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do mundo: comicidade feminina ou feminista? // Pag
COMICIDADE FEMININA OU FEMINISTA?
Ao partirmos em busca dos rastros deixados por esses anos de trabalho da Cia. CLE em Fortaleza, não poderíamos deixar de iniciar destacando a atuação de Sâmia Bittencourt que é, não só a diretora e fundadora da Cia. CLE, mas também referência na formação de muitas artistas circenses na cidade, tendo se destacado por sua pesquisa e atuação como palhaça, sendo uma das pioneiras em um ambiente marcado fortemente pela presença masculina.
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“(...) Um outro braço de estudo que segue lado a lado com a acrobacia cênica é a comicidade voltada para a palhaçaria e no caso da Cia CLE, a palhaçaria feminina/ feminista.
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O primeiro, fala da vida de uma artista da rua e na rua e sua forma de existir entre as buzinas dos grandes centros urbanos. O segundo, uma farsa clássica que narra a busca da palhaça pela proeza de conseguir o título de mulher mais forte do mundo, desafiando a todas e todos”. (Sâmia Bittencourt)
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Tenho gosto em citar os espetáculos solos “Um tiquinho de Nada” (2008) e “ A mulher mais forte do mundo” (2016), que protagonizam a figura da palhaça criando uma dramaturgia própria e que traz como temas o ser mulher em suas várias vivências.
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Que lugares a mulher comumente ocupa embaixo de uma lona circense? Em cena no picadeiro a vemos no corpo de baile, fazendo assistência no número do mágico ou do malabarista, nas performances excêntricas ou de fetichização e objetificação de seus corpos, ou como as volantes que percorrem o ar com suavidade e leveza para serem salvas nas mãos do portô que lhes assegura a vida, com sua força e virilidade. Assim como, estará presente realizando as funções de manutenção do espaço e venda de comidas e brindes. São marcas do patriarcado, que deixa onde vai seu recado contundente em nossas subjetividades. Um tiquinho de Nada (2008) e A mulher mais forte do mundo (2016) são solos de Sâmia Bittencourt, que seguem em cena desconstruindo estereótipos, fortalecendo a diversidade, a igualdade de gênero e o anti-machismo no circo e na comicidade cearense.
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PALHAÇA NADA VAI À FEIRA MEDIR O CUSTO-RISO 3
01/12/2013 | por Valmir Santo
Numa feira apinhada do Bom Jardim, na periferia de Fortaleza, a palhaça Nada puxa seu carrinho de bugigangas e disputa espaço com feirantes, fregueses, sacolas, bicicletas, motocicletas e outros carrinhos de mão improvisados como carreto. Nariz do tamanho de uma maça, peruca de fios encaracolados e macacão azul e amarelo não deixam dúvidas de que ela está na contramão do ambiente aparentemente informal, ao ar livre. Lugar de comprar, trocar e vender desde tempos medievais.
Escudada por Nada, a atriz Sâmia Bittencourt provoca o riso, mas não o dá de barato. Como os feirantes que tentam atrair os passantes, ela intervém com brincadeiras e improvisos até fisgar a atenção de um ou de outro que se permitam contracenar, brincar e improvisar em troca de dinheiro, como ela diz, por meio da voz distorcida ou do gesto em que o dedo polegar esfrega a ponta do vizinho indicador.
A abordagem é lírica ou festiva, contextualizada pela batida do triângulo ou pelo sopro da escaleta do músico Carlos Hardy, que acompanha as estripulias com desenvoltura. O desfecho de cada diálogo bem-sucedido vem sempre na forma da incisão. Para além da moeda do riso, há o vil metal. Eis a contingência do custo-riso.
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3. Crítica de Valmir Santos publicada no site Teatro Jornal >> O jornalista viajou a convite da organização do 9º Festival de Teatro de Fortaleza, em: https://teatrojornal.com.br/2013/12/ palhaca-nada-vai-a-feira-medir-o-custo-riso/#more-6669
A dramaturgia aberta não problematiza tal sistema de troca simbólica numa situação prato cheio. A artista que responde ainda por concepção e direção desperdiça a oportunidade de tensionar o humor, de semear a crítica sobre o estado de coisas.
Somente ao final da intervenção, longe dos olhos da maioria, ela repassa as moedas de bom grado ao grupo de crianças e adolescentes que a acolhe incondicionalmente durante todo o trajeto, inclusive sugerindo-lhe ações diante de um ou outro conhecido do pedaço.
Se a palhaça não aprofunda a contradição, deixando o riso guiar-se pretensamente solto, o mesmo não acontece com interlocutores que reagiram com rispidez diante da presença da alegria. Um feirante armou aspereza, desconfiado de que a molecada liderada pela brincante fizesse um arrastão em sua banca. Um religioso que se pretende fervoroso esconjurou “esse demônio”, de chofre, sem ao menos lhe dar ouvidos.
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Nada, essa figura adorável, de fato diz a que veio. Como se propõe. Cativa, tem atenção perimetral, até dobra um ou outro ranzinza. Mas quando um artista ocupa o espaço público, a rua de uma feira, não dá para se conformar apenas com a simpatia alheia. É pouco.
Houve quem a tratasse por “palhaçinho” ou por “pinguim”. Essa ambigüidade valiosa tem tudo para ser aprofundada. Pululam significações e ressignificações para quem está disposto a ir de encontro às multidões no Brasil atual. O palhaço, principalmente quando na pele de uma mulher, tem poder de instaurar também a discórdia e cutucar a paz presumida. Ou seja, conviria um pouco mais de intrepidez a esse espetáculo itinerante chamado Um tiquinho de Nada, da Companhia Circo Lúdico Experimental. Um piscar de olhos, dizem, às vezes move montanhas.