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Da Educação Infantil para o Ensino Fundamental: como acontece esse processo de transição?

As crianças vão parar de brincar? No Fundamental é mais sério? Como será a alfabetização? O que vai ter no primeiro ano? Na Educação Infantil só se brinca?

Por Ana Paula Correia

stes são alguns questionamentos comuns, tanto das crianças quanto das famílias, com a mudança de nível nas séries iniciais. Nesse sentido, o olhar, enquanto educadores, deve estar atento para que esse processo transite da maneira mais tranquila possível, com significado na ação pedagógica, qualidade nas estratégias, garantindo maior segurança aos estudantes e familiares. E

Para isso, é necessário não perder de vista alguns fatores, como o foco na criança; a troca entre o corpo docente; a concepção do currículo; os princípios inacianos; a escuta diante do processo e o cuidado com a adaptação, tendo em vista a variedade de transições que podem ocorrer, como: novos estudantes, enturmação, inclusão, retenção, os diferentes níveis de séries, entre outros.

REESTRUTURAÇÃO DO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Desde 2016, a Educação Infantil tem como norte a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e os estudos baseados em autores que dialogam com o currículo deste nível de ensino e temas de aprofundamento, a saber: os processos de avaliação; os projetos pedagógicos; a documentação pedagógica; a concepção de infância/criança; as contribuições da Abordagem Emmi Pikller e Reggio Emilia para o pleno desenvolvimento infantil e suas relações com a proposta; o exercício com a organização de novos espaços/ tempos; práticas e interações com relação à cultura do escrito e ao universo infantil; a promoção da autonomia/identidade a partir do brincar e os movimentos.

Nessa perspectiva, a participação da comunidade educativa em reuniões para discussão, a contribuição com experiências para ressignificar a prática, o contraponto de aporte teórico e sistematização do novo currículo projetado resultou em um projeto consistente, embasado em teoria e nas diversas vozes que sustentam e acreditam nesse trabalho.

Sua revisitação é permanente para aprimorar os conceitos, refletir acerca dos temas propostos e atualizar a práxis educativa, alinhando com os órgãos reguladores, os princípios da Pedagogia Inaciana e reverberando as diretrizes do Projeto Educativo Comum (PEC), da Rede Jesuíta de Educação.

A EDUCAÇÃO INFANTIL NO COLÉGIO MEDIANEIRA

O eixo estruturante da Educação Infantil no Colégio Medianeira tem como foco as experiências, brincadeiras e interações, que possibilitem aprendizagens, desenvolvimento e reflexão crítica, na perspectiva da formação integral (dimensões cognitiva, socioemocional e espiritual-religiosa). Os planejamentos elaborados pelas regentes e as investigações provenientes das crianças têm o objetivo de garantir os DIREITOS de aprendizagem juntamente com os CAMPOS DE EXPERIÊNCIA. Junto a isso, a partir das investigações que realizam espontaneamente, as crianças dão indicativos, no dia a dia, ou sugerem o que gostariam de aprender, problematizando situações de aprendizagem, com demandas ou temas específicos da turma. Tendo em vista o Mapa das Aprendizagens – documento interno com a constituição de eixos, parâmetros e palavras-chaves, cujo objetivo é a ampliação das aprendizagens de uma série para outra – temos os requisitos finais para a Educação Infantil.

Levando em consideração esses aspectos, as crianças egressas da Educação Infantil, em sua maioria, possuem a oralidade como forte ferramenta para se comunicar com seus pares e com os adultos. Verbalizam com clareza seus desejos e começam a compreender sentimentos ligados aos diversos vínculos que estabelecem com os seus familiares e outros indivíduos. Dessa maneira, é necessário, estabelecer momentos de diálogo e reflexão sobre suas ações, pois são comuns os conflitos entre colegas e opiniões divergentes.

As Assembleias de Classe são reguladoras do estabelecimento do diálogo, em que a própria criança é autora da sua tomada de decisão, com a mediação do educador. Além de ser protagonista na construção de combinados no dia a dia.

A criança é capaz de recontar histórias com clareza e sequência nos fatos. Assim como contribuir com ideias para a elaboração de textos coletivos, ampliando o vocabulário.

Dramatiza contos e histórias. São intensos os momentos de simbolização e faz de conta, com o contato de materiais, brinque- dos não estruturados que favore- cem essa prática e a criatividade para sua composição, como cai- xas, tecidos, sucatas, jornal, mate- riais da natureza, demonstrando o quanto são produtoras de cultura nesses momentos de brincadeira.

O brincar tem uma função: é uma linguagem própria da crian- ça, há uma intencionalidade, em consonância com os objetivos de aprendizagem, ou seja, não é o brincar pelo brincar – a brinca- deira é material de observação e escuta para o educador. Então, lendo imagens e reconhecendo alguns gêneros textuais, expande ideias e realiza a representação de seus pensamentos a partir de di- ferentes linguagens.

Nesta faixa etária, já começa a dominar seu esquema corporal, com as brincadeiras, jogos e ativi- dades dirigidas, tomando consci- ência das partes e do todo, pois tem seu corpo como referência. Assim, começa a figuração huma- na e, aos poucos, seus desenhos ganham detalhes e acréscimos. Ainda fazem a representação das ideias com diferentes materiais, ampliando sua coordenação mo- tora ampla e fina.

No cotidiano, com a vivência de jogos e brincadeiras em dife- rentes espaços, tem a capacidade de aplicar conceitos perceptivos para ampliar relações quantitati- vas a partir de problematizações. Com base nas estratégias e com a rotina, constrói noções de pro-

priedade, comparação, classificação, ordenação e seriação dos objetos e brinquedos diversos. Assim como a percepção de noções de direção com o próprio corpo.

A partir das experiências e vivências propostas, as interações estão ganhando cada vez mais espaço em estratégias, momentos livres e dirigidos, na promoção do convívio entre as crianças da série e diferentes idades para o incentivo ao sentimento de pertença e à postura de respeito consigo, com o outro e no grupo, bem como na identificação e uso do Magis. Também percebendo o contexto à sua volta e o quanto suas atitudes, dos seus familiares, dos amigos e das pessoas de maneira geral podem contribuir ou não para o exercício da cidadania, local e/ou global.

Outro aspecto que chama a atenção, desde o Infantil 2, a partir do contexto no qual estão inseridas, é o interesse que as crianças têm pela cultura do escrito, como por exemplo, fazendo de conta que estão lendo um livro, folheando as histórias ou até mesmo se arriscando com um material riscante em tentativas espontâneas. Esse despertar se amplia para as séries subsequentes, expandindo as capacidades em compreensão dos modos de aquisição da leitura/escrita, o que torna esse processo natural e significativo.

Dessa maneira, ao sair da Educação Infantil, a criança tem um vasto repertório corporal, artístico, de identidade e representações múltiplas, que possibilitarão dialogar com as novas demandas do Ensino Fundamental.

O PROCESSO DE TRANSIÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL PARA O ENSINO FUNDAMENTAL

No que diz respeito à transição da Educação Infantil, as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (2010) fazem uma breve orientação com relação ao processo, até sugerindo uma articulação entre as referidas etapas. Contudo, é de extrema importância quando ressalta a não antecipação dos conteúdos do Ensino Fundamental para a Educação Infantil, até por um aspecto histórico e carregado de assistencialismo que caracterizou esta etapa de ensino.

A experiência mostra a importância da transição enquanto continuidade dos estudos, no sentido de tornar significativa a etapa de transição entre os diferentes níveis de ensino. As crianças, ao terminarem o ano em curso, possuem uma percepção inicial da série seguinte, o que os auxilia na adaptação à rotina e às exigências do dia a dia.

Dessa maneira, há uma preocupação com a adaptação das crianças, com estratégias em planejamento levando em conta a transição, como conhecer os diferentes espaços, as professoras, os serviços, as crianças que estão no 1º Ano, o que elas têm a dizer sobre a série que estão em processo de finalização e trazendo as curiosidades das crianças da Educação Infantil.

Estabelecido o contato inicial, as propostas se desenrolam para outras, proporcionando sua plena participação e a vivência de uma situação futura. Ao perceber maior tranquilidade da criança, isso se reflete nas famílias, ao se sentirem mais seguras com o processo de mudança. Nesse sentido, é importante que os pais tenham um olhar apenas para a mudança de nível, com todas as preocupações pertinentes a esse momento e não de maior responsabilidade ao iniciar no Ensino Fundamental, pois esse processo se inicia desde a Educação Infantil, ou seja, tão importante quanto!

É preciso considerar a criança na sua totalidade, como um ser completo, que necessita de uma formação que contemple todas as dimensões e que comunga com a aprendizagem integral proposta pela Rede Jesuíta de Educação (RJE). Ressalta-se a importância de ter a clareza da concepção de infância/criança adotada pela instituição e o quanto isso dialoga com a prática para se reverberar com propostas mais assertivas.

Ao pensar sobre a estratégia de transição, é necessário ter como foco um processo contínuo de trabalho com o conhecimento, dialogando com o foco nas três dimensões: SOCIOEMOCIONAL, com a busca pelo desenvolvimento da identidade da criança e o fortalecimento das suas relações com o contexto; ESPIRITUAL- -RELIGIOSA, a partir das vivências voltadas para o seu autoconhecimento, somando-se a uma sensibilização do cuidado consigo, com o outro e ainda o seu envolvimento com as questões da

cidadania global e COGNITIVA, com a relação dos processos do aprender e o saber a pensar acerca dos conhecimentos prévios e adquiridos no processo, levando em conta suas experiências e interações com o contexto, a capacidade de levantar hipóteses e criar soluções.

Com essa perspectiva, o processo de transição e adaptação da criança, é necessário procurar caminhos que realmente garantam as ações em planejamentos, trocas entre os docentes, a escuta da família e a prática do professor, dialogando com a concepção adotada pela instituição.

Nesse caso, destaca-se a busca do Colégio Medianeira em qualificar processos, oferecendo formação ao corpo docente, abertura ao diálogo e visando à formação do estudante, levando em conta suas especificidades e ritmos. Dessa maneira, a transição é um tema em pauta, uma parte que dialoga com o todo da criança, que merece especial atenção para a efetivação da sua plena aprendizagem.

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Ana Paula Correia é graduada em Letras Português/ Inglês, pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUC-PR (2005), em Pedagogia, pela Pontifícia Universidade do Paraná - PUC-PR (2010). Especialista em Alfabetização e Letramento pela Pontifícia Universidade do Paraná - PUCPR (2014), Psicomotricidade Relacional pelo Centro Internacional de Análise Relacional - CIAR (em andamento) e Educação Jesuítica: Aprendizagem Integral, Sujeito e Contemporaneidade, pela Universidade Vale do Rio Sinos - UNISINOS (2019). Atualmente é professora da Educação Infantil no Colégio Medianeira.

Indicações

Diálogos com Reggio Emilia | Carla Rinaldi

Reunindo palestras, entrevistas e artigos sobre uma proposta inovadora para a educação da primeira infância, este é um livro essencial para quem se interessa por educação: pedagogos, educadores e pesquisadores na área.

As cem linguagens da criança: volume 1 | Carolyn Edwards, Lella Gandini, George Forman, Maria Carmen Silveira Barbosa

Essa obra é uma introdução abrangente, que trata de história e filosofia, currículo e metodologias de ensino, escola e sistema organizacional, uso do espaço e ambiente físico, além de falar do papel dos profissionais de educação infantil.

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