resolver, como veremos adiantenesteGuia. A resolução de necessidades sociais básicas neste momento da intervenção formativa tem uma função preventiva e promotora de sucesso formativo, como referido. Mas não invalida a necessidade de um diagnóstico e resoluçãoconjunta de necessidadessociais básicas queterá que serfeito ao longode todo o processo formativo,como veremosadiante.
Portfolio Pessoal Enquanto processo quepromove a reflexãosobre si mesmo, num contexto de autoconfiança, obalanço de competências pretende resultar num arquivo que agrupe provas de capacidades, saberes, competências de que a pessoa é portadora já que as aquisições reconhecidas não se encontram na experiência profissional, masna prova manifestade que umacapacidade transferível existe (Imaginário, 1995, p.13). Os dadosrecolhidos atravésde processosde balançode competênciasdevempermitir: -Fornecerinformação suficientepara escolhasformativas e/ouprofissionais sustentadas erealistas; -Reunir informação suficiente para o início de um processo de validação de competênciase saberes adquiridos. A identificação de saberes e competências adquiridas por experiências prévias, profissionais ou outras, não é por si só um reconhecimento. O participante carece de um reconhecimento, por parte da sociedade, de que detém efectivamente as competências e saberes que afirma deter. Este reconhecimento não émais que umaconfirmação feita porterceiros da existênciados mesmos. O reconhecimento pode ser formal ou informal. Em determinados contextos e intervenções sob objectivos específicos, têm-se ensaiado experiências de reconhecimento social, não formal, de adquiridos. Nestes casos, as entidades apoiam os participantes na identificação dos adquiridos e mobilizam, para o reconhecimento, actores-chave da comunidade, designadamente da área de actividade ou sectoreconómico naqual o participantedetém experiência (vermaior desenvolvimento na dimensão Avaliaçãodaintervenção). Este tipo de reconhecimento social tem um importante papel, na confirmação imediata dos adquiridos, bem como na mobilização e responsabilização dos actores locais na inserção social e profissional de participantes. Tem também agrande vantagem deser um processo relativamente simplese rápido, com ganhos imediatos paraos/as Formandos/assobreconhecimento.
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Todavia, o reconhecimento informal de adquiridos tem adesvantagem de ter validade e valor limitados, nomeadamente fora da comunidade que o validou. Em momentos futuros da vida dos/as participantes que possuem este tipo de validação, ao candidatar-se a um posto de trabalho, o indivíduo está sempre dependente do interesse e validade que o empregador confira a este reconhecimento social. E para efeitos de prosseguimentode estudos oude reforço daqualificação profissional, estavalidação não oficial raramente temqualquerpeso. Deste modo, umreconhecimento oficial deadquiridos tem umaimportância fundamental nummercado de trabalho e de formação que se tem vindo progressivamente a estruturar, designadamente por imperativos deharmonização comos sistemasda restanteUnião Europeia. Neste contexto, as entidades formadoras, sobretudo as que operam junto deste segmento da população, têm aqui um importante papel no apoio aos cidadãos no aumento do seu nível formal de escolaridade e qualificação profissional. Isto exige mobilizar os meios e estratégias necessárias ao reconhecimento, validação ecertificação de adquiridos,escolares e profissionais,com a formação e com aexperiênciade vida.
g) Como mobilizar os sistemas oficiais de reconhecimento, validação ecertificação? O reconhecimento, validação e certificação deadquiridos é umaquestão complexa e, para ser oficial ao nível de um país, exige deste metodologias e sistemas complexos. Todavia, podemos dizer que o nosso país tem evoluídomuito a estenível na últimadécada, pelo quecabe às entidadesformadoras mobilizar os meios de quejá dispõemparaa realização desteprocesso. Existe actualmente em Portugal o Sistema de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) da responsabilidade da Direcção-Geral de Formação Vocacional do Ministério da Educação. Este sistema actua ao nível da certificação de competências escolares e profissionais, procurando oaumento dosníveis deescolaridade deadultos sema escolaridademínima obrigatória.
Reconhecimento, Validação eCertificação deCompetências (inwww.dgfv.min-edu.pt) O Sistema deReconhecimento, Validação e Certificaçãode Competências consiste na oportunidade decada adulto, maiorde 18 anos, poder solicitara identificação, o reconhecimento, a validação e a certificação dos conhecimentos (escolares, profissionais e outros) que adquiriu durantea vida eem diferentes situaçõesda vida (pessoal, socialeprofissional).
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O processo de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências deve ser solicitado e desenvolvido junto de um Centro de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências Centro RVCC.
No que diz respeito àcertificação profissional, aoferta existente abrange as profissões onde já é possível obter a certificação profissional, consubstanciada através de um Certificado de Aptidão Profissional (CAP) emitido pela respectiva entidade certificadora. Existe ainda uma oferta de Homologação que abrange os cursos de formação profissional que podem ser submetidos a reconhecimento, pelas entidades certificadoras, noâmbito do SistemaNacional de CertificaçãoProfissional12.
Certificação Profissional (adaptadodewww.iefp.pt) A Certificação Profissional tem por objectivo garantir que uma pessoa tem as competências necessárias para desempenhar uma determinada profissão; esta garantia concretiza-se atravésda emissão deum Certificado de Aptidão Profissional (CAP) por umaEntidade Certificadora competente,no âmbito doSistema Nacional de CertificaçãoProfissional.
No caso de Formandos/as que tenham desempenhado profissões abrangidas pelos CAP oficiais, vale a pena, neste momento, identificar também emcada formando quaisas competências identificadase com evidências de prova relativamente à referida profissão, e quais aquelas que devem ser desenvolvidas na intervenção formativa, deacordo comos requisitos definidospara cada profissãocertificada. A solução formativa a estruturar deve também responder às lacunas de conhecimentos e competências identificadas para cada formando, tendo como referência os requisitos mínimos definidos para a certificação profissional.
12 Para maisinformações, aceda awww.iefp.pt (Portal IEFP >Certificação Profissional >Profissões Certificadas).
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Colecção Metodologias
PREPARAR A PRÁTICA…
Na presente Dimensão Crítica, apontam-se propostaspráticas que devemser apropriadas eadequadas às realidades concretas de cada contexto social e formativo. Caso as considere pertinentes para a sua prática, propomos quereflicta sobre comoapropriar-se daspropostas apresentadas. > Síntese do ponto: check-list das principais tarefas
Preparar adivulgação da intervenção formativa Divulgar a intervenção formativa Identificar potenciais formandos/as Contactar potenciais formandos/as Realizar balanços de competências individuais Identificar necessidades de formação Reconhecer competências adquiridas Listar competências adquiridas
> De entre as principais tarefas da presente Dimensão Crítica: -
Que dificuldades encontro para “fazer” o que é proposto? O que considero prioritário fazer? Que mudanças implicam aimplementação prática das propostas (em quê, como e com quem)? Quais as vantagens e quais as desvantagens de implementar o que é proposto?
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Formação para a Inclusão - Guia Metodológico
INSTRUMENTOS DE APOIO
> Plano de abordagem apotenciais formandos/as Tipo de abordagem Contacto directo (conversas de rua)
Distribuição de panfletos no contacto directo Distribuição de panfletos nas caixasdo correio Distribuição de panfletos em locais-chave Local Local ... Afixação de cartazes em locais-chave Local Local ... Sinalização de potenciais formandos/as Quem sinaliza Quem sinaliza ... Outras
Outras
Outras
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Datas
Actores aenvolver
Colecção Metodologias
> Ficha individual (I)
[Estas imagens da Ficha Individual (I e II) são exemplo de formulários construídos através de uma aplicação informática para a construção de base de dados]
> Ficha individual (II)
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