José Rogério Almeida é um salesiano, padre. Estudou filosofia na Universidade Pontifícia Salesiana (Roma) e na Universidade Católica Portuguesa (Braga). Lecionou esta disciplina em diversas Instituições: Instituto Superior de Estudos Teológicos (Lisboa), Instituto de Ciências Humanas e Teológicas (Porto), Instituto Superior de Psicologia (Lisboa), Universidade Católica (Lisboa, Porto). Dedicou-se, também, à área da espiritualidade e apresentou as suas reflexões noutros pequenos livros: Deus é o nosso Absoluto; Peregrinos de Deus; O Espírito, a força da nossa fragilidade; Aquele que mora nos céus ri-se deles. Atualmente vive em Lisboa, dedica-se ao ministério sacerdotal, e faz investigação sobre a história da presença salesiana em Portugal.
José Rogério Almeida
O PODER DAS MÃOS VAZIAS
O PODER DAS MÃOS VAZIAS
Sobre o autor:
José Rogério Almeida
Esvazia as mãos. De quê? De tudo o que te impede de ser “pobre em espírito” e “buscador de Deus”. Encontrarás neste pequeno livro algumas sugestões que te levam para um “outro mundo”: o mundo do “impossível”, quer dizer, o mundo da verdade… Mas enche o coração. De quê? De amor. Se amas, morrerás crucificado. Se não amas, morrerás de tédio, e passarás a vida a bocejar… Porque a vida é um dom recebido, para ser oferecido e repartido, como quem distribui pedaços de pão… O modelo é Jesus. Jesus amou, fez-se pão, doação: “Tomai e comei, isto é o meu corpo.” “Tomai e bebei, este é o cálice do meu sangue.” E morreu na cruz…
Rua Dr. Alves da Veiga, 124 Apartado 5281 | 4022-001 Porto Tel.: 22 53 657 50 Fax: 22 53 658 00 edisal@edicoes.salesianos.pt www.edisal.salesianos.pt
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José Rogério Almeida
O poder das mãos vazias
Edições Salesianas Amostra gratuita "O poder das mãos vazias" Edições Salesianas
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Edições Salesianas Amostra gratuita "O poder das mãos vazias" Edições Salesianas Ficha Técnica © 2017 José Rogério Almeida © Ilustrações: Nuno Quaresma © 2017 Edições Salesianas Rua Dr. Alves da Veiga, 124 Apartado 5281 4022-001 Porto Tel: 225 365 750 Fax: 225 365 800 www.edisal.salesianos.pt edisal@edicoes.salesianos.pt Publicado em Abril de 2017 Capa: Paulo Santos Paginação: João Cerqueira Impressão e acabamentos: Printhaus ISBN: 978-989-8850-37-9 D.L: 423923/17
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Prólogo O poder dasEdições “mãos vazias!” Uma metáfora dos “pobres Salesianas em espírito” e dos “buscadores de Deus!” Da primeira à última Amostra gratuita poder mãos vazias" página! Um conjunto de"O temas para ler,das meditar, talvez rezar. Edições Salesianas Sem características técnicas nem académicas. São apenas convites, apelos, sugestões. Talvez não passem de ilusões. Roçam o horizonte do “utópico”, do “impossível”, do “ainda não”. São uma peregrinação. Peregrinação sem caminho: caminhante, não há caminho; o caminho faz-se caminhando… É partir, sem saber que estradas palmilhar, que caminhos calcorrear, a tropeçar, a suar. Mas, se possível, a rezar, a cantar, a dançar. Porque Deus é maravilha, alegria, misericórdia, perdão… É a “aventura” de uma peregrinação: Sei “para onde” vou, mas não sei “por onde” vou… Vou andando, caminhando, 3
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inventando caminhos, criando espaços, de mãos vazias, aberto o coração, na esperança da misericórdia e do perdão… Caminhante, não há caminho; o caminho faz-se caminhando… Caminhante, não há caminho; os caminhos fazem-se inventando-os… Vou andando, caminhando, Edições Salesianas inventando caminhos, criando espaços, "O poder das Amostra gratuita passo a passo, Edições Salesianas de mãos vazias, aberto o coração, à espera do meu Deus, e do seu eterno abraço. Porque Deus é maravilha, alegria, misericórdia, perdão… É a “aventura” de uma peregrinação: (…)
mãos vazias"
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O poder das “mãos vazias” Mas que “poder” é este, oSalesianas das “mãos vazias”? Edições
Luta pelo poder. Conquista o poder. Agarra-te ao poder. Amostra gratuita "O poder das mãos vazias" Não largues o poder… Edições Salesianas Não há dúvida: o poder pelo poder é um poderoso afrodisíaco… Que tem isto a ver com mãos vazias? Nada. E, no entanto, é o poder das mãos vazias que revoluciona o mundo. O Doutor e Mestre da radicalidade deste poder das mãos vazias é Jesus Cristo. Jesus inaugurou o reino da “fraternidade sem brilho”, do “amor sem fronteiras”, da “doação gratuita”, do “sacrifício redentor”. Jesus “esvaziou-se” radicalmente de si mesmo: fez-se presépio, sem-abrigo, refugiado, carpinteiro, pescador, apóstolo errante, sem eira nem beira; fez-se lava-pés, ceia, cruz, abandono.
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Esvaziou-se, e entregou-se como “pão da vida” e “cálice da salvação”: “Tomai e comei: isto é o meu corpo”. “Tomai e bebei: este é o cálice do meu sangue”. Esvaziou-se, abriu os braços e foi crucificado. E sentiu-se abandonado por todos, até por seu Pai. Ficou sem nada, perdeu tudo, exceto a Obediência, o Amor e o Perdão… E o mundo do poder ficou às avessas. E as “revoluções” passaram a ter outros atores: os que, numa atitude de “esvaziamento interior”, se deixam “expropriar” do seu “eu” para se transformarem em oferta, em hóstia, em pão… E no palco da História entram os “perdedores”, os que ficam no “último lugar”, os que nunca ocuparam o “centro do palco”, os que “se perderam pelo caminho”, os que não têm Edições Salesianas assunto para escrever uma autobiografia.
Amostra gratuitaque"O das vazias" Os “vampiros” por poder esse mundo fora mãos se deleitam no exercício orgástico do poder pelo poder e sugam a dignidade de Edições Salesianas vítimas inocentes acabam por ser vencidos por homens de mãos vazias. Mahatma Gandhi e João Paulo II venceram Impérios.
Perguntaram ao Arcebispo de Ho Chi Minh qual era o segredo da vitalidade da Igreja no Vietname. “É não ter poder nenhum” – respondeu ele. Não podemos pôr em causa o poder de “César” usando as mesmas armas. Nem as mesmas, nem outras. A única arma são as mãos apoiadas sobre os joelhos e abertas em direção ao céu, prontas para dar e acolher, para rezar e lutar. As mãos que “agarram” paralisam a vida de partilha e de comunicação. A pobreza do vazio estimula a circulação das
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encomendas com presentes. Pelo menos era esta a opinião dum professor: Passa a encomenda. Por vezes, é tudo o que se pode fazer. Pegar nela, senti-la e pô-la a girar. Não para mim, não para ti, mas para alguém, algures, num dia qualquer. Ponde-a a girar, rapazes. Eis o jogo que quero que aprendais. Ponde-a a girar, rapazes1. Mãos vazias, corações vazios, prontos para o acolhimento! – Que bater é este? Que bater à porta é este, ao longo da noite? É alguém que nos quer molestar. – Não, não, são os pobres, os famintos, os “sem-poder”, os “mãos-vazias”. Edições Deixai-os entrar, deixai-osSalesianas entrar2… Entraram. Amostra gratuita "O poder das mãos Entraram nas casas e nos corações.
vazias"
Edições Salesianas
E converteram os “poderosos” à fraternidade universal. E fundaram um “reino” onde a máquina do poder era conduzida por crianças e palhaços. E armou-se uma grande “confusão”: alegria, risos, cravos vermelhos, algazarra de crianças a brincar, e, no céu, balões e pombas aos milhares, a voar… Era a “República da Filadélfia”3…
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Referência a uma personagem do filme A turma de história, do cineasta Alan Bennett.
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Adaptação muito livre dum texto de um autor inglês (Cf. Timothy Radcliffe, ob. cit., p. 237, nota 37).
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“República do amor aos irmãos”.
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“Tratavam-se todos por irmãos e ninguém chamava seu ao que lhe pertencia”4. O “amor das mãos vazias” encheu a Terra. A felicidade era tanta que as pessoas já não sabiam se estavam na Terra ou no Céu… E cantavam um “cântico novo”: São os pobres, os famintos, os “sem-poder”, os “mãos-vazias”, deixai-os entrar, deixai-os entrar… E não havia polícias nem ladrões… Porque a única “lei” era amar… Era a “República da Filadélfia”… Edições Salesianas
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Act 4, 32 e 2, 42.
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Cinco pães e dois peixes Cinco pães e Edições dois peixes, ou a mística do tudo, que pode ser Salesianas muito, pouco, ou quase nada…
Amostra gratuita "O poder das mãos vazias" Cinco pães e dois peixes é o título de um pequeno livro do Salesianas bispo vietnamita Edições Francisco Xavier Nguyen Van Thuan . 5
Em 1975 Paulo VI nomeou-o bispo de Saigon. A 15 de agosto deste mesmo ano foi preso. Foi libertado a 21 de novembro de 1988. Em 1994 foi nomeado presidente do Conselho Pontifício Justiça e Paz. Em 2000 pregou o retiro ao Papa João Paulo II. Morreu em 2002. Foi introduzido o processo de beatificação. Este bispo passou treze anos na prisão, nove dos quais em isolamento. Nesta situação de fragilidade e sujeito a todos os limites físicos e psíquicos, escolheu como ícone da sua prisão o rapaz do Evangelho que deu cinco pães e dois peixes para Jesus alimentar a multidão: 5
Ed. Paulinas, Prior Velho, 2009.
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Erguendo o olhar e reparando que uma grande multidão viera ter com Ele, Jesus disse então a Filipe: «Onde havemos de comprar pão para esta gente comer?» Dizia isto para o pôr à prova, pois Ele bem sabia o que ia fazer. Filipe respondeu-lhe: «Duzentos denários de pão não chegam para cada um comer um bocadinho.» Disse-lhe um dos seus discípulos, André, irmão de Simão Pedro: «Há aqui um rapazito que tem cinco pães de cevada e dois peixes. Mas que é isso para tanta gente?» (Jo 6, 5-9). Aquele rapaz deu tudo, quase nada, mas deu tudo o que tinha. Talvez pudéssemos expressar a mensagem deste pequeno livro da seguinte maneira: a mística do tudo, que pode ser muito, pouco, ou quase nada. O importante é que seja tudo.
Salesianas E o bispo rezaEdições assim: “Quero ser o rapaz que ofereceu tudo o que tinha. Era nada: cinco pães e dois das peixes,mãos mas era ‘tudo’ Amostra gratuita "O poder vazias" o que tinha, para ser ‘instrumento’ do amor de Jesus”6. Edições Salesianas
E vai identificando as diversas situações por que passa na prisão com a oferta destes cinco pães e dois peixes. A vida é um dom recebido, para ser oferecido e repartido, como quem distribui pedaços de pão… “Quando fui preso, tive de viajar em seguida, ‘de mãos vazias’”. Mas mesmo nesta situação de “mãos vazias”, foi resolvendo alguns problemas servindo-se de umas abençoadas “mentirinhas”. Com o rótulo de “remédio contra o mal de estômago”, chegou-lhe uma pequena garrafa de vinho de missa. E assim, 6
Ibidem, p. 58.
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“com três gotas de vinho e uma gota de água na palma da mão”, celebrava missa todos os dias7. Outra vez, num dia de chuva, andava a cortar lenha. Pediu ao guarda que lhe deixasse cortar um pedaço de madeira em forma de cruz. - “Você não sabe que é severamente proibido ter qualquer símbolo religioso?” - “Eu sei. Mas somos amigos (…). Feche os olhos, vá andando e deixe-me só”. “Talhei a cruz e conservei-a escondida num pedaço de sabão até à minha libertação (…). Tornou-se a minha cruz peitoral”8. No fundo, o recado que este bispo nos quer deixar é o seguinte: há situações na vida em que não fazemos o que queEdições Salesianas remos, mas só fazemos o que podemos. E vivemos como podeAmostra gratuita "Oe confiante poderdos das mãos mos, na aceitação humilde nossos limites.vazias" A única coisaEdições que não sofria limites, e que o bispo fazia Salesianas como queria, era ser instrumento do amor de Jesus: “Quero ser o rapaz que ofereceu tudo o que tinha. Era nada: cinco pães e dois peixes, mas era ‘tudo’ o que tinha, para ser ‘instrumento’ do amor de Jesus”. Um dos limites que nos obriga a fazer só o que podemos é o irrevogável avanço dos anos. A vida nasce, cresce e chega ao seu ocaso (quando chega!). As forças vão faltando, os cabelos também. Quando começamos a ser “jovens em espírito”, quer dizer que as coisas já não andam a correr lá muito bem… E não vale a pena ceder à tentação de um voluntarismo irrealista e frustrante. É melhor aceitarmos as idades e a lei da 7
Cf. Ibidem, pp. 42-43.
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Cf. Ibidem, p. 56.
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vida e, quando chegar o pôr-do-sol e tivermos só cinco pães e dois peixes, rezarmos como o irmão Bonifácio, que já andava a fazer “horas extraordinárias”, sem saber muito bem em que idade andava a navegar: Encanta-me a primavera, O outono, o inverno meu; A quarta idade linda e bela, O pôr-do-sol que sou eu. Também já fui primavera, Mas foi-se, fui desandando; Não voltarei ao que era, Mesmo com ela voltando. Aspiro a outra mais bela, Mais duradoira que ela, Salesianas Edições Que avence séculos além!...
Amostra gratuita "O poder das mãos vazias" Sempre perene, sempre em flor! Edições Salesianas Unido a Deus-criador, Que não esquece ninguém9. Outro limite é a doença. Também ela faz parte da lei da vida. É outra situação em que somos convidados a entrar na mística do rapaz do Evangelho: “Senhor, só tenho isto; não consigo dar mais. É pouco, mas é tudo”. Mas… “A eficácia do anúncio do Evangelho não é fruto somente (e antes de tudo) de estratégias humanas, de capacidade discursiva, de propaganda humana”10. 9
Aires Gameiro, A terceira estação da vida: a sabedoria e a prática do envelhecimento, em AA.VV., “Novos ventos, novos tempos”, p. 169.
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Gianfranco Ravasi, O que é o homem?, p. 76.
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O que há de mais fraco no mundo é que Deus escolheu para confundir o que é forte (1Cor 1, 27). “Aquele Deus, que escolhe os humildes, os débeis e os últimos, consegue mais facilmente revelar a sua palavra de salvação através da fragilidade dos doentes. É o típico paradoxo evangélico dos últimos que serão os primeiros no reino de Deus”11. O leito de uma cama ou uma cadeira de rodas podem transformar-se em púlpitos eloquentes, segundo a doutrina paulina da “loucura” e do “escândalo” da cruz (1Cor 1, 23). Porque… O Reino de Deus é o reino do amor e do poder das mãos vazias, o reino das aves do céu e dos lírios, onde os pássaros comem à mesa dos meninos e os lírios crescem no deserto, onde o “impossível” é a realidade e as coisas ao contrário são a verEdições Salesianas dade…
Amostra "O poder dassomos mãos vazias" Jovensgratuita ou velhos, doentes ou sadios, não o centro do universo. Por muitas coisas que façamos, produzimos só átomos… Edições Salesianas De acordo com a “loucura” e o “escândalo” da cruz, Deus não nos pede façanhas triunfalistas, mas que façamos da nossa vida ofertório, hóstia, comunhão: “Tomai e comei”… Cinco pães e dois peixes! É muito pouco, Senhor, mas é tudo o que tenho. Não tenho mais nada para dar. O resto são limites, fragilidades, doenças e idades, desejos que já não posso realizar. Só me resta amar, e ser, Senhor, instrumento do teu amor. 11
Ibidem, p. 77.
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O caminho da subida faz-se descendo, o caminho da vitória faz-se perdendo. É natal! Edições Salesianas Amostra gratuita "O poder das mãos vazias" Dizem que aEdições tentação original, no “jardim terreal”, foi a Salesianas tentação de ser Deus e a não aceitação dos limites que Deus nos impusera. E continuamos a ceder à mesma tentação: Pouco importa o equilíbrio do porte, e quantas penas meus passos me dão, eu sou senhor do meu destino: da minha alma sou capitão12. Capitão, capitão, não és senhor, nem da tua alma nem do teu destino. És mentira e ilusão. Os homens esquecem-se de que “tudo é graça” e continuam a ceder à tentação de “conquistar” o céu. Naquele tempo… 12
Poeta inglês W. E. Henley.
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O homem tentou subir ao céu. Agarrou numa corda. Lançou-a com força e arrogância para as alturas e fixou-a no vazio. Começou a subir a golpes de pulso. Mas os pés atolavam-se cada vez mais na lama do chão e a corda caiu-lhe nos braços num emaranhado de mil ilusões… O Senhor desfez os planos das nações, frustrou os projetos dos povos. Só o plano do Senhor permanece para sempre, e os desígnios do seu coração por todas as idades (Sl 33). O homem é simplesmente homem e só Deus é Deus. A pretensão de ser mais que homem provoca o riso divino: Aquele que mora nos céus ri-se deles (Sl 2). Os nossos projetos loucos desmoronam-se por “implosão”. “NenhumaEdições condição humana consegue suportar o fardo Salesianas da divindade”13. Faríamos do céu um inferno!
Amostra gratuita "O poder das mãos vazias" O homem é só homem. É preciso descer à verdade de nós Edições mesmos. Não vale a pena lutarSalesianas com Deus. Faz, Senhor, que eu diga sempre Sim: contigo não me importo de perder até ao fim14. Recordemos mais uma vez o bispo mártir vietnamita: não tinha pretensões; não queria ser mais do que era; quando foi preso, teve de partir de “mãos vazias”; e na prisão queria ser apenas “aquele rapazito do Evangelho” que deu pouco, quase nada, mas deu tudo o que tinha: cinco pães e dois peixes. Senhor, ajuda-nos a ser como o “rapazito do Evangelho”: a dar pouco, quase nada, tudo; e aceitar os limites da nossa humanidade. 13
Timothy Keller, Falsos Deuses, p. 69.
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António Couto, Vejo um ramo de amendoeira, p. 44.
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E Deus “desceu” à Terra… E Deus “perdeu”15… Despojou-Se e salvou-nos… E comungou-nos… O caminho da subida faz-se descendo, o caminho da vitória faz-se perdendo. Faz, Senhor, que eu diga sempre Sim: contigo não me importo de perder até ao fim. É Natal! Tu vens do Alto, Senhor. Tu vens de Deus. Tu és Deus. Edições Salesianas Tu és gratuita o Justo Amostra "O poder das mãos que chove das alturas sobre a nossaEdições humanidadeSalesianas sedenta e às escuras16.
15
Referência à dimensão “quenótica” da Encarnação (Fl 2, 5-11).
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António Couto, Quando Ele nos abre as Escrituras, Ano B, p.12.
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Ser feliz com dois peixes, ou só com um Edições Salesianas Quando lemos textos sobre o tema da felicidade, encontraAmostra gratuita "O poder das mãos vazias" mos quase sempre um menu muito complicado, recheado dos Edições Salesianas ingredientes mais diversos. No “restaurante da felicidade” há para todos os gostos. E como gostos não se discutem, acabamos por ficar com a impressão de que a procura da felicidade conduz a um relativismo subjetivista que mete tudo no mesmo saco. Um saco que nunca fica cheio. A felicidade é comparável a um puzzle a que falta sempre alguma peça, ou a uma manta pequena que, depois de esticada em todas as direções, deixa sempre a descoberto alguma parte do corpo17. Enquanto andarmos “por aqui”, a conquista da felicidade será sempre acompanhada pelo sabor amargo da desilusão. Por outro lado, ninguém gosta de sair de um restaurante com fome. Gosta de sair “satisfeito”. Mais um problema: identificar felicidade com satisfação. Mas medir o grau de felicidade 17
Cf. Henrique Rojas, O homem light, p. 117.
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pelo grau de satisfação não é propriamente o apanágio mais dignificante da espécie humana… A satisfação não conduz à felicidade. Quando muito, pode conduzir a um tédio existencial a extravasar longos bocejos de uma imensa lassidão. É mais feliz um sábio insatisfeito que um cábula satisfeito. Pior ainda quando esta satisfação acontece à margem do valor moral. Perante o comportamento “desviante” de alguém, as pessoas desabafam: “Enfim, tem direito a ser feliz!” Mas sem moralidade não há felicidade. A “voz da consciência”, incómoda e acusadora, não permite. Felicidade sem moralidade só pode terminar na mais profunda frustração. No complicado menu da felicidade, há um ingrediente que nunca falta: o bem-estar material. E lá vamos, cantando e danEdições Salesianas çando, à volta do bezerro de ouro…
Amostra gratuita "O apoder mãos vazias" Uma história ajuda-nos avaliar, e adas relativizar, a relação entre bem-estar material e felicidade. Edições Salesianas Era uma vez… “Um turista dialoga com um pescador pobre, a apanhar sol na praia, com o resultado da sua faina: dois peixes. – Porque não pescas mais? – Para quê? – Para teres dinheiro, criares uma empresa, contratares muitos empregados, seres cada vez mais rico, exportares e montares mais empresas… – E depois? – Serias tão rico, que já não precisavas de trabalhar e passarias os dias na praia a apanhar sol.
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– Mas é precisamente isso que estou a fazer, sem ter de passar por toda essa trapalhada”18. Pois é, se não acertamos com o menu da felicidade, armamos mesmo uma grande trapalhada… Proposta para o menu da felicidade: amor a Deus + amor ao próximo + um barquinho + um anzol + dois peixes + banhos de sol. E se quiseres ser mesmo, mesmo feliz, fica só com um peixe e dá o outro a quem não tiver nenhum. E o Pai do Céu, que conhece o segredo dos corações, te dará a recompensa. Porque a vida não é um negócio… A vida é o templo do amor, da comunhão e da partilha. E nós fizemos dela um covil deSalesianas feirantes… A prática obsessiva Edições e paranóica do “sentido da posse” matou a gratuidade e a fraAmostra ternidade.gratuita "O poder das mãos vazias"
Edições Não podemos ser felizes Salesianas sozinhos. A porta da felicidade abre para fora…
O “inferno são os outros” – proclamou o filósofo ateu Sartre. Enganou-se. Os outros são o céu. O céu é a felicidade da infinita comunhão. O contrário é exatamente a definição de inferno: a (in)felicidade da infinita solidão. Sê feliz, caro leitor, mas não te tranques em casa, portas adentro. A porta da felicidade abre para fora… E não te metas em trapalhadas. Podes ser feliz com bem pouco: com dois peixes, ou só com um… 18
Anselmo Borges, Deus e o sentido da existência, pp. 98-99.
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Índice Edições Salesianas Amostra gratuita "O poder das mãos vazias" Cinco pães e dois peixes............................................................................. 11 Edições Salesianas Prólogo........................................................................................................ 3 O poder das “mãos vazias”.......................................................................... 5
O caminho da subida faz-se descendo, o caminho da vitória faz-se perdendo. É natal!...................................................................................................... 17 Ser feliz com dois peixes, ou só com um..................................................... 21 Ou heróis ou santos................................................................................... 25 A porta da santidade abre para fora........................................................... 31 Um coelho a tocar violino.......................................................................... 35 O “impossível” é a verdade........................................................................ 41 Eu não sou ídolo de mim mesmo................................................................ 47 Há notícias do país da Filadélfia................................................................ 53 Não sei de que estás a falar........................................................................ 57 Deus não está “aí”, ou a “nuvem do não-saber”........................................ 63 O Deus-Maravilha..................................................................................... 69
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Porque é que sofrem as crianças?............................................................... 75 E Deus disse a Moisés: “Eu sou aquele que sou”........................................ 83 Deus é alegria, e sabe “dançar”.................................................................. 87 A nossa vida é um hino.............................................................................. 93 Durante uma pregação, acontece alguma coisa?......................................... 99 Ser santo e “deixar de funcionar” é para todos........................................ 105 Mãos vazias, mãos eucarísticas................................................................ 111 Epílogo..................................................................................................... 113 Bibliografia.............................................................................................. 115
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José Rogério Almeida é um salesiano, padre. Estudou filosofia na Universidade Pontifícia Salesiana (Roma) e na Universidade Católica Portuguesa (Braga). Lecionou esta disciplina em diversas Instituições: Instituto Superior de Estudos Teológicos (Lisboa), Instituto de Ciências Humanas e Teológicas (Porto), Instituto Superior de Psicologia (Lisboa), Universidade Católica (Lisboa, Porto). Dedicou-se, também, à área da espiritualidade e apresentou as suas reflexões noutros pequenos livros: Deus é o nosso Absoluto; Peregrinos de Deus; O Espírito, a força da nossa fragilidade; Aquele que mora nos céus ri-se deles. Atualmente vive em Lisboa, dedica-se ao ministério sacerdotal, e faz investigação sobre a história da presença salesiana em Portugal.
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O PODER DAS MÃOS VAZIAS
O PODER DAS MÃOS VAZIAS
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Esvazia as mãos. De quê? De tudo o que te impede de ser “pobre em espírito” e “buscador de Deus”. Encontrarás neste pequeno livro algumas sugestões que te levam para um “outro mundo”: o mundo do “impossível”, quer dizer, o mundo da verdade… Mas enche o coração. De quê? De amor. Se amas, morrerás crucificado. Se não amas, morrerás de tédio, e passarás a vida a bocejar… Porque a vida é um dom recebido, para ser oferecido e repartido, como quem distribui pedaços de pão… O modelo é Jesus. Jesus amou, fez-se pão, doação: “Tomai e comei, isto é o meu corpo.” “Tomai e bebei, este é o cálice do meu sangue.” E morreu na cruz…
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