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André Azenha
MEU NAMORO COM O CINEMA
Edições Caiçaras São Vicente /SP Setembro de 2012
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© André Azenha
Capa, projeto gráfico, diagramação e editoração: Márcio Barreto
Azenha, André Meu namoro com o cinema / André Azenha – São Vicente: Edições Caiçaras, 2012. 66p. 1. Crítica de Cinema I. Título Impresso no Brasil
2012 Edições Caiçaras Rua Benedito Calixto, 139 / 71 – Centro São Vicente - SP - 11320-070 www.edicoescaicaras.blogspot.com mb-4@ig.com.br 13-34674387 / 13-91746212
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Agradeço...
...aos Lumière, Méliès, Chaplin, Eisenstein, Kurosawa, Truffaut, Valerio Zurlini, Pat Morita, John Hughes, Ferris Bueller, Stallone, Marilyn, Julie Andrews, Hitchcock, Katharine e Audrey (Hepburn), Kate Winslet, Anselmo Duarte, Fernando Meirelles, Jorge Furtado, Takeshi Kitano, Ang Lee, Wong Kar-Wai, Walt Disney, Pixar, Elvis, Michael, Rocky, Scorsese, Frank Capra, James Stewart, Juan José Campanella, Ingrid Bergman, Ingmar Bergman, Glauber, Jennifer O'Neill, linda, Michel Legrand, Bong Joon-ho, Daniel Larusso, Spielberg, Lucas, Blake Edwards, Luke Skywalker, Spock, James Dean, Christopher Reeve, Marlon Brando, Chris Nolan, Ridley Scott, Fernanda Montenegro, Claudia Cardinale, Hilary Swank, Jim Carrey, Tim Burton, Ian McEwan, John Williams, Tarantino, Bruce Lee, Glen Hansard e Markéta Irglová, Joel e Clementine, Jesse e Celine, Claude, Berger e Sheila, Zhang Yimou, Amy Adams, Drew Barrymore, Hugh Grant, Jack Black, Nick Hornby, Henry Mancini, Murnau, Woody Allen, Milos Forman, Peter Jackson, King Kong, Sidney Lumet, Sergio Leone, Anne Hathaway, Steve Carell, Jackie Chan, John Ford, Naomi Watts, Rachel Weisz, Patrick Swayze, Sharon Stone, Nicole Kidman, Tom Cruise, Kurt Russell, Robert Zemeckis, Bill Conti, De Niro, Pacino e tantos outros amigos próximos... ...Rubens Ewald Filho, amigo, exemplo e professor; Gustavo Klein, que me honra com o prefácio desta obra; Márcio Barreto, editor do livro; Curta Santos; Cine Roxy; Todos os editores que abriram espaço para meus textos.
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Prefácio
Por Gustavo Klein Carlan * A comparação é mais do que coerente: crítica de cinema e relacionamentos amorosos têm tudo a ver. Tanto em um quanto no outro não existem fórmulas que funcionem sempre. Pauline Kael, da revista New Yorker, talvez a maior crítica norte-americana, disse uma vez que "você deve usar tudo o que é e sabe" em uma crítica. Ou seja: se doar, se colocar sempre, se mostrar por inteiro. Claro que, dentro desse conceito, sempre existirão os galinhas, que traem sua preferida com outras artes e deixam a sensibilidade de lado, e os românticos incorrigíveis. André Azenha demonstra, neste “Meu Namoro Com o Cinema”, que faz parte do segundo grupo. Um apaixonado eterno pela sétima arte, que enxerga a sua magia e a reverencia. É uma paixão que compartilho. O bom, aqui, é que não a precisamos disputar. O cinema é de todos... Nesta compilação de resenhas, Azenha nos brinda com as várias fases de seu namoro, da infância em que queremos bater nos valentões da escola e ficar com a garota mais bonita, passando pela adolescência festeira e pra lá de sensível (e os filmes de John Hughes), a idealização da musa inatingível (Marilyn Monroe), a dor do fim (o japonês “A Partida” ou “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”) e os eternos recomeços (em “Rocky Balboa”). Fala também de declarações de amor impossíveis de esquecer (caso de “Nova York, Eu Te Amo”). Em cada resenha fica muito claro que a máquina de produzir sonhos conquistou o autor desde muito cedo e tem sido, desde
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então, seu amor de infância. "Afinal, quando nos apaixonamos, mesmo que a relação acabe, e nos apaixonemos de novo por outro alguém, não esquecemos, por mais que tentemos acreditar, das paixões passadas", ele diz em um trecho. Ao contrário de amantes magoados, que se fecham para novas histórias, André não se torna ácido pelas más experiências cinematográficas. Acredita que cada filme tem um lado muito bom e gosta de descobri-lo e compartilhá-lo. Bom para nós. Ainda sobre cinema e amor, nos apaixonamos sempre pela vida que podemos ter com a pessoa que está ao nosso lado, por sua visão de mundo, pela companhia que ela nos faz. Com Azenha, fica impossível não se apaixonar junto com ele pelo cinema. Embarquei nessa viagem e não me arrependi. * Jornalista, editor de cultura do jornal A Tribuna
Eterno namoro O que faz alguém escrever sobre cinema ou determinada arte? Deve-se manter apenas o olhar distante na hora de analisar um filme? Ou é preciso escrever com paixão? O “crítico”, ao passar dos anos, tornou-se uma figura enxergada com olhares tortos por boa parte do público: um sujeito “frustrado”, “chato”, “ranzinza”, para muitos. A postura destrutiva de alguns colegas pode ter contribuído para esse olhar. Porém, antes de tudo, é preciso entender que, ao decidir tornar-se crítico, uma pessoa está se entregando de corpo e alma a algo o qual se apaixonou perdidamente. O “crítico” é, primeiramente, um apaixonado. Tal qual um namoro longo, a relação entre o crítico e a arte tem altos e baixos. Volta e meia, se depara com trabalhos “meia boca”, ou que não funcionam por algum motivo. Só que sabe superar esses momentos de crise, e jamais abre mão de sua relação. É fiel.
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Faça chuva ou faça sol. Na alegria e na tristeza. Na saúde e na doença. É a responsabilidade de não deixar-se levar somente pelos gostos pessoais. Mas utilizar sua experiência de vida em prol de algo muito maior. Aqui, no caso, falamos de cinema. Há uma troca. Ao escrevermos sobre uma história, levamos muito da nossa vivência para tentar compreender cada cena, diálogo, imagens e contextualizá-la ao leitor. Ao mesmo tempo, a cada cena, diálogo e imagens nos transformamos, amadurecemos e mudamos nossa visão do mundo. Não. O verdadeiro crítico não é “frustrado”, “chato”, “ranzinza”. Preza pelo leitor. Adora escrever. É honesto e não tem receio em desagradar alguém. Especialmente: sabe amar, entregar-se a um meio encantador, dedicar-se e não se deixar acomodar. “Meu Namoro com o Cinema” traz uma pequena compilação de textos que tenho escrito desde 2005 – primeiramente para vários sites; depois, todos colocados no site CineZen, que edito e tenho a honra de compartilhar com vários colaboradores. Entre cada crítica, cuja data é aquela publicada originalmente no CineZen, alguém vai amadurecendo conforme sua relação amorosa. A seguir, não há só obras-primas. Mas filmes que contribuíram para um amor crescente e imutável e que retratam, por diferentes prismas, de amor, relacionamento e humanidade. Espero, de coração, que ao ler este livro, sinta-se bem. Boa leitura. Obrigado. O autor
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A descoberta do amor, às vezes, pode se dar de forma precoce. Bem cedo. Aqui, daqueles casos em que e só bater o olho para saber que há algo diferente, especial. Que pode durar uma vida inteira. Mal sabia: era exatamente isso que iniciava. Um namoro eterno, de altos e baixos, sim. Porém, capaz de proporcionar muito mais alegrias do que decepção. Nessa época, passaria despercebido pelo meu amor. Afinal, não era o mais popular do colégio, nem o mais bonito. Um pouco nerd. Talvez bastante. Meio desajeitado. Tímido. No entanto, o meu amor me provaria que, neste mundo, pode – e deve – haver lugar para todos. Basta não ter medo. Ir atrás. Começava a nossa história...
Quando éramos jovens Karatê Kid: A Hora da Verdade (The Karate Kid, EUA, 1984, de John G. Avildsen) 21/08/2009 Quando estava lá pela primeira ou segunda série do primário, era comum, no recreio, os garotos disputarem o papel de Daniel-San nas brincadeiras que imitavam o filme “Karatê Kid: A Hora da Verdade”. Afinal, todos queriam ser o sujeito desacreditado que era provocado pelos valentões, dava uma surra neles e ficava com a garota dos sonhos no final. No caso, uma loira linda, linda, linda, chamada Ali, que em nosso universo era interpretada por alguma das meninas mais paqueradas da classe. A história, que em 2009 comemorou 25 anos de seu lançamento, todos conheciam de cor. Daniel Larusso (Ralph Macchio), jovem de uma cidade pequena, muda junto com a mãe para um município maior. Ao chegar à nova escola, logo na primeira festa na praia que vai com seus amigos recém-formados, decide flertar com Ali (Elisabeth Shue), que para azar dele é a ex-namorada do valentão da escola e lutador de karatê Johnny (William Zabka), líder de uma espécie de ganguezinha de playboys. Após apanhar de Johnny, Daniel, rapaz sensível e um tanto tímido, vai conquistando o coração da garota e é perseguido constantemente
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pela turma do algoz, formada por alunos da academia Cobra Kai, comandada pelo sensei inescrupuloso John Creeze (Martin Klove). Numa dessas perseguições, depois de apanhar feio e cair inconsciente, Daniel é salvo por um velhinho simpático da vizinhança, que consertara sua bicicleta e se revela um grande lutador de karatê: Mr. Miyagi (Pat Morita). Sozinho, Miyagi derrota os jovens vilões e faz um acordo com Kreeze. Nenhum dos alunos da Cobra Kai irá encostar o dedo em Daniel até a realização do torneio municipal. E para participar da competição, o bom velhinho passa a treinar Daniel e da relação mestre-aluno nasce uma grande amizade. “Karatê Kid” foi o típico filme juvenil dos anos 80, parte de uma leva de produções cinematográficas que marcaram uma geração, como “Curtindo a Vida Adoidado” e “De Volta para o Futuro”. Virou febre entre a garotada, ganhou uma linha de bonecos, desenho animado, e se transformou numa franquia. Até Silvio Santos, sempre ele, resolveu tirar casquinha do filão, mudando, na cara de pau, o título da série televisiva “Ohara” (cujo personagem título, um veterano policial, era interpretado por Pat Morita) para “Karatê Kid Ohara”, sendo que a única ligação entre o seriado e a franquia do cinema era a presença do veterano ator. Mas se analisado com mais atenção, percebemos que o longa ultrapassa a mera “aventura de artes marciais”. Dirigido pelo subestimado John G. Avildsen, vencedor do Oscar por “Rocky – Um Lutador”, outro filme sobre alguém que supera todas as expectativas, “Karatê Kid” foi contra a maré de muitas outras produções dos anos 80, auge da era Reagan, que mostravam americanos ditando os passos em outros países (inclusive “Rocky IV”, quando o personagem de Sylvester Stallone é aplaudido pelo Primeiro Ministro soviético, na União Soviética, após derrotar um soviético!).
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No caso de “Karatê Kid”, o protagonista é americano (Daniel) sim, mas é ensinado por um oriental (Miyagi). Apesar do roteiro – de Robert Mark Kamen, que também foi karateca contar com o velho romance entre a garota rica (Ali) e um jovem plebeu (Daniel), a relação principal da trama, que sensibilizou pessoas em inúmeros países, era aquela entre Daniel e seu mestre. Uma amizade entre seres humanos com idades completamente diferentes. Relação de pai e filho. Amor fraternal. Tudo isso, somado à velha mensagem “todos podem vencer”, com certa ingenuidade, alguma ação, trilha sonora memorável de Bill Conti – o mesmo de “Rocky” - e boas doses de comédia, serviu para que a obra fizesse sucesso de público e até rendesse parte da crítica. Êxito surpreendente para um filme que tinha um elenco desconhecido internacionalmente. Apesar de longa carreira, Pat Morita (1932-2005) até então era um ator de comédias, principalmente em TV (fez até ponta na antiga série do Hulk). Mas seu desempenho como Mr. Miyagi beirou a perfeição e o reconhecimento veio com indicações ao Oscar e ao Globo de Ouro de Ator Coadjuvante. Ralph Macchio, que um ano antes foi revelado em “Vidas sem Rumo”, de Francis Ford Coppola, na mesma leva de novos talentos que deu ao mundo Matt Dillon, Tom Cruise, Diane Lane, Patrick Swayze e Emilio Estévez, em 1984 já beirava os 24 anos, idade avançada para o personagem adolescente. Mas ninguém sentiu a diferença e o ator serviu como uma luva para viver Daniel. Depois, de importante mesmo ele só teria as atuações nas continuações de “Karatê Kid” e no bacana “Meu Primo Vinny” (1992), ficando relegado a papéis menos importantes no cinema e presença em seis episódios da série “Betty, a Feia”, entre 2008 e 2009. Quem se tornou mais conhecida foi Elizabeth Shue (também com mais de vinte anos quando “ Karatê Kid ” foi lançado ) , tanto pelo
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desempenho em filmes legais – “Cocktail” (1988), no qual dividiu a tela com Tom Cruise, e “Despedida em Las Vegas” (1995), que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz -, como também pelo seu jeito maluquete, dando em cima de repórteres e sem receio de expor a vida sexual. Apesar das idades avançadas do casal de atores protagonista para encarnar personagens teen, “Karatê Kid” levou dois prêmios no Young Artist Awards, nas categorias Melhor Filme Para a Família, e Melhor Nova Atriz Coadjuvante (Elizabeth Shue). Mesmo com falhas visíveis nas coreografias das lutas (numa delas, no último embate, quando Daniel vai golpear Johnny com um chute, parece que ele oferece a perna para o rival segurá-la e contra-golpear), o longa é um clássico à sua maneira. O “golpe da águia” virou hit entre a molecada. Frases ditas por Mr. Miyagi durante os treinos de Daniel tornaram-se célebres, como no diálogo: Miyagi: - O karatê tem duas regras: A primeira é que ele serve apenas para defesa. Daniel: - Qual é a segunda regra? Miyagi: - Aprender bem a primeira. Já algumas cenas são antológicas. Como a que Miyagi, apenas num golpe, quebra as pontas de três garrafas, e aquela em que ele esfrega as mãos para “curar” a perna do pupilo antes do combate decisivo. Até a dublagem brasileira marcou época. Um dos raros casos em que o trabalho de dubladores é lembrado com carinho no Brasil.
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São fatores que parecem bobos para alguns, mas que para muita gente deixou grande saudade. Reprises e reprises foram exibidas na Sessão da Tarde, Temperatura Máxima, Intercine, etc, mas inacreditavelmente encontrá-lo em DVD no Brasil era algo raro até pouco tempo atrás, quando foi lançado um Box triplo, com os três primeiros filmes da série – o primeiro disco tem extras bacanas, com entrevistas concebidas por diretor, roteirista e elenco. Com o sucesso do filme, três continuações foram produzidas – duas delas com mesmo diretor e roteirista. “Karatê Kid 2 – A Hora da Verdade Continua” (1986) levou Daniel e Miyagi ao Japão, pois o pai de Miyagi estava morrendo. Com enredo mais dramático, o jovem americano encontrava um novo amor, a bela Tamlyn Tomita (que já atuou num filme brasileiro, “Gaijin – Ama-me Como Sou” 2005, de Tizuka Yamasaki) e deparava-se com um inimigo “real”, que pretendia matá-lo. Nesse, as lutas são mais trabalhadas e as belas paisagens colaboravam para o clima romântico não apenas para Daniel, mas também para Miyagi, que reencontra um amor de sua juventude. A canção “Glory of Love”, de Peter Cetera, David Foster e Diane Nini, foi indicada ao Oscar. No inferior “Karatê Kid 3 – O Desafio Final” (1989), a dupla retorna aos EUA e reencontra John Creeze, que pretende vingar-se e reabrir a Cobra kai. Da trilogia original, trata-se do filme que teve o resultado inferior. Ralph Macchio está nitidamente fora de forma, e com tantos momentos importantes vividos juntos, chega a ser constrangedora a forma como ele se rebela contra seu mestre. Ao menos a última cena mostra o primeiro abraço, desde o início da série, entre eles. Pois até então, Miyagi permitia apenas o cumprimento oriental, quando as pessoas inclinam o tronco à frente. E ainda foi realizado o menos conhecido “Karatê Kid 4 – A Nova Aventura”, sem a presença de Ralph Macchio e com Miyagi treinando uma
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garota rebelde, que
perdera
os
pais
num acidente e é
neta de um antigo companheiro de guerra dele. Quem interpreta a personagem é uma certa Hilary Swank, que depois venceria duas vezes o Oscar, por “Meninos Não Choram” (1989) e “Menina de Ouro” (2004). Até Will Smith percebeu o potencial universal da trama de “Karatê Kid” e decidiu produzir, por meio de sua empresa Overbook Entertainment, em parceria com o megaprodutor Jerry Weintraub (franquia “Onze Homens e um Segredo”), uma refilmagem muito bacana e que manteve a essência do original e apresentou a clássica história a uma nova geração, levando a trama para a China, com seu filho Jaden Smith no papel de Dre (que seria Daniel) e Jackie Chan na pele do Mr. Han (versão chinesa de Mr. Miyagi). Sobre aquelas brincadeiras relatadas no início desse texto, que preenchiam nossos tempos livres duas décadas atrás? Pois é, atualmente são motivos de conversas de bar entre marmanjos que se emocionam quando lembram do filme. Bons tempos aqueles.
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Amor que é bom também ensina. Faz a gente aprender, amadurecer. Quando tudo parece monótono, chato, causa alegria. Por vezes o mundo parece conspirar contra a gente. Pais, professores, na infância. Chefes, clientes, colegas, anos depois. Todos cobram alguma coisa: a forma correta de se comportar em público, boas notas, que é preciso ser popular, ter os padrões de beleza “corretos”, atingir resultados. Conquistar tudo e todos. Sorte que meu namoro abriu meus olhos. E mostrou que, para ter felicidade, um céu lindo, a companhia certa, fazem toda a diferença. Aprendia o sentido da gratidão.
Remédio para as horas entediantes... Curtindo a Vida Adoidado (Ferris Bueller's Day Off, EUA, 1986, de John Hughes) 28/08/2009 Um clássico absoluto que marcou uma geração e continuou conquistando admiradores nas décadas seguintes. “Curtindo a Vida Adoidado” se tornou o que é, devido a uma série de fatores. A obra prima de John Hughes, cineasta que melhor compreendeu o universo da adolescência na história do cinema, além do excelente diretor, tem roteiro certeiro, gags imperdíveis, ótimo elenco, representa o desejo de milhões de adolescentes e principalmente: possui, dentro de sua trama cômica, um subtexto universal resumido na frase do protagonista Ferris Bueller, interpretado por Matthew Broderick: “A vida se move muito rápido. Se você não para e olha em volta de vez em quando, pode perdê-la”. É papo sério no formato de cultura pop. Inacreditavelmente escrito por Hughes em apenas seis dias, para evitar uma greve do sindicato dos roteiristas, a comédia mostra um dia na vida de Ferris. E é só “o” dia começar que logo percebemos o porquê do personagem ter virado cult, célebre, ídolo da garotada que ainda brincava de He-Man e jogava Atari nos anos 80.
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Ferris não precisa ser fortão, fodão, atleta ou garanhão para conquistar nossa simpatia. Ele é simplesmente… legal. “Cool” diriam os descolados. Dos nerds aos atletas, das patricinhas às garotas de torcida, não há quem resista ao carisma do rapaz, inclusive seu melhor amigo Cameron (Alan Ruck) e sua namorada, Sloane (a gatinha Mia Sara). Ao acordar e perceber que o céu está lindo, Ferris decide que não pode desperdiçar um dia especial indo à escola. Finge estar doente, monta um aparato invejável (quem não sonhou usar os truques dele na época de colégio para fugir da aula?) no quarto para despistar os pais, tira Cameron de casa e Sloane da escola e sai (na Ferrari pertencente ao pai do amigo) para curtir os locais mais descolados de Chicago. Por tabela, causa a revolta do diretor (Jeffrey Jones) mala do colégio e da irmã mais velha e invejosa (Jennifer Grey), que faz de tudo para entregar o caçula.
Divertido do início ao fim, “Curtindo a Vida Adoidado” já nasceu clássico. Apesar das roupas e penteados característicos da década de 80, as situações apresentadas durante a trama são atemporais. Entre tantas cenas inesquecíveis, aquela que mostra Ferris em cima de um carro alegórico, numa parada alemã em Chicago, e que leva milhares de pessoas a cantarem junto determinada música, conseguiu o feito de fazer uma canção que foi cantada pelos Beatles ser mais lembrada pelo filme do que pelos fab four: “Twist and Shout”, de Phil Medley e Bert Russell. Mas nada sairia tão na mosca se o elenco não demonstrasse tamanha química e desenvoltura em cena. Matthew Broderick, apesar de não ser mais um garoto na época das gravações, caiu como uma luva para o papel principal. Sua atuação lhe rendeu uma indicação ao Globo de Ouro de Ator em Comédia/Musical. O jeitão moleque, simpático, um pouco cínico, cúmplice do espectador (já
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que mais de uma vez olha para a câmera e dialoga com o público ) fizeram o personagem impulsionar a carreira do intérprete,
que mesmo mantendo-se trabalhando e famoso ao longo dos anos, jamais repetiu o feito. O restante do elenco não fica atrás. A Sloane de Mia Sara (que depois ficaria nua em várias fitas B, como “Timecop”, com Van Damme) une classe e sexualidade. O par ideal para Ferris. Alan Ruck, na casa dos 30 anos na época do longa, não aparenta a idade e completa de forma perfeita o trio protagonista como o sujeito inseguro que teme o pai e a qualquer momento pode se revoltar. Jennifer Grey (que passou a namorar Broderick durante as filmagens e no ano seguinte estrelaria outro sucesso, “Dirty Dancing”, ao lado de Patrick Swayze) perfeitamente insuportável como a irmã megera; um surpreendente Jeffrey Jones (mais magro do que seu personagem em “Amadeus”) na pele do diretor rabugento; o novinho Charlie Sheen (no mesmo ano fez “Platoon”) em pequena aparição; os atores Cindy Pickett e Lyman Ward (que se casaram na vida real), respectivamente a mãe e o pai de Ferris; até os dois “figuraças” do estacionamento onde Ferris, Sloane e Cameron deixam a Ferrari. Todos estão em sintonia com o espírito da obra. Com trilha sonora deliciosa, “Curtindo a Vida Adoidado” garante sorrisos do início ao fim, principalmente para os jovens, que vibram a cada façanha do protagonista. Ferris, na mesma década que deu ao mundo Rambo e tantos “heróis” anabolizados, foi o verdadeiro ícone da garotada.
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Há quem se aproxime da gente com um ar professoral, quase um Messias, dita regras, mas não compreende nossos anseios, dúvidas, inseguranças. Por sorte, vez ou outra aparece quem realmente se interesse, se importe. Meu amor ajudou inclusive nisso. Não importa se usávamos óculos, fôssemos gordinhos, CDFs. Quando nos sentíamos deslocados em relação ao que era ditado aos quatro cantos do mundo, eis que nos deparamos com uma pessoa capaz de mostrar que podíamos crescer, seguir em frente.
Existe quem nos entenda Obrigado John Hughes, o cineasta dos adolescentes 14/08/2009 “Twist and Shout”, música de Phil Medley e Bert Russell, que ficou mundialmente conhecida na gravação dos Beatles, talvez seja mais lembrada por muita gente graças a uma cena antológica de um certo filme, que mostra um garoto em cima de um carro alegórico, durante desfile alemão por uma avenida de Chicago, e que leva milhares de pessoas a cantarem junto a canção. O rapaz chama-se Ferris Bueller e “o” filme “Curtindo a Vida Adoidado”, clássico do cinema adolescente lançado em 1986, reprisado tantas vezes nas Sessões da Tarde e que, apesar de ter sido realizado durante os anos 80, conseguiu atrair a atenção de todas as gerações teen subsequentes. Impossível não idolatrar Ferris, que em apenas um dia realizou o sonho de milhões de garotos: cabular a aula e levar a namorada para passear pelos lugares mais descolados da cidade na Ferrari “emprestada” do pai de seu melhor amigo, que o acompanha na aventura. A escapulida ainda serve para deixar enfurecidos sua irmã mais velha e o diretor autoritário da escola onde estuda.
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O sucesso do longa pode ser atribuído a alguns fatores: Matthew Broderick, apesar de não mais ser um garoto na época, caiu como uma
luva para o papel principal, o elenco coadjuvante é ótimo, desde a bela Mia Sarah, à Jennifer Grey e Charlie Sheen, que fez pequena aparição. A trilha sonora bacana e as gags deliciosas também colaboraram. Mas principalmente, o “culpado” por tornar “Curtindo a Vida Adoidado” um clássico, é o diretor e roteirista John Hughes, cineasta que melhor soube dialogar com os adolescentes na história da sétima arte. Infelizmente ele nos deixou órfãos em 6 de agosto de 2009, quando faleceu vítima de um infarto em Nova York, onde passava suas férias. Chamado de Spielberg das comédias sobre jovens, ídolo de Kevin Smith (“Procura-se Amy”), Hughes, que retratou suas histórias sempre nos arredores de Chicago, nasceu em 1950, num dia 18 de fevereiro, em Lansing, Michigan. Estudou na Glenbrook North High School e deu início à sua brilhante carreira escrevendo, na década de 70, para a humorística National Lampoon’s Magazine. Seu talento como criador impressionava. Era capaz de escrever um roteiro em uma semana e tinha a sensibilidade necessária que muitos pais não tiveram e ainda não possuem: compreender os adolescentes, fazer o jovem identificar-se, falando de forma realista e natural para esse público. Os nerds, então, encontraram nele um amigo, um confidente, deixaram de ser o motivo de chacota para virarem heróis. Hughes nos deu esperança. Roteirizou “Class Reunion” (1982), “Nate and Hayes” e “Vacation” (ambos de 1983), mas foi em 1984 que ele começou a ganhar o mundo, lançando ao estrelado a atriz Molly Ringwald, a “Juno” da década de 80, em “Gatinhas e Gatões”, primeiro de quatro produções celebradas e inesquecíveis: as outras três são “Clube dos 5” e “Mulher Nota 1000”, os dois lançados em 1985, e o já citado “Curtindo…”, do ano seguinte.
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Todos clássicos absolutos. Filmes que jamais nos enjoam, com tramas divertidas, universais e atemporais. Afinal, não importa o ano ou a década, sempre vai haver um garoto deslocado em busca de identificação. Fora esse “tato” para levar compreensão e felicidade à garotada, o cineasta foi pródigo catapultar a carreira de novos talentos. Revelou, além de Molly, atores como Emilo Estévez, e seu irmão Charlie Sheen, o próprio Matthew Broderick e até Macaulay Culkin, este último em “Quem vê Cara Não vê Coração” (1989). Produziu “A Garota de Rosa Shocking” (outro estrelado por Molly) e “Alguém Muito Especial”, filmes dirigidos por Howard Deutch, que foi lançado por ele, e ainda foi roteirista e produtor de vários longas infantis de sucesso como os três “Esqueceram de Mim” (1990, 1992 e 1997), “Dennis, o Pimentinha” “1993”, “Ninguém Segura esse Bebê” (1994), “101 Dálmatas” (1996), “Flubber” (1997) e “Nadando Contra a Corrente” (1998). Viveu recluso nos últimos anos, longe da mídia, o que tornou maior seu mito. Ainda colaborou com roteiros de “Os Viajantes do Tempo” (2001), “Encontro de Amor” (2002) e “Meu Nome é Taylor, Drillbit Taylor” (2008). Seu legado para o cinema é imenso. “American Pie”, “Ela É Demais”, “Nunca Fui Beijada”, “Mal Posso Esperar”, “10 Coisas que Eu Odeio em Você”, “De Repente 30”, “Ela Não Está Tão a Fim de Você” e “Juno” beberam diretamente na fonte da escola John Hughes. No mesmo ano fomos obrigados a nos despedir de duas figuras que tanto fizeram pela juventude. Dois ídolos pop. Michael Jackson, e agora Hughes. O mundo encontrará substitutos? Não dá para saber. Mas se realmente aprendemos a lição deixada por eles, não podemos perder a esperança.
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Na fase das descobertas, impossível não ser impactado com a percepção do desejo, a libido. A atração despertada por uma saia se levantando, uma voz sussurrante, um belo decote. Ainda mais quando tudo isso faz parte de uma aura mágica, que gera suspiros ano após ano. Não importa o tempo na história. Certas imagens ficam gravadas eternamente. Meu namoro me apresentava um novo universo. Mais um passo foi dado. O romance se transformava.
O despertar 50 anos sem Marilyn 05/08/2012 Musa, Deusa do cinema, maior estrela hollywoodiana nos anos 50, quiçá de toda a história da sétima arte. Há exatos 50 anos dava adeus ao mundo Norma Jeane Mortenson ou, como ficaria mundialmente: Marilyn Monroe. Natural de Los Angeles, nasceu em 1º de junho de 1926. De infância difícil, precisou viver em lares adotivos, lidar com a doença mental da mãe e crescer sem saber quem era o pai. Atuou em vários pequenos filmes, posou nua para um calendário. Tornouse imortal ao estrelar clássicos como ”Os Homens Preferem as Loiras”, “Como Agarrar um Milionário” e “Torrentes de Paixão” (os três de 1953), ”O Pecado Mora ao Lado” (1955) e ”Quanto Mais Quente Melhor” (1959) – este considerado, muitas vezes, a melhor comédia de todos os tempos. Rotulada injustamente de loira burra, Marilyn buscou, ao longo da carreira, reconhecimento artístico. Não foi o tipo de estrela afetada, que se deslumbra facilmente com o sucesso. Chegou a deixar Hollywood e se mudar para Nova York, onde frequentou o respeitado Actors Studio. Seu potencial dramático, no entanto, pode ser comprovado em filmes como
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“Almas Desesperadas” (1952) e “O Rio das Almas Perdidas” (1954), disponíveis em DVD. Ditou a moda, foi imitada à exaustão. Executivos de estúdios concorrentes sempre buscavam encontrar a sua “Marilyn”. Em vão. Casou-se muito jovem com um conhecido da vizinhança, onde encontrou lar e estabilidade, mas não a felicidade. Também foi esposa do dramaturgo Arthur Miller e amante de Frank Sinatra. No entanto, foi amada pelo ex-jogador de baseball Joe Di Maggio, com quem manteve um relacionamento complicado. Relatos dizem que ele a espancou mais de uma vez. Também foi ele, o único que, após a morte da estrela, continuou levando flores ao túmulo dela. Há quem diga que ela procurou, nesses relacionamentos, a presença masculina para preencher o vazio deixado pela falta do pai. Assediada por homens e mulheres, conviveu com a paixão obsessiva de uma professora de interpretação. A morte de Marilyn, em 5 de agosto de 1962, aos 36 anos, até hoje é controversa. “Oficialmente” aconteceu em virtude de barbitúricos usados em excesso que ela tomava contra a depressão. Pode ter sido assassinada pela CIA, numa queima de arquivo, pois suas ligações comprometiam os irmãos Kennedy no poder. O mistério em torno de sua morte e outros episódios, como o “Parabéns a você” cantado para o então presidente John F. Kennedy, e sua demissão da Fox antes do término das filmagens de “Something’s Got to Give” (1962, reconstituído anos depois), ajudaram a imortalizá-la. Sentiu-se culpada pela morte de Clark Gable, com quem contracenou em “Os Desajustados” (1961). O astro sofreu um infarto no miocárdio. Marilyn achava que seus atrasos durante as filmagens contribuíram para o desgaste do colega. Quem deseja saber como foi a conturbada vida da estrela deve conferir a biografia A Vida Secreta de Marilyn Monroe, de J. Randy Taraborrelli.
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Praticamente toda a principal filmografia da atriz está disponível em home vídeo no Brasil. A data da morte, inclusive, marcou o relançamento da caixa "Marilyn Monroe - 50 Anos", com 13 DVDs. Há, ainda, “Sete Dias com Marilyn”, no qual a musa recebe uma interpretação digna de Michelle Williams: a trama mostra os bastidores das filmagens de “O Príncipe Encantado” (1957), de Laurence Olivier. Linda, sexy, chique, charmosa, voluptuosa, simples, boa atriz, triste, cativante, sensível, engraçada, leal. Não importam quantos adjetivos sejam dados, a complexidade de Marilyn Monroe jamais será compreendida totalmente. Assim como ninguém poderá substituí-la.
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Em certos momentos da vida, precisamos tomar decisões que poderão surtir efeito até o fim dos nossos dias. Em alguns casos, é preciso se desapegar de certas coisas para continuar, galgar uma nova etapa, crescer. Lógico que, para um crianção, nerd, garoto em corpo de quase adulto, uma atitude pode ser dolorosa. Ainda mais quando exige que nos desfaçamos de companheiros dos bons e longos primeiros anos da vida. Ficam as lembranças e a esperança de que esses companheiros ganhem novos amigos. Meu namoro soube, como ninguém, retratar tudo isso.
Rito de passagem Toy Story 3 (Idem, EUA , 2010, de Lee Unkrich) 15/11/2010 É incrível como a Pixar, a cada novo projeto, surpreende o mundo com histórias divertidas e inovadoras. Se em tantas outras boas trilogias do cinema, dificilmente o segundo filme igualou ou superou o original em qualidade, com “Toy Story 3” a Pixar criou a cereja do bolo para um série que nasceu para fazer a diferença. Lembremos: “Toy Story”, de 1995, marcou o início do uso da computação gráfica, que levaria o mundo a reboque. O segundo filme, de 1999, é importante internamente, pois foi a primeira e até então a única continuação dentro da companhia. E este terceiro longa utiliza o 3D estereoscópico e prova que, é possível sim, criar uma trilogia cujos filmes mantenham o alto padrão de direção, roteiro, dublagem e interpretação. Sim, interpretação, porque os personagens criados pela Pixar emocionam. Mas acima de tudo, conferir “Toy Story 3” é voltar no tempo, e perceber que, mesmo 11 anos depois, parece que fomos apresentados ontem a Woody, Buzz Lightyear e o resto da turma. Somos próximos a eles. E a Pixar, que nasceu como um braço da Lucas Film para depois ser adquirida pela Disney, soube trabalhar essa proximidade entre público e
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personagens a seu favor. Jamais enjoamos deles. Pelo contrário. Ficamos felizes ao revê-los e torcemos por cada ação da turma. Lee Unkrich, que dividiu a direção de “Toy Story 2” com John Lasseter (produtor desse longa e atual diretor do departamento de animação da Disney) e Ash Brannon, e também foi co-diretor de “Procurando Nemo” e “Monstros S/A”, dirige com talento o filme – ele também colaborou no roteiro. Na trama, passaram-se 15 anos desde a última aventura e Andy, agora com 17 anos, e prestes a ingressar na faculdade, precisa decidir que destino dará a seus brinquedos: leva-os com ele, guarda-os no sótão, faz uma doação, ou joga-os o lixo? Por uma série de desencontros Woody acaba sendo o único escolhido para acompanhar o jovem à universidade, enquanto os outros brinquedos vão parar numa creche. Quando chegam ao local, são recebidos com festa pelos outros brinquedos, principalmente Ken (Michael Keaton) e o veterano urso de pelúcia Lotso (Ned Beatty). Lotso no começo parece um bom velhinho, simpático, receptivo. Mas com o tempo revela-se um ditador, que envia os brinquedos de Andy à ala das crianças menores de dois anos, que batem, puxam, jogam e sujam os brinquedinhos. Woody precisa encontrar os amigos, que procuram uma forma de fugir da creche. Seria clichê dizer que “Toy Story 3” é “ideal para crianças e adultos”. Mas é isso mesmo. É fofinho, engraçado e apaixonante para a garotada, como também tem reviravoltas, ação, romance, e humor para cativar os mais velhos. E ainda traz uma série de mensagens: a passagem da infância para a vida adulta e a necessidade de sabermos dar o passo à frente; o ser humano que não precisa mais de certos bens materiais e, ao invés de doá-los, encontrando pessoas que necessitem deles, simplesmente jogaos fora ou guarda-os sem necessidade; e claro, que a amizade é capaz de superar todas as dificuldades.
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Aliás, por falar em amizade, rever Woody, Buzz Lightyear e companhia foi como reencontrar antigas pessoas queridas. Sabe aqueles amigos que ficamos sem ver durante anos, mas quando reencontramos, o carinho continua o mesmo? Pois é, foi isso que senti ao ver o filme e seus personagens. E só por nos proporcionar esse tipo de sensação, “Toy Story 3” já seria maravilhoso, mas ainda nos presenteia com cenários encantadores, ótimas cenas de ação, piadas certeiras (o encontro entre Barbie e Ken é impagável, e outro momento “latino” causa gargalhadas deliciosas) e cenas emocionantes, capazes de levar o espectador às lágrimas. Mais uma vez a Pixar acertou em cheio.
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Meu amor soube me apresentar algumas trilhas inesquecíveis. São pérolas que ficam na memória. Ajudam a curtir ou superar momentos. Independente da vida pessoal dos responsáveis por essas melodias, o que ficam são as obras. Com elas, relembramos a paquera, o primeiro encontro, a primeira noite, a primeira briga, as pazes, risos, lágrimas. Um namoro não seria um namoro sem boas canções para memorizar instantes de afeto, emoção, intensidade e até despedida.
Trilha sonora Michael Jackson’s This is it (Idem, EUA, 2009, de Kenny Ortega) 28/01/2010 É bom o leitor saber. “Michael Jackson’s This is it”, documentário cujas cenas foram registradas primeiramente para constarem do acervo do astro e como extras num possível DVD da turnê que ele realizaria em Londres é um filme caça-níqueis? Sim, é. Mas se durante muitos anos MJ serviu de fonte para a mídia sensacionalista enriquecer graças a notícias jamais comprovadas, o filme ao menos o retrata como ele sempre mereceu: com respeito. Até veneração. Também é importante saber que o longa não é um retrato dos últimos dias de vida dele e nem tem a intenção disso. É “somente”, como disseram alguns críticos, um esboço do que seria a última turnê de 50 shows que ele faria em na capital inglesa. A última de sua carreira e que teve todos os ingressos esgotados. É um veículo para os fãs. Nada além disso. Quem não conheceu (se é que existe alguém) a obra do Rei do Pop, provavelmente não irá entender o que faz os dançarinos eleitos para trabalhar com Jackson na tour chorarem em suas declarações para o filme e exaltarem cada canção ensaiada nos palcos fechados do Staples Center, de Los Angeles, e The Forum, em Inglewood, na Califórnia, onde Michael preparava a série de apresentações que faria na O2 Arena de Londres. Logo no início, um texto de abertura diz que esta seria a mais espetacular turnê da história da música. Realmente, o pouco que vemos nas quase duas horas de projeção, selecionadas de um material de mais de 100 horas
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de gravações, nos leva a crer que o show em questão poderia ser inesquecível. Só que infelizmente jamais teremos certeza disso. É mais ou menos o que aconteceu com “Smile”, o álbum “perdido” dos Beach Boys, que poderia ter feito páreo ao maior álbum de rock da história, “Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band”, dos Beatles. As gravações com músicas inacabadas do disco de Brian Wilson e companhia realmente davam a entender que se tratava de um disco muito especial. Mas Brian teve problemas psicológicos, se isolou e o disco não foi lançado. Só que o músico sobreviveu para quase quarenta anos depois finalmente dar vida à obra. Infelizmente, Michael não teve tal chance. Dirigido por Kenny Ortega, que ficou mundialmente conhecido como coreógrafo de “Dirty Dancing” e depois faria “High School Musical”, “This is it” chega a mostrar algumas músicas prontas, como seriam exibidas no show. Da abertura com “Wanna Be Starting Something” ao encerramento com “Man On The Mirror”, somos apresentados a uma profusão de coreografias sensacionais, uma tela de cristal líquido em três dimensões, a maior do mundo, muitos dançarinos (todos excelentes, numa entrega emocionante), acrobacias, um coro de crianças e vídeos originais, que seriam projetados ao mesmo tempo que as músicas no show. Em “Smooth Criminal”, por exemplo, Jackson é inserido no clássico “Gilda”, de 1946, sobre a eterna mulher fatal interpretada por Rita Hayworth. Ele escapa de bandidos e interage com os personagens em preto e branco. Já em “Thriller”, nos deparamos com momentos dignos de Tim Burton. Além dos zumbis, surgem fantasmas e uma aranha gigante, de onde MJ sai para fazer a famosa coreografia. A última canção é “Earth Song”, que inclui um filminho sobre uma garotinha que tenta salvar uma planta da destruição das máquinas. É o eterno recado de Jackson para prestarmos atenção no mundo. Michael é sempre flagrado com admiração, mergulhado em luzes, tratado com extremo respeito pelos colegas e pelo próprio Ortega, que o chama de Senhor – ainda que possamos ver o quão magro ele se encontrava. O
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cantor é mostrado como um profissional perfeccionista, que exige o máximo de seus músicos, dançarinos e produtores, sempre os tratando com muita educação e respeito. Alguns fãs reclamaram que as pessoas que trabalhavam com Michael Jackson ignoraram seu estado de saúde, e que ele jamais aprovaria um lançamento de um trabalho inacabado. Compreensível. Mas também é necessário entender que todas as pessoas que compraram os tickets para a turnê inglesa, e muitos outros milhões de fãs, desejavam ver essas imagens. Não à toa o filme (previsto para ficar somente duas semanas em cartaz – período prolongado) estreou liderando as bilheterias nos cinemas americanos (ainda que os produtores esperassem arrecadar mais que os US$ 20 milhões conseguidos na estreia). “This is it”, o filme, (o título também é de uma música até então inédita, composta por Paul Anka, que Michael tinha gravado nos anos 80 e surge nos créditos finais do documentário) foi apenas parte de um esquemão para faturar milhões e milhões de dólares. Inclusive até um CD duplo com as músicas do filme já foi lançado e um DVD com mais três horas de material extra chegou ao mercado ainda em 2009. E tanto como caça-níqueis, homenagem a Michael Jackson e, presente para os fãs, se sai bem. Como fã do astro, eu não consegui esperar e pude presenciar algo raro na sala do cinema. A platéia, que lotou o local, aplaudiu emocionada o filme assim que ele acabou. Não bastasse Michael Jackson ter sido um divisor de águas na música pop, ter feito o álbum mais vendido da história (“Thriller”), introduzido a música negra nas FMs populares e videoclipes estrelados por negros na MTV, também conseguiu o feito de emocionar mais pessoas muito longe de sua Terra Natal, e sem estar presente. Mais do que nunca, assim como Elvis, o Rei do Rock, Michael, a majestade do Pop, não morreu.
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Trilha sonora II Amor a Toda Velocidade (Viva Las Vegas, EUA. 1964, de George Sidney) 17/07/2009 A relação entre Elvis e Las Vegas é emblemática. Foi lá que, em 1956, em seu debute profissional na cidade, ele sofreu sua primeira frustração profissional após ter se tornado o Rei do Rock. O público dos hotéis, acostumado a apresentações intimistas e artistas como Frank Sinatra, não estava preparado para o ritmo acelerado e os rebolados do astro. Mas nada como o tempo para corrigir injustiças. No ano seguinte, Elvis protagonizou aquele que é considerado seu melhor filme, “O Prisioneiro do Rock”. Depois, passou dois anos no exército americano e retomou a carreira, no início dos anos 60, com um repertório musical mais eclético (gospel, baladas, country, blues, etc). Nesse período, ele praticamente sumiu dos palcos – protagonizou uma série de filmes-musicais de qualidade duvidosa, que, segundo o próprio Elvis, se repetiam em histórias em que ele “socava alguns caras, cantava umas doze músicas e ficava com a garota no final”. Apesar disso, todos esses filmes viraram sucesso de público. “Amor a Toda Velocidade” é uma espécie de redenção para o Rei em alguns pontos. Modificou a relação dele com Las Vegas, e, diferente de seus longas anteriores, obteve elogios da crítica. A obra narra a trajetória de um piloto de corridas (Elvis) que precisa arranjar dinheiro para comprar um motor e equipar seu carro no intuito de poder vencer o circuito de Las Vegas. Mas pelo caminho, ele conhece uma instrutora de natação (a bela atriz sueca AnnMargret) que o faz apaixonar-se. O protagonista fica então dividido entre a busca pela grana e o amor da garota.
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Pela sinopse, o filme lembra tantos outros musicais estrelados anteriormente pelo Rei do Rock, e que encarnavam os desejos de muitos garotos naqueles tempos: carrões e lindas mulheres. Mas diferenciase pela excelente trilha musical, composta por clássicos do quilate de “The Lady Loves Me”, “Apreciattion” e “What’I Say”, mais a famosa cançãotema, e principalmente pela química do casal protagonista. Elvis e Margrett incendeiam a tela. A forma como os dois atuaram, e a boa convivência nos bastidores, fizeram com que a imprensa, que publicava notícias sobre eles diariamente, até chegasse a anunciar um casamento entre os dois. Entrevistada para o documentário “Reino – Elvis em Vegas”, que acompanha o filme no DVD, a então namorada de Elvis diz que o roqueiro, quando comentava sobre sua companheira em cena, falava em tom apaixonado. Além disso, foi a primeira vez que o astro realmente dividiu as atenções da plateia com alguém. Como ele, Margrett era um símbolo sexual, cantava, dançava e atuava – fato que fez o empresário “paizão” de Elvis, Coronel Tom Parker, amedrontado com a possibilidade do pupilo ser ofuscado em cena, brigar com o experiente diretor George Sidney (1916-2002). Só que a junção de duas figuras cativantes não prejudicou a carreira nem de Elvis e nem da atriz. “Amor a Toda Velocidade” virou imenso sucesso de bilheteria. Há quem o considere, também, um avanço em relação a “O Prisioneiro do Rock”. Elvis finalmente caiu nos braços da cidade. Tal êxito serviu de incentivo para o Rei voltar aos palcos. Glorificado após o especial “de retorno” da NBC, Elvis quis retornar às turnês, o que implicariam, na ótica do Coronel Parker, em novas e cansativas viagens, o risco de não conseguir dinheiro suficiente e ainda o perigo de confrontar um novo público, agora acostumado a Beatles, Stones e Dylan. Em Vegas, Parker encontrou a solução para sua ambição. Elvis pôde realizar uma série de shows para uma plateia que havia sido adolescente nos anos 50, bateu todos os recordes e lucros de apresentações na cidade, e conseguiu
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reencontrar a felicidade por um breve período. Mal sabia ele que faria seus últimos shows ali. Margrett casou-se em 1967 com o ator Roger Smith e posteriormente recebeu duas indicações ao Oscar, de Atriz Coadjuvante por “Ânsia de Amar” (1971), e Atriz por “Tommy” (1975). Apesar do roteiro irregular, de final apressado, o filme marcou uma geração e a faixa-título tornou-se símbolo da “terra dos cassinos”, sendo executada até hoje por lá. A edição do DVD com o documentário também serve para explicar muito sobre a carreira do Rei do Rock. Nele, presenciamos relatos que explicam a relação do roqueiro com Vegas, e ainda o motivo pelo qual ele passou a vestir aquelas roupas extravagantes nos shows.
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É certo que a vida nos prega peças que, na maior parte das vezes, não estamos preparados para lidar. A maturidade para encarar situações de perda vem após muitos e muitos anos. Tantas e tantas despedidas. Meu amor sabe disso e, não raramente, aborda o tema com serenidade. Provavelmente eu jamais alcance tal estado de espírito.
Quando é preciso dizer adeus A Partida (Okuribito, Japão, 2008, de Yôjirô Takita)
05/06/2009 Quando nós, ocidentais, achávamos que o cinema japonês se tornara produtor exclusivamente do gênero de terror, eis que surgiu uma obra para arrebatar corações e mentes do mundo inteiro. “A Partida” levou o Oscar de filme estrangeiro em 2009, venceu 10 categorias na premiação da Academia Japonesa de Cinema e mais outros 21 prêmios ao redor do globo. O sucesso de crítica é mais que merecido, mas a obra não é apenas de um “filme de arte”. Trata-se de um veículo para todos os públicos, raças, nacionalidades, cuja trama parte de uma tradição nipônica para versar – sem apelar para o melodrama – de forma universal e sensível sobre amor, transformação, perda, orgulho e esperança. O título do filme se refere à cerimônia que prepara o corpo de um recémfalecido antes que ele seja colocado dentro do caixão. Masahiro Motoki (“A Mais Longa Noite em Xangai”) vive Daigo. Kobayashi, violoncelista que é obrigado a abandonar a carreira, devido à dissolução da orquestra onde tocava, e retorna à sua cidade-natal, onde passa a trabalhar como uma espécie de agente funerário, emprego que consiste em lavar, vestir e maquiar os mortos antes dos velórios e enterros. A profissão é vista com olhares tortos por amigos, conhecidos e sua esposa, interpretada pelo fenômeno japonês Ryoko Hirosue (de “Wasabi”,
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longa com Jean Reno, produzido por Luc Besson), que além de atriz, também é cantora de muito sucesso na terra do sol nascente. Mas com o tempo, Daigo se afeiçoa ao trabalho e vai transformando a opinião da amada. Nas mãos de um cineasta menos talentoso, o longa poderia soar deslocado aos olhos ocidentais, porém o diretor Yôjirô Takita, escudado por um roteiro simples e eficiente (que mescla em doses certas drama, romance e comédia), bela trilha sonora e elenco inspirado (destacando a química entre o casal protagonista e o veterano Tsutomu Yamazaki, no papel do chefe de Daigo), transcendeu qualquer barreira étnica que pudesse existir e realizou um filme sublime, utilizando símbolos orientais para fazer poesia universal. A maquiagem utilizada nos corpos pode parecer esquisita para quem vive no Ocidente, mas significa o desejo de que, para onde quer que aquela pessoa querida esteja partindo, continue bonita como foi em vida, e possa estar em paz. Não que os japoneses não sintam dor e/ou saudade pela perda. Sentem. Só que têm fé suficiente para acreditar que a tal partida, nada mais é que uma passagem para algum lugar melhor. Se nos últimos tempos nos acostumamos a elogiar o lirismo de longas chineses, feitos por diretores como Zhang Yimou (“Lanternas Vermelhas”, “Herói”) e Wong Kar-Wai (“Amor à Flor da Pele”), “A Partida” serve para colocar o Japão em pé de igualdade com as produções do país vizinho e lembrar que a pequena (territorialmente) nação asiática já presenteou o público com pérolas como “Dolls” e “O Samurai do Entardecer”. É a sabedoria oriental colocada em prática a favor do amor e dos sentimentos mais intensos.
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Crescer durante os anos 80 pode ser uma delícia. Ou, dependendo do caso, deixar complexado qualquer homem não musculoso tal qual Stallone, Arnold Schwarzenegger e companhia. Em voga, a época dos supermusculosos que, sozinhos, aniquilam exércitos inteiros. Novamente o amor entra em cena e traz á tona um sujeito supermusculoso, sim, e também desajeitado, que fala errado, e não, a princípio não é um “fodão”. Não basta ser forte, é preciso ser obstinado. E assim um novo aprendizado acontece. Logicamente esse sujeito apareceu antes de eu nascer. E, tão jovem, eu não poderia escrever, de tal forma, o que ele me proporciona. Foram precisos anos, e novas aparições dele, para que toda uma lembrança ressurgisse e ganhasse um contexto.
Aprendendo a se levantar Rocky Balboa (Idem, EUA, 2006, de Sylvester Stallone) 07/02/2009 Quando surgiram as notícias de que Sylvester Stallone ia retomar suas duas franquias mais conhecidas (“Rocky” e “Rambo”), muito foi comentado sobre a necessidade do astro em resgatar uma carreira em declínio, tudo em tom de desprezo, com ironia. Tais críticas não foram infundadas, pois desde que conseguiu o Oscar de Melhor Filme com “Rocky, Um Lutador”, em 1976, o ator/diretor sugou tudo o que podia do personagem, realizando quatro continuações em que o nível foi caindo episódio a episódio, culminando com um filme em 1990. Eis a surpresa. Aos sessenta anos, e provavelmente após ter refletido bastante sobre tudo o que realizou na sétima arte, Sly (como é chamado pelos amigos) resolveu tirar o “VI” do título e, como um pedido desculpas aos fãs do garanhão italiano, batizou esse sexto capítulo de “Rocky Balboa”, como que dizendo: “esse é o verdadeiro Rocky, aquele do primeiro filme”. E a ligação desse com o longa de 76 se torna clara ao
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longo da projeção – a começar pelo cartaz de divulgação, extremamente parecido com o original. Na trama, Rocky, aposentado há muitos anos, é dono de um restaurante (chamado Adrian's, em homenagem à esposa que faleceu vítima de câncer), vive de maneira nostálgica contando histórias de suas lutas para os clientes, e parece não ligar para isso. Seu filho (Milo Ventimiglia, da série “Heroes”) trabalha na Bolsa de Valores, é chamado de Baby Rocky pelos amigos e prefere manter distância do pai. Sem conseguir esquecer os ringues, o lutador resolve tentar voltar em lutas pequenas, mas não consegue. Após uma simulação de computador que coloca o atual campeão dos pesos pesados Mason Dixon (Antonio Tarver) enfrentando Rocky em seu auge, vem a reviravolta. Dixon costuma vencer os combates com facilidade, tem técnica reconhecida, porém não tem o apoio do público. E numa jogada de marketing para mudar a fama do rapaz, o agente de Mason resolve realizar uma luta oferecendo uma nova chance a Balboa. Com o aspecto rústico de “Rocky – Um Lutador”, Stallone criou um filme sensível e que mostra - em sua primeira parte - um homem enfrentando a velhice, os problemas de relacionamento com o filho e a saudade da mulher amada (por mais canastrão que seja, o ator realmente consegue emocionar na maneira como retrata a falta que Adrian faz a Rocky, que visita frequentemente o túmulo da amada). Numa atitude plausível, fugiu dos chavões anteriores onde o pugilista tirava parte de sua força do apoio da companheira para enfrentar vilões. Aqui não, o vilão não é necessariamente mau, e o que teria que ser um par romântico é apenas amizade, e o garanhão italiano tem que buscar em si mesmo a força para superar os problemas. E ainda pintam umas surpresinhas para os fãs, como a aparição de uma antiga personagem (uma ponta em cena hilária do primeiro da série, e que dessa vez tem papel importante), a rápida aparição de um velho conhecido dos ringues, o cunhado Paulie (Burt Young, carismático como de costume) e as velhas discussões, além de uma boa dose de humor.
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É claro que para fazer parte da franquia e agradar seguidores de carteirinha do herói, velhos clichês não podiam faltar e é a partir da segunda parte que a ligação com o clássico de 1976 se torna evidente. E dá-lhe o tema de Bill Conti quando o treino para a luta decisiva tem início: Rocky correndo com o cachorro e subindo as escadas do Palácio da Justiça da Filadélfia, inúmeros flashbacks e as manjadas viradas durante a luta, aqueles momentos em que após estar levando uma surra, ele resolve reagir e fazer com que todos gritem: Rocky! Rocky! Rocky! Mas tudo isso faz parte. Vale destacar a maneira diferente com que o combate é filmado, como uma verdadeira transmissão de TV (no caso, a HBO de verdade, com comentaristas e tudo). “Rocky Balboa” é um filme honesto e sem as extravagâncias dos antecessores, encerrando de forma digna uma série que, apesar de irregular, é memorável. Com esse longa os fãs poderão lembrar com carinho de Rocky, um cara bronco, bruto, simples e de gigantesco coração, capaz de achar fofo um cãozinho tido como feio pela maioria das pessoas, arranjar empregos para ajudar gente praticamente desconhecida, não se preocupar tanto com os lucros do seu restaurante, convidando pessoas de que gosta para comer de graça, e acima de tudo, ser um cara capaz de amar eternamente a esposa.
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Leite. Nescau. Refrigerante. Sucos. As primeiras cervejas. As noitadas, que, a princípio, tinham o objetivo de impressionar as meninas. Nem sempre o resultado era o esperado. Certa vez acabou em papelão. Durante esses anos, depois de inúmeros sabores revelados, nada como sentir-se maduro ao saber usufruir daquela que é considerada a bebida dos deuses. Sem frescura. Sem dar uma de especialista. Mas admirando quem entende: pois o prazer deve ser imensamente maior, profundo. A dois, então... Meu amor soube, como ninguém, convencer de que não dá para passar por esta vida sem uma boa taça...
Sabores O Julgamento de Paris (Bottle Shock, EUA, 2008, de Randal Miller)
21/12/2010 Alguns filmes sobre determinadas áreas conseguem despertar no espectador a vontade de saber mais sobre o tema em questão. “O Julgamento de Paris” é um deles. Baseado na histórica competição, de 1976, entre vinhos franceses e norte-americanos, é também sobre quebra de tabus. Alan Rickman interpreta Steven Spurier, verídico dono, inglês, de uma enoteca em Paris, que decide organizar uma degustação às cegas com os principais especialistas em vinho da capital francesa. Nela, concorrem vinícolas da França e da Califórnia. Do lado americano, somos apresentados à excêntrica família Barret, formada pelo pai, Jim (Bill Pullman), e seu filho, Bo (Chris Pine, de “Star Trek”), que lutam contra a falência de sua vinícola, a Chateau Montelena. Jim não vê saída para o negócio e desconta boa parte da frustração no filho, em lutas de boxe. Bo é um hippie que não quer saber de muita
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coisa, a não ser sair com garotas, beber e contrariar o pai. Mas a chance de participar da competição pode colocar (ou não) a família nos eixos. Apesar de baseado em uma história real, “O Julgamento de Paris” possui tom de Sessão da Tarde. Tem momentos dramáticos, mas em sua maior parte é comédia, romance, e até aventura. O roteiro é irregular. O triângulo amoroso, formado por Bo, Gustavo (Freddy Rodriguez) e Sam (Rachel Taylor), nada acrescenta à trama. O conflito amoroso não convence e fica deslocado no filme como um todo. Quanto à fidelidade aos fatos, os verdadeiros Jim Barret e Steven Spurier já declararam suas opiniões sobre o longa: “Eu fiquei profundamente ofendido pela forma incorreta como eu e meu negócio fomos apresentados”, disparou o organizador da degustação. Já Jim parece ter se divertido. “É uma versão totalmente Hollywoodiana. Mas eu gostei muito do filme, é uma carta de amor ao mundo dos vinhos! E, claro, vai despertar a atenção para o Chateau Montelena!”. Mesmo com os tropeços do enredo, Randall Miller, diretor de “Baila Comigo” e alguns trabalhos para a TV, realizou uma obra divertida, auxiliado pelo bom elenco, principalmente Alan Rickman, sempre interessante, e Chris Pine, cabeludo, maluquete e hippie, diferente dos papéis habituais de galã. Porém, são as paisagens e a forma como o vinho e seu processo de produção são tratados, que nos cativam. Dá vontade de visitar as vinícolas e até imaginamos o sabor da bebida. E, claro, histórias sobre superação costumam nos atrair. A Chateau Montelena era a zebra da tal competição. É a velha história do Davi contra Golias. Até então, apenas os vinhos franceses eram venerados mundialmente.
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Uma das facetas do meu amor, que fizeram eu me apaixonar, foi apresentar o mundo. Fazer conhecer cidades, povos, religiões, pratos, idiomas. Fazer-me perceber que vivemos alheios a muita, mas muita coisa bacana. Que nossa visão é imensamente restrita ante a variedade de pessoas, gêneros, culturas e histórias ao redor do planeta. Que o preconceito - ao qual somos apresentados diariamente, e de vez em quando nos toma – não está com nada. E que a vida é muito melhor quando compartilhamos experiências e conhecemos. Ah, o conhecimento. Mais uma vez, meu namoro me presenteou.
Globalização com ternura Nova York, Eu Te Amo (New York, I Love You, EUA, 2009, vários diretores) 21/07/2010 Sou natural de Santos, mas todos os dias vou para São Paulo trabalhar, no bairro Itaim Bibi, centro empresarial repleto de prédios e ruas e calçadas lotadas. E São Paulo é o tipo de cidade que, por vezes, me assusta. O trânsito caótico, a pressa das pessoas, a violência em alguns pontos do município, a disparidade social, a desesperança e a solidão que, segundo alguns amigos, surgem após algum tempo morando na capital paulista. São exemplos de como uma megalópole pode nos engolir. Mas ao mesmo tempo, São Paulo também apaixona. Quem adentra a cidade descobre sua riqueza cultural, bairros charmosos, a diversidade de raças, cores, estilos, a presença de amor e amizade que parecem desaparecer quando olhamos São Paulo em sua totalidade. É um local intenso, para o bem e para o mal. Esses dois lados de São Paulo já apareceram juntos ou separadamente em algumas obras cinematográficas como “Não Por Acaso”, de Philippe Barcinski, “O Invasor”, de Beto Brant, “Linha de
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Passe”, de Walter Salles, entre tantos outros. São diretores que, de alguma forma, conseguiram ver beleza em meio ao caos.
Você deve estar se perguntando por que estou falando de São Paulo se esse texto avalia um filme sobre Nova York. Bom, eu nunca estive, infelizmente, na cidade norte-americana. Mas imagino que, segundo livros, filmes e relatos de pessoas próximas, que a atual “capital do mundo” gere as mesmas sensações e sentimentos que a cidade brasileira. Talvez em doses maiores. O lado caótico de Nova York já foi mostrado inúmeras vezes no cinema – “Warriors – Selvagens da Noite”, de Walter Hill, “Táxi Driver – Motorista de Táxi” e “Gangues de Nova York”, ambos de Martin Scorsese, “Wall Street – Poder e Cobiça”, de Oliver Stone. Talvez até porque seja mais fácil mostrar o que é ruim, do que tentar flagrar o belo entre os arranha-céus e as avenidas batizadas com números do município. Mas alguns cineastas buscaram outra direção em “Nova York, Eu Te Amo”, longa que reúne diversos arcos realizados por diretores diferentes, da mesma forma como aconteceu no inferior e irregular “Paris, Eu Te Amo” (2006). São histórias de pessoas comuns, interpretadas com talento e entrega por atores como Bradley Cooper (“Se Beber, Não Case”), Natalie Portman (“Thor”), Orlando Bloom (“Tudo Acontece em Elizabethtown”), Christina Ricci, Ethan Hawke e muitos outros (alguns irreconhecíveis). E foram escolhidos cineastas igualmente capazes como Brett Ratner (“X-Men 3 – O Confronto Final”), Allen Hughes (“O Livro de Eli”) e Shekhar Kapur (“Elizabeth”). Este último é responsável pelo trecho mais triste do filme, escrito por Anthony Minghella, que morreu antes de poder dirigi-lo e a quem o longa é dedicado. Conta com Julie Christie, John Hurt e um estranho Shia LaBeouf (que ainda não convence como ator dramático) interpretando um deficiente físico. É o episódio que destoa do restante do filme, cujas histórias, de forma geral, misturam romance e comédia. São diferentes maneiras de amor
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e como o ser humano pode expressá-lo. Uma versão menos fantasiosa de “Simplesmente Amor” (que se passa na Inglaterra). Destaque para o encontro da judia Natalie Portman com um indiano no comércio de diamantes, que, apesar das culturas opostas e radicais, se entendem (este arco também foi o segundo trabalho de Portman como diretora – antes ela fez um curta-metragem em 2008 com Lauren Bacall e Ben Gazzara); o encontro de batedores de carteira (um deles Andy Garcia); o trecho dirigido por Brett Ratner, sobre um jovem que passa o dia com uma paralítica (Olivia Thirlby, a melhor amiga de Ellen Page em “Juno”); e aquele em que Chris Cooper escuta os devaneios de uma suposta desconhecida. Enfim, são todas situações escritas e dirigidas com ternura e que mostram ser possível encontrar beleza onde ninguém mais vê. Acima de tudo, “Nova York, Eu Te Amo” nos diz que, em cidades como Nova York e São Paulo, ainda existe quem se apaixone, ame, emocione, enfim… tenha alma. Alma!
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Amor sincero por vezes machuca. A princípio, não compreendemos, achamos que o sentimento não é recíproco. Mas quem ama não esconde a verdade. Fala, avisa, explica, mesmo que cada palavra possa ferir. Meu namoro nem sempre é tomado por flores. Vez ou outra, tira o chão dos meus pés. O sentimento de injustiça é forte. Por outro lado, contribui para o amadurecimento e o crescimento. O coração se torna forte. Fica precavido para possíveis novas decepções. E o amor, se verdadeiro, continua. Nem sempre o final é aquele almejado. No futuro, no entanto, olhamos para trás e percebemos a contribuição daquele momento para a serenidade presente.
Injustiçados A Moça com a Valise (La ragazza con la valigia, Itália / França, 1961, de Valerio Zurlini) 04/07/2011 Não foram poucas vezes: jovens de determinado segmento cultural romperam com o que havia sido feito até então. Consideraram trabalhos artísticos obsoletos e chamaram a atenção da mídia e do público por apresentarem obras, teorias, técnicas, absolutamente diferentes. Foi assim na música, a exemplo do punk rock, contrariando o rock progressivo vigente. Sorte que, eventualmente, os anos se encarregaram de fazer justiça. Exemplo: o Cinema Novo, que desconsiderou Anselmo Duarte, cineasta cuja importância para o cinema nacional felizmente acabou revista, ganhando um belíssimo exemplar na Coleção Aplauso. Triste é que muitos injustiçados não sobrevivem a tempo de ver o reparo. Um episódio, talvez ainda mais triste, de um talento quase destruído pela
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jovem crítica italiana da virada dos anos 50 para os 60, foi Valério Zurlini (1926-1982). Tudo por que o diretor não se enquadrava na turma de Fellini, De Sica, etc. Filmava em estilo clássico. Não menos fascinante que os colegas. A obra do cineasta foi reavaliada e recebeu o status merecido: de grande artesão e realizador cinematográfico. Infelizmente, para ele, o reconhecimento veio após sua morte. “A Moça com a Valise” é o responsável pela revisão. História sobre gente do bem fadada ao amor desiludido. Obra linda, sensível, que mostra a capacidade de Zurlini em extrair o melhor dos atores, traz Claudia Cardinale no auge da beleza, imagens e sequencias memoráveis, trilha sonora com o melhor do cancioneiro italiano daquele período. A trama inicia com a jovem e bela cantora Aida Zepponi (Cardinale) sozinha em Parma, após ser abandonada por Marcello (Corrado Pani). Ele lhe prometera crescimento profissional, sucesso, amor, e todo aquele papo de galanteador barato. Frustrada e furiosa, ela consegue localizar o endereço do rapaz. Quando a campainha da mansão toca, Marcello pede ao irmão mais novo, Lorenzo (Jacques Perrin), que se livre dela, invente qualquer desculpa. No entanto, numa daquelas armações do destino, surge uma forte ligação entre Aida e Lorenzo. Ela, de trinta e poucos anos. Ele, com 16. Lorenzo passa a fazer de tudo para agradá-la, emprestando-lhe dinheiro, hospedando-a em um hotel caro, telefonando no meio da noite para saber se está tudo bem. Está apaixonado. Aida gosta dele, conta com ele. No entanto, sabe que não pode retribuir o amor e não quer magoá-lo. O longa, que inaugurou a coleção da obra de Zurlini no país em cópia restaurada, comprova o talento do diretor em conceber planos maravilhosos e entregar ao público personagens envolventes, profundos. Algumas cenas entraram para a história: a descida da escada ao som de ópera, a dança observada por Lorenzo bêbado, o abraço sofrido de Aida e Lorenzo na praia. Nas mãos de outra pessoa, o trabalho poderia cair no melodrama. Aqui não. Tudo é muito sutil, sensível, triste, porém belo. O retrato de dois seres humanos que tentam acertar, encontrar a saída, algo que faça a vida valer à pena. Há quem pergunte como Aida caiu no papo
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de Marcello. Hora, há quem acredite nas pessoas. Fotografia, montagem, música e atuações ajudam a criar a história de amor que não pode ser consumado. Cardinale e Perrin catalisam nossa atenção. A primeira, linda, numa época em que ser bonita não significava ter corpo esquelético, é a escolha perfeita para o papel. Foi dublada, é verdade, dizem por causa da voz um tanto rouca. A partir dali, no entanto, se tornaria grande atriz. O segundo confere ingenuidade e garra ao personagem. Depois, estaria na obra prima de Zurlini, “Dois Destinos”. O roteiro existia há algum tempo. E teria sido baseado em fatos reais: Zurlini conheceu uma atriz famosa que viveu a história. Para se entender o contexto do lançamento de “A Moça com a Valise”, a importância do filme e do diretor, vale conferir os ótimos extras do DVD: há entrevistas com produtor, assistente de direção, um crítico de cinema italiano e apresentação do crítico brasileiro Rubens Ewald Filho, ardoroso admirador e conhecedor do cinema daquele país. Zurlini morreu sem conseguir filmar alguns projetos. Seu último longa, “O Deserto dos Tártaros”, foi lançado seis anos antes de falecer. Não teve o devido reconhecimento em vida. Não foi a primeira e nem será a última injustiça cometida por artistas, especialistas, público. O que muita gente não entende é que, para se compreender o presente e planejar o futuro, é preciso conhecer o passado. A filmografia de Zurlini não só merece ser conhecida, como admirada.
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Ok, ok. Obviamente não é tudo que aprendo com meu amor. Para algumas situações, ele simplesmente reforça, fortalece ideias, costumes. Adoro momentos simples. Por exemplo? Saborear uma torta de limão. E meu amor, em determinadas ocasiões, sabe, e como, valorizar instantes assim, compreender a vida e as relações humanas. Não somente o sabor de uma torta. Mas a importância da afinidade e, principalmente, da compreensão. Ele lembra, sempre, que em meio ao caos, há solidariedade, cumplicidade. Tipo: dividir uma torta.
Torta de limão Menina de Ouro (Million Dollar Baby, EUA, 2004, de Clint Eastwood) 11/02/2009 “Menina de Ouro” levou quatro estatuetas do Oscar: Filme, Direção (para Clint Eastwood), Atriz (Hylary Swank) e Ator coadjuvante (Morgan Freeman). Mereceu cada uma delas. A trama sobre “menina” de 30 anos que deseja aprender boxe com treinador experiente e até então machista, aborda de maneira peculiar assuntos já retratados no cinema – “o mestre e a aprendiz” e “boxe” são temas manjados e eutanásia é tópico dos mais delicados. Mas não há exageros no filme. O cineasta Clint Eastwood e o roteirista premiado Paul Haggis (diretor e responsável pelo roteiro do vencedor do Oscar “Crash – No Limite”), conceberam uma estrutura simples e
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eficiente, utilizando situações extremamente naturais – a cena em que Eastwood se delicia com uma torta de limão em um restaurante no meio do nada é puro cotidiano (e bela) - beneficiadas por uma direção sóbria e ótimo elenco. O veterano diretor, como costuma fazer, levou pouco tempo para realizar o longa (38 dias) e manteve seu status de autor de obras tristes e líricas, como pôde ser comprovado anteriormente em “Sobre Meninos e Lobos” e depois em “Cartas de Iwo Jima”. Com atuações fabulosas, Clint e Morgan Freeman surgem em cena demonstrando química surpreendente (já haviam atuado juntos em “Os Imperdoáveis”). O primeiro como alguém tentando superar a culpa por estar longe da filha. O segundo na pele de um ex-lutador que ficou cego de um olho. E há Hilary Swank. A atriz, premiada duas vezes pela Academia (venceu também por “Meninos Não Choram”) não possui a beleza de uma diva, mas há algo de muito especial nela. Singela, sempre consegue dar intensidade e sensibilidade a suas personagens, seja numa menina pobre que busca vencer na vida, como aqui, ou no hermafrodita interpretado por ela em “Meninos Não Choram”. Ela é aquele tipo de mulher que no colégio provavelmente não fazia grande sucesso entre os garotos mais populares, mas despertava a atenção daquele cara mais sensível. Aquela menina que precisa ser conhecida para ter desvendada sua beleza (e que beleza, vide sua aparição com um vestido que deixava as costas visíveis quando recebeu a estatueta do Oscar pelo filme). Ela tem dos sorrisos mais cativantes do cinema contemporâneo, muito talento e se entrega de corpo e alma aos seus papéis. Precisou de três meses para se preparar fisicamente antes do início das filmagens, período em que ganhou quatro quilos e meio de massa muscular. “Menina de Ouro” venceu também dois Globos de Ouro, em Direção e novamente Atriz (Swank), entre mais de 40 prêmios ao redor do mundo, e
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acaba sendo aquela história que jamais cansa o espectador. É um drama forte, que se utiliza da tragédia e do remorso e a perspectiva de superação para se transformar em inspiração para quem o assistir.
Se há algo de sábio no meu amor é sacar os caminhos da vida, das relações amorosas, da paixão, do auge, do desgaste, da perda e do resgate ou superação. Saber mostrar que a vida é tortuosa. Apanhamos pacas. Que as decepções podem ser constantes. E que as mágoas não são poucas. Além disso, também é acalantar, revelar novos caminhos ou – porque não? – elucidar como percorrer, novamente, uma estrada já conhecida e encontrar um novo destino ao fim da jornada. Não sou mais o mesmo. Continuo amando.
Perda e resgate Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças (Eternal Sunshine of the Spotless Mind, EUA, 2004, de Michel Gondry) 16/04/2009 Quem nunca desejou apagar alguém da memória? Seja pra esquecer um grande amor, ou uma pessoa que lhe tenha feito mal? Esse é o tipo de situação que se repete não uma, duas, mas várias vezes durante nossas vidas. Nos apaixonamos, amamos, compartilhamos nosso dia-a-dia. Depois a relação se desgasta, não dá certo, acaba. Não importa quem rompeu, se foi bilateral, se acabou bem, mal. Mergulhamos em conflitos pessoais. Refletimos, nos arrependemos, e até sentimos raiva. E é nessa hora que, se pudéssemos, “deletaríamos” tudo o que vivemos naqueles últimos tempos, sem parar para pensar que talvez tenhamos presenciado um aprendizado.
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Pois é, esse turbilhão de pensamentos, sentimentos e sensações é normal. Devíamos estar calejados, porém sempre que volta a acontecer, nos flagramos sofrendo tudo novamente, igualzinho. E é simplesmente genial o fato de, Charlie Kaufman, roteirista criativo, autor de textos no mínimo inusitados como os dos filmes “Quero ser John Malkovich” (1999), e “Adaptação” (2002), ambos em parceria com o diretor Spike Jonze, e “Natureza Quase Humana”, dirigido por Michel Gondry (que fez videoclipes da banda inglesa Radiohead), tenha realizado seu trabalho mais original a partir de algo tão batido na vida do ser humano.
“Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”, cujo título foi retirado do poema “Eloisa to Abelardé”, de Alexander Pope, que Charlie Kaufman já havia usado em “Quero Ser Johm Malkovich”, é uma pequena obra-prima do século XXI, um trabalho cinematográfico que paquera a ficçãocientífica, mas usa poucos – e eficientes – efeitos visuais, ancorando-se principalmente em seu roteiro inovador (premiado com justiça no Oscar) e um excelente elenco. É um filme tecnicamente simples, mas que atinge profundamente o espectador.
Para dar vida a esse romance contemporâneo, os produtores escolheram um casal nada convencional: Jim Carrey e Kate Winslet.
Ele, provando ser um bom ator dramático (já havia mostrado o potencial em “O Show de Truman”), injustamente ignorado nas premiações, interpreta Joel, sujeito tímido, que, segundo ele mesmo, se apaixona por toda mulher que lhe retribui qualquer tipo de contato.
Ela, em mais uma atuação de encher os olhos, foi indicada ao Oscar (prêmio que só levaria em 2009, por “O Leitor”), ao viver Clementine,
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garota maluquete, tagarela, temperamental, que troca a cor do cabelo conforme o sentimento da vez.
A escalação da dupla, se podia causar algum tipo de dúvida antes do longa ganhar as salas de projeção, tornou-se um tremendo acerto. Há uma química diferente entre eles, que conseguem transmitir, beirando a perfeição, as qualidades e os defeitos de duas pessoas extremamente diferentes, que ao mesmo tempo se completam. Trata-se de um romance, mas sem a pompa hollywoodiana. São pessoas reais, que poderiam ser nossos vizinhos. E por isso mesmo há uma identificação entre personagem e plateia. Torcemos por eles. Mas não são apenas os dois que chamam a atenção. Cada ator tem seu momento. Tom Wilkinson, Mark Ruffalo, Elijah Wood, Kirsten Dunst e o restante do elenco. Todos, sem exceção, protagonizam pelo menos uma grande cena. E não é necessária uma catarse para cada artista revelar seus dotes dramáticos. A entrega de cada ator está embutida em pequenos gestos, olhares, momentos quase silenciosos.
Joe e Clementine namoravam, mas num impulso gerado pelo desgaste da relação, ela procura uma clínica (onde o proprietário é Tom Wilkinson) que apaga as memórias das pessoas. Ao descobrir a ação da amada, Joe decide fazer o mesmo. Só que, durante o processo, se arrepende, e tenta salvar suas lembranças, num conflito que acontece dentro de seu próprio cérebro.
O texto não é linear. É “viajandão”. Exige certa atenção do público. E Gondry soube como dirigir esses instantes sem recorrer a clichês, filmando a cidade em tons quase cinzentos, utilizando o frio para dar ênfase à solidão dos personagens, e alternando sequencias sublimes, como aquela em que Carrey e Winslet deitam sobre um lago congelado,
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ou nas cenas em que a “memória” de Joe luta, dentro da sua mente, para não ser apagada. Uma história que acredita no destino, porém não dá o seu recado de maneira brega nem didática.
“Brilho Eterno” ainda foi premiado em Edição e Roteiro no BAFTA, Atriz (Kate) e Roteiro pelos Críticos de Londres, e venceu mais 30 prêmios ao redor do mundo. Foi o melhor longa de 2004 (junto com “Menina de Ouro”, vencedor de quatro Oscars no mesmo ano, incluindo Filme e Atriz, para Hillary Swank), e um dos melhores e mais sensíveis desta década. E mesmo que um dia a tal clínica especializada em apagar as lembranças das pessoas possa existir, eis um filme apaixonante que jamais sairá da memória de quem o assistir. Afinal, quando nos apaixonamos, mesmo que a relação acabe, e nos apaixonemos de novo por outro alguém, não esquecemos, por mais que tentemos acreditar, das paixões passadas.
“Se arrependimento matasse...” Essa não foi meu amor, mas outra pessoa querida quem me ensinou. No namoro, porém, fui apresentado a um dos exemplos mais tristes do que uma atitude estúpida pode causar. Ciúme, inveja, melindre. Ao passar dos anos, somos pegos por esses inimigos invisíveis e, não raramente, nos deixamos levar. Que eu saiba, ninguém sofreu demais por conta de uma besteira minha. E não foram poucas. Espero não repeti-las, para não deixar na mesma situação que aquela apresentada pelo meu amor.
Arrependimento Desejo e Reparação (Atonement, 2007, Reino Unido / França / EUA, de Joe Wright)
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09/02/2009 “Desejo e Reparação”, adaptação cinematográfica do romance “Reparação”, escrito pelo festejado Ian McEwan, fala basicamente sobre como reparar um mal feito, seja o estrago em si, ou o dano moral. Quase todos em algum momento de suas vidas se arrependeram de alguma atitude. Principalmente quando ela pode ter criado uma inesperada bola de neve de acontecimentos. E quando se tenta corrigi-la e já não há mais tempo? O estrago está feito. E como repará-lo? Aos 13 anos, Briony Tallis não tinha noção do que um simples relato falso pudesse causar, prejudicando a vida de duas pessoas amadas: sua irmã mais velha Cecilia, e Robbie Turner, filho de uma das empregadas da família. O cenário é a Inglaterra de 1935. Briony é uma menina que escreveu sua primeira peça. Ficou apaixonada por Robbie (James McAvoy) quando ele a salvou de um afogamento. Robbie é apaixonado por Cecilia (Keira Knightley), que corresponde aos sentimentos do rapaz. Certo dia, quando uma das primas da família é assediada por um visitante rico, a menina é a única testemunha, mas acaba acusando Robbie. O fato faz com que Robbie e Cecilia se separem. Ele vai preso, e depois é convocado para lutar na Segunda Guerra Mundial para poder deixar a prisão. Com o passar dos anos, Briony percebe a besteira que cometeu, mas as vidas dos envolvidos já estão destruídas. O longa é o segundo da carreira do diretor Joe Wright, e pela segunda vez ele tem como protagonista Keira Knightley, em outro drama de época, por sinal, mais apurado que o anterior e ótimo “Orgulho e Preconceito”. Sem medo de arriscar, o cineasta não segue as “normas” dos filmes do gênero, e implementa sequências que mostram a mesma cena de ângulos diferentes.
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A obra foi vencedora dos Globos de Ouro de Melhor Filme/Drama e Trilha Sonora e sua equipe técnica e elenco foram indicados sete vezes ao Oscar (Filme, Atriz Coadjuvante, Direção de Arte, Fotografia, Figurino, e Roteiro Adaptado e a trilha sonora de Dario Marianelli, fabulosa, que levou o troféu da Academia com justiça o Dario realizou um trabalho que – numa grande sacada – mistura trilha instrumental com os sons das cenas, como marteladas, ou um garoto batendo uma bola na parede – a junção de música e barulho soa perfeita e cria o clima necessário para os momentos que alternam drama, romance e suspense. Já o roteiro adaptado escrito por Christopher Hampton condensa com eficiência a trama original. E a reconstituição de época (incluindo os figurinos e a excelente direção de arte) retrata com grande competência o período. Merecem destaque ainda a fotografia de Seamus McGarvey e a direção de Wright, que criou uma das grandes cenas do ano, naquela em que o expectador flagra, através de Robbie e dois amigos na praia de Dunquerque, o horror causado à Europa pelo conflito. Esse planosequência contou com cerca de mil figurantes (seria melhor dizer atores, pois a sintonia e a veracidade com que trabalharam parecem de profissionais experientes) em cena e mais 350 pessoas trabalhando nos bastidores. Mas o longa não seria uma obra-prima caso o elenco não tivesse belo desempenho. Keira Knightley finalmente despe-se da aura de garota ao dar vida a uma mulher sedutora, contracenando momentos incendiários, literalmente molhada, e com cigarro na boca. Essa mudança de “perfil” foi intencional. O diretor queria que ela encarnasse Briony no fim de sua adolescência, mas a atriz pediu para interpretar Cecilia, pois pretendia se afastar do estigma de “menininha” perante o público. James McAvoy entra em sintonia com a atriz, formando um casal cuja química transcende a tela, provando ser um dos melhores atores de sua geração. Porém é a personagem Briony que rende as melhores interpretações. Três atrizes foram escaladas para viver três épocas da vida da irmã caçula de Cecilia – e as três catalisam as atenções. A começar pela pequena Saoirse Ronan, uma das revelações dos últimos anos, lembrada pela Academia para disputar a estatueta de Atriz Coajuvante. Tal indicação também poderia ter ido tanto
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para a bonita Romola Garai (“Scoop”), que faz Briony aos dezoito anos, como para a veterana Vanessa Redgrave, na fase idosa da personagem. Orçado em US$ 35 milhões, o filme abriu o Festival de Veneza e cativa cinéfilos mais ligados na parte técnica assim como o espectador em busca de uma história bem contada e emocionante – que poderia cair em lugar comum caso o desfecho (no livro dentro do livro) não fizesse a analogia com as vezes que imaginamos um final diferente para a burrada que fizemos. Mesmo quando estamos arrependidos e tentamos consertar alguma atitude estúpida, há o costume de entregar ao acaso (ou ao destino, se preferirem) o conserto das coisas. Mas confiar no acaso é dar um tiro no escuro. Então é melhor pensar duas vezes para não atirar em alguém amado ou no próprio pé.
Arrependimento II Um Novo Despertar (The Beaver, EUA, 2011, de Jodie Foster) 06/06/2011 Mel Gibson se queimou feio em Hollywood. Foram as declarações antissemitas, o alcoolismo, a acusação de ter ameaçado bater na exmulher... Chegou ao fundo do poço. Mas gente como Jodie Foster diz que, no fundo, ele é do bem. Amigo generoso, fiel, daqueles que se pode contar a qualquer hora. E a atriz/diretora se manteve ao lado do companheiro. Preparou “Um Novo Despertar” para ele brilhar. Aguentou os atrasos na produção em
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virtude da exposição negativa do colega na imprensa. Foi com ele à Cannes divulgar o trabalho. O personagem protagonista foi pensado para o veterano astro. Walter Black mergulha na depressão, influenciando negativamente os filhos, é abandonado pela família, e encontra num fantoche em forma de castor (em inglês, beaver, do título original), uma nova maneira de se comunicar com o mundo. Quem sabe, redimir-se, recomeçar. Impossível não comparar intérprete e personagem. Ambos chegaram ao limite. Viram suas vidas quase desmoronarem. No lapso de perdição, encontraram apoio em figuras próximas. Na vida real, a amiga Jodie Foster. Na ficção, a esposa, curiosamente vivida pela atriz. O filme fracassou nas bilheterias. No entanto, a história funciona, emociona, chega a dar um nó na garganta. Principalmente quem sabe o que a depressão pode causar. Ou quem vê alguém querido se afundar, precisar de ajuda, e mesmo prejudicando-se, sabe que deve contribuir pela melhora da pessoa amada. Jodie Foster conduz com garra a história e cercou-se de gente capacitada, principalmente no elenco. Mel Gibson incorpora – ou será que vive ele mesmo? – com intensidade Walter Black. É mais ou menos como ocorreu com Mickey Rourke em “O Lutador”. Todos são figuras que erraram, feio. Porém, não são más. Conhecem suas imperfeições. Desejam acertar de algum jeito. Ainda que saibam o quão difícil é encontrar o caminho. Também há Anton Yelchin (o Chekov, do ultimo “Star Trek”, de 2009), bem na pele do filho mais velho, Porter, que faz anotações sobre os defeitos do pai, os quais não quer repetir. A excelente Jennifer Lawrence (“Inverno da Alma”, “X-Men: Primeira Classe”) é Norah, o interesse romântico deste último, outra que precisa superar um trauma do passado. O ator mirim Riley Thomas Stewart corresponde como o filhinho que se isola no colégio e fica fascinado pelo pastor, numa interessante demonstração de como o lúdico
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pode contribuir no desenvolvimento de uma criança. Elogiar a atriz Jodie Foster é chover no molhado. Segura, experiente. O roteiro dá alguns solavancos. Uma ou outra situação força a barra. No entanto, a obra, num todo, envolve, fala diretamente ao coração. Dói é perceber que, enquanto Walter Black encontrou perdão e amor nas pessoas a quem magoou, na vida real nem sempre é assim. Vide a trajetória de Mel Gibson. Ele fez besteira. Mas quem de nós jamais fez? Foi julgado, execrado publicamente, numa onda de hipocrisia à maneira daquela que excluiu Lars Von Trier de Cannes. E tudo começou por que ele mexeu com quem não devia: ao ofender os judeus, ofendeu também o alto escalão de Hollywood, os poderosos da indústria. Tantos fizeram pior do que ele e seguiram em frente. Se tantas vezes pregamos o perdão, ou escutamos pessoas nos dizendo que devemos perdoar, por que não damos uma chance a Mel Gibson? Não fazer isso, é ignorar uma atuação envolvente como essa, de “Um Novo Despertar”. Se é difícil crer nele depois de tantas burradas cometidas pelo astro, podemos crer em Jodie Foster, mulher respeitada, admirada, correta. O longa está aí. Então fica a dica e a torcida para que Mel Gibson, que fez tanta coisa boa no cinema (“Mad Max”, “Máquina Mortífera”, “Coração Valente”), dê a volta por cima.
Se há algo que não aprendi ainda com o meu amor é a entender a mente feminina. Por mais experiências adquiridas, conversas, reflexões e por mais que discutamos a relação, a impressão é que, não adianta: em sua essência, as mulheres sempre serão um mistério. O que fazer? Como administrar quando o coração bate mais forte? Seja de alegria. Ou pela perda iminente. Se há algo que tenho observado, em meu amor, é que a(s) resposta(s) estão longe, bem longe.
Quando o amor confunde a mente Apenas o Fim (Idem, Brasil, 2008, de Matheus Souza)
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Dois jovens: Adriana (Érika Mader, sobrinha da Malu) e Antônio (Gregório Duviver, de “À Deriva”). Ela: bonita, esperta, provocadora, meio maluquete. Ele: nerd, veste camisa pólo antiga e óculos do avô. Adriana vai ao encontro de Antônio quando ele está para fazer uma prova na faculdade. O motivo? Ela não quer mais namorar, vai embora para algum lugar fora do país e tem somente uma hora antes de embarcar, a qual decide passar com ele e propõe: “Podemos utilizar esse tempo transando ou discutindo a relação”. Antônio prefere a segunda opção. A partir daí, o diretor e roteirista Matheus Souza, de então apenas 20 anos, em "Apenas o Fim", nos presenteia com uma hora e meia de diálogos inteligentes, inúmeras citações pop, e um realismo que ora diverte, ora parte o coração. Afinal, todos já vivemos situações que remetem às vontades de Adriana (ter liberdade, fugir do cotidiano) e Antônio, que se vê perdido diante do rompimento. Entre as andanças do casal pelas belas paisagens da PUC/RJ, são inseridos alguns flashbacks que mostram os dois, deitados na cama, conversando temas variados: de Tartarugas Ninja a Supernintendo, de Vovó Mafalda a "O Senhor dos Anéis". Realizado por alunos da PUC-RJ, “Apenas o Fim” surgiu como um trabalho de faculdade para a rrancar elogios da crítica, ser premiado pelo público e ganhar a Menção Honrosa no Festival de Cinema do Rio, e, principalmente, cativar toda uma geração que viveu curtindo episódios dos Cavaleiros do Zodíaco, jogando Mario Bros., imaginando a Britney Spears nua e tentando compreender os caminhos e descaminhos do amor. Matheus Souza, à maneira de Quentin Tarantino, utiliza a obra alheia para criar algo peculiar, que soa novo. Os diálogos remetem a Woody Allen, Domingos de Oliveira, entre outros. As citações pop a Cameron Crowe, Nick Hornby e “Juno”. E o casal formado por Érika e Gregório poderia muito bem ser substituído por Joel (Jim Carrey) e Clementine (Kate
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Winslet), de “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”; Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy) de “Antes do Amanhecer”/“Antes do Pôrdo-Sol” (aliás, a caminhada do casal protagonista é herança direta dos filmes de Richard Linklater); ou ainda pelo casal interpretado por Glen Hansard e Markéta Irglová em “Apenas uma Vez”. Ou seja, são pessoas comuns, como eu e você, vivendo algo real, a despedida e a perspectiva do recomeço. Sem os exageros hollywoodianos, sem dramalhão nem personagens caricatos. A conversa entre Adriana e Antônio flui tão naturalmente que temos a impressão que os atores chegaram a improvisar algumas falas. Apesar da pouca idade para a profissão, Matheus Souza parece ter vivido o dobro, tamanha segurança com a qual ele conduz a trama. Ainda por cima, provou que é possível fazer bom cinema com pouco: o filme custou “meros” R$ 8 mil, valor irrisório para uma produção cinematográfica. “Apenas o Fim” é um sopro de juventude no cinema nacional, um belo exemplo para quem acha que os filmes produzidos por aqui só mostram violência, pobreza, nudez. Pode ser encarado como um veículo somente para quem tem vinte e poucos anos. Ledo engano. Relações amorosas são identificadas por todos os públicos. Acima de tudo, o longa é como aquelas receitas feitas por nossas mães e avós, que utilizam ingredientes simples, se apropriam de itens de pratos mais elaborados, para conceberem algo extremamente saboroso. Ao longo de nossa relação, fui apresentado a vários outros amores. Ou melhor, várias formas de amar. E foi do amor dessas pessoas que nutri a energia necessária para seguir em frente após tropeços, ou comemorar junto, depois de uma vitória.
Ah, o coração... Simplesmente Amor (Love Actually, Reino Unido / EUA, 2003, de Richard Curtis)
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08/03/2011 Sabe aqueles filmes natalinos que já assistimos tantas vezes, mas sempre que reprisam, conferimos novamente e nos emocionamos outra vez? “Simplesmente Amor” é um deles. A diferença é que, ao invés de uma, conta com várias histórias. Cada uma apresentando uma faceta do amor, ou a falta dele. O novo primeiro-ministro inglês (Hugh Grant) se apaixona por uma funcionária (Martine McCutcheon) recém-contratada para sua equipe; escritor (Colin Firth) se refugia no sul da França para tentar superar a traição da esposa e acaba se envolvendo com uma empregada portuguesa; mulher (Emma Thompson), que parece viver o casamento perfeito, passa a desconfiar da fidelidade do marido (Alan Rickman); jovem recémcasada (Keira Knightley) suspeita dos sentimentos do melhor amigo (Andrew Lincoln) do marido (Chiwetel Ejiofor) por ela; viúvo (Lian Neeson) tenta se relacionar com o enteado (Thomas Sangster) que, por sua vez, tenta chamar a atenção de uma colega de escola; americana (Laura Linney) há muito tempo espera pela chance de sair com o colega de trabalho (Rodrigo Santoro), por quem é secreta e perdidamente apaixonada; astro do rock (Bill Nighty), em fim de carreira, tenta o retorno ao show business; jovem (Kris Marshall) sonha ir para os EUA, onde, segundo ele, poderá sair com várias garotas; e rapaz e garota que trabalham como marcadores de cena em filme pornô passam a flertar. Com um elenco repleto de estrelas, destacando o carismático Hugh Grant, e as presenças sempre marcantes de Laura Linney, Emma Thompson e Colin Firth, além de participações e pontas de Billy Bob Thornton (como presidente norte-americano), do Mr. Bean Rowan Atkinson, das atrizes Denise Richards (“Garotas Selvagens”) e Elisha Cuthbert (a filha de Jack Bauer na série “24 Horas”) e da top model Claudia Schiffer, o filme traz vários clichês de histórias de amor. A sensação é que já vimos essas situações. Mas e daí? São tantas atuações charmosas, cenas divertidas, trilha sonora contagiante, tiradas de sarro espertas sobre política e a música pop, que é praticamente impossível não embarcar no longa e se deliciar com ele.
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Não à toa, a produtora Working Title e o diretor/roteirista Richard Curtis foram responsáveis por alguns dos melhores filmes que misturaram amor, drama e comédia nos últimos 20 anos, como “Quatro Casamentos e um Funeral” e “Um Lugar Chamado Notting Hill”, também estrelados por Hugh Grant. Uma obra agradável e de bom gosto que pode ser vista facilmente mais de uma vez, não somente no Natal.
São anos de relação. Acho que não amadureci completamente e nem sei se quero. E anos virão, espero. Aprendi alguma coisa? Acredito que existe amor eterno. Ele está numa tela. E é real.
O Autor
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André Luiz de Albuquerque Azenha é jornalista, formado em 2001. Estudou Roteiro na Escola de Cinema, na capital paulista. Foi repórter e colunista de sites, revistas e jornais de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Limeira e Maceió. Desde 2007 é repórter da Veja Litoral Paulista, colunista de cinema do G1 Santos. Em 2008, publicou seu primeiro livro, “Poesia a Quatro Mãos”, escrito em parceria com sua mãe e poetisa Regina Azenha. Trabalhou com o crítico de cinema Rubens Ewald Filho entre 2008 e 2009. Em 2011, fez críticas de filmes para a revista Época São Paulo. Participa e organiza oficinas de jornalismo e crítica de cinema. Atuou quatro anos em agências de comunicação em São Paulo. Mediou, em 2011, o ciclo Documentários Comentados, no Sesc. Ministra o projeto Cine Comunidade, pela Secretaria de Cultura de Santos, no bairro continental Caruara, com crianças carentes. É editor dos sites www.cinezen.net e www.santoscultural.net e assessor de imprensa. Lançou, em janeiro de 2011, a 1ª “Coletânea CINEZEN” – o objetivo é lançar um volume por ano.
SUMÁRIO Agradecimentos
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Prefácio – por Gustavo Klein Carlan
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Eterno Namoro
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Quando éramos jovens (Karatê Kid: A Hora da Verdade)
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Remédio para as horas entediantes (Curtindo a Vida Adoidado)
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Existe quem nos entenda (Obrigado, Jonh Hughes, o cineasta dos adolescentes)
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O despertar (50 anos sem Marilyn)
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Rito de Passagem (Toy Story 3)
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Trilha sonora (Michael Jackson’s This is it)
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Trilha sonora II (Amor a toda Velocidade)
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Quando é preciso dizer adeus (A Partida)
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Aprendendo a se levantar (Rocky Balboa)
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Sabores (O Julgamento de Paris)
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Globalização com ternura (Nova York, Eu te Amo)
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Injustiçados (A Moça com Valise)
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Torta de limão (Menina de Ouro)
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Perda e resgate (Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças)
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Arrependimento (Desejo e Reparação)
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Arrependimento II (Um Novo Despertar)
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Quando o amor confunde a mente (Apenas o Fim)
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Ah, o coração (Simplesmente Amor)
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O autor
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EDIÇÕES CAIÇARAS São Vicente Brasil
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A Edições Caiçaras é uma pequena editora independente artesanal inspirada nas cartoneras da América Latina, principalmente na Sereia Ca(n)tadora de Santos e na Dulcinéia Catadora de São Paulo. Nasceu pela dificuldade homérica e labiríntica em publicar meus livros em uma editora convencional. É uma forma de reavivar o ideal punk do “faça você mesmo”, incentivando a auto-gestão e o uso da habilidade manual, algo que está se perdendo em nossa sociedade tecnocrata. Assim, de fato, começa a tomar forma a filosofia da Edições Caiçaras, mais do que um caráter social, interessa-nos, ousar na forma e no conteúdo. Na forma é um aprimoramento das técnicas das cartoneras - os livros são feitos com capa dura, costurados com sisal e presos com detalhes em bambu, e no conteúdo, priorizamos um diálogo profundo com a Internet e com as literaturas locais do Brasil. Márcio Barreto CATÁLOGO POESIA O Novo em Folha - Márcio Barreto Nietszche ou do que é feito o arco dos violinos - Márcio Barreto Pequena Cartografia da Poesia Brasileira Contemporânea - Marcelo Ariel (Org.)
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Perdas & Danos - Madô Martins Mundocorpo– as aerografias e outros desvios do tempo – Márcio Barreto Peixe-palavra (poesias caiçaras) – Domingos Santos DRAMATURGIA Atro Coração - Márcio Barreto Ácidos Trópicos – uma livre criação sobre a obra de Gilberto Mendes – Márcio Barreto ENSAIO Obras Cadáveres - Arthur Bispo do Rosário, Estamira, Jardelina, Violeta e o Deus do Reino das Coisas Inúteis - Ademir Demarchi Desaforismos (aforismos) - Flávio Viegas Amoreira ROMANCE Teatrofantasma: O Doutor Imponderável contra o onirismo groove – Marcelo Ariel
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www.edicoescaicaras.blogspot.com www.youtube.com/projetocanoa www.percutindomundos.blogspot.com www.soundcloud/percutindomundos
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Meu namoro com o cinema foi impresso sobre papel reciclado 75g/m² (miolo). A capa foi composta a partir de papelão e sacolas cedidas pelos alunos do Espaço de Consciência Corporal Célia Faustino e pôsteres doados pela Vídeo Paradiso. www.espacodeconscienciacorporalceliafaustino.blogspot.com www.videoparadiso.com.br
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