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Telles, Leandro
O passar dos tempos e a educação a excelência na história do Colégio Farroupilha / Leandro Telles e Naida Menezes. Porto Alegre: [s. ed.], 2012. 186 p. : il. ; 22 x 24 cm. ISBN - 978-85-61797-16-4 1. Colégio Farroupilha Educação história. 2. Educação Rio Grande do Sul história. 3. ABE Colégio Farroupilha. I. Menezes, Naida. II. Título. CDU 37(091) Catalogação na fonte: Paula Pêgas de Lima CRB 10/1229
Associação Beneficente Educacional de 1858 Diretoria Presidente: Fernando Carlos Becker 1o Vice-Presidente: Henrique Ewaldo Streibel 2o Vice-Presidente: Renato Eduardo Santos Silva 1o Secretário: Eduardo Passos Lemmertz 2o Secretário: Rodolfo Schütz 1o Tesoureiro: Sergio Ebling Enck 2o Tesoureiro: Bruno Carlos Foernges Conselheiros: Christian Ulrich Voelcker - Delfino Carlos Plá Filho João Francisco Largher Costa - Marcello Casaccia Bertoluci Mario Fernando F. Espíndola - Nilo Vilmar Lopes Job Rolf Werner Hemesath
Coordenação: Tiago Schmitz
Conselho Fiscal: Efetivos Ciro Itamar Pacheco - João Luiz Scaffaro Rios Raul Carlos Volkmer
Coordenação de pesquisa histórica: Naida Menezes
Suplentes André Meyer da Silva - Arno Ervino Gehrke Paulo Sérgio Pinto
Equipe de pesquisa histórica: Lucas Grimaldi, Naida Menezes, Tiego Rocha Rebello Redação: Naida Menezes e Leandro Telles Capa, Projeto Gráfico e Ilustrações: Redesenhar - Comunicação e Arte Adel Fabian Giacomini Diagramação: Cristiano Marques Revisão: Ademar Vargas de Freitas Impressão: Gráfica Calábria Livro impresso através da Lei de Incentivo à Cultura, do Ministério da Cultura, com apoio da Aços Villares S/A, através de projeto da Adviser Consultores Educacionais, na gestão do ex-presidente da ABE de 1858, Jorge Bertingher.
Conselho Consultivo: Anton Karl Biedermann - Donato Hugo Winkler Fernando Carlos Becker - Germano Pradel Wahrlich Jorge Gerdau Johannpeter - Jorge Guilherme Bertschinger Ricardo Hauck Conselho Escolar-Administrativo: Educação infantil Fabio Maraschin Haggsträm Marco Aurélio Salatti Schitz Ensino Fundamental - Anos Iniciais Marianne Kude de Almeida Roberto Coimbra Santos Ensino Fundamental - Anos Finais Leandro Paulsen Octávio Mendes Teichmann Ensino Médio Adriana Rivoire Menelli de Oliveira Paulo Leandro Nardin Direção do Colégio Farroupilha Diretora Pedagógica: Marícia Ferri Diretor de Administração e Finanças: Milton Fattore
SUMÁRIO APRESENTAÇÃO..............................................................................................................................7 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................9
CAPÍTULO I Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX.............................................................13 Porto Alegre no final do século - modernidade e escola........................................................................25 O Rio Grande do Sul, o Positivismo e a educação - Primeira República (1889-1930).............................31 Educação e Nacionalização Compulsória – 1930/1940........................................................................41 Escola Técnica de Comércio Farroupilha ............................................................................................51 As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades........................................55 Paradigmas repensados – A sociedade de aprendizagem e o século XXI...............................................73
CAPÍTULO II Para além da escola – A mantenedora: sustentáculo e resiliência..........................................................81 Matemática - Cubos, tabuadas e condução global.................................................................................97 Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras........................................................................... 109 Elementos culturais e simbólicos: detalhes do calendário escolar........................................................ 123 O Canto e o coral que transforma e que preserva................................................................................131 Juventudes, disciplina e Bildung........................................................................................................137 Jogos e Ginástica no Colégio Farroupilha..........................................................................................151 Espaço Físico – Entre bondes e figueiras............................................................................................159 Conclusão.......................................................................................................................................... 177 Presidentes da ABE de 1858..............................................................................................................................179 Diretores do Colégio Farroupilha (1886-2012) e Diretores do Curso Primário.....................................................180 Variações do logotipo do Colégio Farroupilha através dos tempos......................................................................181 Referências e créditos........................................................................................................................................183
7
APRESENTAÇÃO
R
esgatar a história de mais de 150 anos de tradição na educação não é tarefa fácil. Da mesma forma, sintonizar a educação com as
demandas da sociedade em diferentes tempos sempre foi um grande desafio para a Associação Beneficente e Educacional de 1858. A obra “O passar dos tempos e a educação – A excelência na história do Colégio Farroupilha” busca resgatar alguns dos muitos momentos importantes do passado até o presente. A brilhante pesquisa histórica – que traça um paralelo entre a evolução do ensino básico no Rio Grande do Sul e as transformações do Colégio Farroupilha ao longo de muitas décadas – retrata o compromisso da ABE com seus pilares da tradição, disciplina e inovação. Como mantenedora, a ABE sempre foi a principal responsável por todas as decisões e projetos implantados na instituição. É também a entidade que procura perpetuar os valores e ideias de uma pujante história em prol da excelência educativa. A obra nos comprova que formar cidadãos competentes e comprometidos com a sociedade em que estamos inseridos sempre foi a missão de nossa instituição desde sua origem. Cabe a nós, nos dias atuais, assumir o compromisso de perpetuar tão bela trajetória e continuar fazendo história, mantendo-nos em constante aprendizado e assumindo o compromisso com a excelência educativa. Como diria o cientista britânico Charles Darwin: não são os mais fortes, nem os mais inteligentes que sobrevivem, mas aqueles que melhor se adaptam. Nós, ao longo de mais de 150 anos, nos adaptamos e continuaremos firmes na promoção de um projeto educativo comprometido com a formação cidadã e transformadora. Boa leitura! Fernando Carlos Becker Presidente da ABE de 1858
INTRODUÇÃO
A
o pensarmos sobre a educação que queremos nas escolas, é importante revisitar o passado. A história dos processos educativos nos
traz subsídios para entendermos o nosso papel na comunidade escolar, respaldando posições mais proativas. O presente livro pretende contribuir nesse sentido. Ele é formado por dois capítulos, duas grandes divisões de análise, construídas de forma que uma complemente a outra. O primeiro capítulo apresenta um texto de imersão e análise no tempo histórico da educação, de forma mais linear e narrativa, dando visibilidade às rupturas ocorridas ao longo dos anos. O objetivo foi situar o leitor em relação ao sistema educacional no Brasil, especificamente na cidade de Porto Alegre. O segundo capítulo aborda um estudo de caso do Colégio Farroupilha, mantido pela Associação Beneficente e Educacional (ABE) de 1858, a partir de temáticas como o calendário escolar, o espaço físico, a juventude (protagonismo, conflitos, saberes e sociabilidade juvenil), as transformações no processo de aprender a ler e fazer contas. Iniciamos essa segunda categoria de análise em relação à história do sistema educacional com um subcapítulo que apresenta subsídios à compreensão dos demais. Ele trata sobre a criação da ABE de 1858, responsável pela fundação e mantenedora do Colégio Farroupilha. Sua história nos remete a um grupo de pessoas que se manteve atento às demandas sociais de cada geração, apresentando soluções inovadoras e eficazes para a educação da sociedade porto-alegrense. O corpo da obra, principalmente no segundo capítulo, é enriquecido com fontes orais, fotografias, livros de registro, livros de notas, atas, ofícios, cartas e cadernos escolares. Buscamos trazer esses elementos cotejando-os e, mais do que isso, promovendo um diálogo com as nossas percepções teóricas e com análises que estudiosos da educação realizaram nos últimos anos. As percepções de
pesquisadores, nossos contemporâneos, contribuem para um olhar mais atento, de forma que possamos perceber padrões da estrutura escolar e também o que não é padrão, algo diferente dentro da normalidade dos registros das atas, ofícios e outros. Além disso, eles nos desafiam com diferentes elementos e questionamentos referentes ao passado. O leitor também reconhecerá a presença de memórias e sentimentos em relação à escola. Nesse viés, pensando o Colégio Farroupilha também enquanto agente socializador, focamos em um personagem do universo educacional: o aluno. Seja criança, seja jovem, ele, volta e meia, sobressai ao texto, através de memórias, imagens, cartas e artigos das revistas publicadas por professores e pelos próprios alunos do Colégio. A voz da comunidade escolar que chega ao leitor, por exemplo, através dos depoimentos, é uma forma de valorizar todas as gestões e gerações que passaram pelo Colégio Farroupilha. A escolha dos depoentes foi pensada de forma a representar a importância do grupo ao qual o entrevistado faz parte: presidentes da ABE de 1858, equipe diretiva, pais, alunos, professores e colaboradores. Todos foram fundamentais, e por isso estão representados nas entrevistas, mas com um detalhe: o professor, o diretor, o presidente e demais entrevistados também foram alunos da escola. Pensando em avançar para além do descrédito e da crítica em relação à educação no Brasil, o livro traz conhecimento e inspiração, narrando a trajetória de uma instituição educativa gaúcha que desde 1858 forma cidadãos competentes, responsáveis e éticos, tendo como pilares a disciplina, a inovação e a tradição. Que esta história sirva de referência para trilhar os caminhos futuros da ABE de 1858 e do Colégio Farroupilha, mas também de outras instituições educativas que estejam inquietas em busca de melhorias em seus processos educativos.
CAPÍTULO I
CAPÍTULO I
Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX
N
a sociedade do século XXI existe uma
Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, é
condição natural para a criança e para
importante observar o formato da rede educacional
o jovem: eles são estudantes, vão à escola. Cem
da primeira metade do século XIX.
anos atrás, essa lógica escolar não fazia parte
Cabia à Câmara de Vereadores administrar
do cotidiano da maioria dos brasileiros. No
em nome do Presidente da Província, as aulas
entanto, é lá no passado que podemos encon-
públicas de primeiras letras. Os livros, a escolha
trar as raízes de nossa cultura escolar
do prédio – normalmente alugado –, a
e também o entendimento de certos
contratação de professores cabiam à
paradigmas relacionados ao ensino.
Câmara de Vereadores, que contava,
Se fizermos uma imersão em busca das raízes históricas da educação no Brasil, de sua gênese, veremos que a Constituição Imperial de 1823 já previa o direito à instrução gratuita de todos os cidadãos. No entanto, cinquenta anos depois de promulgada
em cada distrito do município, com a colaboração de um inspetor escolar. A Câmara costumava, então, adquirir algumas casas onde os professores pudessem receber os alunos. A comunidade escolar se resumia à figura do mestre e do discípulo, era
a lei, 87,5% dos jovens brasileiro ainda não tinham
um professor para cada pequena escola, então
acesso ao ensino (SILVA, 2006, p. 84).
chamada de aula. Sem equipe diretiva, pedagógica
No século XIX, a instrução caracterizava-
ou colaboradores.
se como um sistema de ensino descentralizado,
Nas aulas de primeiras letras, aprendia-se a
sendo coordenado pelo presidente de cada uma
ler, escrever e fazer contas. Além disso, os alunos
das províncias que formavam a nação.
recebiam lições de Historia do Brasil, Moral e
Seguindo o rumo em direção ao passado,
Religião, o chamado catecismo, que passou a
e focando na cidade de Porto Alegre, capital da
fazer parte oficialmente do currículo das escolas
Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX
15
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
ATAS DA CÂMARA DE VEREADORES
25 de junho 1877 Comunicam a mudança da Aula das meninas da Azenha para a Rua da Margem. 9 de julho 1877 16 de março1878 Recebem portaria da Presidência tratando da transferência da aula do sexo masculino de Nossa Senhora dos Navegantes para a Rua da Floresta. 27 de agosto 1878 Recebem Portaria da Presidência comunicando ter prorrogado até junho de 1879 o contrato para o fornecimento do primeiro e segundo livros de gramática para as aulas públicas da Província. Dezembro de 1878 Recebem abaixo-assinado de moradores entre as ruas dos Generais Silva Tavares e Bento Martins, pedindo que seja criada uma aula mista para seus filhos, no primeiro Distrito, por ser insuficiente a que existe (PREFEITURA, 1876/1885).
16
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Praça da Alfândega, 1900, cartão-postal, impresso.
Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX
17
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
elementares públicas em 1843 (OLIVEIRA, 2004). Havia escolas para meninos e escolas para meninas, inclusive com diferença no currículo, mantendo a mesma estrutura patriarcal presente na sociedade, como veremos mais adiante. Terminado o primário, o jovem encaminhava-se
Jornal Correio do Sul Anúncios – 1852 “Resultados dos exames da aula pública de primeiras letras do Segundo Districto,
para o secundário e posteriormente para o ensino
a cargo do Professor Joaquim Antônio
superior – a minoria deles. O ensino secundário
Pereira Coruja. Plenamente aprovados e
era ministrado em locais diferentes, conforme
com distinção: José Tuté Jardim, Thomaz de
a disciplina, de forma isolada e sem nenhuma
Azevedo Barbosa, Manoel José de Azevedo."
seriação entre elas. Assim, o jovem estudante devia dirigir-se à aula que desejasse, normalmente na casa do professor, onde estudava Gramática Latina, Filosofia Racional e Francês, entre outras matérias humanísticas. Matérias científicas não eram lecionadas na primeira metade do século XIX. Foi com a criação do Liceu Dom Afonso que começou a haver certa instrução científica, mas apenas nas aulas de Astronomia (WORTMANN, 1999).
“Aula de Instrução Elementar. Rua da Ponte, n. 173: Joaquim Francisco Pereira Gomes, participa ao respectivo público que no princípio do presente futuro anno, principiase a lecionar no seu estabelecimento o latim, francês e inglês, para o que tem tratado.” (Correio do Sul, 29.12.1852, p. 4).
O Liceu Dom Afonso foi a primeira e única escola pública secundária que havia na
Apenas em 1869 começou a funcionar outra
Província de São Pedro do Rio Grande, por essa
escola pública secundária, mas dessa vez para
época. Quando o Duque de Caxias, logo após a
preparar normalistas, já que a demanda por
Revolução Farroupilha, esteve na presidência
professores era muito grande (ROCHA , 2010).
da província, criou esse estabelecimento onde começaram a ser ministradas aulas de “inglês, geografia, astronomia, história, álgebra, retórica, desenho e música, distribuindo-se essas matérias em seis anos de estudo” (ARRIADA, 2007, p. 61).
18
Na primeira metade do século XIX, um dos professores mais tradicionais era Antônio D’Ávila, conhecido como Amansa-burros. Um de seus alunos, Antônio Álvares Pereira Coruja (18061889), nos informa em seu livro de memórias que
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
o Amansa era natural do Arquipélago dos Açores,
O alfabeto era ensinado em areia ou em
sendo “o mais erudito professor daquele tempo”.
pedra (lousa). Com o passar dos anos, a pedra
(CORUJA, p. 15) 1
mostrou-se mais eficiente já que na areia era difícil
Antônio D’Ávila chegou a Porto Alegre em 1800, e nesse mesmo ano já começou a dar aulas particulares de primeiras letras. Felicíssimo de Azevedo (1823-1905), que também foi seu aluno, assim descreve a sua sala de aula:
a desvantagem de servir para algazarras, pois os alunos costumavam atirar areia uns nos outros. Assim, na maioria das aulas, cada um recebia uma pequena lousa de ardósia e um ponteiro, uma espécie de lápis também de ardósia, ou o giz. As
“No vão, que fica entre a porta e a janela, está
lousas representavam para a aprendizagem da
uma pequena mesa, um pouco afastada da parede
escrita o “principal suporte e, consequentemente,
para dar lugar a uma poltrona com assento de sola,
exigiu da estrutura escolar outros equipamentos
onde se acomoda o professor. Por detrás
indispensáveis para a otimização de
do professor, pendente da parede, está
seu uso, entre eles o banco escolar
uma cruz de madeira pintada de preto,
apropriado” (ARRIADA, 2012, p. 81).
que é como que um símbolo da escola. A
A utilização de livro impresso só fazia
esquerda da sala veem-se três ordens de
parte da realidade do aluno após a etapa
bancos a moda dos circos de cavalinho
de alfabetização. Felicíssimo de Azevedo
ou de rinhas de galo (em anfiteatro), onde
lembra que, ao mesmo tempo em que era
se sentam os meninos, sendo os maiores no primeiro
uma felicidade receber a Cartilha do Padre Inácio,
banco e os outros nos bancos superiores, guardadas
esse era um momento difícil de aprendizado, pois o
as gradações de adiantamento. A direita vê-se um
livro era feito com letra de imprensa e eles aprendiam
grande banco, tomando quase todo o comprimento
a ler em manuscritos, portanto não entendiam
da sala, com altura suficiente para servir de
praticamente nada daquela nova simbologia.
escrivaninha, e a par dele outro da mesma extensão
A Cartilha do Padre Inácio, um livro de
e com a altura proporcionada a nele se assentarem
doutrina cristã, foi escrita no século XVI pelo padre
os meninos quando escrevem” (AZEVEDO, 1884,
jesuíta Inácio Martins2. A partir daí podemos ter
apud ARRIADA, 2012, p. 77).
dimensão da pouca variedade bibliográfica.
As reminiscências foram publicadas pela primeira vez na década de 1880 e referem-se à primeira metade do século XIX.
1
avaliar a perfeição das letras, e ainda apresentava
Disponível em: <http://editorial.up.pt/livro/show/463>. Acesso em: 10.set.2012.
2
Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX
19
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Segundo Maria Helena Bastos, o método empregado por Antônio D’Ávila era o jesuítico. Se observarmos a descrição de Azevedo e de Coruja podemos realmente perceber características do
Ratio Studiorum, o método pedagógico dos jesuítas, no cotidiano da sala de aula. A própria
ensino mútuo, era particular, ministrada pelo padre Juliano de Faria Lobato (SCHNEIDER, 1993). Um dos motivos pelos quais os governantes do Império optaram por divulgar o método de Lancaster era o seu aproveitamento em relação
figura do decurião é um indício. O decurião era
ao número de alunos por sala de aula. Assim, a
o aluno que colaborava com os cuidados em
primeira lei sobre instrução pública aprovada pela
relação à disciplina e organização da aula, que
Assembleia Legislativa Nacional, em 1827, previa
teoricamente deveria ser dividia em decúrias, ou
escolas de primeiras letras em todas as cidades,
seja, grupos de dez alunos (HISTEDBR, s/d).
vilas e lugares populosos, e todas elas deveriam ser
Antônio Coruja também se tornou professor
de ensino mútuo.
em Porto Alegre. Sobre o começo de sua
“O método mútuo, também chamado de
carreira, Maria Helena Bastos afirma
monitorial ou lancasteriano, baseava-se no
que:
aproveitamento dos alunos mais adiantados “O Conselho da Província de São
como auxiliares do professor no ensino de
Pedro do Rio Grande do Sul querendo
classes numerosas. [...] A maior habilidade
metodizar a instrução pública pediu a
exigida, a ser desenvolvida no processo de
criação de uma escola de ensino mútuo na capital. Para isso firmou contrato em 18 de setembro de l825, com Antônio Álvares Pereira (Coruja) pelo qual este se comprometia a ir ao Rio de Janeiro habilitar-se na pratica do método” (SCHNEIDER, 1993, p. 25). No jornal Correio do Povo é anunciada a inauguração, em agosto de 1827, da segunda aula de
ensino e aprendizagem, no plano pedagógico de Lancaster, era a memória e não a fluência verbal, não se admitia conversa. Esta era considerada uma atitude de indisciplina, já que no entendimento de Lancaster não era possível falar e aprender ao mesmo tempo” (NASCIMENTO, s/d).
ensino mútuo de Antônio Alves Pereira Coruja3. Até
A forma de castigar os alunos apresenta-se
então, Porto Alegre possuía apenas uma escola de
detalhadamente na metodologia de Lancaster, prevendo
Disponível em: <http://www.correiodopovo.com.br/Impresso/?Ano=117 &Numero=307&Caderno=0&Noticia=449841>. Acesso me: 17.set.2012.
3
20
castigos
morais
e
castigos
para
“constranger fisicamente” com o objetivo de
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Apenas as classes média e alta conseguiam ter acesso ao ensino, através das aulas e escolas particulares. Assim mesmo, dependendo do local, precisavam encaminhar seus filhos para Porto Alegre, onde colégios internos os recebiam. Em meados do século XIX havia várias escolas particulares em Porto Alegre. Uma delas, o Colégio São João, localizava-se na Rua Andrade Método Mútuo
Neves, sendo dirigida por Qorpo Santo4, que
“ter pregado no corpo a marca de punição”
se notabilizou como dramaturgo (ESPÍRITO
(NASCIMENTO, s/d).
SANTO, 2006). Qorpo Santo iniciou sua carreira docente como professor de uma escola
Apesar da adoção do novo método,
pública.
nenhum investimento de vulto foi
O Colégio Gomes era o preferido pela
realizado na estrutura educacional, o que gerava a impossibilidade de aplicá-
elite
sul-rio-grandense,
concentrando
lo corretamente. O Professor Coruja,
um grande número de alunos. Ele se
inclusive, reclamava da “necessidade de
localizava na Rua Duque de Caxias. Seu
contratação de um professor adjunto,
fundador, Fernando Gomes, mantinha
que o ajude e o substitua em seu impedimento;
uma aula de instrução elementar diferente da
de compra de exemplares de leitura impressos e
maioria das escolas. Ele primava pela comunicação
os utensílios necessários” (BASTOS, 2006, p. 165).
com os alunos sem a utilização de castigos
Com a falta de subsídios e de apoio aos professores, incluindo seus baixos salários, em todas as províncias do Brasil observamos um alto índice de analfabetismo, o que perdurará
violentos. O colégio chegou a ter 95 alunos internos, que nele se matriculavam pela metodologia mais “humana” e centrada nos exames preparatórios para a faculdade (ARRIADA, 2007, p. 101).
até o Brasil República. Em 1890 “a taxa de
O crescimento das escolas particulares era
analfabetismo era de 67,2%, herança do período
apoiado pelo Governo Imperial. Em 1879, foi
imperial” (FRIZON, 2010, p. 146).
4
Seu nome de batismo era José Joaquim de Campos Leão (1829 – 1883).
Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX
21
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Os
comerciantes,
artesãos,
arquitetos,
professores e demais profissionais de origem germânica estavam bem inseridos na economia local durante o século XIX. Já no aspecto cultural, é perceptível uma tendência em organizarem seus próprios espaços, criando templos religiosos, clubes de lazer, de esporte, de beneficência e de ensino. Para esses imigrantes, a formação dos filhos era considerada obrigatória e fundamental. Lembremos Irmãs Engel e suas alunas do Evangelisches Stift (Novo Hamburgo)
que, nessa época, a Alemanha já havia passado por
baixado o decreto nacional 7.247, conhecido
uma etapa de consolidação do sistema escolar, sendo
como Reforma Leôncio de Carvalho, de visível
a cultura da escola fundamental para a formação
cunho liberal. O seu oitavo artigo refere-
dos cidadãos alemães e também para
se à possibilidade subvenção às escolas
o processo de unificação daquele país.
particulares de todas as províncias
No entanto, a questão religiosa, que na
(SAVIANI, 2007, p. 138).
Alemanha dividia a população também
Outra característica marcante do
repercute nas primeiras escolas étnicas
sistema de instrução em Porto Alegre
que fundam no Brasil. Veja a realidade de
é a criação de escolas étnicas alemãs. O núcleo
Porto Alegre:
germânico era significativo na capital não só em
“[...] em 1866 já havia uma Deutsche Schule, a
números, mas em variedade de ocupações, como
qual viria se juntar, em 1860, uma escola para moças,
salienta Magda Gans (2004, p. 21):
sob a direção das duas irmãs Engel (Amalie e Lina)
“Não existia, em Porto Alegre, apenas um grupo
[...]. Em 1870 o Professor Dr. Heinrich Wilhelm
restrito de comerciantes [alemães] enriquecidos pelo
Stahl [...] se estabelece com uma escola para rapazes,
escoamento da produção colonial ou de importadores
também, na Rua Senhor dos Passos. Também em
de manufaturados, situação já constatada pela
1870 a comunidade evangélica organiza uma escola
historiografia, mas também um segmento médio
elementar paroquial sob a direção do Professor
diversificado
Friedrich Schultz [...] a escola começou a funcionar
e
importante
numericamente,
amplamente inserido na vida da cidade”.
22
em 8 de janeiro de 1870 com 50 alunos.”
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
“Os alunos católicos frequentavam a escola do Professor Clemens Wallau, na Rua dos Andradas [...].
“[...] Agora o padre balançava-se
Outra escola particular católica era a do Professor Honorat
de leve na sua cadeira e dizia:
Volkmer na Rua do Rosário” (TELLES, 1974, p. 40).
– Ainda hoje o Coronel Amaral estava se
Essas escolas confessionais, evangélicas ou
queixando que o negócio de charque vai
católicas, eram voltadas estritamente à população teuta, tendo o alemão como a língua oficial em que todas as matérias eram ensinadas. A maioria delas não pode ser caracterizada como instituições escolares, mas como aulas particulares oferecidas por determinados professores para grupos de alunos. Alguns estudantes das escolas citada acima
muito mal. – Mas esta província não pode depender eternamente do charque e do couro! – exclamou Winter. – Foi um erro terem abandonado o trigo. É uma insensatez não cuidar dos rebanhos, um crime não cultivar melhor a terra. Havia outros problemas sérios: o da
eram mantidos por bolsas de estudos oferecidas
instrução pública, por exemplo. Existiriam
pela Associação Beneficente e Educacional de
quando muito umas oitenta escolas em
1858 , mantenedora do Colégio Farroupilha, que
toda a Província, e todas eram de primeiras
5
seria criado algumas décadas depois. A partir, então, das escolas étnicas, de alguns colégios de ensino secundário, das escolas públicas de ensino mútuo e das diversas aulas particulares
letras. Havia uma assustadora escassez de professores. (Erico Verissimo. O Tempo e o Vento – O Continente. p. 77)
de primeiras letras a instituição Escola começou a ser construída. A transmissão de saberes e de condutas passou, aos poucos, a ser dividida entre a família e a escola, mas de uma forma muito lenta e restrita. Para entendermos esse contexto, lembremos em primeiro lugar que o Brasil era escravagista, sendo o ensino formal vedado aos escravos. O No século XIX chamava-se Sociedade Beneficente Alemã, “Deutscher Hilfsverein”. No subcapítulo “Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência”, na página XXX, mais informações sobre a ABE de 1858.
5
processo de escolarização dos negros só teve impulso após a abolição, e de forma gradativa. Em segundo lugar, podemos salientar a força do patriarcalismo nessa época. Essa força acaba por ser determinante para a proporção de meninas encaminhas aos estudos, pois a maioria das famílias não via necessidade de ver suas filhas instruídas. Em terceiro lugar, lembremos que o Brasil Império era extremamente agrário, e, por consequência,
Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX
23
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
os centros urbanos eram poucos e pequenos. A
Qualquer comunidade fará seu planejamento
maioria das localidades longínquas não tinha sequer
e tomará suas atitudes a partir da realidade que
escola elementar. Segundo Moacyr Flores, muitos
se apresenta. Essa afirmativa é importante para
estancieiros gaúchos optavam por pagar a professores
entender o porquê da proliferação, na Província,
particulares para irem à fazenda e ensinar as primeiras
de escolas étnicas teuto-brasileiras. Quando os
letras a seus filhos. (FLORES, 2002, p. 54)
imigrantes alemães começaram a organizar certa
As comunidades estavam espalhadas, muitas delas em espaços de difícil acesso para os meios de transporte que havia, dificultando a contratação de professores. É o caso, também, das comunidades de imigrantes alemães, que a partir de 1824 povoaram as áreas rurais do Sul. Jean Roche faz referência a esse contexto através de uma carta escrita por um imigrante em 1832: “Os começos foram muito modestos: ‘Aqui ainda não há escolas regulares, como na Alemanha, e as que existem ficam muito afastadas para que possamos mandar para elas as crianças; por conseguinte, somos nós mesmos obrigados a instruílas’.
estrutura urbana na Serra Gaúcha e seu entorno, não receberam nenhum apoio para a educação de seus filhos. É claro que poderiam optar em não se preocupar com a instrução, uma vez que o ensino não era obrigatório no Brasil. No entanto, depois da moradia uma das grandes preocupações dessas comunidades era a formação de seus filhos, o que incluía a aprendizagem da escrita. Enfim, lenta, muito lenta foi a assimilação das crianças nas instituições de ensino. Crianças que só falavam alemão, crianças escravas, meninas que queriam mais do que saber ler e bordar, meninos e meninas pobres, e ainda aqueles que moravam lá longe. Para que essas crianças e tantas outras fossem acolhidas nas escolas, muitos
Escrevia um colono de Dois Irmãos em 1832.
paradigmas tiveram que ser quebrados, novas
Desse ensino doméstico nasceram as primeiras escolas.
representações acerca da sociedade precisaram
Confiavam as crianças a uma pessoa idosa ou incapaz
ser gestadas e mesmo assim ainda estamos nos
de cultivar a terra, um pouco mais adiantada que as
transformando para acolhê-las. Acreditamos que
outras em leitura, escrita e cálculo, encarregada de
essa transformação teve um momento importante
ensinar as primeiras noções. A escolaridade era curta,
no final do século XIX e início do século XX.
geralmente um ano, muitas vezes interrompida pelos trabalhos agrícolas” (ROCHE, 1969, p. 664).
24
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Pátio principal - 2o Quartel do Século XX
Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX
25
CAPÍTULO I
Porto Alegre no final do século modernidade e escola
N
o imaginário dos porto-alegrenses, qual
inimaginável, possibilitando ir além da busca pela
era o sentido conferido à educação no
sobrevivência física.
final do século XIX?
Entre as bases institucionais do homem
As evidências nos levam a crer que esse sentido
moderno encontramos a Escola. Ela se apresenta
está entrelaçado a outros tantos que compõem a
como o espaço ideal para a socialização das
construção do ideal de modernidade. Junto a esse
crianças e dos jovens. Torna-se, pois, obrigação
novo pensar estamos diante de uma forte
da família e do Estado a busca pela
transformação econômica e social, na qual
instrução. No entanto essa forma de
as comunidades de todos os continentes se
conduzir a educação e de agir sob
influenciam e se recriam a partir de ideais
o signo da modernidade esbarra na
pautados pela secularização, liberalismo,
estrutura urbana de muitas cidades.
positivismo e industrialização.6
Vejamos o caso de Porto Alegre.
Nesse período já percebemos traços típicos da representação de modernidade. O conhecimento é visto como a porta de entrada para o poder transformador do homem em relação à natureza e do homem para com os seus semelhantes. Estamos diante de grandes possibilidades, em que a transmissão dos conhecimentos historicamente acumulados,
juntamente
com
os
novos
conhecimentos advindos da ciência, permite o Secularização refere-se ao processo que inicia com o Renascimento em que a Igreja católica começa a perder sua credibilidade, e, por consequência, diminui seu poder político e sua força na produção de conhecimento.
6
No ano de 1848, Porto Alegre apresentava 16.900 habitantes. Trinta anos depois, em 1872, já contava 43.998 habitantes (PESAVENTO, 1999, p. 254). Durante esse processo, ouve um significativo crescimento das camadas médias representadas por profissionais liberais, comerciantes e funcionários públicos, entre outros. Para atender as exigências dessa comunidade – que mantinha contatos com outras capitais e, por conseguinte, apresentava a expectativa de uma cidade moderna –, vários projetos particulares e públicos tentavam dar conta das transformações
Porto Alegre no final do século - modernidade e escola
27
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
necessárias. Assim, foi realizada a instalação de equipamentos urbanos, como energia elétrica, saneamento pluvial e linhas de bondes.
“Pela primeira vez na história, se pensou que a educação de todos e cada um era a condição
Mas, o ritmo de transformação urbana não
necessária para a salvação, o progresso, ou o
acompanhava o imaginário de modernidade. A
desenvolvimento econômico e social” (NOGUERA-
historiadora Sandra Pesavento constatou – através
RAMIREZ, 2009, p. 23).
do pensamento de literatos do fin de siècle, como
Como sabemos, no trem da história, no próxi-
Zeferino Brasil e Paulino Azurenha – que a sensação
mo vagão, depois do pensamento, vem a demanda,
era de pertencer a uma aldeia/metrópole onde “o
que nesse caso é atendida por um número expressi-
meio é acanhado, triunfam os ineptos, sufocam-se
vo de escolas particulares devido à pouca qualidade
os talentos” (PESAVENTO, 199, p. 363).
do ensino público. Esse contexto se mantém quase
Em
termos
culturais
também
inalterado até o início do século XX.
encontramos a cidade oscilando entre a
Embora a Proclamação da República
aldeia e a metrópole. Em relatos de viajantes
tenha ocorrido em 1889, o Partido
percebemos as características do circuito
Republicano Rio-grandense só iniciou
cultural. Wilhelm Breitenbach, professor e
um processo de reestruturação do ensino
jornalista alemão, morou em Porto Alegre
público depois de um longo período
entre 1880 e 1883. Consta em suas memórias a seguinte
de lutas políticas internas – inclusive a chamada Revolução Federalista – e de poucos
impressão: “As condições sociais em Porto Alegre são bem agradáveis e tem-se praticamente tudo o que é oferecido nas nossas cidades provinciais de porte médio. Concertos, teatro, carreiras, clubes recreativos, bons restaurantes e assim por diante” (NOAL FILHO, 2004, p. 185). A modernidade, o progresso, dá seus ares também através dos cinematógrafos, dos cafés à francesa e da abertura de várias escolas particulares.
28
Mas, por que escolas?
subsídios econômicos. Antes disso, nos primeiros anos da República, as políticas públicas relativas à educação eram marcadas pela desoficialização do ensino e pela concessão de alguns subsídios às escolas particulares, para que contribuíssem com o Estado na área da educação. No contexto nacional, foi instituída em 1890 a Reforma Benjamim Constant que garantiu a liberdade de ensino por um lado, mas por outro
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
No início da República não havia nenhuma escola de ensino secundário em Porto Alegre. O Ateneu Rio-grandense já havia fechado. Ele foi criado em 1871 em substituição à Escola Dom Afonso. O Ateneu propunha-se a ensinar em quatro anos “português, latim, francês, inglês, alemão, desenho, matemáticas, geografia e história, filosofia, retórica e ciências naturais” (Arriada, 2007 p. 84). Embora apresentasse bons professores, e um amplo prédio construído especialmente para esse estabelecimento, Ferrari & Irmão. Praça Marechal Deodoro (Praça da Matriz), 1888.
orientou os estados brasileiros a manter o ensino
ele fechou em 1873. Um dos motivos foi a falta de um internato para quem morava mais afastado da cidade. Outro foi a obrigação dos alunos
gratuito nas escolas primárias.
comparecerem em todas as cadeiras, que
Na prática, os problemas nessas primeiras
décadas
de
eram muitas, isso não era compatível com
República
os interesses dos alunos, que almejavam
continuaram os mesmos. No Rio Grande
concluir rapidamente o ensino secundário,
do Sul, embora tivesse aumentado o
tendo como foco a Faculdade, Arriada
número de escolas primárias, não foi o
(2007 p. 95) explica:
suficiente para dar conta da população que crescia.
“Os liceus provinciais, além de mal aparelhados
E para a rede de ensino existente os investimentos eram poucos, com baixos salários dos professores.
e
Quanto ao ensino secundário, Patrícia Marchand
competir em condições de igualdade com os colégios
(2006, p. 102) lembra que:
particulares, que se adequavam às demandas
“No
final
do
Império,
continuava
sem
organicidade o ensino secundário. Não havia necessidade de concluir o curso para ingressar no ensino superior e sim estar habilitado para as disciplinas
pessimamente
administrados,
não
podiam
da época, ministrar um ensino que atendesse as necessidades dos alunos e que os capacitasse o mais rápido possível para os exames preparatórios. Podese acrescentar ainda que, via de regra, a qualidade
exigidas para tal ingresso. Este sistema de exames
do ensino ministrado nos colégios particulares era
incentivava os estudos parcelados e assistemáticos e a
melhor que nas escolas públicas, desviando assim
frequência livre aos estudos preparatórios”.
um expressivo número de alunos”.
Porto Alegre no final do século - modernidade e escola
29
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Um dos colégios particulares que se tornou
admissão em cursos superiores, tendo já regular
referência nas últimas décadas do século XIX foi o
número de alumnos dado entrada em diversas
Colégio Rio-grandense criado por Apeles Porto
academias do paiz. Aceitam-se externos, semi-
Alegre em 1876. “Esse estabelecimento funcionou,
pensionistas, menores de 14 anos, garantindo-se bons
por muito tempo, à Rua Duque de Caxias defronte
cuidados materiais, boa hygiene, vida de família
à Praça Conde de Porto Alegre” (FRANCO, 1998,
e educação esmerada” (Almanaque de Alfredo
p. 325). Apeles era irmão de Apolinário Porto
Ferreira Rodrigues para 1898 – Anúncios).
Alegre, ambos estudaram no Colégio Gomes e ambos fundaram escolas. Apolinário criou o Instituto Brasileiro “com regime de internato para meninos, estabelecido no Caminho do Meio à altura das atuais ruas Giordano Bruno e Francisco Ferrer” (Ib Idem, p. 326).
Como se vê essa é mais uma escolas secundárias que apresentava um viés preparatório para as camadas média e alta da sociedade. Para a maioria do povo restava apenas o ensino primário, além de algumas escolas comunitárias criadas a partir do trabalho voluntário
Quanto à presença de imigrantes no sistema educacional, também se destacaram os franceses. Walter Spalding (1967, p. 229) informa que Emmeline Coursteilh, fundou o Sevigné, colégio que dirigiu até 1906, quando ela e seu marido, agente consular, voltaram para a França. Ele cita
de professores ou ordens religiosas. Evidências nesse sentido podem ser observadas através das atas da Câmara de Vereadores da Capital: NOVEMBRO DE 1897 Autorizam
Intendente
a
conceder,
um casal de franceses, Ivo Corseuil e D. Cecília
gratuitamente, a licença para um professor construir
Corseuil. Podemos acompanhar detalhes do ensino
um prédio para aulas a meninos pobres.
dessa escola através de um anúncio publicado na tese de Arriada (2007 p. 95):
MARÇO DE 1899 Construção para a Escola de Meninos
Collegios Ivo Affonso Corseuil
Paupérrimos, pedindo ainda para não pagar as
“Curso Primário e Secundário, Rua Marechal
décimas futuras e, mais um auxílio pecuniário para
Floriano, N.s 194, 196 e 198 (Porto Alegre).
a formação do patrimônio daquele estabelecimento.
Este collegio, vantajosamente conhecido, prepara
(PREFEITURA, 1886/1900)
alumnos para o commercio, empregos públicos,
30
o
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Nessa época, em São Leopoldo, havia o
a Escola de Meninos, revertia o valor das
Ginásio Nossa Senhora da Conceição, criado por
mensalidades pagas pelos pais apenas para as
padres jesuítas alemães. Ele era frequentado não só
necessidades da escola. Seus sócios tinham como
por germânicos como também por vários filhos da
principal objetivo contribuir com a vida econômica
elite política e social gaúcha. No ano de 1890, esse
e social dos teuto-brasileiros. Como as demais
estabelecimento abre outra escola particular, mas
escolas de origem germânica, esta se propunha
em Porto Alegre, conhecida como Colégio dos
a ensinar na língua alemã. No entanto, em seu
Padres (MONTEIRO, 2011). Esse colégio dividia-
currículo, desde o primeiro ano, constaram aulas
se em duas partes, uma para brasileiros e outra
de português, consideradas fundamentais para que
para alemães e seus descendentes. “Em 1908 foi
os descendentes de alemães pudessem exercer a
reconhecido como estabelecimento independente
sua cidadania no Brasil.
do Colégio Nossa Senhora. da Conceição”,
Outra diferença em relação às demais escolas
passando mais tarde a ter o nome de
étnicas é o investimento na qualidade do
Anchieta. (FRANCO, 1998, p. 29)
ensino. A associação Beneficente Alemã
A educação protestante também começou a se estruturar em Porto Alegre
publicou em ata de 1884 o projeto da escola, de onde destacamos:
no final do século XIX. Em 1885 é criado
“[...] No tocante à renda, a taxa escolar
o Colégio Americano, então chamado
não deve ser muito baixa. Partimos do ponto
Colégio Evangélico Misto, criado por
de vista de que não é o objetivo do Hilfsverein oferecer ao público alemão uma escola que facilite
missionárias metodistas. Em 1886 foi criada a Escola de Meninos da Associação Beneficente Alemã7, o Colégio Farroupilha. Essa instituição era interconfessional, não sendo atrelada a nenhuma ordem religiosa. Além disso, não visava lucros, o que a diferenciava das demais escolas particulares fundadas por leigos.
pecuniariamente a educação de seus filhos, mas que a sua finalidade, pela união das forças e em virtude da posição independente, permita aos professores criar algo melhor e mais sólido do que até agora as escolas alemãs se encontram em condições de oferecer”. (TELLES, 1974, p. 48) Como vemos, a escola da Associação Beneficente
A Associação Beneficente Alemã (Hilfsverein),
Alemã primava pela excelência a partir da valorização
além de prever uma subvenção mensal para
de seus profissionais e por um currículo voltado para
7
Em alemão o nome da escola é Knabenschule des Deutsches Hilfsvereins.
a vida, como observamos em seu projeto:
Porto Alegre no final do século - modernidade e escola
31
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
“A escola, cuja criação nós recomendamos, deve dar a um rapaz um ensino tal, partindo dos rudimentos até um determinado grau, que, uma vez ele conclua o terceiro ou quarto ano esteja capacitado para enfrentar a vida, quer ele deseje abraçar uma profissão manual ou se dedicar à atividade comercial. No currículo devem constar as seguintes matérias: Leitura, as quatro operações, escrever, Ensino Prático, Canto, Desenho, Geografia, História Universal, História Natural, Alemão, Português, Francês, Inglês, Geometria, Física, Literatura, Ginástica” (TELLES, 1974, p. 48). Nos primeiros anos havia aulas de Mecânica como parte do Ensino Prático. Veja que para os sócios da Associação Beneficente Alemã a representação em relação à formação das crianças e adolescentes precisava abarcar aulas práticas, domínio de vários idiomas e estudo de todos os Pátio Interno do prédio do Colégio Farroupilha, construído entre 1893 e 1895
campos do conhecimento. No final do século XIX, todas as escolas
e becos, onde viam, ouviam e conviviam com
gaúchas, particulares ou não, se mantêm sob forte
novas ideias, novos inventos, novos formatos de
insegurança, própria de períodos em que reinam
relação – acabou a escravidão. Ou seja: não havia
sérios conflitos políticos, mas nem por isso elas
criança sem educação, já criança sem escola...
deixaram de ser importantes para o amadurecimento do sistema educacional do Rio Grande do Sul. E as crianças do século XIX? Foram todas educadas, mas para as sensibilidades e costumes dessa época outros ambientes eram fundamentais: praças, ruas, pátios, rios, templos, chácaras, docas
32
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
O Rio Grande do Sul, o Positivismo e a educação - Primeira República (1889-1930)
Q
uando finalmente a República, tão
que culminou com uma guerra civil. Em termos
esperada por muitos, chegou – iro-
políticos, os maragatos ou federalistas lutavam a
nicamente por um golpe de estado – trouxe
favor do parlamentarismo, liderados por Gaspar
com ela novas possibilidades de se pensar a
Silveira Martins; enquanto os republicanos, também
sociedade. Já em 1889 o Partido Republicano
chamados de castilhistas ou pica-paus, lutavam pelo
Rio-grandense (PRR) assumiu o governo do
modelo republicano (POSSAMAI, 1993). Quanto
Estado. Esse partido era formado por
ao poder econômico, Jaime Giolo (2012)
lideranças ligadas às esferas econômicas
informa que:
que começavam a ascender socialmente e economicamente, como, por exemplo, comerciantes, profissionais liberais, pequenos agricultores e fazendeiros do centro-norte do Estado.
“O momento representava uma crise interna de um bloco histórico, no qual a classe dominante tradicional (ligada à economia pastoril da região da Campanha) teve que abrir espaço a uma nova elite que se
O PRR era um partido cuja base doutrinária
constituiu em torno de outras atividades econômicas,
era o Positivismo. Essa doutrina tem como grande
rurais (policultura das regiões coloniais e pecuária
mentor o francês Augusto Conte, e foram seus
do centro-norte do Rio Grande do Sul) e urbanas
preceitos filosóficos e políticos que impulsionaram
(comércio, indústria, bancos, etc.)”.
a modernização e o progresso no cenário políticosocial gaúcho.
A crise política e econômica perdurou por décadas. Nesse ínterim, a educação pública e
Essas transformações, no entanto, só começaram
particular se manteve, mas, “por conta e risco”
a ocorrer após um término de um longo período
dos professores, diretores e demais membros das
conhecido como Revolução Federalista (1892-
comunidades escolares. O apoio do aparelho
1895), um período de intensa disputa política
estatal, bem como os parâmetros para um ensino
O Rio Grande do Sul, o Positivismo e a educação - Primeira República (1889-1930)
33
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Escola Étnica de Taquara (RS), década de 1920
nacionalizado, era muito restrito, se bem que
de oferecer a sustentação pedagógica imprescindível ao
a representação em relação à necessidade de
escrutínio político (BOTO, 1999, p. 279)”.
educação já se fazia notar nos discursos políticos
A
tanto de pica-paus quanto de maragatos. Era consenso pensar que:
sustentação
pedagógica,
baseada
na
doutrina positivista, centrava-se na preparação através da escola para o trabalho, moral e civismo.
“Sem educação, o povo permaneceria então a
Para Conte o ensino deveria ser “enciclopédico,
eterna criança a ser tutelada. Democracia em suas mãos
útil e verdadeiro, sem teologismo nem metafísica.
poderia vir a se tornar arma de fogo. Daí o intuito claro
Isto supõe a subordinação do espírito de detalhe ao de conjunto, da análise à síntese, do progresso
In: VERBAND, 1924
8
34
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
à ordem, do egoísmo ao altruísmo” (RIBEIRO Jr.,
É nesse contexto que os governantes cercam-se
2005, p. 120). Daí a importância do estudo das
de um novo método pedagógico, criado na Europa,
ciências naturais e sociais e também das artes, em
chamado de intuitivo. Segundo Saviani (2007, p. 138):
especial da poesia e do canto.
“O método intuitivo, conhecido como lições
Através do estudo das ciências sociais – que
de coisas, foi concebido com o intuito de resolver o
nas escolas gaúchas desmembrou-se em ensino de
problema da ineficiência do ensino diante de sua
civismo, moral, história e geografia – era possível
inadequação às exigências sociais decorrentes da
contribuir para neutralizar os pendores egoístas.
Revolução Industrial que se processa entre o final do
No pensamento de Augusto Conte, “a educação
século XVIII e meados do século XIX. Ao mesmo
deve ter por fim sistematizar essa reação geral da
tempo, essa mesma Revolução Industrial viabilizou
sociedade sobre a vida individual, preparando
a produção de novos materiais didáticos como
especialmente a conduta do indivíduo.
suporte físico do novo método de ensino”.
Toda dificuldade educativa está, para
Assim, mapas, globos terrestres,
ele, em vencer a preponderância dos
cartazes e quadros coloridos para as
instintos inferiores” (RIBEIRO JR.,
aulas de história, português ou ciência,
2005, p. 131).
indicam uma nova relação entre o
A doutrina positivista teve desdobra-
professor e o aluno. A figura do mestre,
mentos e adaptações diversas no Brasil.
solitário com sua oratória e escrita, é
No Rio Grande do Sul os teóricos e técnicos do
considerada pouco produtiva. Ele, agora, conta
PRR se depararam com um ineficiente sistema pú-
com recursos que contribuem para que o aluno,
blico.
através dos sentidos e da prática, desenvolva seus
Nos primeiros anos de ensino as crianças
conhecimentos.
pouco aprendiam em relação à leitura, escrita
Na versão um tanto autoritária da doutrina
e cálculos, sendo os métodos utilizados até
positivista no Rio Grande do Sul, a unificação
então baseados na memorização, priorizando a
do ensino foi colocada em prática através de
“abstração, valorizar a repetição em detrimento
um controle em relação aos livros, materiais e
da compreensão e impor conteúdos sem exame e
regulamentos. Em relação aos livros, por exemplo,
discussão” (Valdemarin, 2006, p. 90).
foram escolhidas para a alfabetização as cartilhas
O Rio Grande do Sul, o Positivismo e a educação - Primeira República (1889-1930)
35
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
de João de Deus, editadas em Portugal. Essa unificação já estava presente no decreto estadual número 239, promulgado em 1899: Art. 3o - É adoptado o methodo intuitivo e prático, começando pela observação de objectos simples, para elevar-se depois a ideia abscracta, à comparação, à generalização e ao raciocínio, vedando-se qualquer ensino empírico, fundado exclusivamente em exercícios de memória [...]. As lições de leitura serão dadas à primeira secção da primeira classe elementar, na forma do artigo anterior, em mappas muraes, pelo methodo de João de Deus (TRINDADE, 2001, p. 126). Também
ocorre
modificação
quanto
à
estrutura escolar. No início do século XX, as “aulas isoladas” cedem lugar às escolas seriadas, onde vários professores são controlados por um diretor que, por sua vez, é controlado por um
inspetor geral da instrução pública. Dessa forma, o poder e arbitragem do professor diminuem. Entre as escolas seriadas públicas ganharam força os chamados grupos escolares: “Os primeiros dados a respeito dos grupos escolares indicam que em 1915 eram seis no estado; subindo para 28 grupos em 1926, atendendo a 5.028 alunos matriculados. Os grupos escolares representavam uma primeira tentativa de reunir
36
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Colégio Farroupilha, peça teatral - 1909 O Rio Grande do Sul, o Positivismo e a educação - Primeira República (1889-1930)
37
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Parque Farroupilha, Avenida João Pessoa, década de 1920
turmas de alunos e professores a fim de tornar o ensino mais vantajoso e orgânico. À medida que fossem realizadas certas exigências regulamentares, o grupo passaria à categoria de colégio elementar’ (Giolo, apud ROCHA, 2010, p. 43). Quanto às escolas particulares podemos observar que algumas delas se identificam com as novas propostas republicanas de ensino. Antes mesmo do decreto número 239 de 1899, citado acima, elas já se utilizavam de instrumentos pedagógicos “modernos”, até porque, muitas, eram formadas por professores estrangeiros, que já trabalhavam a partir do método intuitivo. Em Porto Alegre, um exemplo é o Colégio Americano, que desde a década de 1880 desenvolvia uma “proposta pedagógica de valorização do indivíduo, da educação centrada no aluno e nas suas necessidades básicas” (DORNELES, 2006, p. 68).
38
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Diretor Kramer e professores do Colégio Farroupilha - 1929 O Rio Grande do Sul, o Positivismo e a educação - Primeira República (1889-1930)
39
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Para levar a essa reflexão havia um interesse da equipe diretiva do Colégio Farroupilha em adquirir equipamentos para as aulas. Ainda em 1899, por exemplo, a escola aproveitou a viagem de um dos sócios da associação mantenedora da escola para a Alemanha e encomendou “aparelhos de química” (TELLES, 1974, p. 71). Segundo Telles, as aulas de laboratório geravam “um interesse enorme” por parte dos alunos. Laboratório de Química – Primeira Metade do século XX
Outro exemplo é o Colégio Farroupilha. Essa instituição tinha uma proposta diferenciada para a época em que foi criada, valorizando o ensino prático e
contratando
apenas
professores
habilitados, com formação em educação. Os
professores
utilizavam
uma
abordagem indutiva, o conteúdo não vinha apenas da eloquência do mestre e posterior memorização dos alunos. Em 1891, o relatório do conselho escolar salientava que os resultados dos exames orais – na época eram públicos, participando inclusive os pais – foram muito bons e explica o porquê:
40
Sendo essa uma escola voltada para jovens teuto-brasileiros e formada por uma associação beneficente alemã, a influência do pensamento
pedagógico
germânico
era total, ainda mais se levarmos em consideração que os professores contratados até então possuíam formação e experiência em escolas germânicas. Na década de 1830, o alemão Federico Froebel já praticava a sua metodologia que, no século XIX, se propagou pela Europa e América. Essa metodologia era basicamente intuitiva. Froebel partia da ideia de que:
“Causaram muito boa impressão aos ouvintes e
“A causa da imperfeição de nossas escolas e de
demonstraram que os alunos não foram ensinados para
nosso ensino está em que instruímos nossos alunos sem
uma repetição irrefletida, mas para um pensamento
que a necessidade se haja ainda manifestado neles,
autônomo. O que os rapazes responderam eles haviam
ou então depois de lhes havermos amesquinhado a
refletido e compreendido” (TELLES, 1974, p. 56).
necessidade original” (NISKIER, 2001, p. 135).
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Colégio Farroupilha, Terceira Classe de meninos – 1912
Quando iniciou o século XX, o Colégio
no ano de 1900 (Kreutz, apud FONSECA, 2007,
Farroupilha tinha mais de 200 alunos. A
p. 47). No entanto, conforme foi se delineando
metodologia utilizada certamente influenciou
uma política de uniformização da cultura em solo
essa ascensão, uma vez que vinha ao encontro de
brasileiro, essas escolas sofreram modificações
uma nova representação em relação à escola: não
radicais, fecharam suas portas ou foram estatizadas.
mais como lugar de instruir, mas um espaço de aprendizado a partir da ciência da educação, ou seja, a pedagogia. Além do Colégio Farroupilha, havia no Rio Grande do Sul 308 escolas étnicas de língua alemã O Rio Grande do Sul, o Positivismo e a educação - Primeira República (1889-1930)
41
CAPÍTULO I
Educação e Nacionalização Compulsória – 1930/1940
I
ndustrialização, crescimento das cidades,
periódica de reformas parciais e frequentemente
avanços tecnológicos, crise do modelo
arbitrárias, lançadas sem solidez econômica e
econômico baseado na agro-exportação essas são
sem uma visão global do problema, em todos seus
algumas características da etapa de moderniza-
aspectos, nos deixa antes a impressão desoladora de
ção que o Brasil atingira durante as décadas de
construções isoladas, algumas já em ruína, outras
1920/30. Acompanhando tal conjuntura, ocorreu
abandonadas em seus alicerces, e as melhores, ainda
um rearranjo de poder e Getúlio Vargas
não em termos de serem despojadas de seus
assumiu o governo através de um golpe
andaimes [...]” (AZEVEDO, 2010, p. 37).
mas com o apoio da maioria do povo. Isso lhe garantiu a governabilidade até que pudesse criar leis para manter-se no poder de forma indefinida.
inovações
no
campo
educadores estavam muitíssimo focados em mudança! Com esse respaldo o governo provisório de Getúlio Vargas
Na chamada Era Vargas observamos várias
Os discursos e o cotidiano dos
educacional,
influenciadas pelo Movimento Escola Nova que, em 1932, publicou o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, assinado por lideranças da educação, como Anísio Teixeira e Fernando de
criou o Ministério da Educação e Cultura e a partir daí vez várias reformas. O ensino primário já estava em processo de “modernização” desde a década de 1920, com a criação dos grupos escolares, mas o ensino secundário não.
Azevedo. Nesse manifesto eles apontam a falta de
A reforma do ministro Francisco Campos,
unidade pedagógica e teórica, afirmando que não
de 1931, dividiu o ensino secundário, também
existia outro país...
chamado de Ginásio, em duas etapas. Além
“[...] onde a opinião se divida em maior número de cores [...] A situação atual, criada pela sucessão
disso, essa reforma “imprimiu organicidade ao ensino secundário por meio de várias estratégias escolares, como a seriação do currículo, a
Educação e Nacionalização Compulsória – 1930/1940
43
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
frequência obrigatória dos alunos, a imposição de um detalhado e regular sistema de avaliação discente e a reestruturação do sistema de inspeção federal” (DALLABRIDA, 2009, p. 185). O contexto de reforma nacional que culmina com a criação da Constituição Nacional de 1934 repercute no Rio Grande do Sul com algumas ações pontuais, como a criação da Secretaria de Estado dos Negócios da Educação Pública. No entanto,
Normalistas do Instituto de Educação – (Revista do Ensino, década de 1960)
essa secretaria, até 1938, focou-se mais em projetos
Católicos, por exemplo, através de reuniões e
internos relacionados à estrutura administrativa.
publicações, chegava até as comunidades rurais
Entre as escolas estaduais é importante observar o crescimento e a valoriza-
tornou-se:
ção da escola normal de Porto Alegre, o
“[...] instrumento privilegiado de
Instituto de Educação General Flores da
formação e atualização pedagógica dos
Cunha, que apresentava um curso secun-
professores paroquiais, seja pela apresentação
dário de formação para professores. Esse
de teorias e práticas novas, seja pela publicação
curso acompanhou as mudanças nas di-
pormenorizada de planos de aula para todas
retrizes da educação, de forma que, na década de
as disciplinas, submetendo-as à apreciação dos
1930, podemos observar no seu currículo a presen-
professores” (ARENDT, 2005, p. 17).
ça de aulas de “psicologia experimental aplicada à educação”, além das aulas de pedagogia, didática e legislação do ensino (LHULLIER, 1999, p. 26).
44
mais afastadas. O jornal que publicava
A Associação de Professores Evangélicos Alemães também tinha uma publicação em que postava “experiências e práticas de sala de aula”
Enquanto isso, até 1938, as escolas seguiam as
além de “questões metodológicas relativas a
diretrizes e métodos que consideravam apropriados.
diferentes disciplinas” (ARENDT, 2005, p. 61).
As associações de professores ligadas ao ensino
Chamava-se Jornal Geral do Professor no Rio
particular no Rio Grande do Sul vivenciavam
Grande do Sul e circulava por escolas particulares
movimentos intensos de formação do seu público
formadas, geralmente, por associações comunitárias
beneficiário.
evangélicas. Nessa publicação a metodologia
A
Associação
de
Professores
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Rua Dr. Vale – Bairro Floresta, década de 1930
indicada era influenciada pelas diretrizes da
Assim, as escolas teuto-brasileiras, além de
pedagogia germânica, inclusive algumas publicações
educar a partir de conhecimentos científicos
se originavam de periódicos da Alemanha.
e literários, tinham como importante diretriz
Conforme os imigrantes foram se adaptando ao Brasil, e aqui foram tendo filhos e construindo suas famílias, foi se delineando o termo teuto-brasileiro. Essa expressão dá significado ao sentimento de duplo pertencimento, mas isso não significava que se sentiam pertencendo a duas pátrias. A noção de duplo pertencimento vem da presença de dois países em suas vidas: um representando a origem; o outro a pátria, a cidadania.
a manutenção da cultura de origem, da qual se orgulhava, e cuja língua era uma espécie de guardiã das tradições. Por isso mesmo, não deveria ser esquecida. Isabel Arendt, que estudou a representação de germanidade entre os professores da Associação Evangélica, observa que assim como eles se sentiam parte do “grande povo alemão espalhado por todo o mundo”, achavam que o seu “jeito de ser e agir” muito contribuiria na
Educação e Nacionalização Compulsória – 1930/1940
45
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
do Sul devido à força da doutrina positivista. Na Constituição do Rio Grande do Sul de 1891 já estava previsto que: “O Estado de modo algum pode intervir na vida intelectual do povo. As ciências, as artes e a religião devem desenvolver-se independentemente do Estado. Seguindo o lema “aprenda quem quiser, ensine quem puder” possibilitou-se um enorme desenvolvimento das escolas particulares teutas” (DREHER, 1984, p. 43).
Colégio Farroupilha - Outubro de 1931
formação de bons cidadãos para lutar e trabalhar
Uma das escolas que se desenvolveram muito
pela pátria brasileira (2005, p. 116). Arendt chama
nesse período foi o Collegio Allemão de Pelotas,
atenção para um artigo publicado em
fundado em 1898. Sobre a germanidade
1931 no jornal da Associação, cujo tema
presente na escola, ainda na década de
era o Quinto Congresso Escolar, ocorrido
1930, Fonseca chama a atenção para os
em Porto Alegre. Nessa ocasião, segundo
livros em alemão que havia na escola:
a matéria, o então prefeito da cidade, Alberto Bins, afirmou em seu discurso “a
[...] o material impresso em língua alemã,
importância de manter a língua, costumes
enfocando o aprendizado do idioma, canções
e cultura herdada dos pais” (Ibidem, p. 16). Esse contexto nos leva a entender que as escolas étnicas recebiam apoio para manter as suas tradições de origem, o que vale para outras etnias. No ano de 1937, no Brasil, “havia 1.579 escolas alemãs, 396 italianas, 349 polonesas e 178 japonesas” (Kreutz
através dos livros didáticos que davam continuidade a um bem cultural, composto por um conjunto de valores e conhecimentos, comumente denominado germanismo, que circulava através da língua alemã. (FONSECA, 2007, p. 132)
et.al., apud RENK, 2009, p. 20). No Rio Grande do
O Colégio Farroupilha, na Porto Alegre da
Sul havia também a Escola Israelita, fundada em
década de 1930, apresentava aproximadamente
Porto Alegre na década de 1920.
380 alunos e chamava-se Hindenburgschule
A diversidade de origens e culturas era tolerada no Brasil, e mais ainda no Rio Grande
46
e conhecimento da terra natal, continuava presente
(Escola
Hindenburg),
em
homenagem
ao
presidente da Alemanha – marechal Paul Von
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Setembro, com canções brasileiras e alemãs. Após a introdução e saudação do Dr. Frederico Falk [diretor do Ginásio], aos convidados presentes, o aluno Jorge Geyer pronunciou a alocução principal, em português, e o Diretor finalizou a solenidade com a alocução alemã. No dia 7 uma delegação de 30 alunos e quatro professores desfilou diante do Presidente do Estado, General José Antônio Flores da Cunha” (TELLES, 1974, p. 129).
Colégio Farroupilha - Ginásio de 1937
Hindenburg (JACQUES, 2011). Já nas vésperas
Apenas dois meses após essa festividade, iniciou
de um novo golpe de estado no Brasil, em 1937,
um novo regime político ditatorial no Brasil: Getúlio
o projeto que tramitava no Ministério da
Vargas continuou no poder através de um
Educação para a criação de um ginásio
aparato regulamentar nada democrático.
nessa escola foi aprovado.
Nesse novo regime, a Educação
Nesse período pré-golpe no então
foi considerada peça-chave, digna de
Ginásio Teuto-Brasileiro Farroupilha, como
muitos investimentos. No entanto, esses
em qualquer outra escola étnica do Brasil,
investimentos vieram junto com uma
a cultura de origem estava presente no dia a dia dos
série de transformações na busca da criação de
estudantes. Assim, por exemplo, a maioria das aulas
uma só identidade para o povo brasileiro. Todos
era em alemão, língua falada nas casas dos alunos e
deveriam ser e agir como brasileiros. Mas o que
em vários locais de sociabilidade que frequentavam.
era ser brasileiro? A diversidade étnico-cultural do
No auditório da escola havia o busto de dois literatos
país era tão grande que descendentes de negros,
alemães, Friedrich Schiller e Johann Goethe, e nas
italianos, poloneses, japoneses, alemães, todos, sem
festividades, mesmo sendo comemorações referentes
exceção, ficaram atordoados! Porém, não havia
ao Brasil, a germanidade se manifestava. Na ata do
escolha, lei é lei, ainda mais em tempos de ditadura.
conselho escolar de setembro de 1937 consta: “No dia 4 de setembro a escola e ginásio comemoraram de maneira condigna o Sete de
A
tentativa
de
impor
o
“paradigma
étnico-cultural lusitano”9 em busca de uma GUERTZ, René. A construção de uma nova cidadania. In: MAUCH, 1994, p. 49.
9
Educação e Nacionalização Compulsória – 1930/1940
47
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
À esquerda, a Faculdade de Engenharia e o Colégio Júlio de Castilhos (com a cúpula), à direita o quartel general
homogeneidade cultural partiu, de um currículo
ministravam aulas em língua vernácula e também
único nas escolas onde havia determinada história
aulas semanais de história e geografia do Brasil, bem
a ser contada, apenas um folclore a ser vivenciado
como educação moral e cívica” (RENK, 2009, p. 21).
e só uma língua a ser falada.
No Rio Grande do Sul o recrudescimento do
“A nacionalização compulsória do ensino foi
regime ditatorial da Era Vargas iniciou em 1938.
efetivada pelo Decreto Federal 406, de 1938, enquanto
Proibiram diretores estrangeiros nas escolas e
outros decretos e leis determinavam o ensino em língua nacional, proibiam a circulação de material didático em língua estrangeira e objetivavam a formação da juventude nacional. As escolas étnicas foram fechadas e a partir daquele momento todas as escolas
também professores que não falassem português com fluência. As escolas particulares foram inspecionadas e 95 delas tiveram que fechar suas portas. O Colégio Farroupilha foi uma delas, pois seu diretor e vários professores eram naturais da Alemanha. No entanto, para aqueles estabelecimentos
10
48
Período aproximado.
que não foram transformados em grupos escolares A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Colégio Farroupilha na Semana da Pátria - 1939
estatais, havia a possibilidade de tentarem se
Dessa forma, a Escola teve que remodelar-se
adaptar às novas leis. Foi o que fez a direção
rapidamente, e o fez com rigor, recebendo no dia 28
do Colégio Farroupilha. Agiu de forma rápida
de fevereiro de 1939 uma licença temporária para
alterando, em primeiro lugar, a formação do corpo
abrir suas portas. Como havia fechado em dezembro
docente. Assim, sete de seus professores voltaram
de 1938, os alunos não ficaram sem aulas.
para a Alemanha e quatro se retiraram. Quanto ao currículo dessa escola se observa: “Em primeiro lugar, a proibição do uso do alemão nas aulas; depois, essa mesma proibição se estendendo à conversação usual no pátio do colégio,
Uma dúvida que cabe levantar nesse momento é: como o Governo do Estado fazia para vigiar as escolas? Descobrimos que, nessa época, havia a
Professores da Nacionalização:
entre alunos e nas relações entre os corpos docente
“Cabia a estes professores, também chamados de
e discente, o número de aulas diárias, o currículo a
fiscais da nacionalização, a fiscalização e orientação
regulamentação dos feriados e das férias, tudo fora
do trabalho escolar mediante uma atitude de
determinado pelo governo” (TELLES, 1974, p. 133).
simpatia e de conquista. O trabalho deles deveria
Educação e Nacionalização Compulsória – 1930/1940
49
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Visita de autoridades governamentais ao Colégio Farroupilha – primeiro quartel da década de 1940
pautar-se pela serenidade de deliberação e equilíbrio
dos Negócios da Educação e Saúde Pública (Sesp)”
de atitudes. Deveriam manter contato com os
(QUADROS, 2009, p. 210).
estudantes durante os intervalos das aulas; promover a criação de um ambiente escolar “nacional” mediante a “ornamentação das salas de aula, do hall, dos corredores, das salas de refeições” com o uso de paisagens brasileiras, reprodução de obras de arte de artistas brasileiros, fotografias de homens célebres e heróis e, ainda, promover a criação de bibliotecas, clubes de leitura e associações recreativas, as quais
50
O Colégio Farroupilha continuou ainda por algumas décadas a ser uma escola para “alemães”, mas, agora, alemães que vivenciavam a cultura brasileira com a “ajuda” de três professores da
nacionalização. Assim, o Brasil recebia, nessa escola, as mais variadas homenagens: “Um
exemplo
de
patriotismo
deu
o
trariam “auxílio valioso à socialização dos alunos,
estabelecimento: os alunos do primário escolheram
com a obra de nacionalização”, conforme explicitado
como patrono de suas respectivas classes vultos da
na mencionada Circular da Secretaria de Estado
História do Brasil. Almirante Tamandaré (3a A),
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Colégio Farroupilha, Semana da Pátria – 1959
Colégio Farroupilha, Semana da Pátria – 1959
Ruy Barbosa (3a B), Almirante Barroso (4a A), D.
muito estudo e disciplina. Os professores que se
Pedro II (4a B), Getúlio Vargas (5a A), Duque de
mantiveram, bem como os sócios da mantenedora
Caxias (5a B)” (TELLES, 1974, p. 134).
da escola, conservaram a estrutura de valores
Hedy Boelhouwer, em relação ao ensino do final da década de 1940 recorda:
desse estabelecimento de ensino que incluía o sentimento de germanidade. Décadas depois, o Farroupilha ainda era a escola dos alemães,
“Nessa época em que comecei a estudar no Farroupilha já não existia, por exemplo, alunos que só falassem alemão, que não falassem bem o português, isso não havia. Você sabia que eram descendentes que levavam aquela vida típica da família estilo germânico, isso tinha bastante. Era muito alemão na escola, não tinha italiano, japonês - se bem que tinha um japonês que estudou mais adiante...”11 Passada a fase de adaptação quanto aos rituais e aprendizagens patrióticas, bem como ao fim do bilinguismo, foi possível voltar à rotina de 11 Boelhouwer, Hedy. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 30 de julho de 2012.
muito embora o número de alunos de outras descendências crescesse muito. A Sesp, Secretaria de Estado dos Negócios da Educação e Saúde Púbica, estabeleceu várias exigências a todas as escolas públicas e particulares. Entre as normas técnico-científicas criadas entre as décadas de 1930 e 1940 destacamos, de acordo com Claudemir de Quadros (2009, p. 220): “A
utilização
de
planejamento,
controle,
pesquisa e avaliação; a escrituração minuciosa das atividades de professores, estudantes, diretores e administradores; o desenvolvimento de cadastros estatísticos; a expansão da rede escolar; a utilização
Educação e Nacionalização Compulsória – 1930/1940
51
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Em 1943, o ministro da Educação, Gustavo
de inovações metodológicas (gabinetes de psicologia, biblioteca, cinema educativo); a utilização de testes
Capanema,
psicológicos; a uniformização de programas de ensino;
currículo do ensino comercial, acrescentando
a reorganização e racionalização dos serviços, com
disciplinas técnicas e diversificando a estrutura
a separação da esfera técnico-pedagógica daquela
do curso comercial técnico, que passou a dividir-
encarregada da administração; a assistência técnica
se em: Comércio e Propaganda, Administração,
especializada ao magistério e o estudo e pesquisa dos
Contabilidade, Estatística e Secretariado.13
problemas do aperfeiçoamento do ensino.” É visível a maior organização na estrutura e nos processos de educação no Rio Grande do Sul
determinou
a
modificação
Para entendermos esse contexto, vejamos, como exemplo, a formação da Escola Técnica de Comércio Farroupilha.
a partir da linha de mudanças e modernização que seguiu a Sesp. Assim, o sistema de ensino do estado entrou em consonância com a reorganização econômica brasileira, que necessitava formar líderes, mas também necessitava de uma educação voltada ao trabalho, gerando mão de obra qualificada. A partir de 1931 os estudantes brasileiros podiam optar por, ao invés de entrar no ginásio, realizar um curso comercial básico. E, após essa etapa, entrar para o curso comercial técnico que se dividia em: guarda-livros, secretário, administrador-vendedor, atuário e perito-contador.12 Depois dessa etapa, terminava a fase escolar, com o mesmo número de anos do liceu ou do clássico, propedêuticos à universidade. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/legin/fed/ declei/1940-1949/decreto-lei-6141-28-dezembro-1943-416183-133673-pe. html>. Acesso em: 02.out.2012.
13
Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ ListaPublicacoes.action?id=37550>. Acesso em: 02.out.2012
12
52
do
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Escola Técnica de Comércio Farroupilha
A
diretoria da ABE de 1858 aprovou a
Humanas
abertura no Colégio Farroupilha de
Química, Física etc.). Havia, é claro, o ensino
um curso comercial de Contabilidade no ano
técnico, em que a aprendizagem no ambiente da
de 1949. O grande idealizador dessa ideia foi
escola era complementada por visitas às grandes
Sven Robert Schulze, que também foi o primeiro
empresas, como observamos nos relatórios:
diretor. Ele era bacharel em Ciências Políticas e
e
Exatas
(Matemática,
História,
Visitações a estabelecimentos industriais e laboratórios
Econômicas e perito contador. Segundo sua filha, Ingrid Schulze: “Meu pai, percebeu que, no comércio,
Os trabalhos didáticos foram complemen-
eram necessários profissionais habilitados,
tados por visitações a estabelecimentos admi-
no caso, contadores. Então, conversou com
nistrativos e econômicos locais. A terceira série
pessoas amigas, com colegas, e criaram a
visitou as Indústrias Renner, em dois grupos,
Escola Técnica de Comércio Farroupilha,
muito aproveitando com os bem adestrados ci-
com professores que eram profissionais de cada
cerones da empresa. A terceira série esteve na fábrica da
área: meu pai dava aula de Mecanografia. Depois,
Pepsi-Cola, apreciando especialmente o engarrafamen-
tinha Merceologia, Matemática, Contabilidade
to automático de refrigerantes. A segunda série, dirigida
Industrial, tinha tudo que era tipo de Contabilidade.
pelo professor Horst Beck, visitou os seguintes estabele-
Todos eram profissionais dentro das áreas em que
cimentos: o DEAL, a Fábrica Neugebauer, a Fábrica
trabalhavam.”14
de Plásticos Marco e o Laboratório Central da SAIC.15
Na Escola Técnica de Comércio Farroupilha,
A Escola Técnica seguia a mesma linha de
o aluno e a aluna – era mista - participavam das
disciplina e exigências do Colégio Farroupilha.
aulas de Português e Língua Estrangeira, Ciências Schulze, Ingrid. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
Por isso, muitos empresários, comerciantes e
14
Relatório da Escola Técnica de Comércio Farroupilha. Ano letivo de 1957, p. 08. Acervo: Memorial Colégio Farroupilha.
15
Escola Técnica de Comércio Farroupilha
53
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Escola de Comércio do Colégio Farroupilha, formatura, colação de grau - Década de 1950
donos de fábricas matriculavam lá os seus filhos.
depois fui à Faculdade de Direito na Universidade
Além dos jovens se prepararem para o trabalho nas
Federal do Rio Grande do Sul.
empresas de seus pais, com a qualidade de ensino
Também foi muito interessante devido à dedicação
do Farroupilha podiam, também, entrar com mais
dos professores. O professor Striebel, o diretor, era de
facilidade na carreira universitária. Um exemplo é
uma dedicação fantástica! Era um curso de muita
Jorge Gerdau Johannpeter que recorda:
qualidade. Aprendíamos com o professor Bischoff,
“Havia o curso clássico, mais para a área
que ensinava Contabilidade, propriamente dita. O
jurídica, o Científico, para as Ciências Exatas, e
professor Ribeiro era de Matemática, e todas aquelas
havia cursos técnicos profissionalizantes. Eu fiz o
figuras que marcaram muito”.16
Curso Técnico de Contabilidade. Fiz três anos, e
16
54
Johannpeter, Jorge Gerdau. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Todos os professores das disciplinas técnicas, além de ministrarem aulas, também trabalhavam em grandes empresas de Porto Alegre, de forma que ensinavam os alunos a partir de suas próprias experiências. No relatório de 1958 consta: “O professor procura trazer um ensinamento vivo, objetivo, oferecendo ao estudante além da teoria das matérias, sua própria experiência profissional [...] a direção, por sua vez, procura ampliar a base cultural
Professores da Escola de Comércio do Colégio Farroupilha: Walter Kley, Svean Schulze, Walter Striebel (discursando) e Hans Schmitt. Formatura - 1954
dos estudantes, organizando reuniões coletivas das séries, nas quais são proferidas conferências sobre temas
“O certificado da ETC Farroupilha era
ligados aos assuntos do currículo ou à atualidade.”
reconhecido não somente dentro do estado do
A prática vinha, também, do próprio
Rio Grande do Sul, mas em todo o território
trabalho exercido pelos alunos. Cabe
nacional. Tal notoriedade voltou os olhos
lembrar que o curso era noturno. Assim,
do governo para o estabelecimento, que, em
as empresas entravam em contato com a
1953, através de um auxílio de Cr$ 70.000,
Escola para que lhes enviasse estudantes.
concretizou a primeira subvenção do governo
Como afirmou em 1958 o diretor Walter
federal para a escola. Um dos principais
17
Striebel, “o estudante de cursos técnicos, como o
aspectos incorporados à instituição é que a escola
nosso, por via de regra, trabalha, quer na indústria,
deveria preparar primeiramente o indivíduo para
no comércio, em estabelecimento bancário ou
viver de modo mais completo”.19
repartição pública, iniciando assim, sua carreira
Como
profissional”.18
podemos
observar,
pela
imagem
acima, a partir da década de 1960, a maioria dos
Conforme Pacheco, esse curso técnico comercial
estudantes são adultos, o que leva os professores
em pouco tempo teve repercussão nacional:
a adotarem um método diferente em relação aos
Depoimento concedido em seu escritório à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
19
Relatório da Escola Técnica de Comércio Farroupilha. Ano letivo de 1958, p. 06. Acervo: Memorial Colégio Farroupilha.
17
18
Ibidem.
Pacheco, Pietro Gabriel dos Santos. O Curso Técnico do Comércio no Colégio Farroupilha (Porto Alegre RS – 1949/1962). Este estudo é parte integrante do Projeto de Pesquisa “Do Deutscher Hilfsverein ao Colégio Farroupilha: Entre memórias e histórias (1858-2008)”, coordenado pela Profª Dra. Maria Helena Câmara Bastos (CNPQ/FAPERGS/PUCRS 2011-2015).
Escola Técnica de Comércio Farroupilha
55
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Escola de Comércio do Colégio Farroupilha - década de 1960
demais cursos do Colégio Farroupilha. Como
com aqueles novatos que são ‘da casa’ e esperam
escreveu o professor Sven Schulze:
prolongar um período de inquietação de adolescência
“Uma escola de cursos noturnos como a nossa, deverá ter um ambiente em algo diferente aos cursos diurnos. O próprio aluno já é motivo para isto [...]. O nosso estudante noturno é um adulto como nós, e se na cátedra somos o professor, no
no curso da noite” (Clarin, 1961, p. 37). No início da década de 1970, a escola é transferida para junto dos demais cursos do Colégio Farroupilha, no Bairro Três Figueiras. Pela
intervalo dificilmente se distingue o mestre [...]. Os
infraestrutura desse período – transporte público
nossos professores não são somente ‘mestres’ e sim
precário – e pela pouca circulação de pessoas que
companheiros mais velhos que transmitem aos mais
havia nos “arrabaldes” da cidade, o curso, por ser
jovens os seus conhecimentos.
noturno, não pôde acompanhar o desenvolvimento
Não tivemos, jamais, problemas de disciplina, o
do Colégio Farroupilha, fechando suas portas.
que não exclui pequenas desavenças, especialmente
56
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
O
bservando o Brasil da década de 1950
sem dúvida, uma obra tão civilizadora como o
chama atenção a presença da democracia,
aparecimento de um grande livro em que se espelhe a
novamente, e de uma política desenvolvimen-
alma humana”.21
tista. O país se industrializava através de um projeto de substituição de importação. Crescia a indústria de base, mas, por outro lado, é considerável a entrada de multinacionais
A percepção do poder humano era a tônica do momento. O mundo oferecia possibilidades sem limites. Esse imaginário se refletia nos discursos de pensadores, professores e políticos como
e de empréstimos estrangeiros para os
Kubitschek, presidente eleito em 1956.
projetos governamentais.20
Quanto
Grandes cidades, automóveis, indús-
à
“obra
civilizadora”
tria cinematográfica, eletrodomésticos,
a ualificação dos brasileiros e seu
enfim, eram os símbolos da modernida-
nível escolar não acompanhavam as
de presentes no cotidiano de muitos bra-
transformações urbanas e as novas possibilidades no mercado de trabalho, faltando mão
sileiros. Em um de seus discursos, o presidente Juscelino Kubitschek enfatizou a necessidade de uma “mentalidade industrial”, ressaltando que:
de obra qualificada. Também, pudera: no Brasil, em 1950, apenas 36,2% das crianças de 7 a 14 anos tinham acesso à escola (GOLDEMBERG, 1993). Na capital do Rio Grande do Sul, os discursos
“[...] as civilizações se exprimem e se revelam, dão a medida e de seu poder e do seu caráter pelas
e ideias de progresso e desenvolvimento eram
produções nos setores diversos. Corrigir, dominar
aplaudidos, mas, com ressalvas. Em 1952 Porto
em benefício do homem a natureza, constitui,
Alegre estava em segundo lugar no parque industrial brasileiro, e o nível de construção civil era
MARANHÃO, Ricardo. O Estado e a política populista no Brasil. In: FAUSTO, 1981, p. 261.
20
21
Diário de Notícias, 22/05/1957, n.67, p. 04.
As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
57
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Praça Parobé - 1957
intenso. No entanto, havia sérios problemas ligados à alimentação, moradia e infraestrutura urbana. As primeiras sub-habitações, chamadas de
problema mais sério estivesse no abastecimento de água e, principalmente de energia:
vilas de malocas, surgiram no final da década de
“Havia diariamente falta de eletricidade por
1940 em áreas alagadiças da cidade, e nas encostas
várias horas. O centro costumava ser poupado. Entre
do morro do Partenon.
1950 e 1951, velas e lampiões eram comercializados
Em relação à alimentação, foi um período em
58
Quanto à infraestrutura urbana, talvez o
no mercado clandestino, pois se esgotavam
que houve a escassez de determinados alimentos,
rapidamente no varejo (AXT, 1995, p. 149)”.
de forma que, mesmo quem tinha dinheiro não
Também, entre permanências e especificidades,
conseguia adquiri-los. Muitas vezes, era necessá-
encontramos, nessa época, o sistema educacional.
rio enfrentar filas, para conseguir comprar leite ou
Mas, sem dúvida, o Rio Grande do Sul avançou
carne em Porto Alegre.
em relação aos parâmetros de modernização de A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
seu sistema e na expansão do número de alunos
Quanto às escolas laicas, havia o Colégio
atendidos, tanto em escolas particulares quanto
Farroupilha. Desde 1886 ele era mantido por uma
em escolas públicas. Entre 1950 e 1958, o número
associação beneficente, a ABE de 1858. Essa escola
de estabelecimentos escolares “passou de 899
iniciou a década de 1950 com o nível secundário
para 1.795, enquanto o número de professores
completo, pois, em 1949, além do ginásio, que era
aumentou de 6.468 para 12.244” (ROCHA, 2010,
a primeira etapa, o Governo Federal autorizou
p. 45). Embora o número seja expressivo, o déficit
o funcionamento do colégio (JACQUES, 2011).
escolar, no final da década de 1950, ainda era
Assim, os jovens poderiam estudar todo o último
grande, assim como o índice de evasão:
ciclo, antes da faculdade, no Farroupilha.
“Segundo dados de relatórios do governo do
Nessa escola, as aulas de religião eram
estado, em média, a evasão atingia um universo
ministradas por um pastor e por um padre, os alunos
de 100.000 estudantes matriculados nas três esferas
podiam optar. Também era marcante
(estadual, municipal e particular), com
para os alunos as aulas de Canto, como
maior incidência na esfera estadual
recorda Vera Maria Hemb Becker:
responsável por índices de evasão que
“O professor Nagel, nascido na Alemanha,
variam entre 25%, em 1948, e 16,9%,
dava aula de Latim e de Canto. Ele fez um
em 1958. A menor taxa de evasão estava
coral muito bom que existiu por muitos anos.
nas escolas particulares, onde variou
Selecionava as pessoas a partir do que ouvia
entre 15,2%, em 1948, e 9,1% ,em 1958
na aula de Latim, ali ele ia selecionando as vozes e
(QUADROS, 2006, p. 133)”.
fazia um coral em separado com alunos de todas as
O ensino particular referente à capital era, em
séries. Tínhamos aula de Canto na escola, mas esse
grande parte, ligado a algumas ordens religiosas.
coral era separado. Lá cantávamos de tudo, como
Os Irmãos Maristas, por exemplo, organizaram
músicas em Latim e músicas do nosso folclore.”22
estabelecimentos de ensino que, na década de 1950, já eram tradicionais, como o Colégio
Desde 1895 o Farroupilha estabeleceu-se em
Rosário. Este se originou nas aulas ministradas nas
um prédio na Avenida Alberto Bins em frente à
dependências da Igreja do Rosário pelos irmãos Géraud Dethoôr e Ambrosi Michel, no ano de
BECKER, Vera Maria Hemb. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
22
1904 (FRANCO, 1998, p. 351).
As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
59
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Igreja São José23. De meados do século XX vêm as
sabia. Era uma relação pessoal de respeito, no fundo,
memórias da professora Lia Mostardeiro:
com efeitos positivos na educação” (Jorge Gerdau).24 efetiva
A partir da década de 1940, a tendência para
preocupação com o rigor formal das aulas, ou seja,
um maior diálogo entre professor e aluno permitia
buscava-se a perfeição do aluno, priorizando o
alguns avanços na aprendizagem, se compararmos
capricho, a organização dos cadernos, a disciplina e a
com o método de instrução de finais do século
obediência. No entanto, a sensibilidade da professora
XIX. Outra transformação que já mencionamos,
permitia que, aos poucos, outras práticas fossem
e que se popularizou nas décadas de 1940 e 1950,
introduzidas no cotidiano escolar, proporcionando
foi a presença de cartilhas e livros, de forma que
mais espaço para atividades lúdicas, e assim
todo o ensino era estruturado a partir dessas obras
despertando a espontaneidade e a criatividade
pedagógicas. Vera Matte, alfabetizada no ano
“No
velho
casarão,
havia
uma
de 1942, passou a lecionar no Colégio
infantil (ALMEIDA, 1999, p. 67)”.
Farroupilha no final da década de 1950.
Passado o turbilhão da nacionalização
Ela recorda:
compulsória, observamos que havia pouco rodízio de professores nessa
“Entre os livros, eu tinha a Cartilha do
escola. Os professores podiam construir
Vivi eVavá, em que aprendi a ler e com a
uma relação duradoura com os alunos, o
qual ainda alfabetizei duas turmas no Colégio
que se reflete nas lembranças:
Farroupilha, 16 anos mais tarde. Depois é que mudou. O livro de Aitmética, também. Com o mesmo
“Embora cada professor tivesse sua personalidade
livro em que estudei ainda trabalhei como professora.
se via que o colégio, como um todo, tinha um estilo
Teve um bom período em que os livros didáticos eram
de disciplina, de educação, etc. O perfil das aulas
praticamente os mesmos” (Vera Matte).25
era absolutamente personalizado. Os professores tratavam cada aluno pelo seu nome, e o trato era
Essa constância em relação aos mestres e aos
absolutamente individual: o professor com cada
livros didáticos também se observava quanto ao
aluno. Essa é uma característica muito interessante. O professor sabia perfeitamente se o aluno estava um pouco melhor, se tinha estudado, se sabia ou não
Johannpeter, Jorge Gerdau. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido em seu escritório à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
24
MATTE, Vera Elisabeth Reimer. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi no Memorial do Colégio Farroupilha. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
25
23
60
Onde hoje se localiza o Hotel Plaza São Rafael.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Colégio Farroupilha, Avenida Alberto Bins – década de 1950 As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
61
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
ambiente escolar. A indústria de consumo estava
As práticas corporais, desde o início do século
iniciando, de forma que não havia possibilidades
XX, vinham assumindo maior relevância nas
de trocas constantes de mobiliário, adornos e
escolas, mas apenas na Constituição de 1937 foi
materiais pedagógicos. Mas, a rotina de sala de aula
incluída como prática obrigatória, sendo, então
era quebrada toda semana pelas aulas de Educação
conhecida como Ginástica, tanto em colégios
Física, um dos raros momentos em que os alunos
particulares quanto em colégios públicos.27
saíam de sala. Como o Farroupilha não dispunha de espaço físico, as aulas eram ministradas na Sociedade de Ginástica Porto Alegrense, a Sogipa. A ABE de 1858, realizou uma espécie de contrato com esta sociedade de origem germânica, alugando
Entre as escolas públicas secundárias destacavam-se o Colégio Militar e o Julio de Castilhos, considerado um colégio padrão, “servindo de exemplo orientador a outros colégios do estado” (ROCHA , 2010, p. 44).
o espaço de ginástica do clube. Inicialmente eram
Quanto às escolas profissionalizantes,
ministradas apenas aulas de ginástica,
a Escola Técnica Parobé formava jovens
sem a presença de qualquer forma de
secundaristas desde 1906. Foi criada
jogos. Jorge Bertschinger, aluno do
como uma unidade de ensino da Escola
Farroupilha desde o jardim de infância,
de Engenharia de Porto Alegre, e na
na década de 1930, recorda: “A
gente
fazia
década de 1950 já havia formado muitos
ginástica, mas
técnicos para a construção civil, indústria
precisávamos caminhar até a Sogipa, que era na
mecânica, área elétrica etc. Destaca-se ainda o
Alberto Bins, mas quase no fim, perto da Rua Barros
crescimento da Escola Técnica Feminina Senador
Cassal. Dava-nos aula o professor Georg Black que
Ernesto Dornelles. Nessa época, o mercado
veio da Alemanha, ele ministrava aulas de ginástica.
de trabalho estava abrindo suas portas para as
A Sogipa também tinha um prédio não muito
mulheres. A maioria, no entanto, trabalhava
grande. Durante a aula de ginástica caminhávamos
apenas até o casamento, quando, então, assumia
e depois tinha a caminhada de volta para a escola,
as funções domésticas. Assim, com o intuito de
eram dois exercícios!”26
preparar as moças para o lar e para a fábrica, são NUES, Tatiana Cortez. COUTO, Yara Aparecida. Educação Física Escolar e Cultura Corporal de Movimento no Processo Educacional. Disponível em: <http://www.eefe.ufscar.br/pdf/tatiana.pdf>. Acesso em: 13.out.2012.
27
BERTSCHINGER, Jorge Guilherme. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e a Milene Morais de Figueiredo, na ABE de 1858. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
26
62
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Coleção de Quadros Murais da Revista de Ensino
as “missões pedagógicas”, realizadas em diversas cidades gaúchas. Esses encontros reuniam centenas de professores para debater e receber orientações técnico-pedagógicas, visando à inovação em sala de aula e o aporte de sugestões de materiais didáticos. Outro canal de comunicação com os professores era a Revista de Ensino, criada em 1942, e que, em criados o Curso Técnico em Artes Aplicadas e o
1956, tornou-se uma publicação oficial do CPOE/
Curso Industrial de Corte e Costura. Sobre este
RS. Ela apresentava muitos artigos voltados para
último, Scholl (2012, p. 87) ressalta:
o preparo intelectual e técnico dos professores,
“O curso de Corte e Costura, além das disciplinas
com sugestões de material pedagógicos para as
de cultura geral, comum a todos os ginásios
disciplinas ministradas nas escolas. Apresentava
industriais, oferecia as disciplinas de Tecnologia,
como recurso visual aos professores primários
Desenho Técnico, Corte, Costura, Rendas e
alguns encartes coloridos com temas como:
Bordados, e Confecção”.
“A música, um lugar de destaque; Os Orientação
animais merecem proteção; Do descobrimento à
Educacionais (CPOE), subordinado à Secretaria
Independência; O Dia do Índio; Em maio, o Dia
de Educação e Cultura, orientava professores e
das Mães; As inúmeras utilidades da água; Os Três
equipes diretivas de escolas públicas e privadas.
Poderes, entre outros” (PEREIRA, 2010, p. 56).
O
Centro
de
Pesquisas
e
Um dos canais de contato com os professores eram As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
63
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
“[...] enumerar os elementos, mencionar a ação principal, formar frases, narrar/descrever o fato, imaginar histórias sugeridas pela gravura, realizar dramatizações, dar títulos à gravura. Esse último passo é considerado ‘muito interessante e exige grande capacidade de síntese’.”29 No conjunto de ações educativas de meados do século XX encontra-se, também, um projeto audacioso de construção de escolas estaduais: “Entre as iniciativas estaduais, merece destaque o estado do Rio Grande do Sul durante o governo Leonel Brizola (1959-1963). O projeto ‘Nenhuma criança sem escola no Rio Grande do Sul’, resultou Revista do Ensino, nov.1951, ano I, n.3, imagem de capa
na construção de 1.045 prédios escolares que se
A imagem, seja de fotografias, desenhos colo-
popularizaram como ‘brizoletas’ ou ‘escolinhas do
ridos ou cinema, se manifestava, então, como re-
Brizola’, com 3.360 salas de aula e capacidade para
curso digno de credibilidade. Em 1958, a Revista
235.200 matrículas. Também foram iniciados 113
de Ensino explicava a importância da utilização
prédios com 483 salas e capacidade para 33.810
de imagens na formação das crianças, pois “de-
alunos, e planejados 258 prédios com 866 salas de
senvolve-lhes certas disposições intelectuais, como
aula e capacidade para 60.620 alunos” (ROCHA,
observação, lógica, imaginação, e contribuem para
2010, p. 46).
o enriquecimento das suas experiências”.28 A Revista do Ensino também trazia um
combate ao analfabetismo e aumento do número
encarte chamado “Coleção de Quadros”, que
de estudantes no estado. Em 1959, quando
eram apresentados por séries: História, Zoologia,
começaram a erguê-las, o déficit escolar era de 273
Linguagem etc. Para cada quadro deveria ser
mil matrículas. É claro que a meta de construção
proposta a seguinte ordem de exercícios:
veio acompanhada de contratações, já que nesse
28
64
As novas escolinhas contribuíram para o
Revista do Ensino, nº55, set.1958. In: BASTOS, 2012, p. 09
29
Revista do Ensino, nº55, set.1958. In: BASTOS, 2012, p. 09
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
A LDB, de cunho liberal, garantiu a liberdade de organização do currículo à cada uma das escolas e assegurou a todos os brasileiros, sem distinção de raça ou de classe social, o direito de estudar. No entanto, não foi mencionada a responsabilidade do Estado pela gratuidade do ensino. (Rocha, 2010, p. 33) Em Porto Alegre o crescimento da cidade resulta em maior procura de vagas nas escolas. O Colégio Farroupilha, por exemplo, já no final da década de 1950, apresenta superlotação. De Biblioteca do Grupo Escolar Apeles Porto Alegre. Revista do Ensino, mar. 1952, p. 25.
acordo com as atas de reuniões, desde 1946, os membros da ABE debatiam o problema
ano o déficit era de 23 mil professores no
da falta de espaço32. A conclusão a que
Rio Grande do Sul. 30
chegaram é que uma reforma no exíguo
A atuação forte do governo do
espaço da Avenida Alberto Bins não
estado na área da educação, de certa
seria suficiente, de forma que, naquela
forma, já colocava em prática um
época, já iniciaram a pensar em uma
dos preceitos trazidos com a primeira
nova edificação.
LDB, Lei de Diretrizes e Bases do Brasil, de
Na década de 1950, foram adquiridos terrenos na
1961. Através do artigo 16 outorga aos estados a
Avenida Osvaldo Aranha, entre a Rua Barros Cassal
“autorizar o funcionamento dos estabelecimentos
e a antiga Rua da Conceição, próximo ao Colégio
de ensino primário e médio não pertencentes à
Rosário para a construção da nova escola. Contudo,
União, bem como reconhecê-los e inspecioná-
em 1956, quando o projeto arquitetônico começava
los” , diminuindo, assim, a centralização de todo
a ser executado, foi rapidamente abandonado devido
o sistema no Ministério de Educação e Cultura.
ao novo Plano Diretor da cidade que acarretaria
31
Tendardini, Cleber Dioni. Um caudilho no Piratini. Jornal Extra Classe – n.136 - Agosto 2009. Sinpro/RS. Disponível em: <http://www.sinpro-rs.org. br/extraclasse/ago09/memoria_imp.htm>. Acesso em: 29.set.2011. 30
LEI Nº 4.024, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1961. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4024.htm>. Acesso me: 29.set.2012.
“redução da área útil permitida” (HOFMEISTER FILHO, 1986, p. 56).
31
De acordo com informações da ata da reunião dos sócios da Abe de 1958, de 11.dez. 1952.
32
As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
65
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Assim, a nova escola foi construída em uma
escolar. Principalmente a partir da década de 1970
área pertencente a ABE de 1858, conhecida
surgiram novos profissionais e foram criados novos
como Chácara das Três Figueiras. A construção
setores, como o Serviço de Orientação Educacional
estendeu-se de 1957 a 1961 em uma área muito
e o Serviço de Educação Pedagógica34, o que exigia
maior do que a do “velho casarão” da Alberto Bins.
espaço. Segundo Dóris Almeida (1999, p. 69-70):
Eram três hectares e meio disponibilizados para a
“Realmente, a mudança de prédio não foi um
escola. Assim, ao invés de lugar para 600 alunos, o
fato isolado [...]. Aos poucos, a estrutura administra-
Farroupilha passou a oferecer espaço para 1.500.33
tiva e pedagógica da escola tornou-se mais complexa,
A mudança para um prédio maior se fez
e o número de alunos passa a aumentar sensivelmen-
necessária, também, devido às exigências do
te. Se antes havia uma diretora que praticamente
sistema nacional de educação quanto à estrutura
Colégio Farroupilha, Relatório do Curso Secundário – Ano Letivo de 1972 e 1974.
34
33
66
Revista O Clarin. 1º Semestre, 1961, p. 16.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
a ordem socioeconômica, pois se temia que a persistência dos grupos que então controlavam o poder político formal viesse a provocar uma ruptura no plano socioeconômico” (SAVIANI, 2008).35 Assim, durante vinte e um anos, os militares permanecem no poder, trazendo novamente mudanças para o sistema de ensino brasileiro. Uma delas foi a extinção da estrutura Primário/ Ginásio. A partir de agora o ensino dividia-se em Colégio Farroupilha, nova edificação - 1961
coordenava todo o trabalho das séries iniciais, agora
Primeiro Grau e Segundo Grau. O Segundo Grau abarcava três anos, sendo profissionalizante. Não
surgem outros setores educacionais, cada
havia mais exame de admissão para
um com diferentes atribuições, abrangen-
nenhuma etapa do ensino escolar, apenas
do questões administrativas, comporta-
o Vestibular para entrar na faculdade se
mentais, disciplinares, pedagógicas, etc”.
manteve.
Quanto ao contexto político da
Em 1971, reformulando a 1a LDB,
década de 1960, percebemos que, já nos
o MEC, tornou obrigatório o ensino
primeiros anos, partidos, sindicados,
profissionalizante em todas as escolas
movimento estudantil e demais grupos da
públicas ou privadas. Segundo Saviani:
esquerda brasileira estavam mobilizados em
“A própria escola primária deveria capacitar
torno de propostas como a nacionalização de
para a realização de determinada atividade prática;
empresas estrangeiras e as reformas de base no
o ensino médio teria como objetivo a preparação
sistema bancário, agrário e educacional. Com o fortalecimento desses grupos, chamados de
dos profissionais necessários ao desenvolvimento
subversivos, os militares e seus aliados civis, através
econômico e social do país; e ao ensino superior
de um golpe, desativaram o processo democrático
eram atribuídas as funções de formar a mão de obra
que se expandia:
especializada requerida pelas empresas e preparar
“Consumou-se, desse modo, uma ruptura política, considerada necessária para preservar
SAVIANI, Demerval. O Legado Educacional do Regime Militar. Cad. Cedes, Campinas, vol. 28, n. 76, p. 291-312, set./dez. 2008. Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br. Acesso em: 19.set.2012.
35
As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
67
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
os quadros dirigentes do país (Souza, 1981, p. 67-
3) O processo de transformação: aprendizagem
68). A orientação geral traduzida nos objetivos
realizada pelo estudante com decorrência da
indicados e a referência a aspectos específicos, como
tecnologia empregada.
a profissionalização do nível médio, a integração
4) O produto final: a consecução dos objetivos da
dos cursos superiores de formação tecnológica
escola, a formação do individuo proposto pela
com as empresas e a precedência do Ministério do
sociedade vigente (QUADROS, 2006, p. 180).
Planejamento sobre o da Educação na planificação
Em decorrência da capilarização por todos os
educacional, são elementos que integrarão as
setores da educação dessa estrutura pensada pelo
reformas de ensino do governo militar”. 36
MEC, o CPOE – que então se dedicava muito à
O controle social e político se fez presente em todos os estados da Federação. No Rio Grande do Sul, a Secretaria de Educação e Cultura, de acordo com as diretrizes do MEC, tenta adaptar o sistema escolar ao sistema de produção econômica. Nesse sentido, estabeleceu-se uma correlação entre os elementos de produção industrial com o sistema educacional:
pesquisa e à assessoria pedagógica – foi fechado no início da década de 1970. De acordo com Denise França (2007, p. 52): “[...]
educadores
passaram
a
ser
perseguidos por conta de posicionamentos ideológicos divergentes do regime. O regime militar espelhou na educação o caráter antidemocrático de sua proposta ideológica de governo, e a promulgação do AI-5 impossibilitou aos educadores posicionarem-se em
1) os fatores diretos da produção:
relação às leis e decretos relacionados à educação.”
a) estudantes (matéria prima do processo);
b) professores (principal tipo de mão de obra utilizado);
De forma muito semelhante à época do Estado Novo (ditadura de Getúlio Vargas), as escolas necessitaram se adaptar aos novos padrões técnicos
c) instalações (sala de aula, laboratórios, oficinas);
d) matérias e recursos didáticos.
2) os fatores indiretos da produção: serviços
e burocráticos criados pela Secretaria de Educação e Cultura, principalmente após a Reforma de 1971. Podemos acompanhar o dia a dia de uma es-
administrativos.
cola nesse período, através da farta documentação SAVIANI, Demerval. O Legado Educacional do Regime Militar. Cad. Cedes, Campinas, vol. 28, n. 76, p. 291-312, set./dez. 2008. Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br. Acesso em: 19.set.2012.
36
68
presente no Memorial do Colégio Farroupilha,
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Livro de Registros de Ordens Internas/Ensino Secundário 1950/1970. Colégio Farroupilha
composta porrelatórios, memorandos, correspon-
cuidados com as manifestações, o Colégio precisou
dências, fotografias etc.
adaptar-se ao novo sistema educacional proposto
No Colégio Farroupilha, durante o governo militar, não houve interrupção das aulas. Nenhum professor precisou afastar-se, como aconteceu em outras escolas de Porto Alegre. Mas percebemos que, após a instituição do AI-5 (Ato Institucional no 5) os cuidados foram redobrados quanto às criticas ao sistema de ensino ou ao regime militar. Pelo documento acima percebemos que a escola precisou realizar algumas adaptações aos padrões do novo regime. Mas, para além dos
pelo MEC, com inúmeros novos regulamentos. As evidências nos levam a crer que, mesmo tendo a equipe diretiva trabalhado muito para a adaptação, não faltaram críticas da SEC em relação a algumas irregularidades do Colégio. Assim, por exemplo, foi apontada a omissão da escola em relação à nova nomenclatura de algumas disciplinas, como Língua Estrangeira, que passou a se chamar Inglês. Outra irregularidade apontada pela SEC foi o fato de não ter sido criada a disciplina Ciências Físicas e Biológicas. No relatório de 1973,
As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
69
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Colégio Farroupilha. Irregularidades de 1974. Dossiê referente ao cumprimento do parecer número 108/79 do Conselho Estadual de Educação
encaminhado para a Secretaria de Educação
Se em alguns aspectos foi possível se manifestar
e Cultura, a direção da escola justifica que “a
contra as novas regras, em outros não havia
dificuldade na montagem de programa único para
diálogo. Um exemplo foi a implantação de cursos
a disciplina de Ciências Físicas e Biológicas e sua
profissionalizantes. O documento a seguir nos dá
impraticabilidade justificam o desdobramento da
a ver a proporção das mudanças que a escola teve
mesma em Física, Química e Biologia” . Dessa
que realizar em nível de Segundo Grau:
37
forma, embora mantivessem a carga horária e conteúdos previstos pelo MEC para a referida nova disciplina, não abdicaram do desdobramento. Colégio Farroupilha. Irregularidades de 1973. Dossiê referente ao cumprimento do parecer número 108/79 do Conselho Estadual de Educação.
37
70
Mesmo com a montagem de um novo aparato pedagógico e profissional para a criação dos cursos citados acima, irregularidades ainda eram apontadas. Apenas em 1979 a escola conseguiu
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Festival de Pintura, Jardim de Infância, Colégio Farroupilha – 1972
Outra peculiaridade, típica de épocas de
enviar um relatório para a SEC informando sobre a regularização completa.
regimes ditatoriais, era a presença na escola de
Podemos observar, ainda, que a maioria dos
duas fiscais supervisoras de ensino enviadas pela
cursos profissionalizantes citados no documento na
SEC. De acordo com o relatório de 1969, elas
página ao lado apresentava como base disciplinas do antigo Curso Científico. Dessa forma, foi possível manter o padrão de qualidade do Colégio
faziam um papel importante na adequação da escola aos novos métodos de ensino.
no ensino das Ciências e, por consequência, os
O Colégio Farroupilha reativou em 1972 o
índices de aprovação no Vestibular, sempre altos,
Jardim de Infância38, com capacidade para 110
de acordo com os relatórios da diretoria da escola.
38
Ver página XX (segunda parte do livro) sobre o antigo Jardim de Infância
As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
71
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
crianças. Desde os primeiros anos destacava-se a
A partir de 1974, os alunos do Colégio Farrou-
preocupação com a educação integral do aluno.
pilha participavam das aulas de Química, Física
Vera Matte, diretora da escola nessa época, nos
e Biologia em amplos e modernos laboratórios, algo inimaginável para o antigo prédio da Avenida
informa:
Alberto Bins. Além disso, foi criado o Serviço de
“O respeito pelo meio ambiente remeteu-nos
Recursos Audiovisuais, para facilitar a utilização
às noções de ecologia, fazendo com que no pátio
de materiais pedagógicos pelos professores. Ingrid
do Colégio se cultivasse uma pequena horta.
Schulze, que organizou o novo serviço, sendo por
Além disso, estimulou-se que lá fossem abrigados
muitos anos responsável por ele, recorda:
alguns exemplares de animais domésticos, como
“Confeccionamos muitos jogos - por sugestão dos
ovelha, coelho, galo, galinha, entre outros. Esses
professores - para determinada atividade [...]. Nós
animais recebiam muito carinho das crianças, as
tínhamos também aparelhos, desde sempre tínhamos
quais assumiam a responsabilidade
projetores. No começo a gente passava filmes
de alimentá-los, seguindo um rodízio
para os alunos, filmes 16 mm. E havia uma
previamente combinado com as turmas
lista de filmes das entidades, que emprestavam,
do jardim” (Vera Matte).39
como a Secretaria de Educação. Se, por
Em 1968 a escola inaugurou a
exemplo, quisesse alguma coisa sobre história... tinha muita coisa sobre Física e Química.
Biblioteca Manoelito de Ornelas, com
Havia muitos cartazes. A Revista do
5.000 volumes, o que nos faz recordar da
Ensino durante muitos anos publicou cartazes
biblioteca anterior, assim descrita por Hofmeister:
didáticos muito bons que eram usados tanto em
“No antigo colégio, os livros eram guardados em
Ciências, quanto em Português para redação,
armários fechados que ficavam no corredor. O acervo
também tinha Geografia, História...
era composto de obras específicas para professores e
Havia arquivos com pasta suspensa, com muitas
uma grande parte dada pelo governo alemão. Na
ilustrações [...]. Na época não tinha vídeo, não tinha
década de 1950, a biblioteca, com livros então também
DVD, nada disso, então, era na base da ilustração
para alunos, era utilizada como sala de professores”
concreta, do papel.” 40
(HOFMEISTER FILHO, 1986, p. 88).
Schulze, Ingrid. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
40
que existiu entre os anos 1911 e 1930.
39
72
MATTE, Vera. Um Sonho Realizado. In: Beckel, 2009, p. 10.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
As
novas
possibilidades
pedagógicas
se
manifestavam na escola, assim como a estrutura tradicional ainda estava bem presente, e as aulas eram centradas no ensino do professor. Márcia Terres, estudante da escola, recorda em relação ao início da década de 1980: “[...] Essa referência do professor era muito marcada naquela época. Era uma figura mais imponente e até mesmo austera. Circulava afeto também, mas não de uma forma tão intensa. Era um afeto dosado com muito limite, onde o respeito e muitas vezes a autoridade delineava a relação do professor com o aluno. As propostas eram muito dirigidas, havendo pouco espaço para a interação e
Capa da Revista do Ensino, outubro de 1951, ano I, no 2.
participação expressiva dos alunos” (Márcia Terres)41.
atitudes ou sentimentos já se manifestam antes
Com o crescente desenvolvimento do Rio
de tornarem-se conduta. Um exemplo é a relação
Grande do Sul em meados do século XX, foi possível melhorar a infraestrutra de muitas escolas gaúchas, que também obtiveram novos materiais pedagógicos, como as escolas estaduais. No entanto, em termos de metodologias utilizadas em sala de aula, não houve mudanças significativas como no início do século XX – Método Intuitivo, Escola Nova.
entre professores e alunos. Se no começo do século XXI iniciou uma transformação
significativa
na
metodologia
de ensino de muitas escolas gaúchas é porque o professor de décadas anteriores saiu de seu pedestal, inclusive literalmente. A transformação do mestre que instruía para o que acompanha o aprendizado dos alunos não ocorreu em uma data
Mas é preciso ressaltar que a escola é um organismo vivo, e sendo assim, por vezes, algumas TERRES, Márcia Beck. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 13 de agosto de 2012.
41
determinada ou a partir de algum decreto. “As relações entre professores e alunos são envolvidas por sentimentos mais espontâneos:
As escolas em meados do século XX – Entre permanências e especificidades
73
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
1a Série de 1993 – Colégio Farroupilha
é natural aluno e professores aproximaremse, buscando elos de afetividade. Tudo isso não aconteceu por acaso: com o passar dos anos, as concepções educacionais passaram a focalizar a relação professor-aluno como ponto de partida para a construção do conhecimento. Já não é mais preciso desenvolver somente o intelectual: é preciso também valorizar o aluno que se relaciona com o mundo da ciência, com o mundo da natureza, com o mundo dos afetos” (ALMEIDA, p. 1999, p. 58).
74
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
Paradigmas repensados – A sociedade de aprendizagem e o século XXI
C
omo pode uma sociedade englobar e excluir?
proativa, criaram estratégias e soluções para as
O cenário brasileiro no final do século XX
demandas das comunidades de que fazem parte.
apresenta um fenômeno novo: a globalização. Por
Entre as Organizações do Terceiro Setor que
outro lado, nos remete a um fenômeno antigo:
realizaram projetos voltados para a educação
a exclusão social. A globalização, sem dúvida
podemos tomar como exemplo a ABE de 1858.
resultou em um interessante fenômeno de “inter-
Essa associação, sendo mantenedora de uma
câmbio político, social e cultural entre
escola particular, o Colégio Farroupilha,
as diversas nações” (STEREN, 2001).
assumiu outra escola, para crianças de
Mas esse intercâmbio trouxe soluções
baixa renda, em 2005, como explicam os
muito acanhadas para prioridades sociais
sócios da ABE Becker e Betschinger:
como a miséria e o sucateamento da
“A Escola Correa Lima era do tempo do
educação pública. Dessa forma iniciou
governador Brizola, era uma das ‘escolas de
o século XXI e ainda estamos em busca
madeira’ como eles chamavam.
de uma globalização efetiva:
Localizava-se dentro do CPOR42, mas tinha
“O uso do termo ‘global’ supõe ou leva a supor
muitos buracos e estava cheia de cupim, de forma que
que o objeto ao qual ele é aplicado é, ou tende a ser
o delegado de educação do estado havia mandado
integral, integrado, isto é, não apresenta quebras,
fecha-la, porque não tinham condições de contruir
fraturas, ou hiatos. Globalizar, portanto, sugere o
outra. Foi quando o Coronel veio falar comigo:
oposto de dividir, marginalizar, expulsar, excluir”
- Vocês querem assumir essa escola?
(Limoeiro-Cardoso, apud, STEREN, 2001).
- É hoje que queremos essa escola!
Nesse movimento, oposto a dividir, chama
Agora, tem aproximadamente 200 alunos
atenção o crescimento, no Brasil, de organizações
lá dentro, com a mesma instrução que o Colégio
não governamentais (ONGs) que, de forma
42
Centro de Preparação de Oficiais da Reseva
Paradigmas repensados – a sociedade de aprendizagem e o século XXI
75
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Alunos da unidade Correia Lima
Farroupilha, mesmas técnicas em tudo (Jorge
de 25 alunos. O nível de exigência entre o Colégio
Bertschinger).43
Farroupilha e o Colégio Correia Lima é igual. A única diferença é que recebem o ensino gratuitamente
“É feita uma pesquisa com as famílias para ver
(Fernando Carlos Becker)44.
o perfil. Permanecem na escola apenas os alunos cujos pais apresentam renda baixa. Os professores
A ABE de 1858, ainda na década de 1990,
são os mesmos do Colégio Farroupilha. São turmas
iniciou um projeto pioneiro que foi a instalação da
BERTSCHINGER, Jorge Guilherme. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e a Milene Morais de Figueiredo, na ABE de 1858. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
43
76
BECKER, Fernando Carlos. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
44
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
ESIM 2002 – Colégio Farroupilha
Escola de Instrução Militar (ESIM). Em matéria
“Quando eu era presidente da ABE, levei dois anos para implantar a ESIM. Porque eles tinham
do Correio Militar do Sul, de 2001, consta:
esse tipo de auxílio para escolas em São Paulo, e não
“[...] A escola iniciou suas atividades no dia 26
deu certo. Então foi pior a situação. Nós tínhamos
de março deste ano e objetiva permitir a prestação
de convencê-los de que teríamos condições de fazer
do serviço militar inicial, em caráter voluntário [...].
a coisa certa. E deu tão certo que até hoje continua
Ao final do curso, que se encerra em 24 de agosto,
tudo igual. E muitos pais não acreditavam nisso.
os alunos receberão o certificado de reservista [...].
Eu dizia: ‘vocês tem de esperar, coloquem seus filhos
Ao longo do ano eles terão instruções de ordem
e depois venham falar comigo’. Olha, quando eles
unida, comunicações, informática e tiro de fuzil [...]
vinham falar, era só elogios. Porque o guri mudou
há também a previsão de dois acampamentos e de
naquele ano... Porque com isso ele também ganhou
visitas a quartéis de Porto Alegre”.
um ano na vida dele. Ele não precisa fazer o serviço
45
militar que é de um ano. O CPOR nomeava três
Jorge Bertschinger, ex-presidente da ABE, e
oficiais, sempre, que vinham aqui dar aula e tudo”
Fernando Carlos Becker, atual presidente, recordam: Entrega de boina aos alunos da Escola de Instrução Militar no Colégio Farroupilha. Correio Militar do Sul, jun.2001.
(Jorge Bertschinger).46
45
46
BERTSCHINGER, Jorge Guilherme. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha.
Paradigmas repensados – a sociedade de aprendizagem e o século XXI
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ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
“Em 2012 foi a décima segunda turma desse
Se formos pensar este fato à luz das teorias
convênio com o Exército. Nós fomos pioneiros no Rio
sobre a educação, podemos citar NOGUERA-
Grande do Sul. Eles estudam em período dentro do
RAMIREZ (2009), que nos fala do “cosmopolita
Colégio, de março a julho, para depois poderem se
inacabado”. Esse conceito está ligado a uma
preparar para o Vestibular, é em período oposto da aula,
percepção de futuro em que a educação dá-se
quatro vezes por semana” (Fernando Carlos Becker).
ao longo da vida, sendo a “sociedade educativa”
Quanto à realidade cultural e de comportamento,
formada por aprendizes permanentes e inovadores,
é perceptível, no final do século XX e início do XXI,
que através dos novos meios de comunicação
um movimento de escolarização fora da escola, de
estão a todo o momento adquirindo informação e
dedicação muito forte ao aprendizado, o que, no
prevendo novas possibilidades de ações criativas.
47
caso de crianças, muitas vezes vem acompanhado
Essa percepção dá sinais de sua presença, e
da falta de tempo para brincarem e conviverem com
as crianças e jovens do século XXI têm
amigos e família:
como expectativa uma escola diferente,
“As crianças e os jovens passam a
com foco na aprendizagem e não no
ter grande parte do seu tempo cotidiano
ensino. A maioria dos novos aprendizes,
regulado e estruturado em atividades
cosmopolitas inacabados, se frustra, o
que traduzem elementos e traços da
que, para as instituições de ensino, resulta
escola. Podemos ver aí uma tendência em
em problemas de disciplina e baixo
transformar cada instante em instante de educação, cada atividade em uma atividade educativa, ou seja, como uma atividade cuja finalidade é formá-los, formar-lhes o corpo, os conhecimentos, a moral. Como se não existisse outra forma de estabelecer relações, como se não existisse outra forma de estruturar atividades que não na forma escolar” (Dayrell, Leão & Batista, apud, DAYRELL, 2007).
Esse contexto se manifestou a partir da década de 1990 em todos os estabelecimentos de ensino, porque a mudança de estrutura que exige a nova “cidade educativa” é muito complexa. Mas, muitas escolas, nesse primeiro quartel do século XXI, começaram a se adaptar, porque para os educandos contemporâneos, assim como para
Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e a Milene Morais de Figueiredo, na ABE de 1858. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
os filósofos gregos, “não existe hiato entre vida e
BECKER, Fernando Carlos. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
pensamento (WEBER, 2009)”.
47
78
rendimento escolar.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO I
No Colégio Farroupilha, por exemplo, a
metodologia diferenciada acabam por manter um
equipe diretiva, em conjunto com a comunidade
método focado em ouve-lê-copia, afirma Márcia
escolar, foi se apropriando de uma nova forma de
Terres.
pensar a educação. Márcia Terres, coordenadora pedagógica do Colégio afirma:
Para além das questões pedagógicas o Colégio Farroupilha também é espaço de continuidade no
“Conhecendo o perfil do aluno desse tempo,
que se refere a certos valores tradicionais, honrados
concebemos que não há espaço para engessamento,
pelo tempo, de raízes germânicas mescladas com
falamos de uma geração que se comunica de forma
ibéricas, sempre presentes na escola e entre os
muito mais intensa do que outras gerações, de um aluno
sócios da ABE de 1858. É por isso que iniciou
que tem informação todo o tempo e velozmente. Nesse
um novo século e a escola ainda é conhecida no
cenário, como relativizar o espaço e o tempo escolar
Rio Grande do Sul pela exigência de disciplina
com as demandas da contemporaneidade
e comprometimento dos alunos em
e as tecnologias? Se torna incompatível
relação as suas responsabilidades e em
trabalhar com um formato de educação
relação aos projetos da escola dos quais
tradicional, onde a escola era centralizadora
participam.
da informação [...]”. 48
A história do Colégio Farroupilha nos faz lembrar um ditado africano que
Márcia ressalta ainda que essas transformações são lentas. Exigem, entre outras
diz: É preciso toda uma aldeia para se educar
coisas, muito diálogo com os professores na busca
uma criança. No Farroupilha a aldeia é formada
de uma proveitosa formação continuada da equipe,
pelo grupo de associados da ABE de 1858, pelas
principalmente no que se refere às tecnologias
equipes diretivas, as famílias, os professores e os
educacionais. A capacitação docente é inerente
colaboradores. Dessa aldeia vem a força, o impulso
ao bom uso das tecnologias em prol da qualidade
para seguir com excelência e coragem a construir,
de ensino. Os equipamentos, como projetores
junto com os alunos, conhecimentos sólidos para
interativos, se não vierem acompanhado de uma
a formação de cidadãos competentes.49
TERRES, Márcia Beck. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 13 de agosto de 2012.
48
49
Revista Farroupilha. Ano XX, n. 103, set/out.2012, p.44.
Paradigmas repensados – a sociedade de aprendizagem e o século XXI
79
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
Lousas, decuriões, cartilhas – A cultura escolar do século XIX
81
CAPÍTULO II
Para além da escola – A mantenedora: sustentáculo e resiliência
N
o século XIX a filantropia em Porto
admitidos por irmãos os pardos e pretos escravos,
Alegre era oficialmente um assunto
como até agora, com as condições, porém, de que
da Igreja Católica através das irmandades de
primeiramente apresentarão licença por escrito de
misericórdia, seguindo uma tradição lusa. No
seus senhores [...]” (NASCIMENTO, 2006, p. 109).
entanto, paralelamente às poucas iniciativas da Igreja havia a movimentação, o colorido, as singularidades, as festas, a ajuda mútua e o assistencialismo das associações leigas. Eram confrarias, irmandades e sociedades de auxílio mútuo que se formavam espontaneamente cumprindo “importante papel social e religioso nas mais variadas situações” (NASCIMENTO, 2006, p. 36). É o caso da Irmandade do Rosário, em cujo Documento de Compromisso de 1828 consta: “Nessa irmandade, denominada de Nossa Senhora do Rosário, São Domingos e São Benedito, será admitida toda a qualidade de pessoas de um ou outro sexo, que quiserem entrar por irmãos, assim brancos e pardos como pretos forros, contanto, porém que todos sejam católicos romanos, sem a menor suspeita de heresia. Do mesmo modo serão
As irmandades eram voltadas para objetivos religiosos, para a disseminação de costumes e cultos ligados à Igreja Católica. Já as sociedades de socorro mútuo, como o próprio nome designa, organizavam-se para mutuamente colaborarem em prol de algo considerado importante para o grupo, como a saúde ou o trabalho. “A maioria tinha como objetivo principal oferecer aos associados proteção na ausência dos mecanismos formais de previdência publica. Ofereciam pensões, indenizações,
financiavam
enterros,
forneciam
medicamentos, atendimento hospitalar, entre outros cuidados. O grau de cobertura dependia, naturalmente, dos recursos disponíveis pela associação, que estavam diretamente relacionados ao número e ao poder aquisitivo dos sócios” (JESUS, 2007). Em Porto Alegre havia aproximadamente 103 mutuais entre os anos de 1854 e 1950. Muitas delas
Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência
83
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
eram mutuais étnicas. A primeira a ser fundada foi
data a população, levando em consideração os
a Sociedade Portuguesa de Beneficência, de 1854
moradores do subúrbio, era de aproximadamente
(FRANCO, 1998, p. 67), logo após temos a criação
19.890 pessoas. Desses, segundo levantamento
da Sociedade Beneficente Alemã (Deutscher
da própria historiadora, aproximadamente 2.090
Hilfsverein), fundada em 1858, e mais tarde outras
eram teutos (GANS, 2004, p. 23).
como a Sociedade Italiana Vittorio Emanuele II, de 1977 (TRENTO, 1989, p. 375).
apresentava nível financeiro médio ou elevado,
Essas associações, nas primeiras décadas de
principalmente aqueles que já estavam há mais tempo
existência, estavam totalmente voltadas ao auxílio
na cidade ou na Província. Normalmente os alemães
entre pessoas de sua etnia que, ao chegar ao Brasil,
pobres vinham diretamente da Europa, e não das
encontravam inúmeras dificuldades relacionadas
colônias gaúchas. Ou seja, imigrantes alemães vêm
a trabalho, moradia, saúde. A opção de
a Porto Alegre à procura de trabalho e
reunirem-se em sociedades de socorro
uma parte deles não consegue colocação
mútuo era uma prática comum na Europa
ou fracassa em alguma tentativa de
do século XIX (SILVA JR., 2004).
investimento.
A Sociedade Beneficente Alemã (ABE,
Assim, a ABE de 1858, teve como o
Associação Beneficente Educacional de
seu mais importante foco, nos primeiros
1858) foi fundada para “auxiliar, segundo
anos, a assistência e orientação aos
as possibilidades, todos os alemães necessitados ou
imigrantes, seja em relação ao mercado de trabalho
pessoas de origem alemã” (TELLES, 1974, p. 29).
na capital ou em alguma das colônias gaúchas, seja
Era composta majoritariamente por luteranos, mas
em auxílio financeiro, orientações sobre legislação,
organizou-se como uma sociedade sem confissão
assistência quanto à alimentação, moradia etc.
definida, pois tinha católicos e livre pensadores como
Para termos ideia da organização dessas ações,
sócios.
podemos lembrar que eram distribuídas circulares
Quanto ao número de habitantes de Porto Alegre em meados do século XIX, Magda Gans se refere a uma pesquisa estatística bastante confiável coordenada pelo Chefe de Polícia em 1856. Nessa
84
Segundo Gans, grande parte dos alemães
nos portos do Rio de Janeiro, Santos e Rio Grande para que os imigrantes recém chegados soubessem que poderiam contar com a Sociedade Beneficente Alemã (TELLES, 1974).
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Também, desde cedo, essa associação foi
A ideia de um hospital movimentou a colônia
muito atuante em relação a serviços de saúde. No
alemã. Os enfermos, fosse em consultórios ou na
século XIX os cidadãos que tivessem dinheiro
Santa Casa, tinham dificuldade em se comunicar,
consultavam com médicos particulares; os que não
pois uma boa parte deles não falava português ou
tivessem, iam direto para o Hospital de Caridade
falava muito pouco. Era mais difícil ainda para os
da Santa Casa. Diante dessa realidade , a ABE
evangélicos luteranos, pois o hospital de caridade
passou a acompanhar os enfermos na Santa Casa,
realizava orações e outros ritos católicos, inclusive
para a qual fazia uma doação financeira mensal.
em busca da conversão dos protestantes. Assim, a
E já em 1858 seus sócios começam a se organizar
construção de um hospital era bem-vinda por toda
para a construção de um hospital.
a comunidade de imigrantes.
Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência
85
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Enquanto não saía o hospital, outros projetos foram se desenvolvendo. Em 1860, a ABE criou uma comissão para visitar os alemães hospitalizados na Santa Casa. Essa comissão informava-se a cerca do estado e das necessidades dos doentes, o que era fundamental, principalmente para aqueles que não falavam português. Além disso, em 1861, a associação adquiriu uma maca. “Os enfermos eram buscados em casa e carregados para o hospital nessa maca” (TELLES, 1974, p. 33). A ABE, depois de alguns anos, desenvolveu uma série de atividades ligadas ao socorro mútuo. Na década de 1860 passou a intervir junto aos governantes a favor dos imigrantes proprietários de lotes de terra. Desde os primeiros títulos se constatava algumas irregularidades que prejudicavam a posse dos colonos. Além disso, a partir do movimento de colonização espontânea aconteceu um processo de especulação de terra que prejudicou os imigrantes recém chegados: “Os compradores revendiam as terras ao quádruplo do que haviam pago, sem delimitar os lotes com bastante cuidado, realizando lucros tanto mais exagerados quanto algumas dessas vendas eram fraudulentas” (ROCHE, 1969, p. 117). Na ata da ABE de 1861 consta: “a assembleia, outrossim,
autoriza
à
Diretoria
participar
ativamente da solução da questão dos títulos de propriedade, enviando diretamente ao Imperador
86
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Rua da Praia, na linha do horizonte a Casa de Correção
Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência
87
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
um relatório sobre o assunto” (TELLES, 1974,
construída em 1852 na chamada “Ponta da
p. 34). Nesses momentos a ABE contava com o
Cadeia”, onde, mais tarde, também seria construído
apoio jurídico voluntário de Karl von Koseritz que,
o depósito de gás conhecido como Gasômetro
quando necessário, deslocava-se para as colônias
e a Usina Termoelétrica. Como podemos ver na
buscando solução para os imigrantes.
página anterior a Casa de Correção era um prédio
Koseritz era um dos mais importantes líderes da comunidade alemã no Rio Grande do Sul, sendo,
Esse prédio, aliás, nos dá uma dimensão
inclusive deputado Provincial. Por mais de quinze
da inserção dos alemães na comunidade porto-
anos ele foi redator do jornal “Deutsche Zeitung”
alegrense. Ao mesmo tempo em que para lá eram
(Jornal Alemão), criado em 1861 por outros dois
enviados alguns imigrantes com problemas com a
sócios da ABE, Ter Brüggen e de Friedrich Hansel.
polícia, a construção em si nos remete à imigração
O Jornal Alemão foi:
germânica, pois Friedrich Heydtmann foi o arquiteto que a projetou (MAUCH,
“O primeiro veículo através do qual
1994, p. 188).
a minoria alemã tomou consciência e passou a discutir seus próprios problemas,
A
presença
dos
teutos
traz
à
começou a intervir na limitada esfera
comunidade
pública existente na Província. Através
econômica, cultural, arquitetônica, sendo.
das colunas dessa folha, bissemanal, os
imigrantes
começaram
a
conquistar
o
reconhecimento por parte da sociedade, como copartícipes do seu processo” (Rüdiger, apud BIER, 2001, p. 72).
uma
nova
dimensão
“[...] partícipes da identidade urbana que se construiu na capital. Suas ocupações profissionais, especialmente suas relações com o comércio exterior, com a consolidação do comércio interno e industrialização de produtos e a cultura foram as principais marcas de
Mais tarde Koseritz fundou o Koseritz Deutsche Zeitung. Esse jornal deu muito apoio quando, em 1886, a Sociedade Beneficente Alemã criou a “Escola para Meninos” (TELLES, 1974, p. 50).
88
imponente, em linguagem neoclássica.
sua presença” (AQUINO, 2007, p.67). Os alemães encontravam-se espalhados pela cidade, mas a maioria da classe média e alta não morava no subúrbio. Havia uma concentração
Também havia uma comissão da ABE que
desses imigrantes em ruas centrais como Rua da
auxiliava os alemães presos na Casa de Correção,
Praia, Rua Sete de Setembro e o Caminho Novo
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Rua Voluntários da Pátria, primeiro quartel do século XIX - Cartão-postal impresso na Alemanha.
(Rua Voluntários da Pátria), consideradas redutos
[importação, exportação, alimentos, vestuário];
de casas comerciais fundadas por alemães e seus
341 na prestação de serviços
descendentes.
[lazer, hotelaria, imprensa, transporte, ensino];
Magda Gans (2004, p. 73 e 74) colheu registros referentes a 1.210 alemães na cidade entre 18501889. A partir deles podemos ter uma ideia do universo profissional desses imigrantes: 446 atuavam em um ofício
[de alimentos e tabaco]; 19 possuíam empreendimentos [principalmente em seguros e transportes]; 6 realizavam outras atividades.
[madeira, metalurgia, trabalho em couro, vestuário, ourivesaria];
55 no setor de transformação
A participação de alemães na ABE segue esse universo profissional variado. Na primeira ata,
343 atuavam no comércio Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência
89
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
entre os 99 inscritos a mais de trinta profissões
parte do pagamento por seus serviços. Quase todos
representadas,
carpinteiros,
com formação escolar superior à dos imigrantes,
médicos, importadores, engenheiros proprietários
eram como fermento na organização de escolas,
de lojas, seleiros, funileiros etc.
associações diversas e veículos de imprensa” (BIER,
variando
entre
2001, p.72).
Quando foi fundada, e ainda por muitas décadas, a ABE não possuía sede própria. Reunia-se primeira-
Entre os “Brummer” destacamos na ABE a
mente na Sociedade Germânia, instituída em 1855.
liderança de Koseritz, de Ter Brüggen e de Friedrich
Posteriormente os encontros e reuniões ocorriam nos
Hansel, deputado provincial e industrial. Hansel
mais variados locais da cidade, inclusive em lugares
participou, assim como Ter Brüggen, da criação
públicos como o café do imigrante alemão W. Roth,
do jornal Deutsche Zeitung, como observamos
chamado de Águia Vermelha (TELLES, 1974, p. 49).
anteriormente. Wilhelm Ter Brüggen também foi
Entre
as
lideranças
da
destacavam-se
imigrantes
ativos
comunidade,
integrantes,
deputado provincial, mas destacou-
ABE
se como comerciante, dono de uma
na
livraria, e como primeiro presidente da
também,
Sogipa.1
de outras associações e corporações. Inclusive o primeiro presidente da ABE
Quanto à gestão do Hilfsverein
de 1858, Ernst Ruperti, foi um dos
(ABE de 1858), observamos pelas atas
fundadores da Sociedade Germânia.
das assembleias que seus dirigentes
Algumas ações de cunho notadamente liberal foram certamente influenciadas pelos maçons e pelos “Brummer” (que em muitos casos também eram maçons). Telles constatou que, dos 99 sócios fundadores da ABE, 10 eram “Brummer”, ou seja, soldados alemães mercenários contratados pelo Império para lutarem na década de 1850 na guerra contra Oribe e Rosas. Terminada e ganha a guerra... “Os ‘Brummer’ se dispersaram em boa parte pelas colônias, já que recebiam lotes de terra como
90
encontravam dificuldades financeiras para manter todos os trabalhos realizados, embora os sócios contribuíssem com mensalidade e realizassem muitas atividades voluntárias. Dessa forma, foi fundamental o diálogo com a comunidade, para o reconhecimento da missão dessa organização, o que resultou em muitas parcerias e contribuições. Em 1858, antes mesmo de ser fundada a Hilfsverein, a comunidade já colaborava. No dia 21 de março, Disponível em: <http://www.cref2rs.org.br/atlas/cd/texto/assoc_ esportivas.pdf>. Acesso em: 03.out.2012.
1
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
conforme o registro do viajante Avé-Lallemant,
nos “altos da Independência”, entre as ruas Santo
que estava de passagem por Porto Alegre, foi
Antônio e Ramiro Barcelos. Segundo Hofmeister,
encenada uma peça teatral cuja a renda reverteu
essa aquisição “paulatinamente loteada, muito
em prol da Sociedade Beneficente.
enriqueceria seu patrimônio” (HOFMEISTER,
Na década de 1860 iniciam os contatos com a Alemanha para possíveis colaborações. Por ideia de um dos líderes da ABE, o “Brummer” Ter Brüggen, foram enviados requerimentos para vários príncipes, o que resultou na contribuição financeira de diversos principados, inclusive da Baviera e da Saxônia.
1886, p.10) o que muito contribuirá para os futuros projetos da ABE e demais associações ligadas à comunidade teuto-brasileira. A Sogipa, segundo a historiadora Haike da Silva, para a compra de um terreno e construção da sede do clube no “arrabalde de São João”, onde até hoje se mantém, contou com um “empréstimo em dinheiro, o qual foi concedido pelo Hilfsverein. A primeira fase da obra foi concluída
Ainda na época do Império, a ABE teve uma pequena subvenção do governo, a participação na concessão da venda de bilhetes de loteria. No entanto, dada a quantidade de entidades subvencionadas, o valor auferido era mínimo.
e inaugurada em abril de 1896” (SILVA, 1997, p. 26). Os feitos da ABE ficaram registrados em ata e permanecem na memória da comunidade farroupilhense, que, de geração em geração, mantém a história viva:
“A prodigalidade da concessão de loterias durante o período imperial é tal que uma única lei provincial em 1888 concedeu loterias para a Sociedade de
“O Hilfsverein ajudava na parte financeira e na parte da saúde. Não havia plano de saúde, a pessoa que ficasse doente tinha que pagar hospital e havia
Beneficência Portuguesa em Livramento, para as
apenas a Santa Casa, que era para os carentes. A
Classes Laboriosas, em Pelotas, para a Brasileira
ideia do Hilfsverein era apoiar os imigrantes e seus
União, a Beneficência Porto-Alegrense, o Hilfsverein,
filhos e construir um hospital, mas essa idéia eles
o Krankenverein e a Vittorio Emmanuele II, todas
postergaram porque não tinham dinheiro. Mas
em Porto Alegre, e para o Montepio São José, em
eles pagavam bolsa de estudos para crianças em
Jaguarão” (SILVA JR. 2004, p. 143).
coleginhos. Mais tarde, em 1875, o vice-presidente
A partir de doações, heranças e algumas
Ter Brüggen lançou a ideia de construir uma escola
subvenções, a ABE adquiriu um grande terreno
para as crianças da comunidade teuto-brasileira.
Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência
91
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Ali ele já fala que os meninos deveriam ser fluentes
o número de imigrantes recém chegados da
em português e alemão. Ele era um ‘Brummer’”
Alemanha em condições de miséria. Além disso,
(Fernando Carlos Becker).2
a partir da década de 1880, a economia no RS
A escola e a missão da ABE de 1858
indústria, envolvendo bastante as famílias de
A ideia de incluir crianças e jovens estudantes
alemães que viviam em Porto Alegre. Estas, no
entre o público beneficiado começou a criar
momento em que veem garantido o sustento,
raízes a partir de uma tentativa de abrir uma
começam a preocupar-se com a boa formação de
escola. Em 1875 os dirigentes começaram a
seus filhos. Como vimos na primeira parte deste
avaliar a possibilidade desse empreendimento e,
livro, alguns professores ensinavam as crianças
prontamente, em 1876, ocorreu a inauguração
teuto-brasileiras, mas não havia nenhuma escola
da escola, que se chamou Instituto de Ensino
no padrão que a comunidade alemã desejava para
Teuto
Brasileiro.
Provavelmente,
a
seus filhos. As escolas étnicas de então
falta de experiência e pouco tempo
mantinham
para projetar todas as variantes de um
que era o sentimento de germanidade,
estabelecimento escolar influenciaram
considerada
para o seu fechamento no ano seguinte.
identitária do grupo, mas a qualidade
Mas, acreditamos que esse projeto foi
algo decisivo
importantíssimo, na
formação
do ensino deixava a desejar.
importante como primeira experiência para a
Dessa forma, a ABE terá todo o apoio para or-
formação de uma escola que existe até hoje, o
ganizar uma escola que será pensada nos moldes das
Colégio Farroupilha.
escolas alemãs, com professores alemães, mas sem-
O interesse dos associados pela educação das crianças teuto-brasileiras está relacionado a um
pre com a preocupação de ensinar o português e a história brasileira para formar bons cidadãos brasileiros.
novo contexto da colônia de imigrantes alemães.
Em 1883, quando Carlos de la Grange era
Passadas as primeiras décadas de colonização,
presidente da ABE, o projeto da escola, elaborado
alguns empecilhos iniciais foram desaparecendo,
por uma comissão de sócios, foi aprovado, e nele
como, por exemplo, as questões fundiárias e
podemos ler que:
BECKER, Fernando Carlos. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
2
92
se desenvolveu muito através do comércio e da
“As despesas, na maior parte, residem nos vencimentos dos professores. Os mesmos não devem
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência
93
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
ser muito baixos, pois professores capazes também
trabalhava voluntariamente para a criação de um
devem ser bem remunerados e nós teremos de exigir
hospital. Faziam parte da Verband Deutscher Vereine
dos professores e também do diretor que se dedique aos
(Federação das Sociedades Alemãs) a Sociedade
alunos fora do período das aulas” (HOFMEISTER,
Leopoldina, a Sogipa o Clube dos Caixeiros
1986, p.17).
Viajantes, entre outros. No ano de 1914 iniciaram as
Nos primeiros meses de 1886 foram tomadas as últimas providências: foi contatado o diretor
A criação de associações e o apoio mútuo era
da escola, o professor Peter Gerlach e foi feito um
uma forma dos teuto-brasileiros preservarem e afir-
contrato de locação com a comunidade evangélica
marem a sua identidade, mas é bom lembrar que ne-
para a utilização de algumas salas. Quanto ao
nhuma cultura é estanque. Um determinado grupo
número de turmas ficou determinado que “a nova
só enxerga as suas peculiaridades em contato com
escola deveria ter três classes com dois
o outro, e esse contato, sempre resulta
professores alemães e um brasileiro, este
em maior ou menor transformação de
para o ensino do Português, com 10 a 15
ambos. Afinal, como diz SCHILLING
aulas por semana” (HOFMEISTER,
(2010, p. 4): “não há uma identidade
1986, p. 17).
pronta e acabada, ela está em processo
Embora a ABE fosse formada por líderes políticos e experientes homens de
de construção e reconstrução”. Quando iniciou o Estado Novo, em
negócio, era um trabalho complexo administrar
1937, a multiculturalidade e a interação social, ape-
essa entidades, principalmente depois da criação da
sar das diferentes etnias, não foram aspectos valori-
escola. Uma infinidade de novas demandas passa
zados pelo programa de governo. Diferenças cultu-
a fazer parte dos afazeres: contratar e monitorar os
rais no Brasil provocavam o hibridismo, e essa era
professores e diretores, adquirir material didático,
uma característica marcante da cultura nacional. No
pensar no espaço físico da escola que crescia. Além
entanto, como em tantas outras nações daquela épo-
disso, a associação ainda apresentava suas antigas
ca, buscava-se uma raça, uma cultura para um país.
comissões que também exigiam atenção.
94
obras do Hospital Alemão (Moinhos de Vento).
E nesse contexto, as entidades formadas
A ABE estava presente na comitiva de
por imigrantes que buscam valorizar aspectos
associações ligadas à comunidade teuta que
relacionados à cultura de origem foram censuradas.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Muitas tiveram que fechar suas portas, e as que
como o professor Neubert, por exemplo (TELLES,
permaneceram abertas precisavam de autorização
1974, p. 123). Mas a opção da mantenedora do
do DOPS para qualquer tipo de reunião.
Colégio Farroupilha foi por não se vincular a esse
É bem verdade que o Estado Novo precisava tomar providências em relação ao partido nazista,
partido, e o professor Neubert não se manteve muito tempo na escola.
que crescia no Brasil. De acordo com as pesqui-
Durante o Estado Novo (1937-1945) tivemos o
sas de DIETRICH (2007), depois da Alemanha, o
episódio da Segunda Guerra Mundial (1939-1945)
Brasil foi o país onde o partido era mais forte. Mas
que despertou entre os brasileiros muita revolta
a forma radicalizada como as medidas nacionalis-
contra a Alemanha devido ao bombardeamento
tas foram tomadas não se justifica perante aquelas
de navios do Brasil por submarinos alemães
instituições que não tinham vinculação com o partido nazista. O relatório de Inspeção Preliminar de 1937, realizado a pedido da Inspetoria
(DIETRICH, 2007, p. 341). Em várias cidades brasileiras, incluindo Porto Alegre, houve tumulto e
Geral do Ensino Secundário, apresenta
quebra-quebra.
Sobre
memórias
da época de guerra nos informam as
a seguinte informação:
depoentes:
“Para compreensão deste documento
Não podia ter luz acessa de noite, quando
é necessário esclarecer que das 350
tinha blackout. Lembro de meu avô fazendo
sociedades civis, beneficentes e recreativas
tampos para a janela para poderem atender as
do Rio Grande do Sul, 30 tornaram-se
crianças de noite, porque éramos pequenos. Mas, nós
alemãs, filiando-se à Liga das Sociedades Alemãs,
não sofremos nada” (Vera Maria Hemb Becker).4
em consequência do movimento nazista; a sociedade
“Eles quiseram invadir o bar do meu pai, mas
mantenedora do Ginásio Farroupilha foi uma das
os bombeiros que se localizavam próximo pegaram
dez que não aderiram”.3
as mangueiras com jato de água e os tocaram dali!
Não estamos afirmando que não havia algumas
Depois disso, meu pai colocou o nome de Aimoré
pessoas simpatizantes ou que tivessem algum tipo
no bar, nome de índio para não ter mais problema”
de ligação com o partido nazista no Hilfsverein, Relatório de Inspeção Preliminar Ginásio Teuto-Brasileiro Farroupilha, 1937 1° volume. 4 de abril de 1937. Ministério da Educação e Saúde Pública – Inspetoria Geral do Ensino Secundário. Disponível, juntamente aos demais documentos desse livro no acervo do Memorial do Deutscher Hilfsverein ao Colégio Farroupilha.
(Hedy Boelhouwer).5
3
BECKER, Vera Maria Hemb. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
4
5
BOELHOUWER, Hedy Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento
Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência
95
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
A ordem dos manifestantes era invadir qualquer estabelecimento ou instituição que tivesse nome escrito em alemão. O então Ginásio Farroupilha, mesmo tendo nome em português, foi alvo dos manifestantes. No entanto, o diretor Álvaro Difini “atravessou a turba e conseguiu acalmá-la, afirmando que o estabelecimento era um colégio brasileiro, dirigido por brasileiros” (TELLES, 1974, p.138).
poderes: o da transformação e o da resistência de seu “ethos” fundador. Nosso estudo agora tem como foco de análise o Colégio Farroupilha. A partir de indícios e representações do que de concreto houve criamos a nossa abordagem sobre o passado. Através de cartas, fotografias, desenhos e demais documentos buscamos certa imersão no passado entrecortado, incerto, como nossa memória, mas rico em
Assim, a escola foi resistindo a dificuldades como essa e se tornando cada vez mais o centro das atenções de sua mantenedora, a ABE de 1858.
significados e forte na presença de uma identidade. Observem, a partir de agora, o abrir repentino de antigas salas de aula que nos
Após o sucesso de tantos trabalhos
provocarão sentimentos e percepções
voluntários realizados em suas variadas
quanto ao universo escolar do Colégio
comissões voltadas para os imigrantes, a ABE começou a trilhar outro caminho ao lado da comunidade teuto-brasileira, a
partir
da
grande
demanda
que
representava a educação em Porto Alegre. Assim, com o passar das décadas, a ABE foi encerrando suas variadas comissões e se transformando em
Farroupilha.
também,
que de uma forma ou de outra, eles estarão lá: imigrantes, antigos mestres, diretores,
alunos,
comerciantes,
artífices, “Brummer”, maçons, evangélicos, livres pensadores... a Hilfsverein.
uma entidade voltada para a educação, ou melhor, para a excelência na educação. As equipes que por ela passaram, incluindo seus presidentes, gestores, colaboradores, conselheiros, são muitas. Aliás, só são muitas porque todas elas, de uma forma ou de outra, equilibraram dois concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 30 de julho de 2012.
96
Observem,
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Colégio Farroupilha, década de 1940 Para além da escola – a mantenedora: sustentáculo e resiliência
97
CAPÍTULO II
Matemática - Cubos, tabuadas e condução global
O
s alunos do Colégio Farroupilha, entre
melhor o compêndio escrito por Kleikamp era
finais do século XIX e o início do século
utilizado nas primeiras séries. Na terceira, por
XX, já utilizavam alguns livros e compêndios
exemplo, era possível utilizá-lo para os conteúdos
didáticos em sala de aula. Mas, esses livros não
de “operações fundamentais num espaço superior
eram graduados. O diretor ou professor decidia
de numeração. Leitura e escrita de números num
o programa de cada escola ou turma, pois ainda
espaço infinito. Massa e peso no sistema métrico”.
não era adotado um padrão oficial.
(FONSECA, 2007, p.97)
Ao pensarmos sobre os livros didáticos
De acordo com o depoimento de
daquele período, nos deparamos com
Rodolfo Herrmann, que estudou no
uma questão: as escolas étnicas, como
Farroupilha entre 1900 e 1906, vários
o Colégio Farroupilha, que adotavam o
compêndios
alemão como a principal língua em sala
eram escritos por Kleikamp. Eles eram
adotados
pela
escola
de aula, qual bibliografia utilizavam? Importavam
impressos na Tipografia Gundlach e vendidos na
livros da Alemanha?
Livraria Krahe (TELLES, 1974, p.79).
Podemos afirmar que havia livros importados,
A Escola de Meninas da ABE, que existiu
mas as escolas étnicas adotaram, mesmo, os livros
entre os anos de 1904 e 1929, também apresentava
escritos em alemão e publicados no Rio Grande
o ensino de Matemática, mas não conseguimos
do Sul. Vejamos o caso da Matemática.
informação se no início do século XX as aulas já
Um dos livros mais utilizados nessa época, em
eram iguais às dos meninos. Segundo Pais:
todo o estado, foi escrito pelo diretor do Colégio,
“Desde a Lei das Escolas de Primeiras Letras, de
Christian Kleikamp, autor do Livro “Aritmética
15 de outubro de 1827, as meninas não estudavam
para escolas alemãs-brasileiras” . O livro, ou
Geometria e a parte da Aritmética era bem reduzida
6
6
Rechenbuch für deutsch-brasilianische Volkschulen
Matemática - cubos, tabuadas e condução global
99
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
em relação aos conteúdos previstos para os meninos. Enquanto o plano de estudo previsto para os meninos envolvia o estudo das operações com números naturais, frações, números decimais, proporção, aplicações e noções elementares de geometria; o plano de estudo previsto para as meninas somente envolvia as quatro operações fundamentais” (PAIS, 2011, p. 135). Quanto ao meio físico e objetos didáticos para as aulas de Matemática, o fundamental, para uma boa aula era caderno, caneta (como vemos na imagem) e um ambiente adequado. Do “Velho Casarão” onde a escola manteve-se até o início da década de 1960 podemos salientar: Quadros Negros – Quase todos são de massa adequada e embutidos na parede, devidamente dispostos em relação à iluminação das salas. São todos de cor verde escura.7 Pintura das paredes: É de cor clara e opaca, permitindo difusão uniforme da luz. Carteiras: são amplas e de dimensões apropriadas à idade dos alunos. Têm as dimensões regulamentares e o espaldar de forma anatômica. O tampo, ligeiramente inclinado, tem lugar para lápis, caneta e tinteiro. Ruy Barbosa ao abordar em um de seus textos a questão educacional afirma que o quadro negro para o professor “é tão necessário ao mestre como o arado ao agrícola, a plaina ao carpinteiro, ou a lanceta ao cirurgião”. In: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010201881999000200011&script=sci_arttext>. Acesso em: 12.ago.2012.
7
100
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Sala de Aula do Colégio Farroupilha. Segundo quartel do século XIX Matemática - cubos, tabuadas e condução global
101
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Sala de Aula, Colégio Farroupilha – década de 1940
Colégio Farroupilha, sétima classe de 1936
Móveis Diversos: o mobiliário é confortável e
nhamento de muitos alunos para cursos das áreas
higiênico: mesa para o professor, poltrona, armários
exatas, principalmente para as Faculdades de En-
e estrado, com dimensões regulares.8
genharia. No ano de 1968, por exemplo, consta que
A qualidade das aulas, a experiência e amizade
23 alunos prestaram vestibular para Engenharia e 22
dos professores de Matemática provocaram um
passaram, sendo do Colégio Farroupilha o aluno que
efeito interessante na história da escola. Para
tirou o primeiro lugar para esse curso da UFRGS.
entendê-lo lembremos do matemático húngaro George Polya que, sobre a Matemática, afirmou:
Um dos professores da Faculdade de Engenharia da UFRGS também lecionava no Farroupilha.
“Se experimentar prazer com a Matemática,
Era o professor Ricardo Cauduro, formado em En-
não a esquecerá facilmente e haverá, então, uma
genharia Mecânica e Elétrica, catedrático da cadei-
grande probabilidade de que ela se torne alguma
ra de Termodinâmica na Universidade Federal do
coisa mais: uma ocupação favorita, uma ferramenta
Rio Grande do Sul.10
profissional, a própria profissão, ou uma grande
É interessante observar como a memória é car-
ambição”.9
regada de percepções relacionadas aos diferentes
De acordo com os relatórios de reunião da ABE
sentidos. Ao falar do professor Cauduro, além de
de 1858 das décadas de 1950 e 1960, havia encami-
sua grande capacidade como mestre, os alunos che-
Colégio Farroupilha – Relatório de Verificação encaminhado para o Governo Federal - 1949
8
Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências e Tecnologia. Clube de Matemática. Disponível em: <http://eventos.fct.unl.pt/clubemath>. Acesso em: 18.out.2012.
gam a sentir novamente o aroma inconfundível de seu charuto.
9
102
Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/diarios/2552289/dousecao-1-14-02-1957-pg-6>. Acesso em 02.out.2012.
10
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Ingrid Schulze lembra que para as quartas séries do ginásio ele ensinava álgebra e “às vezes, ele tinha passado no corredor e a gente sabia: ‘Ah, o professor Cauduro já está aí.’ O cheiro daquele charuto permanecia”.11 Em meados do século XX já era mais comum o professor manter diálogo com os alunos, ouvir suas dúvidas e ideias. Também percebemos que, na Matemática, os mestres utilizavam muita criatividade para contribuir com a aprendizagem: “O professor Lucien Thys sempre foi um professor muito querido, e ele tinha também um carisma, uma maneira de apresentar os conteúdos de Matemática - ele dava Geometria e teoremas, essas coisas assim. Claro que para mim nunca foi fácil, mas as aulas dele eram interessantes, o jeito dele era interessante. Quando introduziu os teoremas, ele disse assim: ‘Teorema é basicamente para a gente
Detalhe da Sala dos Professores (década de 1930) ao fundo, sobre a mesa um mata borrão
desenvolver uma linguagem exata. Ali não se fala
que é preciso’. Isso foi uma coisa que o professor de
nem demais nem de menos. Não pode deixar nada
Matemática deixou como marca” (Ingrid Schulze).12
fora, não pode acrescentar nada. É uma linguagem muito enxuta e muito exata. Imaginem vocês se eu
Quanto à época do nacionalismo compulsório
vou descrever um aparelho: Onde aqui sai uma coisa
(Estado Novo), as aulas de Matemática sofreram
meio redonda, meio comprida, depois aqui tem um troço... Negócio, troço, coisa não é denominação exata! Então comparando esta linguagem com as
alterações, uma vez que professores foram demitidos e o ensino não poderia mais ser ministrado em alemão. O documento na página ao lado, escrito
linguagens dos teoremas, o cuidado de dizer só o Schulze, Ingrid. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
11
ainda em alemão, como podemos ver, apresenta
12
Ibidem.
Matemática - cubos, tabuadas e condução global
103
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Listagem de Alunos do Quinto Ano - 1938
104
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Colégio Farroupilha, terceiro ano B – 1938
os dados de 1938 de uma determinada turma
Portuguesa”. Mas, de qualquer forma, a maioria
de crianças com média de idade de onze anos.
das crianças, para continuar seus estudos precisava
Esse documento nos remete a vários detalhes,
aprender o português com fluência. E quanto
como os locais de moradia e os sobrenomes dos
à Matemática? O “fazer as contas” em alemão
alunos, mas, gostaríamos de chamar atenção
remete a uma ordem inversa com as quais os
para as observações escritas no final da página.
alunos tiveram de se acostumar:
Na penúltima linha consta que, dos 49 alunos, 37 falam só alemão, um fala só português e onze falam alemão e português. É provável que o “falar” português refira-se à fluência na língua, pois havia no currículo do curso primário “Língua
“Na língua portuguesa, a leitura dos números segue a ordem em que estão expressos seus algarismos – da esquerda para a direita - fazendo com que o número 23, por exemplo, seja lido ‘da dezena para a unidade’. Já na língua alemã, a nomeação dos
Matemática - cubos, tabuadas e condução global
105
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
vez que era utilizada em vários exercícios. Ao lado observamos um caderno de Matemática onde as palavras estão lá, é claro. O caderno ao lado13, da década de 1950, nos remete a outra temática: o material didático individual usado no Colégio Farroupilha. Ainda no início do século XX, ao invés de cadernos, eram utilizadas pequenas pedras de lousa (quadro negro em miniatura). Podemos observar que as exigências dos professores não se focavam apenas no desenvolvimento dos exercícios, mas também na organização, na ordem do caderno. Inclusive, chama a atenção o fato de cada número estar milimetricamente separado do outro através do quadriculado. E por falar em ordem, para mantê-la na escola, a Matemática era algumas vezes utilizada como mesmos números segue a ordem inversa, ou seja,
castigo:
23 é lido como ‘dreiundzwanzig’ (três e vinte).
“Na quarta série do Ginásio houve um episódio.
Essa maneira de expressar os números permanece
Uma grande parte da turma resolveu matar aula
até mesmo com quantidades maiores [...] 225
depois do recreio e foi à matiné em um cinema do
(zweihundertfünfundzwanzig, ou, dois cem, cinco e
centro da cidade. O que eles ganharam como castigo?
vinte)” (WANDERER, 2007, p. 26).
Não sei quantos teoremas de Matemática para fazer”
Talvez mentalmente as crianças continuassem
(Ingrid Schulze).14
a ler os números da esquerda para a direita, o que não trazia complicações na hora de escrevêlos. Mas, a língua portuguesa começou a ser praticada também nas aulas de Matemática, uma
106
Caderno escolar de Ralf Heimig – Ginásio, Primeira Classe, Colégio Farroupilha.
13
Schulze, Ingrid. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
14
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Ainda sobre os livros didáticos, como se
Bunse e Tochtrop eram, então, professores da
mantiveram os mesmos por muitos anos, era
Faculdade de Pedagogia da UFRGS e colaboraram
possível reaproveitá-los. Vera Matte, sobre o final
para um repensar do Colégio Farroupilha em
da década de 1940, recorda:
relação à Aritmética.
“No ginásio, lembro que não tinhamos muitas
Mas, a adaptação do Farroupilha parecia lenta
condições financeiras. Então, logo nos primeiros dias de
em meio ao turbilhão de transformações. Os desafios
aula, eu pedia emprestado os livros que tinham sidos usados por um vizinho que estava um ano na minha frente. Vosse de Português, de Matemática, Geografia, História. Quase sempre eram os mesmos. Isso era uma tônica de todas as escolas particulares e públicas. A diretriz especialmente do curso ginasial era
do ensino da Matemática eram muitos em meados do século XX. As novas descobertas relacionadas às Ciências Exatas estavam intrinsecamente ligadas à revolução tecnológica e industrial, e também relacionada ao desenvolvimento comercial. Mas, como criar uma metodologia para que os jovens, já na escola, começassem esse aprendizado?
uma diretriz nacional” (Vera Matte).15
“A sociedade exigia acesso a essas
O Colégio Farroupilha, a partir da
descobertas e obrigava pesquisadores e
década de 1950, era visto de forma muito
professores a refletirem sobre o ensino de
positiva pelos técnicos da educação do Go-
Matemática numa dimensão mais utilitária,
verno do Estado e também junto às demais instituições de ensino. Fazia parte de uma rede que englobava todo o sistema de ensino e assim a escola foi provocada a partilhar conhecimentos e se transformar. Em um relatório do ano de 1958, consta: “Na vida interna do educandário continuou a
progresso no novo mercado de trabalho” (FRANÇA, 2007, p. 34). Na década de 1970 encontramos nos relatórios do ensino de Primeiro Grau do Farroupilha
iniciada no ano anterior e ainda orientada pelos
várias referências a reuniões e capacitações dos
professores Dr. Heinrich Adam Wilhelm Bunse e
professores em “Matemática Reformulada”: Zoltan Dienes, professor húngaro, criador
MATTE, Vera Elisabeth Reimer. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi no Memorial do Colégio Farroupilha. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
15
disciplina por maior número de cidadãos, para o
processar-se a reestruturação do ensino de Aritmética,
Leonardo Tochtrop”.16
16
com a possibilidade da compreensão da
Relatório do Curso Primário, 1958.
dos blocos lógicos “propunha atividades do ensino
baseadas
na
psicologia
de
Piaget”
(VASCONCELOS, 1996, p. 309). A primeira vez
Matemática - cubos, tabuadas e condução global
107
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Colégio Farroupilha - Relatório Relativo ao ano de 1973
que veio a Porto Alegre, ainda na década de 1960,
do Colégio Farroupilha. Na década de 1970,
foi assistido por mais de 900 professores. Depois
essa publicação apresentava aspectos teóricos e
disso veio mais dez vezes, uma delas, em 1973.
práticos sobre o assunto. Na coluna “Atividades
Colégio
Bem Sucedias” os professores enviavam suas
Farroupilha, com apoio da ABE de 1858,
experiências, como na matéria acima. Em várias
adquiriram 10 blocos lógicos, de forma que a
edições professores e pedagogos escreveram
Matemática foi reformulada.17 E o novo setor de
afirmando que, através dessa nova proposta,
audiovisual, criado na escola em 1972, também
a Matemática “[...] deixaria de ser monótona,
apresentava modelos em acrílico utilizados em
sem vinculação com o mundo, para se vincular
sala de aula para o ensino de Geometria.
à vida diária”.19
Nesse
ano,
os
professores
do
18
A Matemática Moderna ou Reformulada foi
É bom lembrar que a sensibilidade em relação
um dos assuntos destacados na Revista do Ensino,
à monotonia é completamente vinculada ao
cuja coleção, faz parte do acervo do Memorial
tempo ao qual nos referimos, é vinculada a cada
17
Relatório anual do Colégio Farroupilha – 1973.
108
PEREIRA, Luiz Henrique Ferraz. Revista do Ensino do Rio Grande do Sul e os Discursos sobre o Movimento da Matemática Moderna. Disponível em: < http://www.smmmfloripa.ufsc.br/Pereira_art.pdf>. Acesso em: 02.out.2012.
19
Schulze, Ingrid. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
18
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Revista de Ensino – 20 de novembro de1973
geração. É possível que para alunos do século XXI
Nagel. Tinham um padrão de exigência, mas com
as atividades propostas na década de 1970 fossem
uma qualidade de ensino que é valorizada até
monótonas, no entanto, era o que tinha de mais
hoje... Como o modo, a capacidade de lecionar. Um
“moderno” – objetos em acrílico... fantástico!
exemplo é o professor Cauduro, a forma como ele
Contudo, se nos desvincularmos dos inúmeros
ensinava Matemática. Então, esse conjunto, esse
contextos com os quais o Colégio Farroupilha se
perfil dos professores, cada um com o seu estilo, dava
envolveu, desde 1886, e se observarmos as histórias
uma condução global. (Jorge Gerdau)21
de vida de seus ex alunos haveremos de convir 20
que para muito além dos conteúdos houvesse algo importantíssimo: uma condução global... Eu tenho imagens extremamente positivas, em geral, do Colégio [...]. Os professores do Ginásio já eram pessoas de mais idade, extremamente fortes na sua personalidade - professor Fassina, Nicklas, Johannpeter, Jorge Gerdau. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido em seu escritório à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
21
Como fonte salientamos os depoimentos concedidos para esse livro e entrevistas concedidas à Revista Farroupilha.
20
Matemática - cubos, tabuadas e condução global
109
CAPÍTULO II
Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras “Naquele tempo tudo era na brincadeira, era tirar o guri de casa para acomodar um pouco, para depois levá-lo para casa de novo, quer dizer, enquanto o pai trabalhava e a mãe trabalhava. E assim foi se criando...”
das memórias de Frederico Falk que cursou o Jardim em seu primeiro ano de funcionamento, em 1911: “Passávamos as horas com jogos, cantos e trabalhos manuais. Nunca, porém, me pude conformar de me exigirem, também, trabalhos com
Essas são as memórias de Jorge Bertschinger
22
em relação aos anos em que cursou o Kindergarten, o jardim de infância da
agulha e linha, feitos em cartolina com riscos já impressos” (apud TELLES, 1974. p. 94). Provavelmente
então Sociedade de Beneficência Alemã. A recordação de um tempo de brincar nos remete às ideias do mentor e criador dos primeiros jardins de infância, Friedrich Froebel. Ele salientava a importância de jogar, tecer, cortar, enfim, brincar para “desenvolver os poderes inatos da criança”.23
influenciada
pelo
método intuitivo, Maria Gruber, com apoio da ABE, vencia paradigmas, trabalhando com uma turma mista, de
tenra
idade
e
com
materiais
inimagináveis, principalmente para meninos. Podemos observar que Jorge Bertschinger
Levando em consideração o fato da professora
menciona o trabalho feminino em seu depoimento.
do Kindergarten, Maria Gruber, possuir curso de
No início do século XIX as mulheres de camadas
formação de jardineira, realizado na Alemanha,
média e alta de Porto Alegre não exerciam nenhuma
podemos compreender os métodos e materiais
atividade profissional, mas havia exceções, e as
utilizados por ela. Esses materiais nos chegam através
“alemãs” estavam entre elas. No modelo familiar
BERTSCHINGER, Jorge Guilherme. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e a Milene Morais de Figueiredo, na ABE de 1858. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
22
KISHIMOTO, Tizuko Morchida. Froebel e a Concepção de Jogo Infantil. In: EDUCA - Periódicos On Line em Educação. Disponível em: <http:// educa.fcc.org.br/pdf/rfe/v22n1/v22n1a06.pdf>. Acesso em: 09.out.2012.
23
dos teuto-brasileiros as esposas, além de se responsabilizarem pela a casa e pelos filhos, muitas vezes colaboravam no ofício da família.
Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras
111
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Jardim de Infância turma de 1929. Ao centro Frau Gruber
Em 1913 o Jardim de Infância tinha 39
Sévigné (1919)24; Colégio Batista (1930)25; Colégio Americano (1945). O primeiro jardim de infância
crianças. Segundo Milene Figueiredo:
público de Porto Alegre foi criado na Escola Normal,
“No Rio Grande do Sul, especialmente em
hoje Instituto de Educação General Flores da Cunha,
Porto Alegre, até o momento, considera-se o primeiro jardim de infância particular o criado no Deutscher Hilfsverein (1896), atual Colégio Farroupilha, no ano de 1911 e que funcionou até 1929. Outras iniciativas ocorreram a partir dessa data: Colégio
em 1929” (FIGUEIREDO, 2012, p. 2). O Colégio Sévigné foi fundado no início do século XX e em 1906 foi assumido pela ordem religiosa francesa das Irmãs São José. O Sévigné possuía uma Escola Normal para a educação de moças e, a partir de 1919 passou a contar com um Jardim de Infância. No ano de sua fundação já havia quase 40 crianças matriculadas. No ano seguinte o número de alunos subiu para 110 crianças entre 6 e 9 anos (SOUZA, 2000, p.100).
24
O Colégio Batista foi fundado em 1927 por missionários americanos, e apesar de não haver muitos registros acerca deste período, sabe-se da existência de uma turma de Jardim de Infância no começo da década de 1930.
25
112
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
O Kindergarten esteve sob a direção da ABE
“Jogava-se sapata, barra, piorra, ou com
até 1929. Depois, passou a fazer parte da Ordem
bolinhas de gude, às deveras ou a brinquedo. Jogos
Auxiliadora das Senhoras Evangélicas. Apenas na
de pelota ainda não eram usados, visto que o futebol
década de 1970 a escola voltaria a ter Jardim de
foi introduzido em Porto Alegre por volta de 1903 ou
Infância, como já vimos. E a partir de 1992 foi
1904, quando veio um time do Rio Grande mostrar
inaugurado o Berçário e Maternal do Farroupilha.
aos porto-alegrenses como se praticava o velho esporte
Para essa faixa etária são propostas situações
inglês. Essa demonstração dos rio-grandinos constituiu
de aprendizagem levando em consideração as
grande sucesso entre a juventude da época”.26
características individuais de cada criança, em
Em ambas as escolas, as aulas eram em alemão,
uma rotina baseada no cuidar e educar. Mas, voltando ao início do século XX,
até porque, nesse contexto de início do século XX, o processo de letramento estava completamente
enquanto as crianças “brincavam”, as
ligado à cultura da comunidade teuto-
meninas estudavam nas dependências
brasileira de Porto Alegre. No entanto,
da Comunidade Evangélica na Rua
os membros dessa comunidade, que valorizavam sua origem, também se
Senhor dos Passos. Em 1913, a Escola
sentiam cidadãos brasileiros, e sendo
de Meninas do Hilfsverein apresentava
assim, consideravam importante que
153 alunas. Já, a algumas quadras da Comunidade
seus filhos soubessem o português e por isso ele nunca deixou de ser ensinado.
Evangélica, localizava-se a Escola de Meninos, na Rua São Rafael (hoje Rua Alberto Bins), frequentada, nesse mesmo ano, por 250 alunos. Na Escola de Meninos e na de Meninas
Quando a escola estava em período de formação de seu Ginásio, na virada do século XIX para o século XX, as aulas de Português para as últimas séries eram intensas:
do Hilfsverein, os recreios eram momentos
“As séries seguiam o programa do Ginásio
importantes, de atividades lúdicas e físicas com alto grau de sociabilidade.
Nacional, no Rio, os alunos ao completarem o
Carlos Tannhauser,
oitavo ano já estavam suficientemente preparados
que foi presidente da ABE, estudou no “Velho
para o futuro ingresso numa academia. O ensino
Casarão” no final do século XIX. Quanto aos
de Português nas últimas três classes, aliás, visava
recreios ele recorda:
26
O Clarim, julho de 1952, p. 10.
Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras
113
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
a esse ingresso, estando em consonância com o do Ginásio Nacional” (TELLES, 1974, p.86). No relatório do Conselho escolar de 1906 consta além do Português o estudo de Alemão, Inglês e Francês. Detalhe: o francês era ensinado “com aulas em alemão” (TELLES, 1974, p.86). O sistema escolar mantido pela ABE de 1858 sofreu alteração significativa no ano de 1929: o ensino passou a ser misto. Pelas informações que dispomos, as turmas não foram simplesmente unidas em uma sala, o conteúdo programático era praticamente igual para meninos e meninas. Os alunos se separavam apenas na hora de Trabalhos Manuais e nas aulas de Educação Física. No entanto, a distribuição espacial nas salas de aula apresentou uma transformação mais lenta. A ordenação de classes na sala de aula era normalmente de quatro fileiras de meninos para um lado e quatro fileiras de meninas para o outro. Pelo menos até a década de 1950 encontramos essa distribuição espacial. A língua portuguesa começou a ter outra dimensão na escola após a década de 1930, quando o alemão saiu completamente do currículo. O processo de alfabetização dos novos alunos se transformou, mas não só por causa da proibição do uso do alemão, mas porque a educação no Brasil todo passava por uma reformulação.
114
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Turma de Meninas – 1912 [data aproximada] Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras
115
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
A partir da década de 1930, com o movimento da Escola Nova, a leitura é reconhecida como um importante elemento para o ensino dos pequenos, bem diferente da época do ensino mútuo em que o foco estava na escrita e na oratória dos professores. No Colégio Farroupilha, depois da alfabetização através das cartilhas, quando o aluno já estava no segundo ano, tudo leva a crer que entrava em cena um elemento muito importante, o livro escolar, ou manual. A Série de Leitura Graduada Pedrinho era uma delas. Segundo o autor Lourenço Filho, essa série foi criada levando em consideração as “exigências da evolução psicológica da criança” (Lourenço Filho, 1964, apud, CUNHA, 2011, p. 8). A leitura, no caso dos alunos do Colégio
Até 1939 era possível realizar de forma gradual
Farroupilha, trazia muitas vezes um elemento
o processo de aprendizagem do vernáculo, ou seja, a
novo que para a maioria dos brasileiros não havia:
língua portuguesa. No entanto, a partir do processo
o aprendizado de uma nova língua. Como lembra
de nacionalização, todas as aulas eram em português.
Vera Matte:
Inclusive as línguas estrangeiras ministradas eram
“Minha primeira língua foi o alemão. Português
apenas francês, inglês e latim, sem alemão.
a gente aprende depois! Primeiro era o alemão. Isso
No final da década de 1940, ao chegar o mês
era uma concepção [...]. A minha bisavó só falava
de setembro, as crianças do primeiro ano primário
alemão. Quando uma vez um ladrão foi lá, quis
do Farroupilha terminavam a Cartilha Vivi e Vavá
roubar a casa da minha avó, ela viu, chamou ele e
e se preparavam para a Festa do Livro, última
disse: “Vegonha! Trabáia! Não precisa rôba” (Vera
atividade sugerida nessa cartilha. Para a festa,
Matte).27
onde eles recebiam a Cartilha Proença, a equipe diretiva e a família eram convidadas. Durante
MATTE, Vera Elisabeth Reimer. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi no Memorial do Colégio Farroupilha. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
27
116
muitos anos, nessas ocasiões, a diretora do Curso
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Detalhe do álbum da turma de 1959
Primário, Wilma Funcke, recebeu um convite
Quanto à estética da letra, vinha um ponto
muito especial, um álbum, confeccionado pela
fundamental: não bastava ser legível. As letras
professora da primeira série juntamente com
deveriam apresentar-se no padrão: arredondadas
os alunos. Ele iniciava com uma apresentação e fotografia da turma e logo após apresentava pequenas cartas escrita pelos recém-alfabetizados. “A prática da escrita de carta à diretora parece ser a primeira experiência para muitos dos alunos
e de um mesmo tamanho. Caso a criança fosse alfabetizada e a letra ainda não estivesse “bonita”, ela teria os próximos anos de escola para aperfeiçoá-la:
[...]. As cartas seguem as normas padrão de escrita
“No terceiro ano, a Dona Emma Moreira me
epistolar, as quais faziam parte da aprendizagem [...]
marcou pelo excesso, em me fazer escrever, em fazer
Percebe-se uma orientação uniforme e uma prática
de novo. Ela olhava: “Não está muito bonito, faz de
homogênea entre os docentes. No entanto, alguns
novo”. E assim, tudo a Dona Emma me mandava
alunos foram além do modelo proposto, exercendo
fazer de novo. As nossas redações ela corrigia e se a
uma escrita mais autônoma e pessoal” (BASTOS, 2012, p. 86).
letra estava feia, mandava fazer de novo. Um dia, eu não sei como, parece que alguém colocou a mão
Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras
117
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Relatório do Curso Primário – Colégio Farroupilha - 1950
118
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Chá das Professoras do Colégio Farroupilha, década de 1950
na minha mão e a coisa começou... Impressionante como mudou a minha letra” (Hedy Boelhouwer).28
Quanto às aulas de Trabalhos Manuais Vera Matte, recorda:
Para além do aprender a ler podemos observar
“Na terceira série primária, aprendíamos a
pelo documento da página ao lado – uma parte do
prender botão na sala de aula, a professora é quem
relatório do Colégio referente ao ano de 1950 – que
ensinava. O ponto atrás, o ponto corrente, aquilo
havia várias aulas “especializadas” no programa
tudo. A gente aprendia a fazer os guardanapinhos.
curricular do curso primário, composto, na época, de cinco anos.
rendinha, e depois ia para a exposição no final do
BOELHOUWER, Hedy. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 30 de julho de 2012.
28
A mãe é quem, depois, fazia o crochê ou botava ano. Lembro-me bem, na primeira série ginasial, a
Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras
119
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
fogo, jogou lá dentro, e novamente colocou o ovo na boca da garrafa, e assim ele entrou!” (Fernando Carlos Becker)30. Os passeios e excursões também faziam parte da vida escolar. Vimos anteriormente que em uma das cartas escritas a Dona Wilma o aluno destacou um passeio ao Palácio Piratini. Esse passeio seguidamente era realizado por diversas turmas Alunos do Colégio Farroupilha - Visita ao Palácio Piratini – 1958
entre as décadas de 1950 e 1960:
gente aprendeu a fazer tricô, vários pontos! Isso eu não guardei. Tinha um álbum, onde a gente punha as amostras que tinha aprendido. Bainha
O turismo pedagógico, já era realizado na escola no começo do século XX, sendo importante complemento
aberta, tudo aprendíamos como trabalhos
formal,
entre ensino e vida:
faziam esculturas em madeira. Faziam maravilhas com aqueles formões, uns
Alguns passeios na primeira metade
instrumentos cortantes...” (Vera Matte).29
do século XX realizavam-se na parte
O ensino prático também fazia parte de outros momentos, como as aulas de Ciências, por exemplo. Vem da década de 1940 lembranças da professora da quinta série do curso primário: “Da professora Jurema Almeida, eu recordo algumas coisas que marcavam uma criança. Uma
rural do município de Porto Alegre, como a Chácara das Três Figueiras de propriedade do Colégio, outros, realizavam-se nas proximidades da escola e de forma bastante informal. Rudolf Falk que estudou na escola naquela época recorda dos passeios com o professor de Ciências Naturais, Theodor Kadletz:
vez ela pegou um ovo bem cozido, descascado, e uma
“Seus ensinamentos eram cheios de vida, pois não
garrafa. Tentou colocar o ovo dentro de uma garrafa
raramente convidava a mim e outros companheiros
e não entrava, é claro. Aí ela pegou um algodão com MATTE, Vera Elisabeth Reimer. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi no Memorial do Colégio Farroupilha. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
120
ensino
potencializador de conexões importantes
manuais, na escola. E os meninos
29
ao
meus a acompanhá-lo nos seus passeios de estudo BECKER, Fernando Carlos. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
30
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Professoras 1964, despedida de Dona Wilma Funcke
“Ela tinha uma liderança muito forte no
nos arredores de Porto Alegre à procura de plantas, minérios etc.” (TELLES, 1974, p. 94).
Colégio, com uma personalidade absolutamente
Passadas várias décadas, a equipe gestora
tranquila. Mas ela conduzia aquele Colégio de
continuava a citar em seus relatórios anuais as
ponta a ponta. Interessante, hoje, a gente tem mais
“excursões” do Curso Primário. No ano de 1973
capacidade de analisar como é que uma pessoa
consta: passeio para Veranópolis, na Festa da
exerce uma liderança ou não. Então, era uma
Maçã; Viamão, na Escola Técnica de Agricultura;
liderança forte, mas muito quieta, muito silenciosa
Zoológico de Sapucaia; Museu da Varig; Indústria
na liderança dela. Se eu olho isso, hoje, cresce muito
Springer Admiral, entre outras.
a minha admiração nesse sentido” (Jorge Gerdau)31. Quando Wilma Funcke, se aposentou assume
Outro aspecto interessante de ressaltarmos quanto à educação das crianças, é a forte presença da direção da escola no dia a dia dos alunos. Sobre a diretora Wilma Funcke, Jorge Gerdau recorda:
a direção do Curso Primário a professora Vera JOHANNPETER, Jorge Gerdau. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
31
Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras
121
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Matte. Márcia Terres, que estudou no Colégio Farroupilha na década de 1970, recorda a diretora Vera e seus professores: “Na minha época de estudante a professora Vera Matte era a diretora. Na chegada, tínhamos a presença dela sempre muito bem arrumada, muito sorridente, no início da manhã, aguardando os alunos na ponta da escada. Hoje, a gente se dá conta do quanto era importante ter alguém nos recebendo. Os professores também tinham muito essa marca aqui na escola, de estarem prontos para receber o aluno. Esse planejamento passava até por isso, um preparo, uma valorização desta figura, essa referência do professor era muito marcada naquela época” (Márcia Terres).32 O respeito entre as pessoas que formam a comunidade escolar no Colégio é determinante porque está presente com força na escala de valores de várias gerações que fizeram a história da escola, inclusive entre as famílias que estão na terceira, quarta geração de farroupilhenses e que são várias. Em todos os projetos da ABE de 1858 é flagrante a confiança no potencial humano. Essa confiança era sentida pelo imigrante que despontava no cais do porto e até hoje é sentida pelas crianças ao entrarem na escola. TERRES, Márcia Beck. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 13 de agosto de 2012.
32
122
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Passeio de meninos do Colégio Farroupilha - 1912 Crianças – Primeiras brincadeiras e primeiras letras
123
CAPÍTULO II
Elementos culturais e simbólicos: detalhes do calendário escolar
N
o Colégio Farroupilha, de tempos em
Já o relatório do Colégio Farroupilha referente
tempos, a visão de mundo, a sensibilidade
ao ano de 1959 registra uma palestra sobre
em relação à vida e à aprendizagem se modificam.
literatura infantil e também a “conferência da
Mantêm-se, é claro, estruturas e concepções do
aluna Ana Maria Bergold sobre sua viagem à Ilha
passado, mas, “cada época fabrica o seu universo
do Bananal e visita aos índios Carajás”.
e o fabrica com o que ela tem de próprio, sua ingenuidade específica, suas qualidades, seus dons e suas curiosidades, tudo que a distingue das épocas precedentes” (RAMINELLI, 1990). Podemos,
através
Pensemos no tempo de vida em comum que uma geração vivencia na escola. Nesse tempo, as práticas constitutivas da cultura escolar se transformam, influenciando e sendo influenciadas pelas pessoas que
de
fontes
documentais, observar, à luz de nossos questionamentos, o que consideramos distinto em tempos distantes. Elementos do passado também nos remetem diretamente às curiosidades de cada época. Aliás, o tempo despertava curiosidade:
estão na escola e por aquelas que vêm até ela. A movimentação extracurricular, que se intensifica entre 1960 e 1970, tem o importante papel simbólico de conectar os estudantes aos questionamentos, hipóteses e invenções do seu
“Amanhã, ás 8 horas da noite, no salão do
tempo, nos mais variados campos do saber. Em
Turner-Bund [Sogipa], o Sr. Meyer, director do
1968, para surpresa, mas boa aceitação dos pais,
Hilfsverein [ABE], fará a 5 Conferência das séries
houve um ciclo de palestras sobre orientação sexual
promovidas por aquella associação sportiva. O
para os alunos. Em 1974, a ex-aluna e professora
Sr. Meyer dissertará sobre o thema: o tempo e o
de história Helga Picollo (UFRGS) palestrava no
calendário”.
Farroupilha. Dois anos antes, uma contundente
a
33
Jornal Correio do Povo. Disponível em: <http://www.correiodopovo. com.br/Impresso/?Ano=115&Numero=338&Caderno=0&Noticia=191450>.
33
Aceso em: 29.ago.2012.
Elementos culturais e simbólicos: detalhes do calendário escolar
125
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Apresentação artística - ao fundo outro modelo de relógio, bem conhecido dos alunos
palestra sobre ecologia com Hilda Zimmermann,
Na rítmica própria do Colégio observamos que
representante da Agapan. Também em 1972, o
há momentos extra-classe bem distintos no calendá-
professor Manoel Leão, apresentou sua conferência
rio escolar. Um deles é o momento “palestra” que
intitulada “A realidade do computador”. O
conecta o grupo da escola com o mundo lá fora e
professor Leão, naquele mesmo ano assumia a
com a inovação. Outro é o momento “comemora-
direção do Centro de Processamento de Dados da
ção” em que a tradição se reforça pela seleção de al-
UFRGS, quando foi instalado o Burroughs B6700
guns fatos que precisam ser lembrados e festejados. Segundo a etimologia da palavra, comemorar
com 1Mb de memória.34
é memorar com. As festas comemorativas fazem CPD 30 anos. Disponível em: <http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/ handle/10183/26659/000282914.pdf ?sequence=1>. Acesso em: 15.ago.2012.
34
126
recordar, trazem à memória as lembranças de
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Centenário da Imigração Alemã - SOGIPA, Bairro São João. Ao fundo casa do grupo de escoteiros – 1924
eventos, fatos ou pessoas, por intermédio de uma
“O aniversário de sua majestade o imperador
cerimônia. São, portanto, atos memorativos.
alemão será comemorado de forma a haver uma
Nessa perspectiva, devem-se pensar estas ações
festividade pela manhã das 11 às 12 horas, depois a
como formas de organização e de seleção, com regras próprias e carregadas de significados, regras que criam condições para uma valorização do que
qual a tarde será livre”. (TELLES, 1974 p. 78) Quanto aos momentos memorativos referentes à imigração para o Brasil, podemos destacar o dia
se deve lembrar e ser lembrado. Entre os atos memorativos encontramos, re-
do centenário do início da imigração, 25 de julho
gistrada no estatuto da escola de 1901, uma data
de 1924, e as subsequentes comemorações anuais
muito especial:
no dia 25.
Elementos culturais e simbólicos: detalhes do calendário escolar
127
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Calendário escolar de 1961 – Colégio Farroupilha
O dia 25 de julho foi oficializado como “Dia do
posteriores, em um contexto político democrático
Colono” pelo governador Flores da Cunha, em 1934.
como foi o ano de 1961, percebemos que
Nesse mesmo ano, a escola participou de uma parada
momentos memorativos da história alemã não
de escolas alemãs que reuniu aproximadamente
são retomados. A única exceção é o Dia da
2.000 alunos. (TELLES, 1974, p. 123)
Reforma Protestante, que passou a ser registrado
O calendário escolar também nos remete a elementos simbólicos ligados a aspectos culturais
década de 1970.
de longa duração, como festividades relacionadas
Desde a década de 1970 faz parte do
à Páscoa e às comemorações do dia de São João.
calendário do Farroupilha o “Dia do Plantio”, que
Comemorações
cívicas
apresentaram
significativa mudança com o Estado Novo, como já vimos. E pelos calendários escolares
128
no calendário no ano de 1962 e permaneceu na
sensibiliza os alunos do primeiro ano em relação à sustentabilidade ambiental e memória individual e coletiva. Ele se desenvolve na sede campestre
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Colégio Farroupilha, Festa Junina, 1955 Elementos culturais e simbólicos: detalhes do calendário escolar
129
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Um dia especial no calendário de 1996: inauguração do Centro Cultural e Esportivo do Colégio Farroupilha
do Colégio, em Viamão, e está na sua 33a edição.
à sede campestre e sentir a emoção do “passar dos
Consiste na formação de um bosque pelos alunos
tempos”.
da primeira série. Eles vão até a sede campestre, e cada um planta uma árvore. Além disso, preparam a urna da turma. Nessa urna são colocados textos produzidos pelos alunos, fotografias da turma, jornais do dia e demais elementos que consideram importantes para representar o grupo. Essa urna é guardada até que os alunos estejam no terceiro ano
Falar de calendário escolar é pensar no ano sideral, no calendário juliano, gregoriano, e porque não farroupilhano? Este é um calendário especial, que localiza no tempo acontecimentos que nos remetem à identidade étnica, imposições políticas, aos dogmas da fé, à dimensão do conhecimento e da curiosidade.
do ensino médio. No último ano de Colégio eles terão no calendário um dia reservado para voltar
130
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Dia do Plantio – Sede Campestre do Colégio Farroupilha – Viamão, 2010 Elementos culturais e simbólicos: detalhes do calendário escolar
131
CAPÍTULO II
O Canto e o coral que transforma e que preserva
A
s aulas de canto, o coral e o canto
Essa identidade hibrida formou-se com o
não formal no Colégio Farroupilha
passar dos anos, sendo as raízes germânicas bem
nas primeiras décadas do século XX nos dão a
mais fortes que as brasileiras até o início do século
dimensão da formação de uma cultura hibrida
XX. Nas décadas de 1920 e 1930, as comemorações
que mantinha “viva a ligação entre as duas
da independência do Brasil apresentavam músicas
pátrias” (GARBOSA 2006, p.94). Através das
em português e alemão. O Hino Brasileiro era
aulas de canto também vamos perceber
entoado em todas as festividades.
que as músicas nacionais foram, aos poucos, entrando no repertório, assim como tantos outros aspectos da cultura brasileira. Garbosa, ao pesquisar sobre o canto no contexto escolar teuto-brasileiro da década de 1930, afirma:
Mas
os
primeiros
professores
contratados para dar aula de Canto eram de nacionalidade germânica, e junto consigo traziam o repertório germânico, como os professores Friedrich Köhling e Karl Händler. Este, “recebera sua formação
“O canto preservou e transformou, mantendo
profissional no Seminário de Wolfenbüttel [...]
viva a essência da tradição dos pais e avós, ao mesmo
Lecionara durante muitos anos em escolas na
tempo em que modelou o descendente dentro da
Alemanha [...]” (TELLES, 1974, p. 79).
perspectiva da brasilidade. O canto em português, incorporado ao repertório e executado dentro dos espaços sociais, constituiu-se em um recurso utilizado para atestar e fomentar o amor ao Brasil, influindo diretamente na construção da face brasileira da identidade híbrida e no sentimento patriótico” (GARBOSA, 2006, p. 94).
Em 1893, por ocasião, da solenidade de lançamento da Pedra Fundamental da escola, na Rua São Rafael, “a cerimônia teve início com o canto Was ist des Deutschen Vaterlandes, traduzido por O que é a pátria alemã” (TELLES, 1974, p. 62). O fato de os professores serem germânicos estava de acordo com a representação que
O Canto e o coral que transforma e que preserva
133
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
toda a comunidade porto-alegrense fazia desse
No entanto, esse processo de hibridismo toma
estabelecimento de ensino: era a escola alemã.
outro rumo com a nacionalização compulsória
Era fruto do associativismo e expressão de
e a entrada do Canto Orfeônico como disciplina
E
obrigatória na década de 1930 (PAGLIA, 2012). O
para a consciência coletiva não só do imigrante
grande idealizador do projeto de educação musical
alemão mas de qualquer etnia a língua materna é
durante a Era Vargas foi Heitor Villa-Lobos. Para
extremamente importante, é:
ele, a música era importante para a formação
consciência coletiva dos teuto-brasileiros.
35
“A expressão por excelência do sangue e do
estética e cívica. Villa-Lobos dizia:
espírito comuns [...] a língua humana significa mais
“O canto orfeônico é o elemento propulsor da
do que uma mera expressão. O sinal identificador
elevação do gosto e da cultura das artes, é um fator
vem a ser a língua. Ela torna possível todas as
poderoso no despertar dos sentimentos humanos, não
demais manifestações e até certo ponto as
apenas os de ordem estética, mas os de ordem
engloba” (Rambo, 1994, apud, RENK,
moral, sobretudo os de natureza cívica. Influi
2009, p. 42).
junto aos educandos, no sentido de apontar-
Nas primeiras décadas de existência
lhes, espontânea e voluntária, a noção de
do Farroupilha, as práticas culturais
disciplina, não mais imposta sob a rigidez
inseriam muitos elementos simbólicos
de uma autoridade externa, mas novamente
germânicos, tendo a língua como um desses
aceita, entendida e desejada. Dá-lhes a compreensão
elementos
se
da solidariedade entre os homens, da importância da
destacavam os livros, as aulas de história da
cooperação, da anulação das vaidades individuais e
Alemanha, os retratos de literatos germânicos
dos propósitos exclusivistas” (GUÉRIOS, 203, p.
como Goethe e, é claro, o canto, a música que
185).
junto aos demais elementos simbólicos dava
O Canto Orfeônico possibilitava o aprendizado
suporte para a identidade da comunidade de
rápido, não exigia tantas habilidades musicais
origem germânica, e com o passar dos anos, deu
ou vocais, sendo considerado “uma prática da
suporte para o hibridismo ascendente.
coletividade em que se organizam conjuntos
centrais.
Contudo,
também
heterogêneos de vozes e tamanho muito variável” http://olympicstudies.uab.es/brasil/pdf/55.pdf
35
134
(GOLDEMBERG, 1995, p. 105).
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Colégio Farroupilha, caderno de notas, Aluna do Curso Secundário, Segunda Série.
Se observarmos as matérias que compõem o
na Alemanha; Registro de Professor em Canto
ensino secundário, vamos ver que até a década
Orfeônico”.36
de 1960 no Colégio Farroupilha consta o Canto
“Nas formaturas se apresentava sempre o coro
Orfeônico no currículo:
do colégio. O coro do Professor Nagel. Eu sempre participei deste coro, era muito bom, tínhamos as
Durante dezenas de anos essa matéria foi
sopranos, as contraltos, depois tinham os tenores
ministrada pelo mesmo professor:
e os baixos, sendo os alunos do científico - já bem
“Johannes Nagel: ex-professor do Colégio
mais velhos, porque a gente terminava o ginásio
Cruzeiro do Sul, professor do Colégio Estadual
com 15. Aos 16, 17, 18 anos já estavam com a voz
Júlio de Castilhos, Curso Superior de Música
36
Relatório de Verificação, 1952, Colégio Farroupilha.
O Canto e o coral que transforma e que preserva
135
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Professor Johannes Nagel
formada. Lembro que o professor Nagel era meio temperamental” (Ingrid Schulze).37 “Lá na escola, ele sentava ao piano e, caso ouvisse alguém falar, se virava: ‘Para rua! Anotação no caderno’. E podia não ser aquela pessoa, se ele dizia ser ela quem falou, mandava para rua. As aulas aconteciam numa dessas salas térreas com janelas para a Rua Alberto Bins, era as sala de aula de canto e coral” (Hedy Boelhouwer)38. 37 SCHULZE, Ingrid. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
BOELHOUWER, Hedy. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora
38
136
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Sala dos Professores, Colégio Farroupilha, década de 1930. O Canto e o coral que transforma e que preserva
137
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Formatura no Theatro São Pedro - 1941
“Na década de 1980 as aulas de música eram
Com a reforma da década de 1970 no
meio formais. Havia ênfase no ensinamento dos
sistema educacional brasileiro, deixa de existir
hinos. Eles deviam ser memorizados, e fazíamos
o Canto Orfeônico, aliás, deixa de constar na
prova oral para verificação. Nós tínhamos de
grade curricular do ensino secundário qualquer
estudar os grupos de instrumentos, era bem teórico
tipo de aula de música. Mantém-se, no entanto,
[...]. A instrumentalização e a musicalização eram
no ensino primário, ou Primeiro Grau, mas com
aspectos pouco privilegiados no currículo escolar”
forte tendência teórica.
(Márcia Terres).39
Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 30 de julho de 2012. TERRES, Márcia Beck. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 13 de agosto de 2012.
39
138
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Juventudes, disciplina e Bildung
A
s práticas e o imaginário dos estudantes
para guris, a Sociedade de Regatas Amizade (hoje
interferem no cotidiano escolar assim
Grêmio Náutico União). O protagonismo desses
como o cotidiano escolar influencia nas relações
seis meninos nos faz pensar sobre a importância da
e projetos de jovens alunos, para além da escola.
dimensão da sociabilidade no mundo dos jovens
Vivências de grupo dentro e fora do Colégio se complementam, se entrecruzam, enriquecendo o
“A turma de amigos é uma referência na trajetória da juventude: é com quem fazem os programas,
que chamamos de cultura escolar. Carlos
‘trocam idéias’, buscam formas de se afirmar
Arnt, aluno do Colégio Farroupilha,
diante do mundo adulto, criando um ‘eu’ e
referindo-se, em um depoimento, ao
um ‘nós’ distintivos” (DAYRELL, 2007).
ano de 1906 recorda:
E qual o papel dos “outros” diante
“Eram meus companheiros de colégio
da condição juvenil? Aos adultos cabe,
e de folguedo os irmãos Arnaldo e Emílio
por exemplo, aconselhar, contar suas
Bercht, Arno e Hugo Deppermann e Hugo Berta, todos regulando de 12 a 13 anos de idade. Nós formávamos um grupo de inseparáveis amigos que passavam todas as horas de folga na minha casa, porque esta, à beira do rio, exercia uma
experiências, também, em muitos casos, apoiar. Edmundo, pai de Carlos Arnt, apoiou a idéia dos estudantes do Hilfsvereinschule, o Colégio Farroupilha.
grande atração aos outros [...] Nas visitas que meus
Edmundo era sócio em uma fábrica de móveis
amigos me faziam, passávamos horas a fio na canoa
na Rua Voluntários da Pátria. Em um terreno
da fábrica, remando ou pescando [...]” (LICHT,
pertencente à Marinha, na frente da fábrica,
2007, p. 13).
localizavam-se as balsas e canoas de sua empresa.
Entre a aula e as horas de folga esses companheiros de escola resolveram criar um clube
Esse local, ele permitiu que o filho e seus amigos utilizassem para o clubinho. Assim, “eles iniciaram a prática do remo, montados em troncos roliços
Juventudes, disciplina e Bildung
139
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
jovens para associarem-se” (LICHT, 2007, p. 11). Em sendo guris, de antemão imaginamos a energia e disponibilidade com que se dedicaram a esse projeto. Mas, para além desses elementos, também disciplina e responsabilidade eram condições necessárias para que os jovens pudessem empreender, e essas características eles traziam de casa e da escola. No estatuto de 1901 do Colégio Farroupilha constava que um dos objetivos fundamentais era “desenvolver as forças morais da juventude” (TELLES,
1974,
p.
76).
Para
tanto,
a
responsabilidade, atrelada à forte disciplina, percorria todo o estatuto e, de certa forma, percorria corredores, salas de aula e ainda mantinha-se em estatutos posteriores: Analisando o depoimento de alunos referentes Carlos Simão Arnt com uniforme do Colégio Farroupilha – década de 1900
era preservada, mas, por vezes, comportamentos
ou sobre as balsas da fábrica, usando pedaços
consolidados
de madeira como remos improvisados.” Licht,
momentaneamente:
descrevendo esse momento, ressalta que:
são
ignorados,
pelo
menos
“A professora Emma dava como lição, por
“A ata de fundação foi redigida em alemão pelo
exemplo, procurar sinônimos e antônimos no
secretário, num caderno pautado do Hilfsverein Schule
dicionário, e aquilo tinhas que decorar, tinhas de
[Colégio Farroupilha] e recebeu a assinatura de seus
saber. Uma vez ela me chamou lá na frente - chamava
fundadores. Outros garotos, irmãos dos fundadores,
um ou outro para ver se sabiam - e eu respondi tudo
também participaram da reunião, porém, como
certinho e ainda disse:
tinham menos de dez anos, foram considerados muito
140
às décadas de 1940 e 1950 é visível que a disciplina
- Ai, que bom, eu nem estudei e soube tudo!
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Regulamento Interno do Ginásio Farroupilha - década de 1940 Juventudes, disciplina e Bildung
141
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
- Ah, tu não estudaste, pois então da nota dez que te daria vais para cinco.
“Certa vez Max e Paulo resolveram ‘gazear’ a
Era assim...” (Hedy Boelhouwer)40 “Às vezes, quando as aulas eram monótonas demais, grupinhos saíam pra passear na Rua da Praia, até que um dia não deu para esconder a ausência [...]. Na volta, encontramos em lugar do professor Klein, a Dona Wilma, e foram as mais desbaratadas as desculpas apresentadas” (Friedrich J. P. Tempel, apud, TELLES, p. 136). A partir do comportamento dos alunos, os mecanismos de controle iam se modificando. Becker recorda:
aula, porque não gostavam do professor (Max não se recorda qual era o mestre). O local escolhido para esse ‘dolce far niente’ foi atrás do Edifício Coliseu. O rio chegava até ali e os dois membros do corpo discente da respeitável Hilfsvereinschule aproveitaram essas horas de lazer forçado, jogando pedrinhas na água, no inocente divertimento denominado peixe-rei. Mas, infelizmente, tais folguedos fora do programa escolar não contaram com o apoio do Diretor Kleikamp, que passou aos dois ‘einen roten Zettel’ (um bilhete vermelho) para entregar aos pais” (TELLES, 1974, p.58).
“Quando entrávamos no colégio tínhamos que carimbar uma caderneta que ia para uma gaveta da sala de aula. O aluno só recebia de volta na hora de ir embora. Então, depois, mais adiante, o grande problema era sair do Colégio para ir ao cinema e voltar, era complicado, era preciso fazer uma ginástica muito especial, mas mesmo assim alguns conseguiam” (Fernando Carlos Becker)41
Encontramos
mecanismos
disciplinadores no Colégio Farroupilha, e algumas pessoas estavam diretamente ligadas a eles, além dos professores: os diretores, o prefeito de disciplina – quando foi criado esse cargo na década de 1940 ele já foi concedido ao professor de Educação Física Armando Capra – e o conservador do edifício. Desde que foi criado esse último cargo, em 1939,
Em épocas anteriores, havia o “bilhete
foi exercido por Ernst Paulo Otto Bode. Além
vermelho” entregue aos pais. Da década de 1890
de zelar pelo edifício, o “seu Bode” controlava
BOELHOUWER, Hedy. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 30 de julho de 2012.
40
BECKER, Fernando Carlos. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
41
142
nos vem a seguinte memória:
a disciplina. Nos recreios, pelos corredores, na escadaria, ele estava sempre circulando. Caso encontrasse alguém fazendo alguma travessura ou
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Colégio Farroupilha – Quarta Classe, 1940
gazeando aula dizia: “Secrrretarrria!!!” (TELLES,
professora, algumas vezes, quando ficava brava,
1974, p. 134).
puxava os cabelos dos alunos próximo à parte
Os professores, de acordo com os estatutos da
superior da orelha.42
escola, não poderiam utilizar castigos físicos, mas
Ao falarmos sobre disciplina a partir da década
essa regra só foi inteiramente cumprida depois do
de 1940, lembramos do relógio. Este instrumento
primeiro quartel do século XX. Jorge Bertschinger
de orientação temporal castigava muitas vezes em
recorda que no Jardim de Infância não havia
dobro: uma por controlar o tempo, de forma que o
castigos físicos, esses estavam reservados para os
recreio custava para chegar; a outra por representar
alunos maiores. Conta que no início do século
42
XX não se utilizava mais a palmatória, mas a
BERTSCHINGER, Jorge Guilherme. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e a Milene Morais de Figueiredo, na ABE de 1858. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
Juventudes, disciplina e Bildung
143
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
menina, tu não podes bater. Tu não podes isto, tu não podes aquilo” (Hedy Boelhouwer).44 Alice Jacques, para sua dissertação de mestrado, entrevistou a professora Zilá Schmitz, do Colégio Farroupilha. Esta lhe relatou uma conversa com um aluno depois de muitos anos de sua formatura. Um dos assuntos entre professora e aluno, agora um adulto, foi o relógio: “Zilá, até Colégio Farroupilha, segundo quartel do século XX, ao fundo “o relógio”
hoje eu não sei por que me botaste embaixo do
um dos castigos mais temidos, ou seja, ficar algum
relógio! [...] Eu acho, Zilá, que foi porque puxei o
tempo de pé em baixo do relógio localizado em
cabelo de uma menina que sentava na frente [...]” (JACQUES, 2011, p. 180).
um corredor com abertura para o pátio: Eu era frequentador disto. Eu era
A maior parte do tempo em que o
bastante inquieto, então, volta e meia
aluno permanecia na escola, ele seguia
tinha de ficar embaixo do relógio. E tinha
as regras mais por autorregulação do que
a caderneta com as observações, elógios
por disciplinamento, porque essa era uma
também. A gente levava para casa, e
característica do Bildung. Esse conceito,
quando apresentava problemas estava anotado na
ligado à pedagogia alemã, pode ser traduzido
caderneta. Era um modo de comunicação que existia
por formação, uma vez que leva em conta mais
entre o colégio e a família. (Jorge Gerdau)43
do que o ensino na escola, mais do que o repasse
Eu fiquei muitas vezes embaixo dele, de castigo. Às vezes, ficava no recreio, e aí todo mundo sabia que estavas de castigo. Eu ficava porque dava nos guris, e nas gurias que implicavam comigo. Aí, a Dona Wilma me chamava e dizia: “Hedy, tu és uma JOHANNPETER, Jorge Gerdau. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido em seu escritório à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
43
144
dos conhecimentos historicamente acumulados (NOGUERA-RAMIREZ, 2009). O conceito de Bildung está ligado à formação do caráter, “prevê além do que se aprende e sabe, o que se pode ser” (ARENDT, 2005, p. 154). BOELHOUWER, Hedy. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Memorial do Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi. Porto Alegre, 30 de julho de 2012.
44
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Livro de Registros de Ordens Internas/Ensino Secundário 1950/1970. Colégio Farroupilha
sejam ligados à música, ao jornalismo, à arte ou ao engajamento estudantil. O Grêmio Estudantil Farroupilha, atuante desde a década de 1940, era prestigiado na escola
Jovens nas ruas, momentos cívicos Para a formação integral dos estudantes a diretoria e a mantenedora do Colégio Farroupilha sempre apoiaram projetos extra-classe dos alunos,
pelos projetos sociais e esportivos. Na década de 1950 seus membros participaram do VII Congresso Estadual de Estudantes Secundários. Foi a primeira vez que o Grêmio fez parte de um
Juventudes, disciplina e Bildung
145
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Alunos do Colégio Farroupilha na Parada da Mocidade - 1943
evento dessa monta. Eram cento e três bancadas
havia
de todos os colégios do Rio Grande do Sul, o
simplesmente sentir, imaginar e, depois, expressar
que gerou certa angústia e timidez por parte dos
esses sentimentos. As aulas de Educação Artística
farroupilhanos, conforme relataram no jornal O Clarim (1953, p. 7). A dimensão da subjetividade, importante na
formação dos jovens, é vivenciada fortemente em experiências como essa em que os alunos eram protagonistas (STEPHANOU, 2006). Mas em sala de aula essa dimensão também era trabalhada,
146
momentos
propícios
para
o
aluno
e Português, quando a ênfase eram as redações e a leitura, eram muito importantes nesse processo. A partir da década de 1920, crianças e jovens da escola tiveram a oportunidade de ver as suas redações publicadas em um jornalzinho mensal chamado Das Band, lido pela comunidade escolar e até fora dela.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Livro de Registros de Ordens Internas/Ensino Secundário 1950/1970. Colégio Farroupilha
Segundo Grimaldi (2011), o Das Band não
O tema geralmente era livre, salvo algumas edições
apresentava um padrão em sua estrutura, mas
que pautavam obrigatoriamente sobre as férias
normalmente partia de um tema central registrado
(março) e sobre a Imigração Alemã (julho), nas
por uma imagem ou por um artigo escrito pelo
outras o tema era pautado pelo desejo do aluno [...]”
professor redator (TELLES, 1974, p.131).
(GRIMALDI, 2011, p. 4).
Os primeiros professores redatores foram Schulz e depois Lichtenberg. De 1932 a 1938, o professor Nicklas assumiu essa função. Quanto à participação dos alunos, Grimaldi informa: “A seção Was unsere Schüler schreiben (O que os nossos alunos escrevem) era a mais famosa do jornal, pois estimulava o corpo discente do Curso Primário ao Ginásio, a produzir diversas redações.
O Das Band, importante veículo educativo, também era conhecido como O Elo. No ano de 1930 ele foi tirado de circulação. Em 1945 surge no Colégio Farroupilha outro jornal, mas dessa vez totalmente editado por um grupo de alunos do Ginásio. O primeiro “diretor” foi o jovem Leandro Telles, também responsável
Juventudes, disciplina e Bildung
147
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
O Clarim, considerado na década de 1960 como “órgão oficial do Grêmio Estudantil Farroupilha”, lembra muito em sua estrutura algumas
publicações
contemporâneas
a
ele
como a Revista do Globo e a Seleções do
Reader’s Digest, ambas com grande circulação no Rio Grande do Sul. Apresentava artigos de conhecimento geral, com adaptações feitas pelos jovens redatores de pesquisas científicas e notícias internacionais. Também havia as seções de humor, “assuntos femininos” e sociais, anunciando festas, formaturas, promoções do Grêmio Estudantil Farroupilha, casamentos e demais acontecimentos em que alunos da escola estivessem envolvidos. Jornal Das Band - Edição comemorativa à imigração alemã no Rio Grande do Sul
pela escolha do nome: O Clarim – Órgão do Ginásio Farroupilha.
uma sessão separada, onde uma redatora escreve sobre assuntos como moda e boa conduta. No entanto, na década de 1960, já percebemos a
O Clarim, entre 1945 e 1965, editou matérias
presença feminina em matérias com enfoques
redigidas por alguns alunos do Colégio onde se
variados, além de vê-las atuantes em atividades até
percebe o contexto, a cultura escolar e também
então consideradas masculinas, como participar
o imaginário juvenil. Grupos de estudantes de
de um rally e ainda chegar em segundo lugar.
três décadas, de certa forma revelam através da revista seus comportamentos, anseios e costumes, expressando o que viam e o que sentiam em relação aos professores, ao ensino, eventos sociais, vestibular, e esporte entre outros temas.
148
Em relação às meninas, o Clarim tende a ter
Em 1963 o redator Antônio Ribeiro, aluno do Farroupilha, noticiou no Clarim que o Grêmio Estudantil do Farroupilha organizou o II Rally Intercolegial de Porto Alegre. As meninas participaram e, inclusive, o carro que chegou em
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Primeiro número de O Clarim Juventudes, disciplina e Bildung
149
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Baile de Formatura do Colégio Farroupilha, Clube do Comércio, 1944.
segundo lugar era formado por jovens moças do
Mário Osvaldo de Barros, que colidiu com um
ensino secundário.45
ônibus”.46
Ainda sobre o rally, a matéria do Clarim
No Clarim é possível analisar a condição
informa que ele foi organizado pelo Grêmio
juvenil de forma a perceber universos culturais com
Estudantil Farroupilha, sendo nas Três Figueiras
características inerentes a determinados grupos,
o local de largada. O resultado...
o que nos faz pensar não em juventude, mas em
“Sagram-se vencedores os participantes do
diferentes juventudes. Bastava ver a diferença entre
‘Volks’ azul, de número 4, do colega Eduardo
rapazes e moças e a diferença entre as gerações de
Fontoura [...] a nota triste da competição foi dada
jovens – anos 50, 60...
por dois acidentes: o primeiro com o carro n 16, que o
capotou; o segundo, em que saiu escoriado o colega
45
150
O Clarim, 1963, p. 19.
No entanto, através do Clarim e demais registros em que se evidenciam a participação
46
O Clarim, 1963, p. 19.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Meninas no desfile da Semana da Pátria. Porto Alegre, Avenida Borges de Medeiros, 1944.
observar
simplicidade.47 Com estilo e simplicidade em sua
características recorrentes, como a procura pelo
conduta, muitas gerações de farroupilhanos foram
perigo e pela aventura. E se formos um pouco
deixando suas marcas positivas nas comunidades
mais atentos às imagens, às linhas e entrelinhas
das quais fizeram e fazem parte, o que nos faz
dos documentos, percebemos também uma escala
refletir sobre uma máxima de Aleida Assman,
de valores semelhantes onde sobressai a presença
referente à educação/formação (Bildung): “Não
da responsabilidade, amizade e respeito.
importa apenas o que sabemos mas também o que
e
produção
juvenil,
é
possível
Uma das estudantes redatoras do Clarim,
somos” (Assman, apud ARENDT, 2005, p. 154).
falando sobre moda na década de 1960, afirmou que as pessoas devem ter estilo, mas com muita
47
O Clarim, 1963, p. 54.
Juventudes, disciplina e Bildung
151
CAPÍTULO II
Jogos e Ginástica no Colégio Farroupilha
N
o Colégio Far roupilha, a hora da
de confraternizar, e esse congraçamento através
educação física, seja nas aulas ou nos
do esporte também era uma forma de afirmação
campeonatos, é um momento de proximidade, de união, de sentir profundamente a força do grupo, é a hora de sentir-se grupo.
identitária. A própria análise do processo de construção de identidades no âmbito do associativismo
Essa mesma descrição poderíamos fazer para os
desportivo sugere que: “ser um teuto-brasileiro
teuto-brasileiros do século XIX quando
implicava
começam a se dedicar ao esporte. Das
enquanto que ser brasileiro significava
primeiras associações desportivas de
ser
Porto Alegre, todas foram fundadas por
s/d). Frequentemente, as associações
teuto-brasileiros:
recebiam a visita de instrutores de
“Entre meados do século XIX e princípio do século XX foram organizadas
um
em
ser
um
não-desportista”
desportista; (MAZO,
ginástica da Alemanha para perpetuar esta cultura desportiva.
10 associações desportivas em Porto Alegre pela
O Colégio Farroupilha, antigo Hilfsvereinschule,
iniciativa dos teuto-brasileiros: Turnerbund (1867),
objetivava, como vimos, a formação (Bildung)
Von Musterreiter (1885), Ruder Club (1888),
integral de seus alunos, de forma que os aspectos
Ruder-Verein Germânia (1892), Club Walhalla
culturais identitários da comunidade à qual a
(1896), Rodforvier Verein Blitz (1896), Deutscher
escola estava ligada eram trabalhados. Assim,
Schristzen” (MAZO, s/d, p. 2).
a cultura desportiva era incentivada com aulas
O objetivo dessas associações ia muito além
de ginástica no Turnerband (Sogipa). Mas, nos
da preocupação com o controle do corpo e com
primeiros anos da década de 1900, a Escola
ótimos desempenhos motores. A hora de fazer
também proporcionava aos alunos aulas de
ginástica, de nadar, remar ou jogar era o momento
natação. As aulas eram ministradas na “piscina”
Jogos e Ginástica no Colégio Farroupilha
153
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
as aulas de natação: “Às 16 horas de quarta-feira, iniciava a aula de natação ministrada num grande ‘basin’ de madeira, instalado bem lá embaixo na Rua da Conceição, onde hoje se encontra a Estação Rodoviária. A aula era do professor Heinrich Rohde e sua realização, hoje, despertaria, sem dúvida, o riso e a curiosidade: o professor sustentava na mão uma longa vara de madeira na qual o aluno era amarrado com um cordão e na barriga com um cinto de couro. Assim, era impedido de afundar na água e, sob comando, executava diversos exercícios natatórios ditados pelo mestre, em alemão” (TELLES, 1974, p. 80). Em 1906, a escola contratou um instrutor de ginástica que viera da Alemanha, de München (Monique), para dar aulas na Sogipa. Ele se chamava Georg Black. Lecionou por muitas Alunas do Hilfsverein em competição na Sogipa - 1935
pertencente à Sogipa, construída em 1885. Essa
basin ou ‘casa de banhos’, como era conhecida em Porto Alegre, foi feita dentro do Guaíba, em madeira, aproveitando a água do lago. Segundo Mathilde Wildner, em seu depoimento para um livro sobre a história da Sogipa, a piscina “tinha uns parafusos que regulavam para mais fundo ou menos fundo. Ou se colocava um cinturão no aluno e o professor de natação ia segurando a corda.” (SILVA, 1997, p. 22). Acompanhemos as lembranças de um aluno da Hilfsvereinschule sobre
154
décadas no Farroupilha, ou melhor, na Sogipa mesmo: “Na escola, os pátios eram muito pequenos, não dava para fazer ginástica. Os pátios mal davam para os recreios [...]. Então havia este convênio do Farroupilha com o Turnerbund (atual Sogipa). Imagina você saindo ali de onde hoje é o Hotel Plaza São Rafael, atravessando a Rua Coronel Vicente, caminhando até a Rua da Conceição. Atravessávamos essa rua e chegávamos à Sogipa. Trocávamos de roupa, fazíamos ginástica,
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Alunos do Colégio Farroupilha. Evento da Semana da Pátria, Parque Farroupilha, 1939
voltávamos, trocávamos de roupa novamente e
Eu fazia ginástica à noite, e bem mais tarde o
íamos para a sala de aula” (Vera Matte).48
professor Black continuava lá, dando orientação. Então, o colégio cuidava da educação como um todo,
O professor Capra também dava aula de
mas dava uma atenção à vida esportiva também,
Educação Física. Levava-nos lá para a Sogipa.
que é interessante no processo, dentro de um conceito
Nós tínhamos aula de ginástica, esporte etc. [...].
global de educação... (Jorge Gerdau)49
Eu conhecia o professor Capra por causa do Clube
Já na década de 1930 encontramos o Colégio
Grêmio Náutico União, onde ele era professor de natação. Eu nadava no União com ele. Além disso,
Farroupilha
tinha o professor Black também, que dava ginástica.
“atletas”, em eventos públicos de esporte:
MATTE, Vera Elisabeth Reimer. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi no Memorial do Colégio Farroupilha. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
48
participando
muito,
com
seus
Johannpeter, Jorge Gerdau. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido em seu escritório à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
49
Jogos e Ginástica no Colégio Farroupilha
155
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Campeonato Intercolegial - Sogipa
“A ‘Demonstração de Educação Física’ era
em campeonatos intercolegiais. De acordo com
realizada pelos alunos dos ginásios e colégios
a ata de reunião de diretoria da ABE do ano de
secundários da capital. Na semana da Pátria de
1952, haviam participado dos Primeiros Jogos
1938, a demonstração de Educação Física contou
Estudantis de Porto Alegre. Mais tarde, outros
com ‘os mais lindos bailados, ginásticas e outras
campeonatos sucederam, como os realizados na
provas da mais absoluta originalidade, no Campo de
Sogipa em meados do século XX:
Polo do Parque Farroupilha’” (Pimentel, s/d:19)”
156
Através do jornal O Clarim, é possível
(MAZO, 2003, p. 190).
acompanhar a participação dos alunos em torneios
Em meados do século XX, os alunos do
intercolegiais. Em 1962 participou da Olimpíada
Colégio Farroupilha passaram a se destacar muito
da Umespa, com equipe de vôlei, basquete e
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Sogipa - jogos. Equipe feminina do Colégio Farroupilha
Sogipa - jogos. Equipe masculina do Colégio Farroupilha
futebol interséries. Também há riqueza de
Capra foi convidado a comandar a clássica
detalhes nas matérias do Clarim quanto aos
saudação do colégio.”50
torneios interséries. Em 1973, já no Bairro
A clássica saudação do colégio continuou
Três Figueiras, realizaram-se jogos interséries muito especiais “em homenagem ao professor Capra”:
presente nos torneios, inclusive, nos tradicionais “Jogos do Colégio Farroupilha,” que desde 1972 ocorrem anualmente.
“Realizou-se nas canchas novas do Colégio
Nos jogos do ano de 1979, junto ao roteiro
um torneio interséries de Voley em que se sagrou
oficial há uma mensagem da equipe de professores
campeã a 3 a série tanto no setor masculino como
de Educação Física afirmando:
no feminino [...] antes do Torneio o professor
50
O Clarim, 1962, 2º Semestre.
Jogos e Ginástica no Colégio Farroupilha
157
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Imagens do Roteiro dos Jogos do Colégio Farroupilha de 1974
158
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
“Esperamos que daqui não saiam vencedores e vencidos, mas sim, que prevaleça o espírito sadio
Terres).52
de competição, fortalecido pelo convívio que teremos
Aulas de educação física precisam de espaço,
nestes poucos dias em que serão realizados os jogos”.
material e professores capacitados. Quando a ABE
O espírito de grupo e o protagonismo das
de 1858, depois de muita luta, inaugurou o prédio
51
turmas para se organizarem é recordado por uma aluna da década de 1980:
da escola no Bairro Três Figueiras, as exigências para boas aulas estavam completas, e com mais um fator positivo: a sensibilidade dos mestres.
“E os jogos atendiam algumas modalidades es-
Estes, sempre atentos e participantes em todas as
portivas, mas prevalecia muito o espírito de grupo. A
dimensões que envolvem a Educação Física: corpo,
turma formava uma grande equipe para participar
cultura, sociabilidade, subjetividade e sensibilidade.
das competições que duravam uma semana. Desde
Foi essa sensibilidade, aliada aos valores de
atletismo, corrida, vôlei, handebol, enfim. As es-
casa, da escola e do clube, que influenciou Jorge
colhas buscavam o que cada um tinha de melhor,
Gerdau a certa atitude em um dos passeios feitos
ver quais eram as habilidades, e no próprio grupo
com o Colégio Farroupilha:
isso era reconhecido. E a gente ficava fazendo a tor51
cida também, né? Tinha essa possibilidade” (Márcia
Roteiro Jogos do Colégio Farroupilha, 1979.
TERRES, Márcia Beck. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido no Colégio Farroupilha à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 13 de agosto de 2012.
52
Jogos e Ginástica no Colégio Farroupilha
159
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Jogos de inauguração da Praça de Esportes, 14 de novembro de 1969
“Numa dessas excursões do Colégio para Novo Hamburgo ao Clube dos Caçadores, havia em um açudezinho uma criança - não do colégio. Ela tinha caído no açude e estava morrendo afogada, estava lá no fundo do açude. Aí, como eu sabia nadar muito bem, pulei na água e tirei essa criança. Eu tinha uns doze anos. Mais tarde, reuniu o Colégio todo e eu ganhei uma homenagem. Então, não fui só embaixo do relógio!! (Jorge Gerdau)53
Johannpeter, Jorge Gerdau. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido em seu escritório à historiadora Naida Menezes. Porto Alegre, 08 de agosto de 2012.
53
160
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Espaço Físico – Entre bondes e figueiras
N
a época em que a ABE de 1858 escolheu
Koch. Sobre Thiele não localizamos nenhuma
o terreno para edificar a escola, ainda
informação, mas sobre Gustav Koch sabemos que era
no século XIX, estava certa de ter adquirido um
de origem germânica e possuía um estabelecimento
espaço apropriado, uma vez que se localizava
do ramo de construção e arquitetura na Rua Santa
no centro da cidade, onde morava a maioria da
Catarina, hoje Rua Dr. Flores (GANS, p. 65). Pelo
comunidade teuto-brasileira. Além disso, o local
que percebemos através da documentação, logo
escolhido era afastado do burburinho
após o início das obras, os dois arquitetos
da Rua da Praia, da Rua Sete de Se-
se associam criando a construtora Koch
tembro e das vias próximas ao Mercado
& Thiele. Essa construtora é que, no
Público e docas. A São Rafael era rua
prazo de dois anos, erigiu a escola, sendo
sem saída, calma, longe de elementos
inaugurada no dia 3 de setembro de 1895
visuais ou auditivos que distraíssem aos
(TELLES, 1974, p. 61).
alunos. Carlos Tannhauser, presidente da ABE durante a década de 1950, estudou no “Velho Casarão” no final do século XIX. Em um artigo do Clarim, lembrou aos alunos que: Não havia calçamento na rua, e quando chovia era aquele lamaçal; poucos veículos passavam pela São Rafael [atual Avenida Alberto Bins], nem mesmo o bondinho puxado por mulas.54
O projeto executado seguiu um dos formatos tradicionais para os educandários da época, já
contando
com
espaços
para
atividades
complementares à sala de aula, mas ao mesmo tempo facilitando o controle de todos os recintos. Sabemos que a dimensão espacial de uma escola traz informações e sensações que fazem parte da formação dos estudantes. Na materialidade de
O projeto da obra da escola foi concebido por
uma edificação escolar se institui “um sistema de
Reinhold Thiele com a participação de Gustav
valores, como os de ordem, disciplina e vigilância,
54
O Clarim, julho de 1952, p. 10.
marcos para a aprendizagem sensorial e motora, e
Espaço Físico – Entre Bondes e Figueiras
161
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Colégio Farroupilha, década de 1940
toda uma semiologia que cobre diferentes símbolos
outras escolas. Na frente da Hilfsvereinschule havia
estéticos, culturais e também ideológicos”.55
outras escolas, como bem lembra Vera Matte:
Os alunos do Colégio Farroupilha faziam
“Defronte ao nosso educandário, junto à Igreja
parte da escola e do cotidiano da cidade porque,
São José, havia as escolas católicas: Marienschule
sendo tão próximo das principais artérias da urbe,
(das meninas) e a Josefschule (dos meninos), que
o educandário, de uma forma ou de outra, estava
mais tarde receberam a denominação respectiva de
conectado às ruas, bairros, moradias, templos e
“Nossa Senhora Medianeira” e “Roque Gonzales” (Vera Matte).56
55 VIEIRA, Analúcia de Morais. A Arquitetura no Espaço-Tempo Escolar. Disponível em: <http://www.faced.ufu.br/nephe/images/arq-ind-nome/ eixo1/completos/arquitetura-no-espaco.pdf>. Acesso em: 01.nov.2012.
162
MATTE, Vera Elisabeth Reimer. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e Lucas Grimaldi no
56
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Livro de Registros de Ordens Internas - Ensino Secundário 1950/1970. Colégio Farroupilha
A interação dos estudantes com o atraente
“Eu morava no Centro, eu nasci no Centro, na Rua
entorno do Colégio, inclusive com muitas opções
Coronel Vicente. Era só subir a rua, dobrar e estava na
de lazer, gerava alguns atos de indisciplina, como
escola. Meu pai tinha um bar e restaurante lá na Praça
registra e assina o diretor Marroni:
Rui Barbosa. E ali do lado tinha uma Ferragem que estava
era de um alemão. O nome do bar era Bar Helvetia,
pairando sob a cidade, ele era um dos lugares que
porque pertenceu a um suíço. E do outro lado, na
compunham o dia a dia da comunidade escolar,
esquina, tinha o Tannhauser - camisas e roupas - que
somado aos espaços de moradia, comércio e lazer,
também era de alemão” (Hedy Boelhouwer).
O
edifício
do
Farroupilha
não
como o bar citado no documento apresentado
“Eu adorava andar de bonde. Quando
acima, possivelmente o bar da Escola de Belas
terminava a hora do ginásio, a gente vinha aqui
Artes, na Rua Senhor dos Passos.
para o Bairro Petrópolis, por exemplo, onde nós
Todos esses lugares, de certa forma, também
morávamos. Nós éramos entre quatro estudantes, e
fizeram parte da formação dos estudantes e são
sentávamos colocando os bancos frente a frente. Dava
eles, os estudantes das décadas de 1940 e 1950, que
para virar, porque, conforme se o bonde ia ou vinha,
agora recordam:
eram trocados os lados. E fazíamos os tititi que a gente faz quando é adolescente” (Ingrid Schulze).
Memorial do Colégio Farroupilha. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
Espaço Físico – Entre Bondes e Figueiras
163
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
pegava o bonde. Na esquina tinha a Fiambreria Vigor” (Vera Matte). “A fiambreria era quase na esquina com a Rua Pinto Bandeira, pertencia a um alemão. Era muito conhecida, tinha coisinhas boas para comer. E depois ele até montou uma tenda no mercado público, também. Às 10 horas, no Colégio, era o recreio, e nós íamos lá comprar uns sanduichezinhos que ele fazia, mas o que ele mais vendia era o leite, ele vendia garrafinhas de leite. Podíamos ir só até ali, porque o Colégio não tinha merenda” (Jorge Bertschinger). No
espaço
escolar
do
Hilfsvereinschule
tanta coisa cabia – sala de aula, pátio, materiais pedagógicos, sala da direção, casa do zelador e gente, muita gente envolvida na experiência do aprendizado. No ano de 1957, havia 711 alunos no Primário, 379 no Ginásio, 133 no Científico e Praça Otávio Rocha - Igreja Evangélica (IECLB)
127 matriculados para a escola técnica.57
“A gente desfilava na Rua da Praia, sábado de
Conforme as décadas foram passando o
tarde. Era muito chique. Descia a Rua da Praia e
educandário, mesmo com a construção de um
voltava caminhando, e os guris ficavam no meio da
prédio anexo, que ocupou uma parte do pátio
rua. Havia nessa época o lambe-lambe, e todas as
aos fundos da escola, ficou pequeno. Além disso,
lojas boas se localizavam na Rua da Praia” (Vera
a Rua São Rafael, silenciosa, perfeita para um
Maria Hemb Becker).
educandário, deu lugar à Avenida Alberto Bins,
“As crianças católicas faziam a primeira
onde passavam bondes e muitos carros. Podemos
comunhão na Igreja São José ali na frente da nossa escola. Nós tínhamos ótimo convívio com os jesuítas,
acompanhar
das
atas
da Assembleia de 1946 a movimentação dos
como sempre houve [...] Lembro bem de onde a gente
57
164
através
Ata da Assembléia Geral da ABE, 1957.
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Prédio anexo construído nos fundos da escola – 4a Classe - 1939, Primário, Colégio Farroupilha
integrantes da ABE em relação a esse problema.
Figueiras. A maioria deles optou pela Osvaldo
Observamos,
Aranha.58
também,
o
seguinte
impasse:
onde construir nova edificação? Na chácara da Associação, afastada do Centro, ou em outro local, como o Bairro Bom Fim?
Por isso, a partir de 1954, iniciou a compra de terrenos no Bairro Bom Fim, lindeiro ao centro da cidade, bem próximo a outra escola tradicional da
Em julho de 1954 foram distribuídos 408
cidade, o Colégio Rosário. O terreno escolhido,
questionários aos sócios da ABE solicitando
segundo Becker: “Foi um miolo de quadra com
que manifestassem a sua preferência: escola na
duas entradas, uma para a Rua Barros Cassal;
Avenida Osvaldo Aranha ou na Chácara das Três
58
Ata da Assemble ia Geral da ABE, 1954.
Espaço Físico – Entre Bondes e Figueiras
165
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Pátio do Colégio Farroupilha, festividade de Páscoa, 1950
outra para a Avenida Osvaldo Aranha, na frente do
Nada mais nada menos do que o Túnel da
Instituto de Educação” (Fernando Carlos Becker).59
Conceição e demais viadutos que o circundam seriam
Depois de projetada, quando começaram os movimentos para a construção, a ABE de 1858 foi informada sobre um novo plano diretor da cidade que seria em breve aprovado pela Câmara de Vereadores. Receosa, a direção da Associação resolveu verificar se a área da escola não seria afetada.
166
1955 “ficou deliberado prosseguir nos estudos [...], colher ainda outros informes e entrar em contato com o prefeito da capital para a solução do problema, a fim de expô-lo ao senhor presidente [da ABE]”. O atual presidente da Associação, Fernando
BECKER, Fernando Carlos. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
59
ali construídos. Segundo a ata da assembleia geral de
Carlos Becker, recorda do dia em que seu pai Jacob Becker, tesoureiro da ABE, em 1955, chegou
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
à residência da família contando como fora a
Vejamos alguns detalhes referentes a esse local,
reunião com o prefeito Brizola:
iniciando pela forma como era então conhecido
Uma equipe, incluindo meu pai, foi falar com o
aquele espaço rural da cidade:
prefeito Leonel Brizola e:
“Surgiu então o interesse em comprar essa parte
- Negativo, disse o Brizola, ali vocês não vão
que sobrou daqui de cima até lá embaixo na Avenida
construir, ali já tem colégios, construam lá naquela
Nilo Peçanha. Aqui no morro, como eles chamavam,
chácara de vocês.
havia um casal de estancieiros, como tinha naquele
- Então, alguém da equipe perguntou, podemos
tempo, e aos domingos eles faziam galinhada. Então
construir onde era para ser a praça do loteamento da
a gente ia comer galinhada aqui no fim de semana.
chácara?
Vínhamos até o fim da linha dos bondes Petrópolis, depois seguíamos a pé. O dia tinha que ser bom...”
- Coloquem onde quiserem, mas aqui não aconselho!
60
(Jorge Bertschinger)61
A chácara que Leonel Brizola sugeriu, era um
Na ata de assembleia geral extraordinária
terreno que a ABE havia adquirido ainda em 1928.
de 1928, o presidente da Associação, Wilhelm
BECKER, Fernando Carlos. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
60
BERTSCHINGER, Jorge Guilherme. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes e a Milene Morais de Figueiredo, na ABE de 1858. Porto Alegre, 26 de julho de 2012.
61
Espaço Físico – Entre Bondes e Figueiras
167
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Mücke, sugeriu a compra da chácara nos altos de
Para conceber o projeto, foi contratado o
Petrópolis, que pertencia à viúva Maria Müller. A
arquiteto Carl Herrmann, orientado pelo engenheiro
ideia era lotear e vender terrenos, e se necessário
Carlos Henrique Siegmann. Este engenheiro,
construir, mais tarde, casas para “alemães sem
voluntariamente esteve presente, gerenciando toda
teto”. Segundo Carlos Hofmeister, “a chácara
a concepção e construção do primeiro prédio,
foi batizada de ‘Três Figueiras’ pela Associação
inaugurado em 1962 (TELLES, 1974, p. 162).
Beneficente Educacional devido à existência de figueiras com idades avaliadas em mais de 300 anos” (HOFMEISTER, 1986, p. 33).
No momento em que as obras começaram nas Três Figueiras, lá no Velho Casarão os alunos comentavam entre si esse grande acontecimento.
Como se vê, a compra dessas terras não
No jornal O Clarim o jovem Antônio Petrick
foi com o intuito de construir nela uma escola.
assinou uma matéria onde salientava as vantagens
Afinal, o Colégio deveria estar onde estivesse
do novo educandário: espaço para o Grêmio
sua comunidade, no caso, na década de
Estudantil, salas mais apropriadas “para
1920, no Centro. Além disso, com os
os laboratórios de Química, Física,
meios de comunicação e a malha viária
Desenho e História Natural”.63
daquela época era uma aventura ir até a
Os
chácara... o dia tinha que ser bom, como
envolveram-se
muito
com a idéia de uma nova escola. O
afirma Bertschinger.
Grêmio Estudantil realizou eventos para
No entanto, as décadas foram passando, a
arrecadar dinheiro para as obras. O terceiro ano
infraestrutura urbana melhorando e a cidade
científico de 1961, junto com o professor Hans
crescendo para os lados de Petrópolis. Os alunos
Schmitt, fez “um levantamento demográfico
do Farroupilha, na segunda metade da década de
da cidade de Porto Alegre”. O objetivo era
1950, já estão mais dispersos do que em épocas
encaminhar esses dados para a Prefeitura que
anteriores. Eles moravam além do Centro, em
prometeu colocar linhas de ônibus “que passem
bairros como Vila Conceição, Moinhos de Vento,
pelas zonas em que há maior densidade de
Petrópolis , de forma que, nos anos 50, quando a
população farroupilhense”.64
62
mudança se fez necessária, e o terreno da Avenida Osvaldo Aranha não era mais adequado, decidiuse construir a escola na “Chácara”.
Mas não apenas de forma concreta a nova escola fazia parte do cotidiano dos alunos, de forma
O Clarim, 1956, p. 28.
O Clarim, 1961, 1º Semestre, p. 34.
63
62
168
alunos
O Clarim, 1961, 1º Semestre, p. 17.
64
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
subjetiva eles começavam a acalentar a idéia de uma
continuavam sendo acalentados. Assim, de um
“escola dos sonhos”. Muitas dessas idéias O Clarim
lado enxergavam escadas rolantes, no outro as
publicou a partir de uma entrevista realizada com
salas com projetores, e mais lá adiante um ginásio
vários alunos, onde a pergunta era: como deve ser o
de esportes... Afinal, a imaginação faz a beleza, a
novo Farroupilha? Eis algumas respostas:
alegria e o futuro. Quem sabe?
- Que maravilha, um colégio com escadas rolantes!
Na chácara Três Figueiras
- Deve ser um colégio com aulas grandes, arejadas e claras, e com bancos cômodos e espaçosos. - As aulas serão ilustradas com projeções
O
- Os recreios deverão ser mais
inaugurado
em
1962
possibilitou a formação, já em tempo, de um quadro funcional ampliado, permitindo maior projetos educacionais. Porque existe um momento em que o limite físico inadequado não
compridos no verão para se poder tomar
acompanha
banho de piscina.
as
necessidades
desses
projetos. O diretor da escola em
- Deve ter um gravador para as aulas
1961, Roberto Medaglia Marroni, em
de canto [...] e uma ótima coleção de
entrevista para o jornal O Clarim, com
discos.
riqueza de detalhes, concedeu uma
- Deve ter canchas de tênis, vôlei, basquete [...] um campo de futebol bem tratado.
entrevista sobre o novo prédio a ser inaugurado em breve: “Apesar da aparente simplicidade do edifício
- Um colégio sem aulas de latim.
atual que está sendo construído, as salas, as escadas, os
- Teríamos um grande ginásio para as aulas de Educação Física.
corredores, as aberturas apresentam o panorama geral
65
tão sadio e tão saudável [...]. Há salas para atividades especiais, como Trabalhos Manuais, Canto Orfeônico,
Quando chegaram à nova escola, podemos
Desenho e até a própria Educação Física [...] todo o
imaginar a sensação dos alunos frente a tamanho
revestimento das salas de aula é a prova de ruído, e as
espaço. Mas era tanto espaço que a mente sentia-
esquadrias são de alumínio, com vidros especiais para
se em liberdade, de forma que todos os sonhos
físico
respaldo técnico, pedagógico e psicológico dos
cinematográficas.
65
espaço
Ibidem, p. 34.
iluminação; enfim é um edifício moderno”.66
66
O Clarim, 1961, 1º Semestre, p. 18.
Espaço Físico – Entre Bondes e Figueiras
169
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Mas o que é uma edificação construída em estilo moderno? O estilo moderno, muito resumidamente, foi uma particular concepção em relação à arte e à arquitetura ligada a um contexto onde a tecnologia e a cultura urbana foram dialogando, aliadas à ideia de “formas simples, harmônicas e compreensíveis”, buscando “uma relação entre arte e ciência” (MEDEIROS, 2007, p. 60). O moderno aliava tecnologia com necessidades práticas: “Esse prédio, quando foi inaugurado, era muito avançado, era de última geração. As portas abriam para fora para evitar acidentes como o acontecido, nessa época, em Los Angeles. Um incêndio no teatro de São Francisco, onde morreu muita gente, porque com o tumulto as portas não abriram” (Fernando Carlos Becker).67 É interessante lembrar que junto à modernidade do edifício havia a paisagem “rural” do espaço externo da escola: “Quando foi inaugurado, isso daqui era ‘o fim do mundo’. Nós vínhamos passear quando o prédio estava em obras e havia um tambo onde hoje é o Jardim Europa. Às vezes havia vacas pastando na nossa grama” (Vera Maria Hemb Becker).68 BECKER, Fernando Carlos. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012.
67
BECKER, Vera Maria Hemb. Memórias Sobre o Colégio Farroupilha. Depoimento concedido à historiadora Naida Menezes, na ABE de 1858. Porto Alegre, 14 de agosto de 2012. Onde hoje se localiza o Hotel Plaza São Rafael.
68
170
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Chácara Três Figueiras, 1938 Espaço Físico – Entre Bondes e Figueiras
171
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Colégio Farroupilha, nova edificação no Bairro Três Figueiras - 1961
A comunidade escolar, nos primeiros anos, conviveu com problemas referentes às obras, falta
(Lily Lutzenberger).69
de canchas para esportes, mas, por outro lado, a
Por falar em lanches, no ano de 1961, um
pouca movimentação do Bairro Três Figueiras,
dos alunos entrevistados pelo Clarim afirmou
até a década de 1970, permitia certa liberdade que
que na escola de seus sonhos teria “um bar
faz lembrar os primeiros tempos da escola, lá na
superlegal”. Hoje todos os alunos que passaram
Avenida Alberto Bins:
pelo Farroupilha, as redes sociais comprovam70,
“Comprávamos sanduíches e biscoitos com cobertura de merengue em um mercadinho próximo
172
ao colégio, e adorávamos comer embaixo da figueira”
Depoimento concedido à Revista Farroupilha. In: Revista Farroupilha, julho/agosto.2012, p. 19.
69
Disponível em: <http://pt-br.connect.facebook.com/SouFarroupilha/ posts/386129854740133?comment_id=5049776&offset=0&total_ comments=14>. Acesso em:
70
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Colégio Farroupilha, nova edificação no Bairro Três Figueiras - 1961
lembram do bar superlegal e do prensado com maionese superlegal.
Colégio Farroupilha, Secretaria. Canteiro de obras à direita - 1961
O espaço físico do Colégio Farroupilha delimitava um micro universo onde as dimensões
A equipe da secretaria, já muito eficiente no
da sociabilidade, do saber e da subjetividade se
antigo edifício, potencializou as suas capacidades
entrecruzam. Esse entrecruzamento faz com que
no novo prédio. De acordo com os relatórios
cada geração crie novos usos, questionamentos e
anuais do Colégio, referentes à década de 1970, a
abordagens em relação ao espaço escolar. Mas em
Secretaria da escola era considerada pelo Governo
meio às reformas, novos prédios e novas tecnologias,
do Estado como modelo para todas as escolas do
duas das velhas figueiras continuam lá.
Rio Grande do Sul. Para compreendermos melhor os significados que envolvem o espaço escolar é interessante pensar um pouco sobre a arquitetura, sentindo-a como transmissora de sentidos e propulsora de reações: “Ao experienciar o espaço escolar – estar no local onde convergem todas as mensagens e significados espaciais – eles também reagem a estas mensagens, segundo as características próprias do universo escolar e suas intercessões com as realidades sócioculturais do espaço-tempo dado”.71
71
BENCOSTTA, Marcus Levy. CORREIA, Ana Paulo Pupo. História,
Educação e Arquitetura: um diálogo possível. Disponível em: <http://www.cbhe6. com.br/site/pdf/01_Livro_de_Resumo_VI_CBHE-2011.pdf>. Acesso em: 12.ago.2012.
Espaço Físico – Entre Bondes e Figueiras
173
ABE 150 ANOS - O PASSAR DOS TEMPOS E A EDUCAÇÃO
Bairro Três Figueiras e Colégio Farroupilha, 1965
174
A excelência na história do Colégio Farroupilha
CAPÍTULO II
Vista aérea do Bairro Três Figueiras. Ao centro, Colégio Farroupilha e as figueiras – década de 1990 Espaço Físico – Entre Bondes e Figueiras
175
176
Vista aérea do Colégio Farroupilha na década de 2000. Percebe-se a grande evolução da instituição ao longo da história e o desenvolvimento do bairro no entorno de suas dependências.
177
178
Unidade Três Figueiras
Centro Cultural e Esportivo
Unidade Correa Lima
Sede Campestre
Laboratório de Biologia
Pista atlética
Conclusão
O
bservamos, questionamos, analisamos e assim fomos seguindo através dos tempos.
Como era de esperar, nada concluímos, porque a educação não é conclusa.
Ela suscita mudanças que acompanham, sendo causa e/ou consequência das transformações sociais ao longo dos tempos. No entanto, a partir da história de excelência trilhada pelo Colégio Farroupilha, foi possível compreender a viabilidade de reconfigurar tradições. É possível manter os princípios de disciplina, excelência, ética e responsabilidade se formos sensíveis à contemporaneidade. A história da Associação Beneficente e Educacional de 1858 demonstra que a instituição é e sempre foi sensível às necessidades das diferentes gerações, mas não abre mão dos referencias que lhe deram origem desde os primórdios da imigração alemã em Porto Alegre. As incertezas do século XXI têm reflexos na comunidade escolar, e o passado está aí, comprovando que é possível superar os desafios e aproveitar as oportunidades. Para uma sociedade que se reinventa ano após ano, a Associação Beneficente e Educacional de 1858 e o Colégio Farroupilha demonstram, através da sua história, que é possível acompanhar tamanhas transformações sociais e atender com excelência as mais profundas demandas de formação pessoal e profissional de cidadãos competentes e comprometidos com o mundo em que estamos inseridos. Se compreendermos a importância do passado e do presente para realizar os sonhos mais idealistas, podemos continuar contribuindo, e muito, com a prática da educação de que a sociedade precisa.
179
Presidentes da Associação Beneficente e Educacional de 1858 Período da Gestão
Alfred Schütt................................................1888
Ernst Ruperti................................................1858
João Bastian.................................................1889
Ferdinand Foelzer.........................................1859
Gustav Schmidt................................... 1890-1891
Richard Huch...................................... 1860-1862
Carlos Huber....................................... 1892-1895
José Gertum........................................ 1863-1864
Alfred Schütt................................................1896
Michael Heinssen.........................................1865
João Paetzel......................................... 1897-1902
Wilhelm J. Hasche........................................1866
Heinrich Daniel Meyer.................................1903
Emil Fraeb....................................................1867
João Paetzel..................................................1904
Wilhelm Ter Brüggen....................................1868
Felippe Becker..................................... 1905-1906
Johann Ernst Wollmann................................1869
João Fernando Krahe........................... 1907-1912
Wilhelm Ter Brüggen....................................1870
Jorge Bercht......................................... 1913-1918
Michael Heinssen.........................................1871
Rudolf Deppermann.....................................1919
Georg Pfeiffer...............................................1872
Otto Heymann..................................... 1920-1925
Wilhelm Ter Brüggen....................................1873
Carl Wilhelm A.Mücke........................ 1926-1934
Emil Fraeb....................................................1874
Robert Machemer................................ 1935-1938
Friedrich Arnold Engel.................................1875
Dr. Rodolfo Ahrons............................. 1939-1946
Wilhelm Ter Brüggen....................................1876
Dr. Frederico Ritter.............................. 1946-1947
Richard Huch...............................................1877
Carlos Tannhauser............................... 1948-1955
Alfred Schütt....................................... 1878-1882
Egon Renner........................................ 1956-1965
Carlos de la Grange............................. 1883-1884
Octavio Fauth...................................... 1966-1983
Balduin Röhrig.............................................1885
Jorge Guilherme Bertschinger.............. 1984-2010
Carlos de la Grange............................. 1886-1887
Fernando Carlos Becker....................... 2010-.......
Presidente
181
Diretores do Colégio Farroupilha (1886-2012) Diretores Gerais
Período
Peter Gerlach....................................... 1886-1889 Luiz Grünewald (em substituição).................1889 Pastor Christian Kleikamp................... 1889-1895 Pastor Emil Gans..........................................1896 Pastor Christian Kleikamp................... 1897-1907
Diretores do Curso Primário Diretoras Período Professora Wilma Gerlach Funcke....... 1948-1966 Professora Vera Elisabeth R. Matte....... 1967-1988 Professora Maria Clotilde Azzarini....... 1989-2000
Pastor Otto Meyer................................ 1908-1924 Professor Robert Mangelsdorf .............. 1925-1928 Professor Hans Kramer........................ 1929-1939 Dr. Álvaro Difini.................................. 1939-1949 Dr. Roberto Medaglia Marroni............. 1950-1961 Pastor Rodolfo Jacob Schneider............ 1962-1968 Professor Lucien Jean Felicien Thys..... 1969-1983 Professor Hans Joaquim Sille............... 1984-2000 Roberto Py Gomes da Silveira.............. 2000-2010 Magda von Galem............................... 2010-2012 Marícia da Silva Ferri........................... 2012-.......
Fonte: Do Deutscher Hilfsverein ao Colégio Farroupilha 1858/1974 (TELLES), 1974, p.220-221.
182
Variações do logotipo do Colégio Farroupilha Variações do logotipo do Colégio Farroupilha atravésdos dos tempos através tempos
183
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