FACULDADE KURIOS-FAK INSTITUTO SUPERIOR DE ENSINO-ISE VALIDAÇÃO DE CREDITOS EM TEOLOGIA
LUIZ ANTONIO MARTINS MARIA
TCC
A VALORIZAÇÃO DA VIDA HUMANA A RELEVÃNCIA SOCIAL, TEOCRÁTICA E JURÍDICA DADA AO FETO.
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FACULDADE KURIOS-FAK INSTITUTO SUPERIOR DE ENSINO-ISE VALIDAÇÃO DE CREDITOS EM TEOLOGIA
LUIZ ANTONIO MARTINS MARIA
TCC
A VALORIZAÇÃO DA VIDA HUMANA A RELEVÃNCIA SOCIAL, TEOCRÁTICA E JURÍDICA DADA AO FETO
MARANGUAPE – CE 2014
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FACULDADE KURIOS-FAK INSTITUTO SUPERIOR DE ENSINO-ISE VALIDAÇÃO DE CREDITOS EM TEOLOGIA
LUIZ ANTÔNIO MARTINS MARIA
TCC
A VALORIZAÇÃO DA VIDA HUMANA A RELEVÃNCIA SOCIAL, TEOCRÁTICA E JURÍDICA DADA AO FETO
Trabalho de conclusão de curso apresentado a banca da Faculdade KuriosFAK. como exigência parcial; para obtenção do título de bacharel em teologia.
MANGUAPE – CE 2014
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FACULDADE KURIOS-FAK INSTITUTO SUPERIOR DE ENSINO-ISE VALIDAÇÃO DE CREDITOS EM TEOLOGIA
AGRADECIMENTOS
Jamais poderei esquecer de agradecer: primeiramente a “Deus,” haja vista, ser ele o centro de todas as coisas, sem nada é possível, aos meus pais que sempre me apoiaram em minhas escolhas, a minha “mãe” em especial pelas orações que me sustentam e orientam minha vida. Também a todos aqueles que de forma direta ou indireta contribuíram para este feito, bem como , todos aqueles que não atrapalharam... aos quais desejo que o bom Deus lhes dêem em dobro tudo quanto me desejares. Lembrando que; “fica sempre um pouco de perfume nas mãos que oferecem rosas...”
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DEDICATÓRIA
Ao grande amor de minha vida Kátia Galdino Costa, minha musa e inspiradora, que com o brilho do olhar iluminou meus caminhos “te amo hoje mais que ontem e menos que amanhã.”
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DEDICATÓRIA-II
A minha filha Maria Luiza (o bichinho elétrico) você é a flor mais linda que Deus fez desabrochar no jardim da vida do papai. “Te amarei eternamente.”
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DEDICATĂ“RIA-III
Ao tempo que, sorrateiramente, leva os melhores dias de nossas vidas, para mais tarde, trazĂŞ-los de volta, em forma de saudades...
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FOLHA DE APROVAÇÃO DO TCC
Banca Examinadora: _______________________________________________
Prof. Orientador: Alexsandro Alves. _____________________________________ Prof. Dr. : Augusto Ferreira da Silva Neto.
___________________________________ Prof. Dr. : Luiz Eduardo Torres Bedoya.
___________________________________ Prof. Dr. : Marlon Leandro Schock.
____________________________________ Prof. Ms. : Ladghelson Amaro dos Santos.
______________________________________ Graduando: LUIZ ANTÔNIO MARTINS MARIA
Este TCC Foi aprovado em:
________de________________de________
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RESUMO
O presente trabalho visa pesquisar a importância da vida humana e o porquê da “desvalorização dessa preciosidade,” em uma sociedade moderna, onde valores como: respeito ao próximo, sentimento familiar e a preservação da vida, até mesmo a intra uterina, são deixados de lado. Apresentando questionamentos e argumentos a respeito de causas, e ofertando respostas prováveis, buscando embasamento nos posicionamentos social e teocrático, visando despertar o interesse pela questão da “relevância social, teocrática e jurídica dada ao feto.” Nesse sentido, será verificado se o mesmo possui ou não importância perante a Lei, perante a comunidade cristã, de acordo com os preceitos da Bíblia Sagrada e o ponto de vista das igrejas de diversos seguimentos e denominações de modo geral, bem como a visão jurídica, abordando o confronto entre o início da personalidade apontado pela lei e outros doutrinadores, como Teixeira de Freitas, Clóvis Beviláqua, Carvalho santos entre outros. O estudo terá por base as seguintes correntes doutrinária: a “natalista”, adotada pelo Código Civil – atribui a personalidade ao ser após o nascimento com vida e a “concepcionista”, que acredita ser o feto pessoa, mesmo antes de nascer. Através de conceitos extraídos de livros jurídicos clássicos e contemporâneos, que se funda a temáticada pesquisa, delineando as formas de defesa dos direito do feto, muitas vezes, deixado de lado em detrimento de questões e valores pessoais. Ao final, verifica-se as lacunas deixadas na legislação que trata o assunto, levando a interpretações diferentes, bipartindo a doutrina e mesmo a jurisprudência. A conclusão a que se chega não é pacífica a nenhuma das correntes mencionadas no trabalho, entretanto, tendenciosa á concepcionista, mais pelo lado da interpretação e aplicação dos conceitos básicos, essenciais e geraisdo direito, no que tange ao problema enfocado.
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ABSTRACT
This study aims to investigate the importance of human life and why the "devaluation this gem," in a modern society where values such as respect for others, family feeling and the preservation of life, even intrauterine, are left side. Introducing questions and arguments about causes, and offering likely responses, seeking foundation in the social and theocratic positions, seeking to awaken interest in the issue of "social relevance, theocratic and legal given to the fetus." In this regard, it will be checked whether it has or no importance before the law, before the Christian community, according to the precepts of the Holy Bible and the view of the churches of different segments and generally names as well as the legal view, addressing the confrontation between the beginning of personality appointed by law and other legal scholars, as Teixeira de Freitas, Clovis Bevilaqua, Oak saints among others. The study has the following doctrinal currents based on: the "natalist" adopted by the Civil Code - gives the personality to be alive after birth and the "Immaculate Conception", believed to be the fetus person even before birth. Through extracted concepts of classical and contemporary law books, which is founded the temรกticada research, outlining ways to defend the rights of the fetus, often overlooked at the expense of issues and personal values. Finally, there is the gaps left in legislation addressing the issue, leading to different interpretations, bipartindo the doctrine and even case law. The conclusion reached is not peaceful any of the chains mentioned in the work, however, will Conceptionist biased, more on the side of interpretation and application of basic concepts, essential and geraisdo right, with respect to the focused problem.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .....................................................................................................................12
CAPÍTULO I: DAS RELEVÂNCIAS..................................................................................14 1.1-
1.2-
1.3 -
Relevância Social.............................................................................................14 1.1.1- Do valor da vida em formação..............................................................16 1.1.2- Conceito de pessoa natural....................................................................18 1.1.3- Etimologia da palavra pessoa................................................................19 Da relevância teocrática..................................................................................20 1.2.1- O que a Bíblia diz.................................................................................20 1.2.2- Argumentação contrária a Bíblia...........................................................21 1.2.3- O posicionamento ecumênico...............................................................23 Da relevância Jurídica.....................................................................................25 1.3.1- Histórico.................................................................................................26 1.3.2- O Feto no Direito Romano.....................................................................27 1.3.3- Acepção filosófica do termo..................................................................27 1.3.4- Capacidade Jurídica...............................................................................27
CAPÍTULO II: DA PERSONALIDADE ...........................................................................29 2.1-
Conceito...........................................................................................................29 2.1.1- Inicio da personalidade...........................................................................29 2.1.2- A personalidade no projeto de Lei..........................................................30 2.1.3 A Personalidade no Código Civil....................................... ..................31
2.2- Teorias sob a Personalidade ..............................................................................32 2.2.1- Corrente concepcionalista...................................................................................33 2.2.2- Corrente natalista...............................................................................................35 2.2.3 - Direitos do nascituro (feto)................................................................................36 2.2.4- Capacidade processual do nascituro (feto) ....................................................... 37
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CAPÍTULO III: O FETO E A BIOGENÉTICA................................................................39 3.1- As considerações sobre a biogenética...............,.................................................39 3.1.1- O embrião como pessoa................................................................................39 3.1.2- O embrião no projeto de Lei........................................................................51 CAPÍTULO IV: CONFRONTAÇÕES ACERCA DO TEMA...........................................52 4.1- Teorias explicativas..............................................................................................52 4.1.1- Contradições...................................................................................................54
CONCLUSÃO.........................................................................................................................57
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................59
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INTRODUÇÃO
As vezes ficamos a observar como nossa sociedade tem se desenvolvido, como nossa população tem aumentado, a cada dia que passa a quantidade de pessoas que nascem se torna cada vez maior de que o número dos que morrem, as cidades cada vez mais povoadas. Houve uma época, próximo a “copa do mundo,” que cantava- mos um refrão que dizia; “[...] setenta milhões em ação, salve a seleção”. Atualmente não se ouve mais essa música, haja vista, já ultrapassamos esse número, creio que já triplicamos esse valor ou para melhor dizer, estamos em número muito maior. É notório que a população vem crescendo de forma extraordinária e junto com esse crescimento também herdamos os problemas, conseqüências deste crescimento desordenado ou herança de nosso descuido ou do descaso com o controle da natalidade. Hoje somos vítimas do nosso próprio descuido. Isso porque estamos no século vinte um e vivendo numa sociedade altamente consumista. Onde consumimos aquilo que gostamos e o que não gostamos, aquilo que podemos eaté aquilo que não podemos ou não devíamos. Assim, observando, chegamos a conclusão de que nosso povo (brasileiro) tem crescido muito de modo quantitativo e pouco de forma qualitativa. Situação que costuma agravar um pouco na parte social. Sabemos que nossa sociedade é altamente bem informada. Porem, diante de tantas boas informações ainda temos muitas coisa erradas, ainda cometemos muitos erros, somos consumistas de informações, vivemos em plena era do avanço tecnológico, a „internet” dita as regras, a moda, o que é bom ou ruim, o que se come ou não, enfim como se deve ou não fazer qualquer coisa (isso é demais!!!). Diante disso, estamos nos deparando com um enorme problema social, que é a ausência de identidade, tem pessoas que esquecem que são humanas, que nasceram de uma madre e que possuem semelhanças com outros da mesma espécie. Passamos a vislumbrar um pouco de ausência de “amor” nos corações, amor ao próximo e as vezes até amor próprio. Com isso, vem a falta de humanidade, a perda de valores sociais, assim como o simples respeito aos mais idosos, aos mortos, bem como o respeito ao ser em formação, a vida intra uterina.
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Assim, imaginemos o ser humano só. Sem amigos, sem casa e sem lei. Simplesmente, ele não seria considerado, mesmo que existindo de fato. É imprescindível para acompanhar a existência humana uma série de fatores que o distinga dos outros seres comuns. Ele necessita viver em sociedade, fazer amigos, criar normas para integrá-lo ao seu meio, norteando os limites de suas ações. O ser humano é fruto de uma ética de que necessita de todo um aparato para sustentá-lo desde o início de sua existência até o final de seus dias. O direito não surge isolado, ele nasce das relações humanas (sociais) e a estas vai demonstrar o seu caráter servil. Detectar o início do direito e voltar aos primórdios, pois é a partir da existência humana que deparamos com as regras mais antigas servindo como fontes do próprio direito. Contudo, surgem as primeiras perguntas: quando é que o feto passa a ser gente e quando se deve respeitá-lo como ser humano? Quando passa a ter direitos, entre outros, o de viver? Desde a concepção ou após o seu nascimento? Face a estas dúvidas nos transportamos a um mundo onde deparamos com conceitos definidores de pessoa humana, bem como a sua importância social, teocrática e jurídica, através das mais remotas doutrinas e legislações, de diversas obras . O que realmente interessará no ato deste trabalho é detectar o feto (ser humano em formação) como pessoa, sua importância e se as personalidades (teocrática, social e jurídica) podem ser aplicadas a ele. Neste ponto que centra-se o foco de interesse do trabalho, uma vez que o ordenamento jurídico impõe condições para efetivação dos direitos relativos ao ser humano. Cumpre, então, ao pesquisador analisar os posicionamentos cristão e legal, ou seja, da lei para atingir aos objetivos propostos, que são: detectar o início da personalidade do ser humano; analisar o pensamento da comunidade evangélica; confrontar o posicionamento da lei com os outros doutrinadores; delinear osdireitos do nascituro (feto) desde a concepção definindo-os e estudar o posicionamento atual da legislação em relação aos direitos do feto em face das transformações sociais.
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Antes, porém, para se chegar ao âmago do problema enfocado, é necessário averiguar o sentido de palavras como: “pessoa,” “personalidade,”, “capacidade,” entre outros, o sentido filosófico de pessoa aplicado ao feto, além de demonstrar ascorrentes doutrinárias que abordam o problema e demais posicionamentos para melhor compreensão do tema. Para realização deste trabalho serão realizadas pesquisas em obras teocráticas, doutrinárias, jurisprudências e leis, cujas referencias seguem ao final. CAPÍTULO I – DAS RELEVÃNCIAS
1.1 - Da relevância social
Se o ser em formação (feto) não tivesse importância certamente não haveria proteção para o mesmo. É notório que a sociedade de modo geral estabelece diversas formas de proteção para ser em formação.Isso, através de política diversas, como: ÉCA Estatuto da Criança e do adolescente, que estabelece tratamentos e cuidados especiais para a gestante, não que seja estes cuidados direcionados a mãe, mas sim ao feto. Isso demonstra que existe uma preocupação com o ser em formação. Isso é relevância social que por sua vez entrelaça com a relevância jurídica. Como se vê: Art. 8º. É assegurado a gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal. § 1º. A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de atendimento, segundo critérios médicos específicos, obedecendo-se aos princípios de regionalização e hierarquização do Sistema. § 2º. A parturiente será atendida preferencialmente pelo mesmo médico que a acompanhou na fase pré-natal. § 3º. Incumbe ao poder público propiciar apoio alimentar á gestante e a nutriz que dele necessitem. (Eca, 1990 -Artigo 8º e §§§).
Valendo ressaltar que a Lei prevê penas para quem praticar quaisquer atos ou ações que possam colocar em risco a pessoa em formação ou a vida intra-uterina, observamos o que diz a lei. Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena – detenção de 1 (um) a 3 (três) anos. (Código Penal, 2009, p. 552).
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até mesmo aquelas de cunho político, usadas como meios de controle social. Assim como o controle da natalidade. O referido método é na verdade um assunto política e eticamente controverso em muitasculturas e religiões, e embora seja menos controverso que o aborto especificamente, ainda enfrenta a oposição de muitas pessoas. Existem vários graus de oposição, incluindo aqueles que são contra todas as formas de controle de nascimento que não usamabstinência sexua aqueles que são contra todas as formas de controle de nascimento que eles consideram "não-naturais", enquanto permitem o controle denatalidade natural; e aqueles que apoiam a maioria das formas de controle de natalidade que previnem a fertilização, mas são contrários a qualquer método de controle de natalidade que previna que um embrião fertilizado se fixe no útero e inicie a gravidez. (WIKIPÉDIA, 2011).
A contracepção é atacada por alguns grupos como modo de controle da superpopulação. A população humana já ultrapassou os sete bilhões de pessoas e por conseguinte estes grupos acreditam que há a necessidade de planejamento social para destruir a explosãodemográfica, desta forma diminuindo a devastação e esgotamento dos recursos naturais do meio ambiente. Com mais habitantes no mundo todo causariam níveis mais elevados de emissão de CO2, que alterariam a composição da atmosfera, desta forma aumentando o aquecimento global. Um destes grupos afirma que é muito mais fácil, rápido e barato distribuir preservativos para as pessoas do que tentar controlar a emissão de CO2 através das estratégias atuais, cujo custo é muito mais elevado.
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1.1.1 - Do valor da vida em formação A importância do ser em formação pode exceder até mesmo uma decisão maternal, que apesar de fundamentada sob os mas robustos argumentos, pode ser contextada e até invalidada por motivo de contrariedade ao direito do ser em formação. Isso reforça a tese de que a vida intra úterina tem valor fundamental e deve ser respeitada. Situação em que até as decisôes judiciais para serem válidas precisam ser muito bem respaldadas e não deixar lacunas, caso contrário pode se tornar passiva de revisão e de anulação por meio dos instrumentos legais. Observamos e tomamos como base o fato ocorrido em uma maternidade do Rio grande do Sul, onde uma decisão judicial obrigou uma mãe a passar por uma intervenção cirurgica que em tese, sem ela a situação poria em risco direitos do ser em formação ( nascituro ou feto). O caso foi objeto de uma ação judicial, promovida pelo Ministério público, atendendo pedido de uma médica obstétra do hospital Nossa Senhora dos Navegantes, no Município de Torres no Ro grande do Sul. Situação em que a Juíza Liníza Liniane Maria Mog da Silva, determinou que a parturiente Adelir Lemos de Goes, de 29 anos de idade que estava em seu terceiro filho, cujos dois primeiros haviam nascidos por meio de
“cesarianas”, retornasse ao hospital e se
submetesse a uma intervenção cirurgica para ter o seu terceiro filho sem risco a vida do feto ou ser em formação. Mesmo contrariando o direito subjetivo da própria genitora, que naturalmente exerce o direito de optar como, de que modo terá o seu parto. Isso se deu, haja vista, a constatação da médica do referido hospital que por meio de um exame, a grávida em questão não poderia ter seu terceiro filho por meio de um parto natural, como desejava. Sob alegações de que a forma de „cesariana” seria a mais viável para a preservação e segurança do ser ainda em formação. A autoridade sanitária (a médica) informou, após verificar e encontrar dentro de sua área de conhecimento situações que poderiam causar riscos para o feto e fêz cumprir o seu papel social previsto no estatuto da criança e do adolescente (ÉCA), em que preve que todos tem o dever zelar pelo bem- estar do menor, mesmo que ainda por nascer.
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Assim, comunicou o fato ao representante da sociedade que é o promotor de justiça, que por sua vez promoveu a competente ação que cominou pela decisão da juíza que obrigou a parturiente a retornar ao centro de saúde, embora de forma coercitiva para ser submetida ao procedimento médico cirurgico adequado a situação em tela, sob o prisma de garantir o direito de vida do feto mesmo contrariando a vontade da própria mãe que desejava ter seu terceiro filho de parto normal. Este
episódio
encontra-se
registrado
na
revista
“TRIBUNA do advogado”, número 532 de maio de 2014. É de se observar, que a justiçã fêz cumprir a garantia do direito do feto, mesmo contra contra o direito da mãe no sentido de decidir sobre a forma de ter o seu próprio filho. Valendo ressaltar que a decisão supra está sendo objeto de variados comentários de diversos profissionais do campo da ciência do direito, onde para uns houve violação do direito fundamental da parturiente, que por sua vez não pode fazer uso de seu direito de liberdade de escolha. Para outro, o Estado tem o dever de intervir visando impedir que a pessoa mesmo sendo titular de um direito, exponha em risco a vida em formação. Isso reforça a tese em que se afirma que a vida intra uterina tem importância, chegando até afirmar o seguinte: “ [...] a vida do nascituro tem valor” (Tribuna, 2014, p 19). Diante disso, há quem afirme que a decisão judicial foi bem embasada. Face a situação que demonstrava a verossímilhança de dano irreparável a vida do ser em formação. Desa forma, é notório que existe vários meio, bem como instrumentos que buscam fazer valer e ofertar garantias ao direito de vida “intra uterina”, e que a mesma deve ser preserva e protegida, bem como respeitada por todos. Haja vista, tratar-se de um direito supremo acima de todos e “erga omes” (contra todos).
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1.1.2 -Conceito de Pessoa Natural
Após vir à luz, todo ser humano é pessoa n sentido jurídico da palavra, com a denominação de pessoa natural. Encontramos como atributo de pessoa natural, um conjunto de faculdades e de direitos em estado de potencialidade, que forma o que se chama de direito ou personalidade. A pessoa como sujeito de direitos é o primeiro elemento com que devemos travar conhecimento, porque é a elas que são reconhecidas s faculdades ou poderes de ação nas atividades jurídicas resultantes do convívio pessoal. O termo encontra suas raízes na época romana, quando não possuíam termo específico para exprimi-las. A palavra latina “persona” – com a significação de homem em geral –é utilizada , hoje no campo jurídico, designado aquele a quem a lei confere direitos. Entretanto, pelo direito romano, para que o recém-nascido fosse considerado pessoa, eram necessárias que se reunissem as seguintes condições: a) completa separação das vísceras maternas; b) vida depois da separação; c) forma humana. Alguns autores faziam, ainda, referência à viabilidade como mais outra condição para se tornar pessoa. O nosso código afastou essas questões de viabilidade e da forma humana, afinal, mesmo que o produto da concepção (o ser humano) seja considerado incapaz de viver, pode resistir a alguns dias, e por isso mesmo merece a proteção do direito. Assim, da mesma forma que o direito penal o protege enquanto feto, por que não iria protegê-lo o direito civil, já como ser humano? (SANTOS, 1986, p.248-249). Dessa forma, para que o homem possa ser considerado, atualmente, pessoa natural, detentor dos direitos instituídos pelo ordenamento jurídico, basta a condição do nascimento com vida.
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1.1.3 -Etimologia Palavra Pessoa A palavra pessoa deriva do prefixo “per” e do verbo “sonare” o que significa “ dizer fortemente”. Na Roma antiga, os atores de teatro usavam uma técnica para que suas vozes pudessem ressoar com veemência: utilizavam uma máscara como o meio de acentuar suas falas, e esta máscara passou a ser denominada “persona”, fazendo uma alusão a quem a usasse. Neste sentido, o termo passou a se referir ao indivíduo, a ser utilizado no mundo jurídico para designá-lo. Com o advento do Cristianismo, o vocábulo pessoa se estendeu ao próprio homem, e começou a ser concebido como a dimensão atributiva do ser humano, ou seja, a qualificação do indivíduo como ser social, conquanto se correlaciona no seio da convivência através dos laços jurídicos. De acordo com o ensinamento de inúmeros doutrinadores, podemos encontrar três acepções diferentes da palavra pessoa, conforme nos ensina Monteiro (1989, p.78); - Pessoa como sinônimo de ente humano, significado que não se adapta à técnica jurídica, pois, nesse ordenamento vários são os titulares de direito reconhecidos como pessoa; - Pessoa é o ente que realiza seu fim moral e emprega sua atividade de modo consciente na acepção filosófica; - Na acepção jurídica, pessoa é o ente físico ou moral, suscetível de direitos e obrigações.
É nesta ultima acepção do termo pessoa que se ampara o estudo ora realizado. Dessa forma, aos olhos da lei, pessoa é todo ser físico ou jurídico a quem a norma confere personalidade, em razão dos direitos que adquire.
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1.2- Da relevância teocrática
A secretaria de Políticas para mulheres por meio de sua presidenta, Eleonora Menicucci, propôs um requerimento junto á ONU para legalização do aborto no Brasil e ganhou apoio de muitas pessoas da sociedade civil. Estas obviamente são as pessoas que defendem tal assassinato que hoje pode ser comparado ao infanticídio previsto no Código penal. Porém é perceptível que estes indivíduos não fazem da bíblia o seu manual de orientação e ainda que muitos se intitulam cristãos. Mas sendo ou não cristãos podem considerar que o aborto praticado, do ponto de vista bíblico ( palavra de vida e verdade) é homicídio! Valendo ressaltar, que a relação entre aborto e a religião cristã não é bem definida, não havendo nenhuma menção à prática na Bíblia. No entanto, é possível observar,que enquanto alguns autores dizem que o cristianismo primitivo teve posicionamentos diferentes ao longo do tempo sobre o aborto, outros afirmam que, apesar do silêncio sobre o assunto no Novo Testamento, os cristãos sempre condenaram o aborto em qualquer momento da gravidez como um pecado grave. Assim, por causa dessas divergências, há tanto cristãos que se consideram próvidacomo pró-escolha. 1.2.1-
O que a Bíblia diz
É de se observa, que a Bíblia nunca tratou especificamente sobre a questão do aborto. No entanto, há inúmeros ensinamentos nas Escrituras que deixam muitíssimo clara qual é a visão de Deus, que norteia o pensamento de alguns verdadeiros cristãos sobre esse fenômeno social o aborto. Consultemos o que diz Jeremias 1:5: “Antes que te formasse no ventre te conheci, e antes que saísses da madre, te santifiquei; às nações te dei por profeta” (Bíblia Sagrada, 2009).
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Observe que neste trecho o Senhor diz para Jeremias que antes que se formasse no ventre ele jáo conhecia. Portanto Deus é quem dá a vida e conserva o feto na madre até o nascimento. E mais, Deus nos conhece antes de nos formar no útero materno. Citando mais uma referência bíblica para o perfeito embasamento. O Salmo 139:16 diz: “Os teus olhos viram o meu corpo ainda informe; e no teu livro todas estas coisas foram escritas; as quais em continuação foram formadas, quando nem ainda uma delas havia” ( Bíblia sagrada, 2009). Assim, podemos considerar, que o que está acontecendo atualmente, é que Deus através de sua imensa sabedoria, que ultrapassa os limites da ciência sopra o fôlego de vida no embrião. É depois, escrevendo cada linha de sua vida, traça um plano de vida para aquele “ser” ainda em formação e depois uma pessoa pega a borracha e vem apagando cada linha que fora escrita por Deus. E o pior é que o faz sem a autorização do todo poderoso. Então, vejamos, se o feto tem vida, tirá-la não é um crime? Se Deus coloca o espírito na pessoa já no ventre é para dar continuidade daquela vida (grifo nosso). Observamos, que recentemente um Bispo de uma igreja muito conhecida defendeu o aborto citando o seguinte preceito que está escrito no livro de Eclesiastes 6:3: vejamos:
“Se o homem gerar cem filhos, e viver muitos anos, e os dias dos seus anos forem muitos, e se a sua alma não se fartar do bem, e além disso não tiver sepultura, digo que um aborto é melhor do que ele” (bíblia Sagrada, 2009). Ao argumentar a legalização do aborto com esta passagem, é notório, que faltou hermenêutica para este “Bispo da prosperidade”, pois o trecho quer dizer que não adianta nascer sem viver uma vida fartada do bem, mas não significa que se deve exterminar uma criança no ventre da mãe. No entanto sabe-se que as palavras descritas no livro de Pedro dizem: “Sabendo primeiro isto, que nos últimos dias virão escarnecedores, andando segundo as suas próprias concupiscências.” (2 Pedro 3:3.Bíblia Sagrada, 2009). Estes seguem a sua própria intuição negligenciando a Bíblia que é fonte inesgotável de esclarecimento e inspiração para quem quer viver com Cristo. Atentemos, também para o que diz em Êxodo 21:22-25 “Se alguns homens pelejarem e ferirem uma mulher grávida, e esta abortar, porém, se não houver morte, serão multados segundo o que lhe impuser o marido da mulher e pagará
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como os juízes lhe determinarem. Mas, se houver morte, então pagarás vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe.” (Bíblia Sagrada, 2009).
Observemos, que Deus dá a mesma pena do homicídio a alguém que causa a morte de um bebê no útero. Isto indica claramente que Deus considera um bebê no útero como um ser humano, tanto quanto um adulto que as vezes comete vários pecados. Para o cristão, o aborto não é uma questão sobre a qual a mulher tem o direito de escolher. Pois se trata de uma vida humana que está em jogo. É isso ai!! Trata-se de uma questão de vida ou morte de um ser humano feito à imagem, bem como a semelhança de Deus conforme prevêlivro de Gênesis1:26-27 e também 9:6 (grifo nosso).
1.2.2 – Argumentação contrária a Bíblia
O primeiro argumento que sempre surge contra a opinião cristã sobre o aborto é: “E no caso de estupro e/ou incesto?”. Por mais horrível que fosse ficar grávida como resultado de um estupro e/ou incesto, isto torna o assassinato de um bebê a resposta? Dois erros não fazem um acerto. A criança resultante de estupro/incesto pode ser dada para adoção por uma família amável e incapaz de ter filhos por conta própria –ou a criança pode ser criada pela mãe. Mais uma vez, o bebê não tem nenhuma culpa e por isso, não deve ser punido pelos
a
atos malignos do seu pai (grifo nosso). O segundo argumento que surge contra a opinião cristã sobre o aborto é: “E quando a vida da mãe está em risco?”. Honestamente, esta é a pergunta mais difícil de ser respondida quanto ao aborto. Primeiro, vamos lembrar que esta situação é a razão por trás de menos de um décimo dos abortos realizados hoje em dia.
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Muito mais mulheres realizam um aborto porque elas não querem “arruinar o seu corpo” do que aquelas que realizam um aborto para salvar as suas próprias vidas. Segundo, devemos lembrar que Deus é um Deus de milagres. Ele pode preservar as vidas de uma mãe e da sua criança, apesar de todos os indícios médicos contra isso. Porém, no fim das contas, esta questão só pode ser resolvida entre o marido, a mulher e Deus. Qualquer casal encarando esta situação extremamente difícil deve orar ao Senhor pedindo
sabedoria
(Tiago
1:5) para
saber
o que
ele
quer
que eles
façam.
Sabia que, se procurarmos encontraremos dados alarmantes? Como por exemplo: 94% dos abortos realizados hoje em dia são por razões diferentes da vida da mãe estar em risco? A vasta maioria das situações pode ser qualificada como “Uma mulher e/ou seu parceiro decidindo que não querem o bebê que eles conceberam”. Isto é um terrível mal. Mesmo nos outros 6%, onde há situações mais difíceis, o aborto jamais deve ser a primeira opção. A vida de um ser humano no útero é digna de todo o esforço necessário para permitir um processo de concepção completo. Para aquelas que fizeram um aborto – o pecado do aborto não é menos perdoável do que qualquer outro pecado. Através da fé em Cristo, todos e quaisquer pecados podem ser perdoados. Vejamos o que Diz em João 3:16; “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” ( bíblia Sagrada, 2009). Olhem Romanos 8:1; “Portanto, agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus, aqueles que não andam conforme a carne, mas segundo o espírito” (bíblia Sagrada, 2009). Também em Colossenses 1:14; “ [...] em quem temos redenção por meio de seu sangue, o perdão dos pecados” ( Bíblia Sagrada, 2009).
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Diante de tais preceitos, qualquer uma mulher que fez um aborto, ou um homem que a encorajou a fazer um aborto, ou mesmo um médico que realizou um aborto – todos podem ser perdoados pela fé em Cristo _ basta que se arrependa de todo coração.
1.2.3 –Posicionamento ecumênico
A Igreja Católica adota uma posição firme contra o aborto, ensinando que a vida começa por ocasião da concepção. Alguns sacerdotes estão envolvidos na política e pedem ao papa a excomunhão de políticos católicos que votam a favor do aborto. Entretanto, muitos católicos são a favor do aborto e exigem liberalização. A Igreja Presbiteriana (EUA) relata que 46 por cento dos pastores “não crêem que a Bíblia ensina que o aborto é errado”. Apesar
do
posicionamento
oficial
da
igreja
ser
pró-aborto.
O 16.° Sínodo Geral da Igreja Unida de Cristo decidiu que “sustenta o direito de homens e mulheres terem serviços adequados de planejamento familiar e o direito de aborto legal seguro como opção”. A política da Igreja Evangélica Luterana determina que o aborto “deve ser uma opção apenas de último recurso”; no entanto, negou-se a chamar o aborto de “pecado” ou a dizer que “a vida começa por ocasião da concepção”. A Convenção Batista do Sul é fortemente contra o aborto. Mas a Igreja Batista Americana diz: “Estamos divididos no que diz respeito à definição adequada da política da igreja diante das circunstâncias em torno do aborto”.
Conseqüentemente, reconhecemos a
liberdade de cada indivíduo de defender uma política pública que reflita suas
crenças
na
questão
do
aborto.”
O judaísmo está dividido, a ala ortodoxa adotando uma posição de modo geral contrária ao aborto, ao passo que judeus das alas reformista
e
conservadora
de
modo
geral
favorecem
o
aborto.
O islamismo permite o aborto por qualquer motivo nos primeiros
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40 dias de vida, mas, depois disso, apenas diante duma ameaça à vida da mãe. (ADULÃO,Brasil, 2011).
O Hadith diz que o feto existe “40 dias na forma de semente, depois é um coágulo de sangue por período semelhante, depois um pedacinho de carne por período semelhante, depois . . . é-lhe enviado o anjo que sopra para dentro dele o fôlego da vida”. O xintoísmo não tem posição oficial e deixa o aborto para escolha pessoal. Hindus, budistas e siques ensinam o respeito geral pela vida. Mas não se envolvem na controvérsia em torno da questão do aborto, visto que crêem na reencarnação; o aborto apenas envia o bebê para outra vida.
1.3 - Darelevância jurídica 1.3.1- Histórico Em 1855, após a outorga da Constituição Imperial – que em primeiro plano tentou reunir e organizar os códigos civil e criminal –, o então governo brasileiro encarregou Augusto Teixeira de Freitas de realizaruma consolidação das leis civis, redundando, entretanto, num projeto do Código Civil de 1859. Teixeira de Freitas, em seu projeto, procurou unificar o direito civil com o comercial, motivo pelo qual o governo abandonou essa idéia, restando para o renomado jurista, a publicação a seguir, de um esboço do Código Civil, a partir do seu projeto. Mais tarde a missão foi entregue a Clóvis Beviláqua, autor primitivo anual do Código civil, publicado em 1899 apenas como projeto. Tanto Clóvis quanto Teixeira demonstravam, e suas respectivas obras, a tendência em admitir personalidade ao nascituro, sob a cláusula do nascimento com vida. O Projeto do Código Civil de Clóvis Beviláqua, cotinha, em seu artigo 3º, essa premissa, assim como na obra de Teixeira de Freitas. Porém, na elaboração do Código publicado em 1919, predominou a corrente que traduz o artigo 4º do atual Código. Mesmo assim Clóvis, em 1928, publicou o livro “Theoria Geral do Direito Civil”, conservando as idéias essenciais, porque, segundo ele, constituem a base de todo ordenamento jurídico da sociedade onde repousa a civilização ocidental.
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É sobre esse respaldo jurídico que encontraremos o embasamento do tema desta monografia, demonstrando que o feto pode ser reconhecido como pessoa. Teixeira de Freitas deixa claro em sua obra o posicionamento quanto à personalidade jurídica do nascituro. No esboço do Código Civil publicado em 1864, seção I – Das pessoas -, cap. I, art. 53, encontraremos o seguinte:“são pessoas por nascer as que, não sendo ainda nascidas, acham-se, porém, já concebidas no ventre materno” (FREITAS,1983, p. 72). O feto, no entendimento de A. Teixeira, é consideradopessoa, reconhecendo nele um sujeito de direitos. O mesmo pensamento é encontrado na obra de Beviláqua (1929,p.85), que também considera o feto como pessoa, atribuindo-lhe personalidade caso o nascimento ocorra com vida. Para melhor compreensão dessa assertiva é necessário, primeiramente, averiguar o sentido jurídico dos termos “pessoa”, “personalidade”, “capacidade” de fato e de direito. Isto, em linhas gerais, para detectar e esclarecer quando inicia a personalidade jurídica do feto, não somente pelo que estatui o art. 4º do atual Código Civil Brasileiro – que já define –, mas por uma ordem nova rebuscando na teoria de diversos juristas e doutrinadores do passado a idéia de que o feto possa ser dotado de personalidade, ainda que específica. Os diversos pontos controvertidos dividiram o pensamento dessa linha jurídica em duas correntes doutrinárias, as quais foram denominadas NatalistaeConcepcionista, e que se propõema esclarecer se o feto possui ou não personalidadejurídica. É notório que todo estudo realizado nos leva a tomar uma posição, e aquilo que poderia ser imparcial quanto ao enfoque do assunto, torna-se uma verdade concebível para o estudioso, porém jamais uma verdade universal e infalível. O que se pretende a abordar este tema é tentar conciliar uma solução mais objetiva frente aos avanços sociais e a novas realidades, fazendo-nosrefletir sobre assuntos como, por exemplo, legalização do aborto, fertilização in vitro, clonagens etc. Destarte, o que a norma traduz quanto a personalidade jurídica do feto pode parecer estável, imutável e acabando por não despertar o interesse para novas discussões. Antes, porém, devemos nos lembrar que o direito não é estático; modifica-se a toda hora conforme também, devemos se modifica o mundo, e o que parecia uma verdade intransferível pode se abalar frente a essas transformações. O que se pretende não é somente criar uma versão acerca do tema, mas principalmente, tentarconciliar a acepção do que se entende como justiça para, enfim, efetivá-la.
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1.3.2 - O feto no Direito Romano
O feto, segundo os juristas romanos, é apenas parte das vísceras maternas (“partusenimantequamedatur, mulierisportio est ueluiscerum”), ou seja, o ser antes de vir à luz, a porção da mulher ou de suas vísceras, não podendo contudo, ser considerado homem. Juridicamente considerando o „nascituro‟, feto é o embrião humano, a criatura animada, enquanto permanece no ventre materno, completando a evolução que possibilitará sua vinda à luz. Em outras palavras, nascituro é o ser que irá nascer, ou seja, o feto durante a gestação. Não é ele ser humano – não preenche ainda o primeiro dos requisitos necessários à existência do homem: o nascimento -, mas desde a concepção já se encontra protegido. No terreno patrimonial, a ordem jurídica, embora não reconheça o nascituro um sujeito de direitos, leva em consideração o fato de que, futuramente será, e, por isso, protege, antecipadamente, direitos que ele virá a te quando for pessoa física. Em vista disto, o nascituro pode, por exemplo, ser instituído herdeiro num testamento. E, para resguardar o interesse do nascituro, a mulher que o está gerando pode requerer em juízo a nomeação de um curador: “o curatoruentris”. Com base nesses princípios, anunciados pelos jurisconsultos clássicos, surgiu, no direito romano a regra geral de que o nascituro, quando se trata de vantagem seu favor, considera-se como se estivesse vivo (“in rerum natura esse”). 1.3.3- Acepção Filosófica do Termo “Pessoa” Aplicada ao Feto
Embora o que nos interessa para determinar se o feto possui ou não personalidade é acepção jurídica do termo pessoa, não podemos desconsiderar sua acepção filosófica. Sempre que necessário aprofundamento em qualquer estudo jurídico, imprescindível será a utilização de métodos filosóficos, pois é a partir destes que poderemos questionar ou especular a significação de determinados vocábulos, na expectativa de esclarecer sua natureza jurídica, sendo que um dos métodos encontrados é, sem dúvida, a analogia. Ao verificarmos o sentido filosófico da palavra pessoa aplicada ao feto, vamos nos deparar com a figura do ser humano. Todo ente encerra, na sua totalidade (essência) uma finalidade que se expressa através de sua inteligência e, para ser concebido como ente natural,
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alcançando o fim a que se destina, o homem necessita de um meio para alcançá-lo. A pessoa humana é criada para viver em sociedade e, existindo nessa esfera, deve-se, primeiro, concedê-la a caminho para seu surgimento: dando-lhe o direito à integridade corpórea, à liberdade, à vida. O feto é um ser querendo vir à tona para atingir sua finalidade e desempenhar seu papel de humano no sistema social. Embora não nascido, tendo apenas uma expectativa de vida, deve ser-lhe concedido o meio para que atinja seu fim – o direito à vida. Analogicamente, só se conferem direitos a quem possui o status de pessoa; o feto, adquirindo-o, como princípio essencial para a sua existência, é também assim considerado. Diz-se que a personalidade é a aptidão para ser sujeito de direitos e, sendo o feto o primeiro a adquirir essa qualidade, porque não dizer que também possui personalidade? Daí dizer Machado (1954, p.13) que “o conceito de pessoa, no mundo jurídico, é um conceito analógico” já que este também se aplica à personalidade. Sob a ótica do método comparativo, podemos dizer, então, que o possuidor de diretos é o ser humano (seja feto ou já nascido), ou seja, a pessoa cuja lei confere, paraefetivação de todos os direitos, a personalidade jurídica.
1.3.4 - Capacidade Jurídica
Sendo pessoa e o ente sujeito de direitos e obrigações, tendo personalidade jurídica como meio para exercê-los, surge, nesse ínterim, a capacidade jurídica que abrange a todos os homens. O artigo 2º do Código Civil prescreve: “todo homem é capaz de direitos e obrigações na ordem civil” (Código Civil, 1995,p.7).Através do texto legal, verifica-se que a capacidade de direito é a mesma para todos, segundo o princípio de igualdade emanado da Constituição Federal. Aliás, esse princípio constitucional da igualdade entre as pessoas data de 1891, quando foi postulado na primeira Constituição Republicana sob a égide do artigo 72, parágrafo 2º. Destarte, mesmo sendo proibida a desigualdade no tratamento jurídico entre as pessoas, no exercício da capacidade de agir, as pessoas naturais sofrem a influencia de, seu estado. Deste modo, ante àidéia de que toda “pessoa” tenha personalidade civil e seja titular de direitos em condições iguais, nem sempre possui capacidade de exercê-los em perfeita igualdade. Devo distinguir, então, a capacidade de direito e a capacidade de fato. Capacidade de direito é a capacidade inerente a todos, por força, inclusive, do artigo 2º do Código Civil.
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Capacidade de fato é aquela que tem o homem de agir por si mesmo, desacompanhado, em todos os atos da vida civil, partindo do pressuposto que, para tanto, deve, primeiro, ter personalidade jurídica.
CAPÍTULO IIDA PERSONALIDADE
2.1
Conceito
Para completar a idéia de que o feto possa obtera personalidade é necessário conceituá-la. Definir o início da personalidade do homem constitui matéria singular, porque é deste início, como já dissemos, que emana todo ordenamento jurídico ao regular direitos e obrigações do homem na vida social. Porém, devemos distinguir que a personalidade que se estuda no direito não se confunde com a personalidade vista sob um prisma psicológico. A personalidade psíquica é a individualidade moral do homem, é o conjunto de predicados a distingui-lo das coisas, como a consciência, a liberdade, a ciência. A personalidade jurídica é o conjunto de faculdades e direitos em estado de potencialidade, que dão ao ser humano a aptidão para ter direitos e obrigações. Sem dúvida, nas palavras de Beviláqua, oindivíduo vê na sua personalidade civil a projeção da própria personalidade psíquica; mas, a personalidade civil depende da ordem legal, pois é dela que recebe a existência, a forma, a extensão e a força ativa. Através dessa explanação alcançamos o motivo pelo qual não se reconhecia, antigamente, a personalidade a certas criaturas humanas, como os escravos e os estrangeiros. Funda-se na mesma razão a ideia de se atribuir personalidade a certas criações sociais, denominadas pessoas jurídicas (BEVILÁQUA, 1929, p.87).
Podemos concluir que personalidade é, pois, um atributo da pessoa, ou complexo de faculdades e de direitos em estado de potencialidade que nela existem e lhe dão aptidão para ser sujeito de direitos.
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2.1.1- Início da Personalidade
Em que momento começa a personalidade civil do homem ? De acordo com o nosso código “a personalidade civil do homem começa do nascimento com a vida...”, com a adição de colocar a salvo os direitos do nascituro, desde a concepção (Código Civil, 1995, p.9). Apesar da teoria adotada, e como veremos com mais detalhes a diante, o nosso código apresenta situações em que o nascituro figura como pessoa, o que revela uma reminiscência da teoria adotada por Teixeira de Freitas, Clóvis Beviláqua, entre outros. Pelo artigo 357 do Código Civil, parágrafo único, o concebido pode ser reconhecido pelos pais; pelo artigo 462, será dado curador ao nascituro e pelo artigo 1.718, o nascituro tem capacidade para adquirir em testamento. Considerando que direitos só possui quem tem a aptidão legal para exercê-los, ainda que restritos, o feto possui. Sendo, portanto, detentor de determinados direitos, o feto é, pela lei, considerado pessoa, pressupondo personalidade jurídica. Essa discussão não levou o Código a adotar a personalidade para “o apenas concebido”, mas essa idéia surgiu, anteriormente, com a adesão de inúmeros doutrinadores, levando-nos, até os dias atuais, a rever todo esse processo, a partir do que propôs Teixeira de Freitas no esboço do Código Civil, e Clóvis Beviláquia no Projeto do Código Civil de 1899.
2.1.2-A PersonalidadeProjeto do Código Civil (por Clóvis Beviláquia)
Clóvis Beviláquia expõe em seu projeto do código civil, que a personalidade civil do homem começa com a concepção, sob a condição de nascer com vida. Para embasar sua doutrina, Clóvis Beviláquia encontra apoio em razões valiosas: 1º: desde a concepção o ser humano é protegido pelo direito. Nos costumes romanos já se encontravam vestígios dessa proteção como, por exemplo, a punição ao aborto, conservada até hoje pela nossa legislação. No Direito Romano, a mulher grávida que cometia algum delito não era sequer submetida a julgamento, com o intuito de proteger, unicamente o feto. Se o direto penal mostra, assim, considerações pelo feto, deve a mesma consideração ser tomada pelo direito civil;
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2º: a gravidez autorizaa posse em nome do ventre e a nomeação de um curador especial, sempre que competir à pessoa por nascer, algum direito. O Código Civil ocupa-se da espécie, mais especificamente no artigo 462, regulando-a, segundo os princípios que a orientam. A curadoria do nascituro é instituto conhecido em muitos outros sistemas legislativos, constituindo, como um direito do nascituro, merecendo relevância quanto à personalidade do feto; 3º: a pessoa por nascer considera-se já ter nascido quando se trata de seus cômodos, proclama o preceito romano aceito pelas legislações modernas. Neste caso, alega-se, simplesmente, uma expectativa de personalidade. Mas de duas uma: ou a personalidade já existe e não se trata de mera expectativa, ou é apenas possível e, aos direitos reservados os nascituro falta um sujeito. Alguns civilistas não recuaram diante desta conclusão em não querendo atribuir personalidade ao ser humano ainda na fase intra-uterina da existência, admitiram a possibilidade de direitos sem sujeito. Querendo ser lógicos, romperam com a lógica elementar do direito, em que apresenta uma relação entre um sujeito e um objeto, sob a proteção da ordem jurídica; 4º: é admissível o reconhecimento de filhos ainda por nascer (BEVILÁQUA, 1929, p.88). Em todos esses casos, o direito penal e o civil tratam o nascituro como um ser humano com direito à vida. Estas considerações levaram alguns legisladores a reconhecer, expressamente, a personalidade do nascituro. Face aos diversos textos encontrados, conclui-se que o feto, no útero materno, ainda não é homem; porém, se nasce de direito, a sua existência se computa desde à época da concepção. Ora, se a existência se calcula desde a concepção, para atribuir-se, desde então, direito ao homem, é irrecusável que, acomeçar desse momento, ele é sujeito das relações jurídicas.
2.1.3 - Início da Personalidade sob a Égide do artigo 4º do Código Civil Estatui o artigo 4º do Código Civil: “A personalidade civil do homem começa do nascimento com a vida, mas a lei não põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro” (Código Civil, 1995, p.9).
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O artigo 4º determina, incisivamente, que a personalidade civil do homem começa do nascimento com a vida. É pressuposto para o surgimento da pessoa e, por conseguinte, da personalidade jurídico. Para o direito brasileiro, uma vez positivada a separação do filho das vísceras maternas, surge a personalidade, isto é, reconhece-se a existência de pessoa plenamente capaz para gozar de direitos e obrigações, desde que haja constatação de que ocorreu nascimento com a vida. Não há outra condição imposta senão o nascimento com vida, ainda que tenha respirado por um minuto sequer. Não importa a forma humana; se nascido com vida passa adquirir personalidade. Não há limite de horas ou minutos para ter vivido e, se por acaso surgir alguma dúvida, há de se realizar a docimásia respiratória ou hidrostática de Galeno. É um processo simples que consiste em colocar os pulmões do recém-nascido em um recipiente com água à temperatura de 15º - 20ºC. Flutuando os pulmões é porque houve respiração, existindo, assim, vida que, sob o égide do atual código é a condição primordial para conceder personalidade. Entretanto, a segunda parte do artigo 4º do Código Civil cuidou de resguardar os direitos do nascituro. Segundo os seguidores dessa linha de pensamento, a ressalva feita não significa exceção à regra de que a personalidade só começa com o nascimento com a vida. Consoante a nossa legislação, o feto não tem personalidade, não é, ainda, uma pessoa sob o ponto de vista jurídico. Porém, levando-se em conta a expectativa de vida humana, a lei não podia deixar de levar em consideração esse fato de estar formando, no útero, uma pessoa, fato esse que a lei, cuidadosamente, procurou resguardar, com prevenção, os possíveis direitos. O nosso direito desprezou qualquer outra doutrina e forma de aquisição de personalidade, senão a do nascimento com vida, protegendo o nascituro na esperança de que realmente venha ao mundo, resguardando os direitos do homem desde a sua concepção para a sua morte.
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2.2 - As teorias sob a personalidade
Desde à época da formação de nossa legislação há uma grande perplexidade entre juristas para definir e demarcar o início da personalidade civil do homem como sujeito de direitos. A doutrina subdividiu-se em duas correntes: a natalista e a concepcionista. A primeira atribui a personalidade civil do homem pelo que preceitua o artigo 4º do Código Civil, ou seja, inicia-se a partir do nascimento com a vida; a segunda elege-se pelo principio de que o nascituro é sujeito de direitos, sendo pessoa e detentor de personalidade jurídica. O que reforça o pensamento da corrente concepcionista é o ensinamento de Freitas (1983, p.146), o qual afirma “que desde a concepção a lei protege e reconhece nele um sujeito de diretos”. Atribuindo ao feto o perfil de pessoa, é ele dotado de personalidade e capacidade de forma irrestrita e universal. Esta corrente fundamenta-se nos seguintes itens: a)
desde a concepção o ser humano é protegido pelo direito como se já tivesse
nascido; b)
o direito penal pune a provocação do aborto como crime contra a vida,
protegendo o nascituro como ser humano; c)
o direito processual autoriza a posse em nome do nascituro;
d)
o nascituro pode ser representado por curador;
e)
é admissível o reconhecimento de filhos ainda por nascer;
f)
pode o nascituro receber por doações e por testamento;
g)
enfim, a pessoa por nascer considera-se já ter nascido quando se trata de seus
interesses. Contrapondo a todo esse raciocínio, a corrente natalista não considera correta a opinião dos concepcionistas, porque o ser humano não separado do ventre materno não tem existência própria, sendo parte das vísceras maternas. Mesmo porque se fosse o nascituro considerado pessoa, além de ser sujeito de direitos, também seria sujeito passivo de obrigações. Vejamos separadamente a visão de cada uma das correntes.
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2.2.1- Corrente Concepcionista Embora o Código Civil tenha adotado a corrente natalista – com fundamentações legais que a sustenta – a corrente concepcionista tem apoio de alguns doutrinadores na literatura jurídica pátria. Isto porque, falar em direitosdo nascituro é reconhecer-lhe qualidade de pessoa, levando-se em conta a premissa repetida inúmeras vezes, de que todo titular de direitos é pessoa, adquirindo personalidade. Na lição de respeitados partidários desta corrente, a punição ao aborto, como crime contra a pessoa, é o mais acentuado sinal de que o nascituro, no Direito Brasileiro, tem personalidade civil. Afirmam que no Código Penal Brasileiro, no Título “dos crimes contra a pessoa”, ao declinar, os crimes contra a vida, fica expressa com nitidez a proteção à vida do nascituro como pessoa, pela tipificação do crime de aborto, previsto nos artigos 124, 125 e 126. Por ser a vida um bem inalienável, e nesse sentido, há um direito à vida, não pode, a mãe, nem tão pouco outro individuo, atentar contra a vida de um feto, praticando o aborto. Há fundamento, também, na Consolidação das Leis do Trabalho, quando a lei dá proteção à maternidade em seus artigos 392 a 394. A intenção da norma legislativa é a proteção ao nascituro, mais uma vez. Há quem diga que o artigo 4º do Código Civil consagra a teoria concepcionista e não a natalista, isto porque o texto da lei, como já foi dito anteriormente, refere-se a direitos do nascituro. Teixeira de Freitas em 1983,consagrou taxativamente este principio: “ as pessoas considerar-se-ão como nascidas, apenas formadas no ventre materno; a lei lhes conserva seus direitos de sucessão para o tempo do nascimento.” Concluem os adeptos dessa corrente que, sendo o feto titular de inúmeros direitos, deve ser considerado como pessoa pela ordem jurídica. É até juridicamente impossível não atribuir capacidade ao nascituro, pois toda nação que se preza reconhece a necessidade de proteger os direitos do nascituro. O Código Chinês, através do disposto do art. 7º, consagra essa premissa, reconhecendo e protegendo o nascituro como sujeito de direitos. Ora, quem diz direitos afirma capacidade, e quem afirma capacidade reconhece personalidade. Nesse sistema, de acordo com Semião (1988, p.38): “o feto existe, tem função orgânica e biológica própria, desde a concepção, ligada a vida da mãe. É uma fonte de vida humana. A lei prevê, então, garantia e obrigações relativamente ao nascituro, e, sendo assim, considera-o com personalidade jurídica, que não se confunde com capacidade civil ou humana, coisas diferentes no campo da
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tecnologia jurídica, ligada à vida orgânica.” Afirma ainda que: não gozando de capacidade de agir, não podendo exercer por si mesmo todos atos da vida jurídica, deverá o nascituro ser representado. Aliás, o mesmo se dá com os menores impúberes e as demais pessoas absolutamente incapazes, bem como as pessoas jurídicas que, embora dotadas de personalidade não têm, jamais, capacidade de fato. Todos exercem igualmente os atos jurídicos por meio de representante, isso porque, não feliz conclusão de Aloysio Teixeira, „se os nascituros são representados sempre que lhes competir a aquisição de direitos, dando-se-lhes curador ao ventre, deve-se concluir que já existem e que são pessoas, pois o nada não se representa ”.
Com respaldo de diversos doutrinadores e juristas, mesmo sendo minoria, a teoria concepcionista arremata com o argumento de que, em face o tratamento dispensado ao nascituro no direito penal e pelo direito civil, há que se reconhecer a sua personalidade, uma vez que essas legislações calculam a existência desde a concepção, para atribuir-se, desde então, direito ao homem, sendo, assim, irrecusável que a começar desse momento, ele é sujeito de direito e, portanto pessoa.
2.2.2 - Corrente Natalista
Conforme o pensamento da doutrina natalista, o nascituro é mera expectativa de pessoa e, por conseguinte, tem também mera expectativa de direitos, sendo considerado como existente desde a sua concepção para aquilo que lhe juridicamente proveitoso. A escola natalista sustenta sua tese tendo por base a premissa de que se os direitos do nascituro fossem taxativos, não haveria nenhuma razão para que o código declinasse, um por um, os seus direitos. Essa corrente assevera sua tese doutrinária em juristas como Miranda (1983, p.275): “(...) no útero materno, a criança não é pessoa: se não nasce viva nunca adquiriu direitos, nunca foi sujeito de direito, nem pode ter sido sujeito de direito (nunca foi pessoa). Todavia, entre a concepção e o nascimento, o ser vivo pode achar-se em situação tal que se tem de esperar o nascimento para saber se algum direito, pretensão, ação ou exceção lhe deveria ter ido. Quando o nascimento se consuma a personalidade começa.”
Seguindo este raciocínio, encontramos Roberto de Ruggiero, civilista italiano que considera nascido o feto separado do corpo materno, quer a separação tenhasido natural, quer artificial, ou seja, por intervenção cirúrgica. Ruggiero (1934, p.341):
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“Antes do nascimento o produto do corpo materno não é pessoa, mas uma parte das vísceras maternas. No entanto, com esperança de que nasça, o direito tem-no em consideração, dando-lhe uma proteção particular reservando-lhes os seus direitos e fazendo retroagir a sua existência, se nascer, ao momento da concepção. A equiparação do concebido ao nascituro é feita pelo direito só no seu interesse, pelo que não aproveita a terceiros e exerce-se, por um lado, com o instituto do curador ao ventre, com o fim de vigiar os direitos que competirão ao nascituro.”
Em suma, afirmam os natalistas que antes de nascer não é homem o fruto do corpo humano e não tem personalidade jurídica. Todavia, no período que decorre entre a concepção e o nascimento, existe uma expectativa de personalidade, e por isso é punido o aborto provocado. Tanto as leis penais quanto as civis reservam e acautelam direitos para o caso em que o nascituro venha à vida extra-uterina. A lei considera a esperança do homem, ou seja, sua expectativa de personalidade, como o ser ao qual é justo conservar os direitos que, com o seu nascimento e existência como pessoa, ser-lhe-ão admitidos.
2.2.3 - Os Direitos do Nascituro no Código Civil
Delinear os direitos do nascituro é objetivo de suma importância, pois através deles podemos reafirmar a preocupação dos antigos romanos com a figura do feto no intuito de resguardar o bem maior: a vida. O Código Civil declina no artigo 357, parágrafo único, que o pai pode reconhecer o filho precedendo-lhe o nascimento ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes. Conquanto alguns doutrinadores atribuam o reconhecimento um direito do pai, a norma não exclui que o direito é inerente ao feto, pois os seus interesses serão resguardados com a efetivação do reconhecimento. Tutela-se um direito que beneficiará tão somente aquele que está para nascer. O artigo 353 diz respeito à legitimação do filho estando concebido ou depois de nascido, resultante do casamento dos pais. É correto afirmar que somente legitimar-se-á o filho, caso nasça com vida. Porém, a lei preocupou-se, antecipadamente, com o nascituro, concedendo-lhe um direito, antes mesmo de vir a luz.
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Encontramos por sua vez, no artigo 372, a figura da adoção com relação ao nascituro. É claro que há, mesmo que implicitamente, o direito que o nascituro tem de ver adotado. O mesmo direito tutelando os interesses do nascituro encontra-se também embasado na artigo 462 do Código Civil:“dar-se-á curador ao nascituro, se o pai falecer, estando a mulher grávida, e não tendo o pátrio poder” (Código Civil, 1995,p.94). É inclusive nesse artigo, que a corrente, que a corrente concepcionista encontra apoio, uma vez que a norma garante um direito expresso em favor do nascituro. O artigo 1.169 do Código Civil, faz referência ao nascituro, concedendo-lhe doação, sob a condição de ser aceita pelos pais. Mesmo usufruindo deste instituto somente após o nascimento, a lei já reserva-lhe um direito face à expectativa de que possa nascer com vida. No mesmo diploma legal vamos encontrar o direito que o feto possui de adquirir por testamento. O artigo 1.718 diz que “são absolutamente incapazes de adquirir por testamento os indivíduos não concebidos até a sua morte...”ou seja, se ao tempo da morte do testador já existir um ser concebido no útero, poderá este usufruir do beneficio (Código Civil, 1995,p.94). Ainda que o código cuide das meras expectativasdo direito inerentes ao fetos em conceder-lhe personalidade, atribui-lhe direitos, levando a crer que, às vezes, a norma se traduz contraditória, contrariando o sistema jurídico. Dessa maneira, podemos tirar a conclusão de que o feto obtém a capacidade (por representação) sem possuir personalidade. Reconhecer todos esses diplomas é, sem dúvida, delinear as formas de defesa dos direitos do nascituro, admitindo-lhe personalidade.
2.2.4 - Capacidade Processual do Feto
Ante o exposto, surge um apontamento curioso gerando dúvidas e discussões a respeito da capacidade processual do feto. Com a concepção, o nascituro adquire direitos, mas a personalidade, consoante o Código Civil, surge do nascimento com a vida. São acontecimentos distintos. Primeiro adquire direitos e somente mais tarde adquire a personalidade civil. Surge a curiosa situação de possuir direitos sem ter personalidade no período compreendido entre a concepção e o nascimento. Há aqueles que não atribuem nenhuma capacidade processual ao feto, conforme preleciona Dower (1996, p.56): “ certa vez, após um concubinato, a mulher engravidou e, tendo necessidade de alimentos para o nascituro, propôs ação de alimentos provisionais. O
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magistrado interferiu a inicial de plano dada a manifesta ilegitimidade as causam ativa, decretando a extinção do processo.”
O juiz fundamentou a decisão sob a convicção de que a criança não havia nascido ao tempo da propositura da ação. Em vista da curiosa ação apontada, surgem dúvidas com relação à capacidade processual do feto, porque existem os que vêem no feto, sujeito ativo e passivo para o pólo processual. O nascituro não pode agir por si mesmo, quer do ponto de vista jurídico ou físico. Porém, não há dúvidas que poderá agir através de representação (Código Civil, arts.458 e 462). Existe o princípio de direito de que, quem pode ser causa ativa, também poderá ser parte passiva. Imagine se o nascituro em ação de alimentos e a sentença desta sendo objeto de ação rescisória. Será ele necessariamente parte passiva nesta última. Assim também será, nos casos em que o nascituro for contemplado em testamento, e este, objeto de ação anulatória pelos demais herdeiros. Vê-se que o nascituro pode ser parte ativa e passiva desde que a ação seja relacionada a seus direitos. Entretanto, sempre haverá alguma dúvida frente às confrontações encontradas. Por exemplo, se o nascituro, detentor de capacidade processual – estiver no pólo passivo na propositura de uma ação – terá, contra si, uma obrigação, estando sujeito às regras dos arts, 16 a 35 do Código de Processo Civil. Dúvida maior está inserida na seção com o título DA POSSE EM NOMEM DO NASCITURO, prevista nos artigos 877 e 878 do Código de Processo Civil. Embora muitos admitam que o sujeito do direito é a mulher grávida, existe uma corrente minoritária que infere capacidade ao feto. Na verdade, há uma impossibilidade fática do nascituro imitir-se na posse de alguma coisa e, segundo a corrente natalista, essa impossibilidade é absoluta, sendo que tudo isso não passa de um mero negócio judicial de tutela de interesses privados, configurando tipicamente um procedimento de jurisdição voluntária. Para a corrente natalista, é impossível o feto ser parte processual, mesmo que representado. Se por esse entendimento uma única verdade, não parece contraditório demais o código auferir representação ao feto? Com todas essas controvérsias, somas às novas tendências jurídicas, é necessário reavaliar a postura das normas para que não haja lacunas em nenhum texto de lei, que certamente levará a interpretações diversas, dificultado decisões ou mesmo provocando situações injustas, já que a intenção da lei é uma, e sua redação sugere outra, bem diferente.
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Os cuidados com a elaboração dos textos legais devem surgir a partir do momento em que se verificam as transformações sociais, frente aos avanços tecnológicos, porque esses podem gerar tanto benefícios quanto prejuízos à humanidade. Assim como a ciência vem avançando em suas técnicas de fecundação, é mais que urgente a necessidade de impor leis p sérias que possam acompanhar essa evolução científica, porque a vida-objeto de tantas experiências – deve ser tutelada cuidadosamente, visto que é um bem maior, e sempre deverá ser preservada em detrimento de qualquer “evolução”.
CAPÍTULO III - O NASCITURO E A BIOGENÉTICA
3.1 - Considerações sobre a Biogenética
Toda transformação social traz inovações no campo do direito em se este esta a serviço das relações humanas, regulando-as, deve, então, evoluir sempre para acompanhar com a mesma freqüência as mudanças sociais. A revolução cultural, por exemplo, ocorrida no começo dos anos 60, deu inicio a uma nova conduta de comportamento humano, fazendo com que se criassem métodos diversos de fertilização, uma vez que a mulher passou a ter grandes dificuldades para conceber. A biogenética surge, no meio científico, para solucionar problemas de infertilidade, criando embriões por meio de técnicas ultra-modernas, capazes, inclusive, de melhoramento da espécie. Dessas mudanças surge o biodireito, como conseqüência imediata da bioética e mediata da biogenética, que tem por base o novo surgimento do conhecimento jurídico da vida, e, em razão das inovações da biotecnologia. A omissão do legislador transformou o chamado biodireito em um campo polêmico e fértil da filosofia social. Não restam dúvidas de que as técnicas de procriação humana assistida trazem grandes esperanças aos casais estéreis, mas por outro lado, perturba valores, crenças e representações que se julgavam intocáveis.
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O estudo e avanço da biogenética trazem dúvidas no campo jurídico, mais especificamente no tocante à personalidade, com o surgimento do embrião concebido in vitro e não somente no ventre materno.
3.1.1-O Embrião como Pessoa
O embrião somente se desenvolverá, em todos os estágios para vir ao mundo, no ventre materno. Porém, antes de ser implantado no útero, não podemos desconsiderá-lo como ser vivo. Dessa maneira, como fica o embrião, criado e conservado fora das vísceras maternas? Pode ser considerado pessoa no sentido jurídico? Porque, caso seja admitido como pessoa, como admitir, então, sua destruição, alienação, manipulação para fins científicos ? Mesmo que o objeto do nosso estudo seja o feto, tendo como questionamento se possui ou não personalidade jurídica, não podemos deixar de falar desde novo método de concepção, porque vai refletir diretamente nas correntes doutrinárias que estudam o assunto. A teoria concepcionista, quecertamente influencia bastante o mundo jurídico, admite ser o embrião, desde a fecundação, algo distinto da mãe e com autonomia genética-biológica que não permite estabelecer nenhuma mudança essencial em sua natureza até a idade adulta. A propósito, é o entendimento de inserir nesta realidade embrionária uma categoria nítida de se reconhecer o perfil de pessoa. Os integrantes dessa corrente se recusam em empregar expressões tipo “potencialidade de pessoa” ou “pessoa em potencial”, porque acreditam ser, o embrião, realmente pessoa, devendo a lei respeitar-lhe como tal. A corrente natalista, quando expressa no art. 4º “desde a concepção...” concede ao embrião humano proteção jurídica desde o inicio de sua existência, punindo, por isso, o aborto provocado. Surge uma critica de cunho cientifico uma vez que essas correntes vêem o embrião – que mais tarde se tornará feto, evoluindo até vir à luz – somente concebido no seio materno. E aqueles que são fecundados em tubos de ensaio? Serão considerados pessoas, pela corrente concepcionista, ou apenas expectativas de pessoa, conforme a ótica da corrente natalista? São questionamentos a serem perquiridos em estudos de ordem ética e moral para após, inserir no universo do direito, questões polêmicas, porém, reais, como: se o embrião não é uma pessoa, mesmo em potencial, tudo é permitido e não há nenhuma necessidade da imposições legais; e, caso seja admitido como pessoa, não há lei que regulamente qualquer abuso com relação à comercialização e destruição do ser humano.
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Dessas alusões firma-se a necessidade de se estudar o início da personalidade do ser humano, porque seus interesses e direitos serão salvaguardados a partir desse momento tão peculiar.
TEORIAS ACERCA DO INÍCIO DA VIDA: EMBRIÃO E NASCITURO À LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.
Nota-se que há várias teorias acerca de quando se inicia a vida para o embrião e, consequentemente, também para o nascituro. De fato, independentemente da corrente adotada, é certo que há para o feto uma expectativa de vida humana, uma pessoa em formação. A lei não pode ignorá-lo e por isso lhe salvaguarda os eventuais direitos.
Todavia, o ordenamento jurídico reconheceu a necessidade da tutela do embrião e do nascituro, fazendo no campo das relações civis (garantindo a ele direitos personalíssimos) nos quais o: art. 7º. do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) dispõe que: “a criança e o adolescente tem direito à proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso em condições dignas de existência”. (BRASIL, 1990). E, também no âmbito penal – criminalizando e proibindo o aborto, ressalvadas a exceções legais – no que dispõe o art. 124 do Código Penal Brasileiro que: “provocar aborto em si ou consentir que outrem lho provoque”, cominação de pena de 01 (um) à 03 (três) anos de detenção”. (BRASIL, 1940).
Diante disso, importa tecer algumas considerações acerca das principais teorias do início da vida humana.
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TEORIA CONCEPCIONISTA
A teoria concepcionista salienta que o início da vida se baseia no fato da vida humana ter sua origem na fecundação do óvulo pelo espermatozóide, momento este denominado pelas ciências humanas como concepção.
Desta sorte, adotada essa teoria, não poderá haver pesquisas com embriões mesmo que fertilizados in vitro pois, isto implicaria em uma conduta prevista no Código Penal Brasileiro, o aborto.
A teoria concepcionista sustenta que os direitos desde a concepção do zigoto até sua transformação em embrião é feto viável e que, garantidas as condições naturais pode haver o desenvolvimento à condição humana plena.Desse modo, a Constituição e o Código Civil Brasileiro garantem a integridade de tal ser humano, o seu direito de evoluir, protegido do engenho humano contrário, da condição de vida humana em potencial à vida humana de fato.
Essa teoria é adotada pelo artigo 2° do Código Civil, que dispõe: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção os direitos do nascituro”. (BRASIL, 2002).
Garantidos estão ainda, os direitos do embrião constitucionalmente quando prevê a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, caput, o direito à vida: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida [...]” (BRASIL, 1988).
Nesse contexto, Almeida diz que: “A personalidade do nascituro não é condicional; apenas certos efeitos de certos direitos dependem do nascimento com
vida,
notadamente
os
direitos
patrimoniais
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materiais, como a doação e a herança. Nesses casos, o nascimento com vida é elemento do negócio jurídico que diz respeito à sua eficácia total, aperfeiçoando-a”. (ALMEIDA, 2000, p.81).
De acordo com Meirelles (2000, p. 138), há o seguinte posicionamento: “Porém o que a teoria assegura é que, desde o momento da concepção, encontram-se no genoma do ser que se forma as condições necessárias para o seu completo desenvolvimento biológico. Ainda que insuficientes, tais condições são necessárias, o que vem a significar que desde a concepção existe a potencialidade e a virtualidade de uma pessoa.”
Com esse entendimento, se observa que as propriedades características da pessoa humana, ou seja, todo o material genético, já estão presentes no embrião, em estado de latência. Assim, nota-se que o embrião já é considerado ser humano com vida própria, garantindo o ordenamento jurídico à tutela do embrião e do nascituro.
Assim, tendo em vista o embrião como pessoa em potencial, ele merece respeito e dignidade que é dado a todo homem, a partir do momento da concepção. Assim, merece o devido amparo jurídico para que não seja tratado como objeto.
TEORIA DA NIDAÇÃO
Nidação é o momento em que o embrião se fixa na parede do útero, ocorrendo à partir do 4° (quarto) dia da fecundação
Segundo essa corrente com o fenômeno da nidação o embrião adquire vida. Assim, é pela implantação que o ovo adquire viabilidade e determina o estado gravídico da mulher. Isto posto, antes da nidação apenas havia um aglomerado de células que constituiria posteriormente os alicerces do embrião.
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Completa Scarparo (1991, p. 42): “Não seria viável falar de vida humana enquanto o blastócito ainda não conseguiu a nidação, o que se daria somente no sétimo dia, quando passa a ser alimentado pela mãe”.
Todavia, a teoria em baila é defendida por vários ginecologistas, dentre eles Joaquim Toledo Lorentz, que utilizam o argumento de que o embrião fecundado em laboratório morre se não for implantado no útero de uma mulher, não possuindo, portanto, relevância jurídica. Como o início da vida ocorre com a implantação e nidação do ovo no útero materno, não há nenhuma vida humana em um embrião fertilizado em laboratório e, portanto não precisa de proteção como pessoa humana.[1]
DEFINIÇÃO JURÍDICA DO CONCEITO DE EMBRIÃO:
Em julho de 1978, numa maternidade de londrina, os médicos Patrick Stepoe e Robert Edwards convocaram a imprensa para anunciar que havia sido dada à luz uma saudável menina, de nome Louise. Ela provinha de um embrião fecundado através de uma nova técnica, em pesquisa há mais de dez anos: a fertilização in vitro. Por essa técnica, retiram-se cirurgicamente óvulos do ovário da mãe para fertilizá-los com os espermatozoides do pai em laboratorio. Em seguida, o óvulo fecundado é implantado no útero. A imprensa chamou Louise de “bebê de proveta” (COELHO, 2010, p.148).
Desde então, milhares de casais com problemas de fertilidade, em todo o mundo, têm-se beneficiado da técnica para cumprir a mais gratificante das realizações humanas – ter filho.
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Bernard, externando sua posição: entende que o embrião é certamente uma pessoa em potencial, ou seja, que desde a concepção existe uma potencialidade, uma virtualidade de pessoa. Segundo informa, desde a concepção, as condições necessárias ao desenvolvimento dos diversos estados de organização biológica estão claramente presentes no genoma do indivíduo (BERNARD, 1998, p.37).
Casabona, propõe que: estabelecer que o começo da vida humana é deflagrado com a fecundação do óvulo ou com a concepção não é mais tão simples depois de tantas inovações na ciência. Nessa perspectiva, ditar o começo e o fim da vida humana não é tarefa dos juristas, mas das ciencias biomédicas (CASABONA, 1994, p.138).
Segundo Snustad, um grande estudioso da medicina genética, embrião humano “É o conceito de quando se está em sua fase de diferenciação orgânica, da segunda à sétima semana depois da fecundação, etapa conhecida como período embrionário. O período embrionário termina na 8ª semana depois da fecundação, quando o concepto passa a ser denominado de feto” (SNUSTAD, 2001, p.102).
Assim, de acordo com a Dra. Márcia Mattos Gonçalves Pimentel, PhD em Genética Humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro: “[...] Embora , ao final do séc. XX, muitos processos biológicos ainda se apresentam que não podem ser modificados. No que diz respeito ao momento em que tem início a vida humana, alguns fatos biológicos são incontestáveis. São eles: Primeiro: O indivíduo humano começa a existir biologicamente a partir do
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momento em que ele tem um corpo, e a formação do corpo, de qualquer pessoa inicia-se no momento da fecundação. Ou seja, o primeiro passo para a formação de um novo indivíduo é a fusão de duas células altamente especializadas, denominadas gametas. Desta forma, todo ser vivo começa sua existência a partir de uma única célula quando, então, tem início um processo contínuo de multiplicação e diferenciação celular, até que, ao tornar-se adulto, o indivíduo terá cerca de 100 milhões de células. Segundo: Uma conseqüência da fusão do óvulo com o espermatozóide é que estas duas células perdem a capacidade de operar independentemente uma da outra, passando a trabalhar como uma unidade chamada zigoto ou embrião unicelular. (...) Terceiro: Os genes começam a expressar suas informações, sintetizando RNA mensageiro a partir do DNA, logo após a fertilização. A ativação dos genes no embrião ocorre antes da primeira divisão celular, que se dá de 15 a 20 horas após a fertilização. O zigoto, portanto, começa a existir e a operar como unidade desde o momento da fecundação (...). Quarto: O zigoto possui um genoma (conjunto gênico) absolutamente único, que lhe confere uma identidade biológica. Cada embrião é uma combinação gênica singular. Nunca ocorreu nem ocorrerá outro genoma igual” (NALINI, 1999, p.263-283).
Desse modo, sob o enfoque biológico podemos definir o embrião como uma célula, ou grupo de células, capazes de se desenvolver em ser humano, desde que interagindo em ambiente adequado. Haverá embrião a partir da fecundação, isto é, da união dos gametas masculino e feminino, que constituem uma nova célula composta de 46 cromossomos e vocacionada à vida autônoma.
Com esse entendimento, nota-se que o embrião humano, fruto da fecundação natural, no ventre materno, está compreendido no conceito de nascituro, para efeito da salvaguarda de direitos, de modo que a palavra "embrião", de forma generalizada, atingiria aos provenientes
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da fertilização in vitro, antes, portanto, de sua implantação no organismo da mulher, inclusive os excedentários, que se encontram crioconservados.
Sob um enfoque puramente filosófico, que se ocupa da natureza essencial dos seres e que o embrião é um ente vivo da espécie humana, reconhecido como indivíduo. Admitindo a diversidade de pontos de vista sobre a fixação do instante t, a partir do qual o embrião, como ente vivo humano, deverá ter direito absoluto à vida, muitos filósofos adoptam a postura tuciorista (de tutior) que é a de escolherem a opção mais segura quando há incerteza: a vida do embrião, desde o zigoto, deve ser protegida para se não correr o risco de discriminar seres humanos, instrumentalizando uns em benefício de outros.
Para os moralistas e filósofos que adotam a posição definida pela Igreja Católica não se pode afirmar que o embrião é uma pessoa mas é preferível protegê-lo como uma pessoa para evitar o risco de o discriminar, ao admitir a sua destruição para o benefício de outras pessoas. Outras tradições religiosas fazem uma interpretação moral diferente dos factos científicos ou continuam a apoiar-se em noções antigas como a percepção, pela mãe, dos movimentos fetais, para que o feto receba o estatuto legal de pessoa (SANTOS, p.129).
Para a reflexão ética o que está em causa, nas decisões pessoais, é a ética individual e os valores individuais, entendendo que cada cidadão, como pessoa individual, tem o direito e o dever de assumir uma posição, após informação honesta e compreensível, segundo os seus valores.
Dessa forma, leciona o mestre José Afonso da Silva que: “[…] a vida humana de que trata a Constituição Federal, integrase de elementos materiais (físicos e psíquicos) e imateriais (espirituais), sendo abrangente do direito à dignidade da pessoa humana, do direito à privacidade, do direito à integridade físico-
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corporal, do direito à integridade moral, e, especialmente, do direito à existencia” (SILVA,1994, p.182).
Do mesmo modo, ensina, ainda, que: “[…] o respeito à vida humana é a um tempo uma das maiores idéias de nossa civilização e o primeiro princípio da moral médica. É nele que repousa a condenação do abordo, do erro ou da imprudência terapêutica, a não aceitação do suicídio. Ninguém terá o direito de dispor da própria vida, a fortiori da de outrem e, até o presente, o feto é considerado um ser humano” (SILVA, 1994, p.182-183).
Assim, em um breve estudo realizado em legislação estrangeira, o: Artigo 2º da Convenção dos Direitos do Homem e da Biomedicina, do Conselho da Europa, já vigente em Portugal, diz textualmente: “O interesse e o bem-estar do ser humano devem prevalecer sobre o interesse único da sociedade ou da ciência” (PORTUGAL, 1986).
Esta disposição cria uma norma orientadora que nos deve conduzir à ponderação do interesse e do bem-estar do embrião antes de ponderar o que a sociedade ou a ciência podem querer desse embrião.
Em uma linha ética, o Art. 18º, nº 1, da citada Convenção, afirma que a lei deve proteger adequadamente o embrião sempre que seja autorizado usá-lo em investigação. E reforça este cuidado no nº 2 do mesmo Artigo, proibindo a constituição de embriões apenas para os usar em investigação; subjacente a esta proibição está o conceito ético de que o embrião humano não é algo de que se possa dispor livremente, não é uma coisa ou um simples bem de consumo.
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Todavia, o embrião humano, resultado da fertilização in vitro, enquanto não for implantado no organismo materno, não goza da proteção conferida ao nascituro, pois a ele não se equipara. Não pode ser considerado ente humano por nascer.
Contudo, o nascimento do primeiro bebê de proveta, em meados de 1978, concretizou a possibilidade de concepção de um ente humano fora do corpo da mulher, gerando reflexos no mundo científico e jurídico. E aqui no Brasil, no entanto, para limitar os riscos da gravidez múltipla, a recomendação é de que seja feita a transferência de apenas dois embriões, sendo comum que se chegue a três (BARROSO, 2006, p.264). A Lei 11.105/2005 – Lei de Biossegurança – permite, em seu artigo 5º, a utilização de células-tronco embrionárias, para fins de pesquisa e terapia, obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e que não foram transferidos para o organismo materno, atendidas algumas condições: “Art. 5o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento atendidas as seguintes condições: I – sejam embriões inviáveis; ou II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.
§ 1o Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.
§ 2o Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitê de ética em pesquisa.
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§ 3o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997 (BRASIL, 2005) Desse modo, um casal pode recorrer a técnicas de reprodução assistida – incluindo a fertilização in vitro – de forma que a propia Constituição Federal de 1988 em seu artigo 226 e seguintes dispõem que o homem e a mulher são as células formadoras da familia e que, nesse conjunto normativo, estabelecem a figura do planejamento familiar, fruto da libre decisão do casal e fundado nos principios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável (art. 226, §7°, CF). Entretanto, inexiste o deber jurídico desse casal de aproveitar todos os embriões eventualmente formados e que se revelam genéticamente viáveis, porque nao imposto por lei (art. 5°, II, CF) e incompatível com o próprio planejamento familiar.
Recentemente, o Ministro Marco Aurélio, relator da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 54, mencionou em seu voto que: “[...] mas as três realidades não se confundem: o embrião é o embrião, o feto é o feto e pessoa humana é a pessoa humana. Donde não existir pessoa humana embrionária, mas embrião de pessoa humana. (...). O Direito infraconstitucional protege por modo variado cada etapa do desenvolvimento biológico do ser humano. Os momentos da vida humana anteriores ao nascimento devem ser objeto de proteção pelo direito comum. O embrião pré-implanto é um bem a ser protegido, mas não uma pessoa no sentido biográfico a que se refere a Constituição.”[6] Para Daniel Sarmento “não existe equivalência entre o direito não apenas à vida, mas também à saúde de quem já é pessoa, como a mãe, e a salvaguarda do embrião, que pessoa ainda deve tornar-se” (SARMENTO, 2006, p.103). Nas palavras da Ministra Cármen Lúcia, “há que se distinguir [...] ser humano de pessoa humana [...] o embrião é [...] ser humano, ser vivo, obviamente [...] Não é, ainda, pessoa, vale dizer, sujeito de direitos e deveres, o que caracteriza o estatuto constitucional da pessoa humana” (ROCHA, 2004, p. 22).
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No Brasil, enquanto não editada norma legal a respeito, a operacionalização dos conceitos jurídicos com vistas a precisar o início da existência do sujeito de direito deve ser feita com cautela. Não há dúvidas, nesse contexto, de que o embrião fertilizado in vitro, a partir da implantação no útero, deve ser já considerado nascituro, quer dizer sujeito despersonificado. A sua natureza jurídica, enquanto não verificada a implantação in útero ou caso nunca esta venha a ocorrer, é ainda incerta (COELHO, 2010, p.164).
Dessa forma, se entende a doutrina majoritária que o embrião implantado tem a mesma natureza do nascituro, ser humano já concebido e cujo nascimento é dado como certo. Já o embrião humano resultado da fertilização in vitro, enquanto não for implantado no organismo materno, não goza da proteção conferida ao nascituro, pois a ele não se equipara. Não pode ser considerado ente humano por nascer.
Em curso pelo Congresso Nacional o Projeto de Lei nº. 6.960/2002 (arquivado em 31.01.2007 pelo fim da legislatura) propôs nova redação ao art. 2º do Código Civil, por sugestão da Professora Maria Helena Diniz, para fazer referência expressa ao embrião, sob a justificativa de que: "antes de implantado e viabilizado no ventre da mãe, não pode ser considerado nascituro, mas que também é sujeito de direitos". A nova redação seria a seguinte: "A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do embrião e os do nascituro" (DINIZ,2010, p.196).
Mas, repita-se, o embrião humano fruto da fecundação natural, no ventre materno, está compreendido no conceito de nascituro, para efeito da salvaguarda de direitos, de modo que a introdução da palavra "embrião" no citado dispositivo, de forma generalizada, atingiria aos provenientes da fertilização in vitro, antes, portanto, de sua implantação no organismo da mulher, inclusive os excedentários, que se encontram crioconservados.
Destarte, é necessário que o direito se ajuste a essas novas realidades, quais sejam, as inovações tecnológicas. De tal modo, no caso especifico, é inegável que o Brasil precisa
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definir qual a proteção jurídica que dará a esses embriões, bem como, dizer se permitirá que sejam realizadas pesquisas e até que ponto estas podem ser feitas.
3.1.2 - O embrião e o Novo Projeto do Código Civil Brasileiro:
O novo Código Civil, já em fase de aprovação deverá rever o tema da personalidade civil, visto que as inovações surgidas exigem uma reestruturação para melhor interpretação da lei e sua aplicação. De acordo com Semião (1998, p.191-192), o novo projeto deverá evitar a todo custo reconhecer o nascituro como pessoa, sendo que afetará diretamente as novas técnicas de fecundação, retroagindo a lei, com o risco de inviabilizar toda biogenéttica brasileira, considerando que a jurisprudência poderia ser construída de maneira não pacífica. Segundo estes autos, foi veiculada notícia no jornal “Folha de São Paulo” no dia 09/11/97, de que o atual projeto do no Código Civil é adepto à corrente concepcionista, pois nele, os direitos da pessoa existem desde a concepção. Pelo artigo 4º do Código Civil, em uma interpretação mais profunda, realmente o feto possui personalidade, pois esta é a aptidão conferida à pessoa para obter direitos e obrigações na ordem civil e, mesmo sem querer, o legislador, ao resguardar os direitos do nascituro para o tempo do nascimento, concedeu-lhe personalidade, partindo dos conceitos básicos de „pessoa‟ que norteiam o direito. A idéia de se conferir ao feto personalidade jurídica, pode, realmente, trazer prejuízos no campo cientifico visto que defronta co m os interesses da biogenética, no sentido de que esta não concorda em ampliar a personalidade ao feto. Mas não podemos ver o direito sendo fonte de interesses exclusivos de uma categoria. Por isso é necessário aprofundar em bases mais densas para se chegar a questões de cunho filosófico e doutrinário, que é, sem dúvida, a constante vontade de dar a cada um aquilo que é seu de direito.
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CAPÍTULO VI - AS CONFRONTAÇÕES ACERCA DO TEMA
4.1- Explicações teóricas
As teorias que tentam explicar a personalidade jurídica do feto possuem bases fundamentadas, porém, deixam lacunas que levam a interpretações diversas. A discussão acerca do tema pode parecer uma tanto filosófica, mas em qualquer área do direito, quando aprofundamos o seu estudo, devemos questionar o problema desde as suas raízes, buscando conceitos primordiais para melhor compreensão. Vejamos o que preceitua o art. 4º do Código Civil: “A personalidade civil do homem começa do nascimento coma vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.” A primeira parte do art. 4º é incisiva ao estabelecer que a personalidade civil do homem começa do nascimento coma vida. O artigo subdivide-se em duas partes, em que cada uma parece indicar duas correntes distintas: a natalista e a concepcionista. A primeira corrente, como já visto, atribui personalidade apenas ao ente que nasceu vivo; e a segunda bate-se pelo princípio de que o nascituro é sujeito de direitos, tendo, assim, personalidade. O artigo estabelece normas contraditórias partindo do princípio de que, juridicamente, são pessoas apenas aquelas que são sujeitos de direito e que a personalidade é um atributo destas. Por isso, não se vê dúvidas diante da afirmação de que o nascimento com a vida viabiliza, ou melhor, concretiza a personalidade civil do homem. Quando, porém, se afirma que a lei põe a salvo, desde a concepção os direitos do nascituro, e se o nascituro for irrestritamente sujeito de direitos, a personalidade civil do homem começará da concepção, e não a partir do nascimento, contradizendo expressamente a primeira oração do artigo 4º. Apesar das contradições de redação e interpretação, achou por bem o legislador conferir personalidade somente ao ser nascido com vida, com a cautela de colocar a salvo os direitos do nascituro, resguardado-os de quaisquer perigos eventuais e iminentes, na expectativa do nascimento coma vida. Mas, se o feto somente usufruirá dos direitos que lhe reservaram após o nascimento com vida, por que resguardá-los, pondo-os a salvo? Segundo Rodrigues (1996, p.38), “o nascituro é o ser já concebido, mas se encontra no ventre materno. A lei não concede
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personalidade, a qual só lhe será conferida se nascer com vida, mas como provavelmente nascerá com vida, o ordenamento jurídico, desde logo preserva seus interesses futuros, tomando medidas para salvaguardar os direitos que, com muita probabilidade, em breve serão seus.”
Ou como nos ensina: Theodoro Jr. (1994, p.523): “pelo artigo 4º do Código Civil o nascituro não é pessoa, mas seus interesses são ressalvados e tutelados desde a concepção, caso venha a ocorrer seu nascimento com vida”.
Os ensinamentos dos respeitáveis juristas podem parecer esclarecedores, porém não convencem partindo do principio emanado pela corrente concepcionista. Theodoro Jr. (1994, p.523), por exemplo, refere-se que “...seus interesses são ressalvados...”, enquanto que o texto da lei diz expressamente „direitos‟. Ademais, a lei confere ao nascituro (lembre-se o feto ainda por nascer) direitos enumerados e discriminados em artigos já mencionados, e vai mais longe, concedendo-lhe capacidade de fato. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência (RT 625/172 e 578/182) reconhecem no nascituro a capacidade de ser parte ativa e passiva em processo. Nada há de estranho neste entendimento, visto que, se a lei civil garante-lhes direitos, nada mais óbvio e até mesmo necessário que lhe conceda meio paraa defesa destes. E, se o código alude aos „direitos do nascituro‟, é porque de alguma forma, lhe reconhece capacidade. 4.1.1 – Contradição
Em contrapartida a esse posicionamento, corroborando com a postura do art. 4º que acolhe a corrente natalista, há a opinião de que se o legislador quisesse conferir ao feto personalidade jurídica, atribuindo-lhes todos os direitos pertinentes, não os enumeraria um por um, consoante discrimina o código. Ainda sob a égide do art. 4º do Código Civil sendo o feto parte das vísceras maternas (sem existência própria), embora tendo a lei reservando-lhe direitos, não é pessoa e, portanto,
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não tem personalidade jurídica. Entretanto, a redação leva a interpretação diversa, tornando-se o pensamento ambíguo. Se o feto não é pessoa, cuja existência não é imprópria, o que dizer, então, daqueles que vivem por intermédio de aparelhos? Já ficou esclarecido que do ponto de vista jurídico, pessoa é todo ser sujeito de direitos e a aptidão para o exercício destes pressupõe personalidade. Vamos acreditar que o feto, sob esta visão, não seja mesmo pessoa. Então, como explicar a figura típica do crime de aborto, previsto no Código Penal, estar especificada no capítulo cujo título é “Dos crimes contra a pessoa” ? Há evidente contradição em referir-se a direitos e não conferir ao titular destes, personalidade. Mesmo que o nascituro não atinja sua finalidade, ele, enquanto feto, possui a seu tempo, direitos enumerados pela lei ordinária, sem contar o preceito constitucional do direito à vida. É claro que se nascer morto jamais irá usufruir de todas prerrogativas a si inerentes. Não é nesse ponto que surge o problema. A questão suscita ao tempo da concepção, possuindo ou não personalidade jurídica. Muito embora o raciocínio nos leve à corrente concepcionista, a conclusão a que chegamos é de que a redação do artigo conduz realmente a outras interpretações. Talvez se a norma legislativa fizesse alusão a outro termo senão personalidade jurídica, como por exemplo, „personalidade específica ou sui generis‟, não haveria tanta discussão acerca disso, pois, o feto, possuindo direitos ou apenas expectativas, continuaria sendo o mesmo a quem a lei protege, consoante a segunda parte do artigo 4º. É coerente afirmar que, tendo a lei reservado ao nascituro alguns direitos, seria ele, pessoa, em situações especificas e, analogicamente possuiria personalidade especial. Justificaria até mesmo o aborto, só permitido em duas situações distintas. É inaceitável a tese esposada por Pontes de Miranda de que, se a criança não nasce viva nunca foi sujeito de direito. Ao tempo da concepção o feto tem a seu lado a proteção da lei. A exemplo da lei penal, ele nascendo vivo ou não, tem a tutela de ver a sua vida (ou expectativa), protegida com a punição do aborto. Ainda que tivesse uma única tutela – a proteção à vida – é claro que seria sujeito, mesmo de um único direito. Dizer que o feto ainda não é homem, não é pessoa, é aceitável do ponto de vista psicológico, eis que não possui a realização de seu fim moral, conscientemente, porque ainda não nasceu; porém do ponto de vista jurídico pode e deve ser considerado pessoa, partindo da premissa de que a pessoa é o ente a quem a lei confere direitos.
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Os juristas clássicos, ao esposarem seus seguimentos doutrinários, não tinham dúvidas em afirmar que o sujeito de direito só poderia ser aquele que fosse portador de direitos e obrigações de natureza civil. Na melhor designação, o código deu nome ao possuidor: pessoa. Reafirmar a cada instante que o feto, seguindo toda essa presunção doutrinária, possa ser dotado de personalidade jurídica, denota certa repetitividade. Ao final, não poderemos concluir outro pensamento senão este. Se voltarmos ao tempo, nas primeiras aulas do curso de Direito, vamos nos deparar com o ensinamento filosófico de que, após duas premissas, temos uma conclusão. E o caminho parece-nos estar correto. A contradição é clara quanto à redação. O legislador não tinha a necessidade jurídica de declarar que para adquirir a personalidade é necessário o nascimento com vida, se esta, consoante vontade do código, depende da existência extra-uterina. Poderia se fazer referência ao nascituro com o intuito de resguardar futuros direitos, de forma, especial, já que é certa a afirmação de que, quando se trata, dos seus direitos, o feto é tido como se já estivesse nascido. Mesmo que não houvesse nenhum equivoco de interpretação, o código, ao mesmo tempo em que nega personalidade ao nascituro, lhe protege a vida e lhe concede direitos. Outorgar direitos ao nascituro, nomear-lhe curador, reserva-lhe quinhão em partilha, tudo isso por uma personalidade que não existe, que somente se constitui ao nascer, é realmente admitir a possibilidade de um direito sem sujeito, de uma posse sem possuidor, e de uma representação sem representado. Não há compreensão que possa existir em ser com suscetibilidade de adquirir direitos sem que haja pessoa. Conclui-se que, embora o artigo 3º do projeto primitivo de Clóvis Beviláquia tenha sido rejeitado, sua admissão impõe-se pela ordem natural das coisas, ao compará-lo com o dispositivo da segunda parte do artigo 4º do Código Civil, no momento em que o feto é protegido. Criar uma nova redação que conceda ao nascituro personalidade especial, e que o considere pessoa por nascer – no que se referir apenas aos direitos especificados pela legislação – pode soar com mais coerência frente aos ensinamentos essenciais do direito, no tocante à personalidade. O mais correto é adequar a norma a cada situação correspondente, com o cuidado para não se criar inúmeras versões, prejudicando a quem possa interessar o titular do direito.
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CONCLUSÃO
Definir a relevância ou importância do ser humano já em existência já não é coisa muito fácil, pra falar de importância daquele que nem nasceu, é mais complicado ainda. Dessa forma, como se vê em todo contexto apresentado para firmamos uma ideia sobre essa importância buscamos apresentar um roteiro de informações no sentido de nortear o tema. Para isso buscamos afirmações e nos seguimentos das diversas áreas como: a social, a teocrática e a jurídica, onde fica claro que existe importância na personalidade atribuída ao ser ainda em formação e também existem direitos reservados a este “ser” que nem conhecemos ainda. Assim sendo, se faz mister que devemos criar mais responsabilidade para todos. Isto é, pessoas humanas e jurídicas para que se conscientizem da importância do ser em formação e que possam cada um desempenhar o seu papel neste contexto. Para tanto, devemos nos ater, que o início da personalidade civil do homem, como observamos no transcorrer do trabalho, constitui matéria essencial para delinear o possuidor dos direitos atribuídos nos ordenamentos social, teocrático e jurídico. Pelo que ficou esclarecido a repetido diversas vezes, a partir dos conceitos de “pessoa”, “personalidade” e “capacidade”, o feto, embora não admitido pela legislação, tem personalidade jurídica, com aptidão para exercer os direitos que lhe foram concedidos através de representação. Essa conclusão somente foi possível consoante redação do artigo 4º do Código Civil (e não da intenção da lei, a qual foi clara em dizer que o feto não possui personalidade), interpretado a partir do entendimento de que todo possuidor de direitos é pessoa e, por esse estado, tem personalidade. Se o tema leva a posicionamentos diferentes, com questionamentos diversos, clara fica a ambigüidade da interpretação do artigo e contradição encontrada. A própria jurisprudência se dividiu, admitindo, inclusive, que o feto pode ser parte ativa e passiva no pólo processual. Ainda que as questões não se adéqüem às transformações cientificas, o feto que se concebe de forma natural, dentro do ventre materno, deve ter todos os cuidados voltados para simplesmente pelo que preceitua o princípio constitucional no direito à vida. Partindo desse princípio, o feto passa adquirir o primeiro direito, antes mesmo do nascimento. A aquisição deste pode até não ser pressuposto para a concessão de personalidade prevista pelo código, porém, certamente é aptidão reconhecida pela legislação civil e,
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principalmente, pela penal, a qual pune com severidade aquele que interrompe o elo de se chegar à luz. É imprescindível, ao abordar o direito, harmonizá-lo com a norma, com a lógica, com a semântica, com a evolução, com a moral e, sobretudo, com a ética. Assim, se o nascituro é considerado sujeito, se a lei civil lhe confere curador, se a lei criminal o protege, a lógica e, essencialmente, a interpretação, permitem que lhe reconheça o caráter de pessoa. Embora essa idéia possa ser conservadora ou mesmo absurda, vale lembrar que os conceitos auferidos á pessoa são temporais, e este foram interpretados à luz da pura hermenêutica, constituindo a base antes de se chegar à conclusão de que a personalidade jurídica pode ser aplicada ao feto.
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