Edição 17

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Impresso Especial 9912247598/2009-DR/BA CRIARMED

UM Embate anunciado

DECISÃO DA ABIMED DE INGRESSAR NA JUSTIÇA CONTRA A ANVISA ELEVA O TERMÔMETRO DE UM MERCADO REFÉM DA MOROSIDADE PÚBLICA

OS DESAFIOS DO OBAMACARE

MICHAEL PORTER EM ARTIGO INÉDITO

ANS: HOSPITAIS VÃO GANHAR RANKING Diagnóstico |set/out 2012

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ANO IV Nº 17 |SET/OUT 2012

anvisa x indústria

DISTRIBUIÇÃO DIRIGIDA

a Revista dos Líderes da saúde do brasil


A MÃO DE OBRA ESPECIALIZADA PARA EMPRESAS DE SAÚDE. SÓ A LIBER TEM.

04 Diagnóstico | set/out 2012

(81) 2138.8488 | liberonline.com.br


SUMÁRIO

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Divulgação

ENTREVISTA

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Bruno Sobral Diretor de Desenvolvimento Setorial da ANS explica como funcionará o Qualiss, programa de monitoramento criado pela Anvisa

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bRUNO sOBRAL, DA ANS, e a estreia do qualiss

ENSAIO

INTERNACIONAL Obama Care Presidente reeleito precisa encarar o desafio de pôr em prática a maior reforma já feita no sistema de saúde americano Banco de Imagens

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Práticas organizacionais Artigo da Mckinsey conta como os gestores precisam lidar com os paradoxos do dia-a-dia de uma organização

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ARTIGO Maísa Domenech A contratualização e as ações fiscalizatórias para verificação do cumprimento das normas contratuais

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CAPA Regulação Ação na Justiça movida pela Abimed contra a Anvisa reflete o descontentamento de uma indústria paralisada pela burocracia

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ARTIGO Michael Porter Americano defende um sistema de saúde que gere valor para os pacientes e produza melhores resultados por dólar gasto

PERFIL Boris Berenstein A história do empresário que é referência em radiologia em Pernambuco e comanda o Grupo Boris Berenstein Mc Connell Photography/Divulgação

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Clínica Cleveland, em Ohio: modelo eficiente de negócio, segundo o especialista em competitividade Michael Porter

ENTREVISTA Fernando Mattos Magistrado fala sobre o Fórum Nacional de Saúde e discute a rotina do Judiciário e as demandas do setor

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CARO GESTOR Osvino Souza Professor da Fundação Dom Cabral esclarece questões como cultura organizacional e gestão de pessoas

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ARTIGO Paulo Lopes Headhunter discute liderança e a gestão estratégica de pessoas através dos mais diversos mecanismos de coaching

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FÓRUM DE LÍDERES Mercado As principais lideranças do setor médicohospitalar do Nordeste reunidas em encontro considerado marco para o trade

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ARTIGO IBGC Artur Neves, conselheiro e consultormembro do IBGC, discute as “zonas cinzentas” de um modelo decisório

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RESENHA Gestão Como as Gigantes Caem conta as histórias de empresas que chegaram ao fundo do poço e conseguiram crescer novamente

Fórum de Líderes: evento reuniu, em Pernambuco, os maiores líderes do mercado de saúde do Nordeste

Roberto Abreu

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EDITORIAL

A busca da informação, sem fronteiras

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autar o setor médico hospitalar brasileiro não é tarefa fácil. Afinal, a profusão de notícias produzidas a cada instante por hospitais, indústrias e mercado, nem sempre é garantia de boas histórias para se contar. Escrever o que o leitor quer saber, definitivamente, se tornou um dos mais importantes desafios do jornalismo especializado, moderno e cada vez mais sem fronteiras. Um exemplo recente é como a reeleição do presidente Barack Obama, em novembro, mobilizou a indústria da informação mundo afora. Dos Estados Unidos, o nosso repórter Rodrigo Sombra ouviu pesquisadores, médicos e representantes de entidades de classe para saber que repercussão o segundo mandato do democrata terá no combalido sistema de saúde americano. O resultado foi um texto revelador sobre os bastidores do ‘Obamacare” – uma feliz alusão ao projeto de reformulação do sistema de saúde dos EUA, que deve entrar em vigor a partir do ano que vem. No Brasil, outro assunto que interessa ao setor – e que foi parar nas páginas dos jornais – é o embate, já previsto, entre a indústria da saúde e a Anvisa. A discussão envolve o emaranhando de regras que regula a entrada e a comercialização de produtos e equipamentos médicos no país, aliada à dificuldade da agência em cumprir prazos regulatórios. De tão relevante, o roteiro ganhou matéria de capa na Diagnóstico e uma cobertura com a missão de traduzir os meandros de uma “batalha” que foi parar nos tribunais. Outro desafio prazeroso para nossa equipe foi interagir com os conselhos do americano Michael Porter – maior especialista do mundo em competitividade. Em um artigo inédito no Brasil, dividido em duas partes, o leitor vai poder se deliciar com o estilo e a clareza de ideias de um dos maiores pensadores de seu tempo, em uma análise contundente sobre o futuro do sistema de saúde mundial. Para Porter, caberá aos médicos mudar a equação de um modelo de negócio de custos crescentes e soluções, até aqui, pouco eficazes. Uma história em que todo mundo torce por um final feliz.

Gestão em Saúde

Publisher Reinaldo Braga – (MTBa 1798) reinaldo@diagnosticoweb.com.br Diretor Comercial Helbert Luciano – helbert@diagnosticoweb.com.br Repórteres Salvador Aline Cruz - aline@diagnosticoweb.com.br Eduardo César - eduardo@diagnosticoweb.com.br Gilson Jorge - gilson@diagnosticoweb.com.br Rebeca Bastos - rebeca@diagnosticoweb.com.br Colaboração Rodrigo Sombra (Califórnia - EUA) Gerente Comercial Ricardo Messias – ricardo@diagnosticoweb.com.br Financeiro Ana Cristina Sobral – ana@diagnosticoweb.com.br Fotos Marcelo Soares (Recife) Ricardo Benichio (São Paulo) Roberto Abreu (Salvador) Diagramação Aline Cruz Joelton Goes Ilustrações Tulio Carapia Aline Cruz Revisão Calixto Sabatini Tratamento de Imagens Roberto Abreu Foto capa Banco de Imagens Estagiário Maicon Santos Atendimento ao leitor atendimento@diagnosticoweb.com.br (71) 3183-0360

Boa leitura!

Para Anunciar (71) 3183-0360

Reinaldo Braga Publisher

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A Revista Diagnóstico não se responsabiliza pelo conteúdo editorial do espaço Prestador Referência, cujo texto é de responsabilidade de seus autores. Artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do veículo.


EMAILS CARTAS@DIAGNOSTICOWEB.COM.BR

É estimulante ver o exemplo de médicos empreendedores buscando espaço no mercado de saúde brasileiro. As oportunidades existem, mesmo em um país que dá de ombros para a inovação e não estimula seus jovens talentos. Amaranto Fernandes, São Paulo-SP

Capa

startup saúde

Talento é imprescindível para empreender. O exemplo desses jovens que decidiram contribuir com o mercado de saúde brasileiro precisa ser louvado. Márcio Aguiar, Belo Horizonte-MG

Assim como em outros setores, a entrada do setor médico-hospitalar no universo da web vai criar sua bolha, mais cedo ou mais tarde. Muitas das ideias que vimos na reportagem podem prosperar ou simplesmente ficar pelo caminho. Trata-se de um grande desafio a ser superado. O. Medina, São Paulo-SP

Nenhuma tecnologia é capaz de trazer retorno financeiro na medicina se o paciente não for colocado como principal beneficiado, seja qual for o negócio. Espero que essas ideias possam facilitar a vida de quem precisa do acesso à saúde. J. M. Silva, Recife-PE

entrevista

carlos suslik

O médico e consultor Carlos Suslik dá um aula de como os médicos devem avançar

na carreira, para além da formação científica. O profissional de medicina precisa estudar economia, entender de negócios e ter noção do impacto de sua atuação na cadeia de saúde. Amilcar Veloso, Rio de Janeiro-RJ

Artigo

maisa domenech

Parabéns à articulista Maisa Domenech pela defesa, em seu último artigo, da cooperação mútua entre os diversos atores que compõem o trade de saúde brasileiro. Falta, de fato, partilha de informações, principalmente entre os prestadores, e ações que visem ao benchmarking entre os pares. Acho mais do que oportuno colocar essa discussão em pauta, principalmente em um momento em que o mercado ingressa de vez em uma fase de consolidação Otaviano Prates, Manaus-AM

Ensaio Mckinsey

gestão de pessoas

Não conheço os senhores Toby Gibbs (seção Ensaio da última edição) e Suzanne Heywood, mas gostaria de indicar o artigo publicado por eles na última edição da

Diagnóstico. É uma aula de como gerir pessoas e que pode ser aplicada a qualquer negócio, inclusive a pequenos e médios serviços de saúde Brasil afora. Parabenizo também à revista pela contribuição dada ao mercado. Humberto Lemos, São Paulo-SP

Entrevista

marco flávio cardoso

Fiquei surpreso ao ver o espaço dado por esse veículo ao tema cliente oculto. De distante e fora da realidade do nosso mercado, achei interessante a reflexão feita pelo entrevistado. Acho oportuno que um veículo especializado possa, sempre que possível, olhar fora da caixa. Antônio Damasceno, Campinas-SP

Não vejo como um serviço de saúde possa utilizar as estratégias do cliente oculto, que prevê isenção e que avaliação ocorre dentro da naturalidade de uma relação de consumo. Seria possível alguém se internar com o objetivo de aferir a qualidade de uma UTI ou a atenção do intensivista? A.G., Rio de Janeiro-RJ

Formação

não tão ‘deus’ assim

Corajosa a postura deste veículo em abordar de forma tão franca a questão da formação médica em nosso país. Como médico residente, posso testemunhar que a qualidade da formação das faculdades é, no mínimo, questionável. Mesmo assim, não sou a favor da medida imposta pelo Cremesp. Acho que ela pune o aluno e desvia o foco do problema Lúcio Aquino, Belo Horizonte-BH

Achei absolutamente parcial a matéria publicada nesse veículo sobre a formação dos médicos no Brasil. Está escancarada a defesa dos interesses dos “donos do negócio”. Lamentável. Jaqueline Moura, Salvador-BA

Não tenho estatísticas sobre o assunto, mas é notório o aumento de casos envolvendo erro médico nesse país. Basta ligar a televisão para acompanhar relatos de ocorrência de todo o tipo, principalmente com a morte de pacientes. Parabéns ao Cremesp! T. M., Recife-PE

Diagnóstico |set/out 2012

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ENTREVISTA bruno sobral

Divulgação

BRUNO SOBRAL, DA ANS: Qualiss é a maior aposta da agência para estimular a competição entre os hospitais

“No jogo competitivo do Qualiss, quem tiver mais qualidade ganha”

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Rebeca Bastos

lém da preferência, o paciente vai poder escolher seu hospital também por categoria. Quanto mais ícones que atestem a sua eficiência, melhor para quem precisa de atendimento. É dessa forma, inspirado em exemplos de guias de varejo, que vão de restaurantes a hotéis, que a Anvisa pretende estimular a eficiência da rede hospitalar no Brasil. Com um atraso de mais de seis meses, o Qualiss (Programa de Monitoramento da Qualidade dos Prestadores de Serviços na Saúde Suplementar) estreia em janeiro de 2013, com um grupo de 33 instituições voluntárias de todas as regiões, que serão submetidas a análises mensais. “Desejamos que os prestadores e operadoras que tiverem mais qualidade possam gerar um volume maior de negócio e até cobrar mais pelos seus diferenciais”, salienta Bruno Sobral, diretor de De08 Diagnóstico | set/out 2012

senvolvimento Setorial da ANS. A agência vai avaliar 26 indicadores de qualidade, divididos em seis áreas (efetividade, eficiência, equidade, acesso, centralidade e segurança). Os que apresentarem bom desempenho ganharão um selo de qualidade, identificado pela letra “Q”. A distinção, que foi buscar seu correlato na França – considerado o país com modelo de categorização mais racional –, vai estar presente, obrigatoriamente, no livro de convênio das operadoras a partir de 2014. “No jogo competitivo do Qualiss, quem tiver mais qualidade ganha”, aposta Sobral, a quem vem cabendo a implantação do programa. “E o mais importante é que o consumidor estará inserido nessa ‘competição’ com um instrumento eficaz e balizado para fazer a melhor escolha – o melhor plano, em última instância – e saber pelo que está pagando”. Envolto com os últimos detalhes da estreia do Qualiss, Sobral abriu espaço em sua agenda e falou à Diagnóstico.


Revista Diagnóstico – Como vai funcionar o Qualiss? Sobral – A ANS vai analisar 26 indicadores de qualidade, divididos em seis áreas (efetividade, eficiência, equidade, acesso, centralidade e segurança), e os que apresentarem bom desempenho ganharão um selo de qualidade da agência, identificado pela letra “Q”, que deverá ficar ao lado do nome do hospital na lista de prestadores que fazem parte dos livros e portais das operadoras. Diagnóstico – A resolução normativa do Qualiss foi lançada há mais de um ano (agosto de 2011), e a previsão era que a execução do programa começasse no segundo semestre de 2012. O programa deve estrear somente em janeiro do ano que vem. Por que o atraso? Bruno Sobral – A nossa previsão inicial era que o programa já estivesse em funcionamento a partir do meio deste ano, e depois em novembro, mas os planos tiveram que ser alterados por conta da complexidade de construção das fichas técnicas, já que estamos construindo esse material em conjunto com as prestadoras e com toda a sociedade. Além das dificuldades estruturais, os atrasos também foram motivados pela greve dos servidores. Diagnóstico – Em que fase o programa se encontra atualmente? Sobral – Já demos início à fase de testes dos indicadores de qualidade dos hospitais com um grupo de 33 instituições voluntárias de todas as regiões, que serão submetidas a análises mensais. Essa é a fase de avaliação controlada, em que a ANS recebe os dados para apreciação. Também em janeiro, começa o programa de ação interna na agência, que consiste em uma auditoria dos dados. A partir de julho do próximo ano, com o fim da fase de testes, a avaliação passa a ser obrigatória para os hospitais das redes próprias das operadoras de planos de saúde e opcional para os demais estabelecimentos. O passo seguinte é fazer a divulgação dos referencias obtidos. Assim que tivermos segurança da confiabilidade desses índices, iremos fazer a divulgação no início de 2014.

Diagnóstico – Qual será a periodicidade dessa avaliação? Sobral – O Qualiss foi planejado para ter avaliações em períodos curtos, com o objetivo de enrijecer os padrões de qualidade atuais. Por isso, a coleta e divulgação dos dados vai ocorrer trimestralmente. Quem participar do programa e tiver os padrões mínimos de qualidade, que ainda serão definidos, receberá o selo do Qualiss. Aliás, o programa também prevê que as operadoras façam a divulgação não apenas do programa da ANS, mas também de selos e índices de outras entidades reconhecidas. Deve ficar claro, por exemplo, quais são os hospitais que têm acreditação, com a identificação da entidade acreditadora, quais possuem o selo do Notificações em Vigilância Sanitária (Notivisa). Iremos dar o perfil de qualidade de cada prestador, e isso vai estimular todos a buscarem melhores níveis de qualificação.

ção, e qual é a relevância disso para uma instituição. A ideia do Qualiss é justamente abrir o debate e esclarecer a população sobre a importância desses indicadores. Iremos facilitar esse acesso, mas o melhor veículo será mesmo o livro de convênio das operadoras, que serão obrigadas a disponibilizar essas informações.

O programa não vai provocar o desequilíbrio no mercado. Ao contrário, será um estímulo para que hospitais de pequeno porte se qualifiquem também

Diagnóstico – De que forma o selo irá traduzir o desempenho do hospital? Sobral – Vamos citar o exemplo de um hospital “X”, que pode ser acreditado e participar do Notivisa, mas pode não estar enviando dados para a ANS de qualidade. Então, ele vai ter “A”, que significa Acreditação e o selo “N”, que significa Notivisa, mas não vai ter o “Q” do Qualiss. É como se fosse o Guia Quatro Rodas, que tem ícone para especificar os itens presentes em um hotel. Não é um paralelo com as estrelas de hotel, pois vamos apenas apresentar o que o prestador tem. A atribuição de valor vai ficar por conta dos usuários. A estratégia é fazer com que as prestadoras divulguem esse material, e a agência dê transparência a essas informações através de campanhas que expliquem para a população como o Qualiss funciona. O grande ganho para os usuários é interagir com os parâmetros de desempenho dos hospitais de uma maneira mais fácil e simples. Diagnóstico – O usuário comum do sistema saúde sabe a importância de uma acreditação? Sobral – O usuário comum não tem a exata dimensão do que é uma acredita-

Diagnóstico – Quais são as principais diferenças entre o Qualiss e o Programa de Qualificação da Saúde Suplementar, desenvolvido pela ANS desde 2004? Sobral – O Qualiss veio para aperfeiçoar outras ferramentas que a ANS tinha, como o Índice de Desenvolvimento de Saúde Suplementar (IDSS), que era um programa para as operadoras. Já o Qualiss é um programa para as prestadoras, que definimos em duas vertentes: indicadores e divulgação. A diferença entre os dois é que o Qualiss Indicadores trabalha sobre índices objetivos de qualidade dos hospitais, como taxas de mortalidade, de infecção, entre outros. O programa vai da preparação das fichas técnicas, até a divulgação desses dados para sociedade. Diagnóstico – Com vai funcionar o Qualiss Divulgação? Sobral – O prestador que quiser vai solicitar à operadora que inclua os seus atributos. Por exemplo, um hospital que é acreditado e participa do Qualiss Indicadores vai apresentar os certificados que ele possui, Acreditação e Notivisa, por exemplo, e pedir que a operadora divulDiagnóstico |set/out 2012

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ENTREVISTA BRUNO SOBRAL gue as suas qualificações. Como são índices positivos, acreditamos que o Qualiss Divulgação terá uma boa adesão. Só o fato de participar já dá uma demonstração de que o prestador confia em seus dados a ponto de abrir para a sociedade e mostrar seus resultados. Isso é positivo também como ferramenta de marketing. Para o prestador e para a operadora, inclusive, que pode usar isso na sua estratégia de venda. Diagnóstico – Qualiss é um programa com padrões de análise internacionais. Qual é a principal referência para a metodologia? Sobral – O Qualiss Indicadores já tem algumas experiências correlatas bem sucedidas na Inglaterra e na França. A experiência inglesa possui bastante informações e muitos indicadores, mas peca pelo excesso, uma vez que o usuário não consegue absorver tudo. Já a experiência francesa foi a que mais nos inspirou por ser mais sucinta. Queremos produzir uma versão mais acessível possível para o usuário. Afinal, não adianta dizer para o leigo que o índice de infecção por cateter venoso central da UTI pediátrica é 4%, ou 3%, porque ele não vai entender.

O grande ganho para o usuário (com o Qualiss) é interagir com os parâmetros de desempenho dos hospitais de uma maneira mais fácil e simples

10 Diagnóstico | set/out 2012

Diagnóstico – A pontuação de todos os escores será divulgada ou apenas a avaliação final? Sobral – Todos os dados serão divulgados no começo de 2014, após serem analisados e atestados pela ANS. Mas além de divulgar os índices, que podem não representar muita coisa para o usuário leigo, a agência projeta fazer uma graduação também por cores. A intenção é propiciar uma visualização mais rápida e permitir que o usuário possa usar esses dados como uma ferramenta de escolha a partir dos índices de qualidade dos hospitais conveniados pelo seu plano. Diagnóstico – De acordo com os dados da própria ANS, a rede hospitalar brasileira apresenta grande heterogeneidade, com um número grande de instituições de pequeno porte e outras, maiores, com padrão internacional. Sob esse aspecto, o Qualiss não poderia provocar um desequilíbrio no mercado? Sobral – Acredito que não; pelo contrário. O Qualiss será um estímulo para os hospitais de pequeno porte se qualificarem também. A heterogeneidade é, de fato, muito grande em termos de qualidade, e quem aponta isso é um mapa dos hospitais que foi feito pelo Banco Mundial, entre 2007 e 2011, e publicado pelo Instituto Brasileiro para Estudos e Desenvolvimento do Setor de Saúde (Ibedess). Mas isso não impede que os hospitais pequenos não alcancem índices elevados de qualidade. O que a ANS pretende com o Qualiss é justamente fomentar uma competição positiva do setor. E que essa busca seja motivada pela qualidade. Desejamos ainda que os prestadores e operadoras que tiverem mais qualidade possam gerar um volume maior de negócio a até cobrar mais pelos seus diferenciais. No “jogo” competitivo do Qualiss, quem tiver mais qualidade ganha. E o mais importante é que o consumidor estará inserido nessa “competição” com um instrumento eficaz e balizado para fazer a melhor escolha – o melhor plano, em última instância – e saber pelo que está pagando.

Diagnóstico – Em maio deste ano, a ANS anunciou a publicação de uma cartilha com direitos e deveres dos prestadores. Esse tipo de informação ainda não está claro para o mercado? Sobral – Trata-se de um assunto que ainda é motivo de dúvida por parte dos prestadores. A cartilha, que será publicada ainda esse ano, vai atualizar o mercado sobre as últimas normatizações da ANS, com um capítulo especial sobre a Instrução Normativa 49 (IN 49). Trata-se de um instrumento importante, que estabelece os critérios de reajustes dos honorários médicos e que teve o seu prazo de execução adiado para maio de 2013. Diagnóstico – O Judiciário brasileiro possui cerca de 200 mil processos na área de saúde, grande parte movida por usuários insatisfeitos com seus planos. A que se deve esse número de processos? Isso foi levado em conta na formulação do Qualiss?


Sobral – A ANS tem tentado qualificar essa relação, e a gente entende que ainda há um nível alto de insatisfação dos usuários em determinados momentos. A busca pelo Judiciário tem sido utilizada pelos clientes como uma forma de garantir que operadoras cumpram o que prometeram. Outras vezes, esse grande número de demandas judiciais acaba sendo também uma consequência das interpretações dos juízes, que, na ausência de apoio técnico, acabam dando razão aos usuários na maioria das situações de emergência, o que é compreensível. Essa questão da judicialização ocorre em todos os setores, não apenas na saúde. Diagnóstico – O que cabe à ANS dentro desse contexto? Sobral – Antes de mais nada, esclarecer os usuários sobre seus direitos. As reclamações têm aumentado, muito por conta do crescimento do mercado, mas

também por uma exposição maior da própria ANS na mídia. Um bom exemplo foi a pressão exercida pela agência sobre as operadoras com relação ao cumprimento dos prazos de atendimento. Os usuários se alinharam à causa e começaram a perceber como a ANS pode ser um canal eficaz de reclamação. E isso acaba gerando um movimento que se alimenta: quanto mais usuários utilizam a mídia como canal de reclamações, mais exigem qualidade. Algo, inclusive, mais interessante e positivo do que recorrer ao Judiciário. A ANS acaba também usando as reclamações para punir as operadoras que não cumprem a legislação. Com isso, o usuário percebe que tem voz e que pode contar com a agência para resolver seus problemas. É bom lembrar, no entanto, que a grande maioria dos atendimentos no nosso call center não é de reclamações, mas de dúvidas e, muitas vezes, sugestões dos usuários.

A ANS pretende fomentar uma competição positiva do setor. E que essa busca seja motivada pela qualidade. Quem for melhor também vai gerar mais negócios e poderá cobrar mais por isso

Banco de imagens

QUALISS QUER COLOCAR O PACIENTE NO CENTRO DAS DECISÕES SOBRE A ESCOLHA DO HOSPITAL

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Grupo Delfin Carol Garcia/SECOM

Criado há cinco anos pelo Grupo Delfin, o projeto Unidade Móvel já realizou mais 73 mil momografias no interio da Bahia

Saúde sem fronteiras Grupo Delfin leva unidade móvel ao interior da Bahia

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revenir, diagnosticar e encaminhar para tratamento médico adequado são os objetivos do Projeto Unidade Móvel, que se tornou uma das paixões do Grupo Delfin. Criado pelo doutor Delfin Gonzalez, há cinco anos, o projeto começou com apenas um caminhão, mas ganhou robustez e já realizou mais de 73 mil mamografias em pacientes de 84 municípios baianos. Atualmente, as cinco unidades móveis do grupo passam de sete a 15 dias (a depender da demanda) nos municípios e contam com a parceria de agentes e secretários de saúde das regiões beneficiadas. “A ideologia que nos inspira nesse projeto é a de promover assistência à saúde com excelência e vanguarda, com um rigoroso controle de qualidade e responsabilidade social”, destaca Gonzalez. São mais de 7 mil exames por mês. E os planos são de avançar ainda mais: o médico afirma que o objetivo é atender mais de 300 mil mulheres em todo o estado, até o final de 2013, com as unidades móveis. 12 Diagnóstico | set/out 2012

Priorizado para mulheres de baixa renda, ou que tenham dificuldade de acesso à saúde preventiva, a unidade móvel realiza mamografias e exames como ultrassonografia e punção. Nos casos em que o exame detecta ou levanta a suspeita de câncer, as pacientes são encaminhadas para unidades de oncologia referência na região de origem. Prontos para prestar atendimento de excelência, os micro-ônibus são equipados com o que há de mais moderno em aparelhos de mamografia digital, e cada unidade é capaz de realizar cerca de 50 exames por dia. Além de possuir autossuficiência energética, podendo atender até mesmo em locais que não têm energia elétrica, cada unidade possui ar-condicionado, e o ambiente de atendimento segue todas as regras de funcionamento exigidas pela Vigilância Sanitária. “As mulheres de baixa renda são o nosso principal alvo nas incursões do Unidade Móvel. No entanto, atendemos todas as pacientes que nos procuram que estão dentro do perfil do pro-


jeto: mulher, na faixa etária entre 50 e 69 anos e que apresente cartão do SUS e RG”, diz Rosemeire Simões, coordenadora do projeto. “Queremos oferecer à população carente a oportunidade de acesso à mamografia digital, mais importante exame de diagnóstico precoce do câncer de mama”, frisa Gonzalez, presidente do grupo. Com o compromisso de prestar um dos melhores e mais atualizados serviços de diagnóstico por imagem do Brasil, a Delfin investe constantemente na capacitação dos seus profissionais e em inovação tecnológica. Por isso, a Delfin ocupa hoje um dos lugares de destaque entre as maiores referências de serviços e exames por imagem do Brasil. referência nacional – O Projeto Unidade Móvel foi pioneiro em investir em mamografia móvel na Bahia ao participar do Programa Nacional de Controle do Câncer de Colo de Útero e Mama. Com o apoio institucional da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab), o projeto ampliou o seu raio de ação, antes delimitado devido aos altos custos de manutenção das unidades. Por facilitar o acesso ao rastreamento do câncer de mama e reduzir o deslocamento das pacientes, a iniciativa do Grupo Delfin tornou-se uma referência para a criação, em nível nacional, do Programa de Mamografia Móvel, instituído pelo MS

A ideologia que nos inspira nesse projeto é a de promover assistência à saúde com excelência e vanguarda, com um rigoroso controle de qualidade e responsabilidade social delfin Gonzalez, presidente do Grupo delfin

com o objetivo de qualificar e ampliar a assistência oncológica no Brasil, principalmente entre as mulheres das camadas mais carentes da população. “Estamos buscando garantir a qualidade de vida dessas mulheres”, finaliza Gonzalez.

Prevenir ainda é o melhor remédio

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studos do Instituto Nacional do Câncer apontam que o câncer de mama é um dos mais frequentes no Brasil, e o número de casos diagnosticados esperado para 2012 é de 52.680. Na Bahia, a estimativa é de 2.920 novos casos. A dificuldade para a realização da mamografia – exame que pode detectar precocemente a doença – é uma das principais causas da falta de tratamento das pacientes oncológicas. De acordo com especialistas, o diagnóstico precoce aumenta a taxa de cura em mais de 90%. Ciente de que a prevenção é o melhor remédio, o Grupo Delfin abraçou a causa do Projeto Unidade Móvel, que oportuniza que as mulheres de municípios mais distantes da capital realizem mamografias digitais com os melhores equipamentos do mercado. Dando continuidade à meta de garantir prevenção a todas as mulheres, o Grupo Delfin participou da edição do Outubro Rosa 2012, que realizou quase 5 mil mamografias em mulheres de baixa renda de Salvador. A iniciativa teve a participação da Philips Helth Care, da Sesab e das Voluntárias Sociais.

Unidades têm capacidade de atender em condições adversas

Exames são realizados com equipamento de ponta

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ENSAIO Práticas organizacionais

Liderança ou a arte de girar pratos Executivos serão melhores avaliando pessoas e prioridades se abraçarem os paradoxos da vida organizacional Colin Price | Tradução: Aline Cruz

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uitas vezes faço aos líderes corporativos três perguntas simples. Quais as dez mais importantes oportunidades de criação de valores? Quem são seus dez melhores colaboradores? Quantas dessas dez pessoas estão trabalhando nessas oportunidades? É um exercício difícil e rápido, com certeza. Mas a resposta para a última pergunta é normalmente expressada com uma frustração que demonstra como é difícil para os executivos alcançar o alinhamento organizacional. O que faz esse problema particularmente desafiador é o número de paradoxos, muitos deles enraizados na excentricidade e imprevisibilidade do comportamento humano sobre como as organizações funcionam. Acreditam que o local de trabalho é economicamente racional, quando na verdade não é. Uma década de dados derivados de mais de 700 empresas sugere fortemente que a forma racional para alcançar melhor desempenho – com foco em suas manifestações financeiras e operacionais perseguindo múltiplos geradores de receita de 14 Diagnóstico | set/out 2012

curto prazo e realizando reuniões sobre temas difíceis – pode não ser a mais eficaz. Nossa pesquisa mostra que a maioria das organizações de sucesso, em longo prazo, concentra-se consistentemente em “habilitar” coisas (liderança, processos de gerenciamento, motivação), cujos benefícios imediatos nem sempre são claros. Estas organizações saudáveis, como as chamamos, são internamente alinhadas em torno de uma estratégia e visão claras. Podem funcionar com alta qualidade, graças a capacidades específicas, processos de gestão e de motivação de colaboradores, e se renovar mais eficazmente do que os concorrentes. Em suma, saúde hoje leva ao aumento de desempenho amanhã. Neste artigo, focarei em três paradoxos que, em minha experiência, são igualmente impressionantes e difíceis de conciliar. O primeiro é que mudanças aparecem mais fácil e rapidamente em organizações que mantêm algumas coisas estáveis. O segundo é que organizações são mais aptas a se tornarem bem sucedidas quando simultaneamente gerenciam e empoderam seus colaboradores. E o terceiro é que culturas


empresariais que acertadamente encorajam consistência (por exemplo, na qualidade dos serviços) devem permitir também um tipo de variabilidade – e até mesmo falha – que acompanha a inovação e a experimentação. Confrontar-se com esses paradoxos será de valor inestimável para os executivos que tentam manter seus colaboradores e prioridades em equilíbrio num momento em que a mudança cultural e de liderança, por vezes, parece um imperativo existencial. Assim como um artista de circo habilmente gira pratos ou tigelas para mantê-los em movimento e alinhados, executivos devem constantemente intervir para incentivar os tipos de comportamento que se alinham com as principais prioridades de uma organização. Mudança e estabilidade – Muitas vezes, mudanças organizacionais são imperativas, em resposta às demandas emergentes, novas regulamentações e novas ameaças da concorrência. Mas a mudança constante ou súbita é inquietante e desestabilizadora para as empresas e indivíduos. Assim como os seres humanos tendem a congelar quando confrontados com muitas coisas novas em suas vidas – um divórcio, uma mudança de casa e uma mudança de emprego, por exemplo –, as organizações oprimidas pela mudança resistem e frustram executivos com mentalidade de transformação e determinados a derrubar a ordem estabelecida. Derrubar plataformas pode chamar a atenção, mas pouco faz para motivar a criati-

pensavam que poderiam gerar valor. Por exemplo, o financeiro vai lançar um programa para tornar os custos variáveis​​, e o RH deve anunciar uma iniciativa para sacudir gestão de desempenho e compensação. Gerentes de nível médio infelizes encontraram-se em uma tempestade de mudança que tornou difícil concentrarem-se em prioridades da organização. Agora, antes de programas de mudança serem implantados em termos mais gerais, todos eles são integrados e as complexidades resultantes são tratadas no topo da organização. Desta forma, o modelo operacional da empresa manteve-se mais estável do que deveria ter sido e mais estável do que costumava ser quando as mudanças eram anunciadas de forma descoordenada. Gestores agora compreendem e aceitam o ritmo de mudança, enquanto os gerentes e colaboradores ganharam nova confiança que os diferentes elementos nas transformações serão complementares e coerentes. O resultado é que um fluxo bem-intencionado, mas desarticulado dentro de uma mudança interminável, foi convertido em um bem-estruturado modelo. Controle e capacitação – Todas as organizações precisam de pelo menos um fio de controle para vincular os donos do negócio aos responsáveis ​​pela execução de seus objetivos. Empresas que negligenciam mecanismos que impõem disciplina, padrões comuns, ou conformidade com a regulação externa fazem por sua conta e risco. No entanto, o

Executivos tendem naturalmente a se proteger e proteger suas equipes, comportamento que pode, inadvertidamente, prejudicar a inovação. Afinal, a criação acidental às vezes pode ser a mãe da invenção vidade. Paradoxalmente, portanto, líderes de mudança devem tentar promover uma sensação de estabilidade no núcleo da sua empresa e, sempre que possível, fazer alterações parecerem relativamente pequenas, incrementais, ou mesmo periféricas, enquanto cumulativamente alcançam a transformação necessária para impulsionar o desempenho. Uma grande empresa com a qual sou familiarizado sofreu baixa de três proprietários e cinco CEOs diferentes na última década e recentemente abraçou este paradoxo com um novo modelo de gestão apelidado de “equilíbrio”, uma palavra carregada de significado para o tipo de serviço que executa. A ideia simples por trás do modelo é que quaisquer alterações nos sistemas de uma empresa, estruturas e processos devem sempre ser introduzidas de uma forma consistente, normalmente trimestral, como parte de um pacote de mudança explícita. Se uma alteração proposta não está pronta a tempo para uma dessas versões regulares, ou é adiada para a próxima ou abandonada. Anteriormente, os líderes de cada uma das funções da empresa tendiam a introduzir, por conta própria, mudanças que

controle excessivo, paradoxalmente, tende a estimular o comportamento disfuncional, para minar o senso de propósito e prejudicar a motivação dos colaboradores, colocando-os em uma espécie de “camisa de força corporativa”. O truque para o CEO-com-prato-giratório é obter o equilíbrio certo em função da alteração de contextos empresariais e de mercado. Em geral, uma empresa provavelmente precisará de mais controle quando precisar mudar de direção e mais empoderamento quando já estiver definido o novo curso. A história de uma grande empresa de tecnologia global, recuperada de uma crise de quatro anos atrás, é instrutiva. Forçada a amortizar mais de US$ 2 bilhões em contratos incontroláveis, uma nova equipe de gestão tomou medidas drásticas e decisivas para reduzir os custos, renegociar os acordos antigos, mudar as práticas estabelecidas e impor novos controles rigorosos. A empresa (com mais de 100 mil empregados) foi salva, mas no processo descobriu que tinha perdido a capacidade de cumprir a sua prioridade: novas ideias criativas que alimentam o crescimento orgânico. Isso porque uma consequência não intencional das reduções muito necessárias Diagnóstico |set/out 2012

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Esses gestores tinham se tornado tão acostumados a determinar o que fazer, e tinha sido dado tão pouco espaço de manobra, que se perdeu a capacidade de experimentar. A “árvore” da alta gestão se tornou tão grande que nada poderia crescer à sua sombra de custo foi o surgimento de um relacionamento “pai-filho” entre gestores da empresa e gerentes de nível médio. Esses gestores tinham se tornado tão acostumados a determinar o que fazer e tinha sido dado tão pouco espaço de manobra que se perdeu a capacidade de experimentar. A “árvore” da alta gestão se tornou tão grande que nada poderia crescer à sua sombra. Consistência e variabilidade – Fazer produtos de alta qualidade e entregá-los aos clientes no prazo e com o mesmo nível de consistência em cada ponto da cadeia de valor é essencial para o sucesso na maioria das indústrias. Inconstância é um desperdício e consome tempo, para não mencionar a potencial perda de clientes. A maioria das organizações, portanto, aplaude o comportamento que ataca a inconstância e a elimina. No entanto, em termos humanos, a consistência muitas vezes se transforma em rígidas mentalidades, caracterizadas por medo do fracasso pessoal e organizacional. Tem sido demonstrado que sentimos a dor do fracasso duas vezes mais que nós comemoramos a alegria do sucesso. Executivos tendem naturalmente a se proteger e proteger suas equipes, comportamento que pode, inadvertidamente, prejudicar a inovação. Afinal, a criação acidental às vezes pode ser a mãe da invenção e, como dizem nas montanhas, “se você não está caindo, você não está esquiando”. É difícil pensar em um setor em que é mais importante obter o equilíbrio entre a consistência e a inconstância do que a indústria farmacêutica. Vidas estão em jogo, e os custos de desenvolvimento e lançamento de um novo composto muitas vezes chegam a bilhões de dólares. Confrontada com a aproximação do vencimento de muitas licenças, uma das maiores empresas farmacêuticas do mundo descobriu que a sua tradição de confiabilidade e consistência se tornou uma limitação de mentalidade. Embora desesperadamente necessário para fazer novas descobertas, um viés status quo tomou conta da organização, que congelou em torno de um conjunto complexo de segurança, governança e controles. O medo do fracasso e uma obsessão com o “modo certo de fazer” produziram defensivas apresentações de 100 páginas de PowerPoint em abundância, mas pouco fizeram pelo desenvolvimento de um produto significativo. Problemas de comportamento não ajudam, é claro. Uma cultura do “falar” excessivamente em vez de “escutar” tinha se degenerado em assédio moral; alguns executivos seniores literalmente gritavam com seus colaboradores. As coisas chegaram a um ponto crítico quando dois cientistas, frustra16 Diagnóstico | set/out 2012

dos com o tempo necessário para obter aprovações, deixaram a empresa para criar o seu próprio e bem sucedido negócio e foram abertamente elogiados pelos colegas por se libertarem de uma burocracia sufocante e cultura ditatorial. A autoestima dos que ficaram para trás sofreu mais, e a energia foi drenada para fora da organização. A solução que a empresa concebeu combinava a construção de “folga” em sua mobilização de recursos, uma jogada ousada e um ataque direto sobre o comportamento negativo. Os piores foram removidos, e ficou clara a gaiola de combate a atitudes que eram inaceitáveis. Foram tomadas medidas para elevar o índice de inovação, investindo em pessoas inteligentes, mas os gestores foram mais longe. Eles buscaram alterar o que se chamou de “arquitetura social” da organização, através da construção de comunidades internacionais de cientistas e da promoção do intercâmbio entre eles através das fronteiras geográficas. Experiências bem sucedidas, com certeza, eram mais valorizadas do que fracassos, mas ambos tiveram seu lugar na cultura da empresa. Ênfase em comunicação sobre “a nossa riqueza de ideias” promoveu a simples noção de que a riqueza (o progresso econômico) surge de ideias (experimentação e inovação) e mostrou como a linguagem cuidadosamente trabalhada pode ajudar a mudar a unidade. O resultado foi um aumento na carteira de produtos e, ao longo do tempo, a retomada do crescimento do lucro. Abraçar os paradoxos descritos neste artigo pode ser desconfortável: é contraintuitivo estimular a mudança aterrando-a em fontes de estabilidade tranquilizadora ou focar em limites e controle quando uma empresa quer despertar novas ideias. No entanto, o ato de tentar conciliar essas tensões ajuda os líderes a manter os olhos em todos os seus pratos giratórios e identificar quando as intervenções são necessárias para manter a organização alinhada com suas principais prioridades. Por último, esta abordagem torna possível evitar a frustração de muitos executivos que encontrei, que escolhem um extremo: ou eles tentam sufocar comportamento complexo através da construção de poderosas e rígidas estruturas de cima para baixo, ou expressar perplexidade e decepção quando mais soltos, mais laissez-faire estilos de gestão expõem as realidades sujas do esforço humano. Maiores desempenhos, em minha experiência, são dos líderes que acolhem as contradições inconvenientes da vida organizacional.

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Maisa Domenech ARTIGO Tadeu Miranda

ta. De acordo com a ANS, as operadoras fiscalizadas nos dois programas citados correspondem a mais de 60% do mercado de saúde suplementar. Tivemos ainda a RN 241, de 3 de dezembro de 2010, que estabelece a obrigatoriedade de negociação dos instrumentos jurídicos firmados entre as operadoras Maisa Domenech é engenheira civil, de planos de assistência à saúde e os prestadores de serviços, pós-graduada em Administração assim como a RN 286, de 10 de fevereiro de 2012, que altera Hospitalar e consultora e gera acréscimos à RN nº 42 com relação ao padrão de acomodação nas internações hospitalares. A Súmula Normativa nº 16, de 12 de abril de 2011, veda às operadoras adotar e/ ou utilizar mecanismos de regulação baseados meramente em parâmetros estatísticos de produtividade, os quais impliquem inibição à solicitação de exames diagnósticos complementares pelos prestadores de serviços de saúde. Por fim, a IN-49, de 17 de maio de 2012, que regulamenta a forma e a periodicidade do reajuste dos contratos entre operadoras e prestadores de serviços. Esta última, bastante festejada pelos prestadores de serviços médico-hospitalares, contribuiu de forma importante para que estes passassem a ter um olhar diferenciado e positivo sobre a série de regulamentações criadas pela ANS até então. Porém, para que este sonho vire realidade, faz-se necessário que os prestadores se organizem e façam valer o azendo uma breve retrospectiva, a ANS, em 2003, que é de direito junto às operadoras, já que a resistência destas por meio das consultas públicas nº 09, nº 12 e nº 16, últimas ao cumprimento da IN-49 é fato e notório, assim como abriu para análise e discussão de toda a sociedade o as tentativas de invalidá-la. Apesar de toda essa regulamentatema contratualização. A partir daí, ção, outros tantos problemas são ainda foram editadas as resoluções norvigentes nos instrumentos contratuais e/ é importante constar mativas RN nº 42, de 2003, RN nº ou práticas adotadas na conturbada relae funcionar como 54, de 2003, e RN nº 71, de 2004, ção entre prestadores de serviços médique definem os requisitos para ceco-hospitalares e operadoras de planos rotina do prestador lebração dos instrumentos jurídicos de saúde, alguns deles com reflexos nede serviço a exigência entre operadoras e respectivamente gativos no consumidor final. à operadora de prestadores de serviços hospitalaComo exemplo de dificuldades, pores, prestadores de SADT e clínidemos citar as cláusulas contratuais reencaminhamento dos cas ambulatoriais e profissionais registros profissionais lativas à auditoria, que, mal definidas, de saúde ou pessoas jurídicas que dão espaço para que as equipes de audaqueles que prestam serviços em consultórios. ditores das operadoras, na maioria das auditarão a instituição vezes, estabeleçam ponto de corte nas Conforme a ANS, ações fiscalizatórias para verificação do cumprimencontas a serem auditadas referentes aos prestadora de serviço to das normas foram intensificadas serviços já prestados. Como consequênnos anos de 2005 e 2006, por meio do programa denominado cia, o prestador de serviço fica com volume de contas reprePrograma Olho Vivo, quando foi constatado que várias ope- sadas, aguardando a próxima data de envio de faturas, muiradoras estavam com os instrumentos jurídicos em descon- tas vezes nem tão próxima assim, já que nos acordos existem formidade com as normas, dando início, assim, aos processos situações com apenas duas datas de entrega mensais ou até sancionadores. Com o objetivo de se adequar à totalidade dos mesmo uma única data mensal, portanto, reflexo negativo no instrumentos jurídicos, a ANS propôs que as operadoras fir- fluxo de caixa dos prestadores de serviços. No aspecto audimassem termo de compromisso de ajuste de conduta (TCAC), toria, também merece a atenção dos prestadores de serviços havendo mais de 60 processos de TCAC. Novamente em 2010, o fato de que as mesmas equipes auditam uma mesma instia ANS intensificou a fiscalização destes instrumentos jurídi- tuição para diferentes operadoras e, vez por outra, aplicam as cos, por meio do Programa de Monitoramento da Contratuali- mesmas normas e glosas, independentemente dos diferentes zação, quando foram selecionadas as 30 maiores empresas do acordos comerciais entre as partes. Ainda dentro do tema ausetor, considerando o número de beneficiários e excetuando ditoria, é importante constar e funcionar como rotina do presda relação aquelas que tinham processo de ajuste de condu- tador de serviço a exigência à operadora de encaminhamento

Contratualização na saúde suplementar

F

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merece a atenção dos prestadores de serviços o fato de que AS mesmas equipes auditam uma mesma instituição para diferentes operadoras e, vez por outra, aplicam as mesmas normas e glosas independentemente dos diferentes acordos comerciais dos registros profissionais daqueles que auditarão a instituição prestadora de serviço, como também definir quais os espaços físicos dentro da instituição prestadora de serviços são passíveis de terem o trânsito permitido aos auditores. Sem dúvida, tais definições inibirão uma série de problemas relatados. Merece também destaque, nos contratos vigentes entre as partes, a referência ao Manual do Referenciado, definido pelas operadoras e alterado ao longo do tempo por elas sem a anuência do prestador. Tal referência deveria ser contestada pelo prestador de serviços, já que assina uma “caixa preta” na qual consta uma série de exigências, normas, procedimentos e rotinas a serem obedecidas.

Vale também mencionar as cláusulas relativas à autorização de atendimentos, estas com forte impacto no atendimento ao paciente, já que encontramos instrumentos com exigência de autorização para atendimentos de urgência/emergência e até mesmo autorização para realização de exames em pacientes sob regime de internação. Atentos e vigilantes também devem estar os prestadores nas cláusulas e práticas inerentes aos prazos definidos em contrato para apresentação de contas e recursos de glosas que, se não obedecidos, se transformam em atendimento “grátis”, contrariando o objeto do contrato. É comum não existir a contrapartida de prazo para pagamento pelas operadoras dos recursos apresentados pelos prestadores. Algumas vezes encontramos nos instrumentos prazo para a operadora apurar e responder tais recursos. E o prazo para devolução da conta dita irregular? E o prazo de pagamento ao prestador? Não seriam estas situações um estímulo à fábrica de glosas? E por falar em glosas, será que muitos dos prestadores de serviços médico-hospitalares não contribuem para isto ainda no processo de contratualização, já que fazem constar do instrumento que regerá a relação entre as partes uma tabela de taxas e diárias sem as respectivas instruções de cobrança dos serviços a serem realizados? A discussão em pauta não tem por fim pontuar arestas, mas a necessidade de trabalhá-las adequadamente, de modo a resultar numa relação prestador-operadora mais bem definida e, portanto, menos conflituosa, promovendo a qualificação da gestão e, sobretudo, da assistência à saúde.

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Fotos: Ricardo Benichio

BUROCRACIA PÚBLICA REGULAÇÃO

CARLOS ALBERTO GOULART, DA ABIMED: fila de espera da Anvisa vem prejudicando os interesses dos importadores


vitória no ‘tapetão’ Decisão da Abimed de acionar a Justiça para obrigar a Anvisa a cumprir prazos regulatórios foi vista em Brasília como uma afronta à instituição. Para o mercado, a medida reflete o descontentamento de uma indústria paralisada pela burocracia Reinaldo Braga

A

relação da indústria de equipamentos médico-hospitalares do Brasil e importadores com a Anvisa, a mais alta instância regulatória do setor médico-hospitalar brasileiro, azedou de vez. Depois de quase três anos de negociações, com queixas reincidentes no atraso de liberação de registros, prazos não cumpridos e represamento de demandas, a indústria resolveu acionar o Poder Judiciário para resolver o imbróglio. A medida, tomada pela Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Equipamentos, Produtos e Suprimentos Médico-Hospitalares (Abimed), foi vista em Brasília como se os empresários tivessem recorrido ao “tapetão” – uma linguagem usada pejorativamente no futebol para condenar a iniciativa de clubes em usar a Justiça comum, em vez de resolver o litígio no âmbito desportivo. “O sentimento dentro da cúpula da Anvisa foi de desafio à ordem e à autoridade do órgão”, disse à Diagnóstico um burocrata da agência, que prefere o anonimato. “Entendemos que a esfera jurídica não é o caminho para resolver a questão”. Em caráter liminar, a Abimed conseguiu o direito de ter os certificados de boas práticas de fabricação e controle (CBPF) substituídos pelo seu congênere americano (GPM), emitido pelo respeitado US Food and Drug Administration (FDA). A decisão foi proferida, no início de novembro, pelo juiz Hamilton de Sá

Dantas, da 21ª Vara Federal, e beneficia apenas associados da Abimed cujo protocolo de pedido de inspeção tenha sido realizado há mais de seis meses – prazo legal que a Anvisa preconiza para a emissão do CBPF. Segundo estimativa da própria agência, 1.300 pedidos de inspeção internacional aguardam na fila a visita de seus inspetores. O rito é obrigatório e indispensável para a emissão do registro e consequente comercialização de qualquer produto médico-hospitalar vendido no Brasil. A Anvisa admite que só tem capacidade de inspecionar pouco mais de 200 fábricas por ano – até outubro, apenas 186 inspeções haviam sido feitas. Atualmente, a agência dispõe de 25 inspetores

Sabemos que há um déficit de pessoal que esbarra em qualquer processo de aprimoramento das ações da Anvisa. Mesmo assim, vamos insistir em uma solução negociada paulo fraccaro, diretor executivo da abimo

habilitados, que realizam 25 visitas internacionais por mês. O órgão cobra antecipadamente da indústria R$ 39 mil a cada inspeção. Em seu despacho, o juiz Sá Dantas diz que o atraso no cumprimento dos prazos por parte da Anvisa trata-se de um caso de omissão, que lesa o patrimônio jurídico individual, “causando prejuízo à atividade comercial e aos usuários”. Em nota enviada à redação da Diagnóstico, a Anvisa informa que o passivo na realização das inspeções internacionais afeta todos os países e “não é uma questão exclusiva do Brasil”. Na prática, a lentidão do órgão regulador cria situações prosaicas, como o impedimento de um hospital em adquirir a última versão de um tomógrafo, mais produtivo e preciso, por exemplo. Segundo estimativas do próprio mercado, o cumprimento de todas as etapas previstas na atual legislação brasileira para a chegada de um equipamento médico ao país pode durar entre três e cinco anos – a própria lei prevê um. Estima-se que a morosidade do órgão impeça a chegada ao país de quase 500 novos produtos – ou atualizações – a cada ano. Outros 1.876 medicamentos, segundo a Interfarma, entidade que representa os interesses da indústria farmacêutica, aguardam liberação da Anvisa para chegar à prateleira das drogarias e hospitais. O tempo médio para liberação passou dos 600 dias, em outubro – 50% a mais do que igual período de 2011. A lei prevê que o trâmite leve até 120 dias para similares e 90 para as demais categorias. A lentidão da Anvisa já repercutiu até Diagnóstico |set/out 2012

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BUROCRACIA PÚBLICA REGULAÇÃO mesmo no aquecido mercado de fusões e incorporações do setor, com empresas utilizando os certificados emitidos pelo órgão regulador como um ativo inflacionado. “São casos em que um registro de produto ou até mesmo um selo de boas práticas passa a valer mais do que valeriam em condições normais”, diz o consultor da Pwc Carlos Suslik, especializado em fusões e aquisições do setor médico hospitalar. Segundo ele, a ineficiência do órgão já é conhecida pelo investidor estrangeiro interessado em ingressar no país. judicialização – “É a primeira vez que uma entidade representativa dos interesses de grandes players internacionais, como Philips, GE e Siemens, decide se insurgir contra um órgão regulador”, diz um associado da Abimed, que prefere o anonimato. “Ninguém quer brigar com a Anvisa, mas não tínhamos escolha”. A atitude da Abimed, de acordo com juristas consultados pela Diagnóstico, fez elevar apenas o termômetro de um processo de judicialização que já vinha ocorrendo na rotina do órgão regulador. Há pelo menos dois anos, a agência vem sendo ré em várias ações que obrigam seus dirigentes a cumprir os prazos regimentais da legislação em vigor – criada, é bom que se diga, pelo próprio órgão regulador. “Qualquer demanda jurídica que use como argumento o não cumprimento de prazos por parte da Anvisa vai ser deferida pela Justiça”, garante o advogado Evaristo Araújo, sócio do Gandelman Sociedade de Advogados, de São Paulo. Segundo ele, por ano, o escritório ingressa na Justiça com mais de duas dezenas de ações contra a Anvisa, em demandas que vão de pedido de registro a inspeção. O caso mais extremo ocorreu no final de novembro, com uma liminar que obriga a Anvisa a expedir autorização de funcionamento de estabelecimento (AFE) à LIC Ltda, uma pequena empresa do ramo de equipamentos eletroeletrônicos de uso odonto médico-hospitalar. O documento é considerado o primeiro passo na estrutura regulatória – algo como um CNPJ do setor que faz a empresa existir junto à Anvisa. Segundo a mesma analogia, é como se um empresário tivesse que entrar na Justiça para que a junta comercial de sua cidade e a receita formalizassem a abertura de sua empresa – um processo que dura pouco mais 22 Diagnóstico | set/out 2012

de um mês. A LIC argumentou que já estava há 120 dias à espera da emissão da AFE. E um detalhe: a Justiça deu ganho de causa à empresa mesmo não havendo prazo estabelecido em lei para a emissão do documento, cujo trâmite é considerado elementar. “Chegamos em um momento extremo, sem perspectiva de avanço e com a Anvisa paralisada por falta de estrutura”, avalia o diretor executivo da Abimed, Carlos Alberto Goulart. De acordo com ele, a decisão de acionar a Justiça foi tomada após quase três anos de exaustivas tentativas de sanar as pendências junto à agência no âmbito administrativo. “Buscamos com a medida preservar os interesses dos nossos associados e, em última instância, do paciente”, disse Goulart. “Mas continuamos mantendo o diálogo com a Anvisa para que a questão seja resolvida”. Entre os membros da Abimed, contudo, o clima, mesmo com a decisão liminar favorável, é de insatisfação. Há pelo menos um ano, a cúpula da associação, que possui cerca de 120 associados, vem sendo pressionada a tomar medidas mais drásticas contra a Anvisa. Alas mais descontentes de dentro da associação, que defende os interesses dos importadores,

acham até que a judicialização deve atingir outras etapas da regulação, igualmente represadas. Uma pressão, segundo apurou a Diagnóstico, que vem também de fora, com a cobrança de resultados por parte das matrizes nos EUA e Europa. “A decisão da Justiça resolve apenas uma das etapas do processo”, avalia Aziz Constantino, diretor de assuntos regulatórios da Associação Brasileira das Empresas Certificadas em Saúde (Abec). “De posse do GPM, as empresas vão entupir a agência com pedidos de registros – fase posterior ao CBPF e cujos prazos também não vêm sendo cumpridos”. Uma previsão modesta do próprio mercado, prevê que a Anvisa levaria quase uma década, sem receber mais nenhuma demanda, para pôr em ordem as pendências já existentes. “Sabemos que há um déficit de pessoal que esbarra em qualquer processo de aprimoramento das ações da Anvisa”, afirma Paulo Henrique Fraccaro, diretor executivo da Abimo. “Para nós, contudo, o único caminho é a busca de uma solução negociada, no âmbito administrativo”. Oficialmente, a Abimo é contra a iniciativa da Abimed. Para a entidade, a judicialização da questão não vai resolver as dificuldades enfrentadas pelo setor.

AZIZ CONSTANTINO, DA ABEC: lista de proposição para a Anvisa sugere mais celeridade nos ritos regulatórios


É a primeira vez que uma entidade representativa dos interesses de grandes players, como Philips, GE e Siemens, decide se insurgir contra a Anvisa. Não tínhamos escolha associado da abimed que pediu anonimato

O argumento da associação é que a liminar pode criar um cenário de não conformidade para a comercialização de produtos e equipamentos importados, mesmo com o selo do FDA. Há também o sentimento de que a medida enfraquece institucionalmente o órgão. Nos bastidores da entidade, a postura conciliadora está longe de ser unanimidade. A Diagnóstico apurou que, na semana seguinte à decisão favorável da Abimed, os telefones da associação, que representa os interesses da indústria nacional, não paravam de tocar. Do outro lado da linha, associados querendo saber se a Abimo seguiria o mesmo caminho. poucos servidores – Enquanto tenta acalmar o ânimo dos descontentes, a associação vem preparando, junto com a Abec, uma carta com uma série de proposições, que será entregue pessoalmente ao presidente da Anvisa, Dirceu Barbano. A principal sugestão está na área de inspeção – maior gargalo do setor. A indústria sugere que o trâmite para a autorização de funcionamento de estabelecimento (AFE), o certificado de boas práticas e o registro do produto possa ser feito simultaneamente. Pela atual legislação, as etapas funcionam como uma escada, em que cada degrau acolhe uma demanda por vez. Acredita-se que, com a medida, seja possível reduzir de cinco para dois anos a fila da regulação. No que refere ao registro, a indústria também pleiteia que haja uma distinção no trâmite

PARA A ABIMO, DE PAULO FRACCARO, JUDICIALIZAÇÃO PODE CRIAR UM CENÁRIO DE NÃO CONFORMIDADE NO SETOR

de análise entre novos registros e as chamadas “alterações de registros existentes”, que andam na mesma fila. Acredita-se que mais de 70% dos processos tratam de alteração no conteúdo vigentes. “A maior parte das alterações refere-se a informações que em nada impactam na segurança e eficácia dos produtos, a exemplo do endereço do fabricante, cor da embalagem ou mudança da titularidade”, exemplifica Constantino, da Abec. Outra proposta é formalizar o que vem ocorrendo na prática, com o prazo da renovação do certificado de boas práticas sendo estendido de um para cinco anos. “Trata-se de reivindicações que não mudam uma vírgula das normas em vigor, com as quais concordamos plenamente”, pondera Fraccaro. Ele adianta que a Abimo vai solicitar também a Dirceu Barbano – o encontro estava agendado para a primeira quinzena de dezembro – mais celeridade na contratação de novos servidores. A Anvisa garante que, até o final de 2013, cerca de 230 novos colaboradores serão incorporados à agência – 165 vagas já estão com edital garantido. Um passo importante anunciado pelo órgão é o avanço nos estudos para que o país adote o regime de reciprocidade nas inspeções, o que permitiria que os registros de produtos e equipamentos concedidos por outros países pudessem ser aceitos no Brasil. A Anvisa faz parte do International Medical Device Regulators Forum (IMDRF), criado recentemente com o in-

tuito de pactuar um sistema único de certificação – condição imposta pelo órgão brasileiro para acolher o registro de outros países. EUA, Canadá e Austrália também integram o fórum. “Houve grandes avanços na discussão para harmonizar procedimentos e adotar uma prática que possa ser pactuada pelas agências internacionais”, disse a agência à Diagnóstico, também em nota. Até lá, o país vai continuar perdendo de goleada para a ineficiência da gestão pública.

Qualquer demanda jurídica que use como argumento o não cumprimento de prazos por parte da Anvisa vai ser deferida pela Justiça evaristo araújo, sócio do escritório gandelman, DE SÃO pAULO Diagnóstico |set/out 2012

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Divulgação

ARTIGO GESTÃO

aS LIÇÕES DE MICHAEL PORTER

Em artigo inédito no Brasil, o americano Michael Porter - considerado o maior especialista do mundo em competitividade - defende um sistema de saúde que gere valor para os pacientes e produza múltiplos vencedores: médicos recompensados pela eficiência, custos contidos para as operadoras e melhores resultados por dólar gasto Tradução: Gilson Jorge

Professor de Harvard, Michael Porter é autor de 18 livros sobre gestão e competitividade, incluindo o best seller Repensando a Saúde 24 Diagnóstico | set/out 2012


A

corrente preocupação com o custo de deslocamento e a redução de gasto prejudica médicos e pacientes. Em vez disso, a reforma do sistema de saúde deve se concentrar em melhorar a saúde e valor do cuidado para com os pacientes. Propomos uma estratégia para a reforma que é baseada no mercado, mas conduzida pelo médico. A liderança do médico é essencial. Melhorar o valor dos serviços de saúde é algo que somente equipes médicas podem fazer. O tipo certo de concorrência – para melhorar os resultados – irá conduzir a uma melhoria dramática. Com a concorrência de soma positiva, pacientes vão receber melhor atendimento, os médicos serão recompensados pela excelência e os custos serão contidos. Os médicos podem liderar essa mudança e retornar a prática da medicina para o seu foco apropriado: permitir um sistema de saúde eficaz. Três princípios devem nortear essa mudança: (1) o objetivo é valorizar os pacientes, (2) a prática médica deve ser organizada em torno de condições médicas e ciclos de cuidados, e (3) resultados ajustados ao risco, e os custos de resultados devem ser medidos. Seguindo esses princípios, a satisfação profissional vai aumentar, e as atuais pressões sobre os médicos irão diminuir. Se os médicos não conduzirem essas mudanças, eles vão enfrentar inevitavelmente um controle administrativo da medicina cada vez maior. Melhorar a saúde e valorizar o atendimento aos pacientes é a única solução real. A concorrência baseada em resultados fornece um caminho para a reforma, que reconhece o papel dos profissionais de saúde no coração do sistema. O debate sobre a política de saúde está preso em um lugar que prejudica médicos e a saúde da nação. Embora as propostas de reforma difiram, elas têm isso em comum: cada um analisa o sistema de hoje e pergunta que mudanças incrementais, impostas de fora, podem efetivamente controlar os custos, que são ao mesmo tempo altos e crescentes. Essa abordagem vai falhar porque começa com uma premissa errada. O objetivo do sistema de saúde não é minimizar os custos, mas gerar valor para os pacientes, ou seja, uma melhor saúde por cada dólar aplicado. Oferecemos uma abordagem diferente. Se fosse para desenhar um sistema fo-

cado em valor e em uma inovação gratificante que faça a medicina avançar, como pareceria esse sistema? A próxima pergunta seria como o sistema pode migrar de um que claramente não está funcionando para um que é baseado em valor? Esta abordagem soa utópica e impraticável para alguns críticos. A experiência com a reestruturação de outros setores da economia dá uma perspectiva diferente. Esta é precisamente a forma pela qual as indústrias são realmente transformadas. Além disso, alguns médicos líderes já estão demonstrando que tanto eles quanto os seus pacientes podem se beneficiar com a reestruturação das suas próprias práticas e organizações para melhorar o valor. Mais liderança dos médicos é necessária. E imediata. A única solução real para o problema nacional de saúde é aumentar drasticamente o valor do atendimento prestado por cada dólar que está sendo gasto. Isso nunca vai ser alcançado a partir de fora, mexendo com os sistemas de pagamento e incentivos. Aumentar o valor do cuidado é algo que só pode ser feito por médicos. Se os médicos em número significativo estão dispostos a enfrentar

este desafio, não é tarde demais para fazer pender a balança em favor da reforma que é medicamente saudável e conduzida por médicos. quando a competição é deficiente Para criar um sistema de saúde de alto valor, a concorrência é necessária. Lições de todos os outros campos, tais como serviços de telecomunicações, computadores, serviços financeiros e aeroespaciais, mostram que a concorrência estimula a inovação e cria valor. No entanto, muitos médicos são merecidamente suspeitos de soluções competitivas baseadas no mercado, porque eles têm experimentado um tipo de competição que traz mais danos do que benefícios. O problema na saúde não é excesso de concorrência nem é que a concorrência por si só é inadequada. O problema é que o setor de saúde tem o na opinião do americano, em vez de mais consultas e exames, pacientes querem resolutividade

Fotos: Shutterstock

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tipo errado de competição. A competição é disfuncional quando os participantes trabalham com propósitos contraditórios às necessidades do cliente final: o paciente. A disfuncional competição da saúde atualmente é uma soma zero – a vitória de um lado é a perda do outro. Os custos são “reduzidos”, deslocando-os para os outros. Os médicos são pressionados a “aumentar a produtividade” economizando o tempo que deveria ser dispensado aos pacientes. Médicos “ganham” moldando melhores negócios com seus hospitais ou através da criação de seus próprios empreendimentos lucrativos. Hospitais “ganham” fundindo-se em grupos para ganhar mais poder de barganha sobre as taxas ou inscrevendo mais grupos de médicos para garantir encaminhamentos a especialistas. Planos de saúde “ganham” ao restringir os serviços e forçando os médicos a aceitar pagamentos mais baixos. De maneiras como essas, cada ator no sistema não ganha com o aumento do valor para o paciente, mas retirando recursos de outra pessoa. Nada disso melhora os resultados de saúde por dólar gasto. Na verdade, muitas vezes faz o contrário. Tal modelo de competição é insalubre. Não admira que muitos médicos vejam a concorrência na área da saúde como simplesmente inadequada. Em contraste, a competição de soma positiva diz respeito a criar e melhorar os benefícios ao cliente por cada dólar gasto. Quando a concorrência é baseada no valor, participantes da indústria concentram-se não em acumular poder de barganha ou limitar a escolha do cliente, mas em melhorar a qualidade de seus produtos e serviços e a eficiência com que eles são oferecidos. Quando as empresas competem sobre o valor para os clientes, as capazes crescem e prosperam, a inovação é recompensada, a eficiência aumenta, e os clientes podem pagar mais por produtos cada vez melhores. Esta dinâmica está funcionando em muitos campos, tais como serviços bancários eletrônicos, corretagem de ações e televisores de plasma. O rápido aumento de valor é a razão pela qual não há ninguém preocupado com o percentual do produto interno bruto gasto em telefonia móvel ou tecnologia da informação. A sociedade está melhor servida, em qualquer campo, quando a competição funciona desta forma. A competição na saúde não tem que ser uma soma zero. Não tem que ser sobre 26 Diagnóstico | set/out 2012

o repasse de custos para outra pessoa ou acumular e exercer o poder de barganha. A competição por melhores resultados (melhores resultados de saúde por dólar gasto) produziria múltiplos vencedores: pacientes teriam um melhor atendimento, os médicos seriam recompensados pela excelência, e os custos absorvidos pelos planos de saúde e pela sociedade em geral seriam contidos. Pode haver vários vencedores porque a competição de soma positiva não tem a ver com ganhar à custa de outro, mas com criação de valor. Transformando o atendimento de saúde Os médicos têm o poder de levar a reforma da saúde para um modelo baseado em valor. Uma vez que as melhorias de valor comecem a ser demonstradas, as mudanças no reembolso e na regulação irão seguir. Um sistema baseado em valor fundamenta-se em três princípios simples: (1) o objetivo é valor para os pacientes, (2) o atendimento é organizado em torno de condições médicas e ciclos de cuidados, e (3) os resultados são mensurados. 1) O objetivo é o valor para os pacientes Embora possa parecer óbvio que o valor para os pacientes é o objetivo do sistema de saúde, o modelo atual não é estruturado dessa maneira. Hospitais tendem a definir o sucesso com o aumento de suas receitas ou o alcance de um excedente de exploração. Os planos de saúde (seguros) querem ser rentáveis e atrair mais assinantes. Os médicos pensam em termos de entregar bem a sua especialidade, vendo mais pacientes, ou aumentando a receita de sua prática. Os pacientes, por outro lado, querem bons resultados, em vez de mais consultas, mais procedimentos ou mais exames. Melhorar o valor para os pacientes é claramente o único objetivo válido por razões éticas. Também é o único objetivo que alinha os interesses dos pacientes, médicos, planos de saúde, empregadores e governo. Se os médicos melhorarem o valor para os pacientes, eles serão capazes de engajar de forma confiável o medicare e os planos de saúde em novas contratações e práticas de reembolso que recompensem tal valor. Alguns médicos temem que os seus rendimentos sejam comprometidos se

PRESSIONADOS A AUMENTAR A PRODUTIVIDADE, MÉDICOS ESTÃO ECONOMIZANDO O TEMPO QUE DEVERIA SER DISPENSADO AOs PACIENTES


eles trabalharem para melhorar o valor do paciente dado o atual sistema de reembolso, que está falido. Há duas respostas para essa preocupação. Primeiro, a espera por um sistema de reembolso correto deixa a responsabilidade pela reforma para o governo e para os planos de saúde. Isso simplesmente incentiva o aumento do gerenciamento administrativo da medicina à medida que cresce a pressão dos custos. Segundo, apesar dos incentivos atuais distorcidos, as oportunidades “ganha-ganha” abundam. Considere o especialista em câncer de mama em prática independente que contratou alguém para aconselhar os pacientes durante o ciclo de atendimento. Embora não tenha havido reembolso adicionado para cobrir o custo para o médico, os resultados dos pacientes melhoraram, libertando quantidades significativas de

tempo do médico. No sistema de hoje, muito do tempo dos médicos é desperdiçado por má coordenação, a redundância de esforços e partilha de informação deficiente, todos os quais podem ser abordados de forma a permitir simultaneamente a melhoria da renda do médico e a evolução do paciente. 2) Organizar-se em torno de condições médicas e ciclos de tratamento Para fazer um progresso dramático na melhoria do valor, a prestação de serviços de saúde precisa ser reestruturada. Os médicos tendem a definir as suas atividades de acordo com a sua especialidade. Para os pacientes, o que importa é a sua condição médica. Organizar o cuidado em torno de condições médicas, em vez de es-

pecialidades ou procedimentos, é a chave para melhorar o valor para os pacientes. Uma condição médica é um conjunto de circunstâncias médicas inter-relacionadas do paciente que são melhor tratadas de forma integrada. Isso engloba condições como os médicos costumam defini-las, tais como diabetes, insuficiência cardíaca congestiva, artrite ou câncer de mama. Mas esta definição difere com a inclusão de todas as especialidades necessárias e as comorbidades mais prevalentes, como diabetes, combinadas com problemas vasculares ou hipertensão. Cuidados eficazes para uma condição médica geralmente requerem esforços conjuntos e coordenados de vários médicos e outros profissionais de saúde. Para praticamente todas as condições, o ciclo de cuidado começa com a triagem

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e prevenção e se estende por todo o caminho através da preparação, tratamento, recuperação, monitoramento contínuo e gerenciamento ativo da doença ativa no caso de doenças crônicas. Múltiplas especialidades, serviços e até mesmo entidades estão envolvidos no ciclo de atendimento. O valor para os pacientes vem do efeito global da sequência completa de atividades e não a partir de qualquer serviço individual. O valor para o paciente é reforçado pela organização prática em torno de condições médicas em instalações adaptadas, em vez do vaivém do paciente entre numerosos escritórios e departamentos. Estes não são unidades focadas, mas conjuntos de instalações ou áreas dentro de grandes instalações que integram o ciclo de atendimento. A maioria dos médicos sabe que seus próprios esforços são prejudicados pela forma como o atendimento é organizado atualmente. No entanto, a prática da medicina tornou-se mais fragmentada, mais focada em serviços discretos ou intervenções e mais direcionada para o tratamento do que para a saúde, até mesmo em organizações de saúde que oferecem uma ampla gama de especialidades. O atendimento é fraturado por numerosos repasses de tarefas e por uma série de distinções artificiais, tais como doentes internados versus ambulatoriais e de reabilitação versus cuidados agudos. Ao reorganizar os seus serviços em torno do sistema integrado das condições médicas, os médicos irão ajudar a reverter essa tendência. Uma melhor integração do tratamento com a prevenção, reabilitação e gestão da doença irá revelar maneiras óbvias para melhorar os resultados gerais e reduzir custos. Isso também irá apontar o caminho de como mudar o sistema de reembolso falido. No resto da economia, enormes ganhos têm sido feitos com uma melhor integração e coordenação de todas as atividades necessárias para servir aos clientes. Redes perfeitamente coordenadas e parcerias têm substituído relações contraditórias ou condições normais de mercado na entrega de valor para os usuários finais. O sistema de saúde está muito atrasado nessa transformação. Médicos, em seu crédito, estão começando a organizar os cuidados em torno de condições médicas e, além disso, estão formando institutos, centros e outros tipos de estruturas integradas que trazem especialidades ne28 Diagnóstico | set/out 2012

cessárias, expertise coletiva e abrangem o ciclo de atendimento. O MD Anderson Cancer Center, no Texas, por exemplo, organiza o atendimento ao paciente em centros voltados para o tipo de câncer do qual ele é tratado. Todas as práticas de especialidades médicas relevantes estão nas mesmas instalações de consulta, terapia e acompanhamento. A Clínica Cleveland, em Ohio, criou unidades práticas integradas em cuidados de cardiologia e oftalmologia e está se movendo em direção a utilizar o modelo de unidade integrada prática em todas as grandes áreas. Esta abordagem no atendimento pode ser adotada em todas as práticas, não apenas em grandes centros. ThedaCare, um pequeno grupo hospitalar de Wisconsin, estabeleceu uma prática ortopédica integrada. Quatro médicos independentes em Massachusetts formaram o Boston Spine Group (Grupo de Coluna Boston), que desenvolveu uma unidade de prática virtual integrada ao New England Baptist Hospital, incluindo dedicados enfermeiros e anestesistas e atendimento coordenado de médicos terapeutas. Mesmo pequenos passos na direção do atendimento integrado podem ter uma grande recompensa. Um hospital em New Hampshire,

por exemplo, apresentou melhoras dramáticas nos resultados quando os médicos simplesmente adotaram a prática de fazer visitas aos pacientes em conjunto e não individualmente. Organizar as condições médicas e os ciclos de atendimento será uma grande mudança para os médicos, mas a reorganização da atenção será mais eficaz se for conduzida pelos médicos e motivada pelo objetivo de melhorar o valor para os pacientes. A mudança da prática de uma especialidade para a organização em torno de condições médicas mudará o agrupamento de departamentos tradicionais para a rede de médicos e profissionais de atendimento de saúde que são solidariamente responsáveis por ciclos de tratamento. Essa abordagem também vai mudar a forma como médicos gerenciam suas práticas. Tradicionais definições acadêmicas de especialidades vão evoluir para definições de condições médicas centradas no paciente, que incluem os predominantes

MEDIÇÃO DE RESULTADOS: avaliações devem ser multifacetadas e levar em conta tratamento e tempo de recuperação


de condições coexistentes. Uma prática de nefrologia, por exemplo, irá participar em várias condições médicas distintas, tais como hipertensão, doença renal crônica, estágio final da doença renal e transplante renal. Cada um tem de ser organizado de forma diferente, com os médicos e funcionários integrados em torno de um ciclo de atendimento diferente. A atenção primária irá evoluir de uma categoria “faz-tudo” para uma grande variedade de modelos, incluindo as práticas que centram atenção especial no diagnóstico, aquelas que prestam cuidados na fase inicial para condições particulares, aquelas que fornecem gerenciamento de doenças para combinações de condições e aquelas que se concentram em triagem e gestão da saúde. A maioria das práticas de atendimentos primários vai participar de várias equipes no ciclo de tratamento de condições médicas, além de oferecer exames de saúde de rotina e manutenção. A integração do atendimento em todo o ciclo de uma condição médica é a primeira ordem de integração médica necessária porque beneficia todos os pacientes: a estrutura organizacional e de gestão financeira deve ser centrada a este nível. Coordenação de cuidados em condições médicas, necessários para pacientes com comorbidades incomuns ou complexas (como um paciente com câncer que precisa de cirurgia cardíaca), é a segunda ordem de integração. Isso poderia ser feito por um mecanismo formal de coordenação que envolve um médico principal responsável pelo cuidado global do paciente e uma estrutura de incentivos que motiva todos os grupos envolvidos no cuidado a serem ágeis e trabalharem conjuntamente. A necessidade desta coordenação muito mais rara, no entanto, não deve definir a principal organização da prestação de cuidados. Hoje, há impedimentos artificiais para a integração entre a condição médica e os ciclos de atenção, como a compensação relativamente baixa para os cuidados de consulta, as estruturas de pagamento separadas para internação e atendimento ambulatorial, as limitações das leis Stark de coordenação entre os médicos independentes (projetadas para evitar abusos de autorreferência) e a prática corporativa arcaica de leis de medicina em muitos estados. Estes obstáculos podem ser superados com um custo hoje, mas eles vão ceder à medida que o foco do setor de

ORGANIZAR AS CONDIÇÕES MÉDICAS E OS CICLOS DE ATENDIMENTO SERÁ UMA GRANDE MUDANÇA PARA OS MÉDICOS, MAS A REORGANIZAÇÃO DA ATENÇÃO SERÁ MAIS EFICAZ SE FOR CONDUZIDA PELOS MÉDICOS E MOTIVADA PELO OBJETIVO DE MELHORAR O VALOR PARA OS PACIENTES saúde mude da concorrência disfuncional para a melhoria do valor mensurado para os pacientes, condições médicas e ciclos de cuidados. 3) Mensurar resultados Simplesmente não há maneira de conseguir grandes e sustentadas melhorias de valor para os pacientes sem medir os resultados: o conjunto de resultados ajustados ao risco de atendimento para cada condição médica, juntamente com os custos de atingir esses resultados. Processos de atendimento, o foco de grande parte do atual movimento de qualidade, não são os resultados. Uma boa análise dos resultados são os vitais feedbacks, indicando o que funciona e o que não funciona. Estas medidas permitem uma visão profissional e o desenvolvimento de expertise. Boas medidas de custo também fornecem feedback vital que indica se um médico ou equipe alcançam esses resultados de forma eficiente. Cada setor próspero da economia aproveita esse tipo de informação para estimular o aprendizado. A saúde é a exceção. As mensurações de resultados são necessariamente multifacetadas, incluindo não apenas a mortalidade e morbidade, mas também fatores como complicações, tempo de recuperação e a necessidade de tratamento. Cada condição médica deve ter suas próprias medidas de resultados, estratificadas ou ajustadas ao risco pelas condições iniciais do paciente. Para serem mais úteis, os resultados devem ser medidos ao longo do ciclo completo de

cuidados (ou ao longo de um período de tempo, no caso de uma doença crônica) e não para os serviços individuais ou mesmo episódios de atendimento (como cirurgia). A concepção de uma avaliação de resultados de risco ajustado não é fácil, mas sua praticidade tem sido convincentemente demonstrada. Em algumas áreas muito complexas da saúde, tais como cuidados intensivos, cirurgia de transplante, cirurgia cardíaca e cuidados de longa duração para a fibrose cística, medidas validadas já estão disponíveis há muitos anos. Os médicos podem e devem tomar medidas significativas. Esta é uma área em que lideranças médicas e a coordenação da sociedade médica fariam uma enorme diferença. Certamente, o progresso não é uniforme. Em geral, os resultados de medição são melhor desenvolvidos para a cirurgia do que para a medicina. Especialistas médicos virão a entender que medida de resultado é a única maneira convincente de demonstrar a necessidade de reembolsos mais generosos para serviços que não são baseados em procedimentos. Como qualquer coisa que seja complexa como medidas de resultado, sempre vai haver espaço para aperfeiçoamento. Nada, entretanto, vai apressar mais essas melhorias do que implementar essas medidas. Organizações como The Cleveland Clinic, Intermountain Health, Dartmouth-Hitchcock, ThedaCare e muitas outras estão avaliando os resultados agora, pelo menos para algumas condições médicas. Nessas organizações, dados de resultados, combinado com o estudo das causas, têm levado a um rápido entendimento tanto sobre qualidade quanto sobre eficiência. Algumas associações médicas, como a Sociedade de Cirurgia Torácica e a Sociedade Americana de Mastologia, estão usando análise de dados de resultados para entender e acelerar a adoção de melhores práticas. Médicos de família associados ao Life Laboratório na Pensilvânia criaram uma cultura de atenção aos resultados através da elaboração de uma revisão e do feedback da performance dos médicos. Seus esforços para atingir uma ótima qualidade de atendimento a baixo custo produziram taxas significativamente mais altas do que a média regional, de acordo com testes de rastreio (mamografia, papanicolau, triagem colorretal e varreduras de densidade Diagnóstico |set/out 2012

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óssea), bem como uma menor utilização de medicamentos em geral. Na verdade, onde as informações dos resultados estão disponíveis para os médicos de forma bem elaborada, os ganhos para os pacientes têm sido impressionantes, independentemente de se os médicos desenvolveram suas próprias medidas ou adotaram as desenvolvidas por outros. Quando a medição de resultados começou na fibrose cística, por exemplo, a média de vida de um paciente com a doença era de 18 anos. Hoje, a esperança média de vida é de 33 anos, e nos principais centros, de 47 anos. Em cirurgia de revascularização do miocárdio, a mortalidade entre os pacientes do estado de Nova York diminuiu 41% nos primeiros quatro anos de publicação dos resultados. Em Minnesota, o MN Community Measurement começou a relatar cinco medidas de resultado sobre diabetes para grupos médicos em 2002, com relatório completo publicado no início de 2004. O sucesso foi definido como um paciente passando pelos limites especificados em todas as cinco medidas. Em apenas dois anos de comunicação pública, o percentual de pacientes em todo o estado que atingiram essa medida de sucesso mais do que dobrou. Os médicos devem liderar o desenvolvimento e a utilização de medidas de

resultados. Medidas de custo também são importantes, e o estado atual das informações de custo é abismal. Hoje, os custos são muitas vezes confundidos com encargos, reembolsos ou preços e não são medidos para cada paciente. Mas, em termos de uma concorrência baseada no valor, os custos seriam melhor compreendidos e refletidos nos preços. Idealmente, os médicos teriam boas informações de custo não apenas para procedimentos ou medicamentos, mas para o ciclo de atendimento completo. Assim como com medidas de resultados, boas informações de custo levam a insights sobre o que é realmente eficiente. Análise de resultados (colocando os resultados e os custos juntos) é o único caminho para permitir as decisões sobre a prestação de serviços de saúde que mantenham ou melhorem a qualidade e ao mesmo tempo que reduzam custos. Informações de resultados revelam uma das ideias mais importantes sobre a prestação de serviços de saúde: atendimento verdadeiramente de alta qualidade é geralmente mais barato. Uma das razões mais importantes para medir os resultados é que a melhor maneira de reduzir os custos é melhorar os resultados. A ideia de medir e publicar os resultados muitas vezes tem sido vista por alguns médicos como uma ameaça. É fácil

ver como medidas mal construídas usadas inadequadamente podem fazer mal. Bem entendida, no entanto, a medição e análise de resultados fornece uma tremenda oportunidade para a melhoria. Uma esmagadora evidência sugere que há muito espaço para melhorias de valor em todos os campos da medicina. Somente pelo rastreamento sistemático dos resultados os médicos terão as ferramentas necessárias para melhorar a qualidade e, simultaneamente, reduzir custos. A resistência às medidas de resultados tem sido talvez a mais profunda da ferida profissional autoinfligida pelos médicos. Se os médicos não exigirem as informações que eles precisam para melhorar a si mesmos, os programas que ditam como eles devem praticar a medicina vão continuar a proliferar. Se os médicos liderarem a criação do tipo certo de informação de resultados, eles vão apreciar o poder de excelência demonstrada para permitir melhorias no atendimento, reembolso mais apropriado e maior controle da prática médica por profissionais médicos.

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A Diagnóstico veicula na próxima edição a segunda e última parte do artigo How Physicians Can Change the Future of Health Care (Como os médicos podem mudar o futuro do sistema de Saúde - em tradução livre). Publicado com autorização do autor. Todos os direitos reservados.

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Mc Connell Photography/Divulgação

MD Anderson Cancer Center, no Texas: todas as especialidades de câncer em uma mesma instalação

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PERFIL BORIS BERENSTEIN

Marcelo Soares

Um lÍder soft power

Maior referência em radiologia no estado de Pernambuco, Boris Berenstein tem na simplicidade um de seus maiores ativos. O empresário está em franca expansão nos negócios, mas não perde o foco no que o fez crescer: a relação com os clientes Gilson Jorge

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esmo comandando um grupo que emprega cerca de 300 pessoas e que deve faturar R$ 28 milhões este ano, o médico Boris Berenstein, 62 anos, circula pelo seu escritório, no centro do Recife, com a simplicidade de quem está se preparando para o almoço de domingo com a família e amigos. Voz mansa, sorriso suave e constante, o homem que reinventou a rotina de diagnósticos por imagem em Pernambuco 32 Diagnóstico | set/out 2012

usou, desde o início, a relação com os pacientes como um dos seus principais ativos para crescer. Filho de imigrantes romenos que enfrentaram na Europa o horror do nazismo e, no Brasil, a falência do primeiro negócio da família, Boris parece não se impressionar com o sucesso pessoal obtido em 24 anos como empresário. Para o pernambucano que se tornou uma das maiores referências em radiologia no país, a medicina é uma paixão através da qual pode se conectar com os outros. “Sempre digo a meu filho León que o

mais importante nessa profissão é poder ajudar, conversar com as pessoas”, orgulha-se o empresário, que, com o crescimento da família e dos negócios ao longo de duas décadas e meia, já tem como colaborador direto o seu primogênito, chefe do setor de radiologia do Grupo Boris Berenstein. Iniciado casualmente nessa especialidade, quando um professor da faculdade o convidou para estagiar em sua clínica, Boris dedicou-se a datilografar prontuários de pacientes, uma experiência que seria crucial na formação de sua futura empresa. Ao ver todas aquelas anotações sobre


Filho de imigrantes romenos, o médico e empresário foi pioneiro no Recife em oferecer diferentes exames de imagem em um mesmo lugar

a saúde das pessoas que atendia, o jovem estudante pensou que elas poderiam fazer boa parte dos exames em um mesmo lugar. Assim nasceria, em 1988, a Boris Berenstein Imagem e Laboratório. Ou, como gosta de definir o empresário, o início de sua “carreira solo”. O homem que quase desistiu dos estudos para ajudar a família, após a morte do pai, e que começou a vida profissional vendendo ações de grandes empresas nordestinas, abria seu próprio caminho. “Ele é um visionário”, afirma a presidente da Unimed Recife, Maria de Lourdes Correia de Araújo, que conhece Berenstein há 25 anos, ressaltando o modus operandi do amigo: enxergar oportunidades, trabalhar com afinco e prestar atenção em quem está ao seu redor. “Eu não conheço alguém que saiba ouvir tanto as pessoas quanto ele”, destaca. O modelo desenvolvido por Boris, pioneiro em Pernambuco, prosperou rapidamente e, duas décadas e meia depois, o serviço virou referência no estado. O grupo se espalhou por outras quatro unidades na Região Metropolitana do Recife e até o fim de dezembro abre a sua primeira unidade no interior do estado, em Arcoverde. Importante polo regional do sertão pernambucano, o município vai passar a contar com uma vasta gama de serviços médicos, incluindo ressonância magnética, num investimento total de R$ 2,5 milhões, feito com parceiros locais. Sobre os planos de continuar a expansão da sua empresa, Berenstein anima-se: “Pernambuco está crescendo como a China”. Cresce também a visibilidade da marca em todo o Brasil, e algumas empresas manifestaram interesse em comprar o Grupo Berenstein. O seu criador admite o assédio, mas afirma sua intenção de permanecer ainda por muitos anos à frente dos negócios. O certo é que a valorização atingida pela empresa mostra que ainda há muito por alcançar. Um destino grandioso para o filho de um casal de imigrantes judeus que fugiu da Europa em plena Segunda Guerra Mundial, escapando da perseguição nazista, e que escolheu recomeçar a vida do zero no

Recife, cidade que já contava àquela época com uma considerável população judaica, inclusive membros da família Berenstein, que vieram antes e ganhavam a vida vendendo móveis. Essa também seria a forma com a qual o recém-chegado casal criaria os filhos, incluindo o pequeno Boris, nascido dois anos após o desembarque no Brasil, e que se tornaria, décadas depois, o representante máximo daquela comunidade, como presidente da Federação Israelita de Pernambuco. Mas, há quatro décadas, Boris quase mudou o rumo de sua vida. A morte do pai, nos anos 1970, fez o então universitário pensar em largar os estudos para ajudar no sustento da família. A mãe, Pola, não permitiu e assumiu ela mesma a condução dos negócios até que a loja de móveis, em crise financeira, fechasse as portas. guarda-roupa de papelão – Boris decidiu trabalhar como vendedor de ações, mas seguiu com os estudos. Quando recebeu o primeiro salário, o jovem estudante programou uma farra para comemorar a vida nova. Seu plano, entretanto, foi abortado por uma imposição de dona Pola, hoje com 92 anos, que serviria como exemplo para toda a sua vida profissional: ele foi obrigado a poupar a metade do que ganhava. A austeridade marcou os primeiros anos da empresa, mais do que em qualquer outra época. “Usávamos a embalagem do aparelho de raio-x como nosso guarda-roupa”, lembra Boris, sobre o início do empreendimento, quando ele e Mary, com quem havia casado recentemente, alugaram uma casa no bairro do Derby para trabalhar e morar ao mesmo tempo. Ele sabia que estava começando algo que podia ser grande e não se importava com os incômodos iniciais. “Sempre lembro daquela frase: somente no dicionário o sucesso vem antes do trabalho.” Os investimentos feitos por Berenstein são movidos por uma série de fatores, como o acelerado crescimento da economia pernambucana e a consequente elevação da demanda por serviços de saúde, as relações cultivadas com os clientes e, principalmente, o pragmatismo de um homem acostumado a enxergar soluções para os seus negócios e para as pessoas que trabalham com ele. Funcionários entram sem anúncio prévio na sala onde os Berenstein trabalham, no casarão do Derby, decorada com fotos

As relações com os clientes do tempo em que eu estagiava em uma clínica me permitiram criar uma rede de usuários que funciona como propaganda. Hoje atendemos 30 mil pessoas por mês da família e de cada uma das unidades do grupo. No estacionamento no pátio da empresa não há vagas reservadas à diretoria, embora tenha-se estabelecido o costume de que o carro de Boris para sempre no mesmo lugar. Dois taxistas e um flanelinha que trabalham em frente ao escritório costumam participar das festas de confraternização da empresa. O filho mais velho do empresário, León Berenstein, vê esse clima de trabalho entre amigos como o grande capital do grupo, que realiza cerca de 30 mil exames por mês e conta muito com a propaganda boca-a-boca. O jovem médico se inspira em Boris para tocar o negócio da família. “Ele trabalha pensando nas pessoas”, afirma o primogênito, batizado com o nome do avô paterno. Além da dedicação ao trabalho, Boris cativa funcionários e clientes pela gentileza e pelo bom humor com que enfrenta a rotina da empresa. Não grita com os trabalhadores e nem buzina se a sua vaga predileta no estacionamento estiver ocupada pelo automóvel de outra pessoa. O crescimento dos negócios e o envolvimento da família não significaram uma redução no ritmo de trabalho de Boris, que continua acordando todos os dias às 5h20. Mas ele está cada vez menos presente no escritório e se dedica principalmente ao planejamento da empresa. “Ele vai tendo as ideias, criando as coisas, e eu fico aqui organizando, vendo como colocar em prática”, diz Mary, sorrindo. Diagnóstico |set/out 2012

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POLÍTICAS PÚBLICAS INTERNACIONAL

o presidente DOS EUA, barack obama: reeleição dará chance ao democrata para implementar mudanças no dispendioso sistema de saúde americano

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Fotos: Shutterstock

OBAMA CARE O desafio do presidente reeleito dos Estados Unidos de pôr em prática a maior reforma do sistema de saúde americano desde a Segunda Guerra Mundial Gilson Jorge e Rodrigo Sombra Da Califórnia, especial para a Diagnóstico

A

reeleição do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, no último dia 6 de novembro, foi especialmente festejada pelos quase 30 milhões de norte-americanos que não têm acesso a um plano de saúde. Com a definição de um segundo mandato para o democrata, não há mais obstáculos para que entre em vigor, a partir de janeiro de 2014, a nova lei que garante o acesso ao atendimento médico e à compra de medicamentos a praticamente todos os cidadãos americanos da classe média. Estima-se que na nação mais rica do planeta morram aproximadamente 45 mil doentes, a cada ano, por falta de assistência. Lançado pelo governo norte-americano em 2010, o Patient Protect and Affordable Care Act – ou simplesmen-

te ACA, que em tradução livre significa Lei de Proteção ao Paciente e de Plano de Saúde Pagável – visa à criação de um competitivo mercado privado de serviços de saúde que vai funcionar por meio da internet: são os Affordable Insurance Exchanges, a maior intervenção do governo dos Estados Unidos no setor desde a Segunda Guerra Mundial. Neles, os americanos vão poder comparar os preços e as condições de atendimento oferecidos pelos planos de saúde em cada estado e escolher a opção mais conveniente. A base do programa é o Health Connector (www.mahealthconnector.org), um sistema controlado pelo estado que faz a mediação das relações entre seguradoras e beneficiários. Esse impressionante mercado de serviços de saúde foi criado em Massachusetts em 2006 pelo então governador Mitt Romney e, desde então, elevou a cobertura médica a 98% da população


POLÍTICAS PÚBLICAS INTERNACIONAL do estado. De longe, o melhor índice de cobertura de todo o país. Graças ao programa, cerca de 150 mil pessoas que antes não tinham plano de saúde conseguiram parar de fumar com a ajuda do programa de saúde estatal MassHealth. Curiosamente, Romney, o autor da proeza, passou a ser visto como a maior ameaça ao “Obamacare” durante a última campanha presidencial. Terminada a disputa eleitoral, a tarefa de Obama em seu segundo mandato será fazer com que os cidadãos americanos, em todos os estados, tenham acesso a um plano de saúde parecido com o Health Connector. Os programas serão administrados pelos governos estaduais, mas receberão subsídios do governo federal. Essas versões locais estão sendo chamadas de State-based Health Insurance Exchanges (SBE). Responsável pela implementação do programa em Vermont, Anya Rader Wallack declarou ao site Modern Healthcare que a confirmação de um segundo mandato para o democrata só fez mostrar que esse pequeno estado, no nordeste dos Estados Unidos, estava no caminho certo quando decidiu começar a instalação do Green Mountain Care Board, versão regional do programa, que vai gerir a assistência para os pouco mais de 600 mil habitantes do estado. Desses, 47 mil não têm qualquer cobertura médica. Para Wallack, a eleição de Obama aumenta a certeza de que Vermont vai contar com uma forte parceria do governo federal. “O resultado eleitoral afeta mais o planejamento a curto prazo, antes que o Green Mountain Care comece de fato a atuar”, afirmou. Batizado popularmente de Obamacare, o programa criado pelo governo pode se tornar um alívio na vida de milhões de americanos, que, ao longo dos anos, se tornaram reféns de um sistema que impossibilita os clientes de fazerem qualquer procedimento não especificado no contrato. Caso queira visitar um especialista que não esteja listado em seu plano, por exemplo, um americano de classe média pode ir à falência. Para se ter um ideia, um estudo comparativo feito pela International Federation of Health Plans (Federação Internacional dos Planos de Saúde) em nove países mostra que os americanos pagam mais do que argentinos, chilenos, indianos, suíços, espanhóis, franceses, 36 Diagnóstico | set/out 2012

alemães e canadenses por qualquer um dos procedimentos avaliados na pesquisa: consultas, radiografias, compra de medicamentos ou cirurgias, à exceção da operação de cataratas, que é mais cara na Suíça. Uma diária de hospital nos Estados Unidos custa, em média, US$ 15.734 (mais de R$ 32 mil), o que representa dez vezes mais o valor de uma internação na Espanha. Um americano que precisar de uma apendicectomia vai precisar desembolsar US$ 13 mil (R$ 26 mil), bem mais do que uma cirurgia similar arranca de um paciente argentino, US$ 1.030. O tratamento de azia é bem mais indigesto para quem vive no país mais rico do mundo. Uma embalagem de Nexium sai por US$ 193 (R$ 390) nos Estados Unidos, quase três vezes o valor a ser pago por um suíço que exagerou na comida. Um detalhe é que a diferença da renda per capita entre americanos (US$ 46.850) e suíços (US$ 41.950) é mínima, segundo levantamento da revista Forbes. À frente da maior rede de hospitais da Califórnia (e quinta maior dos Estados Unidos), Lloyd Dean, da Dignity Health, considera que o acesso a planos de saúde deve ser “justamente o oposto de um privilégio”. Fundada em 1986, em São Francisco, a entidade conta com uma rede de 60 mil profissionais e voluntários e atua também nos estados do Arizona e Nevada. “Independentemente do lado político em que se está, não há dúvidas de que o modelo anterior a essa reforma era insustentável”, defendeu Dean. O maior problema para o usuário de plano de saúde, até a intervenção do governo Obama, era a possibilidade de ser esmagado pelos interesses conflitantes de hospitais e médicos, que naturalmente tendem a empurrar procedimentos e exames de utilidade questionável, e das operadoras, que podiam limitar, a seu bel prazer, a cobertura do plano ou se recusar a pagar pelas diárias que julgassem desnecessárias. Abusos como esses estão proibidos desde que o presidente americano assinou, em 2010, o ACA, regulando protesto contra o atual modelo de saúde dos eua: uma doença não deveria levar ninguém à falência, diz cartaz empunhado por americana

As regulações pouco podem fazer para melhorar o atendimento e desviam tempo e energia que deveriam ser empregados nos pacientes michael speer, associação de médicos do texas


a relação entre clientes e operadoras e proibindo que os planos de saúde decidam arbitrariamente quando vão deixar os segurados na mão. As operadoras não podem mais, por exemplo, deixar de atender a pacientes que, ao assinar um plano, já sejam portadores de uma das chamadas doenças preexistentes, como diabetes tipo 2, câncer e asma. Além disso, as operadoras não podem mais cancelar itens oferecidos pelo plano depois que o cliente adoece ou limitar gastos financeiros com despesas consideradas essenciais. E, pelas novas regras, os clientes podem ainda manter os filhos como dependentes até os 26 anos, idade em que normalmente os jovens terminam a faculdade e começam a trabalhar. A implementação do programa propriamente dito segue em passos distintos ao longo do país. Até o último dia 9 de novembro, 14 estados já haviam instituído uma autoridade responsável pela instalação dos State-based Health Insurance Exchanges (SBE). Mas quase metade dos governadores, boa parte deles republicanos contrários à mudança, decidiu aguardar o resultado da eleição presidencial para ver o que ocorreria em caso de uma eventual vitória de Mitt Romney, que fez críticas ao modelo durante a campanha eleitoral,

mesmo tendo executado em Massachusetts, quando governador, um programa idêntico, que inclusive serviu de base para o ACA de Obama. No estado de Michigan, que contribuiu firmemente para a reeleição de Obama, em reconhecimento pela franca recuperação da indústria automobilística local, a expressão forward (avançar, em inglês), slogan de campanha do democrata, ganha uma força ainda maior quando se trata de assistência médica. Para o CEO do Detroit Medical Center, Mike Duggan, o segundo mandato de Obama significa que as reformas vão avançar e que cerca de 500 mil moradores de Michigan vão ter a assistência médica que nunca tiveram. Planos de saúde e brócolis – O projeto do democrata enfrentou forte reação dos conservadores, que chegaram a acionar a Justiça contra o Obamacare alegando uma suposta inconstitucionalidade. Além da oposição política, o projeto ganhou a desconfiança de parte da população, que enxergou na medida uma intromissão inoportuna do Estado na vida privada. Chegou-se a levantar a discussão sobre se as pessoas deveriam ser obrigadas a pagar por um serviço. Para o governo, entretanto, o projeto trata de

assegurar com um pagamento mais em conta o acesso futuro a um bem que pode custar ao cidadão um valor além de suas posses. Durante uma acirrada batalha na Suprema Corte, o juiz Antonin Scalia, contrário à nova legislação, chegou a declarar que, se o Congresso pode exigir que os americanos adquiram um plano de saúde, nada impediria o parlamento de forçar o povo a comprar brócolis, ainda que muita gente não aprecie esse vegetal. A rejeição de Scalia ao projeto tem um viés ideológico. Ele foi indicado para a corte pelo ex-presidente George W. Bush, republicano e antecessor de Barack Obama. Médico residente na prestigiosa Johns Hospkins University School of Medicine, Neil Neumann considera que parte da reação negativa ao plano de Obama se deve ao fato de que os críticos enxergam o programa do governo como uma penalização ao cidadão, que seria obrigado a comprar um serviço. “Só vai haver mudanças (positivas) na vida de quem está abaixo da linha da pobreza e de quem tem doenças preexistentes. Eu sinto que muitas pessoas não entendem os benefícios que o ACA traz para elas”, declarou Neumann em entrevista à Diagnóstico. Ele acha que

por cinco votos a quatro, a suprema corte decidiu em favor do obamacare

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POLÍTICAS PÚBLICAS INTERNACIONAL manifestação no estado de oklahoma em favor da reforma na saúde: 50 milhões de americanos sem plano de saúde

Muitos críticos afirmam que a reforma vai piorar o déficit, mas condenam o aumento de impostos e as provisões econômicas que garantem seu equilíbrio fiscal John McDonough, universidade de harvard

essa imagem ruim do programa decorre de uma certa inabilidade do governo na comunicação. Mas há descontentes por vários motivos. Jornais americanos reportaram, por exemplo, a queixa de empresários religiosos que não querem os planos de saúde contratados por seus negócios arcando despesas de procedimentos anticonceptivos de suas funcionárias. Mesmo não sendo afetado diretamente pelas mudanças no setor de saúde, o empresário Michael Bloodsworth tem uma visão crítica do programa. Com poucos funcionários, sua pequena fábrica de painéis solares na Flórida não vai ter aumento nas despesas, mas ainda assim Bloodsworth se mostra cético. “O resultado dessa nova legislação é que o governo vai controlar quase tudo o que se refere à indústria. Dizem que podemos manter a nossa cobertura atual, mas isso é só um pedaço da verdade. A maior parte da população não vai se dar conta do que acontece até que as mudanças estejam tão arraigadas que os danos sejam irreversíveis”, afirmou Bloodsworth, em entrevista à Diagnóstico. Fora do campo político, muitos americanos têm se perguntado qual será o 38 Diagnóstico | set/out 2012

impacto prático da reforma no sistema. A questão preocupa particularmente a profissionais de saúde, receosos quanto a uma maior interferência do Estado na relação médico-paciente, uma vez que o Obamacare prevê a criação de comissões designadas para estabelecer padrões de qualidade no atendimento e estipula o pagamento de bônus a médicos dispostos a enviar relatórios sobre seu trabalho para a avaliação do governo. Cético, o presidente da Associação de Médicos do Texas, Michael E. Speer, afirmou que essas “centenas de regulações impostas pela lei” pouco podem fazer para melhorar o atendimento e desviam tempo e energia que deveriam ser empregados nos pacientes. Em artigo publicado no Journal of the American Medical Association, sob o título Avaliação suprime a motivação?, as doutoras Christine K. Cassel e Sachin H. Jain levantam suspeitas quanto ao alcance dos parâmetros de avaliação. O risco seria que os médicos se afastassem de diagnósticos complexos, diminuindo seu senso de responsabilidade profissional e tornando a sua atividade mais uma commodity. Para o professor de políticas públicas

da Universidade de Stanford, Laurence C. Baker, essas críticas devem perder fôlego. Baker acredita que, mesmo após a reforma, “ainda haverá independência considerável para doutores e pacientes tomarem suas decisões”. Em entrevista à Diagnóstico, a professora do Departamento de Políticas Públicas da University of California, Los Angeles (UCLA), Arleen Leibowitz, observa que questões a respeito da prática médica podem ser aperfeiçoadas pela reforma no futuro. “O ACA trata primordialmente do financiamento do serviço de saúde, não da assistência médica em si. Os médicos terão muita informação quando as diretrizes acerca do tratamento forem desenvolvidas”, pondera. Orçamento – Apoiados em análises sombrias, especialistas afirmam que a lei não é fiscalmente viável e projetam uma escalada incontrolável da dívida pública devido à elevação dos gastos com a saúde nos próximos anos. Considerando o déficit federal (avaliado em US$ 16 trilhões), críticos consideram a reforma uma “via expressa à bancarrota”. Mas análises da oposição contrariam frontalmente as projeções da Comis-


HOSPITAL SÃO RAFAEL: GESTÃO COM FOCO NO SER HUMANO O São Rafael é um hospital sem fins lucrativos, atuando em Salvador e em diversas cidades do interior da Bahia através do Monte Tabor – Centro Ítalo-Brasileiro de Promoção Sanitária, sua entidade mantenedora. Com foco no ser humano e na missão “Ide, Ensinai e Curai”, somos uma das instituições de saúde mais reconhecidas pelos baianos.

GESTÃO EFICIENTE E ÉTICA NAS OPERAÇÕES Para nós do São Rafael, assistência de qualidade e gestão de excelência estão plenamente articuladas, sem perder de perspectiva as dimensões éticas e sociais. Foi a partir desta convicção que assinamos o “Pacto Empresarial pela Integridade e Contra a Corrupção”, iniciativa do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social. Vale destacar que o São Rafael é o primeiro hospital no Brasil signatário desta iniciativa. Para conhecê-la, visite www.empresalimpa.org.br .

ASSISTÊNCIA PLENA À SAÚDE Em Salvador, a gestão do São Rafael se faz presente, também, no Hospital 2 de Julho e nas Unidades Ambulatoriais Fleming, Garibaldi, Centro de Oncologia Irmã Ludovica Sturaro e São Rafael Onco. Na região metropolitana, na Unidade Vilas. Nossa missão se estende ao Hospital Ana Mariani, em Barra (oeste da Bahia). Como organização social, o São Rafael colabora com o Estado e a Prefeitura na gestão de estruturas públicas, como o Hospital Deputado Luis Eduardo Magalhães, em Porto Seguro, o Hospital Regional Dantas Bião, em Alagoinhas, e a Unidade de Emergência São Marcos, em Salvador. Confira os números!

Cirurgias

Atendimentos

Internamentos

24.277

641.905

35.919

Ano de referência: 2012 (até outubro) - Monte Tabor CIBPS Nosso trabalho foi reconhecido pela Organização Nacional de Acreditação que, após rigorosa avaliação, atribuiu o conceito de “Acreditado Pleno” ao São Rafael. Nossa missão — a cura do homem integral na sua tríplice dimensão biopsicoespiritual — cumpre, assim, o mandato evangélico “Ide, Ensinai e Curai”.

www.hsr.com.br Central de Marcação 71 3409.8000

Dra. Liliana Ronzoni Diretora Médica CRM-BA 9775

facebook.com/saorafaelbahia

Diagnóstico |set/out 2012 @saorafaelbahia

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são de Orçamento do Congresso norte-americano (CBO), órgão autônomo do Legislativo que ratificou, mais de uma vez, o orçamento previsto pela reforma. Para o diretor do Centro de Lideranças para Saúde Pública da Universidade de Harvard, John McDonough, a avaliação da CBO não pode ser ignorada. Na opinião dele, a chancela da comissão acende um sinal verde para a implementação do Obamacare. “O ACA, como concebido e escrito, não irá aumentar o déficit federal porque é totalmente autofinanciado”, afirmou McDonough em entrevista à Diagnóstico. “Muitos críticos dizem que a reforma vai piorar o déficit, mas também condenam o aumento de impostos e as provisões econômicas na lei que garantem o seu equilíbrio fiscal”, assinala. McDonough acredita, porém, que futuras disputas políticas possam causar fissuras na reforma. Segundo o professor, a oposição republicana pode usar a maioria no Congresso para alterar emendas e tentar bloquear fundos que permitam o avanço do Obamacare. McDonough crê ainda que os republicanos podem “continuar a espalhar informações falsas sobre a lei para manter a opinião pública dividida e mais negativa do que estaria caso os americanos entendessem as realidades da lei”. Donald Taylor, especialista em políticas públicas da Duke University, acredita, contudo, que a derrota na eleição presidencial pode mudar a estratégia da oposição. “Penso que eventualmente deve acontecer um acordo político que ponha as impressões digitais de facções republicanas na lei, dando a eles algum crédito, mas também alguma responsabilidade”, disse Taylor em entrevista à Diagnóstico. “Vamos alcançar de algum jeito um sistema melhorado, um processo que nunca será concluído”. Em julho deste ano, o primeiro obstáculo à nova lei foi removido com a decisão apertada (cinco votos a quatro) da Suprema Corte, que considerou não haver nada de ilegal na determinação do presidente em normatizar a relação entre os planos de saúde e os seus consumidores. Agora, com a reeleição, o caminho para o Obamacare está trilhado. 40 Diagnóstico | set/out 2012

Americanos recebem atendimento médico em Cuba

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a esteira dos problemas enfrentados por milhões de americanos para ter acesso aos serviços de saúde, o cineasta Michael Moore lançou, em 2007, o documentário Sicko, em que faz uma comparação entre o atendimento médico nos Estados Unidos, no Canadá, no Reino Unido, na França e em Cuba. Em seu característico estilo provocador, Moore acompanha a via crucis de um grupo de bombeiros com doenças cardiorrespiratórias em busca de atendimento médico em território americano. A maior parte deles adoeceu em consequência da poeira tóxica inalada seis anos antes, no resgate das vítimas dos atentados terroristas de 11 de setembro. Depois de tentativas frustradas, o grupo viajou de barco até Cuba, onde conseguiu atendimento rápido e grátis, incluindo medicação. Para receber na pequena ilha comunista o tratamento que lhes havia sido negado em seu próprio país, os heróis americanos tiveram apenas que apresentar um documento de identificação na recepção do hotel. Antes de voltar, os bombeiros ainda foram homenageados por seus colegas cubanos pela atuação em um dos maiores atentados terroristas da história. O cartaz do documentário, que faz uma comparação do caro sistema de saúde americano com os dos outros países, traz Moore vestido de médico e colocando uma luva cirúrgica, com a expressão “This might hurt a little” (Isso pode doer um pouquinho). Mesmo não prestando assistência universal de saúde, os Es-

tados Unidos são, de longe, o país que tem o maior investimento per capita no setor, desembolsando o equivalente a 18% do PIB, segundo relatório da Organização Mundial de Saúde, publicado no ano 2000. É quase o dobro do que gasta o Reino Unido (9,6%) e mais que o destinado por outras nações desenvolvidas, como a Alemanha (11,6%) e o Japão (9,5%). Segundo o relatório, o sistema de saúde dos Estados Unidos é apenas o 37º mais eficiente do mundo, em um ranking liderado pela França, Itália, San Marino, Andorra e Malta. O Brasil não aparece entre os 40 melhores colocados em 2000, mas outro relatório publicado em 2010 cita o país como uma das nações com baixa renda per capita que têm ajustado o financiamento do setor de forma a permitir o acesso de pessoas pobres ao sistema. A edição da revista Veja de 21 de novembro de 2012 aborda os problemas que o governo Obama enfrenta para vencer o chamado abismo fiscal, enquanto se prepara para arrecadar mais US$ 25 bilhões em impostos, somente para o financiamento do programa de saúde para idosos, deficientes físicos e pessoas com doenças renais crônicas. Por outro lado, no início do ano que vem, deixam de vigorar uma série de subsídios e incentivos fiscais oferecidos há 10 anos pelo então presidente George W. Bush, o que pode retirar de circulação da economia cerca de US$ 700 bilhões, elevando o risco de a economia americana entrar novamente em recessão, caso republicanos e democratas não cheguem a um acordo até o fim deste ano.


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Gilmar Ferreira/Ag. CNJ

ENTREVISTA FERNANDO MATTOS

FERNANDO MATTOS, DO FÓRUM NACIONAL DE SAÚDE: diálogo com a ANS e Anvisa

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“Há mais de 200 mil processos em trâmite na área de saúde no Brasil” À frente do Fórum Nacional de Saúde, o magistrado Fernando Mattos garante que os juízes estão mais preparados para atender as demandas do setor, rebate a tese de que a Justiça é pró-usuário e admite: faltam juízes para julgar Rebeca Bastos Diagnóstico – O que mudou na rotina do Judiciário desde a criação do Fórum Nacional de Saúde, em 2009? Mattos – Apesar do pouco tempo de atuação do Fórum, já identificamos avanços. O primeiro deles é a percepção, por parte do magistrado, de que ele pode ter um auxílio na hora de tomar decisões técnicas. A outra é a identificação de temas que já estão pacificados pelos tribunais e que podem ser implementados diretamente pelas operadoras sem a necessidade de uma intervenção do Poder Judiciário. É importante ressaltar que algumas resoluções do fórum já estão saindo do papel. A ANS dispôs em consulta pública, por exemplo, uma resolução normativa que determina que os planos informem em até 48 horas o porquê do usuário ter tido sua demanda negativada. Isso surgiu da primeira reunião do fórum, a partir da demanda de juízes que atuam na área cível e de direitos de consumidor e que identificaram que muitas vezes o consumidor recorria à Justiça, mas não sabia explicar por que o atendimento tinha sido negado. Então levamos a proposta à ANS, que aprovou uma minuta de resolução que já está em vigor. O trabalho e a experiência de todos têm sido fundamentais para os trabalhos do fórum. Diagnóstico – OPME continua sendo o maior ponto de discórdia entre operadoras e usuários? Falta transparência nos contratos firmados entre as partes? Mattos – A questão de OPME não é mais polêmica que outras, pois o que leva à ação judicial são reinterpretações do que está escrito no contrato. Deveria haver uma evolução na relação das cláusulas dos contratos das operadoras. O que tentamos no Fórum Nacional de Saúde é dar um maior embasamento ao Judiciário para que os processos sejam resolvidos de forma mais técnica. Para tanto, forne-

cemos literatura e informações que possam ajudar na decisão, além de facilitar o acesso a profissionais de saúde que auxiliem na formação de um juízo. Diagnóstico – Outro problema da judicialização são as drogas para câncer e doenças raras que, em geral, não são comercializadas no Brasil. Como o juiz procede nesses casos? Mattos – A ideia é identificar matérias que já estejam pacificadas pelos tribunais e que possam ser implementadas diretamente pelas operadoras sem necessidade de uma intervenção do Poder Judiciário. O fórum também tem buscado apoio junto aos órgãos reguladores, a exemplo da Anvisa, para que esse direito que já foi reconhecido seja garantido ao usuário sem a necessidade da via judicial. Um dos nossos objetivos é justamente a formação de uma rede de juízes integrados, que estejam atentos não apenas à letra da lei, mas às demandas da sociedade. Diagnóstico – Há um consenso entre os empresários do setor de saúde de que a Justiça é sempre pró-usuário. Qual é a sua opinião a respeito? Mattos – Discordo. Trata-se de uma impressão. Até porque, muitas vezes, os casos que chegam às mãos dos juízes têm caráter emergencial, e, por uma questão de tempo, o juiz acaba sendo favorável aos usuários. Vale salientar que a própria criação do Fórum Nacional de Saúde e os diálogos constantes com os integrantes da rede de saúde, tanto a pública, quanto a privada, fazem parte de iniciativas para que o número de ações judiciais diminua com o tempo. Diagnóstico – As operadoras costumam dizer que o usuário compra um Fusca (se referindo a um plano básico), mas quer receber uma Ferrari (uma alusão ao pa-

drão exigido no momento do sinistro). Pode comentar? Mattos – O que acontece com frequência é uma reinterpretação dos contratos. Temos que fazer um esforço para que os contratos sejam cada vez mais legíveis para os usuários, que ainda têm muitas dúvidas sobre quais são os seus direitos reais. Isso é, inclusive, um dos pontos principais de nossas pautas. Diagnóstico – A judicialização no mercado de saúde vai continuar sendo uma tendência? Mattos – O juiz está submetido a uma carga de trabalho muito grande. O Brasil tem déficit de magistrados e conta atualmente com 90 milhões de ações tramitando, entre essas, mais de 200 mil se referem a processos na área de saúde. Então, esse número não é tão discrepante diante da realidade do número global de processos, mas estamos tentando reduzi-lo. Uma das formas de reduzir esse índice é homologar os acordos entre operadoras e usuários nos Procons, para que tenham força executiva, e essa é uma das propostas que estão sendo discutidas entre os representantes do fórum. Mas o caminho passa por entendimento e respeito maior às cláusulas contratuais, além de fazer com que as regras fiquem mais claras para ambas as partes. Para tanto, já temos diálogo com as agências reguladoras e operadoras de saúde suplementar que fazem parte do fórum e podem receber orientações e também dar contribuições sobre os diversos temas discutidos. Diagnóstico – O senhor possui plano de saúde? Está satisfeito com sua operadora? Mattos – Sim e até agora não tive nenhuma intercorrência. Mas não hesitaria em usar o direito para conseguir ter acesso a um serviço que foi contratado. Diagnóstico |set/out 2012

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Hospital Agenor Paiva Fotos: Roberto Abreu

Serviço de ortopedia do hospital conta com atendimento qualificado e com equipamentos de ponta

Inorb marca novo momento do Hospital Agenor Paiva Hospital investe para se tornar referência em atendimento ortopédico na Cidade Baixa

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stabelecer e tornar referência o Instituto de Ortopedia do Bonfim (Inorb) é o mais novo desafio do Hospital Agenor Paiva, modelo em atendimento hospitalar à população da região da Cidade Baixa, em Salvador. Para tanto, o hospital investiu em infraestrutura e ampliou em 50% a capacidade de atendimento do seu centro ortopédico, que conta com uma equipe de 16 ortopedistas capacitados para atender desde traumas até hérnias de disco. A estrutura de pronto atendimento ortopédico chefiada pelo Inorb permite que um paciente fraturado possa ser operado em até 24 horas. Tudo isso associado a uma imagem de solidez e eficiência de quem busca sempre a satisfação de seus clientes e a excelência no atendimento médico-hospitalar que já perdura por 46 anos. “Queremos qualificar cada vez mais o nosso serviço de ortopedia e traumatologia para atender com eficiência toda a demanda de usuários de planos de saúde e particulares da região da Cidade Baixa. Hoje, esses pacientes ortopédicos precisam se deslocar para outros serviços por desconhecimento de que no Bonfim existe um serviço de ponta e com profissionais qualificados para atendê-los com excelência”, assegura Dr. Francisco Bragança, coordenador do serviço de ortopedia do hospital e idealizador da expansão do Inorb. Atualmente, a equipe de ortopedia da instituição é respon44 Diagnóstico | set/out 2012

sável por um volume médio mensal de 120 cirurgias entre SUS e planos de saúde. A ampliação do serviço de ortopedia e traumatologia é mais um dos investimentos da instituição no intuito de atrair um novo perfil de pacientes. Para cativar esse público mais exigente, o hospital ampliou suas instalações físicas, modernizou sua hotelaria, além de investir na aquisição de equipamentos de ponta e na qualificação de seu corpo clínico. Outros serviços importantes também foram reestruturados pelo hospital, como os setores de bioimagem, cardiologia, coloproctologia e oncologia. Outra novidade que faz parte do projeto de expansão do serviço de ortopedia é a reestruturação do serviço de fisioterapia do hospital, que pretende atender até 150 pacientes por dia, aumentando em mais de 100% a sua capacidade atual. “Dessa forma, o paciente de ortopedia poderá fazer o seu tratamento completo aqui no Inorb. Isso representa mais comodidade e eficácia, pois grandes deslocamentos nem sempre são indicados em casos mais complexos”, justifica Dr. Bragança. Com um corpo clínico capacitado, investimentos constantes em melhorias de suas instalações físicas e um atendimento humanizado, o Hospital Agenor Paiva busca se reposicionar no mercado de saúde de Salvador como referência em atendimento hospitalar em uma das regiões mais populosas da cidade, que abrange toda a Cidade Baixa, Península de Itapagipe e Subúrbio ferroviário.


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Carogestor Participe: carogestor@diagnosticoweb.com.br

Tenho um amigo empresário que se orgulha de ter em seus quadros funcionários com 15, 20 anos de empresa. Ele diz que tem uma equipe afinada e que sempre valoriza os quadros internos. Manter funcionários com longos anos de empresa é realmente salutar? Há empresas com políticas específicas de “longevidade curta”, em cargos de diretoria, por exemplo. Isso faz sentido? (Anônimo) O que importa não é o tempo de casa ou a idade dos funcionários, mas o resultado que estes entregam para a organização. Há alguns anos, as políticas e práticas de recursos humanos eram orientadas para valorizar a “lealdade” dos funcionários, que, por exemplo, eram “premiados” crescentemente quando completavam cinco, dez, 15 anos na mesma empresa. Era muito importante ter o menor número de empregos registrados na carteira de trabalho. Passamos por um período em que se valorizou o contrário: quanto mais um profissional se movimentava entre empresas, mais valorizado era. Uma carteira de trabalho cheia de registros era valorizada. É evidente que ambos os modelos têm seus prós e contras, não é mesmo? 46 Diagnóstico | set/out 2012

Osvino Souza é gerente de projetos e professor da Fundação Dom Cabral nas áreas de Comportamento e Desenvolvimento Organizacional

Divulgação

A lealdade pode ser acompanhada de acomodação, situação que pode levar a empresa à estagnação e o funcionário à mediocridade. A alta rotatividade leva a falta de lealdade, visão de curto prazo, perda de investimentos em treinamento e desenvolvimento, entre muitos outros reflexos. Os funcionários que mudam frequentemente de emprego podem até ganhar mais, mas podem, também, ficar superficiais em seu conhecimento e especialização. O contrato psicológico de trabalho sofreu grandes transformações nos últimos anos. Houve uma importante evolução na relação entre o empregador e o empregado. Particularmente, considerando o momento atual do país, quando temos oferta de emprego e carência de profissionais especializados, esta relação implica uma permanente negociação entre as partes. A empresa precisa de resultados, e o funcionário, de satisfação de suas “necessidades”. Cabe aos gestores da organização promover um ambiente de permanente desafio e atendimento às necessidades intelectuais e “espirituais” dos empregados e cabe a estes proporcionar os resultados desejados pela empresa. A questão então é a empresa saber que resultados precisa.


Temos no nosso grupo, que atua na área de diagnóstico por imagem, uma rotina espartana de reuniões, que ocorrem a cada semana. São encontros quase sempre infrutíferos e com pouco resultado prático. Há algum manual de como se fazer reuniões produtivas? (Anônimo) Sim, existem livros que tratam do assunto, alguns até muito bons, mas a questão é que fazer reuniões produtivas depende de muitas condições. De fato, muitas organizações acabam se viciando em reuniões. Elas muitas vezes viram um bom refúgio para quem quer fingir que está trabalhando. Não que elas não tenham seu lugar, mas é preciso saber para que servem e que resultados produzem. Existem reuniões de caráter meramente informativo, para tomada de decisões, para a solução de problemas, para troca de ideias e experiências, para a formação do espírito de equipe etc. É preciso fazer um diagnóstico e uma revisão das práticas da sua organização. Mas é preciso considerar também a atitude das pessoas, desde o responsável pela reunião, até os seus participantes. Se a atitude não for apropriada, nada mudará. Segundo os “manuais”, reuniões têm que ter um objetivo claro e divulgado para todos os participantes. Faça um exercício. Escreva o objetivo das reuniões em que participa ou pelas quais você é responsável. Você verá como a prática contínua disto já promoverá importantes mudanças. É comum encontrar dificuldade para escrever o objetivo pensando em resultado prático para uma reunião. Reunião sem objetivo claro e convincente não deve ser realizada. Outra prática recomendada é a elaboração de uma pauta, que também deve ser distribuída para todos os participantes com antecedência. Recomenda-se a definição de horário para início e término, que a duração seja a mais curta possível, bem como uma análise criteriosa de quem precisa realmente participar. Verificar no final da reunião se o objetivo proposto foi atingido e, se não, qual o motivo, é fundamental. Observe que isto tudo exige muita disciplina e uma atitude voltada para resultados não apenas da reunião, mas da empresa. A reunião produziu resultados para a empresa? Esta é uma pergunta indispensável.

Pedi demissão do meu último emprego logo após receber uma proposta da concorrência. Mesmo assim, fui surpreendido com uma contraproposta bem parecida com o que haviam me oferecido, tanto em termos de valores quanto de progressão na carreira. Recusei e preferi sair. Fiquei pensando por que eles não me valorizaram antes? Achei que foi uma reação de conveniência. Fiz o certo? (Anônimo) Só você e o tempo poderão dizer se você fez o certo. Em sua pergunta, você me remete à percepção de que o que o motivou a mudar de emprego foi a busca por uma melhoria em sua remuneração, mas há uma pontinha de insatisfação com o tratamento que lhe foi dado enquanto esteve no emprego anterior. Seria falta de reconhecimento? A contraproposta pode ter sido um reconhecimento tardio, já que me parece que você estava realmente decidido a mudar. Sou muito preocupado com o uso do termo “emprego”, pois este remete muitas vezes ao conceito simplista de “um lugar onde sou remunerado pelo trabalho que faço”. Os profissionais, hoje em dia, têm buscado mais do que isto que chamo de mão de obra. Já que passamos a maior parte de nossas vidas no trabalho, queremos nos sentir desafiados intelectualmente e realizados “espiritualmente”, ou seja, queremos empregar o máximo de nossa inteligência e sentir que nossos valores pessoais estão sendo respeitados. O trabalho precisa fazer sentido em nossa vida. As empresas têm procurado se ajustar a esta nova realidade, oferecendo projetos desafiadores, disponibilizando oportunidades de treinamento e desenvolvimento aos funcionários. A maior dificuldade, no entanto, tem sido encontrada na questão dos valores. Um bom casamento entre os valores individuais, do empregado, e institucionais, da empresa, é fundamental para a estabilidade e longevidade desta relação. Ambos precisam ter certeza de que está valendo a pena. A empresa precisa estar segura de que o empregado agrega valor, e este, por sua vez, precisa ter certeza de que está “suficientemente feliz” em todos os aspectos: financeiro, motivacional, intelectual etc. As pessoas não devem mover-se orientadas apenas pela remuneração; elas precisam sentir-se realizadas com o que fazem. A velha expressão “o dinheiro por si só não traz felicidade” tem sentido, pelo menos quando nos referimos ao mundo do trabalho. Diagnóstico | set/out 2012

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Diretoaoponto MAURÍCIO BARBOSA

Maristela Dantas/Divulgação

“O e-commerce é um parceiro estratégico para o setor de saúde” A Bionexo foi fundada em São Paulo, no ano 2000, com um modelo pioneiro de e-commerce hospitalar e, em pouco tempo, tornou-se a maior referência do país no setor. Somente em 2012, a empresa espera fechar o ano com um valor total de R$ 3,5 bilhões em transações. Presente em outros quatro países (Argentina, Colômbia, Espanha e México), a Bionexo responde por 90% do market share na América Latina e segue rumo à expansão dos negócios, dentro e fora do território nacional. “Dos cerca de 7.500 hospitais existentes no Brasil, 15% já compram insumos hospitalares pela internet por meio das nossas soluções eletrônicas”, salienta Maurício de Lázzari Barbosa, CEO da Bionexo. Um número que tende a avançar, com a incorporação de 250 hospitais e crescimento anual de 30% – segundo estimativas do próprio executivo, que falou à Diagnóstico. Há ainda barreiras culturais para o avanço do e-commerce hospitalar no país? Sim, mas elas vêm sendo transpostas dia a dia. E, assim como no varejo, o comércio eletrônico tem espaço garantido no mercado corporativo. As empresas da área de saúde mantêm negócios cada vez mais utilizando soluções como a que oferecemos. Dos cerca de 7.500 hospitais existentes no Brasil, 15% já compram insumos hospitalares pela internet por meio das soluções eletrônicas da Bionexo. Vale ressaltar também que a aquisição de bens e insumos representa o segundo item de maior custo para as instituições de saúde. Por isso, uma ferramenta online torna-se um “parceiro” estratégico para o setor de saúde, possibilitando aumento da carteira de fornecedores, crescimento da produtividade, redução do tempo e dos custos operacionais, além de facilidade na gestão dos materiais, entre outras vantagens. QUAL A ECONOMIA MÉDIA CONSEGUIDA POR UM HOSPITAL AO OPTAR PELO E-COMMERCE? Ela pode variar de hospital para hospital, mas um percentual seguro para mercados maduros como o Brasil é de 10%. Na maioria dos casos, contudo, esse número tende a ser maior. Afinal, o comércio 48 Diagnóstico | set/out 2012

eletrônico vem crescendo rapidamente e de maneira constante nos últimos anos. Cada vez mais, os consumidores aderem ao e-commerce. E não é por menos. É uma modalidade que reúne diversas vantagens: comodidade, agilidade, segurança, economia etc. Quais são os planos da Bionexo para o mercado do Nordeste? Já estamos presentes em todos os estados da região, com um total de 117 hospitais e expandindo, cada vez mais, nossa atuação. Por isso, vamos estabelecer um escritório regional em Recife, que será estruturado para atender as demandas de nossos clientes locais nas áreas comercial, de relacionamento e tecnologia, além de necessidades de implementação e treinamento. Apesar de não termos uma data ainda fechada para o início da operação no Nordeste, posso adiantar que deve ocorrer o mais breve possível. em valores, Qual o volume de transações estimado DA bionexo este ano? Devemos fechar 2012 com R$ 3,5 bilhões em transações. Crescemos 30% ao ano, com uma adição de 250 a 300 hospitais anualmente.

Maurício barbosa, da Bionexo: market share de mais de 90% na América Latina e previsão de 30% de crescimento em 2013.

Qual o market share da empresa na América Latina? Dos hospitais que utilizam alguma solução de compras eletrônicas, tanto no Brasil como na América Latina, nossa participação no mercado é de mais de 90%. por que A escolha da ventures partners como parceiro/ investidor ? Nosso objetivo foi acelerar o plano de expansão nacional e internacional da Bionexo. Para capitalizar novas oportunidades e projetos, entendemos que seria importante buscar um sócio que trouxesse não somente aporte financeiro como também que fosse um player global com foco nas áreas de tecnologia/internet e e-commerce. Como líder do setor, a Bionexo tem a responsabilidade de continuar inovando e manter a construção de uma cultura de resultados com transparência nas compras do setor de saúde ibero-americano. Por que o segmento de órteses e próteses ainda engatinha nessa modalidade de negócio? Pelo contrário, este nicho de mercado vem crescendo. E é fundamental para o setor que as compras de órteses e próteses possam ter mais competitividade e transparência em sua gestão de compras.


Quem lê decide. Quem decide lê.

josé Aécio fernandes Vieira, diretor-presidente do Hospital Memorial São José, de Recife

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Foto: Marcelo Soares


Paulo Lopes ARTIGO Iracema Chequer

projetos da área. Agindo desta maneira, teremos então uma gestão eficaz de pessoas. E o grande responsável, sem sombra de dúvidas, deve ser o Paulo Lopes é CEO do Grupo líder principal, o qual deverá buscar implantar na sua organizaOrganiza, diretor da Associação ção práticas avançadas de liderança de pessoas. Comercial da Bahia, headhunter, Uma dessas práticas é o exercício da liderança através da fercoach, palestrante e autor do livro ramenta de coaching. Neste caso, o líder deve exercer o papel “Segredos de um Headhunter” de professor/treinador, ajudando os seus liderados e a equipe a estabelecer uma visão compartilhada, liderar pessoas, proporcionar feedback construtivo e, principalmente, apoio no desenvolvimento das competências comportamentais. Todo líder deveria praticar um processo de líder coach, que compreende alguns passos básicos: 1. Precisa conhecer sua empresa, ou seja, quem são as pessoas que lidera? Qual o projeto de cada uma delas, ou seja, onde querem chegar? Quais são as qualidades que ela já possui que ajudam neste desenvolvimento e quais precisam ser desenvolvidas e/ou melhoradas? 2. Buscar fixar e estabelecer alianças e parcerias entre a equipe e você, o líder principal. 3. Fixar desafios através de metas visando não só à performance (resultados), mas também ao seu desenvolvimento (planejamento de carreira). 4. Apoiar na elaboração de planos visando ao atingimento dessas o Líder deve exercer odos nós sabemos que a competitivimetas, ou seja, o que e quando readade das empresas brasileiras é incono papel de Professor/ lizar. testável, mas a manutenção dessa poos obstáculos, ou Treinador, ajudando seja,5. asIdentificar sição exigirá das lideranças empresariais do dificuldades que serão enos seus liderados país o fortalecimento do fator mais importancontradas e como estruturar planos te para a competitividade, que é o desenvolalternativos para removê-los. e a equipe a vimento de pessoas. Este artigo explora como 6. Exercitar permanentemente o estabelecer uma visão feedback construtivo visando à exisso pode ser feito por meio do líder coach. Para a obtenção de performance e de repansão dos liderados. compartilhada sultados sustentáveis são enormes os desafios 7. Buscar permanentemente o das organizações brasileiras, principalmente ensinamento dos liderados visando do setor de saúde, no qual é notória a escassez de mão de obra ao desenvolvimento pessoal e engajamento com a filosofia e vaqualificada em todos os níveis, o que exige das empresas altos lores da organização. investimentos para a atração, contratação, desenvolvimento e reContudo, é fundamental que essas lideranças estejam fortenção dos seus colaboradores. temente integradas com a cultura organizacional, pois somente Na nossa atividade de headhunter, temos observado que pro- assim podemos ter aderência e, consequentemente, obter resulfissionais com capacidade de gestão, liderança e empreendedo- tados. rismo, aliado à forte competência técnica e que sejam realizaÉ muito importante também que todos os líderes devam posdores, ou seja, façam acontecer, são altamente disputados pelas suir as seguintes competências: autoconhecimento, desenvolver organizações. Além da atração dos talentos, as organizações de pessoas, dar e receber feedback e ter controle emocional. Com saúde ainda precisam enfrentar o desafio da retenção do capital essas competências e os líderes atuando de forma proativa e humano. empreendedora, não temos dúvidas de que irá proporcionar às Acreditamos que uma estratégia seria a de implantação de organizações: um modelo de gestão estratégica de pessoas de forma a possi1. Alinhamento de pessoas, estratégia e performance. bilitar a integração entre pessoas, cultura e resultados. Esse mo2. Programas e processos efetivos de desenvolvimento. delo contempla uma integração do planejamento estratégico dos 3. Existência de uma liderança de pessoas e equipe. negócios com a área de recursos humanos. O modelo pressupõe 4. Modelagem da cultura organizacional. que haja uma definição clara do negócio, estratégias gerais, es5. Melhores resultados econômicos e financeiros do negócio. tratégias funcionais e políticas de recursos humanos, bem como Podemos afirmar, então, que, para obtenção de uma gestão e a fixação de objetivos, indicadores, metas e plano de ação para liderança de pessoas como diferencial competitivo das empresas, a área de recursos humanos. A consolidação desse modelo dar- o vetor fundamental é o papel e atuação dos líderes, pois somen-se-á com a elaboração do orçamento anual da área de recursos te esses poderão fazer germinar o sucesso que existe dentro de humanos, visando possibilitar autonomia na implementação dos cada pessoa.

Gestão e liderança de pessoas: o diferencial competitivo

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MERCADO FÓRUM DE LÍDERES

O Nordeste no mapa Fórum de Líderes da Saúde do Nordeste reuniu, em Porto de Galinhas (PE), as principais lideranças do setor médico-hospitalar da região. Encontro foi considerado um marco para o trade de saúde brasileiro Fotos: Roberto Abreu

evento contou com audiência seleta e a presença de alguns dos principais atores do trade de saúde nacional

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Nordeste entrou definitivamente no mapa dos grandes eventos do setor médico-hospitalar brasileiro. E o marco foi o Fórum de Líderes da Saúde do Nordeste, realizado entre os dias 25 e 28 de outubro, no Enotel Resort & Spa, em Porto de Galinhas, Pernambuco. Durante quatro dias, os principais empresários da região que mais cresce no país puderam discutir o futuro do mercado de saúde nacional. Ao todo, foram mais de 10 palestras, rodadas de negócios e uma profusão de contatos e networking entre os mais de 100 participantes. Tudo isso em um evento que aliou conteúdo de ponta e lazer em um dos mais luxuosos hotéis da região “O fórum se comportou como um desfile de moda: apontou tendências”, comentou o presiden54 Diagnóstico | set/out 2012

te da Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp), Francisco Balestrin. O crescimento econômico do Nordeste, que se mantém, em média, 20% acima do restante do país, foi apontado pelos participantes como fator favorável ao desenvolvimento do mercado de saúde na região. Otimista com as oportunidades do trade, o fundador do Grupo Delfin, Delfin Gonzalez, traçou o momento da economia nacional: “Enquanto as fusões e aquisições tiveram uma queda de 21% no mundo, no Brasil houve um crescimento de 55% só no primeiro semestre deste ano”, informou. “A qualidade das plenárias foi o ponto alto. O Nordeste merecia um evento dessa envergadura”, afirmou a empresária Waleska Santos, da Hospitalar. Para ela, que participou do fórum desde a abertura, a necessidade de aproximar um país continental, com encontros regionais,

é uma tendência. De acordo com Paulo Bragança, executivo da Amil, maior operadora do país, o que se viu no evento foi um encontro marcado pela hospitalidade, organização e audiência qualificada. “Para a Amil, foi uma honra poder participar como patrocinador de um evento dessa envergadura”. Responsável pela organização do evento, o empresário Reinaldo Braga revelou que o encontro teve êxito graças ao apoio incondicional de parceiros como a Hospitalar, Fenaess e FBH, além dos patrocinadores. “O sentimento imperante é de que há uma carência de informação latente por parte do empresariado local. Havia uma lacuna à espera de ser preenchida”, afirmou. “Passamos a ter, a partir de agora, um encontro marcado, todos os anos, com o trade de saúde local. A região já merecia um evento com essa envergadura”.


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Francisco Balestrin (Anahp) 2 Delfin Gonzalez (Grupo Delfin) e Boris Berenstein (Grupo Boris Bernstein) 3 Paulo Magnus (MV) 4 Marcelo Kutter (Medicware) 5 Luis Aramicy (FBH), Carlos Miranda (BR Opportunities), Rendrik Franco (Grupo Fleury) e Carlos Barros (Gávea Investimentos) 6 Edward Yang e Maria Lúcia Teixeira Ramos (Hospital Albert Einstein -SP) 7 Waleska Santos (Hospitalar) 8 Fred Bandeira (Rede D’Or) e Maria de Lourdes Araújo (Unimed Recife) 9 Bruno Sobral (ANS), Alexandre Diogo (IBRC) e Anita Assis (Golden Cross) 1

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Ricardo Nóbrega (White Martins) e João Lampropulos (Hospital Memorial São José (PE) 11 Alfredo Martini (Hospital São Rafael (BA), Carlos Suslik (PwC) e Rodrigo Mota (L+M GETS) 12 Reunião de negócios no stand do Grupo Delfin/Biofármaco 13 Stand da Amil 14 Paulo Garcia (Linde Gases) 15 Área de exposição reservada aos patrocinadores concetrou a atenção do público presente 16 Foto panorâmica da área de exposição do fórum 10

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Roberta Medeiros e Carlos Alberto Medeiros (Hospital de Ávila - PE) 18 Breno Moureira (Sindicato dos Hospitais do Pará) Eduardo Queiroz (Hospital Santa Izabel - BA), Cícero Andrade (Fenaess) e Marcelo Guimarães (BNB) 20 Nádia Holanda, Paulo Bragança e Elisabet Gonçalves Morais - Amil) 21 Carlos Suslik (PwC) 22 Augusto Soares (Santa Casa de Misericórdia BA, sua esposa, a promoter Cristina Maslowiski (UP Eventos), e filhas 23 Débora Andrade e Cláudio Lamenha (Hospital Aeroporto - BA) 24 Alexandre Loback (Hopital Esperança - PE) e Thales Melo (Hospital São Marcos - PE) 25 Marcelo Britto (Ahseb) e Antônio Eduardo Cunha (Sindicato de Hospitais da Paraíba) 26 Jorge Oliveira (Grupo Promédica - BA) e Daniel Figueiredo (Dalkia) 27 Sala paralela discutiu PPP da Saúde 28 Gilson Cidrim e Isabel Nunes - Laboratório Gilson Cidrim) 17

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ARTIGO IBGC

Zonas cinzentas do modelo decisório entre acionista controlador, conselho e diretoria executiva na indústria da saúde Cabe ao conselho de administração zelar por definições claras de competência no modelo decisório. É justamente a partir dessa instância que a boa governança é implantada Banco de imagens

por Artur Neves*

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onas cinzentas de liderança e de controle manifestam-se em empresas de diversos setores, sejam elas listadas, não listadas, de capital multifamiliar ou de dono. Podemos observar que estes vácuos de poder e liderança diferenciam-se apenas no grau de intensidade. A indústria de saúde que caracterizo neste texto como composta pelos (i) prestadores de serviço, (ii) operadoras da saúde e (iii) fornecedores tem em muitos casos as mesmas características quanto ao controle societário. A maior parte dos casos são empresas em transição societária, seja pela passagem de liderança à segunda geração dos acionistas ou pela venda e incorporação pelos grandes grupos que se fortalecem no Brasil. A formação de grandes grupos operadores na indústria da saúde iniciou-se na década de 90 e tem se mostrado como um desenho organizacional eficaz devido aos ganhos de escala e custos operacionais menores que as redes de menor tamanho. A estratégia de crescimento destes grupos societários é clara. Irão expandir-se, seja pelo crescimento orgânico das suas instalações, seja pelo crescimento através da aquisição de outras empresas. Independentemente do modelo de crescimento, as demandas sobre o modelo de gestão e governança se fazem presentes. Um dos componentes importantes do sistema da governança é a racionalização, desdobramento e controle do processo decisório. As zonas cinzentas de liderança se 58 Diagnóstico | set/out 2012

A solução dessas zonas cinzentas de exercício da liderança organizacional passa pela implantação da boa governança

estabelecem como vírus residentes e, frequentemente, alojam-se no sistema do poder decisório da organização, manifestando-se principalmente nos ambientes corporativos em que não há uma clara definição quanto às competências e responsabilidades dos órgãos societários. Observa-se que esta indefinição da liderança pode acontecer também quando as atribuições da estrutura organizacional, apesar de formalizadas, não são adequadamente comunicadas ou respeitadas pelos controladores, conselheiros e diretores. O curioso é que estas zonas de indefi-


nição organizacional, quando instaladas, tendem a se incorporar na cultura organizacional e passam a fazer parte do jeito de ser daquela organização. Entretanto, esta percepção de indefinição da liderança passa comumente a servir aos interesses os mais diversos, inclusive dos próprios órgãos administrativos envolvidos. Os conselhos e conselheiros, de forma geral, quando são incapazes de identificar e solucionar este problema orga-

nizacional, costumam oscilar nos seus comportamentos, tal qual um pêndulo, movimentando-se entre os seus extremos. Num extremo ele colabora com o desenvolvimento dos negócios ocupando os espaços vazios, tornando-se um órgão operacional. No outro extremo, o conselho se posiciona como alheio a estes espaços não preenchidos de liderança e com seu distanciamento reforça o uso da ausência de liderança para fins que não o melhor para a organização. Esta ação pendular do conselho de administração ocorre quando, por exemplo, o conselho atua como gerenciador, inter-

vindo na operação. Ao mesmo tempo em que essa iniciativa sugere uma redução do conflito de agência, pode gerar também dois comportamentos: o primeiro refere-se à omissão do corpo de gestão. O segundo associa-se a um conflito de competências entre o conselho e a diretoria, caso a diretoria reaja à sobreposição de papéis. Esta reação à sobreposição de papéis leva, neste caso, e na maior parte das vezes, à perda de importantes ativos humanos. No primeiro caso, a situação é cômoda para os diretores, uma vez que o conselho passa a ocupar toda a estrutura de poder decisório. As zonas cinzentas surgem, então, do excessivo foco do conselho nas questões operacionais, dando pouca atenção à sua função de equacionar as questões relativas às estratégias e aos desafios de perenidade do negócio. No segundo caso, o conflito de papéis e de competências entre o conselho de administração e a diretoria gera um inevitável conflito e instabilidade no poder decisório, com prejuízos à organização. Esse fenômeno pendular costuma estar mais presente nas organizações de controle concentrado, nas quais as duas hipóteses estão presentes. Ou os controladores atuam como gestores do dia-a-dia, ou, na hipótese extrema, se omitem quase por completo em relação aos seus direitos e deveres, dentre os quais o de fiscalizar. A solução dessas zonas cinzentas de exercício da liderança organizacional passa pela implantação da boa governança, que visa atuar preventivamente e disciplinar o exercício do poder decisório. É a governança implantada que dá legitimidade à escolha do modelo de gestão, dos princípios e dos valores da empresa. Acionistas, conselheiros e diretores são atores do sistema da governança que possuem clara distinção de competências e de responsabilidades, que, quando implementados por meio de regras e procedimentos apropriados, produzem equilíbrio e resultam em um bem maior para a organização. Organizações no segmento da saúde que possuem sistemas adequados de governança têm também sistemas decisórios que se desdobram em toda organização e adicionam valor ao negócio. Infelizmente, contudo, a maioria dos mecanismos de mensuração de valor usados pelas companhias não captura isoladamente a eficiência de um bom sistema decisório. Todavia, se houver o entendimento

esta indefinição da liderança pode acontecer também quando as atribuições da estrutura organizacional, apesar de formalizadas, não são adequadamente comunicadas ou respeitadas pelos controladores, conselheiros e diretores de que o próprio conselho de administração é um dos órgãos críticos de geração ou de estímulo a estas zonas cinzentas, a solução é o próprio conselho ou o conselheiro independente assumir a liderança, demandando a criação de um sistema de governança que enderece soluções a essa questão e que seja compatível com a maturidade da organização. O modelo de governança implantado deve incluir, dentre outras práticas, regras claras sobre as competências e alçadas dos órgãos societários. Dependendo do nível de maturidade da organização, estas definições podem estar fixadas no estatuto social ou nos regimentos da companhia. Este modelo deve contemplar também a estrutura de monitoramento do processo decisório, seus controles e um eficiente fluxo de informações. É por intermédio da liderança do conselho de administração que a boa governança é implantada no segmento da saúde. A boa governança, por si só, não gera valor aos acionistas, uma vez que esse valor irá depender da eficácia dos órgãos que compõem o modelo de governança em desempenhar suas funções, o que inclui zelar pela redução dos espaços não governados.

*Artur Neves (artur.neves@uol.com.br) é conselheiro e consultor. É associado e membro da comissão de saúde do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Diagnóstico |set/out 2012

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RESENHA GESTÃO

O livro de cabeceira de Edson Bueno Obra do americano Jim Collins já foi indicada pelo fundador da Amil a seus executivos. Livro disseca os bastidores das grandes falências e as histórias de quem foi ao fundo do poço e voltou

R Eduardo César

eza a lenda que o fundador do Grupo Amil, Edson Bueno, costuma distribuir livros ligados à gestão no processo de treinamento dos seus executivos. E uma das publicações escolhidas pelo número um da saúde brasileira pela lista da Forbes merece especial atenção, pois toca em um assunto espinhoso: o fracasso. Em Como as Gigantes Caem (Elsevier, 2010), Jim Collins – um dos mais respeitados pensadores de assuntos que envolvem gestão e negócios – tece a teoria em paralelo com exemplos reais do mundo corporativo tangido pelo fracasso. “O objetivo deste livro é oferecer uma visão fundamental em pesquisas sobre como o declínio pode ocorrer, mesmo para empresas aparentemente invencíveis, de forma que os líderes possam ter mais chances de evitar seu trágico destino”, explica Collings. Na busca pelo entendimento e elaboração de um modelo de declínio empresarial, Collins recorre, ainda na introdução, a uma passagem curiosa do romance Ana Karenina, de Tolstoi: “Todas as famílias felizes são iguais. As infelizes o são cada uma à sua maneira”. Em seguida, o autor conclui que existem “mais maneiras de cair do que de se tornar excelente”. E, com base em dados de pesquisa, elabora um modelo com cinco etapas que evoluem em sequência. “Passei a ver o declínio institucional como uma doença em estágios: mais difícil de detectar, porém mais fácil de curar nos primeiros estágios; mais fácil de detectar, porém mais difícil de curar nos estágios posteriores. Uma instituição pode aparentar ser forte, mas já estar doente por dentro, perigosamente à beira de um enorme abismo”, escreve. O Titanic – Antes, o leitor é apresentado a um dos exemplos mais incisivos sobre a queda de um gigante: o Bank of America, ou O incrível banco que encolheu, segundo o título de um artigo que abordou o episódio em meados da década de 80. Maior banco do mundo, com quase 1.100 filiais, operações em mais de 100 países e total do ativo de cerca de US$ 100 bilhões, em apenas oito anos a situação se reverteu, e a instituição se transformou em um dos maiores exemplos de declínio, com reflexos, inclusive, no mercado financeiro. Como as Gigantes Caem foi escrito no auge da grave crise econômica de 2008, quando as instituições bancárias tiveram prejuízos de milhões de dólares. E o drama do Bank of America vem de mãos dadas com uma dura lição: toda instituição é vul60 Diagnóstico | set/out 2012

livro de collins foi escrito no auge da crise econômica de 2008

nerável, por mais excelente que seja o desempenho. E a solução vai muito além da noção de mudança. Segundo Collins, se uma empresa tão poderosa e bem posicionada quanto o Bank of America pode cair tão rapidamente e tão abruptamente, então qualquer empresa pode cair. “E, mais cedo ou mais tarde, a maioria cai”, profetiza o autor. Etapas – As três primeiras fases do declínio, segundo Collins, estão ligadas aos gestores que se comportam como se estivessem em uma espécie de zona de conforto. São elas: excesso de confiança, ambição somada à indisciplina e o não reconhecimento dos riscos. As duas seguintes são consequências diretas das anteriores: o desespero e a morte. Para o autor, o sintoma inicial que pode se tornar uma ameaça às organizações está na arrogância. “Um líder equivocado pode levar uma empresa à ruína praticamente sozinho”, afirma o autor. Ou seja, perder de vista os principais fatores que levaram ao sucesso da empresa, menosprezar a concorrência e as possíveis ameaças são erros fatais. Para ilustrar, Collins também traz o exemplo da Motorola. Em meados da década de 90, alheia à onda digital que surgia, a então líder mundial em telecomunicações apostou todas as fichas na tecnologia analógica, com o modelo de telefone celular


“O caminho para sair da escuridão começa com aquelas pessoas persistentes a ponto de serem irritantes, que são absolutamente incapazes de se entregar” JIM COLLINS Divulgação

Jim Collings

StarTac. Questionados sobre se esta era de fato a melhor postura em relação ao lançamento de um produto, um dos líderes seniores negou a ameaça digital: “Quarenta milhões de clientes analógicos não podem estar errados”. Como resultado, em 1999, a Motorola perdeu o posto de fabricante número um, com 50% da participação de mercado, e caiu para 17%. Ou seja, um processo de declínio em acordo com o primeiro estágio: o excesso de confiança proveniente do sucesso. Reação em cadeia – A segunda etapa é a busca indisciplinada por mais. É quando uma organização se torna cega e obstinada pelo próprio sucesso, cresce além da capacidade, esquece dos principais fundamentos que a levaram ao topo e de gerenciar aspectos básicos, como preencher cargos importantes com profissionais preparados. Como exemplo, Collins remete ao final da década de 90, quando uma das grandes rivais do Walmart, a varejista Ames, decidiu dobrar de tamanho para ultrapassar a principal concorrente através de uma aquisição gigantesca. Resultado: a Ames entrou em concordata quatro anos depois, enquanto o Walmart continuava a crescer no território norte-americano. Collins percebeu, ainda no segundo estágio, que um dos tropeços considerados mais comuns pelas empresas é a violação à máxima conhecida como “Lei Packard”. Em suma, o erro consiste em uma empresa aumentar constantemente a receita, mais rápido do que a capacidade de contratar pessoas certas e em número suficiente. A lei foi batizada em homenagem a David Packard, cofundador da HP, que dizia: “Uma excelente empresa tem mais chances de morrer de indigestão por agarrar oportu-

nidades demais do que de fome por encontrar oportunidades de menos”. Ironicamente, a própria HP violou a lei. Por fim, as três últimas etapas podem ser percebidas quando a empresa já se encontra à beira do abismo. Ou seja, quando ela ignora o risco e não procura entender as razões, quando se inicia o desespero em busca da salvação, porém sem planejamento – como fusões ou contratações de peso –, e a morte, resultado de uma longa permanência no estágio anterior, “uma espiral descendente, cada vez mais fora de controle”. Soluções – Apesar do tom trágico da obra, a intenção de Collins é fazer com que as empresas evitem o pior e saibam se comportar perante as adversidades do mercado. Através da ampla pesquisa, o autor observou que o declínio organizacional é, em grande parte, uma mazela causada pela própria empresa. “O caminho para sair da escuridão começa com aquelas pessoas persistentes a ponto de serem irritantes, que são absolutamente incapazes de se entregar”, ensina. Como as Gigantes Caem é o terceiro livro de Jim Collins, cujas reflexões costumam ser seguidas à risca por muitas organizações. Antes, o autor escreveu o best-seller Empresas Feitas para Vencer (2001) e foi coautor de Feitas para Durar (2007). Em 2011, lançou Vencedoras por Opção, escolhido Livro do Ano pela crítica especializada.

Como As Gigantes Caem | Jim Collins, Editora Elsevier,

2010 (R$59,90) Diagnóstico |set/out 2012

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O Ministério da Saúde convida você, profissional de saúde, a participar de um curso de atualização do manejo clínico da dengue. O curso é totalmente online e pode ser concluído em apenas uma hora, até mesmo nos horários mais convenientes. São recomendações e informações essenciais para o aprimoramento da assistência ao paciente com dengue, através da análise de casos selecionados. Acesse combatadengue.com.br e participe. Juntos somos mais fortes nesta luta. Acesso universal como visitante • Possibilidade de compartilhar suas experiências nas redes sociais • Compatível com plataformas móveis como iPad e iPhone • App de apoio para Android • Aprofundamento do assunto através dos links.

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Estante&resenhas Divulgação

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Leia também Como gerenciar, medir e lucrar através da inovação. A cada capítulo, os autores oferecem dicas para alcançar estes objetivos. Entre os temas tratados, como estruturar seu negócio para ser verdadeiramente inovador.

Alexandre Loback, diretor executivo do Hospital Esperança (Recife)

Carlos Miranda, CEO da BR Opportunities (São Paulo)

Escrito com base no trabalho do Projeto de Negociação da Harvard Law School, trata-se de um manual bastante interessante, com conceitos úteis e de fácil entendimento, com aplicabilidade prática a quase todas as situações da vida que envolvam negociações e conflitos. Talvez uma das maiores dificuldades das pessoas em conseguir boas negociações reside em lidar com os aspectos emocionais. Saber separar a razão da emoção, ou melhor, a pessoa do problema, é fundamental para o sucesso em um processo de negociação.

O autor descreve a sua trajetória, seus pequenos empreendimentos na infância e na vida mais madura, até culminar na Zappos, que revolucionou o mercado de vendas de sapatos online e, principalmente, a forma de tratar consumidores e colaboradores. O mais importante desse livro é a crença de que o princípio de seu negócio é a constante busca da felicidade dele, de seus clientes e sua equipe. Acredito nesse propósito de vida e procuro me relacionar com empresas exatamente com essas características.

Um manual bastante interessante, com aplicabilidade prática a quase todas as situações que envolvam negociações

O mais importante desse livro é a crença de Tony na constante busca da felicidade de seus clientes e sua equipe

“Como Chegar ao Sim - A Negociação de Acordos Sem Concessões” Autores: Bruce Patton, William L. Ury e Roger Fisher Editora: Imago Número de páginas: 216 Preço sugerido: R$ 38,00

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“Satisfação Garantida - No Caminho do Lucro e da Paixão” Autor: Tony Hsieh Editora: Thomas Nelson Brasil Número de páginas: 304 Preço sugerido: R$ 34,90

“As Regras da Inovação: Como Gerenciar, Como Medir e Como Lucrar” Autores: Tony Davila, Marc J. Epstein e Robert Shelton Editora: Bookman Número de páginas: 336 Preço sugerido: R$ 57

Com base em entrevistas de empresários de negócios inovadores, como Apple e Google, os autores desenvolveram uma análise do comportamento destes líderes que pode servir de inspiração aos empreendedores.

“DNA do Inovador: Dominando as 5 Habilidades dos Inovadores e Ruptura”, Autores: Clayton M. Christensen, Jeff Dyer e Hal Gregersen Editora: HSM Número de páginas: 336 Preço sugerido: R$ 62

Clayton Christensen, professor da Harvard Business School, uniu-se a Michael Raynor, diretor da Deloitte Research, para ensinar às pequenas empresas como crescer através na inovação.

“Pense Melhor (O Futuro de Sua Empresa Depende Disso ... Assim Como o Seu)” Autor: Tim Hurson Editora: Dvs Editora Número de páginas: 312 Preço sugerido: R$ 56


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