Odisseia d’uMaPinha passeio de ‘fim-de-curso’ p’la charneca alentejana
quadras soltas
José Luís Sepúlveda
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Relato em quadras trágico-cómicas da viagem dos ‘finalistas’ (sem quinas) da Universidade Sénior da Póvoa de Varzim que sem dar nas vistas foram passear ao Alentejo. Aqui se fala de meninas monofónicas e coisas assim, enquanto versejo.
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No fim dum ano lectivo Como manda a tradição Arranja-se um lenitivo P’ra fazer uma excursão O Sá Couto e a Fatinha Adoram o Alentejo E pegaram nuMaPinha, uMaPinha, P’ra dar azo ao seu desejo Quando por fim se consegue Ter uma rota afinada, As inscrições ao de leve Vão surgindo p’la calada E nessa manhã dilecta Que as coisas são mesmo assim Partimos de camioneta Cá da Póvoa de Varzim E metemo-nos à estrada Envoltos num Mar de Prata Com a malta sossegada E sem haver zaragata Seguimos de manhãzinha Ao raiar do arrebol E o desejo que nos vinha Era ver brilhar o sol
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E lá fomos animados Numa caminhada insana Levando cantigas, fados, Para a gesta alentejana. No meio da caminhada Um telegrama surgia: - Bom dia, boa jornada. Saudades. José Maria! Havia certa hierarquia Nesse alfobre de doutores. E a Lisete nos dizia Quem são os seus assessores Dizia que era Ministra E quem comandava a banda; Que o Sá Couto faz revista, Mas aqui ela é quem manda. O Touguinha é nomeado Como Assessor dos Recados E logo fica assanhado E levado dos diabos O Zé Luís em sarilhos Uns brancos, outros mais pretos, Meteu-se nos trocadilhos E passou-se dos carretos.
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A Teresa, num repente, Se começava a falar, Falava incessantemente Num bulício singular Cansados, entusiasmados, Num dia de imenso sol, Lá chegamos afanados Ao Castelo de Almourol Seguimos numa barcaça Do Manuel timoneiro Brincando sem qualquer graça Co’a desgraça do parceiro E quando por fim nos vimos No meio da fortaleza Uns para os outros sorrimos Dizendo: - Rara beleza! Partimos estrada fora P’ró Alentejo profundo Toda a gente ri ou chora Por terras do fim-do-mundo. De repente, na viagem Encontramos águas mil; Que linda aquela Barragem Chamada de Montargil|
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E não perdendo mais tempo Porque o tempo nos devora Fomos comer num momento À linda Vila de Mora O bacalhau e outros mimos Nós comemos sem demora. Só mais tarde descobrimos Que a vitela fora embora! Salvou-nos o Dom Paulino Que com grande coração Nos ofereceu um lanchinho Na sua linda mansão E toda a gente se afana; Lá fomos e eis senão quando Deparamos com Diana A jantar no D. Fernando. A Codesso e a Milice Saem dali a correr; Dizendo: - Mas que chatice, Vamo-nos escafeder! É que estas deusas assim Não aceitam concorrência! Triste, p’ra ti e p’ra mim Que partiram. Paciência!
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Ao jantar no D. Fernando Nessa noite sertaneja Quis beber e em lume brando Toca a pagar a cerveja Ao ver a conta, espantado, Vi D. Fernando entre naus A dizer-me de bom grado: - Dá cá quatrocentos paus. E fomos, céu estrelado, Tomar café no Giraldo. Mas tudo estava encerrado E a praça num rescaldo. Nesse momento ilusório Procurámos persistentes E na praça do Sertório Já sorrimos mais contentes. Havia ali um café Que no meio de ironia Nos ensinou como é Que o Alentejo vivia. - Tem calma, sinhó qui alguém Já vai vê o qui prêcisa Qui aqui à gente não tem Qui transpirá à camisa!
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- Si tem pressa, vá andando Qui à mesa não tava lá… E só irei mêmo quando Eu vir que o tempo mi dá… - Que sorriso tão bonito Como há tempo já não via! - Vá lá, sinhô si não grito, Não vou com galantèria! No meio da confusão E de toda esta euforia Chegaram sumos e pão E tudo o que se pedia. Fomos dormir com requinte Co’a carcaça fatigada. Logo na manhã seguinte, Seguimos nossa jornada. Perdemos Évora Monte, Ganhamos Vila Viçosa. Ouvimos contar na fonte Coisas de gente ditosa. Lá no Paço já se andava Com algumas maringanças E o guia desabafava: - São tal e qual as crianças!
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E envoltos nessa magia Cheia de gozo e de glória Ouvimos coisas que um dia Construíram nossa História. O Mestre João Maria Andava de lado em lado Tirando fotografia A tudo, por todo o lado
Passámos por Estremoz, Terra de gente raiana E ouvimos a sua voz Que a toda a hora nos chama. Achámos lá na cidade Uma maison tipo asilo E acabámos na verdade Discutindo o seu estilo. Chegamos a Alter do Chão À Lareira Alentejana Comemos em profusão E o borrego ainda nos chama. Alguns jovens bem tentaram Assaltar-nos num momento E na camioneta entraram Ficando presos lá dentro
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Partimos para Arraiolos Numa certa trapalhada E ouvimos, feitos tolos, Sermão e missa cantada: - É lá, guarem os retratos E deixem-te de porfias, Neste lugar de recatos, Não tiram fotografias - Vêm p’ra cá de corpo feito Fazer barulho na Igreja, Já não há qualquer respeito Cá dentro. Louvado seja! Esta lição de moral Já nos serviu de alibi Para deixar o local E logo partir dali E foi assim que seguimos Para o outro itinerário E logo todos sentimos Que se apertava o horário. Agora, as damas do paço, Envoltas em mais fulgor, Buscavam sem embaraço, Vistas de Ponte-de-Sor
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Não pudemos lá chegar Porque algures, num recato, Iríamos encontrar A linda Vila do Crato Que estirpe mais importante Já cada qual se sentia Pois vimos que doravante Tivemos direito a guia! Ao chegar ao Flor da Rosa, Talvez pela lenda imprecisa, Uma amora caprichosa Veio manchar-me a camisa E ali, de corpo feito, Enquanto a Anita esfregava, Eu impunha o meu respeito Co’a pelugem que ostentava E quando a malta chegou Ao Museu do Padre Abel, O Sá Couto é quem pagou Mas ficou sem o pastel Embora o tempo surgisse Com chalaças de permeio, Não faltava quem já visse O findar deste passeio.
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É que o tempo não perdoa Porque a vida é mesmo assim. Voltámos, porque ele voa, Para a Póvoa de Varzim No autocarro, o desmando Era digno de se ver Co’o motorista contando Graças de empalidecer E para animar a malta Na hora da despedida Há muita gente que salta Numa orgia desmedida A Ministra bem pedia Modinhas para animar E logo a Ana Maria Começava a suspirar. A Graça com sua graça E sua voz de encantar Cantava mais p’ra pirraça Dos que não sabe cantar A Codesso quando canta, Mistura arroz com feijão. E a música se alevanta Como bolas de sabão
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Mas tudo queria ria mesmo Ouvir a Áurea Bourbon; Bourbon Aquilo saía a esmo Porque ninguém inguém dava o tom. tom A música não se ouvia No meio dessa aldrabice. aldrabice E logo o Quim me dizia: - Ai se o Carriço te ouvisse! E com o tempo a correr, Em paragem escalada Paramos para comer Mas não encontramos nada. Voltamos livres de p’rigos, Bem contentes e felizes. felizes Fizemos novos amigos E alicerçamos raízes Seguimos no Mar de Prata E a verdade nos assista Que toda a gente está grata P’la condução do Baptista Depois de tanta conversa, Se acabou o frenesim E a rotina recomeça Que a odisseia chega ao fim
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E neste retrato louco, Manda a boa educação Agradecer ao Sá Couto Por tão grata diversão!
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