EDIÇÃO ESPECIAL
revista de educação do Colégio Medianeira NÚMERO 34 | ANO XVII - 2022 | ISSN 1808-2564
ANO INACIANO 500 anos de fé, espiritualidade e legado RUDI E OLINDO
45 anos de amizade
Mundo BANI e os desafios da atualidade
Mediação
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Mediação
Diretor Geral P. Nereu Fank, S.J.
Diretor Acadêmico Profº. Dr. Fernando Guidini
Diretor Administrativo Henrique Weidlich
sumário
expediente
Revista de educação editada e produzida pelo Colégio Medianeira ISSN 1808-2564
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Jornalista responsável
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Daniel Zanella
Coordenação editorial
Ano Inaciano celebra espiritualidade, vida, legado e missão de Santo Inácio
Por Daniel Zanella Fundamentos para compreensão de uma jornada: entre as dúvidas, os valores inacianos e a esperança
Por Fernando Guidini Escola e família: vocação e missão comum
Por Dário Schneider
Fernando Guidini, Liliane Grein e Daniel Zanella
Revisão
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Daniel Zanella
Redação
O mundo humano sob uma singularidade
Por Levis Litz
Daniel Zanella
Projeto gráfico Liliane Grein
Ilustrações e imagens
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Acervo do Colégio Medianeira, Marcelo Weber, Wagner Roger e Shutterstock Imagens
Colaboraram nesta edição Amanda Camiloti Guerreiro, Ana Claudia Baldan Alves, Ana Carla Bavutti, Claudia Furtado de Miranda, Daniel Zanella, Dario Schneider, Fernando Guidini, Francisco Popik Pinheiro, Isabela Mendonça Krutzsch, Juliana Heleno, Katia Luciana Luz Sampaio, Leticia Estela Cavichiolo, Levis Litz, Mayco Delavy, Renato Moitero e Yasmim Egidio de Oliveira
26 Por Leticia Estela Cavichiolo
Educação Infantil: da interação virtual à interação presencial
29 Por Katia Luciana Luz Sampaio
Profº Marcelo Pastre Profª Eliane Dzierwa Zaionc
Centro de Inclusão Karolina Vargas
Colégio Medianeira
Nosso desrespeito pela vida, a pandemia e o cuidado com a casa comum na educação ambiental
Coordenações das Unidades de Ensino Educação Infantil e Ensino Fundamental I Ensino Fundamental II e Ensino Médio
65 anos de tradição, excelência e inovação
Educação Infantil: da interação virtual à interação presencial
Aprendizagens: substantivo plural
33 Por Juliana Heleno
Centro de Formação Cristã e Espiritual P. Agnaldo Barbosa Duarte, S.J.
Centro de Arte e Esporte Vinícius Soares Pinto
Midiaeducação
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O “velho normal” e as novas urgências da educação
Por Mayco Delavy
Vinícius Soares Pinto
Tiragem 3000
Papel Capa: couchê 300g Miolo: off-set 120g
Número de páginas 64
Impressão
O contexto de aprendizagem a distância e a experiência da quarentena
43 Por Claudia Furtado de Miranda
Olindo e Rudi: 45 anos de amizade
46 Por Daniel Zanella
Gráfica Radial Tel: 3333-9593
51 Os artigos publicados são de inteira responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião dos editores e do Colégio Nossa Senhora Medianeira. A reprodução parcial ou total dos textos é permitida desde que devidamente citadas fonte e autoria.
Linha Verde - Av. José Richa, nº 10546 Prado Velho - Curitiba/PR fone 41 3218 8000 www.colegiomedianeira.g12.br comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
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Do mundo VUCA ao mundo BANI: uma abordagem para a era do caos
Por Carlos Renato Moitero e Jamais Cascio Desigualdade social: a atualidade nos olhos de quem vive na rua. Por Amanda Camiloti Guerreiro, Ana
Claudia Baldan Alves, Francisco Popik Pinheiro, Isabela Mendonça Krutzsch e Yasmim Egidio de Oliveira Ilustração
Por Marcelo Weber
Mediação
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editorial
A edição 34 da revista Mediação é comemorativa por inúmeros motivos. Em 2022, celebramos os 65 anos de existência do Colégio Medianeira — em meio a um período de retomada, de retorno gradativo aos estudos presenciais e de inúmeros desafios para as aprendizagens contemporâneas, afetadas diretamente pelo contexto sanitário, econômico e político. A nossa matéria de capa conta, em detalhes e em um tom intimista, a nossa trajetória de mais de seis décadas, marcada por tradição, excelência e inovação. Refletimos sobre o presente e o futuro a partir do espírito de um tempo marcado pela mudança. Nesses dois anos de pandemia e pelos caminhos de Santo Inácio, nossa pedagogia tem sido desafiada a responder às características do momento, atenta aos movimentos de um presente-futuro ainda incerto— e todo o mundo é composto de mudanças, tomando sempre novas qualidades, como dizia Camões, um pouco depois do primeiro jesuíta chegar ao Brasil. Sob o lema “Ver novas todas as coisas em Cristo”, a Companhia de Jesus abriu as celebrações do Ano Inaciano em maio de 2021, convocado para fazer memória aos 500 anos do início do processo da conversão de Santo Inácio de Loyola e dos 400 anos de sua canonização. A nossa matéria sobre essa efeméride tão importante para o Colégio, integrante da Rede Jesuíta de Educação (RJE), convida-nos ao desenvolvimento de uma nova
sensibilidade. A atualidade de Santo Inácio nunca foi tão facilmente verificada diante dos conflitos e dos desafios atuais. O Ano Inaciano é um tempo de renovação. Apresentamos como a jornada trilhada por Santo Inácio, a partir do acidente de Pamplona, pode servir de exemplo para um novo caminho de conversão pessoal e comunitária. Suas palavras nos instigam a aceitar a diversidade de nossa própria vida e a dos outros e ainda abrir o nosso coração para a experiência do seu caminho de fé e de conversão. Com projeto gráfico especial, a edição atual da Mediação é a primeira revista impressa produzida em nossa instituição desde o início da pandemia. Somos o tempo e as circunstâncias. Diversos artigos de nossos educadores refletem sobre o período delicado que passamos, relatando aprendizagens, estratégias, dificuldades, belezas, soluções. A história de educação jesuíta tem como base princípios e valores muito sólidos, reconhecendo o legado do passado, os desafios do tempo presente e a esperança diante do futuro, que somos chamados a construir juntos. Estamos em constante adequação às novas oportunidades e aos elevados objetivos educacionais que visam a contribuir com a inovação da gestão dos métodos e dos processos de ensino e aprendizagem. Acreditamos que estamos preparados para a natureza deste mundo tão volátil e maravilhoso.
A Mediação existe desde 2004. Como o próprio nome diz, buscamos mediar as relações de conhecimento entre toda a comunidade escolar, educadores, estudantes, famílias, obras jesuítas pelo Brasil e várias outras instituições ligadas à educação em Curitiba, no Paraná e pelo país afora. Somos uma revista que contempla diversas linguagens, apresentando nossos valores norteadores e ao mesmo tempo intencionando oferecer um conteúdo que mescle leveza com profundidade. Oferecer a você, leitor, a você, leitora, uma edição caprichada, com textos agradáveis de ler e que promovam a reflexão foi o nosso objetivo. Somos gratos por chegarmos aqui, no nosso modo de existir, em papel, e por sermos um espaço de divulgação de ideias, de debates, de preservação da memória. O mundo era muito diferente em 24 de fevereiro de 1957, quando o Colégio foi inaugurado. O mundo era muito diferente em 15 de agosto de 1534, data da fundação da Companhia de Jesus. O mundo está muito diferente hoje. Queremos seguir praticando ações significativas que priorizem a intervenção pessoal e coletiva de nossa comunidade, independente das condições adversas, conscientes de que estamos todos interligados. Que a nossa sociedade, por meio da educação, seja mais justa e solidária.
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Uma boa leitura a todos.
comunicacao@colegiomedianeira.g12.br Essa e outras edições podem ser lidas na íntegra no nosso site:
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Mediação
ANO INACIANO celebra espiritualidade, vida, legado e missão de Santo Inácio
500 anos da conversão de Santo Inácio de Loyola demarca evento crucial para a fundação da Companhia de Jesus. Por Daniel Zanella
Saiba mais sobre o ANO INACIANO Mediação
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ntre 20 de maio de 2021 e 31 de julho de 2022 celebramos o Ano Inaciano e os 500 anos da conversão de Santo Inácio. A abertura e o fim deste ciclo recordam a data em que, no ano de 1521, Inácio de Loyola (23 de outubro de 1491 — 31 de julho de 1556), fundador da Companhia de Jesus, foi ferido durante a batalha de Pamplona, na Espanha, obrigando-o a uma longa convalescença. Neste período teve início a sua conversão espiritual. O Ano Inaciano é um tempo de renovação e com o propósito de mostrar o exemplo de fé, a vida e o legado de Santo Inácio. Pretende-se mobilizar todas as obras apostólicas da Companhia de Jesus ao redor do mundo. Ao longo de mais de 14 meses, a Companhia de Jesus tem promovido diversas atividades, como Exercícios Espirituais, conferências, palestras e lives, que oportunizarão o conhecimento acerca da vida e da obra do fundador da Companhia de Jesus. O ciclo foi convocado pelo padre Arturo Sosa, superior-geral, e batizado como Ignatius 500. “As celebrações do Ano Inaciano são um chamado a permitir que o Senhor nos guie em uma renovação, nas descobertas de um novo entusiasmo interior e apostólico, uma nova vida”, define. Em 23 de maio do ano passado, o Papa Francisco leu uma carta em homenagem ao Ano Inaciano. “Rezo para que todos os que se inspiram na Espiritualidade Inaciana possam fazer essa viagem juntos como uma família inaciana e rezo para que muitos outros cheguem a descobrir a riqueza desta espiritualidade que Deus deu a Inácio”,
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definiu. “A bala de canhão que lhe feriu mudou o curso da sua vida e o curso do mundo”, completou. No Colégio Medianeira, tivemos diversos momentos de celebração ao Ano Inaciano, como a Semana Inaciana, realizada entre 22 de julho e 1º de agosto. Iniciamos as comemorações com três missas de Crisma. Ao longo desta Semana aconteceu também a ação Minutos com Santo Inácio, todos os dias no primeiro horário de cada turno, guiada pelo Padre Agnaldo Duarte, S.J. A Pausa Inaciana, momento de meditação e reflexão inspirado pelos Exercícios Espirituais de Santo Inácio, e que acontece toda quarta-feira, às 18h30, teve a participação especial do padre Roberto Barros Dias, S.J. O tema da Pausa, “cuidar é uma decisão ética e espiritual”, discutiu a importância do modelo de Santo Inácio para os dias atuais, além de proporcionar um momento formativo único. O Centro de Formação Cristã e Pastoral realizou uma ação de plantio de mudas de diversas espécies no bosque do Colégio juntamente com os estudantes. Ainda tivemos uma tarde especial de oração e o Lucernário, ofício celebrado durante o período da noite, à luz de velas, e também importante ocasião para relembrarmos e agradecermos por todas as vivências. A nossa tradicional missa de domingo, em 1º de agosto, foi toda dedicada a Santo Inácio e seu exemplo. Para o Padre Nereu Fank, S.J., diretor geral do Colégio, o Ano Inaciano é um período de reflexão e de entusiasmo pelo exemplo de Santo Inácio. “A conversão não acontece em único golpe, é um processo que nos acompanha permanentemente,
por toda a vida. Santo Inácio se torna um peregrino em busca da verdade em Jesus Cristo, abre o coração para que a vontade de Deus se realize em sua vida e molde o seu futuro”, afirma. Fernando Guidini, diretor acadêmico do Medianeira, observa em Santo Inácio o exemplo de comprometimento com a fé. Para Guidini, os ensinamentos de Inácio devem ser seguidos muito mais por obras e ações do que por palavras. “Precisamos de pessoas com uma cosmovisão ampla, abertas ao novo e à diversidade, comprometidas com a causa comum da vida, conscientes de que a fé que professamos é dever de justiça, competentes, compassivas consigo, com o outro, com o espaço em que vivem, com Deus”, reflete.
Lema ‘Ver novas todas as coisas em Cristo’ é o lema que inspira a celebração. Basicamente, ele simboliza três pontos: primeiro, que devemos estar sempre com os sentidos abertos para captar as necessidades do nosso meio, perguntando-nos a todo momento como podemos ajudar a transformar a realidade; em segundo lugar, assumir as nossas próprias limitações, como o próprio Inácio o fez, e, em terceiro lugar, sair pela estrada, descobrir aquele Deus que habita e trabalha em todas as criaturas e contemplá-lo em tudo o que nos acontece.
Vida e obra Santo Inácio de Loyola nasceu no Castelo de Loyola, em Azpeitia, região basca ao norte da Espanha, em 1491. Filho de família cristã da nobreza rural e caçula de 13 irmãos, foi batizado como Íñigo López e, mais tarde, mudou seu nome, passando a assinar Inácio.
Batalha de Pamplona
Convalescença em Loyola
Entrega das armas
Cova de Manresa
Em 1506, quando tinha 15 anos, colocou-se a serviço de Juan Velázquez de Cuéllar, ministro do Tesouro Real, durante o reinado de Fernando de Aragão. Aos cuidados de seu protetor, recebeu formação para aprimoramento de sua cultura. Tornou-se um exímio cavaleiro, mostrando sua inclinação pelas aventuras militares. Em 20 de maio de 1521, ao tentar proteger Pamplona (capital de Navarra) dos invasores franceses, Inácio foi ferido por uma bala de canhão, que, além de partir sua perna direita, deixou lesões na esquerda. O grave ferimento foi fundamental para uma mudança radical que aconteceria em sua vida e o início de seu contato com Cristo. Em 15 de agosto de 1534, na capela de Montmartre, em Paris, Inácio e seis companheiros (Francisco Xavier, Pedro Fabro, Afonso Bobadilha, Diogo Laínez, Afonso Salmeirão e Simão Rodrigues) fizeram votos de dedicação ao bem da humanidade, imitando Cristo, peregrinando até Jerusalém e, caso não fosse possível, apresentando-se ao Papa, com o objetivo de se colocar à disposição do Pontífice. Um ano depois, os votos foram renovados por eles e mais três outros companheiros (Cláudio Jaio, João Codure e Pascásio Broet).
setembro de 1540. No ano seguinte, Inácio foi eleito o primeiro Superior Geral da Ordem, passando a viver em Roma. Em 31 de julho de 1556, muito debilitado, Inácio morreu na capital italiana. Sua canonização aconteceu em 12 de março de 1622, pelo Papa Gregório XV. A celebração do Ano Inaciano nos oferece a oportunidade de ampliar o horizonte do nosso olhar, enfrentar nossas feridas para curá-las, aprofundar a espiritualidade inaciana, aceitar a diversidade de nossa própria vida e a dos outros e ainda abrir o nosso coração para a experiência do caminho de fé e de conversão realizado por Santo Inácio de Loyola.
Por meio da bula Regimini militantis Ecclesiae, a Companhia de Jesus (em latim, Societas Iesu, S. J.) foi aprovada oficialmente pelo Papa Paulo III, em 27 de
Rio Cardoner
comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
Daniel Zanella é formado em Jornalismo e editor do Jornal RelevO, impresso mensal de literatura em circulação desde setembro de 2010. É mestre e doutorando em Teoria Literária pela Uniandrade. Trabalha como jornalista e assessor de imprensa do Colégio Medianeira
Indicações Vida de Santo Inácio de Loyola | Edições Loyola A biografia Vida de Santo Inácio de Loyola foi escrita pelo Padre Pedro Ribadaneira em latim, em 1572, apenas 16 anos após a morte de Inácio, e depois foi traduzida para o idioma castelhano em 1983. A presente tradução para o português, de 2021, integra as séries de celebrações do Ano Inaciano.
O Peregrino
Cannonball Fernando Guidini - From Ignatius to education | YouTube Fernando Guidini, Diretor Acadêmico do Colégio, conta sua experiência marcante de vida para o projeto Cannonball Moment (Momento da Bala de Canhão), inspirado na experiência de ferimento na guerra que mudou a vida de Santo Inácio. Os cannonball moments podem determinar um caminho de vida de coragem, fé e esperança.
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Fundamentos para compreensão de uma
jornada: entre as DÚVIDAS,
OS VALORES INACIANOS E A ESPERANÇA Ano Inaciano é oportunidade para nos rever como humanos, cristãos e educadores. Por Fernando Guidini
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m 2020, a Companhia de Jesus nos motivou à celebração do Ano Inaciano: 500 anos da conversão de Santo Inácio e 400 anos da sua canonização. Com o lema “Ver novas todas as coisas em Cristo” e em um contexto pedagógico, estamos sendo motivados a nos rever como humanos, cristãos e educadores inacianos naquilo que fizemos, que fazemos e que ainda poderemos fazer pela missão evangelizadora da Igreja. Mais do que grandes festividades, o Ano Inaciano tem nos provocado à ação compromissada a partir das quatro grandes Preferências Apostólicas: mostrar o caminho para Deus; caminhar junto com os pobres, os descartados do mundo; acompanhar os jovens na criação de um futuro esperançoso e o despertar para uma maior sensibilidade com a Casa Comum. Atenta às sensibilidades desse Ano, a Pedagogia da Companhia de Jesus, em seu grande horizonte de formação integral, tem igualmente nos motivado à reflexão e à ação mais compromissada com a educação que seja libertação e esperança neste século 21. Como uma tradição viva e em contínuo exercício de discernimento, somos provocados a como educar para a fé, para o aprofundamento, para a reconciliação e para a cidadania global. Já no Projeto Educativo Comum da Rede Jesuíta de Educação, o direcionamento é claro: nas instituições educativas da Companhia de Jesus, a aprendizagem se dá na perspectiva do desenvolvimento pleno do sujeito (N29).
Neste grande horizonte de celebrações, motivações e direcionamentos, a proposta local do Colégio Medianeira educa para a excelência, contribuindo com a formação de cidadãos conscientes, competentes, compassivos e comprometidos. Atentos ao movimento da cultura, o Medianeira integra ao seu projeto os 65 anos de tradição e experiência pedagógica, inovando e atualizando a sua proposta curricular em vista de uma educação para toda a vida. Compreendemos que o sucesso da educação aqui oferecida é medido pela forma como nossos formandos comprometem as suas vidas nas décadas seguintes, com e para os demais. É nesse contexto que atuamos como educação inaciana. Nesse período de crise e pelos caminhos de Inácio, nossa pedagogia tem sido desafiada a responder às características do momento, atenta aos movimentos de um presente-futuro ainda incerto. Na condição de Diretor Acadêmico, tenho sido constantemente provocado à leitura da realidade e à opção pelo melhor caminho pedagógico a ser seguido: que mundo é esse e como nos posicionaremos como educação local? Considero que as leituras de contexto sejam abundantes no atual momento histórico. A ciência pedagógica, bem como a teoria sociológica, tem nos auxiliado a ler os cotidianos da educação e a optar pelo melhor caminho a ser trilhado. Considero que são inúmeros os pensadores, os cientistas e os professores que têm trabalhado para que o véu da ignorância não
aumente ainda mais. Há anúncios de anos e gerações perdidas, categoria de análise que considero não ser a melhor.
Então, como recolher o espírito do tempo e apontar direcionadores? Que educação, que aprendizagens, que novos paradigmas apresentaremos aos que confiam seus filhos à educação da Companhia de Jesus?
Embasado sobre o macro horizonte acima exposto, e fundamentando-me no princípio da educabilidade na relação humano-cultura, em um contexto de exercício pedagógico inaciano, e tendo como modo de proceder o discernimento, considero que somos impelidos à crítica reflexiva para além da energéia (do grego – interpretação), movendo a investigação do indeterminado ao determinado. É certo que os passos da pedagogia inaciana nos conduzem à ação. Nesse sentido, gostaria de fazer um exercício, elencando algumas tendências em educação que analisava antes da pandemia, com traços interiores no nosso Colégio:
O PROTAGONISMO ESTUDANTIL Era visível o lugar de uma aprendizagem ativa, com formação para autonomia e cidadania
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amplas, interconectada entre comunidades. Criatividade, abertura ao novo, adaptabilidade e resolução colaborativa de problemas. Pensamento capaz de articular o local e o global.
FLEXIBILIZAÇÕES CURRICULARES E TRANSDISCIPLINARIDADE Pensar complexo – da biologia à teoria do conhecimento. Observava a existência de saberes integrados, pensamento sistêmico, aprendizagem por problemas, continuidade e integralidade pedagógica.
TECNOLOGIAS E CULTURAS DIGITAIS Em uma sociedade digital e interconectada, era visível a consciência de que as aprendizagens aconteciam também mediadas pelas redes e suas múltiplas possibilidades, articulando novas possibilidades e conhecimentos às práticas pedagógicas. Em meu cotidiano, observava evidências de três grandes dimensões: uma antropossociológica (personalização); outra pedagógica (currículo), e uma terceira relacionada ao meio (tecnologias). Em nosso Colégio, o que fizemos ao longo dos últimos anos, de diferentes formas, assentava-se sobre esses grandes referenciais. A partir deles, observo que definimos e atualizamos os direcionadores do Projeto Político-Pedagógico em seus conceitos fundantes (missão, visão, princípios e valores, concepção de aprendizagem integral, dimensões estruturantes), além de toda Proposta Pedagógico-Curricular em nível de estrutura e prática (conceitos, conteúdos centrais e
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periféricos, aprendizagens nas três dimensões, método e avaliação). O Projeto Educativo Comum (PEC) da RJE adquiriu ethos local por meio de inúmeras traduções realizadas pelo conjunto de educadores. A partir do vivenciado entre 2020 e 2021, e dialogando com as análises expostas, parece-me ser importante irmos além, incluindo ao exercício outras três tendências. São elas:
O INVESTIMENTO EM UM PENSAR DE NÍVEL SUPERIOR. Mais do que discursos, a necessidade de educar para o pensar, um pensar crítico e reflexivo, com fatores diretivos e atrelados às práticas, às dimensões da existência e da cultura. Mais do que aprendizagens descritivas, precisaremos de aprendizagens compreensivas, na defesa da vida. Aprendizagens profundas e que resultem em sabedoria de vida. Considero ser esse um dos grandes desafios do futuro, dado o atual contexto econômico, societário, tecnológico, as novas formas de expressão do capitalismo, as novas profissões, as novas formas de exclusão social e humana, as novas formas de aprender, muitas delas sem profundidade. Um pensar que possibilite leituras situadas e comprometidas de realidade, tematizando competências, hábitos e valores.
A NECESSIDADE DE ACELERAÇÃO SOBRE OS PROCESSOS DE INCLUSÃO DIGITAL DE PROFESSORES E ESTUDANTES O contexto dessa dimensão é delicado, pois praticamente não
o temos como grande desafio, dado o público que trabalhamos. No entanto, temos consciência de que quase um bilhão de pessoas passam fome, das quais mais de 200 milhões são crianças. Mais de dois bilhões de pessoas ainda cozinham com lenha. No Brasil, o analfabetismo está na taxa de 11 milhões de pessoas (6,6% da população, dados de 2019 do IBGE). Ao mesmo tempo, a sociedade avança de forma desigual em uma esfera de alta tecnologia que requer uma nova teoria do valor conhecimento, daí a necessidade da inclusão digital. Como educadores e pesquisadores, sabemos que há evidências que já nos mostram ser hoje a tecnologia o principal fator de produção, transformação e desigualdade social. Que conhecimentos e que competências digitais traremos às nossas discussões, aos nossos projetos pedagógicos, às nossas aulas? Teóricos apontam um novo referencial nesse sentido: a equidade passará pelo acesso à tecnologia – do capital intelectual ao capital cognitivo. Em nosso contexto de educação jesuíta, quais provocações, quais meios e qual formação defenderemos, considerando esse novo mundo?
A COLABORAÇÃO NO ATO DE ENSINAR E APRENDER Aqui, considero possível a construção de comunidades aprendentes que envolvam a todos, integrando escola, família e sociedade. A pandemia nos mostrou essa possibilidade. Igualmente, o Papa Francisco nos tem provocado nesse sentido, naquelas que são as grandes defesas do Pacto Educativo Global: é preciso
uma aldeia inteira para educar uma criança. Em um contexto social pós-fático, resulta desse processo uma sadia interrelação, com pessoas que dialogam de forma equilibrada, ética e a partir do conhecimento. Aqui, em especial, o trabalho cooperativo entre educadores, para além dos estrelismos individuais, constituindo aprendizagens de forma cooperativa e interrelacionada. São breves leituras que faço a partir do momento, recolhendo o vivenciado e dialogando com os direcionadores desse Ano Inaciano. Faz-se necessário ver novas todas as coisas em Cristo. Assim, sinalizo que as três dimensões acima expostas nos auxiliam a sintetizar a compreensão pedagógica sobre o momento: epistemologia (exercício do pensar), tecnociência (pedagogia filosófica da cultura), ética (intersubjetividade do agir e da razão prática da vida ética aplicada à educação). Parece-me que os seis referenciais expostos conversam com processos em curso em nosso Colégio, no trato entre estudantes, comunidade interna e famílias.
Da Educação Infantil ao Ensino Médio, experienciamos um pouco disso tudo, integrando tempos, espaços e sujeitos frente ao aprender integral tal como o compreendemos. Talvez nos seja desafiador um exercício de síntese, recolhendo fundas, estruturando projetos, currículo, formação de educadores, aprendizagens realmente pertinentes para um futuro decente, em continuum pedagógico. Penso ser esse um dos grandes desafios para o presente, ao mesmo tempo, oportunidade.
dimensões elencadas problematizam rumos para uma educação diante da crise e da esperança em um contexto pedagógico inaciano ao defender traços de:
Se a crise nos desinstala, o Ano Inaciano nos remete ao ordenamento, vendo novas todas as coisas em Cristo. A Direção Acadêmica me exige olhar apurado acerca das variantes que nos cercam para, então, apontar caminhos. Tenho consciência de que outras são as análises possíveis, e esse recorte por mim estabelecido deu-se a partir de alguns dos direcionadores que, pela prática, tenho procurado melhor compreender e responder.
- Uma educação em rede em que os conhecimentos não sejam fragmentados.
Assim, é oportuno relacionar à reflexão aqui exposta a seguinte tese: de diferentes formas, as
- Uma educação aprendente e dialogante com a cultura, cidadã e global, de excelência e com equidade, justa, em um espaço colaborativo, onde estudantes aprendam a se reinventar.
- Uma educação que ensine para a autonomia do pensar, com discernimento. - Uma educação que forme em ações afirmativas e emancipadoras. - Uma educação integral coerente e testemunha da vida.
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Somos um Colégio Católico Jesuíta. Pensemos sobre tais defesas e integremos conhecimentos, aprendizagem e vida. Não tenhamos medo de inovar, romper barreiras, provocar mutuamente, trazer diferentes sujeitos para os territórios do aprender. Há um pathós (do grego - paixão) que nos move a ampliar horizontes. Talvez esteja em nossas mãos a capacidade de educar jovens agentes para a mudança em um ethos cristão em favor da justiça em um país mais inclusivo e preocupado com a casa comum. Encerro com Alvin Toffler, ao citar a nossa colaboração na construção responsável desse futuro. Em um escrito de 1970, o autor compara nosso mundo com um “trem que está adquirindo velocidade e deslizando por uma estrada onde um número ignorado de agulhas o conduzem a pontos de destino desconhecidos. Não
há um só cientista na locomotiva, mas pode haver demônios nas agulhas. A maioria da sociedade vai no vagão de reboque, olhando para trás”. A partir dessa citação, Padre Pedro Arrupe nos provoca: “o amor que o cristão tem aos homens o impelirá a instalar-se na locomotiva e a guiar eficazmente o trem na direção adequada. Mas
Para onde se dirige o nosso olhar e com o que estamos comprometidos? Convido a uma leitura aprofundada do momento, recolhendo fundas e vendo novas todas as coisas em Cristo. Gratidão por todos aqueles que partilham conosco essa jornada, testemunhando e semeando esperanças. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
isso exige domínio dos comandos, conhecimento do território para onde se caminha, sistema para o controle das agulhas e inclusive dos demônios que regem as agulhas. Na locomotiva não bastam homens de boa vontade, nem sequer mais cientistas de que nos fala a citação: são necessários pensadores profundos e até homens espirituais, exorcistas que saibam conjugar os demônios que regem o mundo” (NOSSOS COLÉGIOS, p. 62).
Fernando Guidini é graduado em Filosofia pelo Centro de Estudos Superiores da Companhia de Jesus. É mestre e doutor em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Cursou as especializações em Formação de Assessores de Comunidades de Vida Cristã pelo Instituto Teológico de Santa Catarina e em Comunicação e Semiótica: Teoria e Crítica da Sociedade da Informação, pela PUCPR . Atualmente, é membro de Equipe Pedagógica no Colégio Medianeira, atuando como Diretor Acadêmico.
Indicações PEC – Projeto Educativo Comum | Edições Loyola O Projeto Educativo Comum (PEC) é o documento norteador e inspirador das práticas pedagógicas das instituições de Educação Básica da Rede Jesuíta de Educação (RJE). Lançado em 2016 e com versão atualizada em 2021, tem como foco a aprendizagem integral e a excelência humana e acadêmica dos estudantes.
A Terceira Onda | Alta Books O best-seller do autor pós-futurista Alvin Toffler trata da sociedade pós-moderna e das revoluções agrícola, industrial e, agora, a chamada Era da Informação. Toffler considerou em seus últimos livros que haveria desdobramentos de tais ondas, sendo essas relacionadas à sustentabilidade e ao meio ambiente.
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ESCOLA E FAMÍLIA:
VOCAÇÃO E MISSÃO COMUM As sementes do passado, os desafios do contexto atual e a esperança diante do futuro. Por Dário Schneider
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escola e as famílias, inspiradas pela educação jesuíta, assumem sua vocação e sua missão educativa caminhando juntas, especialmente nestes tempos desafiadores impostos pela Covid-19. Essa narrativa de vida e de missão, à luz da tradição e atualização em um contexto de crise, é confiança em nossa raiz histórica, é criatividade no tempo presente e é ousadia diante do futuro. A história da nossa educação tem legado, paixão e esperança. Não somente desejamos, mas também trabalhamos, com todo afinco e dedicação, para que os colégios da Companhia de Jesus renovem sua profunda convicção de excelência no cuidado humano e na atenção ao processo de ensino e aprendizagem. Santo Inácio nos recomenda: reze como se tudo dependesse de Deus e trabalhe como se tudo dependesse de ti!
A
A história de nossa educação tem como base os princípios e os valores da Educação Jesuíta, reconhecendo o legado do passado, os desafios do tempo presente e a esperança diante do futuro, que somos chamados a construir juntos. Sob essa perspectiva, a Pedagogia Inaciana se caracteriza pela forte marca de sua excelência humana e acadêmica, na qual o binômio tradição e inovação pode ser compreendido como convergência de constante atualização, como um contínuo exercício de discernimento diante de desafios e de tempos de crise, buscando a prática de uma educação de qualidade por meio da mobilização da comunidade educativa.
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A proposta educativa dos co-
de profissionais e, de modo espe-
légios da Companhia de Jesus,
cial, pela confiança das famílias
em fidelidade criativa e crítica
em nossa proposta educativa.
aos valores inacianos, está em constante adequação às novas oportunidades e aos elevados objetivos educacionais que visam a contribuir com a inovação da gestão dos métodos e dos
A marca de 500 anos de História da Companhia de Jesus é um indicativo de muita resiliência institucional. Na base disso tudo, está a intencionalidade da Educação Jesuíta, um verdadeiro em-
processos de ensino e aprendi-
preendimento humano, marcado
zagem. No cenário atual da pan-
pela ação de lideranças com perfil
demia, somam-se a essas novas
assertivo, empreendedor, empá-
perspectivas os desafios de re-
tico e humilde, compartilhando
fletir, de construir e de compre-
o que está dando certo, demons-
ender o sentido da tradição e o
trando capacidade de mudança e
significado profundo das práti-
transformação, mas também de
cas de inovação, que mobilizam
adequação da estrutura física, da
pessoas, metodologias e recur-
atualização dos recursos tecno-
sos. Percebe-se claramente que
lógicos e da tomada de decisões
o processo de diálogo e de co-
estratégicas no investimento em
laboração entre colégio e famí-
capacitação dos quadros. Enfim,
lias continua gerando conteúdos
nossa História e nossa prática
de comunicação e sensibilidade
educativa são expressão perma-
aguda em torno do acolhimento
nente de coerência entre teoria
de críticas construtivas na busca
e prática, entre passado e pre-
de alinhamento de prática, para
sente, com vistas à projeção do
que estejam em afinidade com a
futuro, em relação ao qual temos
proposta de educação da Com-
apenas uma certeza: vai exigir
panhia de Jesus. Na atual con-
educação de qualidade, com vis-
juntura, importa muito que to-
tas à sustentabilidade da vida no
dos saibamos olhar mais para o
planeta Terra!
que nos une do que para o que nos separa!
A crise provocada pela pandemia levou os colégios da Rede
Diante dos desafios do tem-
Jesuíta de Educação a aguçar ain-
po presente, cabe afirmar que a
da mais sua vitalidade e fidelidade
nossa razão de ser está na voca-
criativa, evidenciadas em nossa
ção de educar, e nossa missão é
base identitária, expressas nos
promover o conhecimento, (re)
Exercícios Espirituais e na Pedago-
imaginando e (re)inventando as
gia Inaciana, demonstrando a atu-
práticas. Tudo isso se torna tangí-
alização constante do apostolado
vel nos colégios da Companhia de
educativo da Companhia de Je-
Jesus por meio da estrutura orga-
sus, que, em tempos de crise,
nizacional, pelo quadro qualificado
sustenta-se por um conjunto
de habilidades e competências traduzidas por:
1. comprometimento do quadro de seus profissionais qualificados; 2. proposta pedagógica sistematizada; 3. inteligência partilhada em Rede; 4. suporte e apoio de ferramentas e tecnologias educacionais. Assim, a necessidade de rápida adaptação gerou um novo conhecimento adquirido pela experiência, pelas demandas e oportunidades que os tempos em que vivemos nos apresentam, exigindo o exercício do discernimento e a capacidade de um novo olhar sobre a nossa organização e a nossa prática. Neste sentido, coube a todos e a cada um, em particular, se perguntar: qual é o meu papel nisso tudo?
Comunicação dos nossos princípios e valores Nossa proposta educativa propõe-se a alargar o olhar, a instigar um novo pensar e promover um agir renovado. Ao buscar horizontes mais amplos, do ponto de vista filosófico, o pensamento crítico é potencializado ao conectar-se com outros saberes: da biologia à metafísica, da psicologia à retórica, da lógica à política, da ética à poesia, das ciências humanas e sociais à espiritualidade. O pensamento humanista é o que fecunda o sentido atribuído à missão educativa, enfim, à vida. Os pilares da UNESCO
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para a Educação sabiamente também evocam isto: aprender a conhecer, aprender a ser, aprender a fazer, aprender a con(viver) e, na perspectiva da educação jesuíta, aprender a discernir! A tendência natural e a capacidade humana despertada de aprender, crítica e criativamente, cria em todos nós a disposição interior de situar-nos local e de agir globalmente! Daí o porquê do mote de nossa educação: “educar para toda a vida”, individual e coletivamente, de forma responsável, comprometida, sustentável e ética. Na crise radical que atravessa o mundo e à qual nenhuma nação e mesmo nenhum indivíduo escapam, a educação constitui um dos básicos elementos como caminho, adequado e comprovado, da ciência humana. Em tempos de incerteza, como família, como escola e como sociedade humana, estamos em constante busca de equilíbrio, do sentido e da razão de ser, de fazer e de estar no mundo. Na perspectiva existencial, o futuro também é um retorno ao passado. Ainda, o futuro é a chave de conexão com o presente. Há algo novo em cada dia. Há sempre uma nova experiência em cada encontro, em cada gesto, em cada ação. Na convergência filosófica e antropológica, o ser humano está sempre em busca de sua opção vital. Em última análise, está em busca constante do sentido de vida em tudo que faz. Daí a importância da conexão, da relação, da sensibilidade com a natureza — nossa casa comum — e também a conexão com o Transcendente.
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Essa consciência vital é o que nos move como pessoas e como humanidade. Na dimensão Escola e Família, está a possibilidade de experienciar momentos da integração com o Universo, com o mundo, com a sociedade local — nosso contexto existencial. Todos somos desafiados a fazer a leitura e a interpretação de nossa cartografia interior, a ressignificar nossa capacidade empreendedora, a ampliar nossos horizontes, a ser e estar no mundo em favor dos outros, cultivando um sentido pessoal e coletivo para nossa condição de “seres no mundo” e “seres do mundo”, que contribuem na construção da História e da humanidade, especialmente em face a crises naturais e desafios sociais graves. Este é o sentido amplo e profundo do Magis inaciano: ser mais, ser melhor, servir com ânimo e liberdade onde há maior necessidade e, assim, realizar o maior bem. Os colégios e as famílias estão atravessando um tempo de provação. A superação dos desafios da Educação, que começa em cada um de nós, depende de nossas convicções e dos ideais e projetos que alimentamos no tempo presente e da esperança de acreditar em um futuro promissor para todos, que seja um espaço de realização das aspirações humanizadoras e humanizantes. Vivemos tempos em que precisamos nos reinventar como seres relacionais — o que verdadeiramente nos caracteriza como humanos —, exercendo as competências da colaboração, da empatia, do acolhimento do
outro, da prática da solidariedade, da busca da personalização, mediante um projeto educativo de excelência. No livro 21 lições para o século 21 (HARARI, 2018), o autor nos auxilia a fazer um mergulho no presente e nas mudanças que estão ocorrendo. Há desafios coletivos e individuais com grandes impactos. Como anunciado, o século 21 é das HUMANIDADES! O ser humano está em busca de si. Deseja encontrar-se consigo, compreendendo a sua existência. Diante de tantas possibilidades, desejar, querer e buscar fortalecer os vínculos institucionais e sociais entre colégio e famílias, e das famílias com o colégio, talvez, seja a experiência mais significativa do enfrentamento do coronavírus. Os aprendizados em tempos difíceis nos engrandecem e dignificam, nos retiram da chamada zona de conforto e nos colocam como atores em um cenário inédito e desafiador. No processo educativo, o sentido da vida e da constante busca da dignidade está em fazer parte da casa comum, que é o universo criado, o contexto societário e de vida humana integral. Enfim, tudo está interconectado. Como sociedade, estamos vivendo a experiência da interdependência, do entrelaçamento. Sozinhos nada somos e nada podemos! Em tudo dependemos dos outros! É a nossa condição de fragilidade, a nossa necessária consciência cidadã humana global, que nos diferencia como seres pensantes, desejantes, racionais, inquietos. Como enfatiza Santo Inácio, sempre é fundamental reconhecer
a Deus como autor e princípio da vida humana, fonte de todo conhecimento e de todo bem. Importante lembrar que Ciência + Espiritualidade + Arte supõem comunicação/conexão com o Transcendente. Hoje, o ser humano está em busca de um novo conceito de vida e de novas formas de ser e de estar no mundo. Nesse sentido, a Educação tem o grande desafio de afirmar a vida sob todas as suas formas de manifestação. Enfim, é tempo de potencializar as relações humanizantes! A maior aprendizagem, nesse sentido, consiste em contemplar a obra do Criador, pois nela todos somos convidados a nos conectar, a nos maravilhar, a nos encantar e, de alguma forma, a ler e compreender a nossa própria narrativa de vida. Trata-se de extrair sentido e atribuir significado à rotina, que tantas vezes nos oculta o essencial! A crise global, acentuada pela pandemia, potencializou também nossos medos, angústias e incertezas. Sob a luz da ciência, da
crítica da modernidade e da pós-modernidade social, e diante da nova realidade da pós-pandemia — que ainda está por vir —, é importante sonhar e projetar futuros diferentes, possíveis, humanizadores e dignificantes para todos! Novamente aqui estamos juntos, colégio e família, para construirmos o que será o futuro de nossas crianças, de todos nós. Os objetivos dos colégios só se concretizam a partir da confiança, da parceria e da compreensão das famílias ao acompanhar seus filhos, participando dessa construção coletiva com professores e equipes. Tais conexões permitem renovar a esperança e desenvolver as potencialidades do processo educativo. Com nossa comunidade (professores, estudantes, pais, colaboradores e direção), construímos juntos uma educação comprometida com a vida, capaz de gerar novos sonhos, abrindo corações e mentes para as mudanças, e, assim, contribuindo para preparar um futuro melhor e mais humano, solidário
e fraterno, colocando em prática os ideais da educação da Companhia de Jesus. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
Dário Schneider é graduado em Ciências Religiosas pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e Pedagogia Multimeios e Informática Educativa pela PUCRS. Tem especialização em Terceiro Setor pela Fundação Irmão José Otão (PUCRS) e Gestão Educacional pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). É mestre em Educação pela PUCRS e doutorando pela Unisinos. No Colégio Anchieta, foi professor, coordenador de ensino e, atualmente, atua como Diretor Acadêmico.
REFERÊNCIAS Colégios Jesuítas. Uma tradição viva no século XXI. In: Centro Virtual de Pedagogía Ignaciana. UNESCO. Relatório, Educação, um tesouro a descobrir. Brasília, 2010 HARARI, Yuval Noah, 21 lições para o século 21. Companhia de Letras, São Paulo, 2018. KLEIN, Luiz Fernando. A Educação Jesuíta frente à pandemia (2020). In: Centro Virtual de Pedagogía Ignaciana. Pedagogia Inaciana. Uma proposta prática. In: KLEIN, Luiz Fernando (org. Educação Jesuíta e Pedagogia Inaciana. São Paulo, Edições Loyola, 2015. In: Centro Virtual de Pedagogía Ignaciana.
Indicações 21 lições para o século 21 | Companhia das Letras O israelense Yuval Harari objetiva responder o que está acontecendo na atualidade e como agir frente aos novos problemas da sociedade contemporânea. O historiador explora o desafio de entender o mundo que criamos, tentando manter o foco coletivo e individual frente às mudanças a que somos responsáveis.
Em defesa da escola | Papirus Editora Rosely Sayão e Julio Groppa conversam sobre o papel da escola, do professor, dos pais e dos estudantes. Com argumentação sólida, a obra busca refletir acerca das principais questões do meio educacional hoje, como a relação dos jovens com o espaço de aprendizagens e as tensões do universo escolar com a sociedade.
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O MUNDO HUMANO SOB UMA SINGULARIDADE
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TRADIÇÃO: substantivo feminino. 1. Ato ou efeito de transmitir ou entregar; transferência. 2. Comunicação oral de fatos, lendas, ritos, usos, costumes etc. de geração para geração.
ATUALIDADE: substantivo feminino. 1. Qualidade ou estado do que é atual. 2. o momento ou a época presente. Definições da Oxford Languages Por Levis Litz
Primeiros passos Tradição configura um fator relevante e crítico do nosso desenvolvimento. Ela molda o fundamento e serve de estrutura para a família e a sociedade. A tradição evoca que fazemos parte de uma história que determinou nosso passado, revela quem somos na atualidade e indica quem seremos amanhã. Atualidade envolve o tempo presente, o que acontece agora. Envolve, com as tendências do momento, costumes atuais, uma real existência. Quando aprendemos a caminhar para frente? Talvez lá pelos oito ou dez meses de idade, ao longo do primeiro ano de vida, em um tempo que tivemos que nos concentrar para manter nosso equilíbrio para ficar em pé e assim conseguir delinear um caminho, um percurso, e seguir adiante na vida e para a vida.
A independência e o socorro Aprender a andar, certamente, foi um dos marcos mais importantes em nossa existência, pois foi uma decisão que exigiu coragem para a nossa liberdade de ação, desgarrar de algum objeto e alçar a independência. Entretanto,
bastou um passo em falso e… escorregamos, caímos, nos machucamos. Um chorinho, quem sabe, um pensamento, um olhar, uma súplica: “pai, me ajude!”. E, como a beleza proveniente da luz que nasce no oriente, do sol que ilumina, o pai vem em socorro com seu olhar de ternura.
A solidariedade e o amadurecimento Poderia ter sido a mãe, a irmã, o irmão ou ainda alguém ao nosso lado que, prontamente, nos oferece a mão. Os laços de família são elementos que congregam. E assim vamos, passo a passo, crescendo e nos desenvolvendo com equilíbrio, coragem e confiança. Momentos fáceis, outros mais difíceis vão emergindo, entre amores e dissabores, rumo ao amadurecimento frente a um mundo que nos espera. E assim vamos. Tradições são absorvidas e vão nos moldando, levando-nos ao norte da nossa própria existência.
O mundo, um sobrevivente O mundo também, no passo de sua história, é um sobrevivente, se constrói ante nossos olhos, apesar dos meteoros, tsunamis, pestes, terremotos, guerras, vírus,
erupções, ditaduras, violência, discriminação, injustiças, preconceitos, queimadas, entre tantas outras facetas que deixam suas cicatrizes.
O discernimento do protagonista Os seres humanos são os atores principais. Nós somos os protagonistas. Cabe a nós discernirmos entre o que deve ser feito ou desfeito. Qual caminho tomar. Preservar ou passar um apagador. Somos responsáveis, seres cientes pelos atos cometidos, pela não escolha de um caminho. Por outro lado, a vida é repleta de incongruências. A desinformação, o fechar dos olhos, não quer dizer que não sofreremos as consequências da nossa não ação. Não agir em prol de caminhar para frente é ceder espaço em favor da inércia, que acaba sucumbida pela inexistência. O indivíduo pode caminhar sob um céu com nuvens carregadas, sombrias, prestes a chover, e não dar a mínima, ficar indiferente, mas não significa que não ficará encharcado.
O reflexo da ação Nessa atitude que parece estar muito presente, reflexões de uma voz humana poderiam ecoar: “seria uma
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falha minha por não ter dado a devida atenção ao clima bruto que se avizinhava ou foi uma falha alheia por ninguém ter me alertado? Por que o outro não olha por onde eu ando? Se culpo sempre o outro, será que ele não seria o reflexo de mim? E se for, sou tão insensível assim?”. Inércia parece, nesse momento, ser inerente. Preciso aprender, como na infância, a andar novamente, não quero mais ficar preso às amarras da ignorância — que fazem tão mal, senão, nada muda, mas… o que fazer? Esqueci!
A finitude que nos espera Pandemias, vírus ou ideologias fascistas são sempre mutantes, presentes, causadoras de pandemônios, fortes lembretes da nossa finitude. Um mundo livre deveria ser o palco no qual fosse possível amar ou contrariar o poeta, sem retaliações. Talvez isso seja parte do segredo de viver.
Solidariedade como esperança A esmagadora maioria das pessoas são solidárias, cooperativas e tem boa vontade em ajudar o próximo. São de boa índole, não são perversas. Em uma sincera autorreflexão, reconhecer e interiorizar suas limitações de compreensão,
pedir perdão e ajuda é a beleza do ser humano se manifestando pela humildade. Uma simbologia que transcende eras.
Generalizar é cair na armadilha É a manifestação da consciência que se sobrepõe ao abismo da insensatez. A ignorância está onde menos esperamos. Generalizações são como armadilhas para uma mente ingênua, desinformada, que segue padrões equivocados de um coletivo. Sem entrar no mérito, culposo ou doloso, com ou sem intenção de prejudicar, certamente, generalizações podem causar danos, e alguns bem sérios. Apesar de iguais — talvez mais do que gostaríamos —, não somos os mesmos, cada um tem sua identidade e diversidade. Essa pluralidade é bela, cuja originalidade só pode ser reconhecida no universal. Tudo tem uma maneira de se notar. Ao viajar pelo mundo, percebi a forte tendência que muitas pessoas têm de generalizar. Escutei certas expressões: “você é brasileiro, mas não dança samba? Não joga futebol? Não é indígena? Não é negro? Deve ser do Sul, pois o Norte é pobre, não tem dinheiro para vir aqui!”. E ainda, mais recentemente, esta: “nossa, como vocês brasileiros são idiotas, elegem um fascista!”.
Valores invertidos? Parece que o lugar da realidade inverteu os valores humanos, especialmente no atual momento de incontinência verbal impulsionada pela virtualidade da vida. A existência é uma mera alternância, seja lá, depois das fronteiras, ou
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cá, dentro dela. A tendência é darmos valor às coisas e às informações sempre de acordo com nossos parâmetros individuais. E, por vezes, nos deixamos enganar por convicções alheias e nos acorrentamos às paredes de uma caverna de preconceito e primitivismo. O grande perigo não são as dificuldades que a natureza impõe, mas a que determinados líderes, por falta de comprometimento solidário, querem impor aos outros. Se pensarmos que eternidade alguma devolverá o momento perdido, nossa percepção da realidade se altera e nós ficamos melhores. Uma fagulha de consciência despertou.
A disparidade é saudável Entretanto, quem não desejaria sair da caverna do isolamento — seja social, político, afetivo —, e sentir como é aconchegante o calor da luz do sol, a delícia do frescor do vento, a beleza nos sorrisos da família, a alegria de uma reunião com os amigos? Deixar de lado os conflitos. Na percepção de fatos comportamentais do cotidiano, ser respeitado, mesmo sem ser compreendido e, respeitar, mesmo sem concordar. A singularidade de cada um é um fator relevante. O confronto racional de disparidade é saudável e essencial, desde que pontuemos também o companheirismo e a empatia estabelecidos nas relações. São debates, diálogos, embates, perspectivas diferentes que auxiliam a ponderar modos de ver. E, assim, ser generoso é poder estar de bem com a vida e com todos.
Outro mundo é possível Viver um mundo melhor é possível. Sem autoritarismo. Assim estaremos indo ao encontro de nós mesmos. Essa perspectiva não pode ser perdida. A luz denota esclarecimento. A luz não entra em conflito com a escuridão, ela vai lá e ilumina. Assim, a escuridão se desvanece. Pura e simplesmente. Entender que aceitar simplesmente a liderança de um ditador, que é dissimulado e que não tem compromisso com a democracia, é legitimar que o poder seja exercido sem limitações por uma pequena elite, que impõe a sua autoridade sem levar em conta os direitos e liberdades de cada cidadão. A emoção, embora também seja informação, deve ser compreendida e gerida, estar sob controle. Um dos maiores patrimônios que uma pessoa pode ter: sua própria consciência. Tudo tem seu jeito de olhar e agir. Criar uma trilha nova. Um horizonte inspirador. Uma esperança que se
fortalece. Enquanto acreditarmos, adultos e jovens, há uma chance de termos um mundo melhor.
O jovem como catalisador O jovem que se encontra atrás das cortinas, e que no futuro pisará no palco do mundo, já tem uma noção diferente no seu modo de conviver e ver a realidade. Cada um estabelece, em seu território particular, uma interface social à qual os adultos mais velhos não estão habituados. Assim, proativos, por meio de muita leitura, de estudo e de um pensar crítico construtivo, podem — assumindo responsabilidades e sem medo — reverter paradigmas antiquados ou nefastos, antecipar futuras necessidades e estimular e dinamizar uma nova realidade.
Desafios de novas gerações Todos já aprendemos a andar e somos profissionais na arte de caminhar. O risco, como exercício da liberdade, é parte essencial da
aventura de viver e amar e, assim, com atitude, não apenas sobreviveremos, mas evoluiremos. Toda ação é transformadora. Eliane Brum escreveu: “O mundo é salvo todos os dias por pequenos gestos”. Imaginemos o que os grandes gestos poderiam proporcionar ao mundo. Todo momento é uma ótima ocasião de ressignificar o que passou para auferir um futuro melhor. Esse é um dos grandes desafios das gerações recentes. A proposta de atualidade é evoluir e assim estimular a vida cultural, debater ideias e ideologias, novas propostas e estimular os direitos e deveres humanos para um amanhecer melhor. Que surjam novas tradições para, a partir daí, crescermos em valores. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
Levis Litz é escritor, repórter fotográfico e jornalista com MBA em marketing. Viajou por mais de 60 países. Viveu em quatro. Ganhou o Prêmio Imprensa CCVB (2004) na categoria de jornalismo para internet. É adepto do Tai Chi Chuan e profissional freelancer. Publica seus trabalhos no site fotoserumos.com.
Indicações Colégios Jesuítas: uma tradição viva no século XXI | SJ Educatio Essa obra educativa serve como inspiração para a implantação de projetos relacionadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS). O texto vivo, que oferece dez indicadores-chave dos colégios Jesuítas, encoraja os estudantes da Rede Jesuíta de Educação (RJE) a encontrarem soluções aos desafios do mundo.
A menina quebrada| Arquipélago Editorial Nesta reunião dos melhores textos da repórter Eliane Brum, encontramos um olhar surpreendente sobre o Brasil, o mundo e a vida – a de dentro e a de fora. De textos sobre a Amazônia profunda às relações familiares marcadas pelo consumo, encontramos uma combinação rara de análise e profundidade.
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DE TRADIÇÃO, EXCELÊNCIA E INOVAÇÃO
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Em 27 de março de 1951, chegou a Curitiba o primeiro jesuíta do ciclo brasileiro, o Padre Edmundo Henrique Dreher. Saiba mais sobre a chegada dos Jesuítas no Paraná acessando o QrCode acima.
Da esquerda para a direita: governador Bento Munhoz da Rocha Neto, Newton Carneiro, Padre Dreher (primeiro jesuíta em Curitiba) e Padre Valério Alberton na reunião sobre a doação do terreno para a construção do Colégio em 29 de julho de 1952.
31 de maio de 1954: cerimônia de lançamento da pedra fundamental.
Fundação do Colégio Medianeira: em 24 de fevereiro de 1957, 188 estudantes tiveram aula pela primeira vez, distribuídos pelo Jardim de Infância, Pré-Primário e Curso Primário.
Início da construção do Colégio.
A Associação de Pais e Professores do Colégio Medianeira foi fundada em 3 de dezembro de 1968 e, desde então, atua em diversas atividades de entrosamento entre famílias e escola.
Registros da primeira turma do Colégio Medianeira.
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Em 1971 é fundado o Grupo Escoteiro do Colégio Medianeira. É o mais antigo e tradicional de Curitiba e um dos maiores do Brasil.
Inclusão feminina: o Colégio Medianeira, antes exclusivamente masculino, abriu as suas portas às mulheres.
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Projeto Pedagógico experiências e desafios: o setor pedagógico organizou-se a partir de 1987, passando por inúmeras discussões, mudanças e realizações, dividindo-se em áreas de conhecimento, equipes de série e serviços para a estruturação do projeto pessoal e coletivo.
Anualmente, acontece a Olimpíada do Colégio Medianeira. A prática esportiva teve início em 1972, com a participação de estudantes do 6º Ano à 3ª Série do Ensino Médio.
Idealizado em 2002, o Prêmio Santo Inácio é uma importante condecoração destinada aos estudantes do terceirão do Colégio e educadores que se destacam humana e academicamente de acordo com os nossos referenciais jesuítas.
Sempre-Alunos Medianeira: em 27 de novembro de 1993, no bosque do Colégio, foi realizado o primeiro encontro de ex-alunos, com a presença de aproximadamente 500 pessoas de várias gerações.
A 30 km do Colégio, em Piraquara, fica o Centro de Educação Ambiental (CEA). A área de 2 milhões de m² preservados é um ambiente de aprendizagem amplamente utilizado pelos educadores e estudantes para pesquisa, convivência e recreação. Desde 2014, parte da área foi transformada em Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP).
FLIM: desdobramento do projeto Sujeitos Leitores, a FLIM (Festa das Linguagens do Medianeira) é criada para incorporar diversos formatos artísticos e se tornar um dos eventos culturais mais importantes de Curitiba.
Constituição da Rede Jesuíta de Educação (RJE). Reúne as 17 Unidades de Educação Básica da Companhia de Jesus no Brasil e busca promover um trabalho integrado, a partir de uma mesma identidade e do sentido de corpo apostólico, com mútua responsabilidade pelos desafios comuns.
Em abril de 2017, a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) foi entregue pelo Ministério da Educação ao Conselho Nacional de Educação. A aplicação se iniciou em dezembro do mesmo ano, impactando a nossa Educação Infantil e o Ensino Fundamental. Realinhamos o projeto pedagógico sem abrir mão da missão, da visão e dos valores jesuítas.
Pautados pelo PEC 2021-2025, compreendemo-nos como um centro de aprendizagem inaciano que educa para a cidadania, tanto local quanto global. Com uma proposta pedagógica atualizada, fortalecemos o nome do Colégio Medianeira no cenário curitibano, integrando a comunidade e sendo autores do currículo. De forma crítica e comprometida, somos alinhados aos grandes norteadores da legislação educacional nacional, com evidências internas e externas de aprendizagem, pautadas pela qualidade. Na Educação Infantil, temos um projeto articulado às atuais pedagogias da infância, aberto e sensível às dimensões da aprendizagem, com acento sobre as experiências. No Ensino Fundamental, os fundamentos e as práticas do currículo integrado bilíngue como proposta curricular em todas as séries, com abordagem inter e transdisciplinar via leitura e pesquisa, utilizam de metodologias inovadoras no trato com as aprendizagens, incluindo as tecnologias. Para o Ensino Médio, desenvolvemos um projeto em diálogo com as séries anteriores, aberto ao contexto, disruptivo, que proporcione continuidades entre a formação geral e os itinerários, e que tenha os estudantes como sujeitos das aprendizagens, preparando-os de forma autônoma para a vivência de uma cidadania que preza pela excelência e pela solidariedade, marcas distintivas da formação integral que oferecemos como educação inaciana.
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do Colégio Medianeira
1957 -1958
Padre Oswaldo Casado Gomes, S.J. P. Oswaldo Casado Gomes, S.J. 1957-1958
1958 - 1959
P. Ayrton Álvares P. Bittencourt, S.J.
Padre Ayrton Álvares P. Bittencourt, S.J. 1958-1959
1959 - 1967 1969 - 1972
Padre Otaviano João Marchi, S.J. P. Otaviano João Marchi, S.J. 1959-1967 | 1969-1972
1967 - 1968
P. Aloísio Bernardo Schuster, S.J.
Padre Aloísio Bernardo Schuster, S.J. 1967-1968
1968 - 1969
Padre Egídio Francisco Schmitz, S.J. P. Egídio Francisco Schmitz, S.J. 1968-1969
1973 - 1976 1993 - 1996
P. Kuno Paulo Rhoden, S.J.
Padre Kuno Paulo Rhoden, S.J. 1973-1976 | 1993-1996
1977 - 1983 2000 - 2004
Padre Raimundo Kroth, S.J. P. Raimundo Kroth, S.J. 1977-1983 | 2000-2004
1984 - 1993
P. João Cláudio Rhoden, S.J.
Padre João Cláudio Rhoden, S.J. 1984-1993
1997 - 1999
Padre Guido Aloys J. Kuhn, S.J. P. Guido Aloys J. Kuhn, S.J. 1997-1999
2005 - 2014
Padre Rui Körbes, S.J. P. Rui Körbes, S.J. 2005-2014
2015 - 2018
Padre Carlos Alberto Jahn, S.J. P. Carlos Alberto Jahn, S.J. 2015-2018
2019 - Atual
Padre Nereu Fank, S.J.
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Quando nasci, em 24 de fevereiro de 1957, contam-me que foi o mês do início da construção de Brasília. Juscelino Kubitschek havia acabado de assumir a presidência, o governador do Paraná era o Moisés Lupion e o prefeito de Curitiba se chamava Ney Braga. A cachorra Laika tinha sido o primeiro ser vivo a ir para o espaço e também foi o ano em que John Lennon e Paul McCartney se encontraram pela primeira vez. A nossa capital estadual tinha pouco mais de 200 mil habitantes, quase dez vezes menos do que em 2022, quando completo 65 anos de existência – com muita disposição e esperança no futuro. Sou o colégio-caçula da Rede Jesuíta de Educação (RJE), formada por 17 colégios espalhados por todo o Brasil, além de creches, universidades e diversas instituições de educação popular, somando mais de 30 mil estudantes. Meus antepassados começaram a missão educativa há mais de 480 anos, quando a Companhia de Jesus foi fundada por Santo Inácio de Loyola. Meu DNA atravessa gerações. Na verdade, comecei a existir, ainda como ideia, em 27 de março de 1951, data da chegada do Padre Edmundo Henrique Dreher na capital paranaense. Ele vinha pioneiramente do Sul depois de mais de dois séculos da ausência dos jesuítas no Paraná. Na época, o sacerdote recebeu a missão de sondar e fundar um estabelecimento educacional na cidade. Em pouco tempo, articulou-se entre o governo do Estado e a Câmara Municipal de Curitiba a cessão de um terreno nas imediações do
Prado Velho. Fui planejado para ter 144 mil metros quadrados, às margens da BR-116 e do Rio Belém, em uma região muito arborizada e de fácil acesso. As obras para o meu nascimento começaram em 31 de maio de 1954, com a chegada de uma pedra fundamental, que veio de Paranaguá, justamente retirada do colégio jesuíta criado por lá no século 18, a primeira instituição de ensino do nosso estado. Depois do primeiro bloco, as preparações para o meu nascimento não foram assim tão tranquilas. Dizem que as verbas federais eram escassas e as estaduais geralmente chegavam com atraso. As dificuldades financeiras motivaram os padres a organizar festas, promoções, rifas, donativos, bingos, até acordo com cinemas para converter uma parte da arrecadação dos ingressos em recursos para as obras. Aos poucos, fui surgindo, tijolo por tijolo, esforço por esforço. Em 22 de dezembro de 1955, pela primeira vez um jesuíta pernoitou aqui. Quando me inaugurei e abri os portões pela primeira vez, passaram por mim os primeiros 188 estudantes, distribuídos pelo Jardim de Infância, Pré-Primário e três anos do Curso Primário. Em 1959, os estudantes que haviam ingressado na Terceira Série dois anos antes, começaram o meu Ginasial. Hoje chamamos tudo isso aí de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Sempre percebi que o Tempo cada vez me atualiza mais. Nos anos 1960, vi muitas turbulências no Brasil, culminando com a instauração da Ditadura
Militar em 1964 e a perda de direitos básicos de cidadania. Presenciei dias de muita tristeza e luta. No Paraná, em 1962, foram aprovadas leis para reestruturar o sistema de ensino, impactando nas nossas dinâmicas de sala, mas também nos dando oportunidade de aprimorar ainda mais o nosso projeto pedagógico, privilegiando as formações profissionais e a preparação para o ingresso no Ensino Superior. Enquanto o Brasil passava por um golpe, começávamos a utilizar as dependências da nossa chácara de Piraquara, com 90 alqueires e muitas cachoeiras, piscinas naturais, árvores centenárias e imensa diversidades de animais. Todas as séries passaram a ter a oportunidade de vivenciar atividades de aprendizado, convivência, estudo e lazer. Até hoje o espaço integra a memória afetiva de várias gerações de estudantes e educadores. Em 1965, testemunhamos a despedida da nossa turma pioneira: dez estudantes encerraram seus estudos secundários, cursando o científico posteriormente. Em 1968, foi fundada a Associação de Pais e Professores do Colégio Medianeira (APP), que promove confraternizações, semanas de conscientização, distribuição de kits, feiras e tardes esportivas. Também teve a chegada do ser humano à Lua em 1969 – viver era difícil, mas nunca nos faltou coragem. Sempre em busca da inovação, nos anos 1970, adotamos a pedagogia libertadora, que tinha no seu bojo a ideia da luta pela cidadania plena e da formação
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política, contextualizando o dia a dia e a realidade de cada estudante. Uma grande mudança foi a admissão de matrículas femininas. Eu atingia a maioridade e me tornava, enfim, uma escola mista e aberta a todos, com novos olhares. Também vi estudantes que começaram em 1957 se formarem no início da década, 14 anos de convívio, vendo-os entrando cedo pelos portões, se desenvolvendo a cada dia, se formando para a amplidão do mundo. Em 1971, foi fundado o Grupo Escoteiro do Colégio Medianeira, o mais antigo de Curitiba e um dos mais tradicionais do Brasil. Em 1972, começamos a ter as olimpíadas colegiais, série de eventos esportivos que mobiliza nossos estudantes da 5ª Série ao Ensino Médio até hoje. A cada ciclo eu crescia, me expandia, motivado por braços fortes e convictos da nossa missão jesuíta. Chegamos nos anos 1980, e o ensino educacional pedia por mudanças. Com o fim da Ditadura em 1985 e o espírito de retomada, começamos a dar passos rumo a um futuro mais livre, arejado e menos opressor. Em 1986, ocorreu o lançamento do documento Características da Educação da Companhia
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de Jesus, que se destina a todos os jesuítas e a todos os leigos e membros de outras instituições religiosas que colaboram em nosso apostolado, especialmente em nossas instituições educativas. Em 1987, iniciou-se um processo de reestruturação das equipes, com a reescrita do marco referencial do Colégio. Assim, em 1988, também ano da promulgação da nossa Constituição Federal, um novo projeto educativo entrou em vigor, priorizando a reflexão conjunta, a construção coletiva e o planejamento participativo. Nos anos 1990, assumimos o compromisso permanente de abrir caminhos, trabalhando nossas aprendizagens com uma visão transdisciplinar. Essa concepção fundamentou-se na reconstrução da história do conhecimento, do sentido do tempo e do espaço, focando na importância da visão de conjunto e na ação coletiva com todos os agentes da comunidade educativa. Em 1993, tivemos o lançamento da Pedagogia Inaciana: uma proposta prática, publicado pela Edições Loyola e com tradução do Padre Mauricio Ruffier, S.J. A Pedagogia Inaciana é um extenso acervo de orientações do
governo central da Ordem dos Jesuítas, de publicações e pesquisas de vários autores sobre um enfoque pedagógico característico, procedente da Ratio Studiorum. É um conceito amplo que oferece uma visão cristã do mundo e do ser humano, um sentido humanista para o processo educativo e um método personalizado, crítico e participativo. Em 1998, surgiu o MEM (Movimento Ecológico Medianeira), com diversas campanhas voltadas para o meio ambiente e a preservação dos nossos recursos naturais. Logo no ano seguinte, surgiu o Departamento de Esportes, que dispõem de um amplo complexo esportivo. Sempre entendemos que a prática de diversas mo dalidades é uma impor tante ferramenta na formação estudantil. O século 21 chegou sem pedir permissão para entrar. Foram muitas mudanças no nosso espaço físico, inovações tecnológicas e diversas transformações culturais. Em 2002, começou a ser realizado o Prêmio Santo Inácio, quando completei 45 anos de existência. Inúmeros aspectos são avaliados na concessão do Prêmio e consideram os estudantes ao longo da sua vida formativa conosco,
pautando-se no cuidado com o processo de aprendizagem nas muitas dimensões que perfazem o SER pessoa, o SER estudante, o SER com o outro, reconhecendo os valores jesuítas, a participação em projetos e a resposta pessoal aos nossos referenciais acadêmicos. Levamos, desde 2004, à comunidade uma revista impressa chamada Mediação, onde agora escrevo as minhas memórias. É um espaço de divulgação de ideias, de debates, de preservação da memória. Como o nome já diz, a revista busca mediar as relações de conhecimento entre toda a comunidade escolar, educadores, estudantes, famílias, obras jesuítas pelo Brasil e várias outras instituições ligadas à educação em Curitiba, no Paraná e pelo país afora. Em 2007, foi lançado o livro Colégio Medianeira 50 Anos – um abraço que transforma, dos nossos professores Levis Litz e Valesca Giordano Litz. Ah, eu fiquei muito orgulhoso em ver tantas histórias, tantos registros, ver em páginas a passagem dos anos. “Batidas na porta da frente... É o tempo”, diz aquela canção bonita. Meio século de vida! Uma coisa que
me marcou muito também foi a criação da FLIM (Festa das Linguagens do Medianeira), já em 2011, como desdobramento do projeto Sujeitos Leitores, projeto de disseminação de leitura com entrevistas sobre livros. Com o passar das edições da FLIM, ela incorporou novas linguagens e tornou-se um dos eventos artísticos mais importantes de Curitiba. Pouco depois de eu mudar o meu logotipo, em 2013, e dar uma repaginada no visual, aconteceu uma movimentação que mudou muito a forma como passei a existir: a criação da Rede Jesuíta de Educação. Constituída em 2014, a RJE reúne as 17 Unidades de Educação Básica da Companhia de Jesus no Brasil, promovendo um trabalho integrado, a partir de uma mesma identidade e do sentido de corpo apostólico. Logo depois, em agosto de 2016, surgiu o Projeto Educativo Comum (PEC), documento norteador e inspirador das práticas pedagógicas nas instituições de Educação Básica da RJE. O PEC é o resultado de uma ampla e intensa troca de saberes entre mais de dois mil profissionais da Rede.
nos orientar em direção ao aprender integral e com a centralidade sobre o estudante. Passamos a focar no desenvolvimento das três dimensões (cognitiva, socioemocional e espiritual-religiosa) como parâmetro que rege os demais aspectos da educação inaciana (e que se mostra cada vez mais contemporâneo e essencial). Trouxemos ainda o bilinguismo e a internacionalização, comprometidos que somos com a formação de sujeitos com conhecimento acerca do mundo, competentes interculturalmente e com amplo senso de responsabilidade e justiça social. 2017 foi o ano da nossa 45ª Olimpíada e também de momentos de integração de toda a comunidade educativa, como a tradicional Festa Julina. Em meio a isso tudo, viramos um grande canteiro de obras. No ano anterior, todas as salas de aulas do Ensino Fundamental ao Médio foram modernizadas e ganharam computadores para o uso pedagógico dos professores. As salas do Terceirão foram redesenhadas e receberam a instalação de ar-condicionado e sistema de som próprio.
Em 2017, cheguei aos 60 anos
No projeto de reformulação dos
com muitas novidades. Começamos a
espaços esteve também a garantia
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de acessibilidade para pessoas com necessidades especiais. Rampas de acesso e a instalação de elevadores fizeram parte da readequação de áreas de uso comum. Além disso, todo o espaço da cozinha na Unidade de Educação Infantil foi reformulado, recebendo novos equipamentos. As refeições das crianças passaram a ter supervisão de nutricionistas. Em 2019, as Equipes Diretivas das Unidades Educativas foram
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consultadas sobre a necessidade de lançamento de um novo PEC. Precisávamos atualizar nosso principal documento, que, após, muitos estudos, foi lançado oficialmente em agosto de 2021, com vigência prevista até 2025.
apoio às aprendizagens) e os apli-
Isso tudo aconteceu em meio à pandemia... Nossa, tivemos que trabalhar muito. Em pouco tempo, foi necessário redesenhar o nosso funcionamento, aprimorar o Por-
tamos com serenidade e criati-
tal, o Moodle (ambiente virtual de
dade educativa, defendendo a
cativos. Adaptamos nosso jeito de ensinar para que a aprendizagem e, principalmente, a formação humana dos estudantes não fosse prejudicada. Deslocamos o ensino presencial para o on-line e enfrenvidade as situações inéditas que este período nos trouxe. Nunca deixamos de garantir a segurança e o bem-estar de nossa comuni-
ampla vacinação e o respeito às normas sanitárias. E, na metade de 2021, veio a vacinação. Aos poucos, o meu pátio foi se enchendo novamente de vozes, de sorrisos, de vitalidade, e cada celebração, cada formatura, foi me deixando emocionado como nunca tinha ficado antes. Em tempos de crise, pude lembrar que o objetivo da Pedagogia Inaciana que nos rege é educar cidadãos para o mundo. A pandemia, reconheço plenamente, apenas evidenciou ainda mais a necessidade da leitura de contexto da nossa parte, dos estudantes e dos educadores – e de como estamos todos interligados. Mas sei que não foi fácil. Perdemos pessoas queridas, adoecemos, ficamos preocupados. Sabíamos que, independentemente da situação, ensinar as crianças a viver com autonomia, inovação e criatividade e a trabalharem por uma sociedade de valores mais humanos e sustentáveis (e neste contexto) era uma tarefa gigantesca. Vimos na prática o verdadeiro sentido do Magis Inaciano. Ser Magis, do latim mais, o maior, o melhor, era uma palavra
muito utilizada por Santo Inácio de Loyola. Pude observar na prática a atualidade do seu pensamento. Sempre podemos nos doar mais em relação àquilo que já fazemos ou vivemos: conduzir o mundo a uma atitude de mudança, de busca pelo melhor que podemos ser. Nessas seis décadas de dedicação à excelência humana e acadêmica, o que mais vimos foram as mudanças, desde os nossos estudantes, que entraram pequeninhos e saíram quase adultos, preparados para enfrentar os desafios da vida. Fiz as contas aqui: mais de 70 mil estudantes passaram por minhas salas. Foram tantos momentos marcantes, tantas histórias, tantos nomes que jamais esqueceremos, tantas amizades. Ao longo dos anos, também foram muitas as propostas educativas, entretanto, todas formulavam uma só resposta: a formação ampla, crítica e humana. 65 anos é muito tempo, mas passou tão rápido... Sigo com a missão de formar estudantes competentes, conscientes, compassivos, criativos e comprometidos, em busca de fazer do mundo um lugar melhor. Quero
continuar transformando vidas e realidades. Estou preparado para responder aos desafios das aprendizagens deste século 21 tão complexo. Sinto-me como se estivesse na melhor época da minha vida, jovem de espírito e disposto a aprender e a lidar com as mudanças sociais e tecnológicas que certamente virão. Integro o Projeto Curitiba 2035, uma iniciativa da sociedade para a construção de diretrizes de longo prazo, que nortearão as políticas de desenvolvimento da capital. Criado em 2016, o Projeto nos envolve nas temáticas Cidade da educação e do conhecimento e Coexistência em uma cidade global. Sei que preciso crescer em harmonia com o lugar que nos acolheu tão bem. Quero seguir praticando ações significativas que priorizem a intervenção pessoal e coletiva de nossos estudantes, almejando que a nossa sociedade, por meio da educação, seja mais justa e solidária. Obrigado, Curitiba, por mais um ano comigo. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
Indicações Colégio Medianeira 50 anos: um abraço que transforma O livro de 50 anos do Colégio apresenta cronologicamente as etapas que passamos desde a nossa fundação, em 1957, até 2007, ano que marcou o nosso cinquentenário. Além disso, o livro apresenta um acervo com registros fotográficos, documentos e depoimentos de pessoas que tiveram sua vida ligada ao Medianeira.
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Nosso desrespeito pela vida, a pandemia e o cuidado com a casa comum na educação ambiental Pandemia evidenciou a importância da educação ambiental e da reavaliação dos nossos hábitos. Por Leticia Estela Cavichiolo
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renomada primatologista britânica Jane Goodall afirmou que a exploração dos animais promovida pelos seres humanos é a causa da Covid-19. Em entrevista a um canal de televisão da França, Jane define: “foi o nosso desprezo pela natureza e o nosso desrespeito pelos animais com quem deveríamos partilhar o planeta que causou esta pandemia, prevista há tanto tempo”. Ela continua: “À medida que destruímos as florestas, as diferentes espécies de animais são forçadas a uma proximidade e, consequentemente, as doenças são passadas de um animal para outro. E esse segundo animal é, então, mais provável que infecte humanos, uma vez que é forçado a viver mais próximo deles”. Muitos pesquisadores compartilham deste posicionamento há muito tempo. Já em 2013, um relatório do Departamento de Alimentação e Agricultura (FAO) das Organização das Nações Unidas (ONU) alertava que o crescimento da população e a expansão agrícola têm mudado drasticamente como as doenças surgem, ultrapassam
fronteiras e se espalham. O documento destaca que 70% do total das enfermidades surgidas desde 1940 são de origem animal, citando exemplos de síndrome respiratória aguda grave (SARS) e o surgimento de novos vírus 2. Em 2019, o mercado de animais de Wuhan (China) trouxe à tona este problema do contato, ao se destacar como provável centro da pandemia, onde diversas espécies de animais silvestres eram vendidas para alimentação humana. Chegou-se a hipotetizar que cobras ou pangolins seriam os hospedeiros originais da Covid-19, no entanto ainda não foi possível determinar a espécie exata que deu origem à pandemia. Os coronavírus (corona, do latim coroa) são um grupo de vírus que apresentam proteínas ao seu redor que os fixam às células de uma determinada espécie de animal, chamado de hospedeiro original. Quando ocorre uma mutação, estas proteínas se tornam diferentes, abrindo a possibilidade de que o vírus possa infectar células de outros animais (hospedeiros intermediários ou humanos diretamente). Existem vários tipos
de vírus para cada espécie animal. Por isso, quanto maior o contato desordenado entre espécies diferentes, maiores são as chances de contágio. Deste modo, o tráfico de animais silvestres como “animais de estimação”, o desmatamento desenfreado, a expansão das fronteiras agrícolas, a mineração e o consumo de carne de caça são componentes que contribuíram para a disseminação de novos vírus no Brasil e no mundo. Mais do que nunca, não podemos tratar da saúde humana de forma isolada da saúde ambiental. As complexas relações socioambientais nos chamam à corresponsabilidade de todos os seres humanos no cuidado com a criação, como destacado pelo Papa Francisco na ‘Carta Encíclica Laudato Si’ 3. Este posicionamento, assim como o de Jane Goodal, leva-nos a refletir sobre os desafios que temos para promover um ideal de qualidade de vida que não esteja desconectado das questões socioambientais que nos cercam. O Padre Arturo Sosa, Superior Geral da Companhia de Jesus,
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destaca na Quarta Preferência Apostólica Universal que a justiça socioambiental é o caminho que a Companhia de Jesus deve percorrer para propagar a mensagem de conservação dos recursos naturais dados pelo Criador, colaborando com o cuidado da Casa Comum. Estar atento à degradação ambiental implica necessariamente em ser comprometido com os vulneráveis, os povos nativos, camponeses e pequenos agricultores que são obrigados a se deslocarem devido às mudanças ambientais e os conflitos decorrentes destas. O despertar para problemáticas socioambientais e a reconexão entre as pessoas e a natureza constituem-se como pilares do Centro de Educação Ambiental do Colégio Medianeira. A educação ambiental é essencial para resgatar nas pessoas o sentimento de pertença à natureza e, posteriormente, fomentar posicionamentos críticos e conscientes frente às diversas questões ambientais da atualidade. Problemas como saneamento básico e escassez hídrica (que impactam tão fortemente Curitiba nos últimos anos) são agravados pelo desconhecimento das consequências das ações humanas nas diferentes esferas do
ambiente. Todos querem água nas torneiras de suas casas, mas poucos compreendem que o desmatamento da Amazônia ocasiona menor formação de nuvens e que a destruição do Pantanal leva a um menor armazenamento das chuvas produzidas pela Amazônia, que são distribuídas por todo o Brasil por meio do Cerrado. Em resumo, a água que abastece os reservatórios brasileiros e as atividades socioeconômicas a estas atreladas depende da preservação dos biomas. A educação ambiental busca desenvolver o sentido de cidadania e de formação integral pela aprendizagem crítica e posicionamento diante dos enfrentamentos e contradições socioambientais. Fomentar a compreensão da triangulação entre surgimento de doenças e problemáticas socioambientais, descaso ambiental e saúde humana coletiva colabora para a construção de modelos alternativos de vida que, fundados no respeito à Criação e no desenvolvimento sustentável, constituem-se no caminho para assegurarem uma vida digna para todos os humanos do nosso planeta.
Leticia Estela Cavichiolo é licenciada e bacharel em Ciência Biológicas pela Universidade Federal do Paraná (UFPR); mestre em Botânica pela UFPR. É pós-graduada em formação de tutores EAD pela Faculdade Bagozzi (2017). Atualmente é responsável pelo Centro de Educação Ambiental (CEA) do Colégio Medianeira.
REFERÊNCIAS Jane Goodall says 'disrespect for animals' caused pandemic. Disponível em: https://www.france24. com/en/20200411-jane-goodall-says-disrespectfor-animals-caused-pandemic . Acessado em abril de 2020. FAO - Food and Agriculture Organization of united Nations. Surge in diseases of animal origin necessitates new approach to health - report. Disponível em: http://www.fao.org/news/story/en/item/210621/ icode/ . Acessado em maio de 2021. FRANCISCO, Papa. “Carta Encíclica Laudato Si”. São Paulo: Editora Paulinas, 2015. Companhia de Jesus. Preferências Apostólicas Universais 2019 -2029. Curia Genealizia della Compagnia di Gezù. Junho de 2019.
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Indicações A vida secreta das árvores | Editora Sextante Apesar de reconhecermos as árvores como seres vivos, não as consideramos sociais como os humanos. É aí que Peter Wohlleben, engenheiro florestal alemão, em pesquisa pioneira, une 20 anos de estudos com as últimas evidências científicas para mostrar que as árvores são tão fascinantes quanto nós.
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Educação Infantil: da interação virtual à interação presencial Retorno presencial demonstra a necessidade de intensificar o desenvolvimento social, emocional e motor das crianças. Por Katia Luciana Luz Sampaio
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ano de 2021 nasceu com a prerrogativa e o anseio pelo retorno das aulas presenciais. O cenário mundial ainda era desfavorável com relação à pandemia da COVID-19, que impactou diversos setores da sociedade, entre eles a Educação e também a Educação Infantil. A necessidade e o desejo de poder vivenciar a escola de forma presencial gerou angústias. Para alguns, a possibilidade de retorno às atividades presenciais foi uma opção, para outros dependeu da realidade socioeconômica. Com o retorno das atividades presenciais, o medo e a insegurança continuaram a fazer parte do nosso cotidiano, seja pelo medo do contágio do vírus ou por estarmos diante do inusitado, do diferente, e mais uma vez foi preciso se reinventar na condição de educadores e escola de Educação Infantil. Em 2020, pelo ambiente remoto e em 2021 pela necessidade do rigor com os protocolos de segurança. A pergunta que fazíamos em abril de 2020 tornou a ecoar em 2021: como dar continuidade ao
projeto e às práticas pedagógicas da Educação Infantil, em que o eixo central são as Brincadeiras e as Interações? Diante de tantas restrições e aparatos para garantir o cuidado de si e do outro, perguntamo-nos se é possível atender às demandas das crianças dessa faixa etária. Sabe-se que as crianças pequenas são ativas e estão em um momento de descobertas e explorações, e o ambiente escolar da Educação Infantil é um dos primeiros locais em que começam a interagir e a descobrir o mundo à sua volta fora do ambiente familiar. É um espaço em que passarão a socializar com outras crianças e adultos de forma mais intensa e frequente. O que dizer, então, depois de um ano e meio de isolamento social? O principal objetivo da Educação Infantil, conforme os documentos normativos, é promover o desenvolvimento dos aspectos físico, motor, cognitivo, social e emocional, além de fomentar a exploração, as descobertas e a experimentação. Em um cenário de pandemia e pós-pandemia, tal espaço será muito mais necessário para o desenvolvimento integral da criança. Mediante ao exposto, o nosso compromisso com a educação da criança pequena é de proporcionar um universo de experiências, de conhecimentos e de habilidades, diversificando e consolidando novas aprendizagens, cumprindo um papel socializador, proporcionando o desenvolvimento da identidade das crianças, por meio de aprendizagens diversificadas, realizadas em situações de interações,
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por mais que essas sejam ainda de forma restritas ou com aparatos de segurança. Temos ciência de que a presença física no Colégio é a melhor forma da criança aprender, de brincar e interagir, mas, diante do contexto, foi preciso se (re)inventar, primeiramente no ambiente virtual e atualmente no ambiente físico. 2021 foi de aprendizagens, retomadas, autoavaliação e diagnósticos das aprendizagens nas três dimensões (cognitivas, socioemocionais e espirituais-religiosas), processos necessários para o planejar e replanejar o continuum pedagógico. Neste sentido, o exercício foi e é de pensar o contexto desta criança que vivenciou dez meses de ensino remoto em 2020, considerando as aprendizagens e não aprendizagens que esse período proporcionou. Foi e é preciso estar atento sobre qual perspectiva devemos olhar para essa criança e refletir de que ponto devemos partir, desconstruindo e reconstruindo os processos pedagógicos. Neste primeiro diagnóstico, percebemos a necessidade de intensificar o trabalho com o desenvolvimento social, emocional e motor, englobando a autonomia, perpassando pelas três dimensões da aprendizagem integral. As crianças, ao chegarem ao Colégio, demonstram-se eufóricas, desconfiadas e cheias de novidades. Elas têm a necessidade, mais do que nunca, de contar sobre suas vivências, de experenciar, de indagar, de duvidar, a necessidade
de serem ouvidas pelos adultos e por outras crianças, uma expectativa gigante de interagir e brincar com o outro, além, é claro, da evidência da necessidade do toque físico, fator este vivenciado pela linguagem corporal, uma das primeiras formas de comunicação da criança pequena e das professoras com elas, nesta etapa de ensino. Segundo Vygotsky, é por meio da interação com o outro e com o meio que o ser humano se desenvolve social e cognitivamente. Estamos aprendendo a olhar por meio das perspectivas sociais ainda não vivenciadas no espaço da escola. As crianças do Infantil 2 que praticamente não tiveram uma experiência social mais ampla no segundo ano de sua existência, chegam ao Colégio com a realidade das máscaras em seus rostos, dos adultos e de seus pares. E essa mudança física impactou na forma do reconhecimento do outro. Por exemplo, quando a professora mostrou uma foto sua sem máscara para as crianças do Infantil 2, elas não a reconheceram como sendo ela mesma. Ao mostrar uma segunda foto com a professora de máscara e ao serem indagadas em qual foto é a professora, as crianças de imediato apontam para a foto em que a professora está de máscara.
As crianças do Infantil 5 relataram que somente conhecem os olhos das professoras e não conhecem o seu corpo e, ao serem questionadas sobre, logo respondem como se fosse algo óbvio: “É porque a gente não pode abraçar e não sabemos com esta parte” (apontando para a parte da boca e do nariz coberta pela máscara de proteção). Algumas chegaram ao Colégio e chamaram a professora bem pertinho para dizer que a sua mãe deixa abraçar a professora e os colegas. E, neste movimento, as crianças e professores foram descobrindo novas formas de relações e construção de identidades. Em 2020, descobrimos que é possível brincar de esconde-esconde no ambiente virtual, assim como tantas outras brincadeiras, e hoje, presencialmente, as crianças e professoras se reinventam na forma de interagir, de se abraçar, de se cumprimentar e até mesmo de brincar, como a brincadeira de mãe-cola, sem encostar no colega, e outras brincadeiras que são corporais e tão importantes para o desenvolvimento motor e social das crianças.
este contexto, e como o Colégio pode amenizar tais impactos.
Experiências como essas nos fazem refletir sobre quais serão as repercussões da pandemia no desenvolvimento social e cognitivo das crianças, que estão vivendo
Esta reflexão reforça a importância de reconectar as crianças com a natureza, e a Educação Infantil do Colégio Medianeira não tem medido esforços em planejar
Um outro aspecto que nos chama atenção é a relação que as crianças estabelecem com o espaço físico, seja ele a sala de aula ou o espaço externo. Algumas crianças exploram esses espaços com medo e receio do desconhecido. Observando esse movimento, até poderia dizer que a relação com o espaço externo (a natureza) é desconhecida para algumas crianças. Aqui refletimos sobre a importância do espaço externo na Educação Infantil. Diante da realidade vivenciada de isolamento social, os espaços externos também deixaram de ser explorados por algumas crianças no decorrer de 2020. Segundo Soares e Flores (2017), o ambiente externo é essencial para o crescimento das crianças, pois “oportuniza diversas possibilidades de aprendizado a partir de brincadeiras e interações que ali podem ocorrer, quando esse espaço é agradável, e rico de alternativas que garantam o contato com a natureza e a oportunidade de criação e imaginação” (p. 122).
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e mediar as ações das crianças nesses espaço, que podem se constituir como um local para ouvir histórias, para relaxar, para fazer atividades, para brincar e estimular a imaginação, a criação, a fantasia e a investigação, oportunizando às crianças aprendizagens tão significativas como as que se constroem nos ambientes das salas de aula internas, contemplando o eixo estruturante da Educação Infantil que são as brincadeiras e as interações, além do conhecimento com a biodiversidade e da sustentabilidade da vida na Terra, conforme prevê as DCNEI 05/2009. O Padre. Geral Arturo Sosa, no documento Colégios Jesuítas: uma tradição viva no século XXI, pontua um dos desafios
que os Colégios Jesuítas devem estar atentos sobre as mudanças abruptas de contextos:
REFERÊNCIAS
É necessário que nossas instituições estejam conscientes da mudança antropológica e cultural que estamos presenciando e saibam educar e formar de um modo novo para um futuro diferente (SOSA apud ICAJE, 2019, p. 82).
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.
Nos últimos dois anos, reinventamo-nos, superamos desafios, refletimos sobre as rápidas mudanças impostas pelo cenário atual e, aos poucos, percebemos que este contexto contribuiu para ressignificar algumas práticas já consolidadas. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
BRASIL. Ministério da Educação. CNE/CEB. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Resolução CNE/CEB 5/2009.
Coleção Leitura e escrita na Educação Infantil/ Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica. – 1ª. ed.- Brasília: MEC/SEB, 2016. Disponível em: www.projetoleituraescrita.com.br/publicacoes/ colecao/ CRAIDY, Carmem Maria & KAERCHER, Gládis Elise P. da Silva. (Orgs.) Educação Infantil: pra que te quero? Porto Alegre, Artmed, 2001.
Projeto Educativo Comum – PEC. Rio de Janeiro. Edições Loyola, 2016
Katia Luciana Luz Sampaio É graduada em Pedagogia pela Universidade Positivo (UP). É especializada em Modalidades de Intervenção no processo de aprendizagem pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), em Psicopedagogia Institucional e Clínica pelo Instituto Superior do Litoral do Paraná (ISAL) e em Psicomotricidade Relacional pelo Centro Internacional de Análise Relacional (CIAR). Também é mestranda em Educação pela UFPR, além de Orientadora Pedagógica e de Aprendizagens da Educação Infantil no Colégio Medianeira.
Indicações Desemparedamento da infância: a escola como lugar de encontro com a natureza | Organização: Maria Isabel Amando de Barros A obra apresenta estudos sobre o impacto educacional de ambientes ricos em natureza, incluindo as escolas com pátios e áreas verdes, praças, parques e espaços livres para o brincar, na promoção da saúde física, mental e no desenvolvimento de habilidades cognitivas, sociais, motoras e emocionais das crianças.
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APRENDIZAGENS: substantivo plural
Retomada enfatiza a importância do planejamento e da autonomia dos estudantes diante de novos desafios. Por Juliana Heleno
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m 2021, comemoramos mais um ano inaciano. Foi um ano em que nos unimos, como escola jesuíta e comunidade inaciana, para celebrar os 500 anos da conversão de Santo Inácio, fundador da Companhia de Jesus.
E
A conversão de Santo Inácio é fruto de uma grande dificuldade, de um ferimento grave, da dor física e emocional. É fruto de um momento de crise. Ouso fazer conexões entre a história de Inácio e a nossa, e pensar no momento de crise sistêmica que vivenciamos, crise sanitária, ambiental, econômica, humanitária, crise de esperança. É comum e é humano que, em um momento tão complexo como este, sintamo-nos perdidos ou impotentes. Mas, olhando para a história de Inácio, talvez possamos nos inspirar e construir caminhos com as pedras que vamos encontrando. Não tenho dúvidas sobre as aprendizagens que tivemos e estamos tendo na pandemia. Aprendemos muito! Fomos obrigados, em 2020, a migrar o Colégio para um ambiente 100% virtual. Para isso, professores(as), estudantes e famílias tiveram que aprender a lidar com inúmeras ferramentas digitais, com a distância e com outra presencialidade. A desenvoltura das crianças com essas questões nos provou que, quando a tecnologia é usada como meio e dentro de um contexto significativo, elas aprendem muito rápido e, neste aspecto, evoluímos dez anos em um. Uma nova didática foi necessária, pois não é possível transpor uma aula do presencial para
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o virtual. O ambiente virtual tem suas características, a comunicação é diferente, o ritmo é outro, e por isso a didática precisou ser reconfigurada. Como trabalhamos com crianças pequenas, a parceria das famílias foi fundamental e isso, certamente, gerou desgastes e sobrecargas do outro lado da tela. Mas também proporcionou, para os que tiveram oportunidade de acompanhar seus(suas) filhos(as), uma compreensão do projeto do Colégio pelo lado de dentro das salas de aula. Os frutos do trabalho começaram a aparecer aos poucos e as evidências das aprendizagens foram nos chegando ao longo de 2020. Uma grande alegria, por exemplo, foi perceber que as crianças do 1º Ano aprenderam a ler e escrever. A autonomia e o domínio sobre o ambiente virtual aumentaram. Os repertórios foram ampliados, tanto em língua materna, quanto em língua adicional. O
que parecia impossível no começo se concretizou: constituímos aprendizagens! Porém, o ambiente 100% virtual, ao mesmo tempo que nos garantia a necessária segurança frente à pandemia, tornava-nos míopes em relação aos(às) nossos(as) estudantes. O acompanhamento aos(às) estudantes é uma máxima institucional, mas como acompanhar crianças a distância? Em sala de aula, o(a) professor(a) lê a expressão corporal, a postura e o comportamento dos(as) estudantes e não só aquilo que eles(as) falam ou escrevem. Muitas crianças se esconderam atrás das câmeras fechadas e ficaram, nesses momentos, inatingíveis. Do outro lado, professores(as) se preocupavam não só com as aprendizagens da dimensão cognitiva, mas também com as dimensões socioemocional e espiritual-religiosa. Como estão se sentindo? Será que estão
aprendendo? Estão fazendo as tarefas sozinhos(as)? Com acompanhamento? A produção é fiel às aprendizagens? Será que darão conta? Quanto tempo de exposição às telas podemos pedir? Essas e outras questões direcionaram o grupo a pensar estratégias didáticas e de escuta, de comunicação, não só com estudantes, mas também com famílias, interlocutoras de seus(suas) filhos(as). Em 2021, depois de tanto tempo de isolamento social, tínhamos muitas expectativas sobre o retorno ao espaço do Colégio. Temos um espaço físico privilegiado, que funciona como um elemento educador. A área verde, as salas de aula, os laboratórios etc., são espaços que promovem as aprendizagens. Mas os desafios eram e são muitos. Voltamos, mas não para o mesmo colégio. As restrições do protocolo de segurança, o uso contínuo das máscaras, o distanciamento social, a simultaneidade, são novas realidades com as quais estamos aprendendo a lidar todos os dias. Apesar disso tudo, o Colégio segue como espaço de interações, brincadeiras e aprendizagens. Crianças brincam e aprendem em contextos diversos. As linguagens das crianças estão espalhadas por todos os cantos e, para nós, que frequentamos o Colégio vazio em 2020 e 2021, cada manhã e cada tarde é um novo sopro de esperança. Os vínculos foram sendo reconstituídos e o Colégio foi aos poucos sendo repovoado por vozes e cores das crianças do presencial e do virtual. A simultaneidade coloca professores(as) e estudantes em
uma sala de aula que se divide em dois ambientes. Isso era inimaginável até pouco tempo atrás. Os(as) professores(as) descobriram formas de mediar aprendizagens de dois grupos distintos, que trabalham os mesmos conteúdos, com dinâmicas e ambientes diferentes. Segue um grande desafio que exige de todos(as) o olhar para o coletivo, pois, por trás dessa organização está a defesa da vida, em uma pandemia que fez mais de meio milhão de vítimas no Brasil. Todos tivemos que aprender a lidar com as frustrações: de não poder estar no Colégio 100% do tempo; de não ouvir ou não ser ouvido; de não conseguir executar o planejamento como havíamos idealizado; de não conseguir atender a todos(as) ao mesmo tempo; de se sentir exposto(a) etc., mas com muito diálogo e empenho de todas as partes vamos constituindo um ambiente seguro, saudável e afetivo, no qual as crianças conseguem aprender.
no início do ano, e consequente suspensão das aulas, seja pela retroalimentação que o processo em sala de aula nos trouxe. Os planejamentos foram feitos pensando sempre em diferentes realidades: estudantes que ficaram 100% on-line, a simultaneidade, as turmas do Integral, as turmas 100% presenciais. Preparar e executar os planejamentos, em um contexto tão complexo, só foi possível porque o Colégio possui diretrizes claras e um projeto pedagógico atual e coletivo, que há
Por outro lado, estar com a maioria das crianças novamente em sala de aula, ainda que com os rodízios, nos permitiu perceber aprendizagens e lacunas a serem retomadas. Pudemos perceber a qualidade da mediação pedagógica que fazemos, pois, em um semestre com momentos presenciais, foram visíveis os avanços dos(as) estudantes, por exemplo, na leitura, na oralidade, mas principalmente na escrita. 2021 foi um ano marcado por muitos momentos de replanejamento, seja pelas constantes mudanças de bandeira na cidade,
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muitos anos é escrito e reescrito pelo grupo de professores(as). Esse projeto tem o conhecimento como meio e a formação integral como fim. Por isso, tanto quanto os conteúdos de Matemática, Ciências ou Geografia, nos interessa a constituição do processo reflexivo, da autonomia, da autocrítica, do cuidado com o outro, da valorização de todas as formas de vida. Nossa missão é formar homens e mulheres que possam e queiram transformar os contextos nos quais vivem e atuam. Hoje, mais do que nunca, sabemos que estar no Colégio é um privilégio, e a maior lição de todas tem sido o cuidado constante consigo e com os outros. Oxalá possamos ter aprendido a valorizar a vida, em todas as suas formas; a valorizar cada encontro, cada abraço; a valorizar cada dia de aula. Que possamos, como Santo Inácio, entender que a nossa vida faz sentido no cole-
tivo e para o coletivo, e que o individualismo é uma grande mentira que nos contaram e contam todos os dias. Somos habitantes de uma Casa Comum. O coronavírus, em sua pequenez, atingiu direta e indiretamente bilhões de pessoas. Percebemos que o vírus não respeitou classes sociais, credos, religiões ou orientações, fomos lembrados, de uma forma muito dolorida, da nossa fragilidade. Talvez possamos aproveitar esta experiência para reafirmar que não há distinção entre a Natureza e nós, somos a parte de um todo, como nos ensina o lema do Ano Inaciano: “que possamos ver novas todas as coisas em Cristo”.
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Juliana Heleno é mestre em Educação. Professora de Língua Portuguesa e alfabetizadora com experiência nas redes pública e privada, trabalha, desde 2009, no Serviço de Orientação Pedagógica do Colégio Medianeira. É profissional de apoio do Sistema de Qualidade em Gestão Escolar da FLACSI (Federação latinoamericana dos Colégios Jesuítas).
Indicações Ensino híbrido: personalização e tecnologia na educação | Penso O livro é feito por coordenadores e professores que participaram do Grupo de Experimentação em Ensino Híbrido desenvolvido pelo Instituto Península e pela Fundação Lemann. Nele, é discutido seu significado e uma série de propostas para inspirar sua implementação na realidade educacional brasileira.
Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra| Companhia das Letras Neste clássico da literatura em língua portuguesa, o moçambicano Mia Couto relata o retorno de Marianinho a Luar-do-Chão, sua cidade natal. Ao chegar à ilha, incumbido de comandar as cerimônias fúnebres do avô Mariano – de quem recebeu carinhosamente o mesmo nome –, se depara com seu passado e novos hábitos.
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O “velho normal” e as novas urgências da educação Cenário desafiador abre novas perspectivas pedagógicas e a escuta de novas experiências. Por Mayco Delavy
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uando somos convidados a sintetizar o projeto educativo do Ensino Fundamental II do Colégio Medianeira, prontamente rememoramos os verbos experienciar, investigar, argumentar. O processo de aprendizagem pode acontecer justamente na ordem disposta: experiência, investigação e argumentação. No entanto, os processos de apreensão e compreensão do mundo-vivido se dão em formas que dependem dos sujeitos das aprendizagens.
Q
Os adolescentes muitas vezes argumentam e, na relação com seus pares e professores, investigam e experienciam. Também é comum que o primeiro passo para compreendermos algo seja a investigação e, ao longo do processo, se experiencia e se argumenta na defesa de posicionamentos que nascem dos processos do conhecer. Nesse caso, mais importante do que a ordem dos verbos, é como se dá a relação substantiva
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do sujeito com o ato humano de
Em 2019, meses antes da pan-
conhecer e com as suas múltiplas
demia, em documento intitulado
mediações.
Colégios Jesuítas: Uma tradição
O contexto socioeconômico e político do mundo após 2020 alterou significativamente o modo como a experiência, a investigação e a argumentação se dão no espaço escolar formal. A massificação do aparato tecnológico
Viva no Século XXI, publicado pela Comissão Internacional do Apostolado da Educação Jesuíta, a leitura de contexto para a educação já nos indicava a necessidade de um olhar atento para as transformações operadas pelas tecnologias da informação, comunicação e
e informacional como mediação
gestão do conhecimento à serviço,
de aprendizagem definitivamente
ou não, da instituição escolar.
não é algo novo.
As novas plataformas digitais,
Desde a década de 1980, a
quando incorporadas à cultura
educação básica se vê transpas-
escolar, potencializam as aprendi-
sada por discussões ora ufanistas,
zagens e, se relacionadas a uma
ora realistas do lugar da técnica e
visão crítica de mundo e socieda-
tecnologia no processo de forma-
de, contribuem para a realização
ção para a apreensão do mundo.
da missão educativa de um colégio
Enquanto estes defendem o uso
católico e jesuíta:
da tecnologia à serviço do huma-
Os estudantes são mais facil-
no, aqueles propõem modelos
mente capazes de receber instru-
educativos que prescindem da
ções diretas e individualizadas e
relação dialógico reflexiva entre
aprender em um ritmo que está
seres humanos que se dispõem a
em sintonia com o seu desen-
educar-se mutuamente.
volvimento. Com a Sala de Aula
Invertida, acesso fácil a materiais
tradição relacionam-se com o sen-
ensino desses “valores”, formemos
curriculares e modelos educativos
tido de i) “Costume transmitido de
seres humanos que, na vida adulta,
híbridos e on-line, existem agora
geração a geração ou aquilo que
poderão colocar em risco a conti-
alternativas desafiadoras e interes-
se faz por hábito” e ii) “Herança
nuidade da civilização. Vários são os
santes aos modelos de educação
cultural, legado passado de uma
exemplos desses “valores universais”
‘tradicionais’ (COMPANHIA DE JE-
geração para outra”.
e necessários à comunidade: capaci-
SUS, 2019, p. 43, grifos do autor)
Não há, necessariamente, um
dade de escuta, polidez, fidelidade, prudência, temperança, coragem,
A sala de aula invertida, primei-
juízo analítico que avalize, ou não,
ra urgência neste tempo de tantas
os costumes transmitidos de uma
mudanças, opera como elemento
geração a outra e que são torna-
sintetizador de uma visão de ensi-
dos hábitos por meio das ações,
no-aprendizagem capaz de reforçar
livres ou não, dos indivíduos. Cada
A educação formal e não for-
a formação de uma comunidade
geração deve, a seu modo e cole-
mal se confunde com esses valores
aprendente em que todos e todas
tivamente, avalizar se os costumes
e virtudes, pois é por meio dela
sejam capazes de aprendendo ensi-
recebidos devem permanecer para
que garantimos às gerações futu-
nar e de ensinando aprender. Rom-
as gerações futuras.
ras a tradição viva do passado e
pe-se, nesse caso, com a hierarquia dos saberes e práticas e ampliam-se visões metodológicas e avaliativas restritas filiadas a uma viva.
É possível que determinadas comunidades tenham, no passado, defendido posturas preconceituosas e não inclusivas que não
justiça, generosidade, compaixão, misericórdia, gratidão, humildade... (COMTE-SPONVILLE, 1996).
lutamos contra algumas faces mais obscuras de nossa história das quais devemos nos afastar e, por que não?, nos envergonhar.
O conceito de tradição é im-
devam ser transmitidas às crianças
A Covid-19 nos ensinou e nos
portante nesse momento de des-
do presente. Assim como também
têm ensinado a discernir as per-
locamentos significativos no modo
é plausível pensarmos que alguns
manências e as rupturas para que
de compreender e gestar a relação
costumes ancestrais mereçam um
possamos fazer nascer algo novo
ensino-aprendizagem. Segundo o
lugar de destaque na educação
de todo esse processo. A capa-
Dicionário Aurélio, os dois princi-
das crianças e jovens do presente
cidade de escutar o estudante,
pais significados do substantivo
correndo-se o risco de que, sem o
ato que funda a fenomenologia
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do conhecer, é ponto de partida e de chegada da humana docência que se volta ao movimento de um aprendizado também experiencial. Sem a escuta, o ato de ensinar se reduz à ação pragmática de transmitir. Mediados pela tecnologia, os interesses, os desejos, os sonhos e as angústias das crianças e dos adolescentes não podem ser desconsiderados, pois os principais sujeitos do processo formativo são os estudantes. Essa escuta se faz urgente em um momento em que médicos, políticos, professores, especialistas em educação e economia, famílias e a sociedade em geral assumem o lugar daqueles que melhor sabem o que deve ser feito para as crianças, jovens e adolescentes, tratando-os como meros receptores e executores de projetos. Em trabalho formativo realizado em maio de 2021, os estudantes do 6º e 7º Anos foram convidados a refletir sobre as angústias e ale-
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grias vividas por eles nesses tempos de distanciamento do Colégio e da convivência com as rotinas e pessoas que eles mais amam. Analisando as experiências individuais, cada estudante teve que construir a “sua bandeira”, demonstrando por meio da escrita ou de desenhos as suas maiores angústias, medos, dificuldades, sonhos, felicidades e amores. A análise de todo esse material abre um campo polissêmico para compreendermos o contexto a partir do que desejam e sentem as nossas crianças e adolescentes. Mais importante do que tomarmos, como adultos, o leme da vida dessas crianças e adolescente, é aprendermos a ouvi-las e respeitá-las em suas liberdades. A saudade dos amigos e amigas, das viagens, das antigas rotinas foi uma constante na maioria dos trabalhos. Mas essa saudade também caminha ao lado do “medo do coronavírus piorar e termos que ficar sem sair de casa por mais um ano”, ou pela “tristeza
quando alguém que conheço vai para o hospital” ou ainda pelo sofrimento e exaustão emocional: “Muita gente está exausta fisicamente e mentalmente com essa pressão escolar e pressão familiar”. As narrativas foram marcadas pelo sentido de esperança e pelo mergulho dessa geração ainda recém-chegada ao mundo, da morte, da separação, de “perder as amizades, de “morrer de corona”. A família aparece como um valor central nesse caminho de superação das dificuldades. Uma segunda urgência a ser pensada no novo ethos escolar tem relação com o desafio da continuidade e do método. Pensando-se o estudante que chegou ao 6º Ano em 2020 e tem entre 10 a 11 anos, a formação para o método de e para cada um dos componentes se encontra em fase de aprofundamento e solidificação. Professoras e professores trabalham os conteúdos vinculados a uma proposta formativa que visa à
autonomia dos aprendentes. Co-
permite acesso a conhecimentos
nhecer, neste caso, é tão ou mais
antes restritos a determinados paí-
importante do que saber que se
ses ou nível de renda familiar, pode
conhece. A mudança do formato
favorecer a criação de uma cultura
da escola trouxe para o centro da
que democratize o conhecimento
discussão a formação para e na
rompendo barreiras históricas que
autonomia. Sem autonomia, fru-
limitaram muitas vezes o ensino:
to de uma cultura sólida de leitu-
“Através do uso da internet, [os es-
ra e aprofundamento científico,
tudantes] podem acessar recursos
a educação híbrida pode vir a se
amplos para realizar pesquisas com
tornar um tormento na vida das
mais facilidade do que com livros
crianças e adolescentes. O acom-
físicos e fontes em papel” (2019, p.
panhamento
professoras
43). É fato que, sem o aparato tec-
e professores é imprescindível,
nológico do qual dispõe a maioria
pois, além de formar para, orien-
das sociedades ocidentais, seria
ta, escuta, cuida para que o mé-
muito mais difícil a continuidade
todo seja acessível a todos e to-
dos processos educacionais em um
das, apreendido, sobretudo, em
momento de suspensão das ativi-
uma dinâmica de autoformação.
dades presenciais.
das
devem ser capazes de despertar uma curiosidade apta a romper com a horizontalidade, ou superficialidade, do conhecimento que muitas vezes é acessado nas Redes. A curiosidade e a pergunta são motores do método. Segundo Alberto Manguel, relatando a sua experiência escolar na infância, "Não há como exagerar a importância de ter liberdade para tais inquirições. Para uma criança, elas são essenciais para a mente assim como o movimento é essencial para o corpo. No século XVII, Jean-Jacques Rousseau afirmou que uma escola deveria ser um espaço onde se dava livre alcance à imaginação e à reflexão, sem qualquer propósito óbvio ou prático ou qualquer objetivo utilitário” (MANGUEL, 2016, p. 52).
Uma terceira urgência diz res-
Mas a experiência do conhecer
peito à criação de uma cultura que
não é redutível à relação lógico-
lide com o conhecimento e pes-
-causal ou meramente de acesso
quisa de modo profundo. A Com-
à tecnologia reduzida às platafor-
panhia de Jesus reconhece que “a
mas digitais. Conhecer é um ato
tecnologia pode dificultar a missão
amplo que deve contar com vá-
dos colégios jesuítas de combater
rias tecnologias mediadoras que
a superficialidade” (2019, p. 43),
nos permitam ler o mundo como
Por fim, a experiência socioemocional, articuladora de todas as urgências anteriores, deve nos servir de guia como escola e família, no processo de acompanhamento e cuidado da caminhada formativa
assim como o potencial disrupti-
forma de acesso e compreensão
do sujeito estudante. O planejamen-
vo da internet na medida em que
da realidade. Essas “tecnologias”
to durante e pós-pandemia deveria
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considerar essa dimensão constitutiva. Como colégio da Rede Jesuíta de Educação, A nossa opção é pelo pensar sobre o pensar, é a percepção dos caminhos e descaminhos presentes no conhecer; é ler o estudante em sua real condição existencial; é atender à cultura; é tentar atingir as pessoas em sua dimensão existencial. Uma prática pedagógica compreendida como prática social e preocupada com a formação/aprendizagem integral fará com que nos deparemos com essa realidade (MEDIANEIRA, 2017, p. 30). As realidades são cambiantes, mas um projeto formativo integral considera a pessoa em seu todo existencial dentro de uma perspectiva pedagógica compreendida como prática social e preocupada com a formação recebida no passado, vivida no presente e que
prepara o adolescente e jovem para um processo que não se encerra na escola básica, mas desemboca na inserção dos sujeitos para a vida em sociedade. Por isso que toda análise reducionista é problemática, pois desconsidera a capacidade e a liberdade daquele que aprende. Começa-se a ouvir na grande mídia que a pandemia formou uma geração “perdida”, como se os estudantes estivessem limitados à mera ação passiva de transmissão de conhecimentos em posse dos adultos. O cenário presente e desafiador nos deve abrir novas perspectivas de trabalho não apenas para, mas sobretudo com os nossos adolescentes e crianças e a escuta dessas experiências será imprescindível.
REFERÊNCIAS AURÉLIO. Dicionário Online de Português. Disponível em: https://www.dicio.com.br/ aurelio-2/. Último acesso: 23 jul.2021. COMPANHIA DE JESUS. Colégios Jesuítas: uma tradição viva no Século XXI. Trad. Pedro Risaffi. Rio de Janeiro, Rede Jesuíta de Educação, 2019. COMTE-SPONVILLE, André. Pequeno Tratado das Grandes Virtudes. São Paulo: Martins Fontes, 1996. MANGUEL, Alberto. Uma história natural da curiosidade. Trad. Paulo Singer. 1ªed. São Paulo: Companhias das Letras, 2016. UNICEF. Averting a lost COVID Generation. Disponível em: www.unicef.org/reports/avertinglost-generation-covid19-world-childrens-day-2020brief. Último acesso: 07 jul.2021. MEDIANEIRA. Formação e Aprendizagem Integral: o currículo em suas dimensões. Documento produzido pelos professores do Colégio Medianeira.
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Mayco Delavy é bacharel e licenciado em Filosofia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia. É pósgraduado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Atualmente trabalha como Orientador Pedagógico no Ensino Fundamental II do Colégio Medianeira, e como professor de Filosofia no Ensino Médio da rede pública. É mestre em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), linha de Pesquisa Escola, Ensino e Processos Educacionais com ênfase no ensino de Filosofia. Também é integrante do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre o Ensino de Filosofia (NESEF/UFPR).
Indicações Pequeno Tratado das Grandes Virtudes |WMF Martins Fontes Em busca de entender as virtudes mais importantes, André Comte-Sponville indica neste pequeno tratado o que acredita que as virtudes são, ou o que deveriam ser, e o que as torna sempre necessárias e difíceis. A obra possui estilo acessível ao grande público, fugindo do hermetismo de muitas obras filosóficas.
Uma história natural da curiosidade | Companhia das Letras Um curioso nato, que cresceu em meio a grandes obras de filósofos, o argentino Alberto Manguel baseia-se em grandes pensadores, como Tomás de Aquino, David Hume, Lewis Carroll, Sócrates e Dante, e define perguntas sem respostas, como “quem eu sou,” para tentar entender o mundo.
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ENSINO MÉDIO
O contexto de aprendizagem a distância e a experiência da quarentena Formação humana e acadêmica segue como importante norteador das práticas jesuítas. Por Claudia Furtado de Miranda
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ntes de descrever sobre as escolhas que fazem parte do projeto de vida dos jovens ao longo das suas trajetórias nos três anos finais do Ensino Básico, gostaria de destacar que tais caminhos foram trilhados nos últimos dois anos em meio a uma série de desafios diante da imprevisibilidade da realidade história e social.
A
A pandemia, em nível global, é talvez comparável aos flagelos da Peste Negra do século 14 e da Gripe Espanhola do início do século 20. As pessoas do mundo todo enfrentaram um vírus que se propagou, infectou e matou na velocidade do processo de globalização – a Covid-19. “Os ‘anos’ em que a Terra parou” (2020 e 2021), parafraseando Raul Seixas1, deixaram uma série de questões em suspensão crítica: como melhorar o sistema único de saúde pública para atender a população? O vírus atinge qualquer pessoa, independentemente da classe social, crenças e etnias, mas em quais regiões e localidades do Brasil as pessoas mais adoeceram? Qual a importância do conhecimento científico sobre as precauções que evitem a proliferação da doença e anunciem as possibilidades de cura (vacina)? A relação destrutiva do ser humano com a natureza – diversidade sistêmica da vida – pode ser superada quando essa dicotomia também for compreendida como um problema para a sobrevivência de todas as formas de vida? A economia e o mercado foram prejudicados em escala local e global, ao mesmo tempo em que as pessoas perderam amigos,
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empregos e segurança. O “mercado” não é uma entidade que existe por si só, tendo as marcas de todos os enredos possíveis (distribuição de mercadorias e riquezas em nível local e mundial, formas de exploração, formas de gerenciamento dos negócios, relação consumo e hiperconsumo...). Pode se humanizar o “mercado” com a humanização das pessoas, com um sistema produtivo alternativo – novas formas de solidariedade, alteridade e justiça socioambiental? Aprendemos algo com a pandemia? Não é minha pretensão responder a essas questões, mas mostrar que este momento pode ser um aprendizado para novas reflexões e formas de agir das pessoas, coletivamente, na direção de um outro mundo possível. Esta análise é importante porque a realidade histórica, social e ambiental não passa à margem do Colégio, ao contrário, é a compreensão desta realidade que situa o jovem diante dos desafios e das escolhas que permeiam o seu projeto de vida: opção pelo curso universitário, compreensão e posicionamento diante do mercado de trabalho, enfrentamento das possibilidades e incertezas da vida. O Colégio e seus muitos sujeitos – estudantes, educadores e famílias – têm enfrentado juntos como reaprender a viver e a compreender a realidade atual com relação às inúmeras dimensões da aprendizagem, sejam as cognitivas e as socioemocionais. Passamos do ensino remoto de 2020 para o ensino semipresencial em 2021, com vistas ao retorno 100% presencial em 2022. Aprendemos a aprender a partir
da tecnologia como inovação metodológica e, neste contexto, nos deparamos com várias demandas, como por exemplo, a importância de ensinar os estudantes a pesquisar, a diferenciar plágio de autoria, compreender o que é Fake News e como ter acesso às informações mais fidedignas aos fatos, a selecionar e relacionar informações, conhecimentos e posicionamentos. Em outras palavras, faz parte do projeto formativo do estudante do Ensino Médio no Medianeira a ênfase ao sentido ético que atribui a autoria a determinada produção acadêmica, além da importância do que está se propondo como estudo para o aprendizado dos estudantes (leituras, exercícios, pesquisas etc.). Essas questões são fundantes para o aprendizado que auxilie no posicionamento do jovem e nas escolhas decorrentes aos rumos e às necessidades que a vida apresenta. É sabido que estamos diante de novas formas de ensino e de aprendizagens para todos os envolvidos (famílias, estudantes e professores) e temos aprendido que a escuta dos estudantes tem constituído um ponto crucial para que possamos adequar os trabalhos desenvolvidos às necessidades emergentes e inéditas para todos. Somos seres de relações e, como tal, nossa aprendizagem acontece nas interações sociais, no olho no olho, nas contradições reais que estão presentes em todo o ambiente escolar: na explicação do professor e nas dúvidas explicitadas pelos estudantes, nas conversas paralelas de sala de aula, nos bate-papos e paqueras
dos corredores, nas brincadeiras e nas piadas, nos encontros e desencontros que constituem as pessoas a partir dos outros. O ensino híbrido, com o rodízio presencial dos estudantes no Colégio, possibilitou ressignificar a dimensão socioemocional do ensinar e aprender pela alteridade – “eu” me constituo como pessoa com o “outro”. Neste sentido, a formação integral compreende as dimensões da ética, da cultura, da ciência e do trabalho no contexto da formação dos projetos de vida dos jovens brasileiros. Envolve também alguns elementos que são centrais para a formação acadêmica e humana, tão cara para a formação inaciana: o estudo do conhecimento das disciplinas/ componentes em suas respectivas áreas (conceitos, linguagem específica de cada ciência, análise, interpretação e produção de textos);
a relação dos conhecimentos dos componentes com o estudo da realidade histórica (leitura crítica da realidade, considerando a relação entre fatos, posicionamentos, alteridade e busca por justiça social); a Escola Aberta para a aprendizagem com a comunidade/ bairro/cidade: biblioteca, museus, centros culturais, centros de ciência e tecnologia – universidades, laboratórios de pesquisa privados e públicos, empresas; o trabalho como princípio educativo e a formação para o trabalho (análise do contexto contemporâneo com relação à constituição do ser humano no e pelo trabalho; relações sociais e econômicas presentes no mercado de trabalho; dimensões formativas do trabalho relacionadas às opções dos estudantes). A formação integral, na perspectiva de uma educação jesuítica, se dá/dará em um tempo e
espaço pedagógico que reavive sonhos e cultive projetos de vida para e com os jovens, principalmente com relação às suas escolhas tão fortemente marcadas no processo de adultecer. Este é o principal compromisso da formação integral situada na formação dos estudantes do Ensino Médio no Colégio Medianeira. 1. Canção lançada em 1977 e escrita por Raul Seixas em parceria com o compositor Cláudio Roberto, “O Dia Em Que A Terra Parou” faz parte do álbum de mesmo nome e tem como inspiração o filme de ficção científica, também homônimo, lançado em 1951. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
Claudia Furtado de Miranda é formada em História pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e especialista na área de Currículo e Prática Educativa pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUCRJ), além de mestre e doutora em Educação pela PUCPR. Atualmente, é orientadora pedagógica do Colégio Medianeira.
Indicações A máquina do ódio: notas de uma repórter sobre fake news e violência digital Companhia das Letras A jornalista Patrícia Campos Mello apresenta, neste livro, detalhes de como sofreu os efeitos da desinformação e das fake news no período de coberturas das eleições presidenciais de 2018, no Brasil. A obra aborda aspectos das disputas narrativas e dos mecanismos de proliferação das notícias falsas.
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Carlos Baggio
45 anos 52
Mediação
Isidoro Rabusque
de amizade Mediação
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Para a Revista Mediação, Olindo e Rudi contam suas histórias de mais de quatro décadas de convivência. Sem pressa, Olindo manobra o seu carro no estacionamento da saída do Prado Velho. São quase 10 horas da manhã de um dia um pouco abafado em Curitiba — e o movimento habitual da Linha Verde segue intenso. Enquanto observo os caminhões se enfileirando entre as grades que separam a rodovia do Colégio, um motociclista passa buzinando pela marginal e sinalizando com a mão algo talvez não muito lisonjeiro para o motorista de um Celta branco. A nossa equipe do setor de Midiaeducação — somos em três, eu (dublê de jornalista), a Lil (a nossa supervisora e designer) e o Wagner (o nosso fotógrafo e cinegrafista) — entra no carro sintonizado na Mundo Livre FM: “uma atitude sonora”, como sempre reforça o slogan da rádio. Dado o meu desconhecimento em matéria de automóveis, dizem-me ser um Cretta, ainda cheirando a novo. Sento-me no banco atrás do motorista e coloco o rosto na janela para aplacar o calor. Vamos visitar o Rudi. * Chegamos em frente à casa do Rudi, na Fernando Amaro, um condomínio de casas geminadas com muitas flores e passarinhos, uns banquinhos de cimento que logo verifico serem ideais para boas fotos externas. Surge-me uma estranha memória de Cartagena das Índias, lugar que nunca fui, talvez presente pela aura dos livros de Gabriel García Márquez. Olindo encontra uma vaga uns 60 metros à frente e, com uma perícia que
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podemos batizar como singular, estaciona o carro 75% na calçada e 25% em cima do meio-fio. Anunciamos a nossa chegada no interfone e Rudi logo abre o portão eletrônico, nos convidando a entrar, derramando uma hospitalidade serena de quem convida velhos amigos para tomar café. Os seus 1,90 m (ou mais) passam a impressão de se tratar de um grande patriarca tranquilo, sossegadamente trajado em uma camisa social e moletom. Ele e Olindo se conhecem de muito tempo e logo emendam piadas internas. “Ô, Olindo, então, você também veio. Desse jeito vão achar que somos amigos”. Entramos na casa margeada pelas orquídeas brancas.
mas aí fui ficando, ficando...”, relembra com um sorriso de canto, enquanto dá uma tragada forte em sua cuia de chimarrão. “Acabei até casando”, solta, piscando de lado para a esposa. Se conheceram no Colégio, daqueles amores avassaladores. “Tive que largar uma outra namorada”, brinca (ou não). E você, Olindo?
* Wagner arruma o tripé da câmera e nos instrui acerca do uso correto do gravador. Sentamo-nos na mesa redonda com tampa giratória sob um aconchegante teto retrátil. Sheila, a esposa do Rudi, que trabalhou mais de 20 anos no Colégio, nos dá a opção entre dois tipos de suco: pêssego ou morango. Escolhemos morango. Tudo pronto. Podemos começar? Rudi, você que é o anfitrião, nos conte: como começou a sua vida com o Medianeira? Em 1972, o jovem seminarista Rudi Isidoro Rabuske foi transferido de São Leopoldo para Curitiba. “Cheguei num dia e no outro dia tava dando aula de Filosofia no Colégio. Era pra ser um estágio jesuíta de apenas uns dois ou três anos,
O Medianeira entrou na vida de Olindo Carlos Baggio em fevereiro de 1976. Com seu rosto redondo e riso fácil, um pouco bem menor que Rudi, conta que dava aula no Colégio Estadual do Paraná (CEP) quando encontrou Luiz Carlos dos Santos, um antigo professor de Química. “Ele que me avisou sobre um chamado para novos professores no Medianeira. Então,
fui lá. Aliás, foi a Sheila que me entrevistou para a vaga de emprego”, recorda de passagem. Ela, inclusive, intervém regularmente e nos auxilia com as datas, lembra de detalhes dos causos dos amigos, resgata nomes e lugares. Pergunta também se queremos mais suco. “Logo depois conheci o Rudi. Na convivência começou a nossa amizade”, destaca Olindo. “Para de falar que somos amigos, Olindo... As pessoas vão acreditar”, se diverte Rudi. “Passamos muitos anos de férias juntos. No começo éramos em três casais, depois cinco. As famílias foram crescendo, crescendo, e, em uma época, chegamos a reunir 22 pessoas na Chácara do Peri”, resgata Olindo. “Mas você nem levantava pra lavar um prato, Olindo...”. “Isso não é verdade, Rudi, a gente fazia revezamento, sobrava até pras crianças mais crescidas”. * Juntos, Rudi e Olindo somam mais de 90 anos de Medianeira. Foram décadas e décadas de convivência intensa com os professores, com os pais, com as famílias. “Por isso sempre digo que 1976 foi um ano mágico na minha vida. Entrei no Colégio, casei, terminei a graduação no fim de ano...”, conta Olindo, emocionado, enquanto dividimos fatias de bolo de cenoura e uma cuca, retirando rapidamente as máscaras para uma larga mordida. Entre uma pergunta e outra, os nomes do passado surgem como cometas, rebrilhando no céu da memória: Padre Paulo, Padre Raimundo, Pedrinho Gomes, José Lorenzatto. “São tantos nomes
importantes na trajetória da gente, tantas saudades...”, reconhece Rudi, com o olho direito um pouco mais aquoso que o esquerdo.
para a 3ª Série do Ensino Médio. Diz o Rudi que depois se arrependeu de ter me contratado”, sorri. “Claro que me arrependi”, completa Rudi.
Em 1976, Rudi era supervisor do Científico, o atual Ensino Médio. Era também professor de Ensino Religioso. “E o Padre Paulo ainda me colocou também como coordenador do transporte escolar...”. Foi o novo supervisor quem idealizou a primeira Olimpíada estudantil, uma tradição que permanece viva no cotidiano do Medianeira até hoje.
* Do que sentem mais falta dos dias de Medianeira? Rudi se adianta: “Ah, a gente tinha uma convivência incrível, de olhar um no rosto do outro e saber se tava bem ou não. Sábado tinha aula e as famílias ficavam pro futebol e pro churrasco, que sempre tinha. Os filhos ficavam conversando o dia inteiro
Os nomes do passado surgem como cometas, rebrilhando no céu da memória: Padre Paulo, Padre Raimundo, Pedrinho Gomes, José Lorenzatto. “São tantos nomes importantes na trajetória da gente, tantas saudades...” Como o mundo é composto de mudanças, tomando sempre novas qualidades, em 1979, as coisas mudaram mais. “O padre Raimundo, então diretor do Colégio, me convidou para a vice-direção. Fiquei surpreso. Assumi em 1980. Fiquei até 2001, acho”. Nesse período, Olindo foi professor de Química do Ensino Médio, de 1976 a 1985, para ser mais exato. “Entre 1986 e 1988, me ausentei, indo fazer meu mestrado em Florianópolis. O Colégio deixou as portas abertas. Voltei em 1989”. Em 1990, Olindo entrou para a Associação de Pais e Professores (APP), onde foi vice-presidente por 16 anos. “Fui também vice-presidente da Associação de Funcionários do Medianeira (AFM). Depois, de 2009 a 2015, trabalhei no Serviço de Orientação e Convivência Escolar (SOCE), além de dar aula
no Colégio”, relembra. “Era difícil um sábado sem ter carne assada”, completa Olindo. Em meados dos anos 1980, o futebol de sábado foi transferido para quinta-feira. O Padre Raimundo não jogava, mas seguia organizando os comes e bebes. A Confraria das quintas-feiras, como foi batizada, existe até hoje. “Somos em 17. O Rudi até comparece de vez em quando”, ironiza Olindo. Os amigos de quatro décadas concordam sobre o clima institucional de tantos anos. “Era difícil um professor sair do Colégio”, conta Rudi. “As pessoas se identificavam com a filosofia do Colégio, um grande eixo norteador que ainda persiste e que vai passando de geração pra geração. Hoje vemos os netos dos nossos amigos se formando”, completa. “Existia um cuidado com as
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pessoas, um compromisso fraternal, uma harmonia apesar das diferenças”. Rudi aposentou-se em 2016. * A entrevista se encaminha para o fim. Precisamos voltar para o nosso departamento e Olindo também tem compromisso com os netinhos. Os pratos de bolo são amontoados e o barulho leve dos copos vai anunciando a hora de partir. Desligo o gravador. O gremista Rudi recorda mais uma vez o valor da vida acadêmica, de ver os estudantes crescendo, se desenvolvendo, os vínculos que vão se criando com as famílias. “É uma vivência inesquecível”, define. É o momento em que os bancos de cimento da frente de casa servirão de apoio para as melhores fotos. “São tantas pessoas especiais, que nos dão saudades, que fazem parte da vida...”, acrescenta Olindo, que, agora, pelo WhatsApp manda bom dia, boa tarde e boa noite para amigos dos anos 1970 a 2019, seu último ano no Colégio. Nos despedimos e entramos novamente no carro. Carrego a sensação intangível de ter saído pela porta de um tempo que nunca mais irá se repetir, muitos nomes nos acompanhando como cometas, rebrilhando no céu da memória. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
Daniel Zanella é formado em Jornalismo e editor do Jornal RelevO, impresso mensal de literatura em circulação desde setembro de 2010. É mestre e doutorando em Teoria Literária pela Uniandrade. Trabalha como jornalista e assessor de imprensa do Colégio Medianeira
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DO MUNDO VUCA AO MUNDO BANI: uma abordagem para a era do caos Autor norte-americano analisa os cenários futuros em meio à crise da Covid-19, abordando a aplicação dos conceitos de VUCA e de BANI nos tempos atuais. Por Carlos Renato Moiteiro
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osso lugar de conhecimento e perspectiva de mundo, enquanto sujeitos ocidentais, sempre foi o da permanência e estabilidade. Desde o bíblico “Eu Sou” às ideias inatas de Descartes – passando pelas essências parmenidianas, o além-mundo platônico e a substância aristotélica, sem contar suas muitas derivações medievais –, o Ocidente sempre reconheceu na fixidez da estabilidade e na objetividade da permanência o ideal de conhecimento e ciência a ser alcançado. Ao longo dos séculos, e mesmo após a revolução científica no século 17, acostumamo-nos a pensar o mundo a partir de suas formas e categorias a priori: simulacros formados, decerto, mediante inúmeras repetições, como também por meio de múltiplas reduções, assimilações, generalizações e exclusões. O mundo da identidade e do mesmo, em detrimento do outro e da diferença.
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Todavia, as aceleradas mudanças que as ciências da natureza experimentaram no final do século 19 e início do 20 exigiram das ditas ciências humanas, de um modo geral, e da educação em particular, um novo caminhar em direção ao desconhecido mundo das probabilidades. Não estávamos mais diante das certezas newtonianas, com seu mundo-relógio e seu objetivismo; tampouco diante do otimismo comtiano e seu homem-progresso – homem-máquina. Abria-se para o pensamento ocidental uma realidade incerta e ambivalente, um universo de distâncias imensas e processos incontáveis, um tempo relativo e um meio-ambiente sistêmico, cíclico e recursivo. Enfim, um mundo complexo.
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A educação do século 20, no entanto, bem como a dos séculos anteriores, não nos preparou para este “salto quântico” no conhecimento e nas ciências, e tivemos que criar então novos instrumentos para lidar com um mundo em transformação: o pragmatismo, as teorias construtivistas, a pedagogia histórico-crítica e a própria teoria da complexidade, foram formas de repensar os métodos e estratégias de ensinagem-aprendizagem, diante de um novo mundo e novas compreensões de universo, realidade e humanidade que se constituíam. Outra mudança, no entanto, já está em curso. E não foi preciso esperar a pandemia do vírus Sars-Cov-2 para que tal ruptura se estabelecesse bem debaixo de nossos pés. Globalização da economia e da informação, rede mundial de computadores, novas configurações geopolíticas no final do século 20, todos estes acontecimentos foram descortinando, ao longo das três últimas décadas, uma realidade caótica, diante do qual nossos melhores esquemas interpretativos falham, ao tentar prever... o imprevisível. É o mundo da hiperconexão, das redes sociais alimentadas por algoritmos, da revolução tecnológica 4.0, das interfaces biotecnológicas, das mudanças climáticas de causa antrópica e seu consequente evento de extinção em massa, do recrudescimento de governos autoritários e da crise das democracias, do risco crescente de novas pandemias... O mundo mudou, a realidade mudou, mas nós não estávamos preparados para esta mudança. Não que devamos nos tornar reféns de um discurso da disrupção,
aquele discurso comumente presente em grandes corporações, fintechs e startups as mais diversas possíveis, e infelizmente em algumas instituições educacionais também, que se apoia em argumentos escatológicos (ou na falácia do apelo ad novitatem), para abandonar tudo o que se considera “ultrapassado”, ou melhor, que se faz parecer ultrapassado – geralmente por interesses econômicos ou ideológicos. Por outro lado, a mudança que o contexto atual exige de nós passa pela compreensão do imprevisível, pela aceitação do caos e do surpreendente, da absurdidade das emergências e pelo reconhecimento de uma história que atua como um fractal – a repetição infinita de equações simples modificadas por eventos singulares. O texto do historiador, antropólogo e cientista político Jamais Cascio, pesquisador do Instituto para o Futuro, com sede em Palo Alto, Califórnia, nos ajuda a repensar esses nossos esquematismos e encarar a mudança a caminho. A partir do conhecido quadro interpretativo sintetizado na sigla VUCA (Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo), Cascio propõe que a realidade que resulta das transformações ora em curso podem ser melhor compreendidas pelo quadro BANI (Frágil, Ansioso, Não-linear e Incompreensível). Ou, na metáfora dos estados da matéria da qual o próprio autor faz uso, trata-se da passagem do “mundo líquido” (ao qual, na verdade, com muita dificuldade estávamos começando a nos adaptar) a um mundo que nos escapa constantemente, como o vapor de água em uma chaleira: um mundo em ebulição.
ENFRENTANDO A ERA DO CAOS Jamais Cascio
Estamos em uma era de caos, uma era que intensamente, quase violentamente, rejeita estruturas. Não é simples instabilidade, é uma realidade que parece resistir ativamente aos esforços para compreender que diabos está acontecendo. Este momento corrente de desordem política, desastres climáticos e pandemia global – e tantas coisas mais – vividamente demonstra a necessidade de um jeito de dar sentido ao mundo, a necessidade de um novo método ou ferramenta para ver as formas que esta era do caos toma. Os métodos que desenvolvemos ao longo dos anos para reconhecer e responder às disrupções rotineiras mostram-se gradualmente, dolorosamente inadequadas quando o mundo parece desmoronar. É difícil ver o grande quadro quando tudo insiste em colorir fora das linhas. Sempre houve incerteza e complexidade no mundo, e temos elaborado razoavelmente sistemas efetivos para compreendê-lo e adaptarmo-nos a esta desordem cotidiana. Desde instituições de peso como “lei” e “religião” a normas e valores habituais, e mesmo a modelos de negócios e estratégias políticas efêmeras, muito do que pensamos compor a “civilização” é, em última análise, um conjunto de acessórios culturais que nos permite domesticar a mudança. Se nós podemos tornar compreensíveis processos disruptivos, esperamos, talvez nós possamos manter sobre controle suas piores implicações.
Uma das melhores formas que tivemos para conceber a familiar (se inquietante) dinâmica da mudança é o conceito “VUCA”. VUCA é um acrônimo que significa Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo. O termo provou ser um quadro útil para dar sentido ao mundo ao longo de décadas recentes. Ele sublinha a dificuldade de fazer boas decisões em um paradigma de frequentes, amiúde dissonantes e confusas, mudanças em tecnologia e cultura. O conceito de “VUCA” apareceu no trabalho da Escola de Guerra do Exército dos EUA ao final da década de 1980, espalhando-se rapidamente por intermédio da liderança militar durante os anos 1990, e começou a aparecer no início dos anos 2000 em livros sobre estratégia de negócios. É uma formulação inteligente, ilustrando o tipo de mundo que emergiu de um cenário pós-Guerra Fria cada vez mais interconectado e profundamente digital. Pelo novo século, volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade tornaram-se todos conceitos rotineiros entre pessoas trabalhando em estratégia e planejamento. Os tipos de ferramentas que criamos para gerir este nível de mudança – pensamento futuro e cenários futuros, simulações e modelos, sensores e transparência – são mecanismos que nos permitem pensar e trabalhar dentro de um ambiente VUCA. Estas ferramentas não nos dizem o que
irá acontecer, mas nos habilitam compreender os parâmetros do que pode acontecer em um mundo volátil (incerto etc.). São metodologias construídas sobre a necessidade de criar uma estrutura para o indefinido. O conceito de VUCA é claro, evocativo, e crescentemente obsoleto. Nos tornamos tão completamente cercados por um mundo do VUCA que este parece menos um modo de distinguir importantes diferenças do que simplesmente uma descrição ou nossa condição predefinida. Usar “VUCA” para descrever a realidade proporciona abordagens reduzidas; declarar uma situação ou um sistema como volátil ou ambíguo não nos diz nada de novo. Emprestando um conceito da química, tem sido uma mudança de fase na natureza de nossa realidade social (e política, cultural, tecnológica) – não estamos mais borbulhando alegremente juntos, a ebulição começou. Com um novo paradigma, precisamos de uma nova linguagem. Se rejeitamos [o conceito de] VUCA como insuficiente, ainda precisamos de um enquadramento que faça sentido não apenas para o presente bem como para suas consequências em curso também. Tal enquadramento nos permitiria ilustrar a escala das disrupções, o caos, em curso e possibilitar a consideração de que tipos de respostas seriam úteis. Idealmente, serviria
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como uma plataforma para explorar novas formas de estratégias adaptativas. Cenários, modelos e transparência são maçanetas úteis em um mundo VUCA; quais poderiam ser as ferramentas que nos permitiriam compreender o caos? Como um modo de chegar a tal questão, considere o BANI. Um paralelo intencional ao VUCA, BANI – Frágil [Brittle], Ansioso [Anxious], Não-linear e Incompreensível – é um quadro para articular as crescentes situações rotineiras nas quais a simples volatilidade ou complexidade são lentes insuficientes pelas quais [se pode] entender o que está ocorrendo. Situações em que as condições não são simplesmente instáveis, são caóticas. Nas quais os efeitos não são simplesmente difíceis de prever, são completamente imprevisíveis. Ou, para usar a linguagem particular desses enquadramentos, situações em que o que acontece não é simplesmente ambíguo, é incompreensível. BANI é uma forma de melhor enquadrar, e responder, ao estado corrente do mundo. Algumas das mudanças que vemos acontecendo em nossa política, ao nosso ambiente, nossa sociedade e a nossas tecnologias são familiares – estressantes em seu próprio modo, talvez, mas de um tipo que nós temos visto e com o qual temos
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lidado antes. Mas inúmeras das convulsões agora em curso não são familiares, elas são surpreendentes e completamente desorientadoras. Elas se manifestam em modos que não apenas somam-se às tensões que experienciamos, elas multiplicam essas tensões. Deixe-nos detalhar um pouco o que cada uma das palavras no enquadramento BANI significam. “B” é para Frágil [Brittle]. Quando algo é frágil, é suscetível a uma falha catastrófica e repentina. Coisas que são frágeis parecem fortes, podem mesmo ser fortes, até que atingem um ponto de ruptura, então tudo desmorona. Sistemas frágeis são sólidos até que eles não são [mais]. Fragilidade é uma força ilusória. Coisas que são frágeis são não-resilientes, às vezes mesmo anti-resilientes – elas podem tornar a resiliência mais difícil. Um sistema frágil em um mundo BANI pode estar sinalizando desde o começo que é bom, é forte, é capaz de continuar, mesmo à beira do precipício do colapso. Sistemas frágeis não falham graciosamente, eles se estilhaçam. A fragilidade emerge com frequência dos esforços para maximizar a eficiência, para torcer cada última ponta de valor – dinheiro, poder, alimento, trabalho – de um sistema. Fragilidade pode ser en-
contrada em monoculturas, onde plantar uma única cultura significa produção máxima, até que um inseto que afeta unicamente aquela espécie ou variedade particular destrói o campo inteiro. Vemos fragilidade na “maldição dos recursos”, quando países ou regiões são ricos de um recurso natural útil, logo focam inteiramente em sua extração... e então aquele recurso torna-se funcionalmente inútil após uma mudança de tecnologia. A fragilidade emerge da dependência de um ponto de falha único, crítico, e da relutância – ou inabilidade – de deixar qualquer capacidade excedentária, ou folga, no sistema. Claramente, a fragilidade não é um desenvolvimento novo – mas no passado, as consequências de falhas catastróficas (p. ex., a fome da batata, a obsolescência do guano) eram mais ou menos regionalmente limitadas. No mundo geopoliticamente, economicamente e tecnologicamente interconectado de hoje, um colapso catastrófico em um país pode causar um efeito cascata ao redor do planeta (p. ex., a Crise da Dívida Grega, a Primavera Árabe). Cada vez mais, estamos vendo a fragilidade manifestar-se em formas novas e surpreendentes. Poucos viam a democracia como um sistema frágil, até darmo-nos conta de quão uma democracia funcional depen-
de da responsabilidade sobre inverdades intencionais. Quanto dos sistemas fundamentais dos quais depende a sobrevivência humana podem agora ser razoavelmente considerados “frágeis”? Matrizes energéticas? Comércio mundial? Alimentos? Se a fragilidade vem da ausência de uma atenuação para a falha, logo quaisquer sistemas que dependam de produção máxima correm o risco de colapso se aquela produção cair. Dado que nossos sistemas centrais estão tão frequentemente interconectados, é completamente possível que o fracasso de um único componente importante possa levar à uma cadeia de falhas. Em um cenário de sistemas estreitamente interlaçados, é perigoso que qualquer peça falhe. Infelizmente, pensar acerca desse tipo de coisas pode levar a induzir muita ansiedade. Então “A” é para ansiedade-indutora ou, mais simplesmente, Ansioso [Anxious]. A ansiedade carrega consigo um senso de impotência, um medo de que, não importa o que fizermos, será sempre a coisa errada. Em um mundo ansioso, cada escolha apresenta-se potencialmente desastrosa. Está intimamente entrelaçado à depressão e ao temor. Um mundo ansioso é
aquele no qual estamos constantemente esperando pelo próximo tropeço – ou, em um clichê mais moderno, onde todo dia é uma “sexta-feira F5”, apenas esmagando a tecla de atualização para renovar as notícias, para ver qual horror aparece depois. Em contrapartida, podemos fazer nosso absoluto melhor para evitar toda e qualquer fonte de notícias sobre o mundo. Ansiedade pode conduzir à passividade, pois não podemos fazer a escolha errada se não escolhermos, certo? Ou pode manifestar-se como desespero, aquela compreensão horrorizada de que perdemos a chance de fazer uma decisão crítica e que não teremos outra oportunidade. Ou aquela profunda e terrível sensação de que há uma possibilidade muito real de que pessoas das quais dependemos farão uma má decisão que irá nos levar a algo muito pior do que [havia] antes. Nosso ambiente midiático afigura-se perfeitamente projetado para intensificar a ansiedade. Ele nos estimula de um modo que instiga excitação e medo. A apresentação de informação na mídia foca no imediato mais que no preciso. Estamos cercados pelo que podemos compreender como má informação [malinformation], uma ampla categoria de mal conhecimento [bad knowledge]
que engloba informação errada [misinformation], desinformação [disinformation], farsas [hoaxes], exageros, pseudociência, notícias falsas [fake news], falsas notícias falsas [fake fake news] e outros. Má informação é a cristalização do que aciona a ansiedade. Alguns de nós podem se adaptar ao criar má informação defensiva, envenenando o fluxo de dados com falsidades intencionais sobre nós mesmos, tornando as coisas piores, mas ao menos mantendo alguma coisa sobre nosso próprio controle. Ou nos adaptamos aceitando e promovendo figuras carismáticas, ou odiando [hating] e zombando de figuras carismáticas, e vendo cada evento como sinal de uma conspiração ou de uma contra-conspiração. Saber que o mundo tem mestres ocultos no controle de todas as coisas têm um efeito notavelmente calmante para muitos. Um número muito grande de nós se adapta pegando uma saída rápida. Globalmente, as taxas de suicídio estão em ascensão. Vemo-las aumentando em frequência entre aqueles que descobrem que as aparentemente boas escolhas que eles fizeram ao longo dos anos estavam na verdade erradas, eram becos sem saída, ou eram más mesmo. Pessoas honestas e que trabalham duro, que uma vez
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consideraram a si mesmas no controle das coisas, descobrindo que, não, elas não estão... e provavelmente nunca estiveram. Não necessariamente porque alguém ou algo mais estava realmente no controle das coisas, mas porque, para começar, o controle nunca foi possível. Neste espírito, “N” é para Não-linear. Em um mundo não-linear, causa e efeito estão aparentemente desconectadas ou [são] desproporcionais. Talvez outros sistemas interfiram ou obscureçam, ou porventura há uma histerese oculta, enormes atrasos entre causa visível e efeito visível. Em um mundo não-linear, os resultados das ações tomadas, ou não tomadas, podem terminar ficando violentamente fora de balanço. Pequenas decisões terminam com consequências massivas, boas ou más. Ou nós aduzimos enormes quantidades de esforço, empurrando e empurrando ainda que com pouco para ver. Estamos no meio de uma crise de não-linearidade com a Covid-19. A escala e o alcance desta pandemia vão muito além da experiência cotidiana; a velocidade com a qual a infecção se disseminou ao longo de seus primeiros meses foi surpreendente. Mesmo que alguns lugares tenham sido bem-sucedidos em reduzir a taxa de infecção, o aumento de casos em âmbito mundial ainda tende rumo ao exponencial[5].
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O conceito de “achatar a curva” é inerentemente uma guerra contra a não-linearidade. A disrupção climática é outro problema não-linear. Vemos à nossa volta, com intensidade e frequência crescentes, exemplos reais dos impactos da mudança climática induzida pelo aquecimento global... e estamos apenas um degrau celsius acima dos níveis pré-industriais. Aqui está algo que não muita gente sabe: o que estamos vendo agora é primariamente o resultado do aumento das emissões de carbono durante as décadas de 1970 e 1980. Há uma inércia massiva no sistema climático global, e as consequências não se manifestam imediatamente. Esse é o elemento “histerético” para nosso clima – um longo lapso entre causa e efeito total. Isso significa que mesmo se tivéssemos apostado tudo nos Protocolos de Kyoto vinte anos atrás, provavelmente ainda estaríamos vendo a sorte de caos climático agora em curso. E isto significa que poderíamos parar de lançar quaisquer emissões de carbono neste momento e ainda veríamos aquecimento adicional por pelo menos mais uma geração, e temperaturas altas continuadas por séculos. O cérebro humano simplesmente não evoluiu para pensar nesta escala. A Covid-19 e o clima do planeta não são os únicos exemplos. Não-linearidade, especialmente
na forma de causa e efeito desproporcionais, é claramente visível no mundo da política, especialmente na política internacional. Quanto o hacking russo nas eleições dos EUA em 2016 custou, comparado ao impacto que isto teve no mundo? Ou, mais amplamente, podemos entender o terrorismo como uma guerra não-linear, em termos de dinheiro e esforços requeridos para empreendê-lo versus o dinheiro e o esforço gasto para localizá-lo, preveni-lo e/ou puni-lo. Nós o vemos na economia, desde a rápida propagação da financeirização e a criação de novos implementos financeiros aos sistemas de negociação algorítmicos hipercinéticos. Demandas por crescimento incessante e sempre progressivo são em última instância uma demanda por não-linearidade. Mais importante, a não-linearidade é onipresente em sistemas biológicos. O crescimento e o colapso de populações, a eficácia da vacinação, inteligência de enxame e, como apontado, a propagação de pandemias – tudo isto tem um aspecto fortemente não-linear. De fora, são fascinantes de assistir; desde dentro, são espantosos de experienciar, como estamos descobrindo agora. E às vezes, é impossível compreendê-los. Assim, “I” é para Incompreensível. Testemunhamos eventos e decisões que parecem ilógicas ou sem sentido, quer porque
as origens são muito antigas, ou muito indescritíveis, ou apenas muito absurdas. “Por que eles fizeram isso?” “Como aquilo aconteceu?” Nós tentamos encontrar respostas, mas as respostas não fazem sentido. Ademais, informação adicional não é garantia de entendimento melhorado. Mais dados – mesmo grandes dados [big data] – pode ser contraproducente, sobrecarregando nossa habilidade de compreender o mundo, tornando difícil distinguir ruído de sinal. Incompreensibilidade é, com efeito, o estado final da “sobrecarga de informação”. Um modo em que isto se manifesta é em sistemas e processos que parecem estar quebrados, mas ainda funcionam, ou são não-funcionais sem qualquer lógica ou razão aparente. É um clichê de programador encontrar softwares que só operam quando uma linha não-funcional particular, alegadamente não-relacionada, permanece no código. Tire-a, o programa pifa ou não compila. Deixe-a ali – mesmo que ela não aparente fazer coisa alguma – e o programa funciona. Por quê? Incompreensível. Incompreensibilidade parece ser intrínseca à classe de sistemas de aprendizado de máquina/inteligência artificial que estamos começando a construir. Conforme nossas IAs se tornam mais complicadas, aprendem mais, fazem mais, mais difícil torna-se entender precisamente como elas tomam suas decisões. Programadores
sabem que há uma teia de lógica em funcionamento, mas acham difícil compreender precisamente como essa teia é modelada. Não podemos apenas ignorar isto; regulações, como aquelas na União Europeia, requerem cada vez mais que usuários de sistemas algorítmicos sejam capazes de explicar como e por que estes sistemas chegaram às suas conclusões. Isto não é só um enigma de tecnologia. Uma vez que softwares de IA se tornam mais firmemente entrelaçados em nossas vidas diárias, temos de prestar atenção especial aos modos nos quais algoritmos complexos podem conduzir a situações racistas, sexistas e outras consequências enviesadas. Códigos que aprendem de nós podem aprender mais que as lições e regras pretendidas. Além disso, como entendemos sistemas onde comportamentos complexos são executados quase perfeitamente, enquanto funções simples falham aleatoriamente? Por que razão um sistema autônomo e autocondutor que pode cruzar o país por si só também colide contra um muro enquanto simplesmente sai de uma garagem? Por que razão um sistema de aprendizagem incumbido de gerar faces humanas realísticas ocasionalmente produz algo absolutamente monstruoso? Você pode dizer que esta sorte de coisas acontece com pessoas, também – mas nós já sabíamos que cérebros humanos estão muito mais no reino do incompreensível.
Todavia essa afirmação sugere um ponto importante: incompreensível agora não significa incompreensível para sempre. Há dinâmicas que, seguramente, permanecem envoltas em mistérios que nós eventualmente compreenderemos. Isto pode, no entanto, significar que 1.400 gramas ou mais de carne incompreensível em nossos crânios podem precisar cooperar com uma similarmente incompreensível porção de silício. … “O Fim está Próximo”. Uma figura caricata em túnicas e barba segurando um cartaz aparenta-se menos divertida em nossos dias. É fácil fazer graça do pensamento apocalíptico quando uma tal possibilidade parece remota. Quando somos confrontados pela imensidão do desastre climático ou uma pandemia global – ou insira seu cenário de fim do mundo preferido aqui –, um profeta da desgraça na calçada assemelha-se mais a uma confirmação que a uma provocação. Uma parte considerável daqueles entre nós que trabalham no campo de imaginar o futuro com frequência debatem-se com o que podemos chamar de uma “ânsia escatológica” – uma dificuldade em ver nosso mundo de qualquer outra forma que não em um quadro apocalíptico. Não é porque nós o queiramos desta forma, mas porque outros enquadramentos figuram inadequados ou falsos. O perigo desta ânsia é
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que ela pode facilmente tornar-se um gatilho para a rendição, um turbilhão em direção ao desespero. Tal perigo não está limitado aos futuristas; para tantos ao redor do mundo, as coisas são muito estranhas, muito fora de controle, muito imensas e muito frágeis para sequer começar a imaginar respostas apropriadas. Não precisa ser desse modo. O quadro BANI oferece uma lente através da qual ver e estruturar o que está acontecendo no mundo. Ao menos em um nível superficial, os componentes do acrônimo podem até sugerir oportunidades de resposta: a fragilidade poderia ser enfrentada com resiliência e afrouxamento; a ansiedade pode ser aliviada pela empatia e atenção plena; não-linearidade necessitaria de contexto e flexibilidade; incompreensibilidade pede por transparência e intuição. Estas podem ser bem mais reações que soluções, mas sugerem a possibilidade de que respostas podem ser encontradas. Talvez seja suficiente que o BANI dê nome ao pavor corrosivo que tantos de nós sentimos bem agora, que reconhece que não
somos apenas nós, não é apenas este lugar, não apenas esta pontinha de tempo. BANI faz a declaração que aquilo que estamos vendo não é uma aberração temporária, é uma nova fase. Fomos da água para o vapor. Algo massivo e potencialmente esmagador está acontecendo. Tudo dos nossos sistemas, de redes globais de comércio e informação às conexões pessoais que temos com nossos amigos, famílias e colegas, tudo destes sistemas está mudando, terá de mudar. Fundamentalmente. Minuciosamente. Dolorosamente, às vezes. É algo que pode precisar de uma nova linguagem para ser descrito. É algo que irá definitivamente requerer um novo jeito de pensar a explorar.
REFERÊNCIAS Texto original: CASCIO, Jamais. Facing the Age of Chaos. Disponível em: https://medium.com/@ cascio/facing-the-age-of-chaos-b00687b1f51d. Acesso em 05 ago. 2021. Tradução e notas de Carlos R. Moiteiro. Pesquisador Associado (Distinguished Fellow) do Institute for the Future – Instituto para o Futuro (Palo Alto, Califórnia). Doutor honoris causa pela UAT – University of Advancing Technology (Tempe, Arizona). E-mail: jcascio@affiliates.iftf.org. As inserções de vocábulos originais entre colchetes, quando necessárias, foram feitas para esclarecer os conceitos utilizados pelo autor, o sentido original da expressão ou, ainda, quando seu uso na língua inglesa é corrente no vocabulário técnico da área em questão; já as inserções entre colchetes em língua portuguesa preenchem as elisões do texto original. Os grifos são do autor (NdT). O texto foi originalmente publicado em 29 de abril de 2020 (NdT).
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Jamais Cascio é antropólogo, historiador e futurista norte-americano, criador do termo BANI, acrônimo em inglês para Frágil, Ansioso, Não Linear e Incompreensível. Foi selecionado pela revista Foreign Policy como um dos 100 melhores pensadores globais da atualidade. É autor de Hacking the Earth, de 2009, e palestrante de eventos sobre os rumos políticos e econômicos do mundo.
Carlos Renato Moiteiro é doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), com aperfeiçoamento em Bioética Clínica y Social pela RedBioética UNESCO. Foi professor do Colégio Medianeira entre 2009 e 2010.
Indicações Hiperculturalidade: cultura e globalização | Editora Vozes O pensador sul-coreano analisa a complexidade da globalização e a perda da diversidade de signos, representações e figuras, que produzem discursos e comportamentos artificiais. Para o autor, a produção da unidade ou da monotonia do igual não é algo característico nem da natureza nem da cultura.
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DESIGUALDADE SOCIAL:
A atualidade nos OLHOS de quem VIVE na RUA. Por Amanda Camiloti Guerreiro, Ana Claudia Baldan Alves, Francisco Popik Pinheiro, Isabela Mendonça Krutzsch e Yasmim Egidio de Oliveira
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desigualdade social no mundo é uma triste realidade, especialmente no Brasil, um país tão rico, porém com uma distribuição de renda injusta. Por isso, é importante entender o papel que exercemos neste sistema. Para isso, é necessário compreender os fatores sociais que movem as engrenagens. Neste artigo você irá conhecer, por meio de pesquisas bibliográficas, pesquisa de campo e experimental, o que nos trouxe a essa situação, além de um aprofundamento em uma das mais tristes consequências: a vida em situação de rua.
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Neoliberalismo na América Latina O neoliberalismo é uma corrente de pensamento e de políticas econômicas, de acordo com o site Politize!. O maior conjunto de ideias neoliberais surgiu em 1989. Diversos economistas se reuniram para debater a dívida
da América Latina e produziram o Consenso de Washington, um conjunto de normas adotadas para combater as crises e as misérias de países subdesenvolvidos. Órgãos financeiros como o FMI e Banco Mundial passaram a exigir que os países que tomassem empréstimos implantassem reformas econômicas baseadas nessas normas. Entre essas medidas estavam o favorecimento da livre circulação dos capitais e mercadorias, abertura das economias nacionais e investimentos internacionais e a redução de gastos do Estado por meio da privatização de empresas ou diminuição de funcionários e serviços públicos. Segundo o livro Teláris História, de Claudio Vicentino e José Bruno Vicentino, apesar das medidas propostas pelo Consenso de Washington promoverem uma significativa redução na inflação, as desigualdades sociais não diminuíram. Ao fim dos anos 1990, havia por volta de 200 milhões de
pessoas em condição de pobreza na América Latina e, em 2002, o desemprego estava em 10,5%. Os processos eleitorais ocorridos entre 1990 e a década seguinte em diversos países latino-americanos resultaram na vitória de políticos voltados para a esquerda, que, apesar de não abandonarem por completo a política neoliberal, buscaram rever os programas de desenvolvimento e melhorar as condições socioeconômicas. A partição do Estado foi retomada com as políticas de redistribuição de renda e desenvolvimento da economia na América latina, assim gerando melhorias sociais. Todavia, a partir de 2010 diante da crise iniciada nos EUA em 2008, a retração econômica internacional ganhou força, afetando as políticas sociais latino-americanas. Após a redução da pobreza, ela voltou a crescer entre 2015 e 2017.
Desigualdade social na pandemia Durante a pandemia, medidas de distanciamento social foram estabelecidas no mundo inteiro visando a minimizar os impactos do vírus. Entretanto, o ato de ficar em casa no atual contexto pandêmico ganha diferente significados. A desigualdade social pode se manifestar de diversas maneiras. O atual contexto pandêmico causou inúmeras consequências, incluindo aumento da violência doméstica, perda de empregos, rotinas escolares alteradas e principalmente impactos econômicos. Segundo o IBGE, o número de
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desempregados em 2019 foi alto, mas, durante o primeiro trimestre de 2020, o número de pessoas desempregadas subiu para 14 milhões. Sem contar os pedidos de falência de empresas no Brasil, que teve um aumento de 12,7% em 2020, conforme informa a CNN Brasil. De acordo com a pesquisa de Schmidt, Januário e Rotoli (2018), o desemprego pode ainda afetar a saúde mental. Sentimentos como vergonha, incapacidade e dependência financeira são os principais causadores do sofrimento. Já ao falar da educação temos o ensino a distância adotado pelo sistema educacional brasileiro, que, em meio a discussões de utilidade e inutilidade, acabou deixando aqueles que vivem em situação de vulnerabilidade mais expostos e excluídos, considerando quem não possui acesso a recursos tecnológicos. Em um país com uma enorme desigualdade social, como o Brasil, é necessário especificar que essa casa, para as classes média e alta, se constitui numa edificação com diversos cômodos, que permite arranjos para o desenvolvimento de atividades individuais e coleti-
vas; já para as classes populares, a casa é, muitas vezes, um único cômodo, onde convivem muitas pessoas, de pequenos a idosos, o que torna praticamente impossível permanecer nesse espaço o dia todo, ou desenvolver qualquer tipo de atividade que exija o mínimo de concentração e dedicação, como são geralmente aquelas ligadas à experiência educacional. No entanto, com esse enorme contingente juvenil sem aula nas escolas, começam a surgir, aqui e em diversos países, soluções para que a educação continue, em casa, sob a responsabilidade dos grupos familiares. Portanto, as hashtags #fiqueemcasa e #aescolacontinua têm significados absolutamente diferentes para uma ou outra realidade, uma ou outra classe social” (PRETTO, BONILLA, SENA, 2020, p. 2-3). Em Curitiba, esse abismo entre as realidades pode ser notado na segregação espacial: os mais ricos situam-se próximos ao Centro, já os menos favorecidos ficam às margens da cidade. A capital é conhecida como um modelo de cidade, porém o relatório Fórum Urbano Mundial da ONU, de
2010, indica a capital do Paraná como o 17º lugar no ranking global de cidades mais desiguais.
Pesquisa de campo Em nossa pesquisa de campo, decidimos entrevistar uma assistente social, que preferiu não revelar seu nome. Para isso, elaboramos quatro perguntas sobre o tema: “Você sabe dizer qual é o principal fator que leva uma pessoa a se encontrar em situação de rua?” “Durante a pandemia, o número de moradores de rua aumentou? Se sim, quais são os principais motivos?” “Qual é a maior dificuldade de viver na rua?” “Você acredita que, nessa pandemia, tivemos mais pessoas doando e em busca de doações?” A assistente social acredita que, dentre todos os fatores que levam uma pessoa situação de rua, alguns dos mais notáveis sejam o uso de álcool e outras substâncias psicoativas. Segundo ela, durante a pandemia, houve um notável aumento no número
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de moradores de rua, o que se deve, além do uso de substâncias psicoativas, ao considerável crescimento do desemprego no Brasil e à depressão. De acordo com ela, a maior dificuldade da vida nas ruas é indiscutivelmente o maior risco de sofrer algum tipo de violência física. Por fim, a assistente social relatou que houve um notável aumento de doações em meio à pandemia.
Experiência/ intervenção: O objetivo com a atividade de campo foi fazer uma campanha de doação. Escolhemos a Associação Vale da Benção, que realiza uma janta toda semana para os moradores de rua locais (@associacaovaledabencao). Iniciamos, então, um processo de arrecadação de mantimentos para doação e, junto com os coordenadores do 8º e 9º Anos e a Pastoral do Colégio Medianeira, conseguimos arrecadar muitos suprimentos que ajudarão muitas pessoas. Em 8 de
novembro de 2021, fomos até a Associação e entregamos as doações. Conversamos também com a responsável pelo projeto, que expressou muita gratidão e nos explicou o quanto aquela ajuda faria a diferença. Além dessa ação com os indivíduos em situação de rua, o projeto ensina mulheres desempregadas a costurar para conseguirem sustentar a si próprias e às suas famílias. Eles fazem um importante trabalho social que impacta a vida de muita gente. Por fim, mesmo com imprevistos, como a dificuldade para conseguir entrevista com uma assistente social, conseguimos cumprir nosso objetivo e responder à problematização inicial. Fazer o presente trabalho foi extremamente gratificante. Acreditamos que foi de grande importância tanto para nós quanto para os leitores, considerando que a desigualdade tem tanto impacto em nossa sociedade. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br
Amanda Camiloti Guerreiro, Ana Claudia Baldan Alves, Francisco Popik Pinheiro, Isabela Mendonça Krutzsch e Yasmim Egidio de Oliveira são estudantes da 1ª Série do Ensino Médio do Colégio Medianeira. O artigo “A atualidade nos olhos de quem vive na rua” integra a Revista Eletrônica, projeto do 9º Ano produzido em 2021, com artigos científicos realizados após processo anual de letramento no campo das pesquisas acadêmicas e orientação da professora Lidiane Grutzmann.
Indicações Desafortunados: um estudo sobre o povo da rua | Editora Vozes Clássico dos estudos etnográficos, apresenta com profundidade a subcultura das ruas do Texas, destacando as rotinas diárias e suas variações, as estratégias e lutas pela sobrevivência material, social e psicológica. Baseia-se em pesquisas de campo e entrevistas com moradores de rua.
Cabeça de Porco | Objetiva Retratando a situação de diversas famílias brasileiras, Luiz Eduardo Soares, MV Bill e Celso Athayde, em 15 anos de análise, organizaram extenso material sobre comunidades de nove estados brasileiros, em que crianças e jovens vivem no mundo do crime, mostrando também suas razões e suas perspectivas de vida.
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As aquarelas desta edição representam o espaço físico do Colégio e são produções do artista, sempre-aluno e educador Marcelo Weber. As obras materializam a nossa preocupação com a inserção da Arte no currículo escolar e a livre expressão de ideias e sentimentos por meio do trabalho artístico.
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