Na Fronteira da História: Um País Armado - Pelas fortalezas do Centro

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desporto cultura lazer

Outubro de 2018

Na Fronteira da HistĂłria: Um paĂ­s armado Pelas Fortalezas do centro


ficha técnica Propriedade, edição e distribuição: Gomes & Canoso,lda. Rua São João, nº.39, Repeses 3500-727 Viseu Telefone: 232 407 544

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Telemóvel: 969 474 853 Directora: Olinda Martins Redacção: Ana Margarida Gomes e Lino Ramos

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Colaboradores: Mariana Rodrigues Paginação: Filipa Pinto, João Barbosa e Tiago Canoso

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Publicidade e Marketing: Joaquim Gomes e Tiago Canoso

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Um país armado

Caros leitores, A nossa viagem pela fronteira portuguesa continua em Figueira de Castelo Rodrigo, que a certa altura da sua história quis ser espanhola, quando tomou o partido de D. Beatriz na crise de sucessão de 1385. É uma das Aldeias Históricas de Portugal, a par de Almeida e Sabugal, que também entram nesta edição. Penamacor, o quarto destino desta segunda revista, tem uma torre que hoje serve de miradouro, do qual avistamos a “aldeia mais portuguesa de Portugal”, Monsanto, e as serras da Gardunha, Estrela e Malcata. Idanha-a-Nova, a seguir, tem mui-

tos castelos, sem contar os que já desapareceram, e em Castelo Branco descobrimos que a fortaleza é uma réplica de outra construída há muitos séculos na então chamada Terra Santa, hoje território sírio. A viagem acaba em beleza, no arrebatador cenário das Portas de Ródão. Que mais poderíamos pedir? Apenas que venha a próxima edição, em meados de Novembro, onde havemos de percorrer a raia alentejana.

Boas leituras!!!!

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Aldeia de Castelo Rodrigo, com o castelo no topo

Coração Dividido A história de Figueira de Castelo Rodrigo começa com Espanha: a vila de Castelo Rodrigo começou por ser domínio de Leão e por uma vez quis voltar a ser espanhola… Texto: Mariana Rodrigues Fotografias: C. M. Figueira de Castelo Rodrigo

Nasceu espanhola mas mantevese portuguesa, não sem incorrer numa infidelidade… Falamos de Castelo Rodrigo, a vila tornada aldeia histórica que integra o concelho guardense de Figueira de Castelo

Rodrigo. Esta é uma das 12 Aldeias Históricas cujo património histórico impressiona o olhar; desde que surgiu, Castelo Rodrigo foi sempre alvo de várias tensões. Desde logo pela sua origem: foi fundada por

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Afonso IX de Leão, que lhe atribuiu o foral em 1209, até passar para as mãos do conde Rodrigo Gonzalez de Girón (a quem deve o seu nome). Foi preciso chegar a 1297 para D.

IV, filho de Sancho IV. Começou assim uma profunda penetração por Castela, avançando desde Ciudad Rodrigo até Valladolid. Com isto D. Dinis conseguiu colocar guarnições

Aldeia Matrix,aldeia histórica de Castelo Rodrigo

Dinis juntar a vila à coroa portuguesa. O rei, ciente da necessidade de fortalecer a presença portuguesa, aproveitou uma fraqueza dinástica de Leão e deslocou-se à Guarda para declarar guerra a Fernando

portuguesas em Castelo Rodrigo, Alfaiates, Sabugal, Vilar Maior, Castelo Bom, Almeida e Castelo Melhor. Isto obrigou os Castelhanos a assinar o Tratado de Alcanizes. Para assegurar a posse das

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Ruínas da Muralha,Castelo Rodrigo Castelo Rodrigo

Lendas e Mais Lendas Era inevitável que um local por onde tanta História correu guarde uma colecção enorme de lendas: só no portal da Câmara Municipal de Figueira de Castelo Rodrigo estão registadas 35 histórias associadas ao misticismo da região, das quais a mais famosa é a da Serra da Marofa. Conta a lenda que um cavaleiro cristão apaixonou-se pela filha de um rico judeu, chamada Ofa, mas cujo amor era absolutamente proibido. A rapariga, perdidamente apaixonada, viu-se obrigada a refugiar-se em Castelo Rodrigo, uma bonita terra da Beira Alta.

Interior do castelo Rodrigo

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terras conquistadas aos reinos de Leão e Castela, D. Dinis mandou reparar as muralhas em volta da vila. Contudo, não faltaria muito para Castelo Rodrigo quisesse tomar o partido espanhol. Isto porque em 1383, D. Beatriz (filha do controverso casamento entre D. Fernando I e Leonor Teles), contraiu matrimónio com D. João I de Castela. Aquando do falecimento de D. Fernando, gerou-se um problema na sucessão ao trono, já que a população preteria D. Beatriz em favor de D. João, Mestre de Avis (meio irmão de D. Fernando). Muitas terras do país recusaram-se a celebrar a sua regência – o que não era o caso em Castelo Rodrigo, onde se tomava o partido de D. Beatriz. Contudo, quem viria a ganhar definitivamente o trono português foi o Mestre de Avis, que, assim que venceu os castelhanos na Batalha de Aljubarrota, ordenou que o brasão de Castelo Rodrigo tivesse as armas reais invertidas. Isto seria o testemunho da deslealdade da vila (aquilo a que se chama um brasão difamado); mas hoje em dia, a freguesia já não ostenta esse famoso símbolo.

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Xeque Mate Dos espanhóis às tropas de Napoleão e aos presos políticos – todos eles deixaram rastos de combate em Almeida, a aldeia que serviu como um autêntico tabuleiro de jogo. Texto: Mariana Rodrigues Fotografias: Tiago Canoso

Uma verdadeira pérola para os fãs de história militar, Almeida é como um livro em aberto perdido no interior. Mas desengane-se quem pense que esta aldeia do distrito da Guarda não conhece o devido reconhecimento: é uma das 12 aldeias históricas de Portugal, e a sua Fortaleza abaluartada (a par com as de Valença, Almeida, Marvão e Elvas) faz parte de uma candidatura em curso a Património Mundial da UNESCO. A Fortaleza de Almeida foi mandada construir no período pós-Restauração por D. Álvaro de Abranches, general da província da Beira, em 1641. Os seus seis baluartes e seis revelins – que, vistos de cima, lhe conferem o ar de estrela de 12 pontas – devem-se

ao desenho de Pierre Gilles de SaintPaul. Devido à sua enorme dimensão, a construção da Fortaleza só findou passadas quatro décadas. A sorte quis que, pouco depois, em 1762, a vila fosse cercada pelos exércitos espanhóis durante a Guerra dos Sete Anos. Nem por isso se deixou de proceder a obras de valorização na fortaleza. Em 1807, Almeida esteve na mira das tropas napoleónicas, que invadiram a praça. Passados dois anos, uma explosão no paiol levou à destruição de parte da fortaleza. Tendo ainda funcionado como prisão política durante as lutas liberais, a Fortaleza deixou de servir para fins militares em definitivo no ano de 1927. A ela juntam-se o Picadeiro

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Quando Napoleão invadiu Portugal…

Porta da fortaleza de Almeida.

O Cerco de Almeida ocorreu entre 15 e 28 de Agosto de 1810, no princípio da última invasão francesa comandada pelo marechal Massena. O general britânico Cox foi encarregue de defender a praçaforte, mas, apesar dos esforços, deu-se uma forte explosão no paiol que deixou a fortaleza indefesa e matou centenas de homens. Cox foi obrigado a capitular e a guarnição entregou Almeida aos franceses no dia 28 de Agosto. Este marco é recriado na festa do Cerco de Almeida, que todos os anos recria esta parte das Invasões Napoleónicas. Também o evento faz parte da estratégia municipal de candidatura da aldeia a Património Mundial no âmbito da inscrição das “Fortalezas Abaluartadas da Raia”. A candidatura foi entregue em Janeiro de 2016 em conjunto pelos municípios de Valença, Almeida, Marvão e Elvas no sentido de valorizar o património militar da zona fronteiriça.

D’el Rey (no qual existiram as forjas para a manufactura e reparação do equipamento bélico, um quartel de artilharia e a Fábrica do Pão; tudo isso foi arruinado nos bombardeamentos do século XIX), a Casa do Marechal

Leitão de Carvalho, também conhecida como Palácio dos Leitões, e o Quartel das Esquadras. Foram elementos de um jogo de combate e agora são, acima de tudo, monumentos que impressionam pelo seu valor.

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Os Cinco

Guardiões Sabugal tem cinco castelos, dois dos quais já serviram de cemitério e um no coração da aldeia histórica da Sortelha. Texto: Mariana Rodrigues Fotografias: Revista Descla

Na cidade de Sabugal, há, nada mais, nada menos, do que meia dezena de castelos. Ao longo das suas trinta freguesias, entre a paisagem acidentada de granito, típica da Beira Alta, não faltam fragmentos de história por redescobrir. Desde logo o Castelo de Sabugal, localizado no centro, tem como origi-

Castelo de Sabugal

nalidade o facto de ter uma torre de menagem pentagonal, facto esse que lhe vale a alcunha de Castelo das Cinco Quinas. O castelo foi mandado construir por D. Dinis no século XIII, sendo que a torre de menagem, com cerca de 30 metros, faz-se ver do ponto mais alto da vila. E, mais do que para fins militares, o Castelo de

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Sabugal também serviu de presídio: um dos seus mais ilustres prisioneiros foi o intrépido poeta e cavaleiro Brás Garcia de Mascarenhas (que ficou célebre pelo seu famoso poema épico “Viriato Trágico”). Aliás, antes de ser preso em Sabugal, Brás Garcia de Mascarenhas tinha passado por Alfaiates, vila da qual foi

Governador da Praça Forte em 1641. Esse foi o ano em que ficaram (parcialmente) acabadas a cerca e a fortaleza de Alfaiates, mandadas construir por D. Manuel. Até hoje, o que se encontra são os restos do que ficou por fazer; no século XVIII houve uma tentativa de modernizar a fortificação, mas nada foi feito. Aquando da extin-

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Ruínas da Vila do Touro

ção de Alfaiates enquanto concelho, o castelo foi transformado em cemitério. Na freguesia de Sortelha encontra-se o castelo, mandado edificar em 1228, ano em que a terra também recebeu foral. À medida que os anos ditaram o crescimento da fronteira para leste, Sortelha foi perdendo alguma importância estratégica. D. Manuel revitalizou a vila ao conceder-lhe

Castelo de Alfeiates

novo foral e incentivar obras de beneficiação no castelo, mas, apesar das vantagens da atenção real, o certo é que Sortelha caiu mais uma vez em esquecimento. Valeu-lhe a inclusão no roteiro das Aldeias Históricas na passada década de 90, que só não foi importante para a recuperação do património, como também para torná-la num ponto turístico.

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Castelo de Vila Maior

Vilar Maior foi conquistada aos mouros por D. Afonso VII de Leão em 1139, e só se tornou portuguesa com o Tratado de Alcanizes em 1297. Ainda teve o privilégio de receber algumas atenções reais ao longo do tempo: tanto D. Fernando, como D. João I e D. Manuel fizeram intervenções nas suas muralhas. Aquando das invasões napoleónicas, Vilar

Maior foi uma das zonas pilhadas. É em Vilar do Touro que se completa a rota dos castelos de Almeida. A construção do seu castelo fazia parte da lista de obrigações contempladas no foral concedido por Pedro Alvites, Mestre da Ordem do Tempo. Segundo as Inquirições de 1290, o castelo foi saqueado e destruído pelo concelho da Guarda.

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Vista de Penamacor

A torre que é um miradouro Acabadas as guerras, Penamacor viu a sua fortaleza ser destruída, pedra sobre pedra. 16 ...by Descla | Na fronteira da história : Um país armado


Texto: Lino Ramos Fotografias: C.M de Penamacor

Entramos em Penamacor à procura do velhinho castelo medieval, quase desaparecido. A sua construção terá começado nos finais do século XII. Impõe-se, desde logo, a majestosa Torre de Menagem, erguida no reinado de D. Dinis, assim como a muralha. A entrada, acima do solo, exigia o uso de uma escada amovível. No século XVIII, um raio atingiu o paiol junto ao edifício, fazendo-o deslocar-se dois palmos e causando uma explosão que destruiu as construções vizinhas. A fortaleza mudou muito nos séculos seguintes. Logo em 1568 edificou-se a Casa da Câmara, assente sobre a antiga Porta da Vila, que controlava quem entrava e saía da povoação. Décadas depois, as muralhas foram reforçadas e parcialmente reconstruídas, no âmbito das Guerras de Restauração, e edificaram-se seis baluartes ao redor da antiga fortificação medieval. Já fora dos muros, encontramos o belo Pelourinho e, mais abaixo, a igreja de São Tiago, o principal tempo de

Vista da Torre da Penamacor

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Penamacor. Muito perto fica o antigo quartel militar, que lembra o importante passado histórico de Penamacor como Praça de Armas e onde se instalou o Museu Municipal. Somos atraídos pela monumental escadaria, pela qual acedemos ao esplêndido Jardim da República. Caminhamos mais um pouco até ao convento de Santo António, relíquia arquitectónica do século XVI, cujo interior, decorado em talha dourada, impressiona pela riqueza artística e carga simbólica. Findas as guerras, Penamacor viu a sua fortaleza desaparecer. No século XIX a sua pedra começou a ser usada para construções privadas

Vista da Torre

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e, aparentemente, ninguém se apôs. Seria preciso esperar pelo século XX para que os habitantes da vila percebessem o dever de conservar o seu património. Há alguns anos a Câmara Municipal de Penamacor requalificou a Torre de Menagem, transformando-a num miradouro e espaço museológico. No cimo do monumento, a luneta permite uma vista de 360 graus. Contemplamos Monsanto, considerada a “aldeia mais portuguesa de Portugal”, e as serras da Gardunha, Estrela e Malcata. Nesta última foi criada uma reserva para proteger o felino mais ameaçado do mundo, o lince-ibérico.

de Penamacor

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Um, dois, três castelos, sem

contar os que desapareceram Idanha-a-Nova, Cidade da Música, é uma terra de lendas e tradições. Texto: Lino Ramos Fotografias: Município de Idanha-a-Nova

Castelo de Penha Garcia

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Castelo de Penha Garcia

O castelo de Penha Garcia fica lá no alto, no cimo de uma escadaria que demora a subir. Vale a pena o esforço: a vista é sublime para o vale do rio Ponsul, onde ainda encontramos os velhinhos moinhos de rodízio, que outrora produziam

farinha de trigo e centeio. A fortaleza terá sido levantada por ordem de D. Sancho I para defender a Beira dos inimigos seculares – o leonês que estava para lá do Erges e o mouro para lá do Tejo. Descemos mais um pouco até

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ao castelo de Segura. A primeira referência conhecida ao edifício data de 1299, quando D. Dinis isentou os moradores da localidade de impostos, com a condição de estes construírem uma fortaleza. O edifício que hoje vemos não é o mesmo, mas sim o resultado de profundas mudanças ao longo de séculos. Segura foi importante na defesa da raia durante as Guerras da Restauração, tendo sido nessa época integralmente cercada por uma muralha, protegida por guaritas. Das obras feitas no castelo, subsistem os três baluartes associados à velha barbacã. No século XX construiu-se a Torre do Relógio, actual marco da história militar de Segura. Salvaterra do Extremo. O castelo será de finais do século XIII, quando esta localidade passou a ter um papel importante na defesa das novas fronteiras negociadas entre Portugal e Castela. Tem um raro traçado circular, bem defendido por torres e munido de forte torre de menagem. Com o passar dos anos a vila cresceu para fora dos muros, mas no século XVII construiu-se uma moderna e extensa fortificação abaluartada que

O Adufe

abrangeu integralmente a povoação. Hoje, restam apenas alguns troços da muralha. O castelo do Rosmaninhal, esse, já não existe. Esta localidade até teve uma grande importância

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estratégica, sendo sede de concelho até ao século XIX, mas o tempo não perdoou a fortaleza. Resiste o pelourinho, um dos mais bonitos da Beira Baixa. A sede actual, deixámola para o fim, até porque não está

junto à fronteira. Em Idanha-a-Nova subsistem as muralhas da Idade Média, do topo das quais a vista é irrepreensível. Numa terra cheia identidade, mantém-se o fabrico do adufe, um instrumento musical feito de pele de ovelha, com armação em madeira. A sonoridade é muito própria e tem o seu ponto alto na romaria da Senhora do Almortão, que atrai milhares de visitantes à vila na terceira semana depois da Páscoa. O seu santuário é muito antigo, sendo mencionado já em 1229, no reinado de D. Sancho II. A Unesco reconheceu a tradição do adufe e o esforço em preservála, atribuindo a Idanha-a-Nova o título de Cidade da Música em 2015. No concelho encontramos também duas Aldeias Históricas de Portugal, Monsanto e Idanhaa-Velha, conhecidas pelas suas lendas e mistérios e intimamente ligadas à fundação do país. A primeira foi eleita, em 1938, a aldeia mais portuguesa de Portugal, num concurso promovido pelo Estado Novo, por ser a mais típica e característica, que sabe defender as suas tradições e identidade.

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Vista da cidade de Castelo Branco

Da Síria a Castelo Branco O castelo será uma réplica do Chastel Blanc, edificado pelos Templários na Terra Santa. Texto: Lino Ramos Fotografias: C.M Castelo Branco

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Castelo

O bonito castelo terá sido construído no século XII pelos Templários como uma réplica do Chastel Blanc, na então chamada Terra Santa, hoje território sírio, edificado pela mesma Ordem. Vários pormenores dão força a essa hipótese: a analogia do nome, a área amuralhada quase idêntica, a igreja com uma cisterna no subsolo. D. Dinis mandou erguer a nova torre de menagem e uma segunda linha de muralhas, devido ao crescimento

da localidade e à importância estratégica da fortaleza. No século XV construiu-se aqui o Paço dos Comendadores, magistralmente desenhado por Duarte d’Armas no Livro das Fortalezas. Castelo Branco haveria de ser, no século seguinte, uma povoação-fortaleza, mas ultrapassadas as guerras e demais ameaças os velhos edifícios perderam a importância e foram votados ao abandono, como aconteceu

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Bordado de Castelo Branco O famoso bordado de Castelo Branco é feito de linho e seda natural. Os desenhos inspiram-se muito em temas orientais e representam sobretudo a flora: o cravo, o lótus, a peónia, a tulipa e a magnólia são algumas das plantas mais comuns, cada qual com a sua simbologia. Também é frequente ver a Árvore da Vida, referida na Bíblia, bem como a ave com duas cabeças, o coração ou o laço. Na cidade, várias calçadas, rotundas e fachadas de edifícios replicam a tradição. O bordado inspirou também uma colecção de selos e uma moeda, a primeira emitida em Portugal com um elemento de cor, além de várias peças de roupa e mobiliário. A colcha ainda é, contudo, a peça mais comum de uma tradição que já ganhou

fama mundial. Desde 2017 que os principais altares da Catedral de Manchester, em Inglaterra, são decorados por painéis inspirados no bordado de Castelo Branco. O trabalho da artista plástica Cristina Rodrigues respeita as matérias-primas e as técnicas seculares e foi inaugurado 60 anos após a rainha Isabel II ter visitado Portugal, onde recebeu precisamente uma colcha como presente. A existência desta tradição deve-se, em grande parte, ao facto de a região da Beira Baixa estar há muito associada ao cultivo do linho e à sua transformação artesanal, baseada em técnicas antigas. Por outro lado, é uma zona onde a amoreira sempre se deu bem, a ponto de permitir a criação em larga escala do bicho-da-seda.

Vista da cidade de Castelo Branco

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Jardim do paço Episcopal

em tantos outros locais do país. No século XIX, muitos particulares e a própria Câmara Municipal aproveitaram as pedras desse palácio para as suas construções. Só no século XX se olhou com a devida atenção para todo este património, restaurando-se o castelo e protegendo-o legalmente. Castelo Branco vale vela história e pela paisagem. É difícil descrever o Jardim do Paço Episcopal, tal a sua beleza. O patim principal tem cinco lagos e a estátua de S. João Batista. No patamar intermédio destaca-se o Lago das Coroas e, em lados opostos, as escadarias dos Reis e dos Apóstolos. O terreno e o divino

cruzam-se na perfeição. No patim superior fica a Escadaria de Moisés e o grande tanque que abastecia os repuxos e todo o Jardim.Mandado construir pelo Bispo da Guarda D. João de Mendonça, no século XVIII, este espaço idílico é um dos mais originais exemplares do barroco em Portugal. Os sinos da imponente Torre do Relógio marcam o dia-a-dia dos habitantes da cidade. Há que subir bastante para chegar ao Miradouro de S. Gens, perto do castelo, mas vale a pena: de lá contemplamos o centro histórico, as encostas Sul da Serra da Gardunha e, mais ao longe, a Serra da Estrela.

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Castelo de Ródão.

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A sentinela das Portas de Ródão

Ainda há muito para descobrir sobre o castelo de Vila Velha de Ródão. Texto: Lino Ramos Fotografias: Geopark Naturtejo

Castelo de Ródão, Castelo das Vila Ruivas, Castelo do Rei Vamba. Todos estes nomes referem-se à mesma fortaleza, da qual resta uma torre, construída presumivelmente nos séculos XII e XIII, por iniciativa da Ordem do Templo, que detinha este território nas primeiras décadas da monarquia. A muralha está bastante destruída. Muito perto fica a Capela de Nossa Senhora do Castelo, essa sim mais bem conservada. Também lhe chamam Castelo das Portas, por estar no topo de uma das Portas de Ródão, uma

formação geológica que é dos mais belos monumentos naturais do país. As escarpas de rocha parecem duas portas que se abrem para deixar passar o Tejo. A fortaleza teria, por isso, alguma importância na defesa do rio e da fronteira com Espanha, mas muito desse papel bélico continua por desvendar. Sabe-se que a estrutura foi intervencionada nas épocas moderna e contemporânea, em particular durante as invasões francesas. Há cerca de 6 mil anos que as primeiras comunidades agro-pastoris estabeleceram-se nas charnecas

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Portas de Ródão.

envolventes do Tejo, construindo dezenas de povoados e monumentos funerários, as antas. Mais de 25 mil gravuras, dispersas ao longo de 40 km de ambas as margens, representam símbolos geométricos, antropomórficos e zoomórficos – o Complexo de Arte Rupestre do

Tejo é um dos mais importantes da Europa. Actualmente, a maioria delas encontra-se submersa pela albufeira da Barragem de Fratel, sendo visíveis apenas na área de Perais e a jusante da Barragem de Fratel. Os vários povos que se seguiram aproveitaram da melhor forma a

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riqueza natural, principalmente os romanos, que exploraram o cobre e o ouro de aluvião, como provam as margens dos rios Tejo e Ocreza. Enquanto isso, nas planícies aluviais do Açafal e do Lucriz cultivavam os terrenos agrícolas que abastecem de cereais as hordas de escravos

utilizados na mineração. No entanto, o património desta terra é muito mais antigo, tem cerca de 600 milhões de anos, a idade dos fósseis de trilobites e bivalves que encontramos nas rochas de xisto e quartzo – são testemunhos de um mar antigo que chegava até Ródão.

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