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PERSONALIDADE: J. ASTREVO

CARLOS ROBERTO FERREIRA Mestre em Estudos de Cultura Contemporânea pela UFMT, ator e diretor teatral e professor efetivo de arte da rede pública de ensino de Mato Grosso. E-mail: robertoferreira.cultura@gmail.com

J. Astrevo Trajetória de um Astro do Humor Luz geral na cena teatral para o ator negro mais popular de Mato Grosso, J. Astrevo Aguiar. Graduado em letras pela UFMT, onde foi professor substituto, especialista em Planejamento e Gestão Cultural pela UNIC, ator, músico-compositor, escritor, diretor e autor de textos teatrais, sai do vilarejo de Rio dos Couros para se revelar pro mundo das artes como o maior comediante da atualidade

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lume MatoGrosso COMO SE DEU O SEU REBENTO NO TEATRO NA CAPITAL MATOGROSSENSE? » Foi no ginásio, frequentando a Escola Estadual Padre Ernesto Camilo Barreto, que tive o meu primeiro experimento com a atividade artística. Nilva, uma Professora de Educação Artística, que muito incentivava o exercício com as artes no ambiente escolar, dividiu a sala em vários grupos, para que cada um escolhesse que tipo de arte iria experimentar. Por afeição, fiquei no grupo onde estava o meu melhor amigo, o João César, e por influência dele, resolvemos fazer um esquete de teatro. Com a direção dele, ensaiamos o esquete e apresentamos na sala de aula. Dado ao grande entusiasmo e surpresa da professora com a destreza natural de uma criança tímida, providenciou uma apresentação do trabalho, desta vez, para os alunos da escola, na hora do intervalo. Essa apresentação foi decisiva para que eu, Justino Astrevo Aguiar se transformasse mais tarde no artista, J. Astrevo.

10 O QUE TE LEVOU A PERCEBER QUE ESSA PRIMEIRA EXPERIÊNCIA CÊNICA, PUDESSE SE REVELAR COMO UM CAMINHO DO TEATRO PARA A SUA VIDA ADULTA? » Foi o encantamento da relação com o público que me fez descobrir uma possibilidade até então, abso

lutamente desconhecida. A partir dessa apresentação, fundamos o Grupo Folhas. Entre os anos de 1980 e 81, apresentávamos sempre nas datas comemorativas, como dia das mães, dos pais, festas de São João e Natal. A partir daí fui tomando gosto pela arte de representar, talvez até para fugir de minha extrema timidez.

A SUA MILITÂNCIA NO TEATRO MATO-GROSSENSE, SEMPRE FOI DE GRANDE DESTAQUE. A PARTIR DE QUANDO VOCÊ COMEÇA A SE DEDICAR ÀS QUESTÕES DA POLÍTICA TEATRAL? » Em 1.980, o ator e diretor Amaury Tangará, então presidente da Federação Mato- -grossense de Teatro, ao assistir uma apresentação do grupo Folhas, nos convidou para ingressarmos na Federação de Teatro. A partir daí começamos a participar de congressos, reuniões, debates, a assistir mais apresentações de outros grupos teatrais, a ler sobre teatro e a fazer as oficinas que a Federação oferecia, entre elas, as de interpretação e direção teatral. Com isso, aquele universo cada vez mais, ocupava o tempo e a cabeça do jovem ator, J. Astrevo.

ENTÃO, A SUA PARTICIPAÇÃO NA FEDERAÇÃO MATOGROSSENSE DE TEATRO, FOI DE GRANDE ÊXITO? » Em minha estada na entidade, ajudei a conseguir a sua sede, trouxe o interior do estado para participar mais ativamente do movimento na capital, concebi e organizei mostras e festivais de teatro e interiorizei as ações da Federação. A efetiva participação no movimento teatral do estado me levou a assumir a diretoria de programação da Federação Mato-grossense no biênio 1989 a 1991, gestão presidida pelo ator e educador José Ferraz de Araújo. A partir do empenho nesse trabalho federativo, fui eleito Secretário da CONFENATA – Confederação Nacional de Teatro, em 1994, gestão que se estendeu até 1996. Esse trabalho teve por missão, reaglutinar as federações estaduais e mobilizar o circuito teatral no Brasil a partir de novas iniciativas, como congressos, seminários e work shops. Nessa gestão, organizamos um Congresso Nacional de Teatro em Goiânia, Circuito Regional Centro Oeste e parceria com a Fundação Nacional das Artes Cênicas para viabilização de projetos de incentivos a produção teatral no Brasil.

O SEU TRABALHO COMO DIRETOR E AUTOR TÊM PRESENÇA SIGNIFICANTE NO TEATRO MATOGROSSENSE. QUANDO VOCÊ COMEÇA E SE ENVEREDAR POR ESSE CAMPO E O QUE JÁ PRODUZIU NESSA ÁREA? » Em 1981, o grupo Folhas montou: Society Tropical - a primeira peça por mim es

crita e dirigida que, a partir daí passei a utilizar o nome artístico, J. Astrevo. Assumindo a direção do Grupo, exercitei mais a minha veia de escritor que já se aflorava. Esse fato foi fundamental na decisão de cursar Letras na Universidade Federal de Mato Grosso. Queria, sobretudo, aprimorar a minha escrita e dar vazão a minha paixão pelas letras. Em 1986, escrevi e dirigi a peça Enquanto Florescem Os Campos, obtendo patrocínio do Ministério da Cultura, por meio de concorrência pública que a antiga FUNDACEN – Fundação Nacional de Artes Cênicas realizava. A montagem foi classificada em primeiro lugar no Festival Regional no ano seguinte, por conta dessa deferência, foi representar Mato Grosso no Circuito Centro-Oeste de Teatro, fazendo temporada em Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal.

Em 1.988, escrevi e dirigi a peça Fantasmas & Vinhos, também patrocinada pelo Ministério da Cultura. Este texto já continha a clara influência dos estudos realizados nos bancos da Universidade, seja por seu caráter literário, seja pelo padrão estético proposto. Foi o primeiro espetáculo que melhor repercutiu junto ao público da capital. O teatro já não estava tão vazio. Fato que permitiu a nossa permanência em cartaz por dois anos.

ISSO SIGNIFICA ENTÃO QUE, A SUA PASSAGEM PELA ACADEMIA, TRANSFORMOU A SUA VIDA DE AUTOR E DIRETOR EM EXPRESSIVO INTELECTUAL? » O tempo que passei na Universidade foi um dos períodos de maior produtividade intelectual, e, foi lá também que me transformei em J. Astrevo. Escrevi os seguintes textos para teatro: Nave Errante, Lua Minguante, Um Trem Expressionista, Encruzilhada e Último Baile de Verão.

No campo da produção artística, paralelo ao trabalho do Grupo Folhas, adaptei, dirigi e sonorizei o monólogo Homem do Barranco, a partir de texto monográfico composto pelo ator e Arte-educador Carlos Ferreira. Esse espetáculo foi extremamente vitorioso. Recebeu dezesseis prêmios, dos quais oito foram em festivais nacionais e outros oito em festivais regionais, tendo sido representado para além de Mato Grosso, em Santa Catarina, São Paulo, Minas Gerais e Piauí. Essa foi a primeira incursão verdadeira de J. Astrevo na temática regional, uma viagem apaixonante pelos matizes da cul lume MatoGrosso

12 tura local. Essa peça ficou em cartaz por quatro anos, de 1995 a 1999.

Ainda de forma paralela na mesma época roteirizei, dirigi e atuei no musical regional Rapsódia Verde, ao lado de dois grandes músicos: Pescuma e Hélio Pimentel. Esse musical era composto por causos, músicas e poemas dos mais ilustres escritores mato- -grossenses, como: Silva Freire, Dunga Rodrigues, Dom Aquino Correa e Moisés Martins. Daí surgiu a parceria com o violeiro Hélio Pimentel que chegou a participar da primeira fase do trabalho de Nico e Lau e a amizade com Pescuma, que realizou um trabalho importante, de inovação no chamado Rasqueado Cuiabano. Esses anos de atuação artística me renderam diversas deferências, como títulos, moções de aplausos e prêmios para ator, diretor e escritor.

NO QUE SE REFERE A ESTUDO, FORMAÇÃO E CAPACITAÇÃO NA ÁREA TEATRAL, O QUE VOCÊ NOS CONTA? » Em 1985, tive uma experiência artística bastante significativa para a minha carreira. Participei do curso Liberte Seu Talento, Faça Teatro, promovido pelo Grupo Andanças de Teatro, umas das maiores expressões cênicas do Centro-Oeste naquela época, dirigido por Amaury Tangará. A convivência com outros grupos, atores e produtores já consagrados no estado, que ministraram as oficinas do referido curso, me influenciaram a decidir exatamente o que eu queria da minha vida: viver para o teatro. Atuando, escrevendo ou dirigindo, era naquele universo que gostaria de orbitar. Outro benefício resultante da participação no curso foi a minha contratação para pertencer ao quadro de funcionários da Casa da Cultura. Trabalhar naquele ambiente de gestão e fomentação cultural, ao mesmo tempo provinha-me o sustento e me colocava em permanente contato com a produção cultural existente.

E QUE CURSOS DE FORMAÇÃO, ESPECÍFICOS EM TEATRO, VOCÊ FREQUENTOU? » Frequentei vários cursos nas diversas áreas do teatro, como: Dramaturgia Brasileira; ministrado por João das Neves na capital Federal. Interpretação; ministrado pelo ator Cacá de Carvalho, Interpretação Teatral; ministrados pela Bia Lessa e Tonico Pereira e Teatro de Rua com Amir Haddad, todos na Universidade Federal de Mato Grosso. E ainda, participou de vários cursos de qualificação profissional, dentre eles: Oficina de Interpretação com o ator Rubem Correa, Projeto Mergulho Teatral no Rio de Janeiro com oficinas de Dramaturgia com o autor Alcione Araújo; Temática Regional com Márcio Souza; Espaço Cênico com Robson Jorge; Interpretação com Luís de Lima; Teatro, Exercício de Paixão com o ator Sérgio Brito e Expressão Vocal com Maria Helena Kropf.

Nesse período ganhei notoriedade artística, e as montagens sucederam-se de forma ininterrupta: Último Baile de Verão, em seguida, veio o espetáculo de variedades: Balada Para Diagnosticar Dementes. Entre 1991 e 1992 montei três espetáculos de minha autoria, quase que paralelamente, peça infantil: Ducatiribute, e as comédias: Balada Para Diagnosticar Dementes 1¹/² e Traído. NESTE ANO DE 2016, VOCÊ COMPLETA 21 ANOS DE DEDICAÇÃO AO PERSONAGEM LAU, NA DUPLA NICO & LAU. QUANDO E COMO SE DEU O SEU PRIMEIRO CONTATO DE AMIZADE E DE TRABALHO COM O ATOR, LIONIÊ VITÓRIO? » Em 1989, no teatro da antiga Escola Técnica, assistindo ao espetáculo Sinfonia Poética em Drummond Maior em companhia do amigo e companheiro de grupo o ator Leal Tadeu. Ao ver Lioniê em cena, tomamos a decisão de convidá- -lo para integrar a montagem da peça Último Baile de Verão de minha autoria. Traído foi a primeira peça em que participei como intérprete, juntamente com Lioniê Vitório e dirigida por Leal Tadeu. Certamente, ali surgiu a química que alimentou a possibilidade de trabalharmos em dupla.

QUE TRABALHO DE DESTAQUE, NESSE COMEÇO DE CARREIRA, VOCÊS PRODUZIRAM JUNTOS? » A partir de 1993, junto com Lioniê, passamos a ocupar a Praça da República, num período de dez dias, todas as noites a partir das 22:00h, realizando uma série de experimentações. Numa delas, Lioniê Vitório foi abordado e agredido fisicamente por um policial, acusando-o de estar agindo sob efeito de drogas. Fato inverídico. A performance foi interrompida, mas a experiência gerou um trabalho absolutamente inusitado na dramaturgia mato- -grossense: o espetáculo cênico Pressão Baixa. Este foi certamente o primeiro espetáculo experimentalista de Mato Grosso. Era uma instalação com a inserção de teatro com vídeo e tinha um texto conceitualmente expressionista. Essa montagem, de minha autoria e direção, foi premiada no Festival Mato-grossense de Teatro, no Festival Regional local e no Festival Nacional de Teatro Universitário de Blumenau- -SC em sua 9ª edição. Pressão Baixa influenciou outros grupos de teatro em Cuiabá, que também começaram a realizar pesquisas e montar espetáculos experimentais. Com essa peça se encerrou o ciclo de existência da Folhas Produções. lume MatoGrosso

13 QUANDO É QUE SURGE, ENTÃO, O PERSONAGEM LAU NA SUA VIDA? » Em 1995, juntamente com Lioniê Vitório, recebemos um convite que mudaria radicalmente a nossa vida. A experiência trazida dos palcos de teatro se estenderia então para os estúdios de televisão. O convite partiu da jornalista Cida Capelassi, diretora do programa revista da Manhã exibido diariamente pela TV Gazeta, hoje Record, para prestar homenagem à cidade de Cuiabá, era 08 de abril de 1995. No referido programa, nós aparecemos mesmo, de J. Astrevo e de Lioniê Vitório, sem nos

tra vestirmos em nenhuma personagem. Na ponta da língua, dois causos para contar e ao lado, o violeiro Hélio Pimentel para fazer o fundo musical. Uma receita muito comum inspirada nos antigos saraus guardados nas reminiscências cuiabanas. Oito minutos ao vivo: uma oportunidade de se mostrar para um grande público através da linguagem do humor, construindo uma releitura da tradição da literatura oral. E COMO SE DEU A INTERVENÇÃO E APARIÇÃO DE VOCÊS, DE FORMA MAIS FIXA, NA TELEVISÃO? » Ao final de quatro aparições específicas, por indicação feita ao vivo pelo jornalista Edivaldo Ribeiro, que era um dos apresentadores do programa, a direção da emissora nos formulou a seguinte proposta: “Transformar aquelas aparições num quadro semanal de oito minutos,

para ir ao ar sempre às quartas-feiras, dentro do programa Revista da Manhã. A contrapartida era o uso da mídia para promoção dos nossos trabalhos de atores”. Foi então que tomaram uma decisão importante: estruturar personagens para o quadro. Com trejeitos, figurinos e fala que caracterizassem o homem cuiabano e o pantaneiro, de forma vigorosa e espontânea que parecesse natural e verdadeiro. Ali surgiram Nico e Lau. Interpretando Lau, permaneci sete anos na TV Gazeta nos programas Porteira Aberta e Ser...tão Mato-grossense. Lá, ao lado de Lioniê, conquistei popularidade e me firmei como autor, diretor e ator. Em 2005 transferi para a TV Centro América, continuando e ampliando o trabalho de Nico e Lau.

Neste ano de 2016, completo 21 anos interpretando a personagem Lau, mantendo uma média de 70 apresentações anuais, entre shows abertos e espetáculo de teatro.

NO CAMPO DA POLÍTICA CULTURAL PÚBLICA, VOCÊ PASSOU PELA GESTÃO DA SECRETARIA DE CULTURA DE CUIABÁ. COMO ISSO SE DEU E QUE DESEMPENHO VOCÊ PROFERIU NA PASTA? » Foi a convite do então prefeito Roberto França, assumi em 2001 como

Sub-secretário de cultura de Cuiabá. E, pelo meu desempenho e dedicação no trabalho como pensador e executor de ações propostas pela Secretaria, fui elevado a Secretário de Cultura em meados de 2003, onde permaneci até dezembro de 2004.

Na qualidade de Secretário, implementamos programas e projetos importantes, focando a cultura popular, o folclore e a música regional. Ampliamos o Festival de Siriri, realizamos o 1º Festra - Festival de Rasqueado, retomamos o Projeto Rua do Rasqueado, democratizamos o uso dos recursos provenientes da Lei Municipal de Cultura, reformamos o prédio da antiga biblioteca pública e do clube feminino e restauramos a antiga Casa do Alferes, hoje MISC - Museu de Imagem e Som de Cuiabá. E, no estado, fui Secretário Adjunto de Cultura de Mato Grosso entre 2011 e 2012.

É POSSÍVEL FAZER UM RESUMO DE TODA A SUA PRODUÇÃO ARTÍSTICA JUNTO À DUPLA, NICO & LAU, NESSES 21 ANOS DE TRABALHO ININTERRUPTO? » Ao todo foram 20 comédias escritas e encenadas. Algumas de maior destaque: A Casa Assombrada; Quem cochicha o rabo espicha; O Golpe; Bico Calado; Preto no Branco; Pega Inteligência; Na ponta da língua; Abafa o caso; Mingana queu gosto!; Piadeiros Marvados; Ribuliço no Reinado; Perdeu Pleyboy. Criei e organizei ao lado de Lioniê Vitório o Festival Nacional do Humor: Humor do Mato e Ataque de Riso – Festival Regional.

Cinco CDs produzidos e lançados: 1998 – Dança do Lambari; 2001 – Arripiá; 2004 – Acho que to apaixonado; 2007 – Agitando na Balada e o último, Bem na foto, sendo um total de 30 músicas gravadas.

Tenho autoria em quatro revistas em quadrinhos: Nico e Lau em quadrinhos; Ministério Público – Agora o quê qué esse?; Parasitose – Jogue limpo com a saúde e Trabalho Infantil, não tem graça nenhuma. Temos três DVDs gravados: O Jogo – curta metragem de 20 minutos; O Golpe – Comédia teatral adaptada para vídeo e Bico Calado – Comédia teatral adaptada para vídeo.

Ao longo de 21 anos são mais de 300 Peças Publicitárias para empresas como City Lar, Unimed, Modelo Supermercado, Ong WWF Brasil, Drogaria América, entre várias outras.

Participamos também de 116 Vídeos do MINUTO DO HUMOR; 80 Vídeos do PAPO CABEÇA e no Cinema, atuação nos filmes: A OITAVA COR DO ARCO-ÍRIS – Amauri Tangará; PARABÉNS VICTOR de Léo Santana; A MORTE DO TOUREADOR de João Lucídio e Roteiro e Atuação em CANHAIN, UMA AVENTURA SINISTRA.

VOCÊ CONSEGUIRIA DESCREVER O QUE REPRESENTA PRA VOCÊ HOJE, A DUPLA, NICO & LAU? » A dupla Nico e Lau para mim hoje, representa a consagração de um formato baseado na teatralidade, na comunicação espontânea e na força da cultura popular do interior do Brasil. A sedimentação de uma carreira artística que conquistou o privilégio de ser representação simbólica da chamada cultura cuiabana. lume MatoGrosso

15 VOCÊ ESTÁ NO SEU SEGUNDO CASAMENTO COM UM SALDO DE QUATRO FILHOS, QUE LEGADO VOCÊ PASSA A ELES COM O SEU TRABALHO? » Acho que meu trabalho já está entranhado na percepção de mundo dos meus filhos. Do modo como vêem a vida e o que escolheram para seguir como filosofia e atuação profissional. O legado da luta persistente, da crença orgânica na realização dos seus sonhos, da ideologia colaborativa e de muito trabalho para conquistar algum resultado. Dois já atuam no mundo arte e cultura: Dríade Aguiar e Matheus de Luca, e outros dois: Raul Guilherme e Nathália Aguiar, ainda têm tempo para serem contaminados.

Poconé Num canto de seu território e atento ao presente dos céus está o povo poconeano, observando, examinando detidamente e consagrando sua atenção nas águas, terras e ares pantaneiros

Omunicípio de Poconé faz parte da região de planejamento Vale do Rio Cuiabá e da Amazônia Legal e foi criado em 25 de outubro de 1831, com área proveniente do município de Cuiabá. É formado pelos distritos Sede, Cangas e Fazenda de Cima.

Trata-se de uma das cidades com maior potencial turístico do estado de Mato Grosso, dispondo de boa

infraestrutura de apoio a estas atividades, possuindo, ainda economia fortalecida pela pecuária e agricultura. O encanto e a magia do Pantanal poconeano residem na exuberância de sua paisagem aberta, de grandes espaços, emoldurando o espetáculo da natureza. As águas refletindo o céu azul e as nuvens claras, as aves em revoada à cata de alimento, em repouso ou em cismas indevassáveis, os bichos cuidando da vida, passeando ou descansando convidam à contemplação. Observar a paisagem pantaneira é sempre comovente, comunicando incrível sensação de paz e plenitude.

HISTÓRIA O núcleo inicial de povoamento, do qual originou-se o atual município de Poconé surgiu por volta de 1777, devido à descoberta de ricos veios auríferos aluvionais. Ao povoado que se formou em torno das lavras garimpeiras deram o nome de Beripoconé, numa referência ao povo boróro que habitava esta região desde tempos imemoriais.

Apesar da precariedade de comunicação da época, a abundância de ouro atraiu muita gente à região. A descoberta das lavras de Ana Vaz, Tanque do Padre, Tanque do Arinos, Lavra do Meio, Tereza Botas e outras, provocou desenfreada corrida ao ouro vil.

O primeiro nome da cidade foi São Pedro d´El Rey, numa homenagem a Dom Pedro III, Rei de Portugal, oferecido pelo capitão general Luiz de Albuquerque Pereira e Cáceres, fundador de Poconé. Com o passar dos tempos ocorreu certa decadência na produção aurífera, ocasionando debandada de garimpeiros para outras paragens, alguns dedicando-se, inclusive à cata de diamantes. lume MatoGrosso

17 RESSURGIMENTO DA GARIMPAGEM DE OURO Uma situação alarmante para as pessoas que realmente tem preocupação ambiental é a frenética retomada da mineração aurífera na cidade de Poconé. O município surgiu sob os auspícios da lida garimpeira, no entanto, os tempos e os valores são outros.

A redescoberta de ricos veios auríferos no final da década de 1980, fez ressurgir a efervescência garimpeira aos moldes do tempo em que surgiu Beripoconé, no século XVIII.

Neste contexto, muita gente passou a buscar na garimpagem do ouro um meio de sobrevivência, objetivando melhores condições de vida, porém estão exercendo a atividade na margem da rodovia que dá acesso ao Pantanal. Até parece brincadeira, mas não é. Mobilizaram-se nesta lida os peões e vaqueiros, que deixaram o trabalho no campo pela aventura garimpeira, sem contar empre-

lume MatoGrosso sários, políticos e fazendeiros que passaram a capitalizar lucros mais significativos na produção aurífera. Desta forma, qualquer pessoa que queira ganhar dinheiro, basta simplesmente arrendar um garimpo em atividade na cidade e faturar milhares de dólares diariamente, visto que é atividade pouco ou quase nada controlada pelos organismos oficiais do Estado e da União.

18 O PANTANAL DE POCONÉ O Pantanal é considerado a maior reserva ecológica do Mundo, manifestado pelo título de Patrimônio da Humanidade, dado pela UNESCO. Este verdadeiro patrimônio ecológico, habitado por incontáveis espécies de mamíferos e répteis, de aves e peixes, tem uma vegetação exuberante e é traduzido em movimento de formas, cores e sons, sendo um dos mais belos espetáculos da Terra.

Em qualquer época o Pantanal de Mato Grosso é interessante, no entanto, se divide em dois momentos bem distintos, a época da cheia e a da seca:

Período de Cheias: de dezembro a março. O período começa com o transbordar das águas dos rios pantaneiros, obrigando os animais a buscar as áreas mais elevadas do terreno, as cordilheiras. Esta é a melhor época do ano para se ver a plenitude do Pantanal com vastos campos totalmente alagados, onde se destaca

toda a beleza da flora pantaneira. Nesta época podem ser avistadas as mesmas espécies de animais que se veem na época da seca só que em grupos menores e mais espalhados.

Período da Seca: de junho a novembro. O período se inicia quando as águas baixam retornando aos leitos dos rios deixando os campos secos. A planície volta a ter o leito de seus rios definidos e várias lagoas aparecem e que com o passar dos dias podem secar totalmente. Durante este período, nestas lagoas encontramos uma grande concentração de animais se alimentando e se reproduzindo.

TRANSPANTANEIRA Anualmente milhares de turistas de todas as partes do mundo visitam Poconé e se encantam com sua flora e fauna, além de certas peculiaridades como a estrada Transpantaneira e suas incontáveis pontes. É verdadeiramente emocionante o espetáculo natural e a magia que esse caminho proporciona. Durante a seca, milhares de animais se concentram nas laterais alagadas da pista, onde podem ser vistos, bem de perto, jacarés, cobras, gaviões, tuiuiús, tucanos e araras, e se o turistas tiver sorte pode até avistar o imponente cervo do pantanal.

A rodovia Transpantaneira possui extensão de 145,3 quilômetros. Esta via atravessa o Pantanal mato-grossense a partir de Poconé e termina em Porto Jofre, na divisa com Mato Grosso do Sul. A Transpantaneira, MT-060, foi idealizada como representação de progresso e expansão do Estado de Mato Grosso. O engenheiro Gabriel Müller foi um dos mais entusiastas em prol da construção da rodovia, tendo sido seu dirigente. O objetivo era transformar Poconé num centro irradiador de economia, já que o projeto inicial da rodovia previa sua extensão até a cidade de Corumbá, no Estado de Mato Grosso do Sul, permitindo escoamento de safras de todo estado mato-grossense, possibilitando o transporte fluvial, via Rio Paraguai.

Mas, registros históricos nos dão conta de que as coisas não saíram exatamente como foi idealizado. Consta que o projeto de construção da rodovia Transpantaneira foi realizado através de projeto técnico científico adequado. No entanto, cortar o Pantanal através de uma rodovia poderia ser traduzido em prejuízo incalculável ao ecossistema regional e ao homem pantaneiro. Ainda nos dias de hoje, há quem deseje retomar o projeto de término da rodovia Transpantaneira, indo até as fraldas do Morro de Urucum.

O fato é que a Transpantaneira é um dos pontos turísticos mais procurados no município, pois em qualquer período do ano é possível observar pássa-

lume MatoGrosso ros e animais que cruzam a rodovia como se estivessem (e estão) no quintal de suas casas. Falta mais interesse por parte das autoridades constituídas em realmente transformar a rodovia, que foi criada como Rodovia Parque, numa “Rodovia Parque de Verdade”.

O CAVALO PANTANEIRO

O Cavalo Pantaneiro possui características próprias adquiridas ao longo de quatro séculos, quando da sua chegada ao Pantanal e posterior aclimatação ao meio complexo e hostil em que se desenvolveu. O

cavalo Pantaneiro é um mosaico racial, originariamente resultante de dois troncos primitivos étnicos: “EquusCaballusAsiáticus” e o “EquusCaballusAfricanus”. O Cavalo Pantaneiro é um patrimônio histórico que cooperou na fixação do homem no Pantanal e em todo território mato-grossense, e é também um fator econômico-social, porque a totalidade da população que habita o Pantanal, tem nele importante meio de transporte, sobretudo nas cheias, e sua mais importante função econômica se faz sentir junto à bovinocultura. CENTRO HISTÓRICO

O Centro Histórico de Poconé possui área tombada de aproximadamente 17 mil metros quadrados e uma área de preservação de entorno, de aproximadamente 28 mil metros quadrados. A importância do Centro Histórico está relacionada à forte presença do homem pantaneiro e sua preservação propiciará a propagação para futuras gerações dos costumes e da cultura do homem pantaneiro. A sua preservação é dever de todos, assim como sua valorização é obrigação do poder público local, não devendo, portanto, ser esquecido, e sim conservar as características arquitetônicas do seu casario do período colonial.

CASARÃO DE COTIA

Trata-se de um dos mais importantes imóveis do período colonial em Poconé, localizado na rodovia que liga a cidade à N. S. do Livramento. Ao longe, da estrada, já se destaca o casarão pela exuberância da construção datada de 1800. As paredes foram feitas de adobe, barro socado e capim ondeos detalhes da arquitetura revelam os traços da cultura portuguesa. As circunferências, portas e janelas largas feitas com madeira nobre resistem ao tempo. Tudo levantado pelo trabalho escravo. O casarão foi construído no caminho para o garimpo. Por isso recebia muitos via-

jantes que dormiam em sua área externa. Outra curiosidade é que o local também serviu de ponto de abastecimento de alimentos para os soldados que participaram da Guerra do Paraguai entre 1865 e 1870. Na capela Nossa Senhora Abadia ao lado do casarão eram realizados os batizados e casamentos da época.

Anos mais tarde, o local passou a ser usado para projetos sociais.

CULTURA

As tradições culturais estão vivas no município de Poconé. Existe desejo por parte da sociedade em conservar as características originais de festas, danças, comidas típicas e das manifestações de fé. As manifestações folclóricas ocorrem durante as festas de São Benedito e de Nossa Senhora do Rosário, que é padroeira da cidade, porém podem ser vistas também em outras oportunidades.

As comemorações dos festejos folclóricos são realizadas com missas, churrascos, bailes, danças, comidas típicas e quermesses. Como parte de divulgação e preservação da cultura popular são cultivadas as danças do cururu, siriri, dos mascarados e cavalhada. Dentre outras atividades culturais se destacam os trabalhos artesanais feitos com os ramos de tecelagem, urubamba, madeira, couro e chifre, crochê e tricô, além do fabrico de doces e vinhos e da música poconeana.

21 DANÇA DOS MASCARADOS É dança típica do município de Poconé, mescla de contra-dançaeuropéia, danças indígenas e ritmos afros. Sua grande peculiaridade é ser dançada exclusivamente por homens, sendo que metade deles usa trajes masculinos e a outra metade porta indumentária feminina. Os dançarinos cobrem seus rostos com máscaras coloridas, assim como são vivamente vibrantes as cores

de suas vestimentas, usando chapéus com plumas, espelhos e outros enfeites, desempenhando função de damas e de galãs. O Bando ou Mascarados é composto por um marcante, doze pares e três balizas (três galãs na frente do grupo de mascarado carregando o mastro). A apresentação se divide em 12 partes: cavalinho é a entrada, depois se seguem a primeira e a segunda quadrilha, trança-fita e Joaquina, Arpejada, caradura, Maxixe de Humberto (assim denominada porque foi inventada pelo músico Humberto, da Banda dos Mascarados), carango, lundu e, por fim, a retirada. A Dança dos Mascarados de Poconé não se assemelha a qualquer dança encenada no Brasil, sendo misteriosa sua origem. Por estar bastante difundida, a Dança dos Mascarados é referência não apenas em Mato Grosso, mas no Brasil, permitindo que seus dançarinos e músicos se apresentem em feiras estaduais e nacionais onde recebem convites especiais para sua apresentação.

CAVALHADA

Trata-se de um dos maiores eventos culturais do estado de Mato Grosso, que acontece todos os anos nas primeiras semanas de junho, durante as festividades alusivas ao glorioso São Benedito.

O evento é realizado na pista oficial, localizada na

parte alta da cidade, no clube Cidade Rosa, que durante o evento torna-se um grande campo de batalha entre cavaleiros Mouros e Cristãos que preservam a continuidade de uma tradição que ocorre há vários anos sendo praticada desde a origem de Poconé.

A Cavalhada é uma batalha fictícia travada entre mouros e cristãos. Para que seja realizada, são utilizados dezenas de cavalos e cavaleiros, que se engalfinham, com o principal objetivo de salvar uma princesa, que está presa numa torre de castelo, permanentemente vigiada.

Esta tradição vem sendo mantida através dos tempos, apesar de inúmeras dificuldades encontradas.

FESTA DO SENHOR DIVINO A devoção ao Divino Espírito Santo no Brasil tem raízes lusitanas e foi trazida ao solo Brasileiro pelos colonizadores. E Poconé é uma das poucas cidades Brasileiras que pode se orgulhar de manter esta tradição. A festa do Divino é caracterizada pela novena, que antecede ao festejo, tendo duração de uma semana, que é recheada de muito barulho, com show pirotécnico, alvorada festiva, shows populares, cantos, visitas da bandeira aos lares das famílias poconeanas, e é considerada como uma benção de confraternização, acima de tudo, de devoção e fé.

TURISMO

A cidade de Poconé é o Portal de Entrada do Pantanal de Mato Grosso.

Quem visita o Pantanal compreende a necessidade de conservar e proteger esse patrimônio inigualável, que a natureza reservou ao homem. A planície pantaneira é composta basicamente de campos e áreas inundáveis que abrigam, entre outros animais, jacarés, capivaras, antas e várias espécies de aves, incluindo o tuiuiú, pássaro símbolo da região. A presença de lagoas de água salgada gera especulações e explicações. Arqueólogos e geólogos discutem a possibilidade desta região ter sido coberta pelo mar, há milhões de anos, ou ainda, pode-se dizer que as águas salgadas podem ser consequência da concentração de sais minerais presentes na água depois da evaporação, no período da seca. Durante as vazantes ou nas baías, os jacarés dominam a paisagem. Quase invisíveis no meio dos aguapés, eles ficam de tocaia durante horas à espera de uma garça, de um socó ou de uma jaçanã, para variar o cardápio que comumente se constitui de peixes.

Uma das atividades turísticas mais desenvolvidas no Pantanal é a focagem noturna de jacarés, feita em barcos pelos inúmeros rios.

O Parque Nacional do Pantanal Mato-Grossense, com área de 135.000 ha, localiza-se no extremo sudoeste de Mato Grosso, na confluência dos rios Paraguai e Cuiabá, pertencendo ao município de Poconé. É a região mais selvagem do Pantanal, oferecendo o espetáculo de sua fauna com jacarés, onças, capivaras, jaguatiricas, tucanos, garças, tuiuiús, além de inúmeros peixes. A flora também é muito rica. O acesso ao parque só é feito de barco, e o Centro de Visitantes fica em Poconé.

TURISMO DE AVENTURA

O conceito de turismo de aventura fundamenta-se em aspectos que se referem à atividade turística e ao território em relação à motivação do turista, pressupondo o respeito nas relações institucionais, de mercado, entre os praticantes e com o ambiente. Como estes esportes envolvem emoções e riscos controlados, o uso de técnicas e equipamentos específicos, a adoção de procedimentos para garantir a segurança pessoal e de terceiros e o respeito ao patrimônio ambiental e sócio-cultural são exigências do mercado.

Exatamente neste contexto se encaixou o projeto ULTRA MACHO, que em novembro último levou milhares de pessoas à Poconé, para participar de uma aventura multiesportiva no Pantanal. Foi o encerramento de um circuito de provas extremamente competitivas que ocorreu no ano de 2015, que os atletas participantes classificaram como o melhor de todos os eventos realizados pela empresa que criou o projeto, há cerca de 5 anos, em Mato Grosso, e dirigida por Maria Rita e Tomio Uemura, empresários do setor de esporte e turismo de aventura no estado. lume MatoGrosso

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