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O ser humano na perspectiva inaciana

Por Ana Paula de Moraes de Siqueira e Edeluci Fernandes Botelho

Colocando o Ser Humano no centro das discussões, a pedagogia inaciana preza pela experiência identitária a partir do legado de Santo Inácio

o falarmos em concepções que caracterizem a “Pessoa Humana”, nos deparamos com várias linhas de pen- samento que, à sua maneira, bus- cam explicar as razões de nossa existência. O que nos faz quem somos? Qual é o verdadeiro sen- tido de vida? E essas são apenas algumas das inquietações que cir- cundam nosso universo. A

A pedagogia inaciana se pre- ocupa em, antes de mais nada, compreender quem é essa Pes- soa Humana. Deus nos fez à sua imagem e semelhança, es- tando presente em tudo e em todos. Nesse sentido, estamos em constante preparação para a vida. Segundo a pedagogia inaciana, a pessoa está sempre em aprendizagem, pois, mais do que saber sobre os conhecimen- tos historicamente acumulados, é a consciência da potencialida- de de aprender a aprender.

Considerando a lógica edu- cacional adotada pela Compa- nhia de Jesus, compreendemos que a formação da pessoa, e de todas as pessoas, deve conside- rar o desenvolvimento de todas as potencialidades criativas, em uma constante preparação para a vida. Vida esta que se fortalece na compreensão e cuidado com o outro, no reconhecimento do pa- pel indispensável de cada pessoa em sua comunidade.

A concepção Jesuítica com- preende que, mais do que apren- der os conteúdos curriculares, devemos construir o pensamento de se aprender a aprender, sen- do isto uma constante na vida de cada pessoa. Essa reflexão per- mite ao sujeito dialogar com a complexidade dos conhecimentos aprendidos com a realidade do mundo e no trabalho com a justi- ça social. Mendonça (2006, p. 24) aponta que “[...] o diálogo passa a ser o caminho possível para a re- alização da pronúncia verdadeira que vai contribuir para que os se- res humanos adquiram sua auten- ticidade e possam realizar a sua vocação ontológica”. Considera- -se que o processo de formação dos estudantes deve fortalecer- -se na compreensão da dimensão humana, na busca pela excelência humana e acadêmica.

A pedagogia inaciana está as- sentada no desenvolvimento da Formação Integral, por compre- ender que a pessoa é única e par- te fundamental na obra de Deus, em busca da reconciliação divina. Portanto, tem a preocupação com o desenvolvimento de pessoas re- flexivas, que promovam o espírito crítico e criativo no exercício da fé em Deus, com esperança de um mundo melhor e mais justo, no qual todos se compadeçam com a vida do próximo.

Segundo Martin (2012, p. 07), “o caminho de Inácio nos leva ao encontro da liberdade: a liberda- de de nos tornarmos a pessoa que

somos destinados a ser. Ele nos ensina a amar, a aceitar o amor e nos torna capazes de tomar boas decisões, desfrutar da beleza da criação e participar do mistério do amor de Deus”. Sua caminhada traz um significado muito importante para a compreensão e interpretação de seus ensinamentos.

O caminho percorrido por Santo Inácio foi repleto de trajetórias, vivências e reflexões, assim como a nossa existência. São as nossas experiências que contribuem para sermos quem/ o que somos. Nossa identidade se constitui daquilo que somos e projetamos ser. Inácio se fez seguidor daquilo que sentia sobre Deus, sua releitura das obras e da vida de Deus o tornaram um semeador e libertador. Assim, tudo aquilo que é de vertente material é colocado em segundo plano.

A natureza de Inácio foi e é tão sublime que ele não se satisfez em tê-la somente consigo, seus ensinamentos, e a construção dos exercícios espirituais, são elementos base que constituem o que é verdadeiramente Santo Inácio. Segundo Oscar E. Buroz Echenagucia S.J (s/a, p. 01) “en sentido general, el término «identidad» hace referencia al conjunto de representaciones mentales que toda persona tiene de sí misma y en las que se lleva a cabo un auto-reconocimiento” (Em sentido geral, a terminação “identidade” faz referências ao conjunto de representações mentais que toda pessoa tem de si mesma e as quais levam a um autoconhecimento). Tendo em vista o que os autores apresentam, a identidade pessoal se ressignifica pelo autoconhecimento a partir das representações que construímos no ambiente, fruto de nossas experiências, vivências culturais, sociais, políticas e econômicas.

Ao buscarmos uma espécie de transcendência, por meio dos ensinamentos de Santo Inácio, podemos dizer que buscamos uma relação profunda com a identidade inaciana. Mas não simplesmente no sentido de uma apropriação sem reflexão, pois a identidade pessoal se fortalece no autoconhecimento de que estar em Deus é o caminho a seguir.

Martin (s/a, p. 08) sublinha que “a espiritualidade é um modo de viver em relacionamento com Deus”. Segundo ele, essa é principal característica que fundamenta a identidade inaciana. Afinal, na tradição cristã, todas as espiritualidades, independentemente de sua origem, têm o mesmo foco: o desejo de união mística com Deus, a ênfase no amor e na caridade e a fé em Jesus como o Filho de Deus enviado a este mundo”.

Nesse sentido, “[...] a espiritualidade inaciana dá mais importância à alegria, à liberdade, à tomada de consciência, à dedicação, à oração e ao cuidado com os pobres. Todos esses aspectos são relevantes para todas as espiritualidades cristãs, porém a diferença está na atenção dedicada a eles por cada “escola espiritual” (MARTIN, s/a, p. 08).

Pensando nisso, Santo Inácio, deixa um legado sobre como se aproximar de Deus. Uma verdadeira identidade inaciana pressupõe refazermos a experiência de Deus e assumirmos a responsabilidade perante os necessitados. Em outras palavras, “ser mais para os demais”: o Magis inaciano.

Em resumo, é preciso aprender a Ser Humano. A humanidade, muitas vezes é deixada em segundo plano. A educação jesuíta destaca a necessidade de se formar pessoas competentes, comprometidas, compassivas, conscientes, que saibam agir reflexivamente na sociedade, contribuindo para um mundo mais justo e igualitário, um mundo mais próximo de Deus (PEC, 2016).

A espiritualidade inaciana é uma maneira de ver o mundo com mais amor ao próximo. É uma maneira de aprender a viver, exercitando os valores e atitudes que constituem o Humanismo Cristão. Ajuda-nos a compreender os obstáculos que impedem de viver plenamente em favor da obra de Deus e partilhar com o próximo sua experiência de vida, tendo papel ativo na sociedade.

Por estas e outras razões que a Pedagogia Inaciana se fortalece no desenvolvimento da educação integral, por assumir que a pessoa é única e parte fundamental na obra de Deus. Além disso, tem uma preocupação com o desenvolvimento de pessoas reflexivas, capazes de ler a realidade e de promover o espirito criativo no exercício da fé em Deus.

Logo, promove o desenvolvimento em todas as dimensões do aprender, ocorrendo uma sinergia entre todos os aspectos da vida de cada pessoa, fortalecidos na e pela fé em Deus, e pela esperança de um mundo melhor e mais justo.

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Ana Paula de Moraes de Siqueira é graduada em Pedagogia (2014) e mestre em Educação (2017), pela PUC-PR. Atualmente, é professora da Oficina de Aprendizagem das turmas de 2º e 3º anos no Colégio Medianeira e professora do ensino fundamental na Rede Municipal de Ensino de Curitiba.

Edeluci Fernandes Botelho é graduada Serviço Social pela PUC-PR (2001) e em Pedagogia (2013), pela Universidade Braz Cubas, especialista em Modalidades e Intervenções no Processo de Ensino e Aprendizagem (2003), PUC-PR, e em Educação Jesuítica: Aprendizagem Integral, Sujeito e Contemporaneidade (2019), pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos. Atualmente, é professora do 2º ano do Ensino Fundamental no Colégio Medianeira. Referências

MENDONÇA, Nelino José Azevedo de. A humanização na pedagogia de Paulo Freire. Dissertação de Mestrado. 168 f. Recife. 2006.

OSCAR E. Buroz Echenagucia S.J. Identidad ignaciana: un modo de ser. Disponível em: <http://www.cerpe. org.ve/tl_files/Cerpe/contenido/documentos/ Pastoral%20-%20General/San%20Ignacio%20y%20 Espiritualidad%20Ignaciana/2%20IDENTIDAD%20 IGNACIANA%20UN%20MODO%20DE%20SER. pdf>. Acesso em: 20 dez 2018.

REDE JESUÍTA DE EDUCAÇÃO. Projeto Educativo Comum. (PEC). São Paulo: Loyola, 2016

MARTIN, James. A sabedoria dos Jesuítas para (quase) tudo: espiritualidade para a vida cotidiana. Sextante, 2012.

Indicações

A sabedoria dos Jesuítas para (quase) tudo: espiritualidade para a vida cotidiana | James Martin

Este livro apresenta uma grande variedade de tópicos acerca da espiritualidade inaciana. Mostrando como encontrar Deus em tudo e tudo em Deus, o autor sugere maneiras claras e simples de incorporar essa espiritualidade à vida cotidiana.

Elementos de Antropología Pedagógica | José Maria Barrio

A obra faz uma espécie de raio-x na realidade humana, a fim de abordar o tema da educação centrada no estudante e nas nunces entre educar, libertar, valorar e formar.

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