Rupturas é empoderamento. É ter um projeto e desenvolver as ações para que ele aconteça.
RUPTURAS RUPTURAS Inovações no cotidiano escolar
Em 2014, o primeiro momento Rupturas realizado no Colégio Oswald abordou os 50 anos do Golpe Militar no Brasil. No dia 31 de março, os alunos do Ensino Fundamental II e do Ensino Médio participaram de uma série de atividades elaboradas pela equipe de educadores de nossa escola, que propunha um mergulho na realidade brasileira durante o período de Ditadura Militar. Assim como outras atividades do Colégio, situações como essa buscam ampliar para nossos alunos as possibilidades de pesquisa e investigação de temas significativos para diferentes faixas etárias, com abordagens interdisciplinares e problematizadoras. A partir desse primeiro momento de debate, diferentes grupos de trabalho com interesses variados foram criados, integrando alunos de diferentes séries, educadores e funcionários do Colégio. Esses grupos tiveram como objetivo pensar em maneiras de aprofundar a discussão
sobre a Ditadura Militar. Para que isso acontecesse, foram planejadas uma série de oficinas, debates e outras atividades, realizadas com as turmas de Ensino Fundamental II e Ensino Médio no período de 08 a 19 de setembro.
Nesse segundo momento Rupturas do ano, os alunos realizaram oficinas abordando a representação da Ditadura Militar em livros didáticos e o humor como ferramenta de resistência; debates com convidados sobre a Polícia Militar, o direito à cidade, o Poder Judiciário e outros temas; além de exibições de documentários, apresentações artísticas e diversos outros momentos que inundaram a rotina escolar com novas possibilidades de trocas e de aprendizagens. Nesta revista você poderá saber um pouco mais sobre as Rupturas e as atividades planejadas e realizadas pelos alunos nesse último mês. Uma boa leitura!
A construção de novas dinâmicas escolares
EDUCADORES
ALUNOS DE VÁRIAS IDADES
Harlei Florentino, diretor geral do Colégio Oswald, fala sobre a Rupturas e a ampliação das experiências de aprendizagem dos alunos
PROFESSORES
Rupturas no Oswald Rupturas são atividades na escola que buscam ampliar as possibilidades de troca entre alunos e educadores do Oswald. Quando a criamos, pensamos em conceber situações nas quais os alunos se envolvessem no planejamento e na execução de palestras, oficinas, debates e apresentações que transcendessem o currículo tradicional e ampliassem o universo de conhecimento para todos os envolvidos.
História das Rupturas As Rupturas acontecem na escola desde 2010. Acho interessante que, com o tempo, o conceito de Rupturas está abarcando a instituição como um todo, e isso é algo intencional. Na prática, isso passa pelo estabelecimento de parcerias e métodos de trabalho pouco tradicionais no ambiente escolar: temos, na construção de diversas ações, trabalhando em conjunto, professores, alunos de diferentes faixas etárias, equipe de comunicação, educadores de biblioteca, laboratórios e tecnologia, direção e coordenação do Oswald. Esses grupos heterogêneos, sem hierarquias predefinidas, constituem poderosos espaços de criação e inovação. Nesse processo, estamos rompendo laços e nos permitindo experimentar e testar práticas e configurações dos espaços de aprendizagem. Temos uma equipe disposta a arquitetar e construir uma nova cultura da instituição como um todo, e isso é fundamental para que possamos criar novas possibilidades dentro da escola.
EQUIPE DE COMUNICAÇÃO COORDENAÇÃO
DIREÇÃO
PALESTRAS
As produções dos alunos e os deslocamentos do saber As Rupturas têm gerado situações muito interessantes. Por exemplo: em um debate em que um aluno está lado a lado com um convidado, a questão do domínio do saber é alterada; não é necessariamente o professor e o adulto que detêm o saber. Temos o pré e o durante a Rupturas. O pré é toda a riqueza do processo de elaboração. Imagine a experiência que o aluno tem ao se preparar para um momento Rupturas. Dependendo do que o aluno for fazer, ele pode ter reuniões com professores e funcionários para preparar algo que envolve produção de conhecimento e compartilhamento de ideias dentro da escola. Isso é uma revolução para o mundo tradicional da educação. Estamos o tempo todo pensando nas experiências dos nossos alunos, e nas trocas de conhecimento que ele está vivenciando. Além disso, não há uma imposição de temática. É
DEBATES
OFICINAS
uma oportunidade de o aluno se aprofundar, se sentir reconhecido entre seus pares e fazer isso de maneira autêntica. Ele vai se aprofundar em algo de que gosta. E a gente sabe que se preparar para ensinar é uma experiência rica de aprendizagem, porque é preciso dar um sentido real para aquele conhecimento que será compartilhado.
Rupturas e a estrutura escolar
A Rupturas me empolga muito: ela é uma das formas para criamos novas possibilidades na escola, problematizando as práticas tradicionais que colocam o professor como dono do saber e que criam uma grade curricular rígida e que limita os bons usos pedagógicos do tempo e do espaço como fatores de aprendizagem. A Rupturas é a quebra das más amarras da tradição, daquilo que impede a mobilização e a oportunidade de dar um sentido maior para as relações e para a produção de conhecimento. Pensar tudo isso significa pensar qual escola queremos construir e que caminhos queremos seguir no século XXI.
Oficinas promovem debate sobre o regime militar Atividades possibilitaram a troca de conhecimentos entre alunos do Ensino Médio e do Ensino Fundamental II
Neste Rupturas, os alunos tiveram intensa participação na organização do calendário. Tomás Massabki, aluno do 3º ano do Ensino Médio, organizou a oficina “A Ditadura na Sala de Aula: a Visão dos Livros Didáticos” para o 8º ano do Ensino Fundamental II.
“Senti deles que a atividade em si foi produtiva, tanto como um primeiro contato escolar com o período da ditadura quanto como uma vivência do processo didático”, disse Tomás, que propôs aos alunos a criação de verbetes relacionados ao tema, a fim de discutir a visão dos livros didáticos sobre o regime militar. A atividade foi criada a partir da pesquisa feita para sua monografia, escrita no 2º ano do Ensino Médio, como parte do Projeto Teses.
Dando continuidade à programação, os alunos do 6º ano do Ensino Fundamental II participaram da oficina “Humor como Crítica e Alternativa de Expressão”. Aluna do 3º ano do Ensino Médio, Júlia Gallo foi a responsável por conceber e realizar a oficina.
Na atividade, Júlia abordou o papel do jornal O Pasquim nos anos de 1970 no Brasil. Uma das características da publicação era criticar a ditadura militar por meio do humor e de ilustrações. Como produção da oficina, os alunos fizeram quadrinhos com imagens e palavras que representassem os principais problemas da sociedade atual, segundo o olhar de cada um.
A ideia de fazer a oficina surgiu, principalmente, da experiência que eu tive com a Tese no 2º ano do Ensino Médio - um trabalho bem extenso de pesquisa que tem a duração de um ano letivo. Acho que a atividade na Rupturas foi uma oportunidade de contar um pouco sobre o que eu tinha aprendido, além de ouvir o que outras pessoas tinham para falar sobre um assunto que eu havia passado um ano pesquisando. No meu caso, como a oficina era direcionada para alunos de 6º ano do Ensino Fundamental II, foi especialmente interessante, pois tive a oportunidade de entender um pouco como funcionava todo o processo pedagógico ao ter que planejar e estruturar a atividade. A ideia era falar um pouco sobre a minha tese, O Pasquim: o Humor como Ferramenta Política, e despertar certo interesse dos alunos a respeito da Ditadura Militar no Brasil. Para isso, foi elaborada uma ofi-
cina de quadrinhos, na qual os alunos tiveram a oportunidade de entender como o humor pode ser utilizado para defender ou criticar uma ideologia, e como fazer uso dessa linguagem para realizar suas próprias produções. Foi muito bacana ouvir o que os alunos de 6º ano tinham a dizer sobre os assuntos propostos, além de ver e acompanhar as produções de quadrinhos que fizeram. A turma me pareceu muito envolvida, e isso tornou a experiência muito especial para mim. Acho muito legal da parte do colégio proporcionar esses encontros entre séries que tem faixas etárias mais distantes: é algo que acaba resultando em uma troca muito rica, criando novas possibilidades de aprendizado que não são, necessariamente, dentro da sala de aula. Júlia Gallo, aluna do 3º ano do Ensino Médio
Uma das motivações para a realização da minha atividade foi a ideia de compartilhar parte de minha monografia, fazendo com que eu relesse o meu trabalho e tivesse que adaptá-lo para uma atividade prática, me reapropriando desse processo tão marcante em minha vida escolar. O tema da Ditadura Militar, muito pertinente neste ano, também me incentivou a tentar ampliar o contato de parte do Colégio com esse período importantíssimo de nossa história. Parte do Colégio, inclusive, que quase não mantenho contato. Poder realizar uma atividade com o 8º ano do Ensino Fundamental II foi uma experiência ótima, por algumas razões. Quando me senti em uma posição próxima a de um professor, entendi como pode ser difícil e surpreendente trocar conhecimentos com pessoas (quase todas) desconhecidas. A aparente frustração de não ser ouvido pode ser rapidamente eliminada por uma mão levantada ou um olhar interessado, dando um leve toque de imprevisibilidade a esses momentos. Uma das coisas mais interessantes foi que não só eu fui colocado na posição de quem ensina: os estudantes que participaram também tinham esse desafio, ao produzirem cartazes que explicassem o regime autoritário para os alunos de 6º ano do Ensino Fundamental II. Estávamos, de certa forma, no mesmo barco. Ao mesmo tempo, fiquei feliz em saber que pude contribuir para uma maior convivência entre todos os alunos, parte essencial de diversos projetos realizados no Oswald. Consegui (espero eu) apresentar a possibilidade de eles deixarem, nem que por um dia, o lugar do aluno – na visão de alguns, aquele que somente é ensinado – para assumir protagonismo no ensino. Sinto, também, que essa é uma ótima fase para isso, considerando que são estudantes já inseridos num ciclo de maior maturidade tanto nas disciplinas curriculares quanto em interesses pessoais, que podem e devem ser trocados entre todos da comunidade oswaldiana. Se isso pareceu possível para eles, me alegro, porque esse é um dos principais motes da Rupturas: quebrar não só as tradições espaciais de aprendizagem, mas principalmente as amarras invisíveis que nos afastam de uma vivência mais prazerosa com o conhecimento, abrindo nossas mentes para uma melhor compreensão de nós e do mundo que nos cerca. Tomás Massabki, aluno do 3º ano do Ensino Médio
A Polícia Militar como herança da ditadura Pesquisador debate a ideologia e as práticas da Polícia Militar nos dias de hoje
Na segunda-feira, 15 de setembro, o colégio recebeu o convidado Adilson Paes de Souza para duas sessões de palestra às classes de Ensino Médio e 9º ano do Ensino Fundamental II, seguidas de abertura para perguntas. Introduzido pelo aluno do 3º ano do Ensino Médio, Brás Moreau Antunes, o palestrante debateu as heranças da Ditadura Militar na sociedade e na instituição da Polícia Militar. Depois de uma sumária introdução sobre os 21 anos de regime militar, feita pelo aluno que produziu sua Tese do 2º ano do Ensino Médio com base no tema, o palestrante propôs à plateia uma análise interna da situação educacional dos policiais militares. Primeiramente foi discutida a Doutrina de Segurança Nacional, como vigora atualmente, até mesmo na mentalidade da classe média e da elite. Fruto da Guerra Fria, na qual o mundo se via dividido em dois blocos, socialista e capitalista, a Doutrina de Segurança Nacional está diretamente ligada a uma concepção ocidental de existência de uma afronta à ordem vigente: um “inimigo interno, altamente subversivo”. Na época, o medo da “ameaça comunista” e o que prevalecia do
Macartismo existiam em boa parte da classe média, tanto que motivaram a Marcha da Família com Deus pela Liberdade. A Escola Superior de Guerra e o Ipes, com a ajuda do Gen. Golbery do Couto e Silva, teórico da Doutrina de Segurança Nacional, contribuíram fortemente para a disseminação dessa ideia. Tal concepção, na mente dos militares, ainda levou ao pensamento de que o Brasil passava por uma guerra “revolucionária”.
Como concluiu o palestrante, depois de seus anos de pesquisa e séries de entrevistas, hoje temos a mesma doutrina plenamente alterada para se “adequar” a um novo “inimigo interno”. Tenente-coronel aposentado da PM, Adilson Paes de Souza fez seu mestrado em Direito na Universidade São Francisco (USP), produzindo a dissertação A Educação em Direitos Humanos na Polícia Militar, em 2012. Aprofundando seu trabalho, escreveu em 2013 o livro O Guardião da Cidade, apresentando sua análise do desenvolvimento da educação em direitos humanos no Curso de Formação de Oficiais da Polícia Militar do Estado de São Paulo e os reflexos dela na atividade policial e na sociedade.
Souza relatou como embarcou na sua pesquisa. Durante sua carreira entrou em contato com diversos casos de violência policial e questionava-se sobre o que levaria algumas pessoas que ingressam na polícia a se tornarem assassinas. Dessa pergunta veio a base do seu trabalho, que contou com uma série de entrevistas com policiais militares que possuíam registros de casos de desaparecimento, assassinato ou até mesmo tortura. As respostas que recebeu levaram-no a algumas teorias. Entre elas a vaga educação em direitos humanos que foi oferecida na academia. Como disse à repórter Lúcia Rodrigues, em 10 de novembro de 2013: “Nas entrevistas, eu perguntei o que os levou a praticar os homicídios. E a resposta foi de que não conheciam a realidade social onde foram trabalhar. ‘Não tive isso nos bancos escolares’. Isso evidencia que houve falha no processo de formação. A minha hipótese de que a educação em Direitos Humanos não estava cumprindo o seu papel se confirmou logo na primeira pergunta.” Além disso, recebeu alegações de pouca fé no sistema de justiça, causada por frustrações com a corrupção e ineficiência. O fato dos estados no Brasil terem polícias diferentes para cada função - policiamento ostensivo e judiciário - influencia na impotência policial, que, segundo a teoria de Souza, pode levar o tal a tomar medidas extremas. O pesquisador ainda discutiu a incitação à violência feita especialmente por programas de televisão, alguns muito populares, que acompanham casos e perseguições policiais. E, da mesma forma, o
caso dos filmes de José Padilha Tropa de Elite 1 e 2, debatidos na segunda sessão de perguntas. Também foi abordada uma atitude de conquista de status pela imposição do medo, e a ideia de um “complexo de super-herói”. Todos esses fatores, é claro, ligados à Doutrina de Segurança Nacional, que vem sofrendo uma metamorfose para considerar um novo “inimigo interno”, o “bandido”. Não à toa o sucesso do horripilante bordão “bandido bom é bandido morto” entre policiais e civis. Para Souza, essa concepção do criminoso como um inimigo é intrínseca à militarização do policial. O fato de as Forças Armadas existirem com a diretriz de proteger o território nacional contra qualquer “inimigo externo”, e serem, por definição, voltadas para a guerra, inevitavelmente inviabiliza qualquer visão de criminoso, pela Polícia Militar, que não a de inimigo. A semana Rupturas em memória dos 50 anos do Golpe Civil-Militar de 1964 deu espaço à palestra e debate sobre as heranças desse tempo, que são a PM e a Doutrina de Segurança Nacional. O tema foi abordado com seriedade e maturidade, com muitas perguntas pertinentes, que resultaram numa atividade muito construtiva. Brás Moreau Antunes, aluno do 3º ano do Ensino Médio
As canções de protesto na ditadura A metáfora como recurso político
Clara Schuartz, aluna do 9º ano do Ensino Fundamental II
Na semana Rupturas sobre o Golpe Militar de 1964, o grupo do 9º ano do Ensino Fundamental II de Música realizou uma atividade sobre a ditadura. Fizemos um trabalho sobre as canções e músicas produzidas durante o período da censura e sobre seus respectivos autores. Dentre todas as músicas que vimos em sala de aula (tendo sido a maioria delas vetada pelos militares) escolhemos uma, “Apesar de Você”, de Chico Buarque, para apresentar às outras séries. Para mim, a coisa mais interessante desse trabalho foi notar a força da canção popular nos momentos de repressão, a força dessa linguagem, em sua maioria não direta e cheia de metáforas, para atingir o público e transmitir uma mensa-
gem importante: nessa música, a mensagem tratada é a esperança de um mundo melhor, apesar desse governo ditatorial e totalitário. Durante toda a “Apesar de Você”, é como se ele estivesse dialogando com os militares, porém, sem deixar explícito que esse “você” eram os ditadores, usando metáforas como “Ainda pago pra ver / O jardim florescer / Qual você não queria”. Além da temática que tratamos no trabalho, foi interessante também a experiência de apresentar para todos os anos, do 6º ano do Ensino Fundamental II ao 3º ano do Ensino Médio. É muito diferente a maneira como cada idade relaciona aquilo que ouviu (tanto a música que apresentamos quanto o histórico do período). Por exemplo, para as turmas mais novas tivemos que relacionar a letra da música com coisas que eles vivem, para entenderem que a música é uma metáfora; já com os mais velhos, discutimos mais o período histórico. Eu achei muito importante a realização desse evento na semana Rupturas porque pudemos abordar o tema da Ditadura Militar de uma forma diferente, com a música, que, como estudamos, teve importância e força muito grandes nesse período
As novas formas de ativismo político Encontro promove debate entre alunos e representantes de movimentos sociais
Os alunos do Ensino Médio e do 9º ano do Ensino Fundamental II participaram do debate “Herança da Ditadura e Movimentos Sociais”. Carla Prandini, aluna do 3º ano do Ensino Médio, foi quem articulou o encontro.
Depois da apresentação geral do tema, foram formadas quatro rodas de conversa, em que se debateram algumas questões-chave dos movimentos sociais. Daniel Biral e Guilherme Revaglia, advogados que fazem parte do coletivo Advogados Ativistas, conversaram com os alunos sobre o papel do Poder Judiciário na garantia de liberdades em manifestações populares.
A repressão policial em manifestações populares, como a que ocorreu no decorrer da Copa do Mundo deste ano, foi debatida por Marina Mattar, integrante do movimento pela desmilitarização da PM. A atuação das mídias tradicionais e as possibilidades das mídias independentes foram temas levantados pelo repórter e videoativista Carlos Carlos. Além disso, Caio Castor e Flávia Lobo, membros do Projeto Comboio - que tem grande atuação na Favela do Moinho -, contaram suas experiências relacionadas ao direito à cidade e à ocupação do espaço público.
Carla Prandini, aluna do 3º ano do Ensino Médio
A ideia de organizar grupos de debate que refletissem sobre os resquícios do período da ditadura nos dias atuais surgiu como uma proposta de intervenção por diferentes objetivos. Muitas vezes, o conteúdo estudado em sala de aula me parece bastante distante da nossa realidade. A intenção da atividade foi mostrar que esse período, especificamente, deixou muitas marcas na sociedade que podem ser percebidas a todo instante em nossa volta. A escolha do tema “ Heranças da Ditadura e Movimentos Sociais” foi uma junção do meu Projeto de Intervenção (“Movimentos Sociais e Opressões”) com a Rupturas (“Ditadura”).
A partir daí, o Cadú e a Lúcia, educadores do colégio, me ajudaram na articulação da ideia e da prática. Chamamos pessoas que estão ativas na construção de uma diferente realidade para conduzirem os grupos de debate. A experiência de organizar essa atividade foi única. Estar na posicão de educador, no sentido de pensar todo o evento e lidar com as complicações para sua realização, como a preocupação com o interesse dos alunos, foi uma experiência muito enriquecedora. Maior ainda foi a gratificação de ver que, de fato, os alunos pareceram aproveitar a atividade e que ela pôde despertar reflexões e novos interesses acerca do assunto, assim como propõe a disciplina de Projetos de Intervenção.
A semana Rupturas deste ano foi diferente. Além de ter sido centralizada no tema dos 50 anos do Golpe Militar, houve uma grande participação dos alunos na execução de projetos. Foram muitos debates e atividades para todas as séries, sobre diversos “subtemas”, e um deles, o qual quis participar, era sobre a desmilitarização da Polícia Militar, exposto por Marina Mattar. Muitas pessoas estavam lá por causa da grande repressão policial que tomaram conta das manifestações do ano passado. A partir daí, o tema foi bastante debatido por nós, participantes, que de uma maneira ou outra concordamos que o funcionamento da polícia deve ser repensado.
Gabriel Vighy Carvalho, aluno do 3º ano do Ensino Médio
Além desse tema, havia outras mesas-redondas interessantes, como, por exemplo, sobre o papel da mídia ou a atuação do Judiciário nos protestos. Infelizmente só era possível participar de uma delas, e gostaria de conhecer mais esses outros temas. A Rupturas deste ano foi muito importante para que cada vez mais os alunos participem do desenvolvimento de propostas para a escola e ganhem autonomia. A escolha do tema também foi muito importante para que houvesse um verdadeiro interesse de todos.
José Mutarelli, aluno do 2º ano do Ensino Médio.
Eu participei somente de duas Rupturas, ano passado e este ano. No ano passado não senti muito os alunos envolvidos com o projeto, porém, neste ano senti todos muito mais engajados e aproveitando as atividades. Na atividade da Carla, do 3º ano do Ensino Médio, fiquei em uma sala onde estava acontecendo uma conversa com dois participantes de uma ONG da Favela do Moinho, e tudo que eles falaram me fez perceber o quanto sempre fa-
Daniel Biral, advogado e parte do coletivo Advogados Ativistas, “fantasiado de advogado”, de terno e gravata, como ele mesmo disse, se destacava dos outros convidados. Minha primeira impressão foi de que ele talvez fosse sério, meio careta, mas em sua apresentação Daniel me fez mudar de ideia, contando, com o maior entusiasmo, sobre a primeira vez que ele foi preso em serviço, há um ano. Ele cum-
lamos muito e agimos pouco. As duas pessoas que estavam lá eram muito legais e simpáticas - uma delas morava na favela e contou para gente como era essa experiência e o contato que tinha com os moradores. A atividade foi muito boa também para pessoas do Oswald que não leem jornal e não buscam informação na internet, pois ela pôde proporcionar isso.
priu a promessa assim que fomos separados nos grupos do debate, e depois disso não foi necessário muito esforço para que todos os alunos se interessassem pelo assunto a ser discutido. Em meio a histórias reais, acontecidas com ele, e explicações sobre a Constituição brasileira, Daniel discutiu conosco sobre o papel do Judiciário e como o sistema que deve julgar as leis muitas vezes as desrespeita.
Beatriz Munhoz, aluna do 1º ano do Ensino Médio
Quando se fala em manipulação da mídia, é fundamental considerar o monopólio que empresas como a Globo têm sobre diversos veículos. A relação das muitas agências publicitárias e a quantidade estrondosa de comerciais que são propagados por tais corporações são instrumentos poderosos, capazes de atingir os lados mais vulneráveis da população de modo geral - que, suscetível, cai no consumo exacerbado em busca de obter um estilo de vida mais parecido com o padrão elitista imposto. A nova série da Globo, “Sexo e as nega”, cujo projeto tem como um de seus responsáveis Miguel Falabella, pode parecer inovadora desse ponto, pois se tratam de mulheres negras, que batem ponto no bar da Jesuína e moram no subúrbio carioca - porém, como se não fosse suficiente desconfiar que tal emissora faça, de boa vontade, um programa que trate dos problemas e das opressões vivenciadas pela mulher negra no Brasil, a série
é baseada em “Sex and the City”, série norte-americana protagonizada por mulheres burguesas. Sem nem ter tido sua estreia, as críticas são numerosas, pois a série apenas reforçaria a ideia de que a mulher negra e pobre vive em função de um homem - nas palavras de Miguel, “são mulheres que gostam de transar, de se arrumar, querem arrumar homem”. Isso é apenas uma das facetas da programação desses canais, inclusive bastante comentada no debate. Não se pode, no entanto, ignorar o caráter político e essencial propagado por esse e vários meios de difusão de informação - como jornais e revistas -, que são grandes formadores de opinião. Por meio da palavra escrita, é muito possível manipular as ideias (também por meio da arte plástica, do cinema, da rádio), e bem sabem os estudiosos que às vezes a mudança do predicado de um verbo pode fazer toda a diferença no sentido da frase. O debate elucidou esses e vários outros pontos, abrindo bastante a percepção que se pode ter acerca de como a mídia pode influenciar nossos pensamentos. Depois disso, certamente tomaremos mais cuidado ao lermos e ouvirmos.
Julia Cunha, aluna do 9º ano do Ensino Fundamental II
Cidade Cinza e o grafite como ruptura Em debate com diretor do filme, alunos refletiram sobre o grafite como forma de ocupação do espaço público em São Paulo
“Por que São Paulo tem tantos grafites e pessoas querendo transgredir?”. Essa foi a pergunta que originou o filme Cidade Cinza, dirigido por Guilherme Valiengo - ex-aluno do Colégio Oswald - e Marcelo Mesquita. O documentário foi exibido em duas sessões, para os alunos de 9º ano do Ensino Fundamental II e do Ensino Médio. No segundo desses encontros, os alunos contaram com a presença do diretor Marcelo Mesquita, que discutiu a ocupação da cidade pelo grafite. Foram levantados temas como a ocupação do espaço público, a verticalização paulistana e os grafites dos artistas OSGEMEOS. “O filme questio-
na o cinza que cerca nossas vidas nas grandes metrópoles e mostra o papel dos grafiteiros como comunicadores da cidade”, contou o diretor.
Ele defende a legitimidade do grafite como arte, pois aponta para novas propostas estéticas em um momento de sufocamento, semelhante àquele que vivíamos na Ditadura Militar. Além disso, de acordo com Marcelo, esse tipo de arte transgressora só existe enquanto houver o que transgredir. “Talvez, se vivêssemos em uma cidade sem muros e repressão, não faria sentido a existência dos grafites, dos pixos e do Rap”, disse ele.
Rap no Oswald Sandrão, Bobina MC e Gão conversaram com os alunos do Ensino Médio sobre a importância do Rap nacional
Os alunos do Ensino Médio do Oswald se encontraram para conversar sobre a origem, a atualidade e a representação do Rap nas diversas mídias. O encontro contou com a presença de Sandrão, do grupo RZO, além de Bobina MC e Gão, do coletivo Labuta.
O encontro foi pensado como extensão de um movimento que já acontece há algum tempo no Oswald. “Nos últimos tempos, realmente foi sendo criado um movimento Rap dentro da escola, entre alunos de várias séries, independente da familiaridade que eles têm com esse tipo de música”, contou João Catan, que organizou a atividade ao lado de André Gil - ambos do 3º ano do Ensino Médio - e Gianluca Fiorini, do 2º ano do Ensino Médio.
Evandro Rodrigues e Marcio Moraes, professores de Língua Portuguesa, também fizeram parte do debate. Para Marcio, professor do Ensino Médio, o preconceito linguístico visa calar uma voz que é impossível de ser calada: a voz popular. Ele fez um percurso histórico da poética do Rap, que tem suas origens em cantigas do século XIII. Em seguida, Evandro, que é professor e músico, apresentou o Rap como ruptura de modelos estéticos anteriores. “O Rap é uma subversão do tempo racional e lógico”, afirmou. Para Felipe Augusto - o Bobina MC -, morador da Brasilândia, na Zona Norte de São Paulo, a cultura do Rap tem um importante papel pedagógico. “A função do Rap na periferia é ocupar o espaço da educação, que o Estado nunca ofereceu”, ressaltou ele. Quem finalizou o debate foi Sandrão, do RZO. Ele reafirmou a importância de o Rap ter sua mídia independente, pois tem que ser comunicado por quem o faz.
Intervenções de dança contemporânea durante o rupturas
Em nossa primeira Assembleia Geral com os alunos, apresentamos o tema a ser trabalhado nas atividades Rupturas: “A Ditadura Militar e suas Heranças”. Logo nas primeiras atividades propostas, a estudante Sofia Cruz veio me procurar para que juntos articulássemos um grupo de dança que apresentasse o tema de forma lúdica e artística, porém, sem perder o embasamento e a preocupação atenta para a mensagem a ser transmitida. Sendo assim, comunicamos os participantes da assembleia de nossa ideia e iniciamos a formação do grupo. Os ensaios foram realmente muito produtivos, e para solucionar nossos problemas, principalmente quanto a horários e disponibilidades, utilizamo-nos de gravações de vídeos e muitos debates online. Com isso, conseguimos compartilhar ideias, informações, vídeos da época - para que nos inspirassem -, além de atrelar nossos anseios e expectativas quanto ao grupo e às intervenções. As apresentações ocorreram muito bem. Sempre acompanhadas de uma boa dose de frio na barriga, normal antes de qualquer apresentação, e ainda mais essa, feita totalmente em coletivo, de forma horizontal e autônoma.
Nos impressionamos com a resposta imediata de todos que nos assistiram. Afinal de contas, como se tratavam de intervenções durante os horários de intervalos, buscamos nos preparar justamente para o oposto: para uma possível falta de respeito com a intervenção, ou até mesmo para encararmos uma plateia que poderia não estar acostumada com tal situação. Porém, para uma positiva surpresa, todos ficaram tomados por nossas intervenções, respeitando e participando da proposta de forma realmente muito boa! Após cada intervenção, nós nos reuníamos em algum local e lá dividíamos tudo o que sentimos durante a apresentação, dos medos e erros coreográficos a sentimentos de satisfação e felicidade. Esses momentos acabaram se tornando uma das principais vertentes da atividade, pois podíamos sentar logo após as intervenções, ainda quentes do “palco”, e trocar um pouco dessas sensações maravilhosas. As intervenções se dividiram em dois blocos: O Golpe e A Repressão. Neles, abordamos cada uma das temáticas conforme nossas pesquisas históricas sobre os temas. Após as semanas Rupturas, tomamos a decisão de que continuaremos a intervir nos intervalos, e já estamos produzindo os próximos blocos. Aguardem! Carlos Eduardo Lima Braga - Educador de Biblioteca
Por algum motivo eu achei que estava certo, jurava que aquilo seria o futuro. Achei que não existia nada mais importante que aquilo Nem pelo espaço, nem na própria face da terra Aos poucos aquilo foi ganhando corpo e crescendo dentro de mim de forma quase inexplicável, se quer matematicamente. Foi algo como um grande salto quântico Cada sorriso ficou amarrado no meu coração, com a mesma força que um elétron é atraído para o núcleo de um átomo, Cada abraço serviu-me como proteção divina, e cada olhar sincero me deu força para lutar pela liberdade, e pelos diretos da vida, os benditos direitos de sorrir.
Fiel
Companheira João Catan aluno do 3º ano do Ensino Médio
Tudo foi perfeito, tão perfeito que eu me esqueci... Eu me esqueci de sofrer sem motivos, Eu me esqueci de querer sem precisar, Eu me esqueci de acreditar nas mentiras contadas pelos mais velhos, E eu esqueci de tentar ser alguém que não sou. Eu me esqueci de tudo. Não lembrava nem ao certo o caminho para minha casa... E foi aí quando me dei conta de que havia esquecido de mim mesmo. Deixei Tudo para trás em prol daquilo, Deixei Tudo para trás em prol de melodias revolucionárias que dão vida aos guetos, Deixei Tudo para trás em prol daquilo que traz o sentir sem pensar, e aquilo que faz o pensar sem sofrer, pois quando sofrido é bem vivido. Deixei Tudo pra trás pois acreditei, acreditei e vi o milagre da vida com meus próprios olhos. Senti a magia do “permitir-se”, e prometi a mim mesmo que, a partir de então, eu mudaria o mundo. Talvez não o mundo todo... nem talvez o país inteiro, e nem ao menos o meu bairro inteiro... porém com certeza o mundo interior dos meus irmãos, e dos demais que encontrarão sentido nas poesias e versos conhecidos como meu Tudo. Não existe homem maior que a música, e nem existe música maior do que o homem pode vir a ser. Tenha esperança na vida e invente a sua canção, pois quem faz música escuta o próprio coração.