ALGARVE INFORMATIVO 22 de outubro, 2016
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Luís Correia Carmelo e a arte de contar histórias Adelino Soares |Empreita de palma algarvia na Moda Lisboa | TEL apresenta Lobo Vermelho |Lagoa recordou a sua Identidade ALGARVE INFORMATIVO #80 1 SUPLEMENTO II ENCONTRO INTERNACIONAL POESIA A SUL
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OPINIÃO 6 - Daniel Pina 28 - Paulo Cunha 30 - José Graça 32 - Mirian Tavares 34 - Bruno Inácio 36 - António Manuel Ribeiro 38 - Augusto Lima
ENTREVISTAS/ REPORTAGENS 8 - Loulé combate Desperdício Alimentar 14 - Desfile Etnográfico em Lagoa 24 - Cristiano Cabrita 40 - Adelino Soares 50 - Luís Correia Carmelo 60 - Maria João Gomes 68 - TEL apresenta O Lobo Vermelho
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O Iraque está-se a marimbar para Portugal, qual é o espanto? Daniel Pina
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governo iraquiano não levantou a imunidade diplomática dos dois jovens suspeitos da agressão a Rúben Cavaco, na vila de Ponte de Sor e o que me espanta no meio de tudo isto é que, pelos vistos, algumas pessoas estavam à espera de um desfecho diferente para o caso. Que raios! Ainda há quem acredite em contos de fados, ou que Portugal manda alguma coisa neste mundo que muitos dizem ser uma «aldeia global», mas que continua a ter aldeias, vilas, cidades e megacidades. E, no contexto político, no mundo das relações internacionais, dos jogos de poder, do mano-a-mano, Portugal é uma aldeia de província e o Iraque, mercê do petróleo que tem no seu território, e do seu historial bélico, é uma cidade. É certo que temos grandes estadistas, tivemos Durão Barroso à frente da Comissão Europeia, agora temos António Guterres a liderar as Nações Unidas, só para citar alguns nomes, mas Portugal brilha frequentemente em termos individuais e raras vezes enquanto nação. Veja-se o futebol, o exemplo mais flagrante dessa realidade, onde temos craques de topo mundial, com o nosso Cristiano Ronaldo à cabeça, mas só este ano ganhamos algum título coletivo nas camadas seniores, e muita gente ainda não percebeu bem como é que vencemos o Campeonato da Europa na França. Portanto, os portugueses são fantásticos, mas Portugal é «assim-assim». Longe vão os tempos dos Descobrimentos, altura em que, de facto, mandávamos no mundo. Íamos onde queríamos, conquistávamos o que nos apetecia, poucos nos podiam fazer frente. Mas isso é passado, e um passado bem longínquo. Por isso, desde o princípio do caso de Ponte de Sor que o desfecho estava mais do que desenhado. Se os alegados agressores fossem filhos do embaixador do Burkina Faso, do Benin ou da Conchichina, Portugal podia dar um murro na mesa a exigir o levantamento da imunidade diplomática e provavelmente veria o seu desejo ALGARVE INFORMATIVO #80
realizado. Como esse não é o caso, o Ministério dos Negócios Estrangeiros fez o que tinha a fazer, pediu, pediu outra vez, pediu ainda mais uma vez e, finalmente, para acabar com as chatices, o lado iraquiano lá se dignou a responder, dizendo o que se estava mesmo a ver que iam dizer. Isso não significa que o Iraque entenda que os seus dois jovens cidadãos estejam acima da lei, indicando que estão disponíveis para serem ouvidos pelas autoridades portugueses. E, se assim o forem, provavelmente vão dizer o mesmo que já disseram numa entrevista a um canal televisivo. Veja-se bem a que estado chegou a justiça portuguesa, em que dois suspeitos de um crime dão primeiro uma entrevista à televisão antes de prestarem declarações às autoridades, mas isso é assunto para outra conversa. Uma entrevista, aliás, em que só faltou os dois jovens pedirem uma indemnização à vítima por causa dos danos causados ao seu carro. Assim sendo, o caso vai continuar a arrastar-se e o mais certo é a família da vítima chegar a um acordo financeiro com a família dos agressores para retirarem as queixas. Quanto ao processocrime instaurado pelo Ministério Público, que não depende de haver ou não queixa da vítima, também vai continuar a arrastar-se e, se chegar a uma altura em que os alegados agressores se fartarem de serem chamados para depoimentos, simplesmente fazem as malas e vão estudar para algum colégio privado na Suíça, Inglaterra ou noutro país qualquer, porque os petrodólares ainda continuam a falar mais alto do que os interesses dos cidadãos comuns .
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Loulé reforçou posição contra o desperdício alimentar A Câmara Municipal de Loulé apresentou, no dia 17 de outubro, uma coleção de quatro livros infantis sobre o desperdício alimentar, que serão distribuídos pelos alunos das escolas do 1.º Ciclo do concelho. A autarquia louletana pretende, com esta iniciativa, contribuir para a alteração de comportamentos relacionados com o desperdício alimentar, nomeadamente junto daqueles que serão os adultos do futuro. Texto:
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desperdício alimentar é uma realidade cada vez mais conotada negativamente no nosso quotidiano, representando um problema global e transversal para o qual se apresenta fulcral definir e implementar medidas, bem como assumir compromissos que coloquem a sociedade no caminho do desperdício zero, ao longo de toda a cadeia alimentar, criando-se uma rede zero desperdício, com todas as entidades envolvidas, na disponibilização diária de produtos alimentares, associações de comércio e restauração, entidades oficiais, estabelecimentos turísticos, entre outros. Segundo a Food and Agriculture Organization (UNFAO) e a United Nations Environment Programme (UNEP), um terço da comida produzida, diariamente, em todo o mundo acaba
no lixo, ou seja 1,3 milhões de toneladas por ano, quantidade suficiente para alimentar três mil milhões de pessoas diariamente. Empenhado nesta causa, Loulé foi o primeiro município algarvio a associar-se ao Movimento Zero Desperdício, através da assinatura do protocolo com a Associação Dariacordar, em novembro de 2014, possibilitando redirecionar os alimentos para a alimentação humana, salvaguardando a qualidade, higiene e segurança alimentar, assumindo-se esta ação como um complemento às respostas sociais já existentes no Concelho. Foi ainda realizada uma cooperação com a Associação In Loco e o município de São Brás de Alportel, no âmbito do projeto «Não desperdice o nosso futuro! – uma aliança europeia de
Vítor Aleixo, presidente da Câmara Municipal de Loulé 9
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jovens e de autarcas no Ano Europeu para o Desenvolvimento», com o envolvimento das escolas. Desde então, o município louletano tem realizado ações concretas que já permitiram contribuir para redução do desperdício alimentar, entre as quais a associação ao Festival MED. Na edição deste ano do MED foi um total de 205,272 Kg de alimentos prontos a consumir. Agora, numa iniciativa integrada nas Comemoração do Dia Mundial da Alimentação, a Câmara Municipal de Loulé apresentou, no dia 17 de outubro, no Salão Nobre dos Paços do Concelho, uma coleção de quatro livros infantis sobre o desperdício alimentar, designadamente «O Tio Desafio» (Ana Maria Magalhães, Isabel Alçada e Carla Nazareth), «Confusão no Corredores dos Enlatados» (José Luís Peixoto e Catarina Bakker), «A Rita encolheu. E agora?» (Marta Hugon e António Jorge Gonçalves) e «A vida difícil de uma manteigueira» (Isabel Zambujal e Rodrigo Goulão de Sousa), que serão posteriormente entregues a todos os alunos das escolas do 1.º Ciclo. “São histórias, umas mais simples, outras mais complicadas, que explicam a importância de não se desperdiçar alimentos e, no dia-a-dia, devemos colocar no prato apenas aquilo que precisamos. São coisas simples que, se as começarmos a fazer de pequeninos, quando formos adultos vamos manter essas práticas. Não desperdiçar é aproveitar aquilo que está em bom estado e isso pode ser um alimento, um livro, as lentes dos óculos, peças de roupa”, apontou Paula Policarpo, da Associação Dariacordar, adiantando ALGARVE INFORMATIVO #80
que, para breve, está o lançamento de outra coleção de livros, desta feita sobre alimentação saudável e sustentável. Associação Dariacordar que foi criada, em 2011, por iniciativa do Comandante António Costa Pereira e que deu origem a um movimento de cidadania com o objetivo da consciencialização para a problemática do desperdício. “A lógica da economia circular é reaproveitar, reutilizar e manter na sua cadeia de valor os bens, as competências humanas, as terras, os edifícios. A única forma de nos mantermos cá é preocupar-nos, não só com a geração atual, mas com as futuras, e essas só sobreviverão se formos parcos na utilização dos recursos naturais do planeta e reutilizar tudo aquilo que tem valor”, reforçou Paula Policarpo. Parceiro nesta coleção de livros é também a Associação In Loco, com Artur Filipe Gregório a contar às crianças, e aos adultos, presentes da sessão que só os alimentos que são deitados fora ainda em boas condições para serem ingeridos bastariam para acabar com a fome em Portugal. “Não é necessário produzir mais, basta aumentar a consciência da sociedade para este problema e assim reduzir o desperdício alimentar”, confirmou, lembrando que esse é precisamente um dos propósitos do projeto «Não desperdice o nosso futuro». “A Terra é um aquário, que tem lá dentro a água, a terra, os seres vivos, tudo 10
num ambiente fechado. O problema é que estamos a fazer algumas asneiras, nuns sítios a deitar veneno para a água, noutros, a desperdiçá-la e, mais cedo ou mais tarde, vamos todos sofrer por causa disso”, alertou o elemento da direção da Associação In Loco. “O projeto tem vindo a trabalhar em três linhas de ação: sensibilização, informação e diagnóstico. É preciso conhecer Paula Policarpo, da Associação Dariacordar claramente a dimensão do problema para se poder sensibilizar e informar as pessoas mais importantes para a sua resolução, e essas são as crianças, que serão os futuros presidentes de câmara e presidentes da República”.
Livros sobre a Identidade chegam em 2017 Com um Salão Nobre Artur Filipe Gregório, da Associação In Loco quase convertido numa sala de leitura infantil, Vítor Aleixo reforçou errado, do que é mau e bom, e essa que Loulé é um município consciente não é uma tarefa simples”, dos seus deveres e responsabilidades reconheceu o presidente da Câmara para com as novas gerações, para com Municipal de Loulé, que aderiu ao a comunidade em geral e a natureza. Movimento Zero Desperdício, em “O que estamos aqui a falar é de ética 2014, tendo estabelecido e é bom que esta palavra seja compromissos e definido um recuperada e introduzida no léxico de conjunto de objetivos, alguns deles já todos nós, porque é necessário que em curso. tenhamos a noção do que está certo e 11
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Vítor Aleixo não escondeu a sua tristeza pelo desperdício que acontece na casa de cada um de nós e na economia que produz e distribui bens, daí o Município de Loulé ter aceite o convite da In Loco para participar no Movimento «Não Desperdice o Nosso Futuro». “Por aqui iremos caminhando, com a certeza de que isto, para nós, não é uma moda, mas sim uma atitude de permanência em relação ao futuro. Olhamos para o mundo e percebemos que há pessoas que compram mais do que aquilo que precisam e depois desperdiçam e que, bem ali ao lado, há outras pessoas que não têm acesso a esses bens, que passam fome. Isso é uma coisa brutal, que traz enorme sofrimento”, frisou o edil. De acordo com o autarca, Loulé quer estar na linha da frente para que haja uma educação com ética nas gerações
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mais novas e uma atitude de responsabilidade relativamente ao uso do meio físico, que tem recursos finitos. “Estas crianças têm que perceber que é delas que depende termos um mundo mais habitável, mais bonito e mais justo”, defendeu Vítor Aleixo, aproveitando para revelar que, depois desta coleção de livros alusivos ao desperdício alimentar, em 2017 será a vez de livros de banda desenhada contarem a história a partir da origem da Vida, no município de Loulé, até à atualidade. “Entendemos que, no processo educativo das nossas crianças, a Identidade é algo que nos distingue dos outros e que nos leva a perceber que as diferenças fazem parte do género humano. Somos diferentes, mas todos respeitáveis nas nossas diferentes identidades”, concluiu o presidente da Câmara Municipal de Loulé .
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Identidade de Lagoa recordada em Desfile Etnogrรกfico ALGARVE INFORMATIVO #80
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Imbuído no espírito de «A Nossa Gente, a Nossa Identidade», mas também do «Lagoa Cidade do Vinho 2016», a Câmara Municipal de Lagoa levou a cabo, no dia 15 de outubro, um desfile etnográfico que pretendeu recordar as tradições e as atividades económicas que têm feito parte da história deste concelho. Uma tarde de festa que contou com a colaboração das coletividades, associações, grupos musicais e juntas de freguesia de Lagoa e que culminou com um arraial popular junto à Única – Adega Cooperativa do Algarve. Texto:
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agoa é uma das principais referências atuais do Algarve enquanto destino turístico, internacionalmente famosa pelas suas deslumbrantes praias, mas, em tempos antigos, a vertente religiosa foi um dos seus pontos de maior destaque. De facto, a meio do século XVI, e a pedido da rainha D. Catarina de Habsburgo, ali se fixaram as Carmelitas da Antiga Observância, tendo sido fundada em Lagoa um importante espaço monástico dessa ordem religiosa, o Convento de Nossa Senhora do Carmo. Depois de ter feito parte das terras de Silves durante alguns séculos, o concelho de Lagoa ganhou autonomia e 16 de Janeiro de 1773, por alvará do rei D. José I, com Lagoa a ser elevada à condição de vila. E as potencialidades naturais da região rapidamente ditaram a estrutura económica que, de certa forma, ainda persiste, assente na agricultura, pesca, pequena indústria e turismo. Isto porque, antes do boom turístico, reinava a atividade piscatória, sobretudo nas comunidades de Ferragudo, Benagil, Carvoeiro e Senhora da Rocha, mas a vinha e a tradicional cultura de sequeiro faziam parte, igualmente, das principais fontes de receita deste concelho.
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Com a pesca em grande destaque, a indústria conserveira respirava saúde no início do século XX, mas o paradigma económico de Lagoa começou a alterarse, um pouco como em todo o Algarve, a partir dos anos 60, com o turismo a tornar-se o principal impulsionador do desenvolvimento do concelho. De repente, o mundo descobriu verdadeiros paraísos nesta zona do barlavento, como a Albandeira, Caramujeira e Monte Carvoeiro, sendo a Praia da Marinha um perfeito exemplo do renome internacional que Lagoa granjeou alémfronteiras. À medida que o turismo crescia, assim cresceram, também, um conjunto de atividades complementares, na área dos serviços, da construção civil, comércio e indústria. ALGARVE INFORMATIVO #80
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Lagoa não esqueceu, contudo, as suas raízes e prova disso é que, sob o tema «A Nossa Gente, a Nossa Identidade», a Câmara Municipal de Lagoa organizou, em colaboração com as Juntas de Freguesia, Associações, Coletividades e Grupos Musicais do concelho, um Desfile Etnográfico no passado dia 15 de outubro, com o intuito de recriar e reviver tradições, costumes, profissões, saberes, fazeres, alfaias e indumentárias de outros tempos, cujas memórias correm o risco de desaparecer. O objetivo do executivo liderado por
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Francisco Martins não era reproduzir a «Festa da Família Agrária» que, entre meados do século XX e início da década de 70, juntava toda a comunidade, do «povo» às elites abastadas, em redor da devoção a Nossa Senhora de Fátima e dos rituais pagãos das colheitas de maio. A ideia foi, sim, celebrar a representação social dos setores de atividades económicas primárias das diferentes freguesias-paróquia, numa viagem pelas comunidades agrícolas, piscatórias e industriais das povoações e lugares deste município, incluindo alguns já desaparecidos. Assim, por volta das 14h30, as gentes de Lagoa começaram a reunir-se junto ao Auditório Municipal, numa verdadeira viagem ao passado, com miúdos e graúdos a vestirem os trajes e a empunharem as ferramentas de outros tempos, representando as ALGARVE INFORMATIVO #80
atividades que fazem e fizeram parte da história desta terra. À hora marcada, o desfile etnográfico arrancou, com muitos residentes e turistas, de máquina fotográfica em punho, a encherem os passeios da rua ao longo do trajeto. Como o desfile estava enquadrado na programação de Lagoa «Cidade do Vinho 2016», o destino final foi a Única – Adega Cooperativa do Algarve, onde muitas destas memórias se continuam a perpetuar. Ali, à espera dos «figurantes» e dos espetadores, estava montado um verdadeiro arraial popular, com música de baile, grupos de cantares, comediantes, sem esquecer os comes e bebes, claro, o indispensável vinho, o porco no espeto, a tradicional castanha assada, num convívio que se prolongou até final da tarde . 20
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Tiago Moreira de Sá, Carlos Silva e Sousa, José de Matos Correia, Cristiano Cabrita, Lívia Franco e Cristóvão Norte
Cristiano Cabrita apresentou livro na Assembleia da República Texto:
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oi na emblemática Biblioteca da Assembleia da República que decorreu, no dia 19 de Outubro, a apresentação do livro «O Neoconservadorismo e a Política Externa Norte-Americana», da autoria de Cristiano Cabrita. A presidir a sessão esteve o Vice-Presidente da Assembleia da ALGARVE INFORMATIVO #80
República, José de Matos Correia, numa iniciativa que contou com as apresentações de Lívia Franco, académica do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, e de Tiago Moreira de Sá, Professor na Universidade Nova de Lisboa. As intervenções estiveram a 24
cargo do Presidente da Câmara Municipal de Albufeira, Carlos Silva e Sousa, e do deputado algarvio Cristóvão Norte. A cerimónia contou com a presença de várias dezenas de convidados, entre diplomatas, deputados, autarcas, professores, estudantes e investigadores dos mais diversos quadrantes. O livro baseia-se na Tese de Doutoramento do autor e é a primeira obra editada em Portugal que aborda com enorme amplitude académica a relação entre o neoconservadorismo e a política externa norte-americana. Todavia, não se cinge somente a esta análise, sendo um livro transversal que investiga a cultura política e a conceção norte-americana de ordem internacional; a construção da grande estratégia de hegemonia dos EUA após 1945; as origens ideológicas e filosóficas do neoconservadorismo; as ramificações do conservadorismo americano; as várias administrações norte-americanas pós 1989 e a teoria das relações internacionais, entre outras temáticas. A pertinência deste estudo não podia ser mais atual tendo em conta o processo político que está a decorrer nos EUA, sendo que muitas das questões em debate têm nesta publicação uma resposta efetiva. A abrir a sessão, o Vice-presidente da Assembleia da República, José de Matos Correia, lembrou que aquele é um espaço de cidadania, dai ser importante que iniciativas deste género ali ocorram, “tanto mais por se tratar de uma obra com muito mérito tendo por base uma Tese de Doutoramento de um 25
Cristiano Cabrita
académico que tenho o prazer de acompanhar há 20 anos”. Para Cristóvão Norte, e face à conjuntura que se vive em torno da campanha presidencial norte-americana, este trabalho é triplamente importante. “Importante por se tratar de uma investigação com inegável qualidade; importante porque permite uma leitura abrangente de uma temática que é pouco explorada em Portugal e na academia portuguesa; e, finalmente, muito importante por se tratar de um trabalho elaborado por um algarvio com inegáveis qualidades”. Também o edil de Albufeira, Carlos Silva e Sousa, teve a oportunidade de elogiar o autor, garantindo ser um ALGARVE INFORMATIVO #80
sublinhando a maneira como este novo estudo “contribuirá para um entendimento mais aprimorado sobre as raízes da política norteamericana, quer do ponto de vista interno, quer do ponto de vista externo”. Cristiano Cabrita é Licenciado e Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Lusíada de Lisboa. É pósgraduado em Estudos Europeus pelo Instituto de Estudos Europeus da Universidade Católica Portuguesa e Doutorado em Ciência Política e Relações Internacionais pelo Instituto de Estudos Políticos daquela Universidade. É Investigador no CIEP – Centro de investigação do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa e foi Visiting Student no St.Antony`s College, Universidade de Oxford, Reino Unido. Bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, foi também Deputado da Assembleia Municipal de Albufeira e é, desde 2012, Coordenador do Gabinete de Comunicação, Relações Públicas e Relações Internacionais da Câmara Municipal de Albufeira. As suas áreas de interesse incluem a Política Externa Norte-Americana, Política Internacional Contemporânea, a Teoria das Relações Internacionais e Estudos de Segurança Internacional .
O autor Cristiano Cabrita, o deputado Cristóvão Norte e Carlos Silva e Sousa, presidente da Câmara Municipal de Albufeira
grande orgulho para o Município ter funcionários como Cristiano Cabrita nos seus quadros. “Sempre contou com o nosso apoio para levar a cabo a sua investigação e assim continuará no futuro. Tê-lo como Coordenador do Gabinete de Comunicação, Relações Públicas e Relações Internacionais autarquia é uma honra e um privilégio para nós”. Já Lívia franco, orientadora da Tese de Doutoramento e que prefacia a obra, considerou que o presente livro de Cristiano Cabrita tem vários méritos mas é, sobretudo, “um contributo inestimável para o entendimento completo e rigoroso do debate norteamericano, da cultura política que lhe está subjacente e, em especial, daquela que é a corrente doutrinal e política mais recente e que mais tem marcado (e de modo bastante polémico) a política daquele país na última década e meia: o neoconservadorismo”. Tiago Moreira de Sá, Professor na Universidade Nova de Lisboa, finalizou o painel de intervenções enaltecendo a “metodologia e o rigor científico da obra em causa”, ALGARVE INFORMATIVO #80
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Qual crise da meia-idade, qual quê!? Paulo Cunha
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empre que, com algum tempo, me olho ao espelho reparo nas alterações que a passagem do tempo me tem oferecido. Muita delas sem que eu a elas aspirasse ou mesmo as quisesse, mas já que cá estão… o melhor é aproveitá-las! Até porque a vida é feita de mudança e como já alguém disse: “Estar vivo é o contrário de estar morto!”. E que bom que é estar vivo, sabê-lo e, mais que tudo, aproveitá-lo. Não escrevo em causa própria, pois atravessei os «quarentas» e entrei nos «cinquenta», serena e pacificamente, sem necessidade de grandes introspeções, saudosismos, meditações, amarguras e lamentações. Portanto, quando oiço amiúde certas mulheres (de outros) culpando a (maldita) crise da meia-idade dos homens, fico a matutar sobre o que será isso: “a meia-idade”?! Como se medíssemos a nossa existência por séculos, e ao nos aproximarmos da sua metade acordássemos - de repente - para vida… Recordo-me de há uns tempos ter lido numa publicação dita feminina, uma série de dicas que indiciariam que os homens poderiam estar a entrar na tão apregoada «crise da meia-idade». Entre outros citavam os seguintes comportamentos: sentir tédio com o trabalho, pessoas e coisas que antes gostava; sentir nostalgia e saudade dos «velhos tempos»; desejar retroceder no tempo e cumprir metas não alcançadas; auto culpar-se pelos fracassos pessoais e escolhas feitas; sentir desejo de estar só; sentir obsessão com a aparência; sentir o desejo ou pensamentos de ter um caso, especialmente com pessoas mais jovens; mudar o comportamento sexual; ter a sensação de não amar mais o cônjuge e/ou sentirse ressentido com o casamento; desejar largar tudo e viver o que nunca viveu antes; sentir-se compelido por alimentos, álcool ou droga; sentir-se incerto sobre o rumo a seguir na vida; descontrolar-se com o dinheiro; culpar o cônjuge pelos seus problemas e por se sentir «amarrado» ao relacionamento; tentar parecer poderoso através da aquisição de bens caros; procurar itens que os jovens costumam adquirir como piercings, joias ou tatuagens. Sei que algumas mulheres estarão agora com um sorriso nos lábios, mas fui confirmar e eram essas as características que lá estavam escarrapachadas. Quem as escreveu lá saberá…
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Como observa a psiquiatra Françoise Millet-Bartoli, autora do livro «A crise da meia-idade, uma segunda oportunidade», “(…) tal como o adolescente se interroga, de forma fatalista, sobre o seu objetivo na vida, o adulto de meia-idade também ele se interroga frequentemente sobre o sentido da existência.”, por isso não é de estranhar que a chamada crise se ancore em razões que sugerem um questionamento constante do que fazer e como fazer na «metade» que ainda lhe resta viver. Numa sociedade que valoriza a juventude e a sua criatividade, cada vez mais os quarentões/cinquentões sentem-se mais vulneráveis. Ao viverem com a obsessão de serem postos de lado como coisas velhas por causa do seu modo de vida rotineiro e da sua forma de estar, profissional e sentimentalmente acomodada, tentam assim experienciar uma segunda adolescência. Tendo a crise económica conjuntamente com a progressiva desvalorização do estatuto de macho que sustenta a família propiciado também uma maior desresponsabilização em relação à instituição «família» (tal como aquela que nos foi dada a conhecer enquanto filhos), novos valores e comportamentos surgiram, tornando outros obsoletos. Várias amigas minhas apontam esta crise transversal ao género masculino como a principal culpada de muitas infidelidades e mau estar latente na vida de muitos casais, pois a tentação de recuperar o prestígio e o destaque perdidos com uma «mulher-troféu» está sempre presente. Talvez… mas como em tudo na vida não convém generalizar, pois muitos homens são pais e maridos empenhados e presentes. Grande parte deles procura outras formas de redescobrir a vida através da entrega ao desporto, às atividades artísticas e à espiritualidade, o que por vezes são tidas como, injustamente, risíveis e menosprezadas pelos que os rodeiam. Pois é meus caros homens, apesar do nosso declínio físico ser já visível e a sociedade baseada na cultura da juventude e da beleza começar a apontar-nos o dedo acusador, olhem para o tesouro que têm em casa e que, tal como vós, precisa que - em família - continuem a mudar o mundo e a deixar que o mundo vos mude também. Só juntos poderemos conseguir que a idade se transforme numa conquista, não numa crise! .
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Todos somos balsenses José Graça
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estação arqueológica da Luz de Tavira, onde se supõe estar localizada a antiga cidade romana de Balsa, é constituída por uma faixa de terreno limitada a sul pelo canal de Tavira, a Norte por uma linha paralela à margem do dito canal e distante dela 500 metros, a nascente pela ribeira do Arroio e a poente pela ribeira da Luz. É uma zona extensa, com perto de cinquenta hectares, que engloba grande parte - senão por vezes a totalidade- de vários prédios rústicos, entre os quais a quinta da Torre de Ares. Classificada como Imóvel de Interesse Público (IIP) pelo Decreto n.º 26-A/92, DR, I Série-B, n.º 126, de 1 de junho de 1992, cuja Zona Especial de Proteção (ZEP) apenas foi fixada através da Portaria n.º 516/2011 de 27 de abril, concluindo um processo desencadeado em 1998 pelo Parque Natural da Ria Formosa, onde se encontra integrada. Adormecida na memória do povo e subterrada por toneladas de detritos, o espaço foi sendo alvo de sondagens episódicas e prospeções arqueológicas que foram comprovando o tesouro existente, sublinhando-se as intervenções de Estácio da Veiga no final do século XIX e de Maria e Manuel Maia nos anos setenta do século XX. Nos intervalos (longos) entre os trabalhos arqueológicos, os terrenos foram usados para exploração agrícola, originando a perda e dispersão de muitos dos achados ocasionais… Em 2007, com a publicação do livro «Balsa, Cidade Perdida», de Luís Fraga da Silva, autor do blogue Imprompto e membro do Campo Arqueológico de Tavira (CAT), a memória da maior cidade romana do sul da península voltou às conversas. Com edição prévia na internet, esta obra trata-se de uma edição invulgar sobre a cidade e a história do Algarve, revelando ao grande público o maior monumento do Algarve Romano e coroando muitos anos de investigação e discussão conjunta no âmbito do CAT, da articulação dos pontos de vista da geografia histórica, da arqueologia, da história, da museologia e da divulgação cultural. Sabemos hoje que Balsa foi uma importante cidade romana, que existiu nas freguesias de Luz de Tavira e de Santa Luzia, nos terrenos litorais hoje designados por Torre de Ares (ou Torre d’Aires), Antas e Arroio, tendo Pedras d’El-Rei, Luz, Rato e Pinheiro como subúrbios.
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É citada nas listas de cidades do Império Romano (por Pompónio Mela e Plínio-o-Velho, no séc. I d. C. e por Ptolomeu, no séc. II), posteriormente como etapa de um dos Itinerários de Antonino (roteiro de estradas e rotas navais do séc. III) e, já após o fim do Império do Ocidente, na Cosmografia do Anónimo de Ravena (séc. VII, mas baseada em documentos muito mais antigos). Quase em simultâneo, é publicado o novo Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (PROT-Algarve), acolhendo e desenvolvendo as orientações definidas no Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT) e assumindo-se em conjunto como um quadro de referência estratégico para os Planos Diretores Municipais (PDM), então a começarem um processo de revisão obrigatória. Neste domínio, uma das opções estratégicas do PROT-Algarve é salvaguarda e valorização do património cultural histórico-arqueológico, que traduz o reconhecimento do potencial de aproveitamento deste recurso territorial em termos socioeconómicos, remetendo tal responsabilidade para os PDM, nomeadamente no capítulo da promoção da reabilitação urbana, e apontando como tarefa a delimitação mais pormenorizada de algumas áreas arqueológicas, dando como exemplo a área arqueológica de Balsa, entre outros. Sublinhando a necessidade de desenvolvimento de atividades recreativas, da criação duma indústria criativa valorizando o património enquanto produto de consumo e de constituir-se uma rede de monumentos, conjuntos urbanos e sítios arqueológicos do Algarve, o novo PDM de Tavira reconhecerá o lugar de Balsa nesse futuro que ambicionamos! . NOTA – Poderá consultar os artigos anteriores sobre estas e outras matérias no meu blogue (www.terradosol.blogspot.com) ou na página www.facebook.com/josegraca1966 (Membro do Secretariado Regional do PS-Algarve e da Assembleia Intermunicipal do Algarve)
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Eu não sou eu nem sou o outro: notas de viagem Mirian Tavares O homem que cavalga longamente por terrenos selváticos sente o desejo de uma cidade. italo calvino
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á uns anos fui à Istambul com duas amigas. Íamos a um congresso europeu de Estudos de Cinema e ficamos ali uns dias a aproveitar a cidade, para mim um deleite e um constante exercício de estranhamento, mesmo que muitos dos habitantes locais me confundissem com uma nativa, a Turquia é um país outro, muito distante dos países em que vivi ou por onde andei. País entre dois continentes e destinos diversos, a Turquia exerce uma enorme atração sobre os ocidentais que ali se encontram numa fronteira ténue entre aquilo que imaginamos do outro, aquilo que nele reconhecemos como nosso e aquilo que nos é diferente. País irmão e, ao mesmo, tempo estrangeiro. Ao contrário de muita gente que, mal chega ao destino, se converte num especialista instantâneo do mesmo, não tenho esta pretensão. Gosto de fruir a cidade, de sentir as suas asperezas e de encontrar a sua doçura. Sem tentar que ela se encaixe no meu desejo, ou em ideias préconcebidas, mas deixando que ela se realize, plenamente, em mim. Como disse Mario Levi, “Istanbul is a city of migration; both away from and to the city. Migration means loss, grief.” Hoje, mais do que nunca, esta perda e esta aflição afloram num país sitiado por políticas conservadoras que afastam ainda mais a Turquia do seu destino europeu. Mas enquanto lá estivemos, vivi o deleite de uma cidade onde sabe bem caminhar e perder-se, sem pensar num destino específico e sem querer chegar a lado nenhum.
nada, deixa-se levar. Enquanto olhamos os lenços e a seda nos envolve, ele não para de falar: porque é muito rico e novo! Um bom marido. Se a Cármen quiser, bailam toda a noite e tomam copos ao luar. Enquanto fala, ensina-me a colocar a pashimina com quatro voltas ao pescoço. Já fiz massagens – diz, antes de ficar rico. O grande bazar é um delírio - cores, sons, línguas, cheiros e muito chá de maçã. Espanholas? Italianas? Francesas? Entrem. E as joias, e as peles, e as malas e a doçura natural e os olhares. Sentamos para um sumo de limão e tentamos aprender turco em três lições, no restaurante, servidas por cinco empregados de mesa que vinham e escreviam palavras no guardanapo: é assim que se escreve cão. Claro que de manhã já não lembrávamos de nada. Lembro-me de Istambul com trovões ao fundo. O mar de Mármara com muitas luzes e tantos navios. O taxista que falava um inglês estranho e mostrava ao fundo a mesquita azul: ali estão as muralhas. Istambul é uma cidade muito velha, dizia com orgulho. O vento que anuncia chuva entra pela janela do carro e já é noite. Deixem-me dormir aqui. Deixem-me sentir os cheiros de especiarias e ouvir as gaivotas que gritam a toda hora anunciando a tempestade. E os gatos – que são tantos. Deixem-me dormir aqui, com o mar de Mármara ao fundo e ser chamada de Cármen, por um dono de uma loja de pashiminas que fala connosco uma mistura de línguas e que nos oferece chá de maçã. E que não deixa de insistir: eu faço massagens, enquanto vende a outros turistas que por ali passeiam, falsos Rolex .
Cármen!! grita o dono da loja de pashiminas. Come on, por favor, tomáte un té de manzana. E Cármen, que somos nós, nesta altura confundidas com espanholas, sem entender ALGARVE INFORMATIVO #80
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2 / Interior / Rogério Bacalhau / Poesia a Sul Bruno Inácio
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Duas vezes mais IRS é o que vai pagar quem explora um alojamento local. É essa a proposta que consta no Orçamento de Estado para o próximo ano. A associação que representa o sector fala num aumento de 133% do imposto sobre o rendimento dos particulares e 775% para as empresas. É um enorme aumento de imposto num sector com uma regulamentação recente e (mais um vez) o Algarve é quem mais perde. Importa notar que metade do Alojamento Local do país está situado na nossa região. Quem investiu é traído com esta mudança de regras que vai penalizar fortemente o sector ao ponto de poder incentivar ao regresso à clandestinidade. É um passo atrás na qualificação turística e um revés no incentivo à requalificação urbana. Ao que parece existe agora quem defenda que a lei que regula este sector deveria ser revista quando o que realmente faz falta é fiscalização. É um desviar de atenções do enorme aumento de impostos no turismo onde a Secretária de Estado do sector assobia para o lado e mais uma vez o Algarve é penalizado. Interior O governo aprovou um programa com 164 medidas para combater a desertificação no interior do País. O Algarve, que em diferentes momentos nos últimos 15 anos, teve classificações diferentes para os seus municípios no que respeita ao seu reconhecimento como sendo ou não interior, necessita de ser abrangido por estas medidas. Digo-o por uma questão de justiça sem ter no entanto grande crença no programa aprovado. Trata-se, antes de mais, de um diagnóstico que procura soluções que são mais do mesmo. Medidas que no passado já foram testadas e se verificaram insuficientes para contrariar a curva de desertificação do país.
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Adicionalmente é mais um embuste político. Onde estão as tão prometidas reaberturas dos serviços públicos no interior? Responde o Ministro Eduardo Cabrita: “não é um programa de regresso a qualquer passado, que implique uma reabertura automática de serviços encerrados nos últimos anos, como escolas ou centros de saúde”. Para quem dizia que era aí que residia a solução, este programa não é consequente. Rogério Bacalhau E a coragem de decidir estrategicamente. O município de Faro, liderado por Rogério Bacalhau, teve a coragem de decidir não vender uma peça do seu Museu Municipal por 2 milhões de euros depois de uma oferta realizada por uma galeria inglesa. Num município que encontrou o seu rumo e onde a cultura tem sido um dos condutores de sucesso, teria sido aliciante um encaixe financeiro daquela dimensão. Mas houve a coragem de projetar no futuro o que uma peça com este valor pode fazer pela cidade e pela região. Poesia a Sul Olhão vai receber um importante encontro que tem na Poesia o seu ponto fulcral. O Poesia a Sul, que vai para a sua segunda edição, tem um programa vasto e com um leque de convidados deveras impressionante. Escritores, críticos literários, gente da música e de muitas outras artes. Em Cacela Velha, em Setembro, também a Poesia sai a rua num encontro que tem vindo a ganhar interesse. A importância destes momentos é relevante, não só pela promoção da “palavra” em diversas dimensões e disciplinas mas também porque se afirmam como momentos de reflexão crítica sobre a cidade, a região o país e o mundo. E é fundamental que nunca percamos essa capacidade de nos juntarmos, de pensar e de discutirmos .
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O lugar do rodapé António Manuel Ribeiro
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ecorre de hoje (quinta) até domingo o Festival da Utopia, organizado pela classe jornalística e que visa conduzir a mesma a um congresso sobre o estado a que a profissão chegou, uma matéria tão actual quanto urgente: a democracia pode ser perversa quando encontra mecanismos capazes de legalmente cercearem a qualidade do regime. Sem informação livre, responsável e capaz de investigar ficamos entregues a boletins informativos (jornais), informação de trânsito (rádio) e chouriços de sangue (TV). O Festival vai decorrer em Lisboa, no Jardim da Amnistia Internacional, freguesia de Campolide. Quando o Viriato Teles me contactou e disse, tu também foste jornalista, alegrei-me com esse tempo na memória onde muito aprendi com os homens da tarimba que sabiam escrever sem gordura – os UHF vão participar hoje no evento que inclui debates com gente do teclado e da fotografia (já foi da pena). A democracia, depois, legalizou muita coisa, da corrupção ao convencimento que acaba naturalmente na estupidez apequenada: a economia é apenas um dos nossos indicadores sem disfarce.
Este tipo de informação, importado, era até há uns tempos exclusivo dos canais de informação financeira internacionais. Depois alargou-se, e hoje é epidémico. Tratados como consumidores abrutalhados, perdemos a informação e a cidadania. Há uma semana, esperava eu um amigo do norte no bar de um hotel de Lisboa, olhei o ambiente à volta e apanhei no radar dois casais estrangeiros sentados à volta de uma mesa. O meu café fumegava, a empregada afastou-se e eu voltei ao enfoque. Quatro humanos na terceira idade, cada um com um iPhone à frente dos olhos e todo o silêncio à volta, sem mexer os músculos. Pensei: os rodapés vão continuar. Disco da semana: «Stones World» de Tim Ries (2009). É um excelente projecto de world music sobre o cancioneiro dos Rolling Stones que inclui Jack DeJohnette (bateria), Bill Frisell (guitarra), Mick Jagger, Keith Richards e Charlie Watts, Milton Nascimento (voz) e a portuguesa Ana Moura com guitarras de fado a morder o jazz e o rock, entre outros .
Tudo isto porque me sinto violado na minha capacidade humana de discernir quando vejo televisão, por exemplo a SIC Notícias, que já foi um excelente canal de informação. Hoje o privilégio é a quantidade sobre a qualidade, o ruído rápido sobre o esclarecimento. Estou a ver um espaço noticioso, há um pivot a ler o teleponto e em simultâneo um rodapé imparável de informação, com a imagem a piscar «actualidade» sobre «actualidade», em contra senso com o que a imagem humana debita. Dou comigo a saltar da voz para a fiada de palavras móveis, perco umas e outras, fico por metade ou menos, tenho de rever o que foi dito na net quando tiver tempo.
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A Globalização Augusto Lima
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omo quase tudo, tem prós e contras, mas é já considerada o Bicho Papão dos nossos dias e o símbolo da escravatura moderna, da opressão, e da alienação. A par das grandes revoluções que transformaram massivamente os nossos hábitos, como a revolução industrial, a globalização é a sílaba tónica da Revolução Informativa e Científica. As revoluções sempre tiveram gémeos na sua caracterização. Se, por um lado, melhoram a vida do homem, trazendo bem-estar e facilitarismo, ao mesmo tempo deterioram-na, tornando as pessoas menos humanas, ilusão a custo zero mas com juros impagáveis. Se, por um lado, trouxe a destruição de muros e a queda de regimes totalitaristas, por outro, trouxe a destruição dos recursos, o uso abusivo de terras, e a alienação dos povos e das gentes. E quem foi o responsável por este vírus que parece não ter cura? Nós! Através das nossas escolhas, sabiamente, subliminarmente, bem induzidas pelos fazedores de sonhos que nos fizeram crer sem ver. Uma das empresas que mais lucra com esta forma de pensar são as grandes superfícies alimentares que têm por trás verdadeiros exploradores sem escrúpulos que souberam juntar a ciência a seu favor e contra todos nós. – Precisamos de ter carne todos os dias, à mesa? – O leite de animais faz realmente bem? – A margarina faz bem? – Precisamos de cozinhar para viver bem? – Podemos ter os produtos que mais gostamos, todo o ano? A estas perguntas, a indústria alimentar avançou, esfregando as mãos de contente e… – Mascarou margarina venenosa com sabores irresistíveis e embrulhados em campanhas não verdadeiras com instituições de saúde. – Fez-nos acreditar que bastava comer um qualquer texturado, liofilizado ou homogeneizado, substituindo-o pelo hábito saudável e saudosista do
pequeno-almoço, em família, como a principal refeição do dia, com fruta, legumes e cereais – Facilitou tudo de forma apelativa, fazendo-nos acreditar que as refeições do dia também se podem tomar em espaços denominados de áreas de restauração, substituindo-as pelas tomadas em casa, em família. – Juntou a gordura assassina transtornando o pão, bolinhos e snacks, crocantes e fofos eternamente. – Manipulou sementes e alimentos, retirou sabiamente à natureza, cores, aromas e sabores, introduzindo fruta verdadeira em boiões com formas apelativas e cores garridas, sempre sublimadas com imagens que atraem as crianças perdidas na floresta para a casinha de chocolate da bruxa comilona. – Deu rações de carne de vaca à ruminante vaca e tornou-a louca. – Injetou sódio em carnes rijas, tornando-as tenras – Introduziu tintas venenosas na alimentação de salmões modificados – Apanhou antes do tempo, frutas e legumes, encerados e encerrados em armazéns sem oxigénio. A parte assertiva da globalização trouxe a anulação de fronteiras, a interação entre os homens, a partilha. Durante muito tempo falou-se de uma Cozinha de Fusão – onde se fundiam produtos, apresentações e utensílios, mais que técnicas, já que são comuns a quase todos os tipos de cozinha. Foi a descoberta de novos produtos que a abertura dos mercados disponibilizou. Em termos gastronómicos, hoje podemos experienciar várias especialidades de outros povos, a um passo de casa, porém, pouquíssimos são originais ou tão pouco cópias boas do original. Felizmente que a cozinha regional tem um ingrediente capaz de anular todas estas artimanhas – tem alma, tem paixão, tem coração. Felizmente que as pessoas começam a despertar para o bom senso mas atenção, não se enganem pois o Capitalismo desenfreado tudo fará para evitar o sucesso dos inquebráveis. Olhos bem abertos e comecem a mudar – já! .
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ADELINO SOARES CONTINUA A CONQUISTAR PRÉMIOS PARA VILA DO BISPO Depois de ter sido Município do Ano em 2015 e de ter entrado para o Top 10 do Índice de Transparência a nível nacional, Vila do Bispo volta a estar em destaque, desta vez ao conquistar o 2.º lugar no ranking relativo a «Participação Pública» no universo dos 308 concelhos de Portugal. A estes somam-se diversos prémios amealhados pelas praias do concelho e pelo crescente sucesso do Festival de Observação de Aves e Atividades de Natureza, reflexo do trabalho realizado por Adelino Soares à frente da autarquia vilabispense nos últimos sete anos. Texto: Fotografia:
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á se está a tornar um hábito Vila do Bispo ser tema de notícia em virtude dos prémios que vai conquistando pelas suas práticas do dia-a-dia e, no dia 17 de outubro, o currículo deste concelho do extremo do barlavento engordou com mais uma distinção. Desta vez, no âmbito do Índice da Presença na Internet das Câmaras Municipais Portuguesas, Vila do Bispo amealhou o 2.º lugar no critério «Participação Pública», num exame elaborado pelo Laboratório de Estudo e Desenvolvimento da Sociedade de Informação da Universidade do Minho que tem como objetivo avaliar a presença na internet das autarquias portuguesas e assim retratar o estado da modernização web das mesmas e do nível da sua relação eletrónica com os munícipes. O critério em que Vila do Bispo foi distinguido dedica-se aos mecanismos de participação que as Câmaras Municipais disponibilizam ao cidadão através da internet, reportando-se a 2014, daí que Adelino Soares acredite que, na avaliação que será feita no primeiro semestre do próximo ano, o resultado possa ser ainda mais positivo. “O nosso trabalho está melhor e a prova disso foi a nossa classificação no 10.º lugar no Índice de Transparência. É um motivo de grande orgulho saber que, no universo dos 308 municípios de Portugal, ficamos na segunda posição, apenas atrás do Fundão, um concelho que também trabalha bastante bem com as novas tecnologias”, afirma Adelino Soares.
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Com a lei a ser cada mais exigente e rigorosa com a informação que as câmaras municipais devem colocar à disposição das suas populações, nomeadamente através da internet, a boa prestação de Vila do Bispo é um reflexo, igualmente, da estratégia implementada no território, da forma de comunicar e do investimento realizado a nível informático, sem esquecer “a excelente equipa constituída pelos colaboradores da autarquia”, destaca o edil, recordando que, em 2015, Vila do Bispo já tinha sido considerado o Município do Ano. E, apesar dos portugueses estarem algo «divorciados» da política, continuam a seguir atentamente o que vão fazendo os homens e mulheres que elegeram para dirigir os destinos dos concelhos onde vivem. “Tentamos sempre melhorar dia após dia a forma como comunicamos, como transmitimos a informação a quem aqui vive e àqueles que nos visitam. Claro que, com prémios destes, as pessoas dão mais importância e relevo ao trabalho que fazemos no quotidiano”, reconhece o entrevistado. Recorde-se que o Prémio Município do Ano foi conquistado em virtude do sucesso do Festival de Aves e Atividades da Natureza e, na edição de 2016, que aconteceu de 30 de setembro a 5 de outubro, voltaram a bater-se todos os recordes de participação, para satisfação de Adelino Soares, o grande mentor deste evento quando chegou à 42
presidência da Câmara Municipal de Vila do Bispo. “Foi um projeto que, no início, muita gente não entendeu. Foi necessário insistir, porque tínhamos noção da importância que poderia vir a alcançar, tendo sido o primeiro festival de observação de aves a nível nacional. Hoje, é o maior evento de turismo de natureza de Portugal e cada vez há mais órgãos de comunicação social a acompanhar as inúmeras atividades, tanto portugueses como estrangeiros”, indica, aproveitando para enaltecer o papel dos parceiros locais que desde a primeira edição se juntaram a esta aventura, assim como dos coorganizadores Almargem e SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo de Aves. “O facto de termos cada vez mais gente no concelho nesses dias e 43
verificarmos que a restauração e o alojamento local têm maior ocupação dá-nos um tremendo alento para seguirmos em frente. Aliás, este ano tivemos participantes de 29 nacionalidades, pessoas que chegaram de todos os continentes, o que traduz, claramente, que temos aqui um projeto com futuro e que vai continuar a ser melhorado gradualmente”.
Aposta bem-sucedida no turismo de natureza Sem os meios financeiros de outros concelhos do Algarve, Adelino Soares cedo arregaçou mangas para definir os nichos de mercado em que Vila do ALGARVE INFORMATIVO #80
Bispo deveria concentrar os seus esforços e o turismo de natureza é um desses casos, sabendo-se que existem, por exemplo, em todo o mundo, milhões de adeptos da observação de aves. “O Algarve vive essencialmente do turismo e nós, face às nossas condições únicas, temos que explorar a coabitação entre a natureza e o homem. O festival, quando nasceu, era essencialmente de observação de aves, com alguns complementos associados. Com o crescimento do evento, tivemos que assumir claramente a vertente das atividades da natureza e a procura tem sido tanta que, este ano, ultrapassamos as 300 atividades”, salienta o autarca. Crescer mais em quantidade, afigurase, porém, complicado, porque as empresas turísticas do concelho não têm margem de manobra para oferecer
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mais do que atualmente disponibilizam aos participantes, mas poucos serão, verdade seja dita, os festivais deste género com tantas atividades. “E muitas delas esgotam antes do festival começar, porque somos uma referência internacional junto dos amantes da natureza, nomeadamente do birdwatching. Não admira, por isso, que algumas pessoas de outros concelhos estejam interessadas em replicar este projeto noutras zonas do país”, aponta Adelino Soares. Turismo de natureza que, de repente, se tornou uma prioridade estratégica para os governantes nacionais, com uma aposta forte em produtos como as caminhadas, os passeios de bicicleta, a observação de aves. “Isto é um trabalho de equipa
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que temos vindo a desenvolver de forma consolidada, à semelhança do que acontece na geologia, arqueologia e paleontologia, onde há estudos científicos conduzidos em parceria com a Universidade do Algarve e a Marinha Portuguesa. O seminário que organizamos sobre as potencialidades do concelho deu a conhecer melhor o território aos próprios residentes e permite-nos a todos vender, de forma mais consistente, organizada e com rigor científico, o que temos para oferecer a quem nos visita”, salienta, assim justificando os bons resultados económicos e turísticos alcançados no passado recente. “Cada vez que vamos ao estrangeiro promover o concelho numa feira de turismo, toda a gente tem maior consciência do território onde está inserida”, reforça. A presença em feiras escolhidas a dedo tem sido outra marca do executivo camarário liderado por Adelino Soares, ao invés de ir sempre aos mesmos certames do costume e onde os resultados podem não ser os melhores. “Este ano fomos com várias empresas locais à maior feira náutica do mundo, que acontece em Dusseldorf, na Alemanha, mas também a outras de Espanha e França, de uma forma bastante organizada e concertada e fomos muito elogiados pelo profissionalismo que demonstramos na promoção de Vila do Bispo. Já fomos novamente convidados para participar nessa feiras e isso é o acumular de muito trabalho das empresas e do apoio que o município dá à sua atividade, para levarmos
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produtos devidamente certificados, com enorme qualidade e que cativam o interesse das pessoas”, analisa. Tal não significa que feiras mais generalistas não sejam importantes, antes pelo contrário, com Adelino Soares a defender a participação dos 16 municípios algarvios como um todo na promoção do Algarve em certos certames. “Mas também é importante que cada concelho se possa autopromover com a estratégia que é mais eficiente para si, porque aquilo que é positivo para Vila do Bispo pode não ser interessante para os outros”, justifica.
Património arqueológico é outra mais-valia Parte integrante da natureza são, claro, as praias, e essas têm proporcionado também muitas alegrias a Vila do Bispo, desde os cobiçados galardões «Bandeira Azul», «Praia Dourada» e «Zero Poluição» a distinções de prestigiadas publicações internacionais. E, se é verdade que as praias já existiam, há todo um trabalho da autarquia a destacar, em questões como a segurança e higiene, os acessos, a sinalética. “O Algarve viveu durante muito tempo do sol e praia, mas cada vez há mais abertura para se perceber as outras potencialidades que possuímos. Trazer mais pessoas no Verão se calhar não é a estratégia ALGARVE INFORMATIVO #80
mais correta, porque temos o alojamento e a restauração praticamente esgotados, o objetivo é atrai-los noutras alturas do ano”, sustenta Adelino Soares, dando o exemplo concreto do surf, outro produto de sucesso deste concelho. “As empresas ligadas a essa modalidade souberam crescer com o decorrer dos anos e deixaram de ser sazonais. Há vários setores económicos que podem ser mais rentabilizados para tentar minimizar um problema crónico do Algarve e que não tem razão de continuar a existir”. E porque se falou em alojamento, ainda recentemente foi reaberto um empreendimento de luxo na Praia da Salema, depois de obras de requalificação, com a certeza de que torres de betão não têm lugar neste paraíso à beira-mar plantado. “As regras de ordenamento do território existentes não permitem mais do que aquilo que tem sido feito, mas levamos a cabo um trabalho bastante assertivo no campo do alojamento local e que também não foi bem compreendido no início. Basicamente, sensibilizamos as pessoas para legalizarem uma atividade que exerciam há muito tempo, porque há vários operadores turísticos a trabalhar com esse tipo de alojamento e a imagem conta imenso. Agora, toda a gente reconhece a importância que teve a certificação do alojamento local e que veio aumentar bastante a nossa oferta de camas”, comenta Adelino Soares. “Antigamente, as pessoas vinham a Vila do Bispo em visita e iam embora ao final do dia, ALGARVE INFORMATIVO #80
agora, permanecem, porque encontram um ambiente diferente, em contato com a natureza, em segurança, afastados da confusão em que vivem no seu dia-adia”. Cartão-de-visita inquestionável deste concelho é a Fortaleza de Sagres, mas há mais património histórico edificado nesta parte do Algarve e que tem conhecido, recentemente, uma grande vida cultural. Grande fulgor tem ganho, igualmente, a arqueologia e Adelino Soares relembra que, em 2017, os vestígios subaquáticos associados à Primeira Guerra Mundial vão ser considerados Património da Humanidade pela UNESCO. “São mais tesouros que é importante serem divulgados, uns através de eventos, outros de estudos científicos. Nesse contexto, este ano queremos ter o projeto concluído para um espaço cultural único no concelho, uma espécie de museu, que retrate tudo aquilo que existe no concelho de Vila do Bispo,
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terminando na etnografia, na história das suas gentes”, revela. Ponto de partida, no século XV, para os Descobrimentos, Vila do Bispo parece ter encontrado novamente o seu rumo, alicerçado no turismo de natureza, na cultura, arqueologia, geologia, paleontologia, e os frutos da estratégia definida pela equipa de Adelino Soares estão à vista. “O trabalho que temos feito é reconhecido por entidades idóneas que são nossas parceiras em diversos projetos, porque
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compreendem qual é o nosso propósito e onde queremos chegar. O caminho está devidamente delineado, mas ainda não está todo percorrido. Este concelho vive do turismo e apenas pegamos naquilo que temos condições para rentabilizar e colocar ao serviço dos operadores, empresários e da própria população. É uma estratégia que não assenta em festas ou concertos que duram uma hora e depois as pessoas vão-se todas embora”, diferencia Adelino Soares .
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À CONVERSA COM LUÍS CORREIA CARMELO SOBRE O OFÍCIO DE CONTAR HISTÓRIAS Inserido na rubrica «No Teatro às 6», o Teatro das Figuras foi palco, no dia 19 de outubro, de uma tertúlia com o conhecido contador de histórias Luís Correia Carmelo. Numa sessão bastante animada com o sol a descer no horizonte, o lisboeta radicado no Algarve há quase uma década falou do seu trajeto, da diferença entre contos, histórias e stand-up comedy e de muito mais, perante uma plateia com diversos rostos conhecidos da vida cultural farense, mas também com muitos jovens aspirantes a uma carreira na arte da representação. Texto:
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em só de grandes concertos de música, peças de teatro, espetáculos de dança e por ai adiante vive o Teatro das Figuras, em Faro, e o final de tarde do dia 19 de outubro foi disso exemplo, com mais uma conversa, em jeito de tertúlia, com o contador de histórias Luís Correia Carmelo. O profissional da narração oral prontamente esclareceu, em jeito de brincadeira, que o seu sotaque peculiar se deve a ter crescido no Brasil. Depois, de regresso a Portugal, estudou na Universidade de Évora, onde fundou uma companhia de teatro para interpretar, nas ruas da cidade, adaptações de contos tradicionais portugueses e teatro de máscara. “Aos poucos, fui-me apercebendo que gostava mais das partes em que me dirigia diretamente ao público, em vez de representar as personagens com as máscaras. Davame imenso prazer narrar as histórias naqueles espetáculos de rua, mas só comecei a usar o termo de contador de histórias quando, em 2001, me cruzei com a Rede de Programação da Narração Oral em Portugal”, recorda. Carmelo passou, naquela época, a ser convidado com frequência para ir contar histórias a escolas, bibliotecas, festivais, associações, mas reconhece que este movimento da narração oral, como de costume, chegou com algum atraso a Portugal, quando comparado com outros países da Europa. “Do que se sabe, a primeira pessoa a desempenhar esta atividade em termos profissionais foi António
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Fontinha, no início dos anos 90. Começou a contar histórias no contexto do seu trabalho de animador cultural com jovens que estavam institucionalizados, cada vez lhe pediam mais histórias, e foi o primeiro a começar a ir às escolas e bibliotecas”, relata, lembrando que muitas bibliotecas municipais já dinamizavam horas do conto, e assim se deu o encontro entre António Fontinha, Cristina Taquelim e Jorge Serafim, entre outros, na Biblioteca Municipal de Beja. Luís Correia Carmelo considera-se um membro da segunda geração de contadores de histórias, embora, naquela altura, estivesse mais habituado a transmitir contos tradicionais brasileiros, num espetáculo com outro colega, ele sim dedicado aos contos tradicionais portugueses. “Tínhamos um tapete, umas cadeirinhas, umas violas e alguns adereços e fomos convidados para as Jornadas do Conto da Universidade do Minho. Eu e o Nuno chegamos com o nosso cenário e figurinos, fomos falar com os elementos da organização e disseram-nos que íamos atuar separados, em salas e horários diferentes”, lembra, com um sorriso, a peripécia. “A programação estava feita, não havia nada a fazer, mas pensamos que seria a mesma coisa cada um contar as histórias que estava habituado a contar no nosso espetáculo. A mim calhoume precisamente a Cristina Taquelim como parceira de sessão, fomos para uma sala lindíssima do 52
Museu de Braga, eu a tentar safar-me o melhor possível daquela situação e, quando ela me perguntou quem é que começava, eu respondi de imediato que as senhoras vão sempre em primeiro”. A poucos minutos de se estrear, de forma não propositada, como contador de histórias a solo, Luís Correia Carmelo ficou bastante emocionado com a experiência de ver, ao vivo, Cristina Taquelim e, verdade seja dita, até se safou bem e foi logo convidado para participar nas «Palavras Andarilhas». “Foi só nesse momento que constatei que havia gente que fazia vida de contar histórias, uns exclusivamente, outros em part-time. É difícil encontrar pontos de conexão do movimento de 53
narração oral português com o de outros países, não é possível identificar que influências tivemos ou não, mas é um facto que, em Espanha, ele começou com uma década de antecedência. Dizem que, em Inglaterra e França, ele apareceu nos anos 70, eu acredito que terá sido mais no início dos anos 80”, prosseguiu o convidado desta tarde do «No Teatro às 6».
O fascínio de jogar com contextos diferentes O certo é que, hoje, há uma programação muito forte em escolas, bibliotecas, teatros e festivais por essa Europa fora, com um número bastante vasto de ALGARVE INFORMATIVO #80
nos conhecemos uns aos outros, há uma troca de informação e uma grande proximidade. O mercado é bastante pequeno, mas não há um sentimento de concorrência, como se observa em Espanha, França ou Inglaterra”, sublinha.
profissionais da arte de contar histórias, número esse que, em Portugal, se limita, possivelmente, a uma dezena. E isto porque, apesar do termo «contador de histórias» se ter disseminado bastante nos últimos anos, ainda há muitas pessoas que não sabem exatamente do que se trata esta atividade. “Em Portugal, não há uma rede formal de narração oral, somos poucos, praticamente todos ALGARVE INFORMATIVO #80
Apaixonado pela vida de contar histórias, Luís Correia Carmelo entende que a narração é uma das artes da relação e esse foi um dos aspetos que o cativou logo no início da sua carreira. “A presença de uma voz narrativa, de um narrador que conta histórias, e a copresença que a performance implica, estabelece uma ligação imediata, mesmo que ela já seja ficcionada. A partir do momento em que há um «eu» que se dirige a um «vós» ou a um «tu», há qualquer coisa que acontece, que depois pode ou não ser explorada”, descreve. “Essa capacidade de estar com as pessoas; de encaminhar o seguimento das narrativas, a sua sequência, de acordo com a perceção do interesse, da disposição das pessoas que estão à 54
nossa frente; o compreender onde e para quem estou a contar, porque um infantário é diferente de um teatro municipal, de um museu ou de um lar de terceira idade. Esse jogar com o contexto é um dos aspetos mais apreciados pelos narradores”, indica. Outro segredo do ofício que também encanta o interlocutor desta tertúlia é a intensidade com que se pode narrar uma história e que não depende, necessariamente, de movimentos ou gestos. “Somos chamados a contar histórias numa enorme diversidade de situações e de locais, com dezenas ou centenas de pessoas à nossa frente, numa sala ou numa rua, e é com a experiência que se vai ganhando maior sensibilidade a esses diferentes contextos. É muito esquisito para uma pessoa estar em cima de um palco, perante centenas de pessoas, e ter uma postura, um comportamento,
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como se estivesse numa mesa de café. Do mesmo modo, se estiver num lar de terceira idade, e começar a fazer algo muito estilizado, eles também não percebem a razão daquela «teatrice» toda”, alerta Luís Correia Carmelo. Antes de passar a palavra aos participantes na tertúlia, o contador de histórias falou ainda da diferença entre «contar» e «mostrar», conceitos que se diluem quando, no dia-a-dia, estamos a relatar algo numa ambiente informal, a amigos ou colegas de trabalho. “Contar é quando usamos apenas o discurso verbal para demonstrar a história que estamos a tentar transmitir. No mostrar, representamos a situação sem utilizarmos as palavras. Todos nós, quando estamos numa narrativa mais extensa, oscilamos
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naturalmente entre o contar e o mostrar, assim como usamos o discurso direto em determinados pontos da história”, esclarece Carmelo. “Os narradores tendem a ficar mais no contar, porque é desse modo que estamos numa relação mais profunda com quem nos está a ouvir. Assim que começamos a representar uma personagem, a mostrar algo, até a cantar, desligamonos um pouco do recetor”, justifica.
Quando a comédia se mistura com os contos E porque a tertúlia não era um monólogo e estava aberta a perguntas da parte dos participantes, houve quem quisesse saber a diferença entre conto e história e qual o efeito que o ALGARVE INFORMATIVO #80
advento da stand-up comedy teve na vida destes contadores. “Não só em Portugal, mas também em Espanha e França, houve uma apropriação da palavra «conto» para especificar a atividade de contar histórias. Veja-se que, na «Hora do Conto» das Bibliotecas, não se transmitem apenas contos, mas também adivinhas, parábolas, rimas, lendas, mitos. Normalmente, quando se fala em contador, estamos a pensar em histórias. O «conto» é um termo abrangente, um guarda-chuva para aglutinar uma série de géneros”, elucida Luís Correia Carmelo. Quanto à stand-up comedy, foi o percurso seguido por alguns contadores de histórias quando surgiu o programa da SIC «Levanta56
te e Ri», dos quais o nome mais sonante é Jorge Serafim. “É dos narradores mais antigos de Portugal, começou na Biblioteca de Beja com o António Fontinha e a Cristina Taquelim, e tem uma maneira bastante contagiante de contar histórias, rapidamente ganha o afeto e o desejo do público”, destaca Luís Correia Carmelo. “Esteve muito tempo ligado às «Palavras Andarilhas», mas deixou a biblioteca quando ganhou toda aquela visibilidade depois de aparecer na televisão e começou a ser convidado com grande regularidade para ir contar histórias. Mas, dependendo do convite, do local e da hora do espetáculo, ele percebe logo se as pessoas querem contos ou comédia”, observa.
portanto, são esses que os contadores utilizam. Na stand-up comedy, o repertório tem que ser diferente e, no caso do Serafim, são reinvenções da sua própria experiência, do que lhe acontece no dia-a-dia”, distingue, antes de ser desafiado por nova pergunta da parte da assistência. Perguntas que, de facto, foram várias, de modo que já o dia tinha dado lugar à noite quando esta sessão de «No Teatro às 6» chegou ao fim. Mas haverá, certamente, mais oportunidades para bebermos das palavras de Luís Correia Carmelo, porque o relato da sua história ficou a meio .
Uma situação que nem sempre é fácil de gerir, acredita Luís Correia Carmelo, porque, na hora da verdade, seja a contar histórias ou anedotas, todos têm pela frente um público que tem que ficar contente com a atuação. “Nós não trabalhamos um mês ou uma semana para alguém, fazemos um espetáculo para alguém e, se as pessoas não gostarem, no mês seguinte não consigo pagar a renda da casa. Se o público já estiver habituado a ouvir histórias, posso fazer aquilo que realmente gosto e quero fazer, contudo, em 90 por cento das vezes, este é um trabalho de concessão”, admite. “Os movimentos da narração oral são revivalistas, olham para o conto dito tradicional como o grande material a ser renovado, 57
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Empreita de palma algarvia brilhou na Moda Lisboa As malas e chapéus de Maria João Gomes foram uma das atrações do desfile do estilista Filipe Faísca na recente edição da Moda Lisboa, com a empreita de palma algarvia a conquistar muitos adeptos e a fazer disparar as encomendas da marca «Palmas Douradas». Uns dias depois, de regresso a São Brás de Alportel, a empresária e artesã falou dos seus projetos para o futuro e da vontade de não deixar desaparecer esta antiga tradição da serra algarvia. Texto:
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ilha de pais emigrantes, Maria João Gomes andou por França, Espanha, Inglaterra e Estados Unidos da América antes de chegar, há sete anos, a São Brás de Alportel, terra de onde é originária a família do lado paterno. O primeiro contato com a empreita teve a observar a avó a criar peças do verdadeiro artesanato algarvio, uma paixão que não desapareceu nas suas andanças pelo mundo, de tal modo que frequentou um workshop, em Salir, para aprender a técnica dos nove ramais. Maria João Gomes, porém, queria mais e não descansou enquanto não aprendeu todas as técnicas da empreita, de tal modo que, hoje, é ela que dá workshops, mas a principal atividade é a elaboração das suas próprias peças originais. Uma veia criativa que já tinha
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dado nas vistas enquanto residiu em Madrid, período durante o qual realizou várias exposições de pintura. “Um dia, a minha mãe ofereceu-me uma balsinha típica, daquelas que se levava para a escola, e fiquei logo com vontade de aprender. Já tinha feito coisas enormes em renda para colocar nas paredes e, na empreita, comecei precisamente pelos murais, que tiveram bastante sucesso. Os ingleses apreciam muito essas peças, para colocar no teto ou numa mesa, com um vidro por cima”, conta. A empresária cedo se apercebeu, contudo, que não há muitas pessoas a trabalhar com a empreita de palma algarvia, normalmente artesãos de idade já avançada, o que coloca em risco esta arte ancestral. “Eu já estou a plantar palmeiras numas terras que herdei e noutras que a minha mãe recebeu do meu avô e que, mais tarde, serão para mim e para a minha irmã. O problema é que a palmeira demora muito tempo a crescer”, indica a entrevistada, revelando que passa grande parte dos seus dias na serra a apanhar a matéria-prima para o seu ofício. “Não sabia que ia ter tanto sucesso, por isso, ando muito tempo no mato a reunir as folhas da palmeira. Depois, as palmas devem secar metade ao sol e metade à sombra, mas eu colocoas em «salchicha» para secar à sombra. Deste modo, ficam mais verdes mas, quando secam 63
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totalmente, ficam douradas”, aponta Maria João Gomes, daí o nome escolhido para a sua marca - «Palmas Douradas». Depois da palma seca, é preciso ser rachada, ou seja, separar as folhas, antes de serem cortadas e molhadas, por serem bastante duras. O passo seguinte é ripar a palma, para ficar toda com o mesmo tamanho, e só depois se pode avançar para o trançado. “Eu cozo com linha de cobre, como se fazia antigamente, e com palma, faço o que se chama baracinha ou tamissa. Tudo à mão, aqui não há máquinas”, garante, o que faz com que uma simples mala consuma quase duas dezenas de horas de trabalho árduo, sem contar com o forro. “O Filipe Faísca viu alguns produtos que eu tinha expostos na Tertúlia Algarvia, em Faro, falou comigo e encomendou-me três malas e seis chapéus para o desfile dele da Moda Lisboa. Foram três dias quase sem parar e, mesmo assim, só consegui terminar três malas e três chapéus. A minha casa ficou parecida a uma cabana e os meus filhos viveram à base de sandes e ovos mexidos durante três dias”, recorda, com um sorriso. Uma diferença que se constata nas peças de Maria João Gomes é o seu design mais moderno, o seu look mais fashion, algo que os artesãos de idade mais avançada não conseguem dominar com facilidade. Depois, como se adivinha, não há dois produtos iguais, embora costume fazer esboços para todas as ideias que lhe enchem a cabeça. “Não consigo estar parada em casa a olhar para a televisão e a empreita até começou por funcionar como um antisstress, de maneira que, às vezes, ALGARVE INFORMATIVO #80
até estou a fazer sem olhar para as mãos. É verdade que a empreita não gosta de ser desfeita mas, para mim, um defeito transforma-se numa qualidade. Gosto da palma rústica, que tem manchinhas, dá um charme extraordinário à empreita. Tenho montes de ideias para novos produtos e as redes sociais são fantásticas para dar a conhecer o nosso trabalho”, sublinha. 64
O artesanato genuíno é assim mesmo, não há réplicas perfeitas e cada criação de Maria João Gomes até possui um Bilhete de Identidade próprio, com a empresária da «Palmas Douradas» a ter por hábito enviar fotografias para os clientes à medida que o trabalho se vai desenrolando. “O Filipe Faísca, por exemplo, tinha pedido as alças das malas mais altas e, depois, pediu-me 65
para as baixar. Como ainda não as tinha cozido, consegui fazer a alteração porque, como disse, a empreita não gosta de ser desmanchada. É cozida com uma agulha grossa de cobre e deixa rastros, não é como o crochet”, justifica, garantindo que a empreita de palma algarvia está a ganhar clientes a um bom ritmo. “Há várias raças de palmeira, mas esta é mesmo típica do ALGARVE INFORMATIVO #80
Algarve e reconhece-se logo, até pelo cheiro”. Face ao disparar da procura, a ideia de Maria João Gomes é ter, no futuro, alguns artesãos a colaborar consigo e não se importa de ajudá-los a lidar com as burocracias necessárias para que possam vender legalmente o que produzem. “Gostava de arranjar um espaço mais amplo para dinamizar o meu projeto, um local onde se trabalhasse a genuína palma algarvia, onde as pessoas que passassem na rua, os turistas, as crianças, se pudessem sentar para ver como se faz empreita. No mesmo local podiam estar expostos outros produtos típicos do Algarve, a azeitona, o pão, o queijo e o presunto. Não descarto vender empreita de palma marroquina ou da América do Sul, mas explicando a sua proveniência”, afirma a entrevistada .
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Teatro Experimental de Lagos
estreia «Lobo Vermelho» O Teatro Experimental de Lagos estreia, no dia 28 de outubro, «Lobo Vermelho», um espetáculo de narração oral, música e teatro onde a conhecida história do Capuchinho Vermelho é analisada de todas as perspetivas possíveis e imagináveis. Interpretada por Nelda Magalhães e Bruno Batista, com música ao vivo a cargo de Carlos Norton, a peça promete encantar miúdos e graúdos, com a certeza de que as peripécias da simpática menina vestida de vermelho a caminho da casa da avó nunca mais serão vistas da mesma forma. Texto:
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Carlos Norton, Bruno Batista e Nelda Magalhães interpretam o «Lobo Vermelho» do TEL
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história desenrola-se numa serra algarvia, tendo como pano de fundo um piquenique com três amigos (Nelda Magalhães, Bruno Batista e Carlos Norton). À medida que os objetos despoletam memórias, o piquenique vai-se transformando numa floresta, numa casa da avó, num trilho, transportando o público para a conhecida aventura do capuchinho vermelho. O «Lobo Vermelho» é, por isso, muito mais do que um simples espetáculo de narração oral, de música e teatro, pois o conto imortalizado pelos irmãos Grimm é virado de pernas para o ar, da frente para o avesso, olhado de todos os pontos de vista possíveis e imaginários, com laços inusitados com a cultura algarvia, os seus costumes e medos. Deambulando por várias versões da história, os narradores, Nelda Magalhães e Bruno Batista, dão eles próprios origem a novas versões num disparate hilariante e inesperado que se dirige à infância, mas também às famílias. E, com a improvisação e a
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performance criativa a andarem de mãos dadas, joga-se com os significados e símbolos presentes nas histórias e na vida, tendo a música como uma aliada valiosa na criação de situações, de memórias sonoras e de estados de espírito, composta e interpretada ao vivo por Carlos Norton. Com base no estudo dos contos de fadas e da iconografia presente nas ilustrações dos textos clássicos de Perrault e dos irmãos Grimm, bem como nas reinterpretações que autores contemporâneos têm desenvolvido sobre o tema, o propósito do Teatro Experimental de Lagos é refletir sobre o papel do feminino na sociedade e o papel do masculino como ameaça à emancipação feminina. “Pretendemos compreender a mutação simbológica
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que o conto tem sofrido segundo a evolução da História da humanidade, bem como segundo as perspetivas culturais que o abordam. O nosso objetivo será situar o conto na contemporaneidade, a pertinência da sua atualidade e da sua função na construção social e educativa da criança e do adulto do século XXI”, explica Nelda Magalhães, a presidente da Associação do TEL. Seguindo esta linha de análise, a dupla de atores debruça-se sobre a semiologia das personagens e sobre o facto de o lobo ser constantemente abordado nos contos como uma «ameaça» ao equilíbrio social. “Esta leitura é feita desta forma em várias culturas, o que se deve, sobretudo, à forma inteligente e organizada que o
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animal canídeo possui de ser marginal, de conseguir subsistir em condições adversas e possuir o dom natural da adaptabilidade ao meio circundante”, conta Nelda Magalhães, acrescentando que, no Algarve, o lobo (no caso peninsular, o lobo ibérico), desapareceu entre as décadas de 30 e 50 do século XX, coincidindo com o surgimento do sector turístico na região. “E, com a transumância balnear desde a década de 50 e suas novas abordagens ao espaço social, chegam ao território algarvio novos «lobos», novos medos e transformações na esfera do quotidiano, que transformam a sociedade algarvia para sempre. Assim, o lobo ibérico passa de ameaça a vítima, assim como nos dias de hoje sofre o lince ibérico, escondido nas serras do Algarve, lutando pela sua
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sobrevivência de ex-predador e recente presa”, prossegue a dirigente e atriz. Depois de assistir ao «Lobo Vermelho», a história do Capuchinho Vermelho, contada nos serões de casa, nunca mais vai ser a mesma. A peça estreia no dia 28 de outubro, na sede do TEL, em Lagos, com sessões para público escolar às 9h30, 11h e 14h30. No dia seguinte haverá duas sessões abertas ao público em geral, às 16h e às 21h, antes de partir em digressão, indo a cena, a 4, 5 e 6 de novembro, em Lisboa. «Lobo Vermelho» conta com os apoios da Direção Regional da Cultura do Algarve, da Fundação INATEL, do Instituto Português da Juventude e Desporto e Município de Lagos .
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