A graça que supera a dor

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verdade com conteúdo evangélico

Fevereiro / Março 2009 Ano 2, número 9

R E P O R T A G E N S

C h r i s t o p h e r H u mp h r e y P h o t o g r a p h y

14 Polêmica no quadro negro

Discussão em torno de ensino do criacionismo reforça defesa de autonomia das escolas confessionais

P o r Tr e i c i S c h w e n g b e r |

20 Juntando os cacos

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24 Abalo global

Divulgação Ricardo Stuckert / Presidência da República Marcos Couto

Missões que atuam no cenário internacional são severamente abaladas pela crise

Por Marcelo Barros |

26 Fé no Brasil

P o r M a r c e l o B a r r o s | Crescimento do país teria sido profetizado por pastores ao presidente Lula

30 Teens de visão

Longe da alienação, adolescentes criativos e engajados levantam fortunas para trabalhos sociais na África

Por Mark Moring |

34 E a Bíblia invadiu o Brasil

14

P o r J o a n n a B r a n d ã o | Programação Ano da Bíblia é um sucesso na distribuição das Escrituras e incentivo à leitura da Palavra de Deus

42 Mudança de maré

P o r S u l a m i t a R i c a r d o | Movimento Igreja Emergente chega à adolescência enfrentando oposição e questionando-se a si mesmo

45 A tragédia da Renascer

26 45

Igrejas hispânicas nos EUA enfrentam o drama das hipotecas e reformulam ministérios para socorrer fiéis que perderam tudo

P o r To n y C a r n e s |

P o r M a r c e l o B r a s i l e i r o | Desabamento de templo em São Paulo deixa nove mortos e desencadeia troca de acusações

46 A perigosa tarefa de desvendar o passado

Arqueólogos cristãos arriscam o próprio pescoço em busca de fragmentos que comprovem relatos bíblicos

Por Marcelo Barros |

50 O milagre da multiplicação de CDs

Alavancado pelo estouro da canção Faz um milagre em mim, Régis Danese saboreia a popularidade

Por Marcelo Barros |

56 A graça de viver cada dia

P o r C a r l o s Fe r n a n d e s | Diante do drama da doença crônica da filha, a missionária Débora Kornfield encontra perspectivas espirituais para o sofrimento

62 Um livro para os sofredores

Por Mark Carpenter |

redenção

A cabana trata da dor humana e da


Fevereiro / Março 2009

N O T Í C I A S ,

S E Ç Õ E S

E

C O L U N A S

6 Primeiras palavras divulgação

7 Cartas e mensagens 8 CH Informa P&R:

Barack Obama Robinson Cavalcanti

10 Obama fala de sua conversão a Cristo

MENTE E CORAÇÃO:

28 Espiritualidade | R i c a r d o A g r e s t e

Ano novo sem resoluções

36 Mulher | E s t h e r C a r r e n h o

O meu porquinho aleijado

Divulgação

38 Especial | R i c h a r d Fo s t e r Formação espiritual

52 CH Cultura

12 Padres bonitões estampam calendário católico

Livros | J a q u e l i n e R o d r i g u e s Música | N e l s o n B o m i l c a r Vídeos | N a t a n i e l G o m e s

Reprodução

60 Reflexão | E d R e n é K i v i t z O céu pode esperar

64 Últimas palavras | C a r l o s Q u e i r o z

12 Lançada B´blia ecológica

A idolatria do consumo

INTERNACIONAL

O governo e a fé deixados por Bush Políticas-chave em casa e no exterior ajudarão vítimas da pobreza e da fome nos próximos anos.

ENTREVISTA

O outro lado do crescimento das igrejas Historiador Phillip Jenkins afirma que precisamos de uma teologia de extinção de igrejas.

MISSÕES

Alguns barcos não afundam Quando vem a tempestade econômica, as instituições de caridade naturalmente esperam uma queda em suas arrecadações. Mas algumas acabam crescendo em épocas de crise.

IGREJA

Cr´ticos se retratam Antigos detratores de Watchman Nee e Witness Lee agora endossam ‘Igrejas Locais’.

POLÊMICA

O debate do contrabando Ministérios discordam sobre qual é a melhor forma de dar Bíblias aos cristãos chineses. Quando a prosperidade gospel falha A crença de alguns ícones evangélicos e prósperos de que Deus recompensa os sinais de fé com saúde, riqueza e felicidade tem ido de encontro às turbulências financeiras.

LIDERANÇA

Jesus não é uma marca Porque é perigoso fazer do evangelismo uma forma de marketing.


a mor representado em ficção e poesia

A reconciliadora

O Segredo da Rosa

A premiada autora, Dee Henderson relata a contagiante história de Rachel, psicóloga especializada em traumas que trabalha para a cruz vermelha. Muitos acontecimentos cercam a vida de Rachel, em uma enchente, um crime pode ser descoberto, a arma do crime cai nas mãos de uma criança; Rachel luta para fazer o seu trabalho e conta com a ajuda de Cole seu grande amor.

Em O Segredo da Rosa, Judith Kemp descreve a linda e romântica história de amor do livro Cântico dos cânticos. Uma linguagem poética que descreve a beleza de um amor puro e verdadeiro entre um homem e uma mulher. Descubra este segredo e siga estes conselhos!

11 5668 5668 Grande SP 0800 772 6272 Outros estados www.hagnos.com.br


Primeiras palavras Carlos Fernandes Diretor de Redação

Graça na dor

Revista Cristianismo Hoje A verdade com conteúdo evangélico www.cristianismohoje.com.br Quem somos Cristianismo Hoje é uma publicação evangélica, nacional e independente, que tem como objetivo informar, encorajar, unir e edificar a Igreja brasileira, comunicando com verdade, isenção e profundidade os fatos ligados ao segmento cristão, bem como o poder transformador do Evangelho a todos os seus leitores

A revista tem uma parceria com o grupo Christianity Today International, um dos mais importantes grupos de mídia cristã do mundo, com 11 revistas e 28 sites de conteúdo Conselho Editorial Carlo Carrenho • Carlos Buczynski • Eleny Vassão Eude Martins da Silva • Marcelo Augusto Souto Mário Ikeda • Mark Carpenter • Nelson Bomilcar Richard Werner • Ronaldo Lidório • Volney Faustini William Douglas Editor Marcos Simas Diretor de redação e jornalista responsável Carlos Fernandes – MTb 17336 Jornalistas desta edição Joanna Brandão • Marcelo Barros • Marcelo Brasileiro Mark Morris • Sulamita Ricardo • Tony Carnes Treici Schwengber • Valter Gonçalves Jr Colunistas Jaqueline Rodrigues • Nataniel Gomes Nelson Bomilcar • Rubinho Pirola Tradutores Ana Maria Rocha Neves • Daniel Leite Guanaes Revisora Alzeli Simas Colaboradores desta edição Carlos Queiroz • Ed René Kivitz • Esther Carrenho Mark Carpenter • Ricardo Agreste • Richard Foster

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oucas questões são tão discutidas no segmento cristão quanto as razões do sofrimento. Embora Jesus tenha sido o mais claro possível ao advertir seus seguidores de que o mundo lhes reservava aflições, nem todo crente aceita a adversidade sem reclamar ou, pior, perder a fé – ainda mais nos dias de hoje, quando teologias equivocadas e mal-intencionadas ensinam que o Evangelho livra o homem da dor. Quando o problema experimentado envolve doenças, então, a situação é ainda mais delicada. Por isso, o drama da família Kornfield tem sido tão pungente. Os missionários David e Débora Kornfield, americanos radicados no Brasil, não são daquele tipo de pessoas a quem se pode atribuir pecados graves ou falta de fé. No entanto, desde que sua filha Karis nasceu, eles convivem com uma rotina de dolorosos tratamentos médicos, longas internações e a inquietante proximidade da dor e da morte. A menina veio ao mundo com uma complicada má-formação que torna simples funções fisiológicas um verdadeiro martírio. Já enfrentou crises que duraram meses, e no momento, aos 25 anos de idade, passa uma fase melhor, embora continue com o futuro marcado por um enorme ponto de interrogação. Contudo, sua mãe tem aprendido que a graça de Deus é o que lhe basta a cada dia. Prestes a lançar um livro sobre o assunto, Débora Kornfield conversou com CRISTIANISMO HOJE e revelou como tem convivido com o sofrimento da filha. Dizer que é uma lição de vida vai soar como lugar-comum, mas o leitor certamente vai se identificar com muitas coisas que ela tem vivido e pensado. Ao publicar reportagens como essa, tratando de confiança em Deus e superação, bem como matérias e artigos sobre vida cristã, Igreja, teologia, missões e tantos outros temas concernentes à espiritualidade humana, a revista tem como objetivo a edificação e a informação de seus leitores. Isso porque, para nós, CRISTIANISMO HOJE é mais que um veículo de imprensa – é um ministério.

Arte Oliverartelucas Publicidade publicidade@cristianismohoje.com.br Assinaturas 0800 644 4010 assinaturas@cristianismohoje.com.br Informações e permissões para republicação de artigos faleconosco@cristianismohoje.com.br Distribuição MR Werner Distribuidora de livros Ltda. CNPJ 06.013.240/0001-07 – IE 07.450.716/001-45 Caixa postal 2351 Brasília, DF CEP 70842-970 Impressão Gráfica Ediouro Tiragem – 20.000 exemplares Cristianismo Hoje é uma publicação bimestral da Msimas Editora Ltda. ISSN 1982-3614

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cartas e mensagens sido omitido que os padres pedófilos têm sido acobertados pela Igreja Católica.

na Escola Superior de Guerra durante o regime militar.

Anderson Baptista

Emano Souza

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É importante resgatarmos a participação da Igreja Evangélica como sujeito histórico na nossa sociedade

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ou assinante da revista CRISTIANISMO HOJE há pouco tempo, mas foi suficiente para ver que seu conteúdo é de enorme valor na edificação da vida cristã. Tanto os editores como os temas escolhidos são dignos de aplausos.

Marcos Jose dos Santos

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reportagem sobre a pedofilia [publicada na edição nº 8] foi muito boa. Gostei da matéria, embora tenha

té quando todos nós, ditos cristãos, vamos ficar de braços cruzados, aceitando que o pecado domine esse mundo? Já passou a hora de irmos para a guerra e lutarmos contra tudo que vai contra a vontade de Deus. Não podemos continuar parados perante toda essa abominação. Kleber Dias Bezerra

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ela reportagem, essa intitulada A vida nos anos de chumbo [edição nº 8]! É importante resgatarmos a participação da Igreja Evangélica como sujeito histórico na nossa sociedade – mesmo que tal participação nem sempre seja motivo de orgulho. É preciso lembrar que, para legitimar o golpe, os militares divulgaram mito do inimigo interno. Segundo eles, este inimigo era a “ameaça comunista”; o que não significa que apenas os grupos de esquerda lutaram contra a ditadura. Mas, o que ocorreu foi o fato de que grupos de direita e da sociedade civil, em geral, apoiaram o golpe, no início. Porém, quando tais grupos perceberam que o objetivo dos militares era permanecer no poder, começaram a fazer oposição (...) Um assunto que poderia ser trabalhado na matéria é o fato de que muitos lideres evangélicos foram “agraciados” com cursos

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escritor da matéria A vida nos anos de chumbo cometeu um erro, ao escrever sobre a “suposta ameaça comunista” no Brasil dos anos 1960. Evidentemente, nem todos os que se opunham ao regime militar eram comunistas. Porém, caso estes tivessem tomado o poder, nós ainda estaríamos vivendo numa ditadura, a exemplo do que ocorre em Cuba, que vive um “AI-5” há quase 50 anos.

Oswaldo Viana

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ma história absurda. Só assim posso classificar o suicídio coletivo promovido em Jonestown há 30 anos. O fanatismo religioso está presente em todos os cantos do mundo – desde as seitas extremistas, como a de Jim Jones, até as fundamentalistas, como o grupo Testemunhas de Jeová. Espero que um dia não haja mais grupos religiosos assim, pregando uma paz e uma salvação que não vêm nunca, já que não têm base bíblica. Eles apenas alimentam as utopias de milhões de pessoas, ao mesmo tempo em que roubam-lhes seu tempo, dinheiro e bem-estar. Nandara Lima

Por necessidade de clareza e em função do espaço disponível, CRISTIANISMO HOJE reserva-se o direito de editar as cartas que recebe, adaptando sua linguagem ou suprimindo texto. Todas as mensagens foram recebidas via portal www.cristianismohoje.com.br

CONTATO COM CH Redação da revista

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CH Informa

Leia Também

» Salvo pela Palavra de Deus 9 » Profecia criminosa 10 » Prefeito do Rio contrata orixá 13

P a r a n o t c i a s d i á r i a s , v e j a e m w w w. c r i s t i a n i s m o h o j e . c o m . b r

[RELIGIÃO]

Detetives de santos Vaticano muda regras para investigação de supostas aparições

Arquivo

Fiéis veneram imagem: fenômenos de aparições agora passarão por crivo rigoroso A partir de agora, as aparições da Virgem Maria e outros santos católicos vão virar coisa de detetive. O Vaticano baixou uma série de medidas que normatizam os relatos de aparições, inclusive a avaliação do local e elaboração do perfil mental da testemunha por comitês formados por psicólogos, teólogos e... exorcistas. Histórias acerca de imagens que choram também serão cuidadosamente averiguadas. O conjunto de novas diretrizes será encaminhado a bispos e dioceses do mundo inteiro e alteram as normas anteriores, estabelecidas em 1978. Pelas novas regras, cada diocese deverá compor o seu próprio grupo de especialistas, que atuará sob orientação 8

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do bispo. O autor dos relatos também deverá submeter-se a visitas de psiquiatras e psicólogos ateus e católicos. O objetivo é atestar a saúde mental e descartar a ocorrência de delírios ou doenças de caráter histérico. Já a participação dos exorcistas deve-se ao fato de que o Vaticano desconfia que muitos fenômenos desse tipo sejam, na verdade, obra de demônios com objetivo de confundir a fé das pessoas. A Igreja quer também a prioridade em anunciar o que considera como verdadeiros milagres – daí o voto de silêncio imposto às testemunhas ser considerado condição principal para que uma aparição seja levada a sério. A confirmação pela Igreja da veracidade de uma aparição costuma ser bem demorada. O último episódio aceito como verdadeiro só foi legitimado em maio do ano passado: uma visão da Senhora de Laus, na França, ocorrida há três séculos. Segundo estudo do teólogo René Laurentin, ao longo da história da Igreja Católica, a Virgem Maria teria aparecido 2.450 vezes. Dos 300 processos de investigação abertos no século 20, apenas 12 foram oficialmente reconhecidos como legítimos pelo Vaticano até agora.

Oração do sufoco Igreja Anglicana divulga modelo de prece para quem perdeu emprego Preocupada com a crise mundial, a Igreja Anglicana divulgou um modelo

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de oração especialmente destinada a trabalhadores que perderam seus empregos nos últimos meses. “Escutaime enquanto confuso choro; ajudai-me claramente a pensar e a minha alma em calma manter”, diz um trecho da prece, chamada de “Oração para os desempregados”. A Igreja também oferece preces para as pessoas que, embora empregadas, sofrem de estresse e sentem-se pressionadas pela demissão de seus colegas. “Quem será o próximo? Como lidarei com as pressões cada vez maiores no trabalho?”, questiona, por sua vez, a “Oração para os que ainda estão trabalhando”.

Religiosidade não basta Estudo aponta que felicidade das crianças depende de uma espiritualidade viva As práticas religiosas, como ir à igreja ou orar, são pouco influentes para determinar o grau da felicidade de uma criança. A constatação é da Universidade da Columbia Britânica, no Canadá. Uma pesquisa da instituição analisou 320 crianças com idades entre 8 e 12 anos, procedentes de quatro colégios públicos e dois religiosos, através de questionários preenchidos por eles e seus pais. As crianças que se mostraram mais felizes são aquelas que sentem que sua vida faz sentido e desenvolvem relações interpessoais mais profundas, além de uma espiritualidade viva, que vá além da mera observância de ritos. “Práticas religiosas, como reza e a simples participação em cerimônias, têm muito pouco efeito sobre a felicidade das crianças”, frisa o pesquisador Mark Holder, organizador do estudo.


Salvo pela Palavra de Deus Cabeleireiro, alvejado por disparo à queima-roupa, escapou porque bala ficou encravada na B´blia em seu bolso Os crentes costumam dizer que o conhecimento da Palavra de Deus leva à salvação. Mas poucos viveram a experiência de um cabeleireiro que mora em Jacaraípe, a 30 km de Vitória (ES). Sua vida foi literalmente salva pela Bíblia. Identificado apenas como N.G.C. por preferir o anonimato, ele foi alvejado por dois tiros, sendo um deles na altura do coração, e só não foi mortalmente ferido porque a bala ficou encravada entre as páginas de uma pequena Bíblia que sempre carrega no bolso da camisa, junto ao peito. Outro projétil teve o curso desviado pela capa dura do livro e apenas atingiu de raspão sua testa. Segundo a vítima, de 45 anos, o crime não se caracterizou como um assalto. “Eu estava com 800 reais na carteira, relógio e outros objetos. Os bandidos não pediram nada. Já chegaram querendo me matar mesmo”, disse o cabeleireiro, que foi abordado na porta de casa. Ele afirma ser muito religioso: “Esta é a segunda vez que a Bíblia me salva. A primeira foi quando eu conheci a Palavra de Deus. Agora, acontece isso. É uma coisa para se pensar bastante a respeito”. Segundo os peritos que atuaram no caso, o projétil só não causou danos graves porque foi disparado a queima-roupa, sem a distância necessária para aceleração plena. Mas N. não está nem aí para explicações técnicas: “Foi um milagre!”, resume.

Drive-thru da oração Igreja Universal de Houston inova e fiéis podem receber serviços espirituais sem sair do carro A Igreja Universal do Reino de Deus instalada na cidade de Houston, no Texas (EUA), descobriu uma maneira de atrair as pessoas que dizem não ter tempo para frequentar cultos. A novidade é o Prayer Drive-Thru (“oração dentro do carro”), sistema pelo qual qualquer alma pode

receber orações sem sair do seu automóvel. “Como aqui em Houston pouco se vê pessoas nas ruas, só carros, então tivemos essa idéia”, explica o bispo Renato Cardoso, responsável pela Universal no Texas. A novidade já virou notícia na imprensa local. O Prayer Drive-Thru acontece aos sábados. Basta entrar com o carro no estacionamento do templo e aguardar a vez numa fila. Tudo é muito rápido, exatamente como nas lanchonetes de fast-food. “Na primeira parada, os ocupantes do automóvel recebem um formulário, onde descrevem os problemas e qual o motivo de oração. Na parada seguinte, em frente à igreja, o pastor faz as orações e presta um aconselhamento rápido”, descreve Cardoso. Segundo o bispo, a igreja já notou um aumento na frequência aos cultos desde a implantação do serviço.

Água benta engarrafada Medo de dengue no Rio de Janeiro leva monges franciscanos a esvaziar as pias rituais O risco de uma nova epidemia de dengue como a do ano passado, que infectou mais de 120 mil pessoas em todo o Estado do Rio e causou cerca de 130 mortes, está mudando até tradições religiosas. A popular Igreja de São Sebastião dos Capuchinhos, na Tijuca, zona norte da capital carioca, entrou firme na guerra contra o mosquito Aedes aegipty, o vetor da doença. Desde dezembro, quando começou o verão, os fiéis já não encontram mais água benta nas tradicionais pias espalhadas pelo templo, mas somente em garrafas plásticas. Segundo o frei Arles Dias de Jesus, a medida foi adotada para não deixar água parada e, assim, evitar o surgimento de focos do mosquito. Um cartaz avisa aos fiéis: “Em razão da dengue, não colocaremos água aqui”. O religioso admite que a medida causou espanto na comunidade, mas logo f e v e r e i r o

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foi bem aceita. “No início, os fiéis acharam bem esquisito, mas entenderam que era uma medida importante”. As garrafas, contendo 1,5 litro de água benta, ficam em local fechado e são entregues quando solicitadas pelos fiéis. [JUSTIÇA]

Igreja partilhada Justiça obriga l´der do ministério Creciendo em Gracia a dividir bens com a ex-mulher José Luis de Jesús Miranda, de 66 anos, o controvertido líder do também polêmico Ministério Internacional Creciendo em Gracia, foi obrigado a entregar metade de todos os seus bens à ex-mulher, Josefina de Jesus Torres. O ex-casal está em processo de divórcio litigioso e a Justiça considera que o religioso portorriquenho faz de sua igreja um “negócio particular”, o que justificaria a partilha dos bens do ministério. A decisão, pronunciada por um Juízo da Flórida (EUA), onde vive Miranda, não é definitiva. Mas a advogada Norma Segall, que representa Josefina, comemorou a sentença de maneira irônica: “Com uma igreja com milhões de membros, basta que ele emita um edital no céu para recuperar rapidamente o que perdeu”. O comentário jocoso baseia-se no fato de que Miranda se intitula como uma encarnação do próprio Cristo e costuma dizer que olhar para ele é como “ver Jesus”.

Divulgação

[COTIDIANO]

José Luis (à frente), com colaboradores e pequenos fiéis: pensão milionária

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Profecia criminosa L´der pentecostal é condenado por estuprar adolescente da própria igreja “O homem de Deus”. Era assim, na terceira pessoa, que José Leonardo Sardinha – autoproclamado “apóstolo” – referia-se a si mesmo perante os frequentadores da Igreja Assembléia de Deus Plenitude, na zona leste de São Paulo. Bastante conhecido na região onde atuava, Sardinha, um ex-vendedor que montou a própria igreja, comandava programas em emissoras de rádio e TV e costumava dizer que recebia mensagens divinas. Mas uma das revelações fajutas o levou à cadeia. Em meados de 2006, ele abusou da adolescente P., de 13 anos. A menina fazia parte da igreja e queria namorar o filho do líder. Sabendo disso, Sardinha lhe revelou o conteúdo de um “sonho profético”: a adolescente teria de fazer um sacrifício, a exemplo do patriarca bíblico Abraão, para conquistar o coração do rapaz. O sacrifício “em nome de Jesus” seria ter relações sexuais com o próprio Sardinha O fato veio à tona após a garota confidenciar à mãe o ocorrido. A congregação presidida pelo criminoso tinha cerca de dois mil membros e, segundo uma das profecias relatada por Sardinha, seria “a maior igreja do Brasil”. Contudo, apesar do nome, a comunidade não possui qualquer vínculo com as convenções estabelecidas pela Assembléia de Deus. Julgado pela 26ª Vara Criminal Central de São Paulo, ele foi condenado a 21 anos de prisão em regime inicialmente fechado por estupro e atentado violento ao pudor.

Arquivo

[ E VA N G E L I S M O ]

Até aos confins da Terra

cabo pela Cruzada Estudantil e Profissional para Cristo (CCC, na sigla em inglês). Através de seu braço de mídia, a Global Media Outreach, a entidade está usando a rede mundial de computadores para compartilhar a mensagem de Jesus aos quatro cantos da Terra, literalmente. A ideia é apresentar o Evangelho nas línguas mais importantes da internet – inglês, espanhol, chinês, alemão, francês, japonês, coreano, italiano, português, holandês, árabe e russo. Segundo o ministério, juntas estas línguas cobrem 85 por cento do usuários da internet em todo o mundo. Só em dezembro, a CCC recebeu informes de que quase 400 mil pessoas demonstraram interesse em conhecer mais da Palavra de Deus e de seguir a Cristo. [DIREITOS HUMANOS]

Escola de intolerância

Ministério da Educação da Turquia distribui livro didático que incita a discriminação contra os cristãos Embora alardeie possuir um governo democrático e aspire vaga na União Europeia, a Turquia anda dando passos para trás no quesito liberdade religiosa. O Ministério da Educação turco distribuiu um livro didático no sistema escolar que estimula a discriminação contra a comunidade cristã. O livro, voltado para a educação primária, chama-se História das Reformas da República e Atatürkismo. O controverso texto descreve a atividade missionária cristã como “ameaça à unidade nacional”, destruindo valores tradicionais e culturais pela conversão do povo turco a outra religião que não a islâmica. Estudantes da Turquia são submetidos a doutrinação anti-cristã na escola

Uma grandiosa iniciativa evangelística está sendo levado a C R I S T I A N I S M O

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“Quero caminhar com Jesus” O recém-empossado presidente dos Estados Unidos Barack Obama já sabe que terá enormes dificuldades no exerc´cio do cargo de maior poder do planeta. E uma delas será justamente mostrar a seu povo e ao mundo que tipo de influência sua fé terá sobre seu mandato. Obama conversou com exclusividade com Christianity Today: CRISTIANISMO HOJE – Qual foi o maior obstáculo para conseguir o voto dos evangélicos?

BARACK OBAMA – Eu acredito que existem coisas na relação entre os democratas e os evangélicos que precisam mudar. Os democratas não têm aparecido – por isso, os evangélicos muitas vezes acreditam que eles rejeitam tudo o que diz respeito à fé. Na campanha, eu tentei alcançar as pessoas e compartilhar minha fé com aqueles que também a possuem. Se Deus quiser, conseguiremos, juntos, construir algumas pontes para que a nação continue a avançar.

O que o senhor fará no governo que chamará a atenção dos cristãos de seu pa´s?

Como presidente, quero celebrar a riqueza e a diversidade das experiências religiosas em nossa nação. Acredito que seja importante encorajarmos igrejas e congregações ao redor deste país a se envolverem na reconstrução de suas comunidades. Creio que as igrejas têm de estar conscientes de que se o governo federal começa a tocar a música, elas precisam entrar no ritmo. O senhor já relatou sua experiência de conversão, dizendo ter a certeza de que seus pecado foram perdoados por Deus. Barack Obama é um homem nascido de novo?

Sou um cristão, um cristão devoto. Creio na redenção através da morte e ressurreição de Cristo Jesus. Acredito que a fé me mostra um caminho de limpeza de meus pecados e de garantia da vida eterna. Eu não quero caminhar sozinho em minha jornada. Ter aceitado Jesus em minha vida foi um poderoso guia para meus valores, conduta e ideais.

Cruzada Estudantil e Profissional para Cristo vai disponibilizar o Evangelho a 85% dos usuários de internet no mundo

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Sarah Pulliam e Ted Olson

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Tradução: Daniel Leite Guanaes

CH Informa



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CH Informa “Durante anos, o Estado e outros grupos têm espalhado o boato de que os cristãos turcos são parte de uma conspiração estrangeira”, protesta a Aliança de Igrejas Protestantes na Turquia. A entidade expressou a preocupação de que o sistema de educação irá marginalizar a população cristã. Para piorar a situação, o Ministério da Justiça apresentou uma moção perante a Comissão de Justiça na Assembléia Nacional dando conta de que a atividade missionária na Turquia era “mais perigosa que ataques terroristas.” Cerca de 99% dos aproximadamente 50 milhões de habitantes do país professam a fé muçulmana.

Assis, ela destaca a palavra “terra”, com quase mil citações no texto. Por enquanto, a nova versão está disponível somente em inglês. [COMPORTAMENTO]

Um bonitão para cada mês Vaticano lança calendário ilustrado com fotos de padres jovens e atraentes

[MERCADO]

Lançada B´blia ecológica Ela tem papel reciclado, tinta de soja e comentários sobre meio ambiente

Reprodução

Dois dos padres do calendário: bonitões de batina

A B´blia ecológica: papel reciclado e referências ao meio ambiente Em tempos ecologicamente corretos, nos quais a preservação ambiental se tornou item obrigatório da agenda mundial, até a eterna Palavra de Deus precisa se adaptar. Calma, ninguém está defendendo qualquer alteração nas Sagradas Escrituras – mas a editora HarperCollins acaba de lançar o projeto Bíblia Verde. Trata-se de uma nova edição, feita com papel reciclado e tinta à base de soja. Ou seja, o livro é produzido sem qualquer agressão ao meio ambiente. Da primeira tiragem de 37 mil exemplares, 25 mil foram vendidos em poucas semanas. Com prefácio do bispo sul-africano Desmond Tutu e comentários de São Francisco de 12

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A partir de agora, é certo que muitas mulheres vão maldizer o celibato obrigatório aos sacerdotes católicos. O Vaticano acaba de lançar um calendário ilustrado com fotos de doze jovens padres – a bem da verdade, os belos religiosos mais parecem modelos. É claro que os zelosos homens de Deus fizeram questão de posar de batina. A iniciativa, segundo a Santa Sé, não tem objetivo de despertar desejos pecaminosos nas fiéis, mas sim, tornar a Igreja mais próxima das pessoas – as do sexo feminino, claro. O calendário com padres bonitões não é novidade. A primeira edição circulou em 2003 e o sucesso foi tão estrondoso que a Igreja resolveu repetir a dose. Ano passado, outra ideia semelhante, mas de gênero oposto, foi lançada por um padre italiano. Ele criou um concurso de beleza para freiras, cujas fotos seriam expostas on line para votação dos internautas. As irmãs deveriam ter entre 18 e 40 anos de idade e, de acordo com as regras do certame, transmitir “beleza física e valores espirituais”. Mas a Igreja torpedeou a iniciativa. f e v e r e i r o

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[POLÍTICA]

CPI do Aborto Deputados da Frente Parlamentar pela Vida criam Comissão para investigar indústria da interrupção da gravidez O tema do aborto promete esquentar o clima no Congresso Nacional este ano. A partir do reinício dos trabalhos legislativos, agora em fevereiro, começa a funcionar também a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Aborto, uma iniciativa das bancadas evangélica e católica, além de congressistas ligados à fé espiritualista. Os deputados religiosos pretendem investigar a venda irregular de drogas abortivas – como a pílula do dia seguinte – e principalmente a rede de clínicas e casas de saúde que realizam ilegalmente cirurgias de interrupção da gravidez. A chamada Frente Parlamentar pela Vida pretende, inclusive, convocar à CPI mulheres que praticaram aborto. O grupo de deputados é liderado por Luiz Bassuma (PT-BA). [SOCIEDADE]

Guerra das frases Campanha ate´sta em Londres já influencia outros pa´ses europeus Depois da Inglaterra, também a Espanha e a Itália lançaram campanhas volantes a favor do ateísmo. A exemplo do que começou a ser feito em Londres no início de janeiro, três linhas de ônibus de Barcelona, uma das principais cidades do país, já estão circulando com a frase “Probablemente, Dios no existe. Deixa de preocuparte y disfruta la vida”, versão espanhola do painel afixado em 800 coletivos britânicos. Já na Itália, o movimento está sob fogo cerrado da Igreja Católica. “Nosso objetivo é tornar visível a existência de milhões de ateus”, justifica o presidente da União de Ateus e Livre-Pensadores da Espanha, Albert Riba. Segundo ele, cerca de vinte por cento dos espanhóis dizem-se ateus ou agnósticos. “Depois da Igreja Católica,


somos a segunda opção religiosa no país”, argumenta o ativista. Em Madri, a capital espanhola, já circula uma contra-mensagem cristã: “Deus existe. Goza a vida em Cristo”, iniciativa da entidade católica E-Cristians. Já na Itália, a União dos Ateus e Agnósticos Racionalistas foi proibida de divulgar mensagens contra Deus nos ônibus de Gênova. A concessionária de publicidade nos meios de transporte públicos da cidade considerou que o slogan “Má notícia: Deus não existe; boa notícia: você não precisa dele” é provocativo e não se enquadraria no código de ética da propaganda italiana. A entidade nega, mas é certo que o Vaticano está por trás da proibição. Os ateus, por sua vez, prometem “uma longa batalha judicial”.

União contra o preconceito

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Lançado o Guia de Luta Contra a Intolerância Religiosa e o Racismo A sociedade brasileira já tem mais um instrumento para lutar contra a discriminação de natureza religiosa. Foi lançado em 21 de janeiro – data consagrada como Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa – o Guia de Luta Contra a Intolerância Religiosa e o Racismo. O documento, que inicialmente foi distribuído às delegacias de polícia e casas religiosas do Rio de Janeiro, reúne normas sobre a aplicação da chamada Lei Caó, que pune este tipo de crime com penas de até cinco anos de detenção, e orientações a quem se sentir discriminado em virtude de sua crença. O evento de lançamento do guia reuniu representantes da Igreja Católica, evangélicos, espiritualistas, judeus e candomblecistas. O ministro Eloy Ferreira: “Prisão apenas não resolve”

Estatisticamente, são os adeptos das religiões de matriz africana que mais sofrem com o preconceito – eles são os queixosos em pelo menos 70% dos casos que são denunciados à polícia. O ministro interino da Igualdade Racial, Eloy Ferreira, defendeu a criação de delegacias especializadas para cuidar dos crimes de intolerância. “Prisão apenas não resolve. É preciso mudar os valores”, discursou. “Quem se cala em relação a atos de intolerância será atingido por ela mais cedo ou mais tarde”, apontou, por sua vez, o presidente da Federação Israelita do Rio, Sérgio Niskier. Para o presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, o babalaô Ivanir dos Santos, é hora de mudar a cultura em relação à tolerância religiosa “antes que as futuras gerações paguem o preço”.

Mente e coração

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onsiderado o mais importante cientista político cristão do país, o bispo anglicano Robinson Cavalcanti é referência obrigatória da Igreja brasileira em relação ao tema da cidadania – e também tem muitos trabalhos nas áreas de liderança, família e sexualidade. Confira alguns de seus pensamentos:

“O protestantismo brasileiro, no passado, foi um entusiasta defensor do Estado laico. Hoje, sofre a tentação teocrática, desejando impor os seus pontos de vista ao conjunto da população, não pela persuasão, mas pela via do poder público”

Prefeito do Rio contrata orixá Eduardo Paes faz convênio com médium que diz incorporar esp´rito capaz de controlar chuvas Preocupado com as enchentes do verão, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB), resolveu não confiar mais apenas nos meteorologistas. Desde o mês passado, a administração carioca conta com a médium Adelaide Scritori, dirigente da Fundação Cacique Cobra Coral (FCCC), que afirma ter o poder de controlar o tempo e desviar as tempestades. Ela diz fazer isso através da incorporação daquela entidade, que, acreditam os adeptos dos ritos afrobrasileiros, é o espírito de um grande chefe indígena do passado. A FCCC já havia colaborado com a gestão anterior, de Cesar Maia (2001-2008), através de um convênio com a Prefeitura. Na época, a notícia provocou surpresa e desencadeou uma onda de ironias contra Maia, um administrador afeito a medidas inusitadas – os chamados factóides. O convênio não representa qualquer gasto para o município, mas havia sido descartado pelo secretário de Obras e Serviços Públicos de Paes, Luiz Guaraná, no início da nova gestão. Contudo, depois das primeiras cheias de seu mandato, o prefeito resolveu contar novamente com os serviços do orixá. E o Cacique até já teria dito que o Rio enfrentaria mais pelo menos 32 temporais de grande porte. f e v e r e i r o

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A igreja, o país e o mundo

“Cabe à Igreja preparar os seus l´deres e os seus liderados para um exerc´cio responsável da cidadania, apoiando, particularmente, aqueles vocacionados para o exerc´cio da função pública” Cristianismo e política

“Santidade e sexualidade sadia não são categorias que se excluem, mas que se integram e se complementam” Uma bênção chamada sexo

“A superficialidade, a autoajuda, a prosperidade, a ‘batalha espiritual’, os cultos-shows, marcam um cenário eclesiástico que incha mais do que realmente cresce” Igreja, um lugar de transformação e liberdade 2 0 0 9

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Polêmica Crianças em sala de aula: aumenta debate acerca da validade do ensino de teorias alternativas à da Evolução

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Treici Schwengber

(Colaboração: Valter Gonçalves Jr)

Às vésperas das comemorações do bicentenário do nascimen- nunca nas aulas de ciências”, disse, reconhecendo, porém, a auto de Charles Darwin – o naturalista inglês que, há 150 anos, tonomia das escolas. ao escrever A Origem das Espécies e propor a Teoria da EvoluNo ano passado, a filial de Brasília do Colégio Mackenzie ção, mudou totalmente a forma de a humanidade entender a aceitou mudar uma apostila após questionamento do ministro natureza –, as escolas confessionais brasileiras têm sido alvo de da Educação, Fernando Haddad, que tem uma filha matriculapesadas críticas da imprensa secular por ensinar também o cria- da na escola. O colégio ensina o evolucionismo normalmente, a cionismo nas aulas de Ciências. De tempos em tempos o debate partir da sexta série do ensino básico, obedecendo às exigências sobre o assunto volta à tona. Desta vez, tudo começou quando curriculares do MEC, mas também dá espaço para o criacioum colunista do jornal Folha de São Paulo reproduziu nismo e para o chamado “design inteligente” – conem seu blog na internet uma lição de criacionismo cepção segundo a qual a complexidade dos organisSociedade do Colégio Presbiteriano Mackenzie, um dos mais mos deriva de uma base pré-existente. O ministro conceituados do país, para turmas da quarta série do teria se queixado do fato de o material não ter sido ensino fundamental. Foi a deixa para o debate se espalhar pela apresentado aos pais no início do ano letivo. A assessoria de mídia, o que pressionou o Ministério da Educação (MEC) a imprensa da instituição negou qualquer pressão do MEC ou de tomar uma posição contra a inclusão, em aulas de Ciências ou Haddad e explicou que se trata de material destinado ao ensino de Biologia, de qualquer perspectiva criacionista, mesmo em fundamental, recentemente adaptado do exterior, e que cabiam escolas confessionais. A autonomia dessas instituições para de- correções de português. O conteúdo religioso também foi amefinir sua grade curricular chegou a ser questionada, num tom nizado. E o ministro manteve sua filha na instituição. fortemente anti-religioso. Mas, ao contrário do que veicularam alguns blogs mais Convicções e diversidade – As escolas adventistas, que seguem apressados, em nenhum momento o ministério atuou para en- a mesma linha do Mackenzie quanto ao ensino do criacionisgessar ou interferir na grade dos colégios. A diretora de Edu- mo, também foram criticadas pela imprensa, mesmo tendo seu cação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda, declarou que o desempenho educacional reconhecido. “A educação confessioórgão é contrário a ensinos criacionistas nas aulas de Ciências nal é um direito constitucional e reconhecido na Lei de Diou de Biologia. “A nossa posição é objetiva: criacionismo pode retrizes e Bases da Educação Nacional”, lembra, em entrevista e deve ser discutido nas aulas de religião, como visão teológica, a CRISTIANISMO HOJE, o reitor do Centro Universitário

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no quadro negro Discussão em torno de ensino do criacionismo reforça defesa de autonomia das escolas confessionais

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O presidente da ABIEE, Euler Bahia: “Educação confessional é direito constitucional” Adventista de São Paulo (Unasp), Euler Pereira Bahia. “Nossos constitucionalistas foram sábios o suficiente para compreender que aqueles que desejam educar os seus filhos em um ambiente escolar cujos valores se harmonizam com suas convicções devem ter o direito de fazê-lo dentro da diversidade que o sistema escolar reconhece”, ressaltou. Euler, que também é o presidente da Associação Brasileira das Instituições Educacionais Evangélicas (ABIEE), não vê motivos para o criacionismo não ter espaço nas escolas. “Aquilo que é ciência, ou seja, aquilo que corresponde aos fatos observáveis e suas leis no mundo natural e que são abordados dentro do chamado método científico, é perfeitamente compatível com a visão criacionista da realidade”, declara o educador. “O que distingue os dois modelos [criacionismo e evolucionismo] é, precisamente, o fato de que, no modelo criacionista, se admite a existência de um Deus Criador, conforme revelado nas Sagradas Escrituras, que planejou a criação do Universo e estabeleceu leis para governarem o seu funcionamento. Ao contrário desta cosmovisão, os evolucionistas defendem que tudo veio à existência através das leis naturais, sem mesmo sequer admitir a existência de um Legislador”. Para Bahia, é preciso ensinar as duas possibilidades. Ele diz que é um erro confundir criacionismo com religião: “Vale dizer que o evolucionismo não é, na melhor das hipóteses, nem mais científico e nem menos religioso que o criacionismo”, destaca.

“Não vejo qualquer razão que não seja a discriminatória para impedir que o aluno tenha o direito de conhecer estas duas estruturas conceituais a respeito das origens e suas implicações sobre as demais áreas do conhecimento e comportamento humanos.” O assunto interessa particularmente aos religiosos. Neste ano, a Unasp, em parceria com a Sociedade Criacionista Brasileira (SCB), já promoveu o seu sexto Encontro Nacional de Criacionistas, com o tema “Evidências e especulações sobre as origens”. Em abril, a Universidade Presbiteriana Mackenzie deve realizar o “II Seminário Internacional Darwinismo Hoje”, para discutir design inteligente, evolucionismo e criacionismo. E em março, no Vaticano, a Igreja Católica vai realizar o seminário “Evolução biológica, fatos e teorias”. Mas o assunto não é ponto pacífico nem entre as escolas confessionais. “Um professor bem formado e consciente não vai falar sobre criacionismo em aula de ciência”, diz José Carlos Barbosa, que é pastor metodista, historiador e autor de vários livros, dentre os quais Lugar onde amigos se encontram – Caminhos da Educação Metodista no Brasil (Editora Unimep). “Lembro de uma palestra que ouvi no salão nobre do Colégio Piracicabano, ministrada pelo professor Warwick Kerr, membro da Igreja Metodista e importante cientista. Ele disse em 1979 que era cristão e que não via nenhuma incompatibilidade entre a Bíblia e os ensinos de Darwin. Penso como ele”, frisa. Ciência e fé – Desde que foi proposta, em 1859, a Teoria da Evolução, concebida a partir da observação científica da adaptação das espécies de plantas e animais ao seu habitat, provo-

O ministro da Educação, Fernando Haddad, reclamou contra apostila fornecida à filha sem seu conhecimento f e v e r e i r o

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P o l ê m ica n o q u adr o n e g r o

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A sede do Institute for

Muito do criacionismo moderno, não Creation Research, nos exatamente o teológico, mas o cientíEUA: na vanguarda do fico, tem base nos escritos de Henri criacionismo moderno Morris (1918-2006), fundador do Creation Research Society e do Institute for Creation Research, instituição sediada no Texas (EUA). Ele questionava a idade do material fóssil encontrado. Suas teorias, no entanto, nunca foram aceitas pela comunidade científica internacional. Ainda nos anos 80, a Suprema Corte americana proibiu o ensino do criacionismo em escolas públicas. Da mesma forma, o chamado design inteligente não recebeu o reconhecimento desejado. O termo, como é atualmente usado, surgiu com a publicação, em 1989, do livro Of pandas and people: The central question of biological origins (“Sobre pandas e pessoas: A questão central das origens biológicas”), de Percival Davis e Dean Kenyon. Muitas outras publicações e idéias apoiando o design inteligente surgiram desde então. Apesar de ter se popularizado rapidamente, a idéia de que a complexidade dos organismos vivos exigiria a existência de um design pré-existente não foi acolhida pela comunidade científica, por não ser passível de comprovação pelos métodos da ciência. Em 2005, a controvérsia foi para os tribunais. Pais de alunos e diversas associações defenderam o ensino da concepção nas escolas públicas como alternativa ao evolucionismo, mas foram derrotados.

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religioso William Paley para explicar a adaptação das espécies ao meio ambiente. Ainda de acordo com Alister McGrath, mesmo o fundamentalismo nor­ te-americano, em seus pri­mór­dios, no início do século passado, aceitava a Teoria da Evolução de Darwin. James Orr, um dos autores fundamentalistas, chegou então a escrever que a “evolução viria a ser reconhecida como apenas um novo nome para criação, só que com o poder criador operando de dentro, e não, como na antiga concepção, de uma forma externa e plástica”. Perspectiva semelhante à de muitos pensadores evangélicos contemporâneos, como John Stott, que apesar de não se alinhar com o liberalismo teológico, não tem dificuldades com a Teoria da Evolução. Em seu livro Entenda a Bíblia, Stott diz que “é uma infelicidade que alguns que debatem essa questão comecem por pressupor que as palavras ‘criação’ e ‘evolução’ são mutuamente exclusivas”, para depois afirmar também que “não parece haver nenhuma razão bíblica para negar que alguma espécie de desenvolvimento evolutivo, servindo a um propósito, possa ter sido o recurso empregado por Deus na Criação”. Entre os teólogos católicos, o evolucionismo tem sido largamente acolhido, e já é oficialmente aceito pelos papas. Bento XVI afirmou que o debate entre o criacionismo e o evolucionismo é “um absurdo”, já que a concepção da evolução pode, no seu entender, coexistir com a fé. Da mesma forma, cientistas respeitados, apesar de trabalharem com a teoria evolucionista – que ao longo do tempo se tornou muito mais complexa e hoje abrange diversos campos do conhecimento –, afirmam sua fé cristã sem qualquer medo ou constrangimento. É o caso do biólogo norte-americano Francis Collins, chefe do Projeto Genoma, empenhado em mapear o conjunto de genes da humanidade. Ele anunciou sua conversão ao Cristianismo, mas defende as descobertas modernas da biologia molecular, alicerçadas na Teoria da Evolução. Outro cientista, Kenneth R. Miller, professor de biologia da Universidade de Brown, nos EUA, também tem publicado livros afirmando que não vê confronto entre o evolucionismo e a Bíblia. Coisa rara no momento em que cresce o clima de antagonismo entre Ciência e Religião, atiçado especialmente pela pregação ateísta do biólogo inglês Richard Dawkins, que combate a fé com a gana de um cruzado medieval rumo a Jerusalém. Na Inglaterra, o clima de caça às bruxas vitimou Michael Reiss, sacerdote da Igreja Anglicana – onde é larga a aceitação da Teoria da Evolução. Reiss teve que deixar a função de diretor de educação da Royal Society depois de defender a liberdade do ensino criacionista pelas escolas inglesas. Saiu sob uma saraivada de críticas.

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Uma teoria contestada

Pastor e historiador, José Carlos Barbosa destaca o papel dos protestantes na educação

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cou um terremoto. Como resultado dos acirrados debates entre cientistas e teólogos da época, consolidaram-se grandes fissuras na relação entre a ciência e a fé. Teólogos defensores da interpretação literal do relato do livro bíblico de Gênesis para a criação do mundo condenaram de pronto a teoria alicerçada na seleção natural das espécies. O que muitos se esquecem é que, mesmo naquele momento, diversos teólogos cristãos de fé firme e ortodoxa não viram problemas em crer na revelação bíblica e explicar o desenvolvimento das espécies pelo prisma da teoria de Darwin. Em O deus de Dawkins: Genes, memes e o sentido da vida (Shedd Publicações), o biólogo e também teólogo Alister McGrath lembra que o anglicano John Henry Newman (1801-1890), contemporâneo do naturalista britânico, já criticava as tentativas da época de confinar e diminuir a fé cristã a uma determinada visão apologética: no caso específico, a então “teologia física” construída pelo


Na base da educação brasileira Escolas ligadas a denominações cristãs tiveram papel decisivo na consolidação do ensino no país

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Freyre, Távola e Brizola: personalidades passaram pelos bancos de escolas confessionais

brasileira a refletir sobre a questão”, explica, referindo-se à fundação do Colégio Piracicabano, no interior paulista, em 1881. Outra mudança implementada pelos educadores confessionais, segundo Barbosa, foi a introdução do Jardim de Infância. “Parece uma coisa simples, mas as implicações foram muitas, já que a iniciativa mostrava uma maneira diferente de tratar as crianças.” Além das inovações específicas, as escolas protestantes foram inclusivas, pois além das mulheres, elas passaram a ensinar aos pobres. “Além das escolas destinadas à educação dos filhos da elite brasileira, as denominações protestantes também organizaram milhares de escolas paroquiais para atender crianças oriundas de famílias carentes”, lembra. Para o teólogo batista Israel Belo de Azevedo, doutor em filosofia e reitor do Seminário Batista do Sul do Brasil, no Rio de Janeiro, os colégios confessionais exerceram um importante papel na construção da cidadania de parte importante da população brasileira. “Além disso, essas escolas eram um contraponto ao único ensino privado existente, de orientação católico-romana”, lembra Israel, que também é pastor batista. Ele ressalta ainda o papel crucial das escolas confessionais evangélicas na popularização da prática de esportes no Brasil. Com a proclamação da República, em 1889, e a consagração do Estado laico, aumentou o número de escolas confessionais no país. Hoje, segundo a Associação Brasileira de Instituições Educacionais Evangélicas (ABIEE), elas somam em torno de 900 unidades, oferecendo do maternal até o ensino superior. Para o reitor da Unasp, Euler Pereira Bahia, além de sua importância educacional, os colégios confessionais se destacam por sua abordagem: “A virtude de uma escola confessional reside em sua visão abrangente do ser humano. É por isso que ela trabalha, além da dimensão intelectual, física e social do indivíduo, o desenvolvimento dos aspectos moral e espiritual. Isso se justifica porque é difícil desenvolver uma consciência de moralidade à parte da espiritualidade”, opina. Muitas personalidades brasileiras passaram pelos bancos de instituições confessionais. Autor de Casa-Grande & Senzala, o sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, por exemplo, foi educado em um colégio batista. Da mesma forma, Ariano Suassuna, autor de O Auto da Compadecida, deu seus primeiros passos estudantis no Colégio Americano Batista. Artur da Távola, escritor, intelectual e político falecido em 2008, cursou o Colégio Batista Sheppard, no Rio de Janeiro. O ex-governador gaúcho e fluminense Leonel Brizola também estudou, na infância, em uma escola metodista. f e v e r e i r o

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Independentemente da polêmica em torno do ensino do criacionismo não só em aulas de religião, mas também nas de Ciências ou de Biologia, há o consenso de que as escolas confessionais desempenham um papel fundamental na educação brasileira. E isso não começou agora, mas em 1870, no bairro da Luz, em São Paulo, com a criação da primeira instituição de ensino protestante, a Escola América, por missionários presbiterianos. A instituição apresentava classes mistas com meninos e meninas e uma nova pedagogia, recebendo elogios do imperador D. Pedro II, que a visitou em 1876. A Escola América deu origem ao Sistema Educacional Mackenzie. Para o historiador José Carlos Barbosa, os protestantes foram os principais responsáveis pela inclusão da educação na agenda do país. “E não podia ser diferente, já que para ser protestante era necessário ter um mínimo de escolaridade a fim de ler a Bíblia”, observa. Barbosa lembra que, no Rio de Janeiro de 1837, os crentes metodistas criaram a primeira escola dominical do país, precursora de muitas outras experiências educacionais da denominação. Além das classes mistas, as escolas confessionais foram responsáveis por trazer outras mudanças, como destaca o historiador: “A primeira delas é referente à educação da mulher, que não tinha espaço na sociedade brasileira. A criação de um colégio para educar mulheres foi uma coisa ‘escandalosa’ e ajudou a própria sociedade

O Instituto Presbiteriano Mackenzie, de São Paulo: tradição centenária

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Sala de casa, sala de aula

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Cléber Nunes, com os filhos Davi e Jônatas: decisão de educar filhos em casa contestada na Justiça

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Família mineira luta pelo direito de educar filhos fora da escola

Insatisfeitos com a educação que os filhos recebem na escola, muitos pais, principalmente cristãos, vêm optando por ensiná-los pessoalmente, em casa. Esse movimento, conhecido internacionalmente como homeschooling (“educação em casa”), é ancorado pela discordância das famílias com os valores morais transmitidos nos currículos e no ambiente escolar, bem como o temor do aumento da violência e do uso de drogas entre os estudantes – além, é claro, da preocupação com o baixo rendimento dos alunos. Segundo estimativas de 2007 do Instituto Nacional de Pesquisas da Educação em Casa, só nos Estados Unidos já são mais de 1,5 milhão de crianças sendo educadas longe das instituições formais de ensino. Mas diferentemente do que ocorre lá e em países como Inglaterra, Austrália e Canadá, onde a prática é aceita e até bem vista, no Brasil, os pais que retiram seus filhos da escola são levados à Justiça e processados, inclusive criminalmente. É que a legislação brasileira consagrou a obrigatoriedade da educação para todos os cidadãos, prevendo punição aos pais que, por negligência, não matricularem seus filhos na escola. É o chamado abandono intelectual, crime previsto no Código Penal. A decisão de dar aos filhos uma educação diferenciada, em casa mesmo, requer a disposição para enfrentar o Estado. É o que está acontecendo a uma família cristã de Timóteo, cidade mineira a 215 quilômetros de Belo Horizonte. Há três anos, o casal Cléber e Bernadeth Nunes resolveu tirar os filhos Davi, 15, e Jônatas, 14, da escola para poder educá-los em casa. Na época, os garotos estavam, respectivamente, nas 6 ª e 5ª séries do ensino fundamental. A decisão veio após um período vivendo nos Estados Unidos, onde Cléber, que é designer autodidata, conheceu a experiência. Após um ano com os filhos fora da escola, o casal mineiro foi denunciado ao Conselho Tutelar por um conhecido e desde então vem lutando para que sua opção seja reconhecida pelo Estado. “Essa é uma luta da família brasileira”, sintetizou Cléber à reportagem de CRISTIANISMO HOJE. Acima da média – Segundo a Associação Americana de Defesa Legal da Educação Escolar em Casa (HSLDA, da sigla em inglês), cerca de 100 famílias vêm fazendo o mesmo no Brasil, mas na clandestinidade, para não sofrer retaliações do poder público. Na briga com o Ministério Público e a Secretaria de Educação de Minas Ge-

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rais, os filhos de Cléber chegaram a ser submetidos, por determinação da Justiça, a uma maratona de provas criadas por uma banca de 16 professores para averiguar seu nível de conhecimento. Mesmo com pouco tempo para estudar o material exigido, Davi e Jônatas tiveram êxito e conseguiram ficar acima da média obtida pelos alunos da rede pública. Antes disso, para demonstrar que o desenvolvimento intelectual dos meninos não estava comprometido, Cléber os inscreveu no vestibular da Faculdade de Direito de Ipatinga, onde eles foram aprovadas com excelentes colocações: em 7° e 13° lugar. O caso dos Nunes não é a primeiro a ir parar na Justiça brasileira. Em 2001, o procurador da República Carlos Alberto Vilhena Coelho, de Anápolis (GO), entrou com um mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para garantir o direito de educar os seus três filhos em casa, mas não obteve sucesso. Apesar dos bons resultados nos testes aplicados aos meninos, a família Nunes ainda não conseguiu que eles fossem usados em sua defesa na Justiça. O casal já perdeu nas primeiras instâncias do processo civil e agora a discussão chegará ao Supremo Tribunal Federal (STF). O processo criminal ainda está sendo julgado na primeira instância, aguardando o depoimento de testemunhas. Para que o ensino em casa seja reconhecido, os deputados Henrique Fonseca (PT-AC) e Miguel Martini (PHS-MG) apresentaram no ano passado uma proposta que muda a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Segundo o Projeto de Lei 3.518/08, que está na Comissão de Educação e Cultura, a educação doméstica poderá ocorrer se for feita exclusivamente pelos pais ou representantes legais, mediante uma licença do governo. Ainda pelo projeto, a educação ficará restrita ao ensino básico e os alunos serão avaliados anualmente por uma escola, de acordo com as diretrizes fixadas pelo Ministério da Educação. Se os testes demonstrarem que o rendimento escolar não é suficiente, a licença poderá ser revogada. Para o deputado Martini, já existe pressão pela não-aprovação do projeto. No seu entender, o que está acontecendo com a família Nunes é um absurdo. “Se o resultado é bom, por que punilos?”, questiona. “Em outros lugares, a educação em casa já provou que funciona”. O parlamentar defende que haja um debate nacional sobre a questão, envolvendo educadores, legisladores e representantes da sociedade.



First published in Christianity Today, copyright © 2008. Used by permission, Christianity Today International

Juntando os cacos Igrejas hispânicas nos EUA enfrentam a crise das hipotecas e reformulam ministérios para socorrer fiéis que perderam tudo

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Ele e a mulher receberam ajuda de uma grande igreja em San Jose, que os colocou em contato com uma agência de hipotecas. Murillo e os agentes eram amigos, e, em 2003, o pastor arrendou um grande prédio para a congregação. Um ano depois, obteve um empréstimo para a compra de sua primeira casa. Uma igreja localizada em um bairro pobre não é garantia segura para um banco, mas naquela época, obter empréstimos, mesmo sem boas garantias de quitação, era fácil. Podia-se fazer pagamentos mínimos, apenas dos juros, e rolar o financiamento por mais dez ou 20 anos. “Atravessamos o inferno” – O agente de Murillo alertou-o sobre os perigos. O aumento dos juros poderia ser mais alto que os pagamentos mínimos que ele faria. Se os pagamentos não fossem honrados, o exercício da dívida seria somado ao saldo credor, resultando em um aumento dramático dos pagamentos restantes. “A minha fé superou os riscos”, diz Murillo. “Nós fomos cheios de fé e entramos no refinanciamento.” Mas em novembro de 2008, o Departamento de Justiça anunciou que havia começado a investigar se o World Savings Bank, agência gestora da hipoteca, estava envolvida em empréstimo predatório. Logo os ajustes do empréstimo feito por Murillo começaram a dar os primeiros sinais da tragédia que se avizinhava. “Em junho de 2004, compramos nossa casa pagando mensalidades de US$ 1.150. Este valor aumentou para US$ 2.200 em 2006”, Murillo perdeu a casa e lembra o pastor. “Todavia, se a a propriedade onde sua receita da igreja permanecesse congregação se reunia: “Como a mesma, nós estaríamos bem”. disse Jó, eu vim nu ao mundo”

GARY F ONG / GENESIS P HOTOS

O pastor Johnny Murillo tem sido frequentemente solidário com os membros de sua congregação no Centro Cristão de Adoração, em Sacramento, Califórnia (EUA). Mas quando um dos fiéis foi ao seu escritório no Natal de 2006, em pânico e desesperado para livrar seu lar da execução da hipoteca, levou um susto. “Sei pelo que você está passando”, Murillo lhe disse. “Existe uma saída”. Ele realmente sentia o drama na própria pele e acreditava que havia uma solução. O problema é que, naquele momento, ele não sabia qual era. Sem que ninguém soubesse, Murillo também estava enfrentando problemas com a hipoteca. Mas não apenas a sua casa estava ameaçada. A igreja também estava lutando para pagar as prestações da propriedade onde se reunia. Na Califórnia, assim como em muitos outros estados americanos, o índice de execuções de hipotecas de casas está subindo, enquanto os preços despencam. A queda nacional dos preços imobiliários foi de 11% de um ano para cá, alavancando um aumento nas vendas de casas. Em Sacramento, a situação ainda é bem pior que em outras áreas. Casas estão sendo vendidas a 37% menos do preço praticado um ano atrás, e o valor das hipotecas está mais de três vezes acima da média nacional. A região teve 3.640 hipotecas executadas até outubro de 2008, quando a crise no mercado financeiro americano começou a sobressaltar o país e o mundo. Os líderes cristãos ao redor da nação admitem que não estavam preparados nem para Crise a repentina desvalorização das moradias nem para a implosão do crédito. Ninguém, de fato, estava. Mas, muitos deles têm descoberto durante esse período de sofrimento como a Igreja, como corpo de Cristo, funciona como um lugar de último recurso – mesmo para seu próprio clero e membresia – em tempos de emergência econômica. Parece uma oportunidade dada aos líderes para desenvolver um novo senso de esperança. “Como disse Jó, eu vim nu ao mundo”, diz Murillo. Seu pai era um alcoólatra compulsivo que morreu atropelado por um trem. O padrasto entrava e saía de prisões por ser membro de uma máfia mexicana e terminou assassinado quando o garoto tinha 11 anos. Murillo e seu irmão uniram-se a uma gangue local, os Barrios Libre Locos, antes de conhecerem Jesus. O grupo de delinquentes foi seu primeiro campo missionário. Vários membros da gangue acabaram tornando-se pastores. O jovem Murillo tornou-se um ministro fundou sua igreja para alcançar os pobres mais pobres.


TONY CARNES

O pastor Dan de León fala Acontece que os membros do Centro Cristão de nifestações de alívio dos membros da igreja que, aos membros de sua igreja: Adoração, que nos melhores tempos chegaram a então, souberam que as suas lutas e dores haviam membresia foi atingida 150 pessoas generosas nas contribuições, começasido comuns. Desde então, todos têm se empeem cheio pelo estouro do ram a perder seus empregos. E os crentes comenhado sobre como manter a retidão em relação mercado imobiliário çaram a perder também suas casas – para muitos, às finanças. “As pessoas que perderam suas casas as primeiras adquiridas em suas vidas. ficaram zangadas com Deus”, reconhece Murillo. “Agora, eles Murillo conseguiu resistir mais um ano, sempre esperando se sentem fortalecidos. Nós atravessamos o inferno, mas vimos o milagre. “Ele nunca aconteceu”, lamenta. Logo começaram o céu no final”. as cartas e os telefonemas ameaçadores. Os banqueiros estavam inflexíveis em não fazer nenhum acordo sobre o emprésti- Decadência – Em Santa Ana, uma vila de operários em Orange mo, pois, àquela altura, o rombo no sistema de financiamentos County, ali mesmo na Califórnia, os sinais do inferno ainda são habitacionais nos Estados Unidos já era evidente. De uma hora aparentes. Lee de León atua como ministro auxiliar do Templo para a outra, as perdas do setor superaram um trilhão de dóla- Calvário, uma mega-igreja latina com 5,5 mil membros e mais res e a quebradeira começou. de mil famílias, enquanto seu irmão, Dan, é pastor titular. Por No fundo do poço, debaixo de todas as fusões de bancos e ali, os bons ventos econômicos que sopravam desde a década de títulos, prostrava-se o pastor Murillo, que estava tão envergo- 1990 fizeram os crentes prosperarem. Em Camille Street, um nhado por suas dívidas que começou a pensar se deveria tirar bairro residencial, centenas de casas enfeitadas com pinheiros, a própria vida. “Eu não estava arriscando apenas a nossa casa, bougainvilles e gramados verdinhos chegaram a ser comerciamas a casa de Deus também”, diz ele. Ele estava lutando para lizadas por 650 mil dólares a unidade durante a bonança financonseguir dinheiro para comprar cada litro de leite. Quando al- ceira. “Os compradores oraram pela compra das casas em 2003, guém deixava mantimentos em sua porta, ficava dominado pela compraram-nas em 2004 e as consagraram em 2005”, diz Lee. gratidão e pela tristeza. “Tentamos tudo. Vendemos fogos de arGrandes bancos em Nova York, Londres e outros centros tifício, biscoitos, tudo o que você pensar”. Finalmente, em 11 de financeiros pediam cerca de bilhões em empréstimos. A indúsjunho de 2008, Murillo foi cambaleando até a Corte Superior de tria financeira recondicionava esses empréstimos e os vendia a Sacramento para entregar suas chaves. Era o fim de seu lar. Ele investidores que, por sua vez, faziam bilhões em comissões e orou para que não fosse também o fim de seu ministério. Sem taxas de negócios. Os tempos não eram generosos apenas para lar, o pastor e a família abrigaram-se com parentes em Nevada. os bancos: muitos dos novos compradores da igreja podiam faSentiu o coração apertar diante da pergunta do caçula de seus zer jogadas com suas casas, vendendo-as com lucros de 100%. três filhos: “Papai, por que temos que nos mudar?” Lembrou-se “Foi um período eufórico”, comenta o pastor Lee. A econoda conclusão do raciocínio de Jó: “Voltarei nu para o Senhor.” mia estava crescendo rapidamente, e a igreja avançava. Um núHoje, a igreja de Murillo reúne-se numa escola secundária. mero recorde de pessoas estava sendo salvas. Agentes imobiliPassado o trauma inicial, tanto o pastor como outras famílias ários e de empréstimos dentro da igreja promoviam a compra da igreja estão alugando casas e ninguém mais está sem teto. O de terrenos e agenciavam construções. Aproximadamente 30% que a congregação tem em comum é a tragédia – mas também da congregação tinham hipotecas. O Templo Calvário lançou uma boa dose de honestidade e humildade recém-adquiridas. uma campanha de US$ 60 milhões para obras e ampliação do O líder compartilhou suas próprias lutas e foi cercado por ma- ministério. Os irmãos pastores estavam absorvidos com a ges

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Seminário de finanças – Depois de sobreviverem aos piores momentos, os pastores dizem que têm aprendido lições de teologia prática e de liderança pastoral. No norte da Califórnia, o pastor Eva Rodriguez, amigo de Murillo, faz um mea culpa: “Deveríamos ter ficado mais atentos. Mas nossa igreja tem sido encaixotada pela teologia e pela cultura hispânica, onde você não tem permissão para falar sobre finanças”, observa. Algumas igrejas que tinham financiamento de seminários entregaram-nos para as pessoas da igreja. Mas, frequentemente, essas igrejas não avaliaram as pessoas para que pudessem separar os que estavam honestamente interessados em ajudar, daqueles que apenas queriam expandir a sua clientela através das comunidades evangélicas. Vale lembrar que a chuva – de juros, no caso – cai sobre justos e injustos igualmente. “Nosso método para criar grupos levantou uma questão. Alguns de nossos próprios banqueiros caíram em sua armadilha”, alerta o pastor Lee. “Um banqueiro me disse que comprou casa e dois condomínios para alugar e simplesmente perdeu tudo.” Neste início de 2009, os pastores hispânicos dos EUA esperam reunir as lições que aprenderam. Através da Conferência de Liderança Cristã Hispânica, estão elaborando um plano para enfrentar a crise. Além de alertar as pessoas interessadas em comprar casas e evitar problemas com empréstimos, a idéia é iniciar um fundo para caridade a fim de ajudar famílias e igrejas na bancarrota. 22

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Divulgação

Casa à venda: Enquanto isso, em Nova Iorque, uma execução de hipotecas igreja de predominância negra do Quefez despencar preços ens, o Tabernáculo Evangélico Betel do no mercado imobiliário Sul da Jamaica, está situada no ponto zero, a nordeste da área mais afetada pela recessão. Lá existem mais casas com hipotecas executadas ou próximas disso do que em toda a cidade de Nova Iorque. Das 2 mil famílias da igreja (algumas delas com membros que trabalham em Wall Street), menos de cinco sucumbiram. O bispo Roderick Caesar está longe de ser convencional. “A igreja precisa fazer com que as pessoas cresçam com fé e hábitos, não apenas sendo cristãos de duas horas por semana”, defende. Nos últimos dez anos, ele sempre encontrou espaço em seus sermões para pregar contra a questão das hipotecas. A congregação pode recitar de cor os quatro pontos do credo de Caesar sobre o uso do dinheiro: “Entregue o dízimo e pague as contas em dia”; “Poupe e invista”; “Gaste com sabedoria dentro de seu orçamento”; e “Nunca compre aquilo de que você não precisa”. Além disso, o líder trabalha individualmente os membros da igreja que estão à deriva, em meio aos destroços do mar de sonhos perdidos. “Nós, na igreja, devemos nos juntar e resgatar os cristãos que estão em apuros”, pontifica. Um resgate semelhante está ganhando força na Califórnia. Ele combina evangelismo e assistência financeira. A Life Inner City, em Los Angeles, está lançando uma parceria com outras 120 igrejas para uma chamada de fé: “Assistência aos casos de hipotecas executadas no bairro”. O ministério fornece uma lista das pessoas com problemas com financiamentos imobiliários ao redor da igreja e treina os crentes para visitarem cada família atingida, oferecendo orações e seminários de aconselhamento sobre finanças pessoais. O líder do movimento, Ken Frech, diz que a maioria das pessoas da área de Los Angeles não vê a igreja como um lugar para procurar quando a execução das hipotecas se aproxima. “Elas vêm para a igreja depois de já estarem na rua”, diz. “E como a Igreja pode ser relevante para a nossa situação? Simplesmente, trazendo um cristianismo radical que vai até as raízes das catástrofes pessoais do povo.” Em Santa Ana, os irmãos León estão planejando seminários para hispânicos em risco de execução. Tais eventos vão envolver bancos, companhias hipotecárias, conselheiros financeiros cristãos e advogados. A igreja está trabalhando com uma equipe confiável junto às pessoas a fim de manter afastado o tubarão das hipotecas. O pastor Lee diz que a credibilidade deles está baseada numa nova realidade: “Nós passamos por tudo isso e voltamos nossas vidas para Cristo”.

Tradução: Ana Maria Rocha Neves

tão do complexo empreendimento, levantando dinheiro e sem tempo para ver a tempestade no horizonte. Até pouco tempo, os frequentadores do Templo Calvário não tinham idéia de que estavam tão próximos do epicentro de uma crise financeira global. Os agentes de empréstimos diziam aos clientes que eles não precisavam de advogados e frequentemente – soube-se depois – lhes davam informações falsas. O “sonho americano” ruiu num redemoinho de fraudes e manobras incompetentes do mercado. Agora, Camille Street tem um dos maiores índices de hipotecas executadas do país, triplicando em menos de um ano. Ratos correm sob os pinheiros ressecados que cercam as casas. Os gramados estão destruídos e as fachadas dos imóveis mostram que evidentemente precisam de reparos. Os tiros que podem ser ouvidos são de policiais perseguindo suspeitos de crimes como furtos e roubos. As gangues de rua utilizam as casas abandonadas como esconderijos e para festas noturnas. Quatro pessoas foram mortas ali ano passado. Muitas famílias ficaram sem casa por algum tempo e agora alugam imóveis ou vivem nas casas de familiares ou irmãos da igreja. O pastor Lee recorda a dedicação espiritual dos primeiros desses antigos proprietários, as orações dos membros das famílias por suas casas e a tensão nos empregos – e, por fim, a impossibilidade de pagar os juros altíssimos. Nos últimos 18 meses, os irmãos León viram o desespero e a vergonha resultarem em expressões de raiva, alcoolismo e até suicídios. Hoje, olhando em perspectiva, conseguem enxergar que os problemas não estavam apenas na macroeconomia, aquela realidade distante dos mortais – a crise podia ser vista dentro da igreja. Lee admite que eles e outros pastores haviam baixado a guarda. “Nós dormimos ao volante, permitindo que nosso povo fosse saqueado”, comenta. “Nós não estávamos equilibrados quanto à mordomia”, diz o pastor. “Tínhamos todos os tipos de meios para ofertar. O que não ensinamos foi como gerir o dinheiro”.



Missões que atuam no cenário internacional são severamente abaladas pela crise

Abalo global

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Marcelo Barros

Colaboração: Joanna Brandão

Desde os últimos meses do ano passado, uma única palavra – crise – é a mais repetida mundo afora. Abalado pela quebradeira do sistema financeiro dos Estados Unidos, o mundo entrou em 2009 resignado em enfrentar um período duro, como não se via há pelo menos uma década. Em todas as latitudes, em maior ou menor grau, as economias têm suas bases afetadas pela perspectiva de uma recessão prolongada. “Uma reces-

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são começa quando investidores acreditam que a hora não é boa para investir e os consumidores crêem que a hora não é boa para consumir”, resume Gustavo Patú, jornalista especializado em economia. “E, na tentativa de proteger sua riqueza, todos empobrecem.” A crise já afeta todos as áreas da economia e, mais que isso, prejudica tremendamente o chamado Terceiro Setor, onde se inclui o trabalho missio-

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nário. As missões que dependem de envio de dinheiro para fora do país estão tendo suas atividades severamente dificultadas pela nova conjuntura global, principalmente devido à alta do dólar. A moeda americana, que até outubro passado, tinha um câmbio que não ultrapassava R$ 1,60, entrou em 2009 cotado na base de 2,5 reais. “Nossos obreiros estão sofrendo muito”, lamenta o diretor da Missão Horizontes, David

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Crianças atendidas por missão evangélica no exterior: obra transcultural está sofrendo efeitos da alta do dólar


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Botelho. Segundo ele, para manter o poder de compra das remessas de dinheiro enviadas para os missionários no exterior, seria necessário um aumento da ordem de 50% – algo impensável no momento, quando mantenedores pessoais e instituições doadoras também se debatem sob os efeitos da crise. “Infelizmente, neste contexto, o missionário se torna o supérfluo a ser cortado”, lamenta Botelho. Não é a primeira vez que a Missão Horizontes, uma das mais respeitada agências especializadas em evangelismo transcultural do país, passa por apertos devido a crises cambiais. O pastor Botelho lembra que, entre os anos de 2001 e 2002, o dólar americano deu um pulo, passando de pouco mais de R$ 1,80 para mais de 4 reais. Justamente naquela época, a agência estava empenhada no Projeto Radical Janela 10-40, mantendo 96 obreiros naquela imensa região imaginária que abrange as nações menos evangelizadas da Terra, entre a África e o Extremo Oriente. “Eu estava em Cingapura e a cada dia olhava na internet o valor do dólar, que somente subia”, lembra o diretor. “Pensamos que nossa organização iria à bancarrota, pois chegamos a ficar com um déficit de R$ 270 mil no cartão de crédito”. Ele não tem dúvidas: “Foi o Senhor que teve misericórdia de nós para a Horizontes não falir.”

social. Atualmente, o Fundo Cristão para Crianças conta com cerca de 65 mil padrinhos, sendo que quase 56 mil são estrangeiros. Beatriz Debien, responsável pela Rede de Comunicação de Resultados da organização, esclarece que não é a alta do dólar o fator que compromete a operação da entidade no Brasil, já que a maior parte dos mantenedores têm seus donativos fixados na moeda americana. “A preocupação maior está na crise mundial, pois, a partir do momento que ela atingir o chamado consumidor final, pode influenciar no apadrinhamento de crianças e adolescentes brasileiros”, teme a assessora. “No setor agrícola, por exemplo, existe a opção de aumentar ou diminuir a produção conforme a movimentação do mercado financeiro mundial. Porém, no Terceiro Setor, isso não é possível”, aponta. “Os programas do órgão não podem ampliar e, pouco tempo depois, cortar o número de crianças e famílias atendidas pelos projetos sociais patrocinados pelo seu sistema de apadrinhamento”, lembra Rodrigo Leite, coordenador de Marketing e Mobilização de Recursos do Fundo Cristão para Crianças. Até o momento, o CCF afirma que ainda não tem registros que alertem

Contando prejuízos – Até mesmo os projetos e as missões que contam com doações em dólar começam a temer a crise. O Fundo Cristão para Crianças (CCF, na sigla em inglês) é um exemplo. A organização internacional desenvolve no Brasil programas voltados para a educação, saúde, meio ambiente e geração de emprego e renda em 760 comunidades rurais e urbanas do país. Suas ações são patrocinadas por meio de doações, parcerias com empresas, fundações e institutos e, principalmente, através de apadrinhamento de crianças e adolescentes em situação de risco

David Botelho teme queda de mantenedores: “Nesse contexto, o missionário é o supérfluo a ser cortado”

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para o aumento de cancelamentos de padrinhos estrangeiros em função da crise. “Mas estamos monitorando nossos indicadores para o caso de haver necessidade de adotar medidas estratégicas”, explica Karina Miranda, assistente do setor responsável pelo relacionamento entre padrinhos e crianças. A organização acredita que, se houver uma maior adesão de mantenedores, empresas e parceiros brasileiros à causa, poderá se prevenir contra o impacto que pode vir a ser causado pela crise mundial. Panorama sombrio – Especulações são feitas a todo momento acerca de quanto tempo ainda durará a crise. Os economistas parecem concordar que, para tanto, a economia americana precisa primeiro voltar a crescer novamente e sair da recessão. Todavia, nem mesmo os mais otimistas prevêem que isso possa ocorrer antes do fim de 2009. Enquanto isso, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (OCDE) sinaliza, em relatório, que o número de desempregados no mundo deve aumentar entre 20 a 25 milhões de pessoas até 2010 por conta da crise econômica. O panorama é sombrio. Segundo a organização, a maioria dos países vai enfrentar uma recessão severa e prolongada, que pode se estender além desta década. Na mesma toada, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que a crise global possa acarretar um recorde histórico de mais 210 milhões de pessoas desempregadas até o fim deste ano, um desastre social de consequências imprevisíveis. Em meio a tantos números e estimativas assustadores, ainda existem os que preferem confiar em outras forças além do mercado. O diretor da Missão Josué, Charles Eduardo, sabe que a disparada do dólar e a recessão dificulta o envio e a manutenção de missionários no campo, mas crê que o Senhor vai continuar suprindo as necessidades de sua organização. Ele é categórico: “O dono da obra é Deus. Cremos na sua providência”, vaticina. O diretor da Missão Horizontes também acredita que é preciso recorrer ao socorro do alto. “É hora de orar por um milagre para os missionários brasileiros”, apela David Botelho. 2 0 0 9

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Fé no Brasil Diante da crise global, pastores lembram encontro no Palácio do Planalto em que o crescimento do país teria sido profetizado Marcelo Barros

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diretor da Visão Mundial; Valnice Milhomens, apóstola da Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo, com sede em São Paulo; e a cantora Baby do Brasil, pastora do Ministério do Espírito Santo de Deus em Nome de Jesus. Após uma breve oração e a bênção apostólica, impetrada por Ariovaldo, Valnice se aproximou de Lula e lhe disse em particular: “Tenho jejuado pedindo a Deus que o abençoasse já há alValnice Milhomens: “Pa´s não sofrerá grandes abalos”

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guns anos. E o Senhor me disse que irá abençoar o Brasil através do seu mandato como nunca antes na história dessa nação”. A cena foi testemunhada pelos outros três evangélicos presentes, que nada disseram apesar da surpresa: “Ela disse como se estivesse conversando baixo com ele. Não fez alarde nem usou nenhuma entonação grandiloquente”, lembra o pastor Ariovaldo. “Nós, que temos o conhecimento do que é uma profecia, ficamos muito surpresos”, comenta. Na ocasião, Baby também entregou ao presidente a sua própria mensagem. “Deus também havia falado comigo semanas antes. Eu já conhecia o Lula há bastante tempo, e até envieilhe um telegrama sobre isso. Disse a ele na mesma reunião com a Valnice que o país viveria um período de prosperidade sem par porque o Senhor era com o presidente.” A artista até sugeriu a Lula que retirasse todas as imagens religiosas do Planalto. Coincidência ou não, o governo Lula experimentou a partir dali uma série de sucessos, melhorando a performance que já havia sido boa no primeiro mandato (2003-2006). Aproveitando-se de uma conjuntura internacional amplamente favorável, a economia brasileira, de 2007 até o terceiro trimestre do ano passado, tornou-se bem mais consistente. O PIB chegou a crescer 5%, o nível de renda

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Há exatos dois anos, no início do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as perspectivas econômicas do país eram bem diferentes das de agora. Saboreando um período de prosperidade que já durava quase cinco anos, alavancado pelo crescimento global, o governo esfregava as mãos diante das possibilidades do futuro. A cena contada a seguir passou-se numa tarde, no interior do gabinete presidencial no Palácio do Planalto, em Brasília, após uma reunião de Lula com líderes evangélicos das mais variadas denominações. Proposta pelo próprio presidente, a conversa tinha por objetivo ouvir as reivindicações e ideias dos representantes da Igreja Protestante no país para a realização de um trabalho conjunto com o governo federal. A intenção era elaborar um plano de ações que beneficiassem a nação, sobretudo na esfera social, uma antiga bandeira evangélica. Após o encontro, a então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva – crente ligada às Assembléias de Deus –, recebeu um pedido de Lula: o chefe do Estado brasileiro gostaria que alguns dos religiosos presentes orassem por ele. Foram recebidos então na sala presidencial, além da própria Marina, o pastor batista Ariovaldo Ramos, na época membro do Conselho de Segurança Alimentar da Presidência da República (Consea) e

Ricardo Stuckert / Presidência da República

Colaboração: Joanna Brandão


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O presidente Lula no in´cio de seu segundo mandato: pastores fizeram previsões otimistas sobre o futuro do Brasil

e consumo da população aumentou na casa dos dois dígitos e os postos de trabalho formal avançaram 5,8% em um ano. Segundo dados do Banco Central, as exportações saltaram do equivalente a US$ 73 bilhões, em 2003, para US$ 160 bilhões, no ano passado. Em 2007, o Brasil teve um superávit recorde de mais de US$ 46 bilhões; no ano seguinte, também fechou no azul, com cerca de 25 bilhões de dólares. Além disso, setores fundamentais para o crescimento do país, como o energético, se fortaleceram – a produção de etanol se consolidou e a Petrobras bateu recordes sobre recordes na produção de petróleo, além da descoberta de mega-jazidas na costa brasileira. Seria o tal espetáculo do crescimento, tão alardeado por Lula? Campeão de popularidade, o presidente chegou ao fim de 2008 a quase 80% de avaliação positiva – patamar jamais al-

cançado por um presidente desde a redemocratização do país, exceto por José Sarney durante o Plano Cruzado, em 1986, que logo se revelaria uma fraude eleitoral. “Furacão” – Mas o que difere uma profecia legítima da chamada “profetada”, aquela previsão espiritual feita mais na base do exagero do que da verdadeira orientação de Deus? “O cumprimento do que foi predito”, define o pastor Ariovaldo Ramos. É exatamente neste ponto que reside o perigo das previsões. Fundador do Ministério Jesus Não Desistiu de Você, com sede em Belo Horizonte (BH), o pastor Sinfrônio Jardim Neto, de 50 anos, diz que boa parte dos crentes

O pastor Ariovaldo lembra do clima do encontro: “Ficamos surpresos com o que foi dito”

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que seu ministério tenta trazer de volta à Igreja, em 15 anos de existência, é de gente frustrada com Deus por não ter recebido a bênção prometida: “Quase sempre as revelações são relacionadas à cura ou à prosperidade. Quando as profecias não vêm de Deus e nada acontece, o indivíduo que, em geral, não tem maturidade na fé culpa Deus pelo ocorrido e se afasta da igreja” diz o pastor, que narra parte dessas experiências em seus livros Voltei agora e Onde está o seu irmão?, ambos publicadas pela Editora Betânia. Sinfrônio diz ainda que já viu gente doar casa e carro esperando Deus “retribuir” a oferta calcada em profecias sem fundamento. Neste sentido, talvez seja precipitado considerar que aquele encontro no Palácio do Planalto tenha de fato sido decisivo na situação do país – ainda mais porque, há cinco meses, o país se vê às voltas com a mais assustadora crise mundial das últimas décadas. Ainda não se sabe quais serão seus efeitos sobre o país no médio e longo prazos, mas por enquanto o solavanco global tem afetado setores específicos da economia nacional, como a oferta de crédito. Existe a expectativa de que, tanto aqui como lá fora, 2009 seja um ano duro, constrastando com o longo período de bonança que durou até setembro passado: “A profecia da apóstola Valnice se referia exclusivamente ao Brasil. Por enquanto, na minha maneira de ver, estamos muito bem. Há até uma previsão de crescimento de 4% para 2009, ao contrário da perspectiva do resto do mundo. Há alguns anos, uma crise global teria jogado o Brasil no buraco” analisa Ariovaldo Ramos. Procurada novamente pela reportagem, Valnice Milhomens informou por meio de sua assessoria que não comentaria a profecia com a revista, mas tem dito em pregações que acredita que o furacão mundial vai passar sem pôr abaixo as esperanças brasileiras. “Ela não nega o que disse ao presidente, mas não quer falar, pois alega que suas palavras são frequentemente deturpadas pela mídia”, afirmou a pastora Ana Charlene Ribeiro, da Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo. Já a sempre animada Baby do Brasil é enfática: “Pode crer que esta crise não vai nos prejudicar. Pode até derrubar a nação mais poderosa do mundo, mas não a gente.” É esperar para ver. 2 0 0 9

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Espiritualidade Ricardo Agreste teólogo e escritor

Ano novo sem resoluções

Pensava que ninguém podia iniciar um ano sem traçar metas e caminhos

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ra sexta-feira, 2 de janeiro, a segunda manhã de um novo ano. Em casa, todos ainda estavam dormindo. O silêncio se contrastava com a intensidade dos últimos dois dias. Parentes e amigos haviam nos presenteado com a oportunidade de tê-los em nossa nova casa nas celebrações da passagem de mais um ano. Com isso, meu tempo havia sido consumido nos preparativos, na recepção e no esforço de prover a todos o tempo mais agradável possível. Somente naquela manhã, passadas as comemorações da véspera, consegui entrar no escritório para aquietar-me diante de Deus e refletir sobre os desafios do ano novo. Enquanto minha alma se silenciava na presença de Deus, os rumores das muitas vozes que nos últimos dois dias haviam demandado minha atenção iam gradativamente se dissipando. Seria impossível ouvir ao Senhor sem primeiramente aquietar minha alma. Pouco a pouco, fui tomado por um sentimento de profundo prazer sem que qualquer palavra fosse pronunciada por mim. Em absoluto silêncio, senti-me acolhido por Deus e convidado a descansar em seus braços. Contudo, permanecia preocupado – eu ainda não fizera os costumeiros planos de boas intenções e necessárias ações para com a vida pessoal, familiar e profissional. Afinal, pensava, ninguém pode iniciar um ano sem boas metas a serem alcançadas e sem determinar caminhos a serem percorridos. Enquanto insistia em “refletir”, sem muito sucesso nos resultados, fui sendo convencido de que aquela inquietação não era fruto de qualquer demanda de Deus, mas sim da minha própria alma. Da parte do Senhor, parecia mais do que suficiente o simples fato de eu estar silenciosa e intencionalmente em sua presença. Fui sendo convencido de que os oito anos anteriores, tendo iniciado uma nova igreja e vendo-a crescer de maneira um tanto surpreendente, haviam gerado em mim um grande cansaço e, consequentente, a necessidade de um tempo de descanso no amor de Deus. Não considero errado ou pecaminoso aproveitar o início de um novo ano para avaliação da vida no passado recente e definição de prioridades para os doze meses seguintes. Além disso, concordo plenamente com aqueles que afirmam não existir um momento mais propício para tanto do que as tradicionais viradas de ano. Só que este tipo de exercício se tornou, ao longo dos anos, uma espécie de ritual para mim. Passei a fazê-lo como parte integrante de meu

exercício de devoção a Deus, desejoso de ouvi-lo e obedecê-lo, constantemente alinhando meu foco à sua vontade. No entanto, naquele exato momento deparei-me com um cenário completamente diferente. Por mais que insistisse com Deus sobre a necessidade de avaliar e planejar, ele me convidava a simplesmente estar e descansar. Lembrei-me então das palavras do Salmo 62.1-2, que fala sobre esse descanso na presença do Eterno. Sim, quando permanecemos em Deus, estamos numa rocha alta e firme. Os braços do Senhor nos são uma torre segura. Logo, posso não saber o que emergirá diante de mim no futuro, mas o que importa é onde me encontro no presente. Eu não preciso saber para onde estou indo, se quem está no controle é o próprio Deus. Neste caso, minha tarefa é apenas estar com ele e descansar no seu cuidado para comigo. Foi assim que, para o escândalo de muitos, iniciei este 2009 como um dos anos mais “sem propósito” e “por acaso” de minha vida. Não tenho claro em minha mente se existem grandes mudanças que devo efetuar, muito menos se existem novos projetos nos quais devo me envolver; tampouco estabeleci grandes metas pessoais, familiares ou profissionais. Envolvido pelos braços fortes e amorosos de Deus, fui convidado a simplesmente estar e descansar. Entendi que este era o projeto de Deus para minha vida no ano que se iniciava. Mas, para não deixar por demais desesperados os superativos como eu, ou gerar um espanto demasiado àqueles que me cercam e bem me conhecem, preciso concluir dizendo que estar em Deus e descansar em seu amor não torna nossas vidas vazias, sem trabalhos ou demandas. Se assim o fosse, a vida de Jesus, descrita nos evangelhos, teria sido bem diferente. O que muda é a fonte de onde emanam as forças para os desafios que emergem e as adversidades que nos assaltam. Para mim, entrar em um novo ano com o desafio de estar em Deus e descansar no seu amor significa viver intensamente, deixando que a graça e o amor do Pai sejam tão presentes em minha vida que transbordem, envolvendo tudo o que faço e todos que me cercam. E fazendo minha uma das orações de Bernardo Clairveaux: “Pai, faça-me represa do teu amor. Não peço para ser canal, pois passa por períodos de seca; mas que eu seja represa do teu amor que alaga e inunda a todos ao meu redor, a partir do meu coração.”

Por mais que insistisse com Deus sobre a necessidade de avaliar e planejar, ele me convidava a simplesmente estar e descansar em sua presença

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Teens de visão

Austin Gutwein com crianças de Zâmbia: arremessos de basquete em favor dos órfãos africanos

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Contrariando o estereótipo de alienação da juventude, adolescentes criativos e engajados levantam fortunas para trabalhos sociais na África

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Mark Moring

O que podem ter em comum um adolescente americano lhe agradeceram diante de uma multidão de mais de mil de classe média, instruído e próspero, com uma criança pessoas. “Eu estava sem fôlego”, admite o rapaz. miserável de Zâmbia, na África, cuja única perspectiva Em 2007, com mais de 5 mil colaboradores em todo o é a morte pela fome ou pelos efeitos do vírus da Aids? mundo, Hoops of Hope angariou mais de 200 mil dólares Nada, na maioria das vezes – ou tudo, no caso um jovem para a construção de um laboratório médico e um centro dotado de um incomum espírito de solidariedade cristã. de aconselhamento no país africano. Neste ano, a organiFundador do ministério Hoops of Hope (“Gritos de espe- zação almeja levantar dinheiro suficiente para construir rança”), Austin Gutwein aos nove anos de idade resolveu uma outra clínica em Zâmbia, com foco na prevenção da sair da acomodação do american way of life para fazer algo transmissão do vírus da Aids de mãe para filho, uma das de concreto em favor de uma multidão de pessoas cujos principais causas de mortalidade infantil. “A prevenção nomes não é capaz de declinar. Capitão do time de bas- é parte importante de nossa missão”, continua Gutwein. quete da escola, ele é um jogador mediano, “Em primeiro lugar, queremos prevenir que daqueles que só acertam a metade de seus crianças fiquem órfãs. Queremos também Solidariedade arremessos livres. Mas a cada lance, acerque os soropositivos recebam tratamento tando ou não a cesta, ele levanta fortunas em adequado. E queremos que eles aprendam doações para crianças zambianas órfãs da Aids. sobre o amor de Cristo”. O Hoops of Hope foi fundado há 5 anos e usa a linguaMilhares de outros adolescentes e jovens estão se gem universal do esporte a paixão americana pelo basquete inscrevendo para participar do Hoops of Hope. Quando para levantar fundos. Nos últimos quatro anos, o ministé- é convidado para conferências, Austin Gutwein diz às rio arrecadou e enviou à África nada menos que meio mi- meninas: “Vocês não têm que mudar o mundo. Você só lhão de dólares. O sistema é simples – uma rede de man- muda o mundo através de uma pessoa”. Ele faz questão de tenedores, pessoas físicas ou empresas, pagavam cada vez não criticar as questões políticas ou morais envolvidas na que o rapaz lançava bolas ao cesto. Em um único dia, ele disseminação do vírus HIV. “Enquanto crianças, nós não fez nada menos que 2.057 lances livres, todos devidamente nos preocupamos a respeito do porquê e como uma pesremunerados. Levantou US$ 3 mil e apadrinhou oito ór- soa contrai a doença”, ele diz. “Tudo o que nós, crianças, fãos africanos através da Visão Mundial. Esta agência de queremos fazer é ajudar outras crianças”, enfatiza. ajuda começou a anunciar a Hoops of Hope e pessoas ao redor do mundo começaram a apoiar seus eventos. Famosa para servir – Ao contrário do que se possa imagiGutwein resolveu entrar pelo caminho do amor prá- nar, a alienação e o individualismo não são a característitico aos nove anos de idade, após assistir a um filme da ca principal dos adolescentes americanos. De acordo com Visão Mundial sobre a Aids na África. O vídeo mostra- um estudo feito em 2005 pela Corporation for National and va uma garotinha da Zâmbia que havia perdido seus pais Community Service, aproximadamente 15,5 milhões de tepara a epidemia. “Ela estava sozinha vivendo dentro de ens – 55% do total – participam de atividades voluntárias. uma cabana de barro, encolhida sob uma lona, na chuva”, O número de pessoas nesta faixa etária que aderem ao volembra. Ele assistiu ao programa na companhia dos pais luntariado é quase duas vezes maior, por exemplo, do que o e da irmã Brittany, de 13 anos, em sua casa em Mesa, no de adultos envolvidos em ações sociais. Arizona. “Era incrivelmente triste. Eu comecei a pensar Os jovens voluntários somam mais de 1,3 bilhões de em como seria a minha vida se eu perdesse os meus pais, e horas de serviços comunitários a cada ano. Muitos dos eu nem conseguia imaginar isso. Senti-me como se Deus serviços são prestados em igrejas, levantando dinheiro estivesse me dizendo para fazer alguma coisa.” para os mais necessitados. Grupos de jovens que se esforçam para levantar fundos de maneiras criativas, como Rede social – Só para comparar, o número de arremessos torneios esportivos ou maratonas, são matérias de capa praticados por Austin Gutwein é bem inferior à quan- dos jornais locais. Mas, às vezes o empenho da juventude tidade de crianças que, a cada dia, ficam órfãs em con- cristã é tão extraordinário que se torna notícia nacional. sequ ência da Aids, estimadas pelas Nações Unidas em 6 É o caso de Kendall Ciesemier, uma estudante de quarta mil. Parte do dinheiro arrecadado foi utilizada para cons- série que, como tantas de sua idade, acreditava que crestruir escolas em Zâmbia. O idealizador do projeto esteve ceria para ser famosa, embora não soubesse exatamente lá ano passado, quando líderes de uma aldeia beneficiada para quê.

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Kendall com o ex-presidente Clinton: 700 mil dólares em caixa para projetos na África

Um belo dia, a garotinha anunciou aos pais, Mike e Ellery, que seria famosa por ajudar as pessoas. Mas, que pessoas? Ela encontrou a resposta um ano mais tarde enquanto assistia a um programa especial da famosa apresentadora Oprah Winfrey sobre os órfãos da Aids na África. Kendall, então com 11 anos, foi movida pela história de uma menina um ano mais velha que havia perdido seus pais e cuidava como podia dos três irmãos mais novos. “Eu pensei como alguém conseguia fazer aquilo?”, lembra Kendall, agora com 15 anos. Enquanto a mãe debulhava-se em lágrimas no sofá, ela resolveu fazer alguma coisa. Foi para o seu quarto, fez uma pesquisa na internet sobre o tema “Órfãos da Aids na África” e encontrou o site da Visão Mundial, onde descobriu que poderia apadrinhar uma criança com 360 dólares anuais. Então ela juntou o dinheiro reservado para sua festa de aniversário, para o Natal e mais alguns trocados, pôs num envelope e pediu um selo a seus pais. “Estou apadrinhando uma criança”, anunciou a menina. “E não me façam muitas perguntas, porque eu quero fazer isto por mim mesma”. Seis meses depois, Kendall precisou de um transplante de fígado. Nascida com uma rara doença chamada atresia biliar, ela viveu uma infância relativamente normal, embora sob frequentes cuidados médicos. Passou a maior parte do verão de 2004 internada. Mandou avisar aos parentes e amigos que o dinheiro que seria gasto com flores e ursos de pelúcia para alegrá-la deveria ser revertido em donativos para as crianças da África, muitas das quais jamais teriam acesso a um quarto de hospital. Estabeleceu um alvo: juntaria US$ 60 mil para apadrinhar uma comunidade africana inteira. E com isso, às vésperas de C R I S T I A N I S M O

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Amiga de Clinton – O primeiro transplante a que Kendall foi submetida falhou devido a complicações, mas o segundo foi um sucesso. Uma vez fora do hospital, ela recrutou amigos e assou pães para vender, montou uma barraca de limonada e vendeu camisetas do KC4K. Em outubro de 2006 ela alcançou os 60 mil dólares. Kendall também se associou ao ministério para Aids da Wheaton Bible Church, uma congregação no bairro suburbano de Chicago, que sua família estava frequentando naquela época. Através dos parceiros e missionários da igreja, Kendall e o KC4K a sustentar o Hope for Life, um ministério para órfãos no Quênia. Logo, informações sobre o KC4K começaram a se espalhar. A rede CBS fez uma chamada para o The Early Show. Ainda em 2007, Kendall foi nomeada uma das “Dez Mais Jovens Voluntárias” da nação. Ela nem desconfiava, mas a equipe do programa de Oprah entrou em contato com seus pais e organizou uma reunião surpresa na Escola Secundária de Wheaton. O ex-presidente Bill Clinton, na época promovendo seu novo livro Ofertando, estava lá como convidado especial. Enquanto ouvia um discurso de Clinton, Kendall, sentada no meio da multidão, surpreendeu-se ao ser chamada pelo nome. Clinton disse que ela era a convidada especial de Oprah. Kendall, seus pais e seu irmão mais velho se amontoaram dentro de uma caravan com o ex-presidente. Duas horas mais tarde ela estava no estúdio, sentada entre a apresentadora e Clinton, falando sobre o trabalho da KC4K para os telespectadores. “Achei que estava sonhando”, conta. Durante o programa, Bill Clinton anunciou que um amigo anônimo estava doando um cheque para a organização, no valor de 500 mil dólares. “Eu simplesmente comecei a chorar”, diz Kendall. “Não poderia ser melhor”. Agora, completamente saudável, ela foi liberada pelos médicos para fazer sua primeira viagem à África. Com US$ 700 mil em caixa, a KC4K implantou dois novos projetos, em parceria com outras entidades, que incluem a construção de um dormitório num orfanato queniano e um programa alimentar para 600 viúvas, órfãos e pacientes com Aids em Zâmbia O pai de Kendall supervisiona as negociações finais das coisas, mas nenhum cheque é preenchido sem a aprovação da menina. “Eu tenho que checar tudo por ser a pessoa que toma a decisão final”, diz ela, cheia de responsabilidade. “Funciona como uma espécie de compra – eu tenho que ir ao shopping com o dinheiro todo para escolher projetos que eu possa apoiar para mudar a vida de pessoas”. Ela resume sua experiência falando da importância espiritual do trabalho: “Quando você se entrega totalmente como instrumento nas mãos de Deus e deixa que ele trabalhe através de você, ele ouve. E trabalha conosco.”

Tradução: Ana Maria Rocha Neves

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uma cirurgia à qual ela poderia não sobreviver, nasceu a Kids Caring 4 Kids (KC4K).



O ano em que a Bíblia invadiu o Brasil Programação do Ano da Bíblia é considerada um sucesso em termos de distribuição das Escrituras e incentivo à leitura da Palavra de Deus

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No Pará, voluntário copia vers´culos: projeto mobilizou o pa´s inteiro

Público participa do projeto “B´blia Manuscrita” na Bienal do Livro, em São Paulo

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O ano de 2008 já acabou, mas certamente deixou marcas que o tempo não vai apagar. E, se “céus e terra passarão, mas a Palavra de Deus não há de passar”, alguns frutos do ano passado também serão eternos. Consagrado pela Sociedade Bíblica do Brasil (SBB) como o “Ano da Bíblia”, 2008 assistiu a uma série de promoções, programações e eventos que deixaram gravado o conteúdo das Escrituras no coração de milhões de brasileiros. Com o lema “A Bíblia – Um livro para todos”, baseado no texto de Isaías 40.8, o Ano da Bíblia alcançou plenamente os seus objetivos, como mobilizar a sociedade e a família brasileiras para a importância da leitura do Livro Sagrado e a preservação e transmissão da cultura bíblica. Dois mil anos depois que o último autor bíblico colocou o ponto final na mensagem re- a capilarização das atividades temáticas velada, milhões de brasileiros tiveram sua – caso da Bíblia Manuscrita, realização mente e coração despertados para esse te- inédita no país, através da qual qualquer souro espiritual que atravessa os séculos. pessoa pôde sentir a emoção de escrever a O Ano da Bíblia celebrou o 60º ani- Palavra de Deus. O projeto ainda continua versário da SBB e o bicentenário da im- em execução e, no fim, serão 29 edições pressão e distribuição, no Brasil, dos da Bíblia estaduais e duas nacionais. Uma primeiros textos sagrados em português. destas será doada à Biblioteca Nacional do A mobilização pode ser considerado um Rio de Janeiro e a outra ficará no Museu sucesso em termos de distribuida Bíblia, mantido pela SBB em ção de bíblias, novos testamenBarueri, na Grande São Paulo. Ministério tos e porções das Escrituras. Só de exemplares completos, foram Marca histórica - “Um grande distribuídos exatamente 5.685.240 (ver momento deste ano foi quando alcançaquadro). “Esse ano especial mobilizou mos a marca de 80 milhões de exemplares mais de 3,2 mil líderes cristãos e milhões de bíblias e novos testamentos impressos”, de crentes em todo o país”, celebra o pas- comemora Eude. “Foram quase 6 milhões tor Eude Martins, de sementes espalhadas em nosso país. Em coordenador do nenhuma outra nação, em todo mundo, Ano da Bíblia. em apenas um ano, foram distribuídas Ele lembra que tantas bíblias. Deus seja louvado por essa os comitês esta- grande semeadura de sua Palavra”, comeduais permitiram mora o pastor Erní Seibert, secretário de Comunicação Social da SBB. “O Ano da Bíblia superou todas as nossas expectatiErn´ Seibert, vas e planos.” secretário de O Ano da Bíblia também estimulou Comunicação as comemorações do Dia da Bíblia, celeSocial da SBB: brado no segundo domingo de dezembro. “O Ano da B´blia Muitas vezes negligenciada pelos evansuperou todas gélicos, a data foi celebrada em igrejas de as expectativas” norte a sul do Brasil com eventos, passe-

Eduardo Cesar

Joanna Brandão

atas e celebrações festivas em homenagem às Sagradas Escrituras. Além disso, foram realizadas sessões solenes em órgãos públicos em homenagem à Palavra de Deus, promoção de seminários de ciências bíblicas em diversas localidades e o IV Fórum de Ciências Bíblicas no Museu da Bíblia, que também abrigou a exposição Os caminhos da Bíblia no Brasil.

Números de um grande ano Durante o Ano da Bíblia, a SBB produziu e distribuiu:

5.685.240

542.137

2.272.094

190.698.000

bíblias completas novos testamentos porções bíblicas seleções bíblicas



Mulher Esther Carrenho teóloga e psicóloga clínica

O meu porquinho aleijado

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No decorrer da vida, estamos sujeitos a acidentes e reviravoltas

assei toda minha infância no campo, criando animais como cabritos, aves e porcos. Lembro-me de uma leitoa que gostava de furar a cerca do chiqueiro e invadir as plantações dos nossos vizinhos com seus filhotes. Um dia, um agricultor ficou enfurecido ao ver sua plantação destruída e atacou o animal e seus porquinhos com uma foice. Um dos golpes atingiu em cheio a perna traseira de um deles, justamente o malhado que meu pai tinha escolhido para ser meu presente. Quando vi o bichinho ensanguentado, com a pata mutilada, gritei desesperada. Mas meu pai era um camponês muito habilidoso no trato dos animais e conseguiu salvar o porquinho – ele ficou sem parte de uma pata, mas conseguia caminhar com as outras três e fazia tudo que os outros faziam. Este episódio singelo ilustra bem a forma como lidamos com aquilo que não recebemos ou que nos foi tirado, e também quando dizemos não para algo que desejamos, mas que contraria nossas crenças e valores. E um dos sinais de maturidade – tanto emocional quanto espiritual – de uma pessoa é sua capacidade de superação diante de alguma perda ou de alguma coisa que lhe falta. A incapacidade de ficar sem algo desejável começou no Éden. Lá, Deus deu ao homem e à mulher o usufruto de todo o jardim, com exceção do fruto de uma árvore. O primeiro casal tinha toda a Criação à disposição, mas pôs o foco de seu desejo justamente na árvore proibida. E por isso foi tão fácil para a serpente convencer Eva a transgredir a ordem divina. Desejos e carências podem ocorrer em diversas situações ou momentos da vida. Atualmente, acredita-se que há necessidades não supridas desde o ventre materno. Assim, sentimentos doloridos ou prazerosos da mãe poderiam afetar o bebê, mesmo que ele ainda seja um feto. Após o nascimento, a criança também está sujeita a uma enorme gama de carências – alguns não serão amados suficientemente; outros não serão aceitos. E desta forma, muitos chegarão à vida adulta com lacunas impossíveis de serem reparadas, simplesmente porque não há como voltar na história. É como a perna aleijada do porquinho: ela existia e até podia ser utilizada, mas sempre seria deficiente. No decorrer da vida, estamos sujeitos a perdas, acidentes e reviravoltas que podem nos mutilar material, física ou emocionalmente. Às vezes somos lesados nos relacionamentos – é um cônjuge que escolhe alguém mais atraente e mais jovem; é um filho que passa meses e meses sem dar

notícias; é uma traição na amizade em que tanta confiança se tinha; e é a tragédia, como a morte prematura que nos arranca uma pessoa querida antes da hora. A má notícia é que muitos, diante do horror da dor e da falta, preferem se desconectar da realidade. Desta forma, nunca experimentarão a integração destas vivências em suas vidas. Lembrome de um jovem que disse: “Eu sofria muito por não me sentir amado pelo meu pai; então, me anestesiei, excluindo algo de mim junto com essa dor . Hoje, quero acessar partes que são minhas e não consigo”. Felizmente, este jovem buscou ajuda e pôde integrar em si mesmo sua própria história. Ele entendeu que, mesmo não tendo sido amado e compreendido pelo pai, poderia, ao longo da vida, amar e aceitar o amor de outros em toda sua plenitude. Já a boa nova é que as pessoas que têm coragem de assumir suas carências e mazelas passarão pelo desconforto dos próprios aleijões, mas poderão redefinir a própria vida de forma amorosa e completa. Como cristã, acredito que o Calvário é um bom lugar para irmos com tudo que nos falta. Ao nos aproximarmos do Salvador sob o peso de nossas fragilidades, contemplaremos um Cristo que foi injustiçado e defraudado, de quem quase tudo foi tirado. Só lhe restou, naquele momento, forças para bradar em alto e bom som todo seu desamparo. No Calvário, encontramos Cristo sacrificado, humano como nós, e que pode caminhar conosco aliviando a dor daquilo que nos falta. E pela sua ressurreição nos dá satisfação plena. Aprender a caminhar sem negar e conviver com as próprias carências é necessário para que sejamos mais amorosos e compassivos com aqueles que sofrem por não receberem o essencial para a vida. Quem consegue conviver com alguma necessidade não suprida terá mais recursos para desfrutar do que lhe está disponível e administrar os desejos egoístas, como a busca desenfreada por prazer, poder e satisfação. Desta forma, sem negar os desejos, é possível destroná-los, subsistir numa eventual falta e ainda escolher a ação que menos danos trará às pessoas que estão à volta. A proposta do Cristianismo é que não neguemos os desejos, mas que os tenhamos sob controle, mesmo que isso signifique a carência de algo tido como importante. Quando Jesus alertou seus seguidores acerca da necessidade de dominar o pecado, ele o faz usando como simbologia o corpo – segundo o Mestre, é melhor entrar no Reino dos céus sem um olho ou uma perna do que ficar inteiro e se perder.

Um dos sinais de maturidade – tanto emocional quanto espiritual – de uma pessoa é sua capacidade de superação diante de alguma perda ou algo que lhe falta

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First published in Christianity Today, copyright © 2008. Used by permission, Christianity Today International

Formação espiritual Paciência e cuidado com o tempo consumido são sempre as marcas de qualidade do trabalho de formação espiritual

O Richard J.Foster

O mundo cristão de hoje clama pelo crescimento de uma teo­ sobre uma vida muito mais abundante, profunda e completa. logia que trabalhe na cruel realidade da vida diária. Infeliz- Em qualquer posição social ou em qualquer situação da vida, mente, muitos têm desistido da possibilidade de crescimento eles encontraram uma vida de “retidão, paz e alegria no Espíriem relação à formação espiritual. Um vasto número de pesso- to Santo”, possibilidade descrita em Romanos 14.17. as bem intencionadas tem se exaurido no trabalho da igreja e Eles descobriram que uma transformação real, à imagem descoberto que isto não influencia substancialmente suas vidas de Cristo, é possível. Viram suas paixões egocêntricas darem espirituais. Elas descobriram que simplesmente eram impa- lugar a um coração abnegado e humilde. Há mais de 2 mil cientes, egocêntricas e medrosas quando começaram a carregar anos, registros das vidas de grandes pessoas – Agostinho, o fardo pesado do trabalho na igreja. Talvez até mais. Francisco de Assis, Teresa de Ávila, Thomas de Kempis e Outros têm submergido em múltiplos projetos de trabalhos muitos outros – provam que seguir arduamente nos caminhos na área do serviço social. Mas quando o ardor de ajudar aos de Jesus torna o caráter ilibado. Os registros estão aí para outros esfria por um tempo, eles percebem que tantos esforços quem quiser ver. Há trinta anos, desde quando Celebração da hercúleos deixaram poucas marcas duradouras em sua vida in- disciplina foi escrita, nós enfrentamos duas grandes incumterior. De fato, deixaram-nos mais doloridos pela frustração, bências: a primeira é que foi preciso rever a grande discusraiva e amargura. Há também os que ainda têm uma prática são sobre a formação da alma; a segunda foi encarnar esta teológica que não permite crescimento espiritual. Havendo realidade nas experiências diárias na vida individual, congresido salvos pela graça, essas pessoas têm ficado paralisadas nis- gacional e cultural. Francamente, nós temos tido sucesso na so. A tentativa de qualquer progresso espiritual tem um sabor primeira tarefa. Todos os tipos de cristãos agora sabem da de “obras de retidão” para eles. Sua liturgia diz que eles pecam necessidade de formação espiritual. em palavras, pensamentos e atitudes diárias; então, pensam ser É a segunda tarefa que precisa consumir a parte principal de esse seu destino até morrerem. A perspectiva do Céu é o seu nossa energia nos próximos 30 anos. Se nós não fizermos um único alívio nesse mundo de pecado e rebelião. Conprogresso real nessas frentes, todos os nossos esforços sequentemente, essas pessoas bem intencionadas vão vão evaporar e secar. Deus tem dado a cada um de nós Especial sentar em seus bancos na igreja – e, passado algum a responsabilidade de “crescer em graça” (II Pedro tempo, vão perceber que nenhum avanço foi feito em 3.18). Isto não é algo que possamos transferir para os suas vidas com Deus. outros. Nós temos que tomar as nossas cruzes individuais e seHá um mal-estar geral que nos toca a todos. Parece que guir os passos do Cristo crucificado e ressurreto. nos acostumamos à normalidade da disfunção. A constante Todo trabalho de formação autêntico consiste em “trabalhar exploração da mídia em relação às torrentes de escândalos, vi- o coração”. O coração é a fonte de toda ação humana. Todos os das partidas e mazelas de toda sorte nos deixa não muito mais mestres espirituais constantemente nos chamam, quase de fordo que simplesmente chateados. Temos que esperar um pouco ma enfadonha, para que nos voltemos e purifiquemos os nosmais do que isso, ao menos de nossos líderes religiosos – talvez, sos corações. Os grandes sacerdotes puritanos, por exemplo, especialmente de nossos líderes. Esta disfunção em toda parte mantiveram a atenção nesse ponto. Em Mantendo o coração, é tão infiltrante que é quase impossível termos uma visão clara John Flavel, um puritano inglês do século 17, adverte que “a do progresso espiritual. Modelos exuberantes de santidade são maior dificuldade na conversão é ganhar o coração para Deus; raros hoje em dia; entretanto, ecoando através dos séculos até e a maior dificuldade após a conversão é manter o coração com aos dias de hoje, estão inúmeras testemunhas que nos contam Deus”. Quando estamos trabalhando o nosso coração, as ati-

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Andres Rodriguez

teólogo e escritor


tudes externas nunca são o centro da nossa atenção. Atitudes visíveis são o resultado natural de algo profundo, bem mais profundo. A máxima do patriarca Actio – “As atitudes seguem a essência” – nos lembra que a nossa atitude está sempre em acordo com a realidade interna do nosso coração. Isso, naturalmente, não reduz as boas obras à insignificância, mas as tornam questões secundárias; meros efeitos, e não causas. O significado principal é a nossa união vital com Deus, nossa nova criação em Cristo, nossa imersão no Espírito Santo. É essa vida que purifica o coração. Quando o ramo é perfeitamente unido à videira, que é o Senhor, o fruto espiritual é natural. Somos todos uma massa de motivos emaranhados: esperança e medo, fé e dúvidas, simplicidade e arrogância, honestidade e desonestidade, sinceridade e falsidade. Deus é o único que pode separar o verdadeiro do falso; o único que pode purificar as motivações do coração. Mas o Senhor não vem sem ser convidado. Se alguns compartimentos do nosso coração nunca experimentaram o toque de cura de Deus, talvez seja porque não temos recebido bem o minucioso exame divino. O mais importante, mais real e mais duradouro acontece nas profundezas do nosso coração; este é um trabalho solitário e interno, que não pode ser visto por pessoa alguma, a não ser por nós mesmos. É um trabalho que somente Deus conhece. É o trabalho de purificação do coração, de conversão da alma, da transformação interior e da formação da vida. O primeiro passo é nosso retorno à luz de Jesus. Para alguns, este é uma inescrutável e lenta jornada; para outros, é um momento instantâneo e glorioso. Em ambos os casos, nós estamos começando a confiar em Jesus, para aceitá-lo como sendo a nossa vida. Nascer espiritualmente é um começo – um maravilhoso e glorioso começo –, e não um final. Mas o trabalho de formação mais intenso é necessário antes de nos colocarmos diante do brilho do Céu. É necessário muito treinamento para sermos o tipo de pessoa segura e reinarmos tranquilamente com Deus. Então, agora nós estamos dando início a esse novo relacionamento. Como Pedro coloca em sua primeira carta, nós “temos nascido de novo, não de uma semente perecível, mas imperecível, vivendo e permanecendo na Palavra de Deus” (I Pedro 1.23). Deus está vivo! Jesus é real e atuante em nossas pequenas vidas, que são fraturadas e fragmentadas. Como Thomas Kelly sustenta, nós estamos vivendo em “uma luta intolerável de agitação”. Nós sentimos a força de atração de muitas obrigações e tentamos cumpri-las todas. E estamos, conforme suas palavras, “infelizes, intranquilos, extenuados, oprimidos e tememos fracassar”. Mas, através do tempo e da experiência – às vezes, muito tempo e muita experiência –, Deus começa a nos dar um sossego surpreendente. Nas profundezas do nosso ser, a alternância nos dá uma vida coesa intacta, de humilde adoração diante da viva presença de Deus. Não se trata de êxtase, mas de serenidade, sem abalos e firmeza de orientação da vida.

Nas palavras de George Fox, nós nos tornamos homens e mulheres “estáveis”. Então, começamos a desenvolver um hábito de orientação divina. O trabalho interior da oração torna-se muito mais simples agora. Lentamente, descobrimos pequenos reflexos de proteção celeste e os sopros de submissão são tudo o que é preciso para nos atrair para uma orientação habitual de nossos corações voltados para o Senhor. Por trás do primeiro plano da vida diária, permanece a bagagem da orientação celestial. Esta é a formação de um coração diante de Deus. Para usar as palavras de Kelly, é “uma vida despreocupada de paz e poder. É simples. É sereno. É espantoso. É triunfante. É radiante. Não toma tempo algum, mas ocupa todo o nosso tempo”. Como os novatos em Jesus, estamos aprendendo, sempre aprendendo – a como viver bem, a como amar a Deus bem, e como amar nossa família, nossos amigos – e até mesmo os nossos inimigos – bem. Aprendemos também a como estudar bem; a enfrentar bem as adversidades; a administrar nossos negócios e instituições financeiras bem; a formar uma vida em comunidade bem; a alcançar os marginalizados bem; e a morrer bem. E, enquanto aprendemos como viver bem, compartilhamos com outros o que estamos aprendendo. Esta é a estrutura do amor para edificar o corpo de Cristo. Todavia, não estamos sozinhos neste trabalho de reforma do coração. É imperativo que nos ajudemos uns aos outros e de todas as maneiras que pudermos. E, em nossos dias, a necessidade desesperada é pela emergência de um exército sólido de guias espirituais treinados, que possam amorosamente estar lado a lado das pessoas, ajudando-as a discernir como andar pela fé nas circunstâncias de suas próprias vidas. Acontece que há uma idéia genuinamente ruim circulando nestes dias – a de que, se nós tivermos um determinado número de cursos e lermos determinada quantidade de livros, estaremos prontos para sermos guias espirituais. Lamentavelmente, a coisa não é tão simples assim. Mas o treinamento de vidas demanda o desenvolvimento da retidão, alegria e paz no Espírito Santo. Isto é a qualidade de vida – habilidade para perdoar quando se está machucado, o desejo de orar – que estamos procurando na vida de guias espirituais treinados. Neste ponto, temos uma dificuldade real, porque cada um pensa em transformar o mundo – mas onde estão aqueles que pensam em transformar a si mesmos? As pessoas podem genuinamente querer ser boas, mas raramente estão preparadas para fazer o que é necessário para produzir uma vida de bondade que possa transformar a alma. Sim, a formação pessoal à imagem de Cristo é árdua e longa. A busca pela comunhão que agrega poder naturalmente leva à nossa segunda grande arena de trabalho para os anos vindouros: a renovação congregacional. Se em nossas igrejas nós não trabalhamos arduamente pela formação espiritual, não conseguiremos pessoas espiritualmente formadas. O problema é que nós temos em nossas igrejas a “doença da pressa”. Muitos do nosso povo são viciados em

O trabalho de formação nos ensina a dar as costas às nossas vontades e focar necessidades reais, como a de anular o ego, tomar a nossa cruz e seguir arduamente Jesus

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F o r m a ç ã o e s pirit u a l

É o amor mundi que compele milhões de pessoas comuns a ministrar vida no nome bom de Cristo a quem nos cerca Segundo, vamos fazer tudo o que podemos para desenvolver a ecclesiola na eclésia – “a pequena igreja dentro da Igreja”. A ecclesiola na eclésia é um compromisso profundo com a vida do povo de Deus, e não um comportamento sectário. Nenhuma separação. Nenhuma exclusão. Nenhuma formação de nova denominação ou igreja. É preciso que fiquemos dentro das estruturas estabelecidas da igreja e, aí sim, desenvolvamos pequenos centros de luz dentro dessas estruturas. A partir daí, é só deixar a nossa luz brilhar. Isto produz uma unidade de coração, alma e mente, um vínculo que não pode ser quebrado – um milagre, enfim –, abastecido de cuidado, mutualidade e compartilhamento de vida juntos que nos levará a enfrentar as circunstâncias mais difíceis. 40

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A última instância é a do compartilhamento do sofrimento. Não devemos nos enganar: o nosso tempo de sofrimento está chegando. Uma multidão de fatores levará a isso. Por exemplo, a cultura geral de hostilidade para as coisas concernentes ao Cristianismo está crescendo. Não devemos ficar surpresos ou mesmo tentar mudar isso. O que nós, como Igreja, deveríamos estar fazendo é construir uma vida comunitária sólida para que, quando o sofrimento chegar, não estejamos dispersos. Ao invés disso, devemos ficar juntos, orar juntos e sofrer juntos, independente do que vamos enfrentar. O sofrimento em comunhão pode ser um bom modo que Deus usará para um novo ajuntamento entre ele e seu povo.

Enquanto aprendemos como viver bem, compartilhamos com outros o que estamos aprendendo. Esta é a estrutura do amor para edificar o corpo de Cristo Os mestres espirituais escreveram muito sobre o treinamento do coração em duas direções opostas: contemptus mundi, o rápido desprendimento das ambições; e amor mundi, quando nosso ser é arremessado para uma divina, porém dolorosa, compaixão pelo mundo. No começo, Deus arranca o mundo de nossos corações – comtemptus mundi. Experimentamos um rompimento das correntes que nos atraem para posições proeminentes e de poder; passamos a viver livre e alegremente, sem enganos. E, então, quando nos libertamos de tudo isso, Deus lança o mundo de volta ao nosso coração – é o amor mundi –, quando nós e Deus, juntos, tomamos o mundo em infinita ternura e amor. Nós aprofundamos a nossa compaixão pelos feridos, pelos arruinados, pelos despossuídos. Sofremos, oramos e trabalhamos por outros de uma maneira diferente, de uma forma abnegada, cheia de alegria. Nosso coração fica estendido em direção aos marginalizados. Nosso coração fica voltado para todas as pessoas, para toda a Criação. Foi o amor mundi que atirou Patrick de volta à Irlanda para responder à sua pobreza espiritual. Foi o amor mundi que impulsionou Francisco de Assis para o seu ministério mundial de compaixão por todas as pessoas, por todos os animais, por toda a Criação. Foi o mesmo sentimento que levou Elizabeth Fry às portas do inferno da prisão de Newgate e induziu William Wilberforce a trabalhar a sua vida inteira pela abolição do comércio escravo; ou que impulsionou Madre Teresa de Calcutá a ministrar entre os mais pobres entre os pobres da Índia e do mundo todo. E é esse amor mundi que compele milhões de pessoas comuns, como você e eu, a ministrar vida no nome bom de Cristo a quem nos cerca.

Tradução: Ana Maria Rocha Neves

adrenalina – e, em toda parte, o espírito de nossos dias é de pular, empurrar, atropelar, produzir ruídos, atrair multidões. Mas o trabalho de formação espiritual simplesmente não acontece com pressa. Ele nunca é um “assunto rápido”, como se diz. Paciência e cuidado com o tempo consumido são sempre as marcas de qualidade do trabalho de formação espiritual. Outra situação contextual que enfrentamos é o fato de que nós agora temos uma indústria de entretenimento cristão que é disfarçada como adoração. Ora, como nós compareceremos em reverência e temor diante do Santo de Israel, quando muitos de nossos cultos são focados em diversão? Um terceiro assunto: nós estamos lidando com uma mentalidade consumista em toda parte que, simplesmente, domina o cenário religioso. Essa mentalidade mantém as demandas individuais sempre à frente e no centro de tudo: “Eu quero o que eu quero, quando eu quero e quanto eu quero”. Naturalmente, o trabalho de formação nos ensina a dar as costas às nossas vontades e focar necessidades reais, como a de anular o ego, tomar a nossa cruz e seguir ardua­ mente Jesus. Todas estas e outras coisas mais tornam o trabalho de formação espiritual em uma congregação realmente complicado. Mas é uma tarefa possível! Primeiro, isto significa que queremos experiências profundas de comunhão através do poder da formação espiritual. A Igreja é reformada e sempre está se reformando. E, se nosso coração, alma, mente e espírito estão sendo reformados – ou seja, se ansiamos por conhecer, seguir e servir a Jesus, sendo formados à semelhança dele –, então seremos poderosamente atraídos na direção de todos aqueles que têm o mesmo anelo. Uma pessoa cheia da beleza de Jesus tem comunhão adicionada ao poder – e os outros serão irresistivelmente atraídos na direção desta pessoa.



Mudança de maré

Um movimento surgido recentemente e que ganhou bas- primeiro século seja uma utopia perseguida de tempos em tante força no segmento evangélico no final dos anos 1990 tempos pelos evangélicos, a Igreja Emergente surgiu com já começa a dar sinais de exaustão. É a chamada Igreja uma proposta nesta linha. “Os relacionamentos são muiEmergente, anunciada por seus adeptos como uma to valorizados entre nós”, destaca o pastor Sandro espécie de resposta do Cristianismo pós-moderBaggio, dirigente do Projeto 242, uma iniciativa Igreja no a questões que há muito inquietam o povo de bem original que vem sendo desenvolvida em São Deus, como “O que é ser cristão?”, “Qual a funPaulo há mais de dez anos. O grupo começou da ção da Igreja?” ou “O que significa fazer missão mesma forma que os emergentes americanos, capino mundo hoje?”. Depois de multiplicar-se pelo mundo taneados pelo pastor Brian McLaren (ver quadro): um gruprincipalmente pela via virtual, através de sites e blogs, o po de amigos se reuniu para buscar a Deus, mais gente se movimento chega à adolescência sem conseguir suprir as interessou e logo o espaço não suportou mais a quantidade expectativas de alguns de seus mais entusiastas defensores. de pessoas. E ainda tem sido apontado como um caminho tortuoso que pode levar à secularização da fé e ao relativismo dos valores Comportamentos heterodoxos – No exterior, existem igrebíblicos. Há quem fale até numa “Nova Era” disfarçada. jas que se denominam emergentes simplesmente porque Em 31 de outubro do ano passado, o Conselho de di- adotam comportamentos heterodoxos, como velas nos culretores da Emergent Village, o guarda-chuvas que abriga tos, cântico de músicas não-evangélicas e bate-papos sobre o movimento, resolveu afastar seu líder, o pastor Tonny as coisas de Deus, no lugar das Jones. A decisão leva em conta o desejo de a organização tradicionais pregações. E são manter seus propósitos originais, ou seja, a descentraliza- estas inovações, e principalmenção. A Igreja Emergente começou com um grupo de ami- te o que estaria por trás delas, gos que começaram a se reunir nos anos 1990, desiludidos que estão na raiz de boa parte com as instituições eclesiásticas tradicionais do século 20. dos detratores do movimento. Para eles, a vivência do Evangelho, desgastada pela suposta “A onda emergente tem um camassificação das grandes igrejas, precisaria ser retomada ráter ecumenista, despreza as informalmente, exatamente como ocorre numa conversa diferenças doutrinárias”, critica entre amigos. Com o tempo, outras pessoas se juntaram a escritora e teóloga pentecostal ao grupo. O movimento cresceu a ponto de gerar livros, Mary Schultze. Segundo ela, eventos, sites e blogs. Em 2001, foi cunhada a expressão a Igreja Emergente é filiada ao Igreja Emergente, já como contraposição ao chamado sistema eclesiástico. Sandro Baggio: A mais marcante característica do movimento, sem dú“Alternativas às vida, é a ênfase na vida comunitária. Por mais que reprodumetodologias atuais” zir o ambiente em que se consolidou a Igreja Primitiva do

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Sulamita Ricardo

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Movimento Igreja Emergente chega à adolescência enfrentando oposição e questionando-se a si mesmo


O pessoal do Projeto 242 reunido: informalidade é a marca de um movimento que tem sido questionado tanto de fora como de dentro

Movimento de Crescimento da Igreja. “Eles pregam o misticismo”, aponta. Mas para o pastor Baggio, o conceito de Igreja Emergente é muito maior do que isso. “Ela seria o lugar para quem está cansado da metodologia das igrejas atuais e quer buscar alternativas”, define. Para os emergentes, o rótulo não importa muito. “Não é esse reconhecimento que move as pessoas envolvidas com essa tendência, mas sim um desejo sincero de viver e comunicar a fé cristã neste mundo em transição”, explica. Segundo ele, o movimento no Brasil ainda não é forte. Entretanto, algumas ações dispersas pelo país começam a ser conhecidas, como a La Red del Camiño, que atua no sul do país, e o Tribal Generation, que já realizou várias conferências. “O que existe são pessoas em vários lugares que se interessam pelo tema e buscam saber do que se trata. As igrejas emergentes são mais famílias do que instituições, mais comunidades do que ajuntamentos”, conclui o dirigente. Líder da Organização Palavra da Vida, em São Paulo, o pastor Carlos Oswaldo diz que os princípios defendidos pela Igreja Emergente não são novos. “Algumas das propostas gerais do movimento já foram recicladas algumas vezes nos últimos 40 anos”, destaca. Ele preocupa-se com alguns métodos utilizados pelo grupo para a consecução de suas metas – inclusive, muitas concessões ao pensamento pós-modernista. “Alguns dos propagadores do movimento adotam uma atitude que poderia ser chamada de ‘agnosticismo evangélico’, por mais contraditória que seja esta expressão”, critica. “A Igreja Emergente terá pontos positivos se for considerada apenas como um movimento não institucionalizado, sem pretensão de oferecer respostas prontas ou apresentar novas verdades”, emenda, por sua vez, o pastor Ed René Kivitz, líder da Igreja Batista de Água Branca, em São

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“Precisamos de uma conversação global”

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No início dos anos 1990, o pastor, escritor e conferencista Brian McLaren agregou pessoas para o que chama de “conversações” – na verdade, a busca por uma nova forma de ser e fazer a Igreja de Cristo fora dos grandes ministérios institucionalizados que já então cresciam a todo vapor. Fundador da Cedar Ridge Communtity Church, uma congregação não-denominacional situada na cidade americana de Baltimore, ele se tornou expoente do movimento emergente, do qual já falou para platéias da Europa, da América Latina e da África, sempre enfatizando a discussão sobre pós-modernismo, liderança, crescimento e Após o entusiasmo implantação de igrejas. inicial, McLaren Agora, diante da evidente mudanagora defende o ça na direção da maré, McLaren tem amadurecimento da sido mais cauteloso na apologia do Igreja Emergente movimento. “As igrejas não devem defender suas idéias como uma verdade absoluta”, pontifica. “Mas não é só porque a Igreja Emergente interpreta alguns princípios bíblicos de maneira diferente que ela está errada ou é herege.” Brian McLaren concedeu a seguinte entrevista a CRISTIANISMO HOJE: CRISTIANISMO HOJE – O que o termo “Igreja Emergente” define hoje? BRIAN MCLAREN – Realmente, eu não gosto de usar o termo Igreja Emergente. Minha ênfase é na conversação. Mas eu penso que essa conversação – ou qualquer que seja o nome usado para descrevê-la – tem que ter vida. As pessoas precisam de liberdade para fazer novas perguntas e olhar de modo fresco as Escrituras, a fim de obter novas percepções. Tem havido dúvidas acerca da rotulação em si. Para muitas pessoas, o termo “emergente” lhes tem permitido permanecer no mundo evangélico. Mas para outros que estão de fora da discussão, essa denominação é sinônimo de uma teologia herege ou um modismo cultural.

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A Igreja Emergente é uma tendência irreversível? Acho que existem muitos movimentos relacionados à Igreja Emergente que fazem parte de algo maior, como muitas ondas que fazem parte de uma maré crescente. E esses movimentos têm se desenvolvido independentemente, no Reino Unido, na Europa, na América Latina, África, Ásia – e, claro, na América do Norte. Em muitos aspectos, a América Latina tem sido o berço de vários valores fundamentais e boas ideias. Pessoas como René Padilla, que começaram falando sobre o Evangelho do Reino de Deus décadas atrás, e grupos como La Red del Camiño, para mim, são os pioneiros nesse movimento global maior. Mas não falta uma interação maior entre esses grupos independentes? O que precisa acontecer nos anos seguintes é que muitas diferentes redes formadas pelo mundo precisam se conhecer pessoalmente. O que a gente precisa é de uma verdadeira conversação global. E isso parece estar começando. Na sua opinião, qual é o futuro da Igreja Cristã? Em relação ao futuro da Igreja, eu penso que a resposta mais certa é aquele ítem que consta de muitas provas: “Todas as alternativas acima”. Veja – sempre existirão igrejas fundamentalistas em desenvolvimento, igrejas liberais em desenvolvimento e mega-igrejas em desenvolvimento. Para mim, a forma de igreja é bem menos importante do que sua mensagem e missão. E talvez a maneira como nós tradicionalmente expressamos o Cristianismo esteja mesmo em crise; mas o futuro traz consigo novas expressões de fé tão eficientes, fiéis, significativas e transformadoras do mundo como aquelas conhecidas até agora. Meu desejo profundo é que a Igreja do futuro redescubra as boas notícias de Jesus sobre o Reino de Deus, e que essa mensagem revolucione as igrejas em todas as formas. Assim, ela será uma comunidade de missão integral. Uma missão que busca a transformação da sociedade fazendo justiça, amando a bondade e andando humildemente com Deus. 44

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Paulo. Ele reconhece a simpatia que tem pelo movimento, mas lembra que prefere o contexto da teologia latino-americana, na qual tem caminhado. Para Kivitz, a plataforma de ideias que embasam essa corrente eclesiástica deve evitar as soluções aparentemente muito naturais, na base do modismo ou de receitas de “como fazer”.

Lu´s Fernando Batista, do site Renovatio Café, alerta para o surgimento de uma geração pós-evangélica

“Cansados” – O administrador Luís Fernando Batista, gestor do site Renovatio Café, que divulga conteúdo ligado ao movimento, ressalta que a Igreja Emergente não deve ser usada como pretexto para que o crente não se envolva com uma igreja local. “Muitos que falam sobre o movimento não têm nenhum envolvimento efetivo com a missão e agem somente por mágoas com alguma igreja tradicional, o que desencadeia observações equivocadas”, observa. “São apenas simpatizantes de qualquer coisa evangélica fora do modelo de igreja tradicional, do qual se dizem cansados”. Batista conta que viu no site de uma igreja nos Estados Unidos o anúncio da realização de três cultos no domingo pela manhã: o primeiro, tradicional, com hinário e órgão; o segundo, com enfoque contemporâneo, com apresentações em PowerPoint e dramatizações. O terceiro era o culto emergente, com velas e rock alternativo. “Congregações que fazem questão de se apresentar como emergentes querem se colocar assim para apresentar-se como as igrejas que têm a novidade do momento.” Todavia, ele aposta que surgirá em breve uma geração pós-evangélica que vai rejeitar a igreja sem abandonar o respeito à pessoa de Jesus. “É para atuar nessa área que surgem movimentos revolucionários, não preocupados apenas em mudar a forma da igreja, mas em deixar a marca de Cristo na sociedade.” Para Sandro Baggio, o desafio do movimento emergente é passar do estágio inicial, no qual, acredita, ainda se encontra. “A Igreja Emergente precisa passar da fase da desconstrução para a etapa da edificação”, assinala. Já o pastor Dan Kimball, outro líder dessa maneira alternativa de se fazer igreja, prefere nem usar mais a terminologia do movimento. Por esta razão, ele e o professor Scot McKnight formaram uma nova rede, provisoriamente chamada de Origins (origens). Em sua opinião, a Igreja Emergente desenvolveu-se em muitas vertentes teológicas. “A definição do que é ser emergente mudou”, sustenta. “Entretanto, continuarei defendendo e trabalhando pelos ideais da Igreja Emergente, pois ela representa evangelismo e missão para a nova geração que surge.”

Arquivo pessoal

A enorme disseminação de informações sobre o movimento pela internet não favorece abordagens equivocadas? Bem, a internet permite que qualquer pessoa diga qualquer coisa e isso fica instantaneamente disponível pelo mundo. Então, muitas pessoas dizem muitas coisas – algumas, menos verdadeiras que outras. A verdade é que muitos grupos diferentes acreditam estar cem por cento certos sobre tudo e acham que precisam proteger seus pontos de vista, expondo o que os outros pensam de modo diverso. Então, eles têm sido enfáticos em dizer que muitos de nós estamos levantando novas questões e abordando nossa fé de modo diferente. Mas é claro que ser diferente não significa estar sempre certo ou sempre errado...


Marcos Couto

A impressionante imagem do templo destru´do: desabamento provocou nove mortos e uma batalha entre a Renascer e os órgãos públicos

“O céu desabou” Tragédia da Igreja Renascer em São Paulo enluta evangélicos e desencadeia troca de acusações

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Depois da prisão dos líderes da Igreja Apostólica Renascer em pensada com a decoração do teto do templo: “O céu desabou”. Cristo, Estevam Hernandes e a mulher, Sônia, nos Estados Uni- De acordo com a perícia, o laudo com as causas do acidente deve dos, ninguém poderia prever que o pior capítulo da história da ficar pronto até o fim de março. denominação ainda estava para ser escrito. Pois o foi da maneira mais dolorosa possível na noite de domingo, 18 de janeiro, quando Cidade irregular – “Vamos apurar o que houve, quem são os eno teto ornamentado com pinturas de uma imensa cruz e um céu genheiros responsáveis pelas obras no templo, que material usaestilizado veio abaixo no templo-sede da denominação, localizado ram – tudo vai ser inspecionado”, alardeou a promotora Mabel na Rua Lins de Vasconcelos, bairro do Cambuci, zona sul de São Tucunduva, do Ministério Público de São Paulo. Segundo ela, Paulo. Placas de gesso, estruturas metálicas e telhas desatodos os templos da Renascer na cidade serão vistoriabaram sobre as centenas de fiéis que aguardavam o início dos. “Os locais de culto que não estiverem enquadrados Brasil do concorrido culto das 19h. Sob o entulho, o terrível salna legislação serão interditados”, fez coro o secretário do da tragédia: nove mortos e mais de cem feridos. das subprefeituras de São Paulo, Andreas Matarazzo. Em poucos minutos, a notícia da tragédia era veiculada via Se quiser cumprir de fato a promessa, o secretário terá um internet para o Brasil e o mundo. Por todo o país, igrejas inter- grande trabalho pela frente. Citando dados da própria Prefeitura, romperam suas programações para orar em favor das vítimas e o vereador evangélico Carlos Alberto Bezerra (PSDB) diz que de suas famílias. Transeuntes, curiosos, bombeiros e policiais 85% dos estabelecimentos da cidade – aí incluídos bares, restauacorreram na tentativa de resgatar as vítimas nos escombros do rantes, clubes, lojas, templos etc – estão irregulares. Na sua opiprédio, que no passado abrigou o Cinema Riviera e que foi tran- nião, a tragédia da Renascer pode ser considerado um episódio formado na sede mundial de uma das mais dinâmicas – e polê- isolado e não é justo dizer que apenas as igrejas ofereçam riscos micas – organizações neopentecostais do país. Entre os membros em suas construções. “Ninguém constrói um templo para que ele da Renascer, a dor inicial deu lugar a um sentimento de determi- desabe. Não construímos igrejas como se fossem ratoeiras”, denação para recomeçar tudo. Reunidos nos templos cedidos por fende. outras igrejas da região ou no salão alugado de um clube, os fiéis Não foi a primeira vez que um templo evangélico desabou desalojados receberam mensagens de fé e palavras de ânimo dos deixando vítimas fatais no Brasil. Em 5 de setembro de 1998, dirigentes, transmitidas por um telão desde os EUA. “Não sabe- na cidade de Osasco (SP), o antigo Cine Glamour, que abrigava mos o motivo do que aconteceu, mas há de haver um propósito um templo da Igreja Universal do Reino de Deus, desmoronou e para tal sofrimento”, sublinhou o apóstolo da Renascer. provocou a morte de 22 pessoas, além de quatro centenas de feNa guerra de palavras depois da tragédia, autoridades, espe- ridos, durante uma vigília de oração. Quatro anos depois, o culto cialistas e veículos de imprensa deixavam no ar que a causa do de domingo à noite na Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo acidente foi a negligência na manutenção adequada do telhado, em Brasília também foi tragicamente interrompido quando a esenquanto os bispos da Renascer esforçavam-se para consolidar a trutura do teto desabou sobre cerca de 100 fiéis. Três morreram versão de que tudo estava em ordem e que o desabamento foi uma e 50 ficaram feridos no acidente. Já em setembro de 2007, uma fatalidade. O governador paulista, José Serra, vistoriou o local do construção de três andares que abrigava reuniões evangélicas ruiu acidente acompanhado do prefeito da capital, Gilberto Kassab, e em Marechal Hermes, subúrbio do Rio de Janeiro. Duas crianças deu a melhor definição para o ocorrido, numa ironia talvez im- morreram e onze pessoas ficaram feridas. (Marcelo Brasileiro)

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A perigosa tarefa de desvendar o passado

Davi, Sansão ou Gideão tenham existido de fato. E, a exemplo do intrépido Jones, também eles já passaram por maus bocados – com a diferença de que, no seu caso, os riscos foram reais. O doutor Rodrigo Pereira Silva, especialista em arqueologia pela Universidade Hebraica, tem mais de dez anos de experiência em escavações ao redor do mundo. Embora não se sinta um herói, ele admite que já correu risco de morte em algumas situações. Uma delas foi em Jerusalém. “Costumava sempre passar num mercado quando voltava do sítio arqueológico de Shaar ha Golan”, lembra. “Certo dia, não me lembro por quê, segui por outro caminho. Não demorou muito e alguns amigos vieram desesperados me contar que um atentado a bomba no mercado tinha feito 50 vítimas, entre mortos e feridos.” Silva, de Barros 38 anos, é professor de Novo Testamento no Centro Universitário Adventista (Unasp) e curador do Museu de Arqueologia Bíblica Paulo Bork, instalado naquela instituição, no município paulista de Engenheiro Coelho. Cada descoberta, claro, tem seu preço. Além de muito trabalho e perseverança, Rodrigo Silva, volta e meia, é envolvido numa situação de perigo. Em 2001, no auge da Intifada, o pesquisador alugou um carro com placa israelense e dirigiuse a Nazaré, área sob administração palestina. “Errei o caminho e fui atacado com paus e pedras pelos moradores da região, que devem ter pensado que eu era judeu.” No sufoco, fez o que qualquer crente faria – pediu socorro a Deus. O professor Rodrigo Silva em um “A ajuda veio através de outro motoriss´tio arqueológico: “Corremos ta, que acenou para que eu o seguisse. riscos, mas vale a pena” Nem sei de onde veio o sujeito, mas ele me indicou o caminho certo e fugi dali”, lembra, divertido. Há dois anos, Silva fazia escavações em Tel Dan, próximo ao Mar Mediterrâneo, quando estourou um blico – a não ser, claro, no caso de uma conflito entre Israel e Líbano por causa descoberta espetacular. Com a arrancada do sequestro de dois soldados israelenda arqueologia bíblica, cada vez mais es- ses pelo grupo radical Hiz­bolla. “Eu só tudiosos cristãos têm se dedicado a juntar ouvia os caças israelenses passando por peças e documentos que comprovam a cima da minha cabeça e depois o estronveracidade das Escrituras Sado das explosões dos mísseis.” gradas. Movidos pelo interesPor segurança, todos os arArqueologia se científico e pela paixão requeólogos foram re­ti­rados da ligiosa, pesquisadores ligados região. Mesmo assim, Rodria universidades confessionais ou mesmo go Silva não desiste do trabalho: “O que autônomos vasculham sítios arqueológi- me move é a paixão pela descoberta, pois cos, sobretudo na Terra Santa, em busca confio no cuidado e proteção de Deus”, de provas de que heróis bíblicos como afirma, cheio de fé.

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O cinema popularizou a figura de aventureiros que enfrentam todos os perigos para desvendar os enigmas do passado. Quem nunca assistiu, por exemplo, um filme do herói Indiana Jones, vivido pelo ator Harrison Ford, que arrisca o próprio pescoço em expedições pelos quatro cantos da Terra? Mas na vida real, os pesquisadores levam uma vida bem menos glamurosa, palmilhando antigas ruínas e cidades perdidas em busca de vestígios de antigas civilizações. Um trabalho duro, que passa longe dos olhos do grande pú-

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Arquivo pessoal

Arqueólogos cristãos arriscam o próprio pescoço em busca de fragmentos que comprovem a fidedignidade da Bíblia


Arquivo

“Vale a pena” – “Temos descoberto tantas evidências que iluminam a parte histórica da Bíblia que isso tem tornado muitos céticos em crentes”, comemora o pesquisador Michelson Borges, citando as palavras do arqueólogo Paulo Bork, um dos mais respeitados arqueólogos bíblicos do Brasil. O estudioso hoje vive nos Estados Unidos, onde dá continuidade aos seus trabalhos. “Ele me dizia que sempre existirão aqueles que não crêem na Bíblia e a criticam. Muitos deles não vão mudar sua forma de pensar, independentemente das evidências arqueológicas”, reconhece. Segundo Borges, Bork escavou, em mais de cinco décadas de carreira, em diversos países, como Egito, Iêmen, Jordânia e Turquia, além, é claro, de Israel. Sob o patrocínio do Museu Arqueológico de Jerusalém, realizou entre 1975 e 1978 um trabalho inédito para traçar e definir a localização dos muros e portões da antiga Cidade Santa. Outro que conhece bem os perigos do ofício de coletar peças antigas in loco é Jorge Fabbro, coordenador do curso de pós-graduação em arqueologia do

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O arqueólogo Paulo Bork fez trabalhos de campo ao longo de quase cinco décadas Oriente Médio Antigo na Universidade de Santo Amaro (Unisa). Ele estava em Megido – local apontado pelo Apocalipse como cenário da batalha do Armagedon, que deve anteceder ao fim dos tempos – em busca de peças da época da ocupação cananita da região, por volta do século 10 a.C. Encantado com a des-

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coberta de uma escama de bronze que provavelmente pertenceu a um guerreiro do período, nem percebeu os combates entre caças israelenses e bases militares do exército do Líbano. Apesar do risco que correu, Fabbro acha que o trabalho valeu a pena. “Os achados foram abundantes e incluem as bases de imensas colunas e os alicerces de um templo monumental do ano 3100 a.C. e muitos outros itens”, entusiasma-se. De outra feita, caminhando pelas ruas do bairro árabe da Cidade Antiga de Jerusalém a caminho do Monte do Templo, o arqueólogo inadvertidamente já ia entrando no santuário islâmico pela porta de acesso exclusivo a muçulmanos. Ele passava distraído pelas barracas de mercadores que vendem toda sorte de produtos e quinquilharias quando foi agarrado pelo braço. “Fui puxado com grosseria por um soldado da Autoridade Palestina, muito bravo, e nem tive tempo de explicar o engano”, conta. Fabbro só teve tempo de olhar o fuzil do militar e sair rapidamente dali. “É pena que os tempos mudam mas os conflitos humanos permanecem”, comenta o estudioso.


Encruzilhada histórica O arqueólogo Yosef Ganfinkel apresenta a descoberta: apesar da cautela da comunidade cient´fica, s´tio de Khirbet Qeiyafa já provou sua importância

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No verdejante vale de Elah, onde, segundo a Bíblia, ocorreu o célebre confronto entre Davi e o gigante filisteu Golias, arqueólogos estão escavando uma cidade fortificada de três mil anos de idade cuja descoberta pode mudar os conhecimentos acerca dos primórdios da nação de Israel. Uma peça com cinco linhas inscritas em cerâmica encontrada na localidade de Khirbet Qeiyafa pode ser o mais antigo texto em hebraico já encontrado. Ela pode lançar luzes sobre o período em que o mesmo Davi reinou em Jerusalém – e fornecer elementos novos ao debate controverso e muitas vezes politizado que tenta determinar se Israel era um reino importante ou simplesmente um conjunto de tribos. Esta questão divide não só os acadêmicos, mas também aqueles que procuram defender ou contestar a legitimidade do sionismo. O sítio arqueológico, de dois hectares, tem fortificações, casas e um portão de entrada dotado de múltiplas câmaras. Somente uma parcela muito pequena do local foi escavada, e nenhum dos resultados foi publicado ou examinado inteiramente. Mas a escavação, conduzida pelo arqueólogo Yosef Garfinkel, da Universidade Hebraica de Jerusalém, já está causando interesse entre seus colegas e entusiasmo daqueles que procuram usar a Bíblia como um guia para a história e a confirmação de sua fé. “Esse é um novo tipo de sítio, que abre uma janela para uma área sobre a qual tínhamos muito pouco conhecimento”, diz Aren Maeir, professor de arqueologia na Universidade Bar-Illan e diretor de uma importante escavação sobre os filisteus, perto do local.

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O século 10 a.C. é o período mais controverso na arqueologia bíblica. De acordo com o Antigo Testamento, foi naquela época que Davi unificou o Estado hebreu. Para muitos judeus e cristãos, e mesmo para aqueles que não interpretam as Escrituras literalmente, a Bíblia é uma fonte histórica vital. E, para o moderno Estado de Israel, que se considera sucessor daquele reino, provas de que os relatos bíblicos procedem têm imenso valor simbólico. O site do Ministério do Exterior Israelense, por exemplo, apresenta os reinos de Davi e de seu filho Salomão, junto com um mapa de seu território, como um fato histórico incontestável. Registro escasso – O fato é que o registro arqueológico do antigo reino de Israel é muito escasso, quase inexistente. Diversas correntes de estudiosos argumentam que, na verdade, ele seria um mito criado séculos mais tarde. Uma grande potência, observam, deixaria sinais de cidades e de atividade, e teria sido mencionada pelas culturas vizinhas. Mas nada parecido surgiu na área, ao menos até agora. O que Garfinkel descobriu até agora é significativo. Dois caroços de azeitona queimados foram submetidos a testes de carbono-14 e datados de entre 1050 a.C. e 970 a.C., exatamente o período em que a maior parte das cronologias aponta para o reinado de Davi. Um especialista em antigos idiomas semitas na Universidade Hebraica, Haggai Misgav, diz que a escrita na cerâmica, que usa carvão e gordura animal como tinta, foi feita com os caracteres conhecidos como proto-cananeus. Tal descoberta pode ter um papel importante em dispu-

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Achado de cidade fortificada com idade estimada de três mil anos pode lançar luzes sobre período em que Davi reinou em Jerusalém tas mais amplas sobre a Bíblia, já que, se outros exemplos de escrita forem localizados, isso sugeriria um meio pelo qual eventos poderiam ter sido registrados e transmitidos no período anterior àquele em que a Bíblia provavelmente foi escrita. Outro motivo para que o local seja promissor é que ele esteve em uso por um período curto, talvez apenas 20 anos, e depois foi destruído. Abandonado ao longo dos séculos, foi acumulando camadas sedimentares, o que selou os achados com uma uniformidade semelhante à de Pompéia, a cidade italiana destruída pelo vulcão Vesúvio no início da Era Cristã e cujos achados impressionam pela conservação. Ainda assim, está longe de estar claro que relação o sítio de Khirbet Qeiyafa tem ou não com o rei Davi e os israelitas. Garfinkel sugere que a escrita hebraica e a localização – uma colônia fortificada a cerca de dois dias de caminhada de Jerusalém – ajudam a sustentar a hipótese de que a capital era importante a ponto de requerer uma posição de defesa avançada como essa, especialmente porque ela ficaria entre a grande cidade filistina de Gath e Jerusalém. “O sítio certamente é importante, um dos pouquíssimos casos datados do século 10 a.C. em que se pode ver uma colônia fortificada em estilo típico dos métodos posteriormente empregados para a defesa de cidades israelitas e de Judá”, acredita Amihai Mazar, professor de arqueologia na Universidade Hebraica. “A questão é determinar quem a fortificou, quem vivia nela, por que ela foi abandonada e de que maneira isso tudo se relaciona aos reinados de Davi e de Salomão”. ( Joanna Brandão)



O milagre da multiplicação de CDs

Faz um milagre em mim, o maior fenômeno musical evangélico do momento, repercute nas rádios seculares

dio católicas, Faz um milagre em mim já foi executada até em centro espírita e em programas de TV como o do apresentador Raul Gil, da Rede Bandeirantes, e o TV Xuxa, da Globo. Tamanho sucesso – um milhão de cópias vendidas, segundo dados da gravadora Line Records – contrasta com a situação do cantor há alguns poucos meses. “Não digo que passei fome, mas para quem andava de carrão importado de repente não ter mais dinheiro para nada, com família para sustentar, é muito complicado. Mas, graças a Deus, isso mudou.” Natural de Passos (MG), Danese iniciou sua carreira em 1989, integrando a dupla sertaneja Régis & Raí, com a qual lançou um LP pela extinta gravadora BMG Ariola. Mais tarde, em 1991, foi convidado pelo pagodeiro Alexandre Pires para participar do grupo Só Pra Contrariar. Durante cinco anos, suas composições fizeram sucesso, como Te amar sem medo, O samba não tem fronteiras e Amor verdadeiro. São dele também várias canções interpretadas por artistas como DaO cantor e compositor mineiro Régis Danese conseguiu mais niel, Gian e Giovani, Cristyan e Ralph, Belo, Vavá, Elimar do que pede a Deus na letra de seu maior sucesso musical, Faz Santos e Alcione. um milagre em mim. Desde que lançou seu último trabalho, o Porém, há quatro anos, Danese se converteu ao Evangelho CD Compromisso, puxado pela canção cujo primeiro verso diz por intermédio de um amigo, o também cantor Vandinho, que “Como Zaqueu, eu quero subir o mais alto que eu puder”, em curiosamente era ministro de louvor de uma Igreja Quadranoutubro do ano passado, Danese está saboreando bem mais gular em Uberlândia (MG) e cantava no grupo de pagode: que quinze minutos de fama. A música é um fenômeno, gruda “Ele ficou durante anos no conjunto e sempre manteve uma na cabeça como chiclete e toca em todas as rádios evangéli- postura diferente da nossa, mostrando seu caráter de homem cas, seja qual for a igreja ou empresa que a controle – o que, de Deus. Certo dia, quando eu passava por um grave problepor si só, já pode ser considerado um milagre, dada a acirrada ma no meu casamento, ele me falou de Jesus. Recebi aquela concorrência, para dizer o mínimo, que caracteriza o palavra e acreditei”, lembra o compositor. A partir setor. Faz um milagre em mim também é pedida pelos dali, Danese abandonou a carreira secular e passou Mercado ouvintes de rádios seculares que tocam em geral funk a conviver com diversos problemas financeiros, até o e pagode, como a popular Nativa FM 96,5, uma das milagre da multiplicação de CDs acontecer. mais ouvidas do Rio de Janeiro. Consciente da realidade do mercado fonográfico brasileiro, “Nunca imaginei que uma canção cristã pudesse tocar numa ele não tem ilusões: “Não dá para viver com o dinheiro dos rádio dessas, é difícil de acreditar”, diz Danese, ainda surpre- direitos autorais”, resigna-se. Danese hoje frequenta com a so com o efeito do sucesso. Na Saara, região de comércio po- mulher Kelly e o filho Bruno a Assembléia de Deus de Uberpular do centro do Rio, os alto-falantes dos boxes que vendem lândia. Nesta entrevista a CRISTIANISMO HOJE, o artista produtos evangélicos (originais ou não) despejam a canção nos fala sobre música evangélica, mercado gospel, direitos autorais ouvidos dos transeuntes o dia todo. Além de emissoras de rá- e a sempre controversa questão da cobrança de cachês:

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Divulgaçã

Marcelo Barros

Cantor e compositor, Régis Danese acha que o hit Faz um milagre em mim pode abrir mercados para a música gospel


CRISTIANISMO HOJE – A quê você atribui o estrondoso sucesso de Faz um milagre em mim? RÉGIS DANESE – Na verdade, essa música não foi composta por mim. A letra é da minha mulher, Kelly, e do compositor Joselito, amigo nosso. Curiosamente, eu pretendia guardar Faz um milagre em mim para o próximo CD, mas várias pessoas que a ouviram antes de ser gravada me disseram para não esperar mais. Alguns desses irmãos profetizaram para mim, dizendo que a música iria abrir as portas do Brasil para o meu ministério. Eu sempre escuto essas pessoas, pois através delas Deus pode falar. E eu tenho um certo dom para reconhecer uma canção que promete. Eu sabia que essa música tinha algo que iria pegar. No início, achei que só estava tocando no eixo Rio-São Paulo, mas vejo que está por todo lado, graças a Deus. Tem uma letra muito forte, que fala com qualquer ser humano, seja crente ou não; o pessoal se identifica com o verso “mexe com minha estrutura”. Essa palavra é a que toca as pessoas, pois vai ao encontro do que há no coração de todo mundo. Todos temos essa necessidade de que Deus vá tão fundo em nossa vida que altere toda a nossa estrutura. Como é o processo de criação de suas composições? Como compositor, posso dizer que a fórmula é a inspiração natural. Você está andando no carro e sente uma inspiração; então, deve parar e escrever. Mas não dá para forçar a barra e tentar repetir fórmulas ou receitas – ainda mais com as coisas de Deus.

sica evangélica. Ela foi cantada até no programa do padre Marcelo Rossi, na Rede Globo, e tem sido chamada de hit gospel. Como foi sua carreira evangélica até aqui? Meu primeiro CD, O meu Deus é forte, ninguém queria pegar. Aí, eu fui indicado como revelação masculina e melhor CD independente num concurso nacional, e só então a Line Records começou a distribuí-lo. O segundo álbum já foi distribuído pela Line. Agora, o Compromisso já chegou à marca de 1 milhão de cópias vendidas. Foi o suficiente para você se estabilizar financeiramente? Tenho participação nas vendas e minha vida financeira mudou da água para o vinho. Volto a dizer que, quando abandonei a música secular, perdi tudo, menos a casa onde moro. Alguém já tinha me dito que Deus iria restaurar meu patrimônio, o que está acontecendo agora. Como é sua relação profissional com o segmento evangélico? Você cobra cachê para se apresentar nas igrejas? No início, quando me converti, eu não precisava, pois vim do mundão com o bolso cheio. Nem aceitava oferta para cantar em igreja. Mas o dinheiro acabou e vieram as dificuldades. Minha banda é formada por nove pessoas, incluindo eu e um auxiliar. Todos os músicos são do Rio de Janeiro e são todos evangélicos. Se sou convidado para ir a um evento com cobrança de entrada, estabeleço um cachê. Mas, quando vou às igrejas, é diferente. Quando elas têm condição de nos abençoar com uma boa oferta, a gente aceita. Mas, quando é uma igreja pequena e sem recursos, cantamos de graça mesmo. Às vezes, nem levo CDs.

Essa música tem uma letra muito forte, fala com qualquer ser humano, seja crente ou não

Antes de se converter, você compunha para vários artistas da música popular brasileira. Ainda recebe pelos direitos autorais? Não. No Brasil, não é como nos Estados Unidos. Aqui, a música é descartável. E isso está ocorrendo com a música evangélica também. Virou um comércio. A música para de tocar, você para de receber. No caso de Roberto Carlos ou Chico Buarque, por exemplo, eles recebem muito dinheiro porque fizeram músicas que não são perecíveis. Mas as minhas composições naquela época, reconheço, eram sucessos de momento, para ganhar dinheiro. A partir do momento em que eu larguei a carreira secular, que era o meu ganha-pão, passei um tempo recebendo dinheiro de direitos autorais: de três em três meses, eu recebia uma grana. Só que depois fiquei sem dinheiro. Perdi quase tudo e quase passei necessidade. Mudei de um carrão importado para um carro velho, assim que entrei na igreja. Houve quem dissesse que eu deveria voltar ao ambiente mundano. Mas com essa música, tudo mudou. O Senhor tem me abençoado. Você acha que o sucesso dessa canção pode aumentar a aceitação das músicas evangélicas no mercado secular? Olha, por volta de 1991, quando eu comecei a cantar sertanejo com o Raí, nenhuma rádio tocava esse tipo de música. Depois, com o sucesso de algumas duplas, o sertanejo virou febre em todo o país. O mesmo aconteceu com outros ritmos que só tinham algum espaço em rádios segmentadas, como funk e pagode, mas que venceram o preconceito e se disseminaram. O sucesso de canções gospel como Faz um milagre em mim tende a abrir mercado para a mú

Quando você canta em cultos, a igreja fica obrigada a comprar determinado número de CDs? Não. Isso não ocorre. Alguma igreja já lhe deu calote? Infelizmente, há igrejas que fazem isso. Já houve casos de eu ter que tirar o dinheiro do bolso para voltar para casa. A igreja fez o convite, eu fui e depois não cumpriram o acordo. Hoje, tento evitar que um compromisso não seja cumprido por parte de quem me convida. Tenho pessoas que cuidam da agenda e outros que me ajudam na questão estrutural, tratando dos detalhes. Uma agência de viagens vende as passagens para a minha banda. Na hora que a pessoa fecha a minha participação em um evento, ela já compra com essa agência de viagem as passagens de ida e volta do grupo. Muitos cantores evangélicos cobram cachê até para cantar em cultos, e não cobram pouco. O que acha disso? Não fico à vontade para julgar isso. É o mesmo caso daqueles cantores que se convertem, cantam nas igrejas e depois voltam para o mercado secular. Como posso criticá-los, se minha conversão é fruto desse vai e vem? f e v e r e i r o

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livros | música | vídeo

CH Cultura

[Livros – Jaqueline Rodrigues]

professora de Português-Literatura

Relação delicada

Liberdade para valer A oração que liberta Beth Moore 352 páginas Mundo Cristão

O HOMEM E O DINHEIRO TRATA DA QUESTÃO DOS VALORES CONFRONTANDO-OS COM A ÉTICA CRISTÃ E OS PARÂMETROS BÍBLICOS O homem e o dinheiro Jacques Ellul 184 páginas Palavra

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o longo dos tempos, muito se tem falado e escrito acerca da relação do homem com o dinheiro. O chamado vil metal tem sido apontado, quase sempre com justiça, como a fonte motivadora da maior parte dos conflitos humanos. Não por acaso, o apóstolo Paulo, em uma de suas epístolas a Timóteo, adverte que o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males, já que, com seu enorme poder de sedução, a riqueza é capaz de subjugar o homem a ponto de determinar como deve viver. Pois o inconformado teólogo, sociólogo e escritor francês Jacques Ellul (1912-1994) reluta em aceitar essa ordem das coisas. Autor de títulos de importância contemporânea como Apocalipse e Palavra humilhada (Paulinas) e Mudar de revolução (Rocco), Ellul convida o leitor de O homem e o dinheiro ao bom senso diante da posse do dinheiro, a fim de não desagradar a Deus – aliás, a devoção a um ou a outro são necessariamente excludentes, conforme o próprio Cristo alertou a seus discípulos. Na visão do escritor, o dinheiro transcende seu papel de simples meio de troca universalmente aceito para assumir um caráter próprio, com poder capaz de interferir em todos os aspectos da vida em sociedade. Como os profetas do Antigo Testamento, Ellul é lúcido, livre e esperançoso, apontando o caminho que se deve trilhar para que as riquezas não sirvam ao egoísmo, mas a propósitos de acordo com o Evangelho. 52

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Ser livre é tudo o que se quer, mas a única e verdadeira liberdade só é proporcionada através do conhecimento da Palavra de Deus. Autora e palestrante de sucesso nos Estados Unidos e no cenário cristão internacional, Beth Moore trata da liberdade cristã em forma de estudo bíblico, usando como base o livro do profeta Isaías. A oração que liberta faz paralelos com um dos períodos mais conturbados da história de Israel, marcado por conflitos externos e sedições internas. Beth menciona como alguns reis hebreus levaram seu povo à ruína da falta de fé, orgulho, idolatria, legalismo – coisas que precisam ser removidas definitivamente da vida do crente, caso seu objetivo seja realmente ser livre.

Seminário em casa Manual do Seminário de Ciências B´blicas 114 páginas Sociedade B´blica do Brasil Este manual reúne o conteúdo de palestras proferidas no Seminário de Ciências Bíblicas, evento promovido anualmente pela Sociedade Bíblica do Brasil (SBB). A formação do Cânon sagrado, a natureza da Bíblia e sua função na Igreja contemporânea são alguns dos temas tratados por estudiosos como Rudi Zimmer, Lécio Dornas e Vilson Sholz, e o mérito do lançamento é justamente trazer tais temas aprofundados para quem não compareceu às oito edições do seminário. Contextualizado com os conhecimentos recentemente adquiridos através de descobertas arqueológicas e dos avanços nos estudos das línguas bíblicas, o Manual do Seminário é um material importante para fomentar o estudo e a utilização mais qualificada das Escrituras Sagradas.

O caminho da transformação Meditações sobre o crescimento espiritual Joshua Choonmin Kang 174 páginas Vida Nova Não deixa de ser surpreendente ver uma editora especializada em obras de referência e teologia publicar um livro como esse. Meditações é exatamente o que o título sugere: são 52 textos curtos para leitura rápida, mas nem por isso, superficial. Na verdade, este é um livro que se alinha a outros que fazem parte de uma nova onda de títulos publicados na área de espiritualidade cristã, assinados por autores renomados como Henri Nouwen, Eugene Peterson, Dallas Willard e James Houston, entre outros. Talvez isso seja resultado da busca por conteúdos mais experimentados e densos por quem não está nada conformado com uma vida cristã utilitária.


[Música – Nelson Bomilcar]

músico e escritor

Evangelho puro

e com arte

JORGE REHDER COMEMORA 35 ANOS DE CARREIRA COM O ÁLBUM PORTO ESPERANÇA, MAIS UMA BELA MOSTRA DE SEU TALENTO E ESPIRITUALIDADE

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orto esperança é um registro autoral celebrando a música e o ministério de 35 anos de Jorge Rehder. O nome certamente dispensa maiores comentários, mas basta dizer que ele é um dos compositores cristãos que sabe transmitir o Evangelho na realidade brasileira e legou à posteridade joias como Em todo o tempo, Enche-me Espírito, Rei das nações e Barnabé, além das cantatas Vento livre, Missões e adoração e Luz. Dentista e pastor, Rehder é um dos artistas contemporâneos mais conhecidos da Igreja brasileira, com uma veia musical simples, que traz a excelência da poesia e a integralidade da fé cristã em melodias que o povo canta e aprecia. Porto esperança é mais uma de suas pérolas. Gravado no estúdio COMEV em São Paulo, com a produção musical de Daniel Maia e produção técnica de Edu Sider, o álbum juntou ainda muita gente boa – além de suas filhas Marina e Carolina Rehder, amigos como Carlos Sider, Bidú Novaes, Juliana e Renato Pimenta, Léo Sider e Karen Bomilcar, entre outros. (contatos: www.vpc.com.br).

Jorge Rehder: arte brasileira e conteúdo b´blico

PRATELEIRA PAULO CESAR BARUK E BANDA SALLUZ Louvor eletro acústico 2 (DVD e CD)

Paulo Cesar Baruk é um dos mais conhecidos e admirados ministros de louvor da nova geração. Músico e cantor experiente em muitas gravações, agora ele traz este registro emocionante gravado ao vivo, em DVD e CD, junto com a competente Banda Salluz, formada por Leandro Rodrigues (piano), Tarcísio Buiochy (bateria), Alexandre Mariano (guitarra) e Fábio Aposan. Além da própria ministração, o destaque é para as músicas Tua Palavra, Cantai ao Senhor, Incalculável e um surpreendente meddley black. Ah, a direção artística é de sua mulher, Rebeca Nemer, e de Márcia Silva (www.baruk.com.br)

ALBINO JUNIOR E BANDA TRAMA Para pais e filhos

Este é um daqueles trabalhos que demonstram claramente o caráter e as motivações de seu autor. Albino Junior é um músico com trajetória diferenciada por sua consciência social cristã, desde sua participação na Cia Alternativa, seus trabalhos solo e o histórico CD O mundo de criança. Para pais e filhos expressa a preocupação do artista com a infância e a família, inspirado no projeto Vila Criar, que trabalha com crianças. Destaque para a faixa A vida por um fio, escolhida como tema de uma campanha social em São Paulo. (www.bandatrama.com.br )

WESLEY E MARLENE / TRANSMUNDIAL Hinos, belos hinos, volume 4

Sossegai, Tudo entregarei, Porque Ele vive, Ninguém detém, Chuvas de bênçãos... O leitor mais jovem talvez não conheça canções como estas, mas é bom saber que, além de centenárias, em alguns casos, elas têm edificado a fé de gerações de cristãos. Pois Hinos, belos hinos é uma deliciosa coleção do que de melhor existe no cancioneiro protestante, selecionado e cuidadosamente interpretado por Wesley e Marlene, músicos com mais de 30 anos de estrada e missionários da Rádio Transmundial. Além dos arranjos contemporâneos, o ouvinte vai se deliciar com o encarte histórico. www.transmundial.com.br

VIVIAN LAZZERINI Vivian Lazzerini Kids

www.nelsonbomilcar.com.br

Depois de três bem sucedidos DVDs com aulas e apresentações que ajudam a igreja a recuperar o universo da dança e vencer preconceitos, a bailarina Vivian Lazzerini usa a trilha sonora do produtor Cezar Elbert para mais este importante trabalho. Música, expressão corporal e magníficas coreografias estimulam a criança a usar sua estrutura corporal e linguagem própria para adorar ao Pai. www.vpc.com.br f e v e r e i r o

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[V deos – Nataniel Gomes]

professor e editor

PELÍCULAS

Guerreiro do bem

São inúmeros os filmes que mostram os crentes através de estereótipos. Algumas vezes, eles são implacáveis; outras, injustos; e em diversas situações, engraçados. Por isso vale a pena, de vez em quando, dar um pulinho na locadora e garimpar algumas obras que, se nem sempre dão orgulho, pelo menos fazem pensar um pouco acerca da fé e da vida cristã que se leva – e, de quebra, entender como gente de fora do segmento religioso enxerga os evangélicos.

EM SUA ÚLTIMA AVeNTURA, RAMBO ENFRENTA UM EXÉRCITO INIMIGO PARA LIBERTAR MISSIONÁRIOS FEITOS REFÉNS

ENTRE O CÉU E O INFERNO (Paramount)

Era (Christina Ricci) é uma jovem viciada em drogas e ninfomaníaca que é encontrada ferida à beira da estrada por Lazarus (Samuel L. Jackson). Cristão do sul dos Estados Unidos, recentemente abandonado pela mulher, ele vai tentar de todas maneiras que conhece a redenção espiritual da jovem – inclusive, usando de métodos pouco ortodoxos. Produzido em 2007, o filme tem direção de Craig Brewer e o elenco é completado por Justin Timberlake, S.Epatha Merkerson, John Cothran Jr e David Banner. Duração: 115 min.

MATADORES DE VELHINHAS (Disney)

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ambo, o comando fortão interpretado por Sylvester Stallone no cinema, não agrada a todos os cinéfilos. Pudera – o personagem, embora defenda a justiça e aja com as melhores intenções, promove verdadeiros banhos de sangue a cada película. O gênero arranca-cabeça normalmente agrada mais aos adolescentes. Só que Rambo IV, que chegou à telona no ano passado e ainda permanece em circuito por aí, é bem mais interessante que os caricatos segundo e o terceiro filmes. Neste episódio, John Rambo está vivendo na Tailândia e trabalha em um barco, quando é procurado por um grupo de missionários cristãos. Eles pedem sua ajuda para levá-los ao seu destino, em algum lugar da região de fronteira com Myanmar. Acontece que o país vizinho está sendo sacudido por uma longa e violenta guerra entre os birmaneses e a tribo karen. Resultado: os missionários são capturados, e adivinhe quem vai resgatá-los? Ele mesmo, Rambo, que é contratado por um pastor para libertar os obreiros. Segue-se uma carnificina – aliás, Rambo IV é o filme mais sangrento da série – e intensas cenas de ação. Dentro do estilo, a produção é uma das melhores do gênero. A lição do filme? Ora, cada um vai achar (ou não) a sua, mas com um pouquinho de boa vontade o espectador crente vai perceber a valorização do chamado cristão. Afinal, só mesmo muito amor pode fazer ocidentais se mandarem para o conturbado Sudeste Asiático em busca de almas para o Reino de Deus, não é mesmo? Da mesma forma, Rambo tem um tipo de vocação, a de ser guerreiro do bem, e vai às últimas consequências para cumpri-la. Na época do lançamento de Rambo IV, muitos evangélicos estavam ansiosos para ver o filme. É que desde Rocky Balboa, lançado em 2006, correu a informação de que Stallone tinha se convertido ao Evangelho. O problema é que, depois desta última aventura de Rambo, muita gente anda confundindo o personagem com o ator e questionando a sua experiência cristã... (Rambo IV, EUA, 2008. Direção: Sylvester Stallone. Elenco: Sylvester Stallone, Julie Benz, Matthew Marsden, Graham McTavish, Reynaldo Gallegos. Duração: 91 min. Flashstar) 54

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Tom Hanks é um estranho professor universitário de línguas antigas que chega a uma pequena cidade do Mississipi, nos EUA, para alugar um quarto na casa de uma senhora cristã piedosa e meio ranzinza. Ele diz que vai usar o porão para estudar música rococó, mas na verdade está tramando um grandioso roubo ao cofre de um cassino flutuante. Dirigido pelos irmãos Joel e Ethan Coen (Fargo) e rodado em 2004, este é o primeiro remake da dupla. O original foi batizado no Brasil de O quinteto da morte (1955), com Alec Guinness e o ainda não tão conhecido Peter Sellers. As tentativas de assassinato da senhora Munson (Irma P.Hall) são absurdamente engraçadas e críticas. Em cena, também, o dilema ético acerca do que fazer da fortuna recebida. Duração: 104 min.

FÉ DEMAIS NÃO CHEIRA BEM (Paramount)

O impagável Steve Martin vive o reverendo Jonas Nightengale, um charlatão que vende bênçãos em troca de doações em dinheiro feitas por pessoas simples e de boa fé. Com sua caravana pirotécnica, o picareta vai de cidade em cidade usando dos mais variados truques para ganhar os auditórios – os milagres são na verdade efeitos especiais. Em uma dessas viagens, o ônibus quebra e Nightengale se instala numa cidade pobre. Enquanto sua agente (Debra Winger) tenta convencer o xerife (Liam Neeson) a permitir a realização do “culto”, Marva (Lolita Davidovich) atrai a atenção do pastor. O final é surpreendente. Com 107 minutos e direção de Richard Pearce, o filme é de 1992.

O APÓSTOLO (Universal)

The Apostle, com Robert Duvall no papel-título, recebeu uma indicação ao Oscar de Melhor Ator e ganhou três prêmios no Independent Spirit Awards, inclusive o de Melhor Filme. A obra, de 1997, narra a trajetória de um pastor fervoroso e contraditório. Violento e ao mesmo tempo piedoso, ele é capaz de espancar um rival com a mesma disposição com que leva um pecador ao arrependimento. Abandonado pela mulher e acusado de assassinato, acaba fugindo e adota nome fictício. Numa pequena cidade, faz bicos para sobreviver até que, com apoio de um pastor aposentado (Billy Bob Thornton), reabre uma antiga igreja. Seu carisma logo faz lotar a pequena congregação. Traído por seu gênio irascível, o apóstolo se mete em muitas confusões, mas consegue despertar a fé de muita gente antes de acertar suas contas com a Justiça. Duração: 133 min.



Diante do drama da doença crônica da filha, a missionária Débora Kornfield encontra perspectivas espirituais para o sofrimento Carlos Fernandes que já nos sentimos injustiçados por Deus”, admite Débora. Em Karis – Adorando a Deus no deserto, que chega às livrarias em março pela Editora Mundo Cristão, ela faz um relato detalhado de como tem enfrentado a doença de Karis, os questionamentos acerca do amor de Deus, as dificuldades em família e o espectro sempre presente da morte. “O Senhor tem me desafiado a cada dia a lhe dar glórias, a perseverar e a crescer na minha fé”, diz. É uma luta que recomeça a cada amanhecer.

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CRISTIANISMO HOJE – Como está sua filha hoje?

DÉBORA KORNFIELD – Ela está vivendo um dia de cada Costuma-se dizer que quem sofre adquire mais sensibilidade vez. Em novembro passado, ela passou por uma situação grave para perceber o sofrimento dos outros. Quando a relação envolve de rejeição e infecção [N.da Redação: na semana em que a entremãe e filha, então, a situação é muito mais delicada. Há 24 anos, vista foi concedida, Karis estava internada nos Estados Unidos, com a missionária Débora Kornfield, nascida nos Estados Unidos, obstrução intestinal e outras complicações]. Nestes últimos meses, criada na Guatemala e radicada no Brasil – mais precisamente, ela passou por duas cirurgias de grande porte. Na verdade, ela em São Paulo –, vive um drama familiar: a doença crônica de sua não esteve bem durante o ano de 2008. filha Karis. Ela nasceu com uma grave deficiência intestinal que paralisa seu trato digestivo. Desde seus primeiros dias de vida, O livro é um desabafo? ela tem convivido com um calvário de longas internações, deli- O Salmo 145 nos manda contar os atos poderosos do Senhor. cadas cirurgias e desgastantes tratamentos. “É uma dor que não Senti que deveria escrever o livro por três motivos. Primeiro, para não me esquecer do que Deus tem feito por tem fim”, resume Débora. mim. Segundo, para encorajar outras pessoas em A dura realidade tem afetado não apenas Karis Entrevista meio às suas dificuldades; e, em terceiro lugar, para e Débora, como também seus três outros filhos e o que eu mesma pudesse entender melhor a nossa marido, e também missionário, David Kornfield. A vida da família tem girado em torno de um misto de provações peregrinação – e, através disso, talvez ajudar a nossa família. e fé – muita fé, diga-se de passagem. Obreiros ligados à Se- Quando começamos a contar a história no site da Karis, recebi pal – Servindo Pastores e Líderes, entidade de origem america- tantos e-mails de pessoas que de fato foram tocadas e encorana sediada na capital paulista, David e Débora estão no Brasil jadas por Deus através do que lhe aconteceu que percebi que o desde 1990. Eles desenvolvem um frutífero ministério junto à Senhor queria usar isso para fortalecer o seu povo. Ora, a linliderança evangélica, o Mapi (Ministério de Apoio a Pastores guagem do sofrimento é comum a todos, independente do tipo e Líderes), baseado na mentoria espiritual. Débora, autora do de provação que cada um enfrenta. livro Vítima, sobrevivente, vencedor (Editora Sepal), dedica-se ao ministério de restauração e especializou-se no aconselhamento A senhora diz várias vezes que sua própria filha pediu que não orassem mais por sua cura, entendendo que, como Paulo, a pessoas vitimadas pelo abuso sexual. Agora, a missionária, de 54 anos, prepara-se para lançar um deveria aprender a conviver com o “espinho na carne”. Como novo livro, onde conta os paradoxos entre a confiança na graça saber a maneira mais certa de orar nestas circunstâncias? de Deus e a própria atitude diante de uma enfermidade que, Creio que precisamos pedir a orientação de Deus em cada caso, apesar de algumas melhoras pontuais, não cede. “Reconheço pois o Senhor tem propósitos específicos em tudo que faz na

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A graça d


de viver cada dia vida de cada indivíduo. Não creio que a situação da Karis é modelo para outros, exceto na necessidade de procurar entender de Deus como devemos orar. Certamente, muitas pessoas continuaram (e continuam) a pedir cura para Karis, e estou muito agradecida por isso. Deus pode, a qualquer momento, responder dramaticamente a essas orações, como tem respondido tantas e tantas vezes de maneiras menos espetaculares, mas igualmente importantes para preservar a vida dela.

de todo sofrimento e enfermidade. Paulo diz que completamos em nossos corpos o sofrimento de Cristo. Os textos de Hebreus 2.14-18 e 4.14-16 destacam que podemos nos aproximar de Jesus confiantes de que ele sabe o que é sofrer, e se compadece de nosso sofrimento. Mas será apenas no novo Céu que Deus acabará com toda doença, morte, tristeza, choro e dor, conforme Apocalipse 21.4. Enquanto vivemos neste mundo caído, tais aspectos tristes da vida serão partes de nossa experiência.

Se é assim, por que Deus não a cura definitivamente? Não seria um sinal muito mais poderoso do seu poder?

Qual é o estado de ânimo de sua filha diante da doença?

Penso que, se Deus curasse a Karis de vez, as pessoas dariam muitas glórias ao seu nome por alguns dias ou semanas; mas, depois, esqueceriam. Já por mais de 25 anos, Deus tem me desafiado a cada dia a lhe dar glórias, a perseverar, a crescer na minha fé, apesar dos momentos muito difíceis que temos passado. Pelas mensagens que recebo, acredito que outras pessoas têm a mesma percepção em relação à situação de minha filha. Em algum momento, a senhora, sua filha ou sua fam´lia sentiram-se injustiçados por Deus? Como administraram este sentimento?

Não creio que o texto de Isa´as 53 significa que Cristo nos livra de todo sofrimento e enfermidade. Somente no novo Céu Deus acabará com toda doença, morte, tristeza, choro e dor

Claro que sim! Aliás, para descrever a luta de cada um de nós levaria muito tempo. Jamais, porém, ouvi a Karis expressar este sentimento. O que ela acha injusto é ser alvo de tantos recursos médicos e financeiros, dado o número de crianças totalmente saudáveis que morrem por fome ou por doenças fáceis de prevenir, especialmente em regiões pobres como a África. Quantas vezes ela tem chorado porque multidões não têm acesso às verbas gastas em favor dela. Como mãe, é claro, eu sofro junto com a Karis – muitas vezes, até pedi a Deus uma troca de lugares, passando para mim o sofrimento dela... Acho que qualquer mãe sentiria a mesma coisa. Confesso que, no início da vida de Karis, foi difícil para nós entender ou aceitar a situação dela, pois nunca havíamos nos imaginado passando por isso. Então, tentei escrever no livro um pouco sobre as minhas lutas – não tanto por me sentir injustiçada, mas por não entender o porquê de minha filhinha ter de sofrer tanto.

Mas um texto muito citado da B´blia, no cap´tulo 53 do livro de Isa´as, diz que Cristo tomou sobre si todas as nossas enfermidades. Como explicar, então, que a maioria dos crentes não recebe a cura divina? Falta-lhes fé?

Minha interpretação dessa passagem é um pouco diferente da de muitas pessoas. Jesus, por haver sofrido e passado o que passou, entende a minha dor, sente o que sinto, chora junto e me dá forças a cada dia. Por causa de textos no Novo Testamento, não creio que o de Isaías 53 significa que Cristo nos livra

É difícil começar a recuperar-se, por exemplo, de uma cirurgia, e logo enfrentar outro desafio, e mais outro, e mais outro, como ondas do mar que mal a permitem respirar. Essa tem sido sua rotina ao longo da vida. É claro que um processo desses impacta a vida emocional; não há como evitar isso. Um efeito colateral dos remédios que ela toma é a depressão. Até que a gente entendesse isso e a necessidade de tratamento específico – o que perdurará provavelmente pelo resto de sua vida –, sofremos muito. Por sua própria natureza, a Karis tem uma personalidade alegre, extrovertida, otimista. Por isso, esta depressão profunda causada pelos remédios foi talvez a mais difícil experiência de sua vida, pois ela sentiu que havia perdido até sua conexão com Deus. Mas nos últimos meses, desde que conseguiu sair do quadro depressivo, ela tem aguentado melhor. Acontece que minha filha tem sofrido uma série de perdas recentemente, inclusive a possibilidade de gerar filhos. E essas perdas precisam ser choradas, embora nem sempre achemos condições para este luto. No fim do ano passado, quando a possibilidade de morrer mais uma vez parecia próxima, a Karis sentiu a Presença de Deus muito perto dela. Estou grata ao Senhor por isso.

No livro, a senhora conta que sua filha recebeu várias supostas profecias e revelações dando conta de que seria curada – e tais previsões não se confirmaram. Quais os preju´zos emocionais e espirituais que isso acarretou à sua fam´lia?

Bem, nós aprendemos a usar de discernimento e cautela com as pessoas que queriam orar pela Karis ou entregar-lhe profecias, pois muitas deixaram-na muito mal. Minha filha é uma pessoa muito amorosa, mas quando disse que não estava conseguindo aguentar esse tipo de situação, tratamos de protegê-la. É difícil para uma menina num leito de extremo sofrimento, que apesar disso está seguindo a Deus com todo o seu coração, ouvir que está ali por conta de seus pecados ou de sua falta de fé. Creio que ninguém quis prejudicar a ela ou a nossa família; simplesmente, muitas pessoas não tiveram o discernimento adequado para nos abençoar da maneira que, sem dúvida, gostariam de haver feito.

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A g ra ç a de v i v er cada dia

Como fica o relacionamento familiar numa situação de crise permanente?

Tentamos equilibrar um dia de cada vez, às vezes conseguimos e outras vezes não – aí, precisamos pedir perdão e tentar restituir uns aos outros no que falhamos. Não acho que exista uma solução mágica ou fácil para isso. Tentei escrever no livro o suficiente sobre estes temas, para que outras pessoas, que também enfrentam esse tipo de pressões, pudessem pelo menos se sentir menos isolados e confusos nesta corda-bamba diária. Uma enorme bênção é o amor que existe entre nossos filhos, e eu e David, como pais, tentamos objetivamente valorizar cada um deles, mas muitas vezes não foi possível tratá-los igualmente. Por outro lado, outras famílias e a nossa igreja no Brasil têm ajudado a preencher lacunas inevitáveis, como minha ausência nos longos períodos em que precisei ficar nos Estados Unidos com Karis. Esse apoio tem sido precioso para nós. De que maneira seus outros filhos têm reagido diante da inevitável prioridade que a senhora tem dado, esses anos todos, a Karis?

Os nossos filhos dizem que a minha disciplina era rígida em comparação com o que observaram entre os colegas. O fato é que eu simplesmente não tive recursos emocionais para aguentar brigas, queixas ou discussões; então, não permiti que agissem assim comigo ou na minha presença. Para brigar entre si, eles tinham que entrar num quarto com a porta fechada e sair apenas quando estivessem em paz. Não sei como teria sido se eu não tivesse tanto estresse sobre mim. Em contrapartida, tentamos ouvir os nossos filhos com respeito e, dentro de nossas possibilidades, atender às suas necessidades e desejos. Raquel, uma de minhas filhas, hoje com 23 anos, não entendia por que Deus permitia tudo que já aconteceu com Karis, e qual o motivo de tanta dor. “Que Deus de amor é esse?”, questionava. Mas com o tempo, esse coração endurecido simplesmente a levou à raiva e à amargura. Só quando Raquel procurou confiar mais no Senhor, apesar das dificuldades, reconhecendo sua bondade e entendendo que ele se importa como nosso bem estar e sente nossa dor, que as coisas começaram a melhorar na sua vida espiritual e emocional. Hoje, ela entende que Deus é bom e compassivo, digno de toda devoção. Já a Valéria, que tem 20 anos, chegou a duvidar até mesmo da existência de Deus. A solução foi a decisão de crer nele, mesmo sem perceber nenhuma evidência de seu amor para com Karis e sem garantia do futuro. Ela permanece firme nessa decisão até hoje, o que lhe dá força para enfrentar cada novo dia. Tanto a senhora, atendendo sua filha, como seu marido, em suas tarefas ministeriais, passam longos per´odos longe um do outro. A vida conjugal sobrevive diante dessa realidade?

Escrevi um pouco no livro sobre as nossas lutas ao longo dos primeiros vinte anos da vida da Karis. Conversas com outros casais com filhos doentes confirmam que a nossa experiência é comum. Aliás, isso faz sentido: dizem que a média de divórcios entre pessoas sem as pressões de uma doença crônica na família está na faixa de 40% a 50% – imagine então o desafio para os casais que, além de todas as demandas do dia a dia, precisam lidar com o estresse multiplicado pela enfermidade de um filho. É claro que isso afeta a dimensão do relacionamento conjugal. Parece que uma doença crônica é como um grande buraco escuro, onde é jogado tudo que se tem de tempo, energia, atenção, recursos financeiros e até cria-

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tividade, restando pouco ou nada para dar ao cônjuge. Além disso, nunca podemos contar com a realização de um plano. Muitas vezes tivemos que cancelar uma viagem em família por conta de uma crise de Karis ou passar as férias num quarto de hospital. Não tem sido fácil, claro. É uma tensão persistente. O tempo que temos juntos é precioso. Quando fico ciente das lutas de outros casais que enfrentam estresses mais, digamos, normais, fico admirada da determinação e compromisso que o meu marido tem com o nosso casamento. O que mais vejo entre os que lidam com doença crônica na família é o marido não aguentando a situação e pulando fora. Hoje em dia, é normal que casais de obreiros desenvolvam o mesmo ministério. Até que ponto seu chamado é diferente do de seu marido e quais as interseções entre eles?

David trabalha mais com o Mapi, pastoreando pastores. Já eu tenho atuado com o Rever, um ministério de restauração da alma, especificamente com sobreviventes de abuso sexual. Meu marido ajudou na organização do Rever e dedicou bastante tempo ao início do ministério, mas agora dá pouca atenção a esta área diretamente. No Mapi, o que mais tenho feito é ajudar no aconselhamento de casais pastorais, onde é vantajoso trabalharmos como casal. Há muito mais que David e eu gostaríamos de fazer juntos, se Deus permitir.

Sua atividade missionária, bem como a de seu marido, obrigou sua fam´lia a constantes mudanças. De que forma a mulher deve enfrentar a situação, já que é delas a maior instabilidade nestas situações?

Em nosso caso, as viagens constantes de meu marido deixam para mim uma responsabilidade maior para manter a estabilidade em casa. Quando as crianças eram pequenas, eu praticamente não viajei com David – fiquei em casa para cuidar dos filhos e me envolvi em ministérios locais. Aliás, recebi críticas de pessoas que achavam melhor que eu acompanhasse mais o trabalho dele, mas não me arrependo. A vida da mulher tem fases, e a fase da infância dos filhos exige dela um compromisso específico por alguns anos. Quando nossos filhos estavam mais independentes, comecei a viajar uma vez por mês – às vezes com meu marido, às vezes sozinha –, mas tentei nunca ultrapassar este limite. Deixei claro que as necessidades de meus filhos eram a prioridade. Além disso, precisei manter os meus compromissos mais flexíveis do que seriam no caso de uma mulher sem filho doente. Felizmente, a nossa missão valoriza e apoia o cuidado da família como parte da vocação missionária. Durante décadas, a Igreja brasileira tem sido influenciada por missionários estrangeiros, sobretudo americanos. A senhora acha que obreiros dos EUA ainda têm o que oferecer ao Brasil, que hoje é uma potência evangélica?

Na minha perspectiva, a Igreja brasileira amadureceu muito. Chegamos ao Brasil em 1990, e naquela época a Igreja parecia uma adolescente, com muito entusiasmo, mas sem tanta estabilidade ou profundidade. A falta de um discipulado adequado fazia com que muitos convertidos saíssem pela porta dos fundos. Poucas igrejas usavam grupos pequenos para aprofundar estudos bíblicos, incentivar relacionamentos ou evangelizar. Além disso, havia competição entre denominações; faltava um trabalho conjunto para alcançar as suas cidades e pouco se fazia para ministrar às gritantes necessidades sociais do país. Agora, quase vinte anos mais tarde, parece-me que a Igreja brasileira tem amadurecido


Arquivo pessoal

ao ponto de assumir mais responsabilidade, não apenas para cuidar de si, mas de multiplicar-se, até mesmo em outros países. A firmeza espiritual da Igreja será revelada na qualidade de suas obras missionárias. Vejo trabalhos muito sérios e eficazes, maior cooperação e respeito entre as denominações e maior ênfase em ministérios holísticos, que cuidam de todas as dimensões da pessoa, e não apenas do aspecto espiritual. Se a Igreja brasileira se fechasse para missionários estrangeiros, continuaria muito bem, talvez até melhor, pois teria que assumir tudo para si. Então, o tempo dos missionários estrangeiros já passou?

carências nas fam´lias dos pastores têm aumentado?

Karis Kornfield

Não, acho que existem áreas em que essa participação ainda é bem vinda. Uma vantagem que os missionários estrangeiros têm a oferecer à Igreja do Brasil é o recurso de tempo integral e, na maioria das vezes, de sustento provido. Assim, alguém como o meu marido pode viajar pelo país afora, oferecendo-se de uma forma que seria difícil para a maioria dos pastores brasileiros, simplesmente por falta de condições. Veja o meu interesse em treinar líderes para grupos de apoio a vítimas de abuso sexual. Creio piamente na habilidade de brasileiros de fazer este trabalho muito melhor do que eu. Mas desconheço alguém que tenha condições para dedicar-se explicitamente para levantar este ministério – pelo menos, ninguém apareceu até agora. Se Deus permitir que eu volte para o Brasil, o simples fato de ter estas condições de tempo, recursos e disponibilidade para viajar, poderá, pela graça de Deus, resultar em um ministério eficaz a nível nacional, com aliados em todas as principais cidades brasileiras. A meu ver, as áreas mais importantes para este tipo de parceria são exatamente as de cuidado e treinamento da liderança brasileira, conforme diz o lema da Sepal: “Servindo aos que servem”.

É dif´cil para uma menina que, apesar de tanto sofrimento, segue a Deus com todo seu coração, ouvir que está sofrendo por conta de seus pecados ou de sua falta de fé

Missionários dependem dos chamados mantenedores. Com a crise que, surgida nos EUA, alastrou-se pelo mundo, o que deve mudar em relação ao sustento dos obreiros no campo?

Em um sentido importante, nada mudou: a nossa dependência de Deus para suprir as nossas necessidades, através da boa vontade e a generosidade de seu povo. Talvez a crise econômica mundial faça de todos nós melhores mordomos de nossos recursos. Ainda estamos longe do tipo de sacrifícios que gerações passadas abraçaram pela causa de Cristo. Talvez, a crise traga como benefício o fato de a Igreja mundial ter que repensar suas prioridades e valores. Mas creio que Deus ainda proverá recursos para as pessoas que ele chama para vocações missionárias. O Mapi se propõe a preencher uma lacuna cada vez mais evidente na Igreja Evangélica: o pastoreio de pastores. As

Não sei se as carências têm aumentado, ou se estão apenas mais evidentes, devido à maior liberdade na Igreja para reconhecê-las e expressá-las. Acho que a saúde da família é alvo específico de Satanás, que usa de muitas artimanhas para destruí-la, especialmente entre a liderança. Falhas na liderança refletem-se automaticamente no bem-estar da Igreja. Também lidamos com valores mundanos que invadem a Igreja, especialmente na área sexual e na idéia de que “merecemos” ser felizes, mesmo se isso leva à destruição de nossos casamentos. Muitos pastores e líderes foram criados em famílias disfuncionais e as igrejas não têm sabido ministrar restauração para eles – e, consequentemente, para seus membros em situações parecidas. A relação entre as igrejas e os pastores precisa ser mudada?

Efésios 4 indica que os membros do Corpo é que devem fazer o ministério, valendo-se dos dons e habilidades que o Espírito distribui para cada um. Aos pastores, cabe cuidar e nutrir suas ovelhas, capacitando-as para o desenvolvimento de seus próprios ministérios. É uma relação diferente do que vemos na maioria das igrejas.

Durante muito tempo, foi reservado às mulheres um papel secundário nas igrejas. Hoje, elas não apenas ocupam cargos eclesiásticos, como até lideram denominações. O que a senhora pensa a respeito?

Que os homens se levantem! Acho que as mulheres têm preenchido um grande vazio deixado pela liderança masculina.

O que a senhora pensa acerca do acesso de divorciados, ou mesmo de pastores em segundo ou terceiro matrimônio, ao ministério?

O peso da dor de um divórcio é enorme, uma tragédia com sequelas até a terceira e quarta gerações. Que os pastores cuidem primeiro de si e de seus lares, para depois ter algo valioso e íntegro com que contribuir à Igreja.

Como cidadã americana, qual sua expectativa em relação ao governo de Barak Obama? Qual deve ser sua relação com o segmento evangélico dos EUA, e particularmente a direita protestante, majoritariamente republicana?

Estou muito entusiasmada e otimista a respeito do presidente Obama. Espero que a direita protestante venha deixar de lado os seus preconceitos e trabalhe harmonicamente para sarar as dores do país. Espero que o governo democrata possa melhorar a imagem do país no exterior, pois hoje esta imagem dificilmente poderia ser pior do que está. f e v e r e i r o

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Reflexão Ed René Kivitz teólogo e escritor

O céu pode esperar

A terra prometida não está em nenhuma latitude ou longitude específica

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az tempo que deixei de relacionar a salvação com a ida para o céu depois da morte. Em minha consciência religiosa, aquela noção de céu como um lugar reservado aos que foram declarados justos no tribunal de Deus ficou para trás. Hoje, ela ocupa o lugar de uma metáfora possível e legítima, especialmente para quem observa superficialmente a teologia paulina. Mas o caminho “terra-tribunal-céu” é apenas uma forma de representar a relação entre Deus e o ser humano, notadamente no que se refere ao destino eterno deste último. Mas há outras metáforas relacionando o Senhor e os homens além das figuras de juiz e réus – como, por exemplo, rei e súditos; general e soldados; senhor e escravos; mestre e discípulos. Das figuras bíblicas, a predileta de Jesus era pai e filho. Foi assim que nos ensinou a evocar e invocar o nome de Deus: “Abba”. Assim, podemos compreender que a salvação é a formação da pessoa de Jesus Cristo em cada ser humano, de modo que todos sejam conformes à imagem do unigênito filho de Deus. O ser humano criado à imagem e semelhança de Deus deve ser transformado à imagem de Jesus Cristo, “o qual é imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação, pois foi do agrado do Pai que toda a plenitude nele habitasse” (Colossenses 1.15,19). Nesse sentido, a salvação pode ser compreendida como processo de “humanização”, que Joshua Heschel entendia como “superação da condição humana”, ou mais precisamente, como “cristificação”, uma vez que este humano em plenitude é como Cristo, participante da natureza de Deus, conforme II Pedro 1.4. A salvação em Jesus, portanto, é muito menos ir para determinado lugar do que tornar-se um tipo de pessoa. O que importa é a transformação do indivíduo, para que a imago Dei lhe seja restaurada, não mais à semelhança de Adão, mas do Cristo de Deus. Tal compreensão confere sentido à existência, não apenas de direção, mas de significado. Quem acorda na segunda-feira pensando no céu após a morte tende a desenvolver a fé expectante (que espera o porvir), enquanto aquele que se levanta da cama almejando ser como Cristo está mais próximo da fé enactante, ou seja, fé em ação, que está engajada no vir a ser. O processo no qual Deus nos convida a vir a ser como Cristo pode ser deduzido de quatro eventos paradigmáticos, que por sua vez sugerem quatro estágios da peregrinação espiritual. O primeiro está contido no chamamento de Adão após seu acesso ao fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, seguido de fuga. Conforme Gênesis 3.9,

Deus passeia pelo jardim e o chama, dizendo: “Adão, onde você está?” Evidentemente, o Senhor não queria descobrir a localização geográfica de Adão. Sua convocação era um chamamento à responsabilidade. Adão aparece, mas ainda escondido atrás de sua mulher, e depois ambos se escondem atrás da serpente. Um passo no processo de humanização é o acolhimento da responsabilidade – e a consequente dignidade que o direito de viver e existir impõe a todo ser humano. O segundo evento é a chamada de Abraão: “Sai da tua terra e da casa de teu pai, do meio da tua parentela, para uma terra que eu te mostrarei” (Gênesis 12.1-3). O rabino Bonder observa que nessa vocação não há endereço, só chamado: “Não se trata de uma trajetória para um lugar, mas sim de um caminho para si. Lech Lechá – assim convoca Deus a Abraão –, vá a si, até a terra que eu lhe mostrarei. O destino é o próprio meio. Simbólico da própria vida – à qual nos apegamos como se fosse a terra, a posse maior. Na fala divina, o objeto não é a terra, é o caminhar, é o ir”. Mais um passo na direção da cristificação é o seguimento de Jesus: “Vinde após mim e eu vos farei pescadores de homens”, o que exige deixar tudo o mais (Mateus 4.18-20). O terceiro evento é o momento quando Deus pergunta pelo nome de Jacó, narrado em Gênesis 32.27. A expressão “Qual é o teu nome?” quer saber da identidade real, em detrimento da identidade idealizada, projetada ou assumida. Enquanto a personagem não for desmascarada, a pessoa à imagem de Deus e do seu Cristo não encontrarão espaço. Finalmente, ouvimos Deus dizer a Moisés: “Tira os sapatos de teus pés; porque o lugar em que tu estás é terra santa” (Êxodo 3.5). Bonder explica novamente: “A descoberta final de todo peregrino, de todo andarilho que caminha para si mesmo, é que somos fundamentalistas. Esses fundamentos são os sapatos com os quais caminhamos pela vida. Esta relação tão ambígua entre o calçado e o caminhante, entre o fundamento e a essência, ou entre a sola e o solo, é o território por onde se dirige Abraão. Esta terra prometida não está em nenhuma latitude e longitude específica. Trata-se de uma viagem não geográfica. A vulnerabilidade maior está nos fundamentos, nas crenças básicas que carregamos em nossa identidade”. É também imprescindível passo no processo humanização-cristificação abandonar as teorias e se entregar ao mistério sagrado – de nada vale ser doutor da Lei; importa renascer: “Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus” (João 3.3).

A salvação é a formação da pessoa de Cristo em cada ser humano, de modo que todos sejam conformes à imagem do unigênito filho de Deus

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Um livro para os sofredores A cabana trata da dor humana e da redenção com a legitimidade de quem perdeu – e reencontrou – tudo

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Mark Carpenter

Comecei a ler A cabana com o ceticismo que reservo a O bilhete é assinado por “Papai”. Com pouco a perder, e qualquer obra de ficção cristã, gênero que costuma ser cheio de ira e abatimento, Mack viaja ao velho casebre. O propagandista, servindo mais aos objetivos ideológicos dos que segue é um encontro alucinante entre o protagonista seus autores do que aos propósitos da arte. O que descobri e as três pessoas da Trindade, personificações distintas e é que, neste livro lançado no Brasil pela Editora Sextan- interdependentes. te, William P. Young de fato aventa uma agenda – uma A representação dessas entidades vai chocar os leitores proposta didática. A realidade é que o autor não tem nem mais conservadores, e alguns não conseguirão engolir a vitalento nem disposição para competir com os melhores são extrema e perturbadora de Young. Aliás, não são pouromancistas. No entanto, a verdade que ele deseja revelar cos os críticos cristãos que abominam o livro, por acharem é mais importante que qualquer escolha de forma literá- que o texto ridiculariza a majestade e a soberania de Deus. ria. Young parece perceber as limitações da sua ficção, e Rejeitam sua metáfora “desrespeitosa” e apontam distormesmo assim arrisca tudo em favor do insight que deseja ções, erros de interpretação bíblica, simplificações impercompatilhar com seus leitores. Sua autopercepção torna doáveis e até sacrilégio. palatável o que normalmente seria o defeito mais irritante O que a maioria dos críticos parecem ignorar é que o da ficção cristã. livro é essencialmente sobre teodiceia, uma justificação do O resultado? Milhões de leitores estão abraamor e da justiça de Deus diante do mal e da çando a proposta para embarcar na narrativa de tragédia humana. Parecem não perceber que – Mercado A cabana – e é bom saber que entre eles estão teópara o mortal que já sofreu grandes traumas e logos e eruditos. Até Eugene Peterson endossou perdas – o lento caminho de volta à sanidade esa obra; no seu entender, o livro poderá fazer por nossa gera- piritual passa necessariamente pela epifania da compreenção o mesmo que O peregrino, de Bunyan, fez para a sua. A são das profundezas do amor de Deus. Não entendem que comparação entre as duas obras é perfeita, pois O peregrino o pecado de Young é apenas o da licença poética – e que também é pouco mais que uma analogia a serviço de uma ele escreve com a legitimidade que só o sofrimento pode mensagem, com sérias limitações literárias. No entanto, é conferir. de se acreditar que a exposição inovadora das verdades que Quem passou pelo vale da sombra da morte não critica impulsionam essas obras compensam as suas falhas. os exageros de imaginação expressos em A cabana. Afinal, A cabana é sobre Mack, um homem cuja pequena filha a revelação da Bíblia não ruirá sob os devaneios de Young, é assassinada. Sua consequente decepção com Deus o leva mas certamente há sofredores miseráveis que perecerão a à beira da loucura, e um dia ele recebe um bilhete enigmá- morte eterna sem darem conta do amor de Deus. Este livro tico que o convida a voltar à cabana onde ocorreu o crime. é para eles, antes que abandonem tudo.

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ÚLTIMAS PALAVRAS Carlos Queiroz professor e escritor

A idolatria do consumo

O espaço urbano trouxe consigo a embalagem e o lixo dos produtos de mercado

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aglomeração de seres humanos em comunidades urbanas é um dos frutos da modernidade. Intensificado a partir da Revolução Industrial do século 18, o fenômeno da urbanização logo se mostrou irreversível – 80% da população brasileira, por exemplo, vive nas cidades. E, no espaço urbano, a vida vai se tornando atrativa e ao mesmo tempo complexa. As cidades modernas são um encanto tecnológico: aviões cruzam os céus acima de monumentais blocos de apartamentos; trens e metrôs atravessam trilhos em alta velocidade, enquanto os shoppings, templos suntuosos do consumo, viraram centros de convivência que exercem uma atração irresistível. Ao mesmo tempo, o espaço urbano trouxe consigo a embalagem e o lixo dos produtos de mercado. O mundo urbanizado aglutinou e incrementou a violência, acentuando a miséria e popularizando a fome. As metrópoles concentraram a riqueza e criaram novos atores sociais. A criminalidade, fenômeno decorrente das desigualdades e da cegueira social, é um câncer que cresce sem controle nos grandes e pequenos centros urbanos, acuando seus habitantes e criando guetos impenetráveis ao poder público. E, neste mesmo espaço, homens e mulheres buscam viver com dignidade, mas são impedidos pelos poderes e potestades deste século. A urbis vai acentuando o individualismo. Na era do narcisismo e da exaltação do ego, cada indivíduo busca uma maneira de existir sem que outros seres humanos lhe perturbem. A automatização cada vez mais distancia possíveis diálogos. Por outro lado, as relações estão fundamentadas na competitividade e no lucro. A própria forma de organização da vida urbana está submetida a regras de produção e consumo. Desse modo, a sociedade urbana divide-se entre os que produzem e possuem poder de compra de um lado; e de outro, aqueles que vivem à margem do sistema econômico. Toda tecnologia é validada, desde que a serviço do capital, para impor a ideologia do consumo. Nenhum outro contexto mostra de maneira mais clara a divisão entre ricos e pobres que as cidades. E estes lados opostos nem sempre são geográficos. No lado dos abastados, encontramos ruas e avenidas bem pavimentadas, ótimos hospitais e as melhores escolas, bem como casas suntuosas e condomínios exclusivos. Já na banda pobre, encontramos aglomerados habitacionais sem o mínimo de saneamento, becos e ruelas de difícil acesso, escolas abandonadas e postos de saúde sucateados. Nas periferias, homens, mulheres e crianças sobrevivem muitas vezes em

condições de carência total. O lado dos excluídos, ou, melhor, os sem lado algum – os “sem eira nem beira” –, estão à margem, à beira: à margem dos direitos, à margem da educação, à margem do trabalho, à margem da dignidade. À beira da fome. No entanto, esses são seres que parecem mais humanos que os habitantes das zonas douradas. Vivem à margem da competitividade, mas beirando a solidariedade. À margem da acumulação, mas beirando a partilha. À margem do lucro, beiram a gratuidade. À margem do individualismo, mas perto da fraternidade. A ideologia de consumo reboca consigo seus ídolos por meio das religiões organizadas, trazendo de volta deuses que, na natureza essencial, são nãodeuses. Só existe um Deus. A idolatria é qualquer sistema, seja econômico, político ou religioso, que nos desvia de Deus e consequentemente nos distancia da fraternidade e do amor entre as pessoas. Enquanto Deus propicia vida para todos, os ídolos geram destruição, violência e morte. O ídolo de consumo requer que seus adoradores produzam e produzam, saqueando irresponsavelmente a natureza. O ídolo de mercado exige o sacrifício dos que não consomem seus produtos – os pobres, os considerados subumanos pelos devotos da religião materialista de mercado. E a Igreja no mundo urbano, aquela que atua na mesma ambiência desse consumo desenfreado? Ela corre o risco de ser “mundanizada”, ou seja, de cair na tentação de se organizar segundo os dogmas da sociedade urbanizada: a crença no poder da tecnologia, na capacidade produtiva, na maior valorização dos resultados sacrificando sua fidelidade ao Evangelho e pondo em risco sua integridade de expressar a natureza singular do povo de Deus. Por outro lado, a Igreja pode renovar sua aliança com o Evangelho de Jesus Cristo e os valores do seu Reino – e orar para que esse Reino venha através de suas comunidades de fé. E é um Reino de justiça e paz. A oração ensinada por Jesus fala de “Pai nosso” e de “pão nosso”. Ora, pão é um bem material; logo, pode ser acumulado ou socializado. Na sociedade de consumo, ele é a materialização do ídolo que só os consumidores possuem. Por isso, a crise de fome no mundo é uma questão básica de idolatria ao bem de consumo. E a crise econômica é a desarmonia dos ídolos sem neurônios. Tornem-se semelhantes a eles os que os fazem e os seus adoradores. Cabe à Igreja a tarefa de se converter a Deus e resistir ao sincretismo materialista da religião de mercado.

Nenhum outro contexto mostra de maneira mais clara a divisão entre ricos e pobres que as cidades. E estes lados opostos nem sempre são geográficos

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