ALGARVE INFORMATIVO #9

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Índice Assim seremos sempre pimbas ………………………………….… Pág. 4 Crónica Daniel Pina Peace and Art Society .….…………….………………………..….. Pág. 6 Entrevista Dino d’ Santiago. Do antigo «Bairro dos Pescadores» em Quarteira para o mundo ……………………………………… Pág. 12 Crónica João Espada Privatize-se Portugal! .…………………..…………………….…. Pág. 14 Crónica Paulo Cunha Atualidade …………………………………………………………….. Pág. 16 Vamos vender a TAP já! …………..………….…….…………….… Pág. 20 Crónica Paulo Bernardo Sogras e noras …………………………………………..….….……. Pág. 22 Crónica Hélder Rodrigues Lopes Atualidade…….…………………………………………...….………. Pág. 24 Manuel Neto dos Santos ………………………………………..…. Pág. 28 Entrevista Atualidade …………………………………………………..………… Pág. 34 Rui Briceno ….,……………………………………………..………… Pág. 40 Entrevista Atualidade …………………………………………………..………… Pág. 44 ALGARVE INFORMATIVO #9 produzido por Daniel Pina (danielpina@sapo.pt); Contatos: algarveinformativo@sapo.pt / 919 266 930 Diariamente, as notícias que marcam o Algarve em algarveinformativo.blogspot.pt ALGARVE INFORMATIVO #9

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Assim seremos sempre pimbas…

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Daniel Pina Jornalista Danielpina@sapo.pt Algarveinformativo@sapo.pt

(…) À borla ou com cachets simbólicos porque só assim é que o poder local e os organizadores dos eventos culturais se lembram da prata da casa. Quando há dinheiro para gastar, lá vem a trupe das bandas de pop/rock de Lisboa e Porto, ou os maestros, pianistas e grupos do resto do país quando o evento se pretende mais elitista. Orquestras não é preciso contratar, há uma boa no Algarve, mas constituída por instrumentistas estrangeiros (…) ALGARVE INFORMATIVO #9

ste sábado à noite fui ao 15.º aniversário da Música XXI, no emblemático Clube Farense. Casa cheia com um público seleto, adulto e culto, os representantes da autarquia, como não poderia deixar de ser, e um leque de artistas de encher o olho que quiseram dar o seu contributo à festa desta importante associação algarvia. Pelo palco improvisado passaram o Coral Feminino Outras Vozes, José Alegre, Fad’Nu, Rui Mourinho, Gonçalo Pescada, Fernando Cunha, Francisco Brazão, Inês Rosa, Vá-de-Viró, Francisco Gil, Augusto Miranda, Jorge Semião, Afonso Dias, Almalusa, Ana Oliveira, António Gambóias e Big Band do Algarve, entre outros convidados especiais. Apesar das minhas preferências musicais irem para estilos mais rockeiros e alternativos, sei ver quando um grupo ou artista tem qualidade, quando sabem o que estão a fazer, quando têm um trabalho consistente e que merecem os meus aplausos. E eu aplaudi. Mas também fiquei triste. Triste por constatar que muitos dos rostos que subiram àquele palco improvisado são homens e mulheres como eu, professores, advogados, comerciantes, empresários, simples cidadãos. Não que haja algo de errado disso. Contudo, face à qualidade musical a que assisti, seria de esperar que, pelo menos um punhado deles, fossem artistas profissionais, ou seja, que fizessem da música a sua atividade principal, o seu ganha-pão. Ao invés disso, a maior parte deles são profissionais de áreas que nada têm a ver com a música, música que é apenas um hobby, encarado com bastante paixão e seriedade, mas um hobby. Não é que nunca tenham tentado a sua sorte como artistas, simplesmente as oportunidades não abundavam no Algarve enquanto eram adolescentes ou jovens adultos e, face à necessidade de pagar as contas da casa, seguiram caminhos distintos. Anos mais tarde, já com alguma estabilidade, voltaram a reunir-se com os amigos de outros 4

tempos, limparam o pó dos instrumentos e retomaram os projetos musicais para criar aquilo que mais gostam, música, temas, melodias. Tocam para os amigos, para as associações recreativas e culturais das suas cidades, em ações de rua, em bibliotecas municipais, em datas especiais, normalmente à borla. À borla ou com cachets simbólicos porque só assim é que o poder local e os organizadores dos eventos culturais se lembram da prata da casa. Quando há dinheiro para gastar, lá vem a trupe das bandas de pop/rock de Lisboa e Porto, ou os maestros, pianistas e grupos do resto do país quando o evento se pretende mais elitista. Orquestras não é preciso contratar, há uma boa no Algarve, mas constituída por instrumentistas estrangeiros. E agora bate à porta o Verão, com os seus festivais duma ponta à outra da região. Uns mais tradicionais e populares a piscar o olho aos emigrantes e turistas portugueses, portanto, contratam-se acordeonistas e moças bonitas para cantar e mostrar a perna. Outros são de maior dimensão, como o FATACIL, Festival do Marisco, Festival da Sardinha e por aí adiante, e contratam-se os dinossauros do rock português, mais umas fadistas que estão na berra. Os empreendimentos turísticos de luxo organizam as suas galas de Verão com estrelas internacionais do outro milénio para agradar aos clientes estrangeiros. E os músicos algarvios, aqueles que não tocam acordeão ou teclado em jeito pimba, tão bons ou melhores que as atrações que chegam lá de fora, mas sem nomes sonantes, nem empresários que saibam mexer os cordelinhos e tenham os contatos certos, continuam a tocar nos encontros de amigos, nos aniversários das associações culturais e recreativas, nos eventos para as novas gerações que preenchem o calendário das bibliotecas e auditórios municipais em período escolar, à borla, ou com um cachet simbólico. E eu bato palmas. Mas fico triste, porque poderiam fazer muito mais, se lhes dessem a oportunidade que merecem .


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Peace and Art Society: De Faro para o mundo Pintor, escultor, argumentista, Paulo Duarte Filipe é também o fundador e presidente da Peace and Art Society, associação que conta com mais de duas centenas de membros dos quatro cantos do mundo e que tem como principal intuito divulgar a arte nas suas mais variadas formas de expressão. E isto porque, para além das dificuldades financeiras que servem de desculpa ao poder local e central para descurar a dinamização cultural do país, as prioridades continuam, e continuarão, a estar focadas no futebol e outras atividades mais mediáticas do que a arte. Sem papas na língua ou meias-palavras, é Paulo Duarte Filipe no seu jeito característico e sem medo de pôr o dedo na ferida. Texto e Fotografia: Daniel Pina ALGARVE INFORMATIVO #9

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oucos dias após inaugurar a exposição coletiva «Minha Fukushima» em Alcoutim e San Lúcar del Guadiana, fomos encontrar Paulo Duarte Filipe na sede da Peace and Art Society (PAS), no coração do jardim da Alameda, centro de Faro. Uma associação que possui membros em praticamente todos os países do mundo civilizado e, por exemplo, uma das últimas exposições organizadas na capital algarvia contou com obras de 110 nações. “São projetos multinacionais e multicontinentais que têm uma enorme visibilidade”, destaca o pintor e escultor, que também escreve guiões para curtas e longas-metragens e que, em 2011, decidiu criar a PAS. “Sempre foi meu intuito criar uma associação internacional e o nosso lema é «De Faro para o mundo e do mundo para Faro». Para nós, a arte não é um ato residual, não nos fechamos em Faro e alguns dos nossos projetos nasceram de artistas da Holanda, da Alemanha, de Israel, pessoas que estiveram cá, visitaram a Ria Formosa e fizeram

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trabalhos de arte urbana que estão espalhados por Faro”. Há muitos anos a lidar com as questões culturais, Paulo Duarte Filipe sabia que os artistas, isolados, nunca conseguiriam alcançar a força e projeção que uma associação proporcionaria e as justificações são bem simples, na sua maneira de ver. “Há por aí muitos «velhos do Restelo» que insistem em que não se faça nada e é bastante fácil um projeto perder-se nas teias burocráticas num departamento qualquer. Unidos temos mais força e, depois de nós, apareceu o Gogyoshi Art Project, na Holanda, e o Artnations, na Alemanha, e funcionamos em rede”, frisa o entrevistado, acrescentando que a arte tem o condão de unir povos de diferentes mentalidades, culturas e credos religiosos. “E a arte está acima da política. Não estamos ligados a partidos ou lobbies, queremos é fazer arte e mostrá-la ao mundo. A exposição «Minha Fukushima» estreou-se em Faro e teve uma visualização superior a 10 milhões de pessoas. São números


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fornecidos pelo Facebook, não fomos nós que os inventamos”. O sucesso do evento não surpreendeu Paulo Duarte Filipe e a verdade é que, de repente, o Mercado Municipal de Faro, e a cidade em si, estiveram nas bocas do mundo, pelo menos daqueles que seguem atentamente o meio cultural. E de Faro a exposição seguiu para Cachopo, uma vila no interior do ALGARVE INFORMATIVO #9

iniciativa da Eurocidade do Guadiana, que engloba Vila Real de Santo António, Castro Marim e Ayamonte e inauguramos três exposições em simultâneo”, descreve. Quatro anos depois de criar a PAS, Paulo Duarte Filipe não esconde a satisfação pelo trabalho que tem sido feito e que demonstra, ainda mais, que a arte não tem fronteiras nem nacionalidades. “Mal do artista ou da associação que pense em termos locais, regionais ou nacionais, não vão a lado nenhum. Em agosto vamos estar na Coreia e em Setembro vou mostrar filmes à Finlândia e devemos ter a perceção de que o mundo existe para além de Faro, do Algarve e de Portugal. Estamos a contribuir para que o mundo conheça locais como Faro, Cachopo, Castro Marim, Vila Real de Santo António e Alcoutim e criamos oportunidades para que artistas algarvios mostrem o seu trabalho alémfronteiras”, destaca, sublinhando que esta projeção beneficia concelho de Tavira que também igualmente as novas gerações. ganhou uma visibilidade “Há um miúdo de 10 anos de tremenda, até porque o poeta Vila Real de Santo António que japonês que inspirou a mostra de costuma ganhar prémios na artes, Taro Aizu, fez parte da escola e que agora tem os seus comitiva. “Comeu queijo fresco, desenhos e pinturas nos quatro papas de milho e favos de mel, cantos do mundo. Este mundo é bebeu vinho tinto, dançou ao completamente diferente som do acordeão. Foi conhecer daquele de há cinco anos e, ou a Ilha de Faro e esteve aqui no seguimos essa dinâmica, ou Jardim da Alameda a recitar perdemo-nos”. poesia, participamos numa 8


Arte é para esquecer em Portugal Foi o objetivo de divulgar o trabalho dos associados que esteve na génese da criação da Peace and Art Society e o fundador garante, sem quaisquer meias-palavras, que nunca houve qualquer intenção ou desejo de concorrer a subsídios ou apoios financeiros do poder local ou das entidades ligadas à cultura. Aliás, Paulo Duarte Filipe refere que a maior parte dos eventos que a PAS organiza é a custas próprias, exceção feita ao «Minha Fukushima», que contou com um apoio da Delegação Regional da Cultura do Algarve e da Universidade do Algarve. “Mas quem teve a oportunidade de assistir ao evento do Mercado Municipal de Faro verifica que os custos envolvidos foram bastante superiores ao subsídio que recebemos. Não surgimos para pedir dinheiro a ninguém, porque temos consciência das dificuldades das autarquias e de outras entidades e também percebemos que eles têm outras prioridades. Provavelmente o Rally do Algarve interessa mais, ou uma Volta ao Algarve em Bicicleta é mais importante do que uma exposição de arte que mostra Faro a 10 milhões de pessoas”, considera, de língua afiada. Como sempre, é tudo uma questão de perspetiva, mas Paulo Duarte Filipe e seus colegas acreditam que é através da arte que se dinamiza uma região e não de eventos que duram poucos dias e consomem dezenas ou centenas de milhares de euros. “Como artistas somos bastante criativos na forma de ALGARVE INFORMATIVO #9

organizar os nossos eventos e de maximizar recursos. Sabemos que a arte é claramente algo para esquecer em Portugal, mas não desistimos, nem deixamos de criar por causa disso”, garante, reconhecendo que os autarcas algarvios normalmente marcam presença nas iniciativas da PAS. “Nesse aspeto têm sido impecáveis, mesmo os técnicos superiores das câmaras que colaboram nas questões logísticas. Contudo, o poder político dar-nos palmadinhas nas costas não nos aquece nem arrefece, o nosso ego não é influenciado por essas questões. O que nos dá gozo é ver os miúdos a participar, é uma criança dizer que gostou imenso. O que os artistas querem é mostrar realidades que consideram importantes e que nem sempre interessa ao poder político e económico que sejam divulgadas”. De volta às prioridades, Paulo Duarte Filipe não duvida que o mais importante para os portugueses é o futebol e que o país para por completo para ver um jogo decisivo do campeonato ou quando a seleção nacional participa em competições internacionais. “Da mesma maneira que o faits-divers de 9

qualquer político ou uma notícia sobre uma celebridade têm mais prioridade do que a arte. Mudar um país demora três ou quatro gerações, só que, como a Cultura está cada vez pior em Portugal, esse processo vai exigir bastante mais tempo”, desabafa. Pessimismo à parte, Paulo Duarte Filipe não se pode lamentar de falta de trabalho, pois tem uma exposição de cerâmica japonesa a decorrer no Auditório Municipal de Olhão, tem encomendas para cumprir e um agente em Inglaterra que lhe vende diversas peças. “Isso garante-me a independência necessária para desenvolver o meu trabalho artístico sem qualquer tipo de pressão. De uma forma ou outra, os artistas conseguem desenrascar-se”. E se mais provas fossem necessárias para demonstrar a posição dos governantes nacionais em relação à arte, Paulo Duarte Filipe aponta a caricata situação da coleção de 85 quadros de Joan Miró. “A primeira coisa a fazer era construir um espaço para colocar os Mirós, depois, à volta desse sítio nascia uma localidade e certamente que tinha uma fonte eterna de


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receita, com uma dinâmica própria que a transformaria numa verdadeira mina de ouro. Mas Portugal prefere vender os quadros num leilão e arrumar o assunto de uma vez”, critica. O entrevistado ficou ainda mais certo desta convicção com a experiência que teve recentemente com o poeta japonês Taro Aizu, que veio à Europa com um programa bastante específico. “Ficou um dia e meio em Lisboa, onde foi ao Bairro Alto ouvir o fado (património mundial). No Algarve esteve em Faro e Cachopo, rodeado de artistas. Depois, foi de autocarro para Sevilha e Granada, uma localidade que exerce um grande carisma sobre os orientais. Finalmente, foi a Barcelona ver a famosa Catedral e, a Madrid, ver os Mirós e Picassos. E nós temos a maior ALGARVE INFORMATIVO #9

coleção privada de Mirós e o Governo não percebe o que podemos fazer com ela, preferem construir estádios de futebol, pontes e barragens. Desde que os fundos comunitários começaram a entrar neste país, as prioridades mudaram completamente, e não para melhor”, prossegue Paulo Duarte Filipe. Quando as queixas e as críticas ao regime sobem de tom, há a tentação de fazer comparações com outros tempos, nomeadamente antes do 25 de abril, um período do qual Paulo Duarte Filipe não tem recordações por ser ainda muito pequena na altura. Isso não o impede, todavia, de questionar que liberdade é que se conquistou com a implantação da democracia em Portugal. “Temos a maior taxa de desemprego desde o 25 de abril, 10

pessoas a passar fome, velhos a morrer nos corredores dos hospitais, ou que passam o dia inteiro à janela sem nada para fazer. Cada vez há mais lojas e restaurantes a fornecer comida e bens essenciais aos mais carenciados. Que país é este? Alguma coisa se perdeu neste caminho”, observa, assegurando que os artistas sempre tiveram uma forte consciência social. “Em qualquer evento de arte que organizamos abordamos problemas sociais bem específicos, não teorizamos apenas. A arte devolve a sensibilidade às pessoas, a noção do que é belo, a esperança, a mobilização. Mas, quando não existe um Ministério da Cultura, está tudo dito. Aliás, nem sei quem é o secretário de Estado da Cultura, nem eu, nem 99 por cento dos portugueses”, dispara.


mês e meio, dois meses. Vou dar agora início a uma longametragem, um «road movie» a partir da Bélgica numa caravana, com um cantor e pintor que vive em Penacova, mas vamos também passar pelo Algarve”, revela o entrevistado, acrescentando que um produtor inglês já manifestou vontade em promover o filme. No campo da pintura, Paulo Duarte Filipe está a concluir a coleção que vai levar à Coreia do Sul, vai também à Finlândia apresentar dois filmes e esteve no Brasil, em 2013, a divulgar o seu livro e outros filmes. “Para mim, a arte é um estado de alma, daí a minha capacidade em criar em diferentes disciplinas. Se estou num fase introspetiva, escrevo. Se estou numa fase mais livre, pinto. Se estou num momento completamente irreverente, parto para as instalações. Se busco o equilíbrio interno, a cerâmica é mais adequada. Se preciso concentrar-me mais para coordenar os pensamentos soltos que tenho, vou para a madeira, porque sei que, se me engano num corte, não posso O artista dá lugar voltar atrás”. ao filósofo Os filmes são a sua faceta mais recente e, por isso mesmo, Paulo Face a este papel bastante Duarte Filipe não se considera ativo enquanto dirigente um realizador, apesar de ter tido associativo, perguntámos a Paulo bastante formação com Duarte Filipe como é que arranja profissionais conceituados de tempo para as suas próprias topo mundial, tais como Matt criações artísticas. “A receita é Cimber, mentor de Quentin dormir o mínimo de horas Tarantino, e Jan Harlan, que foi possível, mas há projetos que produtor executivo de Steven são mais fáceis de fazer do que Spielberg e Stanley Kubrick. outros. Uma curta-metragem “Nunca soube mexer em pode ser feita numa manhã, máquinas e estar em frente a como aconteceu no filme que um computador a fazer edição foi selecionado para o Festival não é comigo, mas o que de Cannes o ano passado, mas interessa num filme é uma boa depois a edição pode levar um ideia e disso não tenho eu falta. Paulo Duarte Filipe confessa, porém, que alguns artistas também têm uma quota-parte de culpa no estado a que chegou o panorama cultural no nosso país. “Quando surge um novo movimento ou um artista mais irreverente que possa ameaçar os poderes instituídos, tentam logo captá-lo para a esfera política, fechá-lo numa galeria ou centro cultural. E o artista, na ilusão da palmadinha nas costas, do ordenado ao fim do mês, de aparecer nas revistas cor-de-rosa, de dar entrevistas num jornal de referência nacional, sem perceber, completamente distraído, deixase corromper pelo sistema”, explica, com tristeza. “Nós, Peace and Art Society, não vamos por esse caminho, andamos pelas ruas, vamos às escolas, vemos a realidade nua e crua. Não nos perdemos nem nos deixamos iludir pelos tapetes vermelhos que nos colocam à frente. Queremos ajudar o país e achamos que a arte é o instrumento indicado para mudar as gerações”.

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Mas tive que aprender a mexer nas máquinas e o meu estilo bebe um pouco do cinema do norte da Europa, mas com uma edição um bocado à americana, rápida e contando apenas aquilo que é necessário. Os portugueses gostam de empastelar, fazem um plano que dá tempo para ir beber um café e voltar, que a história está no mesmo sítio”, critica. Como o tempo não estica e o algarvio tem mesmo que dormir algumas horas, a passagem de testemunho à frente da Peace and Art Society já está a ser preparada, pois também não é apologista dos dirigentes se agarrarem aos cargos, mesmo quando já não os exercem. “A altura para sair está para breve, porque sou filósofo antes de ser artista. Faz-me confusão alguém ir para uma faculdade tirar um curso de belas artes e filosofia e depois intitular-se Artista ou Filósofo, é algo com que se nasce, não se aprende nos bancos das escolas. Eu, aos 11 anos, ganhei um prémio de pintura, aos 18 tinha livros escritos e venci um prémio de poesia. Não posso renegar que sou artista, mas o meu futuro passa por ser um pensador”, revela, de forma algo inesperada. “Estou atento aos sinais que me chegam do meio envolvente e não há coincidências. Existe, sim, uma conjuntura cósmica, quiçá um destino, que por vezes ignoramos. Continuarei sempre a fazer arte, mas noutra perspetiva, longe dos holofotes, como pensador e sempre preocupado com o estado do mundo” .


CRÓNICA

Dino d’ Santiago. Do antigo «Bairro dos Pescadores» em Quarteira para o mundo

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João Espada Professor, Artista Plástico e Presidente da Casa da Cultura de Loulé Joao_espada@hotmail.com

(…) Claudino Pereira transporta a sua forma de estar no seu dia-a-dia para o universo do «Dino d’ Santiago», cantando brilhantemente e de forma humilde e como muita emoção. E quando se vê em desafios conjuntos com outros cantores, expressa a sua arte vocal com cortesia, sem ser evasivo, respeitando o seu colega, dando-lhe o devido espaço numa procura constante da melhor forma de combinar as duas vozes, sem que uma seja prejudicada em detrimento da outra (…) ALGARVE INFORMATIVO #9

eria talvez uns 6/7 anos quando conheci, na escola primária Francisca de Aragão, em Quarteira, o Claudino Pereira, o mais velho de três filhos da Sra. Andresa e do Sr. Jorge Pereira. De origens cabo-verdianas, Dino, como é mais conhecido, vivia com a sua família, no já extinto «Bairro dos Pescadores”. Com o privilégio de ter o mar à porta, foi moldando a sua personalidade, juntamente com os seus irmãos e amigos, naquele espaço carente fisicamente, mas muito rico socialmente. Qualquer simples objeto que nesse bairro existia era o suficiente para construir brincadeiras e sonhos sem fim. Desde muito cedo começou a desenvolver o dote artístico que primeiro o notabilizou, o desenho. Tal como todas as crianças da nossa geração o Dino também explorava o imaginário dos desenhos animados que víamos na TV, mas neste caso de uma forma particular. Como os recursos financeiros não abundavam, viu nos desenhos uma oportunidade de «negócio». Começou a desenhar as personagens dos desenhos animados para os seus amigos a troco de algumas moedas a fim de fazer face às suas necessidades diárias. Com o evoluir dos anos, a pintura passou a ganhar espaço e a sua linguagem visual começou a ser aprimorada. Os simples desenhos de cartoons deram origem a exigentes pinturas em papel e/ou tela e foi mais ou menos nessa altura que surgiu a «música de rua» na vida do Dino, através dos movimentos musicais urbanos o Rap e o hip hop. Não testemunhei muito essa evolução artística, porque aos meus treze anos de idade tive que mudar de cidade. Passei então a viver em Loulé. Essa mudança geográfica foi o suficiente para perder o contacto diário com o Dino e a geração de artistas que estava a crescer em Quarteira. Anos mais tarde, voltei a reencontrá-lo mas virtualmente e na TV, num concurso musical, a «Operação Triunfo». Aquele menino de olhos negros que desenhava brilhantemente estava agora a conquistar o seu lugar como músico no mundo dos grandes, se é que assim posso dizer… À distância de um botão de um comando de 12

TV ou de um click de um rato, comecei então a acompanhar a sua evolução musical até ao álbum EVA. Mas para chegar a este último trabalho o Dino teve que procurar as suas raízes. Com a companhia do seu pai, aprofundou o conhecimento das suas origens, visitando a Ilha de Santiago, em Cabo Verde. Essa viagem foi tão importante e emblemática que teve uma enorme influência naquilo que hoje é como músico. Para trás deixou caminhos musicais diferentes como o hip hop, soul e R&B, agarrando aquela que na minha opinião é a sua mais perfeita linguagem musical, o batuco, o funaná lento, a morna e a coladeira. Determinado o novo rumo, e em jeito de homenagem à sua família, Dino passou então a apresentar o nome artístico de Dino d’Santiago. Anos mais tarde o nosso caminho voltouse a cruzar e desta vez pessoalmente e tudo por culpa de um grande amigo em comum, o Vítor Aleixo. Desde esse encontro até hoje nunca mais perdemos o contacto regular. A amizade reforçou-se e deu lugar à criação artística conjunta. Tive então o privilégio de filmar alguns dos seus mais recentes temas e testemunhar ainda o nascimento de uma música sua, «Santa». Tema que compôs em homenagem à sua avó Santa e que gravamos no Carvoeiro em Lagoa no ano passado. Com ele conheci músicos brilhantes como o Tuniko Goulart («maestro» na composição musical), Mirco Paris (ex. baterista da Cesária Évora) e o Gileno Santana. Porém, o melhor de tudo foi redescobrir a sua voz e sua capacidade de interpretação musical ao vivo. Claudino Pereira transporta a sua forma de estar no seu dia-a-dia para o universo do «Dino d’ Santiago», cantando brilhantemente e de forma humilde e como muita emoção. E quando se vê em desafios conjuntos com outros cantores, expressa a sua arte vocal com cortesia, sem ser evasivo, respeitando o seu colega, dando-lhe o devido espaço numa procura constante da melhor forma de combinar as duas vozes, sem que uma seja prejudicada em detrimento da outra. No fundo, o Dino é em palco aquilo que se pretende que um homem seja em sociedade .


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Privatize-se Portugal! Paulo Cunha

(…) Recuso-me a acreditar que os mesmos gestores que operam milagres no setor privado não tenham capacidade de o fazer no setor público. Muito menos que o motivo seja unicamente a diferença no salário que auferem. Parece que, à medida que o tempo passa, tudo o que é «nosso» está inevitavelmente condenado a ser um fracasso, a dar prejuízo, a ser um «peso morto» e uma fonte de problemas (…) ALGARVE INFORMATIVO #9

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troika assim o exigiu e só nos resta cumprir!”, “Estava no programa eleitoral!”, “Se não o fizermos, teremos que restruturar as empresas e provavelmente seremos obrigados a proceder a «cortes» e despedimentos!”, são as frases feitas de gente que, com frases feitas, convenceu uns quantos, suficientes, que deram a maioria a um governo que - legitimamente - pode fazer o que quiser… à custa de quem não votou, e assim legitimou uma confortável aliança maioritária na Assembleia da Republica. Sou daqueles que não aliena o que é seu apenas por «dá cá aquela palha» ou por um caso de necessidade, mas resolúvel, pois sabe que no futuro poderá ser uma mais-valia. Primeiro tento esgotar todas as possibilidades, hipóteses e soluções possíveis. Sendo um «muito pequenino» administrador, sei que, quando o comando é débil e impreparado, mudando-o, os comandados, naturalmente, trabalharão bem melhor. Sei que a «Máquina do Estado» é atreita a vícios e manhas, mas também sei que tudo tem solução quando quem tutela os vários tentáculos estatais assim o quer (e sabe). Sei que há sempre solução quando a inevitabilidade não é a morte, mas o que atualmente registo é a morte declarada de símbolos e fontes de receita para o erário público português. Portugal não é apenas território, Portugal é essencialmente quem nele vive e o faz viver. Não se pode ver o 14

património público português como um fardo ou um empecilho, mas sim como uma fonte de receita através dos portugueses que dele tratam, cuidam, protegem, garantem, trabalham e financiam. Coloquem nas administrações das empresas públicas pessoas meritocraticamente preparadas e ideologicamente isentas e verão se será necessário, mais uma vez, vender a retalho parte das verdadeiras fontes geradoras de riqueza do país. Com tantas reservas em ouro, ninguém nelas ousa tocar ou falar, mas poucos questionam a venda ao desbarato das «galinhas dos ovos de ouro» que alguns se preparam para, muito brevemente, alimentar no seu «quintal». Recuso-me a acreditar que os mesmos gestores que operam milagres no setor privado não tenham capacidade de o fazer no setor público. Muito menos que o motivo seja unicamente a diferença no salário que auferem. Parece que, à medida que o tempo passa, tudo o que é «nosso» está inevitavelmente condenado a ser um fracasso, a dar prejuízo, a ser um «peso morto» e uma fonte de problemas. Começo a estar farto das inevitabilidades com que certos iluminados que usam os partidos políticos para se «orientarem» me tentam impingir para justificar o que para mim é injustificável. Sei que alguns pensam como eu e isso acalenta-me a esperança de continuar a viver em solo português (em Portugal). Vamos ver até quando?… .


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ATUALIDADE

Abriu época balnear em Albufeira

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Praia dos Pescadores, em Albufeira, foi palco, no dia 15 de maio, da Cerimónia de Abertura da Época Balnear, que decorreu com a presença de responsáveis da Autarquia, Assembleia Municipal, Autoridade Marítima, Polícia Marítima, Associação de Nadadores Salvadores de Albufeira (ANSA) e Proteção Civil Municipal. O evento serviu para efetuar a demonstração dos meios de salvamento e socorro, apresentar os equipamentos de limpeza das praias e realizar a entrega de duas cadeiras anfíbias, destinadas às praias Manuel Lourenço e Oura. A equipa de limpeza das praias, constituída por 15 funcionários, seis máquinas de limpeza com trator acoplado e duas viaturas de recolha, estava devidamente representada num momento de grande simbolismo para o Município. Feita a explicação técnica sobre o funcionamento dos serviços, que começam a laborar a partir das quatro horas para que tudo fique em perfeitas condições para receber os banhistas, seguiu-se uma demonstração de limpeza mecânica do areal. Refira-se que a equipa de limpeza das praias realiza uma média anual de três mil horas de trabalho e que só durante o mês de agosto (o mais concorrido do ano) são recolhidas cerca de cinco toneladas diárias de resíduos através do processo de recolha mecânica e manual. No Posto de Praia, os nadadores salvadores da ANSA e uma viatura todoo-terreno da Polícia Marítima com ALGARVE INFORMATIVO #9

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capacidade de evacuação do areal estavam em estado de prontidão para colaborar na simulação de afogamento com demostrações de salvamento. Uma lancha de alta velocidade da Polícia Marítima, uma embarcação salva-vidas e uma mota de salvamento do Instituto de Socorros a Náufragos completavam os meios à disposição no cenário de operações. Concluídos os salvamentos com boia torpedo, prancha e mota de água, realizados com a colaboração da ANSA, o evento terminou com uma demonstração da capacidade dos meios da Estação SalvaVidas de Ferragudo, com evacuação de náufrago por um veículo da capitania de porto. José Carlos Rolo, vice-presidente da Câmara Municipal de Albufeira, referiu que o prolongamento da época balnear já é uma tradição em Albufeira. “Somos o município com a maior época balnear a nível do Algarve, quase cinco meses, até 18 de outubro, o que é possível graças às condições climatéricas únicas que aqui se verificam e às excelentes infraestruturas de que dispomos”, frisa, lembrando que Albufeira tem uma costa com cerca de 30 quilómetros, 25 praias classificadas para a prática balnear, das quais 24 com bandeira azul, sendo há muitos anos líder nacional deste galardão de qualidade ambiental. O autarca fez ainda questão de salientar que Albufeira é um destino turístico inclusivo, com condições para que todos possam usufruir das suas belezas naturais .


Música, astronomia e desenho animaram Albufeira Já no domingo, o Museu acolheu o «Urban Sketchers Algarve I Encontro Regional de Albufeira», que reuniu jovens de todo o Algarve unidos pela paixão pelo desenho de espaços históricos e monumentos. Desta vez, o desafio lançado foi de retratarem a cidade de Albufeira. O programa terminou na passada segunda-feira, com visitas gratuitas ao museu, uma segunda sessão da iniciativa Urban Sketchers Algarve e um concerto de música islâmica a cargo de Eduardo Ramos, que interpretou cantigas árabes e luso-árabes com poemas de Al-Mutamid, Ibn Ammar e outros poetas do Al-Andaluz .

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e 16 a 18 de maio, o Museu Municipal de Arqueologia de Albufeira alargou o seu horário de funcionamento e acolheu um conjunto de atividades direcionadas a todas as faixas etárias. No sábado à noite, duas dezenas de crianças fizeram uma visita guiada ao Museu, ouviram a história do Pinguim Sebastião e construíram o seu próprio personagem com cartolina, recortes e colagens. Depois subiram até ao terraço, onde observaram as estrelas através de dois telescópios, que permitiram avistar os planetas Júpiter e Vénus. No final da noite, os mais pequenos confessaram ter sido uma experiência fantástica e muito divertida.

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ATUALIDADE

Terra de Maio conquistou Eurocidade do Guadiana cruzamento posterior com a cabra alpina espanhola (no início do séc. XX). O número de efetivos da cabra de raça algarvia está em crescimento no concelho de Castro Marim e, além de ser rentável em termos de produção de carne, tem um excelente potencial leiteiro. O queijo desta cabra é um produto muito procurado e reconhecido pela elevada qualidade e características organoléticas singulares. Nesta edição da Terra de Maio, destaque também para a inauguração da exposição «Passeio Fotográfico pela Nossa Serra», do Centro de Cultura e Desporto do Pessoal da Câmara e 15 a 17 de maio, o Azinhal recebeu Municipal de Castro Marim, para a apresentação milhares de visitantes à procura dos do Guia de Vinhos do Algarve e, no âmbito da saberes e sabores mais genuínos da serra gastronomia, para os «Laboratórios de Gostos», algarvia na 8ª edição da Feira Terra de Maio. A com conceituados chefs de cozinha e pratos afluência de espanhóis demonstrou os bons inspirados em produtos da serra algarvia. A resultados da cooperação entre os três municípios gastronomia local também se fez representar nas (Ayamonte, Vila Real de St. António e Castro tasquinhas, com deliciosas tapas e pratos típicos da Marim) da Eurocidade do Guadiana. região Baixo Guadiana. Promover a Cabra de Raça Algarvia é o mote Artesanato, folclore e música popular e deste evento, que tem vindo a crescer e a tradicional, workshops, exposições de animais, conquistar espaço no calendário de programação exposição de cabras anãs, entre muitas outras cultural do Algarve e agora também na andaluza. O atividades, fizeram mais uma edição da Terra de objetivo do certame é divulgar produtos locais e Maio, que, de ano para ano, aumenta o número de regionais resultantes das atividades ligadas à visitantes e colaboradores. Nesta edição foram agricultura e à criação de gado, bem como as ainda convidados DJ’s para encerrar as noites de próprias atividades em si, e aumentar o volume de sexta e sábado, inovação que aproximou mais vendas através da comercialização direta. jovens do certame . O Concurso da Cabra de Raça Algarvia animou mais uma vez o certame da Terra de Maio. A competição, que escolhe os melhores exemplares da Cabra de Raça Algarvia, contou com a participação de 11 produtores do território do Baixo Guadiana, num total de 55 animais. A Cabra de Raça Algarvia é um animal corpulento, que atinge cerca de 50kg em adulto. Com pelo curto, branco e com malhas castanhas de várias tonalidades, a cabra algarvia resulta de um cruzamento entre a cabra charnequeira do Algarve com a cabra marroquina (no séc. XIX) e do

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CRÓNICA

Vamos vender a TAP, já!

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Paulo Bernardo Empresário pb700123@gmail.com

(…) Obrigado aos nossos antepassados que não escutaram o velho do restelo e saíram pelo mundo procurando novos mundos. Quero agradecer a todos os que tiveram essa coragem, pois eu hoje usufruo de todo o trabalho desses globalizadores da primeira fase, usufruo do respeito de ser conhecido como português, pessoas honestas trabalhadores e com grande capacidade de integração no país onde se encontram (…) ALGARVE INFORMATIVO #9

oo de regresso para a pátria lusa depois de duas semanas de trabalho em São Paulo, sigo num voo da TAP em pleno processo de privatização. Apesar de ter um espírito bastante patriótico, julgo que faz muito mais sentido a TAP vir a ser detida por Brasileiros do que por Portugueses. Só eles hoje tem uma verdadeira logica lusófona, acima de tudo pela sua dimensão. Por motivos de movimentação interna viajei na companhia de um dos concorrentes, a AZUL, que tem um ótimo serviço e uma estrutura bem implementada na América Latina. Assim entendi que qualquer movimento que exista para que a TAP se mantenha sobre o domínio Português não passa de mais uma guerra política de algo que hoje todos somos acionistas. Por isso, que se privatize e rápido para que possamos ter um serviço a sério que possa unir os povos com uma cultura e língua comuns. Já devíamos ter entendido há muito tempo que os nossos fracos governantes não têm qualquer capacidade de dirigir uma política de lusofonia. Já não existe resposta possível para este fracasso, apenas o Brasil tem capacidade de ser o verdadeiro catalisador da lusofonia. Assim, que venha a privatização da TAP. Por estar a dirigir o processo de internacionalização da minha empresa, tenho estado em vários países de língua e cultura diferentes, contudo, o ser português é uma vantagem. Até nos mais pequenos países existe uma comunidade que me acolhe e ajuda a conhecer melhor a realidade. Muitas vezes os consulados fazem um trabalho Hercúleo dentro dos recursos que tem. Assim, conheço bem a vantagem da lusofonia, mas a falta de capacidade política para Portugal assumir essa missão. 20

Solução, assumir cada um a sua lusofonia sem preconceitos entre nações, pois é a nossa língua e cultura que nos une, seja em Boston, Paris, Luanda ou Porto Alegre. Obrigado aos nossos antepassados que não escutaram o velho do restelo e saíram pelo mundo procurando novos mundos. Quero agradecer a todos os que tiveram essa coragem, pois eu hoje usufruo de todo o trabalho desses globalizadores da primeira fase, usufruo do respeito de ser conhecido como português, pessoas honestas trabalhadores e com grande capacidade de integração no país onde se encontram. Facto da Semana: A vitória do Benfica no campeonato, conseguindo aquilo que já muitos não se lembravam, um bicampeonato. O resto são confusões que advém de uma sociedade farta de tudo e de todos, sem motivos para sentir qualquer esperança no folclore das próximas eleições. Por isso, os casos que surgiram foram bastantes negativos mas, para quem tinha dúvidas, são apenas o acumular de frustrações, podendo em breve serem mais graves se não se der alguma atenção aos problemas sociais. Pessoa da Semana: Desta vez quero dar um grande abraço ao homem que não sei o nome por ter estado um pouco longe de tudo, mas quero destacar o polícia que abraçou o pequeno benfiquista e o protegeu de ver os atos tristes e pouco profissionais que aconteceram. E faço na sua pessoa também uma homenagem a todas as forças de segurança que, com o seu profissionalismo e boa vontade, nos protegem e tornam o nosso país melhor .


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CRÓNICA

Sogras e noras

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Hélder Rodrigues Lopes

(…) As relações sociais e mais particularmente as relações familiares são constructos complexos e de forte dinâmica emocional. A capacidade que cada um deve desenvolver para aceitar o próximo por aquilo que ele é e não por aqui que se deseja que seja, é um exercício necessário mas não muito comum, particularmente nas relações familiares e mais especificamente entre Mães (…)

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s últimos temas com que me cheguei até vós foram a Escola e pelas piores razões e o Exercício da Política, os seus agentes e a relação com a Sociedade Civil. Para esta semana escolhi um tema relacional complexo, promotor de piadas, livros com temas muito sugestivos e até canções por todo o Mundo. Tema que desperta amor, carinho e dedicação saudável mas, na maioria, é rico em raiva nos dois sentidos. Poderia escrever sobre a relação entre a sogra e o genro mas talvez não tenha tanto interesse. Esta relação na maior parte dos exemplos é de sentido inverso e eu particularmente sou um privilegiado. A Sogra é, efetivamente, a mãe do filho que 1) a mulher escolheu ou 2) aceitou ser escolhida por este último, ou ainda, 3) aceitou ser escolhida pela mãe do filho para formar família. Existem múltiplas derivações relacionais entre as sogras e as noras na sua maioria muito complexas. Se 1) a mulher escolher o filho para formar família, quando este apresentar a futura à família, o momento decisivo é no tradicional jantar onde a menina é avaliada até ao mais ínfimo pormenor. Se a mãe não tiver já pré escolhido alguém para o seu filho, a probabilidade de aceitar a rapariga é considerável. Se houver sucesso para a maioria das questões formuladas de forma discreta ou direta, e se a rapariga tomar várias iniciativas, particularmente na colaboração na cozinha, então a probabilidade de aceitação é mais elevada e a relação terá condições para avançar até à preparação do casamento, que é outro momento decisivo para a relação entre sogra e nora, dependendo sempre da intensidade de participação da sogra na organização do evento e na elaboração da lista de convidados. O Terceiro momento determinante é o nascimento do primeiro filho, como se realiza as visitas à avó paterna e como a avó paterna vai participar na educação do neto. Se 2) a mulher aceitou ser escolhida pelo filho, então aqui tudo se agrava porque a mãe, digo, a sogra, irá supor 22

que a escolhida é tão impreparada quanto o filho, mesmo que esta já trabalhe e seja independente, o que faz aumentar a dúvida. Contudo, se o filho escolher alguém com o perfil mais ou menos próximo do indicado pela mãe e passado insistentemente durante várias vezes, então existe uma probabilidade de aceitação, embora com reservas, sempre com reservas. Também neste contexto a convivência entre sogra e nora tem três momentos decisivos, as visitas à casa da sogra, a participação maior da sogra em detrimento da mãe da mulher nos preparativos para o casamento, no nascimento do neto, e a participação ou não na educação do neto em comparação com a avó materna são determinantes para uma aceitável relação. Se 3) a mulher aceitou ser escolhida pela mãe do filho, então será sempre um colapso pois por aqui nunca terá liberdade para escolher o lar, nem na organização deste, nem organizar a vida com o marido à sua maneira, não tem escolha no modelo da educação dos filhos. A sogra irá sempre impor-se. O que torna tudo um desgaste, particularmente para a mulher, que está na maior parte das vezes em plano abaixo da sogra. O que até parecia «mel» na realidade é «fel». As relações sociais e mais particularmente as relações familiares são constructos complexos e de forte dinâmica emocional. A capacidade que cada um deve desenvolver para aceitar o próximo por aquilo que ele é e não por aqui que se deseja que seja, é um exercício necessário mas não muito comum, particularmente nas relações familiares e mais especificamente entre Mães. A boa ou má relação entre Sogra e Nora não é mais do que uma disputa entre Mães. A Mãe primeira tem dificuldade em aceitar que a Mãe chegada saiba tanto sobre o cuidar quanto ela. Esta não-aceitação, ou melhor, esta dificuldade de aceitação da Mãe primeira é necessária e fulcral para a manutenção e sobrevivência da Mãe primeira na hierarquia familiar .


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ATUALIDADE

Aeródromo Municipal de Lagos completou 50 anos atenção da autarquia, quer através dos protocolos celebrados com o Aero Clube de Lagos, quer pela colaboração permanente que a Câmara Municipal mantém com esta associação cujo trabalho desenvolvido ao longo dos últimos 30 anos tem valorizado o funcionamento e as infraestruturas que aqui foram construídas”. Depois das alocuções foi descerrada a Placa Comemorativa dos 50 Anos do Aeródromo Municipal Brigadeiro Costa Franco, pelo Vice Presidente da Câmara Municipal de Lagos, o Presidente do Aeródromo Municipal Brigadeiro Costa Aeroclube de Lagos, o Presidente da Assembleia Franco comemorou 50 anos, no dia 16 Municipal de Lagos, Paulo Morgado, os filhos do de maio, ocasião que mereceu o Brigadeiro Costa Franco, Ana Luísa Costa Franco e descerramento de uma Placa Comemorativa e uma Pedro Costa Franco e igualmente Maria João Homenagem ao Brigadeiro Costa Franco, ilustre Veloso (que em 1965 já havia descerrado a placa de lacobrigense que teve um papel preponderante na inauguração do Aeródromo). O programa das concretização deste projeto. Na cerimónia comemorações integrou várias atividades que estiveram presentes familiares e amigos do decorreram nas instalações do aeródromo durante homenageado, autarcas e demais entidades locais os dias 15 e 16 de maio, das quais se destacaram que aceitaram o convite para participar neste uma Exposição Fotográfica e Documental, uma momento. Feira Aeronáutica, bem como um desfile de aeronaves de vários tipos, uma exibição acrobática Para o Presidente do Aeroclube de Lagos, Luís Duarte, a importância da comemoração destes 50 do biplano Pitts do comandante Luís Garção, e a anos de existência do aeródromo “é confirmada no visita de dois antigos aviões militares de instrução protagonismo desta terra, embora modesto, na DHC «Chipmunk» . história geral da aeronáutica portuguesa e em particular da região algarvia”. O dirigente aproveitou a oportunidade para agradecer a todos os que estiveram e estão ligados à existência e evolução deste aeródromo e à atividade do Aero Clube de Lagos. O Vice-Presidente da Câmara Municipal de Lagos, Hugo Pereira, lembrou que aquele aeródromo foi pensado, na sua génese, como uma infraestrutura ao serviço do Turismo, numa cidade que assumia a sua vocação para esta importante atividade económica. “Foi um projeto abraçado desde o primeiro momento pelo município e continua a merecer a

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ATUALIDADE

Quarteira festejou mais um aniversário

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o longo de cinco dias, Quarteira recebeu um programa de atividades que tiveram em vista assinalar o 16.º aniversário desta Cidade. No dia 13 de maio, data em que se celebrou mais um aniversário de elevação a cidade, o executivo municipal e o executivo da Junta visitaram algumas das obras em curso nesta freguesia, com destaque para o Passeio das Dunas. Esta obra irá requalificar a zona costeira entre Quarteira e Vilamoura, através da criação de um passeio marginal, com espaços verdes e de lazer, privilegiando a circulação pedonal e de ciclistas, valorizando e reabilitando o contacto com o mar e funcionando como um novo ponto de atração. Seguiu-se ainda uma visita a outra obra estruturante para a circulação em Quarteira – a Via Distribuidora Norte de Quarteira - nova avenida com cerca de 1022 metros que compreenderá três rotundas: uma na interseção com a Avenida de Ceuta, outra intermédia, sensivelmente a meio do troço, que fará a ligação com a

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Rua da Pernada, e outra na interseção com a EM527, entre o Parque de Campismo e a Fonte Santa. Foi aliás na Fonte Santa que a Autarquia inaugurou simbolicamente a obra de prolongamento da Avenida Sá Carneiro à Fonte Santa, uma via com características urbanas que vem melhorar substancialmente a segurança rodoviária no local. Como tem sido tradição no Dia da Cidade de Quarteira, decorreu durante a manhã, no Centro Autárquico a entrega dos Prémios de Reconhecimento do Mérito Escolar e Cidadão de Mérito da

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Freguesia de Quarteira. Este ano foram distinguidos os alunos Rita Leonardo, Pedro e Cristina Pedrosa, bem como o cidadão Cândido Rocha Correia, um quarteirense que se destacou na atividade da pesca, bem como nas funções no CDR Quarteirense. No dia 14, quinta-feira, teve lugar a cerimónia de cedência de uma viatura por parte da Junta de Freguesia de Quarteira à ARS, que servirá de apoio à prestação de cuidados domiciliários à população desta freguesia. As comemorações do Dia de Quarteira encerraram no domingo, dia 17, com muito atletismo, naquele que foi o 1.º Grande Prémio Cidade de Quarteira, apadrinhado por Carlos Lopes, mas também com a presença da Ministra da Administração Interna que esteve em Quarteira para homologar o protocolo para a construção de duas infraestruturas muito importantes para a freguesia, para o Concelho e para o Algarve: a nova sede do CDOS Faro e a Base de Apoio Logístico .


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ENTREVISTA

Manuel Neto dos Santos: Um defensor eterno da língua mãe

Com 16 livros editados e mais um caminho, Manuel Neto dos Santos é uma das principais referências da poesia algarvia e, como forma de reconhecimento, vai ter um prémio de poesia com o seu nome. O gesto da Arandis Editora não vem modificar, porém, a sua forma humilde de estar na vida, longe dos holofotes, caminhando com passos seguros e sem a pressão de escrever para vender e tirar daí o seu sustento. O ALGARVE INFORMATIVO foi até Messines conversar com Manuel Neto dos Santos e dá-o a conhecer um pouco melhor aos seus leitores. Texto e Fotografia: Daniel Pina

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ascido em Alcantarilha há 56 anos, Manuel Neto dos Santos cedo evidenciou uma aptidão natural para a poesia e já decorreu mais de um quarto de século desde a publicação do seu primeiro livro, «Fogo, Luz e Voz», a que se seguiram mais 15 obras e uma outra deve ser lançada ainda no decorrer de 2015. Ninguém contesta, por isso, a justiça da criação de um prémio de poesia com o seu nome, pela Arandis Editora, que será oficialmente apresentado no dia 30 de maio. “Tem sido uma vida entregue à escrita, ao teatro, à música, ao associativismo. Fui presidente da direção da Sociedade de Instrução e Recreio Messinense durante dois anos e integrei o Grupo de Teatro Penedo Grande ao longo de duas décadas”, conta o algarvio, cujos primeiros poemas datam dos seus 14 anos. “Eu guardo tudo, poemas, rascunhos e projetos, e tenho caixas de inéditos que remontam à minha adolescência. É verdade que os poemas que fiz dos 14 aos 20 anos não estão presentes em nenhuma das minhas obras por serem embrionários. Quando os leio, vejo que há ali um potencial do sonho de ser poeta, mas faltalhes a técnica, pois ninguém consegue correr antes de gatinhar”. Possuidor de um estilo muito característico que se notou logo nos escritos do puto que queria ser poeta, Manuel Neto dos Santos reconhece que ainda hoje tenta resolver as grandes questões manifestadas na época. Quanto à veia poética, diz prontamente que vem do pai, o Mário da Alzira, que fazia rimas e quadras populares em redor dos ALGARVE INFORMATIVO #9

amigos. Da parte da mãe herdou, entretanto, a musicalidade e o que não falta na sua família são cantores, como são o caso de Ricardo Neto e Sérgio Gonçalves. “A musicalidade da língua, tanto na forma escrita, quanto verbalizada no canto, é algo que vem de família, é genético”, revela, com orgulho. Manuel Neto dos Santos que também ficou conhecido pela divulgação do trabalho de João de Deus, colocando-se na sua pele, falando na primeira pessoa, personificando o célebre poeta lírico e pedagogo natural de São Bartolomeu de Messines e responsável pela Cartilha Maternal. “É a minha forma de homenagear um poeta que admiro, enquanto ator, no palco, e que também tenho feito com Bocage, através do «Desmascarando a anedota». Coloco-me na pele e na alma de Manuel Maria Barbosa do Bocage, um homem com uma existência dramática e trágica, uma faceta que quero transmitir às pessoas”, frisa o entrevistado. Com tantas influências na vida e abundante material genético no corpo e alma, a questão que se colocava aos familiares não era tanto se iria sair dali um artista, mas que tipo de artista e quando é que ele se ganharia asas para voar. E foi pela música que Manuel Neto dos Santos começou. “Aos seis, sete anos, o meu meio natural era o palco. Para mim, ter 100 ou 150 pessoas a aplaudirem-me de pé era um orgulho e fascínio enormes, para além do tradicional nervosismo. Cantava para um salão da Casa do Povo de Alcantarilha completamente a abarrotar e percebi nessa altura que o meu universo era partilhar a minha sensibilidade com os outros”, 29

lembra. Contudo, não estava destinado a tirar um curso superior de línguas, belas artes ou outra área que impulsionasse o seu potencial artístico. “Nunca cheguei a ter formação técnica, foi muito à base da experiência. Por volta dos 16, 17 anos, era conhecido em Silves como o «poeta canta» e, quando os colegas festejavam os aniversários, era convidado para ir de sala em sala cantar umas músicas. Mas tenho sido muito coerente nas opções que fiz na vida e a poesia sempre teve um papel mais preponderante, o canto não é a minha matriz essencial”.

Sempre fiel ao seu Algarve A espinha dorsal de Manuel Neto dos Santos é, então, a poesia, o que implica um trabalho solitário e persistente, nas suas palavras. Persistente porque encara com absoluta seriedade quaisquer versos que escreve, solitário porque não busca a fama, aliás, nunca teve o bichinho de concorrer a prémios literários ou menções honrosas. “O que quero é que os meus livros sejam recordados, que se lembrem de mim como um poeta do Algarve, do Sul, com um estilo muito próprio, uma voz poética bastante clara, que seja rapidamente identificada por quem leia o que escrevo”, esclarece. E, neste contexto, não é daqueles que se lamenta por ter nascido numa época em que os poetas, e os artistas na sua generalidade, tinham a vida bastante mais complicada do que atualmente. “A única coisa que hoje, aos 56 anos, penso é que, se voltasse atrás do tempo, teria


ENTREVISTA

ido para a Escola Superior de Teatro, bem como frequentado aulas de canto. Poeta, ou se nasce ou não com esse talento. No ator ou cantor podem-se refinar técnicas, há muito que se pode aprender”, justifica. Mas como a poesia é quase como um sacerdócio, que exige uma atenção completa, uma entrega permanente às palavras, Manuel Neto dos Santos preferiu ficar por terras algarvias, embora ainda tenha entrado num curso de Filosofia em Lisboa. “Leio e releio tudo o que escrevo, hesito, leio ao contrário para ver se as palavras fazem sentido, se não quebram a melodia, e isso permite-me dizer muito com pouquíssimas palavras. Em duas frases poéticas consigo expressar imensas coisas, porque sou muito humilde e auto-exigente e tenho a capacidade de sair de mim para me olhar de fora como leitor”, ALGARVE INFORMATIVO #9

descreve, não concordando com os poetas que não admitem conselhos, recomendações ou pequenas críticas. “Eu também já fui alertado por pessoas que, de coração e com boa vontade, conhecendo mais do que eu na altura, me davam umas sugestões, que a mensagem não estava clara, era ambígua, que a imagem estava confusa, que o som feria o ouvido. Com o tempo, ganhamos traquejo e domínio linguístico e, às duas por três, toda e qualquer frase é potencialmente um belíssimo início de poema”. Seis meses foi o tempo que Manuel Neto dos Santos aguentou fora do Algarve, quando foi tirar o tal curso de Filosofia, pois depressa constatou que não era um homem de grandes cidades. Uma opção que não foi compreendida e aceite de bom-tom por muitas pessoas, mas a decisão de virar 30

costas à capital, onde estava toda a vida cultural, os grandes escritores e editoras, foi fácil de tomar. “Preferi fazer uma vida de camponês, de jardineiro, era esse o caminho que tinha que trilhar. Ficar era como pegar num rouxinol e enfiá-lo dentro de uma gaiola, onde deixaria de cantar. Hoje, vamos a qualquer lado com facilidade e há um universo vastíssimo de pessoas que me leem, que se identificam com aquilo que escrevo”. Arrependimentos não há, então, de ter regressado ao seu Algarve porque, se assim não tivesse acontecido, hoje não era certamente o poeta que é. “Dizem que sou um poeta do Sul, da luz, do Algarve, que sou um poeta arábico, andaluz, e nunca poderia ter explorado paisagens, cores, odores, ritmos, regionalismos da nossa linguagem se tivesse permanecido em Lisboa.


organicamente. Por norma, escrevo de manhã e tomo notas das ideias que pretendo explorar, com o cuidado de não me repetir em coisas que já escrevi. Se, num dia, crio um poema diferente que não se encaixa naquele projeto de livro, transita para outra obra, porque chego a escrever três em simultâneo”, explica. E escreve de manhã antes de ser influenciado pelas notícias que entram pelas nossas casas adentro através da televisão, imaginamos, ao que responde com um acenar de cabeça e um sorriso de confirmação. “Raramente vejo televisão e estou informado apenas sobre aquilo que quero estar informado. As pessoas vivem diariamente em função dos jornais, dos pasquins de faca e alguidar, e eu recuso-me a ser bombardeado por Não pactuo com acordos esses meios. É uma forma de proteção, não é ortográficos negar a realidade. Deixar-me perturbar pela negativa com essas notícias não é um favor que Com 16 livros publicados, é óbvio que Manuel faço a mim mesmo, porque as pessoas perdem Neto dos Santos desenvolveu um processo criativo imenso tempo a dar opiniões sobre tudo e mais que lhe permite transpor para o papel as palavras alguma coisa e esquecem-se de olhar para elas que viajam soltas na sua mente. No início, todavia, próprias”, sustenta. não havia tanto rigor e andava sempre com uma Ora, como está bem ciente da realidade que o caneta e papel no bolso, preparado para quando a rodeia, sabe bem que os 25 anos de carreira e os inspiração surgisse. “Com o decorrer dos anos e a consciência de alguma responsabilidade de alguém que é um trabalhador e defensor da língua, tive que criar um regime. E não pactuo com o acordo ortográfico, nada, nunca, jamais”, dispara, em defesa da sua língua mãe. “O meu próximo livro, o «Passionário», são 366 poemas de amor de ano bissexto e elaborei logo a estrutura antes de começar a escrevê-lo. Preparo os cadernos poéticos antecipadamente e organiza os grupos de poemas, uns sobre a busca interior pela filosofia, outros sobre a temática da sensibilidade, por exemplo. Em «O corpo como nudez», editado em 2014, quis falar sobre amor com os cinco sentidos e cada um tinha 20 poemas. Comecei pelo tato, o mais importante para mim, até à visão, o menos importante, e construi como se fosse cinco gavetas”, relata, entusiasmado. Sem perder energia poética, Manuel Neto dos Santos imaginava como se ama alguém com o tato, através da pele, o suor, e metia os poemas na gaveta respetiva. O que o fascinava quando via alguém, a visão. Que som é que se pode ouvir do corpo da pessoa que amamos, audição. “Depois, foi só uma questão de ir colocando os poemas no seu devido lugar e o livro foi crescendo

Pareceu um disparate na altura, mas a minha alma disse-me que não podia ficar ali atrofiado, que tinha que voltar às origens, fazer a minha caminhada discretamente, um passo de cada vez e sem grandes máquinas promocionais por detrás. Editora só tive num passado mais recente, com a Arandis a publicar os meus últimos quatro livros”, sublinha, adiantando que não se pode deixar de trabalhar só porque as oportunidades parecem teimar em aparecer. “Eu sempre fui escrevendo de forma natural, não tive pressas, fui desenvolvendo o meu projeto de vida e, mais cedo ou mais tarde, as coisas acontecem”, aconselha.

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ENTREVISTA imensos livros que já publicou não lhe garantem qualquer estabilidade financeira, mas isso não lhe traz grandes amargos de boca. “Mal está o poeta que entra num regime de ser produtor de versos, como se estivesse a fazer garrafas de medronho. Depois, vende logo cinco mil, 25 mil cópias do livro e nunca percebi muito bem quem é que lê todos aqueles livros. Acho que há outros meandros e submundos em torno desses números, porque o autor depois aparece na televisão, e eu não vou nessa ficção. Querer ser um poeta famoso e ninguém perceber o que estou a escrever, não é comigo. As coisas têm que acontecer orgânica e naturalmente”, assegura. A conversa estava bastante agradável mas aproximava-se do final, já que Manuel Neto dos Santos tinha que rumar a Portimão para declamar poesia num evento no Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes. Mais ainda houve tempo para perguntar como estão as suas restantes facetas, a de ator, cantor e dirigente associativo. “Fui presidente aqui da Sociedade por desafio de algumas pessoas, por ter o dom da palavra, por ter uma simpatia natural e não saber estar parado, mas nunca quis misturar os assuntos. O Eduardo Ramos já musicou alguns dos meus poemas, aqueles que têm mais a ver com a minha alma arábica e andaluza, só faltam ser cantados. Escrever para teatro ou para prosa é que não tenho jeito, porque exige construir uma estrutura para as personagens, que não podem ser simples bonecos, e não tenho esses conhecimentos de psicologia humana”, reconhece, ALGARVE INFORMATIVO #9

frisando que a sua zona de conforto é a poesia. A terminar, como está Portugal em termos de público para poesia, questionamos, ao que Manuel Neto dos Santos responde de forma otimista. “Há uma nova geração com um grande interesse pela poesia. Fiz um trabalho de fundo com as escolas de Armação de Pêra e Algoz, com quatro turmas de cada vez, e foi engraçado a quantidade e o tipo de perguntas que os jovens me colocavam. Com a internet podemos ser lidos no mundo 32

inteiro e as pessoas têm algo para dizer e querem expressarse. Aliás, este Prémio de Poesia Manuel Neto dos Santos criado pela Arandis Editora é também uma forma de estimular as pessoas para escrever e mostrar o que fazem. Sei que é uma responsabilidade acrescida haver um prémio com o meu nome, mas é igualmente uma forma de me dar razão quando fiz da poesia o meu projeto de vida. É um «obrigado» por ter sido um teimoso cultural ao Sul, por ter sido um persistente cultural” .


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Ministra da Administração Interna assinou protocolos em Quarteira

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Ministra da Administração Interna esteve em Quarteira, no dia 17 de maio, para homologar dois protocolos que se revestem de especial importância para o Concelho de Loulé e para a região do Algarve: a construção do Comando Distrital de Operações de Socorro de Faro e a construção da Base de Apoio Logístico de Loulé (BAL). O novo edifício da Proteção Civil no distrito, que tem um custo estimado de 1 milhão e 250 mil euros, irá localizar-se junto ao Quartel de Bombeiros de Loulé, beneficiando de uma centralidade com acesso às principais vias de comunicação do Algarve. “A localização do futuro Comando, fora do centro urbano, junto a uma via penetrante no distrito com grande capacidade de escoamento de distribuição de recursos, trará uma eficácia que é ainda exponenciada pela localização junto à Base de Helicópteros de Serviço ALGARVE INFORMATIVO #9

cofinanciamento de ambas as obras, através do Fundo de Coesão no âmbito do domínio «Eixo II – Promover a adaptação às alterações climáticas e a prevenção e gestão de riscos» do Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (PO SEUR). Refira-se que a nova sede do CDOS e a BAL integram-se no dispositivo que a Proteção Civil dispõe e do qual fazem parte os Comandos Distritais de Operações de Socorro, mas Permanente e de um Corpo de também outras instalações como Bombeiros, promovendo a os Quartéis da Força Especial de criação de um polo de proteção Bombeiros, os Centros de Meios e socorro altamente Aéreos, as Bases de Apoio operacional”, referiu o Logístico e as Unidades de presidente da Autoridade Reserva Logística. “A criação Nacional de Proteção Civil, desta nova malha de Comandos Francisco Grave Pereira Distritais conta, em cada distrito, com a parceria de uma Relativamente à BAL de Loulé, uma das cinco previstas em todo Autarquia, procurando a o país, as instalações irão situar- obtenção de sinergias entre instalações de proteção e se em frente ao Cemitério de socorro de diversa natureza”, Quarteira, num edifício que se disse o presidente da Autoridade encontra em escombros. “Foi Nacional possível encontrarmos uma solução para resolver um Também a Ministra Anabela problema que nos Rodrigues enalteceu a parceria envergonhava. A instalação entre o poder local e o governo desta infraestrutura em central no âmbito da Proteção Quarteira será uma mais-valia”, Civil. “Mais do que uma visão salientou o presidente da purista das competências de Autarquia, Vítor Aleixo. Esta cada um, dos níveis de unidade logística dará apoio e administração do Estado, impõesuporte direto ao se uma ação conjunta, de todos, desenvolvimento e sustentação assente em colaboração estreita das operações de proteção e e frutuosa, em benefício do país socorro, servindo toda a região. A e dos cidadãos. Esta colaboração Autoridade Nacional de Proteção entre a Autoridade Nacional de Civil irá apresentar uma Proteção Civil e a Câmara candidatura para Municipal de Loulé reflete uma 34


visão integrada do país e do Estado, onde a otimização de recursos e a parceria entre entidades culmina num melhor serviço público. É um bom exemplo desta cooperação entre o poder central e o poder local e que está a dar uns bons frutos por todo o país”, considerou a responsável governamental. Recorde-se que, ainda em 2014, na altura em que Miguel Macedo era responsável pela pasta da Administração Interna, a Autarquia celebrou um protocolo homologado por Miguel Macedo, na altura o Ministro responsável pela pasta da Administração Interna, através do qual serão investidos pelo Município cerca de 1 milhão e 200 mil euros na adaptação e recuperação das instalações para os militares da GNR em todo o Concelho. Entretanto, sendo os incêndios florestais e o risco da atividade sísmica as principais vulnerabilidades do Concelho de Loulé, num extenso território, a Autarquia tem levado a cabo um “exigente e responsável trabalho” na área da Proteção

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Civil, assente em três eixos, de acordo com o presidente da Câmara Municipal. Em primeiro lugar, através de uma via formal ou legal, com a aprovação do Plano de Emergência Municipal, como resultado do trabalho realizado pelo Serviço Municipal de Proteção Civil. Outro dos eixos diz respeito à via formativa e pretende promover e desenvolver uma cultura de segurança. A realização anual de um Seminário sobre Proteção Civil que tem reunido ao longo das

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edições especialistas, num fórum de partilha de experiências e conhecimentos, as ações de sensibilização junto da comunidade escolar, o projeto de auto proteção em condomínio habitacional, as ações de divulgação de medidas de autoproteção e dos procedimentos a tomar em caso de incêndios florestais junto dos aglomerados populacionais rurais do interior e ainda a adesão ao Projeto ClimAdaPT.Local são algumas das áreas de intervenção do Município tendo em vista o envolvimento da comunidade nesta matéria. “Queremos informar os munícipes acerca dos riscos a que estão sujeitos no local onde vivem e explicarlhes como devem reagir a esses mesmos riscos é indispensável quando se quer melhorar a eficácia dos sistemas de prevenção com vista a atenuar as consequências sempre que ocorrem eventos de extrema gravidade”, explicou Vítor Aleixo .


ATUALIDADE

Receitas do Carnaval foram entregues a IPSS e Coletividades de Loulé

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Autarquia de Loulé entregou as receitas da edição deste ano do Carnaval de Loulé a instituições de solidariedade social do Concelho e às coletividades que participaram no corso. O critério de atribuição das receitas que rondaram os 50 mil euros foi definido no sentido de disponibilizar 50 por cento do valor total a quatro IPSS do Concelho, pela relevância do trabalho que têm desenvolvido nas comunidades onde estão inseridas. Beneficiaram deste apoio a Instituição de Solidariedade Social da Serra do Caldeirão, EXISTIR – Associação para a Integração, Reabilitação da População Deficiente e Desfavorecida, UNIR – Associação de Doentes Mentais, Famílias e Amigos do Algarve e NT Social – Cooperativa de Solidariedade de Loulé. Cada instituição recebeu um montante de 6.232,00. Os restantes 50 por cento foram atribuídos às coletividades participantes na animação do Carnaval, tendo em consideração ALGARVE INFORMATIVO #9

(2.567,11€), Ginástica Clube de Loulé (2.567,11€), Clube de Ténis de Loulé (1.959,11€), TUALLE – Tuna Universitária Afonsina de Loulé (1.351,11€) e Associação Artística Satori (2.567,11€). Recorde-se que, na sua origem, o Carnaval de Loulé tinha uma importante componente de solidariedade, desde a sua primeira edição, em 1906, enquanto «Carnaval Civilizado», onde começou por atribuir 200 «esmolas» a pessoas carenciadas do Concelho. Nos anos 20, a sua o número de tripulantes de cada organização começou a ser da carro alegórico, bem como os responsabilidade da Santa Casa respetivos grupos de animação da Misericórdia de Loulé, tendo organizados: Grupo Desportivo como objetivo a atribuição de das Barreiras Brancas toda a receita do Carnaval para o (2.567,11€), Associação António funcionamento do Hospital de Aleixo (2.567,11€), APAGL – Loulé, que durante muitos anos Associação de Pais e Amigos da foi considerado como referência Ginástica de Loulé (2.567,11€), no Algarve. Mais recentemente, a Rugby Clube de Loulé Câmara Municipal retomou esta (2.161,78€), DOINA – Associação iniciativa ao atribuir as receitas de Emigrantes Romenos e arrecadadas no corso Moldavos do Algarve (2.567,11€), carnavalesco a instituições ou Moto Clube de Loulé (1.486,22€), causas sociais . Grupo dos Amigos de Loulé

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ATUALIDADE

Férias Desportivas de Portimão comemoram 25 anos de existência

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projeto Férias Desportivas, iniciativa da Câmara Municipal de Portimão a decorrer de 15 de junho a 31 de julho, comemora os seus 25 anos de existência com um amplo programa de atividades direcionado a crianças e jovens dos 6 aos 16 anos. O projeto realiza-se em três turnos (o primeiro de 15 de junho a 3 de julho, o segundo entre 6 e 17 de julho e o terceiro de 20 a 31 de julho), conta com a participação de 50 monitores entre os 17 e 25 anos, cuja responsabilidade será apoiar as crianças em todas as atividades previstas no programa e que terão lugar nas Escolas EB 2,3 D. Martinho Castelo Branco e Prof. José Buísel, nos Complexos Desportivos de Alvor e da Mexilhoeira Grande e na Área Desportiva da Praia da Rocha. Quem quiser frequentar o 1.º turno pode inscrever-se a partir de 8 de junho, no 2.º turno a partir 29 de julho e os interessados em participar no 3.º turno poder-se-ão inscrever a partir do dia 13 de julho. Os valores de inscrição variam em função dos respetivos escalões sociais, pelo que os interessados deverão contactar a organização para informações complementares, estando incluído em ALGARVE INFORMATIVO #9

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todos os casos o seguro de acidentes pessoais, o almoço e a oferta de uma t-shirt e um boné. Nos núcleos da Escola D. Martinho Castelo Branco e Professor José Buísel, as atividades destinam-se a crianças dos 6 aos 12 anos e na Área Desportiva da Praia da Rocha a jovens dos 13 aos 16 anos, estas inscrições devem ser feitas das 9h às 13h e das 14h às 17h, na Divisão de Desporto da Câmara Municipal de Portimão – Av. Miguel Bombarda, n. 3. Em Alvor e na Mexilhoeira Grande, as inscrições dirigem-se a crianças dos 6 aos 15 anos e devem ser feitas nas secretarias dos respetivos Complexos Desportivos, entre as 9h e as 12h30, ou das 14h às 17h30. São diversas as práticas desportivas que irão ocupar os participantes, para além do basquetebol, futebol de 7, passando pelo voleibol, andebol, ténis, surf, canoagem, Windsurf, bodyboard, natação, ginástica, dança e canoagem, este ano os jovens também terão a oportunidade de experimentar a praticar golfe e participar em atividades como passeios de barco, idas ao slide & splash e cinema, entre outras. O final do projeto culmina com a tradicional festa de encerramento .


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ENTREVISTA

A garra do campeão Não é futebolista de elite. Não defende as cores do Benfica, Porto ou Sporting. Talvez por isso seja um desconhecido para a maioria dos portugueses. Mas foi Campeão da Europa de K1. E também foi Campeão do Mundo de K1. E até ganhou uma medalha de ouro no Europeu de 2013 da International Federation of Muaythai Amateur, um género de Jogos Olímpicos do MuayThai. Apesar disso, continua a trabalhar todos os dias no negócio da família e, quando a oportunidade se proporciona, defende com unhas e dentes as cores da bandeira nacional e traz mais uns títulos para Portugal. Mas, como não é craque da bola, a maioria dos portugueses não sabe quem é Rui Briceno. Texto e Fotografia: Daniel Pina ALGARVE INFORMATIVO #9

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ábado, 16 de maio. Final de tarde, início de noite na vizinha Espanha, em San Pedro de Alcantara, Marbella. Palácio de Deportes a abarrotar de apaixonados de desportos de combate, um cartaz repleto de combates aliciantes e, a cereja no topo do bolo, a disputa do cinturão de Campeão do Mundo de K1 da WKU – World Kickboxing and Karate Union, na categoria de 60Kgs. De um lado o atleta da casa, Salvador Guerrero. Do outro, diretamente de São Bartolomeu de Messines, Rui «Pitbull» Briceno, Campeão da Europa da WKS, Campeão do Mundo da WKA e medalha de ouro na IFMA no Europeu de 2013. A confiança era muito no canto do algarvio que defende as cores da TOP TEAM de Florin Vintila. Contudo, o azar bate à porta quando menos se espera e Briceno, sabe-se lá como, fica com a canela da perna direita bastante inchada e praticamente inútil para combater. «Não há problema treinador, bato com a esquerda», diz Pitbull mas, depois de entrar no ringue, depressa percebe que as coisas não funcionam bem assim na vida real. Apesar da dor e de ter que alterar por completo a estratégia que

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tinha preparado juntamente com o treinador, consegue aguentar os cinco rounds de três minutos. Outra coisa não era de esperar de quem conhece este guerreiro, mas a capacidade de sofrimento não ganha pontos no K1 e, depois de feitas as contas, o título de Campeão do Mundo da WKU fica nas mãos de Salvador Guerrero, que não desperdiçou a oportunidade que lhe caiu inesperadamente do céu. Poucos dias depois, sem tempo para lamentos, nem é esse o seu feitio, Rui Briceno já estava a dar aulas à sua turma na Casa do Povo de Messines, mas notava-se algum desalento natural. “Ia confiante que ganhava o combate, porque tive uma das melhores preparações da minha vida. Fiz bem a descida de peso e a recuperação a seguir à pesagem mas, quando cheguei à arena, tinha uma inflamação na perna direita. Nos treinos estava a 100 por cento, não me doía nada, não sei como isso aconteceu e o resultado é que não conseguia bater com a perna direita. Parti logo em desvantagem e perdi aos pontos”, refere o messinense de 28 anos. Recuando ao passado, Rui Briceno conta que começou a praticar kickboxing aos 17

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ENTREVISTA

anos mas, ao contrário de muitos atletas da sua geração, nunca foi fanático por filmes do Bruce Lee ou do Jean-Claude Van Damme, nem tem outros desportistas na família. “O Florin Vintila abriu esta modalidade em Messines, fui experimentar apenas por curiosidade, nunca me tinha passado pela cabeça subir a um ringue, muito menos competir no escalão dos profissionais. Queria melhorar a minha condição física e nunca tive jeito para o desporto, mas adaptei-me depressa a esta modalidade”, recorda. Terminado o ensino secundário, Rui Briceno tirou um curso de eletricidade e começou a trabalhar no negócio de família, ligado aos eletrodomésticos, painéis solares e ar condicionado, e a reação da família quando disse que tinha começado a praticar kickboxing foi a esperada. “É claro que os pais nunca gostam de ver um filho magoado e, neste desporto, é natural que haja algumas mazelas e lesões. Podem não gostar muito que eu ande a competir, por ser duro, mas sempre me apoiaram. Os amigos ficaram mais admirados por verem a minha rápida evolução, porque sou uma pessoa bastante calma e sossegada”, indica. ALGARVE INFORMATIVO #9

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A treinar com Florin Vintila desde o início, Pitbull nunca desistiu, foi adquirindo o jeito e a técnica e o corpo ganhou força e músculo. Para isso, claro, são exigidos muitos sacrifícios ao longo de todo o dia, avisa logo o jovem entrevistado. “Álcool, posso beber um copo num dia de festa mas é raro e, em vésperas de competições, nem lhe toco. Fumar está fora de questão. A alimentação tem que ser muito certinha e equilibrada, à base de legumes, peixe, carnes brancas, frutos secos, ovos, água e chá, nada de refrigerantes, fritos ou hambúrgueres. A minha mãe, por acaso, adaptou-se depressa à minha alimentação e é ela que trata das refeições”, explica, com um sorriso. Preparação física é outra necessidade imperativa mas, para quem trabalha todos os dias, pode tornar-se mais complicada. Por isso, logo pelas 7h30 já se pode encontrar Rui Briceno a correr pelas ruas de São Bartolomeu de Messines. Sextas e sábados há treinos em Albufeira com Florin Vintila e, às segundas e quartas-feiras, dá treino aos seus atletas na Casa do Povo de Messines. “O meu treinador, quando vê que os atletas têm capacidade e estão preparadas, mete-os logo a combater. Ao fim de três, quatro meses, já estava dentro do ringue e nunca mais parei”.


depois vou trabalhar o dia todo e, à noite, vou a correr outra vez para os treinos e para os meus Aprender todos os dias alunos. É assim a minha vida”, relata, ainda um pouco cansado depois das emoções fortes do fim Se as exigências físicas são imensas nos desportos de combate, e no K1 em particular, Rui de semana. Uma vida de treinador que surgiu também de Briceno sublinha outro aspeto fulcral, a vertente forma inesperada e não programada, depois de psicológica, e quando se chega ao nível profissional, tudo é mais intenso. Em amador, o Florin Vintila deixar de ter disponibilidade para manter a turma em São Bartolomeu de messinense não se recorda de ter tido alguma derrota, que começaram a aparecer quando deu Messines. “Como era o que estava cá há mais tempo e já competia profissionalmente, fiquei o salto para a categoria de neoprofissional e profissional. Em 2009, foi campeão da Europa de como treinador da Casa do Povo de Messines e, K1, em 2012 sagrou-se campeão do mundo de K1 em simultâneo, sou atleta do TOP TEAM. Fui ganhando experiência como treinador e e, no ano seguinte, conquistou a medalha de aprendemos todos os dias algo novo para ouro no campeonato da IFMA, em Muay-Thai. transmitir aos atletas”, salienta, acrescentando Em 2014, foi, sem grandes surpresas, campeão que, como atleta profissional, também não pode nacional de K1 mas, infelizmente, 2015 não descurar essa vertente. “Cada combate é um arrancou da melhor forma, com a derrota oponente único, com técnicas distintas, com inesperada em Marbella fruto de uma lesão de estilos e estratégias de combate diferentes. última hora na canela direita. Curiosamente, a vida não se altera quando Rui Vejo vídeos no You Tube do adversário, da mesma maneira que ele me estuda também, Briceno está a preparar uma competição internacional e continua a trabalhar como se não mas pode acontecer sempre algo inesperado, como foi agora o caso. Por isso é que nunca estivesse um cinturão em disputa. podemos ir para o ringue apenas com uma “Normalmente, só tiro dois dias antes. É óbvio estratégia”. que não é fácil, para o corpo ou para a cabeça, Com a derrota a ser digerida com alguma porque tenho que comer sempre de duas em dificuldade, e uma lesão para ser curada, o duas horas para o peso bater certo. Em calendário competitivo de Rui Briceno alterou-se Portugal, é impossível viver só do K1, mas os um pouco e só deverá voltar a lutar em outubro, meus adversários só fazem isto na vida. Eu num torneio especial entre portugueses e tenho que me levantar mais cedo para treinar, chineses. Depois, é deixar correr o tempo e ainda não traçou uma idade para arrumar as luvas e dedicar-se a tempo inteiro à carreira de treinador. “Ainda quero conquistar mais alguns títulos e vou continuar enquanto o corpo aguentar, porque sei que também sou uma referência e uma fonte de inspiração para os jovens da terra e para os meus atletas” . Rui Briceno com alguns dos seus atletas na Casa do Povo de Messines ALGARVE INFORMATIVO #9

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ATUALIDADE

Centro Histórico de São Brás de Alportel viaja no tempo época, três palcos por onde vão passar inúmeros artistas e músicos e muitas mais surpresas que vão envolver os visitantes numa atmosfera típica de 1914. A Recriação Histórica realizase entre as 18h e as 02h, e é uma iniciativa da Câmara Municipal de São Brás de Alportel, coordenada pela Comissão das Comemorações do Centenário do Município, com o apoio técnico do Museu do Trajo de São Brás de Alportel e a colaboração das urante dois dias, São mais de 240 participantes em associações, entidades, Brás de Alportel vai animação e performances, duas empresas e comunidade local. A mergulhar no tempo e dezenas de espaços abertos ao entrada é livre e todos os recuar 100 anos, recriando o público, para permitir aos visitantes são convidados a ambiente vivido na época. A visitantes conhecer melhor as entrar nesta «viagem no tempo», iniciativa «São Braz d’Alportel histórias das gentes e dos pelo que se lança o desafio de se 1914 – Uma viagem no tempo» edifícios do Centro Histórico, 12 trajarem a rigor para também decorre nos dias 30 e 31 de maio espaços de restauração e eles serem parte desta Recriação e as ruas do Centro Histórico vão bebidas, um espaço de animação Histórica . ganhar novas cores e cheiros e infantil com jogos tradicionais da receber um corrupio de animações e acontecimentos inesperados, do teatro de rua ao baile ou da mostra de artesanato aos deliciosos manjares de outros tempos. São Brás de Alportel assinala assim os 100 anos de elevação a concelho, a implantação da República e um século de progresso com uma Recriação Histórica que só é possível graças ao envolvimento e participação ativa de toda a comunidade que fortemente abraçou a iniciativa. Serão 150 figurantes trajados a rigor,

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VRSA entregou maior prémio literário de ensaio histórico do país

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Câmara Municipal de Vila Real de Santo António entregou, no dia 21 de maio, o Prémio Nacional de Ensaio Histórico António Rosa Mendes, no valor de 10 mil euros, com o objetivo de promover a investigação e a literatura sobre história no nosso país. Daniel Norte Giebels, autor do trabalho «D. João de Melo e Castro», e Marco Sousa Santos, autor da obra «A representação da honra feminina no Algarve na Época Moderna: o recolhimento de S. João Baptista de Tavira», foram os vencedores desta primeira edição do prémio, que será repartido pelos dois concorrentes. Este concurso, lançado no âmbito da homenagem da autarquia de VRSA e da academia algarvia ao ilustre vila-realense António Rosa Mendes, falecido em 2013, destinou-se a galardoar o melhor ensaio histórico inédito na modalidade, com tema livre,

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mas circunscrito ao período da Idade Moderna. A escolha da data de 21 de maio para a entrega do prémio foi propositada, já que neste dia António Rosa Mendes completaria 61 anos. Ainda no âmbito desta primeira edição, o júri deliberou atribuir menções honrosas às obras «Idade moderna: (Des)concerto do Mundo», de Leonor Taborda,

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e «Um ensaio sobre a virtude», de Alexandre Honrado. “Este concurso, inédito no país, honra o nome e o legado de António Rosa Mendes e faz do município uma referência nacional ao nível do impulsionamento da cultura e da investigação histórica”, considera Luís Gomes, presidente da Câmara Municipal de VRSA. Do painel de jurados fizeram parte os seguintes elementos: Prof. Doutor Joaquim Romero de Magalhães (Universidade de Coimbra); Prof. Doutor José Esteves Pereira (Universidade Nova de Lisboa); Prof. Doutor José Eduardo Horta Correia (Universidade do Algarve); Prof. Doutor Luís Filipe Oliveira (Universidade do Algarve); e Arq. José Carlos Barros (Assembleia Municipal de Vila Real de Santo António) .


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