Literatura em nós

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Literatura em Nรณs by Novembro de 2017


04 — Editorial 06 — Tinto no Branco junta Ricardo Araújo Pereira e Michael Palin 10 — Feira do livro à moda do Porto

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14 — Florbela foi maior que os homens 18 — Prémio Pessoa 22 — Festival Literário da Madeira

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Editorial “É condensar o mundo num só grito” A literatura é um mundo infinito. O que lemos inquieta-nos, acalma-nos, inspira-nos, faz-nos rir, sonhar e chorar. Há livros que ficam na memória, mas às vezes basta um poema, até um verso, para nos despertar algo cá dentro, fazendo-nos sentir mais do que seres humanos. Cada escritor ou poeta, em algum momento do seu percurso, terá perguntado a si mesmo: como vou fazer isto, qual será o meu contributo? “Qual será o seu verso?”, perguntava o professor de literatura John Keating aos alunos no filme O Clube dos Poetas Mortos, incentivando-os a pensar para além dos cânones clássicos e a registar os impulsos que vêm do fundo da alma poética. Em Portugal temos inúmeros autores que o fizeram com ma4 | Literatura em nós ...by Descla

gistralidade, escrevendo obras de raro valor, poemas geniais, momentos de puro deleite. Nesta revista falamos de alguns desses homens e mulheres que se tornaram eternos e que hoje celebramos em feiras e festivais literários, prémios e outras iniciativas. Seria impossível falar de todos e não quisemos limitar-nos aos mais importantes. Por isso falamos de prémios nacionais e regionais, feiras do livro em cidades grandes mas também festivais em núcleos pequenos que já conquistaram grande projecção nacional e até internacional. É uma pequena amostra desse mundo infinito e uma homenagem nossa a uma das áreas mais ricas de Portugal. Boas leituras, A equipa da Descla



Tinto no Branco junta Ricardo Araújo Pereira e Michael Palin Texto: Lino Ramos

De 1 a 3 de Dezembro, o Festival Literário de Viseu combina a literatura universal com a gastronomia e os vinhos regionais

Fotografia: Município de Viseu

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Fotografia: Município de Viseu

O frente-a-frente entre o conceituado humorista português Ricardo Araújo Pereira e o colega inglês Michael Palin, ex-membro do grupo Monty Phyton, é a grande atracção do Festival Literário de Viseu “Tinto no Branco”, que vai realizar-se entre 1 e 3 de Dezembro. O encontro inédito, com o mote “E agora para algo completamente diferente”, vai decorrer logo no dia de abertura do evento, às 18:00 horas, na tenda “Jardins de Inverno” – é o primeiro dos vários confrontos que marcam a edição deste ano e que prometem discussões sobre ciência e religião, poesia e prosa, campo e cidade, ócio e trabalho. Além dos dois conhecidos humoristas, Pedro Mexia,

Francisco José Viegas, Nuno Júdice, Frei Bento Domingues, Fernando Dacosta e Afonso Cruz são alguns dos nomes que vão passar por Viseu. O festival vai reunir, ao todo, 30 convidados, em 30 momentos de programação que incluem conversas literárias, exposições visitas guiadas, ateliês infantis, entre outras actividades para todos os públicos. O presidente da Câmara Municipal de Viseu, Almeida Henriques, promete “a melhor edição de sempre” e diz que com este evento a cidade “consolida o estatuto de capital vinhateira do Dão e de um destino turístico cultural de referência”. O grupo Virgem Suta é o grande nome do cartaz musical para as “Noites de Inverno”, Literatura em nós ...by Descla | 7


Fotografia: Tiago Canoso

que incluem ainda Benjamim, Francisco Cappelle, Adfectus e Tempo Singular. Uma “dança de palavras” Num festival que combina a literatura universal com a mesa e os vinhos regionais, 40 produtores regionais vão expor no Solar do Vinho do Dão os melhores néctares, bem como a gastronomia e o artesanato. Para os mais novos, o Espaço Petiz, na capela do solar, promete muita animação. O professor José Dias Pires vai 8 | Literatura em nós ...by Descla

transformar a magia da literatura numa “dança de palavras”, em duas conversas literárias com o público Infanto-juvenil. Os participantes no festival vão ainda poder descobrir o “lado B” de Viseu, através das visitas literárias “Viseu Misteriosa”, com encenação do Teatro AFTA – Projecto OFF. O festival “Tinto no Branco” integra o evento “Vinhos de Inverno”, o último acontecimento enoturístico do ano na cidade de Viseu, que a cada ano convida o público a viajar pelo mundo dos vinhos do Dão num ambiente de charme e glamour.



Feira do livro à moda do Porto Texto: Lino Ramos

A Feira do Livro do Porto, com apenas quatro anos, já se tornou numa evento de referência, tendo atraído 285 mil visitantes na última edição Porto, a cidade invicta, a capital do norte, que muitas vezes

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fica para trás, esquecido na memória colectiva do país. Mas


a urbe que deu nome a um dos vinhos mais famosos do mundo é um mundo à parte, que tem coleccionado prémios de turismo, entre os quais o de melhor destino europeu, já por três vezes, a ponto de se tornar num caso de estudo internacional. É nesta cidade histórica que a cada ano decorre uma das mais conhecidas feiras do livro portuguesas, um evento com apenas quatro anos mas que já atrai milhares de pessoas. A última edição, em Setembro, atingiu o recorde de 285 mil visitantes. A homenageada foi a poetisa – ou “poeta”, como gostava de se auto-intitular – Sophia de Mello Breyner Andresen, autora d’ O Anjo de Timor, um dos livros mais vendidos durante a feira, a par dos volumes Postais Ciclo de Natal, Porto., livro que descreve a nova identidade gráfica da cidade, e o guia histórico Jardins do Palácio de Cristal. Estes jardins, onde se realiza o evento, são mágicos. É o pulmão da cidade, um espaço romântico projectado no século XIX pelo arquitecto paisagista alemão Émille David. Do projecto original conservam-se o jardim com o nome do autor, na Literatura em nós ...by Descla | 11


entrada principal, a Avenida das Tílias, o bosque e a concepção das varandas sobre o Douro. Enquanto folheamos um livro podemos contemplar as magníficas panorâmicas sobre o rio e a cidade, respirar o ar puro no epicentro da agitação. O local não poderia ser melhor, e é por este recanto incauto que a cada ano passam autores de renome, grandes vultos da literatura e não só, pois os livros não se esgotam nas linhas em que correm. Sophia foi a última homenageada, juntando-se a Vasco Graça-Moura, Agustina Bes12 | Literatura em nós ...by Descla

sa-Luís e Mário Cláudio. José Eduardo Agualusa também esteve no Porto, para programar oito debates, mas houve igualmente sessões de cinema e teatro, exposições, sessões de spoken word, lições sobre escritores de língua portuguesa, entre inúmeros eventos. A feira deste ano atraiu não só os portuenses como também novos públicos, garante a Câmara Municipal do Porto, que organiza o certame. Esse era um dos objectivos principais e assim há-de continuar a ser. A cidade vem-se reinventando e os livros copiaram-lhe o exemplo.



Fotografia: André Canoa

Florbela foi maior do que os homens Texto: Lino Ramos

Florbela Espanca é uma das maiores poetisas portuguesas de sempre. Os 36 anos que viveu foram plenos mas simultaneamente inquietos e cheios de sofrimento. O prémio com o seu nome distingue obras inéditas de poesia e ficção

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Ser poeta é ser mais alto, é ser maior do que os homens. As eternas palavras da imortal Florbela Espanca ecoam na memória dos que têm o privilégio de conhecer a sua poesia. É o momento inicial de um poema admirável, apaixonante, que deu origem a uma canção igualmente sublime. Florbela foi maior do que homens e mulheres, mas um génio assim não poderia viver por muito tempo. Nascida em Vila Viçosa em 1894 e baptizada como Flor Bela Lobo, cedo a menina morena e de cabelo escuro mostrou a sua veia poética. Escreveu os primeiros poemas com apenas nove anos, um dos quais intitulado “A Vida e a Morte”… A perda foi sua companheira até ao fim: primeiro a mãe, depois o irmão, Apeles, com quem tinha uma ligação muito forte. As inquietações e os sofrimentos íntimos deram origem a uma poesia brilhante, cheia de erotismo e feminilidade,

Fotografia: Tiago Canoso

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Fotografia: André Canoa

suspiros e lágrimas. Autodenominada Florbela d’Alma da Conceição Espanca, aventurou-se também na prosa, através de contos – onde predomina a figura de Apeles –, muitas cartas e um diário. A poetisa faleceu no dia em que completava 36 anos, devido a uma overdose de barbitúricos, a última de várias tentativas de suicídio. Por essa altura já a sua obra era reconhecida pelos seus pares e pelo pú16 | Literatura em nós ...by Descla

blico, e assim foi e continua a ser. Fernando Pessoa descreveu-a como “alma sonhadora, irmã gémea da minha”. Em sua homenagem, o município de Vila Viçosa criou em 1981 o Prémio Literário Florbela Espanca, que distingue obras inéditas de poesia e ficção. A obra reconhecida é editada pela autarquia, numa tiragem de 500 exemplares, e o autor receber um prémio no valor de 2.500 euros.


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Prémio Pessoa Texto: Lino Ramos Fotografia: Tiago Canoso

O vencedor do Prémio Pessoa vai ser conhecido no início de Dezembro. Quem será a personalidade que verá o seu nome associado à figura do grande poeta?

Que Fernando Pessoa foi um génio ninguém duvida. Que outros génios temos hoje em dia na literatura, na arte e na ciência portuguesas? O Prémio Pessoa surgiu para procurar essa figura a cada ano. O último, Frederico Lourenço, traduziu a Bíblia a partir de fontes gregas. É um homem de trabalho cheio de interesses e realizações que vão da poesia ao romance, da música à história da dança, do teatro aos estudos bizantinos. O galardão não é apenas li18 | Literatura em nós ...by Descla

terário, tal como Pessoa não foi só um escritor e poeta, mas um homem das artes e até da ciência. Ainda assim, a genialidade não lhe valeu qualquer prémio enquanto foi vivo, e essa é também uma das bases desta distinção, que procura “ir contra a corrente de uma velha tradição nacional, segundo a qual o reconhecimento da importância da obra de algumas pessoas só foi verdadeiramente feito postumamente”, explica a organização.


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Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia, Não há nada mais simples Tem só duas datas - a da minha nascença e a da minha morte. Entre uma e outra todos os dias são meus. Pessoa é um talento impossível de medir, não cabe na escala humana que avalia as capacidades dos artistas. A obra que criou está entre as maiores do mundo, e o mundo, com o tempo, reconheceu-lhe isso mesmo. “Tanto génio poético, tanto pensamento, tanta capacidade de exprimir limpidamente as camadas mais profundas e obscuras do sentir”, disse sobre ele o filósofo José Gil. Aquele homem franzino, de rosto comprido e seco, bigode à americana, era misterioso e introvertido. Detestava que lhe tirassem fotografias, não gostava de falar ao telefone e tinha muito medo da trovoada. Morreu relativamente novo, com 47 anos, culpa dos 80 ci20 | Literatura em nós ...by Descla

garros que fumava por dia. As personalidades distinguidas ao longo destes 30 anos de Prémio Pessoa são, só por si, um sinal da grandeza do poeta e do seu nome. O vencedor número 31 do Prémio Pessoa vai ser conhecido em Dezembro, juntando-se a figuras como o historiador José Mattoso, o poeta Herberto Hélder, o físico Henrique Leitão ou o neurocirurgião João Lobo Antunes. O objectivo é o mesmo de sempre: “contribuir anualmente para o alargamento e o aprofundamento da obra de tantas pessoas portuguesas, umas mais conhecidas outras menos, que necessitam e merecem ser encorajadas para fazer mais e melhor”.


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Arouca | Castelo de Paiva | Castro Daire | Cinfães São Pedro do Sul | Sever do Vouga | Vale de Cambra


Festival Literário da Madeira Texto: Edilson Coutinho

Literatura e a Web – entre o medo e a liberdade é o tema da 7.ª edição do Festival Literário da Madeira (FLM). Entre os dias 14 e 19 de março de 2017, o Teatro Municipal Baltazar Dias, no Funchal, foi palco de partilha, lançamentos, reflexões, arte, conversas literárias e sessões de autógrafos.

Literatura e Web – Cabeçalho do site oficial do FLM (http://www.festivalliterariodamadeira.pt/pt)

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Teoricamente, a figura principal desta edição do FLM seria a escritora e jornalista bielorrussa Svetlana Alexievich, vencedora do Prémio Nobel da Literatura em 2015. Acompanhada pelo jornalista Luís Caetano (Antena 2) constituíam a abertura num debate sobre o que haverá de mais assustador para além do homem. No entanto, devido às condições atmosféricas que se fez sentir no Aeroporto Internacional da Madeira Cristiano Ronaldo, a participação da Nobel da Literatura foi cancelada. Assim, o programa disponibilizado pela Eventos Culturais do Atlântico (ECA) sofreu alterações, arrancando apenas no segundo dia do evento. Os pseudónimos angolanos Pepetela (Artur Pestana dos Santos – vencedor do Prémio Camões em 1997) e Ondjaki (Ndalu de Almeida – vencedor do Prémio José Saramago) tiveram como ponto de partida a expressão do autor Yaka: "Queremos transformar o mundo e somos incapazes de nos transformar a nós próprios", para iniciar uma conversa com o

jornalista da TSF, Fernando Alves. No terceiro dia de festival, 16 de março de 2017, a parte da manhã contou com conversas culturais na Calheta e em Machico, com participações especiais de Válter Hugo Mãe, Sandra Nobre, Pepetela e Ondjaki. Na parte da noite novamente uma conversa, seguida da apresentação do livro Nossos Ossos de Marcelino Freire. O penúltimo dia esteve fortemente marcado pela poesia. Encerrando com um dos primeiros espetáculos de Teresa Salgueiro, O Horizonte, que se repetiu no dia de conclusão do acontecimento, após o encontro de Viriato Soromenho-Marques e Frederico Lourenço, onde o tema será a religião. José Manuel Fajardo, Tatiana Salem Levy, Francesco Benozzo, Barry Wallenstein, Adam Johnson e Yang Lian são alguns dos nomes internacionais que passaram pelo Teatro Municipal Baltazar Dias durante os cinco dias literários. Alguns reconhecidos mundialmente através dos prémios ou mesmo da escrita peculiar que os caracterizam. Literatura em nós ...by Descla | 23


Francesco Valentini, diretor do Festival Literário da Madeira, em entrevista ao Diário de Notícias afirma que o festival tem crescido anualmente "principalmente, em termos de público, como se pôde comprovar com as salas quase sempre cheias no ano passado durante as várias mesas e espetáculos". O FLM é um dos acontecimentos com peso relevante na cultura portuguesa. Foram diversos os autores que deram voz ao festival, como por exemplo Alberto Manguel, Naomi Wolf, Adriana Calcanhotto, Miguel Sousa Tavares, Mia Couto, Richard Zimler, Lídia Jorge e o falecido Zygmunt Bauman. Para o evento ser um sucesso, Valentini acredita que a mediatização do mesmo ajuda bastante. Não fosse esse um dos pontos essenciais para a 24 | Literatura em nós ...by Descla

sua divulgação, através da internet e da comunicação social. No entanto, reconhece também que a ajuda financeira dos parceiros e apoios públicos é indispensável, pois um evento cultural não vive apenas do pagamento dos bilhetes e que por estar inserido numa ilha, torna as condições mais complicadas. Assim, sente-se realizado com os madeirenses e a potencialidade do festival. No fim, resta pensar na próxima edição. No meio de tantas palmas, autógrafos e palavras, surgem novas ideias. As mais valiosas serão as que levam os autores a caminhos diferentes, em que se tornam o ponto de partida para mudar a perspetiva de vida. Francesco Valentini, já anunciou o tema do ano de 2018: Literatura e Jornalismo: a Palavra que Prende, a Palavra que Liberta.




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