Revista Mediação Número 33

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Diretor Geral P. Nereu Fank, S.J.

Diretor Acadêmico Profº. Dr. Fernando Guidini

Diretor Administrativo Henrique Weidlich

Jornalista responsável Priscila Murr (MTB 466248)

sumário

expediente

Revista de educação editada e produzida pelo Colégio Medianeira ISSN 1808-2564

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Da estrutura às práticas: a materialização de um projeto educativo

Por Fernando Guidini

JUSTIÇA e 10 RECONCILIAÇÃO Por P. José Ivo Follmann, S.J.

Coordenação editorial Fernando Guidini, Liliane Grein, Priscila Murr e Vinícius Soares Pinto

Revisão

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Daniele Beneli

Redação

Nossa Senhora Medianeira: legado de fé e superação

Por P. Dionysio Seibel, S.J.

Priscila Murr

Projeto gráfico Liliane Grein

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Ilustrações e imagens Acervo do Colégio Medianeira, Francisco Carlos Rehme, Marcelo Weber, Wagner Roger e Shutterstock imagens

Colaboraram nesta edição Ana Paula Correia, Ana Paula de Moraes de Siqueira, Anna Carolina Legroski, Dionysio Seibel S.J., Edeluci Fernandes Botelho, Eliane Barreto Maia Santos, Fernando Guidini, Francisco Carlos Rehme, Marcelo Weber, Maurini de Souza, Michele Maria Nasser Cavalheiro, P. José Ivo Follmann, S.J., Priscila Murr, Rafaela Batista dos Santos, Soraya Rodrigues Kulicheski, Wagner Roger

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Coordenações das Unidades de Ensino Educação Infantil e Ensino Fundamental I

O ser humano na perspectiva inaciana

Por Ana Paula de Moraes de Siqueira e Edeluci Fernandes Botelho Projeto João de Barro: uma formação socioambiental aliada à prática acadêmica

Por Eliane Barreto Maia Santos e Rafaela Batista dos Santos Da Educação Infantil para o Ensino Fundamental: como acontece esse processo de transição?

Por Ana Paula Correia

Profº Marcelo Pastre

Ensino Fundamental II e Ensino Médio

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Profª Eliane Dzierwa Zaionc

Centro de Inclusão

Novos horizontes para uma educação interdisciplinar

Por Soraya Rodrigues Kulicheski

Karolina Marianni Vargas

Centro de Formação Cristã e Espiritual P. Agnaldo Barbosa Duarte, S.J.

Centro de Arte e Esporte Vinícius Soares Pinto

A subjetividade da pesquisa e os novos horizontes para uma

educação interdisciplinar

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Midiaeducação

Projeto Lyrics: o estudante no centro do processo

Por Anna Carolina Legroski e Michele Maria Nasser Cavalheiro

Vinícius Soares Pinto

Tiragem 3500

Papel

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Capa: Papel 180g Miolo: Papel 90g

Número de páginas 56

Impressão

De plebeia a “Rainha do papel de bala”

Por Priscila Murr Fotos Wagner Roger

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Islândia - Eldfell: a montanha de fogo

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Cinema, jornalismo, fake news e o pacto civilizatório

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A liderança jesuítica: uma história de inovação

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Charge

Por Francisco Carlos Rehme

Gráfica Radial Tel: 3333-9593

Os artigos publicados são de inteira responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião dos editores e do Colégio Nossa Senhora Medianeira. A reprodução parcial ou total dos textos é permitida desde que devidamente citadas fonte e autoria.

Linha Verde - Av. José Richa, nº 10546 Prado Velho - Curitiba/PR fone 41 3218 8000 Fax 41 3218 8040 www.colegiomedianeira.g12.br mediacao@colegiomedianeira.g12.br

Por Maurini de Souza

Por Priscila Murr

Por Marcelo Weber mediação

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editorial Porque outro mundo é possível, os ca-

papel. Além da composição teórica de pro-

estudantes atuam de forma sinérgica, numa

minhos à Justiça e à Reconciliação se vislum-

jetos os quais de fato tenham potencial para

troca constante que articula as dimensões

bram. As mais simples atitudes do dia a dia

“mudar o mundo”, atentamo-nos a isto: a

cognitiva, socioemocional e espiritual-

fazem toda diferença. E é isso que almejam

qualidade de ser factível. Afinal, o mundo

-religiosa. O foco no desenvolvimento in-

os seres humanos. A vitalidade em prol de

das ideias é perfeito tão somente mediante

telectual, moral e espiritual não suprime a

ações com reflexos positivos na sociedade

a experiência.

valoração da pesquisa, pelo contrário, ela é

transpõe barreiras, logrando êxito. Os resultados são práticos: teoria não aplicada reflete nulidade lógica.

É por isso que, na 33ª edição da nossa Revista Mediação, delineamos um caminho entre teorias e práticas, elencando as

de ações, a teoria materializa os conhecimentos, pondo em prática as vivências mais

potencialidades empíricas do saber-fazer

fundamental o trabalho partindo daquilo

humano. Da origem de Nossa Senhora Me-

que seja de fato possível. Uma educação

dianeira à estruturação do projeto educa-

O encadeamento das ideias traz, além

integral deve explorar esse princípio básico,

tivo que compete à instituição que recebe

de tudo, um relato de viagem que impulsio-

segundo todas as potencialidades do sujei-

nomenclatura homônima, perpassando

na o conhecer de uma cultura outra e, per-

to: o desenvolvimento pleno, centrado na

o relato do surgimento da Companhia de

filando uma importante artista paranaense,

formação da pessoa toda e para toda a vida.

Jesus, estas páginas são permeadas pela

solidificamos o valor da cultura popular in-

Sob tal perspectiva, e figurando como mote

dedicação na construção de uma história

corporada às vivências cotidianas.

de uma proposta de vida, a realização da

de excelência. A temática, para esse ano

aprendizagem leva os indivíduos a partici-

de 2020, abrange os conceitos de Justiça

parem e intervirem na sociedade, formando

e Reconciliação, demonstrando a simplici-

homens e mulheres conscientes, compe-

dade como um caminho mais que possível:

tentes, compassivos e comprometidos.

imprescindível.

Toda e qualquer explanação carece de

Frisando que cada pessoa é sujeito nos

valor mediante ideias que fiquem apenas no

processos de aprendizagem, educadores e

comunicacao@colegiomedianeira.g12.br Essa e outras edições podem ser lidas na íntegra no nosso site:

www.colegiomedianeira.g12.br

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Como base resultante do desenvolvimento

Mais do que pensar em caminhos, é

Envie sugestões e comentários para:

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o produto na dinâmica das aprendizagens.

singulares estimuladas em sala de aula.

Finalmente, o todo da composição elenca muito mais do que a pesquisa científica ou a correspondência entre um ideal e um real, mas um outro mundo possível aos nossos olhos. Excelente leitura!


DA ESTRUTURA ÀS PRÁTICAS: a materialização de um projeto educativo A proposta pedagógica e os atuais desafios da educação nos Colégios Jesuítas Por Fernando Guidini mediação

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A proposta pedagógica dos Colégios Jesuítas é aquela que objetiva formar a pessoa em sua integralidade. Ao olhar sobre a totalidade do humano, a tradição e a atualidade do modo de pensar e fazer educação, inspiradas na Pedagogia Inaciana, formam pessoas conscientes, competentes, criativas, compassivas e comprometidas, mediatizadas pelas dimensões cognitiva, socioemocional e espiritual-religiosa. A Rede Jesuíta de Educação, em suas 17 unidades presentes no território nacional, vivencia essa proposta com base em um currículo compreendido como evangelizador, no qual o conhecimento historicamente acumulado, bem como as vivências diárias, revertem-se em aprendizagens, as quais se materializam em vidas vividas para e com os demais. Nesse contexto, o Projeto Educativo Comum impõe o desafio da formação para a excelência. A concretização desse projeto no Colégio Medianeira obedece à tríade sujeitos, tempos e espaços do aprender. Sem descuidar de todos os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, a excelência da formação procura dialogar com

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as situações de contexto experienciadas por todos os sujeitos. Traz para o campo curricular a reflexão crítica, situada e criteriosa sobre os componentes; vincula a ação em uma perspectiva de compromisso para com a transformação individual e coletiva, e remete a uma criteriosa avaliação sobre o que temos proposto como aprendizagens sintetizantes e integradoras em nossas séries e componentes. Somos conscientes de que trabalhamos com vidas, território sagrado e de inúmeras possibilidades pedagógicas. A utopia que nos move, bem como os valores que fundamentam a prática de todos os educadores, congregam ideais individuais e coletivas, sempre em vista do Magis, pois os conhecimentos e aprendizagens integrais aqui sistematizados, por mais incipientes que possam ser, vinculam-se à vida de nossas crianças, adolescentes e jovens. Em um contexto de mudança epocal cada vez mais intenso e dinâmico, por que e como pensar em projetos formativos? Qual o significado de um projeto pedagógico que forma integralmente? Onde nos apoiar e que perguntas realizar, a fim de termos segurança didática no que fazemos? Em que a tradição e atualidade da proposta pedagógica da Companhia de Jesus pode nos auxiliar a olhar para o futuro, conscientes de que o que estamos propondo possui significado para as vidas que temos em nossas mãos?

O Colégio Medianeira considera que algumas das respostas para essas questões são fundamentadas em categorias estruturantes da nossa proposta pedagógica. Vamos aos diálogos:

A pessoa humana: Se o currículo é evangelizador, a pessoa de Jesus Cristo se configura como fundamento da antropologia pedagógica que nos une. Mais do que uma soma de partes, a integralidade da proposta do Colégio é fundamentada sobre a totalidade do humano, em uma diversidade de dimensões. Tematizar o humano e pautar aprendizagens pertinentes e atuais nas dimensões cognitiva, socioemocional e espiritual-religiosa, alinhadas ao que há de mais atual em termos de proposta curricular, torna-se necessidade premente. Tais aprendizagens se configuram como eixo norteador do formar/aprender integral desse mesmo ser humano, compreendidas como horizonte formativo para com todos os nossos estudantes.

O conhecimento: Novamente, mais do que uma junção de teorias e/ou conteúdos, precisamos discernir, analisar e sintetizar conhecimentos. Mais do que descrever ou explicar teoricamente, nossos estudantes são conduzidos à dimensão reflexiva. Para que esse conhecimento se transforme em aprendizagem, o mesmo precisa ser sistematizado em diferentes níveis de abstração,


dem que as ciências não se esvaem em si, mas se conectam em uma grande rede de sentidos. As metodologias resultantes são tanto reflexivas quanto ativas, transformando o Colégio em um grande ambiente de aprendizagem. Mais do que uma disciplina passiva e mecânica, educamos na autonomia responsável, mediada pelo aprender junto aos demais.

A sociocosmologia: desde a forma mais elementar àquela mais estruturada ao final da escolarização básica. Nossos estudantes, ao vincularem os conhecimentos produzidos às práticas de vida, aprendem a pensar, a ser, a fazer e a conviver. Tornam-se críticos, e autores da sua própria história.

Os passos do método: Se a sociedade atual e futura questiona sobre o lugar do humano, bem como sobre a pertinência do conhecimento, precisamos estar atentos ao método que fundamenta nossa ação. A proposta pedagógica da Companhia de Jesus, e aquela materializada no projeto pedagógico do Medianeira, compreende o método como caminho, como trilhar constante e questionador sobre a realidade. Atentos ao pressuposto da educabilidade humana, mais do que respostas prontas, preocupamo-nos com as boas perguntas. Ao questionarem e perguntarem sobre o todo, estudantes e professores sistematizam aprendizagens com fundamentos, sentidos e conexões. Compreen-

Em nosso marco situacional, o contexto é currículo. Consideramos a necessidade de educar para uma visão sobre o todo, de um pertencimento integrado e cuidadoso de uns para com os outros, com o espaço, com a cidade e com a nossa casa comum: formar seres humanos capazes de dialogar com a realidade circundante, preocupando-se e agindo localmente em um mundo consumista e de extrema descartabilidade. Além disso, olhar criticamente para o futuro da nossa gente, para “Curitiba 2035”, auxiliando nossos estudantes para que, por meio do conhecimento, sejam criativos e conscientes de seu papel social. Como dizia um dos Superiores Gerais da Companhia de Jesus, o sentido e a pertinência de um Colégio Jesuíta em uma determinada localidade está em seu diferencial: ao ser igual aos demais, perde o sentido de existir. Como Medianeira, consideramos que essa singularidade acontece no cotidiano curricular e pelo quanto formamos e transformamos localmente nesses tantos anos de história.

A ética: Dos fundamentos às relações, a ciência da conduta que nos congrega tematiza pertencimentos, cuidados e atenção a cada um em sua individualidade. Nossa ética pedagógica traz a sacralidade da vida em sua diversidade de expressões, no respeito ao existir. Em contextos e relações cada vez mais digitais, de escanteamento do humano, de fake news e facilidades comunicacionais, garantir a centralidade de um agir ético pautado sobre a verdade, a justiça e a bondade é o princípio para a ação em nossa comunidade educativa. São demandas de extrema atualidade. A excelência almejada é uma só, desdobrada em duas dimensões – acadêmica e humana, perpassada pela coerência da ação. As perguntas iniciais questionavam sobre sentidos e pertinências de projetos formativos, seguranças, tradição e atualidade pedagógicas. As cinco categorias elencadas (an-

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tropologia, epistemologia, metodologia, sociocosmologia e ética) são por nós compreendidas como alguns dos referenciais paradigmáticos mediante os quais a proposta pedagógica da Companhia de Jesus fundamenta o seu currículo. Ao olhar para o futuro, e atentos ao movimento da cultura/ contexto, a partir do espaço no qual nos situamos, tais categorias devem promover: (i) um projeto educativo com uma sólida visão antropológica, para além dos antropocentrismos reinantes, capaz de conjugar a vida em sua existência. Nossas crianças, adolescentes e jovens viverão em um mundo cada vez mais digital, com facilidades, possibilidades, incompletudes e marginalizações. A pergunta “o que é vida na atualidade?” deverá ser problematizada em nossos currículos, a fim de que horizontes compreensivos mais amplos sejam tematizados em uma perspectiva existencial integradora na relação

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vida-meio. (ii) Aprendizagens com sentido, em diálogo com a Base Nacional Comum Curricular, com abertura aos saberes e conhecimentos da realidade local. Mais do que saber o “o quê”, nossos estudantes precisam dominar o “porquê” das coisas, para que, seguros, possam refletir e tomar posição sobre o que estiver em jogo. (iii) O autoposicionamento com iniciativa própria sobre as situações diárias, de forma criativa e por via da comunicação com a devida assertividade. (iv) Uma postura integradora, justa e acolhedora sobre o mundo e sua realidade, agindo localmente e pensando globalmente. Formar redes, e redes de redes solidárias. Aqui, terreno fértil para um conhecimento vinculado ao mundo da vida, de modo que nossos estudantes, e futuros profissionais, impactem vidas e realidades. (v) Por fim, as relações, o sentimento de história, de pertencimento, de reconhecimento do

outro como extensão do eu. Mais do que defender posse ou porte de armas, precisaremos ensinar nossos pequenos a defender vidas, pois uma e única é a nossa regra de ouro. Nomear alguns dos fundamentos pedagógicos que nos identificam, bem como algumas das aprendizagens decorrentes, foi o exercício aqui proposto. Atrevo-me a sintetizar tais ideias na perspectiva da formação de um cidadão global: que as cinco categorias elencadas nos provoquem a considerar a formação dos nossos estudantes naquilo que se configura como desafio para um futuro não distante – a educação de pessoas integradas, atentas a si mesmas e ao meio, e com um senso de responsabilidade para com a perpetuação da vida de todos nós. Nossa cidade e nosso país precisam de seres humanos líderes e sensíveis a tais causas. O projeto pedagógico


auxiliam a preferenciar os horizontes possíveis dessa ação, a qual é experienciada desde o mais singelo projeto da Educação Infantil, até a excelência conquistada nos vestibulares em nosso Ensino Médio.

do Colégio Medianeira dialoga com as defesas aqui expostas, e a preocupação com a espiritualidade que nos congrega, o cuidado com os mais pobres e vulneráveis, a atenção às juventudes, bem como o olhar sobre a casa comum nos

Se a verdade é um todo, como nos dizia Hegel, a educação não pode se furtar a essa tarefa. Atualmente, vemos em nosso país fabricantes de cervejas, de doces e automóveis também fazendo educação. Será esse o caminho para a educabilidade presente-futura? Estão eles certos? Em que nos diferenciamos? A proposta pedagógica da Companhia de Jesus e o projeto pedagógico do Medianeira nos conduzem ao exercício dessa busca, conscientes de que juntos – e compartilhando aprendizagens integrais – chegaremos mais longe, no direito universal a uma educação de qualidade. Pelo exercício re-

flexivo das práticas coletivas, esta edição da Revista Mediação procura mostrar alguns dos caminhos que temos trilhado: das estruturas às práticas, a materialização de um projeto educativo. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

Fernando Guidini é graduado em Filosofia pelo Centro de Estudos Superiores da Companhia de Jesus (2002). É Mestre (2010) e Doutor (2015) em Educação, pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Cursou as especializações em Formação de Assessores de Comunidades de Vida Cristã, pelo Instituto Teológico de Santa Catarina (2004) e em Comunicação e Semiótica: Teoria e Crítica da Sociedade da Informação, pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2007). Atualmente, é membro de Equipe Pedagógica no Colégio Medianeira, atuando como Diretor Acadêmico.

Indicações La pedagogia Ignaciana | José Alberto Mesa Uma obra essencial para conhecer as origens, o desenvolvimento e o atual cenário da educação da Companhia de Jesus, apresentando textos que remontam a história de desafios e oportunidades do apostolado educacional, desde sua fundação até os dias de hoje.

The future of the professions | Daniel e Richard Susskind Este livro prediz o declínio das profissões atualmente existentes, descrevendo o tipo de pessoas e os sistemas que as substituirão. No atual contexto de (r)evolução da Internet, médicos, professores, clérigos, consultores e muitos outros profissionais terão suas funções transformadas. Como nos compreendermos diante desse contexto?

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JUSTIÇA e

RECONCILIAÇÃO

Conceber a gestão com bases na justiça, cultivando a dignidade humana, é o caminho mais correto à reconciliação mundial Por P. José Ivo Follmann, S.J.

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á algum tempo, em uma das redes sociais na qual costumo me comunicar, alguém postou a mensagem de uma senhora trabalhadora vinculada a uma cooperativa de reciclagem de lixo. Na mensagem, ela fazia um apelo veemente, acompanhado de uma recomendação muito justa: uma verdadeira lição de justiça socioambiental para nós! Depois de se apresentar, ela (aquela trabalhadora) pedia para que fôssemos mais atentos em facilitar a coleta seletiva dos lixos. As palavras dela foram um misto de agradecimento pela separação da “matéria prima” do trabalho de quem faz disso a sua profissão, e de estímulo para ampliarmos a nossa contribuição no combate à contaminação, à poluição e ao estrago que vem castigando e destruindo a nossa mãe terra. As palavras dela foram, também, um lembrete delicado para ajudarmos a melhorar as condições de trabalho das pessoas envolvidas nessas frentes. Na fala suave e decidida daquela mulher — uma senhora negra cujo olhar sofrido não escondia um forte brilho repleto de sabedoria e liderança — suas palavras foram finalizadas com uma recomendação muito oportuna, repleta de profundo senso de humanidade. Ela dizia: “Quando separam as caixinhas de leite vazias e garrafas vazias de iogurtes ou coisas parecidas, procurem, por favor, passar uma água, deixando, depois, os frascos abertos no lixo. Isto ajuda muito para nossos na-

rizes. Isto torna o nosso trabalho menos insalubre. Vocês não imaginam os cheiros que às vezes temos que suportar em nosso trabalho. É um pedido! Não custa!” Confesso que aquela fala ressoa em mim até hoje. Aprendi e agradeço! Sempre que vou descartar algum frasco de leite, garrafas de iogurtes ou embalagens parecidas, me lembro de quem estará lá na outra ponta recolhendo aquela matéria-prima para o seu trabalho. Em minha função de Secretário para a Justiça Socioambiental da Província dos Jesuítas do Brasil, tenho viajado bastante e frequentado muitos aeroportos. Um dia, no espaço de um banheiro de aeroporto, a atitude de um senhor de idade —“senhor da bengala” — me chamou a atenção. Ele era bastante idoso. As suas limitações físicas eram visíveis. Apesar de trêmulo, ele manejava com destreza a bengala, na qual se apoiava. Chamou-me a atenção que ele, no meio da correria e do tumulto dos que entravam e saíam, naquele recinto, serviu-se da bengala para juntar os pedaços de papel no chão; pedaços de papel que outros, na pressa e no desleixo, descuidadamente, haviam largado ao redor da lixeira. Na sequência, com cuidado e certa dificuldade, ele se inclinou diversas vezes, para com uma das mãos — a que estava livre da bengala — colocar os papéis no recipiente do lixo, sem se perturbar com os transeuntes. Observei com atenção os movimentos daquele senhor da bengala. Terminada a sua ação,

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que parecia um evidente hábito rotineiro, ele encostou a bengala, pegou o papel, lavou tranquilamente as suas mãos, as enxugou e colocou o papel, cuidadosamente, na lixeira. Depois, armando-se de novo com a bengala, caminhou para a porta, tranquilo, sem se fazer notar. “Que exemplo de delicadeza humana”, pensei comigo. “Preocupar-se em deixar o ambiente limpo para os outros...”. “Quem não se sente bem, quando encontra um ambiente desses, limpo e asseado, sem o horror do desleixo e dos papéis espalhados pelo chão?” Tornei-me um fiel seguidor desse “senhor da bengala”, anônimo, discreto, fisicamente frágil, mas tremendamente robusto em humanidade. Se queremos falar em justiça e reconciliação, precisamos começar pelas pequenas coisas do dia a dia. O cuidado da “nossa casa comum”, é, em primeiro lugar, o cuidado de quem frequenta ou trabalha nessa “casa”. Saber importar-se com as outras pessoas, com o seu bem-estar. Hoje, sempre que entro em algum banheiro bem cuidado e limpo, sem papéis espalhados no chão, lembro-me do “senhor da bengala”. Também me dou conta que existem gestores/as que têm sensibilidade e se preocupam para que as pessoas que usam os ambientes que estão sob sua responsabilidade não se sintam agredidas em sua dignidade. Es-

calam para tal zeladorias permanentes e atentas. A boa gestão pede este cuidado. Fazer gestão com justiça é cuidar da dignidade humana. Praticamos a justiça, como gestores e gestoras, quando as tomadas de decisão, em todas as instâncias de nossos empreendimentos, estão revestidas de sensibilidade e humanidade. Trata-se da atenção permanente de garantir que as pessoas se sintam bem e respeitadas em sua dignidade. Nada melhor para o ser humano do que poder frequentar ambientes limpos e acolhedores. Isso ajuda a cultivar a própria dignidade. Falando em “ambientes limpos e acolhedores”, fico escandalizado, com a mente e o coração perturbados, sempre quando me deparo com cenas em que os nossos irmãos e irmãs estão jogados nas calçadas das ruas ou “residindo” em ambientes sórdidos, amontoados em barracos, rodeados de esgoto e lixo, imundos, como se eles fossem o próprio lixo da humanidade. São vidas humanas desfiguradas, no meio da imundície, que clamam por justiça! Elas clamam para que não sejamos insensíveis e não consideremos estas cenas como normal e como algo que não tem solução. Elas clamam para que não repitamos o mantra horrível: “Infelizmente é assim mesmo; não dá para fazer nada”, como se isso fosse uma espécie de destino fatal dos “deserdados da sorte” ou “descartados do mundo”. O número desses “deserdados” e “descartados” vêm se multiplicando nos últimos anos.

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É um escândalo! É uma interrogação inquieta com relação aos nossos sistemas econômicos, políticos e sociais. Como reverter essa calamidade? Como calar a ignorância cínica, que pensa, diz e age como se isto devesse ser assim mesmo? Como calar essa ignorância cínica que habita, também, dentro de nós? Muitas vezes, a perversidade nos leva ao extremo de jogar a culpa de tudo nas próprias vítimas. Pobre humanidade! A que extremo estamos reduzidos? “Sempre foi assim...” Há um caminho possível para além destes cinismos acomodados e inoperantes. Levar a sério a dignidade humana deve interpelar, de forma permanente, a todos/as nós, e, sobretudo, as pessoas responsáveis pela tomada de decisão com relação aos destinos dos recursos e dos bens dos quais a humanidade dispõe. Só os exemplos aqui relatados já deveriam ser suficientemente mobilizadores para nos fazer acordar e chamar à responsabilidade. Para nós que somos cristãos ou para quem, seguindo o cristianismo ou não, atua em uma organização dirigida pela Companhia de Jesus, tudo isso fala com redobrado vigor porque somos orientados a nos colocarmos na perspectiva da reconciliação como caminho da justiça. Para a Companhia de Jesus e para quem orienta a sua vida religiosa pelo cristianismo, Jesus Cristo é o caminho da reconciliação de tudo, ou seja, da reconciliação consigo mesmo/a, com as outras pessoas em sociedade, com os dons da criação e com Deus. Por um


caminho ou outro, somos convidados/as a assumir a participação na ação de reconciliação em todos os níveis. Esse é um caminho de construção da justiça. No Estatuto da Província dos Jesuítas do Brasil, recentemente aprovado, consta que uma das competências do Secretário para a Justiça Socioambiental é a de “promover a consciência da justiça socioambiental na Província em coerência com o paradigma da Ecologia Integral e da Teologia da Reconciliação” (Estatuto da Província, Art. 27, & 7-a). O paradigma da Ecologia Integral, introduzido pelo Papa Francisco em sua Carta Encíclica

Laudato Sí (2015), baseando-se no princípio da relacionalidade de tudo em nossa “casa comum”, é uma chave que ajuda a pensar a promoção da justiça, como um processo de reconciliação, em todas as dimensões. “Tudo está interligado, nesta casa comum”, diz uma das canções que acompanha o movimento do Sínodo para a Amazônia, realizado de outubro de 2017 a outubro de 2019. É o que chamamos de justiça socioambiental, amparada na Ecologia Integral e na Reconciliação. Trata do trabalho pela justiça, no qual as injustiças sociais e ambientais aparecem profundamente interligadas. Não temos como fazer justiça social sem justiça ambiental, e não temos como fazer justiça ambiental sem justiça social.

lixo e gestores e gestoras que, em suas decisões, colocam a atenção primeira na dignidade humana e no ambiente digno de vida, são profetas da justiça socioambiental: profetas da justiça e da reconciliação de todas as pessoas e de todas as coisas. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

P. José Ivo Follmann, S.J. exerce sua função sacerdotal na Igreja Católica há 44 anos. É doutor em Sociologia pela Universite Catholique de Louvain (UCL), ocupou o cargo de vice-reitor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos por 10 anos e, atualmente, é Diretor do Observatório Luciano Mendes de Almeida (OLMA) e Secretário para a Justiça Socioambiental da Província dos Jesuítas do Brasil.

No meio da perversidade humana e estrutural que nos assola, o “senhor da bengala”, a senhora da cooperativa de reciclagem de

Indicações O paraíso são os outros | Valter Hugo Mãe Neste livro, Valter Hugo Mãe investiga e desmente o pensamento de Sartre, que assume que “o inferno são os outros”. A obra mostra que tanto o amor quanto o paraíso podem ser reais – e que podem ser alcançados através das relações humanas.

A Companhia de Jesus e o direito universal a uma educação de qualidade | CPAL Elaborado pelas três redes de ensino da Conferência dos Provinciais da América Latina e do Caribe (CPAL): FLACSI, Fé e Alegria e AUSJAL, este livro responde ao desafio de pensar e agir na promoção e atualização do Direito Universal à Educação de Qualidade (DUEQ).

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NOSSA SENHORA

MEDIANEIRA:

legado de fé e superação

Uma história de devoção, permeada pelo sentimento comum de prolongamento da fé, dá bases à fundação do Colégio Nossa Por P. Dionysio Seibel S.J. Senhora Medianeira

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o início do século XX, a Igreja Católica foi marcada por uma profunda piedade Mariana. O primeiro lugar onde se manifestou a devoção a Nossa Senhora foi a cidade de Lourdes, na França. Esse era um lugar popular de peregrinação. Os peregrinos buscavam proteção para sua própria vida e celebravam a proclamação oficial do dogma da Imaculada Conceição. Ao mesmo tempo, um novo centro de devoção estava sendo formado em Portugal, na localidade de Fátima. Em 1921, o cardeal Mercier, da Bélgica, pediu à Universidade de Lovaina um estudo que tomasse em consideração a devoção popular, que depositava sua confiança na intercessão materna da Mãe de Deus, e projetasse sobre tal devoção os fundamentos teológicos. O encontro da piedade mariana popular e sua confrontação teológica deu origem ao títu-

lo de Nossa Senhora Medianeira de Todas as Graças. A partir de 1929, esse movimento chegou a Santa Maria, no Rio Grande do Sul, por meio da devoção de um jovem jesuíta, Inácio Valle, que dedicou grande parte de seu tempo na divulgação de um novo título que canalizasse a piedade popular. A cidade vivia dias de pânico, a revolução de 1930 ceifou vidas em Santa Maria. O centro ferroviário principal do Rio Grande do Sul era o lugar de embarque das tropas revolucionárias, dispostas a lutar pela tomada de posse de Getúlio Vargas como presidente da República: o povo, com medo, buscava sua proteção na fé e o momento social favoreceu a propagação da devoção. O culto prestado a Maria florescia em todo país: Aparecida, em São Paulo; O Círio de Nazaré, em Belém; Os jesuítas, no Sul do Brasil, que se tornaram apóstolos marianos e dedicaram a Provín-

cia a Nossa Senhora Medianeira. Os jesuítas chegaram a Curitiba no dia 23 de março de 1951, assumindo atividades na Igreja do Rosário, que se tornou centro difusor da espiritualidade inaciana pelas Congregações Marianas, com pregação e anúncio da fé em escolas e na sociedade. O horizonte de desejo era a fundação de um Colégio. O P. Valério Alberton, com um dinamismo incansável, começou a construção do Colégio, num terreno cedido pela Prefeitura. Em momento algum houve dúvidas acerca do nome da futura instituição. A cidade de Curitiba, por meio de promoções e campanhas ajudou a construir o Colégio Nossa Senhora Medianeira. Em 1958, um acidente aéreo vitimou o P. Oswaldo Casado Gomes, que, em sua bagagem, levava a imagem de N. Sra. Medianeira, conservada até hoje, mas retorcida pelo impacto da queda do avião.

Imagem de Nossa Senhora Medianeira, conservada na Igreja de Nossa Senhora do Rosário de São Benedito, em Curitiba. mediação

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A devoção mariana da década de 1920, propagada e vivida no Brasil sob diversos títulos, entrou em declínio em meados do século XX, mas a invocação a N. Sra. Medianeira permaneceu e abriu novos horizontes, marcados por uma manifestação discreta, devido às suas bases populares e teológicas. O grande mediador entre Deus e a humanidade é Jesus Cristo. Maria, entretanto, conserva sua missão de nos levar ao encontro de Cristo, pois ela é cheia de graça e dedicada à vontade de Deus. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

P. Dionysio Seibel , S.J. é jesuíta formado em Filosofia e atuou como Professor, Orientador Religioso, Diretor Acadêmico e Vice-diretor nos Colégios da Rede e, além disso, já foi Secretário da Língua Portuguesa na casa Cúria Geral da Companhia de Jesus. Estátua original de Nossa Senhora Medianeira, retorcida pelo impacto de uma queda de avião, em 1958, e conservada até hoje no Colégio Nossa Senhora Medianeira.

Indicações Nossa Senhora Medianeira de Todas as Graças | P. Carlos Zanatta Medianeira significa “Mediadora, aquela que faz a mediação, que está no meio, entre Deus e os homens”. E é disso que fala o livro Nossa Senhora Medianeira de Todas as Graças. A obra narra a criação do ícone de Nossa Senhora Medianeira, contando sua história da devoção, que vem desde os primórdios do cristianismo.

Glórias de Maria | S. Afonso de Ligório A obra escrita por Santo Afonso de Ligório traz reflexões acerca das principais festas marianas e trata também de práticas devocionais. É um documento riquíssimo para aqueles que desejam se aprofundar no conhecimento sobre a Virgem Maria e crescerem na intimidade com Ela.

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O SER humano na perspectiva INACIANA Por Ana Paula de Moraes de Siqueira e Edeluci Fernandes Botelho

Colocando o Ser Humano no centro das discussões, a pedagogia inaciana preza pela experiência identitária a partir do legado de Santo Inácio

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A

o falarmos em concepções que caracterizem a “Pessoa Humana”, nos deparamos com várias linhas de pensamento que, à sua maneira, buscam explicar as razões de nossa existência. O que nos faz quem somos? Qual é o verdadeiro sentido de vida? E essas são apenas algumas das inquietações que circundam nosso universo.

der os conteúdos curriculares,

A pedagogia inaciana se preocupa em, antes de mais nada, compreender quem é essa Pessoa Humana. Deus nos fez à sua imagem e semelhança, estando presente em tudo e em todos. Nesse sentido, estamos em constante preparação para a vida. Segundo a pedagogia inaciana, a pessoa está sempre em aprendizagem, pois, mais do que saber sobre os conhecimentos historicamente acumulados, é a consciência da potencialidade de aprender a aprender.

ser o caminho possível para a re-

Considerando a lógica educacional adotada pela Companhia de Jesus, compreendemos que a formação da pessoa, e de todas as pessoas, deve considerar o desenvolvimento de todas as potencialidades criativas, em uma constante preparação para a vida. Vida esta que se fortalece na compreensão e cuidado com o outro, no reconhecimento do papel indispensável de cada pessoa em sua comunidade. A concepção Jesuítica compreende que, mais do que apren-

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devemos construir o pensamento de se aprender a aprender, sendo isto uma constante na vida de cada pessoa. Essa reflexão permite ao sujeito dialogar com a complexidade dos conhecimentos aprendidos com a realidade do mundo e no trabalho com a justiça social. Mendonça (2006, p. 24) aponta que “[...] o diálogo passa a alização da pronúncia verdadeira que vai contribuir para que os seres humanos adquiram sua autenticidade e possam realizar a sua vocação ontológica”. Considera-se que o processo de formação dos estudantes deve fortalecer-se na compreensão da dimensão humana, na busca pela excelência humana e acadêmica. A pedagogia inaciana está assentada no desenvolvimento da Formação Integral, por compreender que a pessoa é única e parte fundamental na obra de Deus, em busca da reconciliação divina. Portanto, tem a preocupação com o desenvolvimento de pessoas reflexivas, que promovam o espírito crítico e criativo no exercício da fé em Deus, com esperança de um mundo melhor e mais justo, no qual todos se compadeçam com a vida do próximo. Segundo Martin (2012, p. 07), “o caminho de Inácio nos leva ao encontro da liberdade: a liberdade de nos tornarmos a pessoa que


somos destinados a ser. Ele nos

rências ao conjunto de representa-

os pobres. Todos esses aspectos

ensina a amar, a aceitar o amor e

ções mentais que toda pessoa tem

são relevantes para todas as espi-

nos torna capazes de tomar boas

de si mesma e as quais levam a um

ritualidades cristãs, porém a dife-

decisões, desfrutar da beleza da

autoconhecimento). Tendo em vis-

rença está na atenção dedicada a

criação e participar do mistério do

ta o que os autores apresentam, a

eles por cada “escola espiritual”

amor de Deus”. Sua caminhada

identidade pessoal se ressignifica

(MARTIN, s/a, p. 08).

traz um significado muito impor-

pelo autoconhecimento a partir

tante para a compreensão e inter-

das representações que construí-

pretação de seus ensinamentos.

mos no ambiente, fruto de nossas

O caminho percorrido por Santo Inácio foi repleto de traje-

experiências, vivências culturais, sociais, políticas e econômicas.

Pensando nisso, Santo Inácio, deixa um legado sobre como se aproximar de Deus. Uma verdadeira identidade inaciana pressupõe refazermos a experiência de

tórias, vivências e reflexões, assim

Ao buscarmos uma espé-

Deus e assumirmos a responsabili-

como a nossa existência. São as

cie de transcendência, por meio

dade perante os necessitados. Em

nossas experiências que contri-

dos ensinamentos de Santo Iná-

outras palavras, “ser mais para os

buem para sermos quem/ o que

cio, podemos dizer que busca-

demais”: o Magis inaciano.

somos. Nossa identidade se cons-

mos uma relação profunda com

titui daquilo que somos e projeta-

a identidade inaciana. Mas não

mos ser. Inácio se fez seguidor da-

simplesmente no sentido de uma

quilo que sentia sobre Deus, sua

apropriação sem reflexão, pois a

releitura das obras e da vida de

identidade pessoal se fortalece no

Deus o tornaram um semeador e

autoconhecimento de que estar

libertador. Assim, tudo aquilo que

em Deus é o caminho a seguir.

é de vertente material é colocado

Em resumo, é preciso aprender a Ser Humano. A humanidade, muitas vezes é deixada em segundo plano. A educação jesuíta destaca a necessidade de se formar pessoas competentes, comprometidas,

compassivas,

Martin (s/a, p. 08) sublinha

conscientes, que saibam agir re-

que “a espiritualidade é um modo

flexivamente na sociedade, contri-

A natureza de Inácio foi e é

de viver em relacionamento com

buindo para um mundo mais justo

tão sublime que ele não se sa-

Deus”. Segundo ele, essa é princi-

e igualitário, um mundo mais pró-

tisfez em tê-la somente consigo,

pal característica que fundamenta

ximo de Deus (PEC, 2016).

seus ensinamentos, e a constru-

a identidade inaciana. Afinal, na

ção dos exercícios espirituais, são

tradição cristã, todas as espiritu-

elementos base que constituem o

alidades, independentemente de

que é verdadeiramente Santo Iná-

sua origem, têm o mesmo foco:

cio. Segundo Oscar E. Buroz Eche-

o desejo de união mística com

nagucia S.J (s/a, p. 01) “en sentido

Deus, a ênfase no amor e na cari-

em segundo plano.

general, el término «identidad» hace referencia al conjunto de re-

dade e a fé em Jesus como o Filho de Deus enviado a este mundo”.

A

espiritualidade

inaciana

é uma maneira de ver o mundo com mais amor ao próximo. É uma maneira de aprender a viver, exercitando os valores e atitudes que constituem o Humanismo Cristão. Ajuda-nos a compreender os obstáculos que impedem

presentaciones mentales que toda

Nesse sentido, “[...] a espiritu-

de viver plenamente em favor da

persona tiene de sí misma y en las

alidade inaciana dá mais impor-

obra de Deus e partilhar com o

que se lleva a cabo un auto-reco-

tância à alegria, à liberdade, à

próximo sua experiência de vida,

nocimiento” (Em sentido geral, a

tomada de consciência, à dedica-

tendo papel ativo na sociedade.

terminação “identidade” faz refe-

ção, à oração e ao cuidado com

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Por estas e outras razões que a Pedagogia Inaciana se fortalece no desenvolvimento da educação integral, por assumir que a pessoa é única e parte fundamental na obra de Deus. Além disso, tem

Ana Paula de Moraes de Siqueira é graduada em Pedagogia (2014) e mestre em Educação (2017), pela PUC-PR. Atualmente, é professora da Oficina de Aprendizagem das turmas de 2º e 3º anos no Colégio Medianeira e professora do ensino fundamental na Rede Municipal de Ensino de Curitiba.

uma preocupação com o desenvolvimento de pessoas reflexivas, capazes de ler a realidade e de promover o espirito criativo no exercício da fé em Deus. Logo, promove o desenvolvimento em todas as dimensões do aprender, ocorrendo uma sinergia entre todos os aspectos da vida de cada pessoa, fortalecidos na e pela

Edeluci Fernandes Botelho é graduada Serviço Social pela PUC-PR (2001) e em Pedagogia (2013), pela Universidade Braz Cubas, especialista em Modalidades e Intervenções no Processo de Ensino e Aprendizagem (2003), PUC-PR, e em Educação Jesuítica: Aprendizagem Integral, Sujeito e Contemporaneidade (2019), pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos. Atualmente, é professora do 2º ano do Ensino Fundamental no Colégio Medianeira.

Referências MENDONÇA, Nelino José Azevedo de. A humanização na pedagogia de Paulo Freire. Dissertação de Mestrado. 168 f. Recife. 2006. OSCAR E. Buroz Echenagucia S.J. Identidad ignaciana: un modo de ser. Disponível em: <http://www.cerpe. org.ve/tl_files/Cerpe/contenido/documentos/ Pastoral%20-%20General/San%20Ignacio%20y%20 Espiritualidad%20Ignaciana/2%20IDENTIDAD%20 IGNACIANA%20UN%20MODO%20DE%20SER. pdf>. Acesso em: 20 dez 2018. REDE JESUÍTA DE EDUCAÇÃO. Projeto Educativo Comum. (PEC). São Paulo: Loyola, 2016 MARTIN, James. A sabedoria dos Jesuítas para (quase) tudo: espiritualidade para a vida cotidiana. Sextante, 2012.

fé em Deus, e pela esperança de um mundo melhor e mais justo. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

Indicações A sabedoria dos Jesuítas para (quase) tudo: espiritualidade para a vida cotidiana | James Martin Este livro apresenta uma grande variedade de tópicos acerca da espiritualidade inaciana. Mostrando como encontrar Deus em tudo e tudo em Deus, o autor sugere maneiras claras e simples de incorporar essa espiritualidade à vida cotidiana.

Elementos de Antropología Pedagógica | José Maria Barrio A obra faz uma espécie de raio-x na realidade humana, a fim de abordar o tema da educação centrada no estudante e nas nunces entre educar, libertar, valorar e formar.

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Por Eliane Barreto Maia Santos e Rafaela Batista dos Santos

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Projeto João de Barro nasceu das discussões, nas aulas de ciências, sobre os impactos das ações humanas no ambiente, pensando na necessidade de transmitir, aos estudantes, informações acerca da importância de se reparar danos socioambientais, tendo como foco central a sustentabilidade.

O

A ideia surgiu a partir da experiência da bióloga e artesã Ângela Feijó, idealizadora do Espaço de Reutilização Artesanal – ERA, que utiliza resíduos plásticos e caixas de leite para confeccionar paredes. Isso porque, em 2016, um grupo de educadoras do Colégio Medianeira fez um curso no qual aprendeu essa técnica. Os estudos e as discussões, durante as reuniões pedagógicas sobre o trabalho de Núcleo de Ciências Naturais e Matemática do 5º ano, no qual o ponto central é a ideia da sustentabilidade, oportunizaram um projeto em que a construção das paredes pudesse viabilizar um trabalho pedagógico. Tal trabalho aliaria perfeitamente os conteúdos dos componentes de Ciências e de Matemática, desenvolvidos no decorrer do ano letivo com os estudantes. Portanto, pelo fato de que o Colégio Medianeira trabalha o desenvolvimento sustentável como uma das questões mais importantes na atualidade, as ações cotidianas da bióloga figuraram como uma proposta real para a redução dos impactos ambientais gerados pelo consumo e pelo descarte de lixo e resíduos, que representa um dos problemas mais graves que o nosso

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planeta enfrenta na atualidade. O consumo e o descarte, por sua vez, estão ligados a problemas globais e locais da sociedade, nas mais diferentes ordens: sociais, políticas, econômicas, ambientais e culturais. O resíduo reaproveitável, em suas variadas formas, com destaque para os resíduos plásticos, tem um impacto ambiental expressivo na contaminação do solo e da água, caso não tenha a destinação correta no seu processo de reciclagem. Como parte do projeto, nos anos de 2016-2017, todos os estudantes do 5º ano visitaram a Usina de Reciclagem para que pudessem visualizar como acontece, na prática, a seleção e a destinação de parte do descarte produzido na cidade de Curitiba. Em uma pesquisa informal, descobrimos que o volume de embalagens plásticas descartadas nas casas é alto. Até mesmo materiais de construção, como tijolos, vêm envoltos em plásticos, fato que reforça a necessidade de propor ações com maior consistência, possibilitando experiência mais significativa e efetiva na vida de nossos estudantes. O Projeto alia a ideia do reaproveitamento de um volume considerável do lixo plástico produzido nas casas dos estudantes e educadores, além da mobilização de mais pessoas que ajudem na coleta dos resíduos para a compactação e produção dos “tijolos”, formando construções que possam colaborar para algo significativo com possibilidade de uma “obra sustentável”.

Ademais, ele oportuniza às educadoras explorarem, com os estudantes do 5º ano, a aplicação de vários conteúdos do componente de Matemática, como cálculos envolvendo as quatro operações com os números naturais e decimais; média aritmética, expressões numéricas, geometria (perímetro, área, ângulos, formas no plano bidimensional e tridimensional), entre outros. Embora o desenvolvimento do projeto João de Barro esteja em processo constante de qualificação, as crianças que estão em contato com as discussões acerca da sustentabilidade, bem como com as temáticas que envolvem resíduos plásticos e logística reversa, já estão familiarizadas com as abordagens do Núcleo de Ciências Naturais e Matemática.

Uma experiência de elaboração sincronizada à realidade circundante No ano de 2015, por exemplo, dentre os estudos realizados está a Encíclica Papal Laudato Si, que fala sobre o Cuidado da Casa Comum, na qual o Papa Francisco aborda as relações do consumismo e do desenvolvimento impensado e desenfreado que a humanidade vem revelando, por lidar mal com os recursos do Planeta Terra, que são esgotáveis. Além disso, o documento entrelaça as preferências da Igreja Católica às da Ciência, simbolizando um convite do Papa à transformação e à unificação global das ações para repensar e combater a degradação ambiental e as alterações climáticas. O apelo do pontífice resgata


a ideia da tomada de consciência por parte de todos, e o posicionamento cidadão frente às questões ambientais. Em consonância com o Projeto Pedagógico do Medianeira e da Rede Jesuíta, o projeto João de Barro se configura como uma proposta de aprendizagem significativa atrelada à alfabetização científica, apresentando-se como um processo pedagógico que engloba as diferentes funções da cidadania, que oportuniza o repensar, o refletir e o reelaborar de novas práticas cotidianas que lidem com soluções para problemáticas que envolvam a todos. Com base no PEC número 25:

“[...] a proposta pedagógica dos colégios jesuítas está centrada na formação da pessoa toda e para toda a vida, trabalhamos para realizar uma aprendizagem integral que leve o estudante a

participar e intervir autonomamente na sociedade: uma educação capaz de formar homens e mulheres conscientes, compassivos, comprometidos e coerentes." Essas discussões, por conseguinte, desafiaram os educadores à materialização nas salas de aula do 5º ano. Nos últimos anos, as turmas demonstraram forte preocupação com o descarte de resíduos no ambiente, além de estarem motivadas a agir. Logo, os anos de 2016 e 2017 foram marcados por significativas reflexões, concretizadas no Núcleo de Ciências Naturais e Matemática. Das discussões acerca dos resíduos plásticos, foi construída a Casateca. Essa construção foi uma proposta de edificação de um espaço, uma pequena casa no pátio central, voltada para os estudantes que quisessem ler, e para que ficassem

mais próximos dos demais colegas, sem precisar necessariamente se deslocar até a biblioteca, afastando-se inteiramente daqueles que desejassem brincar. Dessa forma, a edificação da Casateca reutilizou piso, telhas, portas e janelas disponíveis na marcenaria do Colégio. Nela foram utilizadas 808 caixas de leite e 161kg de resíduos plásticos. Essa experiência demonstrou que o Projeto João de Barro tem um potencial de agregar aprendizagem significativa, cidadania e sustentabilidade. Em 2018, houve o pedido de uma turma da Educação Infantil, que tinha o desejo de construir uma casa na árvore. Nasceu, assim, a ideia do Casulo em formato hexagonal, demandando pesquisas sobre a estrutura e sustentação da casa. Nessa obra foram utilizadas 660 caixas de leite e 132kg de resíduos plásticos.

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Em 2019, com o desejo de

principais aspectos ligados à sus-

edificar algo além dos muros do

tentabilidade e à preservação da

Colégio e realizar uma ação para a

casa comum. Logo, é urgente a

Comunidade na qual o Medianeira

formação das novas gerações em

está inserido, planejou-se, junto à

prol de se tronarem cidadãos am-

instituição escolar municipal vizi-

bientalmente competentes, éticos,

nha, a Escola Noely Simone de Ávi-

críticos, reflexivos e observadores

la, uma parceria para a construção

amparados nos conceitos, tanto

de uma Casa de Brincar, oportu-

no sentido teórico quanto prático,

nizando a integração de estudan-

em experimentações de suas des-

tes das duas escolas, que teriam

cobertas, num processo inicial de

muitos momentos de trabalho em

cientificidade, ligada ao desenvol-

comum, além de dar destino ade-

vimento de ações práticas.

quado a centenas de quilos de resíduos plásticos. O Colégio, por excelência, exer-

instruída, Hurt (1998) aponta que

ce uma função social importante

estas não são ensinadas direta-

no trabalho formativo de seus es-

mente, mas têm esse desenvol-

tudantes, no sentido educativo-

vimento de forma embutida no

-formativo para além de uma abor-

currículo escolar, em momentos

dagem pedagógica estritamente

nos quais os estudantes são cha-

teórica do conhecimento científico

mados a solucionar problemas, re-

das questões ambientais. É fun-

alizar investigações, desenvolver e

damental que, ao longo dos anos

experienciar projetos. Tais atitudes

escolares, aconteça a vinculação

podem ser observadas na tessitura

com atividades práticas que levem

da proposta pedagógica do Colé-

os estudantes a realizar experiên-

gio Medianeira, na medida em que

cias reais de situações vinculadas

se considera um enfoque na e pela

ao exercício da cidadania efetiva.

formação de indivíduos competen-

Situações que extrapolem, inclusi-

tes, humanos e academicamente

ve, os espaços das salas de aula e

inseridos em seu tempo, através

dos muros da escola, que possam

de dinâmicas interativas que per-

contribuir de fato para a transfor-

mitam a transformação social.

mação da sociedade. Ao se pensar

É nesse sentido que o Projeto Educativo Comum (PEC) da Rede Jesuíta desafia suas instituições ao desenvolvimento de pessoas conscientes, competentes, compassivas, comprometidas e coerentes, perpassadas e permeadas por discussões sobre alteridade, sensibilidade e solidariedade para com uma sociedade democraticamente justa e emancipada.

a educação socioambiental, ainda encontramos discursos errôneos e reducionistas ao relacioná-la apenas com ecologia, desvinculando-a de outros componentes curriculares e de aspectos formativos importantes de serem tratados de maneira mais inter, pluri e transdisciplinar. O Colégio não pode se furtar de trazer, via currículo, os

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Enfocando as características de uma pessoa cientificamente

Etapas do projeto: • Definido o projeto de construção (em 2016/2107 construímos a Casateca, em 2018 o Casulo, em 2019 a Casa de Brincar), fazer esboço da planta baixa e das paredes para definir o formato e tamanho das placas (estrutura de madeira que fixam as caixas de leite).

• Solicitar às famílias dos estudantes algum Engenheiro Civil ou Arquiteto que possam elaborar o projeto utilizando programas como Autocad, definindo, com exatidão, as medidas das paredes.

• Solicitar à marcenaria a construção de moldes de madeira, que podem ser quadrados, retangulares, triangulares, conforme as exigências do projeto a ser executado.

• Orientar os estudantes a recolherem, em suas casas, embalagens de feijão, arroz, pão..., materiais como canetas, apontadores (fora de uso), além de caixas de leite vazias e limpas com as medidas: 16,5cm x 6,3 cm x 9,5cm.

• Acomodar as caixas dentro do molde de madeira para que os resíduos possam ser compactados no interior da caixa sem que esta perca o formato.


• Observar que as placas de 1m² utilizam 55 tijolos inteiros e 10 meios-tijolos.

• Revestir as placas com duas camadas de cola branca e tiras de jornal. Depois de seca, a placa recebe duas camadas de tinta emborrachada, conhecida como “batida de pedra” e utilizada também em carros para promover proteção contra pedras e umidade.

• O telhado pode ser intercalado com telhas e telhado verde que garante um ambiente interno mais arejado. Na Casateca, um lado do telhado foi composto de reutilização de telhas de amianto e com telhas de garrafa pet para garantir maior luminosidade interior.

• Todas as etapas de construção são acompanhadas pelos estudantes, que são protagonistas nos momentos de definir o formato da casa, a identidade, finalidade da construção e a disposição das portas e janelas. Durante conversa com as turmas, vão nascendo as ideias, as professoras apresentam para as demais turmas que validam, complementam ou refutam as sugestões. A biblioteca sustentável já foi tema de matéria nos sites: Associação Nova Escola (https:// bit.ly/2IKBP3N), Catraca Livre (https://bit.ly/2rLhPXp), Porvir (https://bit.ly/2EMsfuL), Xalingo (https://bit.ly/2IPkKZo) e Colégio Medianeira (https://bit. ly/2vjiP7i). comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

Em 2019, o Projeto João de Barro foi agraciado com o Prêmio Conectando Boas Práticas. Selecionado entre 2.600 trabalhos inscritos, ficou entre os mais bem avaliados no concurso, recebeu uma placa especial de reconhecimento.

Eliane Barreto Maia dos Santos é graduada em matemática. Professora desde 1992, tem experiência de atuação no Ensino Fundamental, com foco para a questão do ensino-aprendizagem na primeira fase do EF. Atualmente, é professora de Matemática no Colégio Medianeira. Rafaela Batista dos Santos é graduada em em Pedagogia pela, Universidade Federal do Paraná (2015). Tem experiência na área de Educação e, desde 2008, trabalha com foco em alunos com distúrbios de aprendizagem, possuindo experiência com tutoria de alunos com necessidades especiais. Atualmente, é professora do Ensino Fundamental, no Colégio Medianeira.

Indicações Sustentabilidade: o que é - o que não é | Leonardo Boff A sustentabilidade representa, diante da crise socioambiental generalizada, uma questão de vida ou morte. O autor faz um histórico do conceito desde o século XVI até os dias atuais, submetendo a uma rigorosa crítica os vários modelos existentes de desenvolvimento sustentável.

A cultura no mundo líquido moderno | Zygmunt Bauman Um dos mais brilhantes e influentes pensadores da atualidade, Zygmunt Bauman rememora os deslocamentos históricos do conceito de cultura e examina seu destino num mundo marcado pelas novas e poderosas forças da globalização, da migração e da coexistência bélica de populações.

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Da Educação Infantil para o Ensino Fundamental: como acontece esse processo de transição? As crianças vão parar de brincar? No Fundamental é mais sério? Como será a alfabetização? O que vai ter no primeiro ano? Na Educação Infantil só se brinca? Por Ana Paula Correia

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stes são alguns questionamentos comuns, tanto das crianças quanto das famílias, com a mudança de nível nas séries iniciais. Nesse sentido, o olhar, enquanto educadores, deve estar atento para que esse processo transite da maneira mais tranquila possível, com significado na ação pedagógica, qualidade nas estratégias, garantindo maior segurança aos estudantes e familiares.

E

Para isso, é necessário não perder de vista alguns fatores, como o foco na criança; a troca entre o corpo docente; a concepção do currículo; os princípios inacianos; a escuta diante do processo e o cuidado com a adaptação, tendo em vista a variedade de transições que podem ocorrer, como: novos estudantes, enturmação, inclusão, retenção, os diferentes níveis de séries, entre outros.

tempos; práticas e interações com relação à cultura do escrito e ao universo infantil; a promoção da autonomia/identidade a partir do brincar e os movimentos. Nessa perspectiva, a participação da comunidade educativa em reuniões para discussão, a contribuição com experiências para ressignificar a prática, o contraponto de aporte teórico e sistematização do novo currículo projetado resultou em um projeto consistente, embasado em teoria e nas diversas vozes que sustentam e acreditam nesse trabalho. Sua revisitação é permanente para aprimorar os conceitos, refletir acerca dos temas propostos e atualizar a práxis educativa, alinhando com os órgãos reguladores, os princípios da Pedagogia Inaciana e reverberando as diretrizes do Projeto Educativo Comum (PEC), da Rede Jesuíta de Educação.

Junto a isso, a partir das investigações que realizam espontaneamente, as crianças dão indicativos, no dia a dia, ou sugerem o que gostariam de aprender, problematizando situações de aprendizagem, com demandas ou temas específicos da turma. Tendo em vista o Mapa das Aprendizagens – documento interno com a constituição de eixos, parâmetros e palavras-chaves, cujo objetivo é a ampliação das aprendizagens de uma série para outra – temos os requisitos finais para a Educação Infantil. Levando em consideração esses aspectos, as crianças egressas da Educação Infantil, em sua maioria, possuem a oralidade como forte ferramenta para se comunicar com seus pares e com os adultos. Verbalizam com clareza seus desejos e começam a compreender sentimentos ligados aos diversos vínculos que estabelecem com os seus familiares e outros indivíduos.

REESTRUTURAÇÃO DO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO INFANTIL

A EDUCAÇÃO INFANTIL NO COLÉGIO MEDIANEIRA

Dessa maneira, é necessário, es-

Desde 2016, a Educação Infantil tem como norte a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e os estudos baseados em autores que dialogam com o currículo deste nível de ensino e temas de aprofundamento, a saber: os processos de avaliação; os projetos pedagógicos; a documentação pedagógica; a concepção de infância/criança; as contribuições da Abordagem Emmi Pikller e Reggio Emilia para o pleno desenvolvimento infantil e suas relações com a proposta; o exercício com a organização de novos espaços/

O eixo estruturante da Educação Infantil no Colégio Medianeira tem como foco as experiências, brincadeiras e interações, que possibilitem aprendizagens, desenvolvimento e reflexão crítica, na perspectiva da formação integral (dimensões cognitiva, socioemocional e espiritual-religiosa). Os planejamentos elaborados pelas regentes e as investigações provenientes das crianças têm o objetivo de garantir os DIREITOS de aprendizagem juntamente com os CAMPOS DE EXPERIÊNCIA.

comuns os conflitos entre colegas

tabelecer momentos de diálogo e reflexão sobre suas ações, pois são e opiniões divergentes. As Assembleias de Classe são reguladoras do estabelecimento do diálogo, em que a própria criança é autora da sua tomada de decisão, com a mediação do educador. Além de ser protagonista na construção de combinados no dia a dia. A criança é capaz de recontar histórias com clareza e sequência nos fatos. Assim como contribuir com ideias para a elaboração de textos coletivos, ampliando o vocabulário.

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Dramatiza contos e histórias. São intensos os momentos de simbolização e faz de conta, com o contato de materiais, brinquedos não estruturados que favorecem essa prática e a criatividade para sua composição, como caixas, tecidos, sucatas, jornal, materiais da natureza, demonstrando o quanto são produtoras de cultura nesses momentos de brincadeira. O brincar tem uma função: é uma linguagem própria da criança, há uma intencionalidade, em consonância com os objetivos de aprendizagem, ou seja, não é o brincar pelo brincar – a brincadeira é material de observação e escuta para o educador. Então, lendo imagens e reconhecendo alguns gêneros textuais, expande ideias e realiza a representação de seus pensamentos a partir de diferentes linguagens. Nesta faixa etária, já começa a dominar seu esquema corporal, com as brincadeiras, jogos e atividades dirigidas, tomando consciência das partes e do todo, pois tem seu corpo como referência. Assim, começa a figuração humana e, aos poucos, seus desenhos ganham detalhes e acréscimos. Ainda fazem a representação das ideias com diferentes materiais, ampliando sua coordenação motora ampla e fina. No cotidiano, com a vivência de jogos e brincadeiras em diferentes espaços, tem a capacidade de aplicar conceitos perceptivos para ampliar relações quantitativas a partir de problematizações. Com base nas estratégias e com a rotina, constrói noções de pro-

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priedade, comparação, classificação, ordenação e seriação dos objetos e brinquedos diversos. Assim como a percepção de noções de direção com o próprio corpo. A partir das experiências e vivências propostas, as interações estão ganhando cada vez mais espaço em estratégias, momentos livres e dirigidos, na promoção do convívio entre as crianças da série e diferentes idades para o incentivo ao sentimento de pertença e à postura de respeito consigo, com o outro e no grupo, bem como na identificação e uso do Magis. Também percebendo o contexto à sua volta e o quanto suas atitudes, dos seus familiares, dos amigos e das pessoas de maneira geral podem contribuir ou não para o exercício da cidadania, local e/ou global. Outro aspecto que chama a atenção, desde o Infantil 2, a partir do contexto no qual estão inseridas, é o interesse que as crianças têm pela cultura do escrito, como por exemplo, fazendo de conta que estão lendo um livro, folheando as histórias ou até mesmo se arriscando com um material riscante em tentativas espontâneas. Esse despertar se amplia para as séries subsequentes, expandindo as capacidades em compreensão dos modos de aquisição da leitura/escrita, o que torna esse processo natural e significativo. Dessa maneira, ao sair da Educação Infantil, a criança tem um vasto repertório corporal, artístico, de identidade e representações múltiplas, que possibilitarão dialogar com as novas demandas do Ensino Fundamental.

O PROCESSO DE TRANSIÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL PARA O ENSINO FUNDAMENTAL No que diz respeito à transição da Educação Infantil, as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (2010) fazem uma breve orientação com relação ao processo, até sugerindo uma articulação entre as referidas etapas. Contudo, é de extrema importância quando ressalta a não antecipação dos conteúdos do Ensino Fundamental para a Educação Infantil, até por um aspecto histórico e carregado de assistencialismo que caracterizou esta etapa de ensino. A experiência mostra a importância da transição enquanto continuidade dos estudos, no sentido de tornar significativa a etapa de transição entre os diferentes níveis de ensino. As crianças, ao terminarem o ano em curso, possuem uma percepção inicial da série seguinte, o que os auxilia na adaptação à rotina e às exigências do dia a dia. Dessa maneira, há uma preocupação com a adaptação das crianças, com estratégias em planejamento levando em conta a transição, como conhecer os diferentes espaços, as professoras, os serviços, as crianças que estão no 1º Ano, o que elas têm a dizer sobre a série que estão em processo de finalização e trazendo as curiosidades das crianças da Educação Infantil. Estabelecido o contato inicial, as propostas se desenrolam para

outras, proporcionando sua plena participação e a vivência de uma situação futura. Ao perceber maior tranquilidade da criança, isso se reflete nas famílias, ao se sentirem mais seguras com o processo de mudança. Nesse sentido, é importante que os pais tenham um olhar apenas para a mudança de nível, com todas as preocupações pertinentes a esse momento e não de maior responsabilidade ao iniciar no Ensino Fundamental, pois esse processo se inicia desde a Educação Infantil, ou seja, tão importante quanto! É preciso considerar a criança na sua totalidade, como um ser completo, que necessita de uma formação que contemple todas as dimensões e que comunga com a aprendizagem integral proposta pela Rede Jesuíta de Educação (RJE). Ressalta-se a importância de ter a clareza da concepção de infância/criança adotada pela instituição e o quanto isso dialoga com a prática para se reverberar com propostas mais assertivas. Ao pensar sobre a estratégia de transição, é necessário ter como foco um processo contínuo de trabalho com o conhecimento, dialogando com o foco nas três dimensões: SOCIOEMOCIONAL, com a busca pelo desenvolvimento da identidade da criança e o fortalecimento das suas relações com o contexto; ESPIRITUAL-RELIGIOSA, a partir das vivências voltadas para o seu autoconhecimento, somando-se a uma sensibilização do cuidado consigo, com o outro e ainda o seu envolvimento com as questões da

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cidadania global e COGNITIVA, com a relação dos processos do aprender e o saber a pensar acerca dos conhecimentos prévios e adquiridos no processo, levando em conta suas experiências e interações com o contexto, a capacidade de levantar hipóteses e criar soluções. Com essa perspectiva, o processo de transição e adaptação da criança, é necessário procurar caminhos que realmente garantam as ações em planejamentos, trocas entre os docentes, a escuta da família e a prática do professor,

dialogando com a concepção adotada pela instituição. Nesse caso, destaca-se a busca do Colégio Medianeira em qualificar

processos,

oferecen-

do formação ao corpo docente, abertura ao diálogo e visando à formação do estudante, levando em conta suas especificidades e ritmos. Dessa maneira, a transição é um tema em pauta, uma parte que dialoga com o todo da criança, que merece especial atenção para a efetivação da sua plena aprendizagem.

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Ana Paula Correia é graduada em Letras Português/ Inglês, pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUC-PR (2005), em Pedagogia, pela Pontifícia Universidade do Paraná - PUC-PR (2010). Especialista em Alfabetização e Letramento pela Pontifícia Universidade do Paraná - PUCPR (2014), Psicomotricidade Relacional pelo Centro Internacional de Análise Relacional - CIAR (em andamento) e Educação Jesuítica: Aprendizagem Integral, Sujeito e Contemporaneidade, pela Universidade Vale do Rio Sinos - UNISINOS (2019). Atualmente é professora da Educação Infantil no Colégio Medianeira.

Indicações Diálogos com Reggio Emilia | Carla Rinaldi Reunindo palestras, entrevistas e artigos sobre uma proposta inovadora para a educação da primeira infância, este é um livro essencial para quem se interessa por educação: pedagogos, educadores e pesquisadores na área.

As cem linguagens da criança: volume 1 | Carolyn Edwards, Lella Gandini, George Forman, Maria Carmen Silveira Barbosa Essa obra é uma introdução abrangente, que trata de história e filosofia, currículo e metodologias de ensino, escola e sistema organizacional, uso do espaço e ambiente físico, além de falar do papel dos profissionais de educação infantil.

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mediação


NOVOS HORIZONTES para uma educação e A subjetividade da pesquisa INTERDISCIPLINAR os novos horizontes para uma As ciências exatas como produto da relação entre as ciências humanas e as ciências de referência

educação interdisciplinar Por Soraya Rodrigues Kulicheski

mediação

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e um lado, a pesquisa em educação já aponta suas dificuldades, por tratar de um objeto complexo, definido num tempo e espaço característicos e por sujeitos diversificados, logo, carregado de subjetividade. De outro, a pesquisa em ensino, preocupada com o ensinar de algo, trazendo uma característica própria. E, especialmente no caso de Física, “têm uma característica a mais: elas introduzem no reino da interdisciplinaridade educacional a contribuição de uma ciência ‘exata’ com todo o seu aparato institucional e disciplinar” (VILLANI, 1981, p. 81).

D

Essa constatação mostra que o pesquisador em ensino de física se propõe a buscar equilíbrio entre o ensino – sustentado pelas teorias educacionais e concepções de aprendizagem, vindo das ciências humanas – e a física – a ciência de referência, com métodos próprios e pertencente a uma área de conhecimento diferente: as ciências exatas. Esse equilíbrio denota que este pesquisador não fará pesquisa em educação, nem em física, mas se servirá do instrumental teórico de ambas para fundamentar seus estudos. Nos cursos de formação inicial de professores de Física, pelas disciplinas de metodologia de ensino, diversas abordagens metodológicas e resultados das pesquisas na área são apresentados, tais como história da Física, leitura e interpretação de textos, enfoque CTSA (Ciência, Tecnolo-

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mediação

gia, Sociedade e Ambiente), experimentação e resolução de problemas. Contudo, como destaca Correia (2004): “Sem a utilização de perspectivas múltiplas no processo educacional as concepções de ciência ficam distorcidas”. O processo educativo nos colégios jesuítas tem suporte nas aspirações da Pedagogia Inaciana (KLEIN, 2015). Nesse contexto, o Paradigma Pedagógico Inaciano (PPI) indica uma estrutura didática e cinco elementos norteadores de todas as atividades pedagógicas desenvolvidas: contexto, experiência, reflexão, ação e avaliação, que orientam os educadores, visando formar estudantes tal qual se almeja em colégios de identidade inaciana: “homens e mulheres para os outros”. Mais do que ensinar conteúdos e métodos, pretende-se levar as pessoas a construírem responsável e solidariamente a sociedade humana e a cuidar da natureza. Tal estruturação não pretende ser uma metodologia rígida e pode ser aplicada a diferentes conteúdos, disciplinas e estratégias metodológicas, não havendo sequer a necessidade de uma única estratégia desenvolver os cinco elementos, mas sim entende-se que, pelo conjunto de atividades realizadas ao longo do trabalho pedagógico na escola, todos serão explorados. Então, como desenvolver valores que norteiem e promover a formação integral de nossos estudantes por intermédio do ensino de Física?

O que se apresenta a seguir é uma proposta de sequência didática que aborda as leis de Newton, segundo a concepção metodológica revelada pelo PPI, dado que se pretende desenvolver uma abordagem diferente daquelas já exploradas pelas pesquisas em ensino de Física.

Na perspectiva da Pedagogia Inaciana, conhecer os estudantes e sua relação com os conteúdos que serão abordados no tema de estudo é o passo inicial de toda atividade pedagógica. Isso não apenas inclui identificar os conhecimentos prévios dos estudantes, mas discutir temas urgentes do debate local, nacional e global, bem como conhecer a disposição do estudante em apreender o tema proposto. Desse modo, se propõe aplicar um questionário, com perguntas teóricas e qualitativas sobre leis de Newton e vetores, a fim de identificar quais conceitos são conhecidos dos estudantes, desafiando-os a retomar conceitos vistos no Ensino Fundamental. Ao selecionar as questões que compõe o questionário, priorizam-se aquelas que trazem situações vinculadas ao cotidiano dos estudantes ou, ainda que não retratem especificamente a vivência deles, não tragam elementos inteiramente abstratos ou genéricos (como móveis ou corpos).


O contato com o objeto de estudo por meio dos sentidos, da imaginação, dos sentimentos e da vontade do estudante é o que caracteriza a experiência proposta pelo PPI, no sentido de “saborear as coisas internamente”, nas palavras de Santo Inácio. Para que os estudantes experienciem as leis de Newton não apenas como uma motivação inicial desvinculada do trabalho posterior de sistematização do conteúdo, sugere-se uma aula de laboratório que permita, além da observação de fenômenos da dinâmica newtoniana, a investigação de situações que confrontem seus conhecimentos, exigindo dos estudantes recorrer aos conceitos teóricos para explicar suas observações.

Para atingir a reflexão proposta pelo PPI, o estudante deve buscar o significado, a importância e as implicações do que aprendeu em sua vida, a fim de promover uma vida melhor para os demais. Assim, esta reflexão não se encerra em si mesma e culmina em ações balizadas pelos princípios e valores que caracterizam o modo de proceder nos colégios jesuítas. A atividade que se propõe é dividir a classe em dois grupos: aristotélicos e newtonianos, para

explicar, através de uma carta, uma situação do cotidiano, respondendo a questões como: por que estes movimentos ocorreram? Por qual razão os objetos param após certo tempo? Em sua escrita eles devem discursar como se fossem o pensador Aristóteles, desse modo apresentando os pressupostos de sua tese, do mesmo modo que aqueles que representam o ponto de vista Newtoniano precisam fundamentar suas respostas nas leis do movimento tal qual proposto por ele. Posteriormente sugere-se um debate em sala, mediado pelo educador, tratando de questões conceituais acerca dos movimentos, para que as respostas baseadas em teses diferentes sejam confrontadas, o que permite mostrar que o conhecimento não é advindo de gênios, mas sim de um processo histórico e cumulativo, advertindo os estudantes acerca da não neutralidade da ciência.

A ação que pressupõe o PPI mostra ao professor a modificação que o estudante incorpora em sua vida a partir do tema trabalhado, disposto a oferecer à sociedade e torná-la mais justa e solidária. Motivado pela campanha de prevenção de acidentes de trânsito "Maio Amarelo", o objetivo da atividade é conscientizar os estudantes sobre a segurança no trânsito em prol da preservação

da vida, relacionando os conceitos de velocidade; distância percorrida; aceleração e leis de Newton com a atuação de peritos em acidentes automobilísticos. Em grupos, eles devem se inteirar de uma situação hipotética de acidente e fornecer um laudo pericial, contendo informações calculadas com base nos conceitos da mecânica estudados previamente. Por fim, cada grupo deve apresentar um material de divulgação (folder, podcast, vídeo, slides, cartaz, etc), que indique a importância do uso de cinto de segurança na preservação da vida e sua relação com os conceitos da dinâmica.

Avaliar, aqui, indica o diagnóstico pessoal do estudante acerca daquilo que incorporou à sua pessoa pelo trabalho pedagógico realizado. Nesta etapa, o estudante deve ser capaz de tomar consciência de seu progresso e crescimento integral, ou seja, não apenas na dimensão cognitiva, mas também nas dimensões socioemocional e espiritual. O que se propõe é que os estudantes elaborem uma questão no formato de um exercício, tal qual já estão habituados a ler nos livros didáticos, baseando-se numa imagem de algum sistema mecânico real, para, assim relacionar as representações abstratas dos sistemas mecânicos às situações do cotidiano que as originaram, reforçando

mediação

33


O contexto real do estudante (socioeconômico,político e cultural): O contexto real do estudante (socioeconômico, político e cultural): Conceitos Conceitosaportados aportadosdesde desdeooinício iníciodo doprocesso processo de de aprendizagem. aprendizagem.

Experiência

Diagnóstico pessoal do estudante acerca daquilo que incorporou em sua vida; tomada de consciência do progresso e crescimento integral (cognitivo, socioemocional e espiritual).

mediação

Avaliação

“O amor demonstra-se com fatos, não palavras”. A mudança que o estudante incorpora em sua vida e se dispõe a oferecer à sociedade, tornando-a mais justa e solidária.

Confira as atividades

Criação de um exercício sobre sistemas mecânicos com base em imagens do cotidiano

- Relacionar as representações abstratas dos sistemas mecânicos às situações cotidianas que as originaram; - Religar concepões teóricas e práticas acerca das leis de Newton e suas aplicações; - Exercitar a pesquisa e a autopercepção.

O significado, a importância e as implicações do que aprendeu em sua própria vida. A promoção de uma vida melhor para os demais culmina em ações balizadas pelo modo de proceder inaciano.

Criação de um exercício sobre sistemas mecânicos com base em imagens do cotidiano

- Repensar suas concepções sobre os movimentos observados no cotidiano; - Refletir a construção histórica do conhecimento estudado e como isso influencia sua vida; - Considerar a não neutralidade da ciência.

Ação

Debate no qual estudantes defendem as ideias de um dos pensadores

Dinâmica aplicada à vida real

- A segurança no trânsito e as Leis de Newton; - Busca pela promoção da justiça e preservação da vida; - A criação de material de divulgação do uso do cinto de segurança necessita fundamentalmente que o estudante se sensibilize com o outro.

Aristóteles Vs. Newton

- Abordagem de situações vinculadas ao cotidiano dos estudantes; - Alternativas incorretas: erros recorrentes e comuns entre os estudantes; - Debate das dúvidas que surgiram na resolução do questionário.

11 questões de múltipla escolha

Questionário de conceitos

Reflexão

Ação

Preservação da vida e sua relação com conceitos da dinâmica

O significado, a importância e as implicações do que aprendeu em sua própria vida. A promoção de uma vida melhor para os demais culmina em ações balizadas pelo modo de proceder inaciano.

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Propaganda sobre o uso consciente do cinto de segurança.

Dinâmica aplicada à vida real

Contexto

- Repensar suas concepções sobre os movimentos observados no cotidiano; - Refletir a construção histórica do conhecimento estudado e como isso influencia sua vida; - Considerar a não neutralidade da ciência.

Experiência

Debate no qual estudantes defendem as ideias de um dos pensadores

“saborear as coisas internamente”: contato com o objeto de estudo por meio dos sentidos, da imaginação, dos sentimentos e da vontade do estudante.

Reflexão

Aristóteles Vs. Newton

- Investigar experimentalmente as leis de Newton; - Conectar obrigatoriamente teoria e prática; - Reconhecer que tipo de vínculo está sendo estabelecido com o tema estudado.

“saborear as coisas internamente”: contato com o objeto de estudo por meio dos sentidos, da imaginação, dos sentimentos e da vontade do estudante.

- Investigar experimentalmente as leis de Newton; - Conectar obrigatoriamente teoria e prática; - Reconhecer que tipo de vínculo está sendo estabelecido com o tema estudado.

Duas práticas, abordando a 1º e 3º leis

- Abordagem de situações vinculadas ao cotidiano dos estudantes; - Alternativas incorretas: erros recorrentes e comuns entre os estudantes; - Debate das dúvidas que surgiram na resolução do questionário.

“O amor demonstra-se com fatos, não palavras”. A mudança que o estudante incorpora em sua vida e se dispõe a oferecer à sociedade, tornando-a mais justa e solidária.

Duas práticas, abordando a 1º e 3º leis

- A segurança no trânsito e as Leis de Newton; - Busca pela promoção da justiça e preservação da vida; - A criação de material de divulgação do uso do cinto de segurança necessita fundamentalmente que o estudante se sensibilize com o outro.

Laboratório das Leis de Newton

11 questões de múltipla escolha

Preservação da vida e sua relação com conceitos da dinâmica

Laboratório das Leis de Newton

O contexto real do estudante (socioeconômico,político e cultural): Conceitos aportados desde o início do processo de aprendizagem.

Questionário de conceitos

Propaganda sobre o uso consciente do cinto de segurança.

Contexto


O contexto real do estudante (socioeconômico,político e cultural): Conceitos aportados desde o início do processo de aprendizagem.

- Relacionar as representaç Criação de um exercício sobre s base e

Dinâmica aplicad Contexto REFERÊNCIAS

que a dinâmica de forças mecânicas é capaz de elucidar o funcionamento de máquinas muito Questionário de conceitos 11 questões múltipla escolha comuns emde nosso dia a dia, como, exemplo, - Abordagem depor situações vinculadasreboques, ao cotidiano elevadodos estudantes;res e guinchos.

O significado, a i do que aprendeu em sua pr uma vida melhor para o balizadas pelo

- Alternativas incorretas: erros recorrentes e comuns entre os estudantes; Concluindo, a sequência di- Debate das dúvidas que surgiram na resolução dática que se apresentou é uma do questionário.

CORREIA, N. “A história da Física na Educação Brasileira.” Revista HISTEDBR on-line, n.14, jun. 2004. Disponível Duas em <http://www.histedbr.fe.unicamp.br/ práticas, abordando a 1º e 3º leis revista/revis/revis14/art7_14.pdf> Acesso em: 01/ - Investigar experimentalmente as leis de Newton; jun/2018.

Laboratório das Leis de Newton - Conectar obrigatoriamente teoria e prática;

KLEIN, L. F. Educação jesuíta que e pedagogia - Reconhecer tipo deinaciana. vínculoSão está sendo estabelecido Paulo: Edições Loyola, 2015. com o tema estudado. VILLANI, A. Considerações sobre pesquisa em ensino de Ciência: a interdisciplinaridade. Revista Brasileira de Ensino de Física. v. 3, n. 3, p. 68-88, set. 1981.

- Repensar suas concepçõe movimentos observados - Refletir a construção histó estudado e como isso infl - Considerar a não neutrali

proposta de aproximar a Pedago“saborear as coisas internamente”: contato com o gia Inaciana da área de Ensino de objeto de estudo por meio dos sentidos, da imaginaAristóteles Vs. Newton Física. Trata-se de um dos modos ção, dos sentimentos e da vontade do estudante. Debate qual estudantes de no abordar o PPIdefendem com estudanas ideias de um dos pensadores Experiência tes do Ensino Médio, que venha Soraya Rodrigues Kulicheski é graduada em Licenciatura em Física a promover - Repensar suas concepções sobre aos formação integral e mestre em Educação pela UFPR. movimentos observados no cotidiano;mas certamente dos estudantes, Especializada em Pedagogia Inaciana, pela - Refletir a construção histórica do conhecimento Unisinos, também tem experiência na não o único.

Debate no qu as ideia

Aristóteles

estudado e como isso influencia sua vida; - Considerar a não neutralidade da artigo: ciência. comente este

- Abordagem de situações dos estudantes; - Alternativas incorretas: er comuns entre os estudan - Debate das dúvidas que s do questionário.

comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

O significado, a importância e as implicações do que aprendeu em sua própria vida. A promoção de uma vida melhor para os demais culmina em ações balizadas pelo modo de proceder inaciano.

Reflexão

11 ques

Questionário Dinâmica aplicada à vida real

Indicações

Ação

Propaganda sobre o uso consciente do cinto de seguranç

área de Física, com ênfase em Ensino de Física, Laboratório Didático e Formação de Professores. Atualmente, é professora no Colégio Nossa Senhora Preservação da vida e Medianeira. sua relação com conceitos da dinâmica

- A segurança no trânsito e as Leis de Newton; - Busca pela promoção da justiça e preservação da vida; - A criação de material de divulgação do uso do cinto de segurança necessita fundamentalmente que o estudante se sensibilize com o outro. “O amor demonstra-se com fatos, não palavras”. A mudança que o estudante incorpora em sua vida e se dispõe a oferecer à sociedade, tornando-a mais justa e solidária.

Criação de um exercício sobre sistemas mecânicos com base em imagens do cotidiano

O contexto rea Conceitos apor

as representações abstratas dos Educação jesuíta- eRelacionar pedagogia inaciana | Luiz Fernando Klein sistemas mecânicos às situações cotidianas que as originaram;

Confira as atividades

- Religar concepões e práticas acerca que das aponta para a dimensão do sentido da Com foco à visãoteóricas educativa jesuíta, Avaliação leis de Newton e suas aplicações; vida humana, o autor deste livro demonstra a manifestação desta pedagogia - Exercitar a pesquisa e a autopercepção. centrada na pessoa, que busca sempre a excelência humana. Diagnóstico pessoal do estudante acerca daquilo que incorporou em sua vida; tomada de consciência do progresso e crescimento integral (cognitivo, socioemocional e espiritual).

Práticas interdisciplinares na escola | Ivani Fazenda Esta obra apresenta práticas docentes interdisciplinares variadas, da pré-escola à pós-graduação. Anuncia novas formas de analisar e pesquisar o fenômeno educativo, novas formas de escrever sobre educação.

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PROJETO LYRICS:

o estudante no centro do processo Por Anna Carolina Legroski e Michele Maria Nasser Cavalheiro

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mediação


Com o intuito de promover o intercâmbio entre conceitos da Língua Portuguesa e da Língua Inglesa, proposta multidisciplinar e multinível revela aptidões dos estudantes O projeto Lyrics originou-se em

tora. Em um nível prático, na Lite-

2017, durante a aplicação de ativi-

ratura, o trabalho de manipulação

dade multidisciplinar e multinível

de canção se encaixa perfeitamen-

no estudo colaborativo do con-

te na abordagem do texto poético,

traturno, quando começamos a

lidando com reconhecimento de

pensar em algumas propostas que

padrões sintáticos, semânticos, rít-

unissem os componentes de Lite-

micos, ao mesmo tempo em que

ratura – um braço da Língua Por-

trabalha com camadas de leitura,

tuguesa – com a Língua Inglesa,

pensamento abstrato e linguagem

dados os pontos de contato cur-

poética. O componente da Língua

riculares, bem como similaridades

Inglesa se utiliza da língua materna

entre práticas metodológicas com

e todas as suas características fo-

resultados produtivos em sala.

néticas, semânticas e lexicais para

Além da oportunidade, consideramos também a onipresença da língua inglesa no cotidiano dos nossos estudantes, como língua

vivenciar de forma similar, mas em menor escala, o trabalho com o pensamento abstrato e a linguagem poética naquela língua.

de integração com produtos cultu-

Valendo-nos dessas interse-

rais internacionais. Falamos, aqui,

ções, em três anos de prática, os

de músicas, filmes, séries, livros e

estudantes foram organizados em

games que representam uma par-

grupos heterogêneos, com inte-

te indissociável de suas vidas. Pa-

gração multinível, para fomentar

receu, então, natural abrir espaço

a troca e o aprendizado tanto em

para esse sistema de referências,

termos cognitivos quanto em ter-

convidando-os a assumirem o pro-

mos socioemocionais. Sua primei-

tagonismo em um trabalho de ma-

ra responsabilidade é sugerir três

nejo linguístico.

opções musicais de seu repertório

O projeto Lyrics se insere, portanto, na convergência entre texto lírico, componente programático de Literatura, e a versão e tradução, abordadas pelo componente de Língua Inglesa. Enfatizamos que todos os conteúdos abarcados, no que representa a linguagem poética ou conotativa, são

ofensiva ou discriminatória, e que sua versão represente um desafio para o grupo. Sob esse aspecto, a atividade prevê a possibilidade de modulação de sua dificuldade, pois, como cabe aos estudantes a escolha de sua música, eles podem tanto optar por uma letra complexa e por um ritmo rápido (um exemplo seria um rap do Eminem ou dos Racionais MCs, dado seu grau de complexidade); ou optar por uma letra simples, predominantemente literal, dentro de um ritmo lento, como o reggae ou um rock balada. De toda forma, qualquer nível de complexidade é válido, mas é importante que os grupos articulem o trabalho, considerando suas capacidades, habilidades e limitações. Após essa etapa, seguimos para o trabalho com a letra da canção. Nesse momento, precisamos nos assegurar de que os estudantes dominem o nível semântico da

e preferência, compostas na língua de partida (em 2017 e 2018 fizemos a versão do inglês para o português e, em 2019, o contrário), para estabelecer uma negociação com as educadoras. Assim, podemos intermediar a melhor opção em termos de complexidade e desafio que cada letra representa.

uma constante nos dois compo-

O combinado é que todos os

nentes, sendo evocados no trato

ritmos e procedências sejam vá-

cotidiano com a competência lei-

lidos, desde que a letra não seja

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letra, sendo capazes de compre-

recursos virtuais e tecnológicos

ender desde a mensagem geral

como auxílio para efetivar a apren-

até as expressões idiomáticas, ou

dizagem no contexto educacional

demais conotações. Tão somente

é também trabalhada nessa eta-

com esse conhecimento é possível

pa, ou seja, o Google Tradutor ou

que aconteça a tradução e a ver-

qualquer outra plataforma/aplica-

são, do contrário, corre-se o risco

tivo de tradução serve como ferra-

de operar com uma tradução lite-

menta no processo de construção

ral, que se perderá dentro do con-

do conhecimento e não como re-

texto lírico, por não estabelecer

curso fim. A proficiência em língua

conexões próprias com a intenção

para conversar com os estudantes

estrangeira também diz respeito à

original da composição e não será

sobre seu trabalho, mostrando

capacidade de compreender ex-

capaz de passar uma mensagem

escolhas que precisou fazer para

pressões dentro da semântica e da

coerente na língua de chegada.

manter a mensagem ou a forma

pragmática.

das letras originais e, também,

Analogamente, seria o equiva-

A etapa tradutória é iniciada

demonstrar, com canto e violão, o

lente a confiar no Google Tradutor

com a busca pela manutenção

produto final de uma das suas tra-

para uma tradução da música “Hit

do sentido da letra, pressupondo

duções. Essa participação foi fun-

the road, Jack” de Ray Charles,

alterações e adaptações, para ser

damental para que os estudantes

palatável ao público. Por exemplo,

observassem, na prática, como se

na música de Vanessa Carlton,

utilizar dos meios disponíveis para

“Thousand Miles”, no trecho em

efetivar a tradução/versão da can-

que ela canta sobre a distância

ção escolhida.

sobre uma discussão de casal em que Jack é mandado embora. Ao utilizar a ferramenta de tradução do Google tão somente como fim, que por sua barreira de parâmetros funcionais considera as palavras de forma isolada, e não dentro do contexto em que estão sendo usadas, obtemos: “acerte a rua, Jack”, algo vazio de significado dentro do contexto da letra. Nesse caso, para que fizesse o sentido devido, a expressão precisaria ser transformada em algo reconhecível pelos falantes brasileiros, tal como: “vá embora, Jack”, “sai fora, Jack” ou, ainda, “vaza, Jack”, dependendo da comunidade de chegada. Obviamente, a habilidade de utilizar

que poderia percorrer pela pessoa amada “Cause you know I'd walk / A thousand miles/ if I could/ just see you/ tonight”, a milhagem teria que virar uma quilometragem hiperbólica o suficiente para fazer sentido imediato em português (mil milhas são 1.609,34km, mas compreende-se que é apenas um número absurdo para ser percorrido a pé, então não é a quantidade que importa, mas o impacto gerado por ela): “pois você sabe que eu andaria/ mil quilômetros/ se pudesse/ só te ver/ hoje”.

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rada e vertida para o português, ocorre a etapa técnica de manutenção da estrutura poética, tendo em vista que repetições, rimas ou outras sonoridades são consideradas elementos propositais e, portanto, devem ser respeitados, considerando as peculiaridades fonéticas da língua de chegada. O grande auxílio vem da própria melodia da música, que determina a quantidade de sílabas que cabem em cada verso. Seria impossível fazer a frase “ops, eu fiz novamen-

contamos

te” caber no tempo do refrão de

com a participação do educador

Britney Spears. É necessário, pois,

Diego Zerwes, pesquisador e tra-

substituir palavras, reorganizar es-

dutor do músico Leonard Cohen,

truturas sintáticas e lançar mão de

Nesse

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Depois da mensagem recupe-

momento,


outros recursos linguísticos para que a letra vertida possa ser cantada de maneira harmônica, como se fosse a música original. O projeto é entregue em forma de vídeo clip, produzido e editado de acordo com as habilidades técnicas do grupo. Já, para a avaliação, utilizamos como critérios a manutenção do significado e da forma, tendo em vista a comunidade de chegada e levando em consideração toda a complexidade e apanhando de escolhas feitas pelos estudantes-tradutores ao longo do percurso. É provável que a principal aprendizagem desse projeto seja a escolha. Os estudantes escolhem o nível de complexidade e o aspecto da letra original que irá predominar: o sentido ou a forma.

Essa também é uma escolha que se faz, levando em consideração o conjunto de habilidades dos integrantes do grupo, que podem optar por se manterem em sua zona de conforto, ou podem extrapolar seus limites, buscando dominar outros aspectos técnicos. É válido destacar que as habilidades adquiridas no processo do Lyrics são, sem dúvida, utilizadas durante a progressão acadêmica dos estudantes, uma vez que é fomentada a capacidade de ressignificação dos resultados formatados, obtidos por ferramentas de estudo, e de adaptar escolhas em busca da aprendizagem completa, que começa a se efetivar produtivamente em cada estudante envolvido no projeto.

Anna Carolina Legroski é doutoranda em Letras, pela UFPR e mestra em Letras, com ênfase em Estudos Literários, pela UFPR. Mestra em Traduction Littéraire et Édition Critique, por Lumière Lyon 2, bacharela em Estudos Literários Franceses e graduada em Letras-Português pela Universidade Federal do Paraná. Atualmente, é professora de Literatura no Ensino Médio do Colégio Medianeira (CuritibaPR). Pesquisa e trabalha com leitura, mediação de leitura, letramento literário. Michele Maria Nasser Cavalheiro é graduada em Licenciatura Português / Inglês pela Universidade Federal do Paraná (2000). Trabalhou como Redatora Bilíngue Plena na Companhia Paranaense de Energia por 4 anos (2008-2012). Atualmente, é professora de Inglês para Ensino Médio no Colégio Medianeira, é também é Sempre-Aluna.

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Indicações A identidade cultural na pós-modernidade | Stuart Hall O propósito deste livro é explorar algumas das questões sobre a identidade cultural da modernidade tardia e avaliar se existe mesmo crise de identidade, em que ela consiste e em que direção está indo. Stuart Hall introduz certas complexidades e examina alguns aspectos contraditórios que a noção de descentração do sujeito desconsidera.

Moldando um mundo digital: fé, cultura e tecnologia computacional | Derek C. Schuurman Neste livro judicioso e oportuno, Derek Schuurman fornece uma breve teologia da tecnologia, fundamentada na tradição reformada e orientada pelos grandes temas bíblicos: criação, queda, redenção e nova criação. Ele combina o estilo conciso e acessível com a análise cultural e teológica perspicaz.

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De plebeia a “rainha do papel de bala” A artista popular Efigênia Rolim é conhecida por utilizar papel de bala como elemento principal de suas obras, criando os mais diversos artefatos Por Priscila Murr | Fotos Wagner Roger

O

que é a vida senão uma grande

experimentação?

Ainda no século XVIII, o

químico francês, Antoine-Laurent de Lavoisier, anunciava: nada se cria ou se perde, mas tudo se transforma. A (r)evolução humana parte desse princípio. Diariamente, deparamo-nos com ‘n’ situações às quais empregar essa máxima. Em um mundo globalizado, e diante do frenesi do dia a dia, a simplicidade, o essencial se torna tão “invisível aos olhos”, que acaba nem sendo percebido. Mas, como toda mãe, em algum momento da vida alerta ao filho: ninguém é igual a todo mundo. E é nisto que consiste a singularidade do homem, cada um é cada um, com suas particularidades infindáveis. Singular, a mineira Efigênia Rolim cria, recria, transforma.

Utilizando aquilo que aparentemente seria destinado à lata de lixo, seu trabalho dá vida nova a papéis de bala, garrafas de plástico, sacolas, retalhos de tecido e couro, fitas, pedaços de borracha, caixas de leite e de pizza, sementes, tudo o que for reciclável... A criatividade guia o processo produtivo e a existência material é ressignificada. Bem de pertinho, a gente consegue perceber a mágica: o abracadabra mescla realidade e imaginação. É um mundo inteiro novo na frente dos olhos. A capacidade de produzir, a partir de elementos desprezados por muitos, suscita reflexões fundamentais à atuação humana preocupada com a justiça e o cuidado com a nossa casa comum. O ano era 1931 e, no dia 21 de setembro, Efigênia Ramos Rolim

vinha ao mundo, nascida na Zona da Mata, no município de Abre Campo, em Minas Gerais. Na década de 1960, migrou para o Paraná, onde trabalhou no campo. Tempos depois, em 1971, chegou a Curitiba. Enfrentou dificuldades comuns a qualquer migrante. Viveu em condições escassas em meio à pobreza. Mas, diferente do príncipe que vira sapo, a plebeia triunfou, passando à "Rainha do Papel de Bala". Artista por vocação, tem habilidades ímpares. Seus trabalhos têm um quê de paixão. Não há empecilhos no caminho, sua matéria-prima é fabricada a partir do amor pela vida! Reconhecendo seus rumos desde muito jovem, atua também como contadora de histórias, é narradora onisciente de sua própria jornada. E foi o bri-

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lho ofuscante de um papel de bala

esia, sem nem precisar de vari-

sua alegria constante, a artista,

que hipnotizou Efigênia. A luz da

nha de condão! Nada escapa aos

que também é escultora, perfor-

alma refletida naquele pedacinho

olhos de Efigênia, suas produções

mer, estilista e artesã, ensina que

plástico, pela refração perfeita

remetem ao dia a dia, à rotina e à

a vida é bela, sim – mas só se a

das ondas luminosas, num dia en-

simplicidade, à doçura do mundo,

enxergamos dessa maneira. É por

solarado qualquer de 1991: “big

enfim. E é assim, pelo desafio da

isso que, além de produzir, Efigê-

bang”, um universo todo novo se

transposição dos limites da imagi-

nia faz questão de estar pertinho

criou. Atordoada, pensou ser uma

nação humana que ela cria obje-

de cada uma de suas obras para

joia perdida ao chão. Se fosse, “ia

tos de todos os tipos e, de forma

explicá-la com um verso, uma mú-

usar e pronto, a história ia aca-

absolutamente original, imprime

sica, uma dança…

bar”. Por obra do destino tão sa-

um novo significado ao corriquei-

bido: era um papel de bala. Então,

ro, por meio de materiais que se-

a história continuou.

riam destinados à lata de lixo, por

Transbordando amor, nada abala sua forma otimista de ser.

serem vistos como descartáveis, considerados feios.

Da epifania com um papel de bala, o prenúncio. Ela imediatamente percebeu o sinal. E não apenas por ser criativa, ou porque que gostasse de trabalhos ma-

Suas rimas são parte de um cân-

A ludicidade com a qual traba-

nuais e tivesse certa inclinação à

tico intermitente de gratidão pela

lha é a mesma empregada em sua

arte. Mas, de tão simbólico aque-

vida. Vida essa da qual não tem

vida. Entre risos, sorrisos e cam-

le papelzinho de bala vazio… a

medo. Aliás, fragilidade de prin-

balhotas, Efigênia reúne os restos

representação mais que pura de

cesa de conto de fadas nada tem

da realidade, amarra aqui, cola

algo “sem recheio”, tomado pelo

a ver com a vitalidade dessa pro-

ali, e tchanam… o mundo é ou-

vazio: quase que um ser humano

tagonista. Criadora da atmosfera

tro, novinho em folha, ou melhor,

sem alma. Então, ela precisava de-

perfeita, transforma tudo em po-

em papel de bala! Cantarolando

volver vidas! Por isso, cada criação

` Pensou ser uma joia perdida no chão. Se fosse, “ia usar e pronto.” mas era um papel de bala. Então, a história continuou.` `

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é repleta de um universo mágico colorido, envolta numa historicidade imaginária inenarrável por progressão textual. O valor da vida impregnado, num repertório místico, denotando a mescla entre sonho e realidade. E a própria vida se materializou como razão de viver. Cada criatura é livre para ser o que couber. Com seu olhar fantástico, a artista transforma lixo em esculturas de bonecos, palhaços, animais e objetos variados, todos idealizados por ela. Não à toa, é portadora do título de “Cidadã Honorária da Cidade de Curitiba” e já recebeu a mais alta honraria concedida pelo Ministério da Cultura aos brasileiros: a Ordem do Mérito Cultural (2008). É dona do Prêmio de Culturas Populares (2007) e também foi premiada no

“Top View 2018 - Personalidade das Artes”. Além disso, tem sua trajetória narrada no livro “A Viagem de Efigênia Rolim nas Asas do Peixe Voador”, de Dinah Ribas Pinheiro. Digna de produção cinematográfica, já foi tema de dois documentários. O primeiro, intitulado “Rainha do Papel” (1999), dos paranaenses Estevan Silveira e Tiomkim; e o segundo, “O Filme da Rainha” (2006), do argentino Sérgio Mercurio. Como atriz, participou dos curtas-metragens “O Traste” e “Logo será Noite” (ambos de 2001). Para além desse universo, é autora de oito livros de poesia e, desde a década de 1990, transita por diversos espaços do cenário artístico e cultural da capital paranaense, tais como a Feira

do Poeta, a Ferinha do Largo da Ordem e ateliês coletivos, como a Galeria de Arte Reciclada “As três rainhas”, a “Sala do Artista Popular”, da Secretaria de Estado da Cultura, e o Museu Oscar Niemeyer (MON), onde possui acervo fixo atualmente. E ela nunca para! Com quase um século de vida, sua arte é muito mais do que retalhos, mas a garantia da valorização dos processos da cadeia produtiva humana. Remete à consciência ambiental, ao cuidado para com o lar onde se habita. A legitimidade da artista se destaca pela seriedade com a qual encara a arte, mas, ao mesmo tempo, pela forma como brinca com ela, faz de Efigênia um ícone a ser lembrado. De tanto amor pela vida de simplicidade e doação ao próximo, ela mesma se materializa obra de arte.

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Fazendo arte a partir de materiais recicláveis, Efigênia Rolim provoca a criatividade dos estudantes, demonstrando novas possibilidades estéticas. Sua participação no Colégio Medianeira, no ano de 2013, resultou numa verdadeira aula acerca da importância da reciclagem para a conservação do mundo em que vivemos. Apoiada na ideia da sustentabilidade, a autora anuncia um caminho possível à conservação do meio-ambiente. E sua obra fala por si só: é um legado de consciência e dedicação. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

Priscila Murr é Jornalista, graduada em Comunicação Social - Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), e mestra em Estéticas Contemporâneas, Modernidade e Tecnologia – com bolsa Capes/Fundação Araucária – pelo programa de PósGraduação em Estudos de Linguagens (PPGEL) da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Atualmente, é jornalista no Colégio Medianeira.

Indicações A viagem de Efigênia Rolim nas asas do peixe voador | Dinah Ribas Pinheiro A obra conta a história da artista popular Efigênia Rolim. Transformando em arte tudo o que a sociedade de consumo descarta, a Rainha do Papel de Bala é biografada, transformando-se em símbolo de defensa do planeta.

O que é arte? | Leon Tostói Para Tolstói, a boa arte deve comunicar bons sentimentos ao invés de mostrar o que é belo, pois ambos são contraditórios e não podem conviver em harmonia. O bem é eterno e a beleza é temporária.

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ISLÂNDIA

ELDFELL: A MONTANHA DE FOGO Dois geógrafos e um jornalista encaram uma aventura no Atlântico Norte, desvendando os mistérios da Islândia Por Francisco Carlos Rehme

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trilha sobe suavemente pela crista. A superfície externa de um vulcão como o Eldfell, na ilha de Heimaey, não apresenta declividade tão acentuada. A aparência tranquilizadora de seu exterior parece desconhecer a alma convulsa do vulcão. Mas, basta cavar com os dedos um pouco do solo escarlate do topo, na borda da cratera, para sentir o hálito morno baforado das entranhas da Terra. Gases quentes e sulfurosos ainda exalam do solo quase sem vida de Eldfell, cerca de cinquenta anos depois da tragédia.

A

Era janeiro de 1973, quando a fúria de Eldfell, a montanha de fogo na língua islandesa, soterrou de lavas e cinzas grande parte da ilha e obrigou seus 5 mil moradores a atravessar em fuga o oceano até a costa da Islândia, dez quilômetros ao norte. Alguns voltaram e, em embarcações pesqueiras, participaram de uma luta titânica e improvável: deter o avanço do fluxo de lavas que descia por um dos flancos do Eldfell e que, após consumir parte da cidade de Vestmanneyjar, aproximava-se do porto e de seus prédios comerciais (a

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ilha de Heimaey tem na pesca a base de sua economia). Por meio de mangueiras, os destemidos tataranetos de vikings, por vários dias bombeavam água do mar para resfriar o front da lava... Acreditem: o rio de fogo foi detido. Meses depois, a cidade e a economia de Heimaey já estavam sendo reerguidas. Duzentos e dez metros acima da pequena cidade, lá estávamos nós, dois geógrafos e um jornalista, curitibanos da gema (ou seria da gemada com quentão, isso que um dia já foi tão curitibano!), contemplando tudo, extasiados. De um lado (no noroeste da ilha), a cidade, que continua com cerca de 5 mil habitantes. De outro, ao norte e nordeste, campos de lava, de rochas nuas e outras semicobertas pela tundra. Contraste de verde pálido com a rocha escura e férrea. Em poucos anos, a natureza vegetal borda tapetes sobre a pedra vulcânica. Ao sul, outro cone vulcânico, um pouco mais alto e até, que me desculpe o Eldfell, mais elegante (bem, ao menos, conforme os critérios de estética vulcânica). É o Helgafell. Mais ao sul, fora dos domínios de Heimaey, estão outras tantas ilhas. Cerca de uma dezena delas, todas menores e com formas bizarras. A última é Surtsey, cerca de 15 km mais ao

sul, pouco se revela... apenas se insinua, entre o céu enevoado e o espelho grisalho do Atlântico Norte. Alguém que tenha subido ao topo do Eldfell há 60 anos e voltado seu olhar para a mesma direção na qual, agora, vislumbro a ilha de Surtsey, não a teria identificado nem se o céu estivesse cristalino. Simplesmente porque Surstey não existia. Como um bebê que vem ao mundo externo abrindo a goela com seu choro de fome (ou de “pera aí que eu quero voltar pro aconchego”), Surtsey emergiu escandaloso do fundo oceânico em 1963. Fumegante e convertendo lava em rocha, hoje a ilha possui 140 hectares (cada hectare equivale a uma área de 100m por 100m) e se eleva a mais de 150 metros sobre o nível do mar. Nesse meio século de existência, a superfície de Surtsey recebeu as primeiras rajadas de ventos oceânicos e as primeiras gotas de chuva, bem como a ação da alternância de temperaturas. Sob essa conspiração da natureza, a rocha aos poucos se racha, fragmenta-se. Sementes de plantas e pequenos animais chegaram à costa e a ilha começou a ser colonizada. Desde que se ergueu para fora da água, a ilha de Surtsey só

O Helgafell, visto das encostas do Eldfell. Foto: Rehme (2019).


pode ser visitada por cientistas e devidamente trajados como se fossem astronautas. Nenhuma interferência, nenhuma contaminação deve ser levada à ilha, pois Surtsey é um laboratório da vida na Terra. É um modelo em escala pequena do que ocorreu há 3,8 bilhões de anos, quando protozoários e algas unicelulares deram a largada para a maratona da vida planetária. Heimaey, as demais ilhas do arquipélago de Westman e, enfim, toda a Islândia são incríveis laboratórios em que a dinamicidade do planeta e as artimanhas do tempo e das esculturas geológicas se revelam. Nos habituamos a observar paredões rochosos, como o da Pedreira do Tanguá, em Curitiba, ou do Morro do Pão de Açúcar, junto à Enseada do Botafogo, no Rio de Janeiro e automaticamente compreendermos que aquelas superfícies ígneas datam de mais de 2 bilhões de anos... As pedras nos parecem sempre tão... antigas, tão pré-cambrianas... tão... tão da idade da pedra, ora! Mas, eis que nos deparamos, os três absortos em pensamentos, com aquelas rochas meio esfareladas, liberando vapores e que são mais jovens do que nós... Muitas delas de fato nasceram há menos de 50 anos com o resfriamento da lava ejetada pela cratera do

Eldfell. E com meio século de vida mineralizada, as jovens rochas esparramadas nesse novo leste de Heimaey, formado justamente pelo resfriamento da lava extravasada da encosta do vulcão, já são o substrato da rasteira vegetação que nela se fixa. A oeste, conseguíamos divisar o camping em que nos estabelecemos. Majestosamente alojado no interior de um anfiteatro, parte de uma caldeira vulcânica, lá está nosso simpático, limpo e bem cuidado habitat por dois dias. Rajadas de vento frio e úmido lembram que, embora no verão, estamos quase sobre o Círculo Polar Ártico, a mais de 65º do Equador, ou cerca de 7.215Km ao norte desse paralelo que salomonicamente divide o mundo. Solo quente e seus vapores de enxofre que sugerem que a terra mastigara dentes de alho, e o ar gélido de cristalizar a ponta do nariz – esses ventos nórdicos têm o dom de midas, mas ao invés de ouro é em gelo que a tudo transformam, nos alertam: hora de descer as vertentes de Eldfell. Não sem antes dar uma última contemplada na pacata cidade de Vestmanneyjar a seus pés. Pacata, serena, mas, desde 1973, prevenida: qualquer ronco da terra e a única alternativa é zarpar para a ilha maior, a Islândia.

Pelo canal de acesso ao porto na ilha de Heimaey, o retorno à ilha principal da Islândia.

Rochas e solo vulcânicos do topo do Eldfell.

O centro urbano da ilha de Heimaey e seus 5 mil habitantes. Na erupção de 1973 do Eldfell, 2/3 da cidade foram cobertos pelas lavas e cinzas incandescentes.

Painel na trilha para o Eldfell exibe o fluxo de lavas e a deposição de cinzas e lápilis sobre Heimaey, em 1973.

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Horas depois, apoiado sobre a amurada do ferry-boat, um tanto saudoso, via a imagem da ilha de Heimaey, insinuada entre lençóis de nevoeiro e fachos da luz solar, aos poucos se esvair, como uma miragem. Ora de aportar em Landeyjahöfn, apenas um terminal para o ferry, para novos fascínios na terra do gelo e do fogo, a Islândia. Terra de gelo (Eisland, no idioma nórdico) e, paradoxalmente, do fogo! Parte da ilha, que tem a metade do tamanho do território paranaense, é coberta pelas maiores geleiras da Europa. Delas, blocos sólidos se fragmentam em uma laguna e poucos quilômetros adiante fluem para o mar. São os icebergs, que se chocam contra as ondas do Atlântico Norte, uns partem à deriva da corrente, enquanto outros encalham logo à frente, nas areias negras como breu, negras dos resíduos vulcânicos. Gelo e fogo de novo se encontrando. Depois do inverno, quando, enfim, o dia clareia para perdurar por horas a fio, o degelo

forma fluxos vorazes de água líquida. Cascatas despencam pelas encostas das montanhas, quase todas vulcânicas... No solo, durante o verão, tons de verde exibem a tundra formada principalmente por musgos, líquens, algumas gramíneas e um jardim graciosamente florido. No ar, costurando voos pelo céu, uma diversidade de aves em que se destacam os puffins, seja pela sua formosura ou pelo voo meio desajeitado (precisa bater rapidamente suas pequenas asas para deslocar seu corpo sobre as águas e, invariavelmente, descansar em colônias, sobre as rochas das falésias). A Islândia nos lembra que nossa casa comum é um planeta vivo, totalmente dinâmico e fascinante, cujas paisagens mudam por vezes mais rapidamente do que imaginamos. Mesmo a atividade vulcânica e outras forças geradas nas entranhas da Terra, têm sua digna função regeneradora de solos,

da vida vegetal, que por sua vez atrai a fauna... e o ciclo sempre se reinicia... Os cenários rústicos de um dos países de maior desenvolvimento humano (ou seja, de melhora qualidade de vida e de menor desigualdade social), de acordo com a ONU, nos convidam a algo que não devíamos tão facilmente esquecer: religarmo-nos com a natureza. Viagens ou expedições fotográficas como tal, demandam e se plenificam por meio da contemplação, essa singela forma de oração ao tempo, ao fogo, ao gelo, à vida... à majestosa criação divina. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

Francisco Carlos Rehme é geógrafo e professor de geografia. Especialista em Geografia Física - Análise Ambiental, pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e em Currículo e Prática Educativa, pela PUC-Rio. Além disso, é Mestre em Geografia, em Dinâmica da Paisagem, pela UFPR. Atualmente, é professor de geografia da 1ª e da 3ª série do Ensino Médio no Colégio Medianeira.

Indicações O grande bazar ferroviário | Paul Theroux Nestas páginas o americano Paul Theroux conta a façanha de cruzar a Europa e a Ásia, saindo da Inglaterra e chegando ao Japão, com o Expresso do Oriente e, retornando ao Velho Continente a bordo do Expresso Transiberiano, registra suas impressões sobre os países pelos quais passou e sobre os tipos com os quais cruzou durante a viagem.

Cem dias entre céu e mar | Amyr Klink "Cem dias entre céu" e mar é publicado na segunda metade do século XX (1985), pelo escritor brasileiro Amyr Klink. O livro narra viagens em barco pelos oceanos, tratando da rota que durou cem dias cursada pelo próprio autor da obra, o qual enfrentou tempestades, exaustão pelas várias horas gastas remando para chegar ao seu destino: a Bahia.

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CINEMA , JORNALISMO, FAKE NEWS E O PACTO CIVILIZATÓRIO Explorando um enredo baseado em fatos reais, a minissérie americana “Inacreditável” revela o universo midiático contemporâneo e o compromisso com a verdade Por Maurini de Souza

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“E a vida imita a arte” diz o ditado popular. Na verdade, quando voltamos aos estudos sobre arte (voltamos muuuito), encontramos, na Grécia Antiga, Aristóteles afirmando que, ao contrário, a arte é que é a imitação (mímesis). Essa imitação (ou recriação, de acordo com algumas leituras) não tem o compromisso de apresentar algo com um referente no mundo, um evento singular “real” – Luckács, filósofo húngaro, observa que a arte se compõe, assim, das características “particulares” (contrariando as “singulares”) de cada tempo – a cultura, as instituições e seus desdobramentos. A liberdade artística é o dominante. Quando assistimos, em um filme, extraterrestres conversando em inglês, participamos imediatamente de um pacto ficcional, adentramos o mundo verossimilhante que se apresenta na tela e nos divertimos, sofremos, choramos, refletimos, mas cientes desse contrato. Assim, quando um filme se anuncia como “Baseado em fatos reais”, ele nos propõe um novo pacto, em que, diferente de um mundo verossimilhante, a imitação se dá com elementos – ações – que possuem referentes no mundo e serão articulados com mais ou menos rigor quanto ao teor de verdade que propõe. Esse fato, porém, não torna o filme um

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documentário ou uma reportagem jornalística. Existem barreiras entre as denominadas ficção e realidade que nos acompanham enquanto civilização e, na maior parte das vezes, transitamos tranquilamente por esses espaços.

mulheres estupradas sejam trata-

A minissérie americana Inacreditável, com oito episódios, dirigidos por três profissionais diferentes (três por Lisa Cholodenko, três por Michael Dinner e dois por Susannah Grant), é um exemplo. Veiculada pela Netflix, traz a história de Marie, uma adolescente estuprada no ano de 2008, mas, devido à incompetência policial, além de ter seu testemunho desacreditado e, por pressão, desmentido, sofreu um processo por acusação de ter enganado a polícia. Alguns anos depois, em 2011, devido ao trabalho dedicado de duas policiais, que investigavam ataques com o mesmo estuprador – ele seguiu, depois de Marie, estuprando mulheres em diferentes lugares, aproveitando-se do isolamento entre as diferentes jurisdições, que não possuíam um sistema de compartilhamento de crimes – ele foi preso. O site "M de Mulher" apresenta um resumo de Inacreditável sob outra ótica: “E essa é uma história sobre mulheres. Mulheres estupradas. Mulheres desacreditadas. Mulheres que, ao contrário dos homens à sua volta, batalham para que as

que não possui a obrigação de se

das com dignidade – e para que seus dramas recebam a atenção que merecem.” Independentemente da leitura que se teve da obra, entende-se que ela trabalha com acontecimentos reais, mas deter neles (por isso a informação: “Baseado...”). Essa opção de filmes nasce normalmente do jornalismo. Inacreditável foi concebida a partir da reportagem sob o título “Uma história inacreditável de estupro”, assinada por T. Christian Miller, da instituição ProPublica and Ken Armstrong, do Projeto Marshall (disponível, em inglês, em https:// www.propublica.org/article/false-rape-accusations-an-unbelievable-story). Os articulistas escreveram a reportagem em formato de crônica jornalística. Eles entrevistaram Marie; as policiais que investigaram o caso e prenderam o criminoso – um veterano da infantaria do exército americano, que foi condenado a 327 anos de prisão; o próprio Marc O’Leary, estuprador de 28 mulheres dentre 2008 e 2011, e vários outros. Conforme relatam em “Como nós fizemos a reportagem ‘Uma inacreditável história de sequestro’”. A reportagem apresenta, ainda, o relatório do FBI sobre os


estupros assinalados como infundados pela polícia de Lynnwood: 21,3% de 47 denúncias. Uma delas foi a de Marie. Ainda se lê, na matéria, a declaração da advogada da cidade ao jornal Herald, no processo aberto pelos danos causados à menina. Além disso, fotos das policiais, dos arquivos da investigação – incluindo o carro, as evidências recolhidas na casa do criminoso – da casa do criminoso, do próprio O’Leary, do registro de prisão e da prisão em que se encontrava. Elementos que, reunidos, apresentam à população informações sobre os fatos e recebidos como componentes de acontecimentos “reais”. No final da história, os jornalistas informam que, com o valor que recebeu após processar a cidade (150 mil dólares), Marie comprou um caminhão e se tornou caminhoneira, viajando por todo o país; era casada e, em 2015, esperava seu segundo filho. “Recentemente”, eles narram que ela visitou a delegacia e falou com o policial que a descredibilizou; ele pediu perdão e, “para Marie, ele pareceu sincero”. Na série, os diretores optaram trocar o caminhão por um SUV, em que ela coloca sua bicicleta, elemento que a acompanhou durante toda a série, mas que não é citada na matéria. A bicicleta é

uma composição da personagem que, necessariamente, não fazia parte da vida de Marie (ou pode ter sido incluída após a conversa entre o diretor e a pessoa em que a série se baseou). Alguns pontos da matéria são mantidos, outros alterados de alguma maneira; chama a atenção o biotipo das policiais: na série, a atriz que interpretou Stacy Galbraith se parecia com Edna Hendershot e vice-versa. Mas isso não é importante porque uma série de TV não é um órgão informativo. O pacto ficcional é dominante nesse universo. Como afirma Marcelo Costa, no seu trabalho “Francisco de Assis, o cinema humaniza o santo” (UFPR, 2018), os filmes históricos se confundem com a história do cinema no final do século XIX, mas somente passou a atrair a atenção dos historiadores, dentro de parâmetros estabelecidos, nos últimos 50 anos. Ele afirma que, apesar dessa aproximação, precisa-se levar em conta que “O drama histórico tem uma linguagem própria, metafórica e simbólica, (...) A história-ficção, que tem uma de suas formas nas obras cinematográficas, atende a alguns critérios de função e funcionamento, na construção do seu discurso: a escolha das informações está ligada ao presente; o princípio de organização das informações é estético e dramático;

a sua função explícita é o prazer”. Essa afirmação é também válida na comparação ao jornalismo – na relação entre ficção e informação, cada um deve permanecer em seu lugar e, quando se encontram (em filmes baseados em fatos ou em reportagens sobre produtos de ficção), devem ser claros quanto aos seus lugares, preservando os pactos firmados no caminhar civilizatório. A capacidade da população não especializada em nenhuma dessas duas áreas adentrar esses dois universos é fruto da cibercultura; para Henry Jenkins, no livro “A cultura da convergência”, as possibilidades trazidas pelas redes sociais articuladas pela Internet não descartam as mídias anteriores, mas se congregam a elas. Assim, quando se assiste um filme “Baseado em fatos reais”, buscam-se, na rede, elementos que compõem o entendimento e associações entre as diferentes mídias que coexistem em nosso tempo. É um pacto ampliado, menos exclusivo, mais influente, já que, em momentos, eles se cruzam – como neste artigo, em que o filme e a reportagem são trazidos à tona. Nunca, porém, tais tendências deveriam alterar os pactos construídos historicamente via conquistas de cidadania. O teor de verdade obtido pelo jornalismo

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é fruto do embate ininterrupto entre manipuladores da informação – que traziam à tona apenas elementos do fato que serviam para sustentar sua plausibilidade – e jornalistas que se pautavam por trazer elementos representativos da diversidade do acontecimento para, assim, fornecer à população informações fidedignas. Nos nossos dias, um terceiro grupo se observa e é objeto de inquietação. Utilizando-se, da ficção, de seu fundamento estético e liberdade de criação de universos não existentes a partir da imitação (recriação, mímesis) da realidade, em associação com o teor de verdade conquistado pelo jornalismo, as fake news se apresentam a uma população desprotegida por confiar nos pactos construídos no caminhar da História. Quando alguém reúne elementos díspares e os apresenta em contextos es-

pecíficos como jornalismo, sendo ficção, esse alguém é criminoso. A ruptura e o desprezo a tudo o que construímos, enquanto humanidade, nas áreas das artes e no âmbito informativo são as molas propulsoras desses fabricantes de barbárie. Seu produto vem de encontro com o que denominamos Cultura, o que nos diferencia do bestial a que fugimos enquanto sociedade. Neste sentido, é importante a reflexão quanto aos caminhos que desejamos trilhar. Antes de aceitar notícias fantasiosas e compartilhá-las por avaliá-las prazerosas ou interessantes, vamos pensar no tanto que já construímos de material prazeroso e interessante na área das artes e entretenimentos – teatro, literatura, pintura, cinema, fotografia, televisão – e que já foram consagrados em nossa civilização. Da mesma

maneira, antes de compartilhamos tal material por considerá-lo informativo, vamos refletir em quanta reportagem séria é produzida atualmente nas redes, nos informarmos das diferentes fontes de informação, de diferentes veículos de comunicação com os mais diversos cunhos editoriais e credibilidade pública. Assim, estaremos dando uma chance a mais para a sociedade que construímos e uma oportunidade a mais para nós mesmos em corrigir as tantas falhas que essa sociedade apresenta no caminhar da cidadania. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

Maurini de Souza é jornalista e doutora em Sociolínguística (UFPR). Atualmente é professora na Universidade Tecnologica Federal do Paraná (UTFPR) para o mestrado em Linguagens e as graduações em Comunicação Organizacional e Letras.

Indicações A detração: breve ensaio sobre o maldizer | Leandro Karnal Este livro trata daquele inescapável hábito, de toda hora, do ser humano falar mal do outro, seja do que esse outro fez ou disse, seja do que pretende fazer. A detração permeia nosso cotidiano sem que nos apercebamos dessa prática. São múltiplas as modalidades do maldizer e isso é o que aborda o autor Leandro Karnal.

O jornalista e o assassino | Janet Malcolm Pautando temas tão polêmicos quanto a ética do jornalismo e a liberdade de imprensa, este livro se tornou um clássico instantâneo sobre a relação entre jornalismo e poder. A obra conta a história de um médico condenado pelo assassinato da esposa e das duas filhas, que moveu um processo inaudito contra um jornalista que escrevera um livro sobre ele com base em entrevistas feitas durante o julgamento e na prisão.

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A LIDER ANÇA JESUÍTICA: uma história de inovação

Das origens de uma Companhia com visão única sobre o conceito de "líder" às ambições do mundo corporativo Por Priscila Murr

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singular, relativo a quaisquer feitos humanos, não está ligado à novidade, que se apresenta por meio de determinado contexto, mas sim pela qualidade relacionada ao fato. Quão extraordinário pode ser o amor para com o próximo? De que maneira a humanidade qualifica seus feitos? Que tipos de talentos regem a experiência humana no mundo? O que ordena a presença individual em detrimento de uma coletividade integrada? Como cultivar o lar onde habitamos? Esses são os questionamentos presentes na narrativa de Chris Lowney, no livro “Liderança heroica: as melhores práticas de uma companhia que há mais de 450 anos vem mudando o mundo”.

O

Ex-seminarista da ordem jesuíta, escritor, orador público e consultor de liderança, que nos dias de hoje atua na Catholic Medical Mission Center – maior organização de saúde sem fins lucrativos dos EUA, voltada para mulheres e crianças –, Lowney (2015) aborda

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a temática da “liderança”, permeando amplas áreas dos estudos sociais e políticos a fim de comprovar que ser líder não se configura como um privilégio para poucos, pois está para além de uma conceituação: é um modo de vida que pode ser escolhido por qualquer pessoa. Lançado em 2003, originalmente na língua inglesa, sob o título “Heroic leadership”, é o primeiro dentre os oito livros publicados pelo autor até o ano de 2020. Traduzido para o português por Ricky Goodwin, foi reimpresso pela Edições de Janeiro, em 2015. Liderança. Li-de-ran-ça. L-i-d-e-r-a-n-ç-a. Quatro sílabas, nove letras. O que será que essa simples paroxítona é capaz de fazer? Estaria sua raiz ligada a um mundo perfeito? Ou será que isso tudo não passa de um lugar-comum?! De fato, as respostas para essas perguntas vão ser muito diferentes para você e para mim. Cada indivíduo a enxerga de uma maneira singular. É uma questão de ponto de vista, de concepção existencial... É um misto de historicidade

e lugar social, gerando interpretação única. É mais que um estudo sob a ótica da gramática normativa. É subjetividade, interiorização de uma crença, um modo de vida, como alega Lowney (2015). A liderança não deixa de figurar no hall da multiplicidade. Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (HOUAISS, 2010), o sentido denotativo do substantivo feminino “liderança” aponta para “espírito de chefia” e “posição ou característica de líder”. Portanto, liderança remete ao estímulo de se estar à frente, orientando as atitudes, sistematizando os passos. Essa objetividade tem reflexos com relação aos critérios do discurso dentro de uma multiplicidade à vista. Porque as coisas do mundo são múltiplas, Lowney (2015) orienta seu olhar ao objeto em questão sob um ângulo definido: sua própria vivência. A partir de conceitos e preceitos comprovados por premissas registradas, o olhar acurado do autor demonstra sua experiência.


“A liderança não é definida pelo tamanho da oportunidade, mas pela qualidade da resposta” (LOWNEY, 2015, p. 29).

Assim, dando destaque à fonte rica de liderança relativa ao grupo de amigos que há 474 anos se juntou para fundar uma nova “empresa”, demonstra o sucesso. Em pouco mais de uma geração, passavam de mil jesuítas atuando em quatro continentes, configu-

Tendo como pano de fundo as práticas da Companhia de Jesus ao longo de seus mais de 450 anos, Lowney (2015) evidencia seu diagnóstico acerca das marcas perenes deixadas pelos jesuítas mundo afora. Apresentando uma análise inovadora, com base num estudo histórico minucioso, desmembra a conceituação e a aplica às práticas da Companhia. Como que numa aula magna, destacando os valores originais e atemporais dos jesuítas (autoconsciência, inventividade, amor e heroísmo), traça um panorama geral sobre a história da Companhia, e aponta lições variadas à vida pessoal, familiar, política e empresarial. O resultado: um livro para pessoas de qualquer crença, agnósticos e ateus.

meio de passagens descritivas, narrando os acontecimentos a fim de transportar o leitor à realidade desvelada.

rando o empreendimento religioso mais bem sucedido do mundo - e indiscutivelmente a companhia mais bem-sucedida de sua época. Foram pioneiros e foram desbravadores (LOWNEY, 2015, p. 285286). O autor ainda revela que, utilizando princípios que vão contra os estereótipos frios e autoritários das lideranças contemporâneas, os jesuítas têm como pilares a autoconsciência, a inventividade, o amor e o heroísmo para liderar com máximo aproveitamento. Ao longo de 320 páginas, Chris Lowney monta uma cronologia a partir do exame histórico com relação a uma companhia multicentenária e, fundamentando sua obra nas particularidades dos jesuítas, expõe o contexto por

“Os jesuítas fundadores lançaram sua companhia em um mundo complexo que, provavelmente, mudara mais nos últimos cinquenta anos do que nos mil anteriores. Soa familiar? Eles falam conosco não como peritos em lidar com um cenário antiquado do século XVI, mas como especialistas em extrair das pessoas desempenhos confiantes apesar de cenários mutantes e incômodos, em qualquer século” (LOWNEY, 2015, p. 20). Além dessa análise com relação aos feitos e ao sucesso dos primeiros jesuítas, Lowney (2015)

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evidência a relação entre tal sabedoria e as pessoas/organizações que desejem aprender a praticar a liderança de maneira completa e efetiva. Então, explorando detalhadamente os quatro valores únicos na criação de uma liderança com substância, autoconsciência, inventividade, amor e heroísmo, completa um mosaico de ganhos e perdas, pois, como frisa Lowney (2015, p. 20), “Mesmo os grandes tropeçam, e os tropeços dos jesuítas foram particularmente espetaculares”.

“Em pouco mais de uma geração, os jesuítas haviam se tornado o empreendimento religioso mais bem-sucedido do mundo, indiscutivelmente a companhia mais bem-sucedida de sua época" (LOWNEY, 2015, p. 287).

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Desmistificando estereótipos, o ex-seminarista analisa a contribuição dos jesuítas para a sabedoria sobre a liderança. Frisa que a postura deles com relação a isso sempre foi clara: em vez de discutirem liderança, vivem-na. Afinal, a liderança é processo contínuo que surge de dentro. Tem a ver tanto com quem se é, quanto com o que se faz no mundo. Portanto, não se configura num ato, mas na vida, num modo de viver ao qual estamos todos intrinsecamente ligados o tempo todo, para o bem ou para o mal (LOWNEY, 2015, p. 20). Embora os jesuítas não sejam conhecidos popularmente como peritos em liderança, seus métodos, sua visão e sua longevidade os colocam num patamar de líderes. E têm destaque por serem capazes de “compreender suas forças, suas fraquezas, seus valores e sua visão de mundo”; “inovar com confiança e se adaptar para abarcar um mundo em transfor-

mação”; “engajar os outros com uma atitude positiva e amorosa”; “energizar a si mesmos e os outros através de ambições heroicas” (LOWNEY, 2015, p. 37). Rápidos, flexíveis e abertos a novas ideias, o grupo seguidor de Inácio de Loyola, conforme Lowney (2015), encara o mundo de forma confiante, como que imbuídos de talento, dignidade e potencial de liderança. E, descobrindo esses mesmos atributos em seus semelhantes, comprometem-se com paixão a honrar e destravar quaisquer potenciais que encontrarem nos outros e em si mesmos, criando, portanto, ambientes energizados pela lealdade, afeto e apoio mútuo. Sob a inspiração de Inácio de Loyola, um militar que virou líder político, dono de uma história que “se desenrola com a previsibilidade dos dramas sobre a adversidade: a juventude dissoluta, a crise pessoal, a experiência intensa de conversão” (LOWNEY, 2015, p.


50), e com jornada para a liderança que provoca reflexões sobre os reais atributos para um líder, a Companhia de Jesus prepara seus membros para atuarem em quaisquer ocupações que contemplem o ajudar das almas. Criada do zero, sem produto, grife ou plano de negócios, a Ordem dos Jesuítas, exclusivamente masculina, enfatiza a tradição em valores e a prática no reflexo de tais valores no trabalho diário. Eis o ponto determinante: são líderes de si mesmos. Mais que uma companhia, os jesuítas compõem um modelo improvável de liderança exemplar por meio do

amor, engajando as demais pessoas com apoio e positividade. Esse padrão, aplicado ao mundo corporativo, bem como às mais simples atitudes cotidianas de cada um de nós, conduz a resultados sólidos, provenientes de paixão e envolvimento espontâneo dos que trabalham em prol de um ambiente inspirador, no qual seja possível visualizarmos os resultados de nossas atitudes. E isso acontece tão somente por conta de a doutrina jesuítica formar mais do que líderes melhores, mas indivíduos melhores. comente este artigo: comunicacao@colegiomedianeira.g12.br

REFERÊNCIAS: LOWNEY, Chris. Liderança heróica: as melhores práticas de uma companhia que há mais de 450 anos vem mudando o mundo. Rio de Janeiro: Edições de Janeiro, 2015. HOUAISS, Antônio. Minidicionário da Língua Portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.

Priscila Murr é Jornalista, graduada em Comunicação Social - Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), e mestra em Estéticas Contemporâneas, Modernidade e Tecnologia – com bolsa Capes/Fundação Araucária – pelo programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens (PPGEL) da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Atualmente, é jornalista no Colégio Medianeira.

Indicações Uma história dos jesuítas: de Inácio de Loyola a nossos dias | John W. Malley Esta obra preenche uma lacuna: dar uma visão completa da história da Ordem Jesuíta em toda sua riqueza e complexidade. É a primeira síntese escrita sobre essa época na qual a companhia atravessou zonas de turbulência que jamais tinha visto até então.

Paixão e glória: história da Companhia de Jesus em corpo e alma | Ignácio Echaniz, S.J. "Paixão e glória" é uma galeria de mais de cem jesuítas que exerceram funções importantes na história da Companhia de Jesus. Dividida em quatro, apresenta, no Tomo I, as realizações de mártires, santos, missionários e eruditos.

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