Caderno Calafate

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Trabalho de Conclusão de Curso de Belisa Murta, Felipe Carnevalli, Marcela Rosenburg, Mateus Lira e Vítor Lagoeiro, sob a orientação de Adriano Mattos, Ana Paula Baltazar, Natacha Rena, Roberto Andrés e Wellington Cançado. Escola de Arquitetura UFMG Belo Horizonte, 2014

micrópolis é formado por Belisa Murta, Felipe Carnevalli, João Carneiro, Fernanda Gomes, Marcela Rosenburg, Mateus Lira e Vítor Lagoeiro



04 07 08 10

Modo de usar Textos de bolso

12 14 16 18 20

Fazer junto

À sombra dos edifícios Até onde vai a arquitetura? Por que um bairro? Por que o Calafate? Pelas ruas do Calafate Muito espaço, pouco público

128

Casa instantânea

134 144 157 158

Dia do suco

160 170 188 196 214

Presença gráfica

Parquinho

22 24 27 29 101 102

Território Contestado

108 118

Café da manhã

226 244 256 266 276 280

Linha do tempo

292

De perto e de dentro

Momentos Perceber o invisível Investigar pela ação Oficina de fotografia

Interpretações Preencher as lacunas Etiquetas Jornal Plataforma web Assuntos públicos Muro Cinema Bailes da banda Gabinete de curiosidades Casa Calafate

Interpretações Agradecimentos


MODO DE USAR O Caderno Calafate é um livro processual e periódico que compila as pesquisas, registros de ações e perspectivas para o Bairro Calafate. Desde o início do trabalho, em fevereiro de 2014, este caderno foi atualizado semestralmente, sistematizando toda a informação produzida e oferecendo uma oportunidade de avaliação do trabalho antes de sua continuidade. Esta publicação serve também como um manual das ações experimentadas no bairro, tornando seus métodos públicos e replicáveis.

PÁGINAS ROSAS As páginas rosas trazem os textos de bolso: uma série de reflexões e discussões sobre a escolha do território, a abordagem e os métodos experimentados neste trabalho. Ao mesmo tempo, elas traduzem em narrativas o nosso processo inicial de observação no bairro por meio de episódios cotidianos que conformam a paisagem local.

PÁGINAS CINZAS Pelas páginas cinzas estão distribuídos os três momentos que estruturam o trabalho no Calafate. Estas páginas compilam percepções do bairro a partir da vivência (Perceber o invisível), registros de ações realizadas no local que experimentam possibilidades de troca e ativação espacial (Investigar pela ação) e os projetos para o espaço público que surgem como desdobramentos das pesquisas e das ações anteriores (Preencher as lacunas).

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PÁGINAS AMARELAS As páginas amarelas aparecem ao final de muitos dos capítulos marcando os manuais dos processos que iniciamos no bairro. Com a intenção de tornar os procedimentos por nós adotados acessíveis e replicáveis em outros contextos, estes manuais não tem o compromisso de compartilhar o modo mais eficiente de fazer, mas o modo considerado mais adequado frente aos recursos e tempo disponíveis para cada ação ou projeto. Aberto à atualização e à adaptação por quem tiver interesse, as páginas amarelas se propõem a mostrar que as soluções podem ser mais simples que aparentam ser.

CARTAZ O cartaz apresenta uma linha do tempo que organiza um panorama temporal de todos os momentos do trabalho até a edição deste caderno. Categorizando as pesquisas, ações e projetos de acordo com seus métodos e intenções, a linha do tempo permite visualizar a trajetória do trabalho e vislumbra possíveis continuidades.

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TEXTOS DE BOLSO


À SOMBRA DOS EDIFÍCIOS

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A metrópole inquietou primeiro pela imensidão. Em seu princípio, o processo de urbanização esteve na origem de uma sociologia que se preocupava com o afogamento dos recémchegados em uma sociedade de massas anônima e anômica. Por outro lado, a explosão das cidades deu lugar a uma mitologia em que o urbano se tornou o local da realização de todos os sonhos humanos. Logo vieram os grandes projetos, as grandes utopias, preparadas cautelosamente para substituir-se a uma realidade urbana que, a despeito de todas as boas intenções, estava sempre aquém do ideal. Os habitantes — aqueles que observam a cidade não do alto dos mapas, mas de baixo da sombra dos edifícios — não tardaram em mostrar sinais de afogamento. O coletivo Micrópolis nasceu do desejo de enxergar a cidade apesar de sua imensidão — um tecido enorme, porém finíssimo, em que as menores tramas são os principais pontos de apoio dos habitantes. Para nós, os pequenos afetos, os mínimos hábitos, e as estratégias de sobrevivência quase invisíveis são elementos essenciais dos modos de existir na metrópole. Nesta escala, nos deparamos com co-habitantes que, muito mais que usuários, são também co-criadores do urbano. Por isso, enquanto cidadãos, estudantes e praticantes da cidade, decidimos inverter nossa ótica de atuação. Colocamos o processo antes do produto, a negociação no lugar do arbítrio e o micro na frente do macro. Até aqui, nossas ações tem consistido em pequenas intervenções que pretendem alterar brevemente e sutilmente a trama urbana. Nossa presença no Calafate é o prolongamento natural desta trajetória. Neste trabalho, mantemos a mesma escala de atuação, mas ampliamos o seu escopo, abarcando todo um bairro de Belo Horizonte. Da mesma forma, nos propusemos um período de intervenção mais prolongado. Assim, pretendemos privilegiar uma imersão gradual no bairro, um estudo cuidadoso de seu panorama atual e a proposição de ações, juntamente com os atores locais, que possam multiplicar e potencializar os espaços de sociabilidade possíveis do Calafate. A intenção não é propor pretensas soluções, mas antes explorar as potências de práticas que já existem no bairro, além de permitir que os efeitos positivos se reproduzam através do fortalecimento dos laços entre os habitantes e demais atores. Finalmente, nosso interesse pelo bairro Calafate parte da convicção fundamental que uma urbanidade humana e generosa pode e deve existir em todos os lugares da metrópole. Por isso a escolha de um bairro de classe média, um território geralmente distante dos holofotes da Academia. Além disso, escolhendo um bairro majoritariamente residencial e pouco denso, queremos estar o mais próximo possível do habitante da cidade — não do consumidor, passante, ou turista. Este trabalho, enfim, é uma forma de explorar as possibilidades daquela que, acreditamos, é a função fundamental da metrópole: viver o cotidiano. 9


atĂŠ onde vai a arquitetura?

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O exércicio tradicional da arquitetura vem sendo questionado ao longo dos últimos anos frente à complexidade das mutações urbanas e das práticas culturais, sociais e políticas correntes na cidade, cujas demandas não conseguem ser direcionadas a um único campo do conhecimento. Tais contextos acabam por incitar atravessamentos disciplinares e a troca de atribuições específicas. De repente, o arquiteto cozinha como processo de pesquisa, o músico cartografa paisagens sonoras e o cidadão comum aprende a reformar a própria casa. Isso não quer dizer, contudo, que os arquitetos abriram mão da prática espacial. Cooperativas de construção, projetos participativos, financiamento colaborativo e ações coletivas tem mostrado que a mudança no papel do arquiteto está, de fato, localizada nos modos de fazer, e não o leva a abandonar os interesses originais da disciplina. Afinal, o arquiteto estabelece relações mútuas com a cidade e, à medida em que contribui para sua transformação, tem também suas ações transformadas por ela. Ainda muitas vezes empregado na prática da arquitetura, o pensamento moderno se utiliza de um método científico pretensamente neutro para a análise da cidade. Assim, os seus diagnósticos partem do princípio de que a cidade está doente e que, ao identificar esses problemas, nós, arquitetos, podemos oferecer respostas técnicas precisas para solucioná-los. Em contraposição a essa prática, o mapeamento do território é um processo em que se trabalha no espaço concreto e vivido, e não no abstrato e construído. Munindo-se de uma visão otimista, seus praticantes procuram estar sempre disponíveis a procedimentos de pesquisa e ação externos ao campo estrito da arquitetura para identificar e experimentar as potencialidades ali encontradas. Não preocupados em formular arquiteturas icônicas e práticas de urbanismo de vista de topo, a prática arquitetônica e urbanística em que apostamos parte também de um trabalho colaborativo. Dissolvendo a atribuição da autoria a um indivíduo, o repertório de trabalho é construído através de associações e colaborações múltiplas e simultâneas, baseadas no afeto, troca, reciprocidade e transbordamentos de saberes. Além disso, partimos do princípio que pequenos projetos podem ter um efeito multiplicador e transformador na cidade sem necessariamente responder às necessidades de um cliente específico ou materializarse em um objeto construído. Esses projetos são encarados como experimentos, não em busca de uma resposta correta, mas de uma alternativa possível que atenda às demandas encontradas. Assim, enxergamos como possibilidade real para o arquiteto a prática do urbanismo tático em que, para uma melhor compreensão das dimensões sócio-espaciais do espaço de atuação, é feita uma imersão nas temporalidades, memórias, desejos e imprevistos de um lugar. Ao vivenciá-lo, podemos compreendê-lo melhor para reformular constantemente nossos questionamentos e sermos criativos e eficientes frente aos problemas encontrados. Atuar com olhar aterrissado, pragmático, flexível e plural, de acordo com as circunstâncias encontradas, é trabalhar de maneira reativa e propositiva à realidade vivenciada. 11


fazer junto

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O trabalho coletivo sempre se manifestou em momentos em que novas metodologias passam a ser experimentadas como forma de questionar as práticas vigentes de produção do espaço. Team 10, Archigram, Superstudio, os Metabolistas, entre tantos outros, experimentaram utopias críticas como possibilidades de transformação social, usando como plataformas de comunicação cartazes, manifestos, ilustrações, zines, quadrinhos, poesia e statements radicais. Hoje, os coletivos continuam se reunindo em torno da inquietude em relação aos mecanismos estatais e mercadológicos da arquitetura e do urbanismo. Essa busca por uma prática espacial condizente com os conflitos econômicos e políticos correntes é facilitada por uma estrutura experimental de trabalho, livre de uma organização hierárquica, das amarras da autoria individual e que se permite a questionar as regulamentações e enxergar o trabalho do arquiteto para além do objeto construído, ampliando seu campo de atuação. Dentre as várias diferenças entre os grupos de arquitetura experimental da metade do século XX e os de hoje, talvez a mais notável seja o caráter pragmático dos coletivos que atuam nos dias atuais. Ainda tendo como base a potência imaginativa e política de seus experimentos, eles estão muito mais interessados em trabalhar com a potencialidade de territórios e dinâmicas já existentes, abrindo mão dos obsoletos manifestos do século passado que profetizavam um cenário sócio-espacial que ainda estava por vir. A prática de um coletivo é também marcada por relações horizontais e flexíveis. São indivíduos com pontos de vista divergentes que se envolvem para elaborar questões comuns, motivados por interesses compartilhados e afetos mútuos. Nesse formato investigativo, onde há mais perguntas lançadas que respostas formuladas, os desacordos e conflitos são constantes, o que acaba por servir como força motriz para o avanço da prática do grupo. Além de todas essas questões, o trabalho coletivo no bairro Calafate nasce da vontade de multiplicar nossos esforços e aumentar nosso fôlego para a pesquisa, as ações e os projetos para o bairro. Acreditamos que o trabalho em equipe aumentará o alcance de nossas ações, especialmente sob a noção de que o total é mais forte que a soma das partes fragmentadas. Por isso, visando à coerência do trabalho, cada etapa é resultado de muitas conversas que buscam uma construção conjunta, grande parte das vezes por meio do debate e do conflito. Objetivos não menos importantes, porém, são a finalidade prática de nossa atuação e desdobramentos posteriores ao trabalho em si. Tais objetivos não fariam sentido, contudo, sem um processo aberto e colaborativo. Presume-se, portanto, a interferência de agentes externos ao núcleo coletivo inicial que contribua com suas competências e entenda o trabalho como plataforma de troca entre investigações e práticas diversas, seja em procedimentos metodológicos, gráficos e até culinários. O processo se pretende também aberto aos agentes do cotidiano do território de atuação, o que implica em adentrar suas temporalidades, suas vontades e seus valores, de modo a tornar o próprio trabalho mais tático e sujeito ao imprevisível. 13


por que um bairro?

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O bairro é o lugar da transição. Ali, nos deslocamos entre o íntimo e o desconhecido, entre a casa e a cidade, passando por pessoas nem íntimas, nem anônimas. Apesar de bem definidos pelos mapas do município, os limites geográficos do bairro são também transitórios. Além de sofrerem, de tempos em tempos, transformações oficiais pelos planejadores urbanos, estes limites também variam entre aqueles que percorrem diariamente o bairro a pé. Os limites da zona de aconchego, que permitem que uma pessoa saia de chinelo e cabelo despenteado até o comércio mais próximo para comprar o leite que falta de manhã, podem ser diferentes entre vizinhos que compartilham endereços bem parecidos. O bairro é também o lugar do conflito. As disputas e negociações que surgem pelo compartilhamento do espaço são constantes, sejam elas geradas por atividades controversas ou por elementos adicionados ou subtraídos da paisagem local. É no bairro também que se experimentam processos de conquistas coletivas que, engatilhadas pelo esforço cidadão, podem transformar a cidade sem depender de decisões feitas de cima para baixo. Essas ações podem materializar-se em hortas comunitárias, sistemas de coleta seletiva independentes, cozinhas públicas, festas juninas, entre tantas outras. Por outro lado, processos urbanos como a verticalização, a privatização do espaço público e a formação de enclaves fortificados da vida privada, para mencionar apenas alguns, vêm diluindo em ritmo acelerado a dimensão da vida em comunidade dos bairros, reduzindo-os muitas vezes à noção de localização geográfica e posição sócio-econômica de um indivíduo na cidade. Assim, o cotidiano das cidades vai se esvaziando de espontaneidade e simpatia, reproduzindo modelos excludentes e anti-sépticos de vida em comunidade. Nos soa urgente, portanto, mapear, dar visibilidade e nos envolver em territórios e práticas de vizinhança que ainda se encontram pulverizadas pela cidade. Ou seja, potencializar lugares e modos de vida microscópicos que nos encorajam a firmar relações afetivas, tenham elas desdobramentos políticos ou econômicos, nos distraídos trajetos cotidianos que desenham nossos bairros. 15


por que o calafate?

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Rostos familiares, cumprimentos entre o portão e a calçada. Laços afetivos e sutis relações de vizinhança. Muitas casas, alguns muros, poucos prédios. Acesso fácil pelo metrô, encontros animados pelo comércio local. Conflitos rotineiros entre os moradores e o poder público. Rodovias, ruas, becos. Em nossas andanças por Belo Horizonte, buscávamos um bairro que atendesse aos interesses de todos os membros do coletivo. O ponto de partida foram os limites externos à Avenida do Contorno, uma vez que a maioria das atenções já estão voltadas para o centro da cidade. Também nos pareceu sensato reduzir as opções aos bairros onde os membros do grupo moram. Afinal, a percepção requer envolvimento — como salienta o artista catalão Antoni Muntadas — e não há envolvimento maior do que o habitar. Pouco a pouco, fomos percebendo que tudo o que procurávamos podia ser encontrado no bairro Calafate. O Calafate é o lugar do acaso, do inexplorado, das pequenas descobertas e encontros fortuitos. É um território que, de tão presente nas trajetórias cotidianas, já se tornou invisível aos olhos daqueles que vivem ali. Mas a invisibilidade, o acaso e o inexplorado não são características exclusivas desse território. Elas são comuns aos bairros de classe média da capital mineira, o que faz do Calafate um bairro como tantos outros. Se é um bairro “como tantos outros”, o Calafate, mais do que a escolha certa, é um exemplo. Exemplo entre muitos possíveis de como os próprios bairros onde vivemos merecem certa atenção. Nossa experiência nos faz perceber os vários problemas que afetam nosso espaço cotidiano, e descobrir que muitos vizinhos — desarticulados e sempre esperando uma resposta do poder público — compartilham desse incômodo. O olhar que damos ao Calafate hoje poderia ter sido dado ao Santa Tereza, Santa Efigênia, Sagrada Família, Salgado Filho, Jardim América ou Serra. Mas gostamos de considerar a escolha do Calafate como um pontapé inicial. Ele é um experimento, e os experimentos são feitos para serem compartilhados e reproduzidos, seja pelos arquitetos ou por qualquer um que se sinta na responsabilidade de tornar melhor o espaço em que vive. Afinal de contas, a quem a cidade pertence mesmo? 17


pelas ruas do calafate

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Momentos antes do antigo bonde passar pela rua Platina, apinhado de pessoas vindas do centro de Belo Horizonte, a criançada enchia os trilhos de sabão e corria para o alto do jardim da igreja — de onde acabaram de assistir à impreterível missa de domingo — para ver o bonde deslizar. O nervoso motorista, ao ver os sorrisos de missão cumprida estampados nos rostos das crianças, saía correndo atrás dos pestinhas que se separavam e se escondiam pelas ruas (ainda escassas na época) do bairro Calafate. Naquele tempo, as crianças nunca pensaram que o bonde poderia cair, mas acabou acontecendo. Não por causa do sabão, mas para dar lugar ao asfalto que sustenta o tráfego intenso de carros e as atuais linhas de ônibus da capital. Com uma considerável população antiga, o Calafate foi um dos primeiros bairros a se formarem para além dos limites da cidade planejada de Belo Horizonte. Seu loteamento, de 1894, substituiu uma antiga área de fazendas pertencentes a um português calafateador, ofício de reparador de barcos que deu nome ao bairro. Hoje, com cerca de 7500 habitantes, o Calafate já viu seu território se estender e se retrair em relação ao seu vizinho Prado, o que explica o forte vínculo entre os dois. Aliás, muitos moradores são até adeptos da formação de um possível “Calaprado”. De segunda a sexta-feira, as ruas do bairro ficam cheias de gente. Na praça da igreja, um grupo de senhoras vê o tempo passar enquanto os motoristas de taxi se cumprimentam entre uma viagem e outra. Os bares, de tão pequenos, se estendem calçada afora com cadeiras de plástico que parecem não incomodar aqueles que acabam de fazer compras no sacolão. Em frente à loja de sucos, moradores se comprimem no único filete de sombra existente enquanto esperam o ônibus. Ao lado do Banco do Brasil, um grupo de jovens jogadores acaba de sair de uma das inúmeras quadras do bairro, tentando passar por entre o tráfego intenso da rua Platina. Intensidade de carros, mas também de comércios: alguns funcionando no mesmo lugar há cerca de sessenta anos, outros abertos há cerca de sessenta dias. Em horários de pico, o beco que liga o bairro à estação de metrô fica cheio de alunos das três escolas do bairro: uma estadual, uma particular e uma técnica. Personagens importantes vistos frequentemente nas ruas são os militares. No Calafate há alfaiates para militares, salões de beleza para militares, vagas de quartos para militares. Tudo isso por causa do Batalhão de Polícia do Prado que ocupa hoje o que antigamente foi o primeiro hipódromo de Belo Horizonte. Diga-se de passagem, o Calafate e o Prado são os bairros dos primeiros: a primeira decolagem de avião da cidade, a primeira banda da capital, a primeira bacia de contenção da região oeste, que promete desapropriar os moradores da vila que se espreme entre as rodovias da Teresa Cristina. Mas também são os bairros dos “tambéns”: a loja de suco que também é loja de celular, o estacionamento que também é bar, o cinema que também é oficina mecânica, o comércio que também é rua, a rua que também é quintal, o quintal que também é horta. 19


muito espaço, pouco público

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Visto do satélite, o Calafate não deixa a desejar em relação a locais de respiro urbano: áreas verdes e espaços não-construidos pontuam o território do bairro, indicando um potencial considerável de constituição de espaços públicos. Quem caminha pelas ruas tem menos sorte, e descobre que estes espaços se encontram degradados, esvaziados ou confinados entre muros. Mesmo assim, um transeunte desinformado que percorre as ruas do Calafate poderá se deparar facilmente com alguma praça. Há pelo menos cinco delas espalhadas pelo bairro, sendo que a Praça Carlos Marques se destaca pelo tamanho e presença no imaginário dos moradores. É de se esperar que espaços como estes, abertos, de respiro entre as edificações, com vocação ao descanso e à desaceleração, abram possibilidades para o compartilhamento e o estabelecimento de trocas. Ao mesmo tempo, a diversidade de atores e a simultaneidade de ações podem gerar conflitos e disputas, que são um reflexo dos impasses que permeiam a questão pública. De certa forma, ao longo de nossas investigações no Calafate, a Praça Carlos Marques foi se mostrando como um reflexo daquela que identificamos como a principal questão do bairro: o esvaziamento das esferas públicas locais. A praça é objeto de uma série de frustrações dos moradores. Existe um atrito entre estes e os alunos da Escola Bernardo Monteiro, motivado por razões diversas, dentre as quais se destaca o incômodo diante do comportamento dos estudantes, tido como “desordeiro”. A isso se associa uma série de preconceitos ligados com a origem social dos alunos, vindos de bairros mais pobres das redondezas, e assim os canais de diálogo com a escola tem se desgastado. Algumas ocorrências de tráfico ou uso de drogas no espaço da praça acabam por acentuar a insatisfação e o sentimento de insegurança dos moradores. Finalmente, alheios a estas questões mas também fonte de descontentamento, alguns moradores de rua tem por vezes ocupado a praça e o coreto. De outro lado, a praça é também objeto de muitas das lembranças dos moradores e das expectativas para o futuro do bairro. Quando interrogados, muitos apresentam sem hesitar uma série de idéias para a melhoria do local, da manutenção mais frequente dos jardins à instalação de equipamentos de exercício físico. No entanto, estes desejos geralmente ficam limitados à expectativa pela intervenção do poder público. Neste sentido, a Praça Carlos Marques é tratada como a maior parte dos espaços públicos no Brasil: espera-se passivamente a intervenção do poder público no espaço degradado, ao mesmo tempo que se dá pouca credibilidade às apropriações espontâneas. Aconteça o que acontecer, não pise na grama. Portanto, se as praças do Calafate padecem de algum problema, este parece estar mais ligado à falta de público que à falta de espaço. Isso se dá por um fenômeno paradoxal: estes espaços são ao mesmo tempo objeto de todas as expectativas e todos os estigmas. Deseja-se um lugar mais convivial e movimentado, mas evita-se visitar a praça por receios quanto à segurança. Sonha-se com jardins e mobiliários melhor cuidados, mas não se valoriza as iniciativas espontâneas e se descarta a possibilidade de gestão coletiva do espaço. Esta série de impasses acaba por travar evoluções positivas do espaço público. Neste contexto, entendemos que o papel do arquiteto-urbanista não deve ser o de reformular o espaço, mas antes debruçar-se sobre as minúcias destas questões para estimular a formação de um novo público. 21


Territ贸rio contestado

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Os motoristas passam apressados pela Avenida Tereza Cristina, importante via de ligação entre o centro da cidade e regiões afastadas a Oeste. A rodovia urbana margeia o rio mais importante da cidade, onde outrora havia campos de futebol de várzea, pescadores e banhistas. Quem agora mergulha no fluxo do caos rodoviário mal percebe que no gramado vazio dentro de uma alça viária alguns acontecimentos contrastam com a velocidade e impessoalidade dos carros. Cavalos tentam extrair resquícios de pasto da grama curta, algumas crianças jogam futebol em um campo com traves de bambu e uma mulher pendura roupas em um varal improvisado. Do outro lado, casas de alvenaria aparente se apertam à beira da avenida. O aglomerado de becos e barracos se estende até a divisa com a linha de trem. É aí que moram os carroceiros que cuidam dos cavalos, as crianças do futebol e a dona das roupas. No início da década de noventa, um grupo de pessoas decidiu ocupar uma área privada onde hoje se encontra a Vila Calafate. O proprietário do terreno nunca manifestou incômodo em relação à ocupação, que logo se consolidou. Os primeiros barracos de madeirite se concentravam à margem da linha de trem e a Vila foi se expandindo em direção à Avenida Tereza Cristina. Quase nenhuma casa foi construída do outro lado da avenida, onde hoje está o campo de futebol, pois nesta área pertencente à prefeitura o risco de remoção é muito maior. Nos primeiros anos, o número de casas aumentou rapidamente. A notícia de uma nova ocupação se espalhou e, procurando se livrar do aluguel e morar em uma área bem localizada, muitas pessoas compraram partes dos terrenos dos primeiros ocupantes. À medida que os moradores juntavam dinheiro para aumentar suas casas e novos barraco eram construídos, hortas e quintais foram dando lugar a mais tijolo, cerâmica e concreto. As ruas e avenidas que circundam a Vila Calafate funcionam como um muro imaginário, que delimita a área ocupada. Ao mesmo tempo, é nesse perímetro de fronteira que a esfera doméstica se expõe para o público e ocorrem os encontros do cotidiano. Na Rua Bimbarra, que circunda os fundos da Vila, os moradores sentam nas calçadas, conversam nos botecos e se apropriam do gramado em frente com varais e pequenas hortas (ocasionalmente removidas pela prefeitura). Do outro lado, a movimentada Avenida Tereza Cristina não é tão convidativa para a permanência, mas possibilitou o surgimento do topa-tudo e de uma loja de móveis, que se aproveitam da abundante clientela que passa ali todos os dias. Outras economias locais também se beneficiaram da localização privilegiada: a fábrica de cofrinhos de gesso atrai compradores por estar na entrada da vila, o ferro velho surgiu ali pela facilidade de acesso e os carroceiros deixam seus cavalos no gramado depois de jogarem os carregamentos no bota-fora próximo. Atualmente, uma intervenção de grande escala, com o pressuposto de beneficiar toda a cidade, pode acabar com a Vila Calafate. A construção de uma bacia de contenção para o Ribeirão Arrudas irá minimizar os efeitos das inundações que começaram a acontecer depois que as margens e o leito do rio foram impermeabilizados. Na própria vila nunca houve enchente, mas a obra será feita, financiada pela parceria entre o Estado e o setor privado, através de uma operação urbana consorciada. A opinião dos moradores está dividida. Alguns querem ficar pois têm uma relação afetiva com o lugar ou têm medo de ir para muito longe; outros estão indiferentes ou acham que a remoção pode não acontecer, como da outra vez; outros querem sair pois vêem na mudança uma possibilidade de melhoria. E para onde irão essas pessoas? 23


de perto e de dentro

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Nossa inserção no Calafate buscou exercitar, desde o início, meios de infiltração e envolvimento que permitissem uma visão otimista do território e, em vez de identificar mazelas a serem resolvidas, despertassem possibilidades a serem fomentadas. O diagnóstico foi substituído pelos mapeamentos processuais, e os questionários tendenciosos, por ocasiões banais que suscitam conversas. Apesar de descontraídos, esses diálogos estiveram sempre permeados de vestígios de questões e conflitos instigantes da vida cotidiana local, e assumiram os mais diversos formatos - de um corte de cabelo no salão militar à espera do ônibus sob o intenso sol da tarde. Assim, procurávamos substituir a postura do planejador que observa às alturas pela postura de quem vivencia de dentro e de perto. Em todo o processo, nos preocupamos em não assumir uma identidade estanque de arquitetos ou agentes da universidade, para que nossas conversas não se transformassem apenas em oportunidades para as denúncias dos moradores. Pouco a pouco, essas conversas nos levaram a perceber a presença de protagonistas no bairro. Eles são geralmente mais ativos politicamente, dispostos a falar e opinar com maior entusiasmo e, muitas vezes, representam agrupamentos sociais, como a associação de moradores, a igreja, a escola, os alunos, a polícia, a banda, entre tantas outras redes existentes. Nessa altura, nossas intenções de pesquisa já estavam mais esclarecidas, o que nos permitia assumir a postura de agentes interessados em atuar naquele território. As conversas adquiriram, então, formato de entrevistas semi-estruturadas, já que não queríamos que elas, apesar de temáticas, deixassem de ser abertas ao acaso. Esse percurso foi fundamental para a elaboração dos mapeamentos do bairro, os quais buscavam pôr em relevo suas potencialidades e impasses. Entretanto, esse processo não se limitou a dissecar a realidade em camadas. Ele também experimentou um procedimento de pensamento coletivo sobre o espaço e serviu como dispositivo de aproximação entre o observador e observado, uma vez que buscávamos representar não somente os aspectos visíveis da paisagem, mas também as relações de afeto e de cooperação com as quais nos deparávamos ao longo da pesquisa. Tais aproximações foram também sendo testadas em processos híbridos de mapeamento e ação que, além da coleta de informação, nutriam possibilidades de ativação de determinados espaços pelo bairro. Foi o caso, para citar alguns, da oficina de fotografia realizada com os alunos da Escola Estadual Bernardo Monteiro, do café da manhã comunitário, dos mapas mentais das fronteiras do bairro e da linha do tempo coletiva, realizada durante o XVII Encontro dos Amigos dos Bairros Calafate/Prado. Esses primeiros passos rumo à descoberta de potencialidades e impasses têm como objetivo, além da criação de uma rede de afeto e confiança, a elaboração de uma interrogação coletiva que inquiete, impulsione e desafie nossa prática no bairro. Assim, pretendemos encontrar, apesar das singularidades e interesses de cada um de nós, uma ótica comum e transversal a todo o trabalho, de modo a garantir coerência às ações e projetos que vêm sendo desenvolvidos. Apenas evitando esforços paralelos e fragmentados, poderemos tirar proveito das possibilidades de um trabalho proposto a dez mãos e a realizado a muitas mais. 25



MOMENTOS Estruturamos nossa metodologia de imersão no bairro em três momentos. Eles não estão divididos cronologicamente, nem hierarquicamente, mas são simultâneos, de modo a possibilitar interferências entre si. O que os diferencia é o limiar entre o caráter investigativo e o propositivo. Isto é, são aplicados ora para nos informar, ora para ativar transformações no bairro. É claro que qualquer observação, por mais discreta que seja, constitui em si mesma um elemento transformador do espaço. Ao mesmo tempo, toda ação concreta traz algum aprendizado sobre o lugar. De qualquer forma, dissecar nossa prática em três seções contribui com o alcance de um processo mais lúcido e coerente, por mais que o próprio trabalho esteja em constante questionamento e transformação.

1. PERCEBER O INVISÍVEL Através de andanças e conversas, descobrimos e documentamos em mapeamentos as nuâncias e práticas sócio-espaciais invisíveis do bairro, bem como aquilo que é perceptível à vista em diferentes escalas - das calçadas do bairro a bases cartográficas já existentes. 2. INVESTIGAR PELA AÇÃO Participando de eventos locais já existentes, propusemos processos híbridos de mapeamento e ação que catalisam o uso de determinados espaços, instigam a percepção dos envolvidos sobre o bairro e, ao mesmo tempo, nos informam sobre as relações de afeto e visões subjetivas sobre o território. 3. PREENCHER AS LACUNAS A partir de questionamentos formulados pelos mapeamentos e ações realizadas anteriormente, o terceiro momento propõe a experimentação um sistema de projetos que visam processos de reconquista, ressignificação e deslocamentos da noção atual de espaço público no bairro.

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PERCEBER O INVISÍVEL Procuramos em meios oficiais e bases geográficas informações urbanísticas sobre o Calafate e Prado. Mas para além do entendimento quantitativo do bairro, procuramos descobrir práticas socio-espaciais a princípio invisíveis. Em um primeiro momento, não se sabe o que será encontrado, por isso a tática investigativa se assemelha à deriva. Na medida em que se enunciam questões mais bem formuladas, a pesquisa se torna mais específica, com foco naquilo que se mostra mais instigador e paradoxal. Nas andanças e conversas, observamos, nos apresentamos e trocamos experiências com desconhecidos, fizemos entrevistas semi-estruturadas com protagonistas e experimentamos práticas do dia-a-dia do lugar. Entende-se o bairro não como objeto de estudo, mas como ambiente de estudo, onde se estranha o familiar e os pequenos acontecimentos são valorizados como camada de leitura possível e à história oficial, revelando as potencialidades e os impasses do território.


ASPECTOS GEOGRÁFICOS Os bairros Calafate e Prado estão ambos localizados na regional Oeste de Belo Horizonte (MG, Brasil). Para fins de comprendê-los melhor, foram levantados alguns dados geográficos básicos a partir do Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e utilizados de forma comparativa.

Brasil Minas Gerais

Calafate Prado

Regional Oeste Belo Horizonte

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Calafate

Prado

Área: 1,04km2 População: 7.475 Posto de saúde: PAM Campos Sales Escolas públicas: Escola Estadual Bernardo Monteiro e Polimig Escolas particulares: Colégio Piedade Igreja: Paróquia São José Calafate Referência urbana no passado: Estação Férrea do Calafate Referência urbana no presente: Rua Platina

Área: 1,59km² População: 13.800 Escolas públicas: Colégio Tiradentes, Escola Estadual São Bento e Centro Estadual de Ensino Técnico Ensino superior: Faculdade Estácio de Sá e Faculdade de Minas Gerais (FAMINAS) Igreja: Cura D`Ars Referência urbana no passado: Prado Mineiro Referência urbana no presente: Academia de Polícia de Minas Gerais (APM)


Prado

Calafate

área de investigação

Densidade demográfica (habitantes/m2)

4 - 8.186

8.206 - 12.520

12.537 - 17.834

17.882 - 27.455

27.716 - 82.049

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Rendimento nominal mensal mĂŠdio (R$)

0 - 1.000

1.001 - 2.000

2.001 - 3.000

3.001 - 4.000

4.001 - 5.000

111- 153

154 - 281

NĂşmero de pessoas residentes de 0 a 5 anos

0 - 36

32

37 - 72

73 - 110


NĂşmero de pessoas residentes de 20 a 24 anos

0 - 36

37 - 72

73 - 110

111- 153

154 - 281

111- 153

154 - 281

NĂşmero de pessoas residentes de 60 anos ou mais

0 - 36

37 - 72

73 - 110

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ZONEAMENTO A Lei de Uso e Ocupação do Solo de Belo Horizonte já passou por algumas alterações que influenciaram o Calafate e a região.

Em 1985 a lei delimitava zonas específicas de uso, muito relacionadas com as vias. Nessa época, por exemplo, as ruas Platina, Francisco Sá, Cuiabá e Brumadinho já eram consideradas Zonas Comerciais. O centro do bairro era dedicado às residências. Por fim, existiam as Zonas Especiais (onde se localiza o Quartel) e de Ligação Rápida, onde há uma predominância de Galpões. Essa conformação pode ser notada na paisagem até os dias atuais.

A maior parte da região se caracterizava como Zona de Adensamento Preferencial, o que favorece a construção de edifícios. A Zona de Grandes Equipamentos (ZE) determinava áreas como o Quartel e mais a oeste o suposto terminal de passageiros, onde seria implantada uma nova Rodoviária. Este projeto foi abandonado devido a pressão da população da região, que alegava que o sistema viário não teria porte para tal.

Na última versão da Lei, parte do Calafate e o quarteirão onde está a Faculdade Estácio de Sá se mantém como Zona de Adensamento Preferencial, enquanto o Prado é caracterizado como uma Zona Adensada, fato bastante perceptível no bairro. Isso provoca uma mudança no olhar dos investidores imobiliários, que se voltam ao Calafate, visando maiores adensamentos, porém manobrando os seus limites e tirando proveito do prestígio do Prado ao dizer que seus empreendimentos estão nele e não no Calafate. 34


ZC - Zona Comercial ZR - Zona Residencial ZLR - Zona de Ligação Regiona ZE - Zona Especial Lei de Uso e Ocupação de 1985

ZAP - Zona de Adensamento Preferencial ZA - Zona de Grandes Equipamentos Via Coletora Via Arterial Via de Ligação Regional Lei de Uso e Ocupação de 1996 e 2000

ZAP - Zona de Adensamento Preferencial ZA - Zona Adensada

Lei de Uso e Ocupação de 2010 35


FRONTEIRAS DO BAIRRO Este mapeamento sobrepõe as fronteiras do bairro desenhadas por moradores e ex-moradores do Calafate e Prado durante o encontro anual dos Amigos do Bairro. A falta de correspondência entre os limites definidos pelos moradores, pelo Google Maps e pela Prefeitura de Belo Horizonte, que de tempos em tempos os redesenha, nos motivou a investigar quais eram as fronteiras para os moradores que, dentre todos esses atores, são aqueles que cartografam com o pé no chão. Os limites em magenta representam os traçados daqueles que se consideravam habitantes do Calafate e os roxos, daqueles que se consideravam habitantes do Prado. Em tracejado, os limites definidos pelo Google Maps. As fronteiras mais recorrentes foram:

Av. Tereza Cristina, ao norte Av. Silva Lobo, ao oeste Rua Turquesa, ao sul Rua Cura D’Ars, ao leste

36


37


REFERÊNCIAS DO BAIRRO Na esfera local de um bairro, as pessoas o caracterizam pelos seus diversos tipos comércios, serviços e residências. Essas construções passam a constituir importantes elementos que, além de servirem como infra-estrutura ao seus moradores, se tornam pontos de referência. Ao adentrarmos no bairro Calafate, muitos desses locais se tornaram familiares a nós e estão representados neste recorte.

Metrô Calafate Via

Vila Calafate a Silv Av. Lob

Igreja São José do Calafate / Praça Inácio Fonseca

o

Av. Gua ra

Sociedade Musical Carlos Gomes - Banda do Calafate

Escola Estadual Bernardo Monteiro Escola Técnica Polimig Escola Nossa Senhora da Piedade Associação de Moradores do Prado e Calafate 38

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Batalhão da Polícia Militar

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Praça Carlos Marques

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Rua I tuiuta

Rua Cuiabá

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Av. Amazonas

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ASPECTOS HISTÓRICOS O Calafate tem uma rica história, tão antiga quanto a da cidade de Belo Horizonte. Produzido a partir de relatos de moradores antigos, documentos e depoimentos sobre a situação atual do bairro, esse mapeamento mostra como o progresso mudou - e continua mudando - as ruas e as vidas do bairro Calafate.

A capela de São José é construída, e junto com ela as primeiras casas do bairro

A antiga área de fazendas, pertencentes a um português, é loteada pela Comissão Construtora de Belo Hrizonte

O bonde chega ao bairro, o hipódromo da capital é substituído pela Academia da Polícia Militar. O Calafate se torna um bairro festivo, com seus bailinhos e festivais de futebol

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O asfalto chega ao bairro, e os bondes são substituídos por ônibus e carros. É construída a estação de metrô do Calafate.

O bairro é indicado para ser pólo da moda da cidade, e comércio se intensifica. Com o aumento dos estabelecimentos comerciais, a rua Platina sofre com constantes engarrafamentos

Os moradores da Vila Calafate recebem a ordem de despejo para a construção da nova Bacia de Contenção do Calafate, parte do projeto da Nova BH 41


RECONSTRUÇÃO DA PAISAGEM Realizado a partir de depoimentos de moradores que viveram no bairro entre as décadas de 1930 e 1960, este mapeamento simula a vista aérea do Calafate no final da década de 1930.

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Nessa época, a adesão da área à zona urbana de Belo Horizonte ainda se mostrava em processo pela remanescência de fazendas e baixo índice de ocupação. Contudo, ricas manifestações de apropriação do espaço já acontenciam por meio da pesca, futebol de várzea, entre outras práticas.

43


44


Nadava-se e pescavam-se peixes e cágados no Rio Arrudas e no Córrego das Piteiras, que deu lugar à Avenida Silva Lobo.

Frutas disponíveis na beira do rio pela polinização feita por pássaros

gabiroba

araticum

pequi

mamão

manga

Os campos de várzea deram lugar às obras viárias que acompanham o leito do Rio Arrudas.

Nos dias de nado e pesca, banhistas e pescadores acompanhavam a linha da rede ferroviária Oeste de Minas em direção ao Salgado Filho e à Cidade Industrial.

Atividades industriais como a olaria ocupavam alguns dos edifícios próximos à linha férrea nesse período de transição entre zona suburbana e urbana.

Nos primeiros anos que seguiram a inclusão da zona suburbana à zona urbana de Belo Horizonte, algumas das fazendas da região continuaram a produzir milho, abóbora, mandioca e outros legumes.

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COTIDIANO DA VILA CALAFATE Localizada no intersticio entre infra-estruturas de transporte (linha de trem e Via Expressa), a Vila Calafate teve sua ocupação iniciada no início da década de 1990. A densidade de casas e estreitos becos contrasta com o espaço aberto ao redor. Atualmente, os moradores vivem cheios de incertezas, pois há grandes chances de a vila ser completamente removida para dar lugar a uma bacia de contenção para o Ribeirão Arrudas. Estábulos e galinheiros.

Bota-fora onde os carroceiros descarregam

Ferro-velho do Tareco.

Gramado pertencente à prefeitura. Apropriações dos moradores são removidas.

Fábrica de cofrinhos.

Moradores reclamam do lixo que se acumula na rua.

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Essa área, mais consolidada, será a última ser removida.

O campo de futebol é a principal área de lazer para as crianças. Ribeirão Arrudas

O topa-tudo aproveita da localização privilegiada na Av. Tereza Cristina.

Os carroceiros deixam seus cavalos no vazio da alça viária.

O varal da Glaucinei é ocasionalmente retirado pela prefeitura.

Limite do terreno privado, não pertencente à prefeitura.

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POTENCIAL DE REAPROVEITAMENTO Este mapeamento é uma amostragem da diversidade de materiais que podem ser encontrados no bairro. Uma vez que são geralmente resíduos gerados por atividades econômicas locais, tais materiais podem ser coletados gratuitamente, ou ainda comprados a preços baixos em ferro-velhos e topa tudo.

1 Dayana Conserto de roupas Rua Platina, 1252 Um dos inúmeros estabelecimentos de costura do bairro resíduos disponíveis: retalhos de panos variados 2 Comercial Nagasaki Avenida Tereza Cristina, 2001 Galpão que fabrica e vende móveis de escritório resíduos disponíveis: pinus, MDP (compensado de eucalipto), chapa de OSB 3 Sacolão ABCenter Rua Platina, 1450 Comércio que utiliza caixas de madeira para transporte das frutas resíduos disponíveis: caixas de feira 4 Topa Tudo Stilo Avenida Tereza Cristina, 2211 Topa tudo resíduos disponíveis: cadeiras, estantes, armários *compra, vende e troca 5 Unidade de despejo de resíduos MG 050 esquina com Avenida Tereza Cristina Terreno onde são despejados resíduos principalmente de caçambas resíduos disponíveis: madeiras de diferentes tamanhos, pallets, móveis quebrados, molduras, etc. 6 Ferro velho do Tareco Rua Bimbarra, 345 Ferro velho que armazena e vende resíduos diversos resíduos disponíveis: caixas grandes de madeira (elevador) e grades *os materiais são vendidos 48

2

5 4

6


1 3

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DISPOSITIVOS MÓVEIS O intenso movimento na região da rua Platina e da estação de metrô do Calafate faz do bairro um facilitador para o desenvolvimento das pequenas profissões. Seja pela falta de empregos formais ou baixa qualificação, os vendedores ambulantes buscam nessa prática um reforço de sua renda, se apropriando de soluções criativas com poucos recursos disponíveis. Este mapeamento é um pequeno inventário do comércio informal do bairro, e busca compreender as particularidades dos dispositivos ambulantes utilizados pelos vendedores. caixa de plástico de feira

tela metálica ou grade

DVDs afixados com pregadores

bicicleta

estoque

1

2

veículo de entrega

quitutes para venda

expositor de DVDs

tabela de preços suspensa

balas armazenadas em potes de plástico lixeira

carrinho de mão

banqueta de plástico 3 50

lanchonete sobre rodas

4

carrinho-baleiro de mão


suporte para jornais janelabancada

5

acoplamento para carros

6 puxador de jornais

açaí drive guarda-sol fogão e gás

7

carrinho da pipoca

bandeja lateral

caixas de papelão ganchos expositores

sacolas para embrulho

8 sapataria ambulante 51


DIVERSIDADE PRODUTIVA Este mapeamento se estrutura em duas escalas. Em um primeiro momento, o estudo se propõe a detectar quais são os tipos de atividades econômicas existentes no bairro, bem como a predominância de determinadas categorias e sua distribuição territorial. Em um segundo momento, a escala de observação é reduzida à análise espacial de algumas amostras singulares de atividade comercial.

Comércio Serviços Bar/Restaurante/ Lanchonete Serviço Automobilístico Material de construção Franquia Imobiliária Serviço Militar Banco Lazer Artesania

52


53


Artesania Fábrica de Porquinhos. Rua Bimbarra 306 Banco Itaú. Rua Platina 939 Bradesco. Rua Platina 1094 Caixa Econômica Federal. Rua Platina 1328 Banco do Brasil. Rua Platina 1375 Militar A Militar Mineira. Rua Platina 491 Prado Militar Rua Platina 915 Bar Boot. Rua Platina 933 Elion Fardamentos. Rua Platina 1089 Mundo das Túnicas. Rua Platina 1156 Hospedagem Platina. Rua Platina 1701 Bar/Lanchonete/Restaurante Yeshua Service. Rua Platina 329 Quiosque. Rua Platina 675 Prato Feito na Hora. Rua Platina 685 Nova Lanchonete Sukão. Rua Platina 883 Restaurante Vitória. Rua Platina 1050 Sabor Fashion. Rua Platina 1052 Restaurante Dona Dina. 1093 Bar e Restaurante Platina. Rua 1144 Platina Lanches. Rua Platina 1282 Top Açaí Rua Platina 1380 Empadas.com. Rua Platina 1380 Loja de sucos e celular. Rua Platina 1404 Bar do Gordo. Rua Platina 1440 EstacionamentoBar. Rua Platina 1447 Restaurante Platina. Rua Platina 1470 Sorveteria Sabor de Minas. Rua Platina 1510 Caminho de Casa. Rua Platina 1560 Parada do Espeto. Rua Platina 1688 Platina Bar. Rua Platina 1942 Bar da Praça. Praça Carlos Marques s/n Bar Mineiro. Rua dos Andes 238 Guigos Bar. Rua Turqueza 523 Paladar Sef-Service. Rua Turqueza 592 Supermercado Romanina. Rua Turqueza 721 Mineirim Prado. Rua Turqueza 725 Bar do Júlio. Rua Turqueza 784 Patorroco. Rua Turqueza 865 Canto da Alvorada. Rua Turqueza 959 Bar do Prado. Rua Safira 535 Na Garagem Bar. Rua Rio Negro 368 Bem Mineiro. Rua dos Andes 238 BH Japa. Rua Doutor Thomaz Muzzi 234 Bar. Rua Cachoeira do Campo 188 Lanchonete do Flávio. Rua Oeste 622 Restaurante Calhau. Rua Oeste 618 Mona’s Butequim. Rua Oeste 598 Boteco. Rua Tombos 12 Quintal do Calafate. Rua José Viola 102 Chup Chup da Dona Aparecida. Bimbarra 322 J&L Açaí. Rua Bimbarra 167 Felícios Bar. Rua Bimbarra 343 54

Bar dos Artistas. Rua Bimbarra 345 Espestinho de Tudo. Rua Bimbarra 358 Construção Ferragens Elo. Rua Platina 511 AM Serralheria. Rua Platina 569 Coral Tintas. Rua Platina 587 Locação de Máquinas. Rua Platina 1108 Serralheria Metal Arte. Rua Platina 1195 Elétrica Cura Dárs. Rua Platina 1530 Depósito Platina. Rua Platina Calhas Platina. Rua Platina 1886 Calhas, coifas e dutos. Rua Platina 942 Depósito Comercial. Rua Turqueza 483 Ferro Velho do Tareco. Rua Bimbarra 345 Comércio Eletrônica Gontijo. Rua Platina 509 Milicianos. Rua Platina 865 Casa & Tinta. Rua Platina 1012 Supermercado. Rua Platina 1028 Nacional Tintas. Rua Platina 1060 Futura Papelaria. Rua Platina 1084 Fina Estampa. Rua Platina 1228 Dayana Conserto de Roupas. Rua Platina 1252 Fina Estampa Kids. Rua Platina 1262 Purific - Filtro para água. Rua Platina 1262 Sabor do Chá. Rua Platina 1282 Sônia Conrado Calçados. Rua Platina 1287 Galeria Comercial. Rua Platina 1382 Relojoaria Castro, Rua Platina 1398 Frigorífico Uberaba. Rua Platina 1402 Ponto Z Calçados. Rua Platina 1436 Sacolão. Rua Platina 1450 Chocolates e Balas Platina. Rua Platina 1466 Ótica Grande Visão. Rua Platina 1467 Nova Platina Armarinho. Rua Platina 1474 Papelaria Calafate. Rua Platina 1492 Drogaria Calafate. Rua Platina 1511 Loja de móveis. Rua Platina 1518 Nova Velocino Calçados. Rua Platina 1522 Exclusiva Modas. Rua Platina 1562 Armazém Zandona. Rua Platina 1564 Escala Foto. Rua Platina 1576 Flora Verde Rosa. Rua Platina 1580 Embalagens Apel. Rua Platina 1650 Happy Day Roupas. Rua Turqueza 500 Caricatura Jeanswear. Rua Turqueza 527 Trem Bão Delícias. Rua Turqueza 544 Clínica Corpus. Rua Turqueza 588 Maria Flor Roupas. Rua Turqueza 591 Fuxico Roupas Femininas. Rua Turqueza 601 Drogaria Hum. Rua Turqueza 633 Well’s Roupas. Rua Turqueza 643 Sapato e companhia. Rua Turqueza 669 Cheia de Mimos. Rua Turqueza 831 Empório Mineirim. Rua Turqueza 806 Sfera. Rua Rubi 483


Toquinho Kids and Teens. Rua Cura Dárs 530 Móveis usados. Rua Mosenhor Horta 74 Bolsas e calçados. Rua dos Andes 394 Jock Sports Revendedora. Rua Chopin 323 D&R Modas. Rua Bimbarra 306 Topa Tudo Stilo. Av. N. Senhora de Fátima 2211 Combine Móveis. Av. N Senhora de Fátima 2208 Franquias Alphorria Outlet. Rua Platina 241 O Boticário. Rua Platina 1299 Crefisa. Rua Platina 1317 Correios. Rua Platina 1385 EPA Supermercados. Rua Platina 1600 Cacau Show. Rua Monsenhor Horta 10 Serviços Wpeg. Rua Platina 337 Júnior Festas. Rua Platina 481 Salão Platina. Rua Platina 629 Salão Padrão. Rua Platina 637 Molduras. Rua Platina 873 MG Cred. Rua Platina 978 Lavanderia. Rua Platina 1056 VWPed Empréstimos. Rua Platina 1084 Gráfica Sabino. Rua Platina 1077 Mafran Chaves. Rua Platina 1126 Oralle Odontologia. Rua Platina 1176 Criatur Turismo. Rua Platina 1198 Maquigel Assistência. Rua Platina 1171 Renovadora de Calçados. Rua Platina 1262 Conserto Celular. Rua Platina 1281 Inluss. Rua Platina 1338 Perfil Penteados. Rua Platina 1469 Fotochaves. Rua Platina 1637 Equipotec Assistência. Rua Dr. Tomás Muzi 6 Corretor de Seguros. Rua Dr. Tomás Muzi 24 Recepções Vera Viegas. Rua Platina 1782 Clínica Ortodôntica Fabel. Rua Platina 1874 Contacto Brindes. Rua Platina 1863 Karina Advocacia. Rua Platina 1959 Áudio TV Eletrônica. Rua Turqueza 595 Trena Construtora. Rua Turqueza 637 Helen Salão. Rua Turqueza 889 Salão de Beleza. Rua Rio Negro 227 Divina Tattoo. Rua Turqueza 925 Alda Odontologia. Rua Tuqueza 994 Performane Fitness. Rua Turqueza 988 Hair Extension. Rua Três Corações 334 Manutenção Comput. Rua Três Corações 259 Movimentação Pilates. Rua Platina 187 Salão de Beleza. Rua Cachoeira do Campo 186 Regi’s Salão. Rua Alterosa 44 Aulas Particulares. Rua Rio Negro 402 Consultórios Médicos. Rua Rio Negro 459 Território dos bichos. Rua Rio Negro 430 Odontologia e Aulas de Música. Rua Chopin 360 Clínica de Arte. Rua Pedra Bonita 343

Copiadora Arte Livre. Rua Dolinger Ramos 1340 Salão Jerrau. Rua Calcedônia 34 Fidelys. Rua Safira 34 Nalva Salão. Rua Safira 14 Casa das Luvas. Rua Esmeraldas 32 Salão The Best. Av. N. Senhora de Fátima 2202 Salão Novo Visual. Rua Bimbarra 356 Imobiliária Conceito Imóveis. Rua Platina 515 Rede Morar Oeste Imóveis, Rua Oeste 552 Sagel Imóveis. Rua Cachoeira do Campo 195 Turquesa Imóveis. Rua Turqueza 544 Prado Imóveis. Rua Turqueza 669 Gilberto Imóveis. Rua Turqueza 705 Unilar Imóveis. Rua Rio Negro 62 Automóveis Novo de novo. Rua Platina 70 Fama Car. Rua Platina 351 Eletroinduzidos. Rua Platina 367 Autoescola França. Rua Platina 379 Alternativa Baterias. Rua Platina 405 TWS Automação. Rua Platina 457 Lemos Baterias. Rua Platina 463 Baterias. Rua Platina 559 Novo Tempo. Rua Platina 575 Polly Rodas. Rua Platina 677 Sem Detalhe. Rua Platina 711 Posto Shell. Rua Platina 829 TS Automotivo. Rua Platina 833 Bosch Car Service. Rua Platina 861 Jair Óleos. Rua Platina 930 Centro Automotivo. Rua Platina 940-44 Engelcar. Rua Platina 1061 Genair Automecânica. Rua Platina 1140 Sem Detalhe. Rua Platina 1223 Estacionamento Platina 1370 Centro Automotivo. Rua Platina 1688 Serviços Automobilísticos. Rua Platina 1790 Ferro velho ônibus. Rua Platina 1800 Mundo Renault. Rua Platina 1930 Rotribil. Rua Campos Sales 109 Mecânica em Gera. Rua Alterosa 75 Prado Car Wash. Rua Turquesa 1170 Lava Carros. Rua Turquesa 1020 HD Troca de óleo. Rua Cachoeira do Campo 57 Rom Car. Rua Oeste 510 Montanha Centro Automotivo. Rua Oeste 490 Zé Maria. Rua Monsenhor Domingos Pinhero 26 Lanternagem e pintura Jamir. Rua Diorita 217 Estacionamento. Rua Salvador Piló 54 Tudor Baterias. Rua Salvador Piló 15 Dr. Radiador. Rua Platina 58 Lazer Jogo do Bixo. Rua Platina 1135 Teatro Kleber Junqueira. Rua Platina 1827 Escolhinha Fla de Futebol. Rua Platina 1905 55


Bar / estacionamento Este estabelecimento era inicialmente apenas um estacionalmento. Os donos começaram a vender churrasquinho esporadicamente. Com o sucesso das vendas, resolveram construir um pequeno bar e colocar mesas para os clientes.

Quando o bar está fechado, as cadeiras são recolhidas e guardadas.

Durante o dia, o número 1447, um lote comprido e profundo da rua Platina abriga um estacionamento.

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A partir das 18h o espaço se transforma, e o estacionamento compatilha o ambiente com o Espetinho Platina.

Os dias mais cheios são quando há jogos de futebol. Se as mesas estão cheias, as pessoas assistem em pé na rua.

Quem passa pela Platina pode comprar espetinhos do lado de fora. No cardápio do bar, podemos encontrar fígado com jiló, medalhão de queijo, espetinho de boi e pão de tomate.

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Produtos de limpeza Sônia trabalha há aproximadamente 8 anos na loja de produtos de limpeza. A loja vende artigos da fábrica Orvalho que possui uma sede na Cidade Industrial de Belo Horizonte e outra em Nova Lima. Dentre os produtos vendidos, se encontram: detergente, desinfetante, shampoo, glicerina, cera e sabonete.

A loja ficava anexa ao Cine Eldorado, na Rua Platina. Como o proprietário decidiu aumentar o aluguel, ela se mudou para um puxadinho da igreja.

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Cada produto tem uma cor diferente, o que a ajuda a reconhece-los pois estão envasados em embalagens que permitem ver o conteúdo.


Fábrica de cofrinhos Mirian e Amilton têm uma fábrica de cofrinhos de gesso em sua própria casa. Amilton aprendeu a fazer os cofrinhos a 10 anos atrás, e a fábrica foi crescendo ao longo do tempo.

No andar de cima, Mirian pinta alguns cofrinhos com tinta a óleo.

Os produtos finalizados ficam expostos na calçada, e são facilmente vistos por quem passa pela Avenida Silva Lobo, na entrada da Vila Calafate.

Usando moldes de plástico, Amilton produz cofrinhos de diversos tamanhos e formatos. 59


Relojoaria Castro Mauro e seu irmão são donos do comércio mais antigo da rua Platina. O ofício de consertar relógios foi passado de pai para filho e está há 60 anos no mesmo local. As principais atividades comerciais são conserto de relógios, venda de pulseiras e troca de baterias. Os reparos são realizadas em mesas, uma no mezanino e outra no térreo da loja.

Os clientes são fiéis e vindos de diversas partes da cidade.

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Os relógios que foram consertados são colocados na parede próximos ao balcão para que Mauro possa ficar atento ao seu funcionamento correto, sem atrasar nem adiantar.


Padeiro ciclista Eder trabalha em uma fábrica de pães e afins no Prado. Todas as manhãs e finais de tarde, ele e mais outros 4 ciclistas (cada um em uma região do entorno) saem de casa em casa vendendo seus produtos.

A buzina chama a atenção dos possíveis compradores.

Os quitutes são exibidos em bandejas afixadas na bicicleta.

Eder acha bom ter uma clientela fiel e já conhece os itens específicos preferidos de cada cliente. Ele vende bolos, pão de sal, pão doce, biscoito de queijo e outros quitutes.

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ILUMINAÇÃO Buscou-se investigar a iluminação noturna a partir de um recorte específico: a rua Platina. Essa escolha se deve ao fato da Platina ser uma centralidade, dotada de diversos pontos de ônibus e deter uma maior oferta de estabelecimentos que abrem neste período. Além da iluminação pública existente, os focos de luz estão concentrados nos estabelecimentos comerciais que, por sua vez, concentram o público noturno da rua Platina.

Área bem iluminada devido a grande concentração de comércios abertos durante o período noturno

Os pontos de ônibus (por vezes apenas uma placa indicativa) não possuem luz própria, fazendo com que a iluminação da rua seja pontual, resumida aos postes


Apesar de ser uma área pouco iluminada pelo fato da luz dos postes ser barrada pela copa das árvores, os moradores fazem caminhada ao redor do Batalhão da Polícia, vencendo a sensação de insegurança que é comum àqueles que transitam pela rua Platina a noite

Ponto de ônibus Iluminação pública Iluminação dos estabelecimentos Árvores


PATRIMÔNIO Em 2011 o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte deliberou pela proteção do Conjunto Urbano dos bairros Prado e Calafate e pela sua inscrição no Livro do Tombo Histórico e no Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. Nesse contexto, todos os imóveis localizados dentro do perímetro de proteção ficam sujeitos às diretrizes especiais de proteção da memória e do patrimônio cultural de Belo Horizonte.

Limites de altimetria permitidos no perímetro de proteção para novas edificações altimetria máxima permitida de 7 metros altimetria máxima permitida de 10 metros

Graus de proteção das edificações no perímetro de proteção

altimetria máxima permitida de 14 metros

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2 edifícações tombadas

98 edifícações indicadas para tombamento

8 edifícações com registro documental concluído 34 edifícações com registro documental aberto


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EDIFICAÇÕES DE INTERESSE HISTÓRICO Amostragem das edificações de interesse histórico localizadas dentro do perímetro de proteção. Construídas entre os anos 1920 e 1950, elas apresentam graus diferentes de preservação. Atualmente, algumas delas sofreram adaptações para atender melhor ao tipo de uso, como inserção de placas, mudança de revestimento, divisão do edifício, entre outros.

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DIRETRIZES ESPECIAIS A deliberação do Conselho define também o estabelecimento de diretrizes especiais de projeto que visam valorizar a requalificação dos espaços públicos e a paisagem dos bairros Calafate e Prado. Apesar dessas diretrizes contemplarem de forma pertinente os objetivos de preservação, nenhuma delas foi ainda de fato aplicada.

A fiação aérea existente ao longo da Rua Platina deverá ser substituída por dutos e fiação subterrâneos

O fechamento frontal das edificações com afastamento deverá ser feito em gradil ou material transparente

Elaboração de estudo que considere a arborização da Rua Platina

Avaliação da viabilidade de alargamento dos passeios da Rua Platina

Simulação do mesmo recorte se as diretrizes especiais de proteção fossem aplicadas 68


Recorte da situação atual da rua Platina e da Igreja São José do Calafate

O gradil da Igreja São José deverá ser suprimido, afim de promover sua integração ao espaço público

O estacionamento existente em frente à Igreja São José deverá ser removido

Deverá ser realizada intervenção urbana que considere a incorporação do antigo estacionamento à área da Praça Inácio Fonseca e sua ligação com a Igreja São José

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VACÂNCIA Baseado em dados do IBGE e a partir de visitas ao bairro, o mapeamento da vacância mostra os espaços vazios da região, sejam eles ociosos ou em processo de aluguel. As áreas de maior vacância coincidem com aquelas de maior renda média da população, o que pode indicar uma possível especulação imobiliária.

2 1

4 3

3 5

6 7 8

9 10 70


6

2 5

4

3

10 1

8

7

9

Domicílios Particulares Permanentes não Ocupados (Censo 2010)

0 - 14

30 - 45

15 - 29

46 - 64

Ausência de Valor

71


MERCADO IMOBILIÁRIO Ao investigar o mercado imobiliário local, podemos caraterizar essa dinâmica espacial, detectar suas tendências, ofertas e carências. Para isso, foi feita uma pesquisa nos sites de imobiliárias através da qual foi constatada uma grande disparidade entre os bairros Prado e Calafate. Em geral, o Prado apresenta uma maior oferta de imóveis, acompanhada de um valor mais elevado. Um apartamento neste bairro pode chegar a ser até 60% mais caro que um similar no Calafate. Além disso, muitos imóveis são anunciados como situados no Prado mesmo que estejam no Calafate, evidenciando um certo status conferido ao primeiro bairro em detrimento do segundo.

Compra

Preço médio

Quantidade disponível

R$3.694/m²

Espaço Comercial

R$4.904/m²

Apartamento

R$2.228/m²

Casa

R$1.375/m²

Lote

R$17,30/m²

Espaço Comercial

R$20,00/m²

Apartamento

R$10,00/m²

Casa

R$7,86/m²

Lote

Aluguel

72


Calafate

Prado

Quantidade disponível

Preço médio

Espaço Comercial

R$6.050/m²

Apartamento

R$6.034/m²

Casa

R$3.293/m²

Lote

R$3.098/m²

Compra

Aluguel Espaço Comercial

R$27,50/m²

Apartamento

R$24,50/m²

Casa

R$22,00/m²

Lote

--

Pesquisa feita em Maio/2014 73


OCUPAÇÕES POTENCIAIS Durante as visitas ao bairro, constatamos a presença de outros espaços vazios além dos imóveis em aluguel. São lotes, construções inacabadas, veículos e sobras de terrenos, geralmente abandonados ou subutilizados. Tais espaços apresentam grande potencial de ocupação ou intervenção.

Jardim do Lactário

Construção embargada

1

3

Lote da Seguradora

2

4 Terreno compartilhado

1

6 Lote-tripa do beco

5

Casa da Companhia Ferroviária

8 7

Terreno à venda 74

9

Kombi abandonada

10 Parcela ao lado da rampa da Tereza Cristina


10 7

6

5

8

9 2

3 4

75


MANIFESTAÇÕES CULTURAIS EXTINTAS Realizado a partir de registros históricos e de depoimentos dos moradores mais antigos do bairro, este mapeamento mostra as festas, eventos e manifestações que fazem parte da memória e da cultura locais, e se extinguiram a partir da década de 1960. Cada uma delas está intimamente ligada ao uso da rua enquanto extensão da esfera doméstica, e foram desaparecendo aos poucos devido ao crescente sentimento de insegurança no espaço público.

76


Cine Grátis

Carnaval e blocos caricatos

Em alguns fins de semana, o caminhão do Cine Grátis vinha ao bairro exibir filmes para os moradores na Praça Carlos Marques.

Nos dias de carnaval, os clubinhos do bairro se fantasiavam e desfilavam na carroceria de um caminhão da rua Platina até o centro da cidade.

Praia da Turquesa

Festivais de Futebol

Horas Dançantes

Nos domingos de sol, os jovens da Turma do Pão de Queijo traziam um carro com areia, barraca de sol e roupas de banho e montavam uma praia na rua Turquesa.

Os festivais de futebol aconteciam nos campos de várzea do bairro e reuniam jogadores, torcedores, vendedores e diversos moradores da região.

Nos fins de tarde, os membros dos clubinhos abriam a porta das salas de suas casas para a rua e, com apenas um rádio, iniciavam as horas dançantes com os amigos.

Bailinhos da Banda

Feira da Igreja São José

Festa do Divino

Para angariar fundos, a banda Carlos Gomes organizava bailinhos noturnos na sede da orquestra, logo depois das missas.

Todos os fins de semana após as missas, os moradores organizavam uma feira de alimentos na praça em frente à Igreja São José.

Na Festa do Divino havia bandas, levantamento de mastro, foguetes coloridos e leilões de comida.

Vôlei na Praça Carlos Marques Dona Carmen, moradora da Praça Carlos Marques, emprestava uma rede de vôlei para os jovens do bairro todos os fins de semana.

77


MANIFESTAÇÕES CULTURAIS ATUAIS Apesar de ter um caráter pontual, algumas manifestações ainda persistem no Calafate, e outras foram criadas. São muitas vezes ligadas à atuação da Igreja São José ou da vontade dos mais antigos de relembrarem os velhos tempos. Tais manifestações são responsáveis não só por manter fortes as relações de vizinhança entre os moradores através do encontro, mas também por incentivar modos outros de viver o bairro e a cidade.

78


Pedal noturno

Festa Junina

Todas as terças e quintas às 20h, Sérgio, o proprietário da loja Platina Bikes, organiza uma pedalada noturna com cerca de 40 ciclistas.

No mês de junho o bairro se enche de bandeirinhas, barracas de comidas típicas e fogueiras. Várias festas juninas acontecem nas escolas e na igreja.

Bernamonte

Semana Santa

Uma vez por mês os antigos estudantes da escola Bernardo Monteiro se encontram em algum bar do bairro para conversarem e beberem juntos.

Toda Semana Santa, a Igreja São José organiza teatros, procissões e eventos que mobilizam grande parte da população mais antiga do bairro.

Festivais de comida

Dia de São José Operário

Bazar da Pechincha

De tempos em tempos, a Igreja São José organiza almoços e festivais de comida para angariar fundos para seus projetos de caridade.

Em maio, a Igreja São José comemora o dia de seu santo padroeiro com procissões, barraquinhas, missas solenes e sorteios de imagens de São José.

No terceiro domingo de cada mês, a Associação de Caridade da Igreja São José organiza um bazar de roupas usadas a preços baixos.

Rua do Lazer A professora de inglês Cláudia organiza esporadicamente o fechamento da rua Oeste em parceria com o SESI e disponibiliza diversas programações para crianças.

Encontro dos Amigos do Calafate/Prado Uma vez por ano, uma semana antes do dia das mães, os antigos moradores do Calafate e Prado se encontram na quadra Platina Ball para relembrar os velhos tempos.

79


GRUPOS SOCIAIS Grupos de pessoas se aproximam, seja por necessidade ou afinidade, constituindo uma identidade coletiva. Em um mundo com cada vez mais incertezas e com laços cada vez mais frágeis, fazer parte de um grupo pode trazer conforto e segurança. Apesar de vários grupos estarem presentes no Calafate, quatro deles se destacam. Eles costumam se concentrar em locais específicos, mas eventualmente têm suas áreas de influência sobrepostas nas ruas do bairro. Esses personagens são parte da paisagem e peças chave na dinâmica socio-economica do Calafate. São afetados pelo território e, ao mesmo tempo, o transformam.

Carroceiros: o bota-fora ao lado da Vila Calafate os atraiu para a região. Alguns moram na vila, outros vêm de longe. São regulamentados pela prefeitura. Recolhem entulho, objetos usados, etc. de vários bairros da região Oeste. Idosos: como o Calafate é um bairro tradicional, de ocupação antiga, há muitos idosos. Eles se comprimentam nas ruas e gostam de ver gente conhecida quando saem para fazer compras na Rua Platina. Militares: na Academia da Polícia Militar, pessoas de todo o Estado fazem o curso para policial. Nas proximidades há pensões, lojas de farda, cabeleleiros e restaurantes que enchem de militares ao meio-dia. Estudantes: a maioria dos alunos da Escola Bernardo Monteiro e do Polimig são de outros bairros. Muitos deles têm pouca relação com o Calafate. O colégio particular Piedade tem mais alunos do Calafate e do Prado.

80

A M d Alguns cavalos pastam no gramado em frente à Vila.

Os carroceiros descarregam no bota-fora ao lado da Vila Calafate.


A escola de formação de policiais militares ocupa uma grande área do Prado.

Várias lojas na Platina atendem especificamente aos militares.

Alunos da Escola B. Monteiro chegam e saem de metrô ou ônibus.

As três escolas do bairro pssuem perfis distintos de alunos.

Os idosos costumam ficar conversando na porta de suas casas.

Muitos militares moram em quartos alugados na região.

A igreja é muito frequantada pelos idosos.

Horários de maior presença nas ruas: 6h

7h

8h

9h

10h 11h 12h 13h 14h 15h 16h 17h 18h

Carroceiros Idosos Militares Estudantes

81


REDES POLÍTICAS Este mapa registra os atores políticos com os quais tivemos contato ao longo do trabalho, buscando também sinalizar conexões que foram percebidas entre estes grupos, sejam elas relações econômicas de troca ou de compartilhamento do espaço (marcadas em azul) ou conflituosas de disputa pelo espaço (marcadas em laranja). Em cinza, estão etiquetados os grupos cuja atuação apresenta abrangência regional. Em rosa, estão etiquetados os grupos cuja atuação apresenta abrangência local.

Moradores do coreto

Alunos do POLIMIG Vila Calafate

Comércio local

Alunos da Escola Estadual Bernardo Monteiro Quintais

Igreja São José

82


Banda Carlos Gomes

Calafate

Associação de Moradores e Amigos do Prado e Calafate

Pixadores

Moradores antigos

Batalhão da Polícia Militar

83


DOMESTICIDADES Apesar de o espaço público ser normalmente entendido como “de todos” ou “de ningém”, algumas vezes ele é transformado por iniciativas individuais. Essas transformações são feitas para satisfazer necessidades pessoais ou para servir à vizinhança imediata. Na maioria das vezes, passam despercebidas por olhares menos atentos, mas podem ser um incômodo para o poder público, que vê com maus olhos essas intervenções não autorizadas. De qualquer forma, essas apropriações colocam em cheque a definição tradicional de espaço público. Propõem, mesmo que não itencionalmente, a possibilidade de cidadãos se responsabilizarem pelas ruas, calçadas, praças e parques da cidade.

84


Dona Carmen e a praça

Dona Carmen mora desde que nasceu na rua Oeste, em frente a Praça Carlos Marques, mais conhecida como a Praça da Escola Bernardo Monteiro.

Ao acompanhar ao longo dos anos as mudanças que sofreram o bairro e consequentemente a Praça, Dona Carmem se sente responsável por ela, o que fez com que ela se dê ao trabalho de regar, todos os dias, as plantas dali.

85


Bar do Gordo

O Bar do Gordo é um pequeno estabelecimento que se localiza na rua Platina que, além de ser mão dupla, possui uma calçada não muito larga.

Devido ao grande movimento do Bar, o dono se utiliza de parte da calçada para colocar uma mesa, onde clientes e transeuntes dividem o espaço.

86


Horta da Dona Evinha

Dona Evinha costumava cultivar uma pequena horta no gramado em frente sua casa, na Vila Calafate, na Rua Bimbarra. Porém, a prefeitura retirou todas as suas plantas e horaliças da área “pública”.

Atualmente, Dona Evinha mantém alguns vasos na porta de sua casa, pois não tem quintal. Ela cultiva principalmente ervas medicinais, e faz remédios para todos da família.

Como a horta agora é portátil, às vezes ela é levada para dentro de casa quando a prefeitura vem reclamar dos vasos na calçada.

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Varal da Glaucinei

Glaucinei mora na Vila Calafate, em uma casa pequena na Avenida Silva Lobo, em baixo do viaduto. Sua casa não tem quintal, portanto não há espaço pra secar roupas.

Ela montou um varal a alguns metros de sua casa, no descampado às margens da rodovia. A prefeitura ocasionalmente remove seu varal, mas ela sempre o coloca de novo.

88


Jardim da Dona Maria

Dona Maria cultivava suas plantas dentro do quintal de sua casa. Quando ficou sem espaço para tantas plantas, começou a transpor esse jardim para o passeio em frente a sua casa.

Ao observar que as plantas de Dona Maria cresciam, seu vizinho imadiato adotou a idéia e reproduziu o jardim em sua porção do passeio.

A idéia se espalhou e a vegetação passou a ocupar grande parte do passeio daquele lado da rua.

Como já não havia mais espaço desse lado da rua para o crescente jardim, Dona Maria tomou a iniciativa de semear o outro lado da rua, junto ao muro do metro.

89


O ENTORNO DA PRAÇA CARLOS MARQUES A Praça é rodeada por uma grande variedade de tipologias construtivas. Esses edifícios influenciam e são influenciados pelo espaço público em diferentes medidas. Prédios residenciais se beneficiam da arborização e da tranquilidade, enquanto os estabelecimentos comerciais a trazem grande movimento de pessoas.

Residência Topa Tudo

Residência Salão de Beleza Lanchonete

Residência 90

Restaurante Residência

Bar

Residência

Residência

Residência

Restaurante e Bar

Centro Comercial

Escola


Rua Oeste

Praça

Rua Monsenhor Horta

Rua Monsenhor Horta Residência

Loja de Roupas Lanchonete

Rua Oeste

Imobiliária

Residência

Serviços Automotivos

Praça

91


equipamentos A Praça Carlos Marques tem uma variedade considerável de equipamentos fixos como lixeiras, postes de luz e equipamentos de ginástica. É também uma das poucas praças da cidade que possuem um coreto. Apesar da presença de muitos bancos, há apenas duas tipologias diferentes, restringindo as apropriações e dificultando a interação entre as pessoas.

2

1

1

2

92

3

4

5


4

5

3 8 6 9 7

7 8

6

9 93


PRESENÇA COTIDIANA É possível acompanhar alguns padrões de comportamentos que acontecem cotidianamente na praça. Essa diversidade garante a vivacidade do espaço público e também gera conflitos. Cada ator que frequenta a praça desempenha algum tipo de ação. Muitas vezes elas estão vinculadas a um lugar específico e a um período do dia, como os moradores mais idosos que vão conversar e tomar sol durante a manhã e se sentam nos bancos menos sombreados próximos à entrada da escola.

4

3 2 1 8

7 8

1

1

beber e comer praticar exercícios físicos passear tomar sol conversar fumar pixar 94

2

1

5

4 1

2

circular passear brincar conversar fumar pixar

3

brincar passear tomar sol

4 descansar passear tomar sol beber e comer conversar


manhã

2

Estudantes

3

Crianças com adultos

4

Trabalhadores da região

5

Moradores de rua

6

Militares

7

Vendedores ambulantes

8

Funcionários dos ônibus

1

Moradores

3

Crianças com adultos

5

Moradores de rua

8

Funcionários dos ônibus

fim de semana

Moradores

5 dormir armazenar beber e comer descansar

noite

durante a semana

1

almoço

6 circular policiar

7 vender circular

8 descansar beber e comer conversar ir ao banheiro

95


CATÁLOGO DE MATERIALIDADES Os materiais presentes na praça apresentam pouca variação de textura e cores. Em meio a tons acinzentados e apagados, a vegetação se torna o elemento mais marcante da praça. O muro da escola, pintado de azul-esverdeado e coberto por pixações, também tem uma grande presença visual, principalmente pelo sua grande extensão.

1 mosaico

4 vegetação

2 mesa-xadrez

3 pixação

5 grama

6 cimento áspero

1

5

7 pedras

96

8 cimento liso

9 asfalto


4

3

2

8 6

7

9

97


CATÁLOGO DE VEGETAÇÃO e sombreamentos Ao longo do dia, a variação do sombreamento produzido pelas árvores faz com que as pessoas se aglomerem em lugares diferentes. Próximo ao coreto, por exemplo, a vegetação é mais densa, garantindo sombra contínua. Nas épocas mais quentes, este lugar pode ser o mais agradável. Já nos dias mais frios, as pessoas geralmente se sentam em lugares mais expostos ao sol, como nas proximidades da saída da escola. Há ainda várias árvores menores e mais jovens, por isso a tendência é que a praça fique mais sombreada com o passar dos anos.

Pingo D’ouro

9h

Verão

98

Ipê

12h

Washingtonia filifera

17h

Munguba


Flamboyant

9h

Sibipiruna

12h

17h

Inverno

99



INVESTIGAR PELA AÇÃO Aproveitamos acontecimentos do bairro para iniciar diálogos com moradores e propor ações que, além de nos informar mais sobre o lugar, nutriam possibilidades de ativação de determinados espaços. Propomos e infiltramo-nos em eventos organizados por moradores e instituições locais, envolvendo-nos em discussões e demandas já existentes. As atividades e oficinas realizadas nos informam sobre o território, redes de afeto e cooperação, memórias e sonhos para o bairro. Afinal, os maiores conhecedores do lugar são aqueles que o habitam. Ao mesmo tempo, essas ações põem em relevo aspectos que, por falta de sistematização, passam despercebidos para os envolvidos. Quando a informação se torna pública, engata-se um processo de trocas, debates, desacordos e projeções futuras.


OFICINA DE FOTOGRAFIA (quinta-feira, 10 de abril de 2014)

A ESCOLA, O MURO E O BAIRRO Todo começo de manhã, um animado contingente de alunos lota a Praça Carlos Marques, onde está localizada a Escola Estadual Bernardo Monteiro. A praça, que na maior parte do tempo se vê quase totalmente despovoada, vira palco de futebol improvisado, duplas compartilhando fones de ouvidos e rodas empolgadas de conversa que antecipam o fim de semana. Assim que toca o sinal, os grupos se afunilam através do portão metálico que, brevemente, cria uma abertura no muro hostil que isola a escola da praça e, logo, do bairro. A esta configuração espacial, amostra de um rico arsenal de mecanismos ilusórios a favor da segurança e disciplina nas escolas brasileiras, está prestes a juntar-se a presença da Polícia Militar no Bernardão, uma ação proposta pela Associação de Moradores do Prado e Calafate a policiais. Estes últimos, um tanto menos afobados, sugerem intervenções mais sutis como resposta aos episódios criminosos da escola e arredores. Os policiais recomendam nada mais que um uso mais intenso e menos pontual da praça a partir de uma maior integração entre escola, espaço público e comunidade. Tal integração é, contudo, citada como desafio pela mesma associação. Isto porque, segundo seus representantes, os alunos, em sua maioria não residentes do bairro, são muitas vezes estigmatizados pelos moradores e vinculados precipitadamente às ocorrências criminosas. EXPEDIÇÃO FOTOGRÁFICA Convidamos os alunos do terceiro ano do ensino médio a participar da oficina de fotografia e não nos surpreendemos com a adesão: a participação implicava em uma manhã inteira na qual a sala de aula era substituída pelas ruas. A oficina começou com a apresentação de seis eixos temáticos que abrangiam nossas inquietações sobre o bairro em uma linguagem acessível — arquitetura, natureza, lazer, comida, reaproveitamento e retratos. A ideia era dissecar a paisagem cotidiana através destes temas, e ao mesmo tempo, discutir como a fotografia pode registrar e indicar complexas dinâmicas da cidade quando se está disposto a observar e investigar. 102


Depois de escolherem voluntariamente um dos eixos temáticos apresentados, os alunos saíram pelo bairro em trajetos definidos coletivamente. À medida em que se esgotavam as cenas que remetiam ao tema do trajeto, rotas alternativas eram exploradas, levando-nos a confirmar a inospitalidade de ruas paralelas ao metrô, além fazer caminhadas lentas em viadutos desenhados para carros rápidos e passar por bruscas mudanças de paisagem. Fomos do galpão comercial ao campo gramado, do bairro à favela, da calçada esburacada ao muro imponente e assim por diante. CONVERSAS Dois dias depois da expedição, as fotografias e o mapa dos trajetos foram expostos na escola durante o Café Comunitário, momento no qual os alunos e moradores conversaram sobre as fotografias e, ao analisarem o mapa, sobre a cartografia e a paisagem dos arredores da escola. Este foi um momento de descoberta mútua, no qual aqueles que frequentam o bairro diariamente somavam suas percepções às nossas e, em troca, eram incitados por nossos questionamentos a enxergarem alguns potentes aspectos do território que passavam despercebidos. Os comentários, feitos por alunos, professores e moradores, eram muitas vezes usados como lugar de denúncia contra práticas como o pixo e o lixo na rua, revelando uma visão moralista sobre a cidade, isenta de questionamentos sobre os motivos para aquilo que se condena. Além disso, muitos comentários mostraram algum grau de relação afetiva dos participantes com o bairro ao falarem sobre o boteco predileto ou a igreja onde sonham se casar daqui a um tempo. Os comentários dos retratos, diferente do que muitas vezes nos disseram, mostram que os alunos, a princípio não-moradores, não são tão alheios àquele território. Ali, foram reveladas relações cotidianas entre os alunos e personagens e lugares do bairro, muitas vezes atrelados a atividades comerciais, indicando-nos a existência de uma prática de rua rotineira da qual os alunos se tornam parte, nos momentos em que se atravessa o muro. 103


Lista de alunos inscritos na oficina de fotografia 104


Nesta página: Repercussão da oficina de fotografia no grupo do Facebook criado para a divulgação das fotos Na página seguinte: Exemplos de comentários sobrepostos às fotos tiradas na oficina 105


106


107


café da manhã (sábado, 12 de abril de 2014)

Em meio ao agitado entra e sai de alunos e colaboradores, o Café Comunitário do Bernardo Monteiro foi tomando forma. Mesas emprestadas da biblioteca, toalhas de chita trazidas por uma professora, bolos preparados pelas cozinheiras da escola, pães e frutas doados pelas padarias locais e pelos vizinhos, bebidas trazidas pela associação de moradores, letreiro feito com a madeira que sobrou da feira, equipamento de som fornecido pela polícia e escada emprestada pela banca para ajeitar os últimos detalhes. Proposto inicialmente pela associação de moradores como estratégia de desestigmatização dos alunos e da escola, que já viu dias de presença mais orgulhosa no imaginário coletivo da vizinhança, o café da manhã ensaiava uma maior integração, tanto espacial quanto subjetiva, entre a escola e o bairro. A mesa, posicionada entre a praça e a escola, atravessava simbolicamente o muro que opera a imponente divisão entre estes espaços. Naquela manhã de sábado, alunos, professores, moradores e transeuntes curiosos compartilhavam uma só mesa de café da manhã que não estava nem dentro nem fora, mas entre lugares e disponível a qualquer um. Entre xícaras de café e pedaços de bolo, o encontro também ativou relações entre pessoas interessadas em pensar o cotidiano e o futuro da vizinhança. Em conversas paralelas, ideias eram compartilhadas entre a associação e os policiais do batalhão do 108


bairro, cuja presença, por sua vez, era vista com cuidado por professores envolvidos em projetos que propõem a escola como espaço público. Ao mesmo tempo, nós aproveitávamos para começar diálogos com moradores e alunos sobre as questões locais que nos inquietam e nos instigam a envolver-nos com a organização de ações como a do café da manhã. Mas o café não se resumiu só em papo. Houve apresentação de street dance por um grupo de alunos, show da orquestra pop da Polícia Militar (que desta vez vestia o uniforme pardo desprovido dos aparelhos de combate), jogos de vôlei e até alguns casais que se formaram, aproveitando a aglomeração dançante. Tal espontaneidade não esteve, entretanto, presente em todo o processo de organização desta ação. A diretoria da escola se mostrou muitas vezes acanhada em relação ao atravessamento da fronteira entre escola e praça, alegando que a presença dos alunos no espaço público faria com que eles perdessem o controle e a disciplina, colocando em risco a fluência pacífica do café da manhã. Por outro lado, muitos dos professores, a associação de moradores e nós mesmos nos empenhamos em transbordar o encontro para a praça, arriscando o pontapé inicial de um longo processo que vislumbra uma escola e uma cidade menos estanques. 109


1.

2.

NEGOCIAÇÃO ESPACIAL 1. A diretoria sugeriu que mesas cobertas por toalhas douradas fossem montadas na parte interna da escola, próximo à cantina. 2. Propusemos que a mesa atravessasse o muro da escola e operasse simbolicamente o transbordamento da escola para o espaço público do bairro rumo à integração com a comunidade. Entretanto, argumentou-se que a presença dos alunos no espaço público faria com que se perdesse a disciplina e as mesas mantiveram-se douradas e dentro dos limites da escola, apesar de mais próximas ao portão. 3. Uma das professoras sugeriu que fossem usadas toalhas de chita ao invés das imponentes toalhas douradas, o que foi logo aceito por todos. Aos poucos os envolvidos se empolgavam e a mesa chegava ao portão. Apesar disso, não era permitido colocar comida depois do muro. 4. A comida era tão farta que acabou por ocupar toda a extensão da mesa, dentro e fora da escola. De repente, a festa acontecia e experimentava a dissolução da fronteira tão abrupta que separa a praça da escola e, logo, os alunos da comunidade. 110


3.

4.

O letreiro foi feito com caixas da feira do Colégio Arnaldo. A escada para a fixação do letreiro foi emprestada pelo dono da banca de revistas

As faixas de pano foram compradas no Varejão das Fábricas

As mesas do café da manhã pertencem à biblioteca da escola

As toalhas de mesa de chita foram trazidas por uma professora e produzidas por um grupo de um centro espírita

Os bolos foram produzidos pelas cozinheiras da escola, as frutas, pães e bebidas, trazidas por vizinhos, associação e padarias locais

As fotos foram feitas pelos próprios alunos da escola e impressas na Araújo do bairro

O equipamento de som dos shows foi fornecido pelo batalhão da polícia

111


112


113


114


115


116


117


linha do tempo coletiva (sábado, 10 de maio de 2014 )

Desde 1997, todo sábado que antecede o dia das mães é dia do Encontro dos Amigos dos Bairros Calafate e Prado. Integrantes dos clubinhos que foram um dia adversários nas andanças e jogos que ocupavam as ruas dos bairros na década de 1960 hoje se encontram para transformar a rivalidade em boas lembranças. Mesmo que ainda carreguem no bolso a carteirinha de membro oficial da turma do Pincel, do Palito, do Croquete, do Topázio, da Lenha, do Aio, ou do Madri, a turma é hoje uma só - aquela que viveu o bairro com menos carros e muros e mais legumes frescos, bailes e futebol. Apesar do tom nostálgico, também participam do encontro moradores que cresceram ali na nas décadas de 1980 e 1990 e que, entre espetinhos de churrasco e copos de cerveja, proclamam com orgulho e ao som de música ao vivo o hino do Calafate — segundo eles, o único hino de bairro do país. Aproveitando esse cenário, nos propusemos a documentar as memórias que motivam esse encontro, de modo a adicionar uma camada de micro histórias pessoais e memórias coletivas à história oficial que já conhecemos, na maioria das vezes narrada sob a ótica dos grandes acontecimentos e da articulação territorial do bairro com o restante da cidade. Para isso, confeccionamos uma linha do tempo dobrável e portátil que continha os fatos históricos que já conhecíamos distribuídos em décadas que começavam em 1890, antes mesmo da fundação de Belo Horizonte — quando o território do bairro era ocupado por fazendas — até os tempos atuais. Durante o encontro, a linha do tempo foi disposta sobre quatro mesas, sobre as quais os participantes adicionavam acontecimentos e informações que revelavam uma imagem do bairro filtrada pelos vínculos afetivos com determinados 118


espaços, práticas e acontecimentos que configuraram aquele lugar. A linha do tempo serviu também como descanso para pratos de comida e copos de cerveja que davam energia para entusiasmados debates acerca de fatos que começavam a se contradizer e, consequentemente, tornavam ainda mais complexo esse desenho coletivo do bairro. Dentre as discordâncias, as percepções individuais sobre os limites territoriais do bairro representam o maior número de opiniões variantes. Pedimos então que os envolvidos desenhassem em papel vegetal sobre o mapa do bairro quais eram as fronteiras e a qual dos bairros (Calafate ou Prado) pertenciam, o que evidenciou que, apesar de haver limites mais recorrentes que outros, o mapa do bairro depende da experiência de cada um. Mas não foi só em memória que se resumiu a linha do tempo coletiva. No traço que seguia da década de 2010 para frente, foram registradas algumas aflições em relação ao bairro voltadas sobretudo à necessidade de contenção da especulação imobiliária e ao limite oficial do Calafate, que vem diminuindo na medida em que é empurrado em direção ao oeste. Por outro lado, não houve nenhuma manifestação propositiva dedicada a imaginar possibilidades de transformações para o bairro. O predomínio do discurso nostálgico e denunciante sinaliza um descompasso nocivo entre cotidiano e política, cujo papel visionário e articulador na escala local deve ser urgentemente recuperado para que a memória, além de despertar sorrisos saudosistas, passe a despertar também vigorosos desejos coletivos para o futuro. 119


1.

2.

3.

1. Organização prévia da linha do tempo em décadas a partir de 1890 até os dias atuais, contendo fatos históricos marcantes para a paisagem e memória coletiva do bairro. 2. O suporte dobrável da linha do tempo permitiu que ela fosse levada até o XVII Encontro dos Amigos dos Bairros Calafate e Prado. 3. Durante a festa, a linha do tempo serviu como ativadora de conversas que revelavam perspectivas pessoais sobre os fatos apresentados, ao mesmo tempo em que era completada com micro histórias sobre o passado e inquietações sobre o futuro do bairro. 120


121


1912_ Bairro incorporado à Belo Horizonte como “zona suburbana” _Primeira decolagem de avião em BH se dá no antigo hipódromo do bairro Prado 1896- Divisão da Fazenda do Calafate

1890

1895_ Fundação da Sociedade Musical Carlos Gomes

122

1897- Inauguração de Belo Horizonte

1900

1900_ Remoção de operários da área urbana para a “Esplanada do Calafate”. Chegada de 383 italianos

1910

1909_ Abertura da Rua Platina (conexão entre Centro e Barreiro)


1920_ Inauguração da Estação Férrea do Calafate

1920

1917_Expansão da linha férrea para a região oeste de BH

1931_ Inauguração da Igreja São José do Calafate

1930

1930_ Hipodromo se transforma em departamento de Instrucao da PM

1940_ Ampliação da Avenida Amazonas até a Gameleira

1940

1935_ Retificacao do leito do Rio Arrudas

1914_Inauguração da Escola Estadual Bernardo Monteiro _Antigo hipódromo virou o primeiro estádio da cidade

123


Década de 60: Doutor José Maria Magalhães, cognominado o médico do Calafate, foi fundador do IPSEMG. O médico atendia aqueles que mais precisavam sem cobrar Padaria do Adelmo

Festivais de futebol décadas de 50 e 60

1950

1961 - Fundação do Grupo Aruanda de Dança Folclórica, um dos maiores do 1972_ Transferência da Brasil Sociedade Musical Carlos Gomes para o 1963_Fim da bairro circulacao dos bondes

1960

1954 - Festivais de futebol décadas de 50 e 60 Chega a primeira televisão do bairro, na casa do Zu, onde os amigos se reuniam para assistir ao canal Itacolomi

1970

Cárgulas: conjunto musi1960_ Abertura da Via Expressa. cal que existiu entre 1968 A Platina perdeu a funcao de e 1974 conexao entre Barro poreto e Barreiro. Passou a ser via de 1964 - Primeira festa junina Madriveacesso entre os bairros que lo, das turmas do Madri e do Velocino cruza. 1961 - Fundação do Madri Futebol Clube

1955 - Cruzeirinho: clube de dança e futebol localizado na Rua Platina, acima do Cine São José

Década de 60, turmas do bairro: do pincel do palito do croquets do topázio da lenha do aio do madri está faltando o Atlético Clube! - Vila do Marmitex, 1963

124


Conheci Alberto Campos - meu grande amigo. QUE DEUS O TENHA! Chegada de empresas e oficinas de carros que descaracterizam o bairro 1980_ Fechamento do Cine El Dorado

1980

SAÍ DO CALAFATE/PRADO

1981_ Inicio das obras do metro 1986 - Bar do Eldo - samba de primeira! -

1976_ Início das obras de construção da Via Expressa

1990

1997 - Primeira festa dos Amigos do Calafate e Prado

2000

1990_Saturacao da Av. Amazonas e Tereza Cristina, a Rua Platina voltou a ser utilizada para trafego de passagem 1998 - Criação do hino do Fim da Vila dos Marmiteiros Calafate pelo João Mendonça Canalização do córrego

1986_ Inauguracao da Estacao Calafate do Metro

1970 - Televisão colorida na casa do Sr. Edson Malared (rua Conselheiro Dantas) entre 1976 e 1980 - aumento da altura do muro da Escola Estadual Bernardo Monteiro

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Conter a especulação imobiliária! 2001 - Começam a se reunir antigos alunos do Grupo Bernardo Monteiro Turma de 1955 a 1958 “BERNA MONTE”. Os encontros acontecem em todas as primeiras terças-feiras do mês no Mineirinho do Prado)

2010

2014 - o Cine Eldorado deixa de ser estacionamento e fecha para aluguel

Desapropriação da Vila Calafate para construção do piscinão do Calafate

a

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Espero que o bairro ganhe força por suas tradições e pelo orgulho de todos em morar aqui, afinal este é o único bar que possui um hino no Brasil!!! Que nunca acabe.., “...”o Calafate é aqui...”

O limite do Calafate vai diminuir tanto que o bairro vai acabar

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casa instantânea (sábado, 06 de setembro de 2014 )

A Casa Instantânea foi um evento de troca de objetos que aconteceu na Praça Carlos Marques. Convidamos os moradores da região a trazerem de casa objetos subutilizados que poderiam ser trocados por aqueles trazidos por outras pessoas. Na medida em que novos objetos chegavam e outros eram levados embora, uma sala de estar em constante transformação se estabelecia em pleno gramado da praça. Motivados pela curiosidade ou informados pelo panfletos distribuídos na véspera, alguns moradores co-habitaram temporariamente esse espaço que, apesar de inusitado em meio à praça, tinha um caráter inconfundivelmente familiar. Entre pedaços de bolo e xícaras de café, aproveitamos o momento para conversar sobre a praça e descobrir o que os vizinhos tinham a dizer sobre os seus usos, seus limites e suas potencialidades. Quando a conversa se animava, convidávamos os moradores a responder algumas questões mais específicas sobre as qualidades espaciais existentes e ideias para o futuro do lugar. Essas conversas e as respostas às questões indicaram alguns pontos importantes sobre a praça. Primeiramente, o espaço é uma referência importante nos percursos e no imaginário dos moradores. As visitas à praça são frequentes, seja simplesmente como parte dos percursos cotidianos ou para aproveitar da atmosfera do espaço. As idas à praça acontecem também para pequenos passeios com crianças ou cachorros, banhos de sol para os idosos e bate-papo. As ideias surgidas durante as conversas e nos questionários respondidos ao longo do evento dialogam justamente com estas dinâmicas espaciais: 1. Parquinho: O equipamento para a diversão das crianças já existiu na praça, mas foi retirado pela falta de manutenção. Algumas tentam se divertir nas poucas barras de exercícios físicos ou trazem de casa alguns artifícios como brinquedos ou bicicletas. Provavelmente, a presença 128


desse equipamento atrairia a presença de mais crianças, o que estimularia interação entre elas e entre os pais ou acompanhantes. 2. Paisagismo: Atualmente, a vegetação está descuidada, alguns canteiros sem gramados e com resíduos acumulados. Alguns participantes do evento citaram a necessidade de mais árvores para sombreamento, flores para embelezar e um gramado mais convidativo para piqueniques. 3. Equipamentos de ginástica: As chamadas “Academias da cidade”, já instaladas em muitas praças da cidade viraram referência e objeto de desejo para muitos moradores. Por vezes, esta vontade se dá em detrimento da imaginação de outras intervenções possíveis. 4. Eventos: Atividades como feiras, shows e teatro são pouco frequentes na praça hoje em dia. Aqueles eventos que ainda acontecem são geralmente organizados pela Igreja, como a celebração do Domingo de Ramos. Antes, a banda mantinha o costume de tocar na Praça, acontecimento que ficou na memória de muitos moradores, principalmente dos mais velhos, que o relembram com carinho. Estes momentos são bons atrativos para o espaço público, e, além de estimular a interação, passam a fazer parte da memória afetiva coletiva do espaço, proporcionando um maior sentimento de pertencimento ao lugar. 5. Segurança: A presença de pessoas que não moram no bairro ou desconhecidos pode provocar uma sensação de insegurança no lugar. Por vezes, esta presença está aliada ao uso ou venda de drogas, o que deixa os moradores ainda mais apreensivos. Esta é considerada pelos moradores uma das restrições aos passeios noturnos. 129


Disposição dos objetos próximo ao muro da Escola 130


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Dona Eny gostaria de ver uma praça mais florida

Cristina que quer uma praça mais segura

Larissa vai à praça com seus amigos curtir um ambiente agradável

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Flávia que andava de bicicleta ali antigamente

Dona Lúcia que lembra das músicas que a banda tocava

Paulo citou picnic para os gramados

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dia do suco (quinta-feira, 24 de outubro de 2014)

Apesar do sol a pino, o horário de almoço é o de maior movimento na praça Carlos Marques. Nos lugares que recebem sombra das árvores, trabalhadores das redondezas descansam e alunos das escolas próximas procrastinam a ida para casa até que as conversas se esgotem. O dia do suco teve como intuito aproveitar a presença deste público rotineiro para discutir, destraidamente, proposições para um espaço comum imaginário no bairro. Apesar da grande concentração de lanchonetes que vendem sucos e açaí nos arredores, nenhuma delas se conecta diretamente com o espaço da sombreada praça. Com o Dia do Suco, deslocamos para o espaço público a configuração espacial desses estabelecimentos: um balcão com liquidificadores e combinações sortidas de frutas eram operados ao gosto de quem passava com sede por ali. Assim que os aparatos para o acontecimento foram montados, os alunos do turno da manhã começaram a sair da aula e se ajuntaram ao redor da mesa, querendo logo matar a sede. Aos poucos, apareceram também alguns professores e moradores do bairro que passavam pela praça. No entanto, ao invés de comprados, os copos de suco eram trocados por uma Calaficha, moeda fictícia que podia ser adquirida ao se fazer uma colagem ou desenho que imaginassem usos para a Casa do Calafate, esse possível espaço comum que pertencesse a todos do bairro. Levamos canetas coloridas e um repertório de imagens de pessoas, animais, objetos e 134


atividades que eram recortadas e coladas sobre uma base de papel na qual estava impressa a representação genérica de um espaço. Na medida em que colavam e desenhavam, os participantes discutiam entre si e compartilhavam seus imaginários do espaço comunitário, o que rapidamente se misturava a ideias para a melhoria da praça onde o evento acontecia. As colagens entregues iam sendo afixadas na parede, o que, por sua vez, incitava novas conversas. Além de aliviar o calor intenso, o dia do suco serviu para promover uma rica aproximação com o público frequentador da praça, aumentando nossa rede de colaboradores potenciais. Além disso, aquele tipo de ativação temporária foi apontada por muitos como medida interessante para mudança da relação dos moradores e alunos com a praça. Ao verem que o espaço público pode abrigar experiências ricas e de execução muito simples, as pessoas passaram a imaginar outras possibilidades, que inclusive apareceram nas colagens e nos depoimentos. A simples diminuição no ritmo do dia-a-dia e a criação de oportunidade para o compartilhamento do espaço também foram fatores importantes. Muitos dos que estavam de passagem pela praça decidiram pausar e aproveitaram este simples desvio de rota para trocar ideias sobre o bairro e combinações de frutas, algumas mais bem sucedidas que outras.

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ingredientes: 2 1 3 5 6 4 8 9 10 7 12

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1

guarda-sol

7 espremedor de laranjas

13 protetor solar

2

tesoura

8 liquidificador

14 faca para cortar frutas

3

tábua para cortar

9 toalha de mesa

15 mesa

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copos plásticos

10 cadeira de praia

16 energia

5

cola

11 canetinhas coloridas

17 papéis

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gelo

12 água potável

18 frutas


Disposição dos objetos 137


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colagens trocadas por copos de sucos 142


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interpretações (domingo, 01 de junho de 2014)

Felipe: O mapeamento dos Aspectos Geográficos mostra uma baixa população de 0 a 5 anos e uma grande população idosa. A grande concentração de pessoas de 20 a 24 anos se deve principalmente aos militares residentes, indivíduos em transição. Se olharmos com cuidado, percebemos que daqui a alguns anos a população idosa irá morrer, ao passo em que a população jovem residente não será suficiente para continuar o legado. Podemos dizer então que o Calafate é um bairro em situação de transição, de substituição da população. Substituição da Vila pelo Piscinão, e substituição natural da população do bairro. Porém não sei se essa substituição reflete ainda na questão imobiliária, porque o conjunto do Prado e Calafate está tombado, não podem ser construidos edifícios altos ali, pelo menos no entorno da Platina. Talvez a substituição seja menos tipológica e mais populacional mesmo. Mateus: Acho que é recíproco, porque uma coisa influencia a outra. O fato de você ter mais prédios, distancia mais as pessoas. O espaço também influencia, eu acho. Felipe: Mas o patrimônio fala da existência de um limite altimétrico. Belisa: Mas isso é muito restrito à Rua Platina e arredores. Mateus: Sem contar que essas leis podem mudar. Felipe: Podem mudar, mas por existirem essas restrições relacionadas ao patrimônio, a tendência imediata é que a população idosa saia da casa e que ela seja ocupada por uma família com poder aquisitivo maior ou por serviços como escritórios de advocacia, por exemplo. Se a casa for tombada, os empreendedores imobiliários convencionais não terão interesse em ocupar. O caráter do bairro vai mudando nesse sentido. Não é que vão ser derrubadas todas as casas para a construção de prédios, porque não pode. Mas o caráter da população pode mudar. Belisa: Outra coisa interessante que percebi em relação ao mercado imobiliário no bairro é que existem muitas casas sendo vendidas como lotes. Eles simplesmente ignoram que a casa existe e colocam a casa a venda sob a categoria de lote, simplesmente adicionando uma 144


observação que diz que no lote há uma ou duas casas, por exemplo. Ou seja, elas já estão ignoradas e pré-destinadas à demolição para a construção de novos prédios. Então, se na Platina existe essa lógica da proteção, quando se adentra o bairro existe um mercado muito mais aquecido. Vítor: Em relação ao mapeamento das Fronteiras do bairro, o mais legal foi o processo de encontro das pessoas no qual elas desenhavam e discutiam os limites do bairro. De imediato, podemos observar que existem algumas fronteiras mais recorrentes que outras, e isso ajuda a pensar qual é o recorte geográfico dessa memória do bairro e das pessoas que conhecemos lá. Tereza Cristina, Silva Lobo, Rua Turquesa são limites bem definidos. Já a leste, os limites são mais difusos. Marcela: Interessante aparecer a Rua Turquesa, eles a demarcaram como pertencente ao Calafate? Vítor: Ela apareceu muitas vezes como limite do Calafate. Talvez hoje a Rua Turquesa já esteja completamente envolvida pelo Prado. Mas para a geração das pessoas que desenharam os mapas, os limites do Calafate eram bem maiores e abarcavam essa rua. Felipe: Vejo aí outro ponto muito interessante: Cada um imagina o Calafate de uma forma. Hoje, a maioria das pessoas declaram ser do Prado, enquanto as gerações passadas, por mais que habitem o mesmo endereço desse “novo Prado”, afirmam pertencer ao Calafate. E para quem não habita nem um, nem outro, o Prado é visto com melhores olhos. E se fomos observar os imóveis disponíveis para aluguel e venda, mesmo estando no Calafate, são anunciados como Prado. Lembro-me de escutar algum dos moradores dizer que, se continuar assim, o limite do Calafate vai se estreitar tanto, que um dia ele vai sumir. Não vai existir mais Calafate. Mateus: Por isso que faz muito sentido nós continuarmos afirmando que nosso trabalho é sobre o Calafate. Por mais que para a cartografia oficial estejamos trabalhando em alguns pontos do Prado, se os próprios moradores que já conhecemos ainda afirmam que o recorte é o Calafate, a gente pode assumir o Calafate, talvez até numa tentativa de questionamento dessas fronteiras. Marcela: Outro indício desse encurtamento do Calafate é a leva de moradores acima de sessenta anos que saíram de lá. Por mais que tenham o carinho pela memória do Calafate, eles migraram para o Prado. Talvez por isso seja também muito difícil conseguir que eles expressem uma visão prospectiva quando perguntamos sobre projetos para o bairro. Mateus: Acho que o sentimento nostálgico também engessa o pensamento prospectivo. Para eles, o jeito de melhorar é voltar a ser como era, e isso não pode ser feito. Vítor: Isso revela uma certa descrença na possibilidade do cidadão em transformar. Na visão deles, essas transformações dependem sempre de instâncias políticas superiores que vão decidir o que vai ser feito, ou no máximo oferecer algumas possibilidades de escolha para a população. E esse descompasso entre cotidiano e política é 145


outra lacuna a ser preenchida no bairro. E o interessante sobre essa diferença entre as fronteiras subjetivas de hoje e do passado, é que para a geração mais antiga, dos nove participantes, só dois afirmaram ser moradores do Prado. Sendo que, na verdade, se você compara o limite que eles representaram com o limite oficial, muitos demarcavam o Prado oficial de hoje como Calafate. Então, apesar de haver limites mais recorrentes, o recorte geográfico do bairro depende da experiência de cada um. Belisa: Uma situação que me ocorreu agora foi um morador do Prado que já morou no Calafate e tem muito orgulho disso. Posso estar enganada, mas tive a sensação de que ele “melhorou de vida” e migrou para o Prado. E por mais que ele tenha orgulho de ter morado no Calafate, assim que pôde, foi para o Prado. E várias das pessoas falaram que não moravam mais no Calafate, talvez essa seja uma situação recorrente. Pode ser porque a fronteira mudou, mas pode ser também porque o poder aquisitivo das pessoas aumentou e um apartamento no Prado seja de melhor qualidade. E, agora, mais acessível a essa população que fez essa migração. Felipe: Talvez seja mesmo relevante pensar no resgate dessa noção de Calafate enquanto um território. Vemos essa questão de orgulho em relação ao Calafate, pelas pessoas que viveram o bairro nos anos sessenta e setenta, que é a época em que o Calafate tinha os festivais de futebol, os bailes, os cinemas, uma escola pública de referência em toda a cidade. E hoje pode ser que essa negligência do território esteja ligada com a extinção de todas essas práticas. Propor esses eventos como experimento, e reforçar esse caráter de vizinhança onde as coisas acontecem, pode ser uma forma de questionar essa negligência. A população orgulhosa é justamente a mais velha, que não tem mais tanta energia para fazer essas coisas acontecerem e, ao mesmo tempo, não sabemos se os mais novos não pensam muito nisso por não terem contato com essa memória. Vítor: Concordo que os habitantes mais jovens não pensam muito nisso e que para eles isso não é uma questão. Mas de fato ainda não conseguimos acessar a juventude do bairro. A maioria dos adolescentes da Escola Pública, com quem realizamos a Oficina de Fotografia e o Café da Manhã, não são moradores do bairro. Temos que encontrar canais de acesso aos moradores jovens de hoje. Belisa: No dia do encontro dos amigos do bairro havia alguns meninos e eu me lembro de um deles que não seria difícil de reencontrar, porque ele é filho de um dos moradores antigos que conhecemos. Vítor: Sim, e eu me lembro que ele até escreveu um post na Linha do Tempo Coletiva. O post dele era um trecho do hino do Calafate que, segundo ele, é o único bairro no Brasil que possui um hino. Aliás, ele se mostrou atento a todas essas questões que estamos discutindo aqui. Marcela: Só o fato desse menino ter comparecido ao encontro já indica que ele tem um envolvimento legal com aquele lugar. Mateus: O Ricardo da Associação dos Moradores é outro jovem envolvido com o bairro e que pode ter uma boa rede de contatos de outros moradores mais jovens. Felipe: Concordo que pode haver desejos de mudar o bairro entre os jovens. Talvez o que falte seja uma articulação que torne alguns experimentos viáveis. 146


Vitor: Sou muito a favor dessa hipótese, agora falta encontrar essa população para descobrir. Mateus: Essa suposta falta de envolvimento tem a ver também com os tempos atuais. O caráter local dentro de uma metrópole talvez tenha perdido um pouco de sua força. As pessoas estão sempre indo para outros lugares na cidade para resolver seus problemas ou em busca de lazer. Sem contar que, hoje, é muito mais fácil fazer as coisas sem precisar de ir à rua. Belisa: Sim, muita coisa é feita na internet. Vítor: No texto introdutório do João ele menciona esse “afogamento na metrópole”, não é? E que o que estamos experimentando é justamente um movimento contrário. Belisa: Outro ponto que chama muito a minha atenção e até me impressiona é a alta adesão de jovens à Igreja São José do Calafate. Eu, por exemplo, não tenho nenhum contato com esse tipo de rede, mas no dia do café da manhã conhecemos um número bem grande de adolescentes moradores que faziam parte do teatro da igreja. Eles sim são os moradores jovens do bairro e a igreja é um ótimo canal de entrada para iniciar esse diálogo. Felipe: O que eu acho interessante naquela igreja é seu caráter de espaço público. Ela não é um lugar para o qual as pessoas vão rezar. Elas se encontram ali porque é ali que elas fazem seus amigos. Os meninos dessa igreja tem grupo no Facebook e, como eles moram perto uns dos outros, eles se encontram todos os dias, através dessa rede, para ir à rua tomar um picolé, tomar açaí ou beber um suco. A igreja é realmente uma centralidade que funciona como espaço do encontro, ainda mais com a sensação de insegurança e de descuido generalizada depositada nas ruas. Vítor: Isso se relaciona muito com a nossa proposta de encarar o espaço público como a ótica transversal a todas as nossa ações no bairro a partir de agora. É imaginar a escola como espaço público, o quintal como espaço público, a igreja como espaço público. Marcela: O mapa das Referências do bairro pode nos dar muitas pistas sobre quais são esses espaços públicos outros no bairro. Ele mostra a Igreja, as escolas, a Banda Carlos Gomes, entre tantas outras referências. Felipe: São lugares de encontro que substituíram a rua que, por sua vez, era o lugar de encontro dos moradores antigos. Talvez por isso essa noção do bairro Calafate esteja tão negligenciada. Os locais de encontro de agora acontecem dentro de locais fechados. E isso aconteceu na cidade inteira, não só no Calafate. Marcela: É como já nos falaram na escola. Em qualquer cidade, por mais que existam poucos muros, você sempre vai encontrar dois lugares murados: o cemitério e a escola. E os pais deixam as crianças na escola por essa ilusão de segurança, o que já não acontece nas ruas. Vítor: E como a gente está enxergando a questão do espaço público passar por vários aspectos do trabalho, passo a questionar se encontrar uma problemática para o trabalho seria realmente incongruente com a prática do urbanismo tático. Eu ainda acho que uma coisa não anula a outra. Não acho que o espaço público como uma problemática anule as possibilidades táticas do trabalho. A problemática vai servir só como um guarda-chuva que nos 147


possibilita tratar essa questão, que já é ampla por natureza, com coerência. E isso não anula as possibilidades de reformulação e questionamentos constantes das nossas interrogações à medida que o trabalho avança. Falar em espaço público não é falar de praça e calçada, mas é pensar, por exemplo, que o jornal do bairro pode servir também como plataforma de espaço público, assim como a igreja e tantos outros lugares. Felipe: É interessante mesmo pensar o espaço público para além do espaço físico, mas também enquanto noção de vizinhança. Em uma favela, por exemplo, o fato de lutar contra a remoção implica numa coesão social. As pessoas tem que estar juntas para alcançar voz política. No Calafate, há uma noção de vizinhança que vem se desgastando aos poucos por causa dessa descrença em relação ao espaço público e, com isso, perde-se também esse espaço de debate e luta política. Desse modo, transformações impositivas e processos hegemônicos vão chegando e são tidos como naturais. Reforçar o caráter de espaço público no bairro está ligado intimamente a reforçar a noção de vizinhança. Isso pode ser um motivo para o caráter altamente nostálgico nas conversas sobre o bairro que tivemos com os moradores até agora. Mateus: O espaço público deveria ser o espaço que todos podem acessar. Na verdade, a escola e a igreja tem lá suas barreiras, umas mais evidentes que as outras. Talvez seja o caso de colocar todos esses grupos sociais na mesma roda, em uma situação de conflito e choque. Talvez o jornal seja o melhor lugar para isso. Vítor: Sim, para o espaço público funcionar como tal, seu acesso tem que ser perceptível imediatamente. E andando pelo bairro, você não percebe a existência desses espaços de encontro, você tem a impressão de se tratar de um lugar onde todos estão confinados em suas vidas privadas. Nós sabemos que existem coletividades atuando, mas para descobrir isso foi necessário um olhar atento e investigativo. Essas práticas tem que ser tornadas visíveis. Mateus: Já nas primeiras conversas que tivemos com moradores pudemos perceber que, apesar de haver alguns espaços de vida coletiva, as pessoas ficam mesmo muito em casa. Belisa: A cidade propicia esse enclausuramento, que se aplica tanto aos idosos quanto aos jovens. Depois de passar a semana toda trabalhando exaustivamente, as pessoas querem mais é passar o final de semana descansando. Mateus: Sim, mas a sensação de insegurança também tem um papel fundamental nesse enclausuramento. Vítor: E é curioso e surpreendente a postura dos policiais do bairro em relação a isso. Eles mesmos dizem que para tornar a rua e praça seguras, é urgente o uso intensivo desses espaços, e não a vigilância preventiva. Marcela: Mas ao longo dos últimos meses, pudemos perceber também vontades, ainda que tímidas, de ocupar o espaço público. A maioria dos idosos entrevistados manifestaram interesse na implantação da Academia da Cidade na praça, o que poderia realmente ser muito utilizado. Mateus: Não acho que a Academia da Cidade seja solução, longe disso. Mas vejo acontecer também um processo cumulativo de uso do espaço. Quando se pode ir à praça não só para ver os outros, mas para se exercitar, jogar, brincar... uma coisa vai levando à outra. 148


Vítor: Mas o fato da Academia da cidade ser o primeiro desejo que vem à mente das pessoas diz muito sobre a falta de repertório que elas geralmente têm sobre o que o espaço público poderia ser. E isso reflete também na incapacidade das pessoas em pensarem projetos para os bairros onde vivem. Não existem referências e exemplos instigantes pela cidade, as ideias não nascem do nada. Felipe: E, ao mesmo tempo, tem muita coisa acontecendo no espaço doméstico e que poderia reinventar a rua se transbordasse para o espaço público. Belisa: Isso porque as pessoas não vêem o espaço público como um espaço delas. O espaço público não é visto como apropriável, ele é de qualquer um. Felipe: Falta justamente essa noção criativa de que esses muitos acontecimentos poderiam ser deslocados para o espaço público. Mateus: Talvez nos envolver com crianças mais novas seja muito rico para descobrir possibilidades para o espaço público. Elas tem concepções mais livres sobre essas fronteiras do público e privado. Felipe: O próximo mapeamento, dos Aspectos Históricos, mostra justamente essa transformação e substituição da noção de espaço público ao longo do tempo. Mateus: E é legal que esse mapa culmina na Bacia do Calafate, proposta pelo Nova BH. É o símbolo dessa noção institucionalizada e impositiva de espaço público. Belisa: O legal desse mapa é também a escala das práticas que ele apresenta. Várias ações, mais localizadas entre as décadas de 1940 e 1970, foram organizadas localmente e pelas pessoas que moravam ali. A partir da década de 1970, as ações que o mapa representa são manobras maiores, muito influenciadas pela articulação regional do bairro, cujo processo é completamente feito de cima para baixo. Felipe: É possível ver como essas intervenções feitas de cima para baixo interferem completamente no cotidiano das pessoas. O próprio fato da Rua Platina ser hoje bastante engarrafada vem muito da substituição do bonde pelo carro, das grandes obras rodoviárias que circundam o bairro, que constrangem o rio e limpam os campos de várzea. Mateus: O bairro acaba sendo uma vítima desses processos. Vítor: O mapeamento Reconstrução da Paisagem evidencia muitos desses aspectos do mapeamento histórico, pois ele tenta reconstituir visualmente a paisagem e um astral de como o bairro foi um dia. Ele foi feito a partir de depoimentos de moradores que viveram o bairro dos anos trinta e quarenta, e informações que conseguimos em outras conversas e fontes de pesquisa. Podemos ver nele essa substituição de modos de vida pelas escolhas do desenvolvimento, materializadas em obras viárias, apagamento de campos de várzea, canalização do rio, e as relações com processos ecológicos que são perdidas a partir disso. Não se pesca mais, não se colhe mais as frutas nativas, não se tem mais as fazendas. Apesar dos resquícios que permanecem hoje em quintais, perdeu-se uma relação mais visível com o cultivo e, de repente, onde se colhia milho, mandioca e abóbora se instala o Supermercado EPA, onde hoje se compra tudo isso sem saber onde foi colhido. São várias noções de “público” que foram sendo deturpadas pelos processos de transformação da paisagem do bairro. São contradições e retrocessos, apesar de estarmos anos à frente. 149


Felipe: Um dos depoimentos que gerou esse mapa fala sobre a prática de caminhar na beira do rio, acompanhando a linha férrea até a Cidade Industrial, passando pelo bairro Salgado Filho. As temporalidades eram outras, assim como os meios de mobilidade praticados e as relações entre bairros. Assim como eles iam ao Salgado Filho, as pessoas de lá desciam ao Calafate pelo rio e esses encontros aconteciam em contextos e paisagens hoje impossíveis. Atualmente, o caminho entre dois bairros próximos requer complexos trajetos porque as rodovias que existem entre eles, na intenção de conectar regiões distantes, acabam por desarticular territórios próximos. Mateus: Seria interessante comunicar aos mais jovens essas coisas. Porque às vezes a falta de contato com essa história hiperlocal impede que eles enxerguem o futuro de modo mais imaginativo, pois eles acham que as coisas sempre foram como são, não há noção dessa evolução - ou retrocesso. Vítor: E o jornal pode desempenhar um papel importante nisso, no sentido de sistematizar e publicar essas informações por meio da plataforma impressa. E outro ponto interessante nos depoimentos é a forte presença das companhias vinculadas ao transporte ferroviário Central do Brasil, Estrada de Ferro Oeste de Minas. São componentes do imaginário que foram perdidos e que falam também um pouco dessa substituição de meios de mobilidade e suas implicações espaciais. Marcela: Sim, é importante comunicar essas coisas. Porque às vezes chegamos com esse repertório todo e o que as pessoas do lugar mais querem é que o rio seja mesmo tampado para resolver logo o problema, por exemplo. Não se tem ideia de como poderia ser bom ter rio disponível ao nado e à pesca. Além de acharem que esses processos não tem volta, não há exemplos próximos de rios onde isso aconteça. Felipe: A elaboração de documentários é outra plataforma legal de despertar esse tipo de debate, pois existe uma memória quase apagada. Ainda mais porque a linguagem audiovisual pode ser bem acessível e eficiente. Só esses depoimentos já tem uma potência grande em provocar essas imaginações. Mateus: A Vila Calafate se comunica muito com essas transformações. O Mapeamento do Cotidiano da Vila mostra, de cara, que ela está localizada exatamente no resíduo que sobrou do emaranhado da malha viária que circunda o bairro. Marcela: Como foi mesmo que a Vila começou? Mateus: Os primeiros ocupantes chegaram há vinte anos. Existe também um boato de que as pessoas foram para esse lugar pois já sabiam que havia planos para a construção da rodoviária ali. Elas já tinham a ideia de que poderiam receber a indenização pela remoção. Na verdade, muitos dos moradores da primeira leva de ocupantes não moram mais ali. A maioria dos moradores atuais comprou pedaços de terreno dos primeiros ocupantes, pois estes, quando chegaram, dispunham de grande quantidade de terra e puderam dividi-las para a venda. Há casos inclusive de doações de terrenos que foram, posteriormente, vendidos a outras pessoas. É um processo complexo de ocupação. Lá existe uma área pertencente a um agente privado que na verdade nunca questionou a ocupação. E a área pública, pertencente à Prefeitura de Belo Horizonte, é uma área que ninguém nunca ocupou, porque é sabido que a prefeitura não permite a ocupação de seus terrenos. Essa é justamente a área onde as pessoas fazem horta e instalam varais que são rapidamente reprimidos pela prefeitura. É uma área vazia, apesar de pública, o que também reforça os questionamentos acerca da 150


noção de público que o trabalho tem trazido à tona. Outra questão interessante são os condicionantes de uma economia local. Um exemplo são os carroceiros, que estão ali justamente pelos bota-fora das proximidades. Tem também a fábrica de cofrinhos, que está bem na entrada da vila, numa posição visível para quem passa de carro. O topa-tudo também está nessa parte, inclusive seu dono está indignado com a remoção, pois o topa-tudo só dá certo porque é na beira dessa grande avenida. Então a avenida que, a princípio, possui uma péssima característica ambiental, se mostra também fundamental para essa economia que se desenvolveu ali. E esse contraste é muito interessante. A relação da vila com o bairro é um pouco pulverizada. Tem algumas pessoas que mapeamos que trabalham no bairro e também algumas crianças e adolescentes que estudam na Escola Estadual Bernardo Monteiro. Por outro lado, uma das mães que conheci me disse que cada vez mais alunos estão saindo do Bernardo Monteiro devido à violência dentro da escola. De maneira geral, pude observar nas pesquisas que as pessoas estabelecem poucos vínculos afetivos com aquele lugar, muito devido à eminência constante de remoção. E a plataforma audiovisual como registro desse processo e dessa história do lugar poderia ter um papel importante para provocar essa noção do direito a ocupar e continuar naquele lugar. E falta também algum instrumento que questione a visão de futuro que essas pessoas tem. Falta entender que se aquelas lojas estivessem localizadas em outro lugar, por exemplo, elas poderiam não ser tão beneficiadas pela localização como são hoje. Assim, essa expectativa da indenização pode começar a ser questionada. Felipe: Outro aspecto legal desse mapeamento é que podemos observar que muitas coisas que já imaginamos como situações ideias para o bairro, como o uso e apropriação doméstica mais intensa do espaço público, já acontece na vila. Os jardins na frente de casa, os galinheiros, os varais na rua, os campinhos que o bairro inclusive já teve um dia… Belisa: Mas eu fico me perguntando até que ponto esses usos são comuns. Comuns no sentido de que as pessoas fazem conjuntamente e não coisas pontuais movidas pela necessidade individual. Existem práticas que conectam esses usos e seus praticantes na vila ou as pessoas se apropriam individualmente? Mateus: Inclusive no bairro essas manifestações são também individuais. Belisa: Sim, e essa é mais uma relação possível entre os dois lugares. Mateus: Talvez devêssemos justamente tentar entender melhor essas iniciativas individuais e experimentar torná-las mais compartilhadas e coletivas. Marcela: E tentar colidir os diferentes atores desses lugares. Felipe: Mas mesmo que essas ações na vila sejam pontuais, eles tem a noção de que o espaço público não é intocável. Eles vão lá e fazem o que tem que fazer. Estendem o varal e soltam seus cavalos e galinhas. Belisa: Existe muito menos pudor. Mateus: Me parece que no bairro essas ações se concentram nos quintais, e na vila não há quintais individuais, mas sim um quintal enorme na frente de todos os moradores. Talvez 151


seja menos uma questão de consciência do uso do espaço público, e mais uma condição de necessidade estimulada pela conformação do espaço. Vítor: Já que falamos sobre a relação entre conformação espacial e economia na Vila, vale a pena falar sobre o mapeamento da Diversidade Produtiva. Esse mapa foi feito em duas escalas. A primeira delas foi um panorama geral de toda atividade econômica que encontramos em nossas andanças pelo bairro. E esse mapeamento também destacou quais são os tipos de atividades econômicas existentes no bairro, bem como a predominância de determinadas categorias e sua distribuição espacial. Belisa: Isso permitiu que observássemos alguns padrões. Encontramos muitas imobiliárias, o que pode ser relacionado com o aquecimento imobiliário pelo qual o bairro está passando. Foi legal perceber também a grande disponibilidade de lojas de materiais de construção, para quando a gente precisar, e isso inclui tanto lojas de materiais como areia, brita, tijolo, quanto serviços como serralheria. Vítor: E a partir disso geramos uma lista com todos os comércios mapeados, o que pode ser útil não somente para ir atrás de produtos e serviços específicos, mas também para mapearmos possibilidades de anúncio para o jornal do bairro. Belisa: Podemos ver também que faltam atividades relacionadas ao lazer. Mesmo que sejam categorias privadas de lazer, é interessante ver que são muito escassas. Mapeamos três ocorrências: Teatro Kleber Junqueira, Escolinha de Futebol e Jogo do Bicho. E foi legal também ver o comércio concentrado em dois eixos principais: a Rua Platina e a Rua Turquesa. Mateus: Curioso, eu imaginei que havia menos atividades econômicas no interior do bairro. Vítor: No mapa isso fica muito mais visível do que quando se caminha pelo bairro, porque a média é de um comércio por quarteirão. E ainda, a maioria desses comércios são serviços como imobiliária, contabilidade, advocacia, escola de idiomas, que não são tão vistosos como lojas, bares e restaurantes, por exemplo. Felipe: Grande parte desses comércios e serviços estão vinculados à confecção de roupas. E há um tempo a prefeitura queria transformar o Prado e o Calafate em pólo da moda. Isso é típico do planejamento urbano de marketing, em que os lugares passam a ser atribuídos a atividades muito específicas. Isso contribui muito para a questão do aquecimento imobiliário. Vítor: E isso contribui também para o apagamento de outras economias. Passa a ser vantajoso para um tipo específico de atividade econômica estar naquele lugar, então as lojas passam a ser compradas por empresários da natureza predominante, homogeneizando aos poucos aquela região. Mateus: Isso tem a ver com o urbanismo funcionalista que se propõe a setorizar e atribuir funções únicas aos lugares. Felipe: É a imposição de uma identidade. Esquece-se todo o resto e define-se uma vocação artificial para o bairro. Tão artificial que, quando aconteceu essa proposta, os moradores se mobilizaram para impedir que isso acontecesse. 152


Vítor: A outra escala do mapeamento, ou o desdobramento da primeira, é reduzida à análise espacial de algumas amostras singulares de atividade comercial. Olhamos de perto e mapeamos o Espetinho Platina, que é um bar e estacionamento ao mesmo tempo, a loja de produtos de limpeza artesanais, que fica acoplada ao prédio da Igreja, a Fábrica de Cofrinhos da vila, em que espaço de produção se mistura ao espaço doméstico de reprodução, a Relojoaria Castro, comércio ativo mais antigo da Rua Platina e o Padeiro Ciclista, um dos vários ambulantes que atuam na região. E em relação ao comércio ambulante, vale pontuar que eles ainda não entraram no panorama geral da economia, pois ainda temos que pensar em uma cartografia específica para esse tipo de atividade. Felipe: Outra categoria de comércio que existe, mas que também é complexa para mapear, são as redes de troca entre os moradores. Descobri outro dia que as senhoras da igreja se encontram semanalmente para costurar, bordar e pintar para depois vender por aí. Outro dia fomos também à casa de uma das moradoras e ela nos disse que sua mãe faz sapatos de bebê, roupas, bolsas e calcinhas. E ela tem uma clientela que são as amigas dela. E isso é muito forte entre a população mais idosa do bairro, não existem lojas para isso. E nesse caso o mapeamento pode ter um papel muito importante para dar visibilidade a essas redes de economia e fortalecê-las. Belisa: Vi também na fachada de muitas casas plaquinhas informais que indicavam que ali dentro vendia-se algo produzido ali. Não se trata de uma loja, e sim uma casa. E para comprar, você bate a campainha, fala diretamente com o produtor. E essa é uma relação de troca que se firma muito mais intimamente do que nas lojas. Marcela: Todas essas coisas poderiam aparecer no jornal, como um catálogo desse tipo de rede de economia no bairro, para dar visibilidade mesmo. Queria puxar agora para o mapeamento da Iluminação Artificial, que toca nessa questão do comércio. Esse mapeamento assumiu o recorte mais específico da Rua Platina, porque é o lugar no bairro onde há mais pessoas circulando à noite. Por ali passam os ônibus e são encontrados muitos bares. Nesse mapeamento inseri as árvores, e como elas são muito escassas na Rua Platina, as copas não impedem a disseminação da luz, como acontece em tantos outros lugares na cidade. Por outro lado, a área em volta do Batalhão da Polícia Militar tem mais árvores, o que torna essa região mais escura. Outro ponto que o mapa revela são as distâncias entre os focos de iluminação pública, gerando trechos muito escuros na rua, o que aumenta a sensação de insegurança. E além da representação dos postes, em branco, os pontos amarelos representam os comércios que ficam abertos à noite e contribuem para a iluminação da rua. Pensando um pouco na sobreposição da iluminação com o uso do espaço, percebi nas minhas andanças noturnas que os pedestres são raros à noite. Os frequentadores da rua à noite estão concentrados nos bares, nem mesmo nos pontos de ônibus há muita gente. Felipe: Existe um exemplo na Rua Platina que ajuda a confirmar que a má iluminação não está vinculada à insegurança em si, mas sim à sensação de insegurança. O entorno do Batalhão é o ponto mais escuro da rua, devido a maior presença de árvores ali. Por outro lado, é onde as pessoas praticam corrida à noite. Como eles sabem que ali existe um batalhão, isso gera uma maior sensação de segurança, por mais que exista um muro que não permite qualquer visibilidade entre o lado de dentro e de fora do Batalhão que possa prevenir atos criminosos. 153


Belisa: Sempre é mais uma questão de sensação de insegurança do que de insegurança em si. Vítor: O que não justifica a má iluminação. Por mais que a má iluminação gere mais sensação de insegurança do que falta de segurança em si, a boa iluminação e outras medidas que estimulem o uso mais intenso da rua podem de fato torná-la mais segura, ou pelo menos inibir ações criminosas. Felipe: Falando em Rua Platina, queria falar um pouco sobre o mapeamento do Patrimônio. Apesar de existirem no bairro 143 edificações com vários graus de proteção, existem hoje apenas dois edifícios tombados: o Lactário e uma casa próxima ao Batalhão da Polícia. As edificações ainda não tombadas não podem ser demolidas e passam por algumas restrições a serem seguidas pelos proprietários. Esse mapeamento também traz uma coleção das fachadas das edificações de interesse histórico no bairro. É interessante ver como, para as pessoas do bairro, essa noção de patrimônio é um pouco longe da realidade delas, o que gera apropriações bem interessantes. Um dos meus exemplos favoritos fica em frente ao batalhão. É uma casa antiga que foi dividia em três espaços comerciais, cada um pintado de uma cor, sem nenhuma preocupação com a combinação. Mateus: Patrimônio não pode ser um congelamento. Preservar sem impedir o dinamismo! Felipe: Nessa pesquisa do patrimônio, encontrei também diretrizes especiais para a paisagem que são muito interessantes. Temos esse nível de preservação da arquitetura, mas também tem a noção de preservação do espaço público, que tem caráter bem mais prospectivo. Na Rua Platina as diretrizes são de tornar subterrânea a fiação elétrica dos postes, arborização generosa da rua, alargamento das calçadas, reduzir o tráfego e tirar o estacionamento da Praça da Igreja São José do Calafate. Mateus: É legal também pensar o patrimônio imaterial do bairro. Felipe: A Orquestra Carlos Gomes é patrimônio imaterial de Belo Horizonte, apesar de não receber nenhum suporte financeiro para se manter. Belisa: Gostaria de falar sobre o mapeamento da Vacância, que foi feito enquanto eu mapeava o comércio. Durante as andanças em si fui marcando espaços disponíveis para aluguel e venda e sobrepus essas informações aos dados disponibilizados pelo Censo 2010. Podemos observar algumas manchas mais expressivas de vacância próximas às avenidas mais movimentadas. O quarteirão da Escola Bernardo Monteiro apresenta índice alto de vacância. Seria bom estudar mais o porquê disso. Fiz também uma pesquisa em sites de imobiliária para fazer uma média do valor do metro quadrado em cada região, estabelecendo comparações entre o Prado e o Calafate. Pudemos então confirmar que o Prado é de fato muito mais valorizado que o Calafate, além de ter maior quantidade de imóveis disponíveis. Mateus: Comparando esses mapas, podemos inferir que a vacância está relacionada com o mercado imobiliário. Como é um bairro valorizado, muita gente compra para investir, o que acaba gerando muita vacância. Felipe: Mudando um pouco de assunto, o mapeamento em seqüência traz as Manifestações Culturais Extintas. Isso retoma aquela história do uso da rua que foi se perdendo com o passar dos anos: o carnaval de rua, cinema grátis, vôlei na praça, bailes nas ruas, festivais 154


de futebol e a praia na Rua Turquesa. Pelas conversas que tivemos com moradores que participaram dessas atividades no passado, a maioria deles indica a insegurança como fator principal para extinção delas. Vítor: Sendo que, ao mesmo tempo, a extinção dessas manifestações de rua acabam por gerar mais sensação de insegurança no espaço público. Felipe: A extinção aconteceu também muitas vezes devido a imposições que vêm de cima para baixo. A Praia da Rua Turquesa, por exemplo, passou a ser impedida pela polícia ainda na década de setenta. Os festivais de futebol acabaram porque os campos foram substituídos por avenidas. Vítor: É uma prática constante de controle e assepsia exercidos pelo poder público. Felipe: E na contramão disso, temos ainda algumas manifestações que persistem no espaço. Elas estão muito ligadas, mais uma vez, à igreja ou a grupos que se reúnem em torno de uma memória coletiva ligada à vida no bairro em outros tempos. Os exemplos dessas práticas são a Semana Santa, o bazar e as festas da igreja, o Encontro dos Amigos dos Bairros Calafate/Prado, o grupo Bernamonte de ex-estudantes do Bernardo Monteiro. Todas essas práticas são mantidas pela população mais velha do bairro. Mas existem também algumas poucas manifestações mapeadas que são vinculadas a grupos mais jovens, como a Bicicletada Noturna organizada pela loja Platina Bikes e a Rua do Lazer. Mateus: Essas questões todas estão vinculadas aos Grupos sociais atuantes no bairro, que é outro mapeamento. Ele envolve quatro grupos: os policiais, os estudantes, os idosos e os carroceiros, apesar de sabermos que existem de fato muitos mais. Mas escolhemos esses por se sobressaírem na paisagem do bairro, apesar de terem características muito específicas. Eles tem também territórios muito bem definidos. Por outro lado, em determinados horários do dia, principalmente na hora do almoço, esses grupos saem às ruas e começam a se esbarrar, apesar de não haver muita troca. E é legal pensar como que eles influenciam e são influenciados pelo contexto socioeconômico do bairro. Marcela: E é interessante também perceber que é na Rua Platina onde eles se esbarram com mais intensidade. Mateus: A Rua Platina é mesmo a centralidade do bairro. Assim como na escala urbana, você tem o centro da cidade, onde os diversos grupos se encontram, dentro do bairro a Rua Platina funciona como tal. O fim da tarde é outro horário de muita efervescência da rua: vemos os carroceiros descendo em direção à vila, os militares saindo uniformizados do Batalhão, as crianças saindo das aulas, os idosos fazendo suas caminhadas, os pontos de ônibus, as lanchonetes cheias e as pessoas abrindo as portas de suas casas. É o horário de explosão do bairro. Felipe: Temos que fotografar esse momento! Mateus: E falta também descobrir o que fazer a partir de agora, uma vez mapeados todos esses grupos e suas práticas. Vítor: E descobrir quais são seus desdobramentos possíveis no espaço público. 155



PREENCHER AS LACUNAS Apesar da efervescência da Rua Platina, do uso constante da praça Carlos Marques, das apropriações domésticas e dos encontros nas portas dos bares, é evidente no Calafate o gradativo encerramento na esfera privada das práticas que um dia se davam na rua. Isso é resultado, entre outras razões, do crescimento da sensação de insegurança na cidade e de processos urbanos impositivos que, ao longo dos anos e em nome da ordem e do progresso, foram inibindo manifestações festivas que povoavam as calçadas, praças e campos do bairro. Seja por falta de informação, medo, ausência de diálogo ou descrença na capacidade transformadora do cidadão comum, identificamos nos moradores e frequentadores do bairro um ceticismo na noção de espaço público, o que acabar por comprometer a noção de vizinhança. Como resposta a esse contexto e continuidade ao nosso trabalho, propomos um sistema constituído por projetos a serem desenvolvidos no bairro que testam o deslocamento da noção de espaço público para lugares outros, de modo a questionar seu significado desgastado e experimentar o reenvolvimento das pessoas em processos de ações coletivas que extrapolam os muros da esfera privada em direção às ruas do bairro.


etiquetas As etiquetas são uma forma de categorização dos projetos realizados no terceiro momento do trabalho, Preencher as lacunas, a fim de permitir uma leitura mais clara e rápida, além de facilitar posteriores consultas sobre os trabalhos realizados. Foram definidos quatro critérios: Demanda, Intenção, Plataforma, Envolvimento.

D

Demanda recebida percebida

I

Intenção encontro imaginários

Demanda mostra de onde veio o desejo de trabalhar com cada projeto. A demanda recebida vem das pessoas do próprio bairro, enquanto a demanda percebida é uma proposição do grupo a partir do entendimento das dinâmicas territoriais. Intenção caracteriza o propósito do projeto realizado, que pode ser o incentivo ao encontro, a descoberta e estímulo do imaginário urbano, a criação de momentos de discussão, a reafirmação da identidade local e a construção de intervenção de caráter físico no bairro.

discussão identidade intervenção

P

Plataforma física articulação

E

Envolvimento pontual contínuo

Plataforma é o meio através do qual a ação se materializa. Quando a ação acontece de maneira física, desdobra-se em algum tipo de instrumento ou produto construído. O oposto acontece com a plataforma de articulação, em que as repercussões não se concretizam materialmente, mas operam no campo social, político ou cultural. Envolvimento diz respeito ao tempo de comprometimento do grupo com a ação. Ele pode se dar de maneira pontual, durante um curto período de tempo, ou contínuo, por um período prolongado.


D

I

P

E

Presença Gráfica

percebida

identidade encontro

física

pontual

Jornal

percebida

imaginários discussão identidade

articulação

contínuo

Plataforma Web

percebida

encontro discussão

articulação

contínuo

Assuntos Públicos

percebida

encontro discussão

física

pontual

Muro

percebida

discussão intervenção

física

pontual

Parquinho

recebida

encontro imaginários intervenção

física

pontual

Cinema

percebida

imaginários discussão identidade

articulação

contínuo

Bailes da Banda

recebida

encontro identidade

física

pontual

Gabinete de Curiosidades

percebida

imaginários identidade

física

contínuo

Casa do Calafate

percebida

encontro imaginários

física

contínuo

listas de projetos


PRESENÇA GRÁFICA

Quem passa de carro pela Avenida Silva Lobo, na altura da Rua Platina, vê a placa que sinaliza “Calafate - Região Oeste”. É um dos poucos lugares onde está escrito o nome do bairro, como se isso só importasse para os motoristas perdidos na complexa rede viária da cidade. O nome é dificilmente visto nas placas de lojas e outros elementos de sinalização, principalmente na altura do olhar do pedestre. Em nossas investigações, percebemos que as fronteiras do bairro são difusas e cambiantes. Se a conquista de um território sempre foi marcada por uma bandeira, pode ser que a ausência da palavra Calafate nas ruas esteja contribuindo para a redução nas dimensões e no sentimento de identidade em relação ao bairro. Assim, nos parece importante estabelecer uma afirmação gráfica no espaço público, para fomentar o auto-reconhecimento das pessoas como habitantes do Calafate. Ao verem o nome do lugar onde vivem em uma logomarca que foge dos padrões rodoviários, pode-se iniciar um processo de identificaçao e valorização das peculiaridades do bairro. Da mesma forma, para nossa afirmação como grupo, é essencial haver um elemento visual presente em todas as nossas ações, para que elas sejam reconhecidas como parte de um conjunto. Além da logomarca, os cartazes são uma importante ferramenta de presença gráfica no espaço. Usados para divulgar eventos, ações e projetos, eles seguem uma lógica padronizada: fundo em cor clara, tipografia marcante em cor mais vibrante e imagens ilustrativas em tons de cinza. Os cartazes são colados no painel de assuntos públicos na praça Carlos Marques e em locais de grande visibilidade, como o metrô, a Rua Platina, a Escola e a Igreja. Além disso, são postados na página do Facebook. 160


D

percebida

I

identidade, encontro

P

fĂ­sica

E

pontual

161


O processo de elaboração da logo tem como ponto de partida uma pesquisa sobre os símbolos que representam o bairro. Dessa maneira, em nossas ações e entrevistas, perguntamos para os moradores quais são os elementos marcantes que sintetizam o lugar. A partir desse repertório de respostas variadas, elaboramos quatro ícones que pretendem resumir a paisagem e as peculiaridades do Calafate. Os ícones e letras foram adaptados para possiblilitar a aplicação na forma de stencil.

A bandeirola lembra as festas juninas, mas representa todas as comemorações que aconteciam e acontecem no Calafate. Atualmente, a maioria das festas são feitas em locais fechados, mas poderiam voltar a ocupar as ruas. A rosácea aparece na fachada da igreja do Calafate. Representa a tradição e caráter de encontro da paróquia, um lugar de destaque na paisagem e no imaginário dos moradores. Também remete aos cobogós das casas antigas. A ferradura está nos cavalos que circulam pelo bairro: montados pelos soldados do batalhão ou guiados pelos carroceiros. Esse elemento remete ao caráter de cidade do interior que o Calafate ainda preserva em alguns aspectos. O coreto é elemento marcante na paisagem da praça Carlos Marques, espaço público icônico no bairro e de grande importância para os moradores. Ele pode representar outras praças do bairro.

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163


O NOVO JORNAL DO BAIRRO RECRUTA MORADORES, COMERCIANTES, FREQUENTADORES E AFINS PARA ENVIO DE MATERIAL E SUGESTÕES. fala@calafate.org | bairrocalafate.org

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TEM IDEIAS PARA O CALAFATE? QUER SE JUNTAR A QUEM TAMBÉM QUER TRANSFORMAR O BAIRRO? visite o site www.bairrocalafate.org e saiba como colaborar.

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IDENTIDADE GRÁFICA 1

Faça uma pesquisa com os moradores do bairro. Questões como “o que é mais marcante no bairro?”, “se o bairro tivesse que ser representado em um símbolo, qual seria?”, “se um amigo seu viesse visitar o bairro, onde você o levaria?” são bons exemplos levantar informações que posteriormente podem ser transformadas na identidade gráfica do bairro.

2

A partir das respostas mais recorrentes, podemos trabalhar com esses elementos como síntese daquilo que está mais presente na memória dos moradores. Tire fotos daquilo que foi mencionado ou procure fotos antigas com esses moradores.

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3

Refências materiais podem ser facilmente transformados em desenhos como é o caso de uma edificação ou um detalhe marcante dessa construção. Já símbolos imateriais como eventos ou festas podem ser traduzidos em um desenho que simboliza essa festa, seja uma parte da decoração ou uma comida típica, por exemplo.

4

Os desenhos devem ser simplificados ao máximo, para facilitar a sua reprodução. Um bom exemplo de desenhos simples de linhas são os pictogramas.

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5

CALAFATE

CALA FATE

CA LA FA TE

Una esses símbolos com o nome do bairro numa composição gráfica.

6

Para que essa identidade gráfica seja fácil de ser replicada, podemos transformá-la num stencil. Assim, devemos fazer as pontes tanto nos desenhos quanto nas letras A, B, D, O, P, Q, R (se existirem). Dica: Consulte o manual de como fazer um stencil no capítulo do Muro.

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A B D O P Q R

CA LA FA TE


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JORNAL FALACALAFATE

No dia 9 de abril de 1978, o extinto Jornal de Casa já anunciava: “Sobreviver - é por isso que o Calafate está lutando”. Nessa época, os tradicionais becos do bairro já se espremiam entre as obras viárias levadas a cabo pelo governo. Quase quarenta anos depois, as preocupações que o jornal relatava ainda são as mesmas. Mas a edição do periódico está guardada como peça de coleção por moradores mais antigos, junto com fotos amareladas do que um dia foi o Calafate que eles conheceram. Diferente das mídias de massa, os chamados jornais de bairro podem, além da simples disseminação da informação, explorar uma dimensão afetiva de proximidade em relação aos leitores. Isso porque eles são capazes de colocar em relevo os vínculos existentes entre vizinhos, podendo registrar e dar visibilidade ao imaginário compartilhado entre eles. Ao mesmo tempo, eles podem servir como superfície de contato entre interesses conflitantes, favorecendo o debate sobre o espaço. Esse meio se torna ainda mais potente e necessário em um bairro como o Calafate, onde a inexistência de uma plataforma ampla de diálogo e discussão que, aliado ao consolidado sentimento de nostalgia manifestado pelos moradores, cria a idéia de que nenhum esforço devolveria ao bairro os seus remotos tempos de glória. Embora o Calafate não disponha hoje de um periódico próprio, nem sempre foi assim. Até alguns anos atrás havia um jornal organizado por um grupo de moradores do bairro, o Calafatos, que, antes de ser descontinuado, serviu como um meio de disseminação de notícias locais e um ponto de conexão das pessoas dali. A partir desse contexto, o jornal FalaCalafate, organizado por nós, nasce com o objetivo de dar visibilidade a personagens e modos não hegemônicos de viver e transformar o bairro, envolvendo, desde sua primeira edição, textos, ilustrações e fotografias de moradores. Servindo como um instrumento disseminador de práticas e tecnologias, ele se dispõe a estimular que tais ações sejam reproduzidas coletivamente, ensejando processos que dependam menos do poder público. Além de servir como plataforma de difusão de nossas investigações no bairro, o jornal pretende ter um papel de agenciador coletivo capaz de estimular processos de reconquista, ressignificação e deslocamentos da noção de espaço público através da diversidade de memórias e das propostas nele publicadas. O jornal ensaia, portanto, a (re)construção de uma comunidade que luta para não se tornar mais uma peça de coleção guardada com fotos amareladas. 170


D

percebida

I

imaginários, discussão, identidade

P

articulação

E

contínuo

171


172


173


SESSÕES FIXAS Além dos textos que procuram discutir o espaço público no bairro, seja apresentando propostas ou revelando práticas espaciais já existentes, o FalaCalafate é estruturado em nove sessões fixas. Por mais que o conteúdo de cada uma delas não se repita, pretende-se com elas propor situações contínuas que reconfiguram, ainda que temporariamente, a experiência do cotidiano do leitor-morador. Estas ações provocam o olhar dos leitores em direção às microscopias do território e da paisagem cujas riquezas passam despercebidas pela relação funcional que muitos preservam com a rua, reduzindo-a, muitas vezes, ao espaço de ir e vir entre afazeres cotidianos.

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ontem ONTEM eE hoje HOJE

GUI A DA RUA

Ontem e hoje traz duplas de fotografias da paisagem do bairro que, apesar de tiradas do mesmo ângulo, são registros de décadas diferentes. A intenção é reenvolver o olhar do leitor com a memória da paisagem cotidiana e as amnésias provocadas pelas transformações urbanas.

Abordando uma rua diferente a cada edição, o Guia da Rua investiga e revela o comércio ali disponível, bem como histórias, episódios e singularidades que às vezes tornam extraordinárias as esquinas mais banais.

O CALAFATE DE...

tirinhas

Esta sessão traz ao leitor um mapa do bairro produzido a partir de uma expedição realizada com algum morador. As expedições transitam entre a nostalgia e a prospecção, revelando memórias e desejos de paisagens e hábitos.

Elaboradas por Paulo Marcelo OZ, ilustrador residente do bairro, as tirinhas ironizam conflitos políticos e situações corriqueiras que atingem a vida dos moradores do Calafate.


IMAGINA NO CALAFATE!

receitas do bairro

A partir de propostas para o espaço público do bairro sugeridas pelos moradores, a sessão Imagina no Calafate! publica foto-montagens de projetos imaginários e controversos que reconfigurariam a experiência do espaço cotidiano no bairro. Ao compartilhar o imaginário dos moradores com estas ficções, amplia-se o repertório de possibilidades para o espaço público, questionando os modos hegemônicos e anestésicos de se pensar e fazer a cidade.

Esta sessão inicia uma pesquisa da memória culinária no bairro e seus desdobramentos espaciais. Além de descobrir receitas, pretendemos também publicar redes de cultivo e pôr em relevo a possibilidade do plantio e da cozinha como articuladores sociais no bairro - seja nas trocas de excedentes de quintal, nos festivais da Igreja ou na mesa do bar.

gente nossa ----------------

caça ao tesouro

Gente nossa revela moradores cujas práticas, hábitos e histórias apresentam desdobramentos prospectivos para a vida em comum no bairro. Seja pela ocupação doméstica da calçada, por conhecimentos difundidos ou pelo quintal compartilhado, espera-se que esta seção coloque em contato leitores com práticas espaciais afins, de modo a potencializar tais possibilidades na vizinhança.

A cada edição, a sessão Caça ao Tesouro propõe que os leitores saiam às ruas do bairro a fim de resolver enigmas espaciais propostos pelo jornal. Os primeiros a desvendarem os enigmas são recompensados com prêmios fornecidos por um dos comerciantes apoiadores do jornal. Busca-se, assim, inaugurar um processo de transbordamento do universo do jornal para o espaço público através do jogo. 175


176


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foto de Lucas Sallum 178


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JORNAL DE BAIRRO GRÁTIS 1

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Procure saber se já existe um jornal em seu bairro. Se já existir, converse com o editor para garantir que sua proposta não é redundante. Às vezes, vocês podem até virar colaboradores.

Crie um endereço de e-mail para organizar o contato de colaboradores e anunciantes.

3

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Reúna vizinhos ou mesmo amigos de fora que estejam interessados em colaborar. É bom tentar formar um grupo diverso de colaboradores, abarcando experiências e percepções variadas sobre o bairro.

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Planeje o conteúdo do jornal a partir de temas que, além de discutir questões internas, evidencie e informe sobre a articulação do bairro com o resto da cidade.


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Procure variar o ritmo dos textos, inserindo sessões que promovam a virtualização, como jogos, quadrinhos e ficções que têm como tema o espaço do bairro.

Com o conteúdo pronto, faça a diagramação pensando nos formatos de jornal disponíveis nas gráficas de sua cidade.

7 Dica: O orçamento pode ser barateado se o jornal for feito em preto e branco ou duas cores. Mas cuidado! A produção gráfica em duas cores envolve procedimentos complexos.

Feita a diagramação, pesquise a gráfica que trabalhe com impressora rotativa e imprima em papel jornal.

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8

Dica: Ofereça opções acessíveis em tamanhos e preços variados, para abarcar a maior diversidade de comerciantes possível.

Feito o orçamento, monte um plano de venda de anúncios para o comércio local para cobrir ao máximo o custo da impessão. Encare a proposta como um mapa do comércio disponível no bairro.

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Dica: Lugares agregadores de público como sacolões, salões de beleza, equipamentos culturais e escolas são bons exemplos de locais para deixar o jornal.

Negocie com os comerciantes que anunciarem para deixar uma boa quantidade do jornal disponível em suas lojas. Junte-se aos colaboradores e elabore um esquema de distribuição, de modo que cada um seja responsável por cobrir determinadas ruas do bairro. Procure também construir um dispositivo para que as pessoas possam pegar seus exemplares no espaço público.

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DISPLAY DO JORNAL 1

2

Com o auxílio de uma ferramenta (ex.: chave de fenda) faça o movimento de uma alavanca para desconectar as madeiras superiores e inferiores da caixa.

O display do jornal será feito a partir de caixas de feira nas dimensões 30x32x58cm.

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Pegue 3 peças do mesmo tamanho que as peças superiores: 2 para a parte inferior e 1 para o topo.

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Fixe a peça superior na borda, deixando um espaço entre as demais. Já na parte inferior, coloque-as justapostas.


x110

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x2

x2

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Acrescente duas peรงas de igual tamanho a cada face lateral do display.

Separe as madeiras laterais da caixa.

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Pregue as peรงas sem deixar espaรงo entre elas.

Desconecte a parte do fundo da caixa de feira.

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Acrescente uma madeira de igual tamanho e fixe-as deixando um pequeno espaรงo entre elas.

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Una quatro madeiras com uma ripa transversa. Repita o procedimento e acrescente dobradiรงas em uma delas.

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Para pendurar a caixa, passe um lacre ou uma corda entre as frestas das madeiras do fundo.

Fixe a parte com as dobradiรงas no fundo da caixa. A outra parte deve ser colocada inclinada apoiada na parte inferior.


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Para obter um melhor acabamento, lixe a caixa.

Acrescente duas peças na parte da frente da caixa. Uma deverá ser fixada na parte superior e a outra na inferior.

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Dica: utilize lixas mais grossas (granulação entre 120 e 240).

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Estampe com stencil as diferentes faces da caixa.

Aplique verniz para protegê-la da água da chuva.

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PLATAFORMA WEB

Dona Inezita, com seus 74 anos bem vividos, costuma organizar um encontro mensal em sua casa com as amigas de longa data. No Dia do Pastel, como ela mesma batizou o encontro, ninguém sai com fome: tem pastel de carne, de queijo, de banana, de palmito, de frango e de qualquer combinação que surgir na cozinha. Dona Inezita garante a massa e a preparação, e cada convidado leva o recheio que preferir. Anos atrás, sua pequena pastelada era organizada nos dias de missa, onde as amigas se encontravam. Mas hoje - nos conta Dona Inezita com orgulho - tudo é feito através das redes sociais, direto de seu celular. - Hoje tudo é mais fácil, eu quase não preciso sair de casa. Resolvo tudo pelo celular! Dona Inezita tem razão. Em um contexto onde mais da metade da população brasileira tem acesso à internet, muitas tarefas do dia-a-dia não demandam mais do que um clique para serem resolvidas. Serviços bancários, compra de remédios e até de supermercado podem ser feitos sem sair de casa. E pouco a pouco os encontros que se davam na fila do açougue são substituídos pelos chats e pelas correntes dos famosos memes que circulam pelos perfis das redes sociais. A fim de tomar partido dessa articulação proporcionada pela internet, criamos uma página do bairro Calafate no Facebook, como uma forma de tentar articular algumas pessoas também através da web e como experimentação para a criação de um futuro site oficial do bairro. Assim que a página foi para o ar, percebemos a grande e rápida adesão de diversos moradores que, à medida que iam entrando na página, continuavam a convidar os amigos e vizinhos. Crianças, adolescentes, idosos, frequentadores 188


D

percebida

I

encontro, discussão

P

articulação

E

contínuo

assíduos, moradores atuais, ex-moradores e curiosos: toda uma mescla de pessoas cuja característica comum é o sentimento de afetividade pelo bairro Calafate começaram a se reunir em uma mesma plataforma. Dia após dia, atividades na praça eram divulgadas, histórias eram contadas, e fotos, exibidas. Um ex-morador do bairro, por exemplo, mostrava fotografias de sua antiga casa que logo era reconhecida pelo atual morador. E, aos poucos, começamos a ensaiar relações de vizinhança e situações de discussão e trocas através da internet, como se a página do Facebook se tornasse um espaço virtual que representasse o bairro. Um Calafate sem ruas. Mas pretendemos que este deslocamento para as redes sociais de relações que poderiam se dar fisicamente no bairro não inibam o envolvimento das pessoas com as ruas do Calafate. Ao contrário, a internet pode alimentar esse envolvimento. Ao possibilitar a criação de uma rede de pessoas atentas às questões apresentadas, a página do Facebook, aos poucos, vem se tornando uma plataforma para divulgação e estímulo de encontros físicos. De fato, os moradores mais curiosos foram conferir as atividades propostas nas ruas do bairro após verem a divulgação através do Facebook (foi o caso, por exemplo, do Dia do Suco na praça Carlos Marques). Assim, espera-se que as redes sociais atinjam uma rede considerável de moradores e, da mesma maneira que no Dia do Pastel de Dona Inezita, funcionem como um agenciador capaz de estimular encontros dos vizinhos no bairro, indicando caminhos possíveis na contramão de um processo de encerramento e individualização. 189


190


191


Nesta pรกgina: Repercussรฃo dos posts na pรกgina do Facebook do Bairro Calafate Na pรกgina anterior: Exemplos de moradores do bairro Calafate que curtem a pรกgina do Facebook 192


CURTIDAS NA PÁGINA

ALCANCE DAS PUBLICAÇÕES

403 curtidas

605 alcance total esta semana semana passada

3/11

4/11

5/11

6/11

7/11

8/11

mulheres homens

dos quais: são moradores do bairro

74%

3/11

9/11

4/11

5/11

6/11

7/11

8/11

9/11

18%

PERFIL E FAIXA ETÁRIA DAS PESSOAS

55% 44%

esta semana semana passada

13%

13-17

8%

8%

35-44

45-54

55-64

7%

4%

4%

5%

0,3% 18-24

25-34

0,3% 11%

4% 65+ 2%

16% ENVOLVIMENTO

119

pessoas envolvidas

128

5

27

1111

curtidas

comentários

compartilhamentos

cliques em publicações

*dados retirados do site Facebook relativos ao dia 10/11/2014 193


PÁGINA DA WEB 1

Bairro Calafate

Comunidade

Entre no site www.facebook.com.br e crie uma página para o bairro.

2

3

Coloque na foto de capa e na foto de perfil, imagens que ilustrem ou caracterizem o bairro.

194

Dica: a opção “página” no facebook tem uma abrangência maior do que a opção “grupo”, de alcance mais restrito.

Comece convidando amigos e aqueles moradores que tem maior proximidade com você para curtirem e seguirem a página.


4

Nas primeiras semanas, promova campanhas para que os moradores que seguem a página convidem outras pessoas do seu ciclo de co-nhecidos. Dessa forma, uma corrente de pessoas se formará em torno da página do bairro.

5 Poste na página regularmente para mantê-la viva. Dica: Mini campanhas, fotos e notícias são exemplos de postagens que podem chamar a atenção dos seguidores da página e gerar discussões.

6

Procure organizar também eventos que estimulem as pessoas a ocupar espaços do bairro, como festas na praça, exibição de filmes na quadra da igreja e almoços coletivos em ruas sem saída. Dica: o número de pessoas que vão a esses eventos no bairro é um bom medidor da abrangência da página web e de seu potencial de articulação.

VAMOS COMEÇAR A CONSTRUIR UM PARQUINHO NA PRAÇA? TRAGA SUAS FERRAMENTAS E IDEIAS! quinta, dia 30 de outubro, a partir das 14h na Praça do Bernardão

facebook.com/bairrocalafatebh

CALAFESTA! LANÇAMENTO DO JORNAL FALACALAFATE ENSAIO DE CARNAVAL: O PIOR BLOCO DO MUNDO, EXIBIÇÃO DE FILME SOBRE A PRAÇA, CHURRASCO.

Sábado, 15/11 às 16h na Praça do Bernardão Traga com você: carnes e vegetais para grelhar, instrumentos musicais, cadeira ou canga para sentar.

facebook.com/bairrocalafatebh

195


assuntos pÚBLICOS

Quando o assunto é o espaço público do bairro, é rotineiro escutar reclamações de que o Calafate já viu dias em que suas ruas e praças eram mais cheias. Nesses tempos, se materializavam frequentemente ações coletivas de toda sorte, fossem elas sob a luz do sol ou dos postes. A sensação de insegurança e a migração destas atividades de encontro para espaços privados disputam a colocação de principal motivo para a perda de popularidade da rua como lugar para aproveitar o valioso tempo livre. Mas apesar do aparente esvaziamento, algumas conversas mais atentas começam a revelar que, embora às vezes realizadas em lugares de acesso controlado, existem no bairro atividades regulares abertas a todo tipo de público que promovem o encontro e a troca. Estas atividades acabam, muitas vezes, por se tornar restritas a grupos muito específicos e homogêneos, visto que o boca-a-boca e as redes sociais que conectam grupos afins ainda parecem ser as estratégias mais comuns de disseminar esses eventos pelas ruas do bairro. Isso nem sempre garante, contudo, que os eventos alcancem um público para além dos círculos sociais daqueles que os organizam. Com a intenção de mapear e tornar visíveis estes momentos, a plataforma Anúncios Públicos se propõe a concentrar os eventos organizados pelo bairro e para o bairro, sejam elas pedaladas noturnas, bazares comunitários ou reuniões para discutir a reforma do 196


D

percebida

I

encontro, discussão

P

física

E

pontual

coreto. Fixado no muro da escola na Praça Carlos Marques, o painel feito de madeira reaproveitada pode ser usado por qualquer um que queira anunciar. Composto por duas partes, a primeira delas consiste em um calendário com adesivos que notificam ao público os eventos dos próximos dois meses e um espaço destinado a um cartaz do próximo evento a acontecer. Na segunda parte foi gravado uma imagem em perspectiva da praça sobre o qual seus frequentadores podem colar adesivos removíveis contendo ideias para o espaço. Desse modo, registramos e publicamos os desejos de mudança dos moradores e frequentadores, de forma a comunicar que ali existe um processo de discussão sobre as possibilidades daquele espaço. Por mais que o trabalho já possua uma rede de moradores atentos às nossas pesquisas e propostas, sabemos que muitos, apoiadores ou incomodados em potencial, ainda não tiveram contato com nossas ações. Nesse sentido, o dispositivo extrapola o foco inicial de sua utilidade comunicadora, uma vez que o painel inaugura também um processo experimental de nossa presença gráfica no espaço público do bairro. Desse modo, passamos a amplificar a voz de nossas pesquisas e ações. Atingimos moradores pelos quais antes passávamos despercebidos, abrindo possibilidade para novos diálogos, colaborações, descobertas e conflitos cujos desdobramentos estarão, no futuro, marcados no próprio calendário que iniciou este processo, caso ele se comprove uma tentativa de êxito. 197




200


201


sol e chuva

bebedouro posto policial

espaรงo gourmet

202

gangorra parquinho


nuvens

wifi

banheiro público 4:20

revitalização dos jardins

rampa de skate novos aparelhos de ginástica

mais festas música ao vivo

venda de produtos orgânicos

barraquinhas de artesanato

ciclovia

203


PAINEL CALAFATE 1

Dica: Paineis de madeira desse tipo podem ser encontrados em caçambas ou em obras.

Pegue um painel de madeira quadrado. Lixe a superfĂ­cie da madeira.

2

Usando um rolinho, pinte algumas das partes do stencil de uma cor.

204


3

Pinte o resto do painel de outra cor com cuidado para nĂŁo pintar por cima do que jĂĄ foi pintado.

4

Espere a tinta secar e retire o molde do stencil. Para proteger da ĂĄgua da chuva, passe duas camadas de verniz.

205


CALENDĂ RIO DE ATIVIDADES 1

Desenhe quadrados de 5x6cm. 7 fileiras na horizontal para os dias da semana e 6 na vertical para as semanas. Na parte da esquerda, desenhe um retângulo tracejado de 42x29,7cm e a linha com a espessura de 0,5cm.

2

Cole fita crepe nas bordas das linhas desenhadas, vertical e horizontalmente.

206


3

Use um estilete para cortar as sobreposições das fitas.

4

Pinte com tinta acrílica o espaço entre as fitas. Espere a tinta secar e retire a fita.

207


5

Imprima em adesivo os números e nomes dos dias e do mês para que, quando necessário, seja feira a substituição dos meses no calendário.

6

Recorte os adesivos e cole-os nos espaços designados.

208

Dica: Fique atento à periodicidade do calendário e programe-se para atualizá-lo sempre.


7

Posicione o stencil do título na parte superior do painel e pinte com um rolinho. Quando a tinta secar, passe duas demãos de verniz.

8

Adicione atividades e eventos ao calendário escrevendo nos adesivos e colando no painel. Coloque o cartaz de divulgação do evento.

209


PAINEL PRAÇA 2

1

Parafuse a dobradiça de modo a fixar duas tábuas provenientes de caixas de feira.

3

4

Pregue as laterais com peças de madeira menores.

210

Fixe a madeira inferior e a da frente com a peça das dobradiças formando um “U”.

A caixa está pronta para ser afixada no painel.


x30

x2

5

Fixe o fundo da caixa na parte da frente do painel de madeira.

6

Com a caixa fixa, vire o painel de frente para poder pintรก-lo.

211


7

Posicione o stencil do título no painel e pinte com o rolo. Deposite os adesivos dentro da caixinha.

8

1

2

3

1. RETIRE AQUI UM ADESIVO 2. ESCREVA A SUA IDEIA 3. COLE O ADESIVO NA IMAGEM DA PRAÇA

Imprima as instruções do painel em adesivo. Recorte os adesivos e cole-os acima da caixa.

212


9

1. RETIRE AQUI UM ADESIVO

2. ESCREVA A SUA IDEIA

3. COLE O ADESIVO NA IMAGEM DA PRAÇA

Desenhe, cole um adesivo ou imprima a laser a imagem da praça do painel.

10

Pegue um adesivo, escreva sua ideia para a praça e cole-o na imagem do painel.

Dica: Se os adesivos não tiverem a aderência desejada com a madeira, coloque alfinetes na caixinha também.

213


muro

A coincidência territorial da escola pública e da Praça Carlos Marques é, talvez, a maior potencialidade de ambas. A escola garante à praça uma ocupação rotineira, o que estimula o comércio e mantém a praça mais viva. Do ponto de vista da escola, a praça é uma oportunidade para experiências pedagógicas e de expansão do espaço escolar. Essas potencialidades não são, contudo, exploradas com a intensidade que poderiam. O que se observa, na verdade, é que ao longo dos anos a praça vê cada vez mais a escola aumentar seu muro, fechando as atividades da escola em si mesma e as segregando não somente da praça, mas também do bairro. Dessa forma, o muro da Escola Estadual Bernardo Monteiro foi acumulando os significados de ruptura, segurança e disciplina, o que influencia a relação dos alunos com o bairro. Para os alunos, aquela estrutura é vista como um obstáculo a ser superado para o alcance da liberdade, e, para a comunidade, como um elemento que notifica os limites do espaço público e o impedimento do uso das salas e quadras da escola pública. Consequentemente, a exclusividade de funções de cada lugar incrementa as tensões entre a comunidade da escola e os moradores, dificultando o estreitamento das relações. Em conversas com a associação de moradores, com vizinhos e com a comunidade escolar, a falta de oportunidade de diálogo entre esses núcleos foi relatada como principal motivador de atrito e dificultador de negociações cotidianas. A partir dessas conversas, iniciamos uma série de projetos para essa fronteira tendo como ponto de partida a possibilidade do muro como interface transitória, rumo à sua dissolução simbólica como barreira impositiva. O primeiro processo de intervenção teve o intuito de melhorar a experiência visual do muro 214


D

percebida

I

discussão, intervenção

P

física

E

pontual

na paisagem com a pretenção de envolver no processo não só a comunidade da escola, mas uma pluralidade de atores do bairro. O primeiro passo desse processo resultou em uma oficina de stencil com os alunos, técnica acessível e facilmente replicável. Além de apresentar aos alunos um vasto repertório de possibilidades de intervenção em muros que subvertem a noção de barreira, experimentamos com eles processos de abstração e padronagem necessários para a produção do stencil. Os desenhos que geraram essas padronagens foram levantados pelos próprios alunos, a partir de caminhadas investigativas e discussões coletivas sobre modos de travessia e trocas possíveis entre o cotidiano da praça, da escola e do bairro. Dentre os temas escolhidos, as janelas surgem como uma representação da paisagem do bairro, além de um elemento simbólico de abertura do muro. As frutas materializam a ideia de uma diversidade de árvores frutíferas na praça. Já os temas liberdade e celular/wifi respondem a um desejo de rompimento com as normas e limitações impostas pela escola, como a proibição do uso de celulares dentro da sala de aula. A música surge como uma forma de expressão cultural e, por fim, a favela representa o rompimento com preconceito sofrido por aqueles que vivem nesse local (como é o caso de grande parte dos alunos da escola). Devido à espera pelos recursos que iriam ser captados pela própria escola para a compra das tintas e corte dos stencils, este projeto esteve paralizado até então. Assim que tivermos acesso à ajuda de custo, daremos continuidade às atividades. Planejamos levar os alunos para uma visita à Escola de Arquitetura da UFMG, onde os stencils serão produzidos em uma máquina de corte a laser. Em seguida, pretendemos promover um evento para a pintura do muro, envolvendo alunos e moradores do bairro. 215


216


217


218


219


Tema: Liberdade

Tema: Favela

220


Tema: Celular/Wifi

Tema: MĂşsica

Tema: Frutas

Tema: Janelas

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STENCIL 1

Para fazer um stencil primeiramente desenhe ou imprima a imagem desejada usando um papel de uma maior gramatura, como o papel cartão.

2 Recorte o desenho com um estilete ou em uma máquina de corte a laser. Dica: Cortar com estilete, apesar de mais barato, pode ser uma tarefa difícil se existirem muitas curvas no desenho: elas podem ficar imprecisas, ao contrário da outra técnica

3

Fixe o molde nas pontas com fita crepe sobre a superfície que será estampada.

222


4 Com um rolinho de pintura, pinte a parte vazada do molde. Dica: Essa tarefa também pode ser realizada com um pincel ou com uma esponja molhada na tinta, porém, os riscos da tinta vazarem por baixo da base e borrarem o desenho são maiores.

5

Ao remover o molde da superfície, a imagem pintada será sua contraforma.

Dica: Se você deseja criar um stencil que seja composto apenas de linhas, é necessário que se desenhe “pontes” unindo as figuras ao molde, evitando que essas áreas não sejam cortadas fora.

223


Dica: A partir de um desenho simples podemos criar diversos padr천es ao repitir e rotacionar esse desenho base.

1

2

3

90o

90o

90o

90o

90o

90o

90o

90o

60o

60o

60o

60o

60o

224

60o


225


PARQUINHO

Ao relembrar a história do bairro, moradores mais antigos relatam com nostalgia o tempo em que levavam suas crianças para brincar no balanço, no escorregador e na quadra de esportes que animavam os dias na Praça Carlos Marques. Hoje, na geração de seus netos, a praça já não oferece mais tantos aparatos para o exercício do tempo livre. No lugar dos brinquedos, encontramos hoje os equipamentos de ginástica, que incitam um uso programado, destinado a apenas um grupo homogêneo, fato que se repete em tantos outros bairros do Brasil. As brincadeiras, portanto, dependem dos objetos individuais trazidos de casa, como as bicicletas e velotróis, o que por vezes dificulta a experiência espacial coletiva na praça, diminuindo a interação entre as crianças e o surgimento de amizades do bairro antes tão mais frequentes. Alguns moradores contam que a falta de manutenção levou à extinção do parquinho. A degradação causada pelo tempo e os usos subversivos fizeram com que optassem por sua retirada há cerca de três anos. Ao mesmo tempo, o consumo de maconha na praça é apontado por muitos como desmotivador do uso do local por alguns pais e suas crianças, o que leva muitos a trocarem a diversão no espaço público por playgrounds encerrados em áreas de lazer dos edifícios. 226


D

recebida

I

imaginário, encontro, intervenção

P

física

E

pontual

A ativação inversa deste ciclo depende de um processo que devolva à praça a intensidade do exercício coletivo do recreio. Com a intenção de experimentar essa possibilidade, inauguramos, com um balanço pendurado na árvore e duas amarelinhas pintadas no chão, um processo gradativo de construção de um parquinho que desperte um outro olhar das pessoas sobre o mesmo espaço da praça. A cada elemento adicionado, observamos quais são as implicações e relações criadas por esse rompimento com a anestesia do cotidiano do local, o que nos leva a refletir sobre o próximo passo a ser dado. Para além da criação experiências coletivas de lazer, essas intervenções são dispositivos políticos, que afirmam de maneira efetiva nossa presença no bairro e tornam perceptíveis conflitos latentes que povoavam silenciosamente a praça. Afinal, equipamentos que intensificam o uso do espaço implicam na presença e voz ativas de grupos adversos anteriormente silenciados, reconfigurando relações cotidianas e criando demandas pela negociação de um espaço cada vez mais compartilhado. Geram, ao mesmo tempo, aprovação e incômodo, e o resultado de cada experimento orienta a próxima ação do processo, sempre contaminado pelo fazer a céu aberto. 227


228


229


230


231


232


233


BALANÇO 2

1

Usando uma lata redonda de molde, desenhe a curva nos 4 cantos da madeira.

Corte um pedaço de madeira retangular nas dimensþes 50x29cm.

3

4

Com uma serra tico tico, corte a curva desenhada.

234

Lixe os cantos da madeira.


5

6

Para fazer a pintura de listras, cole 2 linhas de fita crepe numa angulação de 60° na madeira distanciadas igualmente. Repita o procedimento no verso do assento.

Com uma furadeira, fure 4 buracos: um em cada canto.

7

8

Aplique tinta acrílica parte onde não foi coberta com a fita.

Espere a tinta secar e remova a fita.

235


9

10

Faça 2 furos com estilete nas pontas da câmara de ar. Elas serão colocadas para proteger o galho da árvore do atrito com a corda.

11

Passe a corda presa à câmara de ar por cima do galho da árvore. Dica: Para ajustar a câmara de ar no lugar certo, o ideal é que se alcance esse galho com uma escada ou subindo na própria árvore.

236

Dobre a corda ao meio e passe a corda pelos buracos.


12

13

Posicione a câmara de ar no galho de modo a protegê-lo. Passe a ponta da corda por dentro da alça e puxe para tensionar a o laço.

Estique as cordas e dê um nó nas pontas soltas.

237


14

15

Passe cada ponta da corda por um furo do assento.

238

DĂŞ um nĂł em cada ponta da corda, corte a sobra e queime com um isqueiro a ponta para que ela nĂŁo desfie.


239


AMARELINHA 1

Tome partido do grid que você encontrar no chão da praça.

2

Imprima ou desenhe os números em uma folha de papel cartão. Faça-os de um tamanho que seja proporcional ao espaço e cole-os com fita no chão.

240


3

Por cima do número, pinte todo o espaço do quadrado.

4

Espere a tinta secar e retire os números em papel cartão.

241


AMARELINHA

2

1

Meça com uma régua e cole com fita as guias para pintar a amarelinha.

2

Pinte o espaço deixado entre as linhas das fitas com um rolinho de pintura.

242

Dica: Pense em retângulos de medidas diferentes para dinamizar o desenho.


3

Desenhe ou imprima os números em papel cartão e corte com estilete. Cole com fita o molde no centro dos retângulos e pinte o interior.

4

Espere a tinta secar e retire os moldes dos números em papel cartão.

243


cinema Nos “tempos áureos” do Calafate, os vizinhos se encontravam com frequência para assistir filmes. Bem antes dos multiplex em shopping centers, DVDs ou internet, havia no bairro dois cinemas de rua e um cinema na igreja, além das exibições do Cine Grátis nas praças. A porta do Cine Eldorado ficava cheia antes e depois das sessões e os jovens aproveitavam o momento para ver os amigos. Quando acontecia o Cine Grátis, os espectadores se mobilizavam para cobrir com panos escuros a luz dos postes mais próximos e traziam cadeiras de casa, transformando a praça em um cinema a céu aberto. Atualmente, os aparatos audiovisuais parecem distanciar as pessoas, mais do que aproximá-las. Muitas pessoas procuram o contato com o mundo exterior através da televisão ou da internet, dentro de suas casas, o que contribui com o esvaziamento das ruas. Pretendemos reverter esse caráter individual e introspectivo, não apenas recuperando o cinema de rua como situação de encontro, mas também propondo um roteiro sobre o bairro e para o bairro, fomentando a discussão acerca do espaço público. O projeto consiste na realização de uma série de video-documentários no bairro Calafate, a partir de entrevistas com moradores. Partimos da ideia de audiovisual como espaço público, não apenas por abordar essa temática, mas pensando o vídeo como lugar de diálogo, debate, dissenso e encontro com a diferença. A cidade reúne pessoas de diferentes origens, classes sociais, idades e pontos de vista. No entanto, indivíduos semelhantes tendem a se agrupar, reduzindo a possibilidade de intercâmbio entre grupos distintos. Ou seja, apesar de haver uma proximidade física entre as pessoas, elas se distanciam cada vez mais em relação à troca de experiências. No Calafate, os transeuntes não se ignoram como no centro da cidade, onde o ritmo é mais acelerado e há um maior número de desconhecidos. De qualquer forma, percebemos que existe pouca conversa entre pessoas diferentes, mesmo que elas se vejam diariamente. Existe uma variedade de narrativas e pontos de vista sobre um mesmo espaço, mas dificilmente eles se encontram. Assim, o vídeo pretende criar, simbolicamente, o debate público, incorporando o papel da praça ou da rua como plataforma de discussão sobre a cidade. Esse debate se aprofunda quando acontece a exibição para os moradores e novas conversas são estimuladas. O processo de produção dos vídeos está totalmente atrelado ao desenvolvimento dos outros trabalhos no Calafate. As discussões que surgiram a partir da nossa inserção no bairro determinaram a escolha dos temas para os documentários. Assim, as entrevistas com os moradores são também uma forma de aprofundar nossa pesquisa. Elas trazem respostas e levantam novas dúvidas, alimentando uma constante investigação. As informações coletadas são usadas, por exemplo como conteúdo para o jornal Falacalafate. Ao mesmo tempo, a aproximação com os entrevistados depende de outras ações realizadas pelo grupo. Nas atividades da etapa “investigar pela ação”, fazemos entrevistas curtas durante os eventos realizados e aproveitamos a oportunidade para agendar conversas mais longas. Essa estraté244


D

percebida

I

discussão, identidade, imaginário

P

articulação

E

contínuo

gia permite o contato com diferentes grupos, desde os alunos da Escola Bernardo Monteiro até os idosos que frequentam a igreja. Além disso, as ações investigativas despertam nas pessoas um imaginário de possibilidades para o bairro, que é expresso verbalmente nos depoimentos filmados. Durante os depoimentos, utilizamos a técnica de entrevista semi-estruturada. Elaboramos um repertório prévio de perguntas sobre espaço público, que perpassam aspectos de memória, usos nos dias de hoje e desejos para o futuro. O contato não se caracteriza como questionário, as questões são gradativamente enunciadas, deixando a conversa o mais natural possível e permitindo que assuntos não planejados venham à tona. As perguntas são adaptadas para cada tipo de entrevistado: conversas com idosos, por exemplo, têm foco nas histórias sobre o passado do bairro; já a entrevista com os moradores de rua tenta evidenciar seu cotidiano e os conflitos com a vizinhança; os alunos da escola têm mais visão prospectiva e falam mais sobre seus desejos para o Calafate. Dessa maneira, conseguimos registrar uma variedade de pontos de vista e maneiras de narrar, que se complementam mas também se contradizem quando colocados em conjunto. Tomamos como ponto de partida a idéia de que o principal espectador é um morador do bairro que deve perceber essas contradições e diálogos divergentes, para que possa ter uma visão crítica sobre o lugar. Na edição dos vídeos, as filmagens iniciais são pré-editadas e separadas em trechos, de acordo com o tema abordado. Cada vídeo-documentário é uma organização desses fragmentos, criando uma narrativa plural: uma sequência de depoimentos que não resulta em uma verdade única. O vídeo explicita que as pessoas possuem diferentes opiniões acerca dos assuntos abordados, pois estão em posições diferentes. A convivência diária em um grupo social legitima determinado ponto de vista, na medida em que há uma concordância entre pessoas similares. Aproximando comentários divergentes, é possível desconstruir alguns argumentos, gerar dúvidas, levar o espectador a considerar outras possibilidades. Além dos depoimentos, são registradas cenas do cotidiano do bairro em espaços e situações que, de alguma forma, aparecem nas entrevistas. Essas imagens são sobrepostas à fala dos moradores, não só para ilustrar o que está sendo narrado, mas também para suscitar novas interpretações. A adição dessa nova camada permite, por exemplo, comparar histórias do passado com a paisagem atual do bairro. Além disso, uma afirmação pode ser colocada em xeque quando aparece uma imagem que a contradiz. Essas cenas também permitem um deslocamento da percepção visual dos moradores, visto que a rotina pode gerar uma espécie de alienação em relação ao espaço urbano cotidiano. Ver um lugar por onde se passa diariamente em um vídeo estimula a análise distanciada e novos olhares sobre o bairro. 245


A pracinha era maravilhosa. Tinha escorregador, tinha balanço. Era aquela união das crianças.

Ninguém aproveita mais aquela pracinha, todo mundo tem medo, principalmete à noite.

O pessoal mais jovem frequenta bastante a praça, o pessoal mais velho também.

Aqui não é lugar de morada de ninguém, mas pelo menos é um lugar pra proteger do tempo.

Falta umas músicas ao vivo, uns shows à noite.

Não adianta nada ter uma reforma se os alunos e os frequentadores da praça não conservarem. 246

Deveria colocar mais área de lazer pras crianças.

Se a gente for esperar nunca vai ser feito.

A conscientização é em primeiro lugar. Eles têm que entender que aquilo é deles também.


CONVERSA NA PRAÇA (15’54’’)

O objetivo principal desse vídeo é fomentar uma discussão sobre a Praça Carlos Marques, revelando diferentes pontos de vista e desejos em relação ao espaço público. Moradores mais antigos contam como era a praça no passado e lamentam que ela esteja abandonada e pouco utilizada nos dias de hoje. Paralelamente, estudantes descrevem como ela é usada por diferentes grupos em vários horários, argumentando que ela ainda é apropriada pelas pessoas, além de ser um lugar de referência no bairro. Os moradores de rua, que habitam o coreto e são vistos como um problema, também têm voz no vídeo e explicam a situação em que vivem. O documentário também põe em relevo desejos e idéias para a praça, que normalmente envolvem uma programação de eventos, mais do que intervenções físicas de fato. Os fragmentos de entrevistas são sobrepostos a imagens de atividades que realizamos na praça, como o dia do suco e a construção do parquinho, ilustrando possibilidades de transformação. Por fim, os entrevistados expressam como acreditam que suas aspirações poderiam ser viabilizadas. Enquanto alguns colocam a responsabilidade no poder público, outros defendem que os próprios moradores devem se mobilizar, envolvendo os alunos da escola. 247


Aí, a mina está secando com esse tempo. A água vem de lá da casa da minha prima.

Eram vários campos de futebol. Muitas vezes a bola caia no rio Arrudas e era uma mão de obra para tirar.

Tinha um arvoredo em volta tudo, essas frutas do mato, gabiroba, articum, tinha pequi.

Tá vendo que não está tendo nem água, já está praticamente seco. 248

Antigamente nadava aqui, que a água era limpinha. Descia o córrego aqui e emendava com o outro lá em baixo.

Eu adorava aquela fazendinha lá em baixo, onde é agora o metrô. Os bois, as vacas, os porcos, era uma delícia.

Você já ouviu falar nesse piscinão que vão fazer aí? Eu acho que vai ser um caos. E vai ter que tirar todo mundo que mora na vila.

Não volta a ser igual antes. Aqui cresceu demais.


PAISAGENS EXTINTAS (11’09’’)

Este vídeo procura revelar camadas da cidade que foram esquecidas ou suprimidas, evidenciando para o espectador a dinâmica de crescimento da cidade. Em Belo Horizonte, assim como na maioria das cidades brasileiras, o processo de expansão urbana considerou o território como uma tábula rasa. A paisagem natural pré existente foi exterminada para dar lugar ao progresso: avenidas, edifícios, ferrovias, asfalto, concreto. No Calafate, os rios, pomares, fazendas e campos de várzea ainda existem na memória de alguns moradores. O vídeo cria uma narrativa que recupera essas histórias a partir do caminho da água. Começando em uma nascente que ainda existe em um lote vago, vai passando pelas ruas que cobrem córregos e deságua no nó viário que sufoca o rio Arrudas. Seu Adão, que foi filmado enquanto caminhava pela área, guia o passeio. Depoimentos de outros moradores complementam a reconstrução da paisagem: fazendas com animais, uma variedade de árvores frutíferas, mergulho e pesca nos rios, jogos de futebol nos campos de várzea. Imagens atuais da região são sobrepostas às entrevistas, criando um contraste entre os fatos narrados e paisagem altamente urbanizada. 249


250


EXIBIÇÃO DO FILME No dia 15 de Novembro de 2014, aconteceu a Calafesta, um evento que ocupou a praça Carlos Marques em um sábado no fim da tarde. Ao som do ensaio de carnaval do Pior Bloco do Mundo, formado por moradores do Calafate, aconteceu um churrasco e o lançamento do jornal Falacalafate. Quando escureceu, penduramos uma tela no tronco de uma árvore e utilizamos o ponto de energia da banca de revista para projetar o filme Conversa na Praça. Como nos tempos do Cine Grátis, a praça ganhou vida durante a noite e se transformou em um cinema a céu aberto. A exibição foi um momento instigante e quase poético, já que o documentário sobre a praça, com muitas cenas gravadas ali mesmo, foi exibido na própria praça. Logo que o filme acabou, a discussão que estava na tela se deslocou para o espaço físico. O vídeo fomentou um debate acirrado, que envolveu moradores com diferentes opiniões, membros do nosso grupo e alguns jovens que participavam do evento. Surgiram novas temáticas e alguns grupos com pontos de vista específicos foram evidenciados. A conversa foi gravada e adicionada a uma edição complementar. Dessa maneira, o vídeo não é um produto final, mas um processo. A ideia é que seja constantemente alterado e apresentado outras vezes, estimulando mais conversas sobre o espaço público. Assim, ele pode ser encarado como ferramenta para um procedimento de planejamento participativo, no qual tem voz mesmo quem não está presente e os contrastes são colocados em relevo. 251


252


253


CINEMA 1

2

Decida qual será o tema do vídeo. A partir daí, elabore um roteiro de entrevista semi-estruturada. Dica: O roteiro deve ser aberto, para que assuntos inesperados possam surgir. As perguntas devem ser neutras, para não induzir respostas.

Faça uma investigação prévia para encontrar moradores protagonistas e tente agendar entrevistas com eles. Depoimentos mais curtos podem ser gravados em eventos na rua.

3

REC Enquadre o entrevistado, mostrando parte do local de filmagem ao fundo.

254


4

REC Filme cenas cotidianas do bairro, que ilustrem ou complementem os depoimentos. Deixe a câmera estática, preferencialmente.

5

6

Na edição dos vídeos, intercale cenas dos entrevistados e cenas cotidianas. Tente construir uma narrativa que dê voz a diferentes pontos de vista.

Organize seções de cinema periódicas na praça. Articule com os vizinhos o equipamento necessário.

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BAILE DA BANDA

História da Banda A Sociedade Musical Carlos Gomes é, curiosamente, mais antiga que a própria cidade que a abriga. Fundada em 1896, um ano antes da inauguração da capital mineira, seus primeiros músicos vieram de Ouro Preto para trabalhar na comissão construtora da cidade, usando seu tempo livre para ensaiar. Com o tempo, foi tomando corpo uma orquestra nos moldes das orquestras americanas que eram chamadas de “Big Band”, cuja base era formada por diversos instrumentos como saxofone, trompete, guitarra, bateria, baixo, além dos cantores. À medida que a orquestra foi se aprimorando, foram surgindo os convites para apresentações nos mais variados cantos do estado, fosse em aniversários de cidades ou em caprichosas festas religiosas. Sua sede passeou por vários cantos da cidade até se instalar no Calafate, onde se encontra até hoje, e a popularidade da banda parece ter sido tão inconstante quanto seu endereço. Nas décadas de 1970 e 1980, ela se destacou na cidade pelas apresentações de chorinho que aconteciam todo sábado no salão da sede. Ao som de um ritmo tradicional brasileiro, as apresentações lotavam a casa e garantiam as contas pagas e investimentos em infraestrutura e na produção musical. Mas, na medida em que os anos passaram, o bairro se adensou e a vizinhança cresceu. O som do chorinho não foi mais bem aceito pelos novos moradores e teve que ser encerrado devido às inúmeras reclamações. Hoje, mesmo com o fim dos bailinhos e do cofre cheio, cerca de vinte músicos de todas as partes da cidade se reúnem religiosamente nas noites de quinta-feira no Calafate para ensaiar. 256


D

recebida

I

encontro, identidade

P

física

E

pontual

A demanda Durante os primeiros seis meses de inserção, em meio às andanças pelo bairro Calafate, conhecemos a Sociedade Musical Carlos Gomes. Entrevistamos o atual regente e professor de música Vanildo e comparecemos a diversos ensaios. Fomos, assim, nos tornando familiares à história daquela banda. Em um desses ensaios, o maestro Belmiro nos revelou o desejo da banda pela volta dos antigos bailinhos. Os motivos são inúmeros, como manter a popularidade da banda para que ela não caia no esquecimento, dar visibilidade ao ambiente musical e incentivar pessoas que queiram estudar música, além de obter uma quantia de recursos para ajudar a pagar as diversas despesas com o espaço físico, já que a Banda não conta com nenhuma ajuda de custo ou isenção fiscal do governo. Para isso, os membros da banda gostariam de reformular o modo como as apresentações acontecem: elas começariam mais cedo e terminariam antes das 22 horas para não mais incomodar os vizinhos. Além disso, a casa precisa ter sua infraestrutura adequada, principalmente segundo as normas atuais do Corpo de Bombeiros, para receber o público. Alexandre, o atual presidente, pontua várias melhorias que poderiam ser feitas: o piso desgastado, a falta de isolamento acústico e inexistência de uma saída de emergência para escoar o público são alguns dos problemas, sendo esta última a demanda mais urgente para possibilitar a volta dos bailinhos da banda ao bairro Calafate. A banda se tornou então, um experimento da possibilidade de nossa atuação remunerada como arquitetos no bairro sem, contudo, onerar o grupo que surgiu com a demanda. Após fazer um levantamento e estudarmos as possibilidades de localização da saída de emergência, juntamente com seus membros, chegamos a três opções 257


de escada, que podem ser possibilitadas por estratégias de financiamento coletivo. A viabilidade de cada uma dessas opções, bem como suas características específicas foram discutidas junto aos membros da banda, chegando à opção que agrupava o maior número de aspectos positivos. Posteriormente foram feitas articulações com outros profissionais do próprio bairro para efetivar o projeto: Leonardo do Atlântida, que fará o projeto para aprovação no Corpo de Bombeiros e Amauri, serralheiro que materializará a escada. Desdobramentos Após uma visita técnica com o Leonardo, engenheiro especialista em projetos contra incêndio, vislumbrou-se uma possibilidade em que a porta que é utilizada como entrada dos Alcoólicos Anônimos, edificação anexa, se configurasse como uma segunda saída para o público dos bailinhos, descartando a necessidade de uma escada de incêndio. Optou-se então por fazer um levantamento completo do lote e das duas edificações, sinalizando as duas saídas para envio e posterior aprovação no Corpo de Bombeiros. Caso o Corpo de Bombeiros desaprove essa proposta, a escada será projetada e executada de acordo com as normas. Para viabilizar essa reforma, um plano de financiamento coletivo foi pensado e será descrito mais adiante. Contudo, se realmente não houver necessidade da construção de nova saída de emergência, a Banda pode se utilizar do mesmo método de financiamento para viabilizar suas outras demandas como a instalação de um isolamento acústico ou a renovação do piso do salão.

2

1

4 6 1032

3

5

258

857

1 salão

3 cozinha

5 andar térreo residencial

2 depósito

4 banheiros

6 alcoólicos anônimos


Opção 1

Opção 2

Opção 3

259


260


Financiamento coletivo Para viabilizar essa reforma, um plano de financiamento coletivo analógico foi montado. O sistema proposto funciona da seguinte maneira: a Banda venderá “tickets” de diferentes preços para os possíveis apoiadores. Esses tickets, adquiridos por pessoas que queiram ajudar a financiar o projeto, serão trocados na sede da Banda por brindes de acordo com o seu valor. Com R$20,00 o apoiador ganha uma faixa bordada com seu nome para ser amarrada no guarda corpo da escada; com R$30,00, ganha-se a faixa bordada mais um CD da Banda; por R$40,00, adquire-se a faixa e um pôster da Banda; pelo valor de R$50,00, compra-se a faixa e uma camisa da Banda e; por último, ao apoiar a banda com R$100,00, obtém-se a faixa além de aulas ministradas pelo professor Vanildo de um instrumento à sua escolha. Além da faixa, todos os tickets valem também como ingresso para o Baile da Banda. Esses valores foram calculados de modo a cobrir os cutos dos brindes, execução do projeto e pro-labore dos profissionais envolvidos. Os tickets serão impressos em papel e a divulgação será feita no boca a boca, ao invés de se hospedar a campanha em uma plataforma online, uma vez que que grande parte dos apoiadores potenciais são de uma geração menos adepta à internet. O plano de financiamento tem, continudo, a estrutura de recompensas semelhante aos famosos “crowdfundings”, mas se difere na maneira de arrecadar, se aproximando ao sistema de rifas. Ao mesmo tempo em que esse plano de financiamento coletivo ajudará a conseguir fundos para a realização das possíveis reformas, seus brindes, além de servirem como um incentivo para que as pessoas contribuam e se sintam parte do projeto, servem como uma forma de divulgar a Banda para além dos muros de sua sede como patrimônio cultural do Calafate. Vizinhança envolvida Sociedade Musical Carlos Gomes

Maestro Belmiro

Serralheria do Amauri

Rua Doutor Thomaz Muzzi, 57 Sede da Banda onde ocorriam os bailinhos e que abrigam hoje os ensaios semanais

Rua Junquilhos Maestro da Banda que entrou em contato com seu vizinho serralheiro

Rua Junquilhos, 528 Serralheiro indicado pelo Belmiro, Maestro da Banda e vizinho da serralheria

Prado Militar

Atlântida Projetos

Coletivo micrópolis

Rua Platina, 913 Comércio onde serão bordadas as faixas com o nome dos apoiadores

Rua Junquilhos, 97A Escritório especializado em projetos contra incêndio

articulação entre os diversos atores do bairro

261


Frente do ticket destacável Parte do apoiador: “vale recompensa”

Parte do proponente: controle das recompensas

texto explicativo do projeto

Verso do ticket

Parte do apoiador: “vale recompensa”

Parte do proponente: controle das recompensas destacável

marcação das recompensas do apoiador 262

descrição da recompensa


informaçþes do apoiador para contato

valor pago pelo apoiador

263


FINANCIAMENTO COLETIVO analógico 1 R$100 R$250 R$425 R$500 TOTAL

R$1.275

Faça o orçamento dos gastos de todo o projeto a ser financiado.

2

Pense em cerca de 5 recompensas possíveis para os apoiadores. Dica: Recompensas relacionadas à força de trabalho do proponente se tornam mais baratas mas fáceis de serem viabilizadas.

3

$

$$

$$$

$$$$

$$$$$

Estabeleça um valor para cada uma das recompensas. Dica: Esse valor deve ser calculado de modo a cobrir o valor das recompensas e sobrar uma parte considerável para financiar o projeto.

264


4

+

=

Escreva um texto explicando o projeto e seus objetivos. Dica: esse texto deve contar a história do projeto de modo sucinto e que sensibilize as pessoas para ajudar a causa.

5

Produza um ticket que será vendido para os possíveis apoiadores e posteriormente trocado por recompensas. Dica: o ticket pode ser dividido em duas partes: uma que ficará com o proponente (como forma de controle da quantidade arrecadada e de recompensas distribuídas) e outra com o apoiador (uma espécie de recibo de participação na campanha e que será trocado pela recompensa).

265


gabinete de curiosidades

Nas tardes ensolaradas do bairro Calafate, quem desce a travessa Dollinger Ramos em direção à estação de metrô se depara com uma cena curiosa que se repete todos os dias. Vendedores ambulantes de toda sorte se acumulam ao longo da rampa de concreto em espiral que leva à entrada da estação. Um ao lado do outro, e sempre dispostos na mesma ordem, o churrasquinho de gato, a pipoqueira, o artesão de brincos feitos a mão, o vendedor de balas e o de produtos chineses formam uma verdadeira feira-caracol protegida do sol do meio dia. Inspirado pelos engenhosos dispositivos construídos pelos vendedores para expor seus produtos, criamos um outro aparato sobre rodas que passaria despercebido por esse ambiente, exceto por uma única desconformidade: diferente daquelas dos vendedores na rampa espiral, essa estrutura não é usada para vender objetos, mas para coletar e os colecionar. O gabinete de curiosidades do Calafate é um arquivo local móvel que passeia pelo bairro coletando, armazenando, expondo e criando discussões acerca de uma série de recordações cedidas pelos moradores do bairro. A cada oportunidade, o gabinete amplia sua coleção pública com objetos, artefatos, pequenas histórias, saberes e produtos locais. Cada um doa aquilo que acha pertinente ser mostrado. Difundidos pela Europa principalmente nos séculos XVI e XVII, os gabinetes de curiosidades eram salões particulares construídos para abrigar extensas coleções de objetos raros e estranhos, geralmente coletados em expedições a lugares exóticos. No lugar de relíquias estranhas vindas de um contexto exógeno, o gabinete de curiosidades do Calafate se propõe a reunir pequenas afetividades e curiosidades que fazem (ou fizeram) parte da rotina de quem vive o bairro de dentro e de perto. Em um bairro em constante mudança e substitui266


D

percebida

I

imaginários, identidade

P

física

E

contínuo

ção da população, onde as boas histórias se vão com os mais velhos, nos parece importante coletar o que é relevante do ponto de vista dos próprios moradores e difundir esses elementos como uma coleção pública acessível a todos do Calafate. Não pretendemos, entretanto, que o gabinete seja restrito apenas a fatos de outrora e alimentado de nostalgia. Ao coletar também fotografias atuais, causos da semana anterior, objetos produzidos recentemente e receitas que são reproduzidas no próprio gabinete, buscamos criar um espaço de discussão onde a mistura entre atualidades e memórias de um passado pouco conhecido possa estimular visões propositivas para o futuro do bairro. Além de acessível, o gabinete também se propõe a ser transformável por todos. Sua adaptabilidade não é somente perceptível pela maneira como sua coleção é (re)organizada ao longo do tempo, mas também por suas respostas aos espaços que habita. Por meio de próteses e acoplamentos, o equipamento parasita as ruas do bairro e experimenta possibilidades temporárias de reconfiguração do espaço e das relações que ali são abrigadas. Seja pelo toldo que se projeta e sombreia uma fração da escaldante Rua Platina ou pelas gambiarras e mesas que dele deslizam, permitindo que a praça seja também sala de jantar compartilhada, entre outras muitas possibilidades. E aos poucos o gabinete vai sendo transformado, tomando para si a materialidade das ruas por onde passa, em um processo contínuo de construção da história local. Ao desenvolver uma rede informal em seu entorno, ele viabiliza experiências urbanas ligadas não somente à coleta de memórias, mas também à produção de experimentos e narrativas. 267


Estrutura inicial do Gabinete de Curiosidades

268


imulação de ocupação do Gabinete Na página seguinte: Amostra da coleção do Gabinete 269


270


271


GABINETE DE CURIOSIDADES 1 Com a ajuda de um serralheiro, produza uma estrutura simples sobre rodas de 60x60x180cm que permita acoplamentos e modificações posteriores. Perfis metálicos e rodas de bicicletas são os mais indicados, pela sua leveza e fácil deslocamento.

272

Dica: Caso deseje uma alternativa ao serralheiro, existem estruturas prontas para serem utilizadas. Carrinhos de picolé e de pipoqueiros ou bicicletas com carroceria, por exemplo, também podem ser usados.


2

Comece a coletar em sua rede de moradores mais conhecidos pequenos objetos, histórias, fotografias, receitas e recordações que tenham um caráter afetivo para essas pessoas a fim de iniciar a coleção do gabinete de curiosidades. Caso o elemento não possa ser doado, não se preocupe. Cópias também são bem vindas.

3

Não se esqueça de registrar em um mapa os locais onde os elementos foram coletados.

273


4

Separe os elementos da coleção por categorias. As histórias podem ser escritas em pequenas fichas; as fotografias, protegidas em sacos plásticos; e as receitas podem compor um livro ou caderno.

5

Tendo em mãos este pequeno arquivo inicial, comece a pensar em modos de armazená-lo no gabinete. Utilize caixas de madeira, cordas e pregadores, bolsos de pano e placas de madeira. As possibilidades são inúmeras!

274


6

Saia pelo bairro com o gabinete a fim de mostrar a coleção às pessoas e ampliar o acervo. Parasite eventos ou locais com maior concentração de pessoas, tente gerar discussões a partir do que foi coletado e produza pequenas situações no próprio gabinete, como pequenos lanches inspirados pelas receitas coletadas.

7

Caso surjam oportunidades, ocupe temporariamente alguns locais do bairro com o gabinete, criando pequenos museus efêmeros. Os locais podem variar, desde um lote vago até uma vaga de garagem ou uma sala subutilizada da igreja local.

275


Casa do calafate

Desde o início de nossa inserção no Calafate, uma preocupação constante com a articulação dos diversos projetos, sua visibilidade, e a manutenção de pontos de contato com os moradores tem alimentado o nosso desejo de conquistar um espaço físico no bairro. Este lugar em constante transformação poderia abrigar nossas diferentes ações, além de propostas dos próprios moradores e projetos em articulação entre os diversos atores do Calafate. Para refletir o caráter familiar e cambiante que vislumbramos para este espaço, decidimos batizá-lo Casa do Calafate. Assim, a ideia é construir um espaço comum com características domésticas, de gestão compartilhada e acesso livre, desestabilizando e questionando as fronteiras entre o público e o privado. A Casa do Calafate será um ponto aglutinador de diversos projetos e atividades que, quando organizados a partir de um mesmo ambiente, se reforçam e se alimentam. Neste contexto, acreditamos que nossos trabalhos no bairro poderão se consolidar e evoluir com mais facilidade. Compartilhando uma infra-estrutura única, antingiremos maior eficiência, aproveitamento dos recursos disponíveis, e articulação com os moradores. O convívio na Casa do Calafate tornará nossos projetos mais contundentes e próximos à comunidade, sendo que um dos maiores desafios que enfrentamos continua sendo envolver os moradores no processo de elaboração e condução das ideias. A Casa permitirá que todos os nossos procedimentos se tornem mais colaborativos, na medida em que o espaço for acessado e apropriado pelos vizinhos. Ao mesmo tempo, para torná-la um espaço convidativo, a Casa do Calafate não deverá ser pensada apenas para os usos produtivos e utilitários. A proposta é romper com a dicotomia 276


D

percebida

I

encontro, imaginários

P

física

E

contínuo

clássica entre o ócio e o trabalho, de maneira a dissolver estas atividades no tempo e no espaço. Os acontecimentos na Casa deverão ocupar o interstício entre esses dois pólos, permitindo estimular o engajamento dos moradores de maneira natural. É nesse sentido que, na contramão da concepção modernista de programa, acreditamos ser mais importante conceber uma programação para a Casa do Calafate. Em outras palavras, nosso papel como arquitetos não será apenas construir um ambiente que acomode uma série de funções específicas, mas imprimí-lo de flexibilidade e abertura para usos e atividades diversos e promover a sua ocupação. Mais do que projetar, queremos preencher o espaço. A busca por um local que acomode este projeto continua. Convencidos de que a cidade de Belo Horizonte não precisa de novas edificações e que é possível e necessário ocupar espaços vazios e subutilizados, partimos à procura de um imóvel ocioso no bairro. Encontramos alguns imóveis que se adequavam a nossas demandas, mas nos deparamos com diversos obstáculos, dentre os quais a resistência dos proprietários em viabilizar ocupações que não envolvam compra ou aluguel — embora a edificação permaneça desocupada. Em seguida, passamos a investigar a possibilidade de nos instalarmos em um lote vago, mas encontramos dificuldades semelhantes. Finalmente, foi levantada a possibilidade de ocupar uma vaga de estacionamento na via pública, mas a solução nos pareceu inadequada, pelas limitações com relação às pequenas dimensões do espaço. Continuaremos a buscar um local que possa acolher a Casa do Calafate. À medida em que nossa inserção no bairro ganha mais destaque, tornam-se possíveis novas parcerias e fontes de apoio, o que, esperamos, poderá viabilizar a construção coletiva deste espaço. 277


Este diagrama compila as sugestões de programação mais reccorentes para a Casa Calafate, a partir das colagens produzidas por moradores e alunos do Bernardo Monteiro no Dia do Suco.

2

1

wifi livre

biblioteca pública 3

bazar e feira de troca

4

sala de estar pública

7

5 bailinhos

6

horta comum

8

treino e apresentações de danças urbanas

refeições coletivas 10

9

cinema/ programação noturna

11 espaço de trabalho compartilhado 278

piscina pública


1

2 3

4

5 6 7

8

9

10

11

279


Interpretações (quarta, 26 de novembro de 2014)

Vítor: Esse trabalho nasce de uma frustração em relação à Escola de Arquitetura, que falhou em operar como um lugar/laboratório de experimentação que promova uma tipologia de trabalho coletiva que não está nem dentro dos grupos de pesquisa acadêmicos, nem formatado para atender a lógica do mercado. Se analisarmos o nosso percurso na universidade, conseguimos observar três vias de atuação. A primeira delas é a arquitetura de excessão, representada pelas pessoas que saem da escola para trabalhar em escritórios de ponta elaborando os projetos de destaque que povoam as revistas de arquitetura e preservam o glamour da profissão do arquiteto tradicional. Mas sabemos que as oportunidades para esse tipo de atuação são poucas. Uma boa fração dos graduados, por outro lado, vai trabalhar com uma vertente da arquitetura que responde às obscenas demandas mercadológicas, muito vinculadas ao lucro máximo dos empreendimentos da construção civil, resultando em arquiteturas previsíveis. Já a terceira via é a de retorno à academia, que costuma ser a opção daqueles que têm uma visão crítica mais afiada sobre os processos econômicos e políticos que envolvem a produção da arquitetura e da cidade. São pessoas que se negam às duas primeiras opções e que, de dentro da universidade, produzem pesquisas que apontam para outras possibilidades. O esforço do nosso trabalho é ensaiar uma outra via. Pensar a possibilidade de, uma vez formados, habitar a fronteira pesquisa-projeto fora da universidade. Marcela: Isso tem a ver com a manifestação da experimentação na “vida real”, o que costumava ficar fechado nas paredes de laboratório. As pessoas têm medo de errar, e acabam se submetendo a fórmulas confortáveis de projeto e planejamento, o que enfraquece os 280


procedimentos mais táticos. Felipe: É um caminho híbrido, que quer mesmo habitar essa fronteira pesquisa-projeto, no sentido de adotar tanto métodos que vem de dentro da universidade quanto de fora dela. E esses erros e acertos acabam também por produzir conhecimento, na prática e no dia-a-dia, junto com as pessoas. Mateus: Eu acho que essa questão de se estar junto com as pessoas talvez seja o maior desafio. Marcela: E na escola não somos treinados para lidar com as pessoas. São sempre clientes imaginários e os trabalhos de campo estão longe de nos fazer experimentar essa aproximação. Felipe: Para mim, o grande desafio é transformar essa prática num modo de ganhar dinheiro, como arquiteto-pesquisador, mas fora da universidade. Será que é possível? Vejo que quem tem subsídio da universidade para atuar na cidade não espera nada das pessoas que são afetadas pelo trabalho, porque o trabalho já está pago. Por outro lado, se estamos no campo atuando como pesquisador e arquiteto, temos que esperar um retorno dessa relação, o trabalho tem que gerar uma economia em seu entorno. Vítor: Não só como remuneração do trabalho, mas também para viabilizar a execução dos projetos. Mateus: Outra questão importante é pensar para quem estamos fazendo esse trabalho. Se pensarmos nossa inserção no bairro, a ideia nunca foi encontrar demandas e solucionar problemas. Quisemos propor projetos que tem a ver com coisas que nós gostamos de fazer. A questão do simples prazer de fazer é importante. Marcela: Na conversa passada falamos mesmo sobre isso. Procuramos um meio termo entre as demandas e desejos que surgem das pessoas do bairro e as coisas que nós gostamos de fazer. Nossa prática se propõe a ser uma interseção entre essas duas dimensões. E por mais que essas ações sejam pontuais e muitas vezes efêmeras, dentro da nossa capacidade de atuação, elas vislumbram transformações sistêmicas a longo prazo. Mateus: E foi muito interessante fazer isso como trabalho de graduação. Poderíamos ter feito um projeto controlado de arquitetura. Por mais que fosse um bom projeto, ele provavelmente seria engavetado e não traria desdobramentos reais. Essa inserção real no lugar é motivadora, não é só pelo prazer, mas pela noção de que o esforço vai realmente trazer uma diferença prática para a cidade. Vítor: Eu acho que talvez uma das maiores motivações seja o fato de não haver o compromisso com a escolha certa ou em acertar a mão em uma determinada ação. Estamos lá para experimentar. Então é ir, fazer, testar, voltar, analisar e responder a essa revisão com outra proposta que dê continuidade ao trabalho. Esse processo de ir e vir, na escala um para um, com o pé no chão e a céu aberto, cria também expectativas nas pessoas que vivem aquele espaço cotidiano, o que nos motiva ainda mais a continuar esse processo. E isso criou um estado de operação que atravessou todo o trabalho. Por mais que estivesse fazendo mau tempo, chuva e frio, nós estávamos sempre dispostos a pegar o ônibus e ir para o Calafate. Criamos 281


uma relação de responsabilidade com o trabalho e com as pessoas que nos anima muito. Belisa: Outra coisa que me motiva é ver a respostas das pessoas às nossas ações, porque é sempre imprevisível. Às vezes, você está esperando um ótimo resultado, mas tudo dá errado, assim como um projeto super simples pode resultar em uma resposta imensa. Eu acho que essa resposta imediata e imprevisível também dá energia para continuar a pensar e fazer projetos. Vítor: Outra questão particular deste trabalho é a noção do cliente dissolvido. Não lidamos com um cliente individual que vai assinar um contrato e pagar a conta. O cliente é uma coletividade, que geralmente espera que o poder público faça este trabalho por eles. Na percepção dos moradores, nossa atuação é nebulosa: é filantropia? Trabalho voluntário? Somos uma ONG? Somos mais um grupo de universitários? Mateus: E falando na eficiência (ou não) da nossa comunicação com as pessoas, vejo que até hoje é um desfio conseguir agregar todas essas pessoas em um mesmo espaço. Vítor: Mas acho que aí mora um fetiche da mobilização, que envolve esse imaginário do grande dia em que todos do bairro estarão compartilhando o mesmo espaço, ao mesmo tempo, em harmonia. Mateus: É uma via de mão dupla que temos que trabalhar. É importante que acessemos os moradores, mas é também importante que eles nos reconheçam como grupo em atuação. A presença gráfica no bairro se torna um questão muito importante, e, nesse sentido, é perceptível que os trabalhos têm finalmente sido reconhecidos como parte de um conjunto. É uma estética comum. Marcela: É interessante as pessoas terem reconhecido uma linguagem que percorre trabalhos diferentes, como o jornal e o balanço. Vítor: A estética comum está presente não só na aparência desses projetos, mas no modo como eles são executados e na experiência do espaço que eles provocam. Existe também uma estética da tática do trabalho, que é a maneira como os projetos vão pipocando e formando uma rede silenciosa, mas potente, para além do visual. O jeito que esse projetos aparecem no bairro é muito particular, afinal, as pessoas dali estão acostumadas com processos super impositivos de implementação de projetos urbanos, geralmente pela prefeitura, que não pressupõem essa delicadeza da aproximação. Mateus: E isso tem a ver com nossa preocupação em nos aproximarmos de diferentes grupos sociais no bairro, e ter uma abordagem plural e respeitosa. E a logo reflete isso um pouco: o bairro tem vários pólos, talvez independentes, e o que a gente faz, com os projetos e com a logo, é tentar criar ligações entre eles. Vítor: E essa discrição pode parecer, às vezes, estratégica e perversa, no sentido de se infiltrar por baixo em busca de relações de poder. Esse ritmo de aproximação, ao meu ver, tem muito mais a ver com o fato de não termos um projeto pronto para o bairro, de se tratar de um processo cujos próximos passos vão se revelando a partir dos experimentos, no tempo das pessoas e dos imprevistos. Mateus: Falando ainda em projetos de comunicação, seria interessante falar sobre o jornal 282


FalaCalafate. Além de recuperar a memória e pesquisar as peculiaridades do bairro, o jornal tem um pouco o papel de aumentar nossa comunicação no bairro. Ele é importante para nós, como grupo. A maioria das pessoas que recebeu o jornal não sabiam que existe um grupo de estudantes de arquitetura atuando no bairro. Felipe: E provavelmente muitas delas vão continuar sem saber, elas não se interessam por quem fez o jornal, e sim pelas questões que o jornal põe em relevo e pelas pessoas cujas histórias estão sendo contadas. E talvez essa “infiltração” seja a grande sacada para esse trabalho no Calafate. E o jornal foi bem sucedido nesse aspecto. Sua distribuição foi sutil e tímida, sem nenhum ação grandiosa que indicasse seu lançamento. De um dia para o outro, aparece um pequeno display no ponto de ônibus, e depois, o jornal começa a aparecer em alguns comércios e nas caixas de correio. Vítor: Esse modelo é também uma resposta a nossa capacidade de execução. Não temos nenhuma infra-estrutura de distribuição para esse ou para qualquer outro projeto, fazendo com que todos eles tenham um quê de homeopatia. Mateus: Retomando a conversa sobre a resposta das pessoas aos projetos, eu senti uma resposta muito positiva das pessoas em relação ao jornal. Uma grande gratidão, inclusive. Todas as pessoas para quem eu entreguei diretamente ficaram felizes. Felipe: É muito legal a experiência de distribuir o jornal. Eu saí com o carrinho na rua e aconteceram duas situações interessantes. Na primeira delas, em um bar, entreguei um exemplar para uma pessoa que já foi logo avisando que já tinha recebido em casa e que tinha gostado muito. E, um pouco mais tarde, enquanto eu passava pela rua sem saída perto do metrô com um carrinho de feira cheio de jornais, uma outra pessoa, do outro lado da rua, me gritou perguntando se eu estava distribuindo o “FalaCalafate”. E quando eu falei que sim, continuou, animado, querendo saber se já era a segunda edição. Fiquei sabendo também que as cópias deixadas na igreja já estão quase chegando ao fim. É muito legal ver essa receptividade. Marcela: Ao mesmo tempo que ele tenha uma estética particular, que as pessoas reconhecem como um projeto diferente e novo no bairro, este talvez seja o trabalho de maior aderência. Vítor: Por mais que ele seja uma ideia nossa, ele ainda é um jornal de bairro, que é super banal. E seu conteúdo foi integralmente formado por histórias que emergiram do território. Recupera-se, assim, um senso de vizinhança, o que leva as pessoas a começaram a se reenvolver pelos lugares e pessoas por onde passam todos os dias despercebidamente. Cria-se, também, uma cultura de visibilidade das histórias e memórias pessoais, o que leva mais pessoas a quererem ser contempladas pelas pesquisas do jornal, como vimos acontecer. Belisa: É um projeto pelo qual as pessoas se identificam, elas se vêem representadas ali. E além do modo sutil do jornal ser entregue e chegar até as pessoas, ele também tem uma sutileza no conteúdo que é importante. Mateus: Essa prática tem a ver com o Perceber o Invisível. Somos nós, observadores externos do bairro, que estamos colocando em relevo as potencialidades silenciadas do bairro, celebrando o espaço e as pessoas que ali vivem através de um jornal. 283


Vítor: Tem um procedimento interessante de deslocamento do cotidiano que o jornal exerce também. E este deslocamento para um lugar de análise, entendimento e celebração acaba reconfigurando essas relações de identidade. As pessoas passam a perceber essas coisas de um jeito diferente. Mas além dos alcances, existe um desafio ainda latente que é o desafio propositivo do jornal. Ele deu muito certo nesse momento de levantar as memórias, colocar as pessoas para celebrarem umas às outras e o território também. Mas sinto que ele ainda não virou o lugar efetivo de debate público sobre questões polêmicas ou sobre transformações que estão por vir ou que poderiam vir, gerando uma discussão entre as pessoas sobre o espaço. Marcela: Essa resposta pode ser medida pelo e-mail e pelo engajamento das pessoas no caça ao tesouro, mas concordo que ainda temos que formular mais diretamente essas oportunidades de diálogo, para que o jornal seja não só um informativo, mas também um lugar de debate. Belisa: Esses conflitos e debates que podem surgir do jornal vão levar tempo para emergir, esse efeito fica mais evidente com o tempo e as pessoas devem começar a nos procurar. Tem também a questão sobre os anúncios, que ainda está mal resolvida. Vamos continuar vendendo anúncios de porta em porta? E se os anúncios não derem retorno imediato aos comerciantes? É possível que tenhamos dificuldade em conseguir anúncios para o próximo número. Marcela: Mas eu sinto que os anunciantes se engajaram mais como apoio ao projeto do que como espera de aumento efetivo de vendas. Mateus: Mas não podemos descartar, de cara, essa ideia para a próxima edição. Belisa: Temos que pensar também em outros modos de viabilizar o jornal, sem vender anúncio. Felipe: Queria retomar a discussão sobre a criação de momentos de debate, que é um desafio que perpassa vários projetos, e em alguns acaba sendo uma questão mais bem resolvida do que em outros. Na web, por exemplo, é interessante pensar na adesão enorme das pessoas à página do Facebook. E a porcentagem de moradores do bairro é altíssima. Uns convidam os outros, e a rede cresce sem parar. E é importante continuar pedindo as pessoas para enviarem fotos pela página, responderem enquetes, e talvez esse momento de encontro vai acontecendo na internet. O debate pode ser iniciado pelo jornal e continuado na plataforma web. Mas, apesar dessa possibilidade, a dificuldade em se criar situações de engajamento presencial das pessoas se revela ainda mais na internet. A participação online dá a impressão de dever cumprido. Quando convidamos as pessoas, pela web, para encontros presenciais as confirmações de participação são sempre muito maiores que o público que conseguimos articular de fato. Mateus: Achei interessante também as pessoas começarem a postar fotografias e relatos sem a gente pedir. Houve um envolvimento voluntário, mais despretensioso, que indica um potencial de apropriação da plataforma. 284


Vítor: Nesse sentido, acho importante que a página não esteja vinculada ao Micrópolis. Ali, a página não se anuncia como um trabalho nosso no bairro, ela é entendida simplesmente como uma página sobre aquele lugar, que representa um território, independente de quem a criou. Isso é interessante porque na internet, apesar dessa noção de hiper-conectividade, sabemos que ali estamos em contato com quem queremos estar, uma vez que as conexões se dão por interesses afins, a partir das páginas que você curte, dos vídeos que você assiste e etc. É um espaço muito mais seletivo que uma praça. Temos um potencial grande de conexão com a diferença, mas acabamos nos conectando aos nossos pares. Entretanto, uma página sobre um bairro não se trata exatamente de uma página temática, é uma página sobre um território, o que faz com que ela consiga abarcar uma diversidade maior de seguidores, que se vêem ali representados em momentos diversos. Belisa: Temos que estudar meios de envolver moradores mais ativamente na construção dessa página, para que o trabalho faça ainda mais sentido. Vítor: Esses planos se aplicam também ao jornal. Quando eu o li pela primeira vez, a primeira coisa que eu li foi “esse jornal é editado por Micrópolis”. Eu acho que os próximo deveriam suprimir essa informação, caminhando em direção à postura da página no Facebook. Não é uma questão de ser omisso, mas sim de tentar dissolver um pouco essa noção de autoria e ser mais convidativo à colaboração. As pessoas tem que saber, de cara, que se trata de plataforma aberta à interferência. Macela: Eu acho que deveríamos aproveitar a potência da web e trabalhar esse projeto mais conjuntamente com o painel dos Assuntos públicos, instalado na praça, no sentido de sincronizar mais as informações divulgadas nas duas plataformas. Felipe: O painel da praça se tornou obsoleto por vários fatores: um deles é que as pessoas estão roubando os adesivos da caixinha, o que faz com que ninguém mais possa usá-lo. E, mesmo se os adesivos estivessem lá, existiram momentos em que as pessoas simplesmente não interviram sobre ele. Temos que ser mais críticos em relação a esse quadro. Mateus: Temos que pensar no que isso vai virar depois. Vai virar um projeto pra praça? Essas plataformas vão evoluir e gerar novas plataformas? Temos sempre que pensar nos desdobramentos dessas ações. Vitor: Temos que ter um planejamento: nosso primeiros mapeamentos indicaram possibilidades para esse tipo de ação. Não se tratou de mapear somente pelo fato de mapear e descobrir o que acontece ali. Os mapeamentos não podem parar por aí, têm de ser propositivos. Mateus: Eu vejo os mapeamentos como uma forma de sintetizar as informações tanto para nós mesmos quanto para as pessoas do bairro. Eles evidenciam um tipo de informação a qual elas não têm acesso no dia a dia, pois só convivem com o mesmo grupo de pessoas que estão mais próximas a elas. Acho que esse é o grande objetivo, criar um debate. Marcela: O muro em que a plataforma está fixada é um bom ponto para se evidenciar esse debate. 285


Belisa: Nós ouvimos isso desde as primeiras conversas que tivemos com os moradores. Existem conflitos em volta desse muro entre os estudantes da escola pública e os moradores vizinhos da praça. Vitor: Tem morador que chega a admitir que não quer a escola pública ali. Felipe: Acho que a pintura do muro na situação em que a praça se encontra agora é bastante interessante, pois é um momento de inflexão da praça: nós instalamos o balanço, pintamos a amarelinha, de repente, a prefeitura destruiu parte do jardim para implementar a academia da cidade e, no dia seguinte, os moradores de rua foram retirados do coreto. Nesse contexto, acho que a pintura do muro pode ter uma potência muito grande, pois pode fazer emergir mais conflitos que desconhecemos ou mais simpatia pela ação. Vitor: Acho que o muro tem uma questão simbólica a ser discutida, que ao meu ver poderia ser encontrado em muitos outros cantos do Brasil: a relação com a escola pública, com o espaço público e a questão da propriedade. O muro é um forte elemento de separação. Ele reflete uma estratégia de separação e confinamento, dentro de seus limites, da escola pública e de uma classe social distinta que a frequenta. Mateus: A praça tem uma segregação espacial que pode ser percebida além do muro. O lado direito da praça, que foi ocupado pelos moradores de rua e pelos alunos da escola, é muito diferente do lado esquerdo, onde estão localizados o bar e a banca de revistas, que recebem os moradores do próprio bairro. Marcela: Essa segregação pode ser evidenciada no discurso dos frequentadores da praça, mas o muro é um elemento que materializa tudo isso. Mateus: O processo de produção dos desenhos para fazer o stencil no muro gerou uma boa discussão em relação a isso. Eles refletem o que os alunos pensam sobre a relação da escola com a praça. Ao estampar isso no muro, o olhar deles se torna visível. Vitor: É legal pensar a oficina de stencil não só como uma pintura bonita, mas como um processo que repensa essa fronteira. Pensar maneiras de perfurar esse muro simbolicamente, não só com esses grafismos mas com intervenções futuras também. Isso pode incomodar muita gente na medida em que grava na parede do bairro o olhar dos alunos “de fora” sobre essa situação. Mas o bairro não está numa redoma inerte, ele está misturado na cidade e esses conflitos refletem isso e não podem ser ignorados. Felipe: Esse assunto me faz pensar no balanço, que parecia uma coisa muito simples e até mesmo ingênua, mas teve desdobramentos para além da nossa imaginação. Marcela: Sim! Primeiramente, ouvimos histórias de que haviam filas para poder usar o balanço e logo depois ouvimos casos de pessoas que estavam ultrapassando os limites ao usá-lo. É engraçado como esse simples elemento pôs em evidência o conflito que sempre ouvimos falar entre os alunos da escola e os moradores. Belisa: Era um conflito até então velado e que entrou em cena com o balanço. Vitor: O balanço possibilitou que outros grupos passassem a permanecer ali na praça. Até então, os alunos não tinham tanto motivo para ficar ali tanto tempo depois da aula. 286


Eles ocupam uma porção maior da praça e, ao mesmo, rompem simbolicamente o muro disciplinar. Mateus: A instalação do balanço também afeta a divisão da praça em lado esquerdo e direito. Tanto que as pessoas mais incomodadas com o balanço são os que ficam sempre mais ao lado direito da praça, próximo à árvore onde o balanço foi instalado. Marcela: Esse conflito serviu também para mapearmos a presença de diferentes atores no território da praça. Felipe: Mas a essência do espaço púbico é justamente essa — a emergência dos conflitos. O balanço foi um elemento revelador. Essa praça é uma amostra do espaço público brasileiro. Temos o grupo de pessoas que afirma que a praça está morta e que precisa de uma reforma, porque não tem ninguém usando. Como se reformas físicas, como pintar o banco, fossem a solução, ao invés da promoção de usos para aquele espaço. Quando esses usos se concretizam, as pessoas querem logo que eles deixem de existir. Vitor: Temos aí outra situação tão recorrente no país: se uma ação tem resultados polêmicos, a resposta imediata é a proibição. Belisa: Existe um código de posturas que deve ser seguido no espaço público. O que você pode fazer naquela praça? Você pode se sentar, passear, admirar. Se você interfere fisicamente ou de uma maneira que não está prescrita nesse código, as pessoas acham absurdo. Vitor: Esse é um retrato de como os projetos das praças são pensados: os usos são todos programados, os mobiliários super duros e pesados. O balanço tem uma virtualidade maior, que te permite uma maior liberdade de movimento, que abrem espaço para a subversão e desobediência. Marcela: Balanço são cada vez mais raros de serem vistos em praças atualmente. Acho que isso está relacionado a esse uso programado e a uma superproteção em relação ao espaço público que acaba causando seu esvaziamento. Mateus: Uma outro aspecto ainda sobre a praça que merece ser abordado é o engajamento dos moradores na construção dos elementos que estamos implantando nela. Belisa: Nós chegamos a convidar as pessoas para construir junto, mas não houve adesão. Mas a intenção era que, mesmo não havendo ajuda dos moradores, essas coisas fossem construídas lá. Felipe: Por mais que a gente chame as pessoas nas próximas ações, não acho que vai haver uma grande adesão na construção em si. Acho que o parquinho não envolve as pessoas na construção física, mas ele cumpre seu papel na construção do espaço pelas pessoas posterior à instalação de seus equipamentos. Vitor: Acho que temos que olhar também pelo lado das pessoas que se sentem incomodadas com o balanço. Eu mesmo fiquei incomodado em ver quatro pessoas em cima do balanço, quase dando uma volta de 360º em volta do galho. Acho que é o caso de conversar, numa boa, com os meninos que estão usando o balanço dessa forma. Dizer que se continuar assim, alguns moradores vão tirar o balanço com as próprias mãos. 287


Marcela: Acho curioso o fato de ninguém ter tomado a iniciativa de tirar esse balanço dali ainda - seja pra pegar pra pôr em casa, seja porque ele está incomodando. Mateus: Verdade, ele apareceu de repente e poderia desaparecer de repente. Temos que pensar se nossas ações vão continuar simplesmente aparecendo na praça de uma hora pra outra, sem as pessoas fazerem parte da construção. Marcela: Acho que nossas ações, por mais que não tenham tido adesão no dia da construção, nos revelaram vários possíveis parceiros para projetos futuros. Essa rede vai se formando aos poucos. Vitor: Acho que a gente tem um certo fetiche da participação criado pela Escola de Arquitetura. Existem outras formas de participar, que fogem um pouco da imagem que esperamos, mas que acontecem em vários momentos do trabalho. Mateus: Acho que esse fetiche da participação pode ser aplicado também ao cinema. Ficamos imaginando uma participação massiva e muita discussão quando ele fosse exibido. De qualquer forma, na Calafesta, onde ele foi exibido, havia algumas pessoas do bairro e o debate gerado foi instigante. Vitor: O vídeo faz acontecer conversas que não se dariam normalmente e que, mediadas por nós, criam possibilidades de imaginação sobre o bairro para quem está assistindo. Por mais que as pessoas que protagonizam o vídeo não estejam reunidas em assembléias quando seus depoimentos são filmados ou quando o vídeo é exibido, o vídeo costura diferentes pontos de vista, diferentes percepções do espaço público. Marcela: É interessante o vídeo dar voz a grupos que provavelmente não seriam ouvidos em situações cotidianas. Mateus: Ele possibilita também registrar coisas que estão acabando no bairro. Como os moradores de rua que já não estão mais lá. Felipe: O vídeo tem uma semelhança com o jornal no sentido de as pessoas se reconhecerem e se sentirem parte daquilo. Para o bem e para o mal. No dia da Calafesta, houve uma moradora que se sentiu muito incomodada ao ver o depoimento dos alunos da escola, relacionando-os, por conta própria, com o tráfico de drogas na praça. Tenho minhas dúvidas se ela realmente o conhece e pode afirmar isso desse jeito. Acredito que a fala das pessoas no vídeo tenha uma potência maior do que as reclamações por escrito, o que é revelado por episódios como esse. Mateus: É preciso que se tenha em mente que um vídeo é resultado de uma edição e, querendo ou não, é o editor quem dita o tom dele. Tem uma intenção ali, desde a escolha do tema até os depoimentos escolhidos e editados. Vitor: Temos que pensar também que nós não sabemos ainda como acessar as pessoas pelo vídeo. Diferente do jornal, que tem uma tiragem expressiva de 3000 exemplares que são entregues nas caixas de correio e dispostos nos comércios do bairro, o vídeo ainda não reuniu um grupo expressivo de moradores. Marcela: Temos que traçar estratégias para que isso aconteça, seja na praça, seja ativando 288


os espaços dos antigos cinemas do bairro, seja pelo YouTube. Vitor: Acho que esses vídeos podem ter um papel interessante na discussão sobre arquitetura no bairro. É instigante pensar que temos que reunir as pessoas no mesmo espaço para a exibição dos filmes. Isso pode ativar a memória afetiva dos antigos espaços de cinema do bairro, que já foram super populares. Temos que considerar isso como um projeto para ser concretizado, pensar na arquitetura da exibição. Felipe: Podemos pensar também esse projeto de modo a envolver mais as pessoas na produção do vídeo, em que elas possam se filmar ou realizar as entrevistas. Vejo os alunos da escola como possíveis parceiros nesse projeto. Vitor: Vejo essa relação entre urbanismo, espaço público e pedagogia atravessar vários momentos do trabalho. É um campo de atuação que a gente vem experimentando sem perceber. E é promissor pois as pessoas passam toda a sua vida escolar sem pensar o espaço público, são temas muito distantes da educação básica no Brasil. Marcela: Somos familiarizados com isso devido ao nosso meio, por estudarmos Arquitetura e Urbanismo. Ainda assim, por mais que tenhamos estudado sobre o espaço público na escola, quando vamos a campo as coisas se dão de uma maneira bem diferente. É na prática que você descobre como se relacionar com uma diversidade incrível de grupos que tem um papel político importante naquele lugar. Vitor: Pensando na viabilidade de continuarmos essa prática no espaço público depois de formados, acho o Baile da Banda promissor. E também uma oportunidade rica para experimentar essa noção do cliente coletivo. A estratégia do financiamento coletivo analógico é um jeito super esperto de conseguir trabalhar com essas demandas e ser remunerado pelo trabalho sem onerar um cliente individual ou um grupo muito específico. É um experimento muito valioso no sentido de pensar esse modo de fazer, dissolvendo os custos em nome de um projeto cujo resultado pode ser compartilhado por muitas pessoas. Marcela: Mesmo que não se coloque em prática esse financiamento coletivo, um saldo positivo que esse projeto teve foram as articulações que dele surgiram. Descobrimos toda uma vizinhança de serviços que poderia estar super conectada e articulada para resolver o problema da saída de emergência, mas um não sabia da existência do outro: O maestro da Banda, o serralheiro e o escritório de projetos contra incêndio estão todos na mesma rua. Foi um processo de fazer essa ponte. Vitor: Isso tem a ver com comunicação, que é outro ponto que atravessa nosso trabalho. Uma coisa urgente é pensar uma sinalização para o pedestre e para os serviços no bairro. Tudo é desenhado para os carros. Seria legal experimentar alguma coisa nesse sentido, disponibilizar certas informações e dar visibilidade a outras para as pessoas que passeiam pelo bairro. Belisa: Acho que essa divulgação dos serviços pode estar veiculada mais pelo jornal do que por essa sinalização. Mateus: Voltando à Banda, acho que ela não é muito conhecida pelos moradores mais novos do bairro. Um dia interessante foi quando levei alguns alunos da escola para conhecer a sede da Banda durante a oficina de stencil. Foi incrível começar a criar essa conexão. Talvez 289


esse seja um papel desempenhado por nós, conectar esses diferentes atores: a banda, a escola etc. A Banda, por exemplo, não tem uma ligação muito forte com o bairro. Muitos dos músicos não moram ali. Belisa: Olhando por outro lado, acho que os moradores antigos têm um certo orgulho da Banda pelo fato de a banda mais antiga da cidade estar ali. Eles têm essa memória de quando a banda tocava na praça. Felipe: Falando em memória, queria aproveitar para mencionar o Gabinete de Curiosidades e a Casa do Calafate juntos. Como o gabinete ainda não foi colocado em prática, gostaria de voltar no que a gente vem discutindo em relação a ele e à casa. A Casa se mostrou um projeto difícil de ser viabilizado. As articulações com os lotes, por mais que não tenham dado errado, não foram concluídas, não houve tempo de amadurecerem e termos respostas concretas. A Casa exige uma articulação muito forte com as pessoas antes da construção, e o gabinete pode ensaiar essa articulação de uma maneira mais rápida. Começamos a pensar nele a partir de coisas que foram sendo postadas no Facebook de maneira espontânea pelas pessoas. Constatamos que o Calafate tem uma população que está mudando, sendo substituída e, com isso, as histórias vão se perdendo. Muitas vezes o pessoal mais novo não tem contato com essas histórias. Seria legal juntar tudo, mas pensando também na ocupação do espaço em que essa prática pode se desdobrar. Fico imaginando o gabinete ocupando uma garagem de uma casa, ou uma sala da igreja, e também ir para o espaço público, já que é móvel. Poderíamos fazer um almoço em volta dele, com uma receita dada por alguma senhora do bairro, criando uma discussão sobre os objetos. Mateus: Apesar da estética dele ser meio banal, inspirada nos vendedores ambulantes, ele vai ser também um objeto estranho no bairro, curioso, que vai chamar a atenção. A partir de agora, ele deve estar presente em todas as ações que fizermos no bairro. É muito interessante pensar nele como processo que vai crescendo e sendo alimentado. É uma forma de compartilhar com as pessoas as informações que estamos agregando. Marcela: O Gabinete poderia explodir seus usos e parasitar esses lugares das ações, para ter uma presença espacial mais significativa. Ele poderia funcionar como mais um espaço aberto através do qual as pessoas interagem entre si e conosco. Vítor: Ele também tem o papel de povoar a imaginação dos moradores com possibilidades de transformação do espaço menos vinculados ao trator que chega da prefeitura para reformar. Ele pode, por exemplo, ter um pano que, conectado à árvore mais próxima, cria uma cobertura que, por sua vez, gera uma especialidade para um encontro. Um pouco como o balanço, ele tem esse papel de ser uma arquitetura pequena que pode indicar possibilidades grandes. Belisa: Fico pensando se ele pode ser tão incômodo como o balanço? Marcela: Sempre haverá incomodados. Mateus: Ele parece menos inofensivo, por ser móvel. Marcela: Mas vejo o incômodo interessante como pesquisa, como início de diálogos mais potentes. 290


Felipe: Mas o balanço também parecia inofensivo, até revelar uma série de conflitos. Belisa: É bom a gente pensar também em como garantir que o Gabinete não tenha um tom muito historicista e nostálgico. Ele não pode ser só sobre o passado, tem que ser um lugar prospectivo, para que sua função não se esgote muito rápido. Felipe: Na verdade, é essa a ponte que ele faz com a Casa do Calafate. Além de coletar histórias, ele permite experimentar usos diversos. Ele começa a ensaiar possibilidades para o espaço, no sentido daquilo que vislumbramos para a Casa do Calafate - uma arquitetura que possibilita interpretações diversas no bairro. Marcela: Existe também o desafio de fazer com que o gabinete faça parte da história das pessoas, e não somente que as pessoas reconstituam a história a ser exibida no gabinete. Felipe: Pensando na possibilidade de incômodo, o fato de se ter uma casa no bairro cria uma implosão. Se passarmos a estar sempre no bairro, nossa relação com o lugar vai mudar totalmente. Mateus: Mas acho que isso não pode ser encarado com receio. Felipe: Sim, e eu vejo isso como uma coisa boa. Pode incomodar no bom sentido, tornando nossa presença no bairro muito mais ativa. Acho que devemos continuar vislumbrando essa possibilidade. Mateus: Mas o espaço está atrelado a um plano de negócios. Seria interessante estar ali diariamente, mas qual seria nossa motivação quando não formos mais estudantes? Além da motivação inicial de experimentar nesse espaço, de criar ali uma programação interessante, seria bom encontrar maneiras de este trabalho trazer retornos para nosso grupo. Belisa: É inviável manter um espaço sem ter dinheiro. Na verdade, é inviável manter o trabalho sem ter dinheiro. Já que estamos falando em planos para o futuro, por mais que a gente fale sobre a quarta via de atuação do arquiteto, que não produz pro mercado nem para a universidade, até agora estivemos no bairro pela universidade. E a grande questão que fica para os próximos passos, ao meu ver, é encontrar modos de sustentar, daqui para frente, estes projetos para o espaço público e para esse “cliente” coletivo. Felipe: Seria interessante experimentar, nos próximos passos, a potência que o trabalho ganha ao se habitar, de fato, o lugar. Eu acho que para além de ganhar dinheiro, este trabalho no Calafate se mostrou como um laboratório de espaço público. E os aprendizados adquiridos por essa experiência se desdobraram, inclusive, em muitos outros trabalhos fora do bairro. Então, não devemos apenas olhar para esta experiência como uma despesa ou um modo de ganhar dinheiro — ele tem uma carga importante em nossa prática como um coletivo. Construímos com nossas próprias mãos, testamos sem medo de errar e nos articulamos com grupos sociais com os quais nunca tínhamos tido contato. Vítor: E, no meio disso tudo, fomos forçados a cruzar nossos pensamentos individuais em nome de uma prática coletiva o mais coerente possível e, ao mesmo tempo, aberta aos imprevistos, reformulações e colaboradores diversos. 291


Esta etapa do trabalho foi impulsionada por leituras, conversas, confrontos e experimentos feitos a partir das ideias ou contribuições diretas de:

Adriano Mattos Ana Paula Assis Ana Paula Baltazar André Veigas Pereira Antoni Muntadas Antônio Yemail Aninha Costa Aline Furtado Artéria Associação da Mouraria Atelier d’architecture autogérée Bernardo Carvalho O Pior Bloco do Mundo Ceci Nery Cicília M. Keohling Peruzzo Danilo Ribeiro Eric Crevels Fernanda Gomes Fernanda Regaldo Gilberto Velho Guilherme Appolinário Guilherme Wisnik Henri Lefebvre Isabela Izidoro Jane Hall e Assemble Studio João Carneiro José Cabral Kevin C.

Lina Bo Bardi Lorena Figueiredo Lucas Kröeff Lucas Sallum Luísa Magalhães Luiza Silva Marcelo Maia Maria Ciça Mateus Mesquita Michel de Certeau muf art + architecture Natacha Rena Núria Manresa Rita Velloso Renata Marquez Roberto Andrés Paisaje transversal Paola Berenstein Jacques Patrícia Nardini Paula Lobato Pedro Castro Sarah Mattos Stefano Boeri Thaisa Nogueira Thalys Eduardo Tiago Flores Wellington Cançado Zoé Aubry




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